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0 USO E OCUPAÇÃO DO SOLO DIAGNÓSTICO E CONSTRUÇÃO DE CENÁRIOS CONSULTORES: Marco Romanelli Patrícia Stelzer

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USO E OCUPAÇÃO DO SOLO

DIAGNÓSTICO E CONSTRUÇÃO DE CENÁRIOS

CONSULTORES:

Marco Romanelli

Patrícia Stelzer

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1

CARIACICA

2012

Lista de Mapas

Mapa 1 – Município de Cariacica Geomorfologia......................................................................... 7

Mapa 2 - Município de Cariacica Sítio Urbano.............................................................................. 9

Mapa 3 – Município de Cariacica Estrutura Urbana...................................................................... 11

Mapa 4 - Mapa com traçados viários propostos pelo Conselho de Desenvolvimento da Grande

Vitória.............................................................................................................................................

23

Mapa 5 - Mapa do PDM localizando centralidades principais e secundárias, além de rotas

cicloviárias. É evidente a necessidade de detalhamentos e aproximações.....................................

26

Mapa 6 - Município de Cariacica Arruamentos Sub-normais........................................................ 45

Mapa 7 – Município de Cariacica Risco de Alagamento............................................................... 48

Mapa 8 – Município de Cariacica Uso e Ocupação do Solo.......................................................... 51

Mapa 9 - Município de Cariacica Centralidades Principais........................................................... 52

Mapa 10 – Município de Cariacica Configuração Urbana............................................................. 56

Mapa 11 - Município de Cariacica Zoneamento Urbanístico......................................................... 72

Mapa 12 - Município de Cariacica Zoneamento Industrial............................................................ 76

Mapa 13 – Município de Cariacica Zoneamento de Impactos....................................................... 78

Mapa 14 – Município de Cariacica Zoneamento de Alcance......................................................... 79

Mapa 15 – Município de Cariacica Configuração Urbana............................................................. 97

Mapa 16 – Município de Cariacica Sistema Viário Proposto......................................................... 98

Mapa 17 - Município de Cariacica Uso do Solo e Sistema Viário Propostos................................ 114

Lista de Figuras

Figura 1 - Novos arruamentos em Vila Progresso, em 1989, 2005 e 2012. Fontes: RMGV –

Dinâmica Urbana na década de 90; e Google Earth, 2012.............................................................

14

Figura 2 - Terminais do Transcol junto às vias principais, que coincidem com as rodovias

federais BR-101 e 262, e estadual ES-080. Fonte: CRUZ, 2011...................................................

15

Figura 3 - Rodovia José Sette, sem infraestrtutura básica e de dimensionamento inadequado...... 16

Figura 4 - Estrada de Caçaroca, sem infraestrutura básica e com conflitos entre ciclistas e

motoristas........................................................................................................................................

17

Figura 5 - Linhas de desejo, segundo as origens-destinos internos ao município: concentração

de demandas no eixo nordeste-sudoeste.........................................................................................

19

Figura 6 - Percursos principais das linhas troncais. Em laranja, os percursos atuais; em

verde,.os percursos possíveis com a conclusão de novas conexões...............................................

20

Figura 7 - Em cores, os traçados viários propostos, com destaque em branco para a quarta

ponte, à esquerda............................................................................................................................

24

Figura 8 - Em verde, proposta de nova ligação entre o novo contorno e Itacibá, evitando passar

pela Sede.........................................................................................................................................

25

Figura 9 - À esquerda, estrutura viária metropolitana; à direita, estrutura viária em áreas

conturbadas. É visível a expansão urbana ao norte e ao sul de Cariacica......................................

28

Figura 10 - Lista de projetos para Cariacica, sistema viário estruturador metropolitano da

Grande Vitória. ..............................................................................................................................

29

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2

Figura 11 - Áreas classificadas como especializadas industriais e logísticas, que podem ser

associadas aos projetos de características expansivas do tecido....................................................

29

Figura 12 - Propostas comuns aos cinco projetos analisados......................................................... 32

Figura 13 - À esquerda, necessidade de melhorias na BR-101; à direita, BR-262, eixo

metropolitano institucional, comercial e de serviços......................................................................

32

Figura 14 - Avenida Alice Coutinho, ligação não concluída com Vila Velha............................... 33

Figura15 - Propostas comuns a quatro dos projetos analisados..................................................... 34

Figura 16 - Propostas que ocorrem em três dos projetos analisados.............................................. 35

Figura 17 - Propostas recorrentes em dois dos projetos analisados................................................ 36

Figura 18 - Tecido urbano em Cariacica, como uma colcha de retalhos........................................ 37

Figura 19 - Padrão típico de inserção topográfica dos arruamentos............................................... 39

Figura 20 - A cultura do ‘valão’: edificação sobre a margem do curso d’água.............................. 40

Figura 21 - O arruamento de padrão sub-normal e um típico ‘beco’, no bairro União.................. 41

Figura 22 - À esquerda, disparidade entre os padrões do arruamento e da edificação; à direita,

invasão da rua, comprometendo seriamente o espaço público.......................................................

42

Figura 23 - À esquerda, a propriedade privada no limite da área de preservação; à direita, a

edificação de frente para o ‘valão’..................................................................................................

44

Figura 24 - O vazio urbano da Fazenda do Estado. Fonte: Google Earth, 2012............................ 47

Figura 25 - Autoconstrução caracteriza a massa edificada, em Porto de Santana.......................... 60

Figura 26 - Estrutura em concreto e vedações com tijolos cerâmicos furados nas encostas.......... 61

Figura 27 - À esquerda, edificações com até 3 pavimentos; à direita, terraço capixaba, em

Itacibá.............................................................................................................................................

61

Figura 28 - A edificação sempre construída sobre o alinhamento e sem afastamentos laterais,

independente da topografia, do arruamento e do padrão construtivo.............................................

64

Figura 29 - Habitação unifamiliar, no bairro Dona Augusta, e ocupação verticalizada, em

Campo Grande, produção assistida do tecido urbano. Fonte: PDM 2006......................................

66

Figura 30 - Avenida Expedito Garcia em Campo Grande. Centralidade comercial, trânsito

caótico, terrenos totalmente ocupados, falta de garagens e de espaço para o pedestre..................

68

Figura 31 - Recentes investimentos imobiliários em Cariacica: maquete do Shopping na BR-

262 e apartamentos junto ao estádio Kleber Andrade. Fonte: Google, em 21/08/2011.................

69

Figura 32 - Parâmetros do Modelo de Ocupação........................................................................... 118

Figura 33 - Zoneamento Rural: áreas de preservação delimitadas por servidões de acesso

público. ..........................................................................................................................................

120

Lista de Tabelas

Tabela 1 - Modelo de Controle da Ocupação do Solo. DE = Densidade de Edificação................ 87

Tabela 2- Rentabilidade do Modelo Proposto. MT = Multiplicação total. CACar = Coeficientes

em Cariacica...................................................................................................................................

88

Tabela 3 - Modelo de Ocupação com Afastamentos Laterais........................................................ 90

Tabela 4 - Modelo simplificado para a Autoconstrução................................................................. 119

Tabela 5 - Modelo simplificado para o Mercado Imobiliário......................................................... 119

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SÚMARIO

INTRODUÇÃO.............................................................................................................................. 6

CAPÍTULO 1: ANÁLISE E DIAGNÓSTICO............................................................................ 7

1.1 Uma caracterização geomorfológica do município........................................................... 7

1.2 A estrutura urbana de Cariacica......................................................................................... 9

1.2.1 O sistema viário existente.................................................................................................. 14

1.2.2 Os diversos desenhos......................................................................................................... 21

1.2.3 Comparação entre os diversos projetos.............................................................................. 30

1.2.4 Considerações..................................................................................................................... 37

1.3 Os arruamentos em Cariacica............................................................................................. 38

1.3.1 Os arruamentos de padrão sub-normal............................................................................... 40

1.3.2 Os lotes vagos e os vazios urbanos.................................................................................... 46

1.3.3 O vale do rio Formate......................................................................................................... 47

1.4 Uso do Solo do município de Cariacica............................................................................. 50

1.4.1 O Uso do Solo Urbano....................................................................................................... 52

1.4.2 A oferta de serviços públicos............................................................................................. 54

1.4.3 Uma configuração perceptível........................................................................................... 56

1.5 A ocupação do solo............................................................................................................ 59

1.5.1 Os padrões de salubridade da edificação............................................................................ 63

1.5.2 A cidade da elite................................................................................................................. 65

1.5.3 A chegada da indústria imobiliária..................................................................................... 68

CAPÍTULO 2: A NORMATIVA TERRITORIAL EM CARIACICA – O PLANO

DIRETOR MUNICIPAL............................................................................................................... 71

2.1 O zoneamento de Cariacica................................................................................................ 71

2.2 O regulamento do Uso do Solo.......................................................................................... 75

2.2.1 Planejamento versus economia: um lado fácil da questão ................................................ 80

2.2.2 A consolidação de uma área central................................................................................... 82

2.3 O controle da Ocupação do Solo........................................................................................ 84

2.3.1 Planejamento versus economia: agora, o lado difícil......................................................... 84

2.3.2 Um modelo de ocupação baseado na qualidade do tecido urbano..................................... 86

2.3.2.1 Comparação com os índices do PDM................................................................................ 88

2.3.2.2 A construção com afastamentos laterais............................................................................ 89

2.4 Conclusões......................................................................................................................... 91

CAPÍTULO 3: PROPOSTAS........................................................................................................ 94

3.1 Sistema viário e mobilidade urbana................................................................................... 94

3.1.1 Uma proposição.................................................................................................................. 95

3.2 Vetores da dinâmica urbana............................................................................................... 101

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3.2.1 O Vetor Vitória................................................................................................................... 101

3.2.2 O Vetor Vila Velha............................................................................................................ 103

3.2.2.1 O eixo BR-447................................................................................................................... 104

3.2.2.2 A Evolução em Caçaroca e Padre Grabiel ........................................................................ 105

3.2.3 A Zona Industrial Norte..................................................................................................... 106

3.2.3.1 Evolução na Sede e em Porto Belo.................................................................................... 108

3.2.4 O eixo quarta ponte............................................................................................................ 109

3.2.4.1 A operação urbana Itanguá................................................................................................. 110

3.2.4.2 Evolução em Porto de Santana, Flexal e Planeta............................................................... 111

3.2.4.3 A evolução no Vale dos Reis e Novo Horizonte................................................................ 112

3.3 Uso do solo – O Zoneamento de uso misto........................................................................ 113

3.3.1 Indústira, instituições e serviços......................................................................................... 115

3.3.2 Zonas Especiais.................................................................................................................. 116

3.4 Modelo de Ocupação do Solo............................................................................................ 118

3.4.1 A Autoconstrução............................................................................................................... 118

3.4.2 O modelo imobiliário......................................................................................................... 119

3.5 A Zona Rural...................................................................................................................... 120

4 Considerações finais......................................................................................................... 121

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Uso e Ocupação do Solo

Introdução.

Este é um diagnóstico das condições em que se encontram o Uso e a Ocupação do Solo Urbano no

município de Cariacica, ES, integrante do ciclo de atualização da Agenda Cariacica 2010-2030.

O trabalho parte de alguns pressupostos baseados em constatações empíricas derivadas de visitas in

loco, corroboradas por alguns dados quantitativos e combinadas com uma análise do mapeamento

resultante das restituições aerofotogramétricas do território municipal.

Uma conceituação preliminar se faz necessária, para permitir a compreensão das análises

apresentadas sobre o trato do Uso e da Ocupação do Solo urbano. Na linguagem corrente, uso e

ocupação costumam ter o caráter de sinônimos, quando se trata das cidades. Contudo, numa já

perceptível tradição normativa capixaba, são expressões que podem ser empregadas para descrever

dois aspectos distintos da gestão urbana, como será feito, também, neste trabalho.

Quando nos referirmos ao Uso do Solo, estaremos descrevendo as possibilidades de instalação de

diferentes atividades na cidade, se residenciais, comerciais, industriais, etc., isto é, Uso do Solo se

refere a onde se instala o quê.

Ocupação do Solo, por outro lado, se referirá ao formato das edificações que abrigam estas

atividades, em termos de tamanho e de inter-relação com o restante do conjunto edificado da cidade,

isto é, Ocupação do Solo se refere a quanto se instala do quê.

Estabelecida esta diferenciação, será possível analisar o estagio atual da localização das atividades

urbanas no município e sua distribuição quantitativa no território, como resultantes do processo

histórico do assentamento humano em Cariacica.

Esta análise permitirá, então, inferir perspectivas futuras de evolução destas localizações e

quantidades, apontando diretrizes para o enfrentamento das questões relativas ao tema do Uso e

Ocupação do Solo.

Outro aspecto que merece atenção, no caso específico de Cariacica, é o desenho do Arruamento da

cidade, fortemente determinante do seu caráter como tecido urbano e do tipo de problema que este

último apresenta ao planejamento.

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Assim, preferiremos a denominação Arruamento, em lugar dos convencionais ‘loteamento’ ou

‘parcelamento’, porque entendemos ser importante destacar o elemento que é efetivamente

introduzido no território nestes processos, quando são criadas áreas públicas no solo originalmente

privado, através do desenho das ruas: Arruamento.

CAPÍTULO 1: ANÁLISE E DIAGNÓSTICO.

Mapa 1 – Município de Cariacica Geomorfologia

1.1 Uma caracterização geomorfológica do município.

Cariacica é a porção do território imediatamente a Oeste da baía de Vitória, estendendo-se por pouco

mais de 26 km para o interior, a partir de um litoral com cerca de 7 km de extensão. O município se

estende também para o Sul, por mais 7 km, mas esta porção avança somente 4,5 km para o interior.

As fronteiras com os municípios vizinhos são quase inteiramente definidas por elementos

hidrográficos: a partir de nascentes na encosta da Serra do Mar no Espírito Santo, o rio Mangaraí e o

córrego do Sabão correm para leste e separam Cariacica de Santa Leopoldina. O córrego deságua no

rio Santa Maria, que é a fronteira com a Serra.

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Ainda no alto do maciço, o córrego Biriricas, no sentido sul, é uma pequena fronteira com Domingos

Martins. O rio Formate, no sentido sudeste, é a fronteira com Viana e deságua no rio Marinho,

fronteira com Vila Velha. Entre a foz do rio Santa Maria e a foz do rio Marinho, está o litoral da

baía, que é a fronteira com Vitória.

O relevo apresenta uma sucessão de cristas rochosas paralelas ao litoral, com altitude entre 500 e 600

m e cobre quase metade da extensão interior do território. A porção restante entre a encosta e o mar é

uma região sedimentar que oscila entre 40 e 100 m e tem sua extensão sulcada pela drenagem natural

que deságua na baía de Vitória.

A partir do extremo Norte da parte baixa do relevo, encontramos o córrego do Engenho, seguido pelo

córrego Vasco Coutinho, pelos rios Bubu e Itanguá e pelo córrego Campo Grande, alem de outros

pequenos cursos d’água sem toponímia, no extremo Sul. Os córregos do Engenho e Vasco Coutinho

deságuam no rio Santa Maria, e o Córrego Campo Grande deságua no rio Marinho.

O rio Bubu forma uma bacia relativamente plana a 10 metros de altitude junto à encosta da serra,

percorre um pequeno vale alargado e deságua na baía de Vitória em meio a um extenso remanescente

de manguezal. O rio Itanguá também drena um vale alargado, com menos de 5 metros de altitude e

deságua num manguezal menor junto à baía.

Esta parte baixa do território, portanto, se apresenta como duas ‘ilhas’ de solo argiloso um pouco

mais elevado – 40 m – separadas pelo vale do rio Bubu e cortadas pelos córregos mencionados, e

contém toda a porção urbanizada do município. Cariacica acontece como cidade numa formação

típica do “mar de morros” do relevo sedimentar litorâneo brasileiro, que se configura como uma

compartimentação variada e de difícil apreensão.

A complexidade geomorfológica do sítio natural é intensificada por aspectos peculiares da

urbanização e torna Cariacica particularmente difícil de decifrar. Perder-se entre seus muitos recintos

topográficos e ruas sinuosas é a regra, mais ainda porque, quase sempre, os arruamentos são

improvisadamente conectados entre si e com a estrutura geral da cidade.

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Mapa 2 - Município de Cariacica Sítio Urbano

1.2 A estrutura urbana de Cariacica

A estrutura interna de uma cidade é composta por um núcleo e por suas conexões a rotas regionais de

transporte. A localização destes elementos se deve a condicionantes funcionais externos à cidade,

que, posteriormente, subordinam a localização das suas atividades à estrutura núcleo+conexões que

encontra pronta.1 A estes fatores externos de localização devem ser somados aqueles de ordem

natural, principalmente topográficos e hidrográficos.2

Assim, o núcleo de uma cidade se instala devido a uma combinação de condições favoráveis do sítio

natural com as relações de interdependência dos demais núcleos em seus arredores. E as conexões

com estes outros núcleos urbanos obedecem, também, à soma das condições naturais favoráveis com

a prioridade de comunicação com os vizinhos.

1 BERRY, Brian, Internal Structure of the City, (1965), in BOURNE, Larry, Internal Structure of the City, Oxford,

University Press, 1971, pp. 97-103. 2 CHRISTALLER, Walter, Central Places in Southern Germany, New Jersey, Prentice-Hall, 1966 (1933), p. 196.

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Em Cariacica, sucessivas etapas do desenvolvimento socioeconômico local determinaram drásticas

alterações nesta estrutura interna, que não foram assistidas por qualquer ação coordenada de

planejamento formal instituído. Desde a colonização agrícola no século XVII, que instalou unidades

portuárias no litoral e no ponto em que o rio Bubu deixava de ser navegável, e fundou o primeiro

núcleo urbano num sítio elevado, de onde se dominavam três vales cultivados, até a condição atual, a

centralidade mudou de lugar duas vezes.

A chegada do minério pela ferrovia Vitória a Minas, em 1940, remodelou as antigas instalações de

manutenção e manobra sobre o manguezal do Itanguá, de 1904, e a localização dos novos postos de

trabalho possivelmente resultou no desenvolvimento do núcleo vizinho em Itacibá, que passou a

disputar com o primeiro núcleo a condição de centralidade principal.

Posteriormente, já nos anos 1950, foi criado o arruamento de Campo Grande, num platô ao sul do

vale do Itanguá, a 6 km da costa, junto à cancela de travessia da Ferrovia Leopoldina. Inaugurada em

1895, a linha atravessava fazendas de gado na região e era, certamente, cercada, constituindo um

extenso limite à mobilidade no território.

Aquele único ponto de travessia terá sido o fator locacional de uma centralidade de fluxos, que

ensejou a iniciativa de urbanização. Mais recentemente, a implantação da CEASA, em 1977, no

restante da área plana vizinha, potencializou o desenvolvimento do bairro Campo Grande, que é hoje

o principal centro de comércio e serviços do município.

O núcleo original se conectava a uma estrutura de rotas regionais hidroviárias que atendia ao arranjo

produtivo agrário, baseado inicialmente na cana de açúcar. A nova centralidade em Itacibá

consolidou a rota da atual rodovia José Sette, de ligação com o núcleo original, quando a economia

local evoluiu para uma base industrial. A consolidação de Campo Grande se deve à sua conexão com

as rotas das rodovias BR-262 e BR-101 e a um novo ciclo econômico, de comércio e serviços.

A estrutura interna de Cariacica ainda mantém a Sede do município no sítio original, mas tem hoje o

núcleo em Campo Grande. Pela rodovia José Sette se vai a Itacibá e à Sede municipal, e as rodovias

federais, fazem a ligação com o restante do Espírito Santo e com os estados vizinhos.

A rota da rodovia José Sette deixa o vale do Itanguá subindo por um afluente ao norte, percorre

ondulações suaves a 40 m de altitude, desce para atravessar a várzea do rio Bubu e sobe novamente

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para encontrar a Sede municipal a 60 m, num desenho tipicamente tropeiro, que procura as

declividades adequadas aos animais de tração.

A rodovia BR-262 percorre, em Cariacica, as ondulações ao sul do Itanguá, procurando um traçado

relativamente favorável a 40 m de altitude e descendo para chegar à primeira ponte para Vitória, nas

proximidades da foz do rio Marinho.

A BR-101 parte da 262 junto à CEASA e atravessa a região sedimentar no rumo Norte, obedecendo

à mesma sucessão da José Sette, sem passar, no entanto, pela sede municipal, desviando-se para

nordeste após a travessia do rio Bubu.

Mapa 3 – Município de Cariacica Estrutura Urbana

Tal estrutura tem como peculiaridade a relativa desconexão entre o núcleo atual em Campo Grande e

o sistema Itacibá – José Sette – Sede. É compreensível que o projeto das rodovias federais tenha

evitado atravessar pequenos núcleos urbanos, privilegiando a mobilidade regional em detrimento do

acesso local.

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Mas a instalação da nova centralidade em função das rodovias, que ocorreu sobre um sistema de

rotas inteiramente novo, coincide com a instalação de novas atividades, que, de certa forma,

substituíram a base anterior da economia local. Há registros de que a base agrícola inicial evoluiu de

forma complementar à base industrial até os anos 1970, instalando unidades de beneficiamento de

matéria prima local – cana, carne, café, madeira – assim como do minério trazido pela ferrovia, na

Companhia Ferro e Aço de Vitória – COFAVI.

Este arranjo, no entanto, não sobreviveu à reestruturação econômica mundial dos anos 1980, que

deslocou o porto de minério para Tubarão, no município da Serra e lá instalou uma nova unidade

siderúrgica, a antiga Companhia Siderúrgica de Tubarão – CST, hoje Arcelor-Mittal. A sucessão

econômica deslocou o capital da pequena indústria para o comércio, para os serviços e para o ramo

imobiliário em Cariacica, parcelando e vendendo intensamente as terras agrícolas desativadas.

É neste contexto, de sucessivas transformações econômicas, que se refletem em evidentes adaptações

da base territorial das atividades, que se pode situar a construção do tecido urbano de Cariacica,

temperada pela peculiaridade local do relativo improviso no planejamento.

Os primeiros arruamentos projetados na cidade coincidem com a conclusão da ferrovia Vitória-

Minas e iniciaram um processo de expansão urbana nitidamente fragmentado, devido à precariedade

com que eram apreciados pelo poder público, somada à já descrita complexidade topográfica e à

incipiência técnica dos desenhos em si.

Os sucessivos traçados obedecem à combinação dos ditames das divisas das fazendas e das glebas

em que foram parceladas, com a conformação do relevo acidentado e com uma opção pela

ortogonalidade de desenho, que nem sempre se revela a mais adequada a cada caso.

A ausência de diretrizes gerais de desenvolvimento urbano – como o traçado preliminar de uma

estrutura de vias principais – possibilitou que cada arruamento novo fosse ingenuamente desenhado

como uma unidade autônoma, sem maiores preocupações com a conexão ao tecido circundante ou

com alguma estruturação interna.

Quando muito, uma praça, geralmente desenhada no centro de cada traçado, é o único elemento que

confere um caráter de singularidade a uma ou duas daquelas muitas ruas de mesma largura. No

entanto, muitas vezes, as condicionantes de acesso – incluído o improviso – resultam em conexões

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que não usam as ruas da praça, deformando seriamente a instalação do comércio e dos serviços junto

às vizinhanças residenciais.

