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D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V OR E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L D O E S T A D O
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
Em termos de evolução histórica, a responsabilidade
civil da Administração, no mundo ocidental, surgiu a partir da Idade
Média.
Inicialmente, o Estado não era responsável por
qualquer dano. Essa idéia da irresponsabilidade do Estado adveio de
diversas teorias que justificavam o poder do Estado na figura do
Rei. Essas teorias são denominadas de TEORIAS DA DIVINDIDADE. O
senhor absoluto – rei – recebia o poder de Deus, por isso não
poderiam ser atribuídos erros a ele e ao Estado, muito menos
quaisquer responsabilidades deles decorrentes.
O rei era o representante de Deus e, por isso, não
errava. Contudo, essa idéia passou a evoluir para reconhecer que,
na realidade, o rei atuava através de agentes que não recebiam o
poder divino e por isso poderiam ser responsabilizados pessoalmente.
Sustenta-se que o Estado e o funcionário eram
sujeitos diferentes, pelo que este último não obrigava a
Administração.
Com a difusão de novas idéias, a teoria que
justificava o poder absoluto nas mãos do réu foi ultrapassada. Com o
iluminismo, firmou-se a idéia liberal, de igualdade. O particular
respondia por suas atividades, por isso a Administração deveria
também responder tal qual o particular.
Essa perspectiva de responsabilidade da
Administração surgiu dentro da idéia de culpa, sendo que daí
nasceram algumas correntes mencionando que se a responsabilidade do
Estado surgia a partir de uma concepção de igualdade, ele só poderia
ser responsabilizado quando atuasse como particular e não quando
atuava como Estado.
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D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V OR E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L D O E S T A D O
Para alguns, a responsabilidade culposa do Estado
só poderia decorrer da atuação deste como particular, ou seja, pelos
atos de gestão por ele praticados. Já quanto aos atos de império, o
Estado não poderia ser responsabilizado.
Outros doutrinadores já defendiam que a
responsabilidade culposa da Administração deveria se dar sem
distinção do tipo de atuação do Estado. Ela estaria presente seja
quando o Estado atuasse como Estado, seja quando atuasse como
particular. Essa concepção passou a prevalecer, sendo que, para
que Administração pudesse ser responsabilizada era necessário que o
agente fosse identificado e que ficasse comprovada a sua culpa.1
Essa teoria predominou até meados do século XIX.
Nessa época, aconteceu o caso de um cidadão francês, que sofreu uma
lesão quando saía de uma agência de postagem. Não foi possível, ao
cidadão, determinar o agente que havia sido responsável pelo dano,
mas ele conseguiu demonstrar que os danos por ele sofridos haviam
decorrido da atuação de agentes da Administração.
O Conselho Administrativo Francês reconheceu, nessa
hipótese, a culpa da Administração, firmando a tese da CULPA
ANÔNIMA, surgindo daí a idéia da culpa da Administração desprendida
da identificação do agente.
A partir de tal caso, surgiu a Teoria da
Responsabilidade Culposa da Administração por Falta ou Falha do
Serviço. Alguns autores identificam a expressão CULPA ANÔNIMA com
falta ou falha do serviço.
A falta ou falha da Administração é uma idéia de
culpa própria da Administração, que é diversa da culpa do
particular. A responsabilidade própria da Administração por falta
ou falha de seu serviço está presente quando éa possível identificar
que a Administração não havia obrado com a devida cautela, deixando
de observar o aparato de que poderia dispor para evitar o evento
danoso.1 Teoria do Órgão – o órgão não é um quid distinto do ente, senão que se identifica com este. O órgão supõe a existência de uma só pessoa do Estado, razão pela qual o dano causado ao particular imputa-se diretamente à pessoa jurídica de cuja organização faz parte o funcionário causador do dano (Yussef Said Cahali - Responsabilidade Civil do Estado)
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Ex. Doente que se dirige ao hospital público para recebimento de tratamento médico e que
morre porque não estava disponível o remédio
apropriado. A responsabilidade da Administração
decorre da falta e falha do serviço, porque o
hospital deveria estar adequadamente aparelhado
para conferir todos os tratamentos possíveis.
A culpa da Administração, então, a partir de meados
do século XIX, começou a ser orientada por essa idéia de falta ou
falha do serviço. A culpa anônima ou a falta de serviço, geradora
de responsabilidade do Estado, não está necessariamente ligada à
idéia de falta de algum agente determinado, sendo dispensável a
prova de que funcionários nominalmente especificados tenha incorrido
em culpa.
Segundo Sergio Cavalieri Filho, a responsabilidade
por falta de serviço, falha do serviço ou culpa do serviço, seja
qual for a tradução que se dê à fórmula francês faute du service,
não é, de modo algum, modalidade de responsabilidade objetiva, mas
subjetiva, porque baseada na culpa do serviço diluído na sua
organização, assumindo feição anônima ou impessoal.2
Com o advento de novas concepções teóricas,
trazendo a idéia de fraternidade, ou seja, de uma dimensão social da
atuação da Administração, passou a ser reconhecida a
responsabilidade objetiva do Estado. Isto porque se o Estado atua
em benefício de todos nós, todos têm que assumir e repartir os ônus
dessa responsabilidade. Essa é a idéia da responsabilidade
desprendida da culpa e até mesmo da falta ou falha da Administração,
importando na responsabilidade objetiva.
Essa posição foi alcançada com base nos princípios
da eqüidade e igualdade de ônus e encargos sociais. Se a atividade
administrativa do Estado é exercida em prol da coletividade, se traz
2 Sergio Cavalieri Filho – Programa de Responsabilidade Civil – pág. 160
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benefícios para todos, justo é, também, que todos respondam pelos
seus ônus, a serem custeados pelos impostos.3
Há duas teorias justificando a responsabilidade
objetiva: Teoria do Risco Administrativo e Teoria do Risco Integral.
Pela Teoria do Risco Administrativo, não há
necessidade de demonstração da culpa da Administração para exigir
sua responsabilidade. O prejudicado deve, apenas, comprovar a
ocorrência do dano e o nexo causal entre este e a atuação da
Administração.
Responde o Estado porque causou dano ao seu
administrado, simplesmente porque há relação de causalidade entre a
atividade administrativa e o dano sofrido pelo particular. Toda
lesão sofrida pelo particular deve ser ressarcida, independentemente
de culpa do agente público que a causou. O que se tem que verificar
é, apenas, a relação de causalidade entre a ação administrativa e o
dano sofrido pelo administrado.
A Administração se eximirá da sua responsabilização
se comprovar a inexistência do nexo causal, ou que os danos
decorreram por culpa exclusiva da vítima, por caso fortuito ou força
maior ou, ainda, por fato de terceiro absolutamente independente.
Se o Estado, por seus agentes, não deu causa a esse dano, se
inexiste relação de causa e efeito entre a atividade administrativa
e a lesão, não terá lugar a aplicação da teoria do risco
administrativo e, por via de conseqüência, o Poder Público não
poderá ser responsabilizado.
Já a Teoria do Risco Integral não admite as
excludentes de responsabilidade da Administração. Para ela, o
prejudicado deve demonstrar o dano e o nexo causal com a atuação da
Administração, sendo vedada a esta a possibilidade de se eximir de
sua responsabilidade por conta da culpa exclusiva da vítima, de caso
fortuito ou força maior, ou por fato independente de terceiro.
3 Sergio Cavalieri Filho – Programa de Responsabilidade Civil – pág. 161
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No Brasil, o primeiro texto constitucional (1824),
não previa a responsabilização da Administração, mas tão somente a
dos agentes. Ainda no Brasil Império, foi reconhecida a
responsabilidade culposa da Administração e não apenas de seus
agentes, responsabilidade essa que refletiu no art. 15 do Código
Civil de 1916. A Constituição de 1891 não tratou da
responsabilidade objetiva, apenas da subjetiva.
O primeiro dispositivo legal que tratou
especificamente da responsabilidade civil do Estado foi o artigo 15
do Código Civil:
Art . 15 (CCV). As pe ssoas ju r íd i cas de d i re i to púb l i co são c i v i lmen te responsáve i s po r a tos dos seus rep resen tan tes que nessa qua l idade causa re m danos a t e rce i ros , p roce de ndo de modo cont rá r i o ao D i re i to ou fa l tando a dever pre sc r i t o po r l e i , sa l vo o d i re i to reg ress ivo con t ra os causadores do dano.
A responsabilidade objetiva da Administração foi
reconhecida, pela primeira vez, na Constituição de 1946 (art. 194),
idéia essa que foi repetida nas Constituições de 1967 (art. 107),
1969 e finalmente na de 1988, que positivou o tema no art. 37, §6º:
Art . 37, §6º (CR ’88 ) . As pe ssoas j u r í d i cas de d i re i t o púb l i co e as de d i re i t o p r i vado p res tadores de se rv i ços púb l i cos responderão pe los danos que seus agen te s , nessa qua l i dade , causa rem a te rce i ros , as segurado o d i re i to de reg resso con t ra o responsáve l nos casos de do lo ou cu lpa .
Houve uma modificação da redação da constituição
atual para a redação anterior, positivada nas Constituições de 1969;
1967 e 1946. Nestes textos constitucionais, estava expresso que a
Administração Pública era responsável pelos danos que seus
funcionários causassem a terceiros.
Havia divergência na doutrina quanto a
responsabilidade dos delegatários. Alguns sustentavam que estes
respondiam por culpa, enquanto outros defendiam, de forma
minoritária, que os delegatários atuavam como Administração e,
portanto, sua responsabilidade era objetiva.
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Atualmente não há mais essa divergência, porque o
texto constitucional estabelece de forma expressa a responsabilidade
objetiva dos delegatários.
O texto atual não menciona mais a expressão
funcionário, substituindo-a por agente. O termo funcionário é
utilizado para identificar o agente que tem um vínculo estatutário
com a Administração, daí porque, na realidade, é uma expressão
estrita.
Já o termo agente abrange toda e qualquer pessoa que venha a prestar uma atividade pública em nome da Administração,
seja estatutário ou celetista, remunerado ou não. A
responsabilidade do Estado subsistirá ainda que se trate de ato
praticado por servidor contratado, funcionário de fato ou
temporário, qualquer que seja a forma de escolha ou investidura.
A primeira discussão acerca do tema é saber se o
termo correto é Responsabilidade Civil da Administração ou se é a expressão Responsabilidade Civil do Estado.
