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Nº 414 Março / 2015FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONÔMICAS

As ideias e opiniões expostas nos artigos são de responsabilidadeexclusiva dos autores, não refl etindo a opinião da Fipe

RobertoLuisTrosteranalisaosdesa�iosdosetorbancárioeatendência

àmaiorconcentraçãoanteaconjunturaeconômicaepolíticade2015.

Regras para Pensão por Morte

R������ N������� C�������

Presidência do Brasil: Sem Rumo Num Mundo de Fantasias

I���� ��� N��� �� C����

Vídeo sob Demanda, Monetização e Outras Fronteiras na Economia Política do Setor Criativo

J���� L������� M�����

O Comportamento da Política Fiscal: de 1990 aos Anos Recentes

C�������� B���� S����� F��������

análise de conjuntura

Política Monetária

R������ L��� T������

Mercado de Trabalho

V��� M������ �� S����

RogérioNagamineCostanzianalisaasmudançasnasregrasparapensão

pormortenaPrevidênciaSocial,diantedeumquadrodeexpressivo

aumentodosgastoscomessebene�ício.

JulioLucchesiMoraesdiscutenovosmodelosdenegócionosetoraudio-

visualinternacional,perspectivasdemonetizaçãodeatividadescriativas

epossíveisregulamentaçõesnessesegmento.

p.3

IracidelNerodaCostatececomentáriosecríticassobreaatuaçãopolítica

eeconômicadogovernoDilmanesteiníciode2015.

p.9

CarlândiaBritoSantosFernandes,nosegundoartigodasérie,apresenta

umaperspectivahistóricadaconduçãopró-cíclicadapolítica�iscaldos

anos1990atéacrise�inanceirade2008.

p.13

p.14

p.17

p.6 VeraMartinsdaSilvafazumbalançodomercadodetrabalho,apartirde

2000,eapresentaosdadosdaPNADcontínuadejaneirode2015.

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março de 2015

Conselho Curador

JuarezA.BaldiniRizzieri(Presidente)AndréFrancoMontoroFilhoCarlosAntonioRocca

DenisardC.deOliveiraAlvesFernandoB.HomemdeMeloFranciscoVidalLunaHeronCarlosEsvaeldoCarmoJoaquimJoséMartinsGuilhotoJoséPauloZeetanoChahad

INFORMAÇÕES FIPE É UMA PUBLICAÇÃO MENSAL DE CONJUNTURA ECONÔMICA DA FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONÔMICAS – ISSN1678�6335

Conselho Editorial

HeronCarlosE.doCarmoLeninaPomeranzLuizMartinsLopesJoséPauloZ.ChahadMariaCristinaCacciamaliMariaHelenaPallaresZockunSimãoDaviSilber

Editora-Chefe

FabianaF.Rocha

Preparação de Originais e Revisão

AlinaGasparellodeAraujo

Produção Editorial

SandraVilasBoas

žhttp://www.�ipe.org.br

SimãoDaviSilberVeraLuciaFava

Diretoria

Diretor Presidente

CarlosAntonioLuque

Diretor de Pesquisa

MariaHelenaPallaresZockun

Diretor de Cursos

JoséCarlosdeSouzaSantos

Pós-Graduação

PedroGarciaDuarte

Secretaria Executiva

DomingosPimentelBortoletto

Indicadores Catho-Fipe

Os indicadores Catho-Fipe, desenvolvidos pela Fipe em parceria com a Catho, oferecem uma visão mais apro-

fundada e imediata do mercado de trabalho e da economia brasileira. As informações disponíveis em tempo

real no banco de dados da Catho e em outras fontes públicas da Internet permitem agilidade na extração e

cálculo dos números. Desta forma, é possível acompanhar a situação imediata do mercado de trabalho, sem

a necessidade de se esperar um ou dois meses para a divulgação dos dados ofi ciais. Todos os indicadores são

divulgados no último dia útil de cada mês, com informações sobre o próprio mês.

O primeiro indicador é uma estimativa para a taxa de desemprego calculada pelo IBGE, a Taxa de Desempre-

go Antecipada. A Fipe calcula também um índice que acompanha a relação entre novas vagas e novos currí-

culos cadastrados na Internet, o Índice Catho-Fipe de Vagas por Candidato (IVC). Este indicador é mais amplo

do que a taxa de desemprego, porque traz informações sobre os dois lados do mercado: a oferta e a deman-

da por trabalho. Além desses dois indicadores, o Índice de Salários Ofertados permite o acompanhamento

dos salários oferecidos pelas empresas que estão em busca de novos profi ssionais.

Maiores Informações:

É:(11)3767-1764

œ:catho�ipe@�ipe.org.br

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3análise de conjuntura

março de 2015

Política Monetária

R������ L��� T������ (*)

Osetorbancáriobrasileiroviveu

muitosdesa�iosaolongodesua

históriaeseencontranumaen-

cruzilhada:podeserumsuporte

importantenestemomentodi�ícil

ouse transformaremmaisum

peso,di�icultandoaretomadada

economia.

Opiorquepoderiaacontecerneste

momentoéterproblemasbancá-

rios.

Oambientemacroeconômicose

apresentacomplicado.Ossinais

desejadosdasvariáveisestãotro-

cados:in�laçãoejurosemaltae

crescimentoeempregoemqueda.

Agravandooquadro,nocenário

internacional,háespeculaçõesde

queoBrasilpodeperderograude

investimento(investmentgrade),os

preçosdascommoditiesestãoem

quedaeoFEDdevesubirastaxas

nofuturopróximo.

Osindicadoresdosetorbancá-

riocomoumtodopreocupam.A

inadimplênciaestáalta,embora

estávelnos�inanciamentosbancá-

rios;oíndiceSerasa,quetambém

incluiatrasosemoperaçõesdo

comércioedo�inanciamentonão

bancário,mostrarecordesdealta

nocomeçodesteano.

Háumaincertezasobreosimpac-

tosdaoperação“LavaJato”nomer-

cadodecréditoeemquesetoresa

desaceleraçãoeconômicavaiafetar

maisocrédito.

Essequadroafetamaisasituação

dosbancosmédiosepequenos,que

jáapresentamumambientehostil.

Osnúmerosdesetembrode2014

(osúltimosconsolidadosdispo-

níveis)mostramqueosquatro

maioresbancostêm49%dopatri-

môniolíquidodosistemae68%do

lucro,enquantoosdemaisbancos

comerciaisemúltiplostêm32%do

patrimônioe10%dolucro.

Essesnúmerosapontamparao

fatodequeaconcentraçãobancá-

riapodevirarmancheteesteano.É

umtemasemprepresentenaanáli-

sedosistemabancáriobrasileiro.

Desdeaestabilizaçãodaeconomia,

osíndicesdeconcentraçãobancá-

riaapresentamvalorescrescentes,

eonúmerodebancos,queda:eram

246instituiçõesem1994,caíram

para157em2010epara155em

2014.

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4 análise de conjuntura

março de 2015

As taxasdeconcentraçãosubi-

ramnasúltimasduasdécadase

aceleraramatendêncianoúltimo

quadriênio.Osquatromaiores

bancosdetinham57%docrédito

dosistemaem2010,aumentaram

suaparticipaçãopara58%noano

seguinte,para60%em2012,para

62%em2013epara63%em2014.

Osnúmerosindicamquedevecon-

tinuaraseconcentrar.Desde2010,

opatrimôniolíquidodessequar-

tetosubiude41%dosistemapara

49%eolucrolíquidoaumentoude

57%para68%.Portanto,observa-

-serentabilidademédiasuperior

aorestoetendênciadeaumentode

suaparticipação.

Maiorconcentraçãodosetorban-

cário,porsi só,nãoquerdizer

nada.Épossívelimaginarumsis-

temadeumúnicobancoe�iciente

oferecendoserviçosadequadosa

preçosrazoáveis,bemcomooutro

demuitas instituiçõesoperando

comoumcartelcommargensde

lucrosabusivas.

Emborasejaumvalormaiorque

odopassadoequecontinuaráa

subir,onúmeroemsinãoémotivo

depreocupações.Usandocompa-

rações internacionais,osistema

bancáriobrasileironãoémuito

concentrado.

Outrasempresasdeabrangência

nacional,comoaviaçãoetelefo-

nia,têmtaxasdeparticipaçãoem

mercadosmaisaltas.Ehásetores,

comoosaneamentobásico,emque

umaúnica�irmaofereceseuspro-

dutoseserviçosacustosrazoáveis.

Oimportanteédeterminarascau-

sasdaconcentraçãobancária,se

sãobené�icasounãoparaasocie-

dade,ecomoestruturaromercado

paraadequá-loaosinteressesdo

Brasil.

