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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU OS RUMOS DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NO BRASIL Autor: Vinícius Arouca da Matta Pereira Orientador: Prof. Dr. Antônio Fernando Vieira Ney RIO DE JANEIRO - RJ 2013 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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  • UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

    INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

    PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

    OS RUMOS DA IMPROBIDADE

    ADMINISTRATIVA NO BRASIL

    Autor: Vinícius Arouca da Matta Pereira

    Orientador: Prof. Dr. Antônio Fernando Vieira Ney

    RIO DE JANEIRO - RJ

    2013

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    UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

    INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

    PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

    OS RUMOS DA IMPROBIDADE

    ADMINISTRATIVA NO BRASIL

    Autor: Vinícius Arouca da Matta Pereira

    Monografia apresentada ao

    Instituto A Vez do Mestre como

    requisito parcial para a obtenção

    do título de especialista em Gestão

    Pública.

    Orientador: Prof. Dr. Antônio

    Fernando Vieira Ney.

    RIO DE JANEIRO - RJ

    2013

  • 3

    RESUMO

    A improbidade administrativa no Brasil é um tema de extrema importância que

    afeta negativamente a gestão pública. Todos os dias, os noticiários trazem alguma

    informação acerca deste assunto que tanto prejudica a busca pela justiça social e pelo

    bem estar da sociedade. Sendo assim, o presente trabalho tem como objetivos:

    identificar a origem da corrupção no Brasil; estudar os motivos pelos quais a corrupção

    se disseminou tanto em nossa população e porque se perpetua até os dias de hoje;

    relacionar os tipos e os sujeitos da improbidade administrativa; e analisar quais os

    mecanismos a serem utilizados para se combatê-la. Os métodos utilizados na

    consecução destes objetivos foram a pesquisa bibliográfica e a pesquisa em sites da

    Internet. Inicialmente, foi analisada a corrupção no Brasil, sua origem e suas

    características. Na sequencia, foram identificados os princípios que regem a probidade;

    foram estudados os controles de prevenção e de repressão à improbidade administrativa;

    foram relacionados os tipos, os sujeitos e as sanções relacionadas aos atos de

    improbidade administrativa; e por fim, foram apresentados casos de improbidade

    administrativa ocorridos no Brasil, em âmbito federal (da década de 90 até os dias de

    hoje), para ilustrar como ocorrem os atos de improbidade na prática e como estes são

    identificados e punidos. Após todo esse estudo, concluiu-se que os mecanismos de

    controle à improbidade administrativa vêm se aprimorando e sendo mais aplicados ao

    longo dos anos, mais notadamente a partir da década de 90. Sendo assim, percebemos

    que há esperança de que, num futuro próximo, a corrupção seja reduzida, o que trará

    melhoria de vida para toda a população.

  • 4

    METODOLOGIA

    Este estudo estará voltado para a análise de atos de improbidade administrativa

    no Brasil, no âmbito da esfera federal, considerando-se o período desde a colonização

    do país até os dias de hoje. A técnica de pesquisa a ser utilizada será a pesquisa

    bibliográfica, que segundo Vieira (2007), “abrange a consulta de livros, artigos e

    matérias de jornais e revistas, da imprensa escrita ou Internet” (p. 81). No caso

    específico deste trabalho, será utilizada apenas a consulta a livros e à Internet.

    Já o tipo de pesquisa empregado será a pesquisa exploratória, pois segundo

    Vieira (2007), é o tipo de pesquisa que serve de base para outras pesquisas, buscando

    aprofundar o conhecimento sobre determinado assunto.

    Relativamente aos tipos de método existentes, aquele que será utilizado é o

    dedutivo, pois segundo Mezzaroba e Monteiro (2009), neste método “são apresentados

    os argumentos que se consideram verdadeiros e inquestionáveis para, em seguida,

    chegar a conclusões formais, já que essas conclusões ficam restritas única e

    exclusivamente à lógica das premissas estabelecidas” (p. 65).

    O estudo analisará o tema improbidade administrativa no Brasil com base em

    obras dos autores Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves e Calil Simão Neto

    (especializados no tema improbidade administrativa), Hely Lopes Meirelles (renomado

    autor de obras voltadas para o Direito Administrativo), além de Elias Freire, Mateus

    Bertoncini, Carlos Frederico Brito dos Santos, dentre outros.

    A pesquisa bibliográfica será utilizada para elaboração dos capítulos I a III. Já

    a pesquisa em sites da Internet estará mais voltada para a elaboração do capítulo IV,

    pois o referido capítulo aborda um tema dificilmente encontrado em livros.

  • 5

    SUMÁRIO

    INTRODUÇÃO .................................................................................................. 7

    CAPÍTULO I - HISTÓRICO E PRINCÍPIOS DA IMPROBIDADE

    ADMINISTRATIVA NO BRASIL .................................................................................. 9

    1.1 A ORIGEM DA CORRUPÇÃO NO BRASIL E SUAS

    CARACTERÍSTICAS ATUAIS .................................................................................. 9

    1.2 O TEMA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NAS

    CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS E A CRIAÇÃO DA LEI 8.429/92 ................... 14

    1.3 OS PRINCÍPIOS QUE REGEM A PROBIDADE ADMINISTRATIVA

    .................................................................................................................................... 16

    1.3.1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS .............................................. 17

    1.3.2 PRINCÍPIOS UTILIZADOS PELA DOUTRINA .......................... 23

    CAPÍTULO II - CONTROLE PREVENTIVO E REPRESSIVO DA

    IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA ......................................................................... 27

    2.1 CONTROLE PREVENTIVO ................................................................. 27

    2.2 CONTROLE REPRESSIVO .................................................................. 36

    CAPÍTULO III - OS TIPOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA,

    SUJEITOS E SANÇÕES ................................................................................................ 45

    3.1 TIPOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA .............................. 45

    3.2 SUJEITOS QUE PRATICAM ATOS DE IMPROBIDADE

    ADMINISTRATIVA .................................................................................................. 49

    3.3 SANÇÕES AOS ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA ... 53

    3.3.1 PERDA DOS BENS OU VALORES ACRESCIDOS

    ILICITAMENTE AO PATRIMÔNIO ................................................................... 59

    3.3.2 RESSARCIMENTO INTEGRAL DO DANO ................................ 60

    3.3.3 PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA .................................................. 60

    3.3.4 SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS ................................. 61

    3.3.5 MULTA CIVIL ............................................................................... 62

  • 6

    3.3.6 PROIBIÇÃO DE CONTRATAR COM O PODER PÚBLICO OU

    RECEBER BENEFÍCIOS OU INCENTIVOS FISCAIS OU CREDITÍCIOS ...... 63

    CAPÍTULO IV - CASOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

    OCORRIDOS NO BRASIL ........................................................................................... 65

    4.1 CASO JORGINA DE FREITAS ............................................................ 65

    4.2 IMPEACHEMENT DO PRESIDENTE COLLOR ................................ 66

    4.3 OS ANÕES DO ORÇAMENTO ............................................................ 67

    4.4 CASO LUIS ESTEVÃO E JUIZ “LALAU” .......................................... 67

    4.5 MÁFIA DOS SANGUESSUGAS .......................................................... 68

    4.6 OPERAÇÃO NAVALHA ...................................................................... 69

    4.7 ESCÂNDALO DOS BINGOS ............................................................... 70

    4.8 QUEBRA DO SIGILO DO CASEIRO .................................................. 71

    4.9 OPERAÇÃO SATIAGRAHA ................................................................ 72

    4.10 ATOS SECRETOS ............................................................................... 72

    4.11 MENSALÃO ........................................................................................ 73

    CONCLUSÃO .................................................................................................. 75

    BIBLIOGRAFIA .............................................................................................. 76

    WEBGRAFIA .................................................................................................. 77

  • 7

    INTRODUÇÃO

    O presente estudo irá abordar o tema: a improbidade administrativa no Brasil.

    Todos os dias, nos deparamos com notícias relacionadas a esse tema e então surge o

    seguinte questionamento: por que há tantos atos de improbidade administrativa no

    Brasil e o que pode ser feito para evitá-los?

    Uma hipótese que responderia esta pergunta é a seguinte: a corrupção no Brasil

    tem origens na colonização e ela se perpetua até os dias de hoje, porém mecanismos

    como a Lei de Improbidade Administrativa e os recentes julgamentos ocorridos no STF

    indicam um caminho para a diminuição destas práticas viciosas no Brasil.

    Com o objetivo de confirmar esta hipótese, o presente trabalho analisará o

    histórico da corrupção no Brasil, identificará os princípios que regem a probidade;

    descreverá os controles preventivo e repressivo da improbidade administrativa, estudará

    os tipos, os sujeitos e as sanções relacionadas aos atos de improbidade administrativa; e

    por fim, analisará casos de improbidade administrativa de grande repercussão ocorridos

    no Brasil, em âmbito federal (da década de 90 até os dias de hoje).

    Para falarmos sobre improbidade administrativa precisamos, inicialmente,

    estudar os conceitos de poder e corrupção. Poder está relacionado à ideia de força,

    capacidade, sucumbência. Pode ser visto, também, como um fenômeno social que

    decorre da relação interpessoal, no qual a força, em suas mais distintas formas (política,

    econômica e psicológica, por exemplo), faz com que uma pessoa imponha sua vontade

    sobre outra. Esta condição de superioridade que o poder traz, faz com que algumas

    pessoas percebam que o poder pode significar também vantagens ou benefícios. Desse

    modo, é de certa forma fácil entendermos o surgimento da corrupção. Corrupção

    significa o ato de desvirtuamento de uma regra social vigente. O sujeito corrupto se

    utiliza de sua posição de poder para obter proveito próprio. Muitas vezes o corrupto se

    apodera de recursos que seriam aplicados para a melhoria da condição de vida de toda

    uma população para beneficiar apenas a si mesmo.

