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DIREITO TRIBUTÁRIO 11ª Edição revista e atualizada JOÃO MARCELO ROCHA Coordenação Vicente Paulo Marcelo Alexandrino

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DIREITOTRIBUTÁRIO

11ª Ediçãorevista e atualizada

JOÃO MARCELO ROCHACoordenação

Vicente PauloMarcelo Alexandrino

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Capítulo 1

DIREITO TRIBUTÁRIO

1. DIREITO

A tarefa de conceituar o Direito sempre foi uma das mais laboriosas por parte dos estudiosos, e esse fato se dá devido à multiplicidade de acepções com que a palavra é utilizada. Segundo Caio Mário da Silva Pereira, a plurivalência semântica do vocábulo direito comporta numerosas manifestações conceituais. Quando o indivíduo sustenta as suas faculdades e repele a agressão aos seus poderes, diz que afirma ou defende seu direito (direito subjetivo; faculdade ine-rente a uma pessoa); quando o juiz dirime a controvérsia, invocando a norma ditada pelo Poder Público, diz que aplica o direito (direito positivo; normas ditadas pelo Estado); quando o professor se refere ao organismo jurídico na-cional, denomina-o o direito de seu país (direito objetivo; conjunto de normas que devem ser respeitadas); quando alguém analisa uma fase de crise na ordem jurídica e critica os mandamentos legislados em nome do ideal de justiça, fala que tais mandamentos se afastam do direito (direito no sentido de justiça).

Apesar da dificuldade de encontrar um conceito suficientemente abran-gente, o mesmo jurista define:

“Direito é o princípio de adequação do homem à vida social. Está na lei, como exteriorização do comando do Estado; integra-se na consciência do indivíduo, que pauta sua conduta pelo espiritualis-mo do seu elevado grau de moralidade; está no anseio de justiça, como ideal eterno do homem; está imanente na necessidade de contenção para a coexistência”1.

1 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1987. v. I, p. 5.

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Segundo Hely Lopes Meirelles:

“O Direito, objetivamente considerado, é o conjunto de regras de conduta coativamente impostas pelo Estado. Na clássica con-ceituação de Jhering, é o complexo das condições existenciais da sociedade, asseguradas pelo Poder Público. Em última análise, o Direito se traduz em princípios de conduta social, tendentes a realizar a justiça”2.

Já José Cretella Júnior, com muita propriedade, define:

“Direito é a arte do meu e do teu. É o complexo das normas obrigatórias de conduta impostas pelo Estado para assegurar a convivência dos agrupamentos humanos”3.

Apesar da disparidade conceitual, percebemos pontos em comum que consubstanciam a essência do Direito, quais sejam: (i) significa o regramento da conduta, estabelecido em normas, cuja imposição é feita pelo Estado e por este é assegurado o cumprimento; (ii) tem como finalidade possibilitar a convivência dos homens em sociedade, impondo-lhes limites em sua liberda-de individual, para que seja assegurada a liberdade de todos. Direito é, pois, conjunto de normas emanadas do Estado, na sua tarefa de viabilizar a vida em sociedade, pela regulação das relações jurídicas entre cidadãos e entre cidadãos e o próprio Estado.

Tal conjunto de normas, por óbvio, visa a disciplinar a vida dos seres humanos nas relações interpessoais; vale dizer, o que se passa na consciência de cada indivíduo, sem causar qualquer influência em outra pessoa, é um aspecto que não interessa ao Direito. Costuma-se dizer que o Direito é um elemento imprescindível à convivência social. Daí se pode extrair a máxima de que sem Direito não há sociedade. Tão verdadeira quanto essa é também a afirmação de que sem sociedade não há Direito.

2. DIREITO PÚBLICO E DIREITO PRIVADO

Clássica é a divisão do Direito em público e privado. Tal divisão é atacada por muitos autores contemporâneos, que a consideram inútil, devido à variante de critérios adotados para a classificação, ou descabida, dado o fenômeno em curso de progressiva publicização do direito privado.

2 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 35.3 CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1975.

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De todo modo, impõe-se aqui fazer referência a essa classificação. São três os critérios normalmente usados pelos autores para estabelecer a distin-ção, que a nosso ver não se excluem, mas, pelo contrário, se complementam. São eles: (i) o critério subjetivo; (ii) o do conteúdo da norma; e (iii) o do interesse protegido.