Alguns defendem que é mais correta a expressão
Responsabilidade Civil do Estado, mas são combatidos porque que
outros autores sustentam que a responsabilidade civil objetiva pode
ser atribuída a pessoas distintas do Estado, como os delegatários,
sendo melhor a utilização do termo Responsabilidade Civil da
Administração. Quanto a essa expressão, a primeira corrente
sustenta que a Administração não personifica ninguém, sendo uma
expressão genérica, vaga, porque a Administração não tem
personalidade jurídica, sendo denotativa de órgãos, figuras.
Contudo, essa discussão é irrelevante e não tem qualquer conteúdo
prático.
As pessoas abrangidas pela expressão “As pe ssoas ju r íd i cas de d i re i to púb l i co e as de d i re i to p r i vado p res tadores de se rv i ços púb l i cos”
são:
União, Estados, Municípios, Distrito Federal, autarquias, que
são as pessoas jurídicas de direito público;
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sociedades de economia mista e empresas públicas, sendo que,
nesse ponto, alguns acham que somente devem ser incluídas as
que prestam serviços públicos, por conta da segunda parte do
texto – pessoas ju r í d i cas de d i re i to p r i vado , p res tadoras de se rv i ços
púb l i cos. Uma segunda corrente sustenta que as empresas públicas
e sociedades de economia mista interventoras no domínio
econômico também estão abrangidas nessa disposição, porque deve
ser feita uma interpretação racional, lógica da vontade do
dispositivo constitucional, porque essa disposição quanto às
pessoas jurídicas de direito privado foi incluída não para
afastar a responsabilidade das empresas públicas e sociedades
de economia mista interventoras no domínio econômico, mas sim
para deixar evidente a responsabilidade objetiva dos
delegatários. Há uma tendência de se seguir a primeira
corrente, mas isso não quer dizer que ela seja majoritária.
pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço
público. As pessoas delegatárias respondem objetivamente,
contudo, essa responsabilidade objetiva se prende à atividade delegada – isso já foi objeto de pergunta na Magistratura
Estadual. Elas responderão objetivamente apenas no âmbito das
atividades recebidas por delegação. Se tais empresas vierem a
causar um dano a alguém por força de atividades que não guardam
relação com as delegadas, sua responsabilidade será subjetiva,
nos termos da legislação civil.
O texto constitucional apresenta uma expressão de
grande relevância: “As pessoas j u r íd i cas de d i re i t o púb l i co e as de d i re i to p r i vado p re s tadore s de se rv i ços púb l i cos responderão pe los danos que seus agen te s , nessa
qual idade , causa re m a t e rce i ros” . Essa expressão indica que a
Administração será responsabilizada pela atuação de seus agentes em
razão da TEORIA DA IMPUTAÇÃO. Quem está atuando é a Administração e
não o agente.
Agir na qualidade de agente não representa,
necessariamente, estar no legítimo exercício.
Exemplos:
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(1) Policial federal, durante seu trabalho,
causa um dano a alguém por conta de sua
conduta. Nessa hipótese, a União será chamada
a responder, porque o policial é um agente e
estará atuando na qualidade de agente.
(2) Policial federal, em dia de folga, trabalha como segurança em um clube. Há um tumulto e o
policial, porque é segurança, causa um dano a
alguém. A União não será responsabilizada pelo
dano porque não há um agente atuando na
qualidade de agente.
(3) Policial federal, em dia de folga, trabalha como segurança em um clube. Há um tumulto e o
policial, identificando-se como policial, puxa
uma arma da corporação e causa um dano a
alguém. A União será responsabilizada pelo
dano porque o agente estará atuando na
qualidade de agente. A partir da
identificação, o policial passou a se valer da
qualidade de agente público para impor a sua
autoridade. Não se pode confundir atuar na
qualidade com agir no exercício. São coisas
distintas. O texto constitucional exige a
conduta na qualidade de agente. Ou seja, há um aproveitamento da condição de ser agente,
aproveitando-se dos meios conferidos pela
Administração à pessoa.
(4) Policial federal aposenta-se. Contudo,
mesmo aposentado sai em diligência para ajudar
seus colegas e causa danos a alguém. A posição
majoritária, quase unânime, é no sentido de
responsabilizar a Administração nessa hipótese.
São duas linhas de raciocínio distintas: a
primeira linha é no sentido de que, apesar de o
policial estar desligado da Administração, se
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sua atuação foi aceita porque havia
necessidade, ele deve ser visto como agente de
fato necessário e a responsabilidade da
Administração decorreria dessa condição. Sua
atuação se deu com a aceitação da
Administração, por isso deve ser
responsabilizada porque houve uma atuação de um
agente de fato. A segunda linha de raciocínio
se dirige à conclusão de que a Administração
deu causa imediata ao dano ao permitir que uma
pessoa externa a seus quadros viesse a atuar e
a praticar a conduta danosa. Para aqueles que
admitem apenas essa segunda colocação, a
responsabilidade da Administração não decorre
da atuação de um agente de fato, mas sim da sua
conduta de aceitar que uma pessoa estranha
atuasse naquelas condições.
Há, ainda, uma segunda corrente, minoritária,
que sustenta que o policial não é um agente, e
por isso não estaria atuando nessa qualidade,
daí porque a Administração não poderia ser
responsabilizada.
(5) Traficantes furtam material da polícia
civil (carteiras, coletes e armas) e fingem
fazer uma blitz, acabando por causar danos a
terceiros. A Administração não pode ser
responsabilizada nesse caso, porque não há
conduta de qualquer agente, como exige o art.
37, §6º, da CR’88. Não se pode sequer falar de
agente de fato nessa hipótese.
Assim, para que a Administração seja
responsabilizada, é necessário que o agente, ao causar o dano, atue
na qualidade de agente, não sendo exigido, entretanto, que esteja no
exercício da função.
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Pólo passivo da ação
Pelo teor do §6º, do art. 37, da CR’88, as pessoas
jurídicas responderão pelos danos. A questão é: pode o lesado optar
entre ajuizar a ação em face da Administração ou em face do agente,
ou em face de ambos?
Essa questão não é pacífica. Alguns como Hely
Lopes Meirelles, Maria Sylvia Di Pietro e Yussef Said Cahali
entendem que a ação deve ser proposta em face da Administração, tão
somente. O lesado não pode ajuizar a ação em face do agente,
porque o dispositivo constitucional estabelece que a
responsabilidade é da Administração e não do agente.
OBSERVAÇÃO: Art. 122, da Lei 8112/91 – Estatuto do Servidor Público da União.
A posição acima não é a mais seguida no âmbito da
jurisprudência. Na doutrina, Celso Antônio Bandeira de Mello,
seguindo seu pai, Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, são contrários a
essa tese. A jurisprudência, especialmente no STF, tem vários
julgados no sentido de que o lesado pode optar entre ajuizar a ação
em face da Administração, ou do Agente ou até mesmo em face de
ambos.
Isto porque a disposição constitucional não
estabelece de forma clara que a ação só poderia ser proposta em face
da Administração. Além disso, esse dispositivo constitucional traz
a responsabilidade objetiva de forma a impor uma maior garantia ao
cidadão. Seu objetivo é estabelecer uma maior perspectiva de
recebimento da reparação e não causar um entrave a isto. O texto
constitucional não retira a responsabilidade do agente, apenas a
coloca no plano da subjetividade. Essa segunda orientação observa
que se aquele que se viu lesado pretender ajuizar a ação em face do
agente, ele terá que demonstrar o dolo ou culpa deste último. Já,
se a ação for proposta em face da Administração, a responsabilidade
será objetiva, sem necessidade de demonstração do dolo ou culpa.
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Aparentemente, seria mais adequado, então, ajuizar
a ação somente em face da Administração, posto que desnecessária a
comprovação do dolo ou culpa. Entretanto, o recebimento da
reparação mediante o sistema de precatório acarreta um entrave à
celeridade do processo, daí porque, para a vítima, às vezes é mais
adequada a propositura da ação em face do agente, pois receberá a
indenização à vista.
Recentemente, apesar de o STF já ter proferido
decisões no sentido de ser possível o ajuizamento de ação em face da
Administração ou do agente, foi proferido um voto em ação de
reparação movida contra Magistrado, inadmitindo a possibilidade de
ajuizamento da ação em face do agente e declarando ser necessário
que a Administração seja demandada (RE 228.977 – ementa ao final).
O prazo prescricional para que se possa mover uma
ação de responsabilidade em face da Administração é estabelecido
pelo Dec. 20910/32 – prazo qüinqüenal.
Mas se a vítima quiser ajuizar a ação em face do
funcionário, o prazo prescricional se regulará pelo artigo 177 do
Código Civil, ou seja, de 20 anos.
Com o Novo Código Civil, o prazo passará de três
anos, conforme disposto no artigo 206, §6º, V. Carlos Gonçalves de
Oliveira sustenta que, com a entrada em vigor do Novo Código Civil,
esse prazo de 03 anos deverá se estender à Administração.
Concorrência de Causas
O art. 37, §6º, adotou a Teoria do Risco
Administrativo, podendo a Administração se defender alegando
ausência do nexo em virtude de culpa exclusiva da vítima, de
terceiro ou caso fortuito e força maior. Nessa linha, surge o
questionamento quanto à possibilidade de a Administração, sem
excluir sua responsabilidade, tentar atenua-la com o argumento de
concorrência de culpa.
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Alguns autores sustentam que não é possível esse
tipo de alegação por parte da Administração porque a
responsabilidade desta é objetiva. Assim, ou a Administração
responderá pelos danos, ou não responderá por culpa exclusiva da
vítima.
Essa posição não é seguida pelo STF e nem pela
maioria da doutrina. Sergio Cavalieri Filho e Yussef Said Cahali
observam que a Administração pode minorar sua responsabilidade, mas
não seria tecnicamente correto se falar em concorrência de culpas,
mas sim concorrência de causas. O enfoque seria dado na causa, no
nexo causal. Para tais autores, se a conduta da Administração
concorresse com a conduta da vítima para ensejar a ocorrência do
nexo causal, é evidente que, nessa hipótese, deve haver uma
“repartição” desses ônus, de forma a diminuir a imposição da
responsabilidade à Administração4.
Inegavelmente, não há nada que obste esse
entendimento. A lei não estabelece a impossibilidade de se apurar,
também, a conduta da vítima para tentar diminuir a responsabilidade
da Administração.
