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Centro de Estudos Arnaldo Araújo
Escola Superior Artística do Porto
DOIS PARÂMETROS DE ARQUITECTURA
POSTOS EM SURDINA
Maria Helena Maia, Alexandra Cardoso
e Joana Cunha Leal
CADERNO 4
Leitura crítica do Inquérito à arquitectura regional
DOIS PARÂMETROS DE ARQUITECTURA
POSTOS EM SURDINA
Maria Helena Maia, Alexandra Cardoso
e Joana Cunha Leal
CADERNO 4
Leitura crítica do Inquérito à arquitectura regional
Publicação sujeita a peer review
Edições Caseiras / 19
Título:
DOIS PARÂMETROS DE ARQUITECTURA POSTOS
EM SURDINA. Leitura crítica do Inquérito à arquitectura
regional. CADERNO 4
Autor:
Maria Helena Maia, Alexandra Cardoso e Joana Cunha
Leal
© Maria Helena Maia, Alexandra Cardoso e Joana Cunha
Leal, CESAP/CEAA, 2013
Arranjo gráfico:
Jorge Cunha Pimentel
Composição:
Joana Couto
Edição:
Centro de Estudos Arnaldo Araújo da CESAP/ESAP
Propriedade:
Cooperativa de Ensino Superior Artístico do Porto
R. do Infante D. Henrique, 131
4050-298 PORTO, PORTUGAL
Telef: +351 223 392 100/40
Fax: +351 223 392 101
Impressão e acabamento:
LITOPORTO Artes Gráficas Lda
1ª edição, Porto, Junho de 2013
Tiragem: 500 exemplares
ISBN: 978-972-8784-50-8
Depósito Legal:
Este livro foi realizado no âmbito do projecto A
"Arquitectura Popular em Portugal". Uma Leitura Crítica
tendo enquanto tal sido financiado por fundos FEDER
através do Programa Operacional Factores de
Competitividade – COMPETE (FCOMP-01-0124-
FEDER-008832) e por Fundos Nacionais através da FCT
– Fundação para a Ciência e Tecnologia (PTDC/AUR-
AQI/099063/2008).
Centro de Estudos Arnaldo Araújo
Escola Superior Artística do Porto
Largo de S. Domingos, 80
4050-545 PORTO PORTUGAL
Telef.: 223392130 / Fax.: 223392139
e-mail: [email protected]
www.ceaa.pt
A equipa do projecto A “Arquitectura Popular em Portugal”. Uma Leitura
Crítica, que decorre entre 1 de Abril de 2010 e 31 de Março de 2013, com
prolongamento até 30 de Junho de 2013, é constituída por Pedro Vieira de
Almeida (investigador responsável), Alexandra Cardoso, Joana Cunha Leal e
Maria Helena Maia e tem como consultores Josefina Gonzalez Cubero,
Mariann Simon e Miguel Angel de la Iglésia.
O projecto é financiado por fundos FEDER através do Programa
Operacional Factores de Competitividade – COMPETE (FCOMP-01-0124-
FEDER-008832) e por Fundos Nacionais através da FCT – Fundação para a
Ciência e Tecnologia (PTDC/AUR-AQI/099063/2008).
Dedicamos este trabalho ao Pedro, nosso IR sempre tão presente
III PARTE
NOTA INTRODUTÓRIA
REVISITAÇÕES DA ARQUITECTURA VERNACULAR.
UM POUCO DE HISTÓRIA
A descoberta de Portugal rural
O contributo da geografia
A invenção da casa portuguesa
Da casa portuguesa ao Inquérito à Arquitectura Regional
O INQUÉRITO À ARQUITECTURA REGIONAL
“Paternidade” e genealogia do Inquérito
Influência da geografia e da antropologia
Relações com o poder
A questão metodológica
Consequências na arquitectura portuguesa
Contexto Internacional
DOCUMENTOS
III Parte. Pedro Vieira de Almeida
Arquitectura Popular em Portugal. Uma Leitura Crítica
Projecto de investigação
Resultados do Projecto
AGRADECIMENTOS
Com o Caderno 4, encerramos a apresentação do trabalho que realizamos ao
longo dos últimos três anos.
Depois de uma I Parte de construção teórica em torno de dois parâmetros
expressivos da arquitectura – a espessura e o espaço-transição – que
publicamos nos Cadernos 1 e 2, e de uma II Parte em que utilizamos o volume
Arquitectura Popular em Portugal como universo de demostração, cabe
agora a esta III Parte reflectir sobre o Inquérito à Arquitectura Regional e o
livro que dele resultou sob o ponto de vista histórico.
Assim, procuramos compreender e enquadrar este Inquérito na evolução da
arquitectura portuguesa e internacional, analisar aquilo que sobre ele foi
escrito, identificando os principais contributos e compreender o seu
significado na cultura arquitectónica portuguesa do século XX.
Muito ficou ainda por fazer, não se esgotando o tema neste nosso trabalho,
que de resto sempre se entendeu como uma primeira aproximação que
poderia levar a desenvolvimentos futuros.
Mas este é o também o último volume em que apresentamos os resultados do
nosso projecto e por isso entendemos dever nele também juntar o rascunho
das considerações finais que Pedro Vieira de Almeida tinha começado a
escrever, a listagem da produção da equipa e o texto do projecto que, em
2009, apresentamos à FCT no âmbito do concurso para projectos de
investigação.
Nota introdutória
11
Sendo Portugal um país historicamente caracterizado por uma profunda
vertente nacionalista, equacionada por Eduardo Lourenço como sendo um
problema de “hiperidentidade, de quase mórbida fixação na contemplação e
no gozo da diferença que nos caracteriza ou nós imaginamos como tal no 1contexto dos outros povos, nações e culturas” , não será de estranhar que a
preocupação com a identificação da especificidade da arquitectura nacional
se tenha constituído como um problema fulcral ao longo dos séculos XIX e
XX.2Efectivamente, logo com a primeira geração romântica , assistimos a uma
tentativa declarada de identificação da “arquitectura portuguesa”, centrada
nas arquitecturas históricas e directamente associada à evolução da histori-3ografia da arte e à estruturação da noção de património então em curso .
Por ventura com menor visibilidade, e com um percurso mais atribulado,
começa igualmente a surgir o interesse pela cultura popular. Como enuncia
António Medeiros, reconhece-se a “existência de 'entidades provinciais' 4diferenciadas” e procede-se à “tipificação das suas populações e paisagens” .
É assim que ao longo do século XIX e da primeira metade do séc. XX, se
assiste a uma progressiva descoberta do território português e com ela ao da
arquitectura e da cultura popular. Esta descoberta acabaria por repercutir-se 5no horizonte da arquitectura portuguesa da segunda metade de novecentos .
Da primeira geração romântica, que a partir de 1825 começou a descobrir a
tradição oral, ao sistemático levantamento da arquitectura popular
portuguesa, realizado na década de 1950 pelo Sindicato dos arquitectos com
apoio oficial, estende-se todo um percurso de descoberta, debate e
compromisso, que importa inventariar.
A Descoberta de Portugal Rural
Desde o início do século XIX que se começa a assistir a uma idealização do
universo popular em grande parte decorrente da procura das raízes da
identidade cultural portuguesa, mas efectivamente só a partir da década de
1870 se começa a construir um real reconhecimento da realidade nacional.
Até lá, o “povo português” e a sua cultura constituíam um universo ideali-
zado, com que intelectuais citadinos tomavam contacto sobretudo por via
REVISITAÇÕES DA ARQUITECTURA VERNACULAR.
UM POUCO DE HISTÓRIA
1. Eduardo LOURENÇO (1990: 10) apud Luís
CUNHA – A Nação nas Malhas da sua Identidade.
O Estado Novo e a construção da identidade
nacional, Porto, Edições Afrontamento, 2001, p. 58
2. Sobre a primeira geração romântica, que inclui
nomes como Almeida Garret e Alexandre Herculano,
ver por exemplo: José Augusto FRANÇA – O
Romantismo em Portugal. Estudo de factos
socioculturais. Lisboa: Livros Horizonte, 1993;
Álvaro Manuel MACHADO – Do Romantismo aos
Romantismos em Portugal. Lisboa: Editorial
Presença, 1996;
3. Vd. Maria Helena MAIA – Património e Restauro
em Portugal (1825-1880). Lisboa: Colibri –
IHA/Estudos de Arte Contemporânea, 2007
4. António MEDEIROS – "Minho: Retrato
oitocentista de uma paisagem de eleição", Revista
Lusitana, Nova Série, nº 13-14, 2005, p. 101
5. Vd. por ex. Nuno Teotónio PEREIRA – “Reflexos
Culturais do Inquérito à Arquitectura Regional” in J-
A nº 195, Março/Abril, 2000 ou Maria Helena MAIA
e Alexandra CARDOSO – “Portuguese Popular
Architecture: Appropriations” in Proceedings of
ISVS-6, 6th International Seminar on Vernacular
Settlements, Contemporary Vernavulars: Places,
Processes and Manifestations. Famagusta, North
Cyprus, 2012.
12
6indirecta e muitas vezes reduzida à memória de velhas amas .
Quando na década de 1870, um paradigma de maior rigor científico obrigou à
saída para trabalho de campo, o confronto com a realidade não foi muito
confortável aos antropólogos e acabou por resultar na instauração de uma
leitura negativa que se estendeu à da própria identidade nacional. Essa é uma
das razões de fundo que explicam as considerações negativas em volta da
cultura e da arte portuguesas que grassam pelos textos de então.
A partir dessa altura a inteligenzia portuguesa passa a cultivar uma atitude
negativa face à nossa identidade cultural, numa exploração quase mórbida da
ideia de “decadência nacional” de que Eça de Queirós fornece um resumo
mordaz - “fomos à Índia, é verdade, mas quase três séculos são passados, e
ainda estamos descansando, derreados desse violento esforço a que nos 7obrigaram alguns aventureiros (…)” .
No entanto, duas décadas depois, um movimento cultural de sentido
contrário surgirá com o ultimatum inglês. O sentimento de humilhação
nacional que este gerou, acabou por originar um surto de nacionalismo de que
os apelos na imprensa à nacionalização da arte e da arquitectura fizeram eco.
É neste contexto que se assiste ao convite aos arquitectos para que produzam
uma casa portuguesa, isto é, para que produzam um modelo de habitação que
simultaneamente reúna características formais indiscutivelmente nacionais e
ofereça o conforto considerado necessário à vida quotidiana.
Concretamente no caso da arquitectura, tratava-se do apelo à invenção de
uma casa portuguesa que eruditos e antropólogos tinham desde 1890 vindo a 8identificar .
A partir daqui, assiste-se o uso simultâneo e indiferenciado da designação de
casa portuguesa com objectivos diferentes consoante se aplicava ao trabalho 9de antropólogos ou de arquitectos . Esta é, sem dúvida, a origem de muitas
das ambiguidades associadas ao tema.
É que existe desde o início um problema de identificação da casa portuguesa
associado aos estudos etnográficos e centrado na clarificação da existência ou
não de um tipo nacional de habitação.
Paralelamente, existe também desde o ínicio, o problema da invenção da
casa portuguesa, isto é, o problema arquitectónico de fornecer uma resposta
concreta aos apelos de nacionalização da arquitectura, analisada mais à
frente.
Importa pois esclarecer sucintamente os contornos que adquiriu cada um
destes problemas entre 1890 e 1910, isto é, no período em que surge e se
define o tema da casa portuguesa, uma vez que, na década de 1950, o
Inquérito à Arquitectura Regional se vem expressamente posicionar contra as
suas consequências
Em primeiro lugar é importante realçar que, apesar do interesse pela
arquitectura popular ter nascido associado ao desejo de identificar um tipo de 10casa portuguesa , existiu desde o primeiro momento a consciência da sua
6. Para uma melhor compreensão da evolução da
antropologia em Portugal e dos efeitos do contacto
dos antropólogos com o seu objecto de estudo ver
João LEAL – “Imagens contrastadas do povo:
cultura popular e identidade nacional na antropologia
portuguesa oitocentista” in Antropologia em
Portugal. Mestres, Percursos, Transições. Porto:
Livros Horizonte, 2006, p. 102 Ver também José
NEVES – Como se faz um povo: ensaios em história
contemporânea de Portugal. Lisboa: Tinta da China,
2010.
7. Eça de Queirós – “O Francesismo” in AA.VV. Os
Conferencistas do Casino. Porto: Fronteira do Caos
Editores, 2005 (1887), p. 127
8. Não cabe na economia deste trabalho abordar a
problemática da casa portuguesa no contexto da
cultura arquitectónica nacional. Este assunto é
tratado em Maria Helena MAIA – “From the
Portuguese House to Surveys of Popular
Architecture: Notes on the construction of
Portuguese architectural identity” in Architecture,
Design and the Nation. Proceedings of the First
Theoretical Currents in Architecture Conference
(NTU 14-15 Sep), Nottingham,UK, 2010; e “From
the Portuguese House to the 'Popular Architecture in
Portugal': notes on the construction of Portuguese
architectural identity”, National Identities, special
issue: Architecture and the Construction of National
Identity, vol. 14, Issue 3, 2012, p. 243-256
9. Para esta dupla vertente do tema foi já chamada a
atenção por Rute Figueiredo que fala de “dois
sentidos”: um sentido retrospectivo ligado aos
estudos etnográficos e centrado na existência ou não
de um tipo nacional de habitação e um sentido
prospectivo que procura responder aos apelos de
nacionalização da arquitectura e à vontade de
encontrar uma solução arquitectónica que lhes desse
resposta. Vd. Rute FIGUEIREDO – Arquitectura e
Discurso Crítico em Portugal (1893-1918). Lisboa:
Colibri – IHA/Estudos de Arte Contemporânea,
2007.
10. Henrique das NEVES – A Cava de Viriato.
Figueira da Foz: Imprensa Lusitana, 1893 e "Casa
Portuguesa", O Ocidente. Lisboa, Year IX, vol. IXI,
n 625, 05/05/1896. Ver também a série de artigos
publicados em 1895 por Gabriel PEREIRA na
revista Arte Portuguesa.
11. Teixeira de CARVALHO – "A Casa Moderna" in
Arte e Arqueologia. Coimbra: Imprensa da
Universidade, 1925 (1901); Abel BOTELHO – "A
Casa Portuguesa", A Construção Moderna, Ano IV,
nº 92 e 94, 1903 (reprodução do artigo publicado no
jornal O Dia de 11-03-1903), Rocha PEIXOTO – "A
Casa Portuguesa", A Construção Moderna, nº 141 a
146, 20/08 a 10/10/1904 e nº 155 10/01/1905.
12. Parece ter sido consensual o facto de a cidade e o
campo constituírem realidades distintas, verificando-
se uma maior diversidade tipológica na primeira.
Apesar dessa constatação, o interesse pela habitação
rural é dominante entre aqueles que se interessaram
pelo tema da casa portuguesa, sendo que apenas
13
11diversidade. Ou seja, rapidamente se identificam diferenças regionais , que
se atribuem à necessidade de adaptação às condições naturais, e se
compreende que a cidade e o campo constituem realidades distintas, a 12primeira com maior diversidade tipológica do que a segunda . Ao mesmo
tempo, começa-se a colocar a possibilidade de que as soluções arquitetónicas
encontradas em Portugal possam não ser exclusivo nosso, existindo também 13noutros países, sobretudo do Sul da Europa .
Por outro lado, se bem que o interesse pela habitação rural seja dominante 14entre aqueles que se interessaram pelo tema da casa portuguesa , quando se
trata de definir o universo arquitectónico com ela identificado, é possível
detectar diferenças substanciais entre os autores.
Efectivamente, se os antropólogos tendem a restringir o campo de análise à
arquitectura popular, esta atitude não é geral. Alguns dos intervenientes,
sobretudo os que desenvolviam trabalho no campo da história da arte, tendem
a alargar o universo da casa portuguesa a exemplares não só históricos, como
de arquitectura erudita. Veja-se o exemplo das casas solarengas, algumas das
quais de traço erudito, que ilustram o trabalho sobre a habitação em Portugal 15publicado em 1909 por João Barreira .
Importa ainda realçar que o universo geográfico da casa portuguesa também
não era uniforme, existindo toda uma variedade de opções quanto à
percentagem do país abrangida e às preferências geográficas dos autores.
Registe-se que o tema da casa portuguesa surge num momento em que se
começava a tomar contacto directo com a realidade do país, nessa altura ainda
bastante mal conhecido, sendo importante aqui realçar o papel que a saída
para o terreno tem na construção desta consciência nacional.
Escritores, pintores, antropólogos, geógrafos, arquitectos e arqueólogos,
entre outros, partilham um mesmo interesse pelo Portugal profundo que
ajudam a descobrir e que vemos reflectido nas suas obras. No caso da
literatura, recorde-se como exemplo mais imediato, o da presença de Portugal
rural na obra de Júlio Dinis (1839-1871), nomeadamente As Pupilas do
Senhor Reitor (1869), A Morgadinha dos Canaviais (1868), Serões de 16Província (1870) e Os Fidalgos da Casa Mourisca (1871) . Na mesma
altura, esse mesmo Portugal é tratado também na pintura, em obras como
Visita Pascal de Augusto Roquemont, Festa da Aldeia de Leonel Pereira ou 17Provando o Jantar de Roque Gameiro .
Por outro lado, a adesão à fotografia como método de registo, vai ganhando
força e vemos arquitectos-arqueólogos como Possidónio da Silva (1861-181862) partirem para o terreno registando monumentos, paisagens e
arquitecturas até aí desconhecidas, que vêm a estar na origem de outras tantas 19gravuras publicadas em revistas da época , como é o caso pioneiro da revista
Panorama Photográfico de Portugal, publicada em Coimbra entre 1869 e
1874, que já incluía vistas de várias localidades, da autoria de vários 20fotógrafos entre os quais Carlos Relvas .
Júlio de Castilho privilegia o estudo da habitação
urbana. Vd. Joana Cunha LEAL – “A
individualidade de Lisboa e o tipo de casa portuguesa
em Júlio de Castilho”, vinte e um por vinte e um, nº
2, Arte e Identidade, Porto, ESAP, 2006, p. 80.