Umaconcentraçãomaiorpodeser

resultadodeabusodopoderde

mercado,daexistênciadeecono-

miasdegrandezaedacombinação

deambos.

Aprimeiracausaéque,emrazão

deseutamanhoedarigidezdos

relacionamentos,osgrandesco-

brariamtaxasmaisaltasecom

issoteriamlucrosextraordinários.

Todavia,nãoéocaso;namédia,as

taxasdosquatrograndesbancos

nãosãomaioresqueasdosoutros

bancoscomerciais.

Umaanálisedasdemonstrações

contábeismostraqueaexplicação

estáemeconomiasdegrandeza,

causadaspordistorçõesinstitu-

cionais,comumviésregulatório

favorecendobancosgrandes.

Osquatromaiorestêm71%dos

depósitostotais,sistemicamente

sãomaisrelevantesdoqueasde-

mais1.576instituiçõesdosistema

juntas,quenamédiatêmumíndice

deBasileia(solidez)queéodobro

dosgrandes.Portanto,ospequenos

sãoapartemenosvulneráveldo

sistema.

Mesmo assim, a regulação é a

mesmaparatodasasinstituições,

éumtamanhoúnico,nãoimpor-

tandosuaparticipaçãoourisco

sistêmico.Comooscustosdecom-

pliancesãopredominantemente

�ixos,sãoproporcionalmentemaio-

resparaosbancosmenores.

EnquantoolemaCCCparabancos

grandeséClientela,CustoseCrédi-

to,paraosdemaissetransformou

emCompliance,ComplianceeCom-

plianceemrazãodoaumentode

exigênciasregulatóriascontábeis,

�iscais,deoperações,depagamen-

tos,cambiais,decadastroepru-

denciais,paracitaralgumas.

Ilustrandooponto,apenasasre-

grasquetratamdeaferirasolidez

decadainstituiçãosão68norma-

tivostotalizando581páginas,um

despautério!Éumabizantinice.

Osistemabancário brasi leiro,

deacordocomoWorldEconomic

Forum, temumdoscustosmais

altosporativosdomundo,ena

médiaosquatromaiorestêmcus-

tosmenoresporativo,oqueexpli-

capartedalucratividademaisalta

dosmaiores.

Umsegundofatorqueexplicaode-

sempenhomelhordosmaioreséa

regulaçãodeliquidez,emrazãodas

exigênciasdeníveisaltosdeencai-

xeseaofatodequeoredesconto

nãocumpreseupapelacontento

–nosúltimosdozemeses,observa-

-seapenasumaoperaçãodeR$20

milhões.

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5análise de conjuntura

março de 2015

Enquantoosquatromaiorestêm

51%doativo emoperaçõesde

crédito,osdemaisapenas38%,em

razãodoestoquemaiordeativos

líquidosquedevemter. Issofaz

comqueoíndicedecoberturados

menoressejamaisbaixo,oquese

re�letenumarentabilidademenor.

Opontoéque,apesardebemin-

tencionada,aregulamentaçãoé

concentradora,temumaltocusto

dee�iciênciaenãoresolveadequa-

damenteaquestãodaestabilidade;

muitopelocontrário,temumefeito

perversodefragilizaremvezde

fortalecerosistema.

Aconcentraçãoémaisconsequên-

ciadoquecausadasdi�iculdades

dosistema.Existeumviésregula-

tórioquegeraeconomiasdegran-

dezafavorecendobancosgrandes,

di�icultandoe,emalgunscasos,in-

viabilizandoinstituiçõesmenores.

Aconsequênciaéquelimitaosur-

gimentodenovosempreendimen-

tos,promoveumenxugamento

inoportuno,desestimulaacompe-

titividadeeainovaçãoefomenta

desnecessariamenteaoligopoliza-

ção.

Instituiçõesmenoresemmerca-

dos,sejaobancário,odesuper-

mercadosououtro,cumpremum

papel importante,eliminandoa

possibilidadedesubsídioscruza-

dos,atendendoanichos,inovando

efacilitandooajustedaestrutura

concorrencialàstransformações

tecnológicaseeconômicas.

Nosetorbancário,osbancosme-

noressãoimportantesporqueca-

nalizamcréditoparaaspequenas

emédiasempresasqueatravessam

umasituaçãoproblemática.De

acordocomoSerasa,maisdame-

tadedelastêmcontasematraso,

muitasdasquaissãosolventes,

massetornaminadimplentesem

razãodadinâmicadosetorban-

cário.

Considerandoafragilidadema-

croeconômicapara2015,quevai

afetardeformaadversaosetor

bancário,mais severamenteas

pequenasinstituiçõesdoqueas

grandes,seriaoportunorepensar

aquestãoprudencialedaliquidez,

analisandoocustobene�íciode

cadanorma.

Poder-se-ia,também,analisarnão

sóasituaçãodospequenos,como

dosistemacomoumtodo,quetem

umpotencialdecontribuirpara

amenizaratravessiade2015ese

tornarumpropulsordaeconomia

apartirde2016.

(*) Fipe. (E-mail: [email protected]).

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6 análise de conjuntura

março de 2015

Mercado de Trabalho: Queda do Nível de Atividade Já Tem Im-pacto no Mercado de Trabalho

V��� M������ �� S���� (*)

Omercadodetrabalho,quenos

últimosanosvinhaapresentando

desempenhomuitobomemtermos

dequedadataxadedesocupação

eaumentosreaisdossalários,�i-

nalmentefoiatingidopelaredução

daatividadeeconômicade2014;

nãohaveriadeserdeoutromodo,

jáqueosdiversosmercadosestão

relacionadosentresi.OGrá�ico1

apresentaaevoluçãodosvínculos

empregatíciosgeradospelaecono-

miaentre2000e2014,tomando-

-secomobaseosdadosdoCAGED

-CadastroGeraldeEmpregadose

DesempregadosdoMinistériodo

TrabalhoeEmprego.Oquesevê

éumaforteexpansãodoemprego

apartirde2004,resultadodame-

lhoriadasrelaçõesdetrocadaeco-

nomiaedaadoçãodepolíticasde

estímuloaomercadointerno,como

aumentosreaisdosaláriomínimo

edeprogramasdetransferência

derendasparaasclassesdabase

dapirâmide.Noentanto,apartir

de2012,essemodelopassoua

apresentarsinaisdeesgotamento,

cujarelevânciafoimitigadapelas

autoridadesdogovernofederal.

Osaldodevínculosformaisge-

radosem2014foiaindapositivo,

cercade153milnovospostosde

trabalhonosetorformal,masfoi

opiorresultadodasériedesde

2000.Os indicadorespassadose

asperspectivasnegativasgenera-

lizadassugeremque2015seráde

fatoumanodeaprofundamentoda

estagnaçãoemesmorecessãoeco-

nômica,demodoqueageraçãode

bonsempregosdemodoconsisten-

tepelaeconomiabrasileirapassaa

serumsonhodistante.

Gráfi co 1 – Saldo de Vínculos Empregatícios Gerados pela Economia Brasileira – Final de Dezembro – 2000-2014

Fonte:CAGED/MTE,<www.ipeadata.gov.br,14/03/2015>.

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7análise de conjuntura

março de 2015

Emtermosdeinformaçõesnovas,

em12demarçode2015,aFunda-

çãoInstitutodeGeogra�iaeEsta-

tística(FIBGE)fezadivulgaçãoda

PesquisaNacionalporAmostrade

Domicílios-PNADContínuaMensal

dejaneiro/2015,quetrazosresulta-

dosdapesquisadotrimestremóvel

queenglobanovembro/2014,de-

zembro/2014ejaneiro/2015.Nesse

trimestre,ataxadedesocupaçãofoi

estimadaem6,8%,oquesigni�ica

umpequenoaumentoemrelação

aomesmotrimestremóveldeum

anoanterior,quandofoiestimada

em6,4%.Notrimestreanterior

terminadoemoutubro(quecompu-

touosdadosdeagosto,setembroe

outubro),ataxadedesocupaçãofoi

estimadaem6,6%.OGrá�ico2mos-

traataxadedesocupaçãosegundo

aPNADContínua,lembrandoquese

tratadeinformaçõesdemédiastri-

mestrais,oquesuavizaatendência

observada.

Emnúmerosabsolutos,otamanho

doproblemaébemmaisclaro:no

trimestreterminadoemoutubro

de2014,oIBGEestimouaexis-

tênciadecercade6,6milhõesde

desocupados,eemjaneirode2015,

essecontingenteaumentouem200

milpessoas,para6,8milhõesde

desocupados.