Critério subjetivo. Importa saber quais as partes envolvidas na relação jurídica regida pela norma. Teremos direito público se pelo menos uma das partes envolvidas na relação jurídica for o Estado e, por outro lado, direito privado, quando as partes envolvidas forem particulares.

Critério relativo ao conteúdo da norma jurídica. Importa saber qual o efeito da norma jurídica. Se imperativa a norma, impondo obrigatoriedade, temos direito público; se apenas dispositiva, regulando aspectos da manifestação da vontade, temos direito privado.

As normas imperativas ou cogentes impõem uma ação ou uma abstenção, sem indagar da vontade das partes; são normas que prevalecem sempre, sem cogitar do interesse próprio de cada um. São mandamentos de conduta inal-teráveis pela vontade particular.

As normas ditas dispositivas, ao contrário, preveem e autorizam a pos-sibilidade de uma acomodação particular. Referem-se a hipóteses em que a vontade das partes pode combinar e pactuar um arranjo mais adequado, conforme seu interesse privado.

De acordo com esse critério, direito público significaria a parte do Direito que cuida de relações jurídicas em que o elemento mais importante não é a vontade individual da pessoa, mas sim o interesse coletivo; já direito privado seria aqueloutra fração de normas que regula relações jurídicas em que, em primeiro lugar, vem a vontade individual das partes.

Critério do interesse protegido pela norma. Nesse ponto, é relevante saber qual o interesse protegido pela regra jurídica. Quando o interesse a ser tutelado na relação jurídica regulado pela norma for o interesse público, público será o direito; se o interesse a ser tutelado é o privado, privado será o direito. É, segundo a doutrina, o critério mais utilizado para tal distinção.

O direito público visa regular, precipuamente, os interesses estatais e sociais e, ainda, a reger as relações entre os Estados soberanos, cuidando só reflexamente da conduta individual. Integram-no, entre outros, o direito constitucional, direito administrativo, direito financeiro, direito tributário, direito penal, direito processual, direito eleitoral e direito previdenciário. Esta subdivisão não é estanque e admite a ramificação dos ramos já existentes, devido à tendência moderna de especialização do Direito, o que se relaciona com a progressiva complexidade da sociedade contemporânea.

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O direito privado, por outro lado, cuida principalmente dos interesses individuais, de modo a assegurar a coexistência das pessoas em sociedade e a fruição de seus bens, quer nas relações de indivíduo a indivíduo, quer nas relações do indivíduo com o Estado, desde que este não esteja investido de seu poder de soberania (ou seja, agindo como se fosse uma pessoa qualquer). Integram-no o direito civil, o direito empresarial e o direito do trabalho.

Seja qual for o critério adotado, o direito tributário classifica-se como ramo do direito público, pois: (i) o Estado é parte na relação jurídica; (ii) a norma tributária traz em si o atributo da coatividade e não deixa, em regra geral, nenhum espaço para a voluntariedade daqueles que a ela estão sujeitos; e ainda (iii) o interesse a ser tutelado é o público, com a finalidade de disciplinar a captação de receitas tributárias, com vistas à sustentação da máquina estatal.

3. DIREITO TRIBUTÁRIO

Como já dito, o direito tributário é uma ramificação do direito público. Cumpre ressaltar que o estudo individualizado dos ramos do direito público é fato historicamente mais recente, em contraste com o estudo do direito privado (principalmente o direito civil, cujas lições fundamentais remetem ao tempo do Império Romano). Por estar intimamente relacionado com a atividade estatal, o direito público veio se desenvolvendo e tornando-se complexo na medida da organização e agigantamento do Estado, ocorridos ao longo da história.

O nascimento do princípio da legalidade tributária (necessidade de lei aprovada pelos representantes do povo ou da classe dominante, para a ins-tituição do tributo), por exemplo, é geralmente creditada à Magna Charta inglesa de 1215. No entanto, o início do estudo autônomo e da sistematização do direito tributário como hoje conhecemos pode ser situada no século XX, com o advento das duas Grandes Guerras Mundiais e com a consciência da necessidade de que o Estado participe ativamente na busca da igualdade e justiça sociais. Em tais realidades, os Estados soberanos viram-se compelidos à ampliação de suas atividades e, consequentemente, da sua atividade financeira.

