dissertacao una pedro h o figueiredo marco de 20112
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O trabalho de campo na Geografia Escolar como estratégia para a percepção da dimensão socioespacial do realTRANSCRIPT
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CENTRO UNIVERSITRIO UNA
DIRETORIA DE EDUCAO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSO
MESTRADO EM GESTO SOCIAL,
EDUCAO E DESENVOLVIMENTO LOCAL
Pedro Henrique de Oliveira Figueiredo
O trabalho de campo na Geografia Escolar como estratgia
para a percepo da dimenso socioespacial do real.
Belo Horizonte
Maro 2011
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Pedro Henrique de Oliveira Figueiredo
O trabalho de campo na Geografia Escolar como estratgia
para a percepo da dimenso socioespacial do real.
Belo Horizonte
Maro de 2011
Dissertao e proposta de interveno apresentadas
ao Mestrado em Gesto Social, Educao e Desenvolvimento Local do Centro Universitrio UNA, como requisito parcial obteno do ttulo de Mestre
rea de concentrao: Inovaes Sociais Educao e
Desenvolvimento Local
Linha de pesquisa: Processos Educacionais: Tecnologias Sociais e Gesto do Desenvolvimento Local
Orientadora: Prof
a. Dr
a. Rosalina Batista Braga
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Ficha catalogrfica desenvolvida pela Biblioteca UNA campus Guajajaras
F476t Figueiredo, Pedro Henrique de Oliveira
O trabalho de campo na geografia escolar como estratgia para a
percepo da dimenso socioespacial do real / Pedro Henrique de Oliveira
Figueiredo. 2011.
108f.: il.
Orientador: Profa. Dr
a. Rosalina Batista Braga.
Dissertao (Mestrado) - Centro Universitrio UNA 2011. Programa de
Mestrado em Gesto Social, Educao e Desenvolvimento Local.
Bibliografia f. 90 93.
1. Geografia estudo e ensino Trabalho cientfico de campo. I. Braga,
Rosalina Batista . II. Centro Universitrio UNA. III. Ttulo.
CDU: 658.114.8
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CENTRO UNIVERSITRIO UNA
DIRETORIA DE EDUCAO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSO
MESTRADO EM GESTO SOCIAL, EDUCAO E DESENVOLVIMENTO LOCAL
Dissertao intitulada O trabalho de campo na Geografia Escolar como estratgia
para a percepo da dimenso socioespacial do real, de autoria do mestrando
Pedro Henrique de Oliveira Figueiredo, aprovada pela banca examinadora,
constituda pelos seguintes professores:
_____________________________________________________
Prof. Dra. Rosalina Batista Braga (Orientadora) UNA
____________________________________________________
Prof. Dra. Valeria de Oliveira Roque Asceno UFMG
__________________________________________________
Prof. Dra. urea Regina Guimares Thomazi UNA
______________________________________________________
Prof. Dra. Luclia Regina de Souza Machado
Coordenadora do Mestrado em Gesto
Social, Educao e Desenvolvimento Local
Belo Horizonte, 16 de maro de 2011
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A solido da escrita foi uma conquista.
Por isso, reconheo o carinho de duas pessoas em
especial: minha orientadora Rosalina
pela persistncia e competncia
e minha esposa Caroline
pela pacincia e compreenso.
Agradeo sempre a presena dos meus pais
e de todos que de certa forma
contriburam para a realizao desta pesquisa.
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RESUMO
A ampliao da leitura de mundo dos alunos um dos objetivos propostos para a educao bsica. A
Geografia Escolar busca desenvolver essa leitura, promovendo uma ressignificao da dimenso
socioespacial do real. Partiu-se da hiptese de que uma das formas para se atingir essa leitura seria
por meio de uma apropriao adequada do trabalho de campo escolar. Esta pesquisa se props
investigar a potencialidade dessa estratgia pedaggica para a construo de percepes da
dimenso socioespacial da realidade dentro do universo da educao geogrfica. Para isso, foi
desenvolvido um projeto de trabalho de campo em um assentamento de sem terra onde,
hipoteticamente, o grupo de assentados havia desenvolvido Tecnologias Sociais. Trabalhou-se com a
hiptese de que o contato com essas Tecnologias Sociais de produo e apropriao do espao e
com o cotidiano do assentamento fomentaria novas leituras de mundo. Foram identificadas algumas
mudanas nas percepes dos alunos sobre a dimenso socioespacial dos processos de produo e
apropriao do espao geogrfico. A metodologia da pesquisa foi, essencialmente, qualitativa e a
coleta de dados foi organizada em trs perodos: uma parte antes do trabalho de campo, para
identificar as percepes iniciais dos alunos; outra durante a execuo do trabalho de campo, aps
uma preparao metodolgica e terico-conceitual dos alunos e por fim uma aps a realizao do
trabalho de campo, para o processo de sistematizao da atividade, quando foram identificadas
algumas mudanas ocorridas nas percepes dos alunos.
PALAVRAS-CHAVE: Educao geogrfica. Trabalho de campo. Geografia escolar. Tecnologia social.
ABSTRACT
The expansion of students' reading of reality is one of the goals espoused for elementary and high
school in Brazil. The Geography taught in those levels tries to develop this approach, promoting a
redefinition of sociospatial dimension of reality. This research had the hypothesis which working with
outdoors classes would improve this redefinition. This study intended to investigate the potential this
strategy to develop new perceptions of the sociospatial dimension of reality. Furthermore, it was
developed a project in a settlement where, hypothetically, the group of landless had developed Social
Technologies. This research also worked with the hypothesis that the contact with these Social
Technologies of production and appropriation of space and with the daily work in the settlement would
encourage new readings of the world. We identified some changes in students' perceptions about the
sociospatial processes of production and appropriation of the geographical space. The research
methodology was essentially qualitative and the data collection was divided into three parts: the
previous one was to identify the initial perceptions of students; the second one happened during the
execution of project with a theoretical and methodological preparation of the students and the last one
was after the project with the process of systematization of the activity, when it was identified some
changes in the perceptions of students.
KEYWORDS: Geographic education. Outdoor class. School geography. Social technology.
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LISTA DE GRFICOS
1. Depoimentos sobre as habitaes populares entre e depois do trabalho
de campo ........................................................................................................37
2. Percepes sobre as condies de vida em aglomerados urbanos e no
assentamento..................................................................................................43
3. As percepes sobre a ocupao do espao urbano e do espao rural ........48
4. A percepo sobre a gerao de renda antes e depois do trabalho de campo
em reas de agroindstria..............................................................................56
5. A percepo sobre a gerao de renda antes e depois do trabalho de campo
em reas com agricultura de subsistncia......................................................58
6. As percepes sobre a urbanizao do Brasil................................................62
7. As percepes sobre as atribuies do poder pblico no meio urbano .........66
8. As percepes sobre a organizao do espao agrrio antes e depois do
trabalho de campo ..........................................................................................70
9. As percepes sobre as atribuies do poder pblico no meio rural .............74
10. Tcnicas e saberes percebidos pelos alunos no assentamento ....................77
11. As relaes entre os assentados e o poder pblico .......................................78
12. Elementos percebidos pelos alunos para construo de tcnicas e estratgias
para o equacionamento dos problemas do cotidiano......................................79
13. Depoimentos sobre as mudanas de percepo sobre o meio rural ocupados
por assentados ...............................................................................................80
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LISTA DE QUADROS
1. Percepo sobre as habitaes populares.................................................................35
2. Percepo aps o trabalho de campo sobre as habitaes
populares....................................................................................................................36
3. Percepo sobre as moradias de alto luxo.................................................................39
4. Percepo inicial sobre a condio de vida em reas pobres....................................41
5. Percepo aps o trabalho de campo sobre a condio de vida em reas
pobres.........................................................................................................................42
6. Percepo inicial da ocupao do espao rural e do espao urbano.........................45
7. Percepo aps o trabalho de campo da ocupao do espao rural e
do espao urbano........................................................................................................47
8. Percepo inicial sobre a agricultura de subsistncia................................................50
9. Percepo inicial sobre as agroindstrias...................................................................51
10. Percepo inicial sobre a condio de vida no meio rural..........................................52
11. Percepo inicial sobre a ocupao do meio rural.....................................................54
12. Percepo aps o trabalho de campo sobre as agroindstrias..................................55
13. Percepo aps o trabalho de campo sobre a agricultura de
subsistncia ...............................................................................................................57
14. Percepo inicial sobre o processo de urbanizao...................................................60
15. Percepo aps o trabalho de campo sobre a urbanizao brasileira.......................61
16. Percepo inicial sobre as atribuies do poder pblico no meio urbano..................64
17. Percepo aps o trabalho de campo sobre as atribuies do poder pblico
no meio urbano.................................................................................................................65
18. Percepo sobre a organizao do espao agrrio brasileiro....................................68
19. Percepo aps o trabalho de campo sobre a organizao do espao
agrrio brasileiro...............................................................................................................69
20. Percepo sobre as atribuies do poder pblico no meio rural................................72
21. Percepo aps o trabalho de campo sobre as atribuies do poder pblico
no meio rural.....................................................................................................................73
22. Anlise das percepes dos alunos sobre o mundo agrrio brasileiro antes e depois
do trabalho de campo.......................................................................................................81
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SUMRIO
1 INTRODUO ....................................................................................................................................8
2 REVISO DA LITERATURA.............................................................................................................14
2.1 A Geografia Acadmica e a Escolar e a aproximao da educao geogrfica com a dimenso socioespacial do real.............................................................................................................14 2.2 O Trabalho de campo escolar ........................................................................................................21 2.3 As Tecnologias Sociais e o Ensino de Geografia...........................................................................25
3 METODOLOGIA E PROCEDIMENTO DE COLETA DE DADOS.....................................................27
4. APRESENTAO E ANLISE DOS DADOS .................................................................................33
4.1 Sobre as habitaes.......................................................................................................................33 4.2 Sobre as condies de vida num aglomerado urbano e no Assentamento Pastorinha......................................................................................................................40 4.3 Sobre a ocupao do espao rural e do espao urbano................................................................44 4.4 A agricultura de subsistncia e a agroindstria..............................................................................49 4.5 As condies de vida no espao Rural Brasileiro (agricultura de subsistncia e agroindstrias)...................................................................................................................................51 4.6 O processo de ocupao no espao Rural Brasileiro (agricultura de subsistncia e agroindstrias).......................................................................................................................................53 4.7 A gerao de renda no meio rural (a agroindstria e a agricultura de subsistncia.......................54 4.8 Sobre o processo de urbanizao..................................................................................................59 4.9 Sobre as atribuies do poder pblico na organizao do espao urbano ....................................63 4.10 Sobre a organizao do espao agrrio........................................................................................67 4.11 Sobre as atribuies do poder pblico na organizao do espao rural ......................................71
5. A PERCEPO DOS ALUNOS NO ASSENTAMENTO PASTORINHA E A
(RE) SIGNIFICAO DA DIMENSO SOCIOESPACIAL DO REAL..................................................75
5.1 Sobre as negociaes comunitrias e a comercializao dos produtos agrcolas.........................75 5.2 Sobre os saberes e as tcnicas comunitrias.................................................................................76 5.3 Sobre as lideranas comunitrias e poder pblico..........................................................................77 5.4 Sobre as estratgias de desenvolvimento da comunidade.............................................................78
6. AS MUDANAS NAS PERCEPES DOS ALUNOS SOBRE O
ASSENTAMENTO PASTORINHA .......................................................................................................80
7. CONSIDERAES FINAIS .............................................................................................................83
8. PROPOSTA DE INTERVENO ...................................................................................................87
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ....................................................................................................90
10. APNDICES ...................................................................................................................................94
10.1 - Roteiro para o diagnstico antes do trabalho de campo.............................................................94 10.2 - Roteiro para a instrumentalizao...............................................................................................96 10.3 - Roteiro para as entrevistas com os assentados.......................................... .............................101 10.4 - Roteiro para o diagnstico depois do trabalho de campo.........................................................105
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1. Introduo
Este trabalho parte da perspectiva de que a educao bsica procura desenvolver
diversas formas de ampliao da leitura de mundo dos alunos por meio de diferentes
procedimentos pedaggicos. Frequentemente so desenvolvidas vrias estratgias
didtico-pedaggicas para a realizao desse objetivo: visitas tcnicas, pesquisas
em bibliotecas e na Internet, apresentaes cnicas, exposies, mostras culturais e
atividades em ambientes fora da escola com destaque para o trabalho de campo.