Ação Regressiva contra o Agente
O art. 37, §6º, da CR’88, em sua parte final,
estabelece que a Administração poderá ajuizar uma ação de regresso
em face do agente, na hipótese de este ter obrado com culpa ou dolo.
O regresso é uma faculdade ou é uma obrigação da
Administração? Está a Administração obrigada a ajuizar a ação
contra o agente?
Essa questão é muito importante, pois se está
diante da aplicação do princípio da indisponibilidade do interesse
público, daí porque a Administração não tem a disponibilidade de
optar pelo ajuizamento ou não da ação. Assim, a Administração está
4 Segundo Sergio Cavalieri, “havendo concorrência de causas, a responsabilidade do Poder Público deverá ser atenuada ou circunscrita ao dano efetivamente causado pela atividade administrativa” – Programa de Responsabilidade Civil – pág. 167
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obrigada a ajuizar a ação regressiva, não podendo deixar de faze-lo,
pois, ao contrário, estaria violando o princípio em questão.
Contudo, isso não impossibilita que a Procuradoria
aconselhe o não ajuizamento da ação em face da situação econômica do
agente, o que inviabilizaria o recebimento da indenização, pela
Administração. O custo para o ajuizamento da demanda pode, às
vezes, superar o benefício que poderia se obter. Assim, o não
ajuizamento da ação, nesses casos, atenderia ao interesse público.
A fixação do prazo prescricional para que a
Administração possa ajuizar a ação regressiva é questão
controvertida na doutrina.
Alguns autores sustentam que o prazo para o
ajuizamento da ação guarda direta relação com o prazo prescricional
para a obtenção de indenização da Administração, daí porque haveria
uma subrogação dos direitos a importar a impossibilidade de
ampliação do prazo, sendo, portanto, de 05 anos, nos termos do Dec.
20910. Essa posição é MINORITÁRIA.
O posicionamento que prevalece sustenta que a
relação é diversa, não sendo possível a aplicação do Dec. 20910
porque tal norma é específica para as ações ajuizadas em face da
Administração. O prazo para o ajuizamento seria o previsto no
art. 177 do CCV, ou seja, de 20 anos.
Há um questionamento na doutrina quanto à
possibilidade ou não de a Administração se valer da denunciação da
lide, sendo controvertida tal questão.
A maioria dos processualistas, inclusive José Carlos Barbosa Moreira defende que não pode ser afastada a
possibilidade de denunciação da lide, na medida em que o art. 70,
III, do CPC é claro ao mencionar as hipóteses de cabimento de tal
instituto, sendo expressamente previsto que se a lei fizer menção ao
direito de regresso deve, obrigatoriamente, haver a denunciação da
lide.
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No caso em exame, o próprio texto constitucional
prevê o direito de regresso, daí porque a denunciação da lide seria
obrigatória por força da conjugação do art. 37, §6º, da CR’88 com o
artigo 70, III, do CPC.
Os administrativistas, contudo, tendem a não
aceitar a denunciação da lide (Hely Lopes Meirelles), como também
alguns processualistas, utilizando-se de dois fundamentos:
1) a denunciação da lide se faz dentro da teoria da substanciação
(que traz a necessidade de ser feita uma adequação da causa de
pedir da ação principal – autor e réu - com a causa de pedir da
ação secundária – denunciante e denunciado). Nesta hipótese,
não haveria correlação lógica porque na ação principal a causa
de pedir está baseada na responsabilidade objetiva, enquanto na
ação secundária a causa de pedir está baseada na
responsabilidade subjetiva.
2) a administração não poderia contestar o pleito indenizatório na
ação principal e, ao mesmo tempo, argumentar que o seu agente
havia obrado com culpa para obter o ressarcimento na ação
secundária. Haveria uma contradição na atuação da
Administração.
Barbosa Moreira, em acórdão de sua lavra, critica essa parte da doutrina porque, no que toca ao primeiro fundamento, a
transmudação da causa de pedir seria inexata, além do que o simples
debate acerca da culpa não justificaria essa restrição. Quanto ao
segundo argumento, Barbosa Moreira sustenta que o réu deve se
utilizar de todos os mecanismos de defesa e, muitas vezes até pelo
princípio da eventualidade, é possível hipoteticamente que venha a
sustentar teses aparentemente contraditórias.
Esse tema ainda é bastante controvertido, sendo que
o TJRJ inadmite a denunciação da lide. No âmbito federal, o STJ vem
aceitando a denunciação da lide, sendo possível também sustenta-la
em concursos.
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QUESTÃO IMPORTANTE!!
Questão: O agente, dolosamente, causa um dano a alguém. A vítima providencia a notícia crime
das lesões sofridas e é instaurado um
inquérito, sendo proposta a ação penal. A
vítima aguarda a solução da ação penal para
ajuizar a ação reparatória, sendo que, nesse
intervalo, decorrem 05 anos até que finalmente
vem a ser proferida a sentença na esfera
criminal, condenando o agente. A vítima ajuíza
posteriormente a ação de reparação em face da
Administração. A pergunta é: prescreveu ou não
a ação?
Resposta: Essa questão guarda uma certa
polêmica. Em 1998, o STJ julgou hipótese
idêntica, tendo sido relator o Min. Ari
Pargendler. O STJ entendeu que a ação penal
ajuizada suspendia o curso do prazo
prescricional, apesar de as partes serem
distintas, porque o agente representava a
figura da Administração.
O Novo Código Civil (Lei 10406), no art. 200, é
claro ao afirmar que o curso do prazo prescricional fica suspenso
enquanto não finalizado o processo crime que gera o direito a obter
a reparação.
Mas será possível, com base na sentença criminal,
que a vítima proceda diretamente à liquidação por arbitramento em
face da Administração? Nessa hipótese, a doutrina e jurisprudência
vêm entendendo não ser possível a liquidação direta porque a
Administração não participou na lide condenatória.
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RESPONSABILIDADE DAS DELEGATÁRIAS DE SERVIÇOS PÚBLICOS
A Lei 8.987/95 estabelece uma responsabilidade
direta das empresas prestadoras de serviços públicos (art. 25).
Quanto à Administração, a maioria da doutrina e da
jurisprudência sustenta que sua responsabilidade é subsidiária,
sendo essa a idéia mais adequada para o concurso da magistratura,
porque quem dá causa direta e imediata é a concessionária e não a
Administração, que tem o dever, somente, de fiscalizar, sendo
responsável subsidiariamente.
O prof. Gustavo Tepedino entende que a
responsabilidade é solidária porque se estiver presente uma relação
de consumo a Administração Pública se coloca no ciclo de produção,
sendo, portanto, responsável solidariamente pela reparação na
hipótese de causação de dano ao consumidor.
Quanto às empresas públicas e sociedades de
economia mista, há divergência no que se refere à existência ou não
de responsabilidade objetiva das sociedades interventoras no domínio
econômico. Alguns autores sustentam que sim, outros não. Para
Sergio Cavalieri, as empresas prestadoras de serviços públicos estão sujeitas à responsabilidade objetiva prevista no art.37, §6º, da
Constituição Federal. As demais – empresas que executam atividade
econômica – respondem subjetivamente; podem responder objetivamente,
não com base na Constituição, mas sim no Código de Defesa do
Consumidor (arts. 12 ou 14) se forem fornecedoras de produtos ou
serviços e estiver em jogo relação de consumo.
A responsabilidade da sociedade de economia mista é
direta. Mas, se seu patrimônio não for suficiente à reparação do
dano, haverá a responsabilização subsidiária da Administração que
criou a pessoa jurídica devedora, de acordo com a maioria da
doutrina.
Contudo, em razão da recente alteração promovida
pela Lei 10303/01 na Lei 6404/76, que trata das sociedades anônimas,
foi revogado, expressamente, o artigo 242 que previa a
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D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V OR E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L D O E S T A D O
impossibilidade de decretação da falência da sociedade de economia
mista. Em razão disso, alguns autores, como Bulhões Pedreira e
Cantidiano, sustentam que a Administração, na sociedade de economia
mista, é apenas uma acionista controladora, logo só poderia
responder por débitos da empresa nessa qualidade, ou seja, nos
termos do art. 117 da lei 6404, sendo equivocada essa expressão
responsabilidade subsidiária.
CONDUTA DA ADMINISTRAÇÃO
O artigo 37, §6º, da CR’88 traz, ainda, uma última
divergência, que se refere ao momento de incidência desse
dispositivo. Ou seja, que tipo de conduta da Administração estaria
sujeita a esse dispositivo.
Hely Lopes Meirelles defende que esse dispositivo se projeta a qualquer tipo de conduta da Administração, seja
omissiva, seja comissiva, porque não há qualquer distinção na
Constituição.
Para Celso Antônio Bandeira de Mello, o texto constitucional apenas se refere à conduta comissiva, ou seja, a uma
ação. O §6º não se aplicaria à conduta omissiva da Administração
porque o dispositivo constitucional se refere ao termo “causar” o
que pressupõe uma ação. Para ele, se a Administração for omissa,
ela não estará causando um dano, pois o fato danoso decorrerá ou da
própria natureza, ou por culpa da vítima, ou por um fato de
terceiro, mas nunca da própria Administração.
Para se responsabilizar a Administração pelo dano,
deve-se comprovar que ele decorreu da omissão, daí porque se trata
de responsabilidade subjetiva e não objetiva. Deve-se perquirir se
a Administração tinha a obrigação de agir e podia agir para evitar o
dano. Se ela tinha essa obrigação, estará configurada falta de
serviço, daí decorrente a responsabilidade subjetiva porque envolve
a culpa.
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D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V OR E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L D O E S T A D O
Há uma terceira orientação, defendida por Sergio Cavalieri Filho, que adverte sobre a necessidade de se distinguir a omissão genérica e omissão específica. Para o Des. Cavalieri,
quando a conduta for ativa, não há dúvida quanto à responsabilização
da Administração.
Contudo, quando se está diante de uma conduta
omissiva e esta omissão for específica, ou seja, pode ser constatado
que a Administração chamou para si e tinha meios para evitar o
evento danoso, estará presente a responsabilidade objetiva, porque a
Administração sabendo que tinha que agir e não o fez deu causa ao
dano.
Já se a Administração apenas tem o dever de agir,
não chamando para si nem cogitou da possibilidade da ocorrência do
evento, há a chamada omissão genérica, não sendo caso de
responsabilidade objetiva.
Ex. Um aluno fere o outro em uma escola
pública, porque a Administração deixou de
cumprir o seu dever de guarda, sendo omissa.