A divisão do Direito em vários ramos ou disciplinas jurídicas se presta, principalmente, ao objetivo didático. Dificílimo seria a tarefa de ensinar e aprender, ao mesmo tempo, as regras e os princípios jurídicos que afetam todas as áreas de convivência social, devido à abundância de normas existentes. Desse modo, uma forma de equacionar o problema didático é o fracionamento da ciência jurídica em várias disciplinas, tais como direito civil, empresarial, tributário, financeiro, penal, constitucional, etc.

Tal divisão é promovida levando-se em conta o tipo de relação jurídica estudada e disciplinada. Por exemplo, compete ao direito civil o estudo das

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relações jurídicas que se dão entre pessoas comuns na fruição de seus bens e direitos. Já ao direito comercial ou empresarial compete, essencialmente, o estudo das relações concernentes aos empresários, pessoas jurídicas ou físicas que se dedicam à tarefa de oferecimento no mercado de mercadorias e servi-ços. Ao direito penal compete o estudo das relações de caráter punitivo que se instauram entre o Estado e a pessoa que comete determinado delito. Ao direito financeiro incumbe o estudo das normas disciplinadoras da atividade financeira do Estado, tais como a forma de obtenção de suas receitas, a forma de gestão dos recursos, bem como a maneira de empreender os gastos. Ao direito tributário, cabe o estudo das relações entre o Estado e o contribuinte, no que concerne à exigência de tributos.

Vê-se, portanto, que o direito tributário significa uma disciplina de estudo autônomo que decorre da complexidade de um setor do direito financeiro, o da obtenção da receita mais importante atualmente, o tributo. A progressiva importância do direito tributário liga-se ao movimento histórico de redução, pelo Estado, do volume de suas receitas patrimoniais ou empresariais.

Podemos, nesse ponto, expor o conceito mais difundido do direito tribu-tário: é o ramo didaticamente autônomo do Direito que estuda as relações jurídicas entre o Estado e o contribuinte, relativas à instituição, fiscalização e arrecadação de tributos.

Instituir significa criar o tributo. Mais adiante, veremos que a instituição de qualquer tributo deve ser feita por meio de lei. Ou seja, desde o instante em que se pretende editar uma lei para instituir um tributo, tal circunstância já é de interesse ao nosso estudo.

Fiscalização compreende uma gama de atividades promovidas pela Admi-nistração Pública no sentido da vigilância sobre o contribuinte, para que este cumpra o dever que a lei lhe incumbe.

Arrecadação, em linguagem mais simples, significa o momento do pa-gamento, situação em que os recursos saem do bolso do contribuinte e in-gressam nos cofres estatais. Após esse instante, sob essa perspectiva didática, cessa o interesse do direito tributário. As fases seguintes, tais como a maneira de gestão dos recursos e sua aplicação, já significam assuntos regulados não pelas normas pertinentes ao direito tributário, mas sim ao direito financeiro.

É conveniente, portanto, que se entenda desde logo a limitação do universo de estudo do direito tributário. A questão do destino do dinheiro arrecada-do, a princípio, não é propriamente um problema a ser estudado e debatido na nossa disciplina, mas sim no direito financeiro. A gestão financeira e a alocação dos recursos públicos são reguladas em normas próprias (CF, arts. 163 a 169; Lei de Responsabilidade Fiscal, Leis de Planos Plurianuais, Leis de Diretrizes Orçamentárias, Leis Orçamentárias Anuais, entre outras). No

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entanto, não se pode perder de vista que o direito tributário e o financeiro guardam especial proximidade, como vimos anteriormente.

Há alguns aspectos de aproximação que merecem destaque. Nossa atual Constituição, por exemplo, concebeu a possibilidade de instituição de tri-butos cujos recursos devem ser usados em finalidades específicas (é o caso dos empréstimos compulsórios e das contribuições especiais). Nesses casos, a norma constitucional que atribui a competência para a instituição do tributo, ainda que implicitamente, subordina a própria legitimidade da instituição à aplicação dos recursos conforme ali previsto. Desse modo, a desvirtuação do destino do dinheiro causa a própria invalidade do tributo. Cuida-se de situação em que o próprio poder de instituir o tributo subordina-se à destinação dos recursos definida pela Constituição. Ou seja, a destinação dos recursos não é tema central da nossa disciplina; no entanto, ele não se mostra totalmente afastado do estudo de algumas normas tributárias.