A localização deste tipo de atividade nas cidades depende de uma combinação de fatores que podem

ser incrementados pelo desenho dos arruamentos, quando este inclui larguras maiores para as vias

que farão a conexão com o tecido pré-existente e com o tecido futuramente acrescido. Outro fator de

adequação dos traçados urbanos ao comércio e aos serviços ocorre quando um local de reunião –

praça ou largo – é desenhado numa esquina entre estas ruas principais ou, ao menos, ao longo de

uma delas.

Quando a crise no arranjo agroindustrial aqueceu o mercado de terras, nada mudou nos

procedimentos municipais, nem na técnica de desenho, e o processo somente se intensificou ainda

mais, resultando no intrincado e desconexo padrão de arruamento, mobilidade e centralidades

encontrado em Cariacica.

Cabe salientar um aspecto aparentemente contraditório em relação a este padrão de urbanização.

Cariacica recebeu, principalmente a partir da instalação do primeiro arranjo industrial, uma

considerável imigração de população de baixa renda, tornada ainda mais intensa após a sucessão para

a base de comércio e serviços.

Estes contingentes, no entanto, pouco se instalaram em terrenos espontaneamente ocupados,

predominando a aquisição – ou mesmo a invasão – de lotes em arruamentos formalmente

desenhados, ainda que muitos fossem irregulares, do ponto de vista legal. Há relatos, inclusive, de

processos de invasão que providenciaram a demarcação de ruas e quadras, dentro de padrões

similares aos demais, e que terminaram por se integrar indistintamente ao conjunto urbanizado da

cidade.

Desse modo é que predominam, no tecido urbano de Cariacica, as ruas intencionalmente desenhadas

antes da edificação, ainda que tal desenho padeça dos males descritos anteriormente. É notável a

pequena quantidade relativa de terras que evidenciam a urbanização em que o arruamento vai sendo

conformado pelas sucessivas edificações justapostas.

A julgar pela localização deste tipo de tecido espontâneo, nas imediações do porto de Santana e de

Itacibá, sua ocorrência pode ser creditada à dinâmica do ciclo industrial, somada a algum descuido

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na posse das terras nos morros de Aparecida e Presidente Médici, que ensejaram estes moldes de

urbanização.

Praticamente todo o solo urbano de Cariacica é mesmo feito de arruamentos formalmente

desenhados, que receberam o Uso e a Ocupação posteriormente. O Uso se distribuiu na exata medida

em que a legibilidade dos arruamentos conseguiu orientar razoavelmente um sistema de usos

diferenciados. A Ocupação ocorreu na medida em que os recursos privados para a construção

conseguiram atender aos requisitos elementares de salubridade e segurança das edificações.

Figura 1: Novos arruamentos em Vila Progresso, em 1989, 2005 e 2012. Fontes: RMGV –

Dinâmica Urbana na década de 90; e Google Earth, 2012.

1.2.1 O sistema viário existente.

Acesso, conectividade e oferta de transporte são importantes indutores da ocupação urbana e

interferem na organização do uso e distribuição da ocupação nas cidades. Além destes, destacam-se

os tempos de deslocamento e a disponibilidade de áreas ocupáveis.

No contexto metropolitano da Grande Vitória, a valorização da terra em áreas centrais,

principalmente na capital, e a conectividade territorial resultante da implantação da rede viária

Estadual e Federal, aliados a uma crescente população urbana, tornou recorrente a ocupação de áreas

distantes dos centros, mas conectadas a estes por eixos viários, de caráter e desenho muitas vezes não

urbano, que permitiam rápido acesso às áreas centrais. Assim, ao longo destas áreas de conexão e nas

áreas de interseção entre vias surgem novas ocupações e centralidades, com concentração de usos

comerciais, institucionais, serviços, entre outros.

Em Cariacica, o traçado viário principal é formado por eixos metropolitanos e rodovias federais e

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estaduais3 que assumem simultaneamente a função logística de escoamento de cargas portuárias e de

estruturação do tecido urbano, incorporados no arranjo do transporte metropolitano (TRANSCOL).

O transporte coletivo existente direciona uma parcela significativa da população de Cariacica para

áreas externas ao município, assim como parte da população de Viana, usuária do transporte coletivo,

é direcionada para Cariacica.

Este fato é resultado do formato da rede de deslocamentos e do sistema TRANSCOL, estruturado em

ligações troncais concentradas no município em torno da BR-262, e pela carência de uma

organização dos deslocamentos intramunicipais, dificultada ainda pelo traçado viário existente e

precariedade na infraestrutura, resultante de parcelamentos isolados e desarticulados.

Figura 2: Terminais do Transcol junto às vias principais, que coincidem com as rodovias federais

BR-101 e 262, e estadual ES-080. Fonte: CRUZ, 2011.

3 A BR-262, originalmente chamada BR-31, foi implantada no final dos anos 1950. O contorno metropolitano pela BR-

101 foi aberto e pavimentado nos anos 1970 e se tornou importante vetor de expansão da ocupação metropolitana no

sentido norte. A Rodovia estadual ES-080, conhecida como Rodovia José Sette é a mais antiga e conecta Vitória à

Sede de Cariacica e ao interior do estado, passando por Santa Leopoldina, mas só foi pavimentada após a abertura da

BR-262.

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No âmbito municipal, os trajetos predominantes pelas modalidades individuais não se sobrepõem aos

trajetos do modo coletivo. De ônibus, a população é direcionada aos terminais de integração, todos

localizados próximos à BR-262, ou para outros municípios, o que aumenta o tempo de viagem e

torna pouco funcional o deslocamento entre bairros e internamente pouco atrativo o modo coletivo

atual. As viagens entre as zonas de tráfego internas ao município nos modos individuais automóvel e

bicicleta se concentram em viagens no sentido nordeste-sudoeste, lógica de deslocamento diversa da

predominante: norte/ BR-262; sul/ BR-262 e esta seguindo o sentido Leste-Oeste.

Vale destacar que os problemas de conectividade esbarram em outra questão não menos importante

que é a ausência de uma hierarquia viária clara e de infraestrutura viária adequada, seja em

dimensionamento ou características físicas. Como exemplo, a Rodovia José Sette e a Estrada para

Caçaroca, principais conexões urbanas no sentido norte-sul, revelam uma problemática ainda maior

relacionada ao planejamento da organização interna de Cariacica: estruturas viárias incapazes de

absorver as demandas atuais e o crescimento da cidade sem altos investimentos em desapropriações.

Tais vias também são carentes de espaço para a circulação pelos modos não motorizados de

deslocamento.

Figura 3: Rodovia José Sette, sem infraestrtutura básica e de dimensionamento inadequado

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Figura 4: Estrada de Caçaroca, sem infraestrutura básica e com conflitos entre ciclistas e

motoristas.

Considerando a potencialidade de um atendimento mais imediato, a possibilidade de redução dos

deslocamentos e melhorias na mobilidade municipal, seriam indicadas linhas de transporte coletivo,

ciclovias e calçadas conectando as vizinhanças às centralidades mais próximas, entretanto,

comprometido com a articulação metropolitana, o TRANSCOL não promove tal conectividade,

tampouco atende a demandas específicas de Cariacica. Desta forma, destaca-se a necessidade de

planejamento da estrutura viária interna e a revisão do formato de transporte predominante para

melhoria na conectividade interna.

Um exemplo de organização de usos pouco referenciada nos percursos do transporte coletivo atual

são as centralidades municipais, que agrupam atividades, serviços e comércio de atendimento local.

Retomando as pesquisas de origem-destino do PDTU-2007, ao traçar um diagrama as linhas de

desejo entre origens e destinos internos ao município, agrupadas em zonas de tráfego, é possível

identificar o predomínio de deslocamentos na direção Nordeste-sudoeste entre as zonas de tráfego de

Campo Grande, Itanguá e Porto de Santana pela concentração de viagens no modo individual –

automóvel e bicicleta.

Estas zonas, por sua vez, apresentam atratividade significativa e relação de troca com as zonas de

tráfego de Jardim América, Alto Laje, Itaquari, Porto Santana, Piranema, São Francisco, Rosa da

Penha, São Geraldo e Bela Aurora. O resultado é um indicador de possibilidades e necessidades de

conexões internas no município que não têm sido atendidas pelo traçado viário principal existente.

Atualmente os fluxos internos são direcionados para os terminais, o que aponta a divisão do

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município em duas partes: norte e sul da BR-262. A partir dos terminais de integração, torna-se mais

fácil o acesso a áreas centrais de outros municípios, como Vitória e Vila Velha que às centralidades

internas de Cariacica, pois o maior número de linhas do transporte coletivo se concentra na BR-262.

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Figura 5: Linhas de desejo, segundo as origens-destinos internos ao município: concentração de

demandas no eixo nordeste-sudoeste.

Fonte: Pesquisa OD do PDTU 2008, adaptada por Marco Romanelli.

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Figura 6: Percursos principais das linhas troncais. Em laranja, os percursos atuais; em verde, os

percursos possíveis com a conclusão de novas conexões.

Fonte: CRUZ, 2011

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1.2.2 Os diversos desenhos.

Reconhecida a importância de Cariacica na conexão entre a capital e os principais eixos viários

federais, assim como na absorção de atribuições de caráter produtivo e logístico no contexto

metropolitano, não lhe faltam projetos viários. Alguns destes buscam rever a conectividade

metropolitana, outros promover novas áreas de expansão urbana e industrial e existem ainda aqueles

com o intuito de reduzir a distância entre Rodovias Federais e a capital Vitória ou áreas portuárias de

Vila Velha.

Dentre as proposições para o rearranjo viário de Cariacica, destacam-se projetos de novos traçados e

conexões e definições de hierarquias que, a principio, permitiriam o ordenamento do tecido existente

e a abertura de áreas de expansão urbana/ portuária/ industrial. Outra proposta de destaque, e

recorrente nos projetos, é a Quarta Ponte, nova conexão com a capital, que abre novas possibilidades

de acesso entre BR-101 e região norte de Vitória.

Na linha das novas conexões metropolitanas, os Estudos de Projetos e Obras Priorizadas para o

Sistema Viário da RMGV, elaborado pelo COMDEVIT – Grupo técnico de Mobilidade Urbana –

GTMU, propõem, além da construção de uma Quarta Ponte conectando Cariacica a Vitória, duas vias

paralelas à BR-101 Contorno, uma como desvio da BR-101 externo à área urbana atual, outra como

via interna, próxima à Baía de Vitória, conformando um anel que liga a região de Porto Santana à

região do Alphaville (Serra), Carapina, Aeroporto, Rodovia Serafim Derenzi e Quarta Ponte,

retornando a Porto Santana. Estão incluídos neste estudo, a rodovia Leste-oeste, que conecta Vila

Velha à BR-101, ao sul de Cariacica, rodovias de contorno à área urbana de Cariacica, Serra e Vila

Velha. São propostas viárias de caráter expansivo, sem enfoque na estruturação interna dos

municípios ou no tecido urbano e usos existentes na metrópole, ou seja, seus traçados atravessam

áreas não urbanas e regiões ainda desocupadas.

No âmbito municipal, a Companhia de Desenvolvimento de Cariacica elaborou o Plano Diretor

Viário Urbano em 1998, que evidencia, em suas considerações iniciais, uma necessidade de integrar

Cariacica aos municípios vizinhos de atender a demandas econômicas e produtivas e se propõe a

ordenar o traçado viário interno, por meio da interligação dos bairros e do desenvolvimento de uma

rede viária articulada e contínua ao existente na metrópole.

A influência de projetos estaduais para a metrópole e do segmento econômico é evidente nas

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considerações iniciais e nos projetos que também apresentam um caráter expansivo do tecido urbano.

Num enfoque mais local, apenas projetos como alargamentos e redesenho de vias aparecem como

solução para a problemática do ordenamento municipal.

O plano define basicamente corredores metropolitanos, vias arteriais e eixos coletores, com o

enfoque no traçado e caixa viária para deslocamentos motorizados e dimensionamentos de calçadas e

canteiros. Tem ainda como diretrizes básicas para a definição dos traçados das vias: o

aproveitamento do fundo de vales; aproveitamento de áreas não parceladas ou ocupadas; utilização

de faixas de domínio da Escelsa/ Furnas; aproveitamento das vias de maior porte dos loteamentos;

adoção de binários de tráfego; aproveitamento do leito da ferrovia Leopoldina como corredor de

transporte em massa.

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Mapa 4: Mapa com traçados viários propostos pelo Conselho de Desenvolvimento da Grande

Vitória.

Fonte: Comdevit

Vale ressaltar que os projetos não possuem a intenção de conter a expansão urbana e solucionar

questões como o ordenamento interno ao perímetro atualmente ocupado, ao contrário, ampliam a

extensão do território acessível pelo meio rodoviário, conforme o planejamento Estadual.

O projeto elaborado pela Associação Empresarial de Cariacica para a Agenda 21 do município,

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intitulado Identificação de Vocações e Projetos Estratégicos para o Desenvolvimento Sustentável de

Cariacica: estudo da logística e do transporte de cargas e de pessoas reforça projetos Estaduais e o

Plano Diretor Viário Municipal, como a abertura de novas rodovias e ampliação e melhoria de

acessos a áreas vazias com o intuito de abrigar atividades econômicas relacionadas à produção,

armazenagem e processamento de cargas. Defende a abertura de novas conexões externas ao

perímetro urbano, definindo um anel viário, conforme imagem abaixo, e a ampliação de áreas para

expansão do tecido. As propostas reforçam as intenções estaduais.

Figura 7: Em cores, os traçados viários propostos, com destaque em branco para a quarta ponte, à

esquerda.

Fonte: Associação Empresarial de Cariacica - AEC

Considerando a existência de vazios, áreas naturais degradadas ou áreas passíveis de grandes

transformações dentro do tecido urbano, como a fazenda do Estado, as áreas da Vale e os

manguezais e rios existentes, é visível o aproveitamento destas áreas para as conexões propostas,

sobretudo com a função da articulação metropolitana, que por vezes são capilarizadas e assumem

características de vias coletoras para uma distribuição nos acessos.

Percebe-se que o sistema viário proposto intenciona ainda a valorização de terras privadas e a

viabilidade de parcelamentos, principalmente em Vila Velha e grande parte da região sul e norte do

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município, ao longo da BR-101. Tal constatação apresenta o paradoxo entre investimentos públicos e

seus reais beneficiários.

Pode-se afirmar ainda o caráter expansivo e a falta de indicações e soluções para o tecido existente, a

exemplo o traçado alternativo à Rodovia José Sette, o que demonstra a intenção de criação de novas

áreas urbanas em detrimento da revisão do existente, dada a complexidade do tecido.

Figura 8: Em verde, proposta de nova ligação entre o novo contorno e Itacibá, evitando passar

pela Sede.

Fonte: AEC.

Este projeto sugere ainda, a retomada do transporte hidroviário integrado a um sistema multimodal

utilizando os estuários existentes do Rio Santa Maria e da Baía de Vitória com fins logísticos e para

reorganização dos espaços retroportuários. Entretanto, não apresenta articulação com o contexto de

usos urbanos existentes e pretendidos para as áreas de impacto do projeto.

O estudo reforça a necessidade do município de Cariacica se adequar para integração aos projetos

previstos na metrópole e capital, como Portal Sul e o BRT que também assumem um caráter

econômico desenvolvimentista, conforme apresentado na conclusão. Ou seja visam melhorias nas

interfaces municipais, conexões logísticas, sem contudo se aprofundar na problemática municipal de

uso e ocupação do solo ou relacionadas à conexões internas.

Por outro lado, o Plano Diretor Municipal reforça, em sua Política de Mobilidade Urbana,

proposições voltadas para a formação de uma hierarquização viária estruturada, que ainda depende

da formatação de um Plano de Mobilidade Municipal para associar projetos viários às demandas de

mobilidade urbana existentes e projetadas. O plano insere a escala e leitura local, com indicação dos

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deslocamentos intra-urbanas entre centralidade e centralidades identificadas, por meio de um projeto

geral de vias para veículos automotores e cicláveis. Entretanto, demonstra a necessidade de

aprofundamento do tema, deixando a cargo da formatação de um Plano de Mobilidade Urbana

Municipal a discussão, desenvolvimento e detalhamento dos projetos necessários e desejados.

Por meio da identificação de áreas com concentração de atividades de comércio, serviços e

institucional, nas escalas regional e local, caracteriza dois formatos de centralidade para os quais

propõe ações e estímulos à ocupação e adensamento.

Assim, por meio de conexões entre vizinhanças, propõe eixos de dinamização que são vias coletoras

com funções de conexão e concentração de atividades de caráter central, que devem ser revistos em

sua extensão.

Mapa 5: Mapa do PDM localizando centralidades principais e secundárias, além de rotas

cicloviárias. É evidente a necessidade de detalhamentos e aproximações.

Fonte: PDM, 2007

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Mesmo com a tentativa de associar usos à malha viária, o PDM mantém a estruturação e

hierarquização do Plano Diretor Viário de 1998, atualizando alguns dados e prevendo um conjunto

de vias de integração dos bairros do município, atualmente dependentes das rodovias federais, BR-

101 e BR-262 e da rodovia estadual ES-080. O plano prevê melhores articulações na região sul com

o município de Vila Velha e o deslocamento de fluxos de passagem, como os de carga, para áreas

externas ao tecido urbano, mas igualmente amplia a rede viária para além dos limites urbanos,

aumentando o risco de pressões sobre áreas de características ainda rurais.

Outro projeto igualmente importante, porém mais recente, o Estudo Integrado de Uso e Ocupação do

Solo e Circulação Urbana da Região Metropolitana da Grande Vitória, afirma que

“A atual dinâmica demográfica e econômica da Região, que se expande especialmente a

partir das conexões entre a Ilha e o continente, exige um planejamento criterioso das

novas intervenções que, necessariamente, devem ser precedidas de um novo

macrozoneamento metropolitano, visando assegurar, não só condições de conectividade

e mobilidade, mas a ocupação ordenada e sustentável das áreas de expansão urbana e

ambiental nos diversos municípios.” (p.12)

Assim, o estudo, em seu discurso, propõe repensar a metrópole de forma integrada: qualidade

ambiental, adensamento, ações no campo econômico, ocupação territorial e capacidade viária para

deslocamentos, em suas escalas locais e metropolitanas.

Com este fim, elenca como pontos estratégicos a serem perseguidos: “a estruturação de um sistema

metropolitano de transportes que leve em consideração os reais desejos de deslocamento; a

construção de uma malha viária local que permita aos municípios uma melhor estruturação e

expansão de sua dinâmica econômica; contínuo movimento para retirada do fluxo de carga pesada

dos centros urbanos, sobretudo das regiões retroportuárias; e melhoria das condições de conexão

entre os municípios”.

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Figura 9: À esquerda, estrutura viária metropolitana; à direita, estrutura viária em áreas

conturbadas. É visível a expansão urbana ao norte e ao sul de Cariacica.

Fonte: Estudo Integrado, Comdevit, 2010.

A estruturação viária metropolitana proposta apresenta dois enfoques distintos: rede viária

estruturadora metropolitana, com o objetivo de promover aumento da velocidade média e

automaticamente aumentar o alcance metropolitano; e rede viária metropolitana de áreas conurbadas,

com o objetivo de reforçar a conurbação do tecido e alterar rotas sobrepostas sobre as vias mais

centrais da rede. Numa breve leitura dos mapas, é possível identificar que ambos os projetos

impulsionam a ampliação do acesso ao sul e norte de Cariacica, potencializando uma especulação

fundiária e possível expansão do tecido urbano.

Por outro lado, ao avaliar o mapa das áreas de transformação urbana de interesse metropolitano, é

curioso que não apareçam a região de inserção da Quarta Ponte, e a região sul de Cariacica.Além

disso, o município concentra o maior número de áreas especializadas industriais e logísticas,

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informação que vai ao encontro dos demais projetos estruturadores do sistema viário.

Figura 10: Lista de projetos para Cariacica, sistema viário estruturador metropolitano da Grande

Vitória.

Fonte: Estudo Integrado, Comdevit, 2010

Estas vias delimitam em grande parte as áreas classificadas para indústrias e logística, ou seja, ocorre

uma migração de parte dessas atividades de Vila Velha em sentido à BR-101 e BR-262.

Figura 11: Áreas classificadas como especializadas industriais e logísticas, que podem ser

associadas aos projetos de características expansivas do tecido.

Fonte: Estudo Integrado, Comdevit, 2010

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1.2.3 Comparação entre os diversos projetos.

Para entendimento do conjunto de proposições para estruturação viária do município, foram

transferidos para uma mesma base cartográfica os traçados viários dos planos e projetos acima,

sobrepostos ao traçado viário existente e à malha urbana atual. Em seguida, foram agrupados por

ocorrência, ou seja, traçados que se repetem em duas, três, quatro ou cinco propostas. Foi incluída

como proposta a sugestão de traçado desenvolvida pela equipe de pesquisa de uso e ocupação do

solo desta Agenda, que tem por objetivo inicial uma intenção de exploração das possibilidades de

ampliação da conectividade entre os bairros, formando uma malha que pode incorporar a função de

vias coletoras e promover as ligações entre bairros e centralidades, prejudicadas pela desconexões,

restrições de dimensionamento e relevo.

Com a sobreposição dos projetos é possível fazer algumas constatações tais como:

O Plano Viário Municipal de 1998 e Projeto da Associação de Empresários de Cariacica apresentam

estreita relação com os projetos do COMDEVIT, ou seja, as proposições são semelhantes e visam a

ampliação da malha viária para além dos limites urbanos, criando de novas áreas destinadas à

atividade logística, industrial e retroportuária. A implantação de tais propostas resultaria na

ampliação da conectividade territorial para além das áreas ocupadas, dificultando o controle e

direcionamento dos usos previamente estabelecidos pelo PDM. Os rearranjos internos propostos por

ambos estão relacionados à adequação do município para implementação de projetos metropolitanos

e estaduais: Quarta Ponte; ligações entre a BR-101 e Vitória, desviando da área central da Capital;

conexões leste-oeste ao sul de Cariacica; via marginal ao Rio Marinho; vias próximas à Baía de

Vitória, permitindo acesso às área lindeiras ao norte. Pequenas variações de traçado demonstram que

o Plano Viário Municipal apresenta algumas soluções de caráter local, mas vinculadas ao

ordenamento dos fluxos metropolitanos.

As propostas do Plano Diretor de Transporte Urbano de 2001 se sobrepõem parcialmente ao Plano

Viário Municipal de 1998 e ao Plano Diretor Municipal, um híbrido entre propostas locais e

metropolitanas onde prevalece a intenção de permitir maior acesso ao transporte coletivo, ou seja

concentra propostas de capilarizar a malha, permitindo novas conexões entre os municípios vizinhos

e Cariacica.

O Plano Diretor Municipal reforça a necessidade de romper a barreira estabelecida pela BR-262,

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com proposições no sentido norte-sul, além de uma maior capilaridade viária. Apresenta proposições

mais contidas no perímetro urbano com poucas vias em áreas rurais ou ambientalmente frágeis.

Reforça a necessidade de tratamento viário diferenciado nas centralidades, eixos de dinamização e

nós viários identificados, áreas definidas pela concentração de fluxos e atividades e onde

potencialmente podem ocorrer conflitos relacionados aos fluxos.