    Portanto os termos improbidade administrativa, poder e corrupção estão

    interligados. O ímprobo é uma pessoa desonesta que se aproveita de seu poder para

    praticar atos que resultem em benefícios para si próprio ou para outrem. O ímprobo é

  • 8

    desprovido de moral e desrespeita as normas vigentes na busca por vantagens pessoais

    em detrimento da coletividade.

    Porém a sociedade busca exatamente o oposto ao ímprobo. Espera-se que todo

    agente público seja probo. Probidade significa honestidade, honradez, integridade de

    caráter, lealdade, virtude. Todos os atos praticados por agentes públicos devem estar de

    acordo com os princípios e as regras que os informam.

    Tendo em vista a extrema dificuldade de haver apenas agentes públicos probos

    na Administração Pública, foram criados diversos mecanismos de combate à corrupção.

    Dentre eles temos inclusive convenções internacionais, uma vez que a corrupção é um

    problema mundial. Contudo, essas convenções não serão detalhadas no presente estudo,

    pois fogem ao seu escopo. Voltaremo-nos, neste trabalho, aos mecanismos de

    prevenção e controle da corrupção existentes no Brasil, mais especificamente em

    âmbito federal.

    Estes mecanismos de combate à corrupção são fundamentais, pois a ganância

    do corrupto causa um enorme prejuízo à população. As políticas públicas ficam

    seriamente comprometidas quando ocorre corrupção. A evasão fiscal que ocorre antes

    da entrada de capital nos cofres públicos e os desvios de verbas que já fazem parte do

    orçamento do governo, acarretam, em conjunto, diminuição da redistribuição de renda,

    diminuição do montante de verba disponível para execução de políticas públicas,

    causando perdas para a sociedade e aumentando a injustiça social.

    Assim, quanto maior for a corrupção no país, menor será a implementação de

    políticas públicas. Desta forma, o custo social da corrupção é elevado, pois o revés que

    a prática traz para toda a coletividade é muito maior do que as benesses individuais,

    fruto da ilicitude, que ela pode gerar para o corrupto.

    Portanto, o esclarecimento a respeito deste tema conduz a uma conscientização

    da população, que permite a esta exigir que os agentes públicos administrem de maneira

    adequada o Erário Público. Sendo assim, este estudo visa identificar e analisar estes atos

    de improbidade administrativa, que são recorrentes no Brasil, relacionando possíveis

    maneiras de se combatê-los.

  • 9

    CAPÍTULO I

    HISTÓRICO E PRINCÍPIOS DA IMPROBIDADE

    ADMINISTRATIVA NO BRASIL

    A improbidade administrativa se manifesta de diversas formas, porém a mais

    incidente delas é, sem dúvida, a corrupção. Por este motivo, o presente capítulo

    discorrerá sobre a origem da corrupção no Brasil, suas causas, além de outros elementos

    com ela envolvidos.

    Além disso, este capítulo irá discorrer sobre os princípios que, em conjunto

    com a legislação, regem a atividade estatal, balizando a conduta dos servidores e das

    entidades, auxiliando em decisões judiciais, delimitando até mesmo a criação das leis,

    dentre outros.

    1.1 A ORIGEM DA CORRUPÇÃO NO BRASIL E SUAS

    CARACTERÍSTICAS ATUAIS

    A análise da corrupção que assola o Brasil nos dias de hoje, deve começar pela

    época da colonização do país. O sistema monárquico absolutista propiciou o surgimento

    da corrupção, como explicam Garcia e Alves (2011):

    O sistema colonial português foi erguido sobre os pilares de uma monarquia absolutista, fazendo que Monarca e administradores se mantivessem unidos por elos eminentemente pessoais e paternalistas, o que gerou a semente indesejada da ineficiência. Não bastasse isto, tinham por objetivo comum o lucro desenfreado e, como única ação, o desfacelamento das riquezas da colônia a si subjugadas, sem qualquer comprometimento com ideais éticos, deveres funcionais ou interesses coletivos. Remonta a esta época a concepção de que a coisa pública é coisa de ninguém, e que sua única utilidade é satisfazer aos interesses da classe que ascendeu ao poder. (GARCIA e ALVES, 2011, p.4).

    Portanto, a ideia dos administradores de enriquecer às custas do patrimônio

    público está presente desde o tempo do descobrimento do Brasil.

    Com o passar dos anos, a situação não se alterou muito. No início do século

    XVIII, por exemplo, até mesmo a Igreja estava envolvida com fatos de corrupção. Os

  • 10

    chamados “frades regenerados”, a fim de evitar tributação, transportavam ouro em pó

    no interior de santos de madeira para que ninguém desconfiasse do que realmente estava

    sendo transportado, daí a expressão “santinho do pau oco”.

    A partir do início do século XIX, com a vinda da corte portuguesa para o

    Brasil, D. João VI decidiu distribuir honrarias e títulos de nobreza com a finalidade de

    conseguir apoio político e financeiro da elite local. Os títulos mais importantes eram

    concedidos àqueles que dessem mais dinheiro e apoio político à Coroa. Esse sistema

    criado por D. João VI gerou uma elite destituída de valores éticos e morais que

    ascendeu ao poder e lá se sedimentou.

    Esse tipo de “cultura” logo contaminou o próprio ambiente social e até os

    comerciantes do século XIX já se utilizavam de diversos artifícios para tentar ludibriar

    seus clientes.

    O cenário se manteve inalterado, mesmo com a proclamação da independência,

    pois os atores foram modificados, mas as atitudes não. O tráfico negreiro que foi

    considerado ilegal a partir de 1830 continuou sendo praticado no Brasil até o ano de

    1850, quando os ingleses (interessados no desenvolvimento do trabalho livre para a

    ampliação do mercado consumidor) invadiram os portos brasileiros e forçaram a

    interrupção do tráfico de escravos africanos. Este fato evidencia que o Brasil já não

    cumpria as leis e encontrava maneiras escusas de manter uma prática ilegal, utilizando-

    se de contrabando e corrupção.

    Com a proclamação da República, em 1889, começaram a ocorrer fraudes

    eleitorais. Essas fraudes perduraram até bem pouco tempo atrás, sendo contidas a partir

    da informatização das eleições.

    Sendo assim, a disseminação dessas práticas acaba sedimentando a ideia de que

    a corrupção é algo normal e inevitável, fazendo com que a corrupção se torne

    “institucionalizada” no Brasil. Este fato faz com que a sociedade releve mais os atos de

    improbidade, bem como gera uma associação da corrupção com as instituições. Porém,

    este quadro deve ser revertido. A sociedade deve rejeitar a corrupção e colaborar para

    que ela seja reduzida, pois esta prática somente traz prejuízos ao desenvolvimento do

    país e prejuízos diretamente aos cidadãos.

    Além do contexto histórico citado anteriormente, há diversas causas para a

    corrupção. Uma delas, citada por Francisco Bilac, em 1950, foi a intervenção do Estado

  • 11

    na ordem econômica. Nesse período houve uma forte descentralização com a criação de

    empresas estatais (estatização) voltadas para a exploração de atividades econômicas.

    Pessoas inescrupulosas de moral questionável, alheias ao objetivo social, que deram

    causa à criação dessas empresas e que chegaram a cargos de gestão das empresas

    estatais, contribuíram para o aumento da corrupção, na medida em que se aproveitavam

    dos lucros das empresas para desviá-los para seu proveito próprio.

    Outras causas seriam as seguintes: a sociedade que já está acostuma à

    corrupção e acaba aceitando sua prática; a remuneração insuficiente para diversos

    servidores públicos; a eleição de candidatos que receberam recursos privados para sua

    campanha e que por isso ficam sujeitos aos interesses desses financiadores (como

    veremos com mais detalhes a seguir); o fato de que o Governo gera uma burocracia

    infindável em diversos setores, causando sérias dificuldades para os administrados que

    acabam vendo na corrupção um modo mais célere de alcançar seus objetivos; dentre

    outros.

    A corrupção ocorre quando o interesse privado se sobrepõe ao interesse

    coletivo. O agente público deveria sempre buscar o bem comum e zelar pelo patrimônio

    público, porém a corrupção desvia seu propósito a fim de garantir a satisfação pessoal

    do agente e de terceiros. O corruptor aufere vantagens como, por exemplo, celeridade

    processual ou administrativa, menor custo para que possa atingir seus objetivos,

    beneficiamento para contratação com o poder público, dentre outras.

    Como a prática da corrupção é muito difundida, gera uma ausência de

    consciência coletiva, fazendo prevalecer o interesse privado sobre o público. O que é

    uma inversão daquilo que deveria ocorrer, ou seja, a prevalência do interesse público

    sobre o privado. Assim, a corrupção acaba sendo aceita pela sociedade.

    A corrupção é muito nociva à população. Porém uma população ignorante não

    é capaz de diminuir a corrupção. Quando o povo é ignorante ele não questiona os atos

    ilícitos dos agentes públicos. Estes por sua vez desviam recursos públicos em proveito

    próprio, em detrimento de políticas de desenvolvimento social, como políticas voltadas

    para a educação, por exemplo. Assim, o povo continua ignorante e este círculo vicioso

    se repete, o que o torna praticamente perpétuo.