Esse ltimo, embora seja bastante utilizado, ainda carece de uma maior
sistematizao, pois em seu planejamento, execuo e na anlise dos resultados,
ainda possvel verificar muitas insuficincias. Como professor de Geografia, o
autor dessa pesquisa vem tentando aprimor-lo a cada sada a campo, contudo h
ainda limitaes a serem superadas para se desenvolver um aprofundamento dessa
estratgia.
As discusses sobre o trabalho de campo no so recentes. Em diversas cincias,
ele tem sido um procedimento muito utilizado para a coleta de dados. Acredita-se
que o trabalho de campo organizado e sistematizado tenha sido um dos
procedimentos centrais e fundantes das atividades cientficas do alemo Alexander
Von Humboldt, no sculo XIX. Grande parte da literatura sobre a construo do
pensamento geogrfico identifica a publicao da coletnea Cosmos (1848) de
autoria de Alexander Von Humboldt (1769-1859) como marco inicial da cincia
geogrfica. Humboldt, como Charles Darwin (1809-82), realizou longas viagens,
percorrendo grandes pores das reas continentais e insulares, coletando dados
empricos que, posteriormente, sustentaram suas formulaes cientficas.
A cincia geogrfica, assim como as demais disciplinas cientficas, convive e se
apropria das diversas alternativas metodolgicas disponveis para a produo do
conhecimento. A Geografia, como a maior parte das disciplinas ligadas s cincias
sociais e humanas, insere-se, historicamente, na produo do conhecimento
sistemtico a partir do final da primeira metade do sculo XIX. As escolhas
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metodolgicas na produo do conhecimento geogrfico deram origem s diversas
correntes no interior da Geografia e pode-se dizer que, hoje, existam Geografias.
Desde meados do sculo XIX, a Geografia, inscrita no universo acadmico como
disciplina cientfica, passa a ser tomada como cincia de referncia para o ensino dos
contedos geogrficos nos processos de escolarizao. Os recentes estudos que
consideram as especificidades das disciplinas escolares em relao s suas cincias
de referncias destacam a necessidade de considerar a distino de objetivos, funo
e finalidades dessas prticas. (BRAGA, 2011. Prelo)1
Mesmo com essa tradio que remonta ao incio do sculo XIX, o trabalho de campo
ainda alvo de discusses e indagaes no universo acadmico e no universo
escolar. Qual seria a melhor forma de execut-lo? Que relaes ele pode propiciar
entre teoria e prtica? Quais as semelhanas e as diferenas com outras atividades
de campo? Como realiz-lo na educao bsica para que ele se torne um
instrumento til ressignificao do espao socialmente produzido? Por que ele, s
vezes, gera desconfianas quando s suas potencialidades pedaggicas nas
escolas? H diferenas entre as prticas de trabalho de campo realizado na
Geografia Acadmica e na Escolar?
Essas indagaes se relacionam com a aprendizagem da dimenso socioespacial
do real na educao bsica. Como o trabalho de campo tem um papel histrico e a
produo da Geografia cientfica o inscreveu em suas estratgias como instrumento
de coleta de dados, desde as suas origens em meados do sculo XIX, nessa
pesquisa se investigou a sua eficcia para a educao geogrfica.
Como a geografia trabalhada no universo escolar e no acadmico e em ambos o
trabalho de campo utilizado como estratgia de coleta de dados e de (re)
significao do espao socialmente produzido, torna-se necessrio distingui-las. A
Geografia Escolar no pode ser considerada como uma miniatura da Geografia
Acadmica, ou seja, a Geografia na escola no tem a funo de formar gegrafos
1 BRAGA, Rosalina Batista. A (re) significao do conceito de natureza e ambiente no ensino bsico:
uma reflexo sobre as heranas iluministas e o trabalho de campo como mediao pedaggica.
Trabalho a ser apresentado e publicado em livro, contendo coletnea dos textos dos palestrantes do
XI Encontro Nacional de Prtica de Ensino de Geografia 11ENPEG (Prelo)
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menores. desejvel que a primeira construa, com os alunos, conceitos espaciais
bsicos, respeitando as possibilidades cognitivas, socioafetivas dos educandos. O
objetivo principal da geografia escolar seria, ento, possibilitar o desenvolvimento de
um raciocnio geogrfico voltado para a compreenso da realidade socioespacial
que mutvel e historicamente construda.
a partir das questes anteriormente que esta pesquisa foi construda. Seu
problema central est vinculado s dificuldades que os alunos tm apresentado para
perceberem a dimenso socioespacial do espao, mesmo quando ocorre o
tratamento de contedos relacionados com a questo em sala de aula. Ela nasceu
da anlise de alguns dados iniciais da prtica pedaggica do pesquisador como
professor de Geografia. A pesquisa teve como objetivo identificar, em que medida, o
trabalho de campo escolar poderia ser uma ferramenta metodolgica para superar a
tradio didtica que refora a memorizao e afasta a possibilidade de uma
interpretao da espacialidade que possibilite uma percepo concreta e sistemtica
da dimenso socioespacial do real pelos alunos.
A proposta desta pesquisa foi investigar a potencialidade do trabalho de campo para
a construo de novas leituras da dimenso socioespacial da realidade dentro do
universo da Geografia Escolar. O intuito foi verificar se o trabalho de campo
contribuiria para superar as caractersticas mnemnicas e enciclopedistas dessa
Geografia, construindo uma percepo do espao mais significativa e real.
Considerando-se que as realidades sociais e econmicas so diversificadas e, alm
disso, que o espao vivido de cada aluno nico, a construo de significados no
processo de ensino/aprendizagem diferenciado e por isso, no aconselhvel
trabalhar com anlises hermticas do espao.
A experincia do pesquisador como docente mostrou que na Geografia Escolar, os
alunos precisam construir conceitos e significados de forma autnoma, com o intuito
de elaborarem entendimentos e refletirem sobre as relaes sociais e naturais. Para
isso, torna-se necessrio, aliar o contedo da disciplina com as informaes e
significados oriundos do espao vivido pelos alunos para reduzir o distanciamento
do real em relao aos contedos dados em sala.
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Por isso, prticas pedaggicas desenvolvidas em ambientes fora da sala de aula
podem, alm de amenizar a tradio da geografia escolar, propiciar um contato
direto com as realidades em construo e ampliar o interesse do aluno pela
disciplina.
No entanto, a consolidao de novos significados sobre a dimenso socioespacial
do real que estruturam o espao geogrfico demanda um dilogo constante com a
teoria em sala de aula. Essa relao entre teoria e prtica ainda muito discutida
nas escolas sob o nome de contextualizao e, at hoje, h muitas dificuldades para
a aproximao do que est dentro e fora dos muros da escola.
A partir da visualizao dos processos de produo, organizao e apropriao do
espao geogrfico a relao sociedade/natureza pode ganhar um significado ainda
no vivenciado pelos estudantes da escola bsica. Por isso o trabalho de campo
pode favorecer a consolidao de prticas pedaggicas mais instigantes e
investigadoras na escola bsica ao fomentar a (re) significao da dimenso
socioespacial do real
O trabalho de campo escolar pode se tornar uma atividade que auxilia o professor a
construir com os alunos uma interpretao sobre a complexidade da
produo/apropriao do espao geogrfico. Esse espao que o objeto de estudo
da cincia geogrfica necessita de uma abordagem mais atenta da Geografia
Escolar, pois ele no pode ser estudado pelos gegrafos como uma categoria
independente uma vez que ele nada mais que um dos elementos do sistema
social. (KAISER, 2006, p. 97). Desta forma, a abordagem do espao geogrfico
sugere a busca de prticas interdisciplinares que integrem os vrios campos
disciplinares.
