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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” Direito Civil e Direito Privado MONOGRAFIA “A Responsabilidade Civil do Estado – Sua Abrangência e seus Limites” Aluna: MARIA HELENA ROCHA RAMOS

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Page 1: Direito Civil e Direito Privado MONOGRAFIA “A ... · caracterizar-se a responsabilidade civil do Estado em face de uma omissão é necessário que haja o descumprimento, por parte

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

Direito Civil e Direito Privado

MONOGRAFIA

“A Responsabilidade Civil do Estado – Sua Abrangência e seus Limites”

Aluna: MARIA HELENA ROCHA RAMOS

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AGRADECIMENTOS

A todos os meus familiares e amigos que amorosa e constantemente me incentivam a buscar meu aprimoramento. Maria Helena Rocha Ramos

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DEDICATÓRIA

A todos os meus familiares, em especial minhas irmãs e sobrinhos, que sempre me apóiam em meus projetos de aprimoramento pessoal.

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RESUMO

É de conhecimento geral o fato de que, em face do disposto no art. 37, § 6o da

Constituição Federal, o Estado e os prestadores de serviços públicos respondem

objetivamente, isto é, sem considerações acerca da culpa ou dolo, pelos danos que seus

agentes, nesta qualidade, causarem a terceiros. Tal construção teórica é, em última análise,

uma conseqüência do princípio da isonomia, posto que se toda a sociedade se beneficia das

vantagens da atuação do Estado, não seria admissível que somente alguns arcassem com os

danos decorrentes dessa atuação.

A construção da teoria da responsabilidade objetiva do Estado confunde-se com a

própria evolução do Estado de Direito e com o progressivo reconhecimento dos direitos

individuais, limitando o campo de atuação do Estado em defesa do cidadão. De fato, desde os

tempos do absolutismo, em que, identificando-se o Estado à pessoa do rei, se negava a

possibilidade de responsabilização do Estado (“the king can not do wrong”) até os dias que

correm, em que o Estado, tal quais os particulares, deve submeter-se completamente às leis e

reparar quaisquer danos por ele causados, o que se vê é uma afirmação, cada vez maior, do

princípio da solidariedade social.

Assim, a moderna doutrina publicística tem afirmado, quase unanimemente, que para

configurar-se o dever de indenizar do Estado, basta ao lesado comprovar a existência do dano

e o nexo causal entre este dano e a atividade estatal.

Isto não obstante, alguns pontos da teoria da responsabilidade objetiva, notadamente

no que se refere às omissões do Estado, continuam causando perplexidade e dissenso entre os

operadores do Direito. É que, segundo a maior parte dos doutrinadores, não pode haver nexo

causal entre uma omissão e um dano. A omissão, entendida como abstenção de um

comportamento, nada pode causar, posto que no plano físico, apenas existem ações, daí

observar que inexiste uma relação de causalidade física entre a omissão e o resultado, uma

vez que, carecendo a inatividade de eficácia ativa, vigora aqui o princípio de ex nihilo nil fit.

Assim, têm a maior parte da doutrina e da jurisprudência entendido que para efeito de

caracterizar-se a responsabilidade civil do Estado em face de uma omissão é necessário que

haja o descumprimento, por parte do Estado, de um dever jurídico de agir. Assim, somente se

poderia pleitear uma indenização do Estado por ato omissivo quando esta omissão

representasse uma violação direta de um dever expresso em uma norma jurídica, o que faria

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com que a responsabilidade deixasse de ser objetiva para tornar-se subjetiva, posto que seria

necessário verificar-se a existência da culpa anônima da administração.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................................................................................... 1 CAPÍTULO I – VISÃO DOUTRINÁRIA DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO .................... 3

1.1. Da Doutrina .................................................................................................................................................. 3 1.2. Corrente Objetiva ......................................................................................................................................... 4 1.3. Corrente Subjetiva ...................................................................................................................................... 10 1.4. Fundamentação das Correntes .................................................................................................................... 11

CAPÍTULO II – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO ................................................................ 15 2.1 Responsabilidade Objetiva .......................................................................................................................... 15 2.2 Responsabilidade Objetiva do Estado ......................................................................................................... 15

CAPÍTULO III – A RESPONSABILIDADE SOB O ASPECTO DO FUNCIONALISMO................................ 18 3.1 A Responsabilidade Do Funcionário Público E de Agente ......................................................................... 18 3.2 O Sentido do § 6º Do Art. 37 da Constituição Federal ................................................................................ 18 3.3 Responsabilidade por Atos Legislativos e Judiciais ................................................................................... 23

CAPÍTULO IV– OS DANOS ............................................................................................................................... 25 4.1 Dano Moral e Material ................................................................................................................................ 25 4.2 A Reparação do Dano .................................................................................................................................. 28 4.3 Breve Notícia Histórica Sobre O Problema Da Reparação Dos Danos No Direito Brasileiro .................... 31 4.4 Meios Preventivos ....................................................................................................................................... 31 4.5 Ônus da Prova ............................................................................................................................................. 32 4.6 Cumulação das Indenizações por Dano Patrimonial e por Dano Moral ...................................................... 32 4.7 Avaliação do Dano ...................................................................................................................................... 33

CAPÍTULO V - DAS DECISÕES ........................................................................................................................ 34 CONCLUSÕES ..................................................................................................................................................... 45 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................................................. 49

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1

INTRODUÇÃO

A Constituição Federal, votada pelo Congresso Constituinte a 5 de outubro de 1988,

consagrou o princípio de que:

"As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa". (art. 37 - XXI - parágrafo 6º)

A norma já fora esposada pelo Código Civil em seu artigo 15, que estatui:

"As pessoas jurídicas de direito público são civilmente responsáveis por atos de seus representantes que nessa qualidade causem dano a terceiros, procedendo de modo contrário ao direito ou faltando ao dever prescrito por lei, salvo o direito regressivo contra os causadores do dano".

A União, cada um dos Estados e o Distrito Federal e cada um dos Municípios

legalmente constituídos são pessoas jurídicas de direito público e respondem pelos atos

constitutivos de danos causados pelos seus agentes, cabendo-lhes, em conseqüência, reparar o

dano, independentemente das sanções civis, penais, éticas e administrativas que o autor do ato

ilícito venha a sofrer.

A Carta Magna vigente manteve a regra já elencada no artigo 107 da Constituição

Federal anterior que dispunha que "as pessoas jurídicas de direito público respondem pelos

danos que seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros", podendo, ainda, em ação

própria haver do agente do dano o ressarcimento da prestação obrigacional que assumiu. É o

chamado direito de regresso.

O Estado, como ente personalizado, tanto pode atuar no campo do direito público

como no do direito privado, mantendo sempre sua única personalidade de direito público e

sendo assim, responderá, em face do mandamento constitucional e do direito civil, pelos atos

de seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros.

A legitimidade ad causam do Estado para figurar no pólo passivo da relação

processual em função de sua responsabilidade objetiva na culpa da administração ou na falha

do serviço prestado pelos órgãos públicos por meio de seus prepostos é incontroversa.

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A jurisprudência identifica a responsabilidade objetiva do Estado na culpa anônima da

Administração ou na falha do serviço prestado, sem estender-se às cegas até o risco integral,

pois este conduziria ao absurdo de fazer-se o Estado responsável por todos os eventos fatais

de que fossem vítimas pacientes recolhidos a estabelecimentos hospitalares públicos, ou que

fossem assistidos por médico do serviço público.

Sendo a apelada Autarquia Estadual, mostra-se incontroverso o reconhecimento de sua

condição de pessoa jurídica de direito público, ainda que distinta do Estado que a constituiu,

estando, pois, em tese, a apelada sujeita à regra do artigo 107 da Constituição da República.

Fixada tais premissas, é de se concluir que, para que se pudesse prosperar pretensão

indenizatória, era mister que se identificasse nos procedimentos adotados que antecederam a

cirurgia e também os subseqüentes, fatos que traduzissem falta anônima do serviço posto à

disposição dos usuários do IAMSPE.

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CAPÍTULO I – VISÃO DOUTRINÁRIA DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO

ESTADO

1.1. Da Doutrina

Longa foi a marcha histórica para a responsabilização objetiva do Estado, evoluindo

primeiro da sua total irresponsabilidade, passando pelas teorias subjetivistas (que adotavam os

princípios do direito civil apoiadas na idéia de culpa) até finalmente se alcançar o primado do

risco administrativo.

Todavia, seu grande avanço só deu-se a partir da contribuição das teorias publicísticas

que surgiram da evolução da jurisprudência administrativa francesa, do seu agigantamento e

da sua submissão aos princípios da legalidade e igualdade inerentes ao Estado Democrático

de Direito. Daí porque se dizer que a “responsabilidade é a marca fundamental do Estado

contemporâneo”.

Em virtude da sua maior presença no dia-a-dia dos indivíduos, exercendo uma

intervenção cada vez maior em suas vidas, o Estado passou a assumir perante o corpo social

novos deveres em relação aos quais não pode mais se esquivar. Todavia, o fato do Estado

receber da sociedade a missão de executar determinados serviços de interesse do grupo social

não faz dele irresponsável para responder pelos atos lesivos ao patrimônio ou a direito do

administrado. De fato, a obrigação de manter o adequado funcionamento dos serviços é um

imperativo básico da administração pública.

Assim, ao mesmo tempo em que houve um alargamento e aprofundamento das

missões do Estado contemporâneo, ampliou-se de forma diretamente proporcional a sua

responsabilidade em face dos administrados, os quais passaram a gozar de plena legitimidade

para cobrar o adimplemento das suas obrigações impostas por lei, ou perdas e danos, em

razão de prejuízos derivados de sua inobservância.

Prevista pela primeira vez no Brasil, a nível constitucional, na Carta de 1946, e

definitivamente consolidada no art. 37, § 6º, na Constituição Federal de 1988 (CF/88),

atualmente, não restam mais dúvidas de que, em face da adoção da responsabilidade objetiva,

qualquer comportamento - seja lícito ou ilícito - proveniente do Estado, que venha a causar

prejuízos aos administrados, gera a obrigação de repará-los, sem se perquirir aí se o Poder

Público agiu com culpa ou dolo, bastando tão somente para tanto a configuração do nexo

causal entre a sua conduta e o advento de danos causados aos particulares.

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Todavia, a questão da responsabilidade extracontratual do Estado ganha contornos

mais acentuados quando se busca aplicar a consagrada teoria objetiva para os casos de

prejuízos ocasionados aos particulares em razão da inação ou omissão do Poder Público na

realização adequada dos serviços que lhe competem em razão do dever geral de cautela.

Assim, enquanto uns entendem que a responsabilidade objetiva do Estado se faz

presente em qualquer situação, seja por comissão ou omissão, outros entendem que a CF/88

albergou apenas a responsabilidade objetiva derivada de atos positivos, devendo-se perquirir,

nos outros casos, sobre a responsabilidade subjetiva.

Daí, grandes divergências tanto no âmbito doutrinário quanto jurisprudencial têm

surgido nesse sentido, questionando-se, para que o Estado seja compelido a indenizar os

danos causados aos particulares em razão de sua omissão, se deve ser levada em conta a

responsabilidade objetiva expressamente positivada no art. 37, § 6º, da Carta Magna ou se,

contrariamente, deve ser adotada a teoria clássica da responsabilidade subjetiva fundada na

culpa em sentido estrito (imprudência, negligência ou imperícia) adotada pelo Código Civil

em seu art. 159.

Sobre este tema digladiam-se assim duas correntes principais: uma que considera

objetiva a responsabilidade do Estado, mesmo nos casos de omissão, e outra que, para estas

hipóteses em especial, aceita tão somente a aplicação da teoria subjetiva descartando-se

totalmente a adoção da primeira que só teria incidência em danos causados por atos

comissivos.

O objetivo do presente trabalho é justamente analisar os fundamentos das duas teorias

diametralmente opostas, apontando suas qualidades e deficiências, tudo com o propósito de se

verificar se o art. 37, § 6º, da CF, também consagra a responsabilidade estatal derivada de sua

omissão, chegando-se assim a uma posição mais condizente com o verdadeiro sentido do

texto constitucional cujo alcance foi colocado em dúvida nessas hipóteses.

1.2. Corrente Objetiva

A CF/88 consagrou em definitivo a teoria do risco administrativo, em que se assenta a

responsabilidade objetiva do Estado, positivando-a expressamente em seu art. 37, § 6°,

dispondo que "as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de

serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a

terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".

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Pauta-se ela no princípio de que, independente da existência de dolo ou culpa, o

Estado ou quem lhe faça as vestes, deve responder pelos eventuais prejuízos causados ao

particular. Prescinde assim da análise dos elementos subjetivos, sendo relevante tão somente o

nexo de causalidade entre o funcionamento do serviço público e o dano sofrido pelo

administrado.

Todavia, para os adeptos da corrente objetivista - ao contrário do que uma

interpretação mais descuidada do texto constitucional possa sugerir - não é apenas a ação

positiva do Estado que pode produzir danos e gerar direito à indenização fundada no risco

administrativo, mas também a sua omissão que pode significar negligência, inatividade,

desídia, inércia ou o “ato ou efeito de não fazer aquilo que juridicamente se devia fazer”.

De fato, segundo os ensinamentos de Maria Helena Diniz, a ação, elemento

constitutivo da responsabilidade civil, não denota apenas um sentido de atividade no plano

material, mas também “o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e

objetivamente imputável” que cause dano a outrem. Assim, enquanto a comissão vem a ser a

prática de um ato que não se deveria efetivar, a omissão significa “a não observância de um

dever de agir ou da prática de certo ato que deveria realizar-se”. 1

Deve ser salientado que, apesar de em regra a omissão - como espécie do gênero ato

ilícito - só produzir o dever de indenizar no âmbito da inexecução das obrigações contratuais,

existem determinadas situações em que ela pode agir como fato gerador de tal dever sem que,

para isso, preexista qualquer vínculo antecedente entre ofensor e ofendido.