Pelaprimeiravez foidivulgada

ainformaçãoderendimentosda

PNADContínua,tendosidoapu-

radoum rendimentomédiode

todosostrabalhosrecebidosde

R$1.795,53,umacréscimorealde

2,1%emrelaçãoaosrendimentos

recebidosnomesmotrimestredo

anoanterior.Amassaderendi-

mentosrecebidosnessetrimestre

terminadoemjaneirode2015foi

estimadaemR$166bilhões,um

crescimentorealde3,2%sobreo

mesmotrimestredoanoanterior.

Logo,mesmocomareduçãodo

níveldeatividadeejáhavendoum

aumentodataxadedesocupação,

oaumentorealderendimentos

continuouocorrendoatéjaneiro,

últimodadodisponível.

Gráfi co 2 - Taxa de Desocupação das Pessoas de 14 Anos Ou Mais de Idade, na Semana de Referência - Brasil

Fonte:PNADContínua,IBGE,<www.ibge.gov.br>,acessoem14/03/2015.

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8 análise de conjuntura

março de 2015

ApesardeaPNADContínuaser

umapesquisamuitomaisabran-

gentedoqueaPesquisaMensaldo

Emprego(PME),tambémdaFIBGE,

aPMEapresenta algunsdados

desagregadosqueajudamnaaná-

lisedoqueocorrenomercadode

trabalho.SegundoaPME,napas-

sagemdedezembrode2014para

janeirode2015,houveestabilidade

nocontingentedeempregadosna

maioriadossetoresinvestigados,

excetoemEducação,SaúdeeAd-

ministraçãoPública(-3,2%)e,na

comparaçãocomjaneirode2014,

houveretraçãode6%naocupação

daIndústriaeaumentode3,6%em

OutrosServiços.Osetordeservi-

çoséomaiorempregadornoPaíse

essasoscilaçõessãoesperadases-

pecialmentenoiníciodoano,quan-

doosgrandesgruposdepro�issio-

naisdeeducaçãoesaúderenovam

suascondiçõesdetrabalho.Oque

nãoéumaboanotíciaéaretração

docontingentedeocupadosna

Indústria,quesucessivamentetem

apresentadoreduçõesdepessoale

temsidoosetormaisatingidopela

polít icaeconômicaquevigorou

atéentão.Asalteraçõesnapolítica

econômicapropostasao�inalde

2014,sedefatoforemimplemen-

tadas,aindalevarãoalgunsmeses

paraimpactaromercadodetraba-

lho.Nomomento,oquesenotaé

umchoquedeofertaagregada,seja

pelaescassezdeáguaparaabas-

tecimentoegeraçãodeenergia

elétrica,sejapelainterrupçãode

obrasemfunçãodoprocessoliga-

doàsfraudesenvolvendoaPetro-

bráseasempreiteiras.Adicionan-

doaissooimpactodadepreciação

cambialsobrepreços,pode-sepre-

verqueain�laçãovaicorroerossa-

láriosediversoscontratoseataxa

dedesocupaçãodeveráaumentar.

Emtermosdedadosjádivulgados,

ataxadedesocupaçãoestimada

pelaPME,quedizrespeitoaseis

RegiõesMetropolitanas(SãoPaulo,

RiodeJaneiro,Salvador,Recife,

BeloHorizonteePortoAlegre)foi

estimadaem5,3%emjaneirode

2015,oquerepresentaumacrés-

cimode1%nataxaestimadapara

dezembrode2014ede0,5%em

relaçãoa janeirode2014.Otra-

balhocomcarteiraassinadateve

umdesempenhonegativotambém

naviradadoano.Nacomparação

comdezembro�icounegativoem

2,1%enacomparaçãocomjaneiro

de2014aquedafoiestimadaem

1,9%,oqueapenascon�irmaos

dadoseapercepçãodetodossobre

ofracodesempenhodaeconomia

em2014einíciode2015.Osdados

jáanunciadoseasperspectivassão

ruins.Vamostorcerpara2016che-

garmaisrápidoesteano...

(*)EconomistaeDoutorapeloIPE-USP.(E-mail:[email protected]).

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9temas de economia aplicada

março de 2015

Regras para Pensão por Morte

R������ N������� C������� (*)

Comapromulgaçãodamedidapro-

visória664,de30dedezembrode

2014,cresceuodebatenasocieda-

debrasileiraarespeitodasatuais

regrasdepensãopormorte,que,

antesdareferidamedida,seen-

contravammuitodesalinhadasem

relaçãoaospadrõesinternacionais,

conformemostradopor vários

estudoscomo,porexemplo,deAn-

siliero,CostanziePereira(2014).

Asmudançasestabelecidaspela

referidaMPparaoRegimeGeral

dePrev idência Social (RGPS),

pormeiode alteraçõesna Lei

8.213/1991, foram:a)estabele-

cimentodecarênciaparapensão

pormorteprevidenciáriade24

meses(anteriormentenãohavia

carência,sendoexigidaapenasa

qualidadedesegurado,permitin-

docomportamentooportunista

deapenasumacontribuiçãogerar

umbene�íciovitalíciono“teto”do

RGPS);b)introduçãodaexigência

deumtempomínimodecasamen-

toouuniãoestáveldedoisanos,

tambémparaevitarcomportamen-

tosoportunistasdecasamentos

arranjadosparagerarpensão;c)

�imdobene�íciovitalícioparacôn-

jugesoucompanheirosjovenscom

plenacapacidadelaboral–duração

passaadependerdaexpectativade

sobrevida,sendovitalíciaapenas

paracônjugescomaté35anosde

expectativadesobrevidaque,na

tabelaatualdoIBGE,signi�ica44

anosdeidadeoumais;d)�imda

reversãodascotasindividuais;e)

retiradadodireitoapensãodede-

pendentecondenadoporcrimedo-

losoquetenharesultadonamorte

doseguradoinstituidor;f)altera-

çãodovalordapensãode100%

daaposentadoriaoudosaláriode

bene�íciopara50%mais10%por

dependente,comamanutençãoda

garantiadepagamentodosalário

mínimo,seguindoalógicaque,com

amortedosegurado,haverádimi-

nuiçãodadespesafamiliar.

Partedasmedidas,maisespeci�i-

camente,acarência,tempomínimo

decasamentoeduraçãovariável

paracônjugetambémforamesten-

didasparaosservidorescivisda

União,pormeiodealteraçõesna

Lei8.112/1990.

Portanto,asmedidasrealizaram

ajustesnecessáriosnasregras.

ComomostradoporAnsiliero,Cos-

tanziePereira(2014),emumestu-

docom132países:a)78%desses

exigiamcarência;b)81,8%colo-

cavamcondicionantesparauma

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10 temas de economia aplicada

março de 2015

taxadereposiçãode100%;c)76,5%tinhamrestri-

çõesparacônjugesequiparadoscomo,porexemplo,

exigênciadeidademínimaparaocônjugeououtras

restrições.Claramente,asmedidasderammaiorali-

nhamentoàsregrasdoRGPScomaquelaspraticadas

emnívelinternacional.

Outropontoaserdestacadoéquevemocorrendoum

expressivoaumentodasdespesascompensãopor

mortenoâmbitodoRGPS.Comopodeservistopelo

grá�ico1,asdespesascompensãonoRGPScresceram

deR$21,1bilhõesem2002,paracercadeR$94,8

bilhõesem2103,representandoumincrementore-

lativoacumuladode349,9%emédioanualde13,4%

a.a.Ditodeoutraforma,adespesanominalmaisque

quadruplicouem12anos,denotandoumritmode

crescimentoinsustentávelamédioelongoprazo.O

incrementomédioanualdasdespesascompensões

urbanaseruraisfoide,respectivamente,13,1%a.a.e

14,2%.

Gráfi co 1 – Despesa com Pensão por Morte RGPS Brasil de 2002 a 2014

Fonte:MinistériodaPrevidênciaSocial–MPS.

Alémdisso,aindaháadespesacompensõespormorte

dosRegimesPrópriosdeprevidênciadosservidores

públicosemilitares.Em2013,somandoadespesa

compensãonoRGPSecivisnaUnião,Estadosemuni-

cípios,chega-seaopatamardeR$131,7bilhões,oque

representou2,7%doPIB.Comoconsequênciadessas

regrasinadequadas,oBrasilapresentavaumnível

dedespesacompensãoem%doPIBmuitoacimado

padrãointernacionaledoquepoderiaseesperarda

suaestruturademográ�icaoudarelaçãodedepen-

dênciadeidosos,comopodeservistopeloGrá�ico2.

Opatamarde2,7%doPIBnãolevouemconsideração

asdespesascompensãodosmilitares,eamédiada

OCDEeUniãoEuropeia,considerandoogastopúblico

compensão,foide,respectivamente,1,02%e1,6%do

PIB,em2011.

