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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES / AVM PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU A UTILIZAÇÃO DO DESENHO NA EDUCAÇÃO INFANTIL COMO INTERVENÇÃO NA PSICOPEDAGOGIA INSTITUCIONAL Clarice Homem Macedo ORIENTADOR: Prof. Marcelo Saldanha Rio de Janeiro 2018 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEIDE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES / AVM PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

A UTILIZAÇÃO DO DESENHO NA EDUCAÇÃO INFANTIL COMO INTERVENÇÃO NA PSICOPEDAGOGIA

INSTITUCIONAL

Clarice Homem Macedo

ORIENTADOR: Prof. Marcelo Saldanha

Rio de Janeiro 2018

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES / AVM PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

Apresentação de monografia à AVM como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Psicopedagogia. Por: Clarice Homem Macedo

A UTILIZAÇÃO DO DESENHO NA EDUCAÇÃO INFANTIL COMO INTERVENÇÃO NA PSICOPEDAGOGIA

INSTITUCIONAL

Rio de Janeiro 2018

3

AGRADECIMENTOS

Aos colegas de turma que tranquilizaram os

momentos de dificuldade e aos professores da

AVM que muito acrescentaram com suas aulas.

4

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus pais, meu irmão e

meu noivo que tanto contribuíram para os meus

estudos e essa nova trajetória.

5

RESUMO

Este trabalho monográfico tem como finalidade analisar a

contribuição do desenho para a intervenção do psicopedagogo em seu trabalho

com as crianças da educação infantil. Assim, a presente monografia apresenta

concepções teóricas sobre a importância e as características do desenho

infantil a partir dos trabalhos de Piaget (1948), Vygotsky (1969; 1988), Luquet

(1969), Mèredieu (1974), Guimarães (2009), Corsino (2009) e Pillar (2012).

Relacionamos e refletimos sobre essas concepções à luz do que os

Parâmetros Curriculares Nacionais e o Referencial Curricular Nacional

preconizam como objetivo do trabalho na educação infantil. Também

apresentamos técnicas de intervenção psicopedagógica que utilizam o

grafismo como principal recurso a partir dos estudos e afirmações de Weiss

(2004), Visca (2008) e Walter Trinca (s/d).

A partir dos estudos citados anteriormente e das vivências da autora

deste trabalho, foi possível ter uma ideia de como o desenho pode colaborar

durante uma intervenção do psicopedagogo nas escolas. A análise da

importância do desenho foi proposta, tendo em vista o quanto a criança evolui

diante de atividades que ocorrem de forma mais lúdica.

6

METODOLOGIA

O presente trabalho tem como função apresentar um estudo sobre a

utilização do desenho na educação infantil como intervenção na

psicopedagogia institucional por meio de uma pesquisa qualitativa bibliográfica,

apoiada em autores como: Florence Mèredieu, Jean Piaget, Rosa Iavelberg,

Analice Pillar, Walter Trinca, Lev S. Vygotsky, Jorge Visca, Nádia Bossa, entre

outros.

Os autores citados acima foram relacionados à vivência profissional

da autora deste trabalho.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I

A origem do desenho e sua inserção na infância 10

CAPÍTULO II

Importância do desenho na educação infantil 13

CAPÍTULO III

A relação entre o desenho e o desenvolvimento da aprendizagem 20

CAPÍTULO IV

O psicopedagogo e as técnicas de intervenção que utilizam o desenho 24

CONCLUSÃO 28

BIBLIOGRAFIA 31

ÍNDICE 33

8

INTRODUÇÃO

Muito ouvimos falar que os desenhos das crianças vão além dos

rabiscos vistos por nós e que sempre há um significado por trás deles.

Optamos por tentar entender um pouco mais a fundo o ato de desenhar e o

próprio desenho, já que, ainda que se proponham muitos desenhos às crianças

na educação infantil, dificilmente encontramos um psicopedagogo atuante nas

escolas que utilize esse recurso como auxiliar em suas intervenções. Por essa

razão, a escolha desta temática baseou-se nessas inquietações sobre a

importância do desenho na educação infantil, principalmente como uso durante

as intervenções psicopedagógicas.

Estando presente desde o surgimento da humanidade, o desenho,

muitas vezes, fala por si só, substituindo até a linguagem oral e escrita. Dentre

as definições de desenho no dicionário Michaelis (1998) podemos destacar

uma que nos parece oportuna para aquilo que se encontra como desenho no

trabalho escolar: “delineação dos contornos das figuras”. Com as crianças,

principalmente na educação infantil, o desenho pode ter muitos significados e

representar diversas situações ou objetos. No entanto, eventualmente, os

educadores dão pouco valor para o momento de desenhar. Por que o desenho

deixa de ser importante para muitos educadores? Por que muitos profissionais

dizem que esse momento não é nada além de um passatempo para as

crianças?

Instigada por essas questões começamos este trabalho investigando a

origem do desenho e como ele se tornou algo próprio da infância (capítulo 1).

Seguindo o artigo de Faria (s/d.) encontramos que o desenho está presente

desde os “tempos das cavernas”. A partir dos trabalhos de Mèredieu (1974)

encontramos que somente ao final do século XIX passou a existir interesse

científico pelo desenho infantil. Pimentel (2010) nos revela a originalidade da

infância em seus trabalhos.

No capítulo 2, com base nos documentos de orientação do trabalho

infantil, Referencial Curricular Nacional (1998) e Lei de Diretrizes e Bases

9

(1996), analisamos como o desenho poderia contribuir para os objetivos

propostos para a educação infantil.

No capítulo 3, a partir dos trabalhos de Luquet (1969), descrevemos os

três níveis do desenvolvimento do desenho infantil, sendo eles: realismo

fortuito, realismo falhado e realismo intelectual. Segundo o autor, o desenho

está ligado a uma visão maturacionista, assim como afirma Mèredieu (1974).

No capítulo 4, apresentamos o papel do psicopedagogo, segundo Bossa

(2000). A partir dessa análise, pontuamos três técnicas de intervenção que

utilizam o desenho, conforme a teoria de Visca (2008) e Walter Trinca (s/d).