De fato, a indenização pode derivar da conduta negativa do agente estatal que,

quedando-se inerte frente a um dever legal, acaba por causar danos a outrem em razão de sua

inatividade. A obrigação de reparar o dano neste caso não se origina por força de um contrato,

mas sim por força da inobservância de lei prevista para situações futuras e abstratas.

Pode-se dizer assim que a responsabilidade do Estado, em face de condutas omissivas,

tem como pressuposto a responsabilidade extracontratual (aquiliana) resultante do

inadimplemento normativo, ou melhor, da prática de um ato ilícito, visto que não há vínculo

anterior entre as partes, por não estarem ligadas por uma relação obrigação ou contratual. A

fonte dessa responsabilidade é a inobservância da lei, ou melhor, é a lesão a um direito, sem

que entre o Estado e o administrado preexista qualquer relação jurídica.

1 DINIZ, Maria Helena Diniz. Curso de Direito Civil. São Paulo: RT, 1986

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Partindo-se desse pressuposto, um dano causado ao particular pode ocorrer

simplesmente em virtude da recusa ou inadimplemento voluntário de uma obrigação pelo

Estado que não se tornou impossível. Trata-se daquelas hipóteses em que a Administração

Pública poderia ter cumprido o seu papel (dever legal), mas não o fez (omitiu-se) porque não

lhe era conveniente ou porque não empregou os esforços necessários (suficientes).

A omissão do Estado pode assim denotar culpa in omittendo ou culpa in vigilando,

podendo causar prejuízos aos administrados, à Administração e ao próprio agente público

responsável, pois como assevera Cretella Júnior "se cruza os braços ou não se vigia, quando

deveria agir, o agente público omite-se, empenhando a responsabilidade do Estado por inércia

ou incúria do agente”. 2

Isto todavia não significa dizer que a responsabilidade objetiva deva ser desprezada,

passando-se a aplicar a teria subjetiva nas hipóteses de danos causados aos particulares por

atos omissivos do Estado. Na realidade, é perfeitamente admissível que, agindo com dolo ou

culpa, um agente estatal venha a omitir-se acarretando a violação de uma norma jurídica

protetora de interesses alheios ou de um direito subjetivo individual, e nem por isso a teoria

objetiva deixa de ter validade.

A peculiaridade com que se reveste a responsabilidade objetiva da Administração

Pública por atos omissivos é que, ao contrário daquela derivada de atos comissivos onde basta

tão somente a demonstração da ação positiva do Poder Público e dos danos causados ao

particular para que se configure o nexo causal, é preciso se perquirir, no caso concreto, se era

exigido do Estado um dever geral de cautela que foi desprezado, já que inexiste um ato

comissivo para ser demonstrado.

De fato, o importante a se notar nesta hipótese de responsabilidade em particular é que

o nexo causal deve ser mantido. Para tanto, não basta para a configuração da responsabilidade

estatal a simples relação entre a ausência do serviço (omissão estatal) e o dano sofrido. É

necessário demonstrar que era obrigatória a execução desse serviço no caso concreto e que,

em razão da conduta negativa do agente que deixou de realizá-lo quando lhe era obrigatório

por força de lei, foram ocasionados danos ao particular. Se tivesse agido, ao invés de quedar-

se inerte quando lhe era devido, os malefícios não teriam se produzido (ou seriam minorados).

Assim, uma vez existindo esse dever legal de atuação e omitindo-se o ente público

frente ao mesmo, vindo o administrado a sofrer um dano em razão dessa ação negativa,

2 CRETELLA JR, José. O Estado e a obrigação de indenizar. São Paulo: Saraiva, 1980.

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qualquer que seja a hipótese, justifica-se a adoção da responsabilidade objetiva já que o nexo

causal, imprescindível para a aplicação da teoria, foi devidamente preenchido. Daí ser

necessária a análise do caso concreto pelo magistrado, que verificará se era, ou não, exigida a

atuação ou dever de vigilância do Estado, para que seja civilmente responsabilizado pelos

danos causados ao particular.

Deveras, caso o Poder Público não estivesse obrigado a impedir o acontecimento

danoso, faltaria razão (nexo causal) para impor-lhe o encargo de suportar patrimonialmente as

conseqüências da lesão.

Assim, verificar-se-á a responsabilidade objetiva do Estado sempre que, em razão da

ausência das diligências necessárias exigidas como padrão no caso concreto ou assemelhados,

forem causados danos aos particulares por omissão. Nesta situação, a falta de adoção das

providências legais para que não se verificasse o evento danoso justifica plenamente a

responsabilização patrimonial do Estado.

A responsabilidade objetiva por atos omissivos deflui assim do descumprimento da lei

que deixou de ser observada na conformidade de seu comando. Quando a prestação do serviço

desvia-se do regime legal a ele imposto, deixando o Estado de prestá-lo no momento correto

e/ou da forma devida, verifica-se sua responsabilidade, devendo então ser composto o dano

decorrente dessa falha da Administração Pública.

Alguns acórdãos anteriores à Constituição de 1946 já consagravam a responsabilidade

objetiva do Estado por omissão, em especial, derivada da falta do adequado policiamento, in

verbis:

“Responde o Estado pelos danos causados à tipografia e oficinas de um órgão de imprensa, não importando averiguar, no caso, se o ato lesivo do patrimônio particular foi praticado por funcionários ou empregados públicos, no exercício de suas atribuições, porque, na falta de medidas tendentes a prevenir a alteração da ordem, a violação da propriedade, a descobrir e punir os delinqüentes, o Estado é obrigado (...) a satisfazer o dano”.

Nesse mesmo sentido:

“Falta o Estado à sua missão precípua, de mantenedor da ordem, quando, por ação ou omissão, permite que movimentos populares, cuja prevenção ou repressão lhe cabem, venham a causar prejuízos à propriedade particular”.

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Da própria dicção do art. 37, § 6°, da CF, vê-se claramente que é irrelevante para que

o administrado - na posição de terceiro prejudicado - venha a obter o reconhecimento da

responsabilidade extracontratual do Estado, se perquirir se este último obrou com culpa ou

dolo.

O que se requer de fato é a existência dos pressupostos para a aplicação da teoria

objetiva, sejam eles, o nexo causal entre a conduta omissiva do Poder Público (omissão essa

que não poderia ter se verificado na hipótese concreta) e o dano efetivamente sofrido pelo

administrado (não meramente circunstancial ou potencial).

O texto constitucional não diverge desse entendimento na medida em que apenas faz

menção às qualidades do agente causador do dano (estar incumbido de autoridade proveniente

do poder público) e não às características de sua conduta (se comissiva ou omissiva, lícita ou

ilícita) para a configuração da responsabilidade do Estado, decorrendo essa do simples

funcionamento ou falta dos seus serviços.

O aspecto subjetivo só ganha relevância no que se refere ao direito de regresso do

Estado contra seus agentes, sejam eles integrantes das pessoas jurídicas de direito público ou

das pessoas de direito privado prestadoras de serviço público. Pode-se dizer assim que no

dispositivo constitucional em análise estão compreendidas a responsabilidade objetiva do

Estado e a responsabilidade subjetiva do agente.

Assim, mesmo que o agente tenha agido com culpa, deixando negligentemente

(omissivamente) de adotar as medidas necessárias quando lhe era cabível - por lei ou dever

funcional - para se evitar o evento danoso, isso não é capaz de excluir a aplicação do art. 37, §

6º, da CF, na medida em que a caracterização da sua conduta (aspecto subjetivo) pouco

importa (não é levado em conta) para a responsabilização do Estado. O importante, diga-se

novamente, é que os pressupostos da teoria objetiva sejam preenchidos, sejam eles a

verificação do dano e o nexo causal.

Nesse sentido Carmen Lúcia Antunes Rocha assevera que: 3

“Inobstante existam autores que agreguem às características comuns dos danos responsabilizáveis ao Estado critérios especiais quando se cuidarem de comportamentos especiais omissivos, ou que salientam a peculiaridade da aplicação do próprio regime da responsabilidade quando destes se tratarem, parece-me que a natureza omissiva do comportamento estatal

3 ROCHA, Carmem Lucia Antunes. Responsabilidade Objetiva. São Paulo: Saraiva, 1992.

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não altera nem o regime de responsabilidade do Estado, nem se requer dos danos qualquer característica peculiar”

O Estado assume assim, por força da Carta Magna, os danos decorrentes de sua

atividade bem como de sua falta, sendo à ele aplicada a teoria dos riscos, segundo a qual, todo

aquele que se propõe a desenvolver qualquer atividade tem a conseqüente obrigação de

responder pelos prejuízos causados, seja em razão de ação ou omissão, não se questionando aí

se concorreu ou não com culpa ao evento danoso (desvincula-se o dever de reparar o dano da

idéia de culpa).

Assim, da mesma forma que o fornecedor de produtos e serviços é responsável pela

reparação dos danos causados aos consumidores, sendo-lhe aplicada a responsabilidade

objetiva (independentemente da existência de culpa), o Estado também responde

objetivamente pelos danos causados aos seus administrados em razão de sua conduta.

Na atualidade, alguns tribunais também já vêm decidindo reiteradamente pela adoção

da responsabilidade objetiva e conseqüente reparação, tanto nos casos de típica omissão do

Estado, quanto nos casos de falta de presteza de seu agente. Até mesmo quando haja ação,

mas sendo ela insuficiente, caracteriza-se a omissão geradora da responsabilidade civil do

Estado.

Recentíssima decisão com repercussão nacional foi proferida a esse respeito pela

Justiça Federal da Seção Judiciário do Rio Grande do Norte, ao julgar procedente uma ação

civil pública proposta pela Procuradoria Geral da República, e condenando-se a Fundação

Nacional de Saúde, a União, o Estado do Rio Grande do Norte e mais 34 prefeituras, a

indenizarem os prejuízos sofridos pela população potiguar com a epidemia de dengue que se

alastrou nos anos de 1996 e 1997. Reconheceu o magistrado na hipótese “ter se caracterizado

a violação do dever constitucional e legal de todos os réus assegurarem à população e à

sociedade o direito à saúde”.

Esse é um caso típico de responsabilidade extracontratual do Estado por omissão na

medida em que a possibilidade de uma epidemia de dengue já era conhecida do Poder Público

desde 1995 e nenhuma providência mais eficiente foi tomada para minimizar os efeitos da

doença, sendo a causa direita de diversas mortes e prejuízos à população norte-rio-grandense.

Vale por fim salientar que embora seja objetiva a responsabilidade do Estado (não se

cogitando de indagar sobre sua culpa), não se quer dizer com isso que inexistam causas

atenuantes e/ou excludentes de sua responsabilidade. De fato, admite-se a concorrência da

vítima (para limitar a indenização) ou a culpa exclusiva desta (fazendo desaparecer o dever de

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indenizar). Também a força maior vem sendo admitida como circunstância excludente da

responsabilidade do Estado quando é ela única causa do evento danoso.

Daí, no que respeita à responsabilidade extracontratual do Estado, pode-se dizer a

regra geral é a da responsabilidade objetiva, fundada na teoria do risco da atividade, constante

no art. 37, § 6º, CF, insuscetível de excluir do Estado o dever de indenizar, mesmo quando

ocorrer omissão.

1.3. Corrente Subjetiva

Para os subjetivistas, tratando-se de ação positiva do Estado, a responsabilidade é

sempre objetiva porque tal é fundada na teoria risco-proveito. Segundo esta teoria, quando o

Estado assume alguma atividade no desiderato de satisfazer a necessidade do grupo social,

assume o risco ao ressarcimento caso ela venha a causar prejuízo ao particular, mesmo que se

trate de um dos beneficiários com a ação estatal.

Assim, nada obstante o propósito de conferir uma comodidade aos seus administrados,

se o Poder Público vier a ocasionar um dano, será obrigado a ressarci-lo sem indagação de

culpa.

Todavia, para os danos causados aos particulares em decorrência da omissão do

Estado na prestação do serviço público, deve ser aplicada a teoria da culpa do serviço (faute

du service), isto é, a culpa anônima, não individualizada. Nestas hipóteses (omissão, inércia

ou falha na prestação do serviço público) é a configuração da culpa do serviço público que irá

justificar a responsabilidade do Estado.

Vê-se assim que, o importante para os adeptos desta corrente é se analisar o aspecto

subjetivo da conduta do agente público (prova de culpa ou dolo), para só então se proceder à

responsabilização do Estado.

Assim, na hipótese de omissão, por impossibilidade de se provar a conduta omissiva

do Estado de forma objetiva, dever-se-á apelar para a responsabilidade subjetiva, verificando-

se, destarte, se houve ausência de prestação devida ou, também – embora tenha havido tal

prestação – sua ausência.

Quando da omissão da Administração Pública, aplicam-se as noções de

responsabilidade subjetiva. É entendimento comum de que se o Estado não agiu, não pode ser

o autor do dano. Não sendo autor, somente cabe ser responsabilizado se descumpriu o dever

legal de impedir o evento danoso.

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A omissão pode ser uma condição para que outro evento cause o dano, mas ela mesma

– a omissão – não pode produzir o efeito danoso. A omissão poderá ter condicionado sua

ocorrência, mas não o causou. Portanto, no caso de dano causado por comportamento

omissivo, a responsabilidade do Estado é subjetiva, porquanto supõe dolo ou culpa em sua

modalidade de negligência, imperícia ou imprudência, embora possa tratar-se de uma culpa

não individualizável em um agente, mas atribuída genericamente ao serviço estatal.