Num primeiro esboço de conexões que permitam otimizar o relacionamento entre bairro vizinhos e

bairros e centralidades, a proposta para esta agenda visa melhorar as conexões internas do município,

capilarizar a malha viária, infraestruturando os percursos, permitindo opções de trajetos internos ao

território de características urbanas.

Ao sobrepor as proposições, percebe-se que as vias de caráter expansivo são as que mais divergem

em traçado, provavelmente pela falta de uma via preexistente ou por indefinições de ordem técnica

ou fundiária.

Assim, as ocorrências de propostas foram processadas de forma que o inicio e fim destas vias fossem

em áreas próximas, caracterizando mais uma intenção de ligação que o traçado propriamente dito. Os

traçados indicados comuns às cinco propostas analisadas visam, prioritariamente, a conexão de

Cariacica com municípios vizinhos.

Todos os projetos destacam a importância de intervenções na BR-262 e BR-101, para adequação das

integrações metropolitanas, com propostas nessa escala, voltadas para o desvio de tráfego de

passagem da área central urbana, e que apresentam grande impacto sobre as formas de uso e

ocupação pré-existentes.

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Figura 12: Propostas comuns aos cinco projetos analisados.

Figura 13: À esquerda, necessidade de melhorias na BR-101; à direita, BR-262, eixo

metropolitano institucional, comercial e de serviços.

Fonte: Consumeta, 2011.

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Nas propostas com ocorrência em quatro projetos, destacam-se as conexões que visam integrar os

grandes eixos metropolitanos e estaduais ou promover o deslocamento e distribuição de grandes

fluxos internos, como melhorias na ES-080, na Rodovia José Sette, na estrada de Caçaroca, e na via

marginal ao Rio Marinho (parcialmente existente, faltam conexões com o traçado viário principal).

As últimas vias demonstram a intenção de ocupação da região sul, no limite entre Cariacica e Vila

Velha.(fluxos, atratividade)

Figura 14: Avenida Alice Coutinho, ligação não concluída com Vila Velha.

Fonte: Consumeta, 2011

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Figura15: Propostas comuns a quatro dos projetos analisados.

Numa leitura das sobreposições de três projetos, são poucos os acréscimos de propostas quando

comparados aos projetos com quatro ocorrências. Nesta sobreposição já aparecem ligações que

visam estruturação e expansão urbana local. De forma geral, as proposições acima apontam duas

direções de projeto: uma de revisão da hierarquia viária existente, por meio de intervenções que

ampliem as capacidades viárias ou revisão do formato de uso (por exemplo, leito da ferrovia

incorporando função urbana de ligação entre terminais de integração TRANSCOL) e outra de

adequação da cidade às novas vias metropolitanas previstas, ou seja a distribuição dos fluxos futuros.

As duas situações resultam na ampliação da conectividade territorial e provável especulação das

terras beneficiadas pelos novos traçados.

A ampliação da conectividade interna de áreas já consolidadas não aparece como princípio neste

mapa de sobreposição de três projetos, fato perceptível nas grandes extensões de áreas urbanas

parceladas e/ou já ocupadas sem vias principais como a região ao sul de Campo Grande e a região a

oeste e norte de Porto de Santana.

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Figura 16: Propostas que ocorrem em três dos projetos analisados.

Numa última relação entre projetos e proposições, traçados com pelo menos duas ocorrências se

dividem em dois tipos: propostas de características expansionistas, principalmente voltadas para

ampliação de áreas disponíveis para projetos econômicos de escala estadual e nacional (logísticos,

portuários, industriais); e propostas de revisão da hierarquia viária existente interna ao tecido urbano,

por meio do aumento da capacidade das vias (ampliação das caixas viárias), inserção de novas

conexões e transposição da BR-262 na região central no sentido norte-sul. Neste mapa, algumas

áreas seriam atendidas pela ampliação das possibilidades de percurso, entretanto outras continuam

dependentes das rodovias federais e de extensos percursos para deslocamentos intra-municipais,

como a região ao sul de Jardim América (dependência da Rodovia Leste-oeste); região de Porto de

Santana e Flexal, fluxos direcionados para a BR-101, Rodovia José Sette e Avenida Vale do Rio

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35

Doce.

Embora não constem no mapa as conexões internas a Viana, percebe-se a formação de uma ligação

entre Novo Horizonte e ES-447, ou seja, entre Novo Horizonte e o litoral de Vila Velha. Associando

esta ligação ao anel viário formado com Cariacica Sede e região do Mochuara, existe uma clara

intenção de exploração e ocupação destas áreas, que terão uma aproximação com o litoral por meio

da ES-447. Embora o projeto da Quarta Ponte se apresente como uma necessidade de nova conexão

entre a BR-101 e a área norte de Vitória, este projeto traz novos usos e formas de ocupação para a

região entre Porto de Santana e a BR-101.

Figura 17: Propostas recorrentes em dois dos projetos analisados.

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1.2.4 Considerações.

O tecido urbano de Cariacica caracteriza-se como uma colcha de retalhos formada por parcelamentos

desconectados, carentes de uma rede viária estruturante capaz de organizar e absorver o

crescimento, a expansão e o adensamento urbano.

Figura 18: Tecido urbano em Cariacica, como uma colcha de retalhos.

Fonte: Google Earth, 2012.

Projetos de caráter expansivo são preocupantes no município, que ainda não solucionou as questões

urbanas complexas de ordenamento territorial do tecido existente. Considerar o território urbano

atual como dado e propor para além dele é arrastar para frente questões preocupantes nos aspectos

territoriais e sociais. Afinal, a quem se destina a “Nova Cariacica”? Como tratar as demandas dos que

vivem a cidade e otimizar sua inserção metropolitana sem ignorar o que já está posto?

Outro fator preocupante é a falta de definições de áreas urbanas e uso do solo compatíveis com a

projeção de crescimento do município. O crescimento proposto ocorrerá, de acordo com os projetos,

de forma expansiva com pouco adensamento de áreas atualmente ocupadas, até mesmo pela aparente

incapacidade de densificação do tecido existente por carência de infraestrutura adequada.

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Preocupante se considerarmos o aumento da especulação da terra que, apenas com a divulgação de

tais projetos, já passam por um processo de supervalorização imobiliária. Como viabilizar projetos

que dependem de desapropriações numa situação como esta? Fazer valer os instrumentos do Estatuto

da Cidade requer também o resguardo municipal, para que seja viável intervir de forma planejada.

Da mesma forma, o zoneamento municipal deve passar por revisões estabelecendo relações com os

projetos de conexões viárias necessárias, principalmente para melhoria dos deslocamentos internos e

reordenamento do tecido.

As propostas tratam o sistema viário como elemento de expansão urbana e estruturação

metropolitana que, caso seja desvinculado de atuação municipal tende a agravar os problemas

relacionados a fluxos de passagem, ocupações irregulares e expansão do tecido a infraestruturar para

ocupação.

1.3 Os arruamentos em Cariacica.

Os arruamentos de Cariacica têm quadras com cerca de 50 x 170m (0,85ha), divididas em lotes com

11 x 24m (264m²) em média. Este é um modelo convencional e razoavelmente enquadrado nos

padrões corriqueiros nacionais da urbanização formal de classe média. Se não foge à regra em

tamanho, no entanto, seu desenho indica alguma simplificação dos empreendimentos.

O parcelamento das quadras é singelo, geralmente em duas fileiras de 15 lotes idênticos, sendo

pouco comuns as fileiras com testadas para os lados menores das quadras. As testadas variam entre 9

e 12m, sendo estas últimas comumente combinadas com a profundidade de 20m, ensejando o

artifício de divisão em dois lotes de 6 x 20m encontrado algumas vezes.

As larguras do arruamento, como já mencionado, são nitidamente uniformes em cada fração

desenhada, oscilando entre 6 e 11m (média 9,5m). Raramente se encontra o que possa ser

evidentemente a “rua principal” porque é mais larga que as demais. A conurbação de vários

arruamentos encadeados em sequência já prenuncia o problema da falta de capacidade de tráfego nas

vias que acabaram sendo improvisadas como acesso e passagem.

Os traçados das ruas raramente se encurvam para seguir a topografia e são, quase sempre, retilíneos,

apesar do terreno acidentado. Isto resulta em freqüentes casos de inclinação exagerada das ladeiras,

muitos lotes com a drenagem para os fundos, (e não para a testada) e diversas ruas em descida que

terminam sem saída, no limite de uma área de várzea.

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O padrão típico de traçado das ruas em Cariacica é lançar um alinhamento mestre na cota mais alta

de um platô e acrescentar paralelas e transversais, em cotas mais baixas à medida que se afastam do

primeiro, interrompendo o traçado nas declividades excessivas. Ocasionalmente há uma via

contornando o arruamento e delimitando a área não urbanizada com um logradouro público.

Figura 19: Padrão típico de inserção topográfica dos arruamentos

Isto acarreta os previsíveis problemas com a pavimentação e a circulação de veículos, nas ruas muito

inclinadas ou mesmo com inclinação transversal, além de levar a drenagem de um lote para dentro de

outro, e de todos para áreas que deveriam ser de preservação.

A hidrografia do sítio urbano de Cariacica tem literalmente dezenas de leitos de drenagem natural,

com ou sem a presença perene de cursos d’água, e que se dirigem aos córregos e rios de maior porte

que definem a conformação geral do relevo. As encostas desses pequenos rincões são íngremes, às

vezes não mais do que taludes de porte médio, e outras vezes são extensas e cortadas pelo

arruamento.

Desse modo, em vários locais, remanescem porções de terreno alagado e manchas rarefeitas de

vegetação. Seria uma paisagem ideal de platôs urbanizáveis separados por córregos, bosques e

lagoas, não fossem os problemas sanitários que o caráter do assentamento impõe a este tipo de

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ambiente. A conformação dos traçados, combinada com a quase total inexistência de sistemas de

drenagem sanitária e pluvial, implica no seu lançamento em sumidouros de infiltração ou mesmo a

céu aberto.

A previsível contaminação do lençol freático e dos corpos d’água perenes é um lugar comum no

imaginário da população, que costuma se referir indistintamente a qualquer os leito de drenagem

como ‘valão’, mesmo que se trate de um canal em meio à relva descampada. A rigor, ‘valão’ é o

resultado da edificação ou arruamento diretamente sobre a margem do curso d’água, que também

ocorrem com freqüência em Cariacica.

Aqui está um problema sério do município, que, pelas carências várias combinadas com outras tantas

urgências, vai sendo deixado no fim da lista de prioridades, enquanto a água onipresente na paisagem

é tratada como esgoto. Mais cedo ou mais tarde, no entanto, por bem ou por mal, a despoluição

deverá entrar na ordem do dia.

Figura 20: A cultura do ‘valão’: edificação sobre a margem do curso d’água.

1.3.1 Os arruamentos de padrão sub-normal.

Na predominância dos arruamentos projetados, existem algumas áreas onde se percebe que o traçado

resultou da justaposição das edificações, sem obedecer a um desenho prévio. Isto ocorreu tanto em

encostas quanto em terrenos planos, sempre sob o risco dos desmoronamentos, nas primeiras, e dos

alagamentos, nos últimos.

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Se a situação de instabilidade de encostas tem se tornado pouco presente no noticiário da cidade, a

questão dos alagamentos permanece cotidianamente viva. No entanto, isto não retira de alguns

arruamentos em morros o caráter sub-normal, principalmente quanto à geometria das vias.

Podemos classificar a sub-normalidade dos arruamentos de Cariacica em dois tipos: primeiro, o que

se refere a insuficiências das estruturas espontânea e cumulativamente demarcadas. As ruas podem

ter problemas de curvatura, declividade, largura, inclinação transversal e freqüência. Este último caso

ocorre quando faltam conexões internas ao arruamento, tornando os percursos incomodamente

longos.

Figura 21: O arruamento de padrão sub-normal e um típico ‘beco’, no bairro União

O caso mais comum é mesmo o da largura insuficiente do logradouro público, que impossibilita o

acesso veicular e prejudica seriamente a salubridade da edificação que dele depende para a

iluminação e a ventilação. A cultura do ‘beco’ de acesso exclusivamente pedestre a vários endereços

é tão comum quanto a do ‘valão’, não sendo difícil encontrar várias situações em que um leva ao

outro: o ‘beco’ começa na rua e termina no ‘valão’...

Os ‘becos’ muitas vezes não chegam a 2m de largura, mas o arruamento sub-normal do tipo

insuficiente opera, em média, com 6m, que permite o acesso de veículos, ainda que limitado. Este

tipo de insuficiência exerce um forte determinismo espacial sobre essas porções do tecido urbano,

uma vez que o arruamento é delimitado pela a fronteira entre o solo público e o solo privado.

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Esta fronteira é um dos mais duradouros atributos das cidades, e, uma vez demarcada e reconhecida

pela comunidade de habitantes, dificilmente é alterada. Quando a demarcação resulta em alguma

deficiência, é provável que assim permaneça por gerações. O tecido urbano cujas ruas nascem

geometricamente pobres está praticamente condenado a permanecer pobre, por mais que enriqueçam

seus moradores.

Por outro lado, é também possível que as carências da população sejam tão intensas, que nem mesmo

o reconhecimento da fronteira original do espaço público se consolide. Há níveis de pobreza e de

estranhamento da vida urbana que podem conduzir uma população a um profundo fatalismo quanto à

sua capacidade de influir sobre o seu ambiente.4

Em Cariacica, são encontradas manifestações dos dois extremos: existem bairros consolidados que

externam a evidente disparidade entre os padrões da edificação, que incorporou os benefícios da

prosperidade dos moradores, e os padrões do arruamento, que manteve a geometria insuficiente do

assentamento original.

Figura 22: À esquerda, disparidade entre os padrões do arruamento e da edificação; à direita,

invasão da rua, comprometendo seriamente o espaço público.

4 HALL, Peter, Cidades do amanhã, São Paulo, Perspectiva, 1995 (1988), p. 280.

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E existem também aqueles em que um arruamento geometricamente aceitável foi deformado

irremediavelmente porque a própria população não se sentiu proprietária daquelas ruas e as deixou

ao sabor das individualidades mais ou menos comprometidas com o bem comum.

O segundo tipo de sub-normalidade encontrado em Cariacica é caracterizado pela ausência de

estruturas essenciais à instalação das facilidades urbanas. Trata-se, especificamente, do caso em que

o limite de uma área que não deva ser ocupada não é uma rua ou equivalente.

O único meio razoavelmente eficiente de manter uma área interna à cidade isenta de urbanização é

delimitá-la com um logradouro público. Assim, criam-se os meios para controlar o acesso e coibir a

invasão de terrenos que não devam ser urbanizados.

Todas as áreas de preservação, todos os declives acentuados, todas as faixas de domínio dos leitos de

drenagem e corpos d’água deveriam ser circundados por ruas. De um lado delas, a ocupação lindeira

convencional, do outro, a área não urbanizada. E ao longo dessas ruas, o controle sobre a integridade

da preservação, feito pela presença dos habitantes e pelo acesso do poder público.

Em Cariacica, como já mencionado, há casos em que o arruamento não contém uma ‘rua perimetral’,

ficando divisas de lotes particulares a demarcar o limite da urbanização. Nesses casos, tanto a

privacidade do controle sobre essas divisas quanto a indefinição do ‘fim’ de algumas ruas, são um

convite à elasticidade da fronteira da área urbanizada.

Tanto um lote pode ser aumentado, quanto uma rua pode ser estendida, acrescentando mais lotes,

sempre adentro de uma área que não deveria ser ocupada. Mesmo nos casos em que existe a ‘rua

perimetral’ é comum encontrar a ocupação em seus dois lados, evidenciando que a presença dos

vizinhos não desencorajou a invasão da área pública.

Outro caso de estrutura urbana ausente é aquele em que o arruamento chega à margem do corpo

d’água, ou, mais grave, a ocupação é edificada sobre esta margem. São comuns os lotes em que a

divisa de fundo é exatamente o ‘valão’. Mais ainda, há muitas testadas de frente dos lotes sobre a

margem da água, sendo necessário improvisar pequenas pontes para o acesso ao terreno.

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Figura23: À esquerda, a propriedade privada no limite da área de preservação; à direita, a

edificação de frente para o ‘valão’.

Os dois tipos de sub-normalidade aqui apontados não parecem, à primeira vista, de determinante

influência sobre o cotidiano da cidade. O segundo tipo tem relação direta com os problemas já

levantados de poluição sanitária e também com o controle dos alagamentos.

Quando for necessário drenar o esgoto sanitário no tecido urbano de Cariacica para tratamento antes

do lançamento no meio-ambiente, sua captação necessariamente deverá ser feita ao longo dos leitos

de drenagem natural, circundando os arruamentos. As ruas perimetrais são o lugar ideal para a

instalação dessa rede de captação.

E onde for necessário drenar a chuva eficientemente para os leitos naturais, sua condução

preferencialmente deverá ser feita por redes instaladas em solo público. Os inúmeros casos em que

um lote drena para dentro de outro, ou em que a seção de um ‘valão’ edificado em ambas as margens

é insuficiente para a carga da bacia a montante demandarão soluções delicadas. No mínimo, acerto

entre vizinhos, no máximo, reassentamentos extensos de moradores antigos.

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Mapa 6: Município de Cariacica Arruamentos Sub-normais

O primeiro tipo de sub-normalidade talvez comece a dar sinais de que pode vir a se transformar num

problema. A geometria das vias é determinante da sua capacidade de operação do tráfego de

veículos. Praticamente todo o tecido urbano de Cariacica é desprovido de vias capazes de coletar e

transportar volumes de tráfego muito maiores do que os atuais.

Como descrevemos antes, cada arruamento tem suas ruas de cerca de nove metros não

necessariamente desenhadas para a conexão com os arruamentos vizinhos. Os corredores de

circulação que atravessam a cidade são encadeamentos improvisados de várias dessas ruas ou vias

abertas à custa da remoção de moradores.

As exceções são a rodovia José Sete e uma ou outra via pré-existente aos arruamentos vizinhos e que

o acaso determinou que fossem mais largas e contínuas, como a estrada de Caçaroca, ao extremo sul,

o antigo leito da Estrada de Ferro Vitória a Minas, na margem direita do rio Itanguá e a via paralela à

Ferrovia Centro Atlântica, em Campo Grande.

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1.3.2 Os lotes vagos e os vazios urbanos.

Se a capacidade insuficiente ainda não se manifesta em todos os lugares onde é visível, podemos dar

graças à grande quantidade lotes vagos ainda restantes em muitos arruamentos. Uma estimativa

visual a partir de imagens aéreas indica que algo entre 20 e 30% dos lotes demarcados em Cariacica

não estão edificados.

Há regiões mais densas, como no entorno imediato da rodovia BR-262 e sua extensão para o sul,

mas, mesmo ali é possível encontrar lotes desocupados. Nos limites norte e oeste do tecido urbano,

há arruamentos praticamente vazios, conformando um considerável estoque de terra demarcada na

cidade.

Outro aspecto notável do arruamento em Cariacica é a presença de significativos vazios urbanos.

Grandes porções de território sem arruamento remanescem completamente circundadas pelo tecido

consolidado, devido a fatores diversos.

No extremo norte, junto à sede municipal, os vazios ilustram o que possa ter sido um excesso de

otimismo da atividade imobiliária dos anos 1970. Ali se pode ver que a oferta superou bastante a

procura por lotes urbanos, até mesmo para a invasão. Estas áreas permanecem como possibilidades

remotas de expansão do tecido, justamente em razão do grande estoque de lotes vagos.

Na região do vale do rio Bubu, estão vazias as partes alagáveis do terreno, que nunca foram

desenhadas, e também de alguns arruamentos sujeitos à inundação. Esta prudência só se explica pelo

já mencionado excesso de oferta de terra numa área periférica, uma vez que a inundação de

assentamentos urbanos é praticamente uma regra no Brasil. Nas regiões mais centrais de Cariacica,

como no vale do rio Itanguá e nas margens do rio Marinho, os alagamentos frequentes estão dentro

da média nacional.

Ao contrário dessas situações periféricas mencionadas, um grande vazio urbano existe em Cariacica,

ocupando boa parte do platô entre os vales do rio Itanguá e do rio Bubu. Ali funcionava a ‘Fazenda

do Estado’, sede da antiga Empresa Espiritossantense de Pecuária – Emespe, antecessora do atual

Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Espírito Santo – Idaf.

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Figura 24: O vazio urbano da Fazenda do Estado. Fonte: Google Earth, 2012

O Idaf tem como objetivos a execução da política agrária, da política cartográfica e da política de

defesa sanitária das atividades agropecuárias, florestais, pesqueiras, dos recursos hídricos e solos; e a

administração da fauna e da flora do Estado do Espírito Santo

Trata-se de uma área com cerca de 180 ha, onde funcionam, além do IDAF, outras instalações do

Governo Estadual, como o Centro de Formação de Oficiais da Polícia Militar do Espírito Santo, o

antigo Hospital Psiquiátrico Adauto Botelho e o antigo Presídio Feminino de Tucum.

A ocupação rarefeita dá mesmo ao local o aspecto de uma fazenda, embora a atividade original

pecuária não se desenvolva mais como na Emespe original. Completamente circundada por bairros

de tecido consolidado, permanece como uma área de grande interesse urbanístico para o município,

sob a administração do governo estadual.

1.3.3 O vale do rio Formate.

A porção sul do município é a mais densamente urbanizada, restando somente algumas glebas a

sudoeste, na fronteira com Viana. Estas terras pertencem ao vale do rio Formate, que é a fronteira

municipal. Seu prolongamento a noroeste atravessa tecido progressivamente menos ocupado ao

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longo das duas margens do rio, ou seja, de cada lado do curso d’água, a cidade está num município

diferente.

A visita a essas localidades mostra que o rio, apesar de drenar uma bacia de mais de 9.500 ha, se

resume a um leito com menos de 10m de largura, sujeito ao mesmo tratamento como ‘valão’ e às

mesmas condições de ocupação das margens descritas para os demais leitos de drenagem natural.

Mapa 7 – Município de Cariacica Risco de Alagamento

O acréscimo da margem direita do vale do rio Formate – território de Viana – ao mapa de Cariacica

mostra interessantes aspectos geomorfológicos e urbanísticos que interessam diretamente a esta

análise.

O rio Formate nasce a mais de 600m de altitude, e desce 550m num trajeto de 6 km no sentido sul,

um vale estreito e densamente florestado. A partir da cota 50m, desvia-se para oeste e prossegue por

10 km como um rio de planície, ladeado por largas várzeas rurais até a cota 20m. A partir deste

ponto, dirige-se a sudeste por 6 km, com a mesma conformação física em várzea, mas ocupada por

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tecido urbano de Viana, na margem direita, e de Cariacica, na margem esquerda. Até a foz no rio

Marinho, na cota 2m, são mais 5 km no sentido sudeste, novamente atravessando várzeas rurais.

Topograficamente, as duas margens do vale são similares, embora o lado de Viana contenha quase

dois terços da área do vale. Ocorre que o solo argiloso em Viana entre o maciço rochoso e o rio

Formate drena totalmente para ele, ao passo em que a mesma formação em Cariacica tem metade da

sua drenagem já voltada para o rio Marinho.