Assim, ao longo do trabalho, encontramos vários teóricos falando sobre

a importância do desenho e de sua significação para o desenvolvimento

posterior do simbólico e também para a aprendizagem e a linguagem. Também

é possível encontrarmos situações em que o desenho ajuda a trabalhar com as

crianças diversas áreas do desenvolvimento, principalmente, com o corpo e

seu movimento. Infelizmente, diante das nossas observações, encontramos

educadores que parecem ignorar esses fatos e desejam apenas que os alunos

sentem para desenhar e, assim, perdem a oportunidade de explorar o

momento do desenho e seus benefícios. Muitas atividades podem ser

propostas para se trabalhar o grafismo, mas para isso é de extrema

importância que o educador tenha o objetivo da atividade em mente quando

pensar em propô-la, além de observar e analisar se cabe propor isso aos

alunos, levando em consideração suas realidades, faixas etárias e processos

de desenvolvimento.

Assim como a expressão corporal e a fala, o desenho é uma das

primeiras formas que a criança utiliza para se expressar, sendo um momento

de brincadeira e ao mesmo tempo de entendimento do mundo onde procura

revelar seus sentimentos. Será que nós, da area de educação, estamos

privando as crianças de aproveitarem e explorarem mais a arte de desenhar?

Será que o desenho não poderia receber seu devido valor dentro e fora das

escolas, considerando tamanha importância? Na conclusão apresentamos

algumas sugestões e caminhos possíveis para o melhor aproveitamento do

desenho no trabalho do psicopedagogo da educação infantil.

10

CAPÍTULO I A ORIGEM DO DESENHO E SUA INSERÇÃO NA

INFÂNCIA

Tal como afirma Faria (s/d.), o surgimento do desenho coincide com o da

humanidade, desde o “tempo das cavernas”. Era nas cavernas que os homens

reproduziam, através do grafismo, cenas que julgamos serem do seu cotidiano,

utilizando as pinturas rupestres para se comunicarem uns com os outros e se

expressarem.

Ainda segundo a autora, na antiguidade a arte de desenhar facilitava a

comunicação entre os povos e o desenvolvimento das linguagens: escrita e

falada. Faria afirma, ainda, que para desenhar o homem usava superfícies dos

mais diversos materiais, tais como pedra, argila, tecidos, entre outros. Eis que,

há mais de três mil anos atrás, os chineses inventaram o papel. A técnica para

fabricação deste material prossegue, até os dias de hoje, com o mesmo

princípio de extrair fibras vegetais, prensar e secar, embora tenha evoluído com

o passar dos anos.

Acompanhando a evolução das superfícies em que os homens

desenham tem-se também a evolução dos “utensílios” usados para desenhar.

Na época das cavernas o grafismo era realizado pelos dedos humanos. Há o

uso de gravetos, carvão e outros materiais antes do surgimento da

caneta esferográfica. Já em 1938 o jornalista László Birô inventou, junto a seu

irmão, a caneta esferográfica, comumente utilizada nos dias de hoje, como

afirma Carsten Heinisch (s/d.). Assim, da mesma forma em que as técnicas, os

utensílios e os suportes evoluíram, o próprio desenho também teve sua

evolução.

Ao longo do século XX as mídias tornaram ainda maior a presença das

imagens no nosso cotidiano. Nos anos 90, com a digitalização, temos imagens

circulando na cidade em todos os lugares, dentre elas desenhos. Essa forte

presença das imagens e dos desenhos na cultura permite pensarmos o quanto

este elemento volta a ser um importante instrumento de comunicação e

expressão como nos tempos das cavernas, ainda que atualmente, conviva com

11

a escrita. Se no ambiente cultural o desenho volta a ganhar espaço, talvez na

escola ele deva ser também valorizado para além da educação infantil.

Além do desenho, talvez a própria infância possa ser revista como etapa

a ser ultrapassada e possa ser pensada como um dos modos de

experimentação de mundo. Nos anos 90, no Japão, por exemplo, foi criado o

conceito da “toy art”. O termo se refere ao conceito de “brinquedo da arte”. É

possível encontrarmos diversas artes marcadas pelo movimento infantil, tal

como as obras contemporâneas que mesclam urbanidade, grafismo e moda.

Obras, estas, marcadas pelos desenhos com traços infantis, porém não

destinadas às crianças, como por exemplo, o “Mickey”, de

Keith Haring e “Ronald McDonald’s”, de Ron English.

Se o desenho, seus suportes e utensílios têm evoluído com a

humanidade desde sua origem, o estudo da evolução do mesmo num percurso

que se poderia dizer ontogenético, da infância à idade adulta, só se deu bem

mais recentemente. Segundo Mèredieu (1974), somente no final do século XIX

desenvolveu-se o interesse científico pelo desenho infantil. Os estudos foram

se diversificando e ampliando, contribuindo com outros já existentes na área de

Pedagogia, Sociologia e Psicologia da época.

No início, os desenhos infantis eram considerados fracassos, vindos de

treinamentos para que existisse ali um futuro artista. Os sucessos eram

ocasionais. Esta visão se devia ao fato de se entender a criança como um

adulto em miniatura ou como um ser ainda não desenvolvido, e que deveria se

desenvolver para chegar a ser um adulto. Tratava-se de ver a infância como

um estágio a ser superado. Fato que foi sendo superado ao longo do século

XX, como nos diz Mèredieu: “As concepções relativas à infância modificaram-se

progressivamente: a criança não é mais aquela maquete do adulto,

aquele adulto miniaturizado que queriam ver nela. A descoberta de

leis próprias da psique infantil, a demonstração da originalidade de

seu desenvolvimento, levaram a admitir a especificidade desse

universo.” (MÈREDIEU, 1974, p.3)

Outro fato que contribuía para a crítica e o não investimento na produção

do desenho infantil eram os altos custos do desenho. Ao longo dos anos houve

12

uma baixa no custo da produção do lápis e do papel, fazendo, assim, com que

seus usos fossem difundidos e mais acessíveis. Antes, por ser muito caro, a

criança não podia ter acesso a esses materiais e só podia expressar sua arte

em suportes mais baratos, como a areia, por exemplo. Dessa forma, os

desenhos não tinham traçados tão definidos quanto os que podiam ser feitos

com um lápis numa superfície plana. Além disso, a arte da criança tinha um

valor menor, visto que não havia jeito de ser guardada, já que na areia seu

desenho facilmente se apagava.