Celso Antônio Bandeira de Mello também comunga dessa corrente ao afirmar que o

dispositivo constitucional em análise não prevê a responsabilização do Estado por um fator

estranho aos seus agentes. Por isso, a omissão do Estado em debater um incêndio ou em

prevenir uma enchente “terá sido ‘condição’ da ocorrência do dano, mas ‘causa’ não foi e,

assim, a responsabilidade do Estado será subjetiva”. 4

Daí acrescenta o mestre, quando “o dano foi possível em decorrência de uma omissão

do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de aplicar-se a

teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode ser ele o

autor do dano”. A ausência do serviço causada pelo seu funcionamento defeituoso, até mesmo

pelo retardamento, é quantum satis para configurar a responsabilidade do Estado pelos danos

daí decorrentes em desfavor de seus administrados.

Para haver a responsabilização do Poder Público por atos omissivos, é mister indagar

sobre a culpa por negligência, imprudência ou imperícia, sendo aplicada na espécie a teoria

subjetiva.

Assim, segundo os subjetivistas, o art. 37, § 6º, da CF reporta-se somente a

comportamentos comissivos do Estado, pois só uma atuação positiva pode causar (produzir)

um efeito danoso, não podendo “presumir sua culpa” por comportamentos omissivos, tal

como nos casos de responsabilidade objetiva.

1.4. Fundamentação das Correntes

Na exegese do art. 37, § 6º, da CF, não pode o intérprete ficar limitado apenas à sua

aparente literalidade. É preciso compreender e pensar o referido dispositivo não isoladamente,

mas conjugado com todo o sistema jurídico, com os princípios gerais de direito e,

4 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Responsabilidade extracontratual do Estado por comportamentos administrativos, Revista dos Tribunais.

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principalmente, com o espírito da própria Lei Maior, sem olvidar, todavia o fim social que a

inspirou, bem como à exigência do bem comum.

Assim sendo, apesar de ambas as correntes oferecerem argumentos consideráveis

sobre o tema, a que mais se coaduna com o alcance do § 6º, art. 37, CF, para os danos

causados pelo Estado por comportamentos omissivos é a teoria objetiva.

O § 6º, do referido artigo, ao se referir aos danos causados a terceiros pelos agentes

das pessoas jurídicas de direito público e pelas de direito privado prestadoras de serviço

público, abrangeu todas as ações destes que, sejam positivas ou negativas, venham a causar

uma situação danosa.

O importante é que o Estado dê ensejo a algum dano ao particular, por ação ou

omissão, devendo o mesmo ser reparado, independentemente da prova da culpa. A relação de

causalidade não decorre, todavia do simples fato de ter ocorrido o dano ou facilitada a sua

ocorrência em virtude da inércia de seus agentes.

É imprescindível se demonstrar que a omissão causadora do prejuízo ao administrado

não deveria ter se verificado em razão de competir ao Estado uma atuação positiva naquela

situação específica, mantendo-se assim o necessário nexo de causalidade. Em outras palavras,

não basta a simples relação entre a falta do serviço e o dano sofrido. Importante a se notar é

que se o agente estatal tivesse agido, ao invés de quedar-se inerte quando lhe era devido por

força de lei, os malefícios não teriam se produzido.

Por conseguinte, uma vez demonstrado este nexo causal, caberá tão somente ao

administrado lesado provar os fatos em juízo e não a culpa do Estado, já que a existência dos

danos evidenciam o funcionamento deficiente ou a ausência de funcionamento adequado do

serviço público (omissão na execução de suas funções). Nesta situação, o Estado só poderá se

exonerar da responsabilidade, em regra, se comprovar ter havido culpa exclusiva da vítima ou

a ocorrência de força maior.

Assim, uma vez deixando o Estado de tomar as providências que lhe competiam em

determinada situação em virtude de lei - providências essas possíveis e que seriam eficazes

para evitar o evento danoso - passa a assumir a responsabilidade pela lesão que venha a ser

causada aos vitimados. Com isso, responsabiliza-se objetivamente pelas suas próprias

condutas, assumindo as conseqüências pelo que fez e pelo que, devendo fazer, não fez

(omitiu-se).

Caso o constituinte desejasse fazer distinções, as teria feito expressamente, não

comportando assim interpretação restritiva por parte dos aplicadores da lei, no sentido de se

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excluir a aplicação da teoria objetiva aos danos causados por atos omissivos do Estado ao

particular.

A adoção da responsabilidade objetiva para os casos de omissão deriva de

pressupostos de índole eminentemente processual já que a defesa dos direitos do cidadão

comum estaria extremamente comprometida, via de regra, face à sua hipossuficiência em

relação à posição privilegiada em que o Estado se encontra.

Partindo desses pressupostos iniciais e fazendo uso da interpretação teleológica, não é

difícil se concluir que o nosso legislador constituinte originário tinha por finalidade facilitar a

defesa dos direitos do cidadão comum frente à onipotência do Estado, razão porque inexiste

motivo lógico para se desprezar a responsabilidade objetiva deste em face de condutas

omissivas de seus agentes.

O Estado precisa entender, de uma vez por todas, que o objetivo principal de sua

existência é o atendimento às expectativas e necessidades do cidadão. O atual administrado,

consciente de sua posição, não aceita mais as explicações em torno de descasos,

desconsiderações ou desleixos oferecidos pelas organizações públicas ou privadas à seu

serviço.

Observa-se assim que o dispositivo constitucional sob análise trata-se, na verdade, de

um eficiente meio de luta colocado ao alcance dos cidadãos que, de outra maneira, ficariam

desprotegidos e sujeitos à inúmeras lesões e abusos resultantes da inércia do Poder Público,

com o desprezo das garantias individuais básicas do Estado Democrático de Direito,

impossibilitando o convívio estável e equilibrado em sociedade do qual o próprio Estado

deveria sempre zelar.

Seguindo esta linha de raciocínio, o legislador infraconstitucional já adotou

expressamente no § 3º, art. 1º, do Código de Trânsito Brasileiro (Lei n.º 9.503/97) a

responsabilidade objetiva do Estado nos casos de omissão, sem que se tenha indagado até o

presente momento qualquer dúvida a respeito de sua constitucionalidade.

A responsabilidade objetiva tem assim por escopo garantir aos lesados, com a falta ou

má execução dos serviços estatais, um meio de defesa mais eficiente, como única forma de

conscientizar o Poder Público do cuidado que deve ter com suas omissões, vindo a atender ao

princípio da isonomia ao colocar-se em “pé de igualdade” partes antes tão diferentes (cidadão

x Estado). Em razão desse mesmo princípio é que a Fazenda Pública também dispõe de prazo

em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer (art. 188, CPC).

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Seria muito fácil e cômodo para o Estado aproveitar-se de sua posição privilegiada

para, em proveito próprio, se furtar às suas responsabilidades se a aplicação da teoria objetiva

fosse desprezada nas hipóteses de danos causados aos particulares por atos negativos

(omissões), somente passando a responder nessas hipóteses se fosse devidamente comprovada

a sua culpa.

Apesar de muitas vezes na prática não ser possível individualizar perfeitamente o

agente causador das conseqüências danosas, se for comprovado que a omissão do Estado

contribuiu decisivamente para determinar um estado de coisas suficientes para a produção dos

prejuízos, sem as quais o dano não teria sido verificado, impõe-se a sua responsabilização.

A responsabilidade do Estado por atos omissivos trata-se assim, na maioria dos casos,

de situações que poderiam ter sido previstas e evitadas pela autoridade competente que

omitiu-se em proceder conforme os ditames legais.

Se a aplicação de tal princípio acaba parecendo onerosa é porque, o aparelho

administrativo não está devidamente organizado, e o único remédio contra tal desorganização

seria precisamente forçar o Estado, por aplicação severa da regra da responsabilidade, a

escolher empregados mais esclarecidos e mais devotados ao interesse público.

Assim, tanto a responsabilidade do Estado por condutas comissivas quanto omissivas é

objetiva, sendo que, esta última, reveste-se de peculiaridade por ser imprescindível ficar

evidenciado, na situação concreta, o dever do Estado agir em virtude de lei, para que não seja

quebrado o nexo causal necessário para a sua responsabilização.

Do exposto, conclui-se que a distinção entre as duas teorias reside nos fundamentos

que as sustentam, devendo-se reconhecer que a responsabilidade do Estado por fatos

omissivos tanto poderá ser objetiva quanto subjetiva, dependendo da configuração do nexo

causal na hipótese concreta a ser levada à juízo.

Nesse sentido, pode-se dizer que a responsabilidade extracontratual do Estado por ato

omissivo será sempre objetiva, desde que, no caso específico, exista um dever legal de

cautela, e que diante desse dever, o Poder Público queda-se inerte, acarretando como

conseqüência dessa inobservância, lesão ou violação de direito ao administrado, ficando

assim configurado o elo causal entre a falta e o dano necessário para a responsabilização da

Administração Pública.

Em caso contrário, se não for comprovado que o Estado tinha, por força de lei, a

obrigação de ter agido de forma preventiva e positiva a fim de evitar o prejuízo que se

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verificou em razão de sua omissão, restará ao lesado apenas a alternativa de recorrer à teoria

subjetiva para que possa ser eventualmente ressarcido.

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CAPÍTULO II – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO

2.1 Responsabilidade Objetiva

Responsabilidade é a obrigação de reparar o dano causado a terceiro em conseqüência

de uma conduta ativa ou omissiva. O fundamento da responsabilidade é o dever do homem de

não prejudicar os demais, o neminem leadere dos romanos, áureo princípio que permanece

íntegro em matéria de responsabilidade, consoante a lição de AGUIAR DIAS.

A responsabilidade é uma categoria jurídica extensiva a todos os ramos do direito,

público e privado, mas alcançou o seu maior desenvolvimento numa das disciplinas

constitutivas deste último, o Direito Civil, de que um dos mais importantes institutos é a

responsabilidade civil. Consiste esta no dever imposto a quem infligiu dano a outrem, em

decorrência de violação de direito deste, de reparar o prejuízo, quer se causado pelo próprio

agente, por pessoa sob sua responsabilidade ou por fato de animal ou coisa sob sua guarda.

A responsabilidade civil pode ser contratual, quando originada de inadimplemento de

contrato, e extracontratual ou aquiliana, quando não há convenção entre as partes, mas resulta

do dever de a ninguém prejudicar. Há de atender a certos pressupostos, que são: fato

voluntário do agente, que tanto pode ser uma ação como uma omissão; imputabilidade ou

capacidade de discernimento do agente; ilicitude, que se revela pela prática por parte do

lesante de ato ou omissão violadores do dever de não prejudicar ou pelo descumprimento da

regra que impõe esse dever.

A ilicitude pressupõe: dolo, culpa ou risco, isto é, exposição dos demais a perigo em

proveito próprio (teoria objetiva); nexo causal entre a ilicitude e o prejuízo; dano, assim

considerado o resultado da ofensa feita por terceiro a um direito, patrimonial ou não, que

acarrete prejuízo ao ofendido, conferindo-lhe, em decorrência, a pretensão a uma indenização.

O dano pode ser patrimonial, quando passível de avaliação pecuniária, ou moral, quando

insuscetível de estimação dessa natureza.

2.2 Responsabilidade Objetiva do Estado

A responsabilidade civil do Estado, por atos comissivos ou omissivos de seus agentes,

é de natureza objetiva, isto é, prescinde da comprovação de culpa. Neste particular, houve

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uma evolução da responsabilidade civilística, que não prescinde da culpa subjetiva do agente,

para a responsabilidade pública, isto é, responsabilidade objetiva.

Esta teoria é a única compatível com a posição do Poder Público ante os seus súditos,

pois, o Estado dispõe de uma força infinitamente maior que o particular. Aquele, além de

privilégios e prerrogativas que o cidadão não possui, dispõe de toda uma infra-estrutura

material e pessoal para a movimentação da máquina judiciária e de órgãos que devam atuar na

apuração da verdade processual.

Se colocasse o cidadão em posição de igualdade com o Estado, em uma relação

jurídica processual, evidentemente, haveria um desequilíbrio de tal ordem que comprometeria

a correta distribuição da justiça.

A doutrina da responsabilidade objetiva do Estado comporta exame sob o ângulo de

três teorias objetivas: a teoria da culpa administrativa, a teoria do risco administrativo e a

teoria do risco integral, conforme preleciona Hely Lopes Meirelles. 5

Pela teoria da culpa administrativa a obrigação de o Estado indenizar decorre da

ausência objetiva do serviço público em si. Não se trata de culpa do agente público, mas de

culpa especial do Poder Público, caracterizada pela falta de serviço público. Cabe à vítima

comprovar a inexistência do serviço, seu mau funcionamento ou seu retardamento.

Representa o estágio de transição entre a doutrina da responsabilidade civilística e a

tese objetiva do risco administrativo.

Pela teoria do risco administrativo basta tão só o ato lesivo e injusto imputável à

Administração Pública. Não se indaga da culpa do Poder Público mesmo porque ela é inferida

do ato lesivo da Administração. Basta a comprovação pela vítima, do fato danoso e injusto

decorrente de ação ou omissão do agente público.

Essa teoria, como o próprio nome está a indicar, é fundada no risco que o Estado gera

para os administrados no cumprimento de suas finalidades que, em última análise, resume-se

na obtenção do bem comum.

Alguns membros da sociedade atingidos pela Administração Pública, no desempenho

regular de suas missões, são ressarcidos pelo regime da despesa pública, isto é, a sociedade

como um todo concorre para realização daquela despesa, representada pelo pagamento de

tributos.