Assim, dois terços da água que enche as várzeas – e alaga a urbanização ribeirinha nos dois

municípios – vem de Viana, e a contribuição total da bacia é significativa para o leito do rio

Marinho. Este último desce somente 2m, em 8 km no sentido norte e pertence ao delicado sistema de

drenagem da várzea do rio Jucu. Este sistema inclui um dique e uma estação de bombeamento em

Vila Velha, e é sempre acionado ao limite extremo, nas enchentes.

O rio Marinho atravessa tecido urbano de Cariacica, na margem esquerda, e de Vila Velha, na

margem direita, área sempre sujeita a alagamentos. A geomorfologia indica, portanto, a necessidade

de, no mínimo, planejamento integrado entre os três municípios, para equacionar o problema das

enchentes nas margens dos rios Formate e Marinho.

Urbanisticamente, a porção de território de Cariacica que pertence ao vale do rio Formate é

fisicamente isolada do restante do município pelas formações elevadas da serra do Anil, que chegam

a 300m de altura. O rio Itanguá nasce nessa região e, a rigor, há uma conexão topográfica possível,

embora claramente percebida como ‘passagem’ entre as montanhas.

Os fragmentos urbanos desta parte de Cariacica são isolados do restante da cidade por áreas semi-

rurais. Por outro lado, em relação aos bairros de Viana ao norte da BR-262, a área urbanizada é

continua, uma vez que o rio, fronteira entre os municípios, nada mais é do que o ‘valão’ nos fundos

dos lotes. No entanto, o cotidiano dos moradores é mesmo separado pelo rio, seja nos padrões de

mobilidade entre suas margens, seja nas estruturas físicas e operacionais – leia-se sistema de

transporte coletivo – existentes para a sua travessia.

A situação do vale do rio Formate indica que seria proveitosa uma reflexão sobre as possibilidades e

interesses em um planejamento integrado de ações operacionais da bacia do ponto de vista

hidrográfico, e da infra-estrutura dos assentamentos instalados, do ponto de vista da relação entre as

comunidades.

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1.4 O Uso do Solo do município de Cariacica.

A estrutura geomorfológica do território praticamente determina os tipos gerais de uso do solo

encontrados no município. Quase metade do maciço rochoso é área de preservação permanente,

instituída pela Reserva Natural de Duas bocas. Ali se encontra um grande fragmento remanescente

de mata atlântica, ainda que de caráter secundário – sem as espécies retiradas na exploração da

madeira – e selecionado pela altitude, sempre superior a 200m. O restante do maciço é inteiramente

dedicado aos usos rurais, no formato de pequenas propriedades operadas em bases familiares.

A maior parte da área é destinada à pastagem do gado, de corte ou de leite. A principal cultura é da

banana que, somada à do café, tem as maiores áreas plantadas. No entanto, a produção de cana de

açúcar e mandioca superam o café, apesar de ocuparem áreas bem menores. É notável, nessas

fazendas, a presença de muitos fragmentos de floresta preservada, principalmente nas encostas de

grande declividade, mas não se pode dizer o mesmo das faixas de proteção dos cursos d’água.

Há que mencionar uma porção rural do maciço que ficou completamente separada do território do

município pela Reserva de Duas Bocas. Esta região corresponde a frações da margem esquerda do

vale do rio Biriricas e da margem direita do vale do rio Mangaraí e as partes mais altas dos vales do

rio do Meio e do córrego Boqueirão. Ela é o resultado de uma inexplicável demarcação de fronteiras,

que terminou por trazer para Cariacica terras cuja compartimentação geomorfológica indicaria

pertencerem a outras unidades territoriais.

É uma região francamente rural, sempre mais alta do que 500m, conectada por estradas aos

municípios de Santa Leopoldina e Domingos Martins. Não foi encontrado qualquer indício

perceptível de maiores pretensões de conexão com Cariacica, seja quanto à estruturação da atividade

rural, e menos ainda quanto a qualquer vestígio de atividade urbana.

A urbanização em Cariacica ocorre mesmo na porção mais baixa do território, de solo argiloso e cota

não superior a 60 metros. Ali estão os arruamentos de ocupação mais densa ao sul do rio Itanguá, os

bairros que circundam o grande vazio entre este e o rio Bubu e as periferias menos densas, ao norte,

onde fica a sede do município e a oeste, no vale do rio Formate. Já registramos que os arruamentos

preferencialmente se localizam sobre os morros da parte baixa do município, ocasionalmente

avançando sobre as planícies.

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Mapa 8 – Município de Cariacica Uso do Solo

Mas este território não é inteiramente urbanizado. O mesmo padrão de atividades rurais das terras

altas ocorre em áreas abaixo de 60m, junto à base do maciço, a oeste do tecido urbano, subindo o

vale do Formate e tornando-se mais extenso na extremidade norte do município. Esta região é

drenada pelos córregos Cachoeirinha, do Sabão e do Engenho, que levam ao rio Duas Bocas,

fronteira com o município de Santa Leopoldina.

Finalmente, a nordeste do território está a porção não urbanizada dos morros drenados pelo córrego

Vasco Coutinho, que atravessa uma grande área de baixada até o rio Santa Maria, na fronteira com a

Serra. Esta região, principalmente a baixada, é a localização preferencial das atividades logísticas de

operação retro-portuária, favorecida pela presença da rodovia BR-101 nas proximidades do

entroncamento da ferrovia Vale com o ramal para o porto de Tubarão.

Ao longo da rodovia encontramos diversos empreendimentos de armazenagem intermodal, em que a

maior área é ocupada pelos pátios de estacionamento dos veículos importados e exportados.

Observa-se também a presença de extensos movimentos de terra, cuja magnitude permite prever que

algumas unidades do relevo serão completamente removidas, como fonte de material para regularizar

e proteger das enchentes o que se tornará uma planície ainda mais vasta e adequada aos

empreendimentos industriais e logísticos.

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A mesma conjuntura pode ser observada na extremidade oposta, a sudoeste, em vazios rurais

drenados pelo rio Formate e Marinho, ainda que muito menor em extensão. Nesta região, favorecida

pela possibilidade de receber estruturas de ligação da BR-262 com o porto de Capuaba, se ainda não

há propriamente os empreendimentos instalados, já se observa a mesma retirada de terra, que

regulariza tanto a origem quanto o destino do material. Por exemplo, um morro em Campo Belo

tenderá a se transformar em terreno plano, ao passo em que grandes áreas em Vila Velha ficarão

abrigadas das inundações.

Mapa 9: Município de Cariacica Centralidades Principais

1.4.1 O Uso do Solo Urbano.

O caráter da urbanização de Cariacica é o de partes individualmente únicas, e coletivamente

homogêneas. Sejam os vários arruamentos, cada um desenhado e estampado a seu modo no solo,

sejam as edificações, cada uma adaptada a condicionantes particulares, quando tomados em

conjunto, se afiguram como um todo sem singularidades.

O mesmo se pode dizer dos usos que se instalam no tecido urbano, em que predomina a residência,

misturada de modo praticamente uniforme com as centralidades de menor alcance. Nesta categoria

estão a padaria, a mercearia, o boteco, o cabeleireiro, a manicure e todas as atividades que oferecem

bens e serviços quase no mesmo lugar em que moram seus consumidores.

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Nesta escala também se encontra a pequena indústria – serralherias, principalmente – e os serviços

gerais, como as oficinas mecânicas, junto a outras atividades, quase sempre de caráter doméstico e

cuja localização é tão dispersa quanto aquelas de menor alcance. Seu grau de impacto sobre as

vizinhanças é variável, mas previsível, e os conflitos costumam ser resolvidos sob a ótica policial, ao

largo de quaisquer considerações de planejamento.

Numa escala de alcance um pouco maior, classificaremos a farmácia, o mercado, o material de

construção e os demais usos que definem uma centralidade ‘de bairro’, por assim dizer. Estes se

concentram em alguns pontos, geralmente nas vias que compõem os corredores de conexão entre os

vários arruamentos. Sua localização depende de fatores que os empresários do ramo conhecem a

fundo, mesmo que intuitivamente. A presença do transporte coletivo é o mais importante deles, neste

tipo de vizinhança. O alcance máximo aproximado dessas centralidades encontrado em Cariacica foi

de 1200m.

As centralidades principais numa cidade são comumente representadas pelos bancos, cuja

localização depende da concentração de outras atividades que movimentem renda, numa escala

suficiente para justificar a abertura de uma agência. Em Cariacica, os bancos são encontrados em

Campo Grande, Jardim América, Itacibá e na Sede. Podemos intuir com grande chance de acerto que

estes pólos concentram a oferta de bens e serviços de maior alcance na cidade, que chega a 3600m.

Finalmente, há o centro urbano principal, localizado em Campo Grande, consolidado a partir dos

anos 1970, e que se diferencia das demais centralidades principais por oferecer, em maior

quantidade, os mesmos tipos de bens e serviços e por ser a localização preferencial das instituições

de ensino superior no município. Seu alcance, dada a configuração da estrutura urbana da cidade,

chega a 9000m.

As centralidades levantadas para permitir tais generalizações se localizam admiravelmente bem

sobre a malha de ruas principais da estrutura urbana do município. No entanto, é também notável o

fato de que nenhuma – com exceção da Ceasa, se tomada como ‘supermercado’ – se localiza nas

rodovias BR-101 ou 262.

A cidade não entende essas vias como ‘urbanas’, mas exatamente como o que são: estruturas de

mobilidade para o tráfego de passagem, adequadas à localização de equipamentos de alcance

metropolitano, ou mesmo estadual. Estes usos dependem menos diretamente da proximidade

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imediata com as demais atividades urbanas, e mais do acesso direto a estruturas de grande

mobilidade, como as rodovias federais.

Nem mesmo o centro urbano de maior alcance, em Campo Grande, desenvolveu-se diretamente

sobre uma das rodovias federais, mas numa rua transversal, integrante de um arruamento não muito

diferente do padrão local – largura 11m, lotes com 12 x 27m, quadras com 20 lotes e 120 x 54m.

Nesta rua principal, aparentemente, os afastamentos convencionais de 3 metros foram incorporados

ao espaço público, em função do caráter comercial, que acenava com a rentabilidade da terra, e hoje

a Avenida Expedito Garcia pode se diferenciar em Cariacica com orgulhosos 17m de largura.

Pode ser este um panorama geral dos Usos do Solo Urbano em Cariacica, que os tem instalado e

localizado quase que somente ao sabor das iniciativas individuais dos empreendedores e dos fatores

locacionais encontrados por cada empreendimento. Seja na área rural, seja no tecido urbano, o

conjunto de Usos existente hoje na cidade praticamente prescindiu de qualquer ação de

planejamento.

1.4.2 A oferta de serviços públicos.

As escalas de alcance das centralidades de comércio e serviços privados encontradas obedecem

claramente ao princípio elementar do mercado, levemente modificado pelas limitações geográficas

convencionais. Assim a oferta segue a demanda, onde a topografia permite, e as centralidades dos

vários alcances se equilibram razoavelmente eqüidistantes.

Os serviços públicos, especificamente saúde e educação, também são setores cujo atendimento

necessariamente passa pela localização de unidades de atendimento para onde a população converge,

e deveriam seguir a regra da localização das centralidades.

Em Cariacica encontramos escolas em quantidade aparentemente compatível com as centralidades

localizadas. Há aproximadamente meia centena de escolas de nível médio, o que corresponde às

centralidades com 1200m de alcance. No ensino fundamental, há cerca de 100 escolas, levando a um

alcance estimado de 800m. Esses valores são perfeitamente compatíveis com as recomendações

clássicas do urbanismo das unidades de vizinhança, que tinha a escola como o centro das diferentes

escalas de organização do tecido urbano.

O sistema de saúde conta com quatro hospitais e pouco mais de trinta unidades de saúde, o que

levaria a uma mesma escala de alcance das centralidades privadas de 1200 e 3600m. No entanto,

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falta claramente um hospital na porção sul do município, uma vez que a região de Caçaroca se

encontra a mais de 6000m de todos os existentes – assim como assinalamos que não há um centro

urbano com atividades financeiras mais próximo dessa região.

Do ponto de vista das centralidades, o extremo sul de Cariacica é geometricamente deslocado do

sistema geral da cidade. As ofertas privadas de bens e serviços podem mesmo se localizar somente

em função da demanda, que talvez ainda não seja sido suficiente nesta região para viabilizar um

centro urbano dessa ordem. No entanto, as demandas por serviços públicos, principalmente de

educação e saúde, lá estão, como em todas as partes da cidade.

Se a quantidade de escolas e unidades de saúde parece apontar para uma cobertura razoável do

território, as suas capacidades individuais não puderam ser aferidas o suficiente para um julgamento

preciso. O que se pode afirmar, com certeza, é que há unidades de saúde e educação em número

suficiente para cobrir o território urbanizado, com exceção do extremo sul, onde claramente falta um

hospital.

O atendimento suficiente às demandas por saúde e educação depende de que cada uma dessas

unidades seja capaz de atender à população contida na região dentro do seu raio de alcance. A

localização favorável de uma unidade pode esbarrar na insuficiência de terreno para instalar toda a

capacidade necessária, o que indica que a reserva prévia e formal de espaços para os equipamentos

públicos é uma prática que deveria ser retomada.

Na região rural, todas as centralidades, privadas e públicas necessariamente atendem a regiões mais

extensas, uma vez que as baixas densidades populacionais não viabilizam a sua instalação de acordo

com os alcances característicos das áreas urbanizadas. Isto conduz ao problema da mobilidade rural,

que passa pela instalação de uma malha viária adequada e pelos sistemas de transporte coletivo,

principalmente o escolar.

A região rural de Cariacica é razoavelmente servida por traçados viários bem adaptados aos núcleos

a atender e aos ditames da geomorfologia do maciço montanhoso. A exceção, como dito antes, é a

região mais alta e isolada pela Reserva de Duas Bocas, somente porque a sua malha rural se dirige a

municípios vizinhos.

Se as conexões existem, o mesmo não se pode dizer da qualidade operacional da malha rural do

município, seja em termos da estrutura – pavimentação, sinalização, manutenção – seja quanto ao

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transporte coletivo disponível. É comum na população rural de Cariacica o relato da dificuldade de

acesso às centralidades, sejam elas urbanas ou da própria região, como as escolas rurais, devido à

precariedade das estradas e à inadequação dos horários e trajetos do transporte coletivo.

Mapa 10 – Município de Cariacica Configuração Urbana

1.4.3 Uma configuração perceptível.

A combinação dos componentes espaciais dos vários temas analisados – geomorfologia, estrutura

viária, mobilidade, arruamentos, usos do solo, centralidades – permite lançar uma hipótese sobre a

organização física da cidade de Cariacica e sua extensão territorial como município.

O centro principal em Campo Grande se conecta aos centros regionais mais próximos – Vitória, Vila

Velha, Serra, Viana – pela BR-262, utilizando, no caso da Serra, a BR-101. Toda a cidade se

organiza a partir do sistema Campo Grande + BR-262, mas já é possível detectar um segundo nível

de organização entre os centros de médio alcance, Itacibá, Jardim América e Cariacica Sede.

Os padrões de mobilidade levantados – ainda que parciais – indicam uma configuração em dois

sistemas paralelos à BR-262. Ao norte, o centro em Itacibá organiza uma sucessão de centralidades

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ao longo da via que segue o antigo traçado da ferrovia Vitória a Minas, na margem direita do rio

Itanguá. A novidade desta estrutura é evidente na toponímia da via, que começa como rua São João e

São Jorge em Iacibá, segue como Francisco Esperidião Pinto e Clarício Alves Ribeiro, até Itanguá e

Nova Brasília.

Após um cruzamento com a BR-101 a via continua como rua Santa Luzia, São José e prossegue para

a área rural sem denominação definida. Apesar da identidade pouco nítida, é um evidente corredor de

circulação da cidade, em que o bom traçado original padece das limitações impostas pela ocupação

lindeira, que resulta num alinhamento com não mais do que 12m de largura, com segmentos

limitados a 8m.

Ao sul da BR-262, o centro em Jardim América cumpre a mesma tarefa ao longo da via que

acompanha a linha da Estrada de Ferro Centro Atlântica, em que se sucedem as centralidades em

Bela Aurora, Vila Betânia e São Geraldo, até o cruzamento com a rodovia Leste-Oeste, junto ao

Terminal de Ônibus de Campo Grande.

Como no anterior, o desenho ferroviário tem curvas e inclinações muito favoráveis, e, neste caso, a

presença da linha em operação resulta numa via urbana lateral ou mesmo separada da ferrovia. O

resultado é que a largura total é bem mais generosa do que na estrutura norte, facilitando possíveis

desenvolvimentos futuros.

No entanto, se ao norte a estrutura secundária é separada do centro principal por declives

importantes, ao sul a ferrovia é adjacente a Campo Grande, praticamente parte do seu arruamento.

Outro detalhe é que, ao norte, o corredor viário se estende à área rural e, ao sul, se detém antes de

integrar o centro em São Francisco, que permanece isolado por conexões tortuosas e acidentadas.

Estes três corredores compõem um núcleo da cidade, em que o tecido urbano é contínuo, as

centralidades se distribuem de modo uniforme e a mobilidade interna é intensa e bastante homogênea

entre todos os centros, apesar da inconsistência de algumas conexões viárias. Comporta-se,

principalmente ao sul, como uma extensão do centro principal em Campo Grande e tem uma

disposição alongada na direção leste-oeste, que coincide com o desenho geral da BR-262, da antiga

ferrovia ao norte e da ferrovia ao sul.

As demais partes da cidade se comportam de modo completamente diferente, num terceiro nível de

organização, claramente hierarquizado em relação ao núcleo principal. Há dois corredores de

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centralidades ao norte: o primeiro, organizado ao longo da rodovia José Sete, inclui a Fazenda do

Estado, Tabajara, Campo Verde, Porto de Cariacica e a Sede, com uma ramificação pela BR-101

para Porto Belo e Nova Rosa da Penha. Toda a região rural do município interage com o núcleo

central através do sistema viário dessa estrutura.

O segundo corredor inclui Porto de Santana, Porto Novo e Flexal, e sua base viária é bem menos

legível e contínua do que a primeira. De todo modo, são estruturas alongadas na direção norte-sul em

que todas as centralidades interagem muito com o núcleo principal e pouco entre si. As interações

transversais entre os dois corredores são pouco significativas, diante da atração exercida pelo núcleo.

No sentido oeste, o prolongamento rural do corredor norte do núcleo da cidade pode ser

compreendido neste mesmo nível de organização, em que os assentamentos em Mucuri, Novo

Horizonte, Vale dos Reis, Novo Brasil e Piranema, de caráter progressivamente rural, são claramente

dependentes do núcleo.

Ao sul, a continuidade do tecido urbano excede o limite do núcleo central no leito da ferrovia e

avança até o vale do córrego Campo Grande, ocupado pela rodovia leste-oeste. A partir de então,

encontramos um corredor de centros na direção norte-sul, ao longo da estrada para Caçaroca, que

inclui Valparaíso, Rio Marinho, e Caçaroca, no extremo sul do município. Mais a oeste, encontra-se

o embrião de outro corredor de centros, que incluirá Jardim Campo Grande e Padre Gabriel.

O estágio ainda inicial de consolidação deste último corredor permite encontrar uma pequena

amostra viva dos componentes do processo de urbanização de Cariacica, antes das intervenções

ditadas pelo crescimento. Lá estão os arruamentos formalmente desenhados, as conexões viárias

improvisadas, o uso francamente residencial e a grande quantidade de lotes vagos, ao lado das

propriedades rurais: a casa, a rua de terra, a cerca e o gado pastando na ondulação da campina.

Em adição a esta configuração já detectável na cidade, devemos considerar as duas intervenções

viárias mencionadas anteriormente – a ‘quarta ponte’ para Vitória e a rodovia leste-oeste – e sua

integração às estruturas existentes. A rodovia leste-oeste encontra-se parcialmente executada, até

desviar-se do leito do córrego Campo Grande, onde deverá conectar-se a um traçado já definido, no

sentido leste, para Vila Velha.

Há informações, no entanto, de que este traçado deva prosseguir, como BR-447, no sentido noroeste,

até a BR-262, já na fronteira com Viana. Nesse caso, Cariacica receberia, ao sul do núcleo central,

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uma rodovia de caráter arterial aproximadamente paralela ao corredor da ferrovia Centro Atlântica,

com grande chance de estruturar novas centralidades que se instalem nesta porção do tecido urbano.

Ao norte, a ‘quarta ponte’, apesar de menos definida quanto ao traçado, deverá atravessar terras

estaduais, também na direção geral leste-oeste. Sua localização, portanto, espelha o traçado

definitivo da BR-447, colocando-se como elemento estruturador da eventual expansão do núcleo

central sobre o vazio urbano da Fazenda do Estado.

Finalmente, em proposições bem menos consolidadas, encontramos registros da estruturação viária

do extremo sul de Cariacica, que acrescentaria mais um traçado leste-oeste; e do extremo norte, onde

a região dos projetos industriais e logísticos receberia todo um novo conjunto de vias.

No entanto, são realidades distantes, no tempo e no espaço, da configuração atual da cidade como

tecido urbano. Suas extremidades sul e norte se comportam como satélites dependentes do núcleo

central e a sua expansão e/ou adensamento estariam fora do horizonte de tempo da Agenda 2020-

2030.

A instalação dos empreendimentos logísticos, ao contrário, é uma perspectiva praticamente imediata,

e o seu equacionamento espacial ainda está em aberto. É comum a denominação de

empreendimentos desse tipo como ‘projetos estruturantes’, referindo-se ao seu potencial

transformador do contexto sócio-econômico a que sejam acrescentados.

Mas é importante lembrar que a estruturação sócio-econômica não vem automaticamente atrelada à

estruturação física, sendo mesmo possível que ocorra exatamente o contrário com as vizinhanças

imediatas de tais localizações. Assim, interessa diretamente ao município de Cariacica participar da

concepção espacial de tão grande parte do seu território.

1.5 A ocupação do Solo

A edificação em Cariacica materializa o caráter dominante da urbanização local, a autoconstrução

não assistida por planejamento. O mercado imobiliário formal, em que edificações são construídas

para vender em escala industrial, praticamente inexistiu enquanto a cidade que lá está hoje foi

edificada.

Esta edificação autoconstruída sem planejamento segue os padrões nacionais de tais condições,

empregando as soluções e técnicas ao alcance da renda e da habilitação disponíveis à população. O

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concreto armado, os tijolos cerâmicos furados e as lajes pré-moldadas são os ingredientes

obrigatórios na receita da casa urbana brasileira, e, em Cariacica, a sua falta só resulta de carências

excepcionais, até mesmo numa população de renda predominantemente baixa.A técnica construtiva é

um híbrido entre a estrutura independente e a alvenaria portante. O uso do concreto como apoio em

peças que atuem efetivamente como pilares isolados é quase uma exceção. Sua função é muito mais

de reforço da alvenaria do que propriamente a constituição de uma estrutura que tenha estabilidade

sozinha.

Sobre fundações rasas de concreto, permitidas pelo solo argiloso, muitas vezes feitas com alvenaria

desse mesmo material, são erguidas paredes comuns de tijolos cerâmicos furados. Essas paredes

recebem reforços verticais em concreto armado nas principais esquinas da planta e horizontais sobre

a última fiada de tijolos, interligando os reforços verticais. As lajes são montadas diretamente sobre

esta planta de paredes emolduradas em concreto.

Figura 25: Autoconstrução caracteriza a massa edificada, em Porto de Santana.