Tal como nos apresenta Pimentel (2010), a partir dos conceitos

pedagógicos como os de Rousseau, as crianças deixaram de ser comparadas

aos adultos e seus desenhos puderam passar a ser vistos como parte de seu

desenvolvimento gráfico, revelando a originalidade da infância.

Segundo Rousseau, “A liberdade da criança é algo que deve ser

desenvolvido no processo de pensar a si próprio. A criança deve seguir o seu

próprio caminho e não seguir à risca as regras e os ditames dos adultos.”

(ROUSSEAU apud PIMENTEL, 2010, p. 57)

No esteio de Rousseau, já no século XX, Piaget e Vygotsky investiram

em corroborar a ideia de uma criança com especificidades ao longo de seu

desenvolvimento, especificidades, estas, presentes em suas produções. Assim

é possível passar a ver o desenho infantil com características próprias e não

como desenhos errados em comparação ao desenho adulto.

Estando presente em todas as culturas e etapas de desenvolvimento da

humanidade como produção fundamental à comunicação e à expressão, o ato

de desenhar, no entanto, no que diz respeito ao universo educacional de nossa

cultura, se faz presente principalmente na educação infantil. É nesse momento

que a criança tem a oportunidade de expressar-se através de seu desenho.

No próximo capítulo veremos a importância que é dada ao desenho da

criança na educação infantil, mas também intentamos pensar o quanto que o

desenho deveria ser aproveitado nas outras etapas educacionais,

considerando sua capacidade expressiva, comunicativa e sua presença na

cultura desde sempre e na atualidade.

13

CAPÍTULO II IMPORTÂNCIA DO DESENHO NA EDUCAÇÃO

INFANTIL

Os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN – são referência para o

ensino de todo o país. Seu objetivo é assegurar e garantir que o ensino se dê

de forma igualitária para todas as crianças e jovens do Brasil,

independentemente de suas condições socioeconômicas. Mesmo que não

sejam obrigatórios, são previstos que serão adaptados e aplicados às

condições de cada instituição.

A partir da leitura do Referencial Curricular Nacional (RCN) para a

Educação Infantil, que integra a série de documentos do PCN, constatamos

que só é possível encontrarmos algo que diga respeito ao desenho na escola

dentro da área de Artes Visuais, previsto na página 83. Todavia, o que

podemos notar, é que muitas coisas que são prerrogativas da educação infantil

também são trabalhadas quando se desenha. “As Artes Visuais estão presentes no cotidiano da vida infantil. Ao rabiscar e desenhar no chão, na areia e nos muros, ao utilizar materiais encontrados ao acaso (gravetos, pedras, carvão), ao pintar os objetos e até mesmo seu próprio corpo, a criança pode utilizar-se das Artes Visuais para expressar experiências sensíveis.” (BRASIL. MEC. Referencial Curricular Nacional, 1998, p. 85)

Tal como apresentado pelo Referencial Curricular Nacional, os trabalhos

das crianças revelam a influência externa que sofreram, as oportunidades que

tiveram, a época histórica que viveram, suas ideias e, até mesmo, o potencial

para reflexão sobre determinada obra.

Estando de acordo com o Referencial em sua afirmação de que as Artes

Visuais devem ser consideradas como linguagem e devem articular três

aspectos: fazer artístico, apreciação e reflexão, entende-se ser importante que,

além de saber explorar e se expressar por meio do desenho, a criança saiba

refletir sobre suas obras e a de outros artistas. Seguindo esses princípios,

caberia à escola proporcionar essas oportunidades aos seus alunos, os

incluindo como artistas, valorizando, assim, sua arte e, também, trazendo uma

14

diversidade maior de artistas consagrados para o conhecimento e estudo

dentro da escola, mesmo na educação infantil.

Nesta direção, vale ressaltar os objetivos de Artes Visuais estabelecidos

para crianças de quatro a seis anos, além dos objetivos determinados para

crianças de zero a três anos. Para crianças de zero a três anos as instituições

devem garantir que elas sejam capazes de:

• “ampliar o conhecimento de mundo que possuem, manipulando

diferentes objetos e materiais, explorando suas características,

propriedades e possibilidades de manuseio e entrando em contato

com formas diversas de expressão artística;

• utilizar diversos materiais gráficos e plásticos sobre diferentes

superfícies para ampliar suas possibilidades de expressão e

comunicação”. (BRASIL. MEC. Referencial Curricular Nacional, 1998,

p. 95)

Encontramos para as crianças de quatro a seis anos mais dois objetivos

que merecem destaque:

• “interessar-se pelas próprias produções, pelas de outras crianças

e pelas diversas obras artísticas (regionais, nacionais ou

internacionais) com as quais entre em contato, ampliando seu

conhecimento de mundo e da cultura;

• produzir trabalhos de arte, utilizando a linguagem do desenho, da

pintura, da modelagem, da colagem, da construção,

desenvolvendo o gosto, o cuidado e o respeito pelo processo de

produção e criação”. (BRASIL. MEC. Referencial Curricular

Nacional, 1998, p. 95)

Considerando que a socialização, a ampliação do conhecimento de

mundo e do conhecimento cultural, permitindo o amplo desenvolvimento do

sujeito e contribuindo para que ele participe da sociedade de forma cidadã e

colaborativa, são funções da escola, podemos entender que as produções

artísticas têm muito a colaborar em todo percurso escolar, não somente na

educação infantil. A Lei de Diretrizes e Bases garante pelo artigo 32 na sessão

lll do Ensino Fundamental que a arte não deve estar presente somente na

educação infantil:

15

“O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante: II – a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamental a sociedade”. (BRASIL. MEC. Diretrizes e Bases da Educação Nacional, 1996.)