5 Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo: Malheiros, 20ª ed., 1995, p. 556

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Daí porque, pode-se afirmar, o risco e a solidariedade fundamentam essa doutrina, que

vem sendo prestigiada, entre nós, desde a Carta Política de 1946. Ela se assenta exatamente na

substituição da responsabilidade individual do agente público pela responsabilidade genérica

da Administração Pública.

Cumpre lembrar, entretanto, que a dispensa de comprovação de culpa da

Administração pelo administrado não quer dizer que o Poder Público esteja proibido de

comprovar a culpa total ou parcial da vítima para excluir ou atenuar a indenização.

Finalmente, pela teoria do risco integral a Administração responde invariavelmente

pelo dano suportado por terceiro, ainda que decorrente de culpa exclusiva deste, ou, até

mesmo de dolo. É a exacerbação da teoria do risco administrativo que conduz ao abuso e à

iniquidade social, como bem lembrado por Hely Lopes Meirelles na obra retro citada.

Essa teoria jamais vincou na doutrina e na jurisprudência e por isso mesmo nunca foi

acolhida pelas diferentes Cartas Políticas de nosso país.

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CAPÍTULO III – A RESPONSABILIDADE SOB O ASPECTO DO

FUNCIONALISMO

3.1 A Responsabilidade Do Funcionário Público E de Agente

A expressão funcionário público, empregada pelas diversas Cartas Políticas, deve ser

interpretada em seu sentido mais amplo. Abarca, para fins de responsabilidade civil objetiva

do Estado, qualquer pessoa incumbida da execução de qualquer obra ou serviço público.

É sinônimo de agente administrativo ou agente público, isto é, todo aquele que presta

serviços à Administração Pública, direta ou indireta. Englobam, também, os agentes políticos

que são apenas os governantes e seus auxiliares diretos como os Ministros e Secretários das

diversas partes do Poder Executivo, bem como os membros de Poder.

Para efeito de responsabilização civil do Estado não importa que o agente público, que

praticou o ato ou a omissão administrativa, estivesse irregularmente investido no cargo ou na

função. O importante é que o dano causado a terceiro decorra da ação ou omissão do agente

público no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las.

De fato, é indiferente para a vítima o título pelo qual o causador do dano esteja

vinculado à entidade política. Outrossim, dano decorrente de abuso do agente público no

exercício de suas atribuições não exime o Estado da sua responsabilidade objetiva, antes a

agrava, pois caracteriza-se aí a culpa in eligendo.

3.2 O Sentido do § 6º Do Art. 37 da Constituição Federal

Desde a constituição de 1946 (art. 194) vem sendo adotada a teoria do risco

administrativo, combinada com princípio da ação regressiva. A carta política de 1988

estendeu, acertadamente, a responsabilidade objetiva do Estado às pessoas jurídicas de direito

privado, prestadoras de serviços públicos.

Outrossim, qualquer pessoa de direito público, nacional ou estrangeira, submeter-se á

ao preceito do § 6º do art. 37 da Carta Política.

O Estado responde objetivamente por dano causado por seu agente, em substituição à

responsabilidade deste, sem indagação de culpa. E o ônus financeiro da assumpção dessa

responsabilidade objetiva é suportado por toda sociedade, que provê os cofres públicos

através de tributos.

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Os tributos são pagos pelos cidadãos para propiciar ao Estado recursos financeiros

necessários ao cumprimento de suas atribuições, inclusive para indenizar os danos por ele

causados, a terceiros, no desempenho dessas atribuições. Daí a teoria do risco administrativo,

que fundamenta toda a doutrina da responsabilidade objetiva do Estado.

O prejudicado pela ação estatal sempre terá o direito à indenização a ser pleiteada

contra a Fazenda Pública ou contra a pessoa jurídica privada prestadora de serviço público a

que pertencer o agente causador do dano. A ação nunca é dirigida contra o agente público ou

de quem faz as suas vezes. Estes limitam-se a responder regressivamente em casos de dolo ou

culpa.

Para a caracterização do direito à indenização segundo a doutrina da responsabilidade

civil objetiva do Estado devem concorrer as seguintes condições:

A efetividade do dano. Deve existir concretamente o dano de natureza material ou

moral suportado pela vítima. Como se sabe, a Constituição Federal de 1988 consagrou,

expressamente, a indenização por dano moral, prescrevendo a inviolabilidade da intimidade,

da honra e da imagem das pessoas (art. 5º, V).

O nexo causal. Deve haver nexo de causalidade, isto é, uma relação de causa e efeito

entre a conduta do agente e o dano que se pretende reparar. Inexistindo o nexo causal, ainda

que haja prejuízo sofrido pelo credor não cabe cogitação de indenização. Por exemplo,

empresa concessionária de transporte coletivo urbano de passageiros emprega um motorista

não habilitado que, ao passar por uma ponte construída e mantida pelo D.E.R. vem a desabar.

Os passageiros sofrem ferimentos, mas nenhuma responsabilidade cabe à empresa de ônibus,

por que o dano não resultou daquela irregularidade de contratar motorista não habilitado. Só

para ter uma idéia da complexidade, na perfeita delimitação da responsabilidade ante a teoria

do nexo causal, imaginaremos um exemplo. O agente público municipal vistoria um prédio

novo e concede o habite-se, equivocadamente. Dois meses depois o prédio desaba. Em

conseqüência desse desabamento ocorreu um saque na empresa X, que perdeu elevada soma

de dinheiro destinado à compra de matéria prima para seu estabelecimento fabril, fato que,

provocou a falência da empresa X. Pergunta-se, o Poder Público, no caso, municipal,

responde por essa falência? No caso, sem falar da responsabilidade solidária das construtoras

e do engenheiro-responsável, nota-se a dificuldade na detectação da verdadeira causa do dano

em função das concausas sucessivas. O Código Civil, como se depreende do art.1060, nessa

matéria, adotou a teoria que exige a relação de causa e efeito, direta e imediata entre o dano e

a conduta do agente. Direto quer dizer aquilo que vem em linha reta, e imediato quer dizer

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sem intervalo. Assim, o Código Civil não agasalhou a teoria da equivalência das condições ou

da conditio sine qua non.

Oficialidade da atividade causal e lesiva imputável ao agente do Poder Público. A

responsabilidade civil objetiva do Estado, que é distinta da responsabilidade legal ou

contratual, decorre da conduta comissiva ou omissiva de seu agente no desempenho de suas

atribuições ou a pretexto de exercê-las. Indispensável que o agente pratique o ato no exercício

da função pública ou a pretexto de exercê-la, sendo juridicamente irrelevante se o ato é

praticado em caráter individual. Outrossim, já decidiu o Colendo STF que é irrelevante a

questão da licitude ou não do comportamento funcional do agente que tenha incorrido em

conduta omissiva ou comissiva, causadora do dano.6 Também, não tem, atualmente, menor

relevância jurídica a distinção outrora feita entre atos de gestão e atos de império para excluir

a responsabilidade do Estado em se tratando desses últimos. Essa divisão não se justifica,

porque uno é o Estado, descabendo a idéia de duas pessoas distintas: uma civil e outra

política. Aliás, quer o ato comissivo ou omissivo provenha do jus imperii ou do jus gestionis

sempre será uma forma de atuação do Estado. Daí a irrelevância proclamada pela

jurisprudência quanto a essa singular distinção doutrinária, que não se coaduna com o direito

positivo.7

Ausência de causas excludentes. A doutrina da responsabilidade objetiva adotada pela

Carta Política está fundada na teoria do risco administrativo e não na teoria do risco integral.

Por isso a responsabilidade do Estado não é absoluta. Ela cede na hipótese de força maior ou

de caso fortuito. Da mesma forma, não haverá responsabilidade do Estado em havendo culpa

exclusiva da vítima. No caso de culpa parcial da vítima impõe-se a redução da indenização

devida pelo Estado. 8

Resumindo, o Estado sempre responderá objetivamente pelo dano causado ao

administrado, por ação ou omissão de seus agentes, desde que injustamente causado.

O Estado, depois de ressarcida a vítima, promove a ação repressiva contra o agente

causador do dano, se houver culpa ou dolo deste.

A expressão utilizada pelo texto constitucional - nos casos de dolo ou culpa - para

legitimar a ação repressiva do Estado não deve ser entendida como afastamento da teoria da

responsabilidade objetiva como, equivocadamente, sustentavam alguns estudiosos. A

6 RTJ-99/1155; RTJ-91/377 7 RTJ-55/50 8 RDA-255/328; 259/149; 297/301; RT-54/336; 275/319

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existência do dolo ou da culpa é matéria que não diz respeito ao terceiro prejudicado pela

atuação estatal. É assunto que diz respeito exclusivamente ao relacionamento funcional do

agente com a entidade pública ou privada a que se acha vinculado. Verificado o dolo ou a

culpa cabe a fazenda pública promover a ação de regresso para recuperar de seu agente

causador do dano tudo aquilo que despendeu com a indenização da vítima.

É oportuno lembrar, ainda, que descabe a invocação de alguns julgados em que se

exigiam a prova de culpa da Administração em razão de uma situação singular, para

generalizar a tese a ponto de contrariar a doutrina da responsabilidade objetiva do Estado. É

preciso bem distinguir os danos causados por agentes públicos ou de quem façam as suas

vezes, de que cuida o texto constitucional, dos danos ocasionados por atos de terceiros ou por

fenômenos da natureza.

Nas hipóteses de depredações por multidões, de enchentes e vendavais que venham

provocar danos aos administrados, suplantando os serviços públicos existentes, são

imprecíndiveis a prova de culpa da Administração para legitimar a indenização.

Na recente inundação do túnel do Anhangabaú, por exemplo, onde dezenas de

veículos ficaram submersos, impõe-se a indagação de culpa da Administração Pública

Municipal. Até que ponto a omissão do órgão público (não acionamento das bombas ou seu

funcionamento deficiente e anormal) foi a causa eficiente da inundação ocorrida? Dado o

inusitado volume de águas qualquer ação do poder Público seria insuficiente para conter a

invasão do túnel pelas águas?

Nesse caso, se era previsível essa situação, não seria o caso de a autoridade

competente promover a oportuna interdição do túnel? São indagações que devem ser

analisadas e respondidas com segurança para definir a responsabilidade da Administração de

conformidade com os artigos 15 e 159 do Código Civil. Nesses casos, os danos não são

decorrentes diretamente da atuação ou omissão do agente público, o que refogem da hipótese

contemplada no § 6º do art.37 da Constituição Federal.

Em alguns casos especiais, embora inexistente uma relação direta de causa e efeito

entre a conduta do agente público e o resultado danoso, porque este foi provocado por

terceiro, a jurisprudência tem responsabilizado objetivamente o Estado. É o que aconteceu,

por exemplo, no julgamento do RE nº 109.615-2-RJ, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 2-8-96,

p. 25.785:

“O Poder Público, ao receber o estudante em qualquer dos estabelecimentos da rede oficial de ensino, assume o grave

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compromisso de velar pela preservação de sua integridade física, devendo empregar todos os meios necessários ao integral desempenho desse encargo jurídico, sob pena de incidir em responsabilidade civil pelos eventos lesivos ocasionados ao aluno. A obrigação governamental de preservar a intangibilidade física dos alunos, enquanto estes se encontrarem no recinto do estabelecimento escolar, constitui encargo indissociável do dever que incumbe ao Estado de dispensar proteção efetiva a todos os estudantes que se acharem sob a guarda imediata do Poder Público nos estabelecimentos oficiais de ensino. Descumprida essa obrigação, e vulnerada a integridade corporal do aluno, emerge a responsabilidade civil do Poder Público pelos danos causados a quem, no momento do fato lesivo, se achava sob a guarda, vigilância e proteção das autoridades e dos funcionários escolares, ressalvadas as situações que descaracterizam o nexo de causalidade material entre o evento danoso e a atividade estatal imputável aos agentes públicos".

Tratava-se, no caso de um ferimento causado em uma aluna de dez anos de idade por

uma colega, que portava uma agulha de injeção. A vítima veio sofrer perda total do globo

ocular direito, com deformidade traumática permanente e percentual incapacitatório para o

trabalho, de 75%.

Embora reconhecendo ausente qualquer parcela de responsabilidade da servidora

municipal (Professora da Escola pública) na eclosão do evento o V. acórdão entendeu

irrelevante essa circunstância, porque o Estado responde objetivamente pela falta dos recursos

necessários ao funcionamento regular e satisfatório dos estabelecimentos públicos de ensino.

Influiu no julgamento o fato de não ter sido prestado socorro imediato à vítima, bem

como, a demora da comunicação do evento aos pais da aluna vitimada. Esse mesmo acórdão

cita jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, versando sobre caso

análogo, RJTJSP-93/156:

“Ao receber o menor estudante, deixado no estabelecimento de ensino da rede oficial para as atividades de aprendizado, a entidade pública se investe no dever de preservar a sua integridade física, havendo de empregar, através dos mestres e demais servidores, a mais diligente vigilância para evitar qualquer conseqüência lesiva, que possa resultar do convívio escolar. E responde, no plano reparatório, se , durante a permanência no interior da unidade de ensino, o aluno vem, por efeito da inconsiderada atitude de colega, a sofrer a violência física, restando-se lesionado de forma irreversível.

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A responsabilidade, ai, é inerente à extensão dos cuidados exigidos para a custódia

do menor vitimado. E, com respeito ao ente estatal, se filia ao princípio consagrado no art.

107 da CR, configurando-se pela simples falha na garantia de incolumidade,

independentemente da culpa concreta de qualquer servidor".

O mesmo entendimento deve ser aplicado em relação aos prisioneiros vitimados por

companheiros de cela, no interior de estabelecimentos prisionais, a menos que se comprove a

culpa exclusiva das vítimas ou de terceiros. É dever do Estado manter a incolumidade física

da pessoa que se encontre sob sua custódia.