13. Abel BOTELHO – "A Casa..."; Rocha
PEIXOTO – "A Casa Portuguesa"…, João
BARREIRA – "A Habitação em Portugal" in Notas
Sobre Portugal. Exposição Nacional do Rio de
Janeiro em 1908, Lisboa: Imprensa Nacional, 1908
14. Destes, apenas Júlio de Castilho privilegia o
estudo da habitação urbana Vd. Joana Cunha LEAL
– “A individualidade de Lisboa e o tipo de casa
portuguesa em Júlio de Castilho”, vinte e um por
vinte e um, nº 2, Arte e Identidade, Porto: ESAP,
2006, p. 80
15. Este autor estabelece uma clara distinção não só
entre habitação rural e urbana, como entre
construções “com carácter de formação espontânea
das que obedecem a moldes eruditos” (João
BARREIRA, 1908,"A Habitação…”, p. 148)
16. No caso da literatura o exemplo mais imediato é
o da presença de Portugal rural na obra de Júlio Dinis
(1839-1871), muito concretamente em obras como
As Pupilas do Senhor Reitor (1869), A Morgadinha
dos Canaviais (1868), Serões de Província (1870) e
Os Fidalgos da Casa Mourisca (1871), que foram
adaptados ao cinema em 1921 (Georges Pallu), 1924
(Maurice Mauriad), 1935 (Leitão de Barros), 1938
(Arthur Duarte), 1949 (Caeltano Bonucci e Amadeu
Ferrari) e 1961 (Perdigão Queiroga). Se bem que
mais tardia e num registo bastante diferente, é
também importante lembrar a obra de Aquilino
Ribeiro (1885-1963), um dos mais importantes
escritores portuguese da primeira metade do sec.
XX, que retractou magnificamente o mundo rural
português sem no entanto perder a universalidade da
sua escrita, em obras como Terras do Demo (1919)
Andam Faunos pelos Bosques (1926), A Casa
Grande de Romarigães (1957), O Malhadinhas e
Quando os Lobos Uivam (1958) e ainda Avieiros
(1942) de Alves Rodol.
17. Também a fotografia tomará por tema Portugal
rural, como acontece nos trabalhos de 1920 de
Domingos Alvão (1872-1946) publicados por
António Sena (História da Imagem Fotográfica em
Portugal 1839-1997, Porto: Porto Editora, 1998, p.
214-15)
18. Possidónio da SILVA – Revista Pittoresca e
Descriptiva de Portugal com vistas Photographicas.
Foi a primeira publicação fotográfica em Portugal a
contar com apoio oficial. Vd. Paulo BATISTA – A
Casa Biel e as suas edições fotográficas no Portugal
de Oitocentos. Edições Colibri / IHA- Estudos de
Arte Contemporânea, Lisboa: FCSH-UNL, 2010,
p.101
19. Veja-se, por ex., o caso das fotografias de Carlos
Relvas que deram origem a um número considerável
de ilustrações nas revistas da época.
14
Note-se que desde o início da década de 1880, ao interesse pelo monumento
histórico-arquitectónico já se tinha juntado uma emergente sensibilidade
pelo conjunto urbano, em grande parte vernacular. É assim que vemos em 211879 Júlio de Castilho estudar o Bairro Alto de Lisboa e em 1880, Carlos
22Relvas fotografar os conjuntos urbanos desenhados por Alfredo de Andrade
e relatados por Rangel de Lima quando percorreram Portugal em busca de
material para a exposição de arte portuguesa que se realizaria no South 23Kensington Museum nesse mesmo ano . Em ambos os casos, a habitação
24popular começava a aparecer, integrada em conjuntos urbanos históricos e
pitorescos.
Recorde-se que paralelamente se vinha construindo um corpus de
conhecimento da habitação tradicional, que no contexto do debate em torno
da casa portuguesa, se tinha tornado num dos temas (senão o tema) centrais
da cultura arquitectónica nacional.
Mas é nos primeiros anos do século XX que vamos ver surgir as principais
obras de descoberta de Portugal rural cuja imagem, com a ajuda da fotografia,
vão começar a vulgarizar. Casas e povoados rurais distantes e arcaicos
surgem em paridade com “belezas” naturais e monumentos nas páginas de
obras como A Arte e Natureza em Portugal, editada por Emilio Biel entre 251902 e 1908 , com fotografias próprias e de Cunha Moraes e textos de alguns
26dos intelectuais mais activos da época .
É na viragem para o século XX que verdadeiramente a arquitectura popular
entra nos interesses da inteligenzia nacional em geral e adquire uma presença
importante no universo arquitectónico português.
20. Carlos Relvas desenvolveu um trabalho
importante no campo da fotografia de arquitectura,
tendo o seu trabalho estado na base de um número
significativo de gravuras publicadas na imprensa
periódica da época. Sobre a relação entre fotografia e
arquitectura em Portugal, no século XIX, ver
Alexandra TREVISAN e Maria Helena MAIA –
“Architecture et photographie d'architecture au XIXe
siècle en Portugal” Aceite [Janeiro 2013] in
Architectes et photographes au XIXe siècle Actas da
Journée d'études. (Paris: INHA, 23 Outubro 2012) e
António SENA – História da Imagem Fotográfica
em Portugal – 1839-1997. Porto: Porto Editora,
1998.
21. Júlio de CASTILHO – Lisboa Antiga T. 1 O
Bairro Alto de Lisboa. Lisboa: Livr. de A. M. Pereira,
1879.
22. Ver também Vistas de Portugal (1880) de Carlos
Relvas (1838-1994). Vd. António SENA – História
da Imagem Fotográfica…p. 66.
23. Rangel de Lima (jornalista), Alfredo de Andrade
(arquitecto) e Carlos Relvas (fotógrafo) percorreram
Portugal em 1880 com o duplo objectivo de recolher
obras de arte portuguesas para a exposição que se
preparava no South Kesinghton Museum em Londres
e recolher os dados que lhes permitissem emitir
parecer sobre o valor do património móvel e imóvel
dos conventos que o governo pretendia por à venda,
com vista à salvaguarda daqueles a que fosse
atribuído valor patrimonial. Os relatórios desta
comissão dão uma ideia bastante negativa do estado
em que se encontrava o património nacional (Vd.
Maria Helena MAIA – Património e Restauro…, p.
222-23).
24. Note-se que Joana Cunha Leal data de 1879 os
primeiros sinais de valorização patrimonial de
conjuntos urbanos, identificados na obra de Júlio de
Castilho dedicada ao Bairro Alto. Vd. Joana Cunha
LEAL – “A individualidade de Lisboa…”
25. A Arte e a Natureza em Portugal. Emilio Biel &
Cª, Porto, 1902-1908
26. Como é o caso, entre outros, de Ramalho
Ortigão, Joaquim de Vasconcelos, Manuel Monteiro,
Gabriel Pereira, Simões de Castro, Júlio de Castilho
ou Augusto Fuschini.
Castelo de Montalegre. A Arte e a Natureza em
Portugal. Emilio Biel ed., 1907, vol. 7
15
Esta presença começou a ganhar corpo na última década do séc. XIX,
coincidindo com o desenvolvimento da corrente atrás referida de identifi-
cação da casa portuguesa que, no campo da antropologia encontra em Rocha
Peixoto o primeiro grande sistematizador. Para Rocha Peixoto apenas em
lugares esquecidos do interior sobrevivia inalterada a imagem autentica e
intemporal do país, sendo essas que “pela persistência de alguns tipos, 27representam o espelho fiel da vida de outras eras” .
28Primeiro em 1898 no artigo Os Palheiros do Litoral e depois em 1904 com A 29Casa Portuguesa , Rocha Peixoto procede à primeira sistematização dos
diferentes tipos de habitação popular, classificando-os e ilustrando-os com
fotografias.
Pouco depois, João Barreira descreve para a exposição nacional do Rio de 30Janeiro de 1908 os tipos de casa portuguesa .
Seguem-se “inquéritos” particulares de arquitectos, como Raul Lino e Carlos
Ramos, que reflectem nos seus projectos a observação da arquitectura 31tradicional que encontraram nas viagens por Portugal .
Será porém necessário chegar aos anos 40 do século XX para entrarmos
numa nova fase da relação com a cultura vernacular, processo em que o
trabalho do geógrafo Orlando Ribeiro terá um significado especial.
O Contributo da Geografia
É hoje consensual considerar-se que a ideia da unidade do território
português hoje existente resulta mais da “continuidade de um poder político 32que dominou o conjunto de uma maneira firme e fortemente centralizada”
ao longo dos séculos, do que de qualquer tipo de homogeneidade étnica ou
geográfica.
No entanto, este consenso não se obteve sem que durante cerca de um século
se reflectisse intensamente sobre a individualidade portuguesa.
No que à geografia se refere, esta reflexão começa em 1876 com o primeiro
volume da Geografia Universal de Elisée Reclus e termina em 1983, com a
síntese das diferentes posições realizada por Carlos Alberto Medeiros na
Introdução à História de Portugal na sequência do balanço realizado por
Orlando Ribeiro nas Introduções Geográficas à História de Portugal em 331977 .
34Como já foi notado , o “problema da nossa individualidade geográfica”
esgotou-se neste século de reflexão e debate, tendo “como resultado mais
positivo a determinação das condições naturais, não do conjunto do território
português, mas da sua divisão regional, ou seja das diferenças que o
atravessam. Acentuou a falta de unidade.”
Efectivamente, desde a publicação em 1945 de Portugal: o Mediterrâneo e o
Atlântico de Orlando Ribeiro, ficou demonstrada a existência de 3 grandes
regiões naturais no território nacional: o Norte Atlântico, o Norte Transmon-
27. Rocha Peixoto – “Palheiros do Litoral”,
Portugália, n. 1, 1899, p. 79 e 81.
28. Rocha Peixoto – “Palheiros do Litoral”…
29. Rocha PEIXOTO – "A Casa Portuguesa", A
Construção Moderna, n. 141 a 146, 20/08 a
10/10/1904 e n. 155 10/01/1905
30. João BARREIRA – “A Habitação em Portugal”
in Notas Sobre Portugal. Exposição Nacional do Rio
de Janeiro em 1908. Lisboa: Imprensa Nacional,
1908
31. Vd. Pedro Vieira de Almeida – Apontamentos
para uma Teoria da Arquitectura. Lisboa: Livros
Horizonte, 2008, p. 106
32. José MATTOSO, Suzanne DAVEAU e Duarte
BELO – Portugal. O Sabor da Terra. Um retrato
histórico e geográfico por regiões, s.l.: Circulo de
Leitores, 2011, p. 27
33. Vd. José MATTOSO, Suzanne DAVEAU e
Duarte BELO – Portugal. O Sabor da Terra…, p.
27-29
34. José MATTOSO, Suzanne DAVEAU e Duarte
BELO – Portugal. O Sabor da Terra…, p. 31
16
tano e o Sul.
Note-se porém que na década de 1960, os geógrafos atribuíam maior
importância à oposição Norte-Sul do que à diferença Leste-Oeste, isto é,
Litoral-Interior, que a divisão proposta por Orlando Ribeiro do Norte 35configurava .
Importa ainda referir que este autor subdividia as suas três grandes áreas em
23 “unidades de paisagem” caracterizadas essencialmente pelo relevo e pela 36natureza do solo . Para chegar a esta divisão, Orlando Ribeiro tomou em
conta as províncias tradicionais – seguidas por exemplo no Guia de Portugal 37publicado em 1924 – embora “procurando definir e caracterizar regiões
38geográficas baseadas principalmente na natureza”
Para além da caracterização geográfica, Portugal: o Mediterrâneo e o
Atlântico propõe ainda uma leitura da arquitectura popular portuguesa, direc-39tamente articulada com os materiais de construção local e com o relevo .
Realçando a existência de um uso generalizado da pedra em todo o território 40português , o autor chama no entanto à atenção para três excepções: as
construções de taipa e adobe; os palheiros de madeira assentes sobre estacas e 41as barracas construídas com estormo .
Quanto à forma da casa popular, Orlando Ribeiro distingue dois tipos
fundamentais: o do Norte e o do Sul, ambos de planta rectangular e telhado
geralmente de duas águas.
Segundo este autor, no Norte a casa é caracterizada por uma construção em
dois pisos, em que o 1º se destina ao abrigo do gado, alfaias e produtos
agrícolas e o 2º piso, com acesso independente através de escadas de pedra, é
ocupado pela habitação constituída por cozinha e quarto. Geralmente esta
casa não só não tem chaminé como tem poucas janelas, o que resulta num
interior escurecido pelo fumo. Exteriormente é frequente existir uma varanda
35. José MATTOSO, Suzanne DAVEAU e Duarte
BELO – Portugal. O Sabor da Terra…, p. 31. Note-
se que existiam variantes nesta divisão geográfica,
entre as quais é de referir a proposta de Amorim
Girão que dividia Portugal em três grandes zonas -
Norte, Centro e Sul – traçadas horizontalmente sobre
o mapa.
36. Orlando RIBEIRO – Portugal, o Mediterrâneo e
o Atlântico. Esboço de relações geográficas. 7ª
edição ampliada, Lisboa: Liv. Sá da Costa, 1998
(1945)
37. Guia de Portugal. 1924, Biblioteca Nacional,
Lisboa, 8 volumes
38. Orlando RIBEIRO – Portugal, o Mediterrâneo e
o Atlântico…, p.141
39. Orlando RIBEIRO – Portugal, o Mediterrâneo e
o Atlântico…, p. 92
40. “o uso da pedra como material de construção, em
muros de suporte ou de resguardo dos campos, no
calcetamento de caminhos rurais, em pontes e
aquedutos, no forro dos poços, nos currais e abrigos
para gado, em edifícios destinados a guardar os
produtos da colheita ou na habitação humana, é um
traço comum ao território português” (Orlando
RIBEIRO – Portugal, o Mediterrâneo e o
Atlântico…, p. 92)
41. Gramínia que cresce nos areais
Beira Litoral, sem data
© Orlando Ribeiro
17
corrida, coberta pelo telhado.
No Sul a construção é de um só piso destinado exclusivamente a habitação,
com paredes caiadas tanto no interior como no exterior. A chaminé é um
elemento arquitectónico de destaque na fachada.
Sob o ponto de vista funcional, Orlando Ribeiro aproxima a casa do norte de
alguns montes alentejanos que, à semelhança desta reúnem aos espaços
habitacionais os espaços destinados a funções agrícolas, se bem que, no
segundo caso, se tratem de construções de um único piso, tendo ambas um
pátio associado.
Este interesse pela arquitectura popular, caracterizou também o trabalho de
outros profissionais.
Já no fim dos anos 1930, um grupo de agrónomos se tinham interessado pelo
tema, tendo realizado com apoio oficial, um Inquérito à Arquitectura Rural
que, por ter denunciado a miséria das condições de vida da população, acabou
por ser objecto da censura política então existente, pelo que apenas foram 42publicados 2 dos 3 volumes previstos
Também os antropólogos portugueses darão atenção ao tema, certamente
atraídos pelos apontamentos de Orlando Ribeiro.
Veiga de Oliveira testemunha que já em 1947 a habitação tradicional
portuguesa era um dos temas a que os antropólogos atribuíam maior
interesse, procurando “levar a cabo um estudo global sobre essa matéria,
analisando e estudando a casa na complexa variedade dos seus aspectos,
arquitectónicos, etnográficos e históricos”. Na década seguinte, foram
publicados numerosos estudos sobre vários tipos de casas, que deveriam 43contribuir para um “projectado estudo global” .
Nesta abordagem da cultura popular, os antropólogos seguem de perto as
zonas definidas por Orlando Ribeiro, identificando o Portugal Atlântico com
a Ibéria Húmida, o Portugal Transmontano com a Ibéria Seca e o Sul, o 44Portugal Mediterrâneo com a Ibéria Árida .
Estava-se muito longe já das primeiras tentativas de identificação de uma
casa portuguesa que caracterizam os primeiros passos do estudo da habitação
popular, como se verá mais à frente.
O mesmo acontecia no que se refere às consequências dos apelos à
apresentação de solução arquitectónica para uma casa portuguesa
contemporânea.
A invenção da casa portuguesa
Paralelamente ao desenvolvimento das diversas abordagens da arquitectura
popular que se têm vindo a tratar, decorria um processo de invenção de uma
casa portuguesa que combinasse uma resposta formal às aspirações
nacionalistas com o conforto necessário para um uso actual.
Como já foi referido, na última década do séc. XIX multiplicam-se na
42. Pedro Vieira de ALMEIDA e Maria Helena
MAIA – “As décadas pós-Congresso. Os anos 50” in
História da Arte em Portugal, vol. 14, Arquitectura
Moderna. Dir. Pedro Vieira de Almeida e José
Manuel Fernandes. Lisboa: Alfa, 1986
43. O estudo da habitação tradicional constituiu uma
verdadeira linha de investigação para Centro de
Estudos de Etnologia, a partir de 1947, data da sua
criação, sendo muito presente na obra dos
investigadores a ele associados. Vd. Ernesto Veiga de
OLIVEIRA – Introdução à 2ª edição de Casas
Esguias do Porto e Sobrados do Recife (1986) apud
Ernesto Veiga de OLIVEIRA e Fernando
GALHANO – Arquitectura Tradicional Portuguesa.
Lisboa: D. Quixote, 2000 (1992), p. 11.
44. Ernesto Veiga de OLIVEIRA e Fernando
GALHANO – Arquitectura Tradicional…, p. 17.
18
imprensa da época os apelos à nacionalização da arte, acompanhada de uma
atitude combativa, que pode ser exemplificada pela ideia de Ramalho Ortigão
de que “uma arte genuinamente portuguesa deveria existir” ou pelo menos 45poderia ser reinventada .
No campo da arquitectura a resposta a estes apelos passava em grande parte
pelo investimento na criação de uma casa portuguesa, que constituísse uma 46alternativa aos modelos arquitectónicos importados .
Aos arquitectos, a quem cabia a tarefa, eram dadas as mais variadas
sugestões, feitas críticas e tecidos elogios nem sempre concordantes entre si.
Por um lado, neste tactear de caminhos possíveis, a “descoberta” da
arquitectura popular vem fornecer um novo universo de referência. E dentro
desta interessava sobretudo a que se podia encontrar nos meios pobres e
rurais e que, por isso mesmo, era vista como a mais genuína representante da 47cultura nacional
Mas a referência vernácula não é a única presente na invenção formal da casa
portuguesa, que tem que ser compreendida no âmbito do movimento geral de
nacionalização da arquitectura.
Convém não esquecer que, nesta viragem do século XIX para o século XX, a 48arquitectura românica , manuelina, ou mesmo do séc. XVII, disputavam
entre si o lugar de principal detentora dos sinais de portugalidade. Por
exemplo, a referência manuelina, que tinha ganho o lugar de representante 49privilegiada da identidade nacional, apesar de fortemente questionada não
só não desaparecera, como continuava a funcionar plenamente na primeira
década do século XX. Efectivamente o repertório formal manuelino não só 50foi defendido como referência a adoptar como foi usado nalgumas das
51primeiras tentativas de concretização da casa portuguesa .
Outra das vias consideradas possíveis, era a apontada pelos projectos do
então jovem Raul Lino, entre os quais se contava o projecto apresentado ao
concurso para o pavilhão de Portugal na Exposição de Paris de 1900. Neste
caso em concreto, socorrendo-se da colagem de elementos provenientes de
referências diversificadas, comum na arquitectura das feiras internacionais, 52Raul Lino construía um projecto dotado de grande coerência formal .
