dialética na fenomenologia do espírito

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Dialética Docente: Erick Lima Discente: Rogério Gonçalves Matrícula: 140051040 Resposta à questão do Segundo Estudo Dirigido A definição de experiência, tanto quanto a respectiva concepção de ciência, requere no pensamento hegeliano uma elucidação, pois a primeira se distingue do modus operandi das ciências modernas, que depositam completo destaque na repetição, na continuidade previsível e calculada quando da análise de determinados experimentos. A filosofia como ciência, não possuindo método igual ao das ciências naturais, que por sua vez dispõe da matemática como eixo metodológico, busca proceder especulativamente propondo-se a ser a ciência da totalidade, que tem por intento o Absoluto em seu desenvolvimento. Essa ciência, contudo, necessita ser um sistema, uma vez que só sistematicamente essa explanação da verdade é possível em e para si. Nessa totalidade, porém, a filosofia requere ela mesma uma mediação, a experiência, que seria essa mediação na consciência entre o conceito e seu objeto. Tendo por alicerce a concepção moderna de experiência na elaboração de seu empreendimento epistemológico, Hegel constrói sua crítica à filosofia e ciência modernas. Nela ele defende que, diferentemente ao que o entendimento moderno erigiu para si como programa, as deliberações do saber não podem adjetivar-se como exteriores ao objeto, como meros meios ou instrumentos para sua compreensão. Ao contrário, as determinações do saber devem antes ser reflexões objetivas da 'coisa mesma'. Assim sendo, tais ponderações se distendem pelo esboço de entrelaçamento entre o sujeito e o objeto, a forma e o conteúdo, a intuição e o conceito, e vice- versa: tudo isto como resultado do movimento de formação do Espírito. Por conseguinte, em sua Fenomenologia do Espírito, Hegel tenciona, a princípio, resgatar criticamente o ponto de vista subjetivo da representação moderna. Por isso, assume, em um primeiro momento, a separação entre sujeito e objeto, procedendo da posição da consciência natural e de sua conjuntura fenomênica. Para tal fim, Hegel ''expande'' a concepção kantiana de experiência, que se delimita precipuamente ao âmbito epistêmico, abrangendo com sua crítica a experiência viva do Espírito, em sua formação histórico-conceitual. Conforme Hegel, de início, para o surgimento da filosofia, é primordial ter por alicerce basilar a experiência, que propicia à consciência mesma refletir acerca de si e criticar-se em seu próprio movimento constitutivo. Diz Hegel que

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Dialética hegeliana

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Page 1: Dialética na Fenomenologia do espírito

Dialética

Docente: Erick Lima

Discente: Rogério Gonçalves

Matrícula: 140051040

Resposta à questão do Segundo Estudo Dirigido

A definição de experiência, tanto quanto a respectiva concepção de ciência, requere no

pensamento hegeliano uma elucidação, pois a primeira se distingue do modus operandi das ciências

modernas, que depositam completo destaque na repetição, na continuidade previsível e calculada

quando da análise de determinados experimentos. A filosofia como ciência, não possuindo método

igual ao das ciências naturais, que por sua vez dispõe da matemática como eixo metodológico,

busca proceder especulativamente propondo-se a ser a ciência da totalidade, que tem por intento o

Absoluto em seu desenvolvimento. Essa ciência, contudo, necessita ser um sistema, uma vez que só

sistematicamente essa explanação da verdade é possível em e para si. Nessa totalidade, porém, a

filosofia requere ela mesma uma mediação, a experiência, que seria essa mediação na consciência

entre o conceito e seu objeto.

Tendo por alicerce a concepção moderna de experiência na elaboração de seu

empreendimento epistemológico, Hegel constrói sua crítica à filosofia e ciência modernas. Nela ele

defende que, diferentemente ao que o entendimento moderno erigiu para si como programa, as

deliberações do saber não podem adjetivar-se como exteriores ao objeto, como meros meios ou

instrumentos para sua compreensão. Ao contrário, as determinações do saber devem antes ser

reflexões objetivas da 'coisa mesma'. Assim sendo, tais ponderações se distendem pelo esboço de

entrelaçamento entre o sujeito e o objeto, a forma e o conteúdo, a intuição e o conceito, e vice-

versa: tudo isto como resultado do movimento de formação do Espírito.

Por conseguinte, em sua Fenomenologia do Espírito, Hegel tenciona, a princípio,

resgatar criticamente o ponto de vista subjetivo da representação moderna. Por isso, assume, em um

primeiro momento, a separação entre sujeito e objeto, procedendo da posição da consciência natural

e de sua conjuntura fenomênica. Para tal fim, Hegel ''expande'' a concepção kantiana de experiência,

que se delimita precipuamente ao âmbito epistêmico, abrangendo com sua crítica a experiência viva

do Espírito, em sua formação histórico-conceitual. Conforme Hegel, de início, para o surgimento da

filosofia, é primordial ter por alicerce basilar a experiência, que propicia à consciência mesma

refletir acerca de si e criticar-se em seu próprio movimento constitutivo. Diz Hegel que

Page 2: Dialética na Fenomenologia do espírito

"Segundo uma representação natural, a

filosofia, antes de abordar a Coisa

mesma - ou seja, o conhecimento efetivo

do que é, em verdade, - necessita

primeiro pôr-se de acordo sobre o

conhecer, o qual se considera ou um

instrumento com que se domina o

absoluto, ou um meio através do qual o

absoluto é contemplado" (HEGEL, 1992,

63).

