direito à liberdade

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Apesar de existirem 78 incisos, é certo que só existem cinco direitos básicos. O art. 5.º, caput, dispõe que os direitos inerentes à vida, liberdade, igualdade, segurança e propriedade serão exercidos nos moldes insculpidos pelos incisos do mesmo artigo. Se notarmos, todos os incisos são variações dos cinco direitos, como, por exemplo, o direito à liberdade, que possui incisos regulando a liberdade de pensamento (IV, V); liberdade de religião, convicção filosófica e política (VI, VII, VIII); liberdade de expressão (IX); liberdade de profissão (XIII); liberdade de locomoção (XV); liberdade de reunião (XVI); liberdade de associação (XVII ao XXI), e assim por diante. São diversas as vertentes da liberdade previstas no art. 5.º: a) Liberdade de ação e omissão – “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (CF, art. 5.º, II). O princípio da legalidade genérica previsto nesse inciso consagra o princípio da autonomia privada em que o Estado não pode interferir na vida do ser humano a não ser nos aspectos essenciais para estabelecer a pacificação social, como normas contratuais, penais etc. Esse princípio foi um dos fundamentos que levaram o STF a admitir a união homoafetiva, posto que não há lei proibindo a relação entre pessoas do mesmo sexo (nem poderia), não cabendo ao Judiciário fazê-lo. b) Liberdade de pensamento – “É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.” Nessa hipótese, caso haja abuso nesta manifestação, será “assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem” (CF, art. 5.º, IV e V). É bom notar que existem hipóteses em que é possível a manutenção do anonimato, como o programa de proteção a testemunhas (Lei 9.807/1999), que permite preservação da identidade, imagem e dados pessoais da testemunha (art. 7.º).

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Manual esquematizado sobre os direitos previstos na Constituição brasileira, em especial o Direito à Liberdade.

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Apesar de existirem 78 incisos, certo que s existem cinco direitos bsicos. O art. 5., caput, dispe que os direitos inerentes vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade sero exercidos nos moldes insculpidos pelos incisos do mesmo artigo. Se notarmos, todos os incisos so variaes dos cinco direitos, como, por exemplo, o direito liberdade, que possui incisos regulando a liberdade de pensamento (IV, V); liberdade de religio, convico filosfica e poltica (VI, VII, VIII); liberdade de expresso (IX); liberdade de profisso (XIII); liberdade de locomoo (XV); liberdade de reunio (XVI); liberdade de associao (XVII ao XXI), e assim por diante.

So diversas as vertentes da liberdade previstas no art. 5.:

a) Liberdade de ao e omisso Ningum ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa seno em virtude de lei (CF, art. 5., II).O princpio da legalidade genrica previsto nesse inciso consagra o princpio da autonomia privada em que o Estado no pode interferir na vida do ser humano a no ser nos aspectos essenciais para estabelecer a pacificao social, como normas contratuais, penais etc. Esse princpio foi um dos fundamentos que levaram o STF a admitir a unio homoafetiva, posto que no h lei proibindo a relao entre pessoas do mesmo sexo (nem poderia), no cabendo ao Judicirio faz-lo.

b) Liberdade de pensamento livre a manifestao do pensamento, sendo vedado o anonimato. Nessa hiptese, caso haja abuso nesta manifestao, ser assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, alm da indenizao por dano material, moral ou imagem (CF, art. 5., IV e V). bom notar que existem hipteses em que possvel a manuteno do anonimato, como o programa de proteo a testemunhas (Lei 9.807/1999), que permite preservao da identidade, imagem e dados pessoais da testemunha (art. 7.).