    No campo empresarial a corrupção ocorre, em muitos casos, nas licitações. As

    empresas acabam praticando atos ilícitos para conseguirem celebrar contratos com as

  • 12

    instituições. Num ambiente já contaminado o empresário se vê compelido a praticar a

    corrupção sob pena de ser, até mesmo, excluído da competição.

    Merece destaque, ainda, a corrupção que leva o agente público a ascensão ao

    poder. Neste caso, os interesses privados pressionam o candidato eleito a realizar atos

    que favoreçam os financiadores da campanha.

    A corrupção não é o único elemento da improbidade administrativa, ou seja, a

    improbidade administrativa é composta de várias ações e omissões, dentre elas a

    corrupção. Porém, se faz necessário um estudo sobre a corrupção, pois esta é uma das

    características mais marcantes de atos de improbidade administrativa.

    A corrupção, normalmente, tem como objetivo a obtenção de uma vantagem

    direta para o corrupto ou para terceiros. Trata-se de vantagens indevidas que

    caracterizam desvio de poder e geram enriquecimento ilícito. Esta nociva prática causa

    danos à sociedade que com menos recursos públicos, vê a possibilidade de melhoria de

    vida perecer. As verbas públicas desviadas, que acabam enriquecendo o corrupto,

    deixam de ser utilizadas no campo da saúde, educação, transportes e etc.

    Como visto acima, o povo brasileiro já sofre com a corrupção a centenas de

    anos e esta acabou sendo disseminada em todos os seguimentos da nação. Com isso

    muitos cidadãos já são corruptos ou têm potencial para ser. Quando as eleições são

    realizadas, o próprio povo acaba levando ao poder pessoas inescrupulosas, que já

    chegam em seus cargos com o objetivo de obter vantagens pessoais. Além disso, o

    próprio sistema dificulta a detecção e a devida punição a atos de corrupção, pois essas

    pessoas mal intencionadas eleitas se aproveitam das limitações dos instrumentos de

    controle, da arbitrariedade do poder e da supremacia dos interesses dos poderosos sobre

    o anseio coletivo.

    Muitas vezes, agentes que pretendem se perpetuar no poder, se utilizam da

    democracia para atingir seu objetivo. Um dos instrumentos usados nesse sentido é o

    repasse ilegítimo de recursos financeiros aos partidos políticos, que pode se dar das

    seguintes formas: repasses de verbas às vésperas da eleição, realização de obras para a

    promoção do partido ou do político, admissão de correligionários do partido em cargos

    em comissão, com a ilegítima permissão de que busquem sua promoção pessoal no

    exercício da função e etc. Devido a este incentivo, a pessoa eleita se vê “nas mãos” do

  • 13

    financiador da campanha. Desta forma, afasta-se a busca pelos ideais políticos e

    apresenta-se a vontade daqueles que garantiram a vitória da pessoa eleita.

    Assim, os desvios comportamentais dos gestores do patrimônio público,

    principalmente daqueles que chegaram ao poder via mandato eletivo, são apenas reflexo

    das alianças que propiciaram esta eleição. O êxito nas eleições é devido ao poder

    econômico, pois quando o candidato tem mais recursos a sua disposição, consegue mais

    visibilidade e assim fica mais conhecido pelo seu eleitorado. A campanha de um

    candidato que tem mais recursos atinge uma parcela maior da sociedade, aumentando a

    probabilidade de que esta pessoa seja eleita. Estes recursos são obtidos por meio de

    financiamentos diretos ou indiretos, de natureza pública ou privada.

    O dinheiro público é injetado em atividades político-partidárias, em

    propagandas de realização de obras, em convênios firmados às vésperas das eleições e

    etc. Tudo para favorecer o candidato à reeleição, ou para a legenda do partido a que

    pertença com fins de eleger os candidatos por ela apoiados.

    O maior problema é o dinheiro privado. Esses recursos, de origem duvidosa,

    deturpam os ideais políticos, pois geram para o candidato vencedor um tipo de dívida

    com esses financiadores. Ou seja, se eleito este candidato que obteve auxílio privado

    deve retribuir o auxílio realizando atos que favoreçam os financiadores, como por

    exemplo: contratação de pessoas indicadas por esses financiadores para o

    preenchimento de cargos em comissão, favorecimento em dotações orçamentárias, na

    contratação de obras, dentre outros.

    No campo da atividade legislativa esse fato é ainda mais grave, visto que a

    influência de vontades privadas na elaboração das leis é extremamente prejudicial à

    população. Normalmente são interesses menos nobres que apenas favorecem grupos

    específicos. Essa pressão dos financiadores pode se refletir também na elaboração de

    leis punitivas de modo a atenuá-las ou evitar a punição de infratores. Fato esse muito

    difícil de ser notado, pois os parlamentares corruptos sempre utilizam o discurso de que

    estas leis têm o objetivo de aperfeiçoar a legislação vigente.

    Para minimizar os problemas citados, além dos dispositivos de controle que

    serão estudos no decorrer deste trabalho, utilizamos no Brasil um sistema de pesos e

    contrapesos (checks and balances). Esse sistema torna-se importantíssimo, pois cria um

  • 14

    tipo de fiscalização de um poder sobre o outro entre diferentes funções estatais.

    Conforme ensinamento de José Afonso da Silva (2011):

    A harmonia entre os poderes verifica-se primeiramente pelas normas de cortesia no trato recíproco e no respeito às prerrogativas e faculdades a que mutuamente todos têm direito. De outro lado, cabe assinalar que nem a divisão de funções entre os órgãos do poder nem sua independência são absolutas. Há interferências, que visam ao estabelecimento de um sistema de freios e contrapesos, à busca do equilíbrio necessário à realização do bem da coletividade e indispensável para evitar o arbítrio e o desmando de um em detrimento do outro e especialmente dos governados. (JOSÉ AFONSO DA SILVA, 2011, P. 110).

    Portanto, este controle recíproco possibilita a contenção de desvios praticados

    por agentes públicos, além de evitar a ocorrência de abusos contra os administrados.

    1.2 O TEMA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NAS

    CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS E A CRIAÇÃO DA LEI 8.429/92

    As Constituições Brasileiras mostram a evolução da preocupação com o tema

    improbidade administrativa ao longo dos anos. A primeira Constituição (de 1824), por

    exemplo, determinava em seu artigo 99: "Pessoa do Imperador é inviolável, e sagrada:

    elle não está sujeito à responsabilidade alguma". Ou seja, a citada Constituição não

    apresentava limites para o líder da nação. Tudo o que o Imperador fizesse seria livre de

    questionamentos e de responsabilidade. Porém, para os Ministros do Imperador havia

    responsabilização “por peita, suborno, concussão ou por qualquer dissipação de bens

    públicos”, como preconizava o art. 133, II e IV, da Constituição de 1824.

    A partir das Constituições Republicanas, de um modo geral, sempre houve

    preocupação com a probidade administrativa, prevendo o crime de responsabilidade

    para aqueles agentes públicos que praticassem atos lesivos ao patrimônio público.

    O crime de responsabilidade praticado pelo Presidente da República pode

    resultar em impeachment dele próprio, dos Ministros de Estado e dos Ministros do STF,

    pois uma das características da República e da Democracia é exatamente a

    responsabilidade do Chefe do Poder Executivo. Constate-se que no Brasil a apuração da

    responsabilidade dos administradores é rara e, além disso, tradicionalmente o

    impeachment é restrito a um pequeno grupo de agentes políticos.

  • 15

    A Constituição de 1891 previa o atentado contra a probidade administrativa,

    como crime político, em seu art. 54, § 6º.

    A Constituição de 1934, em seu art. 57, f, previa a violação da probidade como

    crime de responsabilidade.

    A Constituição de 1937 tratava do assunto em seu art. 85, d.

    A Constituição de 1946 previa a improbidade administrativa como delito

    político em seu art. 89, V.

    A Constituição de 1967 apresentava o assunto em seu art. 84, V. A EC 1/69

    tratava do atentado à probidade administrativa como crime de responsabilidade no art.

    82, V.

    A Constituição de 1988 tratou em muitos de seus dispositivos sobre o tema

    improbidade administrativa, aumentando as referências sobre o assunto. Um dos mais

    importantes dispositivos da atual Constituição sobre a improbidade administrativa

    encontra-se no art. 37, § 4º:

    “Art. 37, § 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão

    dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o

    ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação

    penal cabível”.

    Este texto constitucional determinou ao legislador infraconstitucional a

    elaboração de uma lei que apresentasse as sanções para esses tipos de delitos. Além

    disso, esta nova lei deveria englobar qualquer agente público e não apenas os agentes

    políticos, como previam as constituições anteriores. Neste contexto foi criada, em 1992,

    a Lei 8.429, que ficou conhecida como a Lei de Improbidade Administrativa.

    Outros dispositivos da Constituição de 1988 como aqueles apresentados nos

    capítulos referentes aos direitos políticos, à Administração Pública e ao Poder

    Executivo, mostram a necessidade de se identificar e punir os atos de improbidade

    administrativa, abrangendo todos os envolvidos.

    As determinações constantes do art. 37, § 4º da Constituição Federal,

    provocaram a elaboração da Lei 8.429/92, conhecida como Lei de Improbidade

    Administrativa. Esta lei veio para dar efetividade às disposições constitucionais.