Perceba-se, de toda sorte, que o contribuinte, ao pagar o que deve ao Estado a título de tributo, rompe a relação que antes os unia. Ao pagar o que devia, o contribuinte liberta-se da relação de débito que tinha para com o Estado (até que nova dívida surja). Portanto, a relação Estado-contribuinte, elemento central do estudo do direito tributário, deixa de existir quando o pagamento do tributo é efetuado. Daí concluir-se que, feito o pagamento, encerra-se o universo de apreciação do direito tributário. Compete às normas do direito financeiro regular a gestão e a utilização dos recursos arrecadados.

4. DIREITO TRIBUTÁRIO E OS DEMAIS RAMOS DO DIREITO

Como sustentado anteriormente, a ramificação do Direito não tem razão propriamente orgânica, mas sim primordialmente didática. A divisão existente não se processa devido a diferenças estruturais ou fenomenológicas de cada ramo, mas sim, basicamente, por uma necessidade prática do estudo. Dada a unicidade da ciência jurídica, seus diversos ramos encontram-se visceralmente ligados. Não pode qualquer um deles prescindir dos demais. E assim é também com o direito tributário. Ao estudá-lo, invariavelmente, nos deparamos com conceitos, definições ou fenômenos próprios de outros ramos do Direito, sem os quais a compreensão da norma tributária não seria possível ou completa.

Ao lermos o Código Tributário Nacional, por exemplo, encontramos termos como propriedade, bem imóvel, doação, venda, adquirente, herdeiro, pessoa natural, pessoa jurídica, obrigação, crédito, pagamento, compensação, transa-ção, remissão, prescrição, decadência e muitos outros, que são definições do direito civil; fundo de comércio, incorporação e fusão de sociedades, definições do direito empresarial; União, Estados, Distrito Federal, Municípios, entes

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políticos de direito constitucional; ato administrativo, autoridade administra-tiva, definições do direito administrativo; anistia, crime, contravenção, dolo específico, definições do direito penal; medida liminar, mandado de segurança, ação judicial, tutela antecipada, ação de consignação em pagamento, processo de cobrança, conceitos que são colhidos no direito processual civil. Há ainda muitas outras correlações, nem sempre explícitas, com outros ramos.

Enfim, apesar de sua autonomia didática, o direito tributário relaciona--se com todos os demais ramos do Direito, com aqueles integrantes tanto do direito público como do direito privado.

5. ESTADO

Usual é a definição de que “o Estado é a sociedade politicamente organizada”. Segundo as teorias contratualistas, o Estado tem lugar pela vontade de toda a sociedade de determinado território e existe para realizar a essa coletividade o bem comum e as atividades que cada membro dela, individualmente, não poderia se proporcionar. Para isso, a coletividade investe o Estado de determinadas prer-rogativas não comuns aos particulares. É o que se costuma chamar de soberania do Estado. É o poder de realizar atividades que são privativas do ente estatal, tais como o poder de punir, o de tributar, o de vigilância e o de distribuir justiça.

Tais poderes não emanam diretamente do Estado, mas este os detém pelo fato de o povo ter-lhe outorgado, eis que todo o poder emana do povo. O Estado detém tais poderes por delegação popular, no sentido de que realize os anseios dessa sociedade, mormente o de proporcionar uma convivência harmônica e justa aos cidadãos. Como instrumentos para essa realização, o Estado recebe do povo uma série de poderes especiais, não comuns aos ci-dadãos individualmente considerados. Tais poderes, genericamente chamados de soberania, importam na possibilidade de o Estado sobrepor sua vontade (vontade da coletividade) sobre a vontade do particular. Isso se traduz, por exemplo, na possibilidade de o Estado estabelecer restrição à liberdade de certa pessoa, em prestígio à preservação da integridade da ordem jurídica (poder de punir), bem como na possibilidade de exigir do cidadão determi-nados valores para a manutenção das atividades estatais (poder de tributar).

No fenômeno democrático, tais poderes são entregues ao Estado pelo povo, por meio da Constituição de um país.

No direito brasileiro, o poder estatal é dividido em três esferas políticas: a União (a esfera central), os estados-membros e o Distrito Federal (esferas regionais) e os Municípios (esferas locais). Atualmente, temos no Brasil 26 estados- -membros e o Distrito Federal (27 unidades da Federação), bem como pouco mais de 5.500 municípios localizados nos estados-membros.

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6. RECEITAS DO ESTADO

É bastante usual a classificação das receitas do Estado em originárias e derivadas. Tal classificação leva em conta a maneira pela qual o Estado con-segue obter cada uma delas.