c) Liberdade de convico religiosa, filosfica e poltica A liberdade religiosa est assegurada pelos incisos VI, VII e VIII do art. 5. da CF: inviolvel a liberdade de conscincia e de crena, sendo assegurado o livre exerccio dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteo aos locais de culto e a suas liturgias, assegurada, nos termos da lei, a prestao de assistncia religiosa nas entidades civis e militares de internao coletiva e ningum ser privado de direitos por motivo de crena religiosa ou de convico filosfica ou poltica, salvo se as invocar para eximir-se de obrigao legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestao alternativa, fixada em lei.A liberdade de religio torna o Estado brasileiro laico (leigo ou no confessional), o que designado como princpio do laicismo ou laicidade. De acordo com esse princpio, no possvel pessoas serem segregadas (perder emprego, impossibilitadas de entrar em estabelecimentos etc.) em razo de sua religio. Certo que pessoas podem se recusar a cumprir obrigao no s pela suas convices polticas e filosficas, mas tambm por sua crena religiosa (o que chamamos de escusa de conscincia). Mesmo havendo previso legal, possvel deixar de cumprir a obrigao, desde que a pessoa cumpra prestao alternativa. Caso no cumpra nem obrigao legal, nem prestao alternativa, poder ter restrio de direitos, tais como os polticos (art. 15, IV, da CR). possvel existir ensino religioso em escola pblica, no entanto, em razo do laicismo, a matrcula ser facultativa (art. 210, 1., da CR) e a metodologia no confessional, sendo vedado ensinar religio especfica.

d) Liberdade de expresso, cientfica e de imprensa livre a expresso da atividade intelectual, artstica, cientfica e de comunicao, independentemente de censura ou licena (CR, art. 5., IX);Importa observar que a ampla liberdade artstica deve respeitar os valores ticos e sociais da pessoa e da famlia (art. 221, IV). Nesse passo, as emissoras de rdio e televiso devem adaptar suas programaes ao pblico predominante no momento de sua execuo. Por isso, perfeitamente possvel o Judicirio controlar o contedo das programaes das empresas sonoras e de sons e imagens.e) Liberdade de profisso livre o exerccio de qualquer trabalho, ofcio ou profisso, atendidas as qualificaes profissionais que a lei estabelecer (CR, art. 5., XIII);Apesar de esta previso ser considerada norma de eficcia contida, podendo sofrer restrio, o STF decidiu que nem todos os ofcios ou profisses podem ser condicionados ao cumprimento de requisitos legais para o seu exerccio. A regra a liberdade, por isso, somente quando a atividade profissional exigir conhecimento tcnico, que gere risco coletividade, pode ser restrita por legislao que preveja requisitos especiais. Nesse sentido, o STF entendeu no ser obrigatria a inscrio compulsria de msicos no conselho de fiscalizao profissional, e no ter sido recepcionado o art. 4., V, do Decreto-Lei 972/1969, que exigia diploma para o exerccio da profisso de jornalista. Porm, ao desprover o Recurso Extraordinrio 603.583, declarou constitucional os arts. 8., IV e 1., e 44, II, da Lei 8.906/1994, que versam sobre o exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), in litteris: A obrigao estatal seria a de no opor embaraos irrazoveis ou desproporcionais ao exerccio de determinada profisso, e que existiria o direito de se obterem as habilitaes previstas em lei para a prtica do ofcio, observadas condies equitativas e qualificaes tcnicas previstas tambm na legislao. Sublinhou-se que essa garantia constitucional no se esgotaria na perspectiva do indivduo, mas teria relevncia social (CF, art. 1., IV). (...) Quando, por outro lado, o risco suportado pela atividade profissional fosse coletivo, hiptese em que includa a advocacia, caberia ao Estado limitar o acesso profisso e o respectivo exerccio (CF, art. 5., XIII). Nesse sentido, o exame de suficinciadiscutido seria compatvel com o juzo de proporcionalidade e no alcanaria o ncleo essencial da liberdade de ofcio. No concernente adequao do exame finalidade prevista na Constituio assegurar que as atividades de risco sejam desempenhadas por pessoas com conhecimento tcnico suficiente, de modo a evitar danos coletividade aduziu-se que a aprovao do candidato seria elemento a qualific-lo para o exerccio profissional.