Para verificar essa abordagem e a necessidade de compreenso do dinmico
processo de produo/apropriao do espao geogrfico, os alunos realizaram um
trabalho de campo no Assentamento Pastorinha localizado no municpio de
Brumadinho (MG). Partiu-se da hiptese de que a produo de tecnologias sociais
nesse espao e a gesto do desenvolvimento local poderiam oferecer maior
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visibilidade para a dimenso social do espao. A dinmica do assentamento
explicitaria os processos conflituosos e contraditrios existentes, o que estimularia a
(re) significao da dimenso socioespacial por parte dos alunos.
A discusso sobre as Tecnologias Sociais ainda pouco realizada no ambiente
escolar. O campo de estudo desse conceito recente e traz-lo para a sala de aula
abre novos caminhos para a interao da escola com a dinmica social. Nesse
trabalho foi considerado como Tecnologias Sociais o conjunto
[...] de tcnicas e metodologias transformadoras, desenvolvidas e/ou aplicadas na interao com a populao e apropriadas por ela, que representam solues para incluso social e melhoria das condies de vida (PASSONI, 2007, p. 29)
Desde a redemocratizao do pas no final da dcada de 80, discute-se que as
escolas precisam dialogar mais com a comunidade do entorno. Desenvolver novos
conceitos e opes pedaggicas, dentre elas a identificao e percepo de
Tecnologias Sociais, pode trazer novos caminhos para a escolarizao bsica,
sobretudo, para os estudos ligados s disciplinas vinculadas s Cincias Humanas
nas escolas.
Os alunos, ao compartilharem informaes com a comunidade do entorno e ao
construrem novos significados aps um trabalho de campo em reas que
hipoteticamente desenvolveram Tecnologias Sociais, poderiam ressignificar o
processo de produo e apropriao social desse espao. Porm, h outro desafio:
as articulaes comunitrias e a prpria escola esto diante de cenrios novos e
mutantes no sculo XXI. Os alunos de escolas da rede privada, em sua maioria,
apropriam-se pouco dessas transformaes. Muitos esto desconectados das novas
realidades sociais onde a supresso da desigualdade e a necessidade de gerao
de renda ainda so aspirados.
Desta maneira, o objetivo geral dessa pesquisa foi verificar se o trabalho de campo
escolar em reas em que a comunidade, hipoteticamente, tenha desenvolvido
Tecnologias Sociais, contribuiria para que os estudantes incorporassem a dimenso
social do espao geogrfico. Isto significaria novas leituras do mundo, (re)
significao da dimenso socioespacial do real.
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Na coleta de dados, inicialmente, foi necessrio identificar como os estudantes
significavam a dimenso social do espao atravs de um diagnstico em sala de
aula. Aps esse diagnstico, houve realizao de um trabalho de campo escolar,
com um grupo de alunos do 1 ano do ensino mdio. Nesse houve uma coleta de
dados por meio da observao da realidade e entrevistas junto comunidade
investigada sobre os processos de produo, comercializao e organizao no
interior do assentamento em Brumadinho.
Aps o trabalho de campo, os dados foram analisados com esses alunos, sendo
produzidas snteses para identificar novos possveis significados construdos por
eles sobre a dimenso social do espao geogrfico. Por fim, foram elaborados dois
canais para o fomento de discusses e divulgao de trabalhos de campo entre
escolas, professores e alunos: um encarte cujo modelo est disponvel neste
trabalho e uma comunidade virtual em um site de relacionamento.
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2. Reviso da literatura
Eu perguntei se no aprendiam nada de Geografia. No
precisa, disse um deles, isso a gente aprende no p. Os
igaraps vo pro Tocantins. O Tocantins desce pro mar, s
olh, n? No topo daquele monte no serve pra plant. A terra
ruim. No baixo boa. no p mesmo, andando e olhando.
(Maria Regina C. T. Sader Espao e Luta no Bico do
Papagaio)
A reviso da literatura nesta pesquisa foi arquitetada para sistematizar produes
conceituais significativas a respeito da Geografia Escolar e da Acadmica e tambm
sobre o trabalho de campo escolar e bem como as Tecnologias Sociais.
Por isso, esse captulo, foi dividido em trs partes. A primeira aborda as
especificidades da Geografia Escolar e a complementaridade entre a Geografia
Escolar e a Acadmica. A segunda parte focaliza as observaes e as percepes
sobre o trabalho de escolar. Finalmente, a ltima parte faz um levantamento sobre o
conceito de Tecnologia Social.
2.1. A Geografia Acadmica e a Escolar e a aproximao da educao geogrfica
com a dimenso socioespacial do real.
O ensino de Geografia na educao bsica alvo de diversas discusses tericas.
Entre essas se destaca a relao teoria/prtica materializada no tratamento dado ao
contedo desenvolvido em sala de aula e suas interaes com a dimenso
socioespacial do real. Isso, de acordo com alguns autores, pode levar o ensino da
Geografia Escolar a uma reduo aos contedos da Geografia Acadmica ou a um
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formato enciclopedista e mnemnico. Entretanto, pensar sobre essa questo requer
pensar nas diferenciaes da Geografia como cincia e disciplina escolar.
O pesquisador Andr Chervel (1990) fundamentou, em seus estudos, a distino
entre as disciplinas escolares e as disciplinas cientficas que lhes servem de
referncia. Segundo Braga (2003), no caso da Geografia, essa distino ocorre,
inclusive, com a separao dessas prticas no tempo. Segundo afirma a autora, a
Geografia, como um conjunto de contedos escolares, existiu muito antes da
Geografia se tornar uma disciplina cientfica. Alimentada por um conjunto de
informaes e dados espaciais a Geografia Escolar apresenta uma histria prpria
que se constri mediante objetivos, funes, estruturas e caractersticas ligadas e
constitudas, historicamente, nas prticas de escolarizao.
Ainda segundo a mesma autora, a prtica de confundir ou fundir a Geografia
Acadmica com a Geografia Escolar, como frequentemente feito no cotidiano da
sala de aula e at mesmo nas universidades, tem prestado um grande desservio,
sobretudo ltima. No se trata de afirmar que a Geografia Acadmica e a Escolar
so prticas isoladas e nem de pens-las como distintas. A primeira tem sido aps
meados do sculo XIX, a cincia de referncia para a segunda.
Para os estudos sobre a educao geogrfica bsica, a fuso das duas prticas (escolar e acadmica) tem significado, principalmente, uma secundarizao, seno a prpria eliminao das questes especficas sobre o ensino, na educao geogrfica. (BRAGA, 2003,p.76)
Para Braga (1997), a predominncia da prtica de memorizao na Geografia
Escolar no Brasil ainda um trao importante da tradio didtica escolar. Esse
trao da Geografia Escolar ainda perdura nas escolas at hoje e, no raro, torna
essa disciplina desinteressante para grande parte dos educandos. A memorizao
na educao geogrfica tem levado ao esvaziamento da construo de significados
e das habilidades geogrficas.
[...] com freqncia, trabalhamos um contedo de determinada forma porque j vimos algum fazendo assim ou pensamos que esta uma forma possvel e desejvel de ensinar aquele contedo. freqente trabalharmos um contedo sem, verdadeiramente, nos perguntarmos: por que este contedo e no outro? Por que assim e no de outra forma? Enfim, por que trabalhar isto, desta forma, nesta disciplina? (BRAGA, 2003, p. 64)
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Na educao geogrfica os alunos precisam construir conceitos para elaborarem
entendimentos e refletirem sobre as relaes entre a sociedade e a natureza, ou
seja, sobre a dimenso socioespacial do real. Isso significa que aliar teoria e prtica
fundamental para a estruturao dessa disciplina escolar. E, essa perspectiva
que precisa ser projetada pelo professor em seus planejamentos. A necessidade de
reduo do apelo memorizao na Geografia Escolar pode ser favorecida por
prticas pedaggicas desenvolvidas em ambientes fora da sala de aula que
propiciem um contato direto com as realidades em construo. Braga (2003) refora
a ideia de que os alunos precisam acessar, processar e interpretar as informaes e
os dados geogrficos e no apenas memoriz-los e repeti-los. A educao
geogrfica pautada na memorizao pode enfraquecer a apropriao do contedo e
gerar uma desmotivao no ambiente de sala de aula. As relaes espaciais,
essenciais para o desenvolvimento do raciocnio geogrfico, precisam ser
construdas nos processos pedaggicos. Elas no podem ser tratadas
como se fossem uma aquisio natural e/ou automtica. So tomadas como se fossem apenas resultantes de automatismos, sem se vincularem subjetividade dos sujeitos envolvidos, sem necessitar de um processo pedaggico que considere os significados espaciais dos educandos. Destacamos que a aquisio das relaes espaciais uma necessidade para o desenvolvimento do raciocnio geogrfico e para a construo de estruturas mentais ligadas ao pensamento lgico, mas raramente so tratadas no ensino. (BRAGA, 2003, p. 78)
O francs Jean Michel Brabant questionou, em 1976, as prticas mnemnicas e
enciclopedistas no ensino da Geografia. Para ele, essas afastam a Geografia do real
e maximizam a desmotivao dos alunos frente a essa disciplina. O autor destaca
situaes na Geografia Escolar onde o enciclopedismo prevalece em sala de aula.
Para ele,
[...] o enciclopedismo contribuiu para a abstrao crescente do discurso geogrfico, ao mesmo tempo que alimentou o tdio das geraes de alunos que classificaram a geografia entre as matrias a memorizar. (BRABANT, 1976, p.19).