Quatro anos depois, Ricardo Severo experimentava o mesmo caminho em
casa própria, neste caso, tentando sintetizar a diversidade formal detectada no
terreno numa solução feita do somatório das referências seleccionadas.
Não por acaso, o elogio desta casa é feito por Rocha Peixoto no artigo, já
referido, em que definitivamente sistematiza a diversidade da arquitectura 53popular portuguesa e portanto elimina qualquer pretensão à existência de
um modelo único da mesma.
É que nesta casa se tentava articular o estudo da arquitectura tradicional
portuguesa, fosse ela popular ou erudita, com a construção de um modelo
ideal de casa portuguesa que pudesse congregar claramente os sinais da
nossa identidade nacional.
45. Ramalho ORTIGÃO – “Arte Portuguesa” (1890)
in Arte Portuguesa. Lisboa: Clássica Editora, vol.
III, 1947, p. 140.
46. Eram especialmente criticadas as combinações
estilísticas de carácter cenográfico e a moda do
chalet que então se tinham generalizado nos
arredores de Lisboa, descritas como uma “híbrida
confusão alucinada do chalet suíço, do cottage
inglês, da fortaleza normanda, do minarete tártaro e
da mesquita moura, – nódoa e vexame da paisagem
portuguesa nas redondezas de Lisboa”. (Ramalho
ORTIGÃO –"O Culto da Arte em Portugal” (1896)
in Arte Portuguesa. Lisboa: Clássica Editora, vol.I,
1943, p. 131-32).
47. Esta abordagem resulta em grande parte da
permanência de uma visão do povo vinda do
Romantismo, em que este é "situado à margem do
progresso, encarado como guardião do arcaísmo e da
tradição, entidade imutável na sua persistente
fidelidade a si própria, emblema por excelência de
uma alteridade «doméstica» que, mais do que
demonstrada, é sobretudo para demonstrar" (João de
Freitas BRANCO e João LEAL – "Introdução",
Revista Lusitana, Nova Série, nº 13-14, 1995, p. 5)
48. José de FIGUEIREDO – Portugal na Exposição
de Paris. Lisboa: Livraria Moderna, 1909,p.9.
49. Precisamente em 1904, Guerra Junqueiro (Arte e
Vida, p. 31) falava de "manuelinhos" ou
"manuelzinhos" e em 1908, Joaquim de Vasconcelos
(“Artes Decorativas Portuguesas" in Notas Sobre
Portugal. Lisboa: Imprensa Nacional, 1908)
denunciava a "fúria insana com que se devaneava no
moderno estilo manuelino". Vd. José-Augusto
FRANÇA – A Arte em Portugal no Século XIX.
Lisboa: Livraria Bertrand, vol. II, 1981, p. 175 e 177
50. Não é portanto estranho que, em 1895, entre os
apelos à nacionalização da arquitectura se encontrem
defensores do Manuelino como referência
preferencial. Concretamente, aconselham-se os
arquitectos a procurar inspiração no Mosteiro dos
Jerónimos e dele copiarem fragmentos “em edifícios
actuais para usos actuais” (Gabriel PEREIRA –
"Esthetica Portugueza", Arte Portuguesa, Ano I, nº 2,
Lisboa, Fevereiro, 1895, p. 26).
51. Na viragem do século, para alguns autores, as
composições cenográficas de Francisco Vilaça,
dominadas por valores de imagem e fortemente
condimentadas com a referência manuelina,
constituíam um caminho possível. Veja-se a casa
O'Neill/Castro Guimarães, em Cascais, então
apontada como um dos exemplos de que existia uma
solução “absolutamente satisfatória” para o problema
da casa portuguesa.
52. Vd. Pedro Vieira de ALMEIDA – “Raul Lino,
arquitecto moderno” in Raul Lino. Exposição
retrospectiva da sua obra. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian, 1970
53. Rocha PEIXOTO – "A Casa Portuguesa", A
Construção Moderna, nº 143,10-09-1904
19
Pela mesma altura, construía-se em Cascais a casa do conde Arnoso,
consensual talvez por ser “tão saudosamente semelhante à casa dos nossos 54avós” , mas estava-se ainda longe de ter uma ideia clara da solução
arquitectónica adequada à casa portuguesa, para a qual, no entanto, se ia
caminhando, tenteando entre críticas e elogios.
Na imprensa das primeiras décadas do século XX, proliferavam as
referências a obras enquadráveis no movimento da casa portuguesa,
produzidas por arquitectos desejosos de “dotar o país com arquitectura
propriamente sua”, como noticiava a revista Arquitectura Portuguesa, em 551915 .
Por essa altura, Raul Lino era já identificado como o criador da casa 56portuguesa , e os seus projectos descritos como construções modernas de
inspiração tradicional, vão influenciar os arquitectos do seu tempo, sendo 57tomados como uma espécie de modelo nacional de bom gosto .
Mas aqui importa realçar que, como em primeiro lugar defendeu Pedro Vieira 58de Almeida , para Lino, “a tentativa de um caminho de identidade nacional
implica(va) uma verdadeira inventariação de estruturas do habitar, e não uma
simples catalogação de artifícios formais”.
São essas que se dedica a analisar nas viagens de bicicleta que fez por 59Portugal nos anos de juventude e que se vão reflectir numa proposta de
valores-de-habitar, elemento fulcral de toda a sua obra.
É que a habitação, tanto como programa arquitectónico como enquanto tema
de reflexão, ocupa um lugar central na obra Raul Lino, que contribuiu
decisivamente não só para a contrução das ideias de arquitectura nacional e
de arquitectura doméstica, mas também para a associação entre arquitectura 60doméstica e habitação unifamiliar .
A questão da casa portuguesa vai assim monopolizar a reflexão sobre
arquitectura em Portugal nas primeiras quatro décadas do século XX,
remetendo tudo o resto para segundo plano. Neste processo vão ser
fundamentais os três livros que Raul Lino publicou em 1918, 1929 e 1933, em
defesa das suas ideias.61No primeiro livro, A Nossa Casa (1918) , detecta-se uma clara intenção
pedagógica. Nele, Raul Lino defende o recurso ao bom senso na organização
do interior da casa, revelando preocupações com a sua adaptação ao modo de
vida familiar. Para além disso, resolve o problema da linguagem a usar,
apontando como “lógico que se construa no estilo da região”, socorrendo-se
dos materiais, da mão-de-obra e da tradição locais.
Segue-se A Casa Portuguesa (1929), no contexto nacionalista da represen-62tação portuguesa na exposição de Sevilha . Nesta obra, Lino troca os
objectivos pedagógicos por uma abordagem histórica do tema que tenta
organizar cronologicamente, discurso mais adequado ao fim de representa-
ção a que se destinava.
A acompanhar este texto, surgem mais de uma centena de imagens, quase
54. Ramalho ORTIGÃO – Ramalho Ortigão, 1947
(1890), “Arte Portuguesa” in Arte Portuguesa,
Clássica Editora, Lisboa,vol. III, p. 131-32
55. Rute FIGUEIREDO – Arquitectura e Discurso
Crítico em Portugal (1893-1918). Lisboa: Colibri –
IHA/Estudos de Arte Contemporânea, 2007
56. T.C. (Teixeira de Carvalho) – “A casa do sr.
Albino Caetano da Silva”, Architectura Portugueza,
Ano II, nº 8, Agosto, 1909, p. 29.
57. Ver José Augusto FRANÇA – “Raul Lino.
Arquitecto da geração de 90” in Raul Lino.
Exposição retrospectiva da sua obra. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 1970
58. Pedro Vieira de ALMEIDA e Maria Helena
MAIA – “Sociedade e Identidade Nacionais” in
História da Arte em Portugal, vol. 14 Arquitectura
Moderna. Dir Pedro Vieira de Almeida e José
Manuel Fernandes. Lisboa: Alfa, 1986, p. 47
59. Raul Lino terá percorrido Portugal e em especial
o Alentejo, de bicicleta, na companhia de Roque
Gameiro, recolhendo ao vivo informações sobre a
nossa arquitectura. Vd. Pedro Vieira de ALMEIDA –
“O Inquérito à Arquitectura Regional” in
Apontamentos para uma Teoria da arquitectura,
Lisboa: Livros Horizonte, 2008, p. 105
60. Vd. Patrícia Santos PEDROSA – Habitar em
Portugal nos Anos 1960: Ruptura e Antecedentes.
Um caminho pelo interior do discurso. Tese de
Doutoramento, Barcelona: Universitat Politècnica de
Catalunya, 2010, p. 34.
61. Raul LINO – A Nossa Casa. Apontamentos sobre
o bom gôsto na construção das casas simples.
Lisboa: Atlântida, 1918, p. 9 e 15.
62. Trata-se da Exposição Iberoamericana de
Sevilha, inaugurada em Maio de 1929, destinada a
demonstrar a proximidade de Espanha e Portugal
com as respectivas ex-colónias americanas.
20
todas fotografias de exteriores. A grande diversidade dos exemplos
escolhidos resulta num discurso iconográfico que reforça a consciência da
pluralidade de referências presente na casa portuguesa, o que se virá a
reflectir-se na obra seguinte.63Por último, Casas Portuguesas (1933) , retoma simultaneamente os
objectivos pedagógicos e a reflexão sobre as questões de habitabilidade
afloradas na primeira das obras publicadas.
Raul Lino defende aqui a importância de pensar, e projectar, o interior da casa
em função das necessidades concretas dos respectivos habitantes, aceitando a
inexistência de uma noção de conforto universal e portanto a importância de
equacionar a resposta caso a caso. Simultaneamente, retoma a ideia de “bom
senso” como um factor fundamental no processo criativo. Neste, considera
igualmente importante o cuidado com as proporções e a obtenção da
harmonia, aqui entendida como integração na paisagem.
Nesta obra, defende ainda o uso da “linguagem própria do país, consentânea
Raul Lino, Casas Portuguesas, 1933
63. Raul LINO – Casas Portuguesas. Alguns
apontamentos sobre o arquitectar das casas simples.
Lisboa: Valentim de Carvalho, 1933
64com a época actual” na arquitectura, não através da fixação de modelos mas
da sua constante reinvenção.
A novidade é que, desta vez, a par do texto é publicado um conjunto de
aguarelas em que formaliza graficamente algumas soluções arquitectónicas
pensadas em função das diferentes regiões.
Com estas ilustrações Raul Lino acabou por obter o resultado contrário ao
pretendido. Em vez de serem compreendidas como indicação de exemplos
possíveis, as soluções contidas nos seus desenhos foram rapidamente
absorvidas como receituário formal. Precisamente por isso, Pedro Vieira de
Almeida consideraria As Casas Portuguesas o mais perigoso livro de Raul
Lino.
Por certo quando em 1918 confessava desejar contribuir para a “educação do 65povo” em que reconhecia ser muito “arreigado o espírito de imitação” , Lino
não esperaria que o seu labor didáctico terminasse desta forma.
No início da sua carreira, Raul Lino considerava positivo o movimento da
casa portuguesa, enquanto reacção à desnacionalização da nossa 66arquitectura por via da influência das “revistas francesas” , uma “salutar
67reacção no sentido do reaportuguesamento da nossa casa” .
Em 1933, no entanto, já descontente com os resultados denuncia a 68desqualificação, o “portuguesinho crochet” que caracteriza boa parte dos
projectos que se inscreviam nesta corrente. Talvez daí a tentação em apontar
caminhos possíveis.
Depois dessa data, aos desenhos de Lino, lidos como modelos, juntaram-se
exemplos vários nas revistas da época e alguns livros ilustrados construindo
os fundamentos do processo de transformação da casa portuguesa no que veio 69a chamar-se casa à antiga portuguesa .. E essa, constitui para ele a falência
da casa portuguesa, essa “chuvada de beiralinhos, azulejos, pilaretes e 70alpendroides” , que associa à incultura e a “certa especulação mercantilista”
que rejeita liminarmente.
Rejeição que, no entanto, não evitou que o responsabilizassem pela
movimento casa portuguesa e o estigmatizassem pelos resultados do 71mesmo .
Da casa portuguesa ao Inquérito à Arquitectura Regional
O repertório formal associado à casa portuguesa, assim como a ideia da
necessidade de diversificar as soluções em função das regiões, acabaram por
se enraizar na cultura arquitectónica nacional e, a partir dos anos trinta,
passam a poder ser encontrados também noutros programas arquitectónicos,
de que são exemplos mais evidentes as chamadas escolas dos centenários e as
pousadas do SPN/SNI.
A habitação continua, porém, no centro das preocupações e a sua vertente
popular e rural continua a oferecer um recurso importante para a tentativa de
64. Raul LINO – A Casa Portuguesa. Lisboa: Escola
Typográfica da Imprensa Nacional, 1929, p. 85
65. Raul LINO – A Nossa Casa…, p. 4
66. Raul LINO – A Nossa Casa…, p. 87 e 16-17.
67. Raul LINO – A Casa Portuguesa…, p. 23
68. Raul LINO – Casas Portuguesas…, p. 79
69. Entre estes refiram-se os livros de Perfeito
Magalhães, A Habitação (1939) e de Edmundo
Tavares, A Habitação. Casas Modernas (1946),
ambos já apontados por Patrícia Pedrosa como
importantes neste processo. Vd. Patrícia PEDROSA
– Habitar em Portugal…, p. 53.
70. Raul Lino, 1941, segundo Pedro Vieira de
ALMEIDA – “Arquitectura e Identidade”, vinte e
um por vinte e um, nº2: Arte e Identidade, Porto:
ESAP, 2006, p. 142
71. Veja-se a reacção violenta de mais de uma
centena de arquitectos portugueses ao
reconhecimento da qualidade e da modernidade do
trabalho de Raul Lino explicita no texto de Pedro
Vieira de Almeida Raul Lino. Arquitecto Moderno e
ao próprio facto de ter sido objecto da primeira
grande exposição dedicada à obra de um arquitecto,
realizada na Fundação Calouste Gulbenkian em
1970.
21
identificação da essência da arquitectura nacional. É por isso que em 1938 o
SPN/SNI se dedicava a identificar a Aldeia Mais Portuguesa de Portugal,
trazendo para primeiro plano um povoado rural. Também na Exposição do
Mundo Português de 1940, a habitação popular se encontrava representada 72através do conjunto específico que recreava as Aldeias Portuguesas .
Mas o interesse pela arquitectura popular não se restringia aos cultores da
casa portuguesa, já que o modernismo não foi incompatível com a
construção da identidade arquitectónica nacional.
Veja-se o exemplo do Bairro Operário de Olhão, projectado por Carlos
Ramos por volta de 1925, em que é clara a referência à arquitectura popular 73da região .
Este arquitecto, em quem Pedro Vieira de Almeida encontra o gérmen da sua 74noção de Internacionalismo Crítico , percorreu Portugal com o geógrafo
Orlando Ribeiro, realizando um inquérito privado à arquitectura nacional que
teria reflexos concretos na obra de ambos. Efectivamente, na sequência deste
“inquérito” Orlando Ribeiro publicou Portugal, Mediterrâneo e Atlântico
(1945), obra que, como vimos atrás, dedicava à análise das características
geográficas do país. Esta obra seria marcada também por uma atenção à
questão da habitação, ainda que numa visão algo idealizada, ou seja, pouco
atenta às condições miseráveis de vida a ela associadas.
Este tipo de enfoque permanecerá relativamente intocado no trabalho dos
arquitectos que em 1961, vão publicar com o título A Arquitectura Popular
em Portugal, os resultados de um Inquérito à Arquitectura Regional,
promovido pelo Sindicato dos Arquitectos com apoio oficial. Ou seja, o
alheamento em relação às questões sociais manteve-se como uma constante
na aproximação ao habitat rural.
Face a este panorama, importa sublinhar a radical excepção que foi o
Inquérito à Habitação Rural promovido pelo Senado Universitário em 1942
e realizado pelos agrónomos do Instituto Superior de Agronomia com algum 76apoio oficial .
72. João Leal nota estes dois factos são apenas as
“expressões mais reconhecidas de um processo,
entretanto mais vasto, de emblematização da
habitação popular portuguesa” (João LEAL –
Etnografias Portuguesas (1870-1970): Cultura
Popular e Identidade Nacional. Lisboa: Publicações
D. Quixote, 2000, p. 122). Sobre a Exposição do
Mundo Português de 1940 ver Margarida
ACCIAIUOLI – Exposições do Estado Novo 1934-
1940. Lisboa: Livros Horizonte, 1998.
73. Trata-se de um projecto não construído. Vd.
Ricardo AGAREZ – “A Construção do Quotidiano:
Arquitectura 'Bread-and-butter' no Sul de Portugal,
1925-1950” in Actas IV Congresso de História da
Arte Portuguesa – APHA, Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian. 21-24 Novembro 2012.
74. Pedro Vieira de Almeida defende uma noção de
pós-modernidade em que combina a noção de
regionalismo crítico lançada por Tzonis/Lefevre que
Frampton internacionalizou, com a noção de
internacionalismo crítico definida por ele próprio.
75. Vd. Pedro Vieira de ALMEIDA – Apontamentos
para uma Teoria da Arquitectura…, p. 106.
76. Este Inquérito foi apoiado pela Federação
Nacional dos Produtores de Trigo
Projecto de Carlos Ramos para um Bairro Operário
em Olhão, c. 1925. Pormenor de corte/alçado
(gouache). Publicado in Pedro Vieira de Almeida,
“Arquitectura e Identidade”, vinte e um por vinte e
um, nº 2: Arte e Identidade, Porto, ESAP, 2006
22
O trabalho que realizaram, apresentava preocupações de uniformização na
recolha de dados, patente na utilização de questionários-tipo, e debruçava-se 77sobre as condições de vida da população rural .
A publicação dos resultados do trabalho de campo, que se estendeu até 1946,
foi programada para três volumes, o primeiro dos quais saiu em 1943,
seguindo-se um segundo em 1947, correspondendo às zonas Norte e Centro
do país. O terceiro volume não chegou a ser publicado por intervenção da
censura que não o autorizou em consequência do impacto causado pelo 78panorama traçado nos dois primeiros volumes . É que os resultados do
Inquérito denunciavam a miséria da habitação rural e dos seus habitantes o
que inevitavelmente veio confrontar a visão idealizada dominante associada 79à habitação tradicional .
Em contrapartida, a maqueta final do livro Arquitectura Popular em Portugal
foi apreciada pelo próprio Salazar, que estava muito interessado nos
resultados do Inquérito a cargo do Sindicato dos Arquitectos pelas sua
potencial leitura nacionalista.