Para Hely, a responsabilidade da Administração
seria objetiva, para Celso Antônio, subjetiva
e, para Sérgio Cavalieri, seria uma omissão
específica porque a Administração chamou para
si e tinha meios de evitar o evento danoso,
sendo aí caso de responsabilidade objetiva.
Um sujeito está andando pela rua e é roubado.
Há uma omissão da Administração quanto ao dever
de guarda. Para Hely, a responsabilidade
objetiva da Administração está fundada na idéia
de risco administrativo, que autoriza a
exclusão da responsabilidade se o dano decorrer
de fato de terceiro, culpa exclusiva da vítima
ou caso fortuito ou força maior, daí porque a
Administração não pode ser responsabilizada
porque a hipótese é de fato de terceiro. Celso
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D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V OR E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L D O E S T A D O
Antônio Bandeira de Mello também sustenta,
nessa hipótese, a inexistência de
responsabilidade da Administração. Para
Sérgio Cavalieri, a hipótese seria de omissão
genérica, e por isso eventual responsabilidade
da Administração deveria estar efetivamente
comprovada.
DANOS CAUSADOS A TERCEIROS
Por força dessa expressão “terceiros” boa parte da
doutrina defende que a responsabilidade é “aquiliana”. Os
“terceiros” devem ser vistos de forma técnica, ou seja, devem ser
aqueles que não têm uma relação para com a Administração, conforme
Sérgio Cavalieri Filho.
Há uma outra corrente que entende de forma diversa,
sustentando que essa expressão não deve ser vista no seu aspecto
puramente técnico, sob pena de serem estabelecidas situações
inusitadas.
Segundo essa parte da doutrina, o texto
constitucional quis foi ampliar a segurança, a garantia. A
Administração deve responder objetivamente de forma a repartir o
ônus com toda a sociedade porque, hipoteticamente, a atividade
voltada para o interesse público se coloca em favor de toda a
coletividade. Seria, assim, inusitado dar uma responsabilidade
objetiva a um terceiro e não garanti-la aquele que contrata
diretamente com a Administração, conferindo o cunho de
responsabilidade garantida constitucionalmente.
Segundo essa corrente, o termo “terceiro” deve ser
interpretado como todo aquele que não faz parte da Administração,
incluindo aquele que com ela contrata.
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D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V OR E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L D O E S T A D O
Questão: Se um agente administrativo, no
exercício de sua atividade, sofre um dano.
Pode esse agente pleitear indenização com base
no §6º, do art. 37?
Resposta: Não, ele não pode. Essa orientação é pacífica na doutrina e jurisprudência. Isto
porque o agente faz para da Administração. Se
ele está atuando e sofre um dano, tal fato deve
ser encarado dentro da perspectiva de acidente
de trabalho, devendo a Administração ser
responsabilizada caso demonstrada sua culpa.
RESPONSABILIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PELA ATIVIDADE EXTRAJUDICIAL ATIVIDADE NOTARIAL E REGISTRAL – ART. 236 DA CR’88
Quando se fala na delegação das atividades
notariais e registrais, deve-se indagar se o notário ou registrador
é um mero delegatário ou se ele deve ser visto como um agente “lato
sensu”.
Há uma importância nessa distinção, pois se se
entender que eles são meros delegatários, como a Lei 8935/94, que
cuida das delegações, não estabelece um prazo para o exercício dessa
delegação, eles exercerão essas atividades até morrerem. Se se
entender, contudo, que tais pessoas são agentes “lato sensu”, eles
deverão se aposentar compulsoriamente aos 70 anos, nos termos do
art. 40, II, da CR’88.
O STF já pacificou o tema para reconhecer que tais
pessoas devem ser vista como agentes “lato sensu”, ao fundamento de
que os notários e registradores são investidos na função por
concurso público e podem sofrer punição administrativa através do
devido procedimento disciplinar pelo Estado, mais precisamente pela
Corregedoria Geral de Justiça, e, ainda, que cabe à Administração
regulamentar e fiscalizar essas atividades, inclusive quanto ao
horário de trabalho.
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D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V OR E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L D O E S T A D O
O STF entende que, sendo tais pessoas agentes em
sentido lato e porque o §6º, do art. 37, não faz distinção quanto ao
tipo de agente, deve a Administração ser responsabilizada
objetivamente pelos danos por eles causados a terceiros.
O oficial, titular das atividades, tem
responsabilidade pessoal, podendo responder diretamente pelos danos
causados – art. 22 da Lei 8935/94, sendo que a lei estabelece
expressamente que tal responsabilidade é objetiva.
A r t . 2 2 d a L e i 8 9 3 5 / 9 4 . O s n o t á r i o s e o fi c i a i s d e r e g i s t r o r e s p o n d e r ã o p e l o s d a n o s q u e e l e s e s e u s p r e p o s t o s c a u s e m a t e r c e i r o s , n a p r á t i c a d e a t o s p r ó p r i o s d a s e r v e n t i a , a s s e g u r a d o a o s p r i m e i r o s d i r e i t o d e r e g r e s s o n o c a s o d e d o l o o u c u l p a d o s p r e p o s t o s .
Tal dispositivo é constitucional porque a própria CR’88, em seu artigo 236, §1º, estabeleceu que a lei deveria regular
a responsabilidade civil dos notários e registradores, sem impor
qualquer restrição a tanto, por isso não é inconstitucional o
reconhecimento da responsabilidade objetiva dessas pessoas.
A r t . 2 3 6 ( C R ’ 8 8 ) . O s s e r v i ç o s n o t a r i a i s e d e r e g i s t r o s ã o e x e r c i d o s e m c a r á t e r p r i v a d o , p o r d e l e g a ç ã o d o P o d e r P ú b l i c o .
§ 1 º L e i r e g u l a r á a s a t i v i d a d e s , d i s c i p l i n a r á a r e s p o n s a b i l i d a d e c i v i l e c r i m i n a l d o s n o t á r i o s , d o s o fi c i a i s d e r e g i s t r o e d e s e u s p r e p o s t o s , e d e fi n i r á a fi s c a l i z a ç ã o d e s e u s a t o s p e l o P o d e r J u d i c i á r i o .
A atividade do notário e registrador é exercida
dentro do regime privado, podendo ser contratados funcionários sob o
regime celetista. Se um desses funcionários vier a causar um dano a
terceiros (ex. lavrar uma escritura falsa), o titular do cartório
será responsabilizado objetivamente porque ele responde por toda a
atividade do seu cartório. Além disso, a Administração também será
objetivamente responsabilizada por conta da natureza de agente “lato
sensu” do titular do cartório. Contudo, o escrevente contratado
será responsabilizado por culpa.
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D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V OR E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L D O E S T A D O
Yussef Cahali defende, inclusive, que o lesado pode
propor a ação em face do titular e da Administração.
O Estado, sendo responsabilizado, terá direito
regressivo contra o titular do cartório, sendo que a
responsabilidade deste será objetiva, não havendo necessidade de que
o Estado comprove a culpa deste último.
RESPONSABILIDADE DA ADMINISTRAÇÃO POR ATIVIDADE DO LEGISLATIVO
O Poder Legislativo, tal qual o Judiciário, tem uma
atuação administrativa, e por conta desse tipo de atividade há a
responsabilidade com base no art. 37, §6º, da CR’88.
Com relação à atividade precípua desse poder, ou
seja, atividade legisferante, há divergência quanto ao seu cabimento
e natureza.
Há uma corrente que entende que não há essa
responsabilidade. Segundo essa parte da doutrina, não há a
responsabilidade desse poder porque:
os membros do legislativo que elaboram a lei são agentes
políticos;
os membros do poder legislativo são mandatários, por isso não
seria correto afirmar que eles responderiam perante os seus
mandantes por força de uma conduta praticada com base no
mandato, ou seja, pelo exercício do mandato outorgado;
a lei é um comando genérico e abstrato, incapaz, por si só, de
causar um dano. Uma simples lei não poderia projetar um dano a
quem quer que seja.
Mas há os que defendem a possibilidade de
responsabilização da Administração pela atividade legisferante,
sendo os seguintes os seus argumentos:
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D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V OR E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L D O E S T A D O
O fato de ser um agente político não exclui a incidência do
§6º, do art. 37, da CR’88, pois tal dispositivo se refere a
agente em seu sentido “lato”;
Apesar de os membros do Poder Legislativo serem mandatários do
povo, seus mandatos têm limites. Assim, os membros do Poder
Legislativo têm como limite de sua atuação o texto
constitucional, por isso quando eles produzem uma norma
inconstitucional, causando danos a terceiros, deve-ser
reconhecer que extrapolaram o mandato e por isso devem ser
responsabilizados;
A atividade legisferante não gera, apenas, normas genéricas e
abstratas. Por vezes, o legislativo é capaz de editar uma lei
apenas no aspecto formal, não o sendo no aspecto material, ou
seja, essa lei produzirá efeitos concretos e específicos (ex.
art. 8º do Dec Lei 3165/41 autoriza a edição de lei para
declarar de utilidade pública algum bem). Mas mesmo se
tratando de uma norma genérica e abstrata, é possível que ela
venha a causar danos, como no caso de uma norma
inconstitucional que retire um direito consagrado pelo texto
constitucional.
O STF já teve oportunidade de reconhecer a
possibilidade de o legislativo, através de conduta legisferante,
causar um dano, sendo assim possível a responsabilização desse
poder.
RESPONSABILIDADE DA ADMINISTRAÇÃO POR ATIVIDADE DO JUDICIÁRIO
Primeiramente, deve-se fazer uma distinção entre a
atividade inerente do Poder Judiciário – que é a atividade
jurisdicional – da atividade administrativa desse poder.
Para alguns autores, o art. 37, §6º, da CR’88 é uma
norma de incidência geral e, portanto, inclui as atividades do Poder
Judiciário. Mas quando o Judiciário estiver no exercício de sua
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atividade precípua – função jurisdicional – deve-se aplicar a regra
específica existente para tanto, prevista no texto constitucional,
que é a do art. 5º, LXXV.
Prevalece, no âmbito da jurisprudência, o
entendimento no sentido de que, quando o Poder Judiciário estiver
atuando administrativamente incidirá o §6º, do art. 37, da CR’88, o
que pode ser estendido, também, à atividade cartorária. Contudo, a
atuação do Poder Judiciários tiver natureza jurisdicional, ou seja,
prestação pelo Poder Judiciário de sua atividade fim, a regra que
incide é a do inciso LXXV, do art. 5º, da CR’88.