3.3 Responsabilidade por Atos Legislativos e Judiciais

Parte da doutrina defende a responsabilidade civil do Estado por atos legislativos,

quando se tratar de leis inconstitucionais. Seria indenizável o dano causado por lei

inconstitucional, porque, na realidade, o Estado não teria agido no exercício de sua função

legislativa.

Alguns doutrinadores não admitem a responsabilidade do Estado por atos legislativos,

porque a lei é uma norma geral e abstrata que atua sobre toda a coletividade.

Na hipótese excepcional de a lei inconstitucional atingir o particular uti singuli

causando-lhe dano injusto e reparável impõe-se a demonstração de culpa do Estado, através

da atuação de seus agentes políticos, o que, no dizer de Hely Lopes Meirelles, seria

indemonstrável no regime democrático, em que o próprio povo escolhe os representantes para

o Legislativo. 9

Na verdade o texto constitucional refere-se a danos causados por agentes do Poder

Público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadores de serviços públicos, fato que

envolve os atos dos legisladores que, como membros de Poder, não deixam de ser agentes

políticos. Não se deve esquecer que o texto constitucional emprega a palavra agente como

gênero de que são espécies os agentes administrativos e os agentes políticos. Aliás, a

jurisprudência do STF é no sentido da responsabilização civil do Estado por atos

legislativos.10

Quanto a responsabilidade do Estado em decorrência de atos do Poder Judiciário

nenhuma dúvida pode pairar a respeito.

9 Meirelles HL. Direito Administrativo Brasileiro. 16.ed. São Paulo: Ed.Revista dos Tribunais, 1991. 10 RTJ-140/636

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É de se repelir a doutrina que defende a tese da irresponsabilidade do Poder Público,

baseada no fato de que os juízes não são prepostos do Estado, mas atuam como órgão da

soberania nacional.

O que se impõe, no caso, é o afastamento da res judicata através da revisão ou da

rescisão do julgado. O direito à indenização por erro judiciário está expresso no art. 5º, inciso

LXXV da CF. A regra do art. 133 do CPC, segundo a qual, o juiz responderá por perdas e

danos em casos de culpa, dolo ou fraude, não pode ser entendida como excludente da

responsabilidade civil objetiva do Estado.

Aquela regra deve ser interpretada no sentido da responsabilização individual do

magistrado em ação de regresso visando o ressarcimento, pelo Estado, daquilo de despendeu

com a indenização da pessoa vitimada pela atuação jurisdicional anormal.

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CAPÍTULO IV– OS DANOS

4.1 Dano Moral e Material

Embora seja verdadeiro que o dano moral é, como disse, aquele suscetível de ser

aquilatado monetariamente, não esgota essa afirmação o seu conceito. As definições de dano

moral são divididas em dois grupos: as que adotam formulações negativas e as que adotam

formulações positivas.

Umas conceituam o dano moral de forma que ele seria todo dano extrapatrimonial.

Esta concepção, muito difundida e a que, em oportunidade anterior, aderi, sofre críticas

bastante fundadas. A primeira delas é a de que, para cobrar esse tipo de definições de valor

pleno, deve-se previamente sustentar que os entes ou coisas cujas características se pretende

determinar só admitem dois tipos de diversidade; de maneira que, não pertencendo um dos

elementos que se pretende classificar a um grupo, deve-se concluir automaticamente pela sua

inclusão no grupo oposto, quando é certo que pode existir uma espécie de dano que, não

sendo patrimonial, tampouco possa ser considerado moral.

A contraposição dano patrimonial - dano não patrimonial exauriria completamente o

campo do dano jurídico, no qual não poderia ter ingresso outro tipo de dano. E que este é

possível demonstra o fato de estar reconhecido na doutrina e sobretudo na jurisprudência da

Itália um tertium genus de dano: o dano biológico, ao lado do dano patrimonial e do dano

moral. O dano biológico é a lesão à integridade física ou psíquica do indivíduo, enquanto o

dano moral seria a conseqüência dessa lesão.

Devem ser desprezadas também, conquanto de formulação objetiva, as definições que

consideram dano moral o constrangimento sofrido por alguém por efeito de lesão de direito

personalíssimo, não obstante uma delas seja de autor tão categorizado como Orlando Gomes.

Isto excluiria do conceito de dano moral a lesão de direitos que não são personalíssimos, mas

podem constituir objeto de dano não patrimonial, tais os pertinentes a grupos humanos, como

a família e as pessoas jurídicas.

No conjunto de tais bens jurídicos ou relações jurídicas delimitam-se clara e

nitidamente dois setores perfeitamente identificados: por um lado, o formado pelos bens ou

relações de valor econômico, que se denomina patrimônio; por outro, aquele conjunto de bens

e direitos que configuram o âmbito puramente pessoal do titular da esfera jurídica (bens ou

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direitos da personalidade, direitos de família e sociais). O patrimônio determina o que a

pessoa tem e o âmbito pessoal o que a pessoa é".

Depois de outras considerações, define o dano moral - atendendo à natureza do seu

objeto e à consideração dele como efeito ou conseqüência perniciosa - nestes termos: "o

resultado prejudicial que tem por objeto a lesão ou menoscabo de algum dos bens ou direitos

correspondentes ao âmbito estritamente pessoal da esfera jurídica do sujeito de direito, que se

ressarcem por via satisfatória sob o critério eqüitativo do juiz". É assim compreendendo o

dano moral que falarei sobre a sua reparação no Direito do Trabalho.

Inspirado no Direito Romano consagra o Ordenamento Jurídico Pátrio o princípio da

responsabilidade civil, adotando a máxima “Neminem Laedere” (não lesar ninguém), por

força do qual resta obrigatória a reparação e/ou indenização de danos e prejuízos causados a

terceiros por parte do seu autor, regra que se encontra traduzida normativamente no artigo 5º,

incisos V e X, da Lex Mater nacional:

“Art. 5º. (...) Omissis V- é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem. X- são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.”(grifos nossos)

Ordinariamente, o Código Civil Brasileiro igualmente contempla a matéria, em seu

artigo 159, in verbis:

“Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.”

A compreensão da idéia genérica de dano não requer profundas incursões doutrinárias.

Entretanto, em sua acepção jurídica o termo adquire duplo significado, quais sejam, o dano

material e o moral.

A primeira espécie é regida pela teoria das perdas e danos, que compreende duas

ordens de lesões econômicas: os danos emergentes e os lucros cessantes.

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Os danos emergentes refletem-se no patrimônio do ofendido, gerando-lhe prejuízos

concretos e efetivos. Por seu turno, os lucros cessantes ou frustrados correspondem àqueles

que deixaram de ser auferidos pela vítima em decorrência do ato ilícito.

Neste mesmo diapasão, encontra ainda ampla sede no Direito Nacional a proteção ao

mais precioso bem da pessoa, a moral, encerra direitos integrantes da personalidade, como o

que atine a integridade física, liberdade e honorabilidade, os quais não podem ser

impunemente atingidos.

Impende notar que, mesmo antes da previsão deste direito no Texto Constitucional,

conforme expendido, já era possível visualizá-lo no arcabouço jurídico nativo. O Estatuto

Civilístico, no reportado dispositivo, não torna explícita a natureza da violação ou prejuízo de

que cuida, permitindo ao seu intérprete inferir a amplidão de seu teor, de modo a admitir a

existência de um patrimônio não palpável, suscetível de investida e merecedor de resguardo

estatal.

Adiante, o suprareferenciado diploma legal é mais incisivo e esclarecedor, acolhendo

tal elemento ao autorizar expressamente o ajuizamento de demandas que nele tenham

fundamento:

“Art. 76. Para propor, ou contestar uma ação, é necessário ter legítimo interesse econômico, ou moral”.

No entanto, se o dano moral, inclusive o puro, como realidade indenizável no Direito

brasileiro é questão já pacificada na doutrina e na jurisprudência, a definição de sua

verdadeira dimensão ainda perdura em sítio nebuloso naquelas orbes.

A moral tem sua preeminência manifesta na vida coletiva posto que, conforme leciona

o notável jurisconsulto Paulo Nader (Introdução ao Estudo do Direito, 6ª edição, Editora

Forense, página 39) “esta constitui um conjunto predominante de princípios e critérios que,

em cada sociedade e em cada época, orienta a conduta dos indivíduos. Socialmente, cada

pessoa procura agir em conformidade com as exigências da moral social, na certeza de que

seus atos serão julgados à luz desses princípios”. 11

Prestigiando esta ótica, o renomado Pedro Nunes exara sua conceituação, em seu

“Dicionário de Tecnologia Jurídica”, 12ª edição, Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1990, página

289: 11 NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito, 6ª edição, Editora Forense

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“DANO MORAL - É a lesão do patrimônio abstrato ou imaterial de alguém, que consiste num bem ético-jurídico-social: a liberdade, a honra, a dignidade pessoal, a boa fama, a consideração pública, o crédito, etc. A doutrina hodierna já admite a indenização do dano moral não só em certos delitos (injúria, calúnia, etc.), como em todos os atos ilícitos que possam produzir um agravo moral intenso. (...)”

Dessume-se dos magistérios supra a identificação do bem de índole moral com o

conceito de honra objetiva.

Para os adeptos dessa noção, o dano moral somente se perfaz com a efetiva maculação

da reputação do demisso, com a deterioração de seu conceito perante o seu círculo de

convivência.

Em realidade, no abalo de crédito, conquanto única a sua causa geradora, produzem-se

lesões indiscriminadoras ao patrimônio pessoal e material do ofendido, de modo a ensejar, se

ilícita aquela causa, uma indenização compreensiva de todo o prejuízo.”

A singular importância no meio social mantém-se intocada através do tempo, na

precisa observação do Professor Doutor João Casillo, em parecer de sua autoria publicado na

Revista dos Tribunais, ano 77-agosto de 1988-Volume 634, página 235:

Esta relevância não é gratuita, nem deriva do capricho do legislador. Ao contrário,

espelha uma tradição cultural de toda a humanidade, para alguns acima da própria vida, como

quis Juvenal: ‘Summum crede nefas animan praeferre pudori et propter vitam vivendi perdere

causas’ (‘Considera como maior infâmia preferir a vida à honra e, para salvar a vida, perder as

razões de viver’).”

Isso porque é com base na limpidez e retidão de seu modo de proceder que a pessoa,

física ou jurídica, adquire o respeito e a confiança de todos aqueles com os quais se relaciona.

Sua imagem pública consiste em inestimável, porém frágil, patrimônio, que deve, portanto,

ser perene e atenciosamente resguardado, sob pena de sofrer sumária devastação pelo

inclemente julgamento popular, cujas cruéis seqüelas costumam se revelar duradouras,

quando não irremediáveis.

Semelhante entendimento tem conduzido a convicção de parcela dos julgadores no

sentido de se limitar o reconhecimento da ocorrência de danos morais somente nas hipóteses

onde a boa fama do agredido tenha sido arranhada. O condão de gerar uma lesão de caráter

moral seria, pois, exclusividade da exposição da vítima à voz geral, aos comentários

depreciativos de seus pares, à repercussão deletéria do ato hostilizado, seja sobre suas relações

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próprias e habituais da vida prática com terceiros, seja sobre a opinião nutrida acerca de sua

pessoa pela comunidade onde vive.

4.2 A Reparação do Dano

A responsabilidade pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a

terceiros a que alude o texto constitucional é a de natureza civil, contrapondo-se à

responsabilidade criminal.

O Poder Público e suas concessionárias, permissionárias e autorizatárias respondem

por perdas e danos por ação ou omissão de seus agentes, de conformidade com a teoria do

risco administrativo, isto é, sem indagação de culpa.

Assim, não se encontra totalmente recepcionado pelo Texto Magno o art. 15 do

Código Civil que assim prescreve:

Art.15 As pessoas jurídicas de Direito Público são civilmente responsáveis por atos dos seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros, procedendo de modo contrário ao Direito ou faltando a dever prescrito por lei, salvo o direito regressivo contra os causadores de dano.

A expressão civilmente responsáveis empregada no texto do art.15 é indicativa da

indenização por perdas e danos para bem separar da responsabilidade penal, que só pode ser

pessoal do agente Esse artigo 15, no início, suscitou acirradas discussões doutrinárias e

jurisprudenciais quanto ao acolhimento da teoria subjetivista ou da teoria objetivista.

Entretanto, mais tarde, prevaleceu o entendimento no sentido de que o citado dispositivo ter

perfilhado a teoria da culpa, até que a Constituição Federal de 1946, em seu artigo 194, veio

acolher, expressamente, a teoria objetiva do risco administrativo. O conteúdo da indenização é

matéria regulada pelo Código Civil.

Logo, essa responsabilização civil deve abranger o dano emergente e os lucros

cessantes, conforme artigos 1059 a 1061 do Código Civil. Indeniza-se o credor do dano

efetivamente verificado, isto é, a diminuição do patrimônio sofrido pelo credor, bem como, a

privação de um ganho que deixou de auferir ou de que foi privado o referido credor, em razão

do comportamento comissivo ou omissivo do agente público ou daquele que faz as suas

vezes.

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Por isso o texto do art. 1059 do CC refere-se às perdas e danos e ao que razoavelmente

deixou de lucrar. Esta última expressão está a exigir bases seguras e fundadas para a

indenização dos lucros cessantes. Não são indenizáveis os lucros imaginários, sob pena de

propiciar locupletamento ilícito ao credor. Outrossim, a indenização deve abranger os juros

moratórios, os honorários advocatícios arbitrados pelo juiz, bem como, a atualização

monetária, segundo pronunciamento pacífico de nossos tribunais.