O resultado tem a aparência de uma estrutura independente convencional, em que pilares, vigas e

lajes de concreto recebem a alvenaria somente como vedação. Mas neste tipo especial de construção,

a alvenaria tem funções estruturais, senão de suporte direto de cargas verticais, mas de travamento

transversal da edificação. A retirada de todos os panos de fechamento não poderia ser feita, sob pena

de desestabilizar o edifício e levá-lo ao colapso. Mas nossos autoconstrutores parecem saber disso o

suficiente para que eventos desse tipo sejam pouco frequentes.

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Figura 22: Estrutura em concreto e vedações com tijolos cerâmicos furados nas encostas

O sistema estrutural e os padrões dimensionais das peças de concreto empregados correntemente

estabelecem limites de carga aos pavimentos inferiores, de modo que a edificação raramente

ultrapassa os três pavimentos. Novamente, a tradição empírica, de transmissão oral, tem garantido a

segurança da população em suas casas de alvenaria reforçada.

Assim, Cariacica é mais uma cidade brasileira de alvenaria com fundações rasas e molduras de

concreto, e com até três pavimentos em lajes pré-moldadas. As dimensões dos compartimentos não

ultrapassam muito os três metros permitidos pelos vãos das lajes, que recebem coberturas de

fibrocimento elevadas, compondo o característico ‘terraço capixaba’.

Esta é a tipologia dominante em quantidade de unidades e extensão de território. Desde a casa inicial

de cinco cômodos – sala, dois quartos, cozinha e banheiro – dispostos sob quatro panos de laje com

pouco mais de nove metros quadrados cada, até o pequeno edifício com meia dúzia de apartamentos,

quase tudo em Cariacica são caixas de alvenaria reforçada com terraço coberto.

Figura 27: À esquerda, edificações com até 3 pavimentos; à direita, terraço capixaba, em Iacibá

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A onipresença é certamente derivada do fato de que a população tem conhecimento dessa tecnologia,

ainda que informal, e acesso aos meios para empregá-la de modo satisfatoriamente confiável. Isto

permite também que a casa inicial evolua e se transforme, podendo atingir, em prazo relativamente

curto, o limite de tamanho imposto pelo lote e pela estabilidade estrutural.

A dinâmica do adensamento da ocupação permitida pela técnica tem sido reforçada pelo sensível

incremento na renda da população que constrói dessa maneira para uso próprio. A mobilidade sócio-

econômica pode ser facilmente acompanhada por esta habitação autoconstruída, que tem como

incorporar, em meses, o que outras modalidades levariam décadas.

Especificamente, uma família que cresça e incorpore alguma renda extra, passa, em semanas,

daquela casa inicial para uma de três quartos com suíte. No próximo ano, uma habitação extra,

geralmente no segundo piso, pode alojar um filho que se casa, ou pode ser incorporado mais um

dormitório e talvez mais um banheiro. O mais importante é que tudo isso ocorre rápido e sem

endividamento prolongado.5

Seria uma situação muito favorável, em termos urbanísticos, porque a mobilidade sócio econômica

não conduz necessariamente à mobilidade espacial. As famílias prosperam, as casas melhoram, nos

mesmos endereços, ou seja, a vizinhança progride e supera as carências espaciais iniciais, ou, como

gostamos de dizer no ramo do planejamento, se “revitaliza”.

Mas este cenário quase ideal esbarra nas limitações impostas pelo espaço que os moradores não

podem moldar segundo seus desejos e possibilidades individuais. A fronteira entre o solo público e o

privado, na maior parte das vezes, é razoavelmente respeitada, e quando o seu desenho incorpora

carências espaciais na origem, estas são as que terão as menores chances de superação, por mais que

enriqueçam seus moradores.

O desenho dos arruamentos pode ser decisivo para a evolução de uma cidade, seja como um fator de

incentivo ao adensamento da ocupação com melhorias nas edificações, seja como um obstáculo que

condicione o tecido urbano a um horizonte limitado de qualificação.

5 Lembremos dos padrões convencionais da indústria imobiliária, em que mudar para um apartamento maior leva anos, e

o pagamento pela mudança leva décadas.

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Em Cariacica, encontramos, como reportado, a maior parte do tecido urbano desenhada formalmente,

em padrões gerais aceitáveis. O que se destaca como deficiência são a inserção topográfica

descuidada, a inexistência ou a má localização das singularidades e as conexões improvisadas.

A topografia acidentada demandaria traçados encurvados que se adaptassem ao relevo, mas muitas

ruas retas se transformaram em ladeiras e seus lotes em desníveis que, no mínimo, encarecem a

construção. Na pior das hipóteses, ocorrem a inadequação estrutural e o risco de desabamento, que é

latente em muitos imóveis. No entanto, o acaso e as largas margens de superdimensionamento da

técnica construtiva corrente tem evitado maiores desastres.

As singularidades do arruamento são as vias principais e os locais de reunião, isto é, ruas mais largas

e praças. Como visto antes, a presença e a disposição desses elementos é deficiente em muitos

arruamentos desenhados em Cariacica, mas a sua influência específica sobre os padrões da

edificação pode ser considerada mínima.

Por outro lado, os relativamente poucos arruamentos informais tornam aguda a sua condição como

obstáculo à qualificação urbana das vizinhanças. Ruas que nascem estreitas dificilmente serão

alargadas, mais ainda, se o interesse envolvido se resumir ao dos próprios moradores. Este tipo de

operação nas cidades só tem se justificado quando a quantidade de beneficiários – ou a quantidade de

dinheiro envolvida – excede largamente a escala das comunidades.

Desse modo, o tipo de edifício que abriga Cariacica, se construído sobre arruamentos razoáveis, é

uma solução para vários problemas, inclusive o da sua própria superação, pela via das reformas

sucessivas. E quando o espaço público é inadequado, a edificação pode ser adaptada, ou, no limite,

removida, para viabilizar as melhorias necessárias.

1.5.1 Os padrões de salubridade da edificação.

Devemos dar atenção, no entanto, aos padrões construtivos dessas edificações, que obedecem

somente a limites empíricos, muitas vezes, claramente inadequados. O principal deles é a relação

entre os volumes edificados e os espaços abertos dentro dos lotes. A salubridade dos compartimentos

é seriamente comprometida por afastamentos exíguos, que impossibilitam ventilação e iluminação

suficientes.

Os melhores resultados são obtidos naqueles compartimentos que se abrem para as ruas, mas mesmo

nesses casos há deficiências. As larguras correntes – cerca de 11m – permitem ventilar e iluminar

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bem até os três pavimentos que as estruturas suportam, mas a prática de construir o térreo sobre a

testada e avançar os demais pavimentos sobre o espaço público acaba por comprometer o resultado

final do conjunto edificado.

Figura 28: A edificação sempre construída sobre o alinhamento e sem afastamentos laterais,

independente da topografia, do arruamento e do padrão construtivo

Nas divisas laterais e de fundos, assim como nas ruas com larguras insuficientes – e nos ‘becos’, sem

dúvida – a salubridade das construções deixa muito a desejar, em termos dos padrões aceitos pela

ciência da construção. Mas há que lembrar que este é um conhecimento que os nossos

autocostrutores não dominam, e a empiria precisará tentar-e-errar muito até aprender a imitar os

padrões científicos formais de qualidade do edifício, mesmo com a ajuda da revolução

informacional.

Se há uma iniciativa do poder público efetivamente eficaz no campo da autoconstrução, são as ações

de qualificação dos mestres construtores locais, associadas à propagação do acesso a serviços

técnicos profissionais formais. Tais serviços já fazem grande falta, no estágio de consolidação da

ocupação em que a cidade se encontra, e a população pode ter mais acesso a eles através de

programas de assistência técnica subsidiada ou mesmo de ações corporativas de desmistificação do

custo a ser pago diretamente aos profissionais pelos particulares.

Por outro lado, onde encontrarmos arruamentos claramente insuficientes para atender à desejada

qualificação da cidade, deverá intervir o poder público, nos moldes das operações urbanas permitidas

pela normativa consubstanciada no Estatuto da Cidade. Aquela lei é claramente um conjunto de

autorizações do estado aos poderes constituídos para abrirem exceções institucionais que viabilizem

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a solução de problemas como os que estamos a relatar, e suas possibilidades de aplicação ao caso

específico de Cariacica serão discutidas mais adiante.

Restaria analisar as duas outras tipologias construtivas encontradas no município, que ocorrem em

quantidades muito menores do que a autoconstrução em alvenaria reforçada e em localizações muito

específicas. A primeira delas é a construção artesanal, em taipa e sapê, que ainda existe na região

rural do município.

Sua tendência é o desaparecimento, substituída pela alvenaria reforçada, à medida que a

prosperidade econômica se mantenha em expansão. No entanto, serve como memória viva da origem

do conhecimento sobre a edificação dominado pela população que auto-constrói sua cidade. De

geração em geração, o modo de construir é transmitido verbal e informalmente e a incorporação de

novos materiais e técnicas não necessariamente transforma para melhor algumas tradições, nem faz

desaparecer algumas carências.

A edificação rural é normalmente isolada, num ambiente de luminosidade e temperaturas elevadas.

Isto conduz ao dimensionamento restrito das aberturas, em que a casa é um abrigo de sombra contra

a luz e o calor excessivos. Por outro lado, o isolamento enseja a ventilação e o espaço para a vida ao

ar livre generosamente disponíveis.

Na cidade, as densidades comuns e as carências em geral resultam numa proximidade entre

edificações impensável na origem rural, com sérias restrições à ventilação. Se as casas ajuntadas

providenciam a sombra, a falta de vento piora o calor. A técnica construtiva e os recursos privados

cada vez mais disponíveis permitem transformar ou mesmo substituir os edifícios para incorporar

soluções mais salubres. Mas os auto-construtores não encontrarão tais soluções sem ajuda.

1.5.2 A cidade da elite.

A outra tipologia encontrada em Cariacica é a que resulta do processo formal de edificação, assistida

por aportes de planejamento público e privado. No processo geral de formação da cidade, que integra

um país caracterizado pela concentração aguda de renda, esta assistência sempre foi prerrogativa da

elite que pode pagar pelo planejamento privado e com quem esteve comprometido o planejamento

público.

O cidadão que compra um lote de terra regularmente escriturado e contrata um responsável técnico

para construir sua casa, no Brasil, tem sido parte dessa elite. Para ele são voltados os organismos

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institucionais de registro imobiliário, de análise e aprovação de projetos e de fiscalização de obras

pelo poder público. Compreensivelmente, a ocorrência de tecido urbano produzido nessas condições

é restrita a algumas poucas partes das cidades.

Em Cariacica, o núcleo em Campo Grande, mais os núcleos em Jardim América, Itacibá e na Sede,

são os lugares onde se pode encontrar a Ocupação do Solo Urbano assistida pelo planejamento

formal em conjuntos significativos. Em todo o restante da cidade predominam as iniciativas

empíricas já reportadas.

Figura 29: Habitação unifamiliar, no bairro Dona Augusta, e ocupação verticalizada, em Campo

Grande, produção assistida do tecido urbano. Fonte: PDM 2006

E mesmo nesses conjuntos edificados segundo procedimentos formalmente instituídos, há carências

a reparar. No âmbito privado, devemos considerar que nem todas as assinaturas nos documentos

correspondem mesmo a um técnico projetando e dirigindo as obras. Mais ainda, quando a edificação

ultrapassa o porte da residência unifamiliar, até mesmo os técnicos com treinamento formal

hesitariam em afirmar quais padrões construtivos seriam aceitáveis para a salubridade dos

compartimentos.

A arquitetura, como campo de conhecimentos, conseguiu obter um conjunto razoável de padrões de

salubridade, mas, como prática formalmente instituída, ainda não consegue aplicá-los correntemente.

Seja por questões relativas aos fundamentos teóricos arquitetônicos, seja por pressões pela

rentabilidade da terra, até mesmo nossas vizinhanças mais ricas padecem de mazelas comuns ao

tecido autoconstruído.

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As questões internas da teoria da arquitetura obviamente excedem o escopo desta análise. O que se

pode trazer a este debate é o fato de que os contextos sócio-políticos em que certos conhecimentos

técnicos foram produzidos estiveram sob veemente questionamento, em décadas recentes. Esta

rejeição à origem sócio-política tem sido desnecessariamente estendida ao conhecimento técnico em

si, que recebe, por enquanto, o rótulo da obsolescência, sem que nada equivalente tenha sido posto

em seu lugar.

Os substitutos dos padrões técnicos da qualidade do ambiente construído têm sido apresentados pelo

setor da indústria imobiliária e aceitos sem ressalvas pelas cidades, como norma para a edificação.

Como a indústria imobiliária não conta meio século de existência no Espírito Santo, os efeitos da

troca ainda não podem ser propriamente aquilatados.

O caso único no estado, do centro da cidade de Vitória, em que uma considerável estrutura de

urbanização foi repentinamente abandonada a partir dos anos 1980, porque o discurso sobre a cidade

encontrou eco no imaginário da população quando a chamou de ‘congestionada’ e ‘degradada’; ainda

não parece ter servido de exemplo e de alerta.

O prejuízo coletivo imposto àquela cidade, do qual só começa a se recuperar recentemente, se traduz

no empobrecimento de toda uma classe de proprietários de imóveis repentinamente desvalorizados e

na demanda por construir novamente toda uma infra-estrutura que já havia estado pronta e

funcionando. É importante assinalar que a quantidade de imóveis desocupados ou alugados pelo

valor do condomínio no centro de Vitória até dez anos atrás é um sintoma de que a cidade que havia

ali não cresceu, mas se mudou, deixando para trás a casa vazia.

O efeito dos afastamentos exíguos, da altura excessiva, da falta de garagens, ainda não foi

conscientemente relacionado aos procedimentos de planejamento que empregam índices de

rentabilidade dos terrenos como se fossem índices de qualidade do tecido edificado. Se Cariacica é

uma exceção a esta regra brasileira, isto ocorre porque a indústria imobiliária, como assinalado antes,

praticamente inexiste no município.

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Figura 30 - Avenida Expedito Garcia em Campo Grande. Centralidade comercial, trânsito

caótico, terrenos totalmente ocupados, falta de garagens e de espaço para o pedestre.

Fonte: www.gazetaonline.globo.br em 20/08/2011

O pouco que se construiu, no entanto, sob o controle dos profissionais técnicos e do poder público, já

tem merecido a mesma avaliação aplicada ao centro de Vitória nos anos 1980. Não é novidade

atribuir a Campo Grande a noção de ‘congestionamento’. A noção de ‘degradação’ virá assim que

uma nova localização imobiliária se apresentar como opção aos proprietários de imóveis.

1.5.3 A chegada da indústria imobiliária.

A condição de periferia imune aos problemas da degradação urbana parece definitivamente perdida

por Cariacica. Acostumada aos espaços que nasceram aquém das condições mínimas aceitáveis – e

que, de resto, só tem melhorado, ultimamente – a cidade conhecerá em breve os lugares que

perderão parte da qualidade que tiveram um dia como centro da cidade.

No ramo comercial, a notícia da possível construção de um shopping-center típico no entroncamento

da BR-262 com a rodovia leste-oeste permite prever que haverá uma queda no valor dos pontos de

comércio em Campo Grande. No ramo residencial, se a quantidade de apartamentos construídos na

cidade é proporcionalmente pequena, sua tipologia enfrentará em desvantagem a oferta recentemente

iniciada de unidades construídas junto ao estádio Kleber Andrade, em quadra lindeira à BR-262.

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Figura 31: Recentes investimentos imobiliários em Cariacica: maquete do Shopping na BR-262 e

apartamentos junto ao estádio Kleber Andrade. Fonte: Google, em 21/08/2011

Fonte: Google, em 21/08/2011

No entanto, a instalação efetiva da produção de imóveis para vender em Cariacica esbarra na

raridade das condições locais para o seu desenvolvimento. Em termos gerais, essas condições são a

terra em preços favoráveis e o acesso fácil às estruturas principais de mobilidade metropolitana. Mas

uma evolução recente desse mercado tem exigido lotes de tamanho comparável à quadra típica dos

arruamentos da cidade.

De fato, o produto-padrão recente da indústria imobiliária para as faixas de renda existentes no

município é o apartamento pequeno num condomínio grande, capaz de sustentar uma estrutura

coletiva de lazer. Isto se viabiliza em frações de terreno com cerca de 3.000m², que são escassas, a

não ser nas imediações das rodovias federais, onde alguns empreendimentos industriais e de serviços

ocupam áreas desse porte.

O edifício de apartamentos no lote urbano, com acesso direto para a rua, ainda é um produto

vendável nas proximidades do mar ou das centralidades metropolitanas principais, mas depende

também de um desenho fundiário mais generoso, principalmente no tocante à distância entre as ruas.

A quadra típica em Cariacica tem somente 50m nesta dimensão, restringindo a multiplicação do solo

pela impossibilidade de construir muitos pavimentos.

De todo modo, se vier efetivamente a se instalar, a indústria imobiliária tenderia a se localizar em

bairros como Jardim América, que tem boa parte das quadras tomadas por galpões que ocupam três

ou quatro lotes cada um, mas que enfrenta problemas de alagamento; ou Vila Capixaba, cuja posição

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espelha Campo Grande em relação à BR-262 e teria na rua Colatina um concorrente à altura da

Expedito Garcia.

De todo modo, o momento é propício para o município encarar a novidade com inovações no trato

institucional da construção para vender. Basicamente, isto seria feito reintroduzindo controles

urbanísticos em que os padrões de rentabilidade do solo sejam derivados de padrões da qualidade do

tecido urbano depois de construído, exatamente ao contrário do que se faz hoje.

Podemos concluir que o ramo da construção em si está a demandar melhorias em seus padrões

dimensionais, para resultar em tecido urbano salubre e de valorização sustentável. Isto se traduz em

controlar a edificação para vender e assistir a autoconstrução com conhecimentos que lhe confiram

capacidade de resistir à noção de ‘degradação’ da cidade, seja ela um sentimento verdadeiro da

população ou um mero recurso da publicidade da venda de imóveis.

Em Cariacica esta demanda se associa à necessidade de equacionar as disparidades entre os padrões

de qualidade de alguns arruamentos – ou de algumas de suas partes – no ramo da autoconstrução. E

está em posição relativamente confortável para atrair os negócios imobiliários em bases mais

vantajosas para a cidade, a longo prazo.

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CAPÍTULO 2: A NORMATIVA TERRITORIAL EM CARIACICA – O PLANO DIRETOR

MUNICIPAL.

O planejamento instituído em Cariacica não difere muito do que é empregado nos demais municípios

da Grande Vitória, bem como no restante do país. Uma típica Lei de Uso e Ocupação do Solo,

acrescida das novidades normativas introduzidas pelo Estatuto da Cidade, corresponde à maior parte

do Plano Diretor Municipal.

O Título V sobre o Ordenamento Territorial declina inicialmente seus objetivos, convencionalmente

adequados à condição local, principalmente: conter a expansão urbana, para minimizar novas

demandas; estimular o preenchimento de vazios e a descentralização, para otimizar a infra-estrutura

existente ou a instalar; proteger o ambiente natural, preservar o patrimônio, assistir à população

menos favorecida, gerenciar a mobilidade e regular o uso e a ocupação do solo.

Um destaque notável neste conjunto de objetivos é a intenção declarada de estimulo à consolidação

de uma referência de área central para o município, em certa consonância com a condição atual da

cidade. O centro em Campo Grande concentra a renda da população de modo espacialmente ainda

pontual, não sendo claramente perceptível a clássica expansão migratória setorizada deste segmento.

Os indícios levam a crer que, caso ocorra, tal expansão seguirá a BR-262 no sentido Jardim América,

a caminho da centralidade metropolitana em Vitória. Assim, entenderemos que a consolidação da

referência de área central mencionada no PDM, combinada com o que a lei prevê para a consecução

deste objetivo, será mais exatamente a explicitação da direção que a expansão da renda deverá

seguir na cidade, a partir de Campo Grande.

2.1 O zoneamento de Cariacica.

O Estatuto da Cidade instituiu o planejamento sobre a totalidade do território municipal. Isto conduz

ao assim chamado ‘macro-zoneamento’, que vem a ser, na prática, a subdivisão da ‘zona rural’

clássica – e que se opunha ao ‘perímetro urbano’ – em unidades de planejamento mais detalhado.

Cariacica obedece à nova regra e divide seu território em ‘macrozonas’, com as seguintes intenções,

fora do perímetro urbano:

Reserva Biológica, na região de Duas Bocas em si;

Integração, na região rural segregada pela Reserva de duas Bocas;

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Produção e Dinamização, no restante da região rural;

Amortecimento, das atividades urbanas, próximas a áreas de preservação.

Dentro do perímetro, por sua vez, foram estabelecidas outras ‘macrozonas’, com as seguintes

intenções:

Transição, entre as atividades rurais e urbanas;

Integração, de partes do tecido urbano consideradas segregadas do restante;

Ocupação Consolidada, da área considerada como razoavelmente urbanizada;

Dinamização, das partes da cidade consideradas estratégicas para a economia.

Há ainda uma peculiar ‘macrozona rurbana’ cujas definições, por exclusão, a qualificam como a

porção não parcelada do perímetro, onde se manifestaria a contenção da expansão do tecido, apesar

de contar com diretrizes explícitas para o parcelamento.

Mapa 11: Município de Cariacica Zoneamento Urbanístico

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Num modo particularmente complexo de organização, o zoneamento prossegue subdividindo as

‘macrozonas’ internas ao perímetro urbano em mais intenções declaradas de planejamento:

Natural, para as unidades urbanas de conservação da natureza em conformidade com normativa

federal;

Preservação Ambiental, para as demais unidades urbanas de conservação da natureza;

Ocupação Limitada, por características do sistema viário;

Ocupação Controlada, para deter o adensamento já excessivo;

Ocupação Preferencial, para induzir o adensamento e a otimização da infra-estrutura;

Especial Interesse Social, para lidar com as carências das regiões mais pobres;

Especial, para gerenciar a instalação de atividades de impacto sujeitas a planejamento específico;

A ‘macrozona rurbana’ não é subdividida em zonas, mas sim definida em duplicidade também como

‘zona rurbana’, com delimitação, definições e diretrizes idênticas.6 Completam o zoneamento os

‘eixos de dinamização’ e os ‘sub-centros’, que finalmente manifestam intenções de atrelar o

ordenamento territorial à estrutura do tecido urbano que nele se instala.

Os ‘eixos de dinamização’ correspondem às rodovias federais, à rodovia José Sette, às vias arteriais

da iniciativa estadual e a uma ligação da BR-101 com a sede do município, no extremo norte da área

urbanizada. São a manifestação local do máximo que o planejamento brasileiro para o uso e a

ocupação do solo urbano consegue ler, da estrutura explícita das cidades que aborda.

Apesar das evidências abundantes de que existem outras vias estruturantes, além das estradas e das

artérias, e de que a mistura quase caótica de usos é uma realidade irreversível nas cidades, a cruzada

anacrônica e inócua dos planejadores pela diversidade urbana prossegue se recusando a olhar a

realidade mais de perto.