Por seu turno, os arquitectos que o realizaram, pretendiam provar a
definitivamente a inexistência de uma casa portuguesa, através da
demonstração da diversidade de soluções arquitectónicas existentes no país,
ainda que essa diversidade, afinal, nunca tivesse estado em causa.
É isso que veremos a seguir.
77. Vd. Pedro Vieira de ALMEIDA – Apontamentos
para uma Teoria…, p. 105-06.
78. Inquérito à Habitação Rural. Lisboa: Gráf.
Lisbonense, vol. 1, 1943 e vol. 2, 1947. O primeiro
volume é de E. A. Lima Basto e Henrique de Barros,
sendo volume seguinte só dirigido pelo segundo
autor, que herdou a direcção do trabalho na
sequência do desaparecimento de Lima Basto. O vol.
3, dedicado à zona Sul, só em 2013 foi publicado
pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda.
79. João LEAL (Etnografias…, p.146) identifica
mesmo o início de uma “guerra cultural” a propósito
da publicação dos resultados deste Inquérito.
23
O INQUÉRITO À ARQUITECTURA REGIONAL
Dada a importância desde cedo reconhecida ao Inquérito à Aquitectura
Regional – publicado em 1961 com o título Arquitectura Popular em
Portugal – na cultura arquitectónica portuguesa, seria de esperar que um
volume substancial de estudos e um debate alargado sobre o seu impacto
tivesse marcado de forma inequívoca as últimas décadas de produção
historiográfica.
Porém, assim não aconteceu. Explícito ou implícito, o reiterado reconheci-
mento do contributo do Inquérito para o debate arquitectónico e para a
definição de tendências fundamentais da prática contemporânea da
arquitectura nacional está longe de corresponder a um estudo aprofundado do
objecto. Assim, embora seja sistematicamente referido nos estudos sobre
arquitectura portuguesa do séc. XX, o Inquérito foi na realidade pouco
estudado, baseando-se o seu conhecimento num pequeno conjunto de
importantes leituras, depois sucessivamente repetidas e apropriadas sem
grandes alterações.
O conhecimento que hoje existe do Inquérito assenta mais propriamente em
dois tipos de contributos: (1) a própria fonte que é o volume Arquitectura
Popular em Portugal, bem como os textos posteriores produzidos pelos seus
autores, como é o caso de Nuno Teotónio Pereira ou dos testemunhos de Silva
Dias, António Menéres, Fernando Távora entre outros; (2) a leitura que sobre
ele foi produzida a partir dos anos 70 no âmbito dos estudos de história e
crítica da arquitectura portuguesa. Neste âmbito são especialmente 80 81importantes os trabalhos pioneiros de José-Augusto França , Nuno Portas ,
82 83Pedro Vieira de Almeida e Octávio Lixa Filgueiras a que se seguiram
algumas contribuições para a construção do conhecimento sobre o tema, 84 85 86entre as quais Sérgio Fernandez , Manuel Mendes e Ana Tostões .
Entre estas fontes e as leituras citadas, situam-se algo ambiguamente os
sucessivos prefácios que acompanharam as reedições da Arquitectura 87Popular em Portugal de 1980, 1988 e 2004 , dado que estes textos vão
fornecendo novas leituras desta obra mas são, muitas vezes, equivocamente
lidas como parte integrante da mesma.
Mais recentemente, parece poder identificar-se uma intensificação do 88interesse pelo tema, não só por via de trabalhos como os de João Leal ou
80. José Augusto FRANÇA – “Raul Lino. Arquitecto
da Geração de 90” in Raul Lino. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian, 1970
81. Nuno PORTAS – “A Evolução da Arquitectura
Moderna em Portugal: uma interpretação” in
História da Arquitectura Moderna de Bruno Zevi,
vol. II. Lisboa: Editora Arcádia, 1978
82. Pedro Vieira de ALMEIDA – “Carlos Ramos –
uma estratégia de intervenção” in Carlos Ramos.
Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1986; Pedro
Vieira de ALMEIDA e Maria Helena MAIA – “As
décadas pós-Congresso. Os anos 50” in História da
Arte em Portugal.14: Arquitectura Moderna.
Direcção de Pedro Vieira de Almeida e José Manuel
Fernandes. Lisboa: Alfa, 1986
83. Octávio Lixa FILGUEIRAS – “A Escola do
Porto (1940/69) ” in Carlos Ramos. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 1986
84. Sérgio FERNANDEZ – Percurso – Arquitectura
Portuguesa 1930/1974. Porto: Edições da FAUP,
1988 (1985)
85. Manuel MENDES - “Os anos 50”, RA – Revista
da Faculdade de Arquitectura da Universidade do
Porto, ano I, n. 0, Outubro, 1987
86. Ana TOSTÕES – Os Verdes Anos na
Arquitectura Portuguesa dos Anos 50. Porto: FAUP,
1997 (1994)
87. Arquitectura Popular em Portugal. Sindicato
Nacional dos Arquitectos, Lisboa, 1ª edição, 1961 (2
vol.) 2ª edição; Associação dos Arquitectos
Portugueses, 1980 (1 vol.); 3ª edição: Associação dos
Arquitectos Portugueses, 1988 (3vol.); 4ª edição:
Centro Editor Livreiro da Ordem dos Arquitectos,
2004 (2 vol.).
88. João LEAL – Etnografias Portuguesas (1870-
1970), Cultura Popular e Identidade Nacional.
Lisboa: Publicações D. Quixote, 2000
25
89Rodrigo Ollero , mas também, e sobretudo, pelo contributo das
comunicações apresentadas no âmbito do encontro internacional Surveys on
Vernacular Architecture, Their Significance in the 20th Century 90Architectural Culture , que inscreveu o Inquérito no debate internacional da
cultura arquitectónica do século XX.
Este encontro foi preparado e decorreu no âmbito do projecto de investigação
A “Arquitectura Popular em Portugal”. Uma Leitura Crítica, cujas
conclusões aqui se apresentam e que veio apropriar-se do Inquérito, 91trabalhando-o como universo de reflexão teórica sobre a arquitectura .
Com excepção deste último caso, as demais referências ao Inquérito
aparecem normalmente associadas a estudos que ou fecham a análise no
elenco das condições específicas, dos intervenientes e dos factos associados
ao Inquérito, ou trabalham a arquitectura portuguesa dos anos 1950 e 1960 e o
integram numa narrativa de “evolução” histórica, ou finalmente o elegem
como momento inaugural no quadro de interpretações críticas sobre os
antecedentes da arquitectura contemporânea, fixando os desenvolvimentos a
partir do testemunho da arquitectura de um passado muito recente.
Nesta parte do texto, vamos começar precisamente por identificar os pontos
de vista e as ideias-chave que caracterizam a historiografia do Inquérito,
recuperando para tanto alguma base de trabalho realizada no âmbito do 92Projecto e parcialmente já publicada .
Numa primeira tentativa de sistematização, e no sentido de uma análise mais
pormenorizada da paisagem historiográfica e crítica, pode afirmar-se que as
mais importantes abordagens do Inquérito apresentam como eixos de análise
essenciais as seguintes problemáticas: (1) “paternidade” e genealogia do
Inquérito; (2) ligação à geografia e à antropologia; (3) relações com o poder;
(4) metodologia; (5) consequências na arquitectura portuguesa; (6) contexto
internacional (7) importância actual do Inquérito. Cada um destes pontos é
analisado segundo critérios diferentes e com distinto grau de profundidade.
Ou seja, os temas fixados mantém expressões distintas segundo a maior ou
menor visibilidade que foram ganhando nos últimos anos. Mais ainda,
estando estes pontos intimamente relacionados entre si torna-se inevitável a
sucessiva revisitação dos autores e de questões fundamentais, em alguns
casos já enunciadas na primeira parte deste Caderno.
“Paternidade” e genealogia do Inquérito
Menos de dez anos após a publicação de Arquitectura Popular em Portugal, a
exposição retrospectiva da obra de Raúl Lino organizada pela Fundação 93Calouste Gulbenkian deu a José Augusto França a oportunidade de escrever
o texto onde, pela primeira vez, é delineada a história do problema da casa
portuguesa. No âmbito desta análise o Inquérito é referenciado, definindo-se
os termos da relação que estabelecia com esse problema-chave da cultura
89. Rodrigo OLLERO – “Letter to Raul Lino”.
Cultural Identity in Portuguese Architecture. The
“Inquérito” and the Architecture of its Protagonists
in the 1960's. PhD Thesis. University of Slaford,
School of Construction and Property Management ,
2001
90. Vd. Alexandra CARDOSO; Joana Cunha
LEAL; Maria Helena MAIA (ed) – Surveys on
Vernacular Architecture. Their Significance in the
20th Century Architectural Culture. Conference
Proceedings. Porto: ESAP, May 2012
91. Pedro Vieira de ALMEIDA – Dois Parâmetros
de Arquitectura Postos em Surdina. O propósito de
uma investigação. Caderno zero. Porto: CEAA,
2010; Alexandra CARDOSO; Joana Cunha LEAL;
Maria Helena MAIA (ed) – Surveys on Vernacular
Architecture…
92. Alexandra CARDOSO and Maria Helena MAIA
– “Tradition and Modernity. The Historiography of
the Survey to the Popular Architecture in Portugal”
in Approaches to Modernity. Porto: CEAA, 2013
(2010) e Maria Helena MAIA and Alexandra
CARDOSO – “O Inquérito à Arquitectura Regional:
contributo para uma historiografia crítica do
Movimento Moderno em Portugal” in Actas IV
Congresso de História da Arte Portuguesa – APHA,
Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. 21-24
Novembro 2012, p. 379-387
93. José Augusto FRANÇA – “Raul Lino…, p. 106-
08
26
nacional.
Mais tarde, no âmbito da sua A Arte em Portugal no século XX José-Augusto
França daria ainda um importante contributo para clarificar o enquadramento
contextual do Inquérito, fazendo remontar as suas bases ao 1º Congresso 94Nacional de Arquitectura, realizado em 1948 . Que este Congresso fora um
momento essencial para a maturação da cultura arquitectónica ficara já claro
no texto de 1970, sublinhando então José-Augusto França o facto de os
arquitectos modernos terem reagido no Congresso contra o modelo de casa 95portuguesa e a noção de portuguesismo na linguagem arquitectónica , ao
mesmo tempo que numa série de textos procuravam demonstrar a “falácia”
em que essas ideias se baseavam. Ambas as ideias surgiram reiteradas em “A
Evolução da Arquitectura Moderna em Portugal: uma interpretação”, síntese
que Nuno Portas escreve para a História da Arquitectura Moderna de Bruno 96Zevi .
O texto de Portas introduzia ainda a referência à importância da revista
Arquitectura no contexto histórico da génese do Inquérito, registando o facto
de, no final dos anos 1940, alguns jovens arquitectos terem assumido o
controle desta revista e nela terem introduzido uma tónica de crítica ao
funcionalismo que concertavam com a publicação de novas ideias e de novas
aproximações ao projecto de arquitectura. Foi precisamente na revista
Arquitectura que, em 1947, Keil do Amaral publicou o artigo “Uma iniciativa
necessária”, onde defendia a ideia da necessidade de recolher e registar
informação sobre a aquitectura das diferentes regiões do país. Escreve Keil
que a iniciativa proporcionaria aos “estudantes e técnicos da construção […] 97as bases para um regionalismo honesto, vivo e saudável” . Keil formulou
portanto nas páginas da revista Arquitectura a ideia base do Inquérito.98No aprofundamento que fez da genealogia do Inquérito, Nuno Portas faz
também referência ao texto de Fernando Távora “O Problema da casa 99portuguesa” , texto que criticava duramente o modelo dominante da casa “à
antiga portuguesa”, defendendo em contrapartida a importância de um
conhecimento sério da arquitectura portuguesa. Nesta sequência Távora
escreve que a casa popular, sendo “a mais funcional e a menos fantasiosa”
poderia constituir uma importante lição para os arquitectos.
Outro contributo relevante na construção desta genealogia viria a ser dado 100por Pedro Vieira de Almeida e Maria Helena Maia em 1986 . A par da
“paternidade” de Keil, os autores recordariam então a importância de
inquéritos à arquitectura popular anteriores, decorrentes tanto de iniciativas
suportadas por apoios oficiais, quanto da vontade de actores individuais.
Neste caso estariam as prospecções feitas por Carlos Ramos e Orlando
Ribeiro que mencionámos atrás, e que voltaremos a mencionar mais à frente.
Quanto ao primeiro caso, o destaque cabe ao Inquérito à Habitação Rural da
responsabilidade de Lima Basto e Henrique de Barros. Como demonstram P.
Vieira de Almeida e M. H. Maia, este inquérito minava a possibilidade de
94. José Augusto FRANÇA – A Arte em Portugal no
Século XX. Lisboa: Bertrand, 1974
95. José Augusto FRANÇA – “Raul Lino…”
96. Nuno PORTAS – “A Evolução da Arquitectura
Moderna…”
97. Keil do AMARAL – “Uma iniciativa
necessária”, Arquitectura, 2ª Série Ano XX, nº 14,
Abril 1947
98. Nuno PORTAS – “A Evolução da Arquitectura
Moderna…”
99. Fernando TÁVORA – O Problema da Casa
Portuguesa. Lisboa: Cadernos de Arquitectura, 1947
100. Pedro Vieira de ALMEIDA e Maria Helena
MAIA – “As décadas pós-Congresso. Os anos 50”…
27
interpretações idealizadas da arquitectura popular, na medida em que os seus
resultados denunciavam as condições miseráveis em que vivia a maior parte
das populações rurais. Distanciando-se da aproximação corrente à casa
portuguesa, os agrónomos produziram um retrato substantivo da pobreza das
condições de vida do “povo português” que constituiu um claro desafio ao
folclorismo celebrado pelo Regime. Este desafio justificou, de resto, a
intervenção da censura, já que dos três volumes previstos para publicação
apenas seriam editados os dois primeiros, como já atrás referimos. João Leal
estabelecerá mesmo uma relação directa entre a denúncia resultante do
Inquérito dos agrónomos e a “nubelosa política” por onde gravitavam os seus
promotores, “todos eles coincidentes numa posição de crítica ou oposição ao 101Estado Novo” .
Pensada como um problema estritamente arquitectónico, a iniciativa
necessária do Inquérito à Arquitectura Regional primou, tanto quanto a
demanda antecessora pela casa portuguesa, pela ausência de qualquer tipo de
preocupação social. A excepção que confirma a regra surge no trabalho da
equipa de arquitectos da área de Trás-os-Montes (a zona 2) dirigida por
Octávio Lixa Filgueiras. Talvez devido à extrema pobreza da região, esta
equipa foi sensível às condições de vida da população local que reporta no 102levantamento feito .
Influência da geografia e da antropologia
Foi precisamente o arquitecto responsável pela zona 2, Octávio Lixa
Filgueiras, quem deu um novo contributo para o conhecimento dos antece-
dentes do Inquérito, ao elucidar a importância da antropologia e da geografia
na consolidação do trabalho das equipas destacadas para a zona norte do 103território nacional . Filgueiras oferece também uma descrição do ambiente
cultural vivido nesses meados da década de 1950, na Escola de Belas Artes do
Porto, cujo director, Carlos Ramos, viria a escolher os membros das equipas 104do Inquérito afectas à zona norte do país .
A colaboração entre Carlos Ramos e Orlando Ribeiro é conhecida, sabendo-
se que os dois percorreram juntos o país realizando aquilo que se pode
classificar como um “inquérito informal”. Este trabalho terá estado associado
à preparação de Portugal: o Meditterâneo e o Atlântico que virá a ser publica-105do em 1945 .
Nesta sequência o geógrafo seria também convidado a interagir directamente
com os estudantes da ESBAP, situação que se traduziria não apenas num
conjunto de aulas-conferência, mas também na realização de visitas de 106estudo em que o conteúdo dessas aulas era aprofundado in loco .
Estes estudantes viriam mais tarde a participar em trabalhos de campo e
levantamentos no norte do país, bem como a colaborar com a equipa do 107antropólogo Jorge Dias, trabalhando sobre o material por ela recolhido .
101. (Leal, 2009: 38) João LEAL – Arquitectos,
Engenheiros, Antropólogos: Estudos sobre
Arquitectura Popular no Século XX Português.
Porto: Fundação Marques da Silva, 2009
102. Pedro Vieira de ALMEIDA e Alexandra
CARDOSO – Arnaldo Araújo, Arquitecto (1925-
1982). Porto: CEAA, Edições Caseiras / 1, 2002
103. Octávio Lixa FILGUEIRAS – “A Escola do
Porto (1940/69) ”…, s.p.
104. Octávio Lixa FILGUEIRAS – “A Escola do
Porto (1940/69) ”…, s.p.
105. Carlos Carvalho DIAS – Conversa [gravada]
com Maria Helena Maia e Fátima Fernandes em
29.01.2013.
106. Vd. Octávio Lixa FILGUEIRAS – “A Escola
do Porto (1940/69) ”…, s.p.
107. Octávio Lixa FILGUEIRAS – “A Escola do
Porto (1940/69) ” in Carlos Ramos. Fundação
Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1986
28
Estes encontros e estes trabalhos de campo deram o enquadramento ao que se
considerou já ser a influência de Orlando Ribeiro, e do seu Portugal: o
Mediterrâneo e o Atlântico, na fixação dos limites das 6 zonas geográficas em
que o país foi dividido no quadro do Inquérito à Arquitectura Regional 108Portuguesa . No entanto, esta associação directa entre a delimitação das
zonas de trabalho e o trabalho do geografo não é corroborada nos
testemunhos dos arquitectos do Inquérito. Ou seja, embora recordando que 109Orlando Ribeiro terá sido consultado (Silva Dias) ou mesmo participado
110(António Menéres) nas reuniões de definição das zonas, os autores do 111Inquérito dão conta da relativa arbitrariedade na sua delimitação, mais
condicionada por questões operativas de distribuição das tarefas entre as
equipas do que pela pureza de critérios geográficos. Donde, embora o
enquadramento tenha decorrido “tanto quanto possível adentro de uma certa
unidade regional”, não deixaria de poder ser informalmente comentado como
Painel 39 do CODA de Arnaldo Araújo, Formas do
Habitat Rural – Norte de Bragança. Contribuição
para a estrutura da comunidade, ESBAP, 1957.
108. Rodrigo OLLERO – “Letter to Raul Lino”…
109. Francisco Silva DIAS em entrevista a Inês
Oliveira realizada em 13 de Dezembro de 2010 e
publicada in Inês OLIVEIRA – A fotografia no
“Inquérito da Arquitectura Popular em Portugal”.