    Bertoncicni (2007) descreve em seu livro o conteúdo da lei:

  • 16

    Essa lei estabeleceu regras de direito material e de direito processual em matéria de improbidade administrativa. Previu, inicialmente, os sujeitos ativo e passivo dos atos de improbidade administrativa. Desenhou o perfil dos chamados atos de improbidade administrativa, estabelecendo três espécies dessa categoria: as atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento ilícito, as atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao erário e os atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração pública, fixando, ademais, as respectivas sanções. Também instituiu regras referentes à investigação dos atos de improbidade administrativa, bem como do processo judicial de persecução desses ilícitos, prevendo para tanto medidas cautelares e a ação principal, dentre outras disposições de natureza adjetiva e substantiva. (BERTONCINI, 2007, p. 24).

    Desta forma, a Lei 8.429/92 procura identificar os sujeitos que possam se

    envolver em atos de improbidade, estabelece quais são os tipos de atos de improbidade

    existentes e determina as sanções que devem ser aplicadas aos ímprobos.

    1.3 OS PRINCÍPIOS QUE REGEM A PROBIDADE

    ADMINISTRATIVA

    Os princípios são a base, o alicerce do direito. Eles direcionam as regras

    jurídicas, auxiliando sua aplicação, integração e interpretação. Os princípios são

    importantíssimos, pois até para a criação das leis sua observância se faz necessária. Se

    uma lei for criada e estiver em desacordo com algum princípio, esta lei será inválida.

    Além disso, perante a inexistência de leis ou regras no ordenamento jurídico para a

    resolução de um caso concreto, os princípios são evocados. Como bem definem Garcia

    e Alves (2011):

    Em sua acepção clássica, de alicerce jusnaturalista, os princípios seriam proposições supremas, de natureza universal e necessária, próprios da razão humana e cuja observância independe do poder de coerção inerente à criação legislativa. Para o direito natural, os princípios são extraídos da natureza humana, sendo informados por elementos racionais, de consciência e pela interação do homem com o ambiente. (GARCIA e ALVES, 2011, p. 43).

    Para Alexandrino e Paulo (2011):

    Os princípios são ideias centrais de um sistema, estabelecendo suas diretrizes e conferindo a ele um sentido lógico, harmonioso e racional, o que possibilita uma adequada compreensão de sua estrutura. Os princípios determinam o alcance e o sentido das regras de um dado subsistema do ordenamento jurídico, balizando a interpretação e a

  • 17

    própria produção normativa. (ALEXANDRINO e PAULO, 2011, p. 183).

    A improbidade administrativa observada sob o prisma do Direito

    Administrativo, que é a base do presente estudo, deve pautar-se pelos princípios

    implícitos (que são os princípios não escritos, mas utilizados pela doutrina) e explícitos

    (que são os princípios escritos). No caso dos explícitos, temos como regra primordial o

    disposto do art. 37, caput da Constituição Federal:

    “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da

    União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de

    legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao

    seguinte: (...)”.

    Sendo assim, vemos que os princípios elencados pela Constituição devem ser

    observados pelos agentes de todos os Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). Isto

    mostra que, diversamente do que se poderia imaginar, os princípios não alcançam

    apenas os agentes que desempenham funções de natureza eminentemente

    administrativas, mas sim todos os agentes públicos como magistrados e legisladores

    inclusive. O descumprimento destes princípios acarreta ao agente público as sanções

    previstas na própria Constituição (art. 37, § 4º), bem como as previstas na Lei 8.429/92,

    por tratar-se de ato de improbidade administrativa.

    No caso dos princípios implícitos, aqueles mais citados pela doutrina são os

    seguintes: princípio da juridicidade, supremacia do interesse público, razoabilidade,

    proporcionalidade e princípio da constitucionalidade.

    Devemos observar ainda que os princípios não devem ser analisados

    isoladamente e sim em conjunto, pois os princípios que veremos a seguir se integram e

    se complementam entre si na busca de uma gestão pública de qualidade para todos os

    cidadãos.

    1.3.1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

    Analisaremos, a seguir, os cinco princípios constitucionais, a começar pelo

    princípio da legalidade.

  • 18

    De acordo com o ensinamento de Meirelles (2011), o princípio da legalidade

    estabelece que todos os atos administrativos devem estar de acordo com a lei e com os

    princípios administrativos.

    Todos os agentes públicos só podem praticar atos previstos nas leis. Se assim

    eles não o fizerem, estarão praticando um ato ilícito e deverão ser responsabilizados por

    isso. Devemos observar ainda que se não houver previsão legal para o ato

    administrativo, o agente público não poderá praticá-lo. Mesmo que o ato seja

    discricionário1, conferindo ao agente público um certo grau de liberdade de decisão, ele

    deve estar de acordo com os limites que a lei impõe.

    Segundo Meirelles (2011):

    A legalidade, como princípio de administração (CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. (MEIRELLES, 2011, p. 89).

    Quanto ao princípio da moralidade, vamos, primeiramente, obervar a

    definição da palavra moral. Moral é o conjunto de valores de uma determinada

    sociedade em uma determinada época. Com o passar do tempo e com a evolução da

    relação humana são formulados conceitos abstratos sobre o que é correto, para aquela

    determinada população. Esses conceitos que trazem a ideia de honestidade, coerência,

    bom senso contribuem para a obtenção do bem estar social.

    Sendo assim, o princípio da moralidade está diretamente ligado à ideia de

    honestidade, caráter e boa fé que esperamos dos nossos administradores, o que faz deste

    princípio (em conjunto com o princípio da legalidade) um dos princípios mais

    importantes relacionados à probidade administrativa.

    Como afirma Meirelles (2011), “a moralidade do ato administrativo

    juntamente com a sua legalidade e finalidade, além da sua adequação aos demais

    princípios, constituem pressupostos de validade sem os quais toda atividade pública será

    ilegítima” (p. 91).

    1 Conforme definição elaborada por Alexandrino e Paulo (p. 421), “atos discricionários são

    aqueles que a administração pode praticar com certa liberdade de escolha, nos termos e limites da lei, quanto ao seu conteúdo, seu modo de realização, sua oportunidade e sua conveniência administrativas”.

  • 19

    A moralidade conduz e impõe limites à atividade administrativa, fazendo com

    que o agente público não afaste os valores que decorrem dos direitos fundamentais dos

    administrados, garantindo o respeito à dignidade destes. A moralidade restringe o

    arbítrio, conferindo aos administrados o direito subjetivo de exigir que os atos

    administrativos emanados pelo Estado sejam eficientes, objetivando a realização do

    bem comum.

    Para que os administradores não infrinjam o princípio da moralidade é preciso

    que a sociedade se conscientize de que é necessário fiscalizar a atividade estatal. Esta

    fiscalização deve ser bastante rígida, o que permitirá um constante aperfeiçoamento dos

    atos administrativos, fazendo com que os agentes públicos direcionem suas atividades

    para a obtenção do bem comum.

    Em relação à previsão normativa do princípio da moralidade, verificamos que

    nas Constituições anteriores à Constituição de 1988 não havia previsão expressa deste

    princípio, porém sempre foi considerado princípio implícito que rege os atos

    administrativos.

    Hoje em dia, o princípio da moralidade está presente no texto constitucional

    em seu art. 37, caput: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos

    Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos

    princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e,

    também, ao seguinte: (...)”. Além disso, a observância da moralidade encontra-se ainda

    em outros dispositivos constitucionais como o art. 5º, LXXIII: “qualquer cidadão é

    parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio

    público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio

    ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-

    fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;”.

    A determinação apresentada no inciso LXXIII do art. 5º da CF destaca o

    caráter normativo do princípio da moralidade, pois o ato administrativo que infrinja a

    regra de direito ou não esteja em consonância com a moral, não será um ato válido.

    Podemos citar ainda outros preceitos constitucionais que levam em

    consideração a moralidade administrativa, como por exemplo: os que preveem como

    objetivo fundamental da República Federativa do Brasil a construção de uma sociedade

    livre, justa e solidária (art. 3º, I, da CF); os que resguardam o decoro parlamentar (art.

  • 20

    55 e outros da CF); e o dever de probidade do Presidente da República (art. 85, V, da

    CF).

    Além disso, os requisitos dos atos administrativos e os princípios que os regem

    devem ser observados para que se verifique a licitude do ato, pois um ato administrativo

    pode estar formalmente adequado à lei, porém pode estar revestido da intenção de

    beneficiar ou prejudicar uma determinada pessoa. Isto afasta a moralidade e a finalidade

    do ato, tornando-o inválido.

    Meirelles (2011) conceitua ato administrativo da seguinte forma:

    Ato administrativo é toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria. (MEIRELLES, 2011, p. 154).

    Os atos administrativos devem sempre estar de acordo com a legislação e com

    os princípios do direito, almejando a consecução do interesse público.

    Para que o ato administrativo seja válido, é necessário que ele contenha cinco

    requisitos, que são: competência, finalidade, forma, motivo e objeto. Para Meirelles

    (2011), competência é o poder conferido por lei ao agente público para o desempenho

    de suas funções. Finalidade é o objetivo de interesse público a ser atingido e forma é o

    revestimento exteriorizador do ato (que pode ser um decreto, um ofício e etc.). Quanto

    ao objeto, Meirelles (2011) ensina que “todo ato administrativo tem por objeto a

    criação, modificação ou comprovação de situações jurídicas concernentes a pessoas,

    coisas ou atividades sujeitas à ação do Poder Público” (p. 159). Já o motivo é definido

    por este autor da seguinte forma: “é a situação de direito ou de fato que determina ou

    autoriza a realização do ato administrativo” (p.158).

    Esses requisitos do ato administrativo, que constituem sua infraestrutura, em

    conjunto com o princípio da moralidade, devem ser observados sob pena da invalidade

    do ato.