Justiça seja feita à concessão dos ‘sub-centros’ a Cariacica, que ganhou, ao menos, um esboço da

institucionalização de suas práticas de estruturação urbana. São definidas de início e delimitadas nos

mapas, cinco centralidades – na Sede, em Nova Rosa da Penha, em Porto de Santana, em Bela

6 A seção VI do capítulo III (‘macrozona rurbana’, artigos 53, 54 e 55) é idêntica à seção IX do capítulo IV (‘zona

rurbana’, artigos 111, 112 e 113), com a exceção de que a definição da ‘macrozona’ (art.53) inclui as proximidades das

áreas de preservação, que não constam na definição da zona (art. 111). Como ambas tem a mesma delimitação nos mapas

dos Anexos 2 e 3, podemos dizer que são a mesma coisa definida duas vezes.

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Aurora e em Castelo Branco – como concentrações de usos diversos que reduzem a dependência

dessas vizinhanças do núcleo da cidade.

Nas definições, acidentalmente, os ‘sub-centros’ são sete, acrescentando um em Itacibá e outro em

Novo Horizonte. O centro em Itacibá integra o conjunto de centralidades de longo alcance na cidade,

junto com Jardim América, a Sede e Campo Grande, e seu desenho que falta pode ser creditado à

superposição do eixo de dinamização da rodovia José Sette com o trecho onde ocorre de fato. Já o

centro em Novo Horizonte existe, mas o registro da sua localização foi mesmo esquecido.

De todo modo, é possível ver aqui o tipo de controvérsia que nos assombra ao lidar com a estrutura

das cidades. Admitimos que ela é mesmo feita de ruas, mas só registramos as mais importantes,

porque ainda agimos contra um método obsoleto de planejamento que pregava a segregação absoluta

de usos, e só admitimos segregar usos nas poucas rodovias e artérias que encontrarmos a atravessar o

tecido urbano.

No entanto, se eventualmente compreendemos de que tal estrutura não se resume a rodovias e

artérias, usamos o conceito de ‘centro’ como elemento pontual, ou, no máximo, ‘alongado’, como

são desenhados os ‘sub-centros’ de Cariacica. Tanto são conceituados como ‘pontos’, que, em sua

maioria, estão desenhados desconectados dos eixos de dinamização rodoviários e arteriais, ao passo

em que os cruzamentos entre aqueles eixos não merecem consideração alguma.

As teorias da Localização e da Centralidade são explícitas definir os eixos de mobilidade e seus

cruzamentos como fatores altamente favoráveis às atividades que dependem de fluxos de pessoas e

mercadorias – comércio e serviços, sem dúvida. Por outro lado, a idéia de instalar tais atividades em

conjuntos pontuais deslocados em relação às rotas de mobilidade é um preceito justamente daquele

método obsoleto de planejamento de que dizemos discordar...

É preciso desvencilhar as cidades de tais controvérsias acadêmicas. É preciso ler suas estruturas de

mobilidade – e de localização de usos, portanto – até o limite das atividades de alcance mínimo, que

poderão se instalar em qualquer lugar. É preciso explicitar essas estruturas – essas ruas, enfim – de

modo francamente legível aos empreendedores, que instalarão as atividades a partir de fatores

locacionais perceptíveis ao seu tirocínio.

O que encontramos no Plano Diretor Municipal de Cariacica é o que se poderia chamar de

‘zoneamento de planejamento’, porque delimita áreas onde devem ser implementadas políticas

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adequadas a objetivos e intenções do poder público para com a cidade. No entanto, o desenho da

aplicabilidade dessas políticas está misturado com o desenho das áreas onde devem se manifestar as

iniciativas individuais dos habitantes. Vejamos como estão regulamentadas tais iniciativas, no

tocante ao uso e à ocupação do solo, isto é, no tocante a o que os habitantes desejarão fazer em

Cariacica, e com que intensidade vão pretender fazê-lo.

2.2 O regulamento do Uso do Solo.

Os Usos do Solo Urbano em Cariacica são inicialmente classificados por sua natureza, residencial,

‘comercial e de serviço e institucional’ ou industrial. Este tipo de classificação, assim como a

denominação extensa do que já se chama ‘uso diverso’ em outros planos da Grande Vitória, são mais

algumas relíquias involuntárias do método de planejamento que não deixava casas, apartamentos,

comércio, serviços, instituições e indústrias se misturarem livremente – e, novamente, do qual

dizemos discordar tanto.

O uso residencial se classifica convencionalmente em unifamiliar ou multifamiliar. Os usos

diversos – preferiremos chamá-los assim – são classificados por ‘âmbito’, ‘local’, ‘de bairro’,

‘municipal’ e ‘regional’. Entende-se que o plano considera, corretamente, o caráter central das

atividades comerciais, institucionais e de serviços, assim como seus alcances diferenciados, ainda

que chamados por um sinônimo lato senso.

O uso industrial, por sua vez, é classificado pela combinação da área do lote de instalação com os

impactos potenciais: ‘industrial 1’ seria ‘sem impacto’ até 600m²; ‘industrial 2’ ‘com algum

impacto’ entre 600 e 2000m²; e ‘industrial 3’ seria ‘com algum tipo de impacto’ acima de 2000m².

Ficam sem classificação os usos industriais abaixo de 600m² com impacto e aqueles acima desse

limite de área que não causem impactos sobre a vizinhança e/ou a natureza.

Em seguida, o plano classifica os mesmos Usos do Solo a partir dos seus impactos, abordagem bem

mais atual e sensata, em consonância com a verdadeira dinâmica urbana, em que a mistura de usos só

deve ser evitada no caso de incômodos insuportáveis aos vizinhos, ou danos ao meio-ambiente cuja

mitigação não possa ser compartilhada com esses vizinhos.

Então, em Cariacica haveria atividades ‘de Impacto Grau 1’, que não incomodem os vizinhos nem

danifiquem a natureza; ‘de Impacto Grau 2’, que somente incomodem os vizinhos; e de ‘Impacto

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Grau 3’ que incomodem os vizinhos e danifiquem o meio-ambiente. No entanto a classificação que

atribui a cada um dos usos um grau de impacto diferente, tem problemas de aplicabilidade prática.

Até mesmo uma inocente quadra com casinhas em lotes comuns, se muito extensa, causa impactos

negativos sobre seus vizinhos, e sobre seus habitantes também. A relação entre o alcance de uma

centralidade e seu impacto sobre a vizinhança ou o meio ambiente não pode ser considerada de modo

direto. O mesmo já dissemos sobre a indústria.

Ou seja, dizer que casas, centralidade de pequeno alcance e indústria de pequeno porte não causam

impactos, ao passo em que apartamentos, centralidades de longo alcance e indústria de grande porte

os causariam, não é exatamente verdade. Tal simplificação não considera que um simples botequim

pode causar mais incômodo do que um banco, e que um posto de gasolina pode destruir mais a

natureza do que um pátio de estocagem.

Mapa 12: Município de Cariacica Zoneamento Industrial

O melhor seria recorrer às listas de atividades individuais classificadas por impacto, já empregadas

em outras cidades e cada vez mais disponíveis como informação livre. A formulação desta

alternativa é mais coerente e fácil de entender pela população interessada, e de implementação tão

complexa quanto a que está no PDM.

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O próprio texto, ao definir os critérios de enquadramento das atividades para a exigência de estudos

e/ou relatórios de impacto, já permitiria classificá-las como proposto acima e gerenciar o controle da

mistura de usos em Cariacica de modo mais claro e eficiente.

Estas classificações evidenciam as intenções misturadas no plano. Uma coisa é regular a necessária

segregação entre atividades incompatíveis e outra coisa completamente diferente é otimizar os

fatores locacionais das atividades que deles dependem. Uma intenção se relaciona com um interesse

difuso, que se manifesta em toda a cidade, e que se materializa em zonas industriais onde os

impactos serão suficientemente segregados dos vizinhos e os danos à natureza serão mitigados de

modo otimizado.

A outra intenção de planejamento se refere a um interesse segmentado – dos empreendedores do

comércio, serviços e instituições, inclusive o poder público – que se manifesta exatamente nas

estruturas principais da cidade e nelas se materializa. Segregamos usos impactantes coercitivamente

por um motivo e explicitamos localizações favoráveis por outro, ambos no interesse da cidade. Só

não podemos misturar os dois numa mesma classificação de atividades.

O regulamento do uso do solo contido no PDM de Cariacica se expressa no espaço, então, por três

critérios distintos – alcance, indústria e impacto – com alguma complexidade excessiva, como

veremos. O mapa “Zoneamento Industrial” mostra as permissões de instalação dos diferentes tipos

de indústria e o “Zoneamento de Impactos” mostra as permissões dos diferentes graus de impacto.

Lembrando que os usos industriais se diferenciam por área e por impacto, vemos que somente a

classificação por área é efetiva no zoneamento.

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Mapa 13: Município de Cariacica Zoneamento de Impactos

O grau de Impacto 1 não aprece no Zoneamento de Impactos, indicando que, afinal, não teria sido

necessário defini-lo. O que faz mesmo a diferença é a segregação dos impactos sobre o meio-

ambiente (grau 3) às zonas especiais e ao eixo da BR-101. Os impactos somente sobre os vizinhos

(grau 2) podem ocorrer em todo o restante do tecido urbano.

Por este caminho, o Zoneamento Industrial mostra que é a classificação por área que define a

localização da indústria, uma vez que o uso industrial 2 é proibido em zonas em que o seu grau de

impacto 2 é permitido. De todo modo, aplicar tais permissões ao desenho das zonas de planejamento

acarreta algumas situações problemáticas.

A rigor, Cariacica está permitindo a instalação de atividades que demandarão a mitigação dos danos

ao meio-ambiente em algumas zonas concentradas e também ao longo de um extenso corredor de

mobilidade ao longo do município. Como dito antes, a concentração dessas atividades em áreas

segregadas ajuda a otimizar e controlar as medidas mitigadoras dos seus impactos, mas a dispersão

ao longo de uma via extensa não parece uma boa idéia.

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A distribuição da indústria somente por área também cria situações controversas, porque o uso

industrial 2 compreende instalações de até 2000m² que incomodam os vizinhos e são permitidas em

boa parte do que é o núcleo da cidade. Somente em Campo Grande, Itanguá e Bela Aurora o coração

de Cariacica não conviverá com este tipo de incômodo.

Os usos diversos diferenciados por alcance também recebem uma classificação por impacto, mas o

mapa “Zoneamento de Alcances” mostra que é o alcance que acaba definindo as localizações. Há

zonas em que o grau de impacto permitido corresponde a um alcance proibido, com o detalhe

acidental de que o alcance ‘de bairro’ não tem classificação de impacto.

Mapa 14: Município de Cariacica Zoneamento de Alcance

Até mesmo o uso residencial multifamiliar é enquadrado no grau de impacto 2, que incomoda os

vizinhos. Como a residência só não é permitida nas zonas especiais, esta classificação é que

estenderia este tipo de incômodo a toda a cidade, não fossem os critérios de distribuir a indústria por

área e os usos diversos por alcance.

Enfim, um intrincado sistema de permissões por critérios variados, que termina por neutralizar as

categorias de Impacto Grau I, que nunca é atribuída como máximo permitido, e de Impacto Grau II,

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que termina substituída pela área das indústrias, pelo alcance dos usos diversos e pela onipresença

dos condomínios.

De tal sistema, resta a segregação do Grau de Impacto 3 às zonas especiais como critério acertado,

que limita a instalação das atividades incômodas e poluidoras na região já ocupada pelos

equipamentos logísticos ao norte, às áreas onde já ocorrem dentro do tecido urbano –

especificamente em Itacibá (ferrovia da Vale), Jardim América e Bela Aurora (siderúrgica Belgo) – e

a duas regiões ainda desocupadas, a noroeste e sudoeste do município, às margens do rio Formate.

Há também a permissão do Grau 3 no vazio da Fazenda do Estado, mais pela classificação

desajeitada dos usos que lá existem do que pela intenção de criar ali uma zona de impactos urbanos

intensos. De fato, alguns equipamentos ali instalados poderiam ser causadores de incômodos, mas a

condição central desta área pouco ocupada na cidade indicaria que seria mais proveitoso prever a sua

transformação gradual em tecido urbano convencional do que sinalizar com a instalação de um

enclave de usos incompatíveis com as vizinhanças.

Quanto às duas novas áreas propostas, uma delas, a noroeste, ficaria lindeira a um novo traçado

ferroviário e sua proposição seria uma estratégia de médio prazo, a depender da construção efetiva

daquele ramal. A outra zona especial a sudoeste, ao contrário, é uma porção de território rural,

servido somente por futuras artérias rodoviárias de caráter urbano, já parcialmente circundado por

bairros em Cariacica e em Viana, e cujo relevo não é dos mais propícios a grandes instalações

industriais e outros pólos geradores de impacto.

No entanto, a permissão de usos do PDM ensejou o início da instalação de um loteamento industrial

nesta ZE 1 sudoeste, cujas intervenções de terraplanagem já preocupam pelo possível assoreamento

do rio Formate. Tal conjuntura indicaria, portanto, uma atenção especial quanto à qualidade do

projeto e dos serviços em execução e uma alteração do zoneamento que proibisse o impacto

ambiental (grau 3, no PDM), limitando a área ao impacto sobre a vizinhança, (grau 2).

2.2.1 Planejamento versus economia: um lado fácil da questão.

Assinalamos que em Cariacica estão misturados os zoneamentos de atuação do poder público e de

iniciativas dos habitantes. Especificamente, o desenho das intenções de planejamento no espaço

depende, obviamente, de quais sejam essas intenções. Até aqui, encontramos no PDM de Cariacica

esta lista:

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Preservar a natureza e o patrimônio cultural;

Integrar regiões espacialmente ou economicamente segregadas;

Amortecer os efeitos da urbanização sobre as áreas de preservação;

Graduar a transição entre as atividades rurais e urbanas;

Deter a expansão do tecido urbano;

Limitar as demandas sobre a infraestrutura de oferta menos flexível, como o sistema viário;

Controlar e deter o adensamento já excessivo;

Induzir o adensamento e a otimização da infra-estrutura ociosa;

Minimizar as carências da população mais pobre;

Gerenciar os acontecimentos especiais e localizados.

Estimular a economia rural e urbana;

Otimizar a mobilidade de pessoas e mercadorias;

Estimular a distribuição equilibrada de centralidades.

Quase todas são intenções de planejamento cuja manifestação no espaço não precisa obedecer a

qualquer tipo de estruturação discernível. A natureza ou a cultura a preservar, as carências a atender,

os excessos a conter, os desperdícios a evitar, as transições a graduar, tudo isso se dispõe no espaço

de modo não necessariamente estruturado.

Por outro lado, as três últimas intenções da lista só se materializam sobre a estrutura do território – as

ruas principais da cidade e as estradas rurais – e dependem fundamentalmente de que tal estrutura

esteja claramente explicitada aos interessados. O que mais importa aqui é que necessariamente são

dois desenhos completamente distintos, superpostos, e, principalmente, imprescindíveis.

Não estimularemos a economia, a distribuição das centralidades nem a mobilidade se não soubermos

onde são os melhores lugares para isso, e, com toda a certeza, nada há que indique que são os

mesmos lugares a preservar, ou onde estejam as carências, excessos, desperdícios e transições.

A teoria clássica sobre a estrutura da cidade já avisava que a riqueza se estrutura no espaço e a

pobreza ocupa as sobras. Riqueza, nesta análise, é justamente a instalação das atividades por

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iniciativa dos habitantes, e o poder público agirá no interesse coletivo se contribuir para compartilhar

as melhores informações sobre como otimizar tal prosperidade, desenhando-as de modo inequívoco.

Pobreza, por outro lado, são todas as mazelas que precisam ser resolvidas de algum modo, e a

contribuição do poder público neste sentido dependerá da sua identificação suficientemente precisa.

Aparentemente, este último desenho está a contento no Plano Diretor de Cariacica, mas o outro ainda

merece reparos.

A rigor, a cidade deveria providenciar o registro das áreas intocáveis da natureza preservada e das

áreas onde todo o cuidado é pouco com o patrimônio cultural. No restante, seriam superpostos os

desenhos da estrutura de otimização das atividades privadas e das áreas que demandam atenção do

poder público, inclusive a para a segregação dos impactos mais intensos da riqueza.

Para as atividades privadas dentro tecido urbano, o mais indicado seriam três classificações de uso, o

residencial, os demais usos que podem e os que não podem se misturar se misturar com ele. Estes

últimos ficariam obrigatoriamente segregados em zonas especificamente designadas, ao passo em

que a mistura dos demais com a residência seria definida pela malha de ruas principais.

O resultado seriam algumas zonas para usos de impacto e uma única grande zona de uso misto, em

que ruas exclusivamente residenciais seriam estruturadas por ruas para usos diversos. Todo o restante

do controle deveria ser feito pelos limites de ocupação, que adequariam a forma do conjunto

edificado aos padrões viários e fundiários.

2.2.2 A consolidação de uma área central.

Identificamos esta intenção manifesta nos objetivos do ordenamento territorial do PDM, e

assinalamos que poderá gerenciar a migração da localização da renda mais alta local a partir de

Campo Grande, caso venha a ocorrer. No entanto, mesmo que não ocorra, é possível imaginar que o

traçado da BR-262 possa servir como eixo de adensamento populacional, dadas as condições que já

reúne e algumas outras que precisariam ser atendidas.

O mapa de uso do solo atual mostrou a concentração de instalações industriais e logísticas em

terrenos lindeiros à rodovia, de tamanho significativamente grande, em relação ao parcelamento

típico do município. Esse padrão fundiário é sensivelmente adequado à multiplicação intensa do

solo, mantendo condições satisfatórias de salubridade dos compartimentos internos e dos espaços

externos às edificações.

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A largura do alinhamento da rodovia permitirá acomodar faixas de tráfego em quantidade adequada

ao incremento da população, bem como equipamentos de transporte coletivo de alta capacidade,

como trens urbanos de superfície e suas respectivas estações. Finalmente, seu traçado em direção a

Vitória fica no caminho percorrido diariamente pela população nos movimentos pendulares casa-

trabalho.

Ou seja, se há um lugar em Cariacica que possa se transformar num “centro” da cidade é o traçado da

BR-262, desde que deixe de ser uma rodovia federal e passe a ser uma avenida urbana. Para isto,

seria necessário que o tráfego de passagem de alcance mais longo, principalmente de carga, em

direção aos portos de Vitória e Capuaba, deixasse de circular ou, ao menos, fosse sensivelmente

reduzido.

A já iniciada rodovia Leste-Oeste poderá dar inicio a esta adaptação, porque será uma rota muito

mais favorável para Capuaba, evitando o arruamento intrincado em Jardim America e os aclives nas

travessias do rio Marinho. Mas o seu desenho também urbano, que atravessa tecido consolidado e

reduz à metade o tempo entre Campo Grande e a praia, em Vila Velha, indica que, cedo ou tarde,

caminhões pesados também não serão desejáveis ali.

O traçado previsto para a chamada BR-447, que desviaria a Leste-Oeste do tecido urbano para

encontrar a BR-262 já em Viana, pode ser uma rota mais definitiva para a carga que se destina a

Capuaba. Mas o ideal seria fazer este transporte por uma via que estruturasse toda a margem

esquerda do vale do rio Jucu, desde o sopé da serra, em Viana, até a rodovia do Sol, em Vila Velha.

Este desenho tanto pode ocorrer parcialmente em Cariacica quanto ficar inteiramente em Viana e

Vila Velha, mas a sua viabilização parece exceder o horizonte de tempo desta análise.

O tráfego de carga para Vitória, por outro lado, dependeria da concretização da chamada ‘quarta

ponte’ e da sua ligação com a BR-101, numa paralela ao norte da BR-262. Ou ainda, numa

perspectiva mais remota, da desativação das operações de carga e descarga no cais de Vitória, que,

ao que tudo indica hoje, seria uma completa reversão das tendências atuais.

Reunidas as condições para a consolidação de uma área central na BR-262, restaria estender a ela as

prescrições de uso de acordo com a estrutura interna da zona delimitada como ZOP 1. É necessário

identificar as vias estruturantes que deveriam receber diretrizes de transformação e/ou consolidação,

para atuarem como suporte para os usos não residenciais. E será necessário formular modelos de

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ocupação diferenciados para os diferentes padrões fundiários, pelo menos quanto aos lotes industriais

maiores na rodovia versus os lotes convencionais nas demais ruas.

2.3 O controle da Ocupação do Solo

A Ocupação do Solo Urbano em Cariacica não foge à regra nacional: os índices de rentabilidade do

mercado imobiliário são incorporados à normativa urbanística como se fossem índices de qualidade

do tecido urbano edificado. O PDM enumera seus índices de controle da ocupação como Coeficiente

de Aproveitamento, Taxa de Ocupação, Taxa de Permabilidade, Afastamentos, Gabarito, Área

para Garagens, Área dos Lotes e Testada dos Lotes.

A área e a testada dos lotes se referem ao controle sobre o parcelamento do solo, atividade

independente da edificação. Mas é prática comum em nosso país mais esta confusão entre a norma e

seus objetos. O regulamento do parcelamento necessariamente deveria incluir condicionantes para o

arruamento, como as larguras mínimas e o provimento das singularidades já mencionadas – ruas

principais e locais de reunião.

Mas o mercado imobiliário não se interessa por estes aspectos do desenho das cidades, porque só

atua em terra regularizada, ou seja, cujo desenho já não seja objeto em questão. Assim, para otimizar

a construção para vender, basta prestar atenção à área e à testada dos lotes. O planejamento, então,

inclui tais indicadores no regulamento da edificação e dá-se por satisfeito.

Os outros índices regulam mais diretamente a construção dos edifícios, e podem ser divididos em

duas categorias: o gabarito e os afastamentos controlam o formato dos imóveis, ao passo em que os

demais controlam a multiplicação do terreno ou o solo criado pela atividade imobiliária.

2.3.1 Planejamento versus economia: agora, o lado difícil.

Dissemos anteriormente que o planejamento deveria explicitar seu compromisso com o atendimento

às carências e com o estímulo à geração de riqueza. No caso da Ocupação do Solo, este

discernimento é mais complexo, uma vez que edificar tanto pode ser o atendimento a uma carência –

e que, em última análise, acaba gerando alguma riqueza – quanto pode ser uma iniciativa direta de

geração de riqueza.

A condição de Cariacica como lugar em que o mercado imobiliário pouco se manifesta acentua ainda

mais a dicotomia entre o que está escrito em suas normas sobre a produção de edifícios e o que a

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cidade verdadeiramente demanda. A autoconstrução está muito mais interessada no controle sobre a

qualidade do tecido que produz, do que na rentabilidade da sua venda, que, de resto, não é um

objetivo primordial.

Assim, para a quase totalidade do território urbanizado desta cidade, a multiplicação do solo é um

aspecto de menor importância. Por outro lado, na perspectiva prenunciada da chegada da atividade

imobiliária comercial, o interesse coletivo indica que uma norma pública deva regular este segmento

também através da forma do conjunto edificado depois de pronto.

Ou seja, tanto numa situação como na outra, o controle sobre a Ocupação do Solo deve ser

formulado a partir de índices como os afastamentos e o gabarito, dos quais podem ser derivados –

por quem tenha interesse nisto – os coeficientes de multiplicação. Pode haver quem argumente que

controlar a criação de solo seria necessário para adequar as demandas ao provimento público da

infra-estrutura.