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11temas de economia aplicada

março de 2015

Gráfi co 2 – Relação de Dependência de Idosos e Despesa com Pensão por Morte em % do PIB – Vários Países 2009/2010 e Brasil 2013

Brasil 2,7

0,0

0,5

1,0

1,5

2,0

2,5

3,0

0,0 5,0 10,0 15,0 20,0 25,0 30,0 35,0 40,0

Razão de dependência de idosos em %

Fonte:BancoMundialeelaboraçãoprópriaparaoBrasil.

Umpontoimportanteaserenfati-

zadonadiscussãoéqueasmesmas

forampensadasemumperíodoem

quehaviaumaparticipaçãomuito

maisreduzidadamulhernomer-

cadodetrabalho.Contudo,coma

crescenteparticipaçãodamulher

nomercadodetrabalhoéneces-

sáriodebaterasregrasdepensão

frenteaessaimportantetransfor-

maçãoestrutural.

ComopodeservistopelaTabela1,

em1992,apenas9,9%dospensio-

nistasacumulavamaposentado-

ria,percentualqueseelevoupara

31,6%em2013(semconsiderar

NorteRural)eatendênciaéque

essepercentualseeleveaindamais

emfunçãodacrescentepartici-

paçãodamulhernomercadode

trabalho.Considerandoapenasas

mulheres,quesãoagrandemaio-

riaentreospensionistas,nesta

mesmacomparação,oincremento

daquelesqueacumulavamaposen-

tadoriafoide9,9%,em1992,para

31%em2013(semNorteRural).

Considerandoaquelespensionistas

queacumulavamaposentadoriaou

estavamocupadoscomcontribui-

ção,opercentualdepensionistas

comduplaproteçãoelevou-sede

21,3%,em1992,para39,7%em

2013(semNorteRural).Consi-

derandoapenasasmulheres,o

percentualcresceude20,6%,em

1992,para38,6%,em2013(sem

NorteRural).Ademais,em2013,

haviacercade347milpessoas

queacumulavampensão,aposen-

tadoriaerendadotrabalho,eem

1992,eramapenascercade55mil.

Comoexisteumadefasagementre

ocrescimentodaparticipaçãoda

mulhernomercadodetrabalhoe

opercentualdospensionistasque

acumulapensãoeaposentadoria,

atendênciaéqueestepercentual

cresçaaindamaisnofuturo.

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12 temas de economia aplicada

março de 2015

Referências

ANSILIERO,Grasiela; COSTANZI,Rogério

Nagamine;PEREIRA,Eduardo.Apensão

pormortenoâmbitodoregimegeralde

previdênciasocial.RevistaPlanejamento

ePolíticasPúblicasIPEA,jan.-jun.2014.

(*)MestreemEconomiapeloIPE/USPeEspecialistaemPolíticasPúblicaseGestãoGovernamentaldoGovernoFederaldesde

janeirode2000.MestreemDireçãoeGestãodosSistemasdeSeguridadeSocialpelaUniver-

sidadedeAlcalá/EspanhaeOrganizaçãoIberoamericanadeSeguridadeSocial(OISS).

OautortevepassagenspeloMinistériodaPrevidênciaSocial(AssessorEspecialdoMinis-

tro,Coordenador-GeraldeEstudosPreviden-ciárioseDiretordoDepartamentodoRegime

GeraldePrevidênciaSocial),MinistériodoTrabalhoeEmprego(AssessorEspecialdo

MinistroeCoordenador-GeraldeEmpregoeRenda),MinistériodoDesenvolvimentoSocial

(Coordenador-GeraldeAcompanhamentoeQuali�icaçãodoCadastroÚnico),Organização

InternacionaldoTrabalho(OIT)eInstitutodePesquisaEconômicaAplicada(IPEA).

Aopiniãodoautornãoexprimeaposiçãoinstitucionaldasinstituiçõescitadas.(E-mail:

[email protected]).

Tabela 1 – Pensionistas por Situação de Aposentadoria e no Mercado de Trabalho

PENSIONISTAS HOMENS E MULHERES

SITUAÇÃO DO PENSIONISTA 1992 2013 sem norte rural – serie 2013 com norte rural

I - total de pensionistas (II + III) 3.339.086 6.903.831 6.954.563

II - pensionistas que acumulam aposentadoria 330.046 2.179.566 2.196.235

Acumulam aposentadoria e ocupados com contribuição 12.943 37.215 37.459

Acumulam aposentadoria e ocupados sem contribuição 41.885 304.488 309.937

III - pensionistas que não acumulam aposentadoria 3.009.040 4.724.265 4.758.328

Sem aposentadoria, mas ocupados com contribuição 382.386 562.952 565.357

Sem aposentadoria, mas ocupados sem contribuição 638.821 628.667 639.690

MULHERES

I - total de pensionistas (II + III) 3.118.255 6.007.517 6.044.737

II - pensionistas que acumulam aposentadoria 307.690 1.863.030 1.875.895

Acumulam aposentadoria e ocupados com contribuição 10.819 28.100 28.100

Acumulam aposentadoria e ocupados sem contribuição 37.366 244.471 248.973

III - pensionistas que não acumulam aposentadoria 2.810.565 4.144.487 4.168.842

Sem aposentadoria, mas ocupados com contribuição 334.783 454.714 455.687

Sem aposentadoria, mas ocupados sem contribuição 586.169 515.771 522.898

Fonte:ElaboraçãoprópriaapartirdemicrodadosdaPNAD/IBGE.

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13temas de economia aplicada

março de 2015

Presidência do Brasil: Sem Rumo Num Mundo de Fantasias

I���� ��� N��� �� C���� (*)

AatualpresidentedaRepública

doBrasiltomousuareeleiçãonão

comoaculminânciadeumdes-

lavadoengodopespegadoemum

eleitoradodespreparadoparaiden-

ti�icarasmanobrasdeseuhábil

marqueteiro,mascomoumaval

paradarcontinuidadeàsfaláciase

mentirasqueinformaramsuacam-

panhaeleitoral.

Assim,emprestaàcrise interna-

cional–desencadeadaporpro-

blemasdecorrentesdafacilitação

creditíciabancáriadestinadaa

favoreceromercadoimobiliárioe

praticamentejásuperadanosEUA

eemváriasnaçõeseuropeias–a

origemdasdi�iculdadeseconômi-

casdefrontadaspeloBrasil,óbices

estesdevidos,comosabido,àim-

plementaçãodeumprogramaeco-

nômicoabsolutamenteerrôneoe

desfocadocomrespeitoàsefetivas

necessidadesdenossaeconomiae

dapopulaçãobrasileira.

Umsegundoaspectododesvir-

tuamentodarealidadepresente

nasfalaseatitudespresidenciais

dizrespeitoàlargadeferênciano

tratamentodos interessesdos

aplicadoresdedinheiroedosem-

presáriosemgeral.Destarte,as

medidasde“correçõeseajustes”

apresentadaspeloministroda

Fazendaferemos interessesdos

menosprivilegiadosedamassa

dapopulação,deixandodelado

práticasquepoderiamafetaros

ganhosdosendinheirados,casoda

taxaçãodasgrandesfortunas,dos

ganhosdecapitaldecorrentesde

aplicações�inanceirasedasheran-

çasvultosas.

Daperspectivapolítica,édenun-

ciada,sobretudopeladireçãodo

PT,ainexistenteaçãodeumadi-

reita�ictíciaeaigualmenteirreal

atuaçãodamídiaqueestariaafo-

mentaraçõescontráriasaogover-

noinstituído.En�im,en�ileiram-se

fantasmagóricas�igurasinteira-

menteausentesdenossarealidade,

fantasmasestesqueoperariamde

sorteaprejudicarumgovernoque

agedeformacoerenteetotalmente

a�inadacomassoluçõesconcretas

exigidaspelaeconomiabrasileira.

Esteconjuntodeinverdadesefalsi-

dadespropaladaspeloatualgover-

nocentralepelosdirigentesdeseu

partidodesquali�icaintegralmente

aamboseimpedequeseestabele-

ça,entreapresidênciadaRepúbli-

caeagrandemaioriadapopulação

brasileira,umdiálogoproveitoso

egeradordeumpactocriativoe

geradordepolíticassustentáveis

delongoprazo.

Nãoé,pois,quiméricaahipótese

levantadaporváriosanalistaspolí-

ticosquantoàpossívelemergência

de largosmovimentospopulares

contráriosàsatitudesassumidas

pelogovernocentralbrasileiroo

qual,bemcomooPT,pretende-se

perfeitoecaminhasemrumono

mundodafantasia.Esteúltimofato

nãojusti�ica,evidentemente,cam-

panhasfavoráveisaoimpeachment,

masdárazãoesustentaçãoamo-

vimentospopularesdecontestação

dasituaçãopresente.