Finalmente, a indenização não se limita aos danos materiais. Por expressa disposição

do inciso V do art. 5º da Constituição Federal abrange os danos de natureza moral. A maior

dificuldade quanto a estes últimas está na fixação do quantum da indenização à vista de

ausências de normas para aferição objetiva desses danos. Entretanto, pouco a pouco, doutrina

e jurisprudência estão construindo parâmetros adequados para esse tipo de indenização,

levando-se em conta a gravidade do dano moral infringido, a formação da vítima, a

quantificação do dano material e a situação patrimonial do ofensor, esta última inaplicável em

relação ao Estado.

Uma vez promovida a liquidação da sentença fixadora da indenização na forma do art.

603 e seguintes do Código de Processo Civil, mediante apresentação, pelo credor, da memória

de cálculo, é promovida a citação da Fazenda Pública para opor embargos no prazo de dez

dias, sob pena de expedição de precatório judicial pelo presidente do Tribunal que proferiu a

decisão exeqüenda (art. 730 do CPC).

O precatório entregue até o dia 1º de julho terá o seu valor atualizado até essa data

para ser incluído no orçamento do exercício seguinte, a fim de ser pago até o final desse

exercício, dentro da rigorosa ordem cronológica de sua apresentação (art. 110 e § 1º da CF). O

credor preterido em seu direito de preferência pode requer o seqüestro da quantia necessária à

satisfação do débito (§ 2º do art. 100 da CF).

Como normalmente essas indenizações têm caráter alimentar não se sujeitam a ordem

cronoloógica de apresentação de precatórios. De fato, o art. 100 da CF exclui os créditos de

natureza alimentícia do procedimento aí previsto. Ocorre que, se houver vários credores de

natureza alimentícia e não dispondo a Fazenda Pública de recursos financeiros para pagar a

todos de uma só vez, o princípio da moralidade pública impede de favorecer este ou aquele

credor.

Impõe-se, nessa hipótese, a instituição de ordem cronológica específica para os

credores da espécie. A não-inclusão no orçamento de verba necessária ao pagamento de

débitos tempestivamente apresentados, bem como, a não-satisfação desses débitos, até o final

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do prazo, em virtude de desvio da respectiva dotação orçamentária, configuram, em tese,

crimes de responsabilidade, conforme artigos 12, nº 4, e 10, nº 4, c.c. art. 11, nº 1 da Lei nº

1.079, de 10-4-1950, respectivamente. Finalmente, o não cumprimento do precatório judicial

no prazo assinalado na Carta Política pode ensejar a intervenção federal no Estado-membro e

intervenção estadual no Município, por desobediência à ordem ou decisão judiciária,

conforme prescrevem, respectivamente, os artigos 34, VI e 35, IV da CF.

4.3 Breve Notícia Histórica Sobre O Problema Da Reparação Dos Danos No Direito

Brasileiro

A abordagem do tema que estamos desenvolvendo não se realizou antes de

promulgada a Constituição Federal de 1988 porque até então estava aferrada a jurisprudência,

principalmente do Supremo Tribunal Federal, à tese da irreparabilidade do dano moral,

segundo a qual a dor não tem preço.

A jurisprudência, entretanto, consolidou-se no sentido de que o dano moral só era

indenizável quando fosse indireto, ou, em outras palavras, quando resultasse de dano

patrimonial, o que não era reparar o dano moral e sim o dano patrimonial com ele cumulado.

Fora disto somente admitia a reparação do dano moral quando expressamente autorizada em

lei, como nos casos excepcionais da Lei de Imprensa e do Código de Telecomunicações. O

fundamento para a reparação do dano moral se encontra realmente nos artigos do Código

Civil, nº 76, consoante o qual para propor, ou contestar uma ação, é necessário ter legítimo

interesse econômico, ou moral, e 159, em cuja conformidade aquele que, por ação ou omissão

voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem, fica

obrigado a reparar o dano.

Embora achando que não se encontra no Código Civil brasileiro preceito consagrador

da responsabilidade por dano moral, à conclusão de que se tratava de lacuna cujo

preenchimento era imperioso, para atualização de nossa lei civil, tanto mais necessária quando

procedem os argumentos invocados pelos partidários da responsabilidade.

A reforma viria, não como preconizado, através do Código Civil e sim de fonte de

direito de hierarquia mais alta, a Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, incisos V e X.

O primeiro preceito garante aos brasileiros e estrangeiros residentes no país "o direito de

resposta, proporcional ao agravo, além de indenização por dano material, moral ou à

imagem". O segundo, mais abrangente, declara "invioláveis a intimidade, a vida privada, a

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imagem e a honra das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou

moral decorrente de sua violação".

4.4 Meios Preventivos

Uma regra de experiência ensina que é melhor prevenir do que remediar. Tem ela

plena aplicação ao dano moral, cujos efeitos prejudiciais dificilmente são apagados de todo

pela reparação, sendo, portanto, da maior conveniência evitá-lo. Alguns autores, sustentam

que, por isso mesmo, o trabalhador ameaçado de sofrer um dano moral está legitimado para

recorrer à autodefesa privada, recusando-se a cumprir sua obrigação.

Assim, esclarecemos pode se negar a submeter-se a revista ou qualquer outro vexame

que afete sua dignidade pessoal ou não comparecer ao local de trabalho ou até recorrer à força

no exercício do direito de legítima defesa para evitar que o dano se produza quando exista um

perigo atual ou iminente.

Tal medida seria legítima se cumpridos os requisitos a que a subordina a doutrina:

agressão ilegítima, necessidade racional do meio empregado para a defesa e falta de

provocação por parte do que usa os meios de autodefesa.

Outra solução seria uma ação judicial para solicitar que determine o magistrado à

outra parte se abstenha de praticar o ato ou omissão atentatório à dignidade do postulante.

Esta situação pode se apresentar a respeito da difusão pública (qualquer que seja o veículo

utilizado: boletins, informes, listas negras), sem que haja uma causa que o legitime, na qual se

comunicam fatos e circunstâncias que afetam o direito da personalidade do trabalhador ou da

outra parte, ainda quando fossem certos, mas sem que exista razão legítima para sua difusão.

4.5 Ônus da Prova

Falando sobre o ônus da prova do dano moral, sustentamos que sobre a vítima desse

dano pesa o ônus de prová-lo em sua existência e gravidade, mas acrescenta que essa prova

pode ser produzida mediante presunções hominis extraídas de indícios, conforme as regras da

experiência.

Mas impede presumir (porque isto concorda com as regras da experiência) a dor dos

ascendentes, descendentes e cônjuge, o complexo de inferioridade do mutilado, o descrédito

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derivado da difamação. Muitos autores, porém, acham que a prova do dano moral se faz in re

ipsa.

4.6 Cumulação das Indenizações por Dano Patrimonial e por Dano Moral

Prevalece na doutrina brasileira o entendimento de que, sendo autônomos o dano

patrimonial e o dano moral, podem ser cumuladas as indenizações ressarcitórias de um e

outro, ainda que resultantes do mesmo fato. Não cabe considerar que são incompatíveis os

pedidos de reparação patrimonial e indenização por dano moral. O fato gerador pode ser o

mesmo, porém o efeito pode ser múltiplo. A própria jurisprudência se cristalizou neste sentido

na Súmula 37 do Superior Tribunal de Justiça, deste teor: “São cumuláveis as indenizações

por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato".

4.7 Avaliação do Dano

Parece-nos que esse problema pode ser solucionado recorrendo-se à aplicação

subsidiária do art. 1553 do Código Civil, na conformidade do qual nos casos não previstos no

capítulo II - Da liqüidação das obrigações resultantes de atos ilícitos - fixar-se-á por

arbitramento a indenização. O abuso de direito é também ato ilícito, como resulta da

interpretação a contrario sensu do art. 152, n. II do Código Civil, que declara não serem

ilícitos os atos praticados no exercício regular de um direito reconhecido. Logo, são ilícitos os

atos praticados no exercício irregular ou anormal de um direito, como os abusivos.

A indenização por dano moral não é o preço da dor (pretium doloris ou pecunis

doloris), que nenhum dinheiro paga.

A dificuldade para determinar com exatidão o montante do dano moral sofrido

efetivamente pela vítima é superada pelo arbítrio discricionário do juiz. Mas se bem seja feita

referência de forma reiterada ao prudente arbítrio do juiz para fixar o quantum ressarcitório,

nem tudo fica entregue à sua discricionariedade, já que tanto a doutrina como a jurisprudência

assinalaram que existe elementos objetivos que devem ser tomados em conta para graduar o

montante da indenização. Por exemplo, se foram produzidas lesões físicas considera-se a

importância das mesmas, a extensão do período de recuperação da vítima, o caráter doloroso

das lesões, os tratamentos que teve de suportar, as sequelas, o caráter permanente do dano

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moral, etc... No caso de injúrias toma-se em conta o lugar onde elas foram produzidas e a

publicidade.

De todos os modos, mesmo utilizando-se os referidos critérios objetivos, a

determinação final do prejuízo fica sujeita ao arbítrio do juiz. Levam-se em conta ainda outros

fatores, como personalidade, sexo e idade da vítima. Deve-se a vítima receber uma soma que

lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo às circunstâncias de

cada caso, e tendo em vista as posses do ofensor e a situação pessoal do ofendido. Nem tão

grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne

inexpressiva. As más condições do ofensor, todavia, não o eximem do dever ressarcitório.

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CAPÍTULO V - DAS DECISÕES

RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO

CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA

IMPROCEDENTE

Num. Processo 120.924-1

Acórdão do STF

RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 120.924-1 - SP

Primeira Turma (DJ, 27.08.1993)

Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves

Recorrente: Valte de Oliveira

Recorrido: Estado de São Paulo

EMENTA: - Responsabilidade objetiva do Estado. Ocorrência de culpa exclusiva da vítima.-

Esta Corte tem admitido que a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito

público seja reduzida ou excluída conforme haja culpa concorrente do particular ou tenha

sido este o exclusivo culpado (Ag 113.722-3-AgRg e RE 113.587).

- No caso, tendo o acórdão recorrido, com base na análise dos elementos probatórios cujo

reexame não é admissível em recurso extraordinário, decidido que ocorreu culpa exclusiva

da vítima, inexistente a responsabilidade civil da pessoa jurídica de direito público, pois foi a

vítima que deu causa ao infortúnio, o que afasta, sem dúvida, o nexo de causalidade entre a

ação e a omissão e o dano, no tocante ao ora recorrido.

Recurso extraordinário não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do

Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas,

por unanimidade de votos, em não conhecer do recurso.

Brasília, 25 de maio de 1993.

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MOREIRA ALVES, Presidente e Relator.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO MOREIRA ALVES: - É este o teor do acórdão recorrido (fls. 275/276):

"Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 106.646-1, da Comarca

de SÃO PAULO, em que é apelante VALTE DE OLIVEIRA, sendo apelada a FAZENDA DO

ESTADO DE SÃO PAULO.

Trata-se de recurso de autor objetivando a reforma da r. sentença de fls. 245/9, que

julgou improcedente a ação indenizatória que propôs contra a Fazenda pelo atropelamento e

morte de sua esposa por viatura policial, que teria ultrapassado sinal vermelho da Rua

Senador Vergueiro, em São Bernardo do Campo.

A r. sentença concluiu pela improcedência diante da prova testemunhal corroboradora

da contestação, que alegou culpa exclusiva da vítima, a qual não respeitou o sinal, que lhe era

contrário.

O recurso sustenta que em face da responsabilidade objetiva há o dever de indenizar e

mais que o reexame da prova leva à culpa do motorista da viatura.

Houve resposta.

É o relatório.

À evidência a responsabilidade objetiva não implica em indenizar qualquer dano, posto que

comprovada a total isenção de culpa da Administração inexiste o pressuposto para

responder.

A orientação doutrinária e jurisprudencial nesse sentido é uniforme.

A prova é clara e uníssona no sentido da culpa exclusiva da vítima, com exceção da

testemunha JOSÉ AGRIPINO TAVARES (fls. 34/6), que, todavia, não explicou a razão da

mudança da versão que dera no processo administrativo (fls. 60).

A par de tal prova ser de testemunha única, tem-se que aparenta ser claramente de favor.

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Todos outros depoimentos quer na fase administrativa, como na judicial, são claros,

coerentes e coincidentes.

Só o de tal testemunha discrepa e tem-se que é contraditório.

A improcedência é a conclusão lógica e decorrente dos fatos.

Isto posto,

ACORDAM, em Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça, por votação unânime, em

negar provimento ao recurso."Interposto recurso extraordinário, foi ele admitido por este

despacho (fls. 288/289):

Trata-se de ação ordinária de indenização proposta contra a Fazenda do Estado de São

Paulo, objetivando indenização por morte causada por viatura policial.

A ação foi julgada improcedente em primeiro grau, sendo a decisão confirmada por

acórdão unânime da Egrégia Primeira Câmara Civil deste Tribunal.

Inconformado, recorre extraordinariamente o autor, com fundamento no artigo 102,

inciso III, letra "a", da Constituição Federal.

Impugnação a fls. 284/286.

O recurso merece prosperar porque não se trata apenas de reexame de questão de fato,

como pretende a Fazenda do Estado.

Discute-se, isto sim, o alcance real do dispositivo constitucional que estabelece a

chamada responsabilidade objetiva do Estado.

O tema foi prequestionado, tendo a Câmara Julgadora afirmado a tese de que "a

responsabilidade objetiva não implica em indenizar qualquer dano, posto que comprovada a

total isenção de culpa da Administração " (fls. 275).

Deve, assim, ser processada a inconformidade para que a questão seja decidida pela

Colenda Suprema Corte.

Diante do exposto, defiro o processamento do recurso extraordinário interposto."