Receita originária é aquela que o Estado consegue angariar pela realização de atividades comuns aos particulares. Nesse momento, o Estado despe-se de sua soberania e age como se particular fosse. São receitas que derivam de obrigações surgidas por vontade das partes, ou seja, do contrato entre o Estado e outra pessoa qualquer. Ocorre, de ambas as partes (Estado e pes-soa que oferece o numerário), a manifestação individual da vontade. Alguns exemplos: aluguéis recebidos, lucros auferidos pela venda de bens, lucros recebidos em função de participações societárias (quando o Estado é sócio de uma sociedade empresária) e doações recebidas.

Nessas hipóteses, a obrigação de entregar a receita ao Estado não decorre da coerção imposta por este, mas sim de um contrato, uma manifestação bilateral da vontade.

Veja-se o exemplo do aluguel recebido. O dever de o locatário realizar o pagamento decorreu de sua manifestação de vontade de obter o imóvel em locação, firmada no contrato. Alguém que adquire um bem vendido pelo Poder Público (como ações de empresas a serem privatizadas) não o adquire por coerção estatal, mas por vontade. Os dividendos recebidos pelo Poder Público (lucros distribuídos por empresas nas quais o Estado detenha participação no capital) são recebidos em virtude do contrato ou estatuto social da empresa que previa a distribuição aos sócios. Na hipótese da doação, podemos dizer que quem doa o faz porque deseja, não por coerção. A fonte que dá origem à obrigação é a vontade das partes envolvidas.

Nas receitas originárias, o Estado desenvolve uma atividade que não re-quer o uso da soberania. Para identificar se determinada receita é realmente originária, basta propor a seguinte indagação: esse tipo de receita poderia ter sido auferida por qualquer particular? Em sendo a resposta positiva, trata-se de receita originária.

Uma observação que aqui nos parece relevante é a de que as receitas auferidas por empresas estatais não são receitas do Estado. A partir do mo-mento em que é criada, por exemplo, uma empresa pública (CEF, BNDES, etc.) ou uma sociedade de economia mista (Banco do Brasil, Petrobras, etc.), temos uma nova pessoa jurídica, diferente, portanto, da pessoa que ajudou a constituir seu capital. A Petrobras, por exemplo, é uma sociedade anônima e, portanto, pessoa diferente da União, sua principal sócia. Deve valer a máxima de que o patrimônio da pessoa jurídica não se confunde com o do sócio. Na

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hipótese, as receitas da venda de combustíveis são receitas da Petrobras, e não da União. No entanto, se produzido resultado anual positivo (lucro), a empresa distribuirá, nos termos do estatuto social e da deliberação dos sócios, os di-videndos a estes. Aí, sim, teríamos receita da União – os lucros distribuídos.

Receita derivada é aquela que o Estado consegue angariar com a realiza-ção de atividades que lhe são típicas. Nesse momento, o Estado se utiliza da soberania que lhe foi outorgada pela coletividade. São receitas que derivam de obrigações surgidas por imposição coativa do Estado, por meio da lei. São exemplos: tributos, multas administrativas e penais e reparações de guerra.

Nesse tipo de relação, temos, de um lado, o Estado, que angaria a receita, e de outro alguém que lhe fornece a receita. No entanto, este último não manifesta individualmente sua vontade junto ao credor (Estado), no sentido de contrair a dívida. Esta surge ou tem fonte não na vontade das partes en-volvidas, mas apenas na manifestação soberana do Estado, que faz valer sua vontade sobre a de outrem.

Alguém que é obrigado a pagar IPTU (Imposto sobre Propriedade de Imóvel Urbano) ao município, por exemplo, não contraiu tal dever pelo fato de um dia ter celebrado individualmente um contrato junto à Administração municipal. É obrigado a pagar em função de uma coerção estatal.

O mesmo a dizer a respeito das multas administrativas e penais. São im-posições estatais sobre aqueles que transgridem a ordem jurídica. No primeiro caso – das multas administrativas –, houve infração às normas administrativas relativas ao trânsito, ao ordenamento urbano, à atividade de edificação, ao meio ambiente, às normas de vigilância sanitária, etc. No segundo caso – das multas penais –, houve prática de crime ou contravenção.

Reparações de guerra são valores exigidos pelo Estado vencedor do conflito internacional sobre aquele que foi o perdedor, relativos aos danos sofridos com o conflito. Significa a manifestação de soberania de um Estado sobre o outro.