A jurisprudência não entende que o art. 37, §6º,
teria natureza geral subsidiária quanto ao Poder Judiciário. Ao
contrário, a jurisprudência sustenta que tal dispositivo somente se
aplica à atividade administrativa do Poder Judiciário e, quanto à
atividade jurisdicional, deve ser aplicada a regra específica e
especial disposta no art. 5º, LXXV, do texto constitucional – esse
entendimento deve ser adotado em provas para a magistratura.
Art . 5º , LXXV – o E s tado inde n i za rá o condenado po r e r ro jud i c iá r i o , ass im como o que fica r p reso a l ém do t empo fixado na sentença .
Deve-se checar, primeiramente, o âmbito de
incidência da regra acima. O dispositivo se refere ao “condenado
por erro”, havendo controvérsia quanto à extensão dessa expressão.
Alguns autores entendem que a interpretação do
inciso LXXV, do art. 5º, deve levar em conta todo o conteúdo do
dispositivo, referindo-se, tão somente, à esfera criminal, na medida
em que expressamente menciona a figura do “preso”. Essa posição não
é a que prevalece atualmente.
Hoje, reconhece-se de forma predominante que a
expressão abrange todas as esferas da Justiça, cível, família,
sucessão, ou seja, onde for constatado o erro. Contudo, tal regra
deve se projetar dentro da concepção do erro, ou seja, condenação
errônea, decisão inadequada, “contra legem”.
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D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V OR E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L D O E S T A D O
Também há divergência quanto à forma de
identificação do erro judiciário. Quando é que se poderá constatar
que a decisão foi errônea?
Maria Sylvia Di Pietro e Yussef Cahali entendem que não há a necessidade de se desconstituir a decisão errônea, porque o
texto constitucional não exigiu tal providência. Para se reconhecer
a responsabilidade da Administração, bastaria que fosse comprovado o
erro e que fosse proposta a ação objetivando a indenização. Segundo
esses autores, a parte, nessa demanda, poderia demonstrar o erro
judiciário. Essa posição não é a que prevalece atualmente.
A doutrina e jurisprudência, em grande parte,
exigem que, para que haja a propositura da ação condenatória, o erro
deve estar caracterizado através da desconstituição da decisão, sob
pena de ser afrontada a idéia da coisa julgada, sendo inviável que
um juiz de 1º grau possa reconhecer o erro de uma decisão judicial
transitada em julgado, funcionando como órgão revisor, sem que tenha
sido desconstituída através do procedimento próprio que é a ação
rescisória.
Além disso, se não for desconstituída a decisão
errônea, a execução desta será absolutamente incompatível com a
execução da sentença que reconheceu o erro. Assim, por exemplo, no
âmbito criminal, o Estado indenizaria a vítima pelo erro, mas, mesmo
assim, ela continuaria presa porque a sentença que a condenou não
foi desconstituída.
Por força de tais argumentos é que se entende
necessária a desconstituição da decisão. A decisão criminal deve
ser desconstituída pela Revisão Criminal e a civil pela Ação
Rescisória.
Questão: A decisão condenatória equivocada deve ou não ter a característica de sentença ou
acórdão ou pode abranger, também, as decisões
interlocutórias?
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D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V OR E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L D O E S T A D O
Resposta: Sim, estão abrangidas as decisões interlocutórias, pois algumas decisões de
caráter cautelar podem causar conseqüências
danosas. Na esfera criminal, as prisões de
caráter cautelar (preventiva, temporária) podem
causar danos. Na esfera cível, o juiz pode
antecipar a tutela. Aliás, o próprio CPC
estabelece a obrigatoriedade de ressarcimento
de danos, a ser promovido pela parte que obteve
a seu favor a decisão cautelar, quando esta
causar danos a outra parte.
Assim, doutrina e jurisprudência têm
reconhecido que a responsabilidade de indenizar
também pode decorrer de decisões
interlocutórias que imponham uma restrição ou
constrição ao direito da parte no curso do
processo.
Questão: Cabe o pedido de indenização em razão decisão proferida no curso do processo criminal
que decreta a prisão preventiva ou temporária,
observando corretamente seus pressupostos, mas
que posteriormente é revogada por força da
absolvição do réu?
Resposta: Se a decisão que decretou a prisão foi proferida dentro de seus pressupostos
legais, entende a maioria da doutrina e
jurisprudência que não cabe o pedido
indenizatório.
O prof. Ricardo Couto não concorda com
tal corrente porque entende que sempre que o
Estado intervém na liberdade de alguém deve
haver indenização, se comprovada a inocência do
réu. Fazendo um paralelo com o direito de
propriedade, o Estado sempre indenizará o
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D I R E I T O A D M I N I S T R A T I V OR E S P O N S A B I L I D A D E C I V I L D O E S T A D O
particular se, mesmo de forma lícita, intervir
na propriedade ainda que de forma temporária.
Igual raciocínio deveria ser feito quando da
prisão, pois nessa hipótese o Estado intervém
mesmo que licitamente na liberdade do
indivíduo, devendo indenizá-lo se se constatar
sua inocência. Contudo, tal posição não
prevalece no âmbito jurisprudencial.
A jurisprudência do STJ aponta pelo não
cabimento de indenização na hipótese de prisão
cautelar decretada com a observância de todos
os requisitos legais, porque, nessa hipótese,
faltaria um dos pressupostos constitucionais
para o cabimento da indenização, qual seja, o
ERRO.
Questão: E quanto à decisão cautelar proferida na esfera cível, cabe indenização?
Resposta: Quanto ao processo civil, a decisão cautelar se faz sobre o risco da outra parte.
A outra parte que é a beneficiada pela decisão.
Na esfera criminal, quem tem a persecução
criminal é o Estado, ou seja, todos nós,
enquanto na esfera cível nem sempre estarão
presentes a União, Estados, Municípios em um
dos pólos da lide, objetivando a tutela
preventiva. Nesses casos, o CPC projeta à
outra parte a responsabilidade pela
indenização, por isso que não se deve imputar
ao Juiz e ao Estado essa responsabilidade.
Deve-se atentar, por fim, que a desconstituição de
uma decisão condenatória por ação rescisória nem sempre acarreta a
responsabilidade do Estado de indenizar a parte.
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Na esfera criminal, a revisão criminal é acolhida
para absolver o cidadão, e, inegavelmente, nessa hipótese, é cabível
a indenização.
Contudo, no âmbito civil, invariavelmente, os
particulares é que estarão presentes em um dos pólos da relação
processual. A decisão condenatória por erro é aquela considerada
como sendo a que se faz contra a lei. O juiz decide “contra legem”. Apenas nesse caso é que a atividade jurisdicional estará,
efetivamente, projetando a perspectiva de uma lesão.
Quando o juiz é induzido por uma das partes que
traz provas falsas, quem deve eventualmente responder é aquela parte
e não o Estado. Quando se está comprovado, na ação rescisória, fato
novo que, ao tempo da sentença condenatória não poderia ser trazido,
seja por inexistência ou desconhecimento, também não estará evidente
o erro preconizado pelo texto constitucional, apesar de cabível a
rescisão do julgado.
Por isso é que na esfera cível deve ser analisado o
art. 485 do CPC, que trata da ação rescisória, para se identificar
os casos em que, realmente, pode estar presente o erro judiciário.
Quanto à prisão além do prazo, esta é vista de
forma objetiva. O preso só deve permanecer nessa condição pelo
período fixado na sentença/decisão. Extrapolado tal limite,
presente automaticamente o dever de indenizar. O Estado assume a
responsabilidade de, findo o prazo da prisão, restabelecer a
liberdade do cidadão, logo, se o Estado não adotar automaticamente
tal providência, deve ser obrigado a indenizar o preso que assim
permaneceu indevidamente, mesmo que só por um dia.
RESPONSABILIDADE CIVIL POR OBRAS PÚBLICAS
Quando a obra estiver sendo realizada pela própria
Administração, não há dúvidas quanto à responsabilidade desta por
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danos causados a terceiros, devendo ser aplicado o §6º, do art. 37,
da CR’88.
Contudo, quando a Administração contrata uma
empresa, após o devido procedimento licitatório, para a realização
da obra, alguns doutrinadores, como Cretella Jr. e Hely Lopes,
observam que a Administração deve ser responsabilizada
objetivamente, devendo indenizar os lesados, quando o dano advier da
obra em si, ou seja, por força da própria obra. Segundo eles, a
responsabilidade objetiva está configurada porque a obra decorreu de
um ato da própria administração, que foi o que deu causa ao
prejuízo.
Ex. a Administração faz uma obra,
inviabilizando o comércio daquela área durante
um certo período. A obra estará causando um
dano aos comerciantes, devendo a Administração
responder objetivamente pelos prejuízos, o que
está dentro da idéia de “risco da atividade”,
que se faz em prol de toda a coletividade.
Se o dano não for causado pela obra em si, mas sim
pela imperícia, imprudência, negligência da empresa que está
realizando a obra, segundo Cretella Jr. e Hely Lopes, a
responsabilidade seria da empresa por culpa dela. Deve ser aplicada
a regra do art. 70 da Lei 8666/93 que prevê que o empreiteiro
responde por culpa.
Art . 70 (Le i 8666/93) . O cont ra tado é responsáve l pe l os danos causados d i re tamente à Admin i s t ração ou a te rce i ros , deco r ren te s de sua cu l pa ou do lo na execução do con t ra to , não exc l u i ndo ou reduz indo e ssa responsab i l i dade a fisca l i zação ou o acompanhamento pe l o ó rgão in te ressado.
O Supremo Tribunal Federal – sendo essa a posição própria para concurso – já tem posicionamento sobre o tema. O STF sustenta que mesmo na hipótese de o dano advir de uma atuação
culposa da empreiteira, poderá a Administração contratante ser
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responsabilizada, com fundamento no seu poder-dever de fiscalização,
o qual não estaria sendo cumprido, gerando sua responsabilidade
objetiva.
O interessado poderia propor a ação em face da
Administração (responsabilidade objetiva) ou da empreiteira
(responsabilidade culposa) por conta da má realização da obra. O
Min. Moreira Alves sustenta, inclusive, que a ação poderia ser
proposta em face de ambos, não obstante a diversidade da natureza da
responsabilidade, porque não estaria afastada a idéia da
solidariedade entre a Administração e a Empreiteira, por força da
necessidade de sua atuação conjunta. Observa, ainda, o Min. Moreira
Alves que o artigo 1518 do CC estabelece a responsabilidade
solidária quando a conduta causadora do dano decorrer de mais de uma
pessoa.