A fls. 307/311, assim se manifesta a Procuradoria-Geral da República, em parecer da

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Dra. Anadyr de Mendonça Rodrigues:

O Recurso extraordinário foi interposto em 10 de fevereiro de 1989, dizendo-se

fundamentado exclusivamente na alínea "a" do art. 101, III, da Carta de 1988 e fazendo

alegação de ofensa aos artigos 107, parágrafo único, da Emenda nº 1, de 1969, e 37,

parágrafo 6º, da vigente Carta Magna, e foi admitido na origem (fls. 188/189).

2. Eis o v. acórdão recorrido:

À evidência a responsabilidade objetiva não implica indenizar qualquer dano, posto que

comprovada a total isenção de culpa da Administração inexiste o pressuposto para

responder.

A orientação doutrinária e jurisprudencial nesse sentido é uniforme. A prova é clara e

uníssona no sentido da culpa exclusiva da vítima, com exceção da testemunha JOSÉ

AGRIPINO TAVARES (fls. 34/6), que, todavia, não explicou a razão da mudança da versão

que dera no processo administrativo (fls. 60).

A par de tal prova ser de testemunha única, tem-se que aparenta ser claramente de favor.

Todos os outros elementos quer na fase administrativa, como na judicial, são claros,

coerentes e coincidentes.

Só o de tal testemunha discrepa e tem-se que é contraditório.

A improcedência é a conclusão lógica e decorrente dos fatos." (fls. 275/276)

3. O recurso extraordinário, por sua vez, assim se sustenta:

“A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de Direito Público é objetiva, ou seja,

independe da prova de culpa ou dolo, quando seus servidores causarem danos a terceiros, no

exercício de sua função”.

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A respeito do art. 107, da Constituição Federal, o ilustre constitucionalista, MANOEL

GONÇALVES FERREIRA FILHO, em sua obra, Comentários à Constituição Brasileira, 5ª

Edição, 1984, teceu as seguintes considerações:

A responsabilidade objetiva do Estado.

Mantém-se na Constituição vigente, a solução adotada na Constituição de 1946

(Artigo 194), ou seja, a responsabilidade, dita objetiva do Estado por danos causados no

exercício de função Pública a particulares. Em face desse princípio, quem sofreu o dano, para

haver do Estado a reparação desse dano, apenas deve provar ter sido ele causado no exercício

da função pública. A reparação prescinde de prova de culpa ou dolo por parte do causador,

depende exclusivamente, de estar este no exercício de função pública.

Esta solução é de justiça social, visa reparar de modo eqüitativo os encargos sociais. O

custo do serviço público, no qual se inclui o dano causado a particulares, deve ser repartido

por todos. Se a vítima do dano arcasse com este ou tivesse de comprovar a culpa ou dolo para

vê-lo ressarcido, estaria suportando mais do que sua parte, como integrante da comunidade.

Note-se que funcionário público, no texto em exegese, abrange todo aquele que exerce função

pública, ou seja, a que título for. Abrange, portanto, os servidores do regime especial nos

termos do artigo 106, os eventualmente sujeitos ao regime trabalhista, etc.

Assim é que, o parágrafo 6º, do artigo 37, da Constituição Federal vigente, deixa claro

o seguinte:

Permanece a responsabilidade da pessoa jurídica de Direito Público, principalmente

aos danos causados por seus funcionários a terceiros, no exercício de suas funções, exigindo-

se, apenas, a prova da culpa ou do dolo, para assegurar o direito de regresso.

Isto significa que, realmente a pessoa jurídica de Direito Público, deve provar a culpa

ou dolo do servidor, quando pretender obter regressivamente deste, o que pagou a título de

indenização.

A responsabilidade civil objetiva do Estado é tranqüilamente aceita pela maioria dos

administrativistas, e para excluí-la, somente a culpa exclusiva da vítima, e, no presente caso,

não fora comprovada a culpa da mesma, eis que agiu com a devida cautela.

Além do mais, faz-se mister ressaltar que o próprio Supremo Tribunal Federal, adotou

o entendimento agora mencionado e conforme se segue:

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"A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público, não depende da prova de culpa, exigindo apenas a realidade do prejuízo injusto" (RTJ 47/378 - RF 169/137)." (fls. 280/282)

4. Tudo posto, não merece conhecimento o recurso extraordinário.

5. É que a culpa da vítima do dano - exclusiva ou concorrente - constitui, conforme o caso,

fator excludente ou mitigador da responsabilidade civil do Estado.

6. Trata-se de entendimento que essa Excelsa Corte há muito consagra, do que são meros

exemplos os seguintes vv. arestos:

“Responsabilidade civil de pessoa jurídica de direito público (autarquia) (Departamento de

Estradas de Rodagem do Estado de São Paulo) (art. 107 da C.F.), litisdenunciada pela ré, em

ação indenizatória por colisão de veículos em rodovia estadual”.

A responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito público (no caso litisdenunciada)

pode e deve ser reduzida, se houver culpa concorrente da demandante (ré-litisdenunciante, na

hipótese).

Acórdão que assim decide, com base na prova dos autos (Súmula 279), não viola o artigo 107

da C.F.

Precedentes da Corte. (Ag. 113.722-3-AgRg-SP, Rel. Min. Sydney Sanches, in DJ de

20.03.87, p. 4.600, destaques nossos)

“A responsabilidade civil do Estado, responsabilidade objetiva, com base no risco administrativo, que admite pesquisa em torno da culpa do particular, para o fim de abrandar ou mesmo excluir a responsabilidade estatal, ocorre, em síntese, diante dos seguintes requisitos: a) nexo causal entre o dano e a ação administrativa”. (RE 113.587-5-SP, Rel. Min. Carlos Velloso, in DJ de 3.4.92, pág.4.292, destaques nossos)

7. Ocorrendo culpa EXCLUSIVA do particular que sofreu o dano - como, in hoc casu,

decidiu o E. Tribunal a quo, ao abrigo da Súmula 279 -, deixa de existir o imprescindível nexo

CAUSAL justificador da atribuição da responsabilidade civil ao Estado.

8. O parecer é, por conseguinte, de que o recurso extraordinário não comporta conhecimento."

É o relatório.

VOTO

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O Sr. MINISTRO MOREIRA ALVES (Relator):

1. Como bem demonstra o parecer da Procuradoria-Geral da República, esta Corte tem

admitido que a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito público seja reduzida

ou excluída conforme haja culpa concorrente do particular ou tenha sido este o exclusivo

culpado (Ag. 113.722-3-AgRg e RE 113.587).

No caso, tendo o acórdão recorrido, com base na análise dos elementos probatórios cujo

reexame não é admissível em recurso extraordinário, decidido que ocorreu culpa exclusiva da

vítima, inexiste a responsabilidade civil da pessoa jurídica de direito público, pois foi a vítima

que deu causa ao infortúnio, o que afasta, sem dúvida, o nexo de causalidade entre a ação e a

omissão e o dano, no tocante ao ora recorrido.

2. Em face do exposto, não conheço do presente recurso extraordinário.

EXTRATO DE ATA

RE n. 120.924-1 - SP

Relator: Min. Moreira Alves.

Recte.: Valte de Oliveira.

Advs.: Rogerio da Silva Gonçalves e outros.

Recdo.: Estado de São Paulo.

Advs.: Mirna Cianci e outros.

Decisão: A Turma não conheceu do recurso extraordinário, nos termos do voto do Relator.

Unânime. 1ª Turma, 25-05-93.

Presidência do Senhor Ministro Moreira Alves.

Presentes à sessão os Senhores Ministros Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e Ilmar

Galvão. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Sydney Sanches.

Subprocurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza.

Ricardo Dias Duarte, Secretário.

RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO

ENCHENTES - TRANSBORDAMENTO DE CÓRREGOS

Num. Processo 153.680-1/89

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - Enchentes.

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Transbordamento de córrego. Insuficiência da seção de vazão. Obras de canalização não

concluídas. Demora. Ineficiência da administração municipal. Indenização apurada em

perícia. Obrigatoriedade do ressarcimento com base nesta. Ação julgada improcedente.

Decisão reformada. A responsabilidade da Municipalidade ré deflui de sua ineficiência

administrativa, demorando na realização das obras necessárias e, assim, permitindo que as

inundações se repetissem. Tanto assim é que, concluída a canalização, cessaram os

desbordamentos.

Acordam, em 5ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça, por votação unânime, negar provimento

aos agravos retidos e prover à apelação.

Ação de ressarcimento de danos, provocados por inundações do córrego Pirajussara, quando

da ocorrência de chuvas, aforada por proprietários, de imóveis localizados em vias públicas

próximas, invadidos pelas águas, em face da Municipalidade de São Paulo. A r. sentença, de

relatório adotado, julgou-a improcedente, condenando os autores no pagamento das custas e

despesas processuais, além de honorários advocatícios, arbitrados em 10% do valor da causa,

verbas atualizadas na forma da lei.

Apelaram os autores, pleiteando a reforma integral. Reiteraram agravo retido (fls.).

Resposta da ré, também requerida a apreciação de agravo retido (fls.). Preparo anotado.

Encaminhados os autos ao eg. 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, a col. 3ª Câmara os

remeteu a esta Corte (ven. acórdão, fls.).

É o relatório.

Os agravos ficam improvidos.

O deduzido pelos apelados foi interposto contra decisão, que indeferiu pedido de

inquirição da única testemunha ouvida em audiência, frente às falhas ocorridas quando da

estenotipia e, posteriormente, de sua transcrição.

Verifica-se, porém, pela própria impugnação (fls.), que, apesar da ocorrência de erros,

estes não se referem a aspectos fundamentais do testemunho, mas a palavras ou expressões

isoladas, de molde a permitir o conhecimento de seu inteiro significado. Não há indicativo de

que a transcrição esteja errada (fls.), motivo pelo qual a decisão, que indeferiu a pretensão à

nova tomada do depoimento, merece prevalecer.

Há, ainda, outro agravo retido, este interposto pela Municipalidade ré (fls.) e

direcionado à reforma do saneador, na parte em que repeliu a prejudicial de mérito, atinente à

prescrição, cujo prazo, conforme a agravante, já estaria consumado de acordo com o art. 1º do

Decreto-Lei n.º 20.910, de 6.1.30. Postulando os autores indenização dos danos que teriam

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sido causados em fevereiro/82, em decorrência de inundações provocadas pelo córrego

Pirajussara e havendo proposto a ação em 4.1.88, citada a Municipalidade em 19, dos mesmos

mês e ano, deixaram fluir lapso superior a cinco anos. Prescrito estaria o direito da ação.

O saneador repeliu a preliminar, argumentando que a medida cautelar intentada teve o

condão de interromper o prazo prescricional, eis que a vistoria se mostrava indispensável à

elucidação de determinados fatos, especialmente a apuração das verdadeiras causas da

enchente que possibilitariam o correto endereçamento da ação principal. E salientou o

julgador, na oportunidade, que a medida cautelar foi aforada imediatamente após as

inundações e que os autores propuseram a ação principal logo em seguida ao despacho

homologatório do exame pericial.

Em razões de agravo, a Municipalidade de São Paulo afronta ser irrelevante o

fundamento do saneador, porque a vistoria não é peça indispensável para a propositura da

ação, uma vez que os autores poderiam requerê-la concomitantemente com a propositura da

ação ou propor, desde logo, a ação e, no desenrolar do processo, realizar a vistoria.

Invoca a Súmula 154 do STF. No caso, todavia, como bem acentuado pelo magistrado,

o processo cautelar assumiu conotação de medida preparatória de ação.

Sem ele, ou seja, ausente a perícia técnica, não seria possível concluir pela origem do

fato inundação, pelo nexo causal e também pela extensão dos prejuízos. De muito, assim,

superado o caráter preventivo da medida.

Aliás, consta expressamente da inicial da cautelar (fls.) que seu ajuizamento se destina

a instruir oportuna ação de indenização contra a requerida, tendo sido proposta antes que se

torne impossível e mais difícil a apuração dos prejuízos (RTJ 114/1228 e RT 599/257 -

julgados referidos por Theotonio Negrão, Código de Processo Civil e Legislação Processual

em Vigor, p. 187, 21ª ed., Revista dos Tribunais).

A apelação

O laudo pericial (fls. do apenso), subscrito pelo perito e assistentes técnicos, assinala

que os contínuos transbordamentos do córrego Pirajussara ocorreram, porque em função da

precipitação pluviométrica, a seção de vazão mostrou-se insuficiente (fls.). Ressaltaram,

também, que, embora não tivessem obtido o índice pluviométrico do dia 6.2.82, poder-se-ia

concluir que foi anormal (fls.).

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Afirmaram, também, que as obras de canalização o mencionado córrego, iniciadas em

1979, com o emprego de técnicas avançadas, como é o caso das paredes-diafragma, não

contribuíram para as inundações, já que "este processo executivo permite a concretagem das

paredes laterais do canal sem necessidade de desvio ou obstrução do curso d'água natural"

(fls.).

Apesar das considerações do laudo, a responsabilidade da Municipalidade de São

Paulo não pode ser afastada. As enchentes, em razão do transbordamento do córrego

Pirajussara começaram por volta do ano de 1976, sendo a do referido dia 6.2.82 a de maior

volume. Nessa época, ainda estava em curso a canalização do córrego. E a inundação

aconteceu, assim, exatamente porque a obra ainda não havia terminado.

Conforme José de Aguiar Dias, de três ordens são os fatos identificáveis como falta no

serviço público, conforme resultem: de mau funcionamento do serviço, do não-funcionamento

do serviço, do tardio funcionamento do serviço (Da Responsabilidade Civil, t. II, p. 611,

Forense, 1960).