    Ao agir em nome da instituição, o agente público deve buscar o bem comum,

    escolhendo uma finalidade compatível com a previsão abstrata da lei, garantindo que o

    ato esteja, também, em conformidade com a moralidade administrativa. Se assim o

    fizer, o agente garantirá a licitude do ato.

  • 21

    O ato discricionário, que permite ao agente uma certa flexibilidade de decisão,

    sempre nos limites da lei, deve ser analisado com mais cautela por estar relacionado à

    subjetividade do agente. Neste contexto, os elementos relacionados à

    discricionariedade, quais sejam, o motivo e o objeto ganham uma importância

    diferenciada.

    O motivo e o objeto devem sempre estar de acordo com o interesse público e

    com a moralidade, pois se não estiverem, indicarão a existência de vícios dos atos

    administrativos discricionários ou mesmo abuso de poder.

    O princípio da impessoalidade, que também é conhecido como princípio da

    finalidade, trata de afastar o interesse individual para que se possa alcançar os interesses

    coletivos.

    O princípio da impessoalidade, referido na Constituição de 1988 (art. 37, caput), nada mais é do que o clássico princípio da finalidade, o qual impõe ao administrador público que só pratique o ato para o seu fim legal. E o fim legal é unicamente aquele que a norma de Direito indica expressa ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal. (MEIRELLES, 2011, p. 93).

    Neste sentido existem duas vertentes sobre o assunto.

    A primeira diz respeito ao agente público. Segundo esta vertente, o agente

    público não deve praticar atos votados para seu interesse pessoal. Os atos praticados

    pelo agente público devem ser voltados para o coletivo, ou seja, deve ter como

    finalidade o interesse público. Além disso, os atos estatais não devem ser vistos como

    emanados de um agente específico e sim como atos emanados do órgão ou entidade. As

    realizações e a publicidade desses atos devem ser atribuídas ao órgão que os praticou e

    não aos indivíduos (agentes públicos) que viabilizaram sua concretização.

    A segunda vertente relaciona-se ao fato de que a Administração deve tratar

    todos os administrados, que se encontrem em posição similar, de mesma maneira. Não

    deve haver distinção de efeitos dos atos administrativos para os cidadãos em situação

    fática e jurídica idênticas. Por exemplo, se o Governo decide fornecer remédios aos

    cidadãos de baixa renda, não pode um agente público negar a entrega do medicamento a

    uma pessoa que seja seu desafeto se esta pessoa se enquadra no critério estabelecido

    pelo Governo. Por outro lado, para que a imparcialidade seja garantida, havendo uma

    situação de impedimento ou suspeição, o agente público envolvido deve deixar de atuar

  • 22

    para que outro agente atue. O impedimento ou suspeição ocorrem quando, por exemplo,

    a um determinado juiz for distribuído um processo no qual sua esposa é a ré. Neste

    caso, o juiz deve se afastar do caso, pois do contrário poderia, mesmo

    inconscientemente, beneficiar sua esposa. Sendo assim, outro juiz deveria assumir o

    caso, garantindo a observância do princípio da impessoalidade.

    O princípio da publicidade determina que todos os atos do Poder Público

    devem ser levados ao conhecimento de todos os cidadãos, ressalvados aqueles

    expressamente elencados na Constituição. Este amplo acesso permite aos órgãos

    competentes e também à população, o controle da atuação do Governo. A transparência,

    gerada pelo princípio da publicidade, faz com que qualquer pessoa possa acompanhar os

    atos das entidades estatais e possa, portanto, questioná-los, pois se não houvesse

    publicidade, seria uma tarefa extremamente difícil detectar um desvio em determinado

    ato e impugná-lo.

    A observância deste princípio é obrigatória para todos os entes da

    administração pública, direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União, dos

    Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, como prevê a Constituição em seu art.

    37, caput. Caso um ente não observe o princípio da publicidade, estará praticando um

    ato ilícito.

    Finalmente, o princípio da eficiência estabelece que os atos da Administração

    Pública devem alcançar seus objetivos com qualidade e agilidade. A eficiência diz

    respeito também a como o Poder Público administra os recursos que obtém. Os recursos

    devem ser captados pelo Governo com a menor utilização do aparato governamental

    possível e deve ser gasto da maneira mais célere e sem desvios ou desperdícios.

    Segundo o princípio da eficiência o Poder Público não deve buscar atingir um

    bom resultado, ele deve buscar o melhor resultado.

    A inobservância deste princípio além de conduzir a uma má prestação de

    serviços públicos ou maiores despesas do que obtenção de recursos, ainda pode levar a

    outros efeitos nocivos para a população como o aumento da carga tributária. Muitas

    vezes, quando os governantes percebem que os recursos disponíveis não serão

    suficientes para se atingir suas pretensões, este pode aumentar a carga tributária para

    conseguir atingir essas pretensões. Quando esta situação ocorre, quem mais sofre é o

    povo que deve pagar tributos mais caros, ficando assim mais empobrecido.

  • 23

    Portanto, a falta de eficiência pode comprometer o desenvolvimento

    socioeconômico do país.

    1.3.2 PRINCÍPIOS UTILIZADOS PELA DOUTRINA

    Como já descrito anteriormente, os princípios que regem a probidade

    administrativa, utilizados pela doutrina são: o princípio da juridicidade, supremacia do

    interesse público, razoabilidade, proporcionalidade e princípio da constitucionalidade.

    O princípio da juridicidade é um princípio moderno e amplo. Ele estabelece

    que toda ação do Estado deve estar de acordo tanto com as regras jurídicas como com

    os princípios constitucionais explícitos e implícitos. Logo, este é um princípio amplo

    que engloba, inclusive, o princípio da legalidade.

    A noção de legalidade reduz-se ao seu sentido estrito de conformidade dos atos com as leis, ou seja, com as regras – normas em sentido estrito. A noção de juridicidade, além de abranger a conformidade dos atos com as regras jurídicas, exige que sua produção (a desses atos) oberve – não contrarie – os princípios gerais de Direito previstos explícita e implicitamente na Constituição. (MORAES apud GARCIA e ALVES, 2011, p. 59).

    Quanto ao princípio da supremacia do interesse público, Alexandrino e

    Paulo (2011) informam que:

    O princípio da supremacia do interesse público é um princípio implícito. Embora não se encontre enunciado no texto constitucional, ele é decorrência das instituições adotadas no Brasil. Com efeito, por força do regime democrático e do sistema representativo, presume-se que toda atuação do Estado seja pautada pelo interesse público, cuja determinação deve ser extraída da Constituição e das leis, manifestações da “vontade geral”. Assim sendo, lógico é que a atuação do Estado subordine os interesses privados. (ALEXANDRINO e PAULO, 2011, p. 184).

    Nesse contexto, o princípio da supremacia do interesse público prevê que o

    interesse coletivo deve prevalecer sobre o privado. O Governo deve estar em um

    patamar superior ao seu administrado. Desta forma, havendo previsão legal, o Governo

    pode afastar um interesse individual em prol do coletivo, ou seja, deve buscar a

    consecução de uma finalidade pública.

    Para melhor compreensão da aplicação deste princípio, podemos citar os

    seguintes exemplos: a) a desapropriação, que deve assegurar ao administrado uma justa

    e prévia indenização; b) a aplicação das cláusulas exorbitantes em contratos

  • 24

    administrativos (essas cláusulas preveem, por exemplo, a modificação ou rescisão

    unilateral do contrato); c) o exercício do poder de polícia administrativa (que é a

    limitação ou condicionamento ao exercício de atividades privadas, em benefício do

    interesse público), tendo como exemplo a concessão de alvará para o funcionamento de

    estabelecimento comercial; e d) a existência da presunção de legitimidade dos atos

    administrativos, o que transfere ao administrado o ônus de provar, por via

    administrativa ou judicial, que há vícios no ato.

    Devemos notar que o agente público deve sempre observar a sistemática legal,

    pois do contrário estará praticando um ato ilegal. O agente não pode praticar um ato

    ilegal evocando o emprego da supremacia do interesse público.

    O princípio da razoabilidade informa que quando um ato administrativo é

    aplicado por um agente público ele deve ser razoável, ou seja, o juízo de valor que

    motivou sua prática deve estar de acordo com os padrões de aceitabilidade de um

    determinado meio.

    É um princípio implícito especialmente aplicado no controle de atos

    discricionários. Estes atos podem causar restrições ou implicar condicionamento a

    direitos dos particulares, ou podem, ainda, impor sanções administrativas que sejam não

    razoáveis e devem, neste caso, ser anulados para que o administrado não seja

    prejudicado. Portanto, a aplicação do princípio da razoabilidade serve como um

    mecanismo para evitar abusos da autoridade, uma vez que estes abusos poderiam

    emanar de um ato revestido de legalidade, eficiência, moralidade e etc., porém poderia

    ser um ato não razoável.

    Apesar do princípio da razoabilidade e o da proporcionalidade (que será

    analisado a seguir) serem vistos muitas vezes como sinônimos, os administrativistas

    associam, frequentemente, o princípio da razoabilidade às análises de adequação e de

    necessidade do ato administrativo. A adequação está ligada ao fato de que o ato

    administrativo deve alcançar os resultados pretendidos. Já a necessidade está

    relacionada ao fato de que o ato administrativo deve ser aplicado da maneira menos

    gravosa possível ao administrado, ou seja, havendo duas ou mais possibilidades de

    aplicação de determinado ato administrativo para a consecução de um objetivo comum,

    deve ser escolhido, pela Administração Pública, aquele que seja mais brando, mais

  • 25

    prudente e menos restritivo para o administrado, sob pena de o ato ser anulado, caso

    haja análise de sua razoabilidade.