f) Liberdade de informao assegurado a todos o acesso informao e resguardado o sigilo da fonte, quando necessrio ao exerccio profissional (CR, art. 5., XIV);

g) Liberdade de locomoo livre a locomoo no territrio nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens (CR, art. 5., XV);A cobrana de pedgio uma exceo constitucional a esta regra. Segundo o art. 150, V, da CR, sem prejuzo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, vedado Unio, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municpios: estabelecer limitaes ao trfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrana de pedgio pela utilizao de vias conservadas pelo Poder Pblico. Confira-se, ainda, a Lei Federal 12.587/2012, que instituiu a Poltica Nacional de Mobilidade Urbana, especialmente no ponto que autoriza a cobrana de tributos pelo uso da infraestrutura urbana municipal (art. 23, III).

h) Liberdade de reunio Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao pblico, independentemente de autorizao, desde que no frustrem outra reunio anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prvio aviso autoridade competente (CR, art. 5., XVI);Na anlise da ADPF 187, o STF declarou constitucional a chamada marcha da maconha, entendendo ser direito liberdade de pensamento e reunio, porm fixou parmetros: 1) que se trate de reunio pacfica, sem armas, previamente noticiada s autoridades pblicas quanto data, ao horrio, ao local e ao objetivo, e sem incitao violncia; 2) que no exista incitao, incentivo ou estmulo ao consumo de entorpecentes na sua realizao; 3) que no ocorra o consumo de entorpecentes na ocasio da manifestao ou evento pblico; e 4) que no haja a participao ativa de crianas e adolescentes na sua realizao;Em 2013, eclodiram no Brasil diversas manifestaes, nas quais assistamos gruposdemocrticos exercendo seu poder legtimo e grupos de vndalos que, misturados aosmanifestantes, seguiam destruindo patrimnio pblico e privado.Em razo disso, foram adotadas diversas medidas administrativas e normativas, restringindo o direitode manifestao, como a Lei 6.528/2013 do Rio de Janeiro que, sob o pretexto de regulamentar o art. 23da Constituio daquele Estado, estabelece diversas condies ao exerccio da manifestao.A restrio ao direito de reunio j havia sido analisada pelo STF em 2007, no julgamento da ADI n.1.969-4/DF, na qual foi declarado inconstitucional o Decreto do DF 22.098/1999, que 1estabelecialimitaes liberdade de reunio e de manifestao pblica, proibindo-se a utilizao de carros de some de outros equipamentos de veiculao de ideias na Praa dos Trs Poderes, dentre outros locais43.Esse julgado, inclusive, foi utilizado como parmetro de reclamao para cassar deciso do TJ/MGque teria supostamente desafiado aquela deciso ao impedir que o Sindicato nico dos Trabalhadores emEducao de Minas Gerais SIND-UTE realizasse manifestaes em vias e logradouros pblicos emqualquer parte do territrio estadual.44Andou bem o Min. Luiz Fux, ao lembrar de um instituto norte-americano chamado doutrina dos frunspblicos (public-forum doctrine), segundo a qual uma sociedade livre deve criar uma pliade deespaos nos quais se assegure, queles indivduos que desejam se expressar, o direito de ter acesso aoslugares necessrios para permitir a difuso da sua opinio entre as pessoas, notadamente aquelas reasonde muitas delas se encontram (SUNSTEIN, Cass. Republic. com 2.0. New Jersey: Princeton UniversityPress, 2007. p. 22-23).45i) Liberdade de associao plena a liberdade de associao para fins lcitos, vedada a de carter paramilitar; a criao de associaes e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorizao, sendo vedada a interferncia estatal em seu funcionamento; as associaes s podero ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por deciso judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trnsito em julgado; ningum poder ser compelido a associar-se ou a permanecer associado; e as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, tm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente (art. 5., XVII ao XXI).