Entretanto, necessrio destacar que nem sempre a realidade visvel esclarece
completamente o que de fato acontece no espao. (SERPA, 2006, p. 16). Fazer um
trabalho de campo representa, portanto, um
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[...] momento de reconstruo do conhecimento que no pode prescindir da teoria, sob pena de tornar-se vazio de contedo, incapaz de contribuir para revelar a essncia dos fenmenos geogrficos. (ALENTEJANO e ROCHA-LEO, 2006, p. 57)
Contudo, levar os alunos a campo para essa (re) significao da dimenso social do
espao poderia ser feito por qualquer disciplina escolar e em qualquer srie. Porm,
trata-se dessa dimenso social produzida e reproduzida no espao geogrfico e
ento, a Geografia Escolar a disciplina que deve possuir competncia construda
para realizar esta atividade j que o mesmo o seu objeto de estudo. Contudo, fazer
essa afirmao no pode significar uma secundarizao da necessidade das
prticas multi e interdisciplinares e sim deixar clara a necessidade de precisar o
campo de produo original dessa abordagem.
A Geografia trabalhada dentro da sala de aula no pode ter objetivos semelhantes
aos da formao dos gegrafos, mas deve servir para construir os significados que
possibilitem uma releitura do mundo pelos alunos. Braga (2003) ressalta que
necessrio ultrapassar prticas pedaggicas da educao geogrfica que
configuram como uma mera repetio da Geografia Acadmica, pois a Geografia
como disciplina escolar tem caractersticas prprias, principalmente no que tange ao
desenvolvimento da percepo da dimenso socioespacial do real. Moraes (1986)
tambm problematiza essa questo entre a Geografia Acadmica e a Escolar,
ressaltando a necessidade de uma reviso dos processos desenvolvidos na
formao inicial dos professores com o que ser trabalhado em sala de aula ao
pontuar que as
[...] prticas questionadas na discusso universitria acabam estranhas ao cotidiano do professor. O abismo da linguagem, numa poca de rpida renovao, avana exponencialmente. Na mesma circularidade tem-se a defasagem do currculo universitrio, que coloca o ingressante no magistrio despreparado para a situao de aula. (MORAES, 1986, p.120).
Outros autores tambm ressaltam o enfraquecimento da Geografia Escolar quando
h uma reproduo da Geografia Acadmica.
[...] ainda h bem pouco tempo a geografia praticada nas escolas no ia alm de uma diluio da geografia universitria, enciclopdica e com os conhecimentos organizados por gavetas. Este problema, associado a muitos outros, nomeadamente, a crise geral do ensino e da identidade da geografia, que junto do grande pblico se afigura como uma cincia menor, de interesse limitado e, ao nvel da educao, como
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uma disciplina fastidiosa e intil, voltada para a simples memorizao de factos sem importncia. (HERCULANO, 2000, p.74)
Herculano (2000) ainda pontua em seu artigo que o ensino de Geografia na escola
bsica deve ser oriundo de uma problemtica real. Por duas razes:
1) Em vez de tudo querer conhecer, devem-se selecionar os principais problemas que realmente se colocam s comunidades humanas inseridas nos distintos contextos scio-espaciais 2) ()a resoluo de problemas alimenta a curiosidade (HERCULANO, 2000, p.75)
Alm dessa distino, Oliveira (1987) mostra um problema da Geografia Escolar ao
criticar os livros didticos. Para ele, a geografia que se ensina definida pelos
contedos encontrados nesses livros e isso pode criar uma ameaa autonomia do
professor e distanciar os contedos tratados em sala de aula da realidade local.
Nesse processo o professor foi perdendo ou, ento, nem teve a oportunidade de formar a sua condio de produtor de conhecimentos. Ele se tornou ou foi transformado em um mero repetidor dos contedos dos livros didticos. As editoras chegaram inclusive a publicar o livro do professor, uma espcie de cartilha na suposio de lhe facilitar o trabalho. (OLIVEIRA, 1987, p. 138)
Essa Geografia Escolar estagnada ou repetidora da Geografia Acadmica desmotiva
os alunos. A Geografia foi perdendo aquilo que de especial ela sempre teve, discutir
a realidade presente dos povos, particularmente no que se refere a seu contexto
espacial. (OLIVEIRA, 1987, p. 138). Esse mesmo autor ainda aprofunda essa
discusso ao mostrar que para
[...] entender esse espao produzido, necessrio entender as relaes entre os homens, pois dependendo da forma como eles se organizam para a produo e distribuio dos bens materiais, os espaos que produzem vo adquirindo determinadas formas que materializam essa organizao social. (OLIVEIRA, 1987, p. 142)
Brabant (1976) destaca que a Geografia como disciplina escolar alm de trabalhar o
espao que o seu objeto de estudo, precisa enfatizar a realidade vivida pelo aluno,
tornando-a compreensvel e significativa.
Esse mesmo autor escreveu que, j em 1822, se lia que tudo aquilo de que a
cincia se ocupa tem uma existncia atual. Para ele, a
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A geografia escolar, apesar de uma predisposio aparente a tratar do mundo que nos rodeia, acabou se desenvolvendo no mesmo plano das outras disciplinas, um plano antes de tudo marcado pela abstrao. Esta contradio to mais surpreendente na medida em que por mais longe que se remontar a histria da instituio escolar contempornea em geral e da geografia na escola em particular, encontra-se esta preocupao permanente da ligao privilegiada da geografia com o real. (BRABANT, 1976, p.15)
Verifica-se que esse questionamento sobre a relao entre a Geografia e o real
ainda precisa se concretizar. Essa disciplina ainda trabalhada de uma forma muito
descritiva em algumas escolas e isso pode torn-la desinteressante.
Para Brabant (1976), a nfase na descrio implica em uma despolitizao do aluno,
ou seja, ela se distancia de possveis crticas e intervenes no seu respectivo
cotidiano. Ao trabalhar a Geografia Escolar em contedos encaixotados e de forma
enciclopdica oriunda de conhecimentos produzidos pela Geografia Acadmica, o
aluno acaba se distanciando do real.
No entanto, h um paradoxo. Segundo Brabant (1976), ao mesmo tempo em que a
Geografia se prope a ser a cincia do espao, o mesmo, no ambiente escolar,
barrado nos portes da escola. Isso reafirma o problema da pesquisa e por isso, o
incentivo ao trabalho de campo na educao geogrfica pode favorecer uma
aproximao com o real e uma melhor compreenso da distino entre a Geografia
Escolar e Acadmica que possuem objetivos prprios.
A pesquisadora Callai (1986) sinaliza essa necessidade de aproximao com o real
ao escrever que o mundo tem mudado rapidamente e com ele devem mudar
tambm a escola e o ensino que nela se faz. (CALLAI, 1986, p.134)
Essa mudana no ensino de Geografia deve acontecer tambm para Cavalcanti
(2005) ao ressaltar que o aluno o sujeito ativo de seu processo de formao e de
desenvolvimento intelectual, afetivo e social; o professor tem o papel de mediador no
processo de formao do aluno. (CAVALCANTI, 2005, p.67),
Callai (1986) tambm trabalha sob essa perspectiva. De acordo com a autora, para
minimizar a mesmice da educao atual e transformar o aluno em um sujeito ativo
no processo de ensino aprendizagem, preciso desenvolver
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[...] uma prtica que seja aberta possibilidade de questionar o que se faz, de incorporar de fato os interesses dos alunos e de ser capaz de produzir a capacidade de pensar, agindo com criatividade e com autoria de seu pensamento. (CALLAI 1986, p.134)
Trazer a problemtica do real para o ensino de Geografia implica em modificaes
no planejamento dessa disciplina escolar. Vesentini (1984) mostra que o contedo
programtico deveria ser adequado realidade social e existencial do aluno
tornando-o co-autor do saber. Para esse autor uma renovao na Geografia
permeia-se pela mutao constante dos temas, afinal, tudo muda ao mesmo tempo:
os conceitos, as categorias e os mtodos. (VESENTINI, 1984, p. 112)
Moraes (1986) tambm mostra essa necessidade de um aluno co-autor. Para ele,
mister tentar aproximar a teoria e a prtica no plano do ensino de Geografia. Para
isso preciso uma reflexo pedaggica alm do planejamento e do mtodo que
assimile os avanos tericos da cincia geogrfica nas ltimas dcadas.
Contudo, essa assimilao da cincia geogrfica no pode ser feita por meio da
aplicao direta, mas sim por processos de construo endgenos desenvolvidos
pela Geografia Escolar.
Alm dessa reflexo, uma luta por modificaes na conduta pedaggica do ensino
de Geografia presumvel. Wettstein (1982) comunga com Moraes (1986) a ideia de
que o aluno precisa enxergar as transformaes do cotidiano. Ele ressalta que
necessrio um compromisso com um trabalho menos distante do real, por parte do
professor.
Desta maneira, a relao aluno/professor/realidade tende a ser mais slida e
produtora de um ambiente mais propcio para a educao geogrfica. Assim, o
ensino de geografia na educao bsica poderia fomentar o interesse do aluno ao
trabalhar essa perspectiva de significao e aproximao do real que ainda est em
construo, deixando mais claro para professores e alunos os objetivos da
Geografia Escolar.
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2.2 O trabalho de campo escolar
Ao conhecer a trajetria histrica do trabalho de campo, o professor de Geografia
pode no perceber outra intencionalidade para o mesmo na escola, pois falar sobre
[...] a importncia do trabalho de campo para a produo do conhecimento geogrfico, creio seja desnecessrio. Penso que a maior parte dos gegrafos concorde com o fato de que a ida a campo seja um instrumento didtico e de pesquisa de fundamental importncia para o ensino e pesquisa da/ na Geografia. Enquanto recurso didtico, o trabalho de campo o momento em que podemos visualizar tudo o que foi discutido em sala de aula, em que a teoria se torna realidade, se materializa diante dos olhos estarrecidos dos estudantes, da a importncia de planej-lo o mximo possvel, de modo a que ele no se transforme numa excurso recreativa sobre o territrio, e possa ser um momento a mais no processo ensino/aprendizagem/produo do conhecimento. (MARCOS. 2006. p. 106)
Ao mesmo tempo em que a autora Marcos (2006) ressalta a importncia do trabalho
de campo, Alentejano e Rocha-leo (2006) mostram que ainda h um desconforto
na escola bsica em relao s sadas a campo.