No entanto, cada vez mais, a infra-estrutura urbana será instalada onde for solicitada e paga pelo

cidadão. Os itens que restam sob a tutela do estado são justamente aqueles que ocupam espaços

físicos significativos na cidade: a mobilidade, o acesso, a iluminação, a ventilação e a dissipação de

ruídos.

E o controle da demanda sobre tais itens da infra-estrutura se traduz exatamente no controle sobre a

forma edificada, através do gabarito e dos afastamentos. A experiência mostra que se a forma urbana

permite a iluminação, a ventilação e a dissipação dos ruídos de modo satisfatório, a mobilidade e o

acesso ficam praticamente assegurados, ressalvados os casos extremos de extensão da cidade ou de

falta de singularidades.

A extensão de Cariacica está confortavelmente dentro dos limites em que a mobilidade é viável nos

arruamentos comuns, se a salubridade dos compartimentos edificados estiver garantida. Mas a

carência de singularidades resultante do mau desenho dos arruamentos poderá conduzir a impasses

de solução mais complexa.

Estamos afirmando que, se o estabelecimento dos índices de Ocupação mudar radicalmente para um

compromisso maior com a salubridade do conjunto edificado, restará à cidade agir proativamente

para a sua aceitação pelos auto-construtores e intervir pontualmente para disponibilizar uma malha

de mobilidade compatível com as densidades resultantes.

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Mas será necessário enfrentar com firmeza as naturais pressões do mercado imobiliário, que verá

seus interesses em Cariacica – ainda que não exatamente imediatos – contrariados pela explicitação

do fato de que a configuração fundiária da cidade não permite altos rendimentos na venda de

imóveis, a não ser às custas da qualidade do tecido edificado e da sua provável degradação.

2.3.2 Um modelo de ocupação baseado na qualidade do tecido urbano

Podemos conceber um esboço do modelo de ocupação do solo que regularia a qualidade do tecido

urbano resultante da sua implementação e que adequaria as densidades edificadas ao desenho dos

arruamentos.

Os critérios de qualidade dos conjuntos edificados são as já mencionadas ventilação, iluminação e

dissipação de ruídos. Nos espaços exteriores, estes critérios são quantificados pela relação H/E, entre

a altura das edificações H e a distância entre elas E. Internamente, os mesmos critérios são medidos

pela relação L/P entre a largura dos pavimentos L e o seu pé-direito.

Tais padrões, portanto, derivam do estabelecimento da altura dos compartimentos interiores,

relacionada empiricamente com a estatura dos habitantes e com o volume de ar interno disponível.

Na prática, este valor parece bem aceito pela população brasileira em torno de 2,60m, ou treze fiadas

de tijolos com 20 cm de altura. Considerando uma espessura de piso acabado em 15 cm, chegamos a

um valor de 2,75m para a distância piso-a-piso P, que será empregado na relação L/P.

Figura 32 - Parâmetros do Modelo de Ocupação.

Outros parâmetros extraídos da prática autoconstrutiva são a) 0,6 < H/E < 2 e b) 2,5 < L/P < 4 em

qualquer caso, e ainda c) o desuso dos afastamentos laterais, substituídos por poços de iluminação e

ventilação, quando as quadras e lotes tem pouca largura. Em Cariacica, encontramos quadras com

larguras entre 40 e 60m, ruas entre 8 e 12m e lotes entre 9 e 12m, combinadas de modos variados.

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Tipicamente, numa quadra de largura 50m com ruas de 10m, construiríamos 4 pavimentos sem

afastamento frontal nem lateral, com 4m de afastamento de fundos e 5,3m de dimensão mínima no

poço de ventilação. Isto resulta em espaços externos com altura de 8,2m, igual à largura (H/E =

1,02); e internos com 7,8m de largura, pouco menor do que três vezes o pé direito (L/P = 2,85).

A Tabela 01 apresenta outros valores calculados para outras dimensões quadra-rua encontradas em

alguns bairros de Cariacica, que resultariam em edificações entre 3 e 7 pavimentos, com

afastamentos frontais entre zero e pouco mais de 2m, afastamentos de fundos entre 3 e pouco mais de

6m e poços com 3 a 8m de dimensão mínima. A densidade edificada7 varia entre 0,7 e 0,5,

diminuindo com o aumento do gabarito.

Tabela 1: Modelo de Controle da Ocupação do Solo. DE = Densidade de Edificação

Quadra Rua H/E L/P P GAB AFR AFD poço DE

40m 8m 0,9 2,5 2,75m 3 pav. 0,0m 3,1m 3,1m 0,7

40 10 0,9 2,5 2,75 3 0,0 3,2 3,1 0,7

50 8 1,02 2,85 2,75 4 0,0 4,0 5,3 0,6

50 10 1,02 2,85 2,75 4 0,0 4,0 5,3 0,6

60 8 1,13 2,85 2,75 7 2,1 6,1 8,1 0,5

60m 10m 1,13 2,85 2,75m 7 pav. 1,1m 6,1m 8,1m 0,5

Como dito antes, é possível derivar os índices de rentabilidade deste modelo, e a Tabela 02 apresenta

os cálculos para o Coeficiente de Aproveitamento, Taxa de Ocupação, Área de Garagens e

Multiplicação Total do lote. Os Coeficientes variam entre 1,5 e 2,7, a Ocupação entre 70 e 50%, as

garagens precisariam de um ou dois pavimentos e a Multiplicação Total ficaria entre 2,2 e 4,1.

7 Relação entre o volume edificado e o volume definido pela área do lote multiplicada pela altura da edificação.

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Tabela 2: Rentabilidade do Modelo Proposto. MT = Multiplicação total. CACar = Coeficientes em

Cariacica.

Quadra Rua CA TO GAR MT GAB AFR AFD poço CACar

40m 8m 1,5 70% 0,7 2,2 3 pav. 0,0m 3,1m 3,1m 1,9

40 10 1,5 70 0,7 2,2 3 0,0 3,2 3,1 1,9

50 8 1,9 60 1,0 2,9 4 0,0 4,0 5,3 2,5

50 10 1,9 60 1,0 2,9 4 0,0 4,0 5,3 2,5

60 8 2,7 50 1,4 4,1 7 2,1 6,1 8,1 3,5

60m 10m 2,7 50% 1,4 4,1 7 pav. 1,1m 6,1m 8,1m 3,5

2.3.2.1 Comparação com os índices do PDM.

Os índices da Tabela 01 foram calculados incluindo no Coeficiente de Aproveitamento toda a área

construída com exceção das garagens. Especificamente, varandas, circulações, compartimentos

técnicos e áreas de lazer comuns cobertas estão incluídas no Coeficiente, para permitir a estimativa

correta da densidade edificada, que só faz sentido se considerada a totalidade da área construída.

É comum que os índices sugeridos pelo mercado às municipalidades calculem o Coeficiente de

Aproveitamento somente com a área interna das unidades habitacionais, excluindo até mesmo as

garagens, que chegam a representar um terço da área total construída. A rigor, levantamentos feitos

em outros municípios da Grande Vitória indicam que a área total construída é mais de duas vezes a

área interna dos apartamentos, ou seja, um Coeficiente 3,0 na lei pode resultar em edifícios mais de

seis vezes maiores do que o lote.

Em Cariacica, os Coeficientes de Aproveitamento do PDM incluem toda a área construída, com

exceção das varandas. No entanto, não foi possível localizar na normativa municipal algum padrão

que limite a área das varandas em relação à área das unidades habitacionais. Já é folclórico o enredo

capixaba de que ‘varandas são boas para a cidade, por isso não devem contar no coeficiente’,

‘varandas abertas são incômodas devido ao vento excessivo e à poeira’ e ‘deve ser permitido fechar

as varandas com vidro’, institucionalizando a ampliação das unidades – e dos coeficientes – através

das varandas.

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Os levantamentos junto ao mercado indicam que cerca de 30% da área interna das unidades são

construídos como varandas, se não contarem no coeficiente. Assim, um aproveitamento que resulte

em 50 apartamentos de 80m² totalizando 4.000m² permitirá a comercialização de unidades com mais

de 100m², totalizando 5.200m² à venda.

Os Coeficientes de Aproveitamento do Plano Diretor de Cariacica variam entre 1,0 e 7,0 com média

pouco acima de 3,0, descontando somente as varandas. A Tabela 02 mostra que, mantendo as áreas

externas com a proporção H/E próxima de 1,0 e os pavimentos com L/P próximos de 2,8,

obteremos, nos arruamentos da cidade, aproveitamentos de 2,7 vezes a área do lote, incluindo as

varandas.

Para possibilitar a comparação, devem ser acrescentadas as garagens e deduzidas as varandas dos

coeficientes calculados, para que correspondam aos índices de Cariacica. A Tabela 02 mostra que

com o modelo proposto, chegaremos, no máximo, a 3,5, valor que o PDM tem como média. Um

coeficiente 7,0 com 10 pavimentos, previsto no PDM em toda a ZOP 1, deve admitir afastamentos de

fundos com meros 3,7m, resultando em blocos de quase 30m de altura espaçados com 7,4m, ou seja,

H/E próximos de 4,0.

Estes espaços teriam a mesma luminosidade de um beco de 1,5m de largura entre casas com dois

pavimentos, do tipo fácil de encontrar em Cariacica. Reproduzir tais condições nas vizinhanças

centrais da cidade é a prática comum brasileira, que resulta da aplicação de índices de rentabilidade

como se fossem controles de qualidade.

Um município que ainda aguarda um eventual incremento no interesse imobiliário pode dedicar

algum tempo a refletir se o seu caminho será estabelecer padrões afirmativos de qualidade do

ambiente construído ou se prosseguirá construindo becos, no caso, com dez pavimentos de altura,

justamente onde pretende instalar uma referência de área central.

2.3.2.2 A construção com afastamentos laterais.

O modelo aqui apresentado considera a inexistência de afastamentos laterais, de tipologia similar à

que a autoconstrução pratica na quase totalidade de Cariacica. Há unidades habitacionais voltadas

para a rua e também para os fundos do lote, daí a preocupação em equilibrar a quantidade de espaço

externo diante das janelas com H/E próximo de 1,0 tanto na rua quanto no miolo da quadra.

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Para a ventilação cruzada nas habitações, é necessário um poço de iluminação e ventilação junto às

divisas laterais, compartilhado entre edifícios em lotes vizinhos, metade em cada lote, com H/E ~

1,5. É a clássica “planta em H”, empregada onde as quadras e lotes são estreitos ou quando há

restrições na altura máxima das edificações.

Se considerarmos os afastamentos laterais, é possível construir mais alto e com aproveitamentos bem

maiores, se admitirmos que, como o edifício será ventilado e iluminado por todas as fachadas, a

relação H/E pode chagar a 1,5 e L/P pode se ampliar até 7,5.

A Tabela 03 mostra que, assim, os coeficientes variam entre 5,1 e 6,2, a ocupação entre 50 e 30%,

algumas garagens teriam três pavimentos, a multiplicação total varia entre 7,7 e 9,3, o gabarito entre

dez e dezoito pavimentos. Os afastamentos ficam entre 9,7 e 19,7m na frente do lote e entre 13,7 e

24,7m nas laterais. A densidade construtiva é bem menor, devido à maior altura, variando entre 0,52

e 0,34.

Tabela 3: Modelo de Ocupação com Afastamentos Laterais.

Quadra Rua H/E L/P CA TO GAR MT GAB AFR AL DE CACar

40m 8m 1,0 7,5 5,1 50% 2,6 7,7 10 pav. 9,7m 13,7m 0,5 6,7

40 10 1,03 7,5 5,7 50 2,8 8,5 11 9,7 14,7 0,5 7,4

50 8 1,03 7,5 5,8 40 2,9 8,7 14 14,7 18,7 0,4 7,5

50 10 1,05 7,5 6,2 40 3,1 9,3 15 14,7 19,7 0,4 8,1

60 8 1,045 7,5 6,2 30 3,1 9,3 18 19,7 23,7 0,3 8,1

60m 10m 1,0 7,5 6,2 30% 3,1 9,3 18 pav. 19,7m 24,7m 0,3 8,1

Sem dúvida, é um modelo que resulta em espaços mais luminosos e arejados, ainda que com mais

altura construída. Mais ainda, mesmo a condição inicial de que H/E seja próximo de 1,0 e as

dimensões típicas das quadras em Cariacica permitem o aproveitamento nos valores apresentados. A

tabela foi calculada considerando somente um bloco edificado na largura total da quadra, ou seja,

seria necessário adquirir e remembrar lotes vizinhos pelos fundos e obter testadas para as duas ruas.

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Na largura, seria necessário adquirir entre três e quatro lotes típicos de 11m para acomodar o edifício

e os afastamentos laterais, ou seja, seria necessário adquirir de seis a oito lotes típicos de Cariacica

para obter os aproveitamentos calculados.

Assim, com terrenos maiores, conseguimos, no arruamento típico da cidade, um aproveitamento de

até 6,2 em 18 pavimentos, correspondentes a um impressionante coeficiente de 8,1 pelo PDM de

Cariacica. As torres teriam cerca de 50m de altura, mas estariam separadas por quase 50m de espaço

externo e os afastamentos frontais poderiam ser parcialmente utilizados para tornar o arruamento

mais generoso.

O efeito da largura das ruas sobre o aproveitamento se explica porque os afastamentos, aqui, são

considerados somados para definir uma distância entre os edifícios. Neste caso, nas laterais e nos

fundos, os afastamentos devem corresponder à metade dessa distância, mas, entre edifícios

fronteiros, boa parte dela fica na rua, permitindo afastamentos frontais menores.

2.4 Conclusões

O estudo da normativa de ordenamento territorial contida no PDM de Cariacica mostra que ela é um

exemplar bastante típico no contexto da região metropolitana em que se insere, bem como do país

como um todo. Suas virtudes e defeitos são mais ou menos as mesmas encontradiças pelo Brasil

afora.

A incorporação das novidades do Estatuto da Cidade e da noção de “Zoneamento de

Planejamento”, em que as intenções e objetivos do poder público são espacializadas de acordo com

as peculiaridades de cada local, são instrumentos poderosos de implementação de políticas públicas.

Os institutos jurídicos e políticos do Estatuto – comumente chamados de ‘instrumentos’ – já

integrados à lei municipal só aguardam as respectivas regulamentações para se tornarem aplicáveis.

Quando isto for feito, restará somente encontrar disposição para encarar os tipos de problemas

urbanos que tais recursos ajudam a resolver.

A segregação dos Impactos mais intensos e nocivos em zonas específicas é um dos pontos mais

acertados do Plano, restando somente alguns ajustes no tratamento interno da zona já eleita pelo

mercado como prioritária para a instalação desses usos; assim como a reconsideração da destinação

do vazio da Fazenda do Estado e das áreas rurais a oeste e sudoeste às mesmas finalidades.

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A demarcação de uma zona de ocupação preferencial para instalar uma Área Central na BR-262

pode significar uma transformação radical na imagem da cidade, se as condições que faltam forem

possíveis e se a expectativa pela novidade não ceder à tentação de construir segundo padrões de

ocupação excessivos e que não terão como resistir, com o tempo, à noção de degradação.

O restante do regulamento sobre o Uso do Solo merece uma revisão profunda, para melhor adaptá-lo

à cidade, em dois sentidos. Primeiro, simplificar os regulamentos ajuda a adequar as demandas

impostas ao poder público para providenciar a aplicação da norma, mais ainda num município

carente de recursos.

Além disso, a oportunidade de redigir uma normativa destinada a gerenciar a iniciativa privada de

instalação de atividades na cidade deveria ser aproveitada para atender ao cidadão de acordo com

suas expectativas. Tudo indica que a realidade local merece ações coercitivas, quanto aos impactos

mais intensos, e educativas, quanto aos demais usos.

Identificar, explicitar e intervir para completar e consolidar uma estrutura viária principal até a escala

local viria ao encontro do que a Cariacica mais precisa neste assunto: informações sobre onde é mais

indicado instalar o comércio, os serviços e a indústria não impactante, em função dos seus alcances

de clientela e de insumos.

O regulamento da Ocupação do Solo também não foge à regra nacional e adota a linguagem e os

índices do mercado imobiliário, mesmo que ele praticamente não atue na cidade. Enquanto isso, a

auto-construção predomina largamente na produção do tecido urbano, ao desabrigo de qualquer

manifestação do poder público a seu respeito. Todo o aparato previsto na norma se destina a um

processo de projeto e edificação que raramente ocorre, raridade que desafortunadamente se coaduna

com a capacidade instalada de análise dos projetos e fiscalização das obras, diante da ubiquidade

auto-construída.

A espera por uma intensificação da atividade da indústria imobiliária pode ensejar a formulação de

índices baseados na qualidade do ambiente construído e que sejam apresentados à população em

atitude também de caráter educativo. Se vão continuar a auto-construir, que o município tenha o que

dizer a respeito, para aprimorar o processo.

Por outro lado, sempre é possível aferir a rentabilidade imobiliária de qualquer modelo de ocupação,

e os estudos aqui iniciados demonstram que é possível obter adaptações mais rentáveis, desde que

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aplicados a terrenos suficientemente espaçosos. De todo modo, fica a lição de que os índices

brasileiros de ocupação do solo dependem de admitir a insalubridade – e a previsível ‘degradação’ –

da cidade, ou de redesenhar os arruamentos, ou ainda, de frentes de expansão parceladas de outro

modo e que estão fora de questão, diante do estoque de lotes de Cariacica.

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CAPÍTULO 3: PROPOSTAS.

O diagnóstico a respeito do Uso e da Ocupação do Solo em Cariacica indica três grandes aspectos

gerais a considerar, na revisão da Agenda do município para os próximos vinte anos.

Primeiro, trata-se de um território que é tido como cenário da viabilização de iniciativas externas, de

caráter privado ou do governo estadual. Principalmente derivadas da instalação de atividades

logísticas e industriais por particulares, ou da instalação do sistema de Transporte Coletivo

Metropolitano pelo estado, as intervenções físicas em Cariacica raramente objetivam o atendimento a

demandas totalmente internas à cidade.

Em segundo lugar, destaca-se a disparidade entre a capacidade operacional da municipalidade e a

magnitude das demandas representadas pela cidade, principalmente no tocante às suas interações

com o meio ambiente natural e às deficiências de origem do tecido urbano em si.

Finalmente, no arcabouço normativo urbanístico consolidado no Plano Diretor Municipal, o desenho

das permissões de Uso está misturado com o desenho das intenções de planejamento, ao passo em

que os índices de Ocupação falam a linguagem de um mercado imobiliário ainda incipiente na

cidade, e nada dizem à autoconstrução onipresente.

As recomendações a seguir têm como princípios gerais o foco nos interesses municipais, seja na

interação com os interesses externos públicos ou privados, seja no trato das questões internas ao

município; a eleição de prioridades de atuação compatíveis com as capacidades operacionais do

governo local e a adequação das normativas de Uso à estrutura urbana e de Ocupação à

autoconstrução, bem como a um eventual mercado imobiliário local.

3.1 Sistema viário e mobilidade urbana

Assim como a BR-262 e BR-101 foram os vetores de expansão municipal após meados dos anos 50,

Cariacica se depara no século XXI com o desafio de projetar seu território e suas conexões

assumindo o direcionamento do crescimento urbano e do reordenamento da área atualmente

ocupada. As pressões em expandir o tecido e gerar o novo são fortes, entretanto o caráter expansivo é

um tanto preocupante, principalmente quando considerado o diagnóstico das características urbanas e

os impactos ambientais dos quais o município tem sido causador e vítima.

A necessidade de integração metropolitana, dada a conurbação existente é fato. Mas como conectar e

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ampliar o acesso a áreas povoadas tão distantes e desprovidas de serviços básicos sem que estas

passem a ser especuladas e devoradas pelo mercado de terras? Ou seja como levar serviços,

transporte e infraestrutura e ao mesmo tempo conter a expansão do tecido, tão ávido de

“desenvolvimento”? Estes são alguns dos desafios que estão associados ao planejamento viário e da

mobilidade urbana.

Novos eixos viários são implantados ao sul, projeções de ponte ao centro metropolitano, novas

conexões logísticas ao norte e leste. Vale lembrar que nenhum caminho, por mais precário que seja,

está isento de impacto sobre o território. O acesso é um caminho sem volta pois, uma vez aberto,

gera novas possibilidade de ocupação e, sem planejamento e gerenciamento se torna uma porta

aberta ao inesperado.

Neste contexto, os projetos viários previstos apontam para alguns novos vetores da dinâmica urbana

em Cariacica. A área central do município, polarizada pela BR-262 tende a se consolidar e novas

frentes de expansão são esperadas, dependentes dos grandes projetos viários.

Numa tentativa de atendimento às necessidades também urbanas, as novas vias ao sul do município

permitem uma maior integração com Vila Velha, promovendo a intensificação dos deslocamentos

intermunicipais. Entre tantas propostas viárias, a Leste-oeste (em execução) e a duplicação da BR-

101 são as que provavelmente se consolidarão no horizonte de 20 anos. Ainda é provável que a

Quarta ponte também saia do papel, promovendo a região central que tende a mudar profundamente,

a comparar com o que acontece com áreas de chegada de pontes e novas conexões com áreas

centrais, neste caso, com Vitória.

3.1.1 Uma proposição

A estratificação da Pesquisa Origem-Destino do PDTU 2007 para os deslocamentos internos a

Cariacica, principalmente nos modos individuais – que independem da vocação externa do Transcol

– permitiu discernir uma configuração da cidade que, aparentemente, ainda não fora alcançada pelos

diversos olhares planejadores que aqui analisamos.

Ao que tudo indica, sempre registramos a estrutura urbana de Cariacica, representada pelas vias

principais existentes, e sempre com o olhar de viés intermunicipal do sistema de transporte coletivo

estadual. É compreensível que a racionalidade na formulação de tal sistema indique a concentração

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no atendimento às demandas predominantes, que evidentemente são aquelas de caráter pendular

casa-trabalho/escola em toda a metrópole, cujo principal destino são regiões do município de Vitória.

Uma configuração urbana registra as dinâmicas dos deslocamentos internos à cidade, que nem

sempre correspondem à estrutura das vias principais, podendo, inclusive, ser bastante divergentes,

como veremos. No caso de Cariacica, esta divergência se mostrou particularmente evidente.

As linhas de desejo de deslocamento mostram que há um intenso relacionamento entre todas as

centralidades mais próximas da BR-262, e que as demais partes da cidade se relacionam mais com

este conjunto central do que entre si. Ou seja, a configuração urbana de Cariacica pode ser lida – e

desenhada – como um núcleo central e unidades suburbanas.

O mapa desta configuração mostra que o núcleo central tem um formato alongado no sentido leste-

oeste, acompanhando a BR-262 dentro do município. Dentro dele estão as localidades de Mucuri,

Itanguá, Itacibá e Boa Vista, ao norte da rodovia federal e estruturadas pelo corredor da ferrovia

desativada Vitória-a-Minas. Ao sul, estão São Francisco, Rosa da Penha, São Geraldo, Bela Aurora e

Jardim América, ao longo do corredor paralelo à ferrovia Centro-Atlântica. Estas três vias são as

principais estruturas do núcleo central de Cariacica, apesar de nunca terem sido registradas assim.

As três principais centralidades da cidade se encontram dentro deste núcleo, nas vias principais,

Campo Grande na BR-262, Itacibá no Corredor Itanguá e Jardim América no Corredor Leopoldina.