Dissertação de Mestrado de Integrado em
Arquitectura, Faculdade de Ciência e Tecnologia da
Universidade de Coimbra – Departamento de
Arquitectura, Julho 2011, anexo
110. António MENÉRES – Conversa com Alexandra
Cardoso e Maria Helena Maia em 04.04.2013. Arcos
de Valdevez, por altura do Colóquio Internacional
Arquitectura Popular.
111. Introdução à Arquitectura Popular em
Portugal…, p. XXIV.
29
112tendo sido traçado “um bocado a régua e esquadro” .
Um recente estudo comparado dos limites geográficos propostos em
Portugal: o Mediterrâneo e o Atlântico e as zonas do Inquérito levou já a que
defendêssemos que a influência de Orlando Ribeiro terá tido uma dimensão
cultural mais global, mais de reforço e estruturação da atenção à diversidade
da paisagem e aos modos de vida no território nacional, do que de guia das 113especificidades técnicas ou práticas na programação Inquérito .
Essa dimensão estruturante denuncia-se num um efeito transversal de fundo
que deve ser considerado. Concretamente, o testemunho de Octávio Lixa
Filgueiras permite-nos esclarecer que o contacto com o universo da geografia
e da antropologia teve realmente consequências profundas na ESBAP. Desde
logo pelo facto de ter proporcionado que, em 1954, fosse pela primeira vez
aceite uma dissertação de índole teórica para a atribuição do grau de
arquitecto. Trata-se do CODA do próprio Octávio Lixa Filgueiras – 114Urbanismo: um tema rural – trabalho que acabaria por estar na origem da
sua escolha para coordenador da equipa de Trás-os-Montes (zona 2). Seguiu-
se-lhe em 1947 Arnaldo Araújo, membro da mesma equipa, com um CODA
dedicado às Formas do Habitat Rural – Norte de Bragança. Contribuição 115para a estrutura da comunidade .
A apresentação destes CODA na ESBAP permite ainda enquadrar o
Inquérito no contexto de importantes dinâmicas da arquitectura portuguesa.
Ou seja, é precisamente este trabalho de Arnaldo Araújo que, como já foi 116notado por P. Vieira de Almeida e M.H. Maia , vai estar na origem da
proposta para uma comunidade agrícola de Trás-os-Montes que viria a ser 117apresentada pela equipa CIAM Porto no CIAM X realizado em Dubrovnik
118em 1956. Ana Tostões destaca também o importante contributo deste
trabalho para “a revisão do método internacional condensado na abordagem
das formas autênticas de vida como inspiração da arquitectura”, assumindo a
sua directa ligação ao Inquérito então curso.119Também Manuel Mendes sublinhará o facto da abordagem ao Inquérito
feita pelas duas equipas do Norte se caracterizar por uma visão mais
antropológica do espaço e das formas arquitectónicas. Pouco mais tarde
escreverá ainda que o levantamento destas equipas “adopta uma abordagem
territorial das formas de ocupação e modos de vida provocados pela 120apropriação do espaço: terra, áreas construídas, construções” . Esta
caracterização será todavia considerada por P. Vieira de Almeida e A. 121Cardoso como reportando-se exclusivamente à análise realizada pela
equipa de Trás-os-Montes, precisamente a que Octávio Lixa Filgueiras,
liderava e a única que se reconhece como “amplamente articulada sobre uma
vertente etnológica”. Por esta razão, os autores acabariam por considerar que
este é o estudo “mais rico e mais completo de todo o Inquérito”.
O que o debate sobre a “dívida” do Inquérito para com a geografia e a
antropologia finalmente nos demostra é pois a flagrante diversidade do
112. Francisco Silva DIAS em entrevista a Inês
Oliveira…
113. Alexandra CARDOSO e Maria Helena MAIA
– “Architecture and the Discovery of Rural Portugal”
paper presented in International Conference
Theoretical Currents II: Architecture and its
Geographical Horizons, Lincoln, UK, Abril 2012
114. Octávio Lixa FILGUEIRAS – Urbanismo: um
Tema Rural. CODA, Escola Superior de Belas Artes
do Porto, 1954
115. Arnaldo ARAÚJO – Formas do Habitat Rural
– Norte de Bragança. Contribuição para a estrutura
da comunidade. CODA, Escola Superior de Belas
Artes do Porto, 1957
116. Pedro Vieira de ALMEIDA e Maria Helena
MAIA – “As décadas pós-Congresso…”, p. 152
117. A representação portuguesa era constituída por
seis arquitectos, quatro deles pertencentes às equipas
do Inquérito: Alfredo Viana de Lima, Alberto Neves,
Fernando Távora, coordenador da Zona 1 (Minho) e
toda a equipa da Zona 2 (Trás-os-Montes): Octávio
Lixa Filgueiras (coordenador) Arnaldo Araújo e
Carlos Carvalho Dias.
118. Ana TOSTÕES – Os Verdes Anos…, p. 165
119. Manuel MENDES – “Os anos 50”, RA –
Revista da Faculdade de Arquitectura da
Universidade do Porto, ano I, n. 0, Outubro 1987
120. Manuel MENDES – "Porto, The School and its
Projects 1940-1986" in Architectures à Porto.
Brussels: Pierre Mardaga, 1990, p. 56-57
121. Pedro Vieira de ALMEIDA e Alexandra
CARDOSO – Arnaldo Araújo…
30
trabalho produzido pelas equipas envolvidas, comprovando que a
excepcionalidade do enfoque da equipa de Trás-os-Montes enriquece um
olhar quase sempre determinado apenas por uma concepção essencialista-
formalista da pesquisa arquitectónica do habitar (e que nisso se assemelha
mais com Lino do que alguma vez poderia supor-se).
Relações com o poder
Trata-se de um dado fundamental na análise de Arquitectura Popular em
Portugal, já que, como se sabe, não só o levantamento teve o patrocínio
oficial, como as provas finais do livro foram apresentadas ao próprio Salazar,
uma vez que este mostrara particular interesse pelos resultados do Inquérito
realizado pelo Sindicato dos Arquitectos.
Esta questão vem levantando vários problemas de enquadramento e
interpretação, tendo sobretudo em conta a perspectiva de resistência à
ideologia do regime em que alguns autores têm vindo a inscrever o tema. 122Para Nuno Portas , “uma curiosa coincidência de equívocos ou
fingimentos” contribuiu decisivamente para a concretização do Inquérito.
Assim, enquanto o governo acreditava que este trabalho contribuiria
decisivamente para reforçar o portuguesismo da arquitectura nacional, os
arquitectos procuraram “montar um documentário explosivo” que pudesse
demonstrar a existência de tantas “tradições” quantas regiões.
Por sua vez, a Direcção da Associação dos Arquitectos, no prefácio à 2ª 123edição de Arquitectura Popular em Portugal , retoma a ideia de que o
equívoco tinha sido intencionalmente mantido de modo a garantir o
122. Nuno PORTAS – “A Evolução da Arquitectura
Moderna…”
123. Os membros da Direcção da Associação dos
Arquitectos Portugueses que assinam o prefácio da
edição de 1979 da Arquitectura Popular em Portugal
são Antonieta Silva Dias, António Mattos Gomes,
Celestino de Castro, Fernando Ferreira Torres, Inácio
Peres Fernandes, José Charters Monteiro e José
Norberto.
Apresentação a Salazar da maquete do livro A
Arquitectura Popular em Portugal pelos seus
autores. Fotografia publicada no jornal O Primeiro
de Janeiro.
31
financiamento do governo, sem o qual realmente o projecto não poderia ter
sido realizado.
Registe-se porém que as interpretações do Inquérito como um acto de
resistência contra as imposições arquitetónicas do regime só surgiram após o
25 de Abril de 1974, bem como a necessidade de sublinhar a duplicidade dos
arquitectos modernos face ao poder, que se detecta na historiografia
produzida no pós-Estado Novo, de que a interpretação das condições em que
se realizaram tanto o Congresso dos Arquitectos de 48 como o Inquérito à
Arquitectura Regional são exemplo.
Como já tivemos oportunidade de notar, “efectivamente, ambos foram
financiados e apoiados oficialmente pelo Estado e ambos teriam sido usados
pelos arquitectos envolvidos como instrumentos de resistência contra esse
mesmo Estado, ao que parece ingénuo objecto de manipulação que teria pago 124e apoiado o enterro das suas próprias convicções arquitectónicas” .
Todavia, a ideia implícita de que o Estado Novo exerceu algum tipo de 125“controle arquitectónico” não é de modo nenhum consensual . Com efeito,
para P. Vieira de Almeida a permissa da imposição de um “estilo ou estilos
nacionais” pelo regime constitui a base de um dos grandes mal-entendidos do
Inquérito desde a sua origem. Reportando-se aos resultados do trabalho,
Vieira de Almeida sustentou mesmo que a descoberta da diversidade e a
ausência de aspectos específicos da arquitectura portuguesa resultou
precisamente do facto das equipas terem partido para o terreno
“militantemente dispost[as] a ler a diversidade, tudo o que no território 126nacional resulta desuniforme, desconexo” Tal atitude teria sido finalmente
legitimada pelo prefácio à 2ª edição de Arquitectura Popular em Portugal
(1979) através precisamente da tese da “deliberada e circunstancial estratégia 127de contrariar uma alegada interpretação oficial” .
É essa situação que explica, por exemplo, a posição de Nuno Teotónio Pereira
ao identificar como uma das consequências imediatas do Inquérito “ter
proporcionado provas inquestionáveis de que a pseudo-arquitectura
propagandeada e até imposta pela ditadura do Estado Novo não passava de 128uma mistificação baseada em clichés manipulados cenograficamente” .
Curiosamente, na Introdução à Arquitectura Popular em Portugal, os autores
sentem-se na necessidade de advertir o leitor de que as fotografias publicadas
resultam de uma selecção daquelas que melhor salientariam “o que de mais
representativo caracteriza a nossa Arquitectura popular”, sendo que “dessa
solução resulta necessariamente um falseamento do aspecto real e das 129condições de vida dos povoados em que nem tudo é exemplar” .
A questão metodológica
Sendo embora um dos aspectos problemáticos do Inquérito, a questão
metodológica é uma das vertentes que menor atenção tem recebido. Em
112. Francisco Silva DIAS em entrevista a Inês
Oliveira…
124. Alexandra CARDOSO e Maria Helena MAIA
– “Arquitectura e Poder. Para uma historiografia do
Movimento Moderno em Portugal” in Apropriações
do Movimento Moderno. (Actas do VII Encontro do
CEAA, Zamora, Junho 2011), Porto: CEAA, 2012
(2011), p.
125. A existência da imposição de uma linguagem
arquitectónica por parte do regime não só não é
consensual, como tem vindo a ser questionada. Vd.
Alexandra CARDOSO e Maria Helena MAIA –
“Arquitectura e Poder…”, p. 116 e seguintes.
126. Pedro Vieira de ALMEIDA – Apontamentos
para uma Teoria da Arquitectura. Lisboa: Livros
Horizonte, 2008, p. 110
127. Pedro Vieira de ALMEIDA – Apontamentos
para uma Teoria…, p. 108
128. Nuno Teotónio PEREIRA – “Reflexos
Culturais do Inquérito à Arquitectura Regional”, J-A,
nº 195, Março/Abril, 2000, p. 70
129. Arquitectura Popular em Portugal..., 4ª ed., p.
XXV
32
regra, e como vimos, a literatura sobre a Arquitectura Popular em Portugal
limita-se a descrever aspectos factuais da iniciativa, ao mesmo tempo que
apresenta os seus antecedentes e as suas consequências como evidências
empíricas susceptiveis de uma interpretação “natural”. Todavia, os resultados
do Inquérito não podem ser dissociados da metodologia utilizada na sua
concretização.130Pedro Vieira de Almeida foi o primeiro autor a concentrar a sua atenção no
Inquérito em si, nos procedimentos, no olhar dos arquitectos, na estrutura do
levantamento. Surge assim destacado o problema da total ausência de uma
metodologia comum entre as equipas envolvidas no Inquérito, facto que virá 131a ser um pouco mais tarde confirmado por Nuno Teotónio Pereira ,
responsável pela equipa da Zona 4, no perfácio à 3ª edição da Arquitectura
Popular em Portugal.
Reconhecendo embora a disparidade do trabalho apresentado pelas 132diferentes equipas, Ana Tostões , refere a existência de um plano prévio e de
directrizes comuns a todos os grupos “de modo a assegurar a unidade do
trabalho”. Fá-lo com base num documento escrito por Keil do Amaral onde, 133segundo Rodrigo Ollero seriam definidos os pressupostos do trabalho.
A partir da leitura da Introdução à Arquitectura Popular em Portugal,
constatamos que aí se encontram parcialmente transcritos os pressupostos
atrás referidos pelo que, é razoável deduzir que constituirão uma primeira
síntese da questão.
Diz-nos esta Introdução, que à partida foi estabelecido um conjunto de
“condições prévias sobre os aspectos que convinha analisar” a saber:
130. Pedro Vieira de ALMEIDA – “Carlos Ramos –
uma estratégia de intervenção” in Carlos Ramos.
Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1986
131. Nuno Teotónio PEREIRA – Prefácio da 3ª
Edição de A Arquitectura Popular em Portugal.
Lisboa: Associação dos Arquitectos Portugueses,
1987
132. Ana TOSTÕES – Os Verdes Anos…, p. 160
133. Trata-se do mesmo documento ao qual Rodrigo
Ollero terá tido acesso através de Ana Tostões
Segundo Rodrigo Ollero o documento de Keil do
Amaral previa que fossem analisados: a “ocupação
do território, (…) estruturação urbana, (...) expressão
e valor plástico dos edifícios e dos aglomerados
urbanos, (…) materiais e processos de construção,
(…) influências do clima, (…) condições
económicas, (…) organização social, (…) costumes e
hábitos das populações.” (K. Amaral apud Rodrigo
OLLERO – “Letter to Raul Lino”…)
33
Trabalho de campo na Zona 2, Trás-os-Montes
“ocupação do território, estruturação urbana, materiais e processos
concorrentes de construção, influência do clima, da economia, da
organização social e dos factores de evolução, sobre os edifícios e os seus
agrupamentos; e uma análisa das sínteses plásticas desses e doutros fatores 134condicionadores” .
Efectivamente, o documento a que se referem Ana Tostões e Rodrigo Ollero é 135 136desconhecido de Carvalho Dias e de António Meneres , embora este
último tenha memória da existência de umas indicações genéricas que depois
cada um interpretou a seu modo, o que vem confirmar a nossa leitura.
A partir da documentação referenciada por Ana Tostões, Rodrigo Ollero
destacará ainda outro documento, igualmente redigido por Keil do Amaral,
que consistia num esboço de uma carta dirigida às equipas do norte. O
documento em causa revela, nas palavras de Ollero, “um mal-entendido entre
as equipas do norte e do sul acerca de como o trabalho deveria ser feito,
especialmente sobre a dimensão e capacidade do que eles tinham que fazer, 137de uma maneira muito diferente do que acabou por ser feito” .
138Recorde-se que Manuel Mendes , registara já a diferença de abordagem do
levantamento das equipas do Norte, caracterizado, em sua opinião, por uma
maior atenção aos valores espaciais.
Uma análise promenorizada da metodologia do Inquérito, ou da falta dela, foi
entretanto apresentada no âmbito do projecto A “Arquitectura Popular em 139Portugal”. Uma leitura crítica . Particularmente sublinhada foi neste
contexto a ausência de uma sinalética comum nos mapas publicados para as
várias zonas, o que, independentemente da vontade de Keil de definir uma
base comum de recolha, manifesta bem a impossibilidade de realizar uma
leitura de conjunto do levantamento realizado.
A questão metodológica voltará a ser objecto de análise na III parte deste
Caderno.
Consequências na arquitectura portuguesa
O Inquérito realizou-se num momento de viragem histórica da cultura
arquitectónica, quando alguns dos princípios do Movimento Moderno
estavam já a ser criticamente revistos, tanto a nível nacional como
internacional.
O Inquérito constituiu nesse contexto, quer pela relevância dos arquitectos
directamente envolvidos nas equipas, quer pelo impacto da sua publicação
sob a égide do Sindicato dos Arquitectos, um momento fundamental na
reconciliação dos arquitectos modernos com a história e a tradição vernácula 140como já notou Ana Vaz Milheiro . No mínimo, poderá afirmar-se que com a
divulgação do volume Arquitectura Popular em Portugal, “os arquitectos
passaram a utilizar com um novo à-vontade, sem o sentimento de estarem a
trair os princípios basilares da arquitectura moderna, alguns elementos
134. Arquitectura Popular em Portugal..., 4ª ed., p.
24
135. Carlos Carvalho DIAS – Conversa [gravada]
com Maria Helena Maia e Fátima Fernandes em
29.01.2013.
136. António MENÉRES – Conversa com
Alexandra Cardoso e Maria Helena Maia em
04.04.2013. Arcos de Valdevez, por altura do
Colóquio Internacional Arquitectura Popular.
137. Rodrigo OLLERO – “Letter to Raul Lino”…,
p. 133
138. MENDES, Manuel (1987) – “Os anos 50”…
139. Pedro Vieira de Almeida – Dois Parâmetros de
Arquitectura Postos em Surdina. O propósito de uma
investigação. Caderno zero. Porto: CEAA, 2010;
Maria Helena MAIA, Alexandra CARDOSO and
Joana Cunha LEAL – “Our Project: The 'Popular
Architecture in Portugal'. A Critical Look. Intercalar
results of a research Project” in Surveys on
Vernacular Architecture. Their significance in 20th
century architectural culture. Conference
Proceedings. Porto: CEAA, May 2012, p. 15-24
140. Ana Vaz MILHEIRO – “A Tradição em Brazil
Buildings e o Inquérito à Arquitectura Popular em
Portugal” in Nos Trópicos sem Le Corbusier.
Arquitectura luso-africana no Estado Novo. Lisboa:
Relógio d'Agua, 2012.
34
141tradicionais que eram antes considerados – impuros e por isso proscritos” .
Assim, em articulação com os objectivos teóricos e com a riqueza e a 142dimensão estética dos recusos visuais do Inquérito uma terceira via
emergiu na arquitectura portuguesa usando a tradição na construção da
modernidade. Comummente citados como exemplos desta terceira via são a 143casa de Ofir , de Fernando Távora, a casa de Afonso Barbosa e a HICA de
144 145Januário Godinho , a casa do poeta Ruben A., de João Andresen . Similar-146mente, as obras de Viana de Lima , Nuno Teotónio Pereira, Nuno Portas,
Álvaro Siza e muitos outros são também considerados representativos desta
corrente.
Manuel Mendes salientou também como o estudo da arquitectura vernacular
repôs um equilíbrio, “a harmonia entre espaço, arquitectura e a vida dos
habitantes, a relação entre as propostas de transformação e a paisagem
existente”, equilíbrio “que havia sido deformado pela valorização 147tecnológica do Movimento Moderno” .