Orientação do Supremo Tribunal Federal, quanto ao art. 70 da Lei 8666/93 (mais adequada para concurso público):
Se o dano advém da obra em si – responsabilidade objetiva
da Administração.
Se o dano advém da má realização da obra – a
Administração responde objetivamente e se tiver
contratado uma empresa para a realização da obra, ela
responderá objetivamente, enquanto a empresa
subjetivamente.
Orientação de Cretella Jr.: Se o dano advém da má realização da obra, a responsabilidade é subjetiva da empreiteira.
RESPONSABILIDADE DA ADMINISTRAÇÃO POR DESCUMPRIMENTO DO SEU DEVER DE GUARDA
A Administração, em suas atividades, chama para si
uma gama de obrigações, vários deveres. Na sua atividade, ela pode
trazer o dever de guarda.
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Na escola pública, ela chama para si o dever de
guarda de seus alunos. Se algo acontecer aos alunos, a
Administração será responsabilizada objetivamente.
No presídio, a Administração chama para si o dever
de guarda e garantia dos detentos. Assim, se houver uma insurreição
no presídio, causando o falecimento de um dos detentos, a família do
preso poderá requerer em face da Administração a reparação dos danos
causados, que será responsabilizada objetivamente mesmo que a morte
tenha sido causada por outro detento.
Mas, se um detento fugir da prisão e causar um dano
a terceiros, será responsabilizada a Administração?
Há dois julgados do STF sobre o assunto. O
primeiro, do ano de 1995, do Min. Moreira Alves, afirmando a
irresponsabilidade da Administração na hipótese de dano causado por
detento fugitivo, ocorrido, entretanto, mais 2 anos após a fuga do
preso.
Para o Min. Moreira Alves, a responsabilidade civil
da Administração pressupõe a idéia de causalidade – nexo causal –
que deve ser visto dentro da concepção da causa imediata ou causa
direta, conforme estabelece o artigo 1056 do CC, que é a regra
principiológica do nexo causal no direito brasileiro, apesar de se
referir à responsabilidade contratual.
No caso submetido ao STF acima citado, o Ministro
Moreira Alves reconheceu não ter havido uma relação direta, imediata
do dano com uma omissão do Estado, porque já havia decorrido muito
tempo entre a fuga e o dano causado pelo detento ao terceiro.
Ocorreu, assim, a quebra do nexo causal, tendo o dano sido causado
por fato de terceiro, não ligado à figura do Estado.
Em um outro julgado do STF mais recente (2001),
sendo relator o Ministro Maurício Corrêa, houve o reconhecimento da
responsabilidade da Administração, entendendo que estava presente o
nexo causal, na hipótese em que o preso, durante sua fuga, causar
dano a terceiro. Nessa hipótese, o STF reconheceu que o preso ainda
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estaria dentro da esfera de vigilância do Estado uma vez que o dano
havia ocorrido momentos após a fuga do preso do presídio, por isso o
Estado deveria ser condenado a recompor os prejuízos causados.
Assim, nesse julgado, foi reconhecida a
responsabilidade da Administração por força de não se ter realizado
a adequada guarda do preso, que se evadiu e causou o dano.
OUTRAS QUESTÕES SOBRE RESPONSABILIDADE
Em princípio, a Administração não responde diante
de fatos da natureza porque presente a quebra do nexo causal.
Entretanto, se houver uma chuva forte que causa uma inundação
gerando danos a terceiros, mas essa inundação decorreu por conta de
uma falta ou falha do serviço, a Administração poderá ser
responsabilizada Ex. se a Administração deixa de fiscalizar os
canais de água, deixando que fiquem entupidos, causando a inundação,
a Administração poderá ser responsabilizada pelos danos.
Muitas vezes, são ajuizadas ações na esfera
federal, objetivando reparação civil do Banco Central pela má
fiscalização de instituições financeiras. Na história recente do
Brasil, houve várias quebras de instituições financeiras onde os
particulares acabaram sendo lesados. Há divergência na
jurisprudência quanto à responsabilidade ou não do BACEN nessas
hipóteses.
O Superior Tribunal de Justiça possui julgados
afirmando que a Administração não pode ser responsabilizada pela má
aplicação de recursos financeiros pelo particular. Isto porque o
risco é inerente ao mercado financeiro, sendo que se fosse
reconhecida a responsabilidade do Bacen nesses casos, estar-se-ia
reconhecendo que o aplicador nunca poderia perder em suas operações.
Contudo, vários Tribunais Regionais Federais têm o
seguinte posicionamento, que se mostra mais adequado: em princípio,
o Banco Central do Brasil não responde pelas aplicações de risco
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porque a idéia de perda econômica é inerente ao risco da aplicação.
O Banco Central não pode ser garante de lançamento de produtos no
mercado. Entretanto, o Banco Central do Brasil poderá ser
responsabilizado caso haja evidência de que era conhecedor da
situação precária da instituição financeira e, mesmo assim, permitiu
que a mesma continuasse a captar clientes. Ou seja, se estiver
evidenciada uma falta ou falha na atividade de fiscalização do
Bacen, este poderá ser levado a responder pelos prejuízos causados.
Se a instituição financeira, através de um
funcionário seu, induz seu cliente em erro, a responsabilidade será
só dela, com base no Código de Defesa do Consumidor.
Se o Banco Central intervém causando uma
modificação, deve-se verificar os termos do contrato firmando entre
a instituição financeira e o cliente para constatar se estava
previsto que as condições da aplicação deveriam obedecer as regras
estipuladas pelo Bacen. Em caso positivo, nem o BACEN e nem a
instituição financeira terão qualquer responsabilidade por eventuais
danos causados ao investidor pela alteração das regras. Se, ao
contrário, o contrato prever sua desvinculação a eventuais
modificações introduzidas, eventual alteração das regras pelo BACEN
não poderá atingir o cliente por força da garantia ao ato jurídico
perfeito, conforme o art. 5º, XXXVI, da CR’88, podendo ser proposta
a ação em face da instituição financeira caso esta tente impor a
alteração das regras do contrato.
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JURISPRUDÊNCIA SOBRE O TEMA
Informativo 270 (RE-283989)Responsabilidade Civil do Estado
Por entender não caracterizada a alegada ofensa ao art. 37, § 6º, da CF, a Turma, concluindo o julgamento de recurso extraordinário, manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná que assegurara o direito de particular à indenização por danos causados em sua propriedade em face de invasão por membros do movimento dos sem-terra por haver reconhecido, na espécie, a omissão do Estado, ante o descumprimento, pela polícia militar estadual, das ordens judiciais de reforço policial na área invadida (art. 37, § 6º: "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa."). Esclarecemos que está incorreta a notícia da conclusão deste julgamento, veiculada no Informativo 241. RE 283.989-PR, rel. Min. Ilmar Galvão, 28.5.2002. (RE-283989)
Informativo 268 (RE-258726)Responsabilidade Civil do Estado
Por entender não caracterizada a alegada ofensa ao art. 37, § 6º, da CF, a Turma manteve acórdão do TRF da 5ª Região que condenara a União ao pagamento de indenização por danos morais e materiais aos recorridos, em face da morte dos seus pais em decorrência de acidente aéreo. O acórdão recorrido, na espécie, entendera manifesto o nexo de causalidade entre o dano sofrido e a omissão do agente estatal responsável pela fiscalização das atividades de aviação civil, no caso o Departamento de Aviação Civil - DAC, comprovada pela situação irregular em que se encontrava a aeronave, sem o cumprimento de requisitos mínimos de segurança, bem como pela confirmação, segundo laudo do próprio Ministério da Aeronáutica, de que o checador, oficial da aeronáutica, que operava a aeronave - em situação também irregular, pois o comandante, que nessa hipótese, deveria assumir a posição do co-piloto, estava fora da cabine de comando - não possuía treinamento adequado para a situação de emergência ocorrida (Art. 37, § 6º: "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa."). RE 258.726-AL, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 14.5.2002.(RE-258726)
Informativo 263 (RE-228977)Dano Moral e Atos Judiciais (Transcrições)
Dano Moral e Atos Judiciais (Transcrições) RE 228.977-SP* (v. Informativo 259) Relator: Min. Néri da SilveiraEMENTA: - Recurso extraordinário. Responsabilidade objetiva. Ação reparatória de dano por ato ilícito. Ilegitimidade de parte passiva. 2. Responsabilidade exclusiva do Estado. A autoridade judiciária não tem responsabilidade civil pelos atos jurisdicionais praticados. Os magistrados enquadram-se na espécie agente político, investidos para o exercício de atribuições constitucionais, sendo dotados de plena liberdade funcional no desempenho de suas funções, com prerrogativas próprias e legislação específica. 3. Ação que deveria ter sido ajuizada contra a Fazenda Estadual - responsável eventual pelos alegados danos causados pela autoridade judicial, ao exercer suas atribuições -, a qual, posteriormente, terá assegurado o direito de regresso contra o magistrado responsável, nas hipóteses de dolo ou culpa. 4. Legitimidade passiva reservada ao Estado. Ausência de responsabilidade concorrente em face dos eventuais prejuízos causados a terceiros pela autoridade julgadora no exercício de suas funções, a teor do art. 37, § 6º, da CF/88. 5. Recurso extraordinário conhecido e provido.