Podemos dizer que, nas receitas derivadas, não temos contrato, mas sim imposição, uso da soberania por parte do Estado.

Nos Estados de Direito (como é o caso da República Federativa do Brasil), as Constituições trazem a cláusula de que nenhum cidadão poderá ser coagido a fazer o que não queira ou a deixar de fazer o que queira, senão em virtude da lei (CF, art. 5º, II). Lei, nesse sentido, significa ato que emana do Poder Legislativo, em que temos a representação popular. Ou seja, os membros do povo não podem sofrer coerção estatal, senão por meio de um veículo que seja votado e aprovado pelo próprio povo, por intermédio de seus representan-tes. A imposição a ser manifestada pelo Estado – como vimos, circunstância típica das receitas derivadas – deve ser veiculada por lei. Daí dizermos que as receitas derivadas são aquelas estabelecidas em lei.

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Uma observação que nos parece oportuna é a questão das multas con-tratuais. Elas são previstas em contrato, aplicáveis na hipótese de o devedor se mostrar impontual em seus pagamentos ou descumpridor de alguma cláu-sula avençada. Por exemplo, firma-se no contrato de venda de ações que o comprador deverá pagar o preço em certa data, sob pena de recair sobre ele multa de 5% em caso de atraso. Nessa circunstância, apesar de se tratar de multa, tal receita tem essência originária, e não derivada, eis que estipulada em contrato.

Por derradeiro, nesse tema das receitas estatais, podemos dizer que, em ambos os casos (receitas derivadas e originárias), existirá uma obrigação de pagar em favor do Estado. No entanto, varia a origem ou a fonte dessa obri-gação. Nas receitas originárias, a fonte é o contrato. O contrato entre Estado e outra pessoa faz surgir o direito à percepção da receita. Já em se tratando de receitas derivadas, pode-se dizer que a fonte é a lei, manifestação legítima da soberania estatal.

7. DEFINIÇÃO DE TRIBUTO (CTN, ART. 3º)

Todas as definições vistas anteriormente são de origem doutrinária, ou seja, estabelecidas pelos autores e estudiosos do assunto, que tentam reduzir a conceitos fenômenos observados. No entanto, a definição de tributo é de origem legal. O art. 3º do CTN define o conceito da seguinte forma: “tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”.

A definição é extensa e merece análise pausada, eis que vários assuntos recorrentes na nossa matéria são discutidos à luz do conceito. Podemos dividi--la em cinco partes, que indicam, cada qual, certa característica.

1ª parte: é prestação pecuniária, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir. Prestação pecuniária significa aquela que deve ser satisfeita em di-nheiro, em moeda corrente. Nesse ponto, cabe a observação de que, devido ao modelo econômico moderno, em que não convivemos mais com a economia de troca ou de escambo, as necessidades de qualquer pessoa, inclusive as do Estado, são normalmente satisfeitas em dinheiro. Ou seja, o Poder Público, para satisfazer as incumbências que lhe são próprias, tais como a manutenção da saúde pública, educação, previdência, assistência social, segurança, justiça, encargos da dívida, folha de pagamentos, como tantas outras, carece de re-cursos em dinheiro, e não de mercadorias ou outras utilidades. Daí a ideia bastante razoável ou congruente, a nosso ver, de que os tributos – forma mais significativa de manutenção financeira do Estado – sejam satisfeitos em moeda.

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Cap. 1 • Direito tributário 11

Já houve o tempo, de certo bastante remoto, da existência de tributos in natura, pagos em mercadorias ou em serviços. No entanto, é modelo que não mais se ajusta à realidade atual.

Nas situações em que o contribuinte deixa de promover o pagamento do tributo devido, a Administração deverá ajuizar contra o inadimplente a ação de execução fiscal. Significa uma ação judicial pela qual a Fazenda Pública irá requerer ao juiz que penhore os bens do devedor, para que sejam levados a leilão judicial. Na hipótese, não haverá, a princípio, o pagamento da dívida com os bens do devedor, mas eles servirão tão somente para, mediante leilão, converterem-se em dinheiro, a ser utilizado no pagamento da dívida. O que queremos dizer é que, mesmo na hipótese de penhora de bens, o objetivo visado é a conversão destes em dinheiro.