SeguranaGuilherme Pea de Moraes54 resume bem ao afirmar que os direitos individuais cujo objeto imediato a segurana correspondem ao:Direito segurana art. 5., caputSegurana das relaes jurdicas art. 5., XXXV, XXXVI, LXXVIIISegurana do domiclio art. 5., XISegurana das comunicaes pessoais art. 5., XII, initioSegurana em matria penal art. 5., XXXVII a LXVIISegurana em matria tributria art. 150, I a VI

Segurana das relaes jurdicas (art. 5., XXXV, XXXVI, LXXVIII)O Pas somente se desenvolve por meio de relaes jurdicas. Por bvio, essas relaes foram feitaspara ser respeitadas, mas nem sempre isso ocorre, por isso necessrio que o Estado conceda seguranaa essas relaes amparando pessoas que tiveram seus direitos violados por terceiros. No por outrarazo que o art. 5., XXXV, da CR estabelece que nenhuma leso ou ameaa a direito pode ser subtradada apreciao do Poder Judicirio. Este o famoso princpio da inafastabilidade do controlejurisdicional ou acesso ao Poder Judicirio.Porm, no se pode confundir prestao jurisdicional com tutela jurisdicional. O princpio do acessoao Poder Judicirio impe a prestao jurisdicional, que o pedido de providncia ao Judicirio.55 Aprestao jurisdicional dada tanto ao autor quanto ao ru. Mesmo quando julgado improcedente semanlise do mrito, o processo submetido autoridade estatal, que analisa a situao posta. Contudo, atutela jurisdicional diferente, a satisfao do direito para uma das partes: a procedncia para oautor/impetrante ou improcedncia para o ru/impetrado.Porm, de nada adianta admitir aes judiciais se essa prestao no for clere, efetiva e adequada.Por isso, a EC 45/2004 incluiu, no art. 5., o inciso LXXVIII, que concede a todos, no mbito judicial ouadministrativo, a razovel durao do processo e os meios que garantem a celeridade de sua tramitao.A EC 45/2004, conhecida como reforma do Poder Judicirio, foi editada com o intuito de desafogaresse Poder e garantir mais celeridade na tramitao processual.A Constituio elenca trs excees ao princpio do acesso ao Poder Judicirio:a) Algumas autoridades, como Presidente da Repblica, Procurador-Geral da Repblica,Advogado-Geral da Unio, Ministro do STF, membro do CNJ e do CNMP, sero julgadas noSenado Federal por crime de responsabilidade (art. 52, I e II e pargrafo nico, da CR); assim,mesmo que queiram se socorrer ao Judicirio, no podero. Esta previso no ofende oprincpio do juiz natural, que determina que ningum ser processado seno pela autoridadecompetente.b) J os arts. 42, 1., e 142, 2., da CRFB estabelecem a inviabilidade da propositura dohabeas corpus nas infraes disciplinares militares (Polcia Militar, Corpo de BombeiroMilitar, Marinha, Exrcito e Aeronutica). Ao impedir o remdio heroico, o constituinte deixouclaro que no deve o Poder Judicirio interferir no mrito militar no tocante a indisciplinas.Entretanto, se houver ilegalidades, possvel que o Judicirio aprecie os direitos lesados.c) O art. 217, 1., apresenta-nos a Justia Desportiva determinando que somente aps oesgotamento das instncias desportivas possvel anlise do Poder Judicirio de questesreferentes infrao disciplinar nas competies. Como complemento, o 2. do mesmo artigorelativiza e afirma que a Justia Desportiva ter o prazo mximo de 60 dias, contados dainstaurao do processo, para proferir deciso final. Escoado esse prazo, possvel obterprestao jurisdicional independentemente do esgotamento.Ainda estabelecendo a segurana das relaes jurdicas, h previso do princpio do juiz natural (art.5., XXXVII e LIII), segundo o qual no haver juzo ou tribunal de exceo e ningum serprocessado nem sentenciado seno pela autoridade competente.J o art. 5, XXXVI, impede que lei viole direito adquirido, ato jurdico perfeito, coisa julgada.Direito adquirido aquele que j possui todos os requisitos cumpridos para seu exerccio. Assimcomo os demais direitos, este