Caberia, então, a todas as escolas incluir os objetivos previstos pelo

Referencial Curricular Nacional em seus planejamentos, a fim de valorizar cada

vez mais as produções artísticas presentes em nossa cultura e as de outros

locais, como também valorizar a produção de cada aluno, o que consideramos

o mais importante dentro de uma escola. Deve-se respeitar a produção alheia,

valorizando o que o outro faz de diferente, refletindo sobre o que isso pode

acrescentar ao conhecimento de cada um como sujeito e ao respeito à

diferença.

Contudo, consideramos de extrema importância que o professor saiba

um pouco mais sobre cada aluno e qual relação ele tem com a arte, incluindo o

desenho. O primeiro contato que a criança tem com o desenho, na maioria das

vezes, acontece antes dela ingressar no espaço escolar. Muitas crianças já

vivenciaram em casa, com sua família, e através dos meios de comunicação,

como revistas, jornais e nos desenhos animados que assistem na televisão

desenhos nas mais variadas formas. Contudo, algumas nunca tiveram a

oportunidade de pegar num lápis, grafite ou de cor, para desenhar. Muitos pais

esperam que a criança entre na escola para conhecer esta atividade. Nesse

momento a criança entra na escola e lhe possibilitam experimentar um lápis e

um papel, assim como participar junto com outras crianças que desenham

habitualmente onde os desenhos são partilhados e realizados em conjunto.

Por essa partilha e produção coletiva, é possível perceber uma mudança

qualitativa no desenho da criança a partir do momento em que ela ingressa na

escola, mesmo que o desenho já tenha surgido muito antes desse momento. E

ainda, considerando o Referencial Curricular Nacional, é função do educador

promover essa integração e essa troca para que os objetivos da educação

sejam alcançados. Para além da autoexpressão, trata-se de uma expressão

com outros e para outros, produzindo conhecimento coletivo. No entanto, ainda

que o ingresso na escolarização possa ocorrer de forma positiva, através de

oportunidades de desenvolvimento e ampliação do repertório da produção

16

gráfica, também pode acontecer de a escolarização diminuir esse repertório e,

mesmo, ser prejudicial ao grafismo, caso trabalhemos com uma visão que

considere a infância e o grafismo infantil como imperfeições em comparação ao

grafismo adulto, como dito anteriormente.

Devemos entender que as instituições escolares poderiam ajudar a

aguçar os sentidos e a curiosidade da criança de experimentar e descobrir

coisas novas. A escola nos dá a ideia de que o processo de desenvolvimento

de seus alunos define para a criança: “como sou”, “como devo ser” e “como

faço para ser”. Assim, desde a educação infantil, a construção de

conhecimento está em jogo, não apenas os cuidados com asseio e

alimentação. Há muito discutimos que a escola não tem o papel de babá, como

podem ainda pensar alguns adultos e pais, mas serve ao desenvolvimento

integral dos indivíduos ou àquilo que Guimarães (2009) chama de cognição

corporificada. “Assim, a educação compromete-se com o desenvolvimento da ‘cognição corporificada’, ou seja, relaciona-se não só com o que acontece na mente, no racional, na lógica, mas envolve especialmente o corpo e a emoção. Principalmente, relaciona-se com a ideia da aprendizagem não só como solução de problemas, repetição do modelo de mundo adulto, mas como criação de sentidos sobre o mundo, invenção de possibilidades, com o corpo inteiro.” (GUIMARÃES, 2009, p. 94 In CORSINO, 2009)

Como a educação infantil é, em geral, o início do contato da criança com

a escola, é comum que, ao recebê-las o professor, de imediato, sugira uma

atividade que lhe parece lúdica e escolha algo que envolva o grafismo, por ser

prazeroso para quase todas as faixas etárias das crianças que estão na

educação infantil. Porém, muitas escolas impõem o que a criança deve

representar em seus desenhos, como casa, árvore, sol, carro, entre outros. A

repetição constante dessa prática pode acabar por empobrecer o desenho

infantil. É possível que dessa maneira a criança perca o interesse por uma

atividade que gostava tanto de fazer, já que antes se considerava “livre” para

expressar-se como quisesse. Entretanto, é importante desafiar a criança,

propondo algo a ser desenhado. A tensão entre o direcionamento e a liberdade

é sempre uma questão a ser enfrentada pelos professores. No entanto, o

principal problema que podemos pensar não é a proposição de temas para o

17

desenho, mas as expectativas dos professores em relação à produção dos

alunos.

Pillar (2012) ressalta a importância do contato direto entre a criança e o

objeto para a produção do desenho: “Por desenho compreende-se, aqui, o

trabalho gráfico da criança que não é resultado de uma cópia, mas da

construção e da interpretação que ela faz dos objetos, num contexto

sociocultural e em uma época”. (PILLAR, 2012, p. 43)

O professor, muitas vezes, espera que as crianças representem os

objetos como eles realmente são. Poucos entendem que a criança não

necessariamente irá reproduzir fielmente o objeto como condiz com sua

realidade. Ela reproduz o objeto a partir do contexto sociocultural que está

inserida, como afirma Pillar (2012).

Luquet (1969) enfatiza que o objeto serve apenas como modelo e

sugestão, pois a criança irá desenhar o modelo interno 1. Mesmo que ela não

veja o objeto por completo, irá desenhar tudo que considera essencial.

Dependendo da instituição de ensino e do professor, a atividade

pedagógica desenvolvida com a criança pode ser enriquecedora. O contato

com outras crianças contribui para que a criança perceba outras produções. Já

o professor tem o importante papel de estimular e convidar seus alunos para

que eles possam refletir sobre suas produções e as de outras pessoas. “O fortalecimento do aluno no papel de desenhista pode ser importante. Essa ação do professor bastará para algumas crianças se desprenderem dos estereótipos. Mas, em geral, é preciso criar intervenções didáticas, como as de sugerir meios e suportes diferentes, oferecer imagens da arte para a criança trabalhar a partir delas ou vincular seus desenhos às suas experiências”. (IAVELBERG, 2013)

A afirmativa acima nos revela o que muitas crianças vivem nos dias de

hoje, como, por exemplo, a sensação que têm ao experimentarem diferentes

maneiras para desenhar. É importante ensaiar exercícios de coordenação de

psicomotricidade fina através de exercícios de psicomotricidade ampla, em que

os alunos utilizam o corpo como um todo para desenhar.