    Alexandrino e Paulo (2011) resumem o assunto da seguinte forma:

    O princípio da razoabilidade tem por escopo aferir a compatibilidade entre os meios empregados e os fins visados na prática de um ato administrativo, de modo a evitar restrições aos administrados inadequadas, desnecessárias, arbitrárias ou abusivas por parte da Administração Pública. (ALEXANDRINO e PAULO, 2011, p. 202).

    O princípio da proporcionalidade é um princípio implícito que tem como

    objetivo estabelecer limites aos atos praticados pelos agentes públicos e impedir que aos

    administrados sejam impostas restrições a sua liberdade ou propriedade que não se

    apresentem como primordiais à preservação do interesse coletivo. Este princípio protege

    os cidadãos da imposição de um sacrifício exagerado e impede a aplicação do ato

    inadequado ao atingimento da finalidade legal, pois se isto ocorresse haveria

    desproporcionalidade e consequentemente a ilegalidade do ato.

    Tendo em vista os constantes abusos praticados pelo Poder Público, vemos a

    importância da aplicação do princípio da proporcionalidade quando este é evocado para

    limitar o poder de polícia, trazendo um equilíbrio adequado entre os distúrbios da ordem

    e da segurança pública e a limitação à propriedade e à liberdade dos cidadãos.

    Como os demais princípios já citados, o princípio da proporcionalidade deve

    ser observado por todo o Poder Público, ou seja, deve ser levado em consideração na

    elaboração da legislação, bem como nas decisões de juízes e acórdãos dos tribunais.

    Sempre no sentido de evitar abusos contra os administrados.

    Mesmo sendo um princípio implícito, podemos observar a presença da ideia de

    proporcionalidade em diversos dispositivos constitucionais, como mostram Garcia e

    Alves (2011):

    Apesar de não estar devidamente individualizado em um preceito específico, são múltiplas as manifestações do princípio na Constituição, podendo ser citadas as seguintes: a) o princípio da capacidade contributiva, segundo o qual os impostos devem respeitar as possibilidades do contribuinte (art. 145, § 1º); b) o direito de resposta proporcional ao agravo (art. 5º, V); c) piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho (art. 7º, V); d) aviso prévio proporcional ao tempo de serviço (art. 7º, XXI); e) nos casos que legitimam a intervenção de um ente federativo em outro, o decreto do Executivo limitar-se-á a suspender a execução do ato impugnado, se essa medida bastar ao restabelecimento da normalidade

  • 26

    (art. 36, § 3º); f) aplicação, pelo Tribunal de Contas, de multa proporcional ao dano causado pelo administrador público (art. 71, VIII); g) o Ministério Público deve zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados pela Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia (art. 129, III); h) a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo (art. 173, caput) e etc. (GARCIA e ALVES, 2011, p. 114).

    Quanto ao princípio da constitucionalidade, primeiramente, devemos

    entender que a Constituição é a Lei Maior. Ela está no topo do nosso ordenamento

    jurídico, sendo hierarquicamente superior a todas as leis do país. Todas as leis editadas

    no Brasil devem ser compatíveis com a Constituição. Daí o surgimento deste princípio

    tão amplo e importante.

    Todos os atos praticados pela Administração devem observar os preceitos

    constitucionais.

    Segundo Garcia e Alves (2011):

    O administrador deve obediência à norma; o legislador, ao elaborar a norma, deve obediência à Constituição; e o juiz deve zelar pelo respeito à Constituição, o que inclui os princípios e regras que dela defluem, os quais a todos obrigam: Executivo, Legislativo e Judiciário.

    Desta forma, a ilegalidade ou a inconstitucionalidade do ato apresenta-se como relevante indício de consubstanciação da improbidade, já que o agente não observou o principal substrato legitimador de sua existência e norteador da atividade estatal. (GARCIA e ALVES, 2011, p. 80).

  • 27

    CAPÍTULO II

    CONTROLE PREVENTIVO E REPRESSIVO DA

    IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

    Neste capítulo serão apresentados dois controles que têm como objetivo combater

    a improbidade administrativa. São eles o controle preventivo utilizado para se evitar que

    ocorram atos de improbidade administrativa e o controle repressivo que surge para que

    se possa corrigir eventuais desvios ocorridos.

    O controle preventivo é composto dos seguintes mecanismos: códigos de conduta

    (que determinam o que o agente público deve ou não fazer); as incompatibilidades

    (casos nos quais o agente público não deve intervir para não possibilitar a ocorrência de

    atos de improbidade); ombudsman (figura que fiscaliza a atuação dos agentes públicos);

    e o acompanhamento da evolução patrimonial do agente público (declarações

    apresentadas pelo agente para que a Administração possa identificar eventuais

    acréscimos patrimoniais suspeitos).

    Já o controle repressivo divide-se em controle administrativo, legislativo e

    judiciário.

    2.1 CONTROLE PREVENTIVO

    A Administração Pública deve pautar-se pelos princípios do direito e pela

    legislação em vigor. Em relação à probidade administrativa, o princípio mais importante

    a ser observado é o princípio da moralidade. Porém, como este é um princípio

    extremamente abstrato, é necessária a elaboração de diretrizes básicas para nortear a

    atuação dos agentes públicos.

    Nesse contexto, surgem os Códigos de Conduta ou Códigos de Ética que

    auxiliam a aplicação do princípio da moralidade.

    Estes códigos devem nortear a honestidade, integridade e responsabilidade do

    agente público. Os códigos a serem destacados neste trabalho são o Código de Conduta

  • 28

    da Alta Administração Federal e o Código de Ética Profissional do Servidor Público

    Civil do Poder Executivo Federal

    Em 21 de agosto de 2000, o Governo Federal aprovou o Código de Conduta

    da Alta Administração Federal, a fim de prevenir e impedir condutas que não estejam

    revestidas de honestidade, ética, moral, ou seja, não compatíveis com o padrão desejado

    pela Administração Pública.

    Este código tem por objetivo traçar uma linha de conduta, adequada à

    administração pública, para que os agentes públicos do alto escalão desempenhem suas

    funções com lisura e transparência. Além disso, o código visa a alcançar também as

    autoridades de hierarquia inferior e aos servidores, os quais devem agir espelhando-se

    em seus superiores, que por sua vez devem ser probos, devem buscar o bem comum e

    administrar corretamente o Erário em cumprimento ao código.

    Com a criação deste código, foi possível o preenchimento de uma lacuna nas

    leis, quanto ao comportamento dos agentes públicos à luz da ética, tendo em vista a

    aproximação do interesse público e o privado (é a chamada zona cinzenta). Esta

    aproximação gera uma série de dúvidas a cerca de qual seria o comportamento

    adequado do agente, porém o código busca esclarecer este tipo de dúvida.

    O código não tem natureza normativa, porém ele auxilia na densificação do

    princípio da moralidade.

    Abaixo traçaremos um breve comentário a respeito de alguns artigos do

    código:

    O art. 1º transcorre sobre as finalidades do código, que são as seguintes:

    I - tornar claras as regras éticas de conduta das autoridades da alta

    Administração Pública Federal, para que a sociedade possa aferir a integridade e a

    lisura do processo decisório governamental;

    II - contribuir para o aperfeiçoamento dos padrões éticos da Administração

    Pública Federal, a partir do exemplo dado pelas autoridades de nível hierárquico

    superior;

    III - preservar a imagem e a reputação do administrador público, cuja conduta

    esteja de acordo com as normas éticas estabelecidas neste Código;

  • 29

    IV - estabelecer regras básicas sobre conflitos de interesses públicos e

    privados e limitações às atividades profissionais posteriores ao exercício de cargo

    público;

    V - minimizar a possibilidade de conflito entre o interesse privado e o dever

    funcional das autoridades públicas da Administração Pública Federal;

    VI - criar mecanismo de consulta, destinado a possibilitar o prévio e pronto

    esclarecimento de dúvidas quanto à conduta ética do administrador.

    O art. 2º determina as autoridades que devem observar o código. Estas

    autoridades têm em comum a característica de serem normalmente demissíveis a

    qualquer tempo pelo Presidente da República, exercendo funções de natureza política

    ou ocupando cargos de confiança.

    Os art. 4º e 5º estabelecem regras para que a autoridade preste informações à

    Comissão de Ética Pública (CEP) sobre seu patrimônio, como: transferências

    patrimoniais a parentes; a aquisição direta ou indireta do controle de empresa;

    alterações significativas no valor ou na natureza do patrimônio e etc.

    O art. 7º discorre sobre as vedações relacionadas ao recebimento de vantagens

    por parte da autoridade pública.

    O art. 9º determina que o agente público não deve receber presentes, salvo as

    exceções. Uma das exceções prevê que o agente público poderia receber presentes que

    não ultrapassassem o valor de R$ 100,00. Porém, isto causa uma incoerência perante a

    Lei 8.429/92, uma vez que esta lei prevê em seu art. 9º, caput que constitui ato de

    improbidade administrativa o recebimento de qualquer tipo de vantagem patrimonial

    por parte do agente público. Logo, como o código não tem força de lei, concluímos que

    a determinação constante da Lei 8.429/92 é que deve ser seguida pelo agente público.

    Os art. 14, 15 e 16 discorrem sobre o tempo que os agentes devem ficar

    afastados da iniciativa privada após deixarem seus cargos públicos. Esta vedação tem o

    intuito de preservar a administração pública, pois este agente que acabara de sair de um

    cargo público possui informações e conhecimentos que poderiam beneficiar

    determinado particular. Porém, estas vedações só serão eficazes se também estiverem

    presentes em leis, pois como já dito anteriormente, este código não tem força de lei e

    portanto não pode estabelecer obrigatoriedades.