princpio no absoluto, sendo possvel relativizar o direito adquiridodiante de tributo, regime jurdico ou nova Constituio.J a coisa julgada (deciso judicial que no cabe mais recurso) tambm pode ser relativizada pela leipenal benfica, ao rescisria, querela nulitatis, ao de investigao de paternidade (podendodesconstituir a paternidade com base em exame de DNA) e assim por diante.7.8.4.2 Segurana de domiclio (art. 5., XI)O art. 5., XI, da Constituio estabelece que a casa asilo inviolvel do indivduo, ningum nelapodendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou paraprestar socorro, ou, durante o dia, por determinao judicial.O conceito do termo casa j foi diversas vezes alterado. Atualmente, casa qualquer compartimentoprivado, no aberto ao pblico, onde a pessoa exera sua profisso ou utilize como moradia. Nessesentido, domiclio, residncia, habitao, clnica mdica, escritrios (de advocacia e contabilidade,e.g.), trailer, quarto de hotel ocupado podem ser considerados casa.56 Quanto a estes ltimos, ascamareiras possuem permisso tcita para ingressar em aposento de hotel, em razo do costume. Sestaro proibidas de entrar se houver manifestao expressa do ocupante.Merece meno o julgamento do Inqurito 2.424, no qual o Supremo entendeu que no ocorre ainviolabilidade do escritrio de advocacia quando o prprio advogado seja suspeito da prtica de crime,sobretudo concebido e consumado no mbito desse local de trabalho, sob pretexto de exerccio daprofisso.57Um tema que sempre surge em sala de aula o conceito de dia previsto no art. 5., XI, da CR. Paraconceder uma viso geral da discusso vale trazer palavras do renomado Alexandre de Moraes, citandodiversos autores: Para Jos Afonso da Silva, dia o perodo das 6:00 horas da manh s 18:00 (critriocronolgico), ou seja, sol alto, isto , das seis s dezoito, esclarecendo Alcino Pinto Falco que duranteo dia a tutela constitucional menos ampla, visto que lei ordinria pode ampliar os casos de entrada nacasa durante aquele perodo, que se contrape ao perodo da noite. Para Celso de Mello, deve ser levadoem conta o critrio fsico-astronmico, como o intervalo de tempo situado entre a aurora e ocrepsculo.58 Ao nosso entender, o critrio cronolgico mais objetivo, concedendo maior segurana srelaes processuais.7.8.4.3 Segurana das comunicaes pessoais (art. 5., XII, initio)O art. 5., XII, estabelece que inviolvel o sigilo da correspondncia e das comunicaestelegrficas, de dados e das comunicaes telefnicas, salvo, no ltimo caso, por ordem judicial, nashipteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigao criminal ou instruo processualpenal.Sem sombra de dvidas, este dispositivo trata do direito privacidade e avisa que necessrio ordemjudicial apenas para violar a comunicao telefnica, sendo mister a investigao criminal. As outras trs(correspondncia, telegrficas, dados) so igualmente inviolveis, mas podem ser relativizadasindependentemente de deciso judicial, por determinao de outras autoridades.A ttulo de exemplo, podemos citar a possibilidade de as comisses parlamentares de inqurito,Banco Central e Receita Federal determinarem a quebra de sigilo bancrio independentemente deautorizao judicial (LC 105/2001, art. 1., 3.).59 Observe que o Tribunal de Contas e o MinistrioPblico no podem quebrar sigilo de dados.As autoridades que possuem esta atribuio, para quebrarem o sigilo de dados, precisam fundamentar,e os eventuais excessos so passveis de indenizao a serem analisados pelo Judicirio.J no que diz respeito s conversas realizadas por meio telefnico (comunicao telefnica), gnero,do qual se extraem duas espcies: interceptao telefnica, em que o interlocutor que est grampeadono sabe; e a escuta telefnica, na qual o interlocutor que est com o telefone grampeado sabe da oitiva.Nas duas hipteses necessrio ordem judicial, mesmo na