(*)ProfessorLivre-DocenteaposentadodaFEA-USP.(E-mail:[email protected]).

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14 temas de economia aplicada

março de 2015

Vídeo sob Demanda, Monetização e Outras Fronteiras na Econo-mia Política do Setor Criativo

J���� L������� M����� (*)

Emcontinuidadeanossobalan-

çodetendênciasedestaquesna

economiapolíticadaEconomia

CriativaedasTICsem2014,avan-

çamosagorarumoanovostemas.

Nossasegundarodadadere�lexões

parte,umavezmais,deumepi-

sódiotranscorridonaÁsia.Curio-

samente,nãoestamosfalandode

grandespotênciastecnológicas

docontinente,comoaChinaouo

Japão,massimdaCoreiadoNorte

que,inusitadamente,tomouparte

deumadasmaisinteressantespo-

lêmicasdosegmentonoanopassa-

do:oataqueaoscomputadoresda

SonyPicturesporhackers,numa

açãoemsupostarepresáliaaolan-

çamentodo�ilme“AEntrevista”,

obraqueironizavaolíderdopaís.

Paraalémdasearaestritamen-

tepolítica,oacontecimentoabre

portastambémparadiscussões

ampliadasdenaturezaeconômica.

Ésobretaisaspectosquenosde-

bruçaremosnopresenteartigo.

1 “A Entrevista” e os Novos Mode-los de Negócio no Audiovisual Internacional

Logoapósainvasãoaoscompu-

tadoresdaSony,diversascadeias

exibidorasnorte-americanascan-

celaramassessõesprevistaspara

acomédia,commedodepossíveis

ataques terroristas.Poralgum

tempo,questionou-seseopróprio

lançamentoseriamantido,masa

opçãodaempresafoiincrivelmen-

teinovadora:naausênciadeum

volumeextensodesalasdispostas

aarcarcomorisco–econtando

comfrancoapoiodapopulação

norte-americana–aprodutora

fechoucontratodelançamentoda

obrapormeiodecanaisdigitais,

mobilizandoparceiroscomooGoo-

glePlayeoYoutubeMovies.

Oresultadodessaopçãofoibastan-

teinteressante:areceitadocha-

madovideo-on-demand(V.O.D.)do

�ilmefoide15milhõesdedólares,

contraapenas5milhõesnaarre-

cadaçãoconvencionaldesalasde

cinemas.Muitoemboraoresultado

nãotenhanemdelongecobertoos

custosdolonga,amodalidadede

comercializaçãoadotada–aprincí-

pio,umsimplesefeitocolateraldo

fatopolítico–acabousemostrando

exitosaerentável,elevandoaSony

aotítuloderecordistamundialem

bilheteriadigital.

Algunsanalistasatéarriscaram

ahipótesedequeoepisódionão

tenhapassadodeumaousadíssima

estratégiademarketingdaempre-

sa.Apropostaépolêmica,jáqueo

casochegouaenvolverautoridades

eórgãosdesegurançadosEstados

Unidos.Teoriasconspiratóriasà

parte,é fatoque “AEntrevista”

abriuuminteressantecasodentro

douniversodemodelosdenegócio

noaudiovisualsobdemanda,um

ambienteemfrancaexpansão,mas

ondemuitasdúvidasaindapersis-

tem.

2 Video on-Demand: a Revolução do Consumo Audiovisual

Nãoporacaso,poucodepoisdaes-

treiao�icial,“AEntrevista”atraiu

o interessedeoutrosatoresdo

segmento,comooNet�lix,empre-

salíderemV.O.D.nomundoeque

anunciou,poucotempoapósolan-

çamento,queaobraestariadis-

ponívelemstreamingparaseus

usuários.Osúbitointeressepelos

direitosdeexibiçãodo�ilmeabre

portasparaumadiscussãoam-

pliada,vinculadaaoexpressivo

aumentodessajaneladecomercia-

lizaçãonadinâmicaeconômicados

produtosaudiovisuais.

Adisponibilidadedeconteúdosno

formatosobdemandanãoéexata-

menteumanovidade.Nosúltimos

anos,contudo,oaltovolumede

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15temas de economia aplicada

março de 2015

investimentoseotamanhodabase

deespectadoreslograramalcançar

númerosbastanteexpressivos.

Apenasparacitaralgunsexemplos:

aAmazonrevelourecentemente

que,em2014,gastou1,3bilhão

dedólaresemseuserviçodestre-

amingdevídeo,oPrimeInstant

Video.Ovalorestáabaixodosnú-

merosdoNet�lix,quechegaram

àcasade3,8bilhõesdedólares

anuaisnaaquisiçãodeconteúdos

audiovisuais.Estima-se,aliás,que

50%dotrânsitodedadosdein-

ternetdosEUAhojesejadevídeos

disponibilizadospelaempresae

peloYoutube.

Paraalémdouniversodascifras,

jápodemospensarnumaefetiva

in�lexãoqualitativa.Nãoestamos

lidando,aqui,comumasimples

mudançanopadrãodeconsumo

deprodutosaudiovisuais:ocres-

cimentodeplayersemvídeosob

demandatrazimpactospolíticose

econômicosnãonegligenciáveis.Já

háumafortediscussãonosEstados

Unidosarespeitodeumpossível

remanejamentodaforçadetraba-

lho,comoesvaziamentopaulatino

naindústriadocaboeahegemonia

dasmodalidadesemstreaming.

Tambémouniversopublicitário

vemserealinhandoparadarconta

deestabelecer-senanovajanela.

Mesmoem termosde lobbies e

dedisputaspolíticas,vemosuma

mudançaexpressivanopanorama

audiovisualglobal.Nosúltimos

meses,oV.O.D.ganhoudestaque

nasdiscussões�iscaiseregulató-

riasaoredordomundo.Diversos

paísescomeçamaestudarmétodos

detaxaçãoaoconsumodevídeos

remotos.Emsetembrode2014,a

Argentinaestabeleceuumimpos-

tosobreessetipodeproduto.Jáa

AgênciaNacionaldoCinema(ANCI-

NE),brasileira,aventouahipótese,

emjaneirodesteano,deestipular

cotasdeprodutosnacionaisnas

plataformas,emulandoapolíticajá

aplicadaaoscanaisporassinatura.

Épossívelquevejamos,aolongo

dospróximosmeses,diversasou-

trasaçõeseiniciativasaparecendo

aoredordoglobo.

3 Das Fronteiras Regulatórias às Fronteiras do Valor

Otemordeumapossíveltaxação

sobreoconsumooudaimplemen-

taçãodeoutrosentravesregulató-

riosnãosãoosúnicosfantasmas

namentedosadministradoresdas

companhiasdosegmento.Ades-

peitodagrandeeuforiaedinamis-

modaplataforma,aindasubsistem

consideráveisdúvidasarespeito

daspossibilidadesdemanter,de

umlado,umacarteirainteressante

detítulosesériese,deoutro,asse-

gurarumpreçoacessívelecompe-

titivonosdiversosmercadosonde

aempresaatua.

Adiciona-seaoquadrooacirra-

mentoda concorrência, coma

constituiçãodeoutrasempresas

deoferecimentodeconteúdossob

demanda,muitasdelasvinculadas

àsoperadorasdetelevisãoacabo

oumesmooperadorasdetelefonia

móveljásedimentadas.Certamen-

te,maiscomplicadaéaconcorrên-

ciacomnovasplataformasdis-

postasadisponibilizarconteúdos

integralmentegratuitos.Umavez

mais,uminteressantecasovem

daArgentina:emboraatuenum

nichobastanteespecí�ico,podemos

mencionarcasoscomoodoCine-

margentino,umaplataformaque

ofereceacessoaobrasaudiovisuais

nacionaisemstreamingsemcusto

algum.

Maisousado,oPopcornTime,pre-

senteemdiversospaíses,inclusive

noBrasil,operacomoumaespécie

debuscadoresincronizadorde

arquivosdeTorrent.Naprática,

portanto,tem-seumsistemades-

centralizado,colaborativoe,aopé

daletra,“pirata”.Asidasevindas

jurídicasdaplataformaremetema

outrofamigeradositedeconteúdos

audiovisuais:oPirateBay,este

sim,declaradamenteàmargemda

legalidade.Tantonum,quantoem

outrocaso,contudo,observamos

convergênciasrumoàsdiscussões

sobreoslimiteslegais,regulató-

rios,econômicose,obviamente,

políticos,dosegmentoaudiovisual

global.