Como se vê no texto legal, há, no entanto, uma menção à prestação em moeda ou cujo valor nela (moeda) se possa exprimir. A leitura isolada e su-perficial dessa passagem parece colidir com o sustentado até aqui, ou seja, que a satisfação da dívida poderia ser feita mediante a entrega de bens ao credor tributário. Essa noção é defendida por uma minoria de autores.

Na visão da maioria, o dispositivo não autoriza por si só o pagamento da dívida tributária em mercadorias, por exemplo. Deve-se entender que a menção apenas autoriza que o tributo seja expresso em algo que não seja moeda, como no caso das unidades fiscais usadas para indexação (Ufir, BTN, OTN, ORTN, etc.). No entanto, são expressões que podem ser facilmente convertidas novamente em dinheiro, para fins de pagamento. A impossibilidade, a nosso ver, do pagamento por meio de mercadorias, serviços ou outras utilidades, é expressa no art. 162 do CTN, que veremos oportunamente (Capítulo 19).

A LC 104/2001, que alterou o Código Tributário Nacional, acrescentou, no entanto, o inciso XI ao art. 156, para determinar que a dívida tributária possa ser extinta mediante dação em pagamento em imóveis, na forma e condições estabelecidas em lei. Dação em pagamento significa a entrega de coisa que não seja dinheiro, em substituição ao valor devido. Portanto, atualmente, o CTN autoriza a entrega de bens imóveis (terrenos, apartamentos, casas) para a quitação de dívidas tributárias. Tal mecanismo depende de regulação em lei de cada esfera tributante (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). Abordaremos o tema mais adiante (Capítulo 20). Em resumo, podemos con-cluir que, atualmente, o tributo é pagável em dinheiro, mas também em bens imóveis, nos termos da lei.

De todo modo, prevalece como regra geral a noção de que o tributo é prestação de natureza pecuniária.

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DIREITO TRIBUTÁRIO • João Marcelo Rocha12

2ª parte: é prestação compulsória. Essa característica confirma justamente a natureza de receita derivada do tributo. O dever de pagar não surge em função de um ajuste contratual entre o Estado e o contribuinte, mas sim de uma imposição estabelecida pela lei.

3ª parte: é instituído em lei. Essa característica, a rigor, nem precisaria constar expressamente do conceito, eis que já é decorrência do elemento anterior (compulsoriedade). Ou seja, se vivemos sob a égide da cláusula constitucional de que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer nada senão em virtude da lei (CF, art. 5º, II), e se o tributo é compulsório, logo, deverá ser instituído por lei. Como já se disse, lei significa ato normativo que emana do Poder que representa a vontade geral do povo – o Legislativo.

Quanto a esse aspecto, é de mencionar a questão da medida provisória. Do ponto de vista conceitual, as medidas provisórias (CF, art. 62) não são leis, eis que emanam no Poder Executivo, especificamente do Chefe do Executivo (na esfera federal, do Presidente da República). No entanto, nossa Constituição estabelece que elas tenham força de lei, ou seja, valem como se leis fossem durante seu prazo de validade (60 dias, prorrogáveis por mais 60). As me-didas provisórias devem, durante esse interstício, ser apreciadas pelo Poder Legislativo, que, assim querendo, promoverá a conversão em leis. Embora historicamente muitos autores não admitam a ideia, os tribunais brasileiros, especialmente o Supremo Tribunal Federal, vêm entendendo no sentido de a possibilidade de medida provisória ser veículo idôneo para a instituição de tributos. Em verdade, já houve vários casos em que isso se processou, com o abono do Judiciário. Atualmente, na redação do art. 62 da Constituição dada pela EC 32/2001, não se pode mais ter qualquer dúvida sobre a possibilidade de a medida provisória instituir tributos.

4ª parte: não é sanção de ato ilícito. Esse elemento determina que o tri-buto não significa uma punição por alguma infração cometida. O dever de pagar tributo não decorre do fato de o contribuinte ter transgredido alguma norma jurídica. Nesse sentido, o tributo extrema-se da multa. Esta, sim, pos-sui caráter punitivo. Tributo e multa jamais se confundem, mesmo no caso das multas tributárias, que são decorrentes do descumprimento de um dever estabelecido pela legislação de algum tributo (deixar de emitir notas fiscais, deixar de efetuar o recolhimento do tributo dentro do prazo regulado pela lei, deixar de efetuar escrituração etc.).