O racionalismo, a funcionalidade e a forte ligação com a paisagem que
sobrevém na arquitectura regional tradicional – divulgada em imagens
marcantes – influenciaram decisivamente os rumos tomados pela
Viana de Lima, Escola primária de Bragança, 1960
141. Nuno Teotónio PEREIRA – Reflexos
Culturais…, p. 70
142. Nuno PORTAS – “Arquitecto Fernando
Távora: 12 anos de actividade profissional”,
Arquitectura, 3ª serie, 71, Lisboa, Julho 1961
143. Nuno PORTAS – “A Evolução da
Arquitectura…”, p. 741
144. Ana TOSTÕES – “Modernização e
Regionalismo 1948-1961” in Arquitectura do Século
XX. Portugal. Ed. by Annette BECKER, Ana
TOSTÕES and Wilfred WANG. Portugal-Frankfurt
97, 1997, p. 48
145. Ana TOSTÕES - "Arquitectura Portuguesa do
século XX" in História da Arte Portuguesa.
Direcção de Paulo Pereira, vol. III, p. 538
146. Sérgio FERNANDEZ – Percurso –
Arquitectura Portuguesa…p. 144, Pedro Vieira de
ALMEIDA e Maria Helena MAIA – “As décadas
pós-Congresso…”, p. 150
147. Manuel MENDES – "Porto, The School and its
Projects…”, p. 58
35
arquitectura portuguesa subsequente. No entanto, a forma como os
arquitectos construíram a modernidade no contacto directo com essa versão
da tradição conheceu importantes variantes.
Segundo Nuno Portas, as diferenças de interpretação entre as equipas do
Inquérito – as do norte com um trabalho mais antropológico, “mais cultural” e
as do sul com recolha “mais instrumental ou táctica” – anunciavam “a
clivagem que, ao longo dos anos 60 (...) dividiria os seguidores dos CIAM 148dos críticos dos CIAM (…)” . Esta divisão foi determinante ao nível das
várias formas de entendimento da relação entre tradição e modernidade.
Em meados da década de 1980, Sérgio Fernandez recorda que o Inquérito 149teve efeitos pedagógicos consideráveis nos alunos da ESBAP . Tendo tido
por professores alguns dos membros das equipas do norte, os alunos da
ESBAP desenvolveram uma atenção renovada às questões da habitação
rural. Este interesse acabou por materializar-se na apresentação de teses de
licenciatura como as de José Dias ou, precisamente, de Sérgio Fernandez
sobre comunidades de Bragança, ou ainda de José Forjaz numa aldeia no 150Alentejo .
Este interesse pela habitação e os modos de habitar seria ainda, no imediato,
exportada para Moçambique, onde José Dias e José Forjaz acabariam por ter
importantes responsabilidades técnicas e administrativas no governo. Aí,
António Quadros, pintor e poeta oriundo também da ESBAP, exerceria uma
influência cultural unanimemente reconhecida, tendo P. Vieira de Almeida e
A. Cardoso colocado a hipótese de que “a abordagem multi-funcional com
raízes antropológicas e etnográficas” gerada no seio da ESBAP tenha
influenciado a implementação e desenvolvimento das “aldeias comunais” em 151Moçambique, em que Quadros desempenhou um papel fundamental .
Já no seu CODA Arnaldo de Araújo defendia que era no “esforço para a
análise e detecção de necessidades concretas das populações concretas, bem
como de empenhadas propostas locais de intervenção” que poderia vir a 152“estabelecer-se a base de um novo regionalismo” . Ao concluir, Arnaldo de
Araújo defendia ainda que “o arquitecto português, sem ter de abandonar ou
diminuir (e sem poder fazê-lo) as suas relações com a linhas universais
(técnicas e estéticas) da arquitectura moderna, mais se aproximasse das
realidades do seu povo, se fizesse intérprete das suas virtualidades, 153construísse uma radicada arquitectura portuguesa, universal pois” .
154Em 2000, num outro registo, Nuno Teotónio Pereira , chamará a atenção
para o facto de uma das consequências mais imediatas do Inquérito ter sido a
sua contribuição para a expansão da noção de “património arquitectónico”
que, a partir dele passou definitivamente a abranger a arquitectura popular e
os assentamentos rurais. Ao sublinhar esta dimensão, Teotónio Pereira torna
indiscutível a ideia de que o Inquérito à Arquitectura Regional cumpriu um
dos principais objectivos da iniciativa de Keil: registar uma realidade rural
em vertiginoso desaparecimento.
148. Nuno PORTAS – “A Evolução da
Arquitectura…” p. 736
149. Sérgio FERNANDEZ – Percurso –
Arquitectura Portuguesa…p. 141
150. Vd. Pedro Vieira de ALMEIDA e Alexandra
CARDOSO – Arnaldo Araújo…, p. 14
151. Vd. Pedro Vieira de ALMEIDA e Alexandra
CARDOSO – Arnaldo Araújo…, p. 14
152. Vd. Pedro Vieira de ALMEIDA e Alexandra
CARDOSO – Arnaldo Araújo…, p. 14
153. Arnaldo ARAÚJO – Formas do Habitat
Rural…
154. Nuno Teotónio PEREIRA – “Reflexos
Culturais do Inquérito…”
36
O Prefácio de 1979 da Arquitectura Popular em Portugal, clarifica o papel de
Francisco Keil do Amaral, apresentando-o não apenas como o autor da ideia
do Inquérito, mas como aquele que na qualidade de presidente do Sindicato
dos Arquitectos deu o impulso decisivo para a sua concretização. Ao fazê-lo,
introduz também a ideia de que o facto do património da arquitectura popular
se degradar de dia para dia, tendendo ao desaparecimento, teria levado Keil a
estabelecer como prioritária a realização de um levantamento que abrangesse
todo o país. Abre-se assim a porta para um entendimento do Inquérito como
procurando afinal, não só demonstrar que a ideia de um único “estilo 155nacional” era na realidade um mito , mas sobretudo proceder ao registo de
um mundo em desaparição, isto é, do mundo rural como bem cultural.
Mais deve notar-se que a recolha fotográfica publicada, integrando os
elementos arquitectónicos em sugestivas composições plásticas, acabou por
proporcionar uma renovação do repertório formal disponível nem sempre
coincidente com o enfoque crítico e patrimonial da iniciativa de Keil do 156 157Amaral. Isto é, nas palavras de Vieira de Almeida e de Siza Vieira criou-se
uma verdadeira Bíblia que teve como consequência inesperada, e perversa,
uma pronta apropriação no quadro do desenho de empreendimentos
turísticos e de muitas construções “típicas” da área costeira do país.
Contexto Internacional
Apesar do interesse pela arquitectura popular, que caracteriza o Inquérito,
partilhar as suas raízes com processos equivalentes levados a cabo noutros
países europeus, a discussão do enquadramento internacional do volume
Arquitectura Popular em Portugal só muito recentemente foi considerado na
historiografia da arquitectura nacional.
Uma das possibilidades de diálogo internacional primeiro reconhecidas
destaca o grupo catalão GATEPAC que, precisamente nos anos 1930,
publica vários exemplos de arquitectura vernacular mediterrânica na sua 158revista A.C. Documento de Actividade Contemporânea . Por seu turno,
159Michel Toussaint chama a atenção para o facto de que tanto o Inquérito,
como a publicação de Arquitectura Popular em Portugal, antecederem a
famosa mostra do MoMA e o livro catálogo de Bernard Rudovsky,
Architecture without architects (1964). Chama igualmente a atenção para o
facto de Arquitectura Popular em Portugal ser referenciado em importantes
obras, como House Form and Culture (1969) de Amos Rapoport.
Igualmente reconhecida é a influência do Inquérito nos cinco volumes da
Arquitectura Popular Espanhola (1973) de Carlos Fontes, frequentemente
mencionada nos testemunhos orais de contemporâneos como Pedro Vieira de 160 161Almeida ou Álvaro Siza .
Muito recentemente, vem sendo levantada a hipótese da ideia do Inquérito ter
tido na sua génese a influência do arquitecto brasileiro Lúcio Costa. Na
155. Direcção da AAP – Prefácio à 2ª edição de
Arquitectura Popular em Portugal. Lisboa:
Associação dos Arquitectos Portugueses, 1979
156. Francisco Silva DIAS em entrevista a Inês
Oliveira realizada em 13 de Dezembro de 2010 e
publicada in Inês OLIVEIRA – A fotografia…
157. Guido GIANGREGORIO – Conversasión com
Alvaro Siza Vieira. Primeira Parte, Experimenta 29,
2011
158. Vd. Alexandra CARDOSO e Maria Helena
MAIA – “Tradition and Modernity…”
159. Michel TOUSSAINT – Da Arquitectura à
Teoria e o Universo da Teoria da Arquitectura em
Portugal na Primeira metade do século XX. PhD in
Architectural Theory, Lisboa: Universidade Técnica
de Lisboa – Faculdade de Arquitectura, 2009
160. Pedro Vieira de Almeida costumava recordar a
relação então estabelecida entre o grupo de
arquitectos liderado por Nuno Portas e ligado à
revista Arquitectura com Carlos Flores, ao tempo
diretor da revista Hogar y Arquitectura e que teria
realizado o seu levantamento da arquitectura
espanhola na sequência do contacto com o trabalho
dos portugueses (transmissão oral de informação
testemunhada pelas autoras). Curiosamente, Carlos
Flores no seu trabalho não refere a existência do
trabalho português anterior.
161. Álvaro SIZA - mesa redonda com os arquitectos
António Meneres, Álvaro Siza, Carvalho Dias,
Francisco Silva Dias e Pedro Borges Araújo, Museu
Nacional Soares dos Reis, Porto, 1 de Março 2012
37
realidade, Lúcio Costa fez várias visitas a Portugal, com o objectivo expresso
de conhecer a arquitectura portuguesa, em 1926, 1948, 1952 e depois em
1961. Mais ainda, vem sendo notada a importância do seu texto 162Documentação Necessária publicado em 1937 . No entanto, sob o ponto de
vista historiográfico, esta relação é muito recente, sendo que nenhum dos
autores das zonas norte do Inquérito se recorda de ter havido relação direta o
Inquérito e as viagens de Lúcio Costa pelo país, em busca das raízes da
arquitectura brasileira no seio da arquitectura portuguesa. Correndo o risco
de errar por desconhecimento da documentação de suporte em que se
baseiam os defensores desta ideia, baseando-nos nos desenhos de Lúcio
Costa divulgados na recente exposição A Arquitectura Portuguesa no Traço 163de Lúcio Costa. Bloquinhos de Portugal , diríamos que pode existir aqui
algum equivoco de interpretação. Efectivamente, os desenhos demonstram
um interesse genuíno sobre a arquitectura portuguesa em geral e Barroca em,
particular, mas não especificamente sobre a arquitectura popular. Como
notou Ana Vaz Milheiro, do Brasil chega à arquitectura portuguesa a
possibilidade de uma relação descomplexizada com a tradição arquitectonica 164nacional . Isto não significa necessariamente a assunção de um papel
singular da arquitectura popular neste contexto.
International Conference
SURVEYS ON VERNACULAR ARCHITECTURETheir significance in 20th century architectural culture
Porto, ESAP, 17-19 May 2012
architecturalsurveys.wordpress.com
Organization:
Project Popular Architecture in Portugal. A critical look(FCT: PTDC/AUR-AQI/099063; COMPETE: FCOMP-01-0124-FEDER-008832)
CEAA I Centro de Estudos Arnaldo Araújo (FCT uID 4041)Escola Superior Artística do Porto
162. Madalena Cunha MATOS e Tânia Beisl
RAMOS – “Um Encontro, Um Desencontro. Lúcio
Costa, Raul Lino e Carlos Ramos” in O Moderno já
Passado. O Passado no Moderno. Reciclagem,
requalificação, rearquitectura. Anais do 7º seminário
do do.co.mo.mo – Brasil, Porto Alegre: 22 a 24
Outubro 2007
163. Lisboa: Lx Factory, 2013
164. Ana Vaz MILHEIRO – “A Tradição em Brazil
Buildings e o Inquérito à Arquitectura Popular em
Portugal” in Nos Trópicos sem Le Corbusier.
Arquitectura luso-africana no Estado Novo. Lisboa:
Relógio d'Agua, 2012.
Cartaz da conferência internacional Surveys on
Vernacular Architecture. Their significance in the
20th century architectural culture, Porto, ESAP,
2012. Concepção gráfica de Jorge Cunha Pimentel
38
Outro exemplo de influência possível, poderia ser encontrado na bem 165estudada experiência italiana – que os autores do Inquérito afirmam
166desconhecer – onde os diferentes inquéritos à arquitectura rural, realizados
desde os anos 30 tiveram importantes consequências na arquitectura do
tempo.
Outros casos similares haverá ainda que identificar e trabalhar.
Com o encontro internacional Surveys on Vernacular Architecture. Their
Significance in the 20th Century Architectural Culture, tentamos inquirir dos
paralelos internacionais do Inquérito. Assim concebido, o volume
Arquitectura Popular em Portugal ganhou pela primeira vez uma pertinência
internacional que não se confunde com um mero esforço de divulgação. Isto
é, o projecto A “Arquitectura Popular em Portugal. Uma Leitura Crítica”
abriu margem para o entendimento do Inquérito numa dimensão cultural 167vasta, apta a estravasar a especificidade do contexto nacional , porque
apostada em inscrever o debate sobre o Inquérito no campo da cultura
arquitectónica do século XX. Abriu assim a possibilidade de diálogos inter-
nacionais (nomeadamente porque se atentou ao elenco e à discussão dos
múltiplos inquéritos que à arquitectura popular foram sendo feitos em vários
países europeus). Abriu igualmente a possibilidade de revisão de ideias feitas
sobre o modernismo na arquitectura e a sua relação com o domínio da
tradição, do popular e do vernacular com repercussões na história da
arquitectura geral.
165. Michelangelo SABATINO – Pride in Modesty.
Modernist Architecture and the Vernacular Tradition
in Italy. Toronto/Buffalo/London: University of
Toronto Press, 2011
166. Tanto António Menéres, Carlos Carvalho Dias
como Silva Dias, nas conversas atrás referidas,
afirmaram que ao tempo desconheciam a existência
dos inquéritos italianos.
167. Vd. por ex. António NEVES – “The Second
Modern Generation and the Survey on Regional
Architecture. Some notes based on projects of
Arménio Losa and Cassiano Barbosa” in Surveys on
Vernacular Architecture Their Significance in the
20th Century Architectural Culture. Conference
Proceedings. Porto: ESAP, May, 2012; Ricardo
AGAREZ – “Vernacular, Conservative, Modernist:
The Unconfortable 'Zone 6' (Algarve) of the
Portuguese Folk Architecture Survey (1951-1961)”
in Surveys on Vernacular Architecture…; Paula
ANDRÈ – “Surveys, Travels and Disclosure of
Vernacular Architecture in the Portuguese and
European Context” in Surve ys on Vernacular
Architecture…
39
DOCUMENTOS
Numa primeira parte deste trabalho procurámos em primeiro lugar esclarecer
do âmbito da própria investigação, dos seus limites previsíveis e de algumas
características do discurso, com que a queríamos explicar.
Esse foi o primeiro capítulo.
Em segundo lugar abordámos problemas de enquadramento genérico da
periodização histórica na medida em que nela se teem escondido alguns dos
insidiosos argumentos que reiteradamente teem servido para uma
interpretação manipulada por interesses políticos em relação aos quais
queríamos manter a nossa autonomia.
Este foi o segundo capítulo.
Em terceiro lugar quisemos deixar perfeitamente clara a maneira como
encarávamos as bases teóricas em que apoiávamos as nossas hipóteses
percebendo as relações que se estabelecem com outros domínios do saber,
rejeição firme de qualquer transcendência e defesa de uma deliberada
concretude na análise espacial.
Esse foi o terceiro capítulo.
Em seguida procurou-se definir e enquadrar a noção de espaço na
arquitectura, as razões de uma obstinada resistência à sua aceitação.
Neste capítulo foi proposta a articulação da noção de espaço com a noção de
massa.
E esse foi o quarto capítulo.
Foram depois estudados alguns casos conhecidos que se teem por exemplos
significativos, o que permitiu desenhar interpretações de alguma maneira
diversas das interpretações habituais.
E esse foi o quinto capítulo.
Finalmente foi estudado com maior detalhe o caso português que entretanto
tinha gerado e permitido toda a investigação, propondo entender em termos
críticos a situação que em Portugal opôs arquitectos e Governo num diálogo
longamente recusado de parte a parte e sem qualquer solução consistente
durante toda a vigência de Estado Novo.
Finalmente procura-se fazer um ponto da situação não directamente em
termos políticos mas procurando decifrar todo o sistema basicamente em
argumentos de Arquitectura.
III PARTE
Pedro Vieira de Almeida
43
Mas também importava determinar em malha profissional mais alargada
alguns aspectos que temos por co-laterais mas que entendemos mesmo assim
serem determinantes na investigação que queríamos levar a cabo, quer por
servirem enquanto enquadramento genérico quer enquanto motivação.
De aí que embora possa parecer demasiado extenso o território que
percorremos com a consequente superficialidade mesmo que relativa de
tratamento dos problemas, acreditemos que na perspectiva em que nos
colocámos era importante não iludir as dificuldades e que pelo contrário sem
estarmos demasiado preocupados com a segurança académica do discurso,
deveríamos desenvolver a estruturação autónoma dos nossos próprios pontos
de vista certamente com uma fundamentação aceitável, mas sem qualquer
pretensão de exaustividade.
Talvez se tenha percebido na sequência dos textos a preocupação de avançar
com alguma prudência, prudência que não pretende excluir o risco e que tem
a ver com a determinação de deixar justificados todos os passos no caminho
que iniciávamos.
Este que se desenvolveu a partir sobretudo da análise de exemplos de
Arquitectura Popular, procurou entender da viabilidade de isolar como
variáveis duas noções a ter em conta na análise da arquitectura o “espaço-
transição” e a “espessura”, aqui considerados enquanto hipóteses de trabalho.
Neste momento parece já possível abordar alguns aspectos da História da
Arquitectura em geral, ou a obra de alguns arquitectos em particular.
Aqui apenas foram obras que se considera poderem ser verdadeiramente
significativas nos temas em estudo.
Mas há certamente todo um trabalho muito mais vasto a realizar.
Falo aqui em relação a um passado próximo.
Mas será evidente que se em relação a um passado longínquo teremos de ter
presente ser discutível que tivesse presidido à sua concepção uma consciente
noção espacial particularmente articulada.
E será ainda mais discutível uma atitude deliberada em relação a uma sua
modelação concreta com ponderada formação de espaços núcleo e espaços
complementares e de transição, com todas as implicações a nível
antropológico e sociológico que estas categorias em si podem revestir.