Nocernedessasdiscussõespersis-

teagrandequestão:comoasem-

presasdosetoraudiovisual–en-

tendidasaquiemseusentidolato,

istoé,levandoemcontaaextensa

cadeiaprodutivadosetor–podem

desenvolver-senumambienteonde

agratuidadesefaztãopresente?

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16 temas de economia aplicada

março de 2015

Voltaremosadiscutiressaquestãoemartigoposte-

rior,quandodenossaanálisesobreo�lorescimentode

novosmodelosdenegócionouniversocriativo.

Porora,cabemencionarqueodesa�iovemsendo

encaradofrontalmente,indicandoaincrívelversati-

lidadedosagenteseconômicosenvolvidos.Talveznão

hajacasomaisinteressantedoqueodoWhatsapp,o

popularíssimoaplicativodecomunicaçãoquesedis-

seminoumundoaforacobrandomeros0,99centavos

dedólarporanodeutilização.Háumano,aempresa

foiadquiridapeloFacebookpelaincrívelcifrade22

bilhõesdedólares.Quasenamesmaépoca,omundo

viuaaberturadecapitaldairlandesaKingDigital

Entertainment,detentoradediversostítulosdejogos,

incluindooCandyCrush.Temostambém,aí,osucesso

deoutramodalidadedemodelodenegócioemfranco

crescimento:adoschamadosprodutos“freemium”,

istoé,comacessoparcialmentegratuito,mascom

ofertadeaquisiçõesqueauxiliame/ouampli�icama

experiênciadousuário(nestecaso,ajogabilidadedos

games).

DoNet�lixaoCandyCrush,doCinemargentinoao

Whatsapp.Iniciativasdiversasdocomplexotecno-

lógicointernacionalmarcadasporumaquestãoem

comum:quaissãoasefetivasperspectivasdemone-

tizaçãodasatividadescriativasdepontaequaissão

suasimplicaçõeseconômicasepolíticasemâmbito

global?Talvezestasejaaquestãomaiscentralaser

feitaaosetorcriativo.

(*)GraduadoemCiênciasEconômicaseDoutoremHistóriaEconômi-capelaUSP.Trabalhacomtemasligadosàeconomiadacultura,eco-nomiacriativaeeconomiadatecnologia,informaçãoecomunicação

(TICs).(E-mail:[email protected]).

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17temas de economia aplicada

março de 2015

O Comportamento da Política Fiscal: de 1990 aos Anos Recentes

C�������� B���� S����� F�������� (*)

Noprimeiroartigodasérie foi

apresentadaatrajetóriadapolí-

tica�iscalparaadécadade1970

(períododeintensosincentivos

�iscais)eparaadécadade1980,

que,aocontrário,apresentoucomo

característicapredominanteforte

restrição � iscal.Nestesegundo

artigoseráapresentadoocompor-

tamentodapolítica�iscalde1990

aosanosrecentes.

Adécadade1990,assimcomoa

de1980,foimarcadaporplanos

deestabilização,porém,comadi-

ferençadequeumadastentativas

obteriasucesso.Lopreato(2002)

a�irmaqueasmedidasadotadasno

PlanoCollor,comoaretençãodos

ativos,adesvalorizaçãodariqueza

�inanceiraeasmedidas�iscaisque

aumentaramaarrecadaçãoredu-

ziramocustoderolagemdadívida

públicaecriaramespaçoparao

controledodé�icit.Outraestraté-

giadogovernofoiautilizaçãoda

valorizaçãodataxadecâmbioreal

comoformadecombaterodé�icit

públicoea in�lação.Asmedidas

provocaram,inicialmente,aqueda

abruptadain�lação,masadeterio-

raçãodosaldocomercialeoimpas-

senarenegociaçãodadívidaexter-

naapontavamparaproblemasno

balançodepagamentos,tornando

inevitáveladesvalorizaçãocam-

bialpararecuperarosaldocomer-

cialeevitarocolapsoexterno.

OresultadodoPlanoCollor,além

doelevadosuperávit�iscal,foide

forteretraçãononíveldeatividade

econômica.Épossívelobservarno

Grá�ico1queoPIBrealdecresceu

maisde4%emrelaçãoaoanoan-

terior.Oefeitosobreain�laçãofoi

temporário,sendoretomadanos

mesesseguintesaolançamentodo

Plano,fechandooanode1990em

aproximadamente1.500%.1Anali-

sandoocomportamentododé�icit

público,conformedadosapresen-

tadosnoGrá�ico2,noconceito

nominaldaNFSP2odé�icitatingiu,

em1990,29,6%doPIB,enquanto

noconceitoprimáriohouvesupe-

rávitde4,6%doPIBenoopera-

cional,superávitde1,3%doPIB,

indicandobomdesempenho�iscal

dosetorpúblico.3

Gráfi co 1 – Produto Interno Bruto, Variação Real Anual (% a.a.)

Fonte:InstitutoBrasileirodeGeogra�iaeEstatística(IBGE)SistemadeContasNacionais.

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18 análise de conjuntura18 temas de economia aplicada

março de 2015

Giambiagi(2008)de�ineoperío-

dode1990a1994,dosgovernos

ColloreItamarFranco,comosendo

dedé�icitreprimido,poisenquan-

tonogovernoSarneyasNFSPno

conceitooperacionalapresentaram

umamédiade5,1%doPIB,nogo-

vernoCollor/Itamarestedé�icitfoi

praticamentezerado.Istoocorreu

emfunçãodamelhoradoresultado

primárioetambémdareduçãodas

despesascomjurosreais.Oautor

aindaargumentaqueamelhorado

resultadoprimáriofoibaseadana

facilidadepermitidapelaaltataxa

dein�laçãoparaajustarovalordas

despesasreaisemfunçãodosob-

jetivos�iscaisdogoverno,emum

contextodereceitasrazoavelmen-

teindexadasàin�lação(GIAMBIA-

GI,2002;2008).

OPlanoReal,queobtevesucesso

nocontroledain�lação,foilançado

duranteogovernoItamarFranco.

Ascondiçõesexternasfavoráveis,

emtermosdeliquidez,possibilita-

ramousodocâmbiocomoâncora,

�icandoreservadoàspolíticas�is-

calemonetáriaopapeldegaran-

tirasexpectativaspositivasdos

investidores,paraqueosmesmos

nãotivessemdúvidasquantoao

�inanciamentodobalançodepa-

gamentos,permitindoamanuten-

çãodocâmbiovalorizado.Opapel

dapolítica�iscalfoiacomodaros

custosdaspolíticasdecâmbioe

dejuroseimpedireventuaisriscos

dedefault nadívidapúblicaque

pudessemlevarà fugadecapi-

taiseameaçaraestabilidadedo

câmbio.Assim,dopontodevista

�iscal,ocrescimentododé�icitex-

ternoapós1994criouaobrigação

demanterascontaspúblicasem

condiçõesdetransferirrendaaos

capitaisresponsáveispeloseu�i-

nanciamento,atravésdacolocação

detítulosdadívidapúblicacom

juros reaiselevadoseproteção

diantedaincertezadocâmbio.

Estaobrigaçãosomentefoipossí-

vel,alémdoespaçoquehaviapara

ocrescimentodadívidapública,

devidoaosuperávitprimáriode

1994,que�icouacimade5%doPIB

(LOPREATO,2002).

Nosquatroanosqueseseguiram

aoPlanoRealas�inançaspúblicas

apresentaramumapiora.Amédia

doresultadoprimáriofoidedé�icit

deaproximadamente0,2%doPIB,

eadoresultadooperacionaldedé-

�icitdequase5%doPIB,conforme

ilustradonoGrá�ico2.4Lopreato

(2002)argumentaqueaestabilida-

dedocâmbioeareduçãogradual

dosjurosindicavamarecuperação

dascontaspúblicasedavamtran-

quilidadeaomercadoemrelação

aocomportamentodoestoqueda

dívida.Alémdisto,obommomento

econômicoefatoscomoosdes-

taquesaosproblemasdosbancos

estaduais,àsdívidasdosEstados

emunicípios,aos“esqueletos”5 e

àreformadaprevidênciasocial,

comoprioridadesdapolítica�iscal,

foramrecebidoscomosinaispo-

sitivospelomercado,favorecendo

aexpectativadesustentabilidade

dascontaspúblicasepermitindo

afrouxarorígidocontrole�iscal

de1994.Nestecontexto,adeterio-

raçãodoquadro�iscalapartirde

1995nãocomprometeuoprogra-

madeestabilizaçãoenãocolocou

emriscoasustentabilidadeinter-

temporaldascontaspúblicas.