Hegel intenta sobrepor as interpretações abstratas no que se diz respeito à constituição

do saber por intermédio de uma crítica à consciência natural, prestada por si mesma em seu acesso

ao mundo real. Segundo Hegel, tal movimento não teria então de ser compreendido como uma

intercessão da posição filosófica mediada sobre a posição natural imediata, mas sim de uma auto-

mediação da imediatidade da consciência natural, que constituiria uma consciência tomada em sua

imediatidade, porém que ainda não se reconhece como Espírito. Por isso, a consciência mesma

cinde-se deste com uma independência própria, uma subjetividade abstrata e estranha a si mesma.

Desse modo, a consciência deve então buscar em si mesma suas determinações, sua

norma, convertendo-se em uma autocrítica que dispõe na experiência um movimento fundamental.

Nesse movimento, todavia, a experiência, por sua vez, exerce um fator negativo – a saber, uma

negatividade - sobre a posição em que se encontra a consciência, e é em meio a esse movimento de

negatividade, posto pela experiência, que a consciência põe a si mesma como seu próprio padrão de

medida, de autocrítica através do empreendimento mediativo da experiência. Dessa forma, ela

acaba por se constituir uma ciência, uma ciência da experiência da consciência.

Por conseguinte, no processo de desenvolvimento, a Fenomenologia do espírito intenta

por esse transcurso a própria efetivação da ciência. Para tal procedimento de investigação,

entretanto, é preciso estabelecer um padrão de medida, visto que o exame, em seu aspecto clássico,

consiste em conferir a relação de adequação, de um lado, entre o intelecto e a coisa – a saber, a

identidade entre 'ser' e 'pensar', comum ao pensamento eleata -, como remete, assim, a uma

identidade entre conceito e verdade; e de outro, entre a coisa e o intelecto, portanto a relação entre

verdade e conceito. No entanto, como a ciência ainda não se efetivou em-si, ela mesma não pode ser

o paradigma através do qual o conhecimento é construído: conforme Hegel, resta, para superar esse

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impasse metodológico do parâmetro do saber, que se evidencie a autodeterminação da consciência,

através de uma exposição do objeto tal como ela se dá na consciência.

Este preâmbulo da Fenomenologia do espírito, portanto, parte da eclosão de uma

inquirição, tipicamente moderna, de caráter metodológico, que é o parâmetro, o paradigma, ou seja,

a própria realidade do conhecimento. Para Hegel, esse inquérito traz a contradição entre saber e

verdade, e com ela a dicotomia, o dualismo entre sujeito/objeto, intuição e conceito, forma e

conteúdo. A princípio, para sanar o problema, Hegel encadeia na consciência esses dois momentos,

com os quais ela se distingue e se relaciona reciprocamente e, além disso, expressa um como algo

para a consciência, que é o saber, e o outro como ser de alguma coisa para a consciência, que é o

objeto.

Contudo, esse paradigma se concatena com o saber como ele é “para nós”, a saber,

como um objeto da consciência que tem como seus momentos o em-si, ou seu saber do ser do

objeto, e seu saber que sabe o objeto, para-si. Destarte, essa unidade de medida do saber se radica

na própria consciência, que fornece, em si mesma, sua própria medida. Diz ele que

"Se investigarmos agora a verdade do

saber, parece que estamos investigando o

que o saber é em si. Só que nesta

investigação ele é nosso objeto: é para

nós. O Em-si do saber resultante dessa

investigação seria, antes, seu ser para

nós: o que afirmássemos como sua

essência não seria sua verdade, mas sim

nosso saber sobre ele. A essência ou o

padrão de medida estariam em nós, e o

[objeto] a ser comparado com ele e sobre

o qual seria decidido através de tal

comparação não teria necessariamente de

reconhecer sua validade" (HEGEL, 1992,

69).

Aqui está o ponto fundamental da compreensão do movimento dialético que a

consciência realiza em si mesma: ele é sempre uma dialética dela (consciência) consigo mesma. O

saber de um objeto, que é a verdade na forma em que ela existe para a consciência, deve tornar-se

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ele próprio objeto da consciência, de forma que ela produza sempre um saber de seu próprio saber.

A experiência da consciência, dessa maneira, consiste na reflexão sobre si mesma, revertendo o seu

saber em objeto, e produzindo um outro saber menos imperfeito a partir desse novo objeto. Esse

exame do saber, por seu turno, sendo feito pelo próprio saber, é o caminho de construção da ciência

como a forma do saber de si da consciência – o que, em resumo, já é a própria ciência se realizando.

Portanto, o marco dessa ciência, que Hegel intitula fenomenologia, se dará no momento

da correspondência entre seu saber e seu saber do saber, isto é, entre si mesma (consciência) e o

saber de si. E nesse momento, sua aparência corresponde à sua essência: aquilo que ela conhece de

si corresponde ao seu ser-em-si. Ou seja: seu conhecimento abarca o âmbito total de sua verdade,

que é, propriamente, a consciência mesma.

Page 5: Dialética na Fenomenologia do espírito

Referências

G.W.F. HEGEL. Fenomenologia do espírito. Tradução de Paulo Meneses. Ed. Vozes: 1992.

BEISER, F.C. (ed.). The Cambridge Companion to Hegel. Cambridge: CUP, 1993.