Quando se está desenhando, dependendo do tipo de proposta que é

utilizada com o desenho, outras muitas coisas estão sendo trabalhadas, como 1 Luquet afirma que: “(...) O nome modelo interno é destinado a distinguir claramente do objeto ou modelo propriamente dito esta representação mental que traduz o desenho”. (LUQUET, 1969, p. 81.)

18

por exemplo, a sociabilidade, a coordenação motora, comparação com critérios

estabelecidos, entre outros.

Para as crianças de quatro a seis anos, o Referencial Curricular

Nacional estabelece alguns objetivos para a presença do movimento na

educação infantil, sendo eles:

• “ampliar as possibilidades expressivas do próprio movimento, utilizando

gestos diversos e o ritmo corporal nas suas brincadeiras, danças, jogos e

demais situações de interação;

• explorar diferentes qualidades e dinâmicas do movimento, como força,

velocidade, resistência e flexibilidade, conhecendo gradativamente os limites e

as potencialidades de seu corpo;

• controlar gradualmente o próprio movimento, aperfeiçoando seus

recursos de deslocamento e ajustando suas habilidades motoras para

utilização em jogos, brincadeiras, danças e demais situações;

• utilizar os movimentos de preensão, encaixe, lançamento etc., para

ampliar suas possibilidades de manuseio dos diferentes materiais e objetos;

• apropriar-se progressivamente da imagem global de seu corpo,

conhecendo e identificando seus segmentos e elementos e desenvolvendo

cada vez mais uma atitude de interesse e cuidado com o próprio corpo”.

(BRASIL. MEC. Referencial Curricular Nacional, 1998, p. 27).

Tal como afirma o Artigo 29º da Seção II, previsto na página 12 da Lei

de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB): “A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança, até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade”. (BRASIL. MEC. Diretrizes e Bases da Educação Nacional, 1996, p. 12)

É importante notar que tanto o Referencial Curricular Nacional quanto a

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional enfatizam que faz parte da

educação infantil desenvolver integralmente a criança em todos os aspectos.

Neste sentido, as artes e o desenho têm muito a colaborar com esse

desenvolvimento, não só na educação infantil.

Corsino (2009) vai ao encontro dessas ideias quando afirma que: “Acreditamos que é também a própria escola que, reorganizando seus espaços e tempos para as manifestações infantis, pode caminhar na contramão da fragmentação, tornando-se um lugar de

19

valorização dos gestos expressivos por meio de jogos, brincadeiras, narrações, desenhos, imitações e dramatizações capazes de ampliar as possibilidades de as crianças se dizerem, de trocarem afetos, de viverem suas emoções e aguçarem sua sensibilidade.” (CORSINO, 2009, p. 57-58)

No próximo capítulo abordaremos a relação entre o desenho, o

desenvolvimento e a aprendizagem, analisando a visão de cada autor mediante

as etapas de desenvolvimento do grafismo.

20

CAPÍTULO III A RELAÇÃO ENTRE O DESENHO E O

DESENVOLVIMENTO DA APRENDIZAGEM

Para Luquet (1969) o que caracteriza o desenho infantil em seu conjunto

denomina-se realismo, classificando, assim, o desenvolvimento do desenho em

três níveis. O primeiro nível é conhecido como realismo fortuito, sendo dividido

em dois momentos. O primeiro momento é involuntário e a criança rabisca sem

ter consciência de que aqueles traçados podem representar algum objeto. Já o

segundo momento é voluntário, onde a criança dá início ao desenho com uma

intenção que pode não ser a mesma da representação final, já que interpreta o

que fez com o que acha que possa parecer. Segundo Luquet, a criança

encontra-se neste nível até, aproximadamente, os dois anos e meio. É

característico das crianças menores o predomínio das garatujas.

No segundo nível encontram-se crianças dos três aos cinco anos que

representam objetos exagerando ou deixando de desenhar determinadas

partes. Esse nível é denominado realismo falhado ou incapacidade sintética.

O terceiro nível, conhecido como realismo intelectual, é onde as crianças

fazem o desenho utilizando o recurso da “transparência”, tornando necessário

desenhar tudo o que conhece do objeto. Como exemplo, podemos citar quando

ela desenha um avião e o que há dentro dele.

Luquet (1969) está entre os autores que, segundo artigo de Silva (1998),

acredita que o desenho infantil está ligado a uma visão maturacionista, onde o

processo é desconsiderado, para assim, considerar o resultado final da

produção gráfica. Neste grupo estão também Goodnow (1979) e Mèredieu

(1974). Segundo esta visão muitos meios externos não são considerados

influentes na produção da criança e sim como prejudiciais à produção do

desenho. Nesta visão, o desenvolvimento do desenho segue uma diretriz

predeterminada sem sofrer influência das condições externas do desenho. Se

seguirmos esta visão, o ambiente escolar não teria em que colaborar com o

desenho, senão para prejudicá-lo, e tampouco o desenho teria a colaborar com

as aprendizagens em geral, por ser um processo isolado.

21

Ainda de acordo com Silva (1998), diferentemente da visão

maturacionista, Gombrich (1986) afirma que determinadas obras só ocorrem

por causa do meio em que o artista vive e através dos contextos sociais que

convive. Esta afirmação pode servir para uma reflexão a partir das obras

infantis que valorize as especificidades do ambiente escolar e das funções e

objetivos que esta coloca para a educação infantil. Neste sentido, as propostas

da professora ou a interação com a turma podem interferir na construção do

desenvolvimento do desenho infantil, seguindo mais a linha de Gombrich

(1986).

A visão maturacionista também não analisa o papel da fala diante o

desenho infantil. Porém, alguns autores, como Silva (1998) e Vygotsky (1988),

entendem que a fala ocorre no processo de nomear as etapas do desenho.

De início a criança nomeia seu desenho ao terminá-lo. Porém, essa

nomeação sofre diversas mudanças. O desenho pode ser chamado de casa,

num outro dia ser uma árvore, num outro ser uma bola, e assim por diante. Aos

poucos essa nomeação passa a acompanhar o desenho. É possível que ela

nomeie seu desenho após realizar alguns traços ou até mesmo

simultaneamente. Ao final do processo de nomeação das etapas do desenho, a

criança, por sua vez, nomeia sua produção antes de realizá-la. Ao planejar seu

desenho, há intenção representativa e a criança ordena o que será feito por

meio da fala.