Relatório: Em apelação cível interposta visando reformar sentença que julgou extinto o processo, sem conhecimento do mérito, reconhecendo a ilegitimidade de parte passiva, nos autos de ação
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reparatória de dano por ato ilícito proposta pelo Prefeito Municipal, contra Juiz de Direito da Comarca de Serra Negra, em vista de termos usados em decisão prolatada em ação popular e em manifestação pública, a Quinta Câmara do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo proferiu acórdão dando-lhe provimento parcial, de onde destaco o seguinte (fls. 356): "Com essa orientação, pelos atos imputados ao juiz demandado - quer pelas expressões consideradas ofensivas à honra do autor, usadas em decisão prolatada em diplomação, quer em discurso proferido, quando da diplomação dos candidatos eleitos, no pleito realizado em 1992 - a responsabilidade direta não pode ser obliterada. Se essa responsabilidade se cinge à primeira hipótese, ou se abarca a segunda, é perquirição própria do merecimento, inadmissível neste estágio, sob pena de se suprimir um grau de jurisdição. A solução se resume em afastar a ilegitimidade passiva nos limites em que decretada. A Turma julgadora provê, em parte, a apelação para desconstituir a sentença de extinção do processo, sem apreciação do mérito, para que o feito tenha regular processamento." José Antônio Lavouras Haicki, visando aclarar pontos do aresto que entendeu obscuros, interpôs os embargos de declaração de fls. 359/361, solicitando fossem esclarecidas a referência ao art. 133, do CPC, e a exclusão da incidência da regra contida no art. 37, § 6º, da Constituição Federal. A Câmara julgadora, entendendo inexistente a obscuridade alegada, por unanimidade, rejeitou os embargos interpostos. O recorrente, com fundamento no art. 102, III, "a", da Carta Magna e, alegando que o acórdão prolatado ofendeu flagrantemente o art. 37, § 6º, da mesma Carta Constitucional, interpôs o recurso extraordinário de fls. 371/386 e, alegando necessidade de apreciação, incidenter tantum, pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, interpôs recurso especial concomitantemente, às fls. 388/402. Não foram apresentadas as contra-razões, conforme certificado às fls. 419. Em despacho de fls. 421/423 os recursos foram deferidos pelo ilustre 3º Vice-Presidente do Tribunal a quo. No Superior Tribunal de Justiça, em despacho do ilustre Ministro relator, o recurso especial foi sobrestado até exame do recurso extraordinário por esta Corte. Vindo-me conclusos, abri vista dos autos à douta Procuradoria-Geral da República, que opinou pelo provimento do recurso, em parecer de fls. 439/445, do qual destaco o seguinte, verbis: "A irresignação do recorrente merece acolhimento, já que a autoridade judiciária não tem responsabilidade civil pelos atos jurisdicionais praticados. É que, embora seja considerada um agente público - que são todas as físicas que exercem alguma função estatal, em caráter definitivo ou transitório -, os magistrados se enquadram na espécie agente político. Estes, são investidos para o exercício de atribuições constitucionais, sendo dotados de plena liberdade funcional no desempenho de suas funções, com prerrogativas próprias e legislação específica, requisitos, aliás, indispensáveis ao exercício de suas funções decisórias. (...) Tais agentes, portanto, não agem em nome próprio, mas em nome do Estado, exercendo função eminentemente pública, de modo que não há como lhes atribuir responsabilidade direta por eventuais danos causados a terceiros no desempenho de suas funções. Com efeito, o magistrado, ao outorgar a prestação jurisdicional, atuou em nome do Estado-Juiz, exercendo a atribuição que lhe fora imposta constitucionalmente.". É o relatório. Voto: A Procuradoria-Geral da República, às fls. 440/445, opinou no sentido do conhecimento e provimento do recurso, cabendo, do parecer, destacar (fls. 440/445), verbis: "1.4 A autoridade monocrática julgou extinto o processo sem julgamento do mérito, acolhendo a preliminar de ilegitimidade passiva do demandado, considerando, para tanto, que os atos supostamente ofensivos teriam sido praticados pela autoridade judiciária no exercício de suas funções. Logo, a ação deveria ter sido proposta em face do Estado, a teor do disposto no art. 37, § 6º da CF (fls. 319/323). 1.5 O d. Colegiado local, por sua vez, ao dar provimento parcial à apelação, destacou a responsabilidade concorrente do demandado, nos seguintes termos: "Em síntese, a doutrina e jurisprudência analisadas, resulta descartada a posição de negativa da responsabilidade direta do juiz, pois confronta com o texto expresso no art. 133 do CPC. Prevalecem, portanto, as diretrizes que admitem essa responsabilidade, de modo concorrente, quer do Estado e do juiz, quer, exclusivamente, do último, autorizando que a tutela para recomposição do dano, com relação a ele, possa ser pleiteada por quem teve direito subjetivo atingido. Com essa orientação, pelos atos imputados ao juiz demandado quer pelas expressões consideradas ofensivas à honra do autor, usadas em decisão prolatada em ação popular, quer em discurso proferido, quando da diplomação dos candidatos eleitos, no pleito de 1992 - a responsabilidade direta não pode ser obliterada. Se essa responsabilidade se cinge à primeira hipótese, ou se abarca a segunda, é perquirição própria de merecimento, inadmissível neste estágio, sob pena de se suprimir um grau de jurisdição. A solução se resume em afastar a ilegitimidade passiva nos limites em que decretada." Assim, desconstituiu a r. sentença que extinguiu o processo, determinando o regular prosseguimento da ação. 1.6 No apelo extremo, o recorrente alega afronta ao art. 37, § 6º da Constituição Federal, sob o fundamento de que seria exclusiva a responsabilidade do Estado. 2. A irresignação do recorrente merece acolhimento, já que a autoridade judiciária não tem responsabilidade civil pelos atos jurisdicionais praticados. É que, embora seja considerada um agente público - que são todas as pessoas físicas que exercem alguma função estatal, em caráter definitivo ou transitório -, os magistrados se enquadram na espécie agente político. Estes são investidos para o exercício de atribuições constitucionais, sendo dotados de plena liberdade funcional no desempenho de suas funções, com prerrogativas próprias e legislação específica, requisitos, aliás, indispensáveis ao
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exercício de suas funções decisórias. É o que elucida o saudoso HELY LOPES MEIRELLES, em sua obra "Direito Administrativo Brasileiro" (18ª ed., pág. 72): "Os agentes políticos exercem funções governamentais, judiciais e quase-judiciais, elaborando normas legais, conduzindo os negócios públicos, decidindo e atuando com independência nos assuntos de sua competência. São as autoridades públicas supremas do Governo e da Administração na área de sua atuação, pois não estão hierarquizadas, sujeitando-se apenas aos graus e limites constitucionais e legais de jurisdição. Em doutrina, os agentes políticos têm plena liberdade funcional, equiparável à independência dos juizes nos seus julgamentos, e, para tanto, ficam a salvo de responsabilidade civil por seus eventuais erros de atuação, a menos que tenham agido com culpa grosseira, má-fé ou abuso de poder. Nesta categoria encontram-se os Chefes de Executivo (Presidente da República, Governadores e Prefeitos) e seus auxiliares imediatos (Ministros e Secretários de Estado e de Município); os membros das Corporações Legislativas (Senadores, Deputados e Vereadores); os membros do Poder Judiciário (Magistrados em geral); os membros do Ministério Público (Procuradores da República e da Justiça, Promotores e Curadores Públicos)..." (Negritos não-originais, assim como os futuros.) 2.1 Tais agentes, portanto, não agem em nome próprio, mas em nome do Estado, exercendo função eminentemente pública, de modo que não há como lhes atribuir responsabilidade direta por eventuais danos causados a terceiros no desempenho de suas funções. Com efeito, o magistrado, ao outorgar a prestação jurisdicional, atuou em nome do Estado-Juiz, exercendo a atribuição que lhe fora imposta constitucionalmente. Do mesmo modo, ao presidir a solenidade de diplomação dos candidatos eleitos em 1992, o MM. Juiz de Direito se manifestou como autoridade pública (agente político), razão pela qual não poderia ter sido diretamente acionado pelo postulante. 2.2 Ora, o § 6º do art. 37 é expresso ao estabelecer que as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. O texto constitucional não restringiu a responsabilidade do Estado aos atos praticados pelos funcionários públicos como na Carta anterior, mas consignou o termo agente - gênero do qual é espécie o agente político, abarcando, assim, os atos praticados por todos os agentes públicos. Desse modo, em consonância com o comando constitucional, o postulante deveria ter ajuizado a ação em face da Fazenda Estadual - responsável pelos eventuais danos causados pela autoridade ao exercer as suas atribuições -, a qual, posteriormente, teria assegurado o direito de regresso contra o responsável nas hipóteses de dolo ou culpa. 2.3 Vale transcrever, quanto ao tema, a lição de JOSÉ AFONSO DA SILVA, em sua obra "Curso de Direito Constitucional Positivo", 14ª ed., pág. 620: "Responsabilidade civil significa a obrigação de reparar os danos ou prejuízos de natureza patrimonial (e, às vezes, moral) que uma pessoa cause a outrem. ... A obrigação de indenizar é da pessoa jurídica a que pertencer o agente. O prejudicado há que mover a ação de indenização contra a Fazenda Pública respectiva ou contra a pessoa jurídica privada prestadora de serviço público, não contra o agente causador do dano. O princípio da impessoalidade vale aqui também, O terceiro prejudicado não tem que provar que o agente procedeu com culpa ou dolo, para lhe correr o direito ao ressarcimento dos danos sofridos. A doutrina do risco administrativo isenta-o do ônus de tal prova, basta comprove o dano e que este tenha sido causado por agente da entidade imputada. A culpa ou dolo do agente, caso haja, é problema das relações funcionais que escapa à indagação do prejudicado. Cabe à pessoa jurídica acionada verificar se seu agente operou culposa ou dolosamente para o fim de mover-lhe ação regressiva assegurada no dispositivo constitucional, visando a cobrar as importâncias despendidas com o pagamento da indenização. Se o agente não se houve com culpa ou dolo, não comportará ação regressiva contra ele, pois nada tem de pagar." 2.4 Ao analisar a discussão ora travada, JOSÉ CRETELLA JÚNIOR ("Manual de Direito Administrativo", 2ª ed., págs. 348/347) distingue as funções jurisdicional e administrativa praticadas pelo magistrado no exercício de suas atribuições, concluindo que em ambas o Estado responde objetivamente pelos eventuais prejuízos por ele causados. É o que se depreende do trecho abaixo transcrito, sobre o qual se fundou, inclusive, a r. sentença que julgou extinto o processo (aliás, corretamente): "No campo do Poder Judiciário, editam-se atos judiciais jurisdicionais e atos judiciais não-jurisdicionais ou atos administrativos materiais. Os primeiros são atos típicos, atos, por excelência, do Poder Judiciário; os segundos são atos administrativos editados pelo Judiciário, agora nas vestes de administrador. Sempre que estes atos produzem dano ao particular, vai-se indagar se o Estado é responsável. A responsabilidade do Estado por atos judiciais é assunto relevante no campo do direito e tem sido bem tratado pelos tribunais brasileiros. É uma espécie do gênero responsabilidade do Estado por atos decorrentes do serviço público, porque o ato judicial é, antes de tudo, ato público, ato de pessoa que exerce o serviço público judiciário. O magistrado é equiparado, para esses efeitos, ao funcionário público. Pelos prejuízos que os atos judiciais, quer jurisdicionais, quer não-jurisdicionais, causem ao administrado, responderá o Estado, quer se prove a culpa ou o dolo do magistrado, quer os danos sejam ocasionados pelo serviço da administração da Justiça, que é, primordialmente, um serviço Público do Estado. Se há uma culpa ou dolo do julgador, o Estado responde pelos prejuízos causados, exercendo depois o direito de regresso contra o causador do dano." 3. Portanto, considerando que a legitimidade passiva, em tais hipóteses, é reservada ao Estado, e tendo em