A utilizao do trabalho de campo como instrumento didtico no tem sido alvo de muitas reflexes. No deveria ser assim, afinal, todo professor de Geografia principalmente dos ensinos mdio e fundamental j deve ter se irritado quando ouviu de seus alunos ou dos professores de outras disciplinas que no dia tal no haveria aula porque tinha passeio, marcado pelo professor de Geografia... Ser que de fato promovemos passeios? (ALENTEJANO e ROCHA-LEO, 2006, p. 62)
Discute-se muito o local a ser visitado e como ser feita a organizao do mesmo.
Porm, muitas vezes nos esquecemos de relatar o processo que permitiu a
realizao do produto. (DUARTE, 2002, p. 140)
Esse processo citado por Duarte (2002) vagaroso e demanda uma organizao e
disponibilidade do corpo docente. Realizar um pr-campo, discutir com os alunos as
possibilidades de reas a serem visitadas e trabalhadas so etapas essenciais de
um trabalho de campo, mas que s vezes, no so realizadas pelos professores.
aconselhvel que o corpo docente discuta com os alunos os objetivos do trabalho,
converse sobre a importncia da atividade, mostre aos alunos as potencialidades e
as fragilidades do local e realizem reflexes sobre o que ser visto em campo. Os
alunos precisam perceber que um trabalho de campo estudar em um ambiente
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fora da sala de aula e no apenas um momento de descontrao onde buscaro
informaes desconectadas de um contexto terico.
As reflexes sobre o trabalho de campo na universidade ainda apresentam limites e
na escola bsica as discusses ainda so muito embrionrias. A sua importncia
pedaggica real, mas, Alentejano e Rocha-leo (2006) afirmam que se realizado
desarticulado do mtodo e da teoria, torna-se banal. Mesmo assim, o trabalho de
campo apesar dos riscos e dificuldades que impe, revela-se sempre um
empreendimento profundamente instigante, agradvel e sedutor. (DUARTE, 2002,
p. 140)
A afirmao de Duarte (2002), ao dizer que uma atividade em campo pode ser
instigante, agradvel e sedutora levanta discusses, pois os trabalhos de campo
escolares podem ter especificidades, potencialidades e interesses diversos. Desta
forma, seu planejamento e preparao merecem uma ateno, principalmente, no
ensino bsico, pois ainda h divergncias conceituais e discordncias metodolgicas
no processo de elaborao do mesmo.
Os prprios autores Alentejano e Rocha-leo (2006) cometeram impropriedades
conceituais ao escrevem excurses referindo-se ao trabalho de campo que bem
mais sistematizado que uma simples excurso, com uma organizao prvia e
posterior dos dados ..
A nosso ver, se estas excurses forem previamente preparadas, instigando-se os alunos a problematizar o que vo ver, a preparar o que vo perguntar e refletir acerca do que vo observar, podem representar uma importante contribuio para o processo de formao destes alunos como pesquisadores. (ALENTEJANO e ROCHA- LEO, 2006, p. 63).
Alm dessas limitaes, h alguns professores que acreditam na execuo do
trabalho de campo como suficiente para gerar respostas s algumas questes
postas em sala de aula. Esse tipo de viso pode resultar em pouca credibilidade
para a atividade pedaggica em campo, com a possibilidade de esgot-la na
superficialidade, pois simplifica a relao teoria/prtica, que, por natureza, apresenta
grande complexidade. Alentejano e Rocha-Leo (2006, p.56) ressaltam que o
trabalho de campo no deve se reduzir ao mundo do emprico, mas ser um
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momento de articulao teoria-prtica e, dessa forma, necessrio planej-lo
desde a teorizao da atividade em si, para que ele possa se tornar efetivamente
uma inovao educacional no ensino bsico.
Afinal, imaginar que a execuo e a sistematizao do trabalho de campo so
suficientes para acessar o conhecimento da dimenso socioespacial do real j foi
superado e isso faz parte da crtica ao empirismo positivista. Alm disso, houve
situaes na histria da Geografia que a importncia dessa atividade foi minimizada
pela ideia de que apenas a quantificao dos fenmenos conseguiria responder as
questes sociais. Na
[...] Geografia Teortico-Quantitativa, os trabalhos de campo passaram a ser execrados e praticamente riscados do mapa das prticas dos gegrafos, sob o argumento de que as tecnologias da informao e os modelos matemticos seriam instrumentos mais adequados para a investigao da realidade. (ALENTEJANO e ROCHA- LEO, 2006, p. 55)
Para que o trabalho de campo escolar, como processo mediador para a produo do
conhecimento na escola sobre os problemas sociais e ambientais do espao tenha
sucesso, seu planejamento e desenvolvimento precisam seguir um caminho
metdico criterioso e ocorrer de forma articulada entre professores, alunos e
superviso da escola, bem como expressar uma rica relao entre teoria e prtica
Rodrigues e Otaviano (2001) justificaram a importncia do trabalho de campo em
geografia em um guia metodolgico ao afirmarem que o
[...] contato com a realidade dar ao aluno uma nova dimenso dos assuntos tratados nas aulas o que, se bem programado e orientado, servir entre tantas finalidades para estimular o estudo articulado com as diferentes disciplinas. (RODRIGUES e OTAVIANO, 2001, p.36)
Diferentemente de uma visita tcnica ou de uma excurso, o trabalho de campo
pressupe uma relao mais ativa dos alunos. Os alunos precisam ser vistos como
os protagonistas do trabalho de campo escolar, pois o mesmo, como uma
ferramenta de (re) significao da dimenso social do real, torna o aluno um sujeito
ativo em seu processo de formao e desenvolvimento intelectual, pois cabe aos
alunos a tarefa de coleta de dados e materiais, entrevista, observao e anotao
dos aspectos naturais e culturais [...]. (TOMITA, 1999, p.14). E, posteriormente,
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cabe tambm aos alunos a discusso e a produo de snteses das informaes
coletadas.
Assim, o espao geogrfico que constantemente mudado pelas intervenes
antrpicas e pela dinmica natural pode ser interpretado pelos alunos por meio do
trabalho de campo que serviria como uma ponte para a percepo dessas mutaes
em cada ecossistema ou em cada comunidade onde h articulaes e conflitos,
aproximando o aluno de uma forma mais significativa da realidade.
Por isso, a utilizao do trabalho de campo pode ser favorvel construo de
novos significados sobre a realidade encontrada no espao e reduzir o
distanciamento da realidade concreta em que vivem os alunos, ou seja, essa
estratgia pedaggica pode ampliar as possibilidades de ressignificao da
dimenso social do espao, contribuindo para uma renovao da educao
geogrfica.
Para que haja uma possvel consolidao dessa estratgia de ensino-aprendizagem
necessrio sensibilizar os alunos para que eles tomem conscincia de possveis
mudanas no espao a partir da construo de um saber integrado realidade e
possivelmente atrelado ao conhecimento e difuso de Tecnologias Sociais.
Contudo, no possvel creditar ao trabalho de campo, por si s, a construo dos
significados desejados para a compreenso da realidade, principalmente se
articulado com as questes socioambientais ou com as tecnologias criadas de forma
endgena em uma comunidade. Alentejano e Rocha-leo (2006) afirmam que se o
trabalho de campo escolar, como uma prtica pedaggica para o ensino de
Geografia gerar um retorno ao saber integrado se ancorando em um discurso
ambiental, o mesmo pode se perder em discusses vagas e sem a gnese de
novos significados. Desta forma, o trabalho de campo necessita de um planejamento
adequado, pois, ele no resolve os limites da educao geogrfica como um passe
de mgica. A imerso no contexto, de forma sistematizada e organizada, pode ento
ser um estmulo aprendizagem.
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Gohn (2006) sinalizou que h vrios espaos de aprendizagem. Para ela, a escola
no o nico local de gerao de conhecimentos. H espaos externos sala de
aula (tecnicamente denominados no-formais de ensino-aprendizagem) que so
sustentados por saberes locais, mas que tambm so geradores de modificaes
concretas da realidade. Por isso, esta pesquisa partiu da hiptese de que o trabalho
de campo, quando articulado metodologicamente de forma adequada, poderia se
tornar um suporte pedaggico para a superao dos limites existentes na tradio
didtica da Geografia Escolar.
2.3. As Tecnologias Sociais e o ensino de Geografia Escolar
Como a hiptese dessa pesquisa envolve a discusso das Tecnologias Sociais,
houve a necessidade de uma conceituao desse termo.
Para Rodrigues e Barbieri (2008),
[...] a tecnologia social implica a construo de solues de modo coletivo pelos que iro se beneficiar dessas solues e que atuam com autonomia, ou seja, no so apenas usurios de solues importadas ou produzidas por equipes especialistas, a exemplo de muitas propostas das diferentes correntes da tecnologia apropriada. (RODRIGUES e BARBIERI, 2008, p.1075)
A proposta de se utilizar o trabalho de campo em reas que supostamente tenham
desenvolvido Tecnologias Sociais pode ser um caminho para que os alunos
identifiquem, por intermdio desta estratgia, o modo como uma tecnologia se torna
social gerando benefcios individuais ou coletivos no processo de produo e
apropriao do espao geogrfico. Afinal,
[...] as TSs so tcnicas e metodologias, produtos e processos, como quaisquer tecnologias, elas tambm envolvem de maneira intrnseca um modo prprio de pensar e agir. Muitas vezes, no modo de aplicao que uma tecnologia torna-se social. Este modo ento compreendido como uma abordagem sistmica que leva em conta todo um conjunto de fatores, desde o reconhecimento das necessidades e da mobilizao para a mudana, at os mtodos de gesto e a eficcia da soluo tecnolgica desenvolvida, passando pela avaliao de impactos socioambientais e a busca direta de impactos positivos para o conjunto da sociedade. (PASSONI, 2007, p. 30)
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Para Novaes e Dias (2009) o conceito de Tecnologias Sociais surge em
contraposio lgica capitalista, j que ela precisa ser orientada para a satisfao
das necessidades humanas sem promover um tipo de controle capitalista, como por
exemplo, de dominao dos trabalhadores. Nesse contexto possvel trabalhar com
os alunos uma perspectiva diferenciada da dominante sobre a produo e
apropriao do espao geogrfico. O conhecimento de reas que desenvolvem
Tecnologias Sociais pode estimular novas perspectivas pedaggicas para o ensino
de Geografia, pois os alunos vivenciariam alternativas mais justas e solidrias de
construo e produo do espao. Afinal, essas tecnologias transitam pela incluso
cidad, pela acessibilidade, pela sustentabilidade, pela organizao, pela promoo
do bem-estar e pela inovao (PASSONI, 2007, p.40). Por isso nessa pesquisa foi
escolhido um assentamento de sem terra na regio metropolitana de Belo Horizonte,
pois se trabalhava tambm com a hiptese de que naquele espao estariam sendo
desenvolvidas Tecnologias Sociais que pudessem possibilitar aos alunos visualizar
as contribuies expostas acima com o intuito de potencializar seus respectivos
significados dados dimenso socioespacial do real.