Essa organização, através da linguagem e da fala, das ações citadas

anteriormente é apontada por Vygotsky (1988), que considera a fala um

recurso que vai mediar a relação entre o sujeito com os outros e com ele

mesmo, através da ordenação e orientação de sua produção e comportamento.

A partir das observações realizadas na escola, encontramos diretrizes

que permitem pensarmos da mesma maneira que Vygotsky (1969) quando ele

afirma sobre o papel da linguagem oral no processo gráfico das crianças. Para

as crianças mais jovens, a fala tem como função organizar o desenho. Já para

as crianças de mais idade a função é de orientar o desenho.

“[...] Um bebê começa por desenhar, decidindo depois o que é aquilo

que desenhou; numa idade ligeiramente superior, nomeia o seu desenho

22

quando este se encontra meio feito; e, por fim, decide antecipadamente aquilo

que vai desenhar.” (VYGOTSKY, 1969, p.23)

De acordo com as ideias de Vygotsky (1969) é possível notar que a

criança tem sua fala orientando o desenho quando diz o que vai desenhar, para

depois o fazer. Isso acontece quando ela diz “Vou desenhar o sol” e assim o

faz, sendo orientada pela palavra. Simultaneamente, temos o inverso, quando

o desenho organiza a palavra. Ao desenhar, por exemplo, seu grafismo sugere

um coração. A criança, assim, denominará sua ação gráfica. Porém, o ato de

desenhar é constituído por estes dois movimentos concomitantemente.

Por outro lado, Piaget (1976) afirma que a origem do conhecimento

ocorre quando o sujeito interage com o objeto. Como tal objeto é observado e

percebido pelo sujeito vai depender das estruturas mentais que ele possui no

momento. Assim, o objeto seria mais determinante do desenho do que a fala,

sendo ela mesma desenvolvida em decorrência de interiorizações e

construções simbólicas feitas a partir da ação sobre os objetos.

A relação do desenho com o entorno, suas condições de produção e a

socialização estão indicadas no Referencial Curricular Nacional, apontando

para a relação do desenho com a aprendizagem desejada na educação infantil.

No RCN para a Educação Infantil é possível encontrarmos orientações

didáticas para os professores. Inclusive, há uma atividade que ajuda no

desenvolvimento do desenho da criança, qual seja: a de partir de uma

produção já feita sugerir que a criança copie sua produção em escala menor ou

maior. Essa atividade possibilita que a criança reflita sobre sua produção e

organize de outra maneira seus traçados no papel.

Outras atividades são sugeridas para que os professores tenham base

para as atividades que pretendem realizar com seus alunos, mesmo que não

precisem seguir passo a passo das atividades propostas pelo Referencial.

A partir da leitura do RCN poderíamos entender que as instituições que

não permitem a movimentação da criança enquanto esta exerce uma atividade

como escrita ou desenho não favorecem a aprendizagem, visto que o corpo é

importante para realizar essas atividades. Tais educadores acreditam que se

não suprimirem os movimentos, a criança não conseguirá se concentrar, além

do fato de que a movimentação dos alunos parece não corresponder com a

23

disciplina que eles crêem que a sala de aula deva ter. Entretanto, impossibilitar

a movimentação da criança poderá dificultar seu pensamento e concentração.

Guimarães (2009) nos alerta sobre a importância de trabalhar com as

crianças, seu corpo e movimentos: “Portanto, se considerarmos uma criança ativa, exploradora e criadora de sentidos, é preciso pensar um espaço e um educador que deem apoio aos seus movimentos, que incentivem sua autoria e autonomia, que contribuam para a diversificação de suas possibilidades.” (GUIMARÃES, 2009, p. 94-95 in CORSINO, 2009)

O próximo capítulo irá abordar a descrição do papel do psicopedagogo

nas escolas e as diferentes técnicas de intervenção que utilizam o desenho

como base.

24

CAPÍTULO IV O PSICOPEDAGOGO E AS TÉCNICAS DE

INTERVENÇÃO QUE UTILIZAM O DESENHO

Há muito discute-se sobre a área de atuação do psicopedagogo e qual

seria o seu papel dentro das instituições de ensino. O objeto de estudo do

psicopedagogo passou por diferentes mudanças. De início, era o indivíduo que

não podia aprender, para, depois, o fato deste indivíduo não aprender. Chegou-

se a conclusão, então, que o objeto de estudo deveria ser sempre o sujeito em

processo de aprendizagem. Bossa nos traz, brevemente, o surgimento da

psicopedagogia e seus desdobramentos: “Historicamente, a Psicopedagogia nasceu para atender à patologia da aprendizagem, mas ela se tem voltado cada vez mais para uma ação preventiva, acreditando que muitas dificuldades de aprendizagem se devem à inadequada Pedagogia institucional e familiar. A proposta da Psicopedagogia, em uma ação preventiva, é adotar uma postura crítica diante do fracasso escolar, em uma concepção mais totalizante, visando propor novas alternativas de ação voltadas para a melhoria da prática pedagógica nas escolas” (BOSSA, 2000, p. 48)

Temos encontrado cada vez mais psicopedagogos atuando nas escolas

do Rio de Janeiro, mesmo que a psicopedagogia no Brasil ainda não tenha se

concretizado como profissão legalmente. É comum que as escolas indiquem às

famílias estes profissionais como um serviço a parte da instituição,

principalmente quando a equipe escolar observa alguma necessidade de

intervenção com o aluno.

O trabalho do psicopedagogo é de caráter preventivo e visa criar e

desenvolver habilidades e/ou potencialidades para que os problemas sejam

solucionados e, para isso, é necessário o conhecimento sobre o

desenvolvimento cognitivo. O mesmo pode atuar na escola com os educadores

e equipe de profissionais, como uma formação complementar, ou até mesmo

com os próprios alunos.

Seja dentro ou fora da escola, o trabalho do psicopedagogo vai dialogar

com o que é realizado pela instituição escolar e pela família do sujeito. É

preciso que haja avaliações, utilização de instrumentos especializados e

25

estratégias para atender ao indivíduo, além de um planejamento para dar início

e continuidade às intervenções.