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19análise de conjuntura

março de 2015

19temas de economia aplicada

Gráfi co 2 – Necessidades de Financiamento do Setor Público

Fonte:ConjunturaEconômica,v.63n.06,2009ev.67n.11,2013.Osdadossãorelativosàposiçãodedezembrodecadaano.(+)superávite(-)

dé�icit.Elaboraçãoprópria.

NosegundogovernoFHC,emfun-

çãodoacordoestabelecidocomo

FMIno�inalde1998,oqualacabou

sendoestendidoaté2002,amédia

doresultadoprimáriofoide3,62%

doPIB.6Giambiagi(2002)destaca

comopontoimportanteanature-

zadaexpansãodogastopúblico,

ocorridadepoisdoPlanoReal.Uma

interpretaçãomuitodifundidaé

queestateriasidodecorrentedo

chamado“efeitoTanziàsavessas”,

resultantedofatodeadespesadei-

xardesercorroídapelain�lação.

Acrisecambialde1999forçoua

elevaçãodataxadejuros,assim,os

elevadoscustoseoriscodedefault

exigiramumapolítica�iscalmais

rígida,sendoprecisoelevarosu-

perávitprimário,diluiroriscode

inadimplênciadadívidapúblicae

reduziraabsorçãodosetorpriva-

doeanecessidadede�inanciamen-

toexterno.

Tornou-seobrigatóriode�inirna

LeideDiretrizesOrçamentárias

(LDO)ametadesuperávitprimá-

riodopróximoanoeaindicação

paraosdoisanosseguintes.Aex-

plicitaçãodocompromissocoma

trajetóriadadívidapúblicaesta-

beleceunaexecuçãoorçamentária

apráticadocontingenciamento

dosgastospúblicos,nomontante

exigido,paraqueametadesupe-

rávitprimáriofossealcançada.A

austeridadedascontaspúblicas

depoisde1999devolveuaomerca-

doacon�iançanaconduçãodapo-

lítica�iscalenasuperaçãodacrise

cambial.Alémdisto,ossinaisde

reversãodoritmodecrescimento

dodé�icitexternoearetomadada

liquidezinternacionalassegura-

ramascondiçõesde�inanciamento

dobalançodepagamentoseman-

tiveramasbasesparaacontinui-

dadedoprogramadeestabilização

(LOPREATO,2002;2007).Adécada

de1990seencerracomosgastos

dogovernorelativamenteestáveis,

representandoaproximadamente

22%doPIBnosúltimostrêsanos.

Asreceitasdogoverno,porém,re-

gistraramtrajetóriadescendente,

comreduçãode21,8%doPIBem

1997para18,73%em1998,voltan-

doacrescerem1999.7

Nestecontexto,umamudançaim-

portanteocorridalogonoiníciodo

milêniofoiaLeideResponsabili-

dadeFiscal(LRF)8nº101,de4de

maiode2000,queestabelecenor-

masde�inançaspúblicasvoltadas

àgestão�iscal.Pressupõeaação

planejadaetransparente,deforma

aprevenirriscosecorrigirdesvios

quepossamafetaroequilíbrio

dascontaspúblicas,cumprindo

metasderesultadosentrereceitas

edespesaseaobediênciaàsregras

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20 temas de economia aplicada

março de 2015

relacionadasàrenúnciadereceita,

geraçãodedespesascompesso-

al,daseguridadesocialeoutras,

dívidasconsolidadaemobiliária,

operaçõesdecrédito,inclusivepor

antecipaçãodereceita,concessão

degarantiaeinscriçãoemrestosa

pagar(LRF,art.1o§1

o).

AaprovaçãodaLRFreforçouocon-

troledascontasdeEstadosemuni-

cípios.Aconcepçãodonovoregime

�iscaldeuatençãoàdefesadaesta-

bilidadeeàminimizaçãodosriscos

deaplicaçãoemmoedanacional,

incutindonomercadoacertezade

queosmovimentosinesperadosde

jurosecâmbioseriamcompensa-

doscomoaumentodosuperávit

primáriocapazdegarantiroajuste

intertemporaldascontaspúblicas

(LOPREATO,2007).

Ocomportamentodadívidalíquida

dosetorpúblicoconsolidado,em

relaçãoaoPIB,utilizandoocon-

ceitodoBancoCentraldoBrasil

queincluiabasemonetáriacomo

partedadívidainterna,éilustrado

noGrá�ico3,paraoperíodo1981

a2013.Percebe-seumpadrãoem

formatodeVentre1984e2002.

Apósoprimeiropicode55,5%do

PIBem1984,adívidalíquidaentra

emtrajetóriadescendente,atin-

gindoummínimode30%doPIB,

em1994,voltandoaumatrajetória

crescente,atéatingirummontante

semelhanteaode1984,em2001.A

dívidatotalcontinuoucrescendo

até2002eatingiu,historicamente,

onívelmaiselevado.

Gráfi co 3 – Dívida Líquida do Setor Público (DLSP)

Fonte:BancoCentraldoBrasil(BCB)eGiambiagi(2009).Elaboraçãoprópria.

Confrontandoestasinformações

comasapresentadasporGiambia-

gi(2009)eporLopreato(2007),

provavelmentedevidoaquestões

metodológicasouàatualização

dosvaloresdasérie,aDLSPcres-

ceuaté2002enãoaté2003,como

constatamosautores.Comrelação

aocomportamentodadívidaem

1984,Giambiagi(2009)destaca

que,naquelemomento,adívida

públicaerapredominantemente

externaefatorescomoacriseda

dívida,aresponsabilidadeassumi-

dapelogovernofederaldepassivos

externoseoaumentorelativoda

dívidaemmoedaestrangeiracom

amaxidesvalorizaçãorealde1983

levaramaumaexplosãodoseu

valor,quemaisdoquedobrouem

apenastrêsanos.

Giambiagi (2009)apontacomo

causasparaaquedadadívidapú-

blicalíquida,entre1984e1994:a

tendênciadelongoprazoàaprecia-

çãorealdocâmbio,emrelaçãoàs

taxasqueprevaleceramlogoapós

amoratóriamexicana;oacordo

dadívidaexternaem1994,que

representoureduçãodamesma;

osdiversosepisódiosdesubinde-

xaçãodadívidainternaemfunção

daselevadas taxasdein� lação;

um�luxodesenhoriagemde3%

a4%doPIBquecontribuíapara

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21temas de economia aplicada

março de 2015

�inanciarpartedodé�icitpúblico;

eocrescimentodoPIBnoperíodo,

acumuladoem32%,contribuindo

paraareduçãodarelaçãodívida/

PIB.Lopreato(2007)argumenta

queaquedadaDLSPapartirde

2004éexplicadapelaperdade

participaçãodadívidaexternano

totaldadívidapública,comavalo-

rizaçãodataxadecâmbioocorrida

nogovernoLulaea liquidaçãoe

reestruturaçãodepartedadívida.

Porém,adívidainterna,apesarde

nãoterriscodedefault,manteve

a tendênciadecrescimentoem

relaçãoaoPIBdevidoaoaltocusto

derolagemdostítulos,os juros

nominais.

Nocontextodeacordos juntoao

FMI,oúltimoanodogovernoFHC

fechoucomumsuperávitprimário

daordemde4%doPIB;porém,a

DLSPfechouemmaisde60%do

PIBeodé�icitnominalsuperiora

10%doPIB.ComaDLSPatingindo

patamaressuperioresàquelesdos

anos1980,osagentespassaram

atemerumapossívelmoratória,

oquegerouumaprolongaçãodo

acordocomoFMIparaoprimeiro

anodopróximogoverno.Oresulta-

doparaoperíodode2000a2008

nãopoderiaserdiferente:foram

anosdesuperávitsprimárioscon-

secutivos,variandoentre3,2%e

4,01%doPIB.

Lopreato(2007)a�irmaqueogo-

vernoLulabuscouampliaroesfor-

ço�iscalcomoobjetivodeevitar

queosmovimentosdastaxasde

câmbioedejuroscolocassemem

riscooresultadodascontaspúbli-

cas.Oaumentodosuperávitpri-

márioeobomcomportamentoda

economiainternacionalapartirde

2003ajudaramaconterataxade

câmbioeospreçosinternoseafas-

tarossinaisdedominância�iscal.

Aaltadospreçosdascommodities

−portanto,melhoranostermosde

troca−repercutiusobreastaxas

dein�lação,provocandoaumento

dastaxasdejurosapartirde�ins

de2004,afetandoascontaspúbli-

casem2005e2006.Aestratégia

foi,novamente,ampliarosuperávit

primário,procurandomantera

trajetóriadequedadadívidapú-

blicaeacredibilidadedapolítica

econômica(LOPREATO,2007).