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3. Metodologia e procedimento de coleta de dados
Esta pesquisa trabalha, principalmente, com a articulao de duas temticas: a
educao geogrfica e o trabalho de campo como estratgia pedaggica. Ao fazer
essa delimitao, foi possvel identificar o problema dessa investigao que se refere dificuldade que os alunos tm de elaborarem significados e interpretaes
sobre a dimenso socioespacial da realidade. A identificao desse problema foi
essencial, pois o que determina como trabalhar o problema que se quer trabalhar:
s se escolhe o caminho quando se sabe aonde se quer chegar (GOLDENBERG,
1999, p.14).
A partir desse pressuposto foi possvel escolher a metodologia, as tcnicas de coleta
de dados, as fontes dos dados e os mtodos de interpretao e anlise dos
resultados.
No caso desta investigao, cujo tema foi as dificuldades de apropriao da
dimenso socioespacial do real pelos alunos e cujo objeto de estudo foram as
potencialidades do trabalho de campo escolar como estratgia para potencializar
uma melhor percepo da dimenso socioespacial do real, a metodologia traada
insere-se dentro do paradigma qualitativo. Essa perspectiva de investigao
responde s necessidades desta pesquisa, pois, segundo Chizzotti (2003), a
[...] pesquisa qualitativa recobre, hoje, um campo transdisciplinar, envolvendo as cincias humanas e sociais, assumindo tradies ou multiparadigmas de anlises (...) e adotando multimtodos de investigao para o estudo de um fenmeno situado no local em que ocorre, e enfim, procurando tanto encontrar o sentido desse fenmeno quanto interpretar os significados que as pessoas do a eles. (CHIZZOTTI, 2003, p. 221)
O referencial terico metodolgico que orientou a coleta e anlise dos dados foi a
Anlise de Contedo trabalhada por Bardin (1976). Silva, Gobbi e Simo (2005, p.
73) destacam que a anlise de contedo uma tcnica de investigao que tem por
finalidade a descrio objetiva, sistemtica e quantitativa do contedo manifesto da
comunicao. No caso desta pesquisa, a descrio quantitativa aconteceu no
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levantamento de depoimentos dos alunos sobre as percepes in loco a partir das
orientaes disponveis no material levado a campo.
Silva, Gobbi e Simo (2005) ainda sinalizam que a anlise de contedo aparece
como uma ferramenta para a compreenso da construo de significados que os
atores sociais exteriorizam no discurso.
Anlise de Contedo costuma ser feita atravs do mtodo de deduo frequencial ou anlise por categorias temticas. A deduo frequencial consiste em enumerar a ocorrncia de um mesmo signo lingstico (palavra) que se repete com freqncia, visando constatar a pura existncia de tal ou tal material lingstico, no preocupando-se com o sentido contido no texto, nem diferena de sentido entre um texto e outro, culminando em descries numricas e no tratamento estatstico. A anlise por categorias temticas tenta encontrar uma srie de significaes que o codificador detecta por meio de indicadores que lhe esto ligados; [...] codificar ou caracterizar um segmento coloc-lo em uma das classes de equivalncias definidas, a partir das significaes, [...] em funo do julgamento do codificador. (CAREGNATO e MUTTI, 2006, p.683)
Esse referencial terico-metodolgico de anlise foi utilizado para a anlise dos
dados coletados aps uma categorizao e um registro de frequncia de diversas
percepes dentro dessas categorias. Essa frequncia extrada das percepes dos
alunos permitiu a construo de tabelas e grficos.
Godoy (1995) destaca que qualquer comunicao que vincule um conjunto de
significaes de um emissor para um receptor pode, em princpio, ser traduzida
pelas tcnicas de anlise de contedo. Parte-se do pressuposto de que por trs do
discurso encontra-se um sentido que deve ser desvendado e descoberto pelo
pesquisador.
O mtodo de anlise de contedo aparece como um instrumento para a percepo
da elaborao de significados que os atores sociais expressam no discurso. Esses
significados so o foco da investigao para desvendar os sentidos dos discursos
elaborados. A partir deles foi possvel averiguar se o trabalho de campo realmente
modificou ou no a interpretao e a sensibilizao dos alunos sobre a dimenso
social do espao.
No que tange coleta de dados no assentamento estudado, o recurso utilizado foi a
entrevista. Os alunos, aps a explanao da lder do assentamento, caminharam em
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direo s moradias e entrevistaram os assentados. Fraser e Gondim (2004)
mostram a importncia desse recurso ao pontuarem que a
[...] entrevista na pesquisa qualitativa, ao privilegiar a fala dos atores sociais, permite atingir um nvel de compreenso da realidade humana que se torna acessvel por meio de discursos, sendo apropriada para investigaes cujo objetivo conhecer como as pessoas percebem o mundo. Em outras palavras, a forma especfica de conversao que se estabelece em uma entrevista para fins de pesquisa favorece o acesso direto ou indireto s opinies, s crenas, aos valores e aos significados que as pessoas atribuem a si, aos outros e ao mundo circundante. (FRASER e GONDIM, 2004, p.140)
Foi levantada a percepo dos alunos sobre a dimenso socioespacial do real em
dois momentos e locais. Um deles ocorreu durante as aulas onde foi feito um
diagnstico sobre os conceitos e significados j construdos pelos discentes sobre
articulaes comunitrias e sobre as caractersticas e o processo de produo e
apropriao do espao rural e do espao urbano, antes do trabalho de campo,
realizado no Assentamento Pastorinha.
A teorizao em sala de aula aconteceu antes da sada a campo. Os alunos, alm
de estudarem os conceitos necessrios para a coleta de dados, trabalharam com os
mesmos articulando-os com o contedo da srie, por meio de um diagnstico
(apndice 10.1) aplicado em sala de aula. Todo o trabalho foi feito de forma
individual e depois houve momento de debates para a socializao das ideias e
percepes.
O segundo momento de coleta de dados ocorreu no assentamento Pastorinha no
municpio de Brumadinho (MG) onde os alunos, por meio de entrevistas realizadas
com os assentados, tiveram uma maior aproximao da realidade socioespacial do
assentamento. Havia um roteiro previamente trabalhado com os alunos, mas eles
tinham autonomia para perguntar outras questes que julgassem pertinente no
momento. Os alunos investigaram, principalmente, questes ligadas apropriao
do territrio e sobre as tcnicas elaboradas pela comunidade para se manter no
assentamento.
Em relao sada a campo, uma empresa de Turismo Pedaggico organizou o
nibus e o seguro dos alunos, juntamente com o professor de Geografia da turma e
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a orientadora da escola. A contratao da empresa foi uma exigncia da escola,
mas foi solicitado que no houvesse uma interferncia da mesma na coleta de
dados dos alunos. A funo da empresa era transportar, com segurana, os alunos
at o assentamento. O trabalho de campo foi tambm acompanhado pela
orientadora da pesquisa em questo e pela orientadora pedaggica do colgio.
A turma escolhida poderia ser do ensino fundamental ou mdio. A exigncia para a
escolha da turma centrou-se na adequao do contedo programtico da srie com
as temticas abordadas na pesquisa que estavam relacionadas com as questes
sociais e econmicas do espao geogrfico. Como a 1 srie do Ensino Mdio
estuda o territrio brasileiro e as modificaes antrpicas ocorridas no mesmo, seus
alunos/as foram escolhidos como os sujeitos de investigao. Alm disso, cabe
ressaltar que esses alunos selecionados pertenciam a uma escola de elite da rede
privada e isso, de certa forma, influenciou alguns depoimentos.
Em sntese, toda a investigao e seus procedimentos foram feitos em quatro
etapas. Primeiramente, a aplicao do diagnstico em sala de aula antes do trabalho
de campo. Depois, a teorizao (apndice 10.2) com os alunos sobre a questo
agrria no pas. A terceira etapa foi composta pela sada a campo e pelas
entrevistas feitas pelos alunos com os assentados (apndice 10.3) e por fim, a
quarta etapa contemplou a sistematizao em sala de aula das novas percepes
por meio do diagnstico ps trabalho de campo (apndice 10.4).
A primeira etapa, ento, aconteceu por meio da realizao de um diagnstico, em
sala de aula, com os alunos, antes das primeiras iniciativas ligadas ao planejamento
do trabalho de campo. O objetivo desse diagnstico foi verificar os significados j
construdos pelos alunos sobre a dimenso socioespacial do real, abordando as
caractersticas e o processo de produo/apropriao do espao rural e do espao
urbano. O instrumento de coleta de dados utilizado nessa parte (apndice 10.1) foi
elaborado associando imagens e textos e questes construdas sobre os espaos
citados.
Na segunda etapa (Apndice 10.2), houve uma teorizao em sala de aula sobre os
conceitos estruturantes da temtica e a contextualizao da rea que seria
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investigada. Em seguida, foi feito o planejamento e a organizao do trabalho de
campo no municpio de Brumadinho (MG). Nesse momento os alunos observaram,
por meio de slides digitais, o espao que seria investigado e discutiram textos em
sala de aula sobre a temtica, como por exemplo, sobre a Reforma Agrria.