escuta, pois os interlocutores queconversam com a pessoa grampeada no tm conhecimento do grampo e tambm possuem direito assuas intimidades.J a gravao ambiental, como, por exemplo, a gravao realizada por alunos em sala de aula,somente poder ser utilizada como prova se a pessoa que manifesta seu pensamento tem conhecimento dagravao ou se a pessoa expressa suas convices para o grande pblico.Existe ainda a hiptese da gravao clandestina, quando uma das pessoas que est conversando nosabe que est sendo gravada. Esta somente poder ser utilizada em situaes excepcionais, como legtimadefesa ou estado de necessidade (excludente de ilicitude), ou, ainda, utilizada a proporcionalidade emfavor do ru.De acordo com a Lei 9.296/1996 (Lei de Interceptao Telefnica, art. 2.), admite-se a interceptaoda comunicao telefnica quando esta for o nico meio de prova para fins criminais, cuja pena seja derecluso. No cabe interceptao telefnica para crimes punidos com deteno ou multa.Uma posio de que no comungamos, mas referendada pelo STF, a possibilidade de transcriosomente dos trechos da conversa realizada pelas partes envolvidas, sem necessidade de escrever todasas conversas.60 A nosso ver, fragmentos de conversas podem deturpar completamente o fato real e induzirmagistrado a erro, fazendo-o, por exemplo, admitir denncia em face de inocentes.Outro entendimento do Pretrio Excelso que deveria ser revisto a possibilidade de interceptaotelefnica por tempo indeterminado, desde que renovados quinzenalmente, valendo-se de novafundamentao.61 Entendemos que essa prtica no se coaduna com a sistemtica do Estado Democrticode Direito. Se, mesmo no estado de defesa (estado de exceo), a restrio ao sigilo das comunicaestelefnicas s permitida por 30 dias prorrogveis por igual perodo (art. 136, 1., I, c, c/c o art.136, 2., da CR) , no deveria ser possvel que, na legalidade ordinria, houvesse restries ao direito intimidade por anos.7.8.4.4 Segurana em matria penal (art. 5., XXXVII a LXVII)Neste tema, o instituto que merece apreo a extradio, previsto no art. 5., LI e LII, da CR.Extradio o ato de enviar a pessoa para outro pas, o qual competente para julgamento oupunio. Manoel Coelho Rodrigues explica que a extradio consiste em ato de vontade soberana de umEstado que entrega justia repressiva de outro Estado um indivduo, por este perseguido e reclamado,como acusado ou j condenado por determinado fato sujeito aplicao da lei penal.62Ao contrrio da expulso e deportao, que podem ser decretadas de ofcio, a extradio depende derequerimento.Assim, o pas que requer a extradio, por estar no polo ativo do pedido extradicional, pratica aextradio ativa. J o pas a quem se solicita a extradio pratica a extradio passiva.O brasileiro nato somente poder ser extraditado na modalidade ativa. J o brasileiro naturalizadopoder ser extraditado tanto na modalidade ativa como passiva. Contudo, o Brasil somente poderefetivar a extradio de brasileiro naturalizado por crime comum se no momento do crime a pessoa nohavia adquirido a nacionalidade brasileira. Quanto ao trfico de entorpecentes, o brasileiro naturalizadopoder ser extraditado a qualquer tempo.J o estrangeiro, cumpridos os requisitos, poder ser extraditado, salvo por crime poltico ou deopinio.O art. 5., LII, da Constituio da Repblica, nesta esteira, reza que no ser concedida extradio deestrangeiro por crime poltico ou de opinio. Para o STF, o fundamento dessa limitao humanitrio, epor isso entende-se que na problemtica dos refugiados, o interesse daquele que busca refgio ou asilocomo ser humano deve prevalecer sobre eventuais conflitos de interesse entre Estados.63Muitas dvidas pairam sobre a extenso do termo crime poltico, porm o prprio Pretrio Excelsoreconhece que no existe um conceito rgido e absoluto de crime poltico. Celso de Albuquerque Mello preciso ao