Voltandoàquestãoabordadano

primeiroartigo,darelaçãoentre

ascontaspúblicaseostermosde

troca,percebe-se,atravésdoGrá-

�ico4,quesemantémomesmo

padrãoqueocorreunosanos1980:

asreduçõesnostermosdetroca

sãoacompanhadasporumapiora

nascontaspúblicas.Mesmoapós

oPlanoReal,quandonãohámais

oproblemadasaltíssimastaxas

dein�lação,arelaçãosemantém.

Outraconstataçãoimportanteé

quea incidênciadostermosde

trocaempatamaresmaiselevados

−porexemplo,aquelesqueseefe-

tivaramnamaiorpartedosanos

1990e2000−está relacionada

aummelhorresultadonominal,

pois,emboraaindade�icitários,sua

proporçãonemsecomparaàquela

anteriora1993.Conformemencio-

nadoanteriormente,estarelação

seráveri�icadanoterceiroartigo.

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22 temas de economia aplicada

março de 2015

Atrajetóriadapolítica�iscalmodi-

�icou-seapartirdosúltimosmeses

de2008emvirtudedade�lagração

dacrise�inanceira,abrindoespaço

paraaadoção,noBrasil,deuma

política�iscalmais�lexível.Osu-

perávitprimário,conformeapre-

sentadonoGrá�ico2,declinoude

3,42%doPIBem2008para2,03%

em2009.Estapolítica�iscalcon-

tracíclicacontribuiu,mesmoque

emparte,paraarecuperaçãoda

economia,oquesepercebeatravés

deanálisedataxadecrescimen-

todoPIBapresentadanoGrá�ico

1,quesaltoude-0,33%em2008

para7,53%em2010.Aindaduran-

te2009retomou-seapolíticade

expansãodosuperávitprimário,

tantoqueomesmoatingiu2,77%

doPIBem2010e3,11%em2011.

Naverdade,oagravamentoda

criseeuropeiaeoambienteins-

távelemnívelinternacionaltêm

exigidoumapolítica�iscalbrasi-

leiracadavezmaisaustera,oque

édefendidopelaagendadoFMI.

Apesardisto,oresultadoprimário

dosúltimosanosnãotemsidodos

melhores:caiupara2,38%doPIB

em2012epara1,58%em2013.

Estefatotemdespertadoumasérie

decríticasemrelaçãoàpolítica�is-

calbrasileira.

Essascríticasse intensi� icaram

noanode2013emfunçãodeum

aumentodadívidabruta,quede

acordocomdadosdoFMI(2014)

passoude63,5%doPIBem2008

para68,2%em2012e66,3%em

2013.AquestãoéqueoBrasilpos-

suiumhistóricodepolítica�iscal

econdiçõesdeestabilidadenão

agradáveisaosolhosdosinves-

tidores,comooendividamento

brasileironosanos1980eocon-

sequentedefault,aselevadastaxas

dein�laçãoquemarcaram,prin-

cipalmente,osanos1980e1990,

equetêmperturbadoogoverno

brasileironosúltimosanos.Estes

fatores,masnão limitadosaos

mesmos,fazemcomqueapolítica

�iscalsemantenhacomorefémdas

expectativasdosinvestidores.Con-

sequentemente,asdecisões�iscais

sãotomadas,namaioriadasvezes,

comoobjetivodeguiaraopinião

dosinvestidoresouevitarumacor-

ridadosmesmosdomercadobrasi-

leiro.Assim,oquedeixaosinvesti-

doresfelizes(etambémoFMI)ea

política�iscalimuneacríticassão

oselevadossuperávitsprimários.

A impressãoéqueseesquecem

queaverdadeiramedidaquedeve

serlevadaemconsideraçãoéore-

sultado�iscalmedidopeloconceito

nominal,oqualincluiasdespesas

comjurosemsuaapuração.

Gráfi co 4 – Défi cit Público Nominal e Termos de Troca

Fonte:Ipeadata;ConjunturaEconômica,v.63n.06,2009;v.67n.11,2013.Elaboraçãoprópria.

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23temas de economia aplicada

março de 2015

Oresultadodessasituação,depo-

lítica�iscaldependentedasopini-

õesdosinvestidores,éumcírculo

viciosoqueseperpetuaporduas

vertentes:pelatentativadeconter

oaumentodospreços,elevando

astaxasdejuros(oquetambém

éótimoparaos investidores)e

pelatentativadesatisfazerosin-

vestidores,buscandosuperávits

primárioscadavezmaiselevados.

Oproblemaéqueossuperávitssão

obtidoscomaumentodeimpostos

oureduçãodegastos,reduzindoo

níveldedemandaagregadainterna

e,consequentemente,onívelde

rendadaeconomia.Poroutrolado,

oaumentodataxadejurostendea

reduzirosinvestimentosnosetor

produtivoetambémaconterade-

manda.Oresultadodessaespiral,

namelhordashipóteses,seráopa-

gamentodejurosdadívidapública.

Otipodepolítica�iscalpraticada

desviaosrecursos�iscais,quepo-

deriamserinvestidosparamelho-

rarascondiçõesestruturaisdo

paísemeducaçãoeinfraestrutura

−porexemplo,paraopagamento

dejuros−comprometendoataxa

decrescimentodopaís.

Conclusão

Oobjetivodesteartigofoiapresen-

tarumpanoramadapolítica�iscal

paraosanos1990e2000,percor-

rendopelasvariáveisquepossam

in�luenciaroseucomportamento,e

darbaseàparteempíricaqueserá

desenvolvidanopróximoartigo.

Emresumo,nosprimeirosanos

dadécadade1990apolítica�iscal

foivoltadaàestratégiadaestabi-

lizaçãoeparecetermantidoum

padrãopró-cíclico.Mesmoapóso

controlein�lacionárioestepapel

prevalece,comadiferençadeque

éexecutadogarantindoocâmbio

valorizado.Osanos2000sãomar-

cadospelaLeideResponsabilidade

Fiscal,pelosacordoscomoFMIe

porsuperávitsprimáriosconse-

cutivos.Comacrise�inanceirade

2008apolítica�iscalpassaater

umpapelmais�lexível,naverdade

contracíclico.Porém,algunsanos

depois,comoaumentodadívida

públicabrutaeareduçãodosu-

perávitprimário,aconduçãoda

política�iscaltemsofridocríticase

atendênciaéquesetornecadavez

maisaustera.Nogeral,asanálises

desteedoprimeiroartigoindicam

queapolítica�iscalsemanteve

pró-cíclicadurantetodoperíodo,

comexceçãodoperíodopós-crise

�inanceira.Alémdisto,osdados

demonstramquearelaçãoentre

ostermosdetrocaeapolítica�is-

caléumaspectointeressanteda

pesquisaeprecisa,portanto,ser

investigadomaisa fundo.Estas

questõesserãoinvestigadasnoter-

ceiroeúltimoartigodasérie.

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1 IGP-DI-(%a.a.)-FundaçãoGetúlioVargas,ConjunturaEconômica.

2 Lembrandoqueestenãoéumaboamedidaparaperíodosdeelevadastaxasdein�lação.

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24 temas de economia aplicada

março de 2015

3 Giambiagi(2002)argumentaqueoanode1990normalmentenãoéconsideradonasanálisessobrepolítica�iscalpelofatodequeasreceitas arrecadadas,nocenáriodoPlanoCollor I, apresentaramresultadoexcepcional.

4 Giambiagi (2002;2008)refere-seaoperíodocomode“dé�icitdemetas”e“dé�icitaberto”.

5 Oschamados“esqueletos”referem-seàsdívidasnãocontabilizadas.

6 RevistaConjunturaEconômica,v.63n.06,jun.2009.

7 InternationalMonetaryFund(IMF),GovernmentFinanceStatistics(GFS),Yearbookanddata�iles,WorldBankandOECDGDPestimates.

8 Parauma ideiasobrea in�luênciadaLRFnocomportamentodapolítica�iscal,consulteRochaeGiuberti(2008),Rocha(2009)eArenaeRevilla(2009).

(*)DoutorandaemEconomiadoDesenvolvimentonaFEA/USP.FoiVisitingScholarnaColumbiaUniversity(EUA).E-mail:carlan-

[email protected]çãodeAmparoàPesquisadoEstadodeSãoPaulo(FAPESP),processosnº

2012/04600-0e2013/07326-9.Asopiniões,hipóteseseconclusõesourecomendaçõesexpressasnestematerialsãoderesponsabilidadeda

autoraenãonecessariamentere�letemavisãodaFAPESP.


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