A terceira etapa foi a realizao do trabalho de campo propriamente dito. No dia de
sua execuo, os alunos participaram de algumas atividades no assentamento
Pastorinha que visavam o mximo conhecimento do local. Primeiramente, foi servido
um caf da manh para os alunos e depois a lder do assentamento conversou em
torno de uma hora com eles. Depois dessa atividade, houve uma caminhada para
conhecer toda a rea ocupada pela comunidade. Isso durou at a hora do almoo.
Aps a refeio, os alunos foram liberados para entrevistar os assentados e
perceber tcnicas e saberes que eram utilizados pelos mesmos para equacionar
questes do cotidiano. O roteiro da entrevista foi elaborado pelo pesquisador, com a
participao dos alunos. Ressalta-se que no assentamento em questo, algumas
pessoas acessaram a terra por meio de uma ocupao ilegal e tentam, at hoje, se
manterem na localidade de forma autnoma. O motivo desse ato foi a escassa
oportunidade de acessar o mercado de terras legal. A partir dessa situao, os
alunos, in loco, tentaram identificar quais eram os laos de domnio do territrio bem
como o papel dos lderes locais. Alm disso, eles coletaram informaes se havia ou
no Tecnologias Sociais produzidas no local que causariam formas de gerao de
renda, que possibilitariam a incluso social de membros da comunidade e o fomento
da qualidade de vida.
Em sntese, os alunos, alm de participarem de uma longa exposio dialogada com
a principal liderana local e da observao do espao, coletaram informaes com
os assentados, por meio de entrevistas, que serviram de norte para a sistematizao
das percepes em categorias e para identificar se houve ou no a produo de
Tecnologias Sociais. A quarta etapa foi o processo de sistematizao das
percepes que comeou ainda no espao do assentamento (FIG 1), com um rpido
debate e com a participao de alguns assentados. Esse dilogo foi sustentado pela
seguinte questo colocada pelo pesquisador: o que mudou na percepo de vocs
aps a visita no assentamento Pastorinha?
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FIGURA 1 Socializao das percepes sobre o Assentamento
Pastorinha
Fonte: Produo da pesquisa
A sistematizao continuou e terminou, no espao da escola, quando os alunos
desenvolveram, individualmente, uma sntese retomando o roteiro do primeiro
diagnstico (Apndice 10.1) no qual foi feita uma adaptao, agora convertido num
instrumento para a elaborao da sntese (Apndice 10.3). Esse instrumento de
coleta de dados recuperava a questes do primeiro instrumento com o objetivo de
permitir a verificao das mudanas nas percepes dos alunos. Deste modo, foi
possvel sistematizar e categorizar os dados coletados a partir dessa organizao
que captou as vises dos alunos antes do contato com os contedos em sala de
aula, durante o contato dos mesmos em campo e depois do contato com a realidade
emprica, no assentamento. Uma anlise das percepes dos alunos foi organizada
em antes e depois do trabalho de campo. Buscou-se perceber a (re) significao
ocorrida na percepo dos alunos sobre da dimenso socioespacial do real.
Como proposta de interveno decorrente dos resultados desta pesquisa, foi
elaborada uma comunidade no site de relacionamentos e de troca de informaes
denominado ORKUT cujo link est disposto no encarte que ser enviado por email
para escolas que desejarem realizar trabalhos de campo em reas onde,
potencialmente, tenham desenvolvido Tecnologias Sociais em sua ocupao.
Busca-se um intercmbio de experincias entre professores sobre ao trabalhos de
campo, sobre a conceituao e a importncia desse recurso pedaggico e sobre a
discusso da importncia da abordagem das Tecnologias Sociais na educao
geogrfica para que os alunos percebam a dinmica social do processo de
produo/apropriao do espao geogrfico.
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4. Apresentao e anlise dos dados
Para a apresentao e anlise dos dados foi traado um caminho para que
houvesse um confronto de informaes e dados sobre a percepo dos alunos
anterior ao planejamento e realizao do trabalho de campo, sobre a dimenso
socioespacial da realidade e as alteraes, se houvessem, das percepes dos
mesmos alunos, posteriores ao trabalho de campo.
Afinal, se houvesse uma real mudana de leitura de mundo, aps o o trabalho de
campo o mesmo poderia ser, ento, visto como uma ferramenta para tornar a
educao geogrfica mais prxima da realidade.
Os instrumentos de coleta de dados utilizado esto disponveis nos apndices 10.1,
10.2 e 10.3 desse trabalho.
As diversas percepes dos dezessete alunos sobre a dimenso socioespacial do
real foram organizadas em subtemas oriundos dos instrumentos de coleta de dados
e dos textos dos alunos.
4.1. Subtema 1- Sobre as habitaes
Os alunos se depararam nos diagnsticos com imagens de habitaes do
assentamento visitado e de algumas moradias localizadas em um aglomerado
(favela) tpico do municpio de Belo Horizonte (Apndice 10.1). No primeiro
diagnstico, os alunos descreveram sobre as casas existentes num aglomerado e no
diagnstico aps o trabalho de campo, eles confrontaram as descries com o que
foi visto no assentamento no que tange a questo da moradia.
Na percepo inicial, um aluno pontuou que a falta de organizao nos aglomerados
foi causada pela atrao descontrolada de pessoas para o meio urbano, ou seja,
pelo xodo rural.
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Cinco alunos disseram que a situao precria dos aglomerados era fruto da falta de
higiene no local. Isso foi extrado de exemplos como: falta de saneamento, esgoto a
cu aberto e sujeira generalizada nas ruas. Um aluno escreveu que a localizao
era o fator determinante da existncia de moradias precrias. Para ele, o fato das
moradias estarem numa favela, j determinava uma qualidade ruim de construo e
acabamento. Outro aluno ressaltou que o fraco investimento nessas reas por parte
do poder pblico era a razo das dificuldades e da falta de estrutura locais. Nove
alunos no escreveram as possveis causas da precariedade das moradias dessas
reas e apenas sinalizaram que havia uma baixa qualidade construtiva ou que as
casas eram feias. A percepo da origem do problema social foi, ento, pouco
discutida pelos alunos. Foi detectada apenas uma percepo simplista de causa e
consequncia ao analisarem a questo da moradia em reas mais pobres. Deixou
entender que construir moradias feias, morar em locais feios, era uma escolha do
pobre e que apenas os mais afortunados possuem bom gosto.
A seguir, h a categorizao das percepes dos alunos antes do trabalho de
campo sobre as habitaes populares.
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QUADRO 1
PERCEPO SOBRE AS HABITAES POPULARES
Categorias Nmero de
depoimentos
Alguns depoimentos antes do
trabalho de campo
Qualidade construtiva
das habitaes
populares
9 (...) casas de um aglomerado em
situaes precrias, sem saneamento
bsico (...) Aluno S
(...) onde cada um constri o que quer
(...) Aluno E
Higiene 5 (...)em condies precrias, sem
higiene e esgoto onde pessoas de
baixo nvel e com menor renda vivem
(...) Aluno V
(...) higiene precria do local, casas e
barraces em pssimo estado.
Aluno T
Localizao 1 as casas esto muito mal localizadas,
em cima de uma montanha (...)
Aluno R
Relao com o poder
pblico
1 (...) as consequncias [...] do mau
investimento do governo. Aluno L
Origem do xodo rural 1 Esses aglomerados surgiram devido
ao xodo rural (...) Aluno L
Fonte: Dados e elaborao da pesquisa
No quadro a seguir que mostra os resultados aps o trabalho de campo realizado,
foi possvel identificar que quatorze alunos perceberam uma melhoria da qualidade
construtiva das casas do assentamento em relao s do aglomerado, mesmo
sendo uma rea com habitaes populares.
Trs alunos destacaram que a relao com o poder pblico foi determinante para
que houvesse casas melhores no Assentamento Pastorinha, pois o governo federal
disponibilizou o material de construo. Isso foi relatado pelos assentados. Um aluno
apenas descreveu que esteticamente as casas dos assentados eram mais atraentes
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e confortveis, sem se preocupar em relatar as causas desse depoimento. No
houve observaes sobre xodo rural, localizao e higiene no segundo diagnstico.
No quadro a seguir, h a categorizao das percepes dos alunos aps o trabalho
de campo, tanto no grfico quanto na tabela, sobre as habitaes populares em
reas de aglomerados e do assentamento Pastorinha.
QUADRO 2:
PERCEPO APS O TRABALHO DE CAMPO
SOBRE AS HABITAES POPULARES
Categorias Nmero de
depoimentos
PERCEPO
INICIAL
Nmero de
depoimentos
PERCEPO
PS-
TRABALHO
DE CAMPO
Alguns depoimentos aps do
trabalho de campo
Qualidade
construtiva
9
14 (...) com telhado e infraestrutura
no meio da zona rural. Aluno L
(...) a rea bem feita e h
bastante vegetao ao redor.
Aluno R
Higiene 5 0
Localizao 1 0
Relao com
o poder
pblico
1
3
A ocupao dos assentados
ocorreu com a ajuda do governo
que paga ao proprietrio a terra
(...) Aluno P
O nmero de moradores
delimitado pelo governo. Aluno
F
Origem rural
(xodo)
1 0
Fonte: Dados e elaborao da pesquisa
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Grfico 1: Depoimentos sobre as habitaes populares antes e depois
do trabalho de campo
Fonte: Dados e elaborao da pesquisa
As respostas elaboradas pelos alunos no segundo diagnstico apresentaram
diversas abordagens sobre as condies estruturais e sociais de moradias
populares. Ao tratarem sobre os aglomerados, os alunos pontuaram, principalmente,
questes vinculadas precariedade das construes e a m organizao do
espao. O saneamento bsico tambm foi um problema citado em cinco
diagnsticos e a observao que h um escasso apoio do governo surgiu em
apenas um.
Percepes cotidianas dos aglomerados fazem parte da rotina dos alunos
investigados, pois a grande maioria mora em Belo Horizonte. Foi possvel identificar
que h uma relao de segregao entre essas realidades, justificada pelo alto
nmero de depoimentos dos alunos que retrataram a precria condio de vida em
rea de aglomerao urbana mais popular.