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vista a ausência de responsabilidade concorrente em face dos eventuais prejuízos causados a terceiros pela autoridade julgadora no exercício de suas funções, a teor do art. 37, § 6º da Lei Maior, o parecer é pelo provimento do recurso." Acolhendo os fundamentos desse bem lançado pronunciamento da Procuradoria-Geral da República, conheço do recurso extraordinário e lhe dou provimento. * acórdão publicado no DJU de 12.4.2002
Informativo 262 (RE-217389)Responsabilidade do Estado e Dano Cirúrgico
Por ofensa ao art. 37, § 6º, da CF/88, a Turma deu provimento a recurso extraordinário para reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, entendendo não ter havido erro médico, ou seja, a culpa subjetiva do agente, mantivera a improcedência de ação de indenização por danos causados em razão de cirurgia realizada em hospital público por equipe médica composta de funcionários do Estado. Tratava-se, na espécie, de recorrente que, em razão de seqüela permanente decorrente de procedimento cirúrgico - perda da visão do olho esquerdo em razão de cirurgia para correção de desvio do septo nasal -, ingressara com ação de indenização dos danos causados, em face do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, sob o fundamento da responsabilidade civil objetiva do Estado (CF, art. 37, § 6º). Considerou-se que, sendo caso de responsabilidade objetiva, basta a comprovação do nexo de causalidade entre o dano e a intervenção cirúrgica, não havendo, na espécie, qualquer elemento que indique ter a vítima concorrido para o evento danoso. Entendeu-se, ainda, que o risco cirúrgico não exime o Estado, no âmbito da responsabilidade civil objetiva, do ressarcimento à vítima. Precedente citado: RE 178.806-RJ (DJU de 30.6.95). RE 217.389-SP, rel. Min. Néri da Silveira, 2.4.2002.(RE-217389)
RESP 392240 / DFDJ DATA:19/08/2002Relator Min. ELIANA CALMON SEGUNDA TURMA
Ementa PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO - INDENIZAÇÃO POR ATO ILÍCITO - PENSÃO À COMPANHEIRA E AO FILHO DA VÍTIMA: LIMITE TEMPORAL - DENUNCIAÇÃO DA LIDE.1. A denunciação da lide, em ação de responsabilidade civil do servidor público causador do dano, não é obrigatória senão para o litisdenunciado que, quando chamado, não pode recusar-se.2. Harmoniza-se com a celeridade processual, e não impede o exercício do direito de regresso a não-aceitação dalitisdenunciação.3. Mulher e filho mantidos pela vítima têm direito à indenização sob a forma de alimentos, como estabeleceu o acórdão, em quantitativo que esta Corte não pode dimensionar por óbice da Súmula 07/STJ.4. A pensão fixada para a companheira da vítima não pode ser condicionada à manutenção da sua situação de mulher sozinha, dado o seu caráter indenizatório (precedentes do STJ).5. A pensão fixada para o filho tem como termo final a sua idade de 24 (vinte e quatro) anos e não a vida provável da vítima, fixada em 65 (sessenta e cinco) anos.6. Recurso especial conhecido pela alínea "c" e parcialmente provido.
RESP 167132 / RJDJ DATA:05/08/2002Relator: Min. MILTON LUIZ PEREIRAPRIMEIRA TURMA
Civil. Administrativo. Processual. Responsabilidade Civil do Estado (art. 37, § 6º, C.F.). Pedido. Denunciação da Lide. Pretensão de Nulidade. CPC, artigos 70, 267, I, 286 e 295, I.1. Admite-se que o Estado promova a denunciação da lide em ações de responsabilidade civil. No entanto, processada a ação, por si, o indeferimento não leva à nulidade. Se assim sempre ocorresse, com o retrocesso ou retardamento do processo, ficaria afrontada a finalidade do
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instituto da denúncia que visa a celeridade e economia preconizadas. Por isso, a jurisprudência tem resguardado o processo do impacto anulatório, homenageando o caráter instrumental do processo. Demais, a doutrina atual sustenta ser relativa a obrigatoriedade da denunciação da lide, distinguindo garantias próprias (formais) e impróprias, estas vinculadas à responsabilidade civil. Nulidade recusada.2. Desnecessária, na ação por danos, o pedido certo na inicial, uma vez que, mormente do dano moral, o valor é abstrato.3. Multifários precedentes jurisprudenciais.4. Recurso sem provimento.
Informativo 143 (RE-187753)Serviços Notariais e Responsabilidade
Os titulares das serventias de notas e registros são servidores públicos em sentido amplo, pois são ocupantes de cargo público criado por lei, submetido à fiscalização do Estado e diretamente remunerado à conta da receita pública, bem como provido por concurso público. Com esse entendimento, a Turma confirmou acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná que condenou o Estado, ora recorrente, baseado na sua responsabilidade civil por dano causado por serventuário de cartório de registro a adquirente de imóvel. Afastou-se a alegação do recorrente no sentido de que os oficiais de registro não detêm a condição de servidores públicos para efeito da responsabilidade objetiva do Estado por serem os serviços notariais exercidos em caráter privado por delegação do Poder Público (CF, art. 236). Precedente citado: RE 178.236-RJ (DJU de 11.4.97).RE 187.753-PR, rel. Min. Ilmar Galvão, 26.3.99.(RE-187753)
RESP 156284 / SPDJ DATA:08/10/2001Relator: Min. FRANCISCO PEÇANHA MARTINSSEGUNDA TURMA
PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO – ACIDENTE DE TRÂNSITO – DIREITO DE REGRESSO – INDEFERIMENTO DA DENUNCIAÇÃO DA LIDE – AUSÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA – DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL SUPERADA – SÚMULA 83/STJ – VIOLAÇÃO AO ART. 333, I, CPC NÃO CARACTERIZADA – PREQUESTIONAMENTO AUSENTE – SÚMULAS 356 E 282 DO STF – PRECEDENTES.- A denunciação da lide torna-se obrigatória na hipótese de perda do direito de regresso prevista nos incisos I e II do art. 70 do CPC, não se fazendo presente essa obrigatoriedade no caso do inciso III do mesmo dispositivo, onde tal direito permanece íntegro.- Fundando-se a ação em responsabilidade objetiva, o juiz pode rejeitar a denunciação da lide sem acarretar nulidade do processo, pois o preponente, podendo acionar regressivamente o seu preposto, não sofre qualquer prejuízo.- Considerando o rito sumaríssimo do processo, o acolhimento da arguição de nulidade atentaria contra os princípios da economia e da celeridade processuais.- Dissídio interpretativo superado (Súmula 83/STJ).- Se o Tribunal "a quo", mesmo após a oposição dos aclaratórios, deixa de apreciar questão suscitada no recurso de apelação, deve o recorrente, ao manifestar este apelo especial, alegar violação ao art. 535 do CPC, a fim de atender ao requisito do prequestionamento.- Recurso especial não conhecido.
Informativo 194 (RE-136247)Responsabilidade Civil do Estado
Não ofende o § 6º, do art. 37 da CF ("As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.") acórdão que reconhece o direito de indenização a herdeiros de vítima de homicídio praticado por detento logo após sua fuga. Com base nesse entendimento e afirmando a responsabilidade objetiva do Estado, tendo em vista a existência de nexo de causalidade entre a
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falha do sistema de vigilância do Estado e o dano sofrido, a Turma manteve acórdão que responsabilizara o Estado do Rio de Janeiro pela morte da vítima. RE 136.247-RJ, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 20.6.2000. (RE-136247)
Informativo 144 Responsabilidade Civil do Estado
O princípio da responsabilidade objetiva previsto no art. 37, § 6º da CF ("as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros...") aplica-se, também, aos agentes públicos delegados. Com esse entendimento, a Turma, admitindo a responsabilidade civil do Estado por ato praticado por cartório de registro de imóveis, reformou acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, reconhecendo que a possibilidade constitucional e a execução dos serviços notariais e de registro ser efetivada "em caráter privado, por delegação do poder público" (CF art. 236), não descaracteriza a natureza essencialmente estatal dessas atividades. RE 212.724-MG, rel. Min. Maurício Corrêa, 30.3.99.
Informativo 146Responsabilidade Civil do Estado
O art. 37, § 6º, da CF ("As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.") não exige que o agente público tenha agido no exercício de suas funções, mas na qualidade de agente público. Com base nesse entendimento, a Turma confirmou acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que reconhecera a incidência da responsabilidade objetiva do Estado em ação de indenização, movida por vítima de agressão praticada por policial militar com a utilização de arma de fogo da corporação, em que se busca o ressarcimento pelo dano físico sofrido. Afastou-se a alegação do recorrente no sentido de que, por ter sido o crime cometido por policial militar que não se encontrava fardado, não houve a vinculação do ato delituoso à função pública. RE 160.401-SP, rel. Min. Carlos Velloso, 20.4.99.
Informativo 156Responsabilidade Civil do Estado e Ato Judicial
A responsabilidade objetiva do Estado não se aplica aos atos do Poder Judiciário em sua função jurisdicional, a não ser nos casos expressamente declarados em lei. Com esse entendimento, a Turma, por ofensa ao art. 37, § 6º, da CF, conheceu de recurso extraordinário do Estado do Paraná e lhe deu provimento para reformar acórdão do Tribunal de Justiça estadual, que reconhecera o direito de indenização a adquirente de imóvel com base no presumido error in judicando do juiz que anulara a venda do bem por fraude à execução - já que o mesmo era objeto de penhora -, cuja penhora não havia sido arquivada no cartório de registro de imóveis, sem prova da má-fé do adquirente. Precedentes citados: RE 32.519-RS (RTJ 39/190); RE 69.568-SP (RTJ 56/273). RE 219.117-PR, rel. Min. Ilmar Galvão, 3.8.99.
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