  • 30

    Segundo o art. 18, as infrações ao código de conduta serão apuradas pela

    Comissão de Ética Pública (CEP) que poderá aplicar sanções de advertência ou censura

    ética. Dependendo do caso poderá ainda encaminhar sugestão de demissão à autoridade

    hierarquicamente superior.

    Em 22 de junho de 1994, o Decreto nº 1.171 instituiu o Código de Ética

    Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal. Este código

    traça a linha de conduta ética e moral a ser seguida pelos servidores públicos federais. O

    Código é composto de dois capítulos, sendo que o Capítulo I possui três seções. Das

    regras deontológicas, listadas na Seção I do Capítulo I, merecem destaque: a) a

    necessidade de preservação da honra e da tradição do serviço público; b) a observância

    do elemento ético, devendo preservar a dicotomia entre o honesto e o desonesto; c) a

    observância da moralidade administrativa com a distinção do bem e do mal e com a

    necessária satisfação do interesse público; d) ressalvadas as exceções legais, a

    publicidade dos atos administrativos é requisito de eficácia e moralidade, da sua

    omissão decorrendo o comprometimento ético do bem comum; e) o dever de dizer a

    verdade; f) a cortesia e a boa vontade no serviço; g) a preservação do patrimônio

    público; e h) o atendimento inadequado, permitindo a formação de longas filas, viola a

    ética e causa dano moral aos usuários dos serviços; i) a obediência às ordens legais dos

    superiores.

    A Seção II do Capítulo I relaciona os principais deveres do servidor. Esta

    relação de deveres reforça as diretrizes da Seção I, acrescentado ainda alguns deveres

    não listados naquela Seção I.

    A Seção III discorre sobre as vedações impostas ao servidor público federal.

    Por fim, o Capítulo II trata da criação da Comissão de Ética e de funções, além

    de definir os indivíduos alcançados pelo termo servidor público.

    Outro mecanismo de controle preventivo é a figura do ombudsman que,

    segundo Garcia e Alves (2011), é um agente que teria a relevante missão de fiscalizar o

    Poder Público em todas as suas variantes. O ombudsman pode intervir no controle da

    legalidade dos atos administrativos, pode intervir ainda no mérito administrativo ou

    atuar como órgão de repasse de informações, encaminhando-as aos órgãos competentes

    para as providências necessárias.

  • 31

    É um servidor público que recebe críticas, denúncias e sugestões, que são

    analisadas por ele e, posteriormente, convertidas em recomendações para que os órgãos

    possam se aperfeiçoar. Tudo isso, sem prejuízo do envio às autoridades competentes

    para a atuação do controle repressivo (que será analisado no Capítulo IV).

    O ombudsman é, portanto, mais uma ferramenta de prevenção dos atos de

    improbidade administrativa. Ele controla a probidade administrativa dos agentes

    públicos, zela pelo aperfeiçoamento da atividade estatal e busca atingir um equilíbrio

    entre os desejos da sociedade e os deveres do Poder Público, sempre observando o

    princípio da eficiência.

    Perante a figura do ombudsman, o agente público desonesto encontra mais uma

    barreira para executar atos ilícitos. Além de todos os mecanismos de prevenção e

    controle já existentes, o Poder Público aprimora sua fiscalização, utilizando para isso

    informações fornecidas pelos administrados e compiladas pelo ombudsman,

    proporcionando a máxima efetividade no controle da ilicitude.

    No Brasil, a Constituição Federal conferiu ao Ministério Público todas as

    atribuições que seriam executadas pelo ombudsman.

    Quanto às incompatibilidades, podemos dizer que em determinadas situações

    o agente público corre o risco de se desviar de sua finalidade, qual seja o interesse

    público, por razões de ordem pessoal ou patrimonial, maculando a imparcialidade que

    se espera deste agente. Para evitar que este tipo de situação ocorra, existem comandos

    legais que desaconselham ou impedem a atuação dos agentes públicos nessas situações

    que podem afastar os princípios da isonomia e da impessoalidade. Esses comandos são

    conhecidos como impedimentos e suspeições e podem ser denominados de

    incompatibilidades.

    Essas incompatibilidades são mais uma maneira de se prevenir os atos de

    improbidade administrativa.

    O impedimento, que normalmente é considerado vício insanável, deve ser

    aplicado em situações em que há presunção absoluta (ou seja, não há possibilidade de

    prova em contrário) de que o agente atuará com parcialidade. Como exemplo de

    imparcialidade podemos citar: o art. 9º da Lei 8.666/93; a art. 18 da Lei 9.784/99; o art.

    252 do CPP; o art. 134 do CPC; e o art. 30, I, da Lei 8.906/94.

  • 32

    Já a suspeição, que normalmente é considerada vício sanável, deve ser aplicada

    em situações em que há presunção relativa (ou seja, presunção que admite prova em

    contrário) de que o agente atuará com parcialidade. Como exemplo de suspeição

    podemos citar: o art. 20 da Lei 9.784/99; o art. 253 do CPP; e o art. 135 do CPC.

    Assim, as incompatibilidades impedem que o agente público atue com

    parcialidade nas questões a ele relacionadas. Caso seja detectada uma incompatibilidade

    e ainda assim o agente atue naquela questão incompatível, incidirá o art. 11, caput, da

    Lei 8.429/92, que classifica este ato como ato de improbidade administrativa por atentar

    contra o princípio da imparcialidade. Uma vez aplicado o art. 11, caput, da Lei

    8.429/92, só caberá produção de provas para a defesa do agente infrator nos casos de

    suspeição.

    Merece destaque, ainda, um tipo de incompatibilidade ulterior à dissolução do

    vínculo do agente público com a Administração Pública conhecida como “quarentena”.

    A quarentena tem como objetivo evitar que o agente público, que tenha perdido o

    vínculo com a Administração Pública, repasse informações privilegiadas a terceiros

    mesmo após a citada dissolução. Sendo assim, é estabelecido um período (quarentena)

    no qual o ex-agente público não poderá, por exemplo, prestar serviços a terceiros se

    esses serviços envolverem a revelação de uma informação que apenas diz respeito à

    Administração Pública.

    Finalmente, outra maneira de se conter preventivamente a improbidade

    administrativa é o acompanhamento da evolução patrimonial do agente público.

    Devem ser instituídos órgãos que possam ter acesso a informações patrimoniais dos

    agentes públicos para poder estabelecer uma relação entre o que a pessoa recebe de

    remuneração e o patrimônio que ela possui. Dessa forma, seria possível identificar um

    agente que recebe uma remuneração baixa, porém usufrui de bens de luxo. Com a

    improbidade administrativa identificada e impedida de continuar ocorrendo, sobrariam

    mais recursos para serem aplicados em prol da sociedade. Seria possível, então, a

    construção de uma sociedade livre, justa e solidária, seria possível garantir o

    desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e a marginalização, reduzir as

    desigualdades sociais e regionais e seria possível a promoção do bem de todos, como

    preconiza nossa atual Constituição.

  • 33

    É fundamental para a Administração Pública monitorar a evolução patrimonial

    do agente público, pois se for detectada uma discrepância entre a remuneração do

    agente e o patrimônio que efetivamente este possui, há uma possibilidade de que este

    agente esteja praticando atos de improbidade administrativa.

    As ferramentas normalmente utilizadas para a realização deste

    acompanhamento são: a declaração de atividades e a declaração de bens.

    Para Garcia e Alves (2011) a declaração de atividades

    costuma abranger todas as atividades que o agente desempenhou ou desempenha na iniciativa privada paralelamente ao exercício da função pública, o que, além de possibilitar o controle dos rendimentos percebidos de fontes outras que não os cofres públicos, permitirá a identificação de eventuais incompatibilidades em razão de relações preteritamente mantidas com terceiros, garantindo-se a imparcialidade daquele que deve perseguir a consecução do bem comum. (GARCIA e ALVES, 2011, p. 141).

    Ainda segundo Garcia e Alves (2011),

    a declaração de bens, por sua vez, é providência que em muito facilita a coibição do enriquecimento ilícito, pois, sendo conhecido o patrimônio pertencente ao agente no momento em que este inicia o exercício da função pública, será facilmente identificada uma evolução patrimonial dissonante dos rendimentos percebidos dos cofres públicos, o que em muito contribuirá para a valoração da conduta do agente e a identificação da improbidade. (GARCIA e ALVES, 2011, p. 142).

    A apresentação da declaração de bens além de inibir a prática de atos ilícitos,

    confere ao agente público honesto um importante instrumento de defesa, caso ele venha

    a sofrer acusações inverídicas por parte de seus desafetos.

    Para que se alcance a efetividade destes mecanismos de controle, é necessário

    que as declarações sejam periodicamente atualizadas, o que normalmente é feito

    anualmente.

    Os dispositivos legais que regulam este assunto são a Lei 8.429/92 e a Lei

    8.730/93.

    Em relação à Lei 8.429/92, observamos que o art. 13, caput estabelece que “a

    posse e o exercício de agente público ficam condicionados à apresentação de declaração

    dos bens e valores que compõem o seu patrimônio privado, a fim de ser arquivada no

    serviço de pessoal competente”. Logo, este dispositivo exige que o agente público

  • 34

    apresente a declaração de bens para que seu patrimônio possa ser monitorado,

    possibilitando à Administração a identificação de eventual prática de ato de

    improbidade administrativa, como o enriquecimento ilícito, por exemplo.