Avulta essa derradeira hipótese: a lentidão administrativa a caracterizar o

descumprimento da obrigação do Poder Público e, dessa forma, provocando dano ao

particular.

Cabe realçar, doutro turno, que o fato inundação era perfeitamente previsível, porque

já vinha se sucedendo há vários anos, sem que a Municipalidade providenciasse a construção

de um canal com seção bastante para comportar o curso das águas, aumentado em face das

chuvas.

Há que ter presente, outrossim, a ponderação dos peritos de que a seção de vazão

mostrou-se insuficiente, em virtude da precipitação pluviométrica e daí a enchente (fls.). Ora,

tal revela que, ao menos no estágio em que se encontrava, a obra ainda não proporcionava

condições necessárias para conter a quantidade de líquido proveniente da chuva, mormente

durante os meses em que esse fenômeno é comum em São Paulo, como janeiro e fevereiro.

De tudo resulta que a responsabilidade da Municipalidade ré deflui de sua ineficiência

administrativa, demorando na realização das obras necessárias e, assim, permitindo que as

inundações se repetissem. Tanto assim é que, concluída a canalização, cessaram os

desbordamentos.

Não prospera o argumento de que as moradias dos autores se situavam próximas ao

leito d'água, no mesmo nível e, portanto, quando construídas, estes sabiam que estavam

sujeitas a serem atingidas pelas inundações.

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Contudo, as edificações são anteriores ao ano de 1976, quando sucederam os primeiros

transbordamentos do córrego. Em segundo, mesmo que as construções fossem posteriores às

inundações, tal não libera a Municipalidade da obrigação de indenizar os prejuízos, pois

"deveria obstar qualquer edificação na região, negando licença ou exigindo requisitos de

segurança específicos; licenciando a edificação, deve suportar os prejuízos que a eficiência

dos serviços públicos vem acarretando" (ver acórdão da 3ª CCv do eg. TJSP, RT 544/93,

citado por Yussef Said Cahali, Responsabilidade Civil do Estado, p. 166, Revista dos

Tribunais, 1982).

De anotar, igualmente, e de molde a afastar a alegada força maior, não haver prova

segura, nos autos, de que a precipitação atmosférica do dia 6.2.82 tenha sido excepcional,

acima do índice de normalidade. O posicionamento dos técnicos a respeito mostra-se

meramente opinativo, sem qualquer sustento e destituído de certeza (cf. fls.). A pretendida

desoneração da Municipalidade, com esse fundamento, não prevalece. Fixado o nexo causal e

a responsabilidade do Poder Público pelos danos, só resta a estimativa destes.

No que tange aos imóveis, ficam excluídos da indenização os autores C. M. e O. J. R.,

por haverem obtido, via de cobertura securitária, a recomposição de suas casas (fls.). Inclusive

a indenização, quanto a eles, já ficou restrita, unicamente, aos bens móveis, na oportunidade

do saneador, irrecorrido, nesse tópico.

O quantum dos danos causados às residências dos demais demandantes foi,

corretamente, estabelecido no laudo (fls.), no item avaliação dos danos.

No atinente aos móveis, merece ser aceita a crítica do assistente técnico da

Municipalidade, que excluiu aqueles em que possível concluir não terem sido atingidos pelas

águas, ou aqueles passíveis de recuperação, cujas despesas, para esse fim, não foram

comprovadas. Em suma, prevalecem, já que os danos não se presumem, mas devem ser

comprovados, os valores expressos como correspondentes ao conjunto dos bens inutilizados

(fls.).

Pelo exposto a Turma Julgadora dá provimento à apelação, para julgar procedente a

demanda, condenada a Municipalidade de São Paulo a indenizar, com relação a depreciação

das construções, os autores E. S. C., em Cr$ 1.369.473,00, J. C. N. V., em Cr$ 548.471,00, e

J. M., em Cr$ 687.765,00, montantes corrigidos monetariamente, desde a data do laudo,

agosto/83.

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Com referência aos bens móveis, a condenação da ré é para ressarcir os autores E. S.

C. em Cz$ 74.848,00, C. M. em Cz$ 55.075,00, J. C. N. V. em Cz$ 61.181,00, J. M. em Cz$

25.504,00 e O. J. R. em Cz$ 60.354,00, quantias atualizadas a partir de novembro/86.

A Municipalidade, também, fica condenada a solver os juros da mora, contados da

citação, custas em reembolso, salários do perito e assistentes técnicos, e honorários de

advogados, de 15% sobre o total do débito.

Em suma, a Turma Julgadora nega provimento aos agravos retidos e provê a apelação.

São Paulo, 21 de novembro de 1991

Marcus Andrade, presidente e relator.

(Ap. 153.680-1/89 RT 690/61,)

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CONCLUSÕES

Assim, em sede de responsabilidade objetiva do Estado, tem se sustentado serem

aplicáveis em nosso sistema jurídico tanto a teoria objetiva (risco administrativo) quanto a

teoria subjetiva da culpa anônima, sendo esta última reservada aos atos omissivos. Ocorre,

entretanto, que a partir da leitura da Constituição Federal, não há como, de um ponto de vista

eminentemente técnico, sustentar-se a responsabilidade subjetiva, mesmo que a culpa seja

anônima (falta do serviço).

De fato, dispondo o art. 37, § 6o da CF que “As pessoas jurídicas de direito público e

as de direito privado prestadoras de serviço público responderão pelos danos que seus

agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros(...)”, resta evidente que o dever do Estado de

indenizar surge independentemente de culpa ou dolo, seja em face de condutas comissivas

seja em face de omissões. Aliás, a própria ressalva feita pela CF quanto ao direito de regresso

contra o agente, em que deverá ser verificada a culpa ou dolo, está a confirmar que em face da

Administração não se levará em conta qualquer aspecto subjetivo da conduta do agente ou

mesmo da regularidade da prestação do serviço (culpa anônima da administração). Daí não

decorre, entretanto, que a Administração Pública deva assumir um dever geral de indenizar,

sendo responsável por qualquer fato ou ato, comissivo ou omissivo no qual esteja envolvida,

direta ou indiretamente.

Afirmar-se que a responsabilidade do estado, em face da Constituição é sempre

objetiva, mesmo em face de atos omissivos, não implica em advogar-se a teoria do risco

integral, vez que ainda assim seria necessária a comprovação, por parte do lesado, da

existência de dano e de nexo causal. Creio que é justamente neste ponto que residem as

maiores dificuldade para o correto enquadramento da teoria da responsabilidade objetiva.

É que no mais das vezes, ao tratar do nexo causal em sede de atos omissivos, têm os

operadores do direito utilizado-se de elementos das ciências naturais, em que impera o

princípio da causalidade, expresso por postulados do tipo “se ‘A’ é, então ‘B’ é ”.

Daí a afirmação freqüente de que a omissão nada pode causar, que fundamenta a teoria

da aplicação da responsabilidade subjetiva às omissões. A rigor, entretanto, o nexo funcional

que necessita ser comprovado para a configuração da responsabilidade Estatal não deve ser

pesquisado com base em princípios das ciências naturais.

Não há, portanto, que se falar em aplicação da teoria da responsabilidade subjetiva em

relação aos atos omissivos, vez que nada impede, a priori, que o Estado venha a ser

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responsabilizado por suas omissões independentemente de verificação de culpa do agente ou

de culpa administrativa.

Formulada nestes termos, entretanto, pode a afirmação da responsabilidade objetiva do

estado dar margens a abusos e iniqüidades, pelo que é necessário tornar claro quais os limites

à imputação da lesão a um ato omissivo do estado. Neste sentido, tenho que pode ser de

extrema importância a utilização da teoria da imputação objetiva, que atualmente vem

ganhando corpo no âmbito do Direito penal como um limite à configuração do nexo causal.

Entre a conduta do agente e o resultado.

Segundo os partidários desta teoria, a imputação da responsabilidade por um dado

evento lesivo deve necessariamente ter em conta o estado atual de desenvolvimento alcançado

pela sociedade concreta, de modo que, em face da multiplicidade de fatores aptos a serem

considerados como “causa” do dano, deve ser selecionado aquele que, em face do caso

concreto e das expectativas sociais, objetivamente consideradas, atue como fonte de risco

determinante.

É preciso ter em conta que numa sociedade de massas como a nossa, a infinidade de

contatos anônimos que se estabelecem diariamente entre os indivíduos e grupos sociais (aí se

incluindo o próprio Estado como partícipe) somente é possível se aceitarmos a possibilidade

da ocorrência de alguns danos. A dizer, se tentássemos evitar a ocorrência de todo e qualquer

dano, fatalmente estaríamos decretando a paralisação da vida social. Assim, tem-se que a

sociedade depende, para sua própria existência, da pré-determinação de quais papéis serão

vividos pelos diferentes sujeitos sociais. O Direito atua, assim, prevendo expectativas de

comportamentos.

Assim, no âmbito da teoria da imputação objetiva: Imputam-se os desvios a respeito

daquelas expectativas que se referem a um portador de um papel. Não são decisivas as

capacidades de quem atua, mas as capacidades de um portador de um papel, referindo-se a

denominação papel a um sistema de posições definidas de modo normativo, ocupado por

indivíduos intercambiáveis. Trata-se, portanto, de uma instituição que se orienta com base

nas pessoas.

Em resumo, tem-se que todos os sujeitos que vivem em sociedade (inclusive o Estado)

estão na condição de portadores de um papel, e somente quando violação deste papel for

determinante para a produção do evento lesivo é que este pode ser imputado ao sujeito,

devendo a verificação da adequação da conduta às expectativas ser feita de modo objetivo,

isto é, de acordo como grau de desenvolvimento de uma determinada sociedade. Assim, por

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exemplo, imagine-se uma hipótese em que fosse descoberto que um medicamente largamente

utilizado há vários anos, tendo sido aprovado pela agência governamental responsável pela

liberação do uso de medicamentos, pudesse causar, a longo prazo, efeitos nocivos à saúde.

Uma omissão da agência em, após a descoberta, proibir a comercialização do

medicamento, seria causa de responsabilidade do estado. O fato de ter erroneamente

autorizado a comercialização antes da descoberta, entretanto, não torna o Estado responsável

por eventuais danos, vez que a liberação teria ocorrido de acordo com as normas técnicas e

científicas até então aceitas, e não é exigível que um medicamente somente seja liberado para

uso pela população quando for absolutamente comprovada a inexistência de qualquer risco,

sob pena de impedir-se os avanços da farmacologia e dos tratamentos médicos.

Assim, ainda que se pudesse falar em culpa da administração, não haveria, nesta

hipótese qualquer violação ao papel desempenhado pelo Estado, que, de acordo com o

conhecimento científico existente à época, liberou o medicamento. Objetivamente, então, os

danos provocados pela liberação do medicamento não seriam imputáveis ao estado.

Há, portanto, um espaço de risco permitido no atuar dos atores sociais que é

determinado pelo desenvolvimento da sociedade em concreto, já que não faz parte do papel de

ninguém (nem mesmo do Estado) a eliminação total de todos os riscos ínsitos à vida social.

Ademais, é de se ter claro que também funciona como limite à imputação objetiva de danos o

princípio da confiança: numa sociedade complexa, a divisão do trabalho e a especialização

das funções exige que em suas interações, os atores sociais possam confiar uns nos outros, ou

seja, não faz parte do papel de ninguém controlar permanentemente todos os demais.

Ao cumprir seu papel, assim, deve o sujeito confiar que os demais atores sociais

também cumprirão o seu, de modo que inexistindo violação do papel por parte do Estado, não

pode ele ser responsabilizado pelo descumprimento de outrem.

Outro limite à imputação objetiva de danos é o relativo à proibição de regresso, pelo

qual a prática de um ato que invariavelmente é inofensivo, ainda que este ato seja utilizado

por outrem numa atividade lesiva, não enseja responsabilidade. Assim, por exemplo, se um

ladrão utiliza um transporte público para transportar o produto de seu roubo, não pode a

concessionária deste serviço ser responsabilizada pelo dano causado pelo ladrão, ainda que

este tivesse contado com o serviço público para conseguir seu intento. Cabe ainda referir à

responsabilidade exclusiva da vítima do dano como forma de exclusão da imputação, vez que

nesta hipótese, sendo o atuar da vítima o fator determinante para a produção do dano, não

cabe falar-se em responsabilidade do Estado.

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Assim, e em resumo, tem-se que a responsabilidade civil do Estado, tanto por atos

comissivos quanto por atos omissivos, independe da pesquisa acerca de culpa ou dolo do

agente ou da ocorrência da culpa anônima da Administração, critérios claramente violadores

da Constituição.

A responsabilidade do estado exsurge sempre que, comprovada a existência de um

dano a um particular, este dano for objetivamente imputável ao Estado, isto é, sempre que o

dano for conseqüência da violação do papel destinado ao Estado nas relações sociais, podendo

ser a imputação excluída sempre que o dano estiver dentro dos limites do risco permitido,

quando for possível aplicar-se o princípio da confiança, quando o ato, por si só, for

invariavelmente inapto a causar danos ou quando a própria vítima for responsável pelo dano.

Revele-se, por fim, que tais princípios, de forma mais ou menos explícita, vêm sendo

constantemente acolhidos pela doutrina e pela jurisprudência, apenas sendo justificados com

base em construções teóricas que não se enquadram adequadamente no sistema jurídico-

positivo brasileiro, como a teoria da faute de service, por exemplo. Assim, a linha de idéias

aqui defendida, longe de pretender modificar o entendimento dominante em nossos tribunais,

visa tão somente a buscar uma melhor fundamentação da responsabilidade (e principalmente

da exclusão da responsabilidade) do Estado por atos omissivos, conciliando os dispositivos

constitucionais com os reclamos de justiça.

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