As atividades propostas pelo psicopedagogo podem se tornar mais

significativa para quem vivencia, quando estas envolvem sons, movimentos e

imagens, o que faz com que a aproximação do aluno ocorra de maneira mais

natural e envolvente.

Algumas pesquisas apontam a utilização do desenho como um

mecanismo para avaliar as crianças e o seu desenvolvimento, visto que este é

um recurso facilitador da comunicação verbal. A representação gráfica pode

indicar e registrar sentimentos, conhecimento, percepções, vivências, entre

outras abordagens que uma criança vivencia durante a sua interação social

com o meio e com os outros.

Segundo Weiss, “O uso do desenho em Psicopedagogia aproveita uma

forma de a criança expressar-se espontaneamente, satisfazendo seus desejos

de atividade lúdica”. (WEISS, 2004, p. 120)

É possível apoiar-se nas técnicas que utilizam o grafismo para realizar

intervenções psicopedagógicas com as crianças da educação infantil. Vejamos

a seguir algumas abordagens com o uso do desenho, possíveis de serem

aplicadas nas instituições de ensino com o trabalho de um psicopedagogo.

4.1 Técnicas projetivas As técnicas projetivas têm como finalidade extrair do sujeito o que ele

realmente é, em diferentes perspectivas, como os processos de sua

personalidade e a expressão do seu mundo pessoal.

Como nos afirma Weiss, “Algumas propostas são de situações

nitidamente escolares, outras ligadas à família, à vida em geral, mas sempre

buscando o viés da aprendizagem”. (WEISS, 2004, p. 122)

Visca reuniu algumas técnicas projetivas psicopedagógicas com o

objetivo de identificar e investigar o vínculo que o sujeito estabelece entre os

domínios: escolar, familiar e consigo mesmo. As técnicas desenvolvidas por ele

se diferenciam em:

26

• “Par educativo, Planta da sala de aula e Eu com os meus colegas

- para investigar predominantemente os vínculos no âmbito

escolar;

• A planta da minha casa, Família Educativa e As quatro partes de

um dia – para estudar o vínculo em relação ao espaço familiar;

• O desenho em episódios, O dia do meu aniversário, Em minhas

férias e Fazendo o que mais gosto – para observar

predominantemente a relação consigo mesmo”. (VISCA, 2008)

Para decidir qual(quais) teste(s) utilizar e em que momento, cabe ao

psicopedagogo que está atuando e trabalhando com o sujeito a ser observado.

Com base na faixa etária em que estamos abordando nesse trabalho, a

técnica mais apropriada a ser aplicada para as crianças da educação infantil é

“O desenho em episódios”, também conhecida por “Os quatro momentos de

um dia” ou “As quatro partes de um dia”. Os desenhos deverão ser analisados

em um contexto e não de forma isolada. É comum ser indicado para crianças a

partir de 4 anos de idade.

O psicopedagogo entregará uma folha ao indivíduo que será analisado e

lhe mostrará como deve fazer. Ele dobra a folha em quatro partes e lhe pede

que faça o mesmo.

Solicita-se que seja desenhado quatro momentos do seu dia, desde

quando acorda até quando vai dormir. Após esse desenho, pede-se que relate

o que está acontecendo e o psicopedagogo faz intervenções com perguntas de

detalhes e sobre o relato.

Visca (2008) afirma que ao precisar escolher quatro momentos do dia e

estabelecer uma sequência entre eles, a criança hierarquiza os momentos

privilegiados e os relaciona em ordem temporal. Isto vai ser um facilitador para

investigar os vínculos que essa criança estabelece.

4.2 Desenho-Estória Walter Trinca, um estudioso contemporâneo dos desenhos na educação

infantil como instrumento de intervenção, sistematizou um método em que se

aplica desenhos associados a estórias.

27

Essa técnica pode ser utilizada com crianças e adolescentes, entre 5 e

15 anos, não descartando a possibilidade de ser usada com adultos também.

Os materiais a serem utilizados deverão seguir os padrões, sendo eles:

folhas de papel em branco tipo ofício, lápis de cor, lápis número 2.

Para realizar essa proposta, é necessário que o indivíduo que está

sendo avaliado realize cinco desenhos livres (acromáticos ou cromáticos).

Após esse momento, contará as estórias, dará um título e o psicopedagogo

poderá intervir com questionamentos sobre as mesmas. O indivíduo que aplicar

a técnica deverá permanecer atento a todo o processo de realização desses

desenhos, assim como ao que é contado pelo sujeito avaliado.

Cabe ressaltar que para realizar essa técnica, é importante que haja um

vínculo estabelecido entre quem vai aplicar, no caso o psicopedagogo, e a

criança, no caso o aluno.

É possível que em uma sessão os desenhos não sejam finalizados,

podendo dar continuidade a eles posteriormente, em outro encontro.

4.3 Desenho de família com estórias Para essa abordagem o foco é a convivência familiar, que tem por

finalidade a avaliação de dinamismos conscientes e inconscientes relacionados

à família.

O psicopedagogo deverá solicitar ao sujeito analisado que faça alguns

desenhos com os mesmos materiais da técnica citada anteriormente. Os

desenhos deverão respeitar a seguinte ordem:

1- Desenhe uma família qualquer.

2- Desenhe uma família que você gostaria de ter.

3- Desenhe uma família onde alguém não está bem.

4- Desenhe sua própria família.

Assim como a outra técnica de desenho com estória, o psicopedagogo

deverá e poderá intervir com perguntas, após cada consigna ter sido realizada,

e solicitar que o sujeito que fez os desenhos crie um título para as estórias.

28

CONCLUSÃO

Em vista dos autores apresentados, conclui-se que existem divergências

entre o que pensam sobre as etapas do grafismo e a importância do desenho

na educação infantil. Há também alguns autores que se aproximam mais do

pensamento de outros, seguindo a mesma linha de raciocínio ou se baseando

no pensamento de outro autor.