De aí que a nossa leitura hoje nela detectando esses elementos possa aparecer 168como que sobreposta às intenções primeiras
No entanto o mesmo se verifica em relação à arquitectura mais próxima de
nós, não servindo qualquer obra, mesmo dos arquitectos mais destacados,
para exemplo bastante de quanto se quer dizer.
De qualquer modo esta leitura das particularidades da modelação espacial,
supomos continuar a ter a sua legitimidade específica – não quero com isto
dizer que a tenhamos necessariamente por correcta --já que como qualquer 168. V. Argan e Zevi
44
outra, a obra de arte arquitectónica só vive através da nossa participação
enquanto seus leitores e essa participação implica e implicará sempre a nossa
capacidade de interrogar, com as grelhas de leitura de cada momento.
Com a noção de “espessura” passa-se também qualquer coisa de parecido,
sobretudo articulado com uma determinação e modelação espacial.
Por um lado os arquitectos modernistas recusavam mesmo considerar a
espessura como variável expressiva, fiéis à ideia de que a “parede delgada”
que os cânones do modernismo recomendavam, correspondia por assim dizer
a uma conquista na linguagem arquitectónica que acreditavam ter sido
adquirida de maneira definitiva.
E recusavam igualmente a noção de “espaço-transição” em nome dos
“volumes puros” sob a luz, que a definição de arquitectura de Le Corbusier
referia.
Parecia-lhes assegurar-se ali uma relação privilegiada com a evolução
tecnológica e o desenvolvimento industrial, abraçando-se a ideia -- de resto
com não total ingenuidade -- de que só esta linguagem de “parede delgada”
permitia uma coincidência com a ideia de democracia na arquitectura, o que
era certamente uma relação excessivamente directa e justifica por inteiro a 169prevenção de (Lacan? A não determinação, ver) separando …
Foi de resto, a esta desagregação que eu pretendi referir em 70 quando
sublinhei os parágrafos de Fialho de Almeida em que ele descreve o ambiente
que supunha ver nas casas de Raul Lino, “onde fiam velhas em rocas e velhos 170lêem gravemente in-fólios de aventuras” .
Mas de qualquer maneira terá sido aquele tipo de convicções de uma relação
muito directa entre a noção de espessura e posição ideológica, que lançou
genericamente no espírito de uma arquitectura modernista, um anátema sobre
a noção de “parede espessa”.
Esta foi considerada como se significasse uma directa relação com valores
políticos de direita e com regimens de índole reaccionária.
De resto este mesmo simplismo de catalogação ainda hoje é frequentemente
encontrável em relação ao pensamento expressionista.
Mas vimos, também a cultura modernista recusava por inteiro a noção de
“espaço-transição”, agora em obediência aos “volumes puros” sob a luz, que
a definição de arquitectura de Le Corbusier consagrava.
Nisto tudo, o que pode hoje causar alguma estranheza é o facto de as ideias de
Le Corbusier, terem sido totalmente acolhidas apenas pelo seu valor facial,
sem um mínimo de elaboração posterior, perfeitamente impermeáveis os
arquitectos aos magníficos exemplos que Le Corbusier foi simultaneamente
semeando ao longo da sua obra, onde se acumulavam exemplares de uma
grande liberdade de concepção, em que as famosas “coberturas jardim”
169. Optou-se por deixar a anotação tal como estava
no texto porque se considera que pode ajudar a
compreender a intensão da frase que ficou
incompleta. Nota das Editoras.
170. Fialho de ALMEIDA (A Esquina, p. 206)
citado in Pedro Vieira de ALMEIDA – “Raul Lino.
Arquitecto Moderno” in Raul Lino. Exposição
Retroespectiva da sua Obra. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian, 1970, p. 128. Nota do autor no
texto: “ (aumentar ver catálogo pág. 130)”.
45
carregadas de saudável lirismo teem um lugar absolutamente destacado.
A única forma encontrada para enquadrar aqueles exemplos tidos por
desnorteantes, foi o considerar Le Corbusier como um caso extremo de
dispersão e incoerência, sentindo ainda os arquitectos terem o direito a achar-
se profissionalmente ofendidos e “atraiçoados” por algumas das suas obras.
Situação que cresceu exponencialmente com o quase escândalo cultural da
magnífica Capela de Ronchamp.
Genericamente portanto para os arquitectos modernistas nada de “paredes
espessas”, nada de “espaços-transição”.
O que aqui é de sublinhar é que ao faze-lo os arquitectos modernistas se
recusavam à partida a um vector indispensável para um entendimento do
espaço enquanto expressão, simultaneamente recusando-se entender o que
poderiam ser os vectores de um verdadeiro compromisso democrático, que
por outro lado e bem justificadamente, lhes era tão caro defender.
Não se põe minimamente em causa a seriedade das intenções, mas será
inevitável pôr em causa a clarividência teórico-crítica em que se apoiavam.
Mas aqui por razões que profissionalmente se prendiam com o respeito pelas
estritas normas modernistas antes referidas, os arquitectos até poderiam estar
de acordo.
Nenhuma destas duas posições opostas, seja por parte dos arquitectos e muito
menos por parte do Estado, em relação à “espessura” ou em relação ao
“espaço-transição” era percebida em quadro teórico-crítico, o que permitiu
durante décadas o desenvolvimento de um diálogo de surdos em que de vez
em quando até acontecia uma surpreendente coincidência de pontos de vista
que no fundo ninguém previa e de alguma maneira resultava embaraçante.
Mas a discussão entretanto possível não era uma discussão de linguagens ou
concepções, era um confronto de incomodidades várias que ninguém sabia
explicar bem, nem fazia o mínimo esforço para entender, o Estado por natural
incompetência neste sector, os arquitectos pela convicção arreigada de que
não valia a pena aprofundar os conhecimentos em arquitectura, já que aquilo
que estava definido nos CIAM representava um estádio final do
conhecimento possível.
E vão ser curiosas as consequências formais.
Os arquitectos que representam o grosso da linguagem do chamado
“português suave”, confrontados com uma expressão urbana, novos
materiais e condicionantes financeiras, vão construir também com paredes
delgadas, mas entendendo sem entender as reticências do poder, cercam as
janelas de ombreiras e vergas sólidas que dão ao conjunto um certo sentido
exterior de espessura, reforçado pelas molduras nas portas da rua que acabam
por dispor de exuberantes moldurações mesmo fora de escala em relação ao
conjunto, como é bem o caso dos prédios construídos na Av. António Augusto
Aguiar.
46
Não se tratava só de uma questão de estilo mais ou menos “digno” de uma
cidade que embora modestamente se pretendia com digna e sólida
monumentalidade, mas do estabelecer para uma visão exterior a ilusão de um
tipo de qualidade de habitação que de facto só existia em aparência.
Numa versão mais modesta mas muito significativa, os prédios de Alvalade
com idêntico tratamento de entradas e vãos e com uma inserção de janelas
como óculos, vão tentar satisfazer essa intenção com a convicção oscilante de
quem não tem uma visão inteiramente lúcida do que estava em jogo e como se
jogava aquele jogo.
Ainda é Neil Leach que cita Stanley Fish para dizer que cada acto está inscrito 171no quadro de uma posição ideológica, o que parece evidente.
172[ ]
È evidente e é precisamente isso que torna sem muito sentido as pretensões
dos regimens fascistas de se proclamarem como a-ideológicos.
Poderia mesmo considerar, que tal pretensão, é sintoma da ainda que
encapotada fascisação de qualquer estrutura política.173Assim a pergunta de Leach “can there ever be a democratic architecture”
parece desadequada ao problema e de imediato redutora.
Assim os arquitectos enquanto profissionais não podem desconhecer estas
vertentes, nem fingirem supor que a arquitectura está isenta deste contacto
com o social.
Nem podem desleixar teoricamente o aprofundamento destas relações que
precisam de ser estudadas.
Por isso mesmo é que considerar o “programa” como um obstáculo ao
desenvolvimento de uma arquitectura como poética, é apenas reflexo de um
“oportunismo” menor.
Claro que seria um erro de sinal contrário o considerar que só é arquitectura 174aquela que responde a esse tipo de problemas .
Nota das editoras
O presente texto de Pedro Vieira de Almeida encontrava-se em fase de redacção, tendo nós optado por publica-lo tal como se apresentava, com algumas, pequenas, intervenções editoriais. Assim, com apenas uma excepção, devidamente referenciada, as anotações incluídas no texto foram passadas para nota de rodapé e as referências bibliográficas completadas.171. Neil LEACH – A Anestética de Arquitectura.
Lisboa: Antígona, 2005 (1999), p. 117
172. (alargar)
173. V. Neil LEACH – A Anestética de Arquitectura.
Lisboa: Antígona, 2005 (1999), p. 25
174. (v. na URSS)
47
Palavras-chave
Arquitectura Popular / Popular Architecture ; Inquérito / Survey; Teoria da
Arquitectura / Architectural Theory; Arquitectura Moderna / Modern
Architecture
Instituições envolvidas
Instituição de Gestão
Cooperativa de Ensino Superior Artístico do Porto (CESAP)
Instituição de Acolhimento
Escola Superior Artística do Porto (ESAP)
Unidade de Investigação
CEAA | Centro de Estudos Arnaldo Araújo
Equipa
Alexandra Cardoso
Joana Cunha Leal
Maria Helena Maia (IR 2011-2013)
Pedro Vieira de Almeida (IR 2009-2011)
Consultores
Josefina Gonzalez Cubero
Mariann Simon
Miguel Angel de la Ignesia
Financiamento
€ 48.653,00
ARQUITECTURA POPULAR EM PORTUGAL.
UMA LEITURA CRÍTICA
Popular Architecture in Portugal. A Critical Look
PROJECTO
49
Sumário
O programa de investigação que neste momento propomos, centra-se no
ESTUDO CRÍTICO DO VOLUME “ARQUITECTURA POPULAR
E M P O RT U G A L ”, V U L G A R M E N T E C O N H E C I D O P O R
“INQUÉRITO”.
Publicado no início da década de 60, pelo Sindicato dos Arquitectos, o
“Inquérito” constitui na história da cultura arquitectónica portuguesa um
marco, enquanto testemunho histórico de uma época, representando um
significativo desafio para uma consciência crítica actual
A necessidade de dar continuidade ao trabalho ali desenvolvido, foi de resto
explicitamente sugerida logo no prefácio da primeira edição, sendo reiterada
quasi 20 anos mais tarde, no prefácio da 2ª edição, em ambos os casos textos
subscritos pelas Direcções do Sindicato, à altura vigentes.
Mais concretamente vaticinava-se no segundo prefácio referido, que aquela
nova edição pudesse vir a servir “como estímulo ao estudo da documentação
obtida no 'Inquérito' e ao aprofundamento da problemática da Arquitectura”.
Embora sempre adiantada enquanto hipótese, desse plano de trabalhos nada
foi produzido de concreto.
Assim ao tornarmos hoje a pegar no tema, passados 48 anos, estamos cons-
cientes de que estamos afinal a cumprir com objectivos de há muito traçados.
Mas também entendemos que o abordar o “Inquérito” com a distância de
meio século de intervalo, arrefecidas algumas polémicas que em seu torno se
terão levantado, constitui um facto que nos vem propor uma maior exigência
de métodos, um maior rigor, seja na própria análise que do “Inquérito” pos-
samos fazer, seja nas consequências que dessa análise venhamos a destacar.
Podemos considerar que o âmbito mais ambicioso do programa de
investigação que propomos, teria como horizonte mais vasto de possibilida-
des, o poder contribuir de forma consistente para uma discussão e aprofunda-
mento dos argumentos de um discurso teórico de arquitectura, que hoje
julgamos poder dizer já não reivindicar nem um carácter científico/filosófico,
nem um estatuto normativo.
Pelo contrário pensamos até, ter sido essa mesma presunção filosófico-
científica, essa mesma presunção de normatividade, a causa de muitas pistas
e esforços claramente equivocados na definição dos seus objectivos próprios,
na selecção dos seus métodos.
É nossa ideia que para ser efectivamente operativo, seja qual for o nível que se
pretenda estabelecer, o discurso teórico terá de se manter resolutamente
“arquitectónico”, isto é, terá de se afastar quasi militantemente dessa sedução
das referências filosofantes que em geral os arquitectos não controlam, nem
em verdade têm de controlar.
50
Entretanto consideramos que a discussão crítica do “Inquérito” mantém toda
a sua oportunidade, agora que o tema dos vernáculos e regionalismos tornou a
entrar no âmbito das discussões profissionais.
Mas em vez de estudar o “Inquérito” de maneira isolada, em si mesmo e por si
mesmo, defendemos o seu estudo num quadro ponderado e em constante
diálogo com elementos teóricos subjacentes à expressividade própria de
algumas das linguagens eruditas modernas.
Sabemos que os tempos de exploração de cada uma destas linhas, uma mais
marcadamente abstracta, outra mais marcadamente pragmática, não parecem
ser directamente sobreponíveis ao longo de todo o estudo, nem os seus
resultados serão avaliáveis com idênticas margens de erro, o que torna
qualquer calendarização e valoração global, marcadamente assimétrica.
No concreto, o que neste momento se pensa levar a cabo, mantendo em
paralelo as duas linhas apontadas, a vernacularidade e a contemporaneidade,
será constituído por:
1) UMA PARCELA PILOTO DOS TRABALHOS A REALIZAR
SOBRE O “INQUÉRITO”;
2) UM APROFUNDAMENTO TEÓRICO QUE FOR POSSÍVEL
PRODUZIR EM PERÍODO DE TEMPO COMPATÍVEL.
Parece além disso, haver um ganho nesta aproximação dupla, já que permite
uma leitura mais estruturada e estruturante do “Inquérito” e ainda por termos
verificado que grande parte das preocupações que actualmente invadem o
mundo da arquitectura e que são frequente objecto de análise em encontros
internacionais ou em escritos divulgados pela imprensa do ramo, podem ser
melhor analisadas, não numa observação ansiosa e obsessiva da ofuscante
diversidade presente, mas na mais ponderada leitura comparada, neste caso
concreto, com os argumentos de um espólio “estabilizado” como o do
“Inquérito”.
Claro que referimos aqui, uma leitura estruturada através de uma análise
renovada, essa sim deliberada e exigentemente actual.
Torna-se claro portanto que não se pretende desenvolver um trabalho no
plano da investigação histórica, mas sim um trabalho no plano da teoria-
crítica da arquitectura, em que os aspectos estritamente históricos, por
importantes que sejam, não podem ser entendidos senão, enquanto
inevitáveis “efeitos colaterais”.
Supomos com alguma razoabilidade, revestir-se este caminho de suficientes
elementos de originalidade na sua formulação, sendo além disso importante
sublinhar a preocupação em manter em simultâneo toda a investigação numa
perspectiva de operacionalidade crítica em relação à arquitectura da
actualidade
51
Summary
The research proposal we are presenting is centred on the CRITICAL
STUDY OF THE PUBLICATION “A ARQUITECTURA POPULAR
EM PORTUGAL”, MORE COMMONLY KNOWN AS THE
“INQUÉRITO”.
Published in the early 1960s by the Sindicato dos Arquitectos [Architects'
Union], the “Inquérito” constitutes an important point in the history of
Portuguese architectural culture as a historical testament of its time,
representing a serious challenge to our current critical conscience. The need
to continue the work developed was explicitly mentioned in the preface of the
first edition of the “Inquérito”, and was reiterated in the preface to the 2nd
edition, published twenty years later, both texts being signed by the then
commitees of the Sindicato.
In fact, the preface to the 2nd edition laid down the hope that the new edition
could serve “as a stimulus to the study of the documentation obtained in the
“Inquérito” and the further inquiry into the problematic of Architecture”.
Though the intention was maintained, nothing concrete was ever produced.
As such, in picking up on this project, 48 years later, we are aware that we will
be achieving aims which were drawn up long ago. But we also understand
that the study of the “Inquérito” half a century after its publication and the
polemical discussions surrounding it, will require of us a more careful
methodology and rigor, be it in the actual analysis of the publication, or in the
results of that analysis.
We consider that the most ambitious part of our research proposal has among
its other possibilities, the ability to contribute consistently to the discussion
and deepening of the arguments of a theoretical discourse on architecture,
which we believe has today lost its claim to a scientific/philosophical
character, as well as to its normative character.
On the contrary, we believe it to be that philosophical-scientific
presupposition, that presupposition of normativity, the cause of numerous
mistaken efforts in the definition of its own objectives and in the selection of
its own methodology.
It is our belief that for it to be effectively operative, no matter what level one
aims to establish, that the theoretical discourse should maintain itself
resolutely architectonic; that is to say that it should distance itself almost
militantly from that selection of philosophical references which architects
generally do not control, nor are meant to control.
We consider that the critical discussion of the “Inquérito” maintains all its
relevance, now that the themes of the vernacular and regionalism have again
entered into professional discussions.
However, instead of studying the “Inquérito” in isolation, in and for itself, we
defend that its study within a framework in constant interaction with
52
theoretical elements connected to the expressiveness characteristic of some
of the modern erudite languages. We are aware that the time necessary to
explore either of these branches, one markedly more abstract while the other
markedly more pragmatic, does not seem to be strictly contiguous throughout
the course of the study, neither will the results of the study be evaluated with
the same margins for error, which makes any attempt at calendarization and
evaluation of the project noticeably asymmetric.
Concretely, what we endeavour to study, while maintaining in parallel both
branches mentioned, the vernacular and the contemporary, will be
constituted by:
1) A PILOT PORTION OF THE WORK TO BE PRODUCED ABOUT
THE “INQUÉRITO”;
2) A THEORETICAL EXPLORATION REDUCIBLE TO THE TIME
AVAILABLE.
There also seems to be something to gain in this double approximation, in that
it permits a more structured and structuring reading of the “Inquérito” and
also because we have verified that the majority of concerns currently
invading the world of architecture which are frequently the object of analysis
in international conferences or in published materials, can be better analysed,
not in an anxious and obsessive observation of the obfuscating diversity, but
in the careful comparative reading, in this case, of the arguments of a
'stabilized' legacy as that of the “Inquérito”.
Of course here we should also refer to a structured reading based on renewed
analysis, an analysis which is deliberate and necessarily contemporary.
It is clear then that we do not endeavour to develop a historical research
project, but a project on architectural theory and criticism, in which the
historical aspects, important as they may be, cannot be considered but
inevitable 'collateral effects'.
We believe that this investigative path contains sufficient original elements,
though at the same time it is important to underline our concern in keeping the
study in constant critical dialogue with the architecture of today.