O dever de pagar tributo decorre do acontecimento do fato gerador. O fato gerador é uma situação prevista na lei instituidora do tributo. A lei define que, toda vez que acontece determinado tipo de fato, surge para o contribuinte o

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Cap. 1 • Direito tributário 13

dever de pagar. Vejamos alguns exemplos: o fato gerador do IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículo Automotor, de competência estadual) é ser proprietário de veículo automotor em cada ano-calendário. Embora o fato de deter a propriedade não seja uma situação ilícita, ainda assim o proprietário é compelido ao pagamento. Outro exemplo: o fato gerador do IR (Imposto sobre a Renda, de competência da União) é auferir renda; embora não seja algo ilícito, o tributo é devido.

Questão que se mostra interessante é a referente aos fatos geradores que ocorrem em meio a situações ilícitas, como na hipótese do banqueiro de jogo de bicho (autor de contravenção penal) que aufere renda com a referida atividade. Nesse caso, mesmo assim, o imposto de renda é devido. Não como consequência do ato ilícito praticado, mas sim em função do acontecimento do fato gerador do tributo. Na hipótese, devem ser isolados os dois aspectos existentes. O primeiro tem relevância tributária: acontecido o fato previsto na lei do imposto como gerador do dever de pagar, surge inevitavelmente a obrigação tributária. Por outro lado, ocorrido o evento que a lei penal quali-fica como ilícito, surge para o Estado a pretensão punitiva também prevista em lei (prisão de quatro meses a um ano e multa). Nessas hipóteses, viria a questão: o tributo é devido? Sim. É devido não pelo fato de ter sido perpe-trada atividade ilícita, mas por ter se aperfeiçoado o fato gerador tributário.

A expressão sanção tem também o sentido de legitimação, de purgação. Ou seja, a aplicação e o cumprimento da sanção purgam o ilícito e o infrator, assim, passa a uma situação de, digamos, quitação para com a sociedade. Por isso dizer que o pagamento do tributo não sanciona (não legaliza, não purga) a atividade ilícita. Mesmo que pago o tributo decorrente de fato gerador ocor-rido em meio a atividade criminosa ou contravencional, o infrator continua sujeito à aplicação da punição fixada na norma penal.

5ª parte: é cobrado mediante atividade administrativa plenamente vincula-da à lei. Significa dizer que a lei não outorga às autoridades administrativas incumbidas da cobrança nenhuma margem de opção sobre exigir ou não o tributo, ou, ainda, sobre escolher de quem ou quanto exigir. Compete às autoridades do Fisco exigir o tributo nos casos previstos em lei, de quem a lei indicou, na quantidade e nas épocas por ela também definidas. Não resta à autoridade fiscal um juízo político de decisão. A lei trará em seu texto to-dos os elementos necessários para a estruturação do tributo que instituir. À autoridade fiscal restará apenas um caminho válido. Na verdade, tal caracte-rística é uma especial decorrência da compulsoriedade e da legalidade vistas anteriormente. O contribuinte não está obrigado a pagar mais do que a lei exige nem tem o direito de pagar menos do que a lei define.

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Por derradeiro neste tópico podemos dizer que toda vez que pairar dú-vida a respeito de uma prestação ser ou não tributo, basta cotejar a criatura estudada com a definição vista. Será tributo aquilo que se conformar com todas as características anteriormente mencionadas.

8. SINOPSE

Abordamos o conceito de direito e a sua tradicional divisão entre direito público e direito privado. Verificamos que há vários critérios aceitos para essa divisão. Concluímos que o direito tributário é ramo do direito público, seja qual for o critério adotado.

Enfrentamos o conceito de direito tributário e suas fronteiras com o direito financeiro, do qual se originou. Mencionamos a intensa e necessária relação do direito tributário com outros ramos do direito, especialmente com o di-reito constitucional, administrativo, civil, empresarial, penal e processual civil.

Tratamos sobre a definição de Estado, bem assim sobre a soberania que o povo lhe outorga. Em seguida, cuidamos das espécies de receitas do Estado, as originárias (contratuais) e as derivadas (decorrentes do uso da soberania). Fixamos que o tributo é a modalidade mais importante das receitas derivadas.

Estudamos a definição legal de tributo e os seus cinco aspectos: (i) prestação pecuniária, (ii) compulsória, (iii) instituída por lei, (iv) que não consiste em sanção de ato ilícito e (iv) que é cobrada por meio de atividade administrativa plenamente vinculada à lei.

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