A partir da bibliografia utilizada para realização deste trabalho é possível

dizer que o desenho na educação infantil tem papel fundamental na formação e

construção do conhecimento da criança. É preciso entender que desenhar faz

parte do processo do desenvolvimento da linguagem do sujeito, podendo se

perceber isso através da autoexpressão da criança em seus grafismos. É no

desenho que a criança transmite o que sente e vê do mundo em que vive, além

de ser o momento em que pode colocar em prática sua imaginação e

criatividade.

Através de seus traçados podemos observar diferentes formas, cores,

tamanhos, símbolos, entre outros, podendo nos revelar ou não a mensagem

que a criança transmitiu em sua produção gráfica.

Nas escolas dos dias de hoje já encontramos recursos, materiais,

técnicas e suportes suficientes para o pleno desenvolvimento dos alunos? É

possível ampliar e melhorar as condições das instituições?

Guimarães (2009) nos remete à realidade da maior parte das escolas

brasileiras, quando afirma que:

“A diversidade de materiais é um desafio para a realidade brasileira. [...] Objetos do cotidiano de nossa vida social, às vezes, interessam mais às crianças do que os que são produzidos para elas; é importante ficarmos atentos a isso, ampliando suas possibilidades de interação e contato com superfícies, formas e texturas.” (GUIMARÃES, 2009, p. 102-103 In CORSINO, 2009)

De acordo com as atividades plásticas que encontramos nas escolas e o

papel do psicopedagogo, pensamos em técnicas possíveis de serem utilizadas

durante as intervenções com as crianças dentro das instituições.

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Os traçados ganham complexidade conforme seu progresso, de forma

que impulsione o desenvolvimento expressivo e cognitivo das crianças. De

início a criança rabisca pelo simples prazer de ocupar a folha e perceber o que

um lápis com o auxílio de suas mãos é capaz de fazer. Usam a força, leveza,

rapidez, lentidão, movimentos circulares, repetidos ou aleatórios, de forma

inconsciente, observando a transformação de seus rabiscos. Com o tempo, a

criança busca representar o mundo no papel, sendo essa uma forma de lidar

com as emoções e as situações do dia a dia.

Um ponto em questão é a desvalorização do desenho, dentro do

ambiente escolar, quando as crianças tornam-se jovens. Os alunos parecem

não ter interesse em desenhar e os educadores demonstram insatisfação em

dar um tempo para essa atividade dentro da sua sala de aula. Considera-se

que os conteúdos são muitos e que o tempo é curto para pensar-se em

desenhar. O professor e a escola, na maioria delas, argumentam que o

desenho faz parte da infância, da educação infantil. Porém, errôneo dizer que,

por ter saído da educação infantil, deixou de ser criança e fazer parte da

infância.

Qualquer idade em que esteja o aluno, ao estar dentro do ambiente

escolar, necessita de estímulo para desenhar, expressar seus sentimentos,

emoções e desejos, desenvolver sua criatividade, imaginação e seu

pensamento. Em nenhum momento, por maior que seja a quantidade de

conteúdos, deve-se desmerecer o desenho para os alunos. O professor e a

escola precisam ser os primeiros a apoiar e incentivar que o desenho faça

parte de toda a trajetória escolar e desenvolvimento do aluno como indivíduo.

Vale ressaltar que o professor e o psicopedagogo têm papel

fundamental de mediador e interventor, devendo orientar os alunos e

diversificar os recursos, suportes, materiais, técnicas e, até mesmo, os desafios

a oferecer a eles. Entretanto, é necessário que a escola seja um ambiente

estimulador para o desenvolvimento de seus alunos, também com a função de

intervir nesse processo. Algumas crianças dizem que não sabem desenhar.

Nesse momento, cabe, também, à escola incentivá-la, mostrando que cada um

desenha do seu jeito e que não existe certo/errado.

30

O trabalho com desenho some da escola ao passar dos anos por ele ser

subestimado. Porém, se mesmo no ensino fundamental ou ensino médio os

professores continuassem a fazer atividades com desenho, às vezes mais

facilmente conseguiriam trabalhar outras coisas, como questões estéticas e de

afeto. Tais questões são muito potentes quando trabalhadas com artes. É vital

à humanidade produzir arte. Não faz sentido a humanidade ter isso sempre

presente e algumas escolas julgarem como algo com pouca importância.

Muitas culturas não têm escrita, entretanto nenhuma não tem arte,

desenho, canto ou dança. Essas são importantes, diferente da escrita que é

possível prescindir. Na nossa cultura, mesmo, temos muitas pessoas

analfabetas, mas que produzem música e arte. Isso parece ser algo muito mais

essencial à comunicação e expressão humana do que o puro texto. Querer

isolar o texto dessas produções é um empobrecimento do texto, da arte e da

escola.

Mais do que importante, é essencial que os futuros psicopedagogos,

estudantes em formação, tenham dimensão de quão importante é o desenho

para o desenvolvimento de uma criança. Mais do que isso, é que eles saiam

preparados para lidar com o processo de desenvolvimento do sujeito, lhes

acrescentando valor e conhecimento.

O presente trabalho poderá auxiliar o trabalho do psicopedagogo, além

do professor, no que diz respeito à condição do grafismo e à relação entre o

desenho e a aprendizagem, levando, sempre, em consideração as condições

da escola e vivências dos alunos. As técnicas citadas são possíveis de serem

aplicadas dentro das instituições, além de terem muito a acrescentar às

observações e atividades de intervenção com o aluno.

31

BIBLIOGRAFIA

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32

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ÍNDICE FOLHA DE ROSTO 02 AGRADECIMENTOS 03 DEDICATÓRIA 04 RESUMO 05 METODOLOGIA 06 SUMÁRIO 07 INTRODUÇÃO 08 CAPÍTULO I A origem do desenho e sua inserção na infância 10 CAPÍTULO II Importância do desenho na educação infantil 13 CAPÍTULO III A relação entre o desenho e o desenvolvimento da aprendizagem 20 CAPÍTULO IV O psicopedagogo e as técnicas de intervenção que utilizam o desenho 24 4.1. Técnicas projetivas 25 4.2. Desenho-Estória 26 4.3. Desenho de família com estórias 27 CONCLUSÃO 28 BIBLIOGRAFIA 31