    Os parágrafos do art. 13, transcritos abaixo, determinam o que deve ser

    relacionado na declaração (§ 1º), quando deve ser entregue (§ 2º), as sanções para o

    agente que não apresenta a declaração ou a apresenta contendo informações falsas (§

    3º), e a possibilidade de entregar cópia da declaração apresentada à Receita Federal

    relativa ao Imposto de Renda (§ 4º):

    § 1° A declaração compreenderá imóveis, móveis, semoventes, dinheiro,

    títulos, ações, e qualquer outra espécie de bens e valores patrimoniais, localizado no

    País ou no exterior, e, quando for o caso, abrangerá os bens e valores patrimoniais do

    cônjuge ou companheiro, dos filhos e de outras pessoas que vivam sob a dependência

    econômica do declarante, excluídos apenas os objetos e utensílios de uso doméstico.

    § 2º A declaração de bens será anualmente atualizada e na data em que o

    agente público deixar o exercício do mandato, cargo, emprego ou função.

    § 3º Será punido com a pena de demissão, a bem do serviço público, sem

    prejuízo de outras sanções cabíveis, o agente público que se recusar a prestar

    declaração dos bens, dentro do prazo determinado, ou que a prestar falsa.

    § 4º O declarante, a seu critério, poderá entregar cópia da declaração anual

    de bens apresentada à Delegacia da Receita Federal na conformidade da legislação do

    Imposto sobre a Renda e proventos de qualquer natureza, com as necessárias

    atualizações, para suprir a exigência contida no caput e no § 2° deste artigo.

    Já a Lei 8.730/93, conforme determinação contida em sua ementa, “estabelece

    a obrigatoriedade da declaração de bens e rendas para o exercício de cargos, empregos e

    funções nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, e dá outras providências”. Ou

    seja, assim como art. 13 da Lei 8.429/92, a Lei 8.730/93 trata das regras para a

    apresentação da declaração de bens e rendas dos agentes públicos. A Lei 8.730/93 não

    trás muita inovação ao assunto, porém merece destaque por detalhar melhor a matéria.

    O seu art. 1º determina que é obrigatória a apresentação de declaração de bens

    do agente público, com indicação das fontes de renda tanto no início do vínculo com o

    Poder Público quanto no término deste. O § 1° do art. 1º lista as autoridades e os

  • 35

    servidores que estão sujeitos à lei em questão. O § 2° determina que o agente público

    deve enviar cópia da declaração ao TCU, para que este possa atuar conforme descrito

    nos incisos I a VI, transcritos abaixo:

    I - manter registro próprio dos bens e rendas do patrimônio privado de

    autoridades públicas;

    II - exercer o controle da legalidade e legitimidade desses bens e rendas, com

    apoio nos sistemas de controle interno de cada Poder;

    III - adotar as providências inerentes às suas atribuições e, se for o caso,

    representar ao Poder competente sobre irregularidades ou abusos apurados;

    IV - publicar, periodicamente, no Diário Oficial da União, por extrato, dados

    e elementos constantes da declaração;

    V - prestar a qualquer das Câmaras do Congresso Nacional ou às respectivas

    Comissões, informações solicitadas por escrito;

    VI - fornecer certidões e informações requeridas por qualquer cidadão, para

    propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou à

    moralidade administrativa, na forma da lei.

    Além do disposto acima, o TCU pode instituir formulários relativos à

    declaração e prazos máximos de remessa, bem como pode exigir a comprovação da

    legitimidade da procedência dos bens e rendas acrescidos ao patrimônio do agente no

    período relativo à declaração, conforme determinação do art. 2º, § 7°.

    O art. 2º relaciona os bens que devem ser declarados.

    Se a declaração não for apresentada, não haverá posse ou se a posse já tiver

    ocorrido, haverá sua nulidade (art. 3º, caput). Se a cópia da declaração não for

    apresentada ao TCU, ou se for apresentada com atraso, implicará, de acordo com o art.

    3º, § único, alíneas “a” e “b”:

    a) crime de responsabilidade, para o Presidente e o Vice-Presidente da

    República, os Ministros de Estado e demais autoridades previstas em lei especial,

    observadas suas disposições; ou

    b) infração político-administrativa, crime funcional ou falta grave disciplinar,

    passível de perda do mandato, demissão do cargo, exoneração do emprego ou

  • 36

    destituição da função, além da inabilitação, até cinco anos, para o exercício de novo

    mandato e de qualquer cargo, emprego ou função pública, observada a legislação

    específica.

    O art. 7º estabelece que as diretrizes traçadas pela Lei 8.730/93 devem ser

    adotadas pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, no que couber, com normas

    gerais de direito financeiro.

    2.2 CONTROLE REPRESSIVO

    O controle repressivo da improbidade administrativa surge perante a

    necessidade de se apreciar e rever os atos administrativos, para que se possa corrigir

    eventuais desvios.

    Tendo em vista a organização político-administrativa contida na Constituição

    Federal, notamos que a atividade administrativa e os princípios que por ela devem ser

    observados abrangem tanto o Poder Executivo quanto o Legislativo e o Judiciário.

    Dentro desta ótica, o controle pode ser dividido em três partes: controle

    administrativo, controle legislativo e controle judiciário. Segundo Garcia e Alves

    (2011):

    O primeiro se apresenta como uma forma de controle interno, ou autocontrole, realizado no âmbito da própria organização administrativa de onde emanara o ato. Os dois últimos, por sua vez, são formas de controle externo, exercidos por órgãos alheios à atividade administrativa, ainda que esta tenha sido desempenhada por órgãos que integram os Poderes Legislativo e Judiciário. (GARCIA e ALVES, 2011, p. 152).

    É importante destacar que há também um controle exercido pelo Ministério

    Público, conforme determinado pela Constituição Federal em seu art. 129, II, ao

    estabelecer como atribuições do MP: “zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e

    dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição,

    promovendo as medidas necessárias à sua garantia”. Porém, vamos destacar no presente

    trabalho apenas os controles administrativo, legislativo e judiciário.

    Para Freire (2006), “controle administrativo é o exercido pelo Executivo e

    pelos órgãos administrativos do Legislativo e do Judiciário, sob os aspectos de

    legalidade e mérito, por iniciativa própria ou mediante provocação” (p. 475).

  • 37

    Os órgãos que integram os Poderes Públicos têm competência para fiscalizar e

    rever seus próprios atos administrativos e também os atos administrativos de órgãos que

    estejam hierarquicamente em patamar inferior. Este é o dever-poder de autotutela que é

    restrito ao âmbito interno de cada Poder, não havendo assim interferência extrínseca.

    Quando o controle administrativo é aplicado, os atos administrativos podem ser

    ratificados, suprimidos ou modificados após a análise da compatibilidade destes atos

    com os princípios que regem toda atividade estatal, ou até mesmo por razões de

    conveniência e oportunidade da Administração.

    O controle administrativo pode ter início das seguintes maneiras: a) sendo

    instaurado de ofício, ou seja, instaurado pelo próprio órgão, sem provocação, quando

    este identifica alguma irregularidade no seu âmbito de atuação; b) pela apresentação de

    petição, conforme determinação contida no art. 5º, XXXIV, “a”, da Constituição

    Federal que garante a todos “o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de

    direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder”; ou c) utilização do recurso

    administrativo que é o instrumento utilizado pelo administrado para que a autoridade

    reveja atos administrativos por ela praticados (pedido de reconsideração) ou para que

    autoridade superior à que proferiu o ato reveja este ato (recurso hierárquico).

    A identificação, por meio de controles internos, de atos administrativos

    contrários à juridicidade que deve direcionar a atuação do Poder Público, nem sempre

    resultará na individualização de um ato de improbidade. Quando um agente público,

    responsável por um determinado ato, identifica o ilícito e procura corrigi-lo, sem o

    envolvimento de fatores externos (por exemplo, uma investigação criminal), estará

    afastando, a princípio, a improbidade, pois estará afastando o dolo e estará zelando pelo

    interesse público. Porém, havendo o envolvimento de fatores externos, seria provável

    que o agente em questão estivesse tentando encobrir um ato ilícito já consumado, fato

    este que confirmaria a improbidade.

    Uma vez detectada a improbidade administrativa, será instaurado um processo

    administrativo para investigar os atos praticados pelo ímprobo. As sanções

    administrativas que poderão ser aplicadas, quando o processo chegar ao fim, estarão

    cominadas no estatuto regente da categoria funcional do agente investigado. Estas

    sanções não impedem que sejam aplicadas as sanções nas esferas civil e penal, além das

    sanções contidas na Lei 8.429/92, segundo determinação do art. 12, caput, da Lei de

  • 38

    Improbidade: “independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas

    na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes

    cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a

    gravidade do fato”.

    No tocante à fiscalização financeira e orçamentária, a Constituição Federal

    determina que os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário deverão manter, de forma

    integrada, sistema de controle interno, sem prejuízo do controle externo exercido pelos

    Tribunais de Contas. Apesar de o texto constitucional estar direcionado à União, todos

    os demais entes federativos devem observar estas determinações, que estão contidas no

    art. 74 da Constituição, transcrito abaixo:

    Art. 74. Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma

    integrada, sistema de controle interno com a finalidade de:

    I - avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução

    dos programas de governo e dos orçamentos da União;

    II - comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e

    eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da

    administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de

    direito privado;

    III - exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como

    dos direitos e haveres da União;

    IV - apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.

    § 1º - Os responsáveis pelo controle interno, ao tomarem conhecimento de

    qualquer irregularidade ou