Literature Review
The results of the “Inquérito” undertaken by the then Sindicato dos
Arquitectos to "Portuguese popular architecture" were published in 1961,
having been reprinted in 1980, 1988 and 2004 thus proving the interest it
created. Constantly referred to in the contemporaneous studies, the
“Inquérito” is usually referred to merely as a historical element, at times
articulated with direct or indirect references to the project and, less
frequently, as an important element for the reading of its contemporary
architecture (Portas, 1973).
53
Of all these approaches to the “Inquérito”, there never is the idea to approach
the document as a source which itself can be subject to critical inquiry.
Though the Associação dos Arquitectos Portugueses, later the Ordem dos
Arquitectos, promoted and published an extension of the survey on popular
architecture in the archipelagos of Madeira (Mestre, 2002) and Açores
(Caldas, 2000), these works did not contain a specific methodological
reflection.
The surveys on the regional architecture of the island were preceded by
studies in the fields of ethnography and anthropology, of which we should
mention the work of Ernesto Veiga de Oliveira and Fernando Galhano (1992)
and, more recently, João Leal (2000) which, following José-Augusto França
(1974), offers a historic panorama of the approximation to rural architecture,
in the context of the construction of a notion of 'national identity'.
From the point of view of the theory and history of architecture, the
perception that the discovery and the later understanding of vernacular
architecture as a cultural artifact, constitutes the basic condition to
comprehending the reasons for the undertaking of the “Inquérito”, is derived
from the work of some members of the team regarding the evolution of the
notion of heritage as associated to the construction of a 'national identity' (vd.
Maia 2006a, 2006b, 2007; Leal, 2006 and Trevisan and Maia, 2004).
At the same time, Pedro Vieira de Almeida (2002b, 2004, 2006a, 2006b, 2007
e 2008) has proposed a theoretical formulation of the notion of postmodernity
in which he articulates his own notion of 'critical internationalism' and the
idea of 'critical regionalism' – previously formulated by Alexander Tzonis
and Liane Lefaivre (vd. Lefaive and Tzonis, 2003) and reformulated by
Kenneth Frampton (1983) – a notion of postmodernity which could
potentially serve as frame of reference for the understanding of the
“Inquérito” and its consequences in national architecture.
Regarding the approach to the “Inquérito”, it is noted that already in 1990,
Pedro Vieira de Almeida and Maria Helena Maia – in a publication often
referred to in later studies on Portuguese 20th century architecture – alert to
the political contextualization of the “Inquérito” – a contextualization which
would later become object of its own study (Almeida, 1997, 2002a) – and to
the lack of a serious theoretical consideration given to it and the importance
of undertaking a “structured critical reading” of the data it provided (Almeida
and Maia, 1990: 153).
A similar position was later taken in monographic studies on the work of two
architects connected to the “Inquérito”, Arnaldo Araújo (Almeida and
Cardoso, 2002) and Octávio Lixa Filgueiras (Almeida and Cardoso, 2007), in
which a partial contextualization of the “Inquérito” is already made, and will
later be further developed (Almeida, 2008).
These studies aim to frame themselves within a critical reading of Portuguese
contemporary architecture (Almeida, 1994), based on the work of some
54
architects, following monographic studies undertaken as a support to the first
three large architecture exhibitions sponsored by Fundação Calouste
Gulbenkian and dedicated to the works of Raul Lino, Carlos Ramos and
Viana de Lima (Almeida, 1970, 1986 and 1996).
As such, we believe it is possible to conclude that, apart from the work our
team has been developing, there are no studies that truly approach
“Portuguese popular architecture” in the light proposed by our project.
Plan and Methods
The more generic, operational and prudent option in an investigation which
from the start seems to correspond to a high level of uncertainty we suppose
exists in this particular investigation – especially considering that this project
must be a complete piece of work in itself and, at the same time, be
understood as part of a larger investigation – will be to advance with
successive controlled approximations, establishing a reduced number of pilot
areas with a limited research programme in areas chosen specifically not
because of any eventual coherence in the source material, but instead because
of the diversity of situations it will make us aware of and begin to consider its
real impact.
It is very problematic to propose, at this stage, firm and reliable
methodological tracks to follow in this project.
We believe it is more important, without any break in the continuity of the
investigation and deliberately establishing the connection to other longer
phases of work which may develop in the future, maintain a high degree of
malleability and adaptability in the entire course of the project.
This double perspective will naturally determine some supplementary
concerns in the study.
As such, though we do not rule out other options, more ambitious for the
future development of the project, the following programming, cost
evaluation, staff and logistical requirements will only pertain to this specific
project.
The anticipated phases for this study will be mainly practical even though
they may imply a parallel theoretical approach, which we can summarize as:
1st phase – Collection of material, study and treatment of available data,
research trips and the registering of provisional conclusions. Organization of
a scientific meeting.
2nd phase – Field work;
3rd phase – Theoretical analysis and data mapping, preparation of reports and
other texts for publication with project conclusions.
Connected to and in parallel with this essentially practical part of the project,
55
we will develop a theoretical basis and a reflection which will not only
include Portuguese modern architecture, but also current architectural
manifestations in diverse parts of the world.
The reason we believe public funding should be spent on this project is
because it is an original piece of research which presents a certain level of
disciplinary demand, developed in an area of knowledge which, as all of
critical and theoretical architecture, has not been excessively developed in
Portugal, especially if supported by work which requires the availability of
means.
Furthermore, the “Inquérito”, basis of our research proposal and which
nowadays is not questioned in its entirety, even though we may disagree more
or less strongly with it, allegedly waited six years for the state funding which
would make it a reality (Inquérito).
What we aim to do is, based on the re-analysis of a work of inestimable value
from the last century, the “Inquérito”, develop a consistent group of elements
of a possible THEORETICAL BODY which will prove operable in the
appreciation of the study, not only of the architectures mentioned in the
“Inquérito” and the arguments then used to interpret and integrate, but
operable still as an instrument capable of understanding and participating
creatively in a discussion on some of the current architectural expressions,
more or less accepted and known.
In this project we aim to understand if the hypothesis previously formulated
of the determined meaning of the “thickness” vector in the field of
architectural expression has, in vernacular architecture, the same incidence it
seems to have in erudite architecture.
In relation to this, we believe that there can be established a distinction
between the group of architectures based on the “poetics of thick walls” and
the group of architectures based on the “poetics of thin walls”.
It is our conviction that during all of modernism, the expression articulated
around the “poetics of thin walls” was privileged, though there are examples,
even within modernism, of a sensibility to the “poetics of thick walls”.
Another hypothesis which should also be considered is that of the real
expressive meaning of the category “space-transition” in the structuring of
the idea of “habitation”, which we understand to be space-transition, an in-
between space defined as being simultaneously interior and exterior.
In relation to the first variable, the “thickness”, we believe that this was, even
on the international level, one of the causes of the strangeness with which the
majority of architects received a building of such vigour and suggestive
structure as the Ronchamp chapel of Le Corbusier.
There are numerous examples, as we can see from some projects by Aalto
(Three Crosses Church of Imatra, occasionally in Villa Marea).
In Portugal we can see also elements of that same sensibility, expressed in
works by Nuno Teotónio Pereira (Águas Church, Torre dos Olivais) or of
56
Álvaro Siza (Matosinhos Houses, Marco Church).
In relation to the second variable, “space-transition”, it is also our belief that
here also Modernism exercised a deliberate lack of understanding, which we
suppose can be interpreted mainly in the context of precise ideological
concerns.
This attitude was in some way imported to the architecture developed in
Portugal, more due to supposed ideological affinities – which the Portuguese
context enhanced – than a true theoretical and critical adherence.
If these readings are true, there are ample conclusions to be drawn, be they
directly in relation to the typological definition we can formulate from the
examples in the “Inquérito”, or in the critical possibility of a new dialogue
between the erudite fields and the vernacular fields in the architectural
language in general, or even in the renewed discussion of the values of an
“identity” which still today can and should be considered, albeit with other
significance and criteria.
On the other hand, some paths remain open to what could be a more
consistent interpretation of the mutual incomprehension between what has
been called Estado Novo architecture and an architecture of Modernity.
Finally, these and other possible questions may lead us to understand our
capacity for theoretical and critical creation in the field of architecture,
setting aside the common role of mere commentators of international
theoretical production, thus assuming consciously and securely our ability to
contribute autonomously and creatively to the discussions, even if they may
be on the international level.
There, we will be understanding each other in the cultural framework we
privilege – that of post-modernity, which we define – because culture is not
technological – as being a time, in fact our own, in which the notion of
peripheral countries and leading countries ceases to make sense, neither will
it be credible to maintain the notion of universal vanguard.
57
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Porto: CEAA, Edições Caseiras/16, 2012 (80 pág.)
2012 | Alexandra Cardoso, Joana Cunha Leal and Maria Helena Maia (ed)
Surveys on Vernacular Architecture. Their significance in 20th century architectural
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Porto: CEAA, 2012 (554 pág.)
2012 | Alexandra Cardoso, Joana Cunha Leal and Maria Helena Maia (ed.)
Surveys on Vernacular Architecture. Their significance in 20th century architectural
culture. Book of abstracts.
Porto: CEAA, 2012 (68 pág.)
2010 | Pedro Vieira de Almeida
Dois Parâmetros de Arquitectura Postos em Surdina. O propósito de uma
investigação.
Porto: CEAA, Edições Caseiras/14, 2010, (28 pág.)
CAPÍTULOS DE LIVROS, ARTIGOS E TEXTOS PUBLICADOS EM ACTAS
2013 | Alexandra Cardoso, Maria Helena Maia e Joana Cunha Leal
Arquitectura Popular em Portugal. Valores expressivos: o espaço-transição
Actas do Colóquio Internacional Arquitectura Popular. Arcos de Valdevez: Casa das
Artes, 3-6 Abril 2013
2013 | Joana Cunha Leal, Maria Helena Maia and Alexandra Cardoso
Architectural theory and the vernacular in Pedro Vieira de Almeida's writing
in To and Fro: Modernism and Vernacular Architecture.Porto: CEAA, 2013, p.109-121
2012 | Pedro Vieira de Almeida
Posicionamento Teórico Genérico
Revista de História da Arte, nº 10, Práticas da teoria/practices of theory. Instituto de
História da Arte da FCSH-UNL, 2012, p. 26-44
2012 | Maria Helena Maia e Alexandra Cardoso
O Inquérito à Arquitectura Regional: contributo para uma historiografia crítica do
Movimento Moderno em Portugal
in Actas IV Congresso de História da Arte Portuguesa – APHA, Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian. 21-24 Novembro 2012, p. 379-387
2012 | Maria Helena Maia
From the Portuguese House to the 'Popular Architecture in Portugal': notes on the
construction of Portuguese architectural identity
National Identities, special issue: Architecture and the Construction of National Identity,
vol. 14, Issue 3, 2012, p. 243-256. DOI:10.1080/14608944.2012.702746
2012 | Maria Helena Maia, Alexandra Cardoso and Joana Cunha Leal
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Our Project: The 'Popular Architecture in Portugal'. A Critical Look. Intercalar
results of a research Project
in Surveys on Vernacular Architecture. Their significance in 20th century architectural
culture. Conference Proceedings. Porto: CEAA, May 2012, p. 15-24
2012 | Joana Cunha Leal, Maria Helena Maia and Alexandra Cardoso
Pedro Vieira de Almeida and the Survey
in Surveys on Vernacular Architecture. Their significance in 20th century architectural
culture. Conference Proceedings. Porto: CEAA, Maio 2012, p. 25-35
2012 | Maria Helena Maia and Alexandra Cardoso
Portuguese Popular Architecture: Appropriations
in Proc. of ISVS-6, 6th International Seminar on Vernacular Settlements, Contemporary
Vernaculars: Places, Processes and Manifestations, April 19-21, 2012, Famagusta, North
Cyprus, 2012, p. 312-22
2012 | Pedro Vieira de Almeida
A Criação Teórica
J.A. Jornal Arquitectos, 244, Lisboa, Ordem dos Arquitectos, Jan/Fev/Mar 2012, p.111-
115.
2012 | Alexandra Cardoso and Maria Helena Maia
Arquitectura e Poder. Para uma Historiografia do Movimento Moderno em
Portugal
in Apropriações do Movimento Moderno/ Apropriaciones del Movimiento Moderno.
Livro de Actas (Encontros do CEAA/7, Zamora, Fundação Rei Afonso Henriques, 23-25
Junho 2011) Porto: CEAA, 2012, p. 113-122
2012 | Alexandra Cardoso e Maria Helena Maia
Architecture and Discovery of Rural Portugal
Theoretical Currents II: Architecture and its Geographical Horizons, Lincoln, UK, 5-6
Abril 2012. Texto distribuído mas não publicado.
2011 | Alexandra Cardoso e Maria Helena Maia
“Tradition and Modernity. The Historiography of the Survey on Regional
Architecture”
Accepted [2011] in Approaches to Modernity. Porto, CEAA, 2013
2011 | Pedro Vieira de Almeida
Post-Modernity as a Cultural Weapon
Aceite [2011] in Approaches to Modernity. Porto, CEAA, 2013
2010 | Maria Helena Maia
From the Portuguese House to the Survey on Popular Architecture in Portugal: notes
on the construction of Portuguese architectural identity
in Theoretical Currents: Architecture, Design and the Nation. International Conference
Proceedings. Nottingham Trent University, 2010, p. 136-44.
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RELATÓRIOS
2013 | Alexandra Cardoso, Maria Helena Maia e Joana Cunha Leal
A "Arquitectura Popular em Portugal". Uma Leitura Crítica. Relatório Final
Porto, Julho de 2013 (59 pág.)
COMUNICAÇÕES
2013 | Alexandra Cardoso, Maria Helena Maia e Joana Cunha Leal
Arquitectura Popular em Portugal. Valores expressivos: o espaço-transição
Colóquio Internacional Arquitectura Popular. Arcos de Valdevez: Casa das Artes, 3-6
Abril 2013
2012 | Maria Helena Maia e Alexandra Cardoso
O Inquérito à Arquitectura Regional: contributo para uma historiografia crítica do
Movimento Moderno em Portugal
IV Congresso de História da Arte Portuguesa – APHA Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, 21-24 Novembro 2012
2012 | Joana Cunha Leal
O Plain, Pombaline and (Post)modernism: on some pre and post-Kublerian
narratives on Portuguese architecture
Symposium Systems of History: Georges Kubler's Portuguese Plain Architecture, CES –
Centro de Estudos Sociais, Coimbra, 7 Sep 2012
2012 | Joana Cunha Leal, Maria Helena Maia e Alexandra Cardoso
Pedro Vieira de Almeida and the Survey
Surveys on Vernacular Architecture. Their significance in 20th century architectural
culture, Porto: ESAP, 17-19 Maio 2012
2012 | Maria Helena Maia, Alexandra Cardoso e Joana Cunha Leal
Our Project: The “Popular Architecture in Portugal”. A Critical Look. Intercalar
results of a research Project /
Surveys on Vernacular Architecture. Their significance in 20th century architectural
culture, Porto: ESAP, 17-19 Maio 2012
2012 | Alexandra Cardoso e Maria Helena Maia
Architecture and Discovery of Rural Portugal
Theoretical Currents II: Architecture and its Geographical Horizons, Lincoln, UK, 5-6
Abril 2012
2012 | Maria Helena Maia e Alexandra Cardoso
Popular Portuguese Architecture: Appropriations /
ISVS-6 Sixth ISVS Conference: Contemporary Vernaculars: Places, Processes and
Manifestations, Famagusta, North Cyprus, 19-21 Abril 2012
2011 | Alexandra Cardoso e Maria Helena Maia
Arquitectura e Poder. Para uma historiografia do Movimento Moderno em Portugal
Encontros do CEAA/7: Apropriações do Movimento Moderno. Zamora, Fundação Rei
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Afonso Henriques, Junho 2011.
2010 | Maria Helena Maia
From the Portuguese House to the Survey on Popular Architecture in Portugal: notes
on the construction of Portuguese architectural identity
Theoretical Currents – Architecture, Design & the Nation, Nottingham, England,
September 2010.
2010 | Alexandra Cardoso e Maria Helena Maia
Tradition and Modernity. The Historiography of the Survey to the Popular
Architecture in Portugal /
Encontros do CEAA/5: Approaches to Modernity. Budapest: BUTE, 8 Outubro 2010.
2010 | Pedro Vieira de Almeida
Post-Modernity as a Cultural Weapon
Encontros do CEAA/5: Approaches to Modernity. Budapest: BUTE, 8 Outubro 2010.
2010 | Alexandra Cardoso
O Inquérito à Arquitectura Regional
A Arquitectura Tradicional Como Património. Covilhã: Universidade da Beira Interior, 17
Dezembro 2010.
2010 | Maria Helena Maia
A Descoberta da Arquitectura Popular
A Arquitectura Tradicional Como Património. Covilhã: Universidade da Beira Interior, 17
Dezembro 2010.
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Referees
Em diferentes momentos e a diversos níveis realizaram trabalho de revisão
[peer review] no que respeita os livros editados no âmbito deste trabalho:
Alexandra Ai Quintas
Alexandra Trevisan
Antoni Remesar
Marco Ginoulhiac
Margarida Brito Alves
Miguel Silva Graça
Miguel Pais Vieira
Paolo Marcolin
Rui Jorge Garcia Ramos
O acesso à documentação reunida e produzida neste projecto pode fazer-se
através da página www.ceaa.pt ou contactando directamente o CEAA |
Centro de Estudos Arnaldo Araújo para o efeito.
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Agradecimentos
Família de Arnaldo Araújo
Família de Octávio Lixa Filgueiras
Família de Pedro Vieira de Almeida
Alexandra Trevisan
António Menéres
Carlos Carvalho Dias
Helena Cabral
Joana Couto
Jorge Cunha Pimentel
Miguel Filgueiras
Nuno Pinto Cardoso
Nuno Portas
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CEAA Edições Caseiras 19 I
As Edições Caseiras, publicadas pelo Centro de Estudos Arnaldo
Araújo da ESAP, pretendem divulgar em pequenos cadernos,
estudos académicos sujeitos a revisão por pares (peer review),
elaborados no seu âmbito de investigação e interesses.
Com este quarto e último caderno encerramos a apresentação dos
resultados do projecto de investigação A Arquitectura Popular em
Portugal. Uma Leitura Crítica, pelo que nele se juntam textos de
índole diferente. Por um lado o resultado do estudo que permitou
compreender e enquadrar o Inquérito na evolução da arquitectura
portuguesa e internacional, analisar aquilo que sobre ele foi
escrito, identificando os principais contributos e compreender o
seu significado na cultura arquitectónica portuguesa do século XX.
Por outro, um conjunto de documentos que incluem o rascunho
das considerações finais que Pedro Vieira de Almeida tinha
começado a escrever, a listagem da produção da equipa e o texto
do projecto que, em 2009, apresentamos à FCT.