Por outro lado, ao escreverem sobre o assentamento, os alunos destacaram a
diferena na organizao do espao em relao aos aglomerados. Em quatorze
depoimentos, os alunos pontuaram que h uma variao na qualidade estrutural e
organizacional do espao, sendo melhor no assentamento que no aglomerado. Isso
indicou que o trabalho de campo no assentamento Pastorinha mostrou uma nova
leitura sobre as habitaes populares. Isso confirma a fala de Marcos (2003) ao
dizer que o trabalho de campo
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[...] um instrumento didtico e de pesquisa de fundamental importncia para o ensino e pesquisa da/ na Geografia. Enquanto recurso didtico, o trabalho de campo o momento em que podemos visualizar tudo o que foi discutido em sala de aula, em que a teoria se torna realidade, se materializa diante dos olhos estarrecidos dos estudantes, da a importncia de planej-lo o mximo possvel, de modo a que ele no se transforme numa excurso recreativa sobre o territrio, e possa ser um momento a mais no processo ensino/aprendizagem/produo do conhecimento. (MARCOS. 2006. p. 106)
Durante as abordagens com os assentados, os alunos foram informados de que a
comunidade local desenvolveu mutires e acordos para que todos pudessem
melhorar as condies de moradia. Isso provavelmente favoreceu a percepo dos
alunos sobre a questo da moradia, mesmo sendo uma rea cuja renda per capita
se assemelha de reas de favelizao.
A organizao do espao no assentamento pode ter sido outro motivo da
identificao que a moradia no local era melhor. Afinal, foi possvel extrair do
primeiro diagnstico uma percepo da relao entre as moradias em locais
imprprios com a falta de espao e com as altas densidades demogrficas. Para os
alunos, a disponibilidade de espao na rea do assentamento contribuiu para uma
melhor qualidade de vida no local.
Os alunos tambm descreveram, no primeiro diagnstico, sobre habitaes em
reas cuja populao apresenta uma renda elevada. Essa descrio foi includa,
pois todos os alunos investigados pertencem s classes sociais mais privilegiadas
economicamente e uma viso desses espaos seria interessante como critrio de
anlise e comparao.
Entre os dezessete depoimentos, onze pontuaram sobre temas vinculados
esttica, organizao e qualidade do imvel, ou seja, destacaram a beleza dos
imveis nas reas mais ricas. Isso confirma a percepo que as reas mais pobres
apresentam uma qualidade esttica inferior, ou seja, para a maioria dos alunos
investigados h uma relao entre poder aquisitivo e beleza do imvel. Houve
tambm a caracterizao por meio da meritocracia e pela facilidade de acesso
renda, ou seja, para os alunos, o acesso moradia vinculado capacidade
financeira do cidado. Se um indivduo possui uma renda maior, logo ele pode
acessar uma residncia melhor. Isso para alguns alunos determinou a melhor
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qualidade construtiva das moradias em reas mais ricas. Alm disso, vale ressaltar
que os agentes fundirios e imobilirios escolhem as melhores reas urbanas para
os melhores empreendimentos.
QUADRO 3
PERCEPO SOBRE AS MORADIAS DE ALTO LUXO
Categorias Nmero de
depoimentos
Alguns depoimentos antes do trabalho
de campo
Qualidade construtiva 11 (...) uma casa de luxo com um espao
grande ao seu redor e bem planejada.
Aluno H
(...) casa grande e bem construda- Aluno
L
Higiene 0
Localizao 0
Relao com o poder
pblico
0
Origem rural (xodo) 0
Acesso riqueza 6 (...) moradia das classes mais altas da
populao brasileira. Aluno P
(...) ambiente propcio para a vida, com
uma notvel alta renda Aluno S
Fonte: dados e elaborao da pesquisa
Confirmando a ideia exposta no pargrafo anterior, nos depoimentos sobre a
Qualidade construtiva foi perceptvel uma relao entre a beleza do imvel e a
renda. Na categoria Acesso riqueza foi possvel notar uma relao entre o mrito
das classes mais afortunadas de ter os melhores salrios e empregos com o acesso
aos melhores empreendimentos nas melhores reas do municpio.
No houve depoimentos sobre as categorias: higiene, localizao, relao com o
poder pblico e origem rural. Isso pode indicar um distanciamento dos reais
problemas, causas e caminhos para o acesso moradia. Para os alunos, as
categorias vinculadas beleza e riqueza eram suficientes para justificar o
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predomnio dos melhores empreendimentos nas melhores reas da cidade. Talvez,
isso seja fruto de educao geogrfica pouco investigativa que eles tiveram e que
proporcionou mais uma memorizao do que uma (re) leitura da dimenso
socioespacial do real. Cabe aos professores de geografia promover uma abertura
para que essa disciplina se torne mais investigativa e crtica, tornando os alunos
pesquisadores da realidade. Reafirmando, ns, professores, trabalhamos um
contedo de determinada forma porque j vimos algum fazendo assim ou pensamos que esta uma forma possvel e desejvel de ensinar aquele contedo. freqente trabalharmos um contedo sem, verdadeiramente, nos perguntarmos: por que este contedo e no outro? Por que assim e no de outra forma? Enfim, por que trabalhar isto, desta forma, nesta disciplina? (BRAGA, 2003, p. 64).
4.2. Subtema 2: Sobre as condies de vida num aglomerado urbano e no
assentamento Pastorinha
A pergunta solicitou aos alunos que descrevessem sobre as possveis condies de
vida das populaes que habitavam os dois espaos representados por imagens no
segundo diagnstico. Eles se depararam com uma imagem de um aglomerado
oriunda do primeiro diagnstico e tambm analisaram uma imagem capturada in
loco de uma moradia do assentamento Pastorinha (disponvel apenas no segundo
diagnstico).
Oito alunos sinalizaram que, no primeiro caso, antes do trabalho de campo, a
precria condio de vida nos aglomerados era oriunda do restrito acesso riqueza
e aos servios bsicos de um municpio. Dois escreveram que havia um precrio
acesso ao lazer, educao e sade e sete alunos relacionaram a pior condio de
vida no local com a estrutura fsica existente no aglomerado.
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QUADRO 4
PERCEPO INICIAL SOBRE A CONDIO DE VIDA EM REAS POBRES
Categorias Nmero de
depoimentos
Alguns depoimentos antes do
trabalho de campo
Acesso renda e aos
servios pblicos.
8 A condio de vida da populao
da primeira imagem no boa, o
salrio das famlias muitas das
vezes no d para alimentar (...)
Aluno H
(...) so pessoas humildes que
devem ganhar 1 ou 2 salrios
mnimos (...) Aluno R
Lazer, estudo, emprego,
e sade.
2 (...) as pessoas no estudam em
uma boa escola e o contato com o
crime enorme (...) Aluno L
Estrutura fsica local 7 (...) As condies de vida
possivelmente so ruins por no
ter infraestrutura de modo que
cubra as necessidades do cidado
(...) Aluno G
(...) Eles no tm gua tratada,
tratamento de esgoto, no tm
postos de sade e para ter esses
servios necessrio descer para
a rea dos ricos. (...) Aluno L
Fonte: dados e elaborao da pesquisa
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QUADRO 5
PERCEPO APS O TRABALHO DE CAMPO
SOBRE A CONDIO DE VIDA EM REAS POBRES
Categorias Nmero de
depoimentos
PERCEPO
INICIAL
Nmero de
depoimentos
PERCEPO
PS
TRABALHO
DE CAMPO
Alguns depoimentos aps o
trabalho de campo
Acesso renda
e aos servios
pblicos.
8
(precrio
acesso)
7
(acesso
garantido por
articulaes
comunitrias)
(...) pois eles tm uma
moradia com infraestrutura e
um possvel saneamento
bsico (...) Aluno C
(...) possuem um trabalho fixo,
uma renda estvel e um bom
lugar para morar. Aluno F
Lazer, estudo,
emprego e
sade.
2 9 Uma populao pobre, mas
que tem uma condio de vida
melhor, com mais higiene,
alimentos e at mesmo mais
dinheiro. Aluno T
(...) embora precria a
condio de vida, estes tm
acesso escola, saneamento
e alimento (...) Aluno L
Estrutura fsica
local
7 0
Relao com o
poder pblico
0 1 (...) o governo no leva
melhorias nenhuma para os
assentados (...) Aluno L
Fonte: dados e elaborao da pesquisa
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Grfico 2: Percepes sobre as condies de vida em aglomerados
urbanos e no assentamento.
Fonte: dados e elaborao da pesquisa
Aps a ida ao assentamento, sete alunos destacaram que o planejamento
comunitrio favoreceu o acesso renda e aos servios numa rea cuja renda per
capita mdia se assemelhava existente nos aglomerados urbanos. Isso contradiz o
que foi exposto antes do trabalho de campo, pois os alunos escreveram que as
reas mais pobres apresentavam uma m qualidade de vida devido ao restrito
acesso renda e aos servios.
Nove alunos escreveram que havia melhores condies de vida no assentamento
devido ao acesso ao lazer, estudo, emprego e sade. Apenas um aluno escreveu
que o governo ajuda mais os assentados do que os moradores de aglomerados em
reas urbanas.
Os alunos identificaram que o assentamento visitado possui algumas articulaes
sociais que favoreceram uma melhor organizao do local e por consequncia
melhores condies de vida, fato esse justificado pela categoria lazer, estudo,
emprego e sade. Os alunos notaram que havia, no assentamento, reas
diferenciadas para o plantio, para o lazer e para a moradia. Ou seja, para os alunos,
essas reas, aliadas baixa densidade demogrfica do local, favoreceram uma
melhor organizao do espao. Isso aprofunda o que foi dito sobre os aglomerados,
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pois nos depoimentos iniciais dos alunos foi visvel a relao entre alta densidade
demogrfica com a precariedade da organizao do espao.
Houve outros destaques: um depoimento citou uma relao entre o b