afirmar que mais fcil dizer o que no crime poltico do que definir este. (...) a discussodo que venha a ser crime poltico to ampla que se pode dizer que s ser crime poltico o que o STFdesejar (...). A conceituao de um crime como poltico , por sua vez, um ato poltico em si mesmo, comtoda a relatividade da poltica.64Em seu livro, Gilmar Ferreira Mendes explica que o procedimento adotado pela legislao brasileiraquanto ao processo de extradio o da chamada contenciosidade limitada (sistema belga), que nocontempla a discusso sobre o mrito da acusao.65 Este sistema de contenciosidade limitada,institudo no Brasil pela Lei 2.416, de 1911, impe dizer que no cabe ao pas discutir o mrito do crime(culpa ou inocncia), e sim analisar se haver ou no possibilidade de extradio.Ento, o primeiro ponto saber se o Brasil no adentra no mrito da culpabilidade do extraditando.Outro ponto analisar a real funo do Supremo Tribunal no processo de extradio, isto , o Judiciriodetermina a extradio ou somente analisa a legalidade da extradio, sendo de competncia doPresidente da Repblica determin-la?Ao analisar o caso do italiano Cesare Battisti, o STF entendeu que sua deciso seria simplesmentedeclaratria, em que se examina apenas a legitimidade, aferindo os requisitos de possibilidade deextradio diante da ordem jurdica nacional. A efetivao da extradio seria competncia do PoderExecutivo, j que este possui poder para celebrar relaes com estados estrangeiros (art. 84, VII, da CR).O Supremo anotou que o processo extradicional composto de trs fases: No tocante primeiradelas, eminentemente poltico-administrativa, enfatizou que a natureza discricionria do podergovernamental de decidir sobre extradio estaria diretamente vinculada estrutura da relaoobrigacional entre os Estados requerente e requerido. Nesta fase, caberia ao Poder Executivo decidir, emtermos de poltica internacional e, ante suas obrigaes convencionais ou de reciprocidade , sobre oprosseguimento do pleito de extradio. Assinalou que, por outro lado, a fase seguinte seriapredominantemente jurisdicional e processada perante o Supremo. No ponto, salientou que esta Corte noadentraria o mrito da condenao penal infligida ao extraditando, no revolveria provas que ensejarama condenao e tampouco reapreciaria aspectos procedimentais que pudessem implicar a nulidade doprocesso penal no mbito do Estado estrangeiro requerente. Assim, a este Tribunal competiria somente ocontrole da legalidade do processo em tela e, com o julgamento, estaria encerrada a fase jurisdicional.Ficaria a cargo do Poder Executivo a mera responsabilidade pela entrega do extraditando ao Governorequerente, nos termos do art. 86 da Lei 6.815/80 (Concedida a extradio, ser o fato comunicadoatravs do Ministrio das Relaes Exteriores Misso Diplomtica do Estado requerente que, no prazode sessenta dias da comunicao, dever retirar o extraditando do territrio nacional). Registrou queesses controles de constitucionalidade e de legalidade tambm deveriam ser traduzidos como garantia derespeito incondicional ordem constitucional e como proteo jurisdicional dos direitos fundamentais doextraditando.66 bom grifar o trecho discricionariedade do poder governamental de decidir sobre extradio estariadiretamente vinculada estrutura da relao obrigacional entre os Estados requerente e requerido, pois,ao contrrio do que pode parecer, no significa dizer que a extradio ato discricionrio. Ao revs, vinculado aos termos do tratado de extradio, ao acordo bilateral. Contudo, existem trs graus devinculao:67 a) atos vinculados por regras; b) atos vinculados por conceitos jurdicos indeterminados; ec) atos vinculados diretamente por princpios.Nestes termos, mesmo sendo vinculado, possvel (nos casos b e c) existir certa margem deinterpretao do ato, como ocorreu na extradio daquele cidado italiano.68