No entanto, apesar da intensa dinâmica de deslocamentos entre as várias partes deste núcleo, as

ligações entre suas três vias principais são escassas e desconexas. Existem três ligações da BR-262

com o Corredor Itanguá e mais quatro com o Corredor Leopoldina.

Pela BR-101, é possível conectar a 262 com o Corredor Itanguá, numa interseção que mal chega a

ser sinalizada, apesar de atender a 10% dos deslocamentos internos totais da cidade.

A segunda maior demanda por deslocamentos internos – Itanguá-Campo Grande, 7% do total – é

atendida pela atual rua Dom Bosco, com não mais de 9 metros de largura do alinhamento.

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Mapa 15 – Município de Cariacica Configuração Urbana

A única conexão da BR-262 com o Corredor Itanguá, cujas características dimensionais sejam

compatíveis com as demandas que atende, é o trecho da rodovia José Sette entre Itacibá e a 262. No

entanto, seu traçado, assim como as demais conexões com o Corredor Itanguá, não permite o

prosseguimento para o sul, atravessando a BR-262.

Entre o Corredor Leopoldina e a BR-262 são possíveis as recentes conexões pelas rodovias Leste-

Oeste e Alice Coutinho, que ainda pouco se integram ao tecido urbano e não prosseguem para o

norte.

Dentro de Campo Grande, a conexão do Corredor Leopoldina com a 262 é feita pelo binário

Expedito Garcia Getúlio Vargas e José Gomes.

E dentro de Jardim America, o Corredor Leopoldina vai à BR-262 pela avenida Espírito Santo, em

delicada conexão com as ruas Paraguai e José Barreiros. Esta ligação é a única que tem um

prosseguimento convincente para o norte, através da rua Ailton Faria, ligada ao Corredor Itanguá

em 2009, através de terrenos da companhia Vale. Nenhuma das demais conexões do Corredor

Leopoldina com a BR-262 prossegue para o norte. Ou seja, há um evidente núcleo central

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configurado em Cariacica, mas ainda pouco estruturado para atuar como dele se espera, porque suas

três vias principais não se interligam diretamente.

As unidades suburbanas, por outro lado, se conectam admiravelmente com o núcleo central, através

de corredores bem definidos. A estrada de Caçaroca vai diretamente a Jardim América; Porto de

Santana vai a Itacibá pela avenida Florentino Avidos; a Sede também vai a Itacibá, pela mais antiga

via municipal, a rodovia José Sette e Novo Horizonte chega a Itanguá e Itacibá pela avenida Santa

Luzia. Até mesmo a ainda incipiente unidade suburbana em Padre Gabriel vai a Campo Grande, pela

rua Estrela Matutina.

O mapa completo deste sistema viário nunca foi desenhado claramente como estrutura principal da

cidade, e este fato diz muito sobre como Cariacica tem sido objeto do planejamento viário. Estas vias

cumprem bem o papel de suportar a dependência das unidades suburbanas de algumas centralidades

do núcleo, mas é claramente visível que não atendem bem às dinâmicas internas a este núcleo

central.

Mapa 16 – Município de Cariacica Sistema Viário Proposto colocar só o do corredor

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Isto se explica porque a lógica do transporte coletivo metropolitano prescinde de deslocamentos

internos ao núcleo em si, coletando os fluxos das unidades em terminais que ficam exatamente nos

pontos de conexão com o núcleo e levando-os diretamente para fora do município.

Assim, uma primeira linha propositiva acerca de uma estrutura viária mais voltada para a

configuração existente na cidade trataria de providenciar as conexões mais convincentes entre as

diversas partes internas do núcleo central, principalmente na direção norte-sul, atravessando a BR-

262 com vias arteriais da cidade.

O prosseguimento da rodovia Leste-Oeste até o Corredor Itanguá, por dentro da área da CEASA e as

ligações da rua Eurico Salles, em Campo Grande, com a rua Dom Bosco; e da rodovia Alice

Coutinho com a rua Paulicéia são as travessias da BR-262 que o sistema viário existente apresenta

como mais viáveis.

Esta última ligação poderá prosseguir pela área da indústria desativada Fricasa até encontrar a José

Sette no bairro Santana, providenciando um necessário corredor contínuo norte-sul, da Sede até

Caçaroca.

A BR-101 estaria, portanto, fora deste conjunto, por seu caráter completamente diverso de conexão

regional. Suas interseções com as vias do núcleo – o Corredor Itanguá e a ligação pela CEASA –

deveriam ser em desnível, sem necessariamente providenciar todos os movimentos de conversão. No

restante do seu traçado o mesmo princípio deve ser observado, para separar suficientemente o tráfego

de passagem e de carga desta rodovia do tráfego arterial Urbano de Cariacica.

De acordo com as estratégias de gestão do uso do solo adiante apresentadas, o restante do sistema

arterial da cidade deverá ser complementado em projeto imediatamente – até mesmo para garantir

previamente alguns traçados mais favoráveis – e implementado na medida das demandas instaladas.

Uma conexão entre Santa Paula e Planeta, cruzando a Jose Sette poderá prosseguir pela rua Santa

Leopoldina até o Corredor Itanguá, passando por Nova Valverde e Nova Brasília.

A ligação entre Porto de Santana e Flexal pela rua Amélia Siqueira pode prosseguir sob a BR-101 na

ponte sobre o rio Bubu até a Jose Sette, em Planeta. As ligações Flexal-José Sette (rua Dominique) e

Porto de Santana-José Sette (rua Retiro Saudoso) devem ser preparadas hoje, em projeto e

informação à população, para assumir o caráter arterial assim que a demanda se instale.

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O Corredor Itanguá deve ser complementada com uma paralela na margem esquerda do rio Itanguá,

que poderá atuar em binário com a via atual na margem direita, estruturando todo o vale até o

manguezal em Itaquari.

O Corredor Leopoldina deve ser consolidada ao limite do possível em sua convivência com a

ferrovia, ao mesmo tempo em que as gestões que reivindiquem o remanejamento desta última devem

ser intensificadas.

A conurbação com Viana deverá ser estruturada por duas vias marginais ao rio Formate, com pontos

de travessia convenientemente espaçados. Na margem direita, em Viana, a ocupação lindeira já

existente limitará a via marginal ao caráter local de delimitação da faixa de domínio do rio.

Na margem esquerda, em Cariacica, poderá ser aberta uma via com maior capacidade, que

funcionará como estrutura principal do possível polo de impactos na ZE 1/8 e, posteriormente, como

conexão metropolitana entre a BR-447 e a via marginal esquerda do rio Jucu.

Esta via deverá começar na rodovia do Sol (em Vila Velha), prosseguir sobre a estrada do dique,

encontrar a marginal Formate, a BR-101 (ambas em Viana) e prosseguir até a sede daquele

município, onde poderá encontrar o contorno metropolitano.

Uma travessia da BR-262 entre Novo Horizonte e Vila Betânia, através de Marcílio de Noronha e

(ambos em Viana) ajudaria a complementar estruturação da área conurbada entre os dois municípios

e a definir mais nitidamente a vocação dos vazios vizinhos.

O futuro corredor Padre Gabriel, assim como suas conexões com a estrada de Caçaroca, e com a via

marginal do rio Formate devem ser desenhados como diretrizes de parcelamento dos vazios urbanos

existentes na área.

A conurbação com Vila Velha deverá ser estruturada por duas vias marginais ao rio Marinho, com

pontos e travessia convenientemente espaçados, complementando os existentes. Especial atenção

deve ser dada à duplicidade no leito do rio, assim como aos assentamentos diretamente localizados

sobre suas margens, na definição do traçado definitivo das marginais.

Na margem esquerda do leito original, em Cariacica, a ocupação lindeira limitará a via ao caráter

local de delimitação da faixa de domínio do rio. Na margem esquerda do canal retificado, em Vila

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Velha, poderá ser aberta uma via com mais capacidade, que funcionará como avenida urbana de

articulação entre os dois municípios.

O trecho final do rio Formate, na fronteira sul com Viana, deverá receber vias marginais de caráter

somente local, para delimitação da faixa de domínio do rio. A estrutura viária desta porção do

território poderá ser feita com a conexão local prevista entre Caçaroca e o corredor Padre Gabriel

assim como pela marginal esquerda do rio Jucu.

Os traçados previstos para ligações regionais – BR-447 ao sul, quarta ponte ao norte e novo contorno

metropolitano a oeste – devem providenciar as devidas interseções em desnível com as vias arteriais

urbanas, assim como as conversões minimamente necessárias e possíveis.

Especial atenção deve ser dada à conexão da quarta ponte com o novo contorno, que ajudará a

estruturar o acesso à região do Vale dos Reis, estratégica do ponto de vista turístico e ambiental.

Finalmente, valem algumas considerações sobre o novo traçado da ferrovia Centro-Atlântica. Foram

encontradas duas alternativas na documentação do planejamento para Cariacica, uma que atravessa o

tecido urbano em Planeta e Porto de Cariacica, ligada à ferrovia existente em Nova Rosa da Penha; e

outra que contorna completamente a cidade numa cota mais elevada e encontra a linha atual já em

Santa Leopoldina.

Deve ser encontrada uma escolha definitiva para este traçado, de modo a preparar a cidade para a sua

possível implementação. A travessia do tecido urbano precisaria ser feita em desnível, num trecho

elevado de cerca de 3 km, ao passo em que o contorno da cidade cruzaria pelo menos cinco vales –

dois braços do Bubu, Duas Bocas, Cachoeirinha e Sabão – com inserção topográfica mais delicada e

dependente de obras de arte.

3.2 Vetores da dinâmica urbana:

Abordaremos alguns itens que se afiguram como probabilidades no horizonte de tempo desta revisão

da Agenda e suas repercussões no âmbito do planejamento e da gestão municipais. Em seguida,

abordaremos os aspectos normativos e faremos uma breve incursão sobre a gestão territorial na

região rural do município

3.2.1 O Vetor Vitória

Foi possível colher vários indícios da instalação de um vetor de desenvolvimento urbano ao longo da

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BR-262, partindo do centro em Campo Grande, em direção a Vitória.

A amostra dos resultados da Pesquisa Origem-Destino estratificada somente para as viagens internas

ao município, somada aos expressivos volumes de viagens para a capital, cuja única rota é a 262,

indicam a localização favorável de habitação em densidades mais elevadas ao longo do seu traçado,

principalmente se atendida por transporte coletivo de capacidade adequada.

A intenção explicitamente manifesta no PDM de consolidação de uma referência de área central

neste mesmo traçado demonstra que tal localização favorável já foi percebida e incorporada aos

objetivos – declarados – do planejamento local.

Já assinalamos que seria a área mais adequada para a instalação de um segmento de mercado

imobiliário, combinando aquelas demandas locacionais favoráveis com a relativa disponibilidade de

lotes maiores do que a média da cidade, sejam lindeiros à rodovia ou nas suas imediações.

Esta instalação ocorreria dentro do núcleo da configuração urbana atual, coincidindo com a sua

principal estrutura interna, a própria BR-262 no trecho entre a CEASA e Jardim América. Tal

coincidência somente realimenta os fatores favoráveis à instalação deste vetor e contribui para

otimizar o aproveitamento da infra-estrutura urbana instalada na área.

Já mencionamos que este processo dependeria da retirada ou sensível redução do tráfego pesado de

carga pela rodovia, que, por sua vez, depende da consolidação de rotas alternativas de iniciativa

estadual, de que trataremos adiante. De todo modo, é importante notar que é um processo já em

curso, ainda que somente esboçado, mas que praticamente independe da iniciativa e, principalmente,

de grandes volumes de recursos municipais.

A gestão da instalação desta dinâmica depende de um projeto urbano para toda a área, que pode

ser elaborado e pago pela iniciativa privada, a partir de termo de referência publicado pela Prefeitura.

Em paralelo, deve ser instalada uma articulação da municipalidade com o governo do estado, no

sentido de concluir a conexão da rodovia Leste-Oeste com Vila Velha, como rota alternativa

provisória para o tráfego de carga.

Esta ligação será feita com um segmento da rodovia BR-447, de que depende diretamente a

consolidação do vetor Vitória nos moldes aqui apresentados. Por outro lado, a BR-447 é, em si,

também um vetor da dinâmica urbana local e será abordada em seguida.

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Os demais aspectos da iniciativa municipal para a concretização deste vetor Vitória são a adaptação

específica do modelo de Ocupação para o mercado imobiliário no local, assim como a instituição da

ocupação compulsória de terrenos sub-utilizados dentro do núcleo da cidade, em Vila

Independência, Itacibá, Vera Cruz, Bela Vista, Campo Feliz, Dona Augusta e Jardim América.

3.2.2 O Vetor Vila Velha

A construção da rodovia Leste-Oeste é um daqueles momentos em que interesses diversos e externos

a Cariacica se materializam numa mesma obra. De um lado, a iniciativa privada a demandar uma rota

mais adequada para a carga pesada entre o porto de Capuaba e o sistema de rodovias federais; do

outro, o governo estadual a providenciar conexões que faltam no sistema Transcol.

Inteiramente desenhada sobre o curso do córrego Campo Grande, é uma ligação entre as

proximidades da CEASA e uma travessia do rio Marinho, a meio caminho entre Jardim América e

Caçaroca. Percorre uma região densamente arruada, seguindo o único desenho possível que evita

atravessar diretamente o tecido urbano consolidado, canalizando o córrego.

Sua condição urbana, portanto, acrescenta aos seus objetivos originais o efeito previsível de

estruturação arterial da mobilidade dos bairros vizinhos. Este efeito se coaduna bem com a rota

das linhas troncais do transporte coletivo, mas tende ao conflito com o tráfego de passagem de carga.

Mais ainda, a ligação com Vila Velha não se resume ao porto, mas também à praia, que é o principal

fator locacional do mercado imobiliário de alta renda da Grande Vitória.

Uma ligação nova e inicialmente desimpedida, com bom traçado e boa pavimentação, poderá

estender o alcance do litoral à região que atravessa em Cariacica, desde Valparaíso e Santa Paula,

passando por Morada de Campo Grande e Santa Bárbara e até mesmo chegando a Vila Palestina e

São Francisco. As conexões com a estrada Alice Coutinho e com a Estrada de Caçaroca incluiriam

praticamente todo o restante da porção urbanizada ao sul do núcleo central no mesmo alcance do

litoral.

Este seria, então, um segundo vetor de intensificação da urbanização, inclusive atraindo alguns

segmentos do mercado imobiliário, principalmente pelo empresariado local. Deve-se observar que

as motivações serão completamente diversas do vetor Vitória, porque não terá as demandas já

instaladas de fluxo para a capital nem a generosidade fundiária das testadas para a BR-262.

A demanda será de caráter completamente subjetivo – a proximidade temporal com o mar – e seu

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atendimento será viabilizado nos lotes típicos da cidade. No entanto, este tipo de motivação é dos

mais poderosos no mercado de imóveis e já demonstramos que é possível multiplicar e vender

razoavelmente o solo nos arruamentos comuns de Cariacica.

De todo modo, é um processo que depende da finalização da conexão da rodovia Leste-Oeste com

Vila Velha, usando parte da BR-447. Como se trata de obra inacabada, mas que certamente será

concluída, é possível antever que, caso venha a se instalar, o vetor de crescimento urbano para Vila

Velha também pouco dependerá da iniciativa e de grandes recursos municipais.

A articulação com o governo estadual para reivindicar a conclusão da obra da 447 já é um fator

primordial para a instalação do vetor Vitória na BR-262. Além disso, restaria a eventual adaptação do

modelo de ocupação ao mercado, mas, neste caso, como se trata de tecido urbano comum e já

consolidado, cremos que o mais indicado seria construir como no restante da cidade.

Um detalhe sobre este vetor Vila Velha é que ele ocorrerá fora do núcleo central de Cariacica, sobre

a continuidade que já existe do tecido urbano no sentido sul, somente intensificando a ocupação e a

dinâmica dos usos. Enquanto o vetor Vitória, dentro do núcleo, reforça a configuração geral da

cidade, o vetor Vila Velha acentuaria a disparidade observada entre o sul e o norte.

De fato, a topografia gerada pela drenagem natural determina que se possa avançar, ao sul da BR-

262, ao longo da suave declividade dos córregos. Para o norte, ao contrário, é necessário atravessar o

vale do rio Itanguá, galgando suas encostas, bem mais íngremes. Além disso, o fundo deste vale é

mais largo e alagadiço, tendo recebido uma das grandes concentrações de tecido urbano sub-normal

na cidade.

Todos esses fatores são barreiras que tem detido a expansão do núcleo central para o norte e

incentivado seu prosseguimento para o sul, tendência que será reforçada pela instalação do vetor de

crescimento para Vila Velha. Mais adiante veremos que tal desequilíbrio deverá ser principal objeto

de atenção da municipalidade.

3.2.2.1 O eixo BR-447

Desta rodovia depende a instalação dos vetores de crescimento para Vitória e para Vila Velha,

retirando o tráfego de carga do primeiro e providenciando a rota do litoral ao segundo. Em que pese

o potencial conflito entre a carga ao porto e a ida à praia, é possível que, num prazo médio, os dois

possam conviver razoavelmente. No entanto, a consolidação definitiva de ambos dependerá do seu

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atendimento por estruturas separadas, vale dizer, por outra rodovia para o fluxo de carga.

Esta última aparece somente esboçada, no extremo sul de Cariacica, no que seria uma estrutura geral

para o território até Viana, pela margem esquerda do rio Jucu, atravessando áreas ainda francamente

rurais e compatíveis com uma rota de carga. No entanto, está diante da municipalidade o interesse

direto na conclusão do trecho iniciado entre a rodovia Leste-Oeste e Vila Velha, assim como na

definição do traçado restante, de conexão com a BR-262.

A conformação territorial indica levá-la a noroeste, fazendo a ligação próxima à ponte da 262 sobre o

rio Formate, opção que esbarra na delicada feição das margens do Formate junto à ponte, onde há

uma zona de preservação ambiental contígua às instalações da antiga indústria Braspérola. A rigor,

este trecho a noroeste será parte da marginal esquerda do rio Formate, que poderá prosseguir ao sul

junto ao rio, com a devida interseção em desnível com a BR-447, com as conversões necessárias.

Assim, a atenção à BR-447 deve ser dada à sua ligação com Vila Velha e a manutenção do seu

caráter suburbano, com restrição à instalação de usos lindeiros e função de mobilidade regional.

Deve ser especialmente enfatizada a necessidade da previsão de interseções em desnível, com a

estrada de Caçaroca, e com o futuro corredor Padre Gabriel e com a avenida marginal do rio

Marinho.

Estes aspectos é que devem ser prioritariamente tratados pela prefeitura de Cariacica, enquanto não

se consolida o desenho definitivo da ligação com a BR-262. Antes dessa ligação, o tráfego de carga

fluirá certamente pela Leste-Oeste; depois disso, o interesse municipal deverá se concentrar na

proibição deste tráfego, que deverá ser finalmente desviado em definitivo para a BR-447.

3.2.2.2 A Evolução em Caçaroca e Padre Gabriel

Estas localidades são os extremos da urbanização de Cariacica para o sul, limitada pelo vale do rio

Formate, fronteira com Viana. O território prossegue em morros de até 40m por cerca de 1 km, até

encontrar a extensa várzea inundável do rio Jucu. O corredor de Caçaroca está urbanizado até a

fronteira municipal, ao passo em que o corredor Padre Gabriel se encontra detido 2 km antes, no

limite de propriedades rurais ainda não parceladas.

Esta região terá sua estratégia de gestão condicionada à ligação com Vila Velha, pela BR-447. Antes

dela, deverá ser mantido o caráter suburbano dependente do núcleo central nas duas localidades.

Os novos arruamentos devem ser proibidos e a ocupação de lotes vagos deve ter prioridade total. A

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estrada de Caçaroca deve receber um projeto de alinhamento que possibilite o futuro alargamento e

qualificação do desenho urbano como via arterial, simultâneo com a fiscalização rigorosa das novas

edificações.

O corredor Padre Gabriel, onde se pode presenciar o início do processo que resulta numa cidade

como Cariacica, está no momento exato para o traçado do seu prolongamento ao sul. Isto deve ser

feito com a definição legislativa de diretrizes de parcelamento das propriedades ainda rurais,

literalmente desenhando um sistema de vias arteriais – inclusive de conexão com a estrada de

Caçaroca – e demais servidões públicas em meio às atuais pastagens.

Sempre que houver iniciativas de urbanização, serão submetidas às diretrizes vigentes, nos exatos

termos da lei 6766/76 de Parcelamento do Solo Urbano. Será uma oportunidade – tardia – de aplicar

a esta frente de urbanização as prescrições federais tão pouco empregadas no Brasil, apesar de já

velhas de décadas.

O trecho já existente deste corredor deve receber o mesmo tipo de projeto de alinhamento

recomendado para Caçaroca, com especial atenção à interseção com a BR-447, onde será

importante prever uma solução em desnível.

Depois da ligação da BR-447 com Vila Velha, a região estará sob a influência do alcance da praia,

como mencionado anteriormente. A partir desse momento, deverá ser monitorada cuidadosamente a

nova conexão, com especial atenção ao controle da expansão do tecido, que deverá ser contida, em

favor da ocupação dos lotes vagos nos arruamentos existentes.

Em paralelo, estará presente a oportunidade do lançamento de operações de redesenvolvimento

urbano e reajuste fundiário. Estas operações terão como objetivo a remoção da ocupação em áreas de

preservação e/ou risco e o redesenho do arruamento sub-normal em bases mais convencionais, para

viabilizar a conseqüente instalação de uma centralidade suburbana mais independente do núcleo

central da cidade.

3.2.3 A Zona Industrial Norte

Esta área corresponde ao desenho das Zonas Especiais 1/01 e 1/02 do Plano Diretor Municipal, e

seria especificamente designada para receber a instalação dos usos incompatíveis com as vizinhanças

urbanas devido ao excessivo grau de impacto. Esta segregação depende da classificação extensa das

diversas atividades econômicas, principalmente as industriais e de serviços.

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Deve ser admitida alguma flexibilidade de localização para as atividades que não dependam de

medidas de controle e mitigação de impactos sobre o meio ambiente, como ruídos e efluentes

sólidos, líquidos ou gasosos, que poderiam ser classificadas como passíveis de localização também

ao longo das testadas da BR-101. As demais, no entanto, devem ser obrigadas a se instalar na zona

industrial, onde será possível concentrar o monitoramento de tais impactos, reagir mais prontamente

a eventuais imprevistos e resguardar ao máximo a cidade da sua propagação acidental.

Nunca é demais lembrar que, por contingências várias, esta localização industrial acabou ficando a

montante do vento dominante em Cariacica. Isto contra-indicaria inicialmente tal zoneamento, mas o

estado presente de consolidação da área indica que a convivência com o potencial de propagação

poluidora será inevitável.

Atualmente, já se localizam na área diversos empreendimentos logísticos que se afiguram como uma

retro-área remota do complexo portuário, servida pela rodovia BR-101 e por um ramal ferroviário da

empresa Vale. Tais atividades efetivamente ocupam espaço de estocagem, mas empregam

proporcionalmente pouca mão de obra. Além disso, há instalações de reciclagem de resíduos que

também consomem espaço e geram poucos empregos.

A ocupação presente mal atinge 10% do total demarcado como ZE 1/01 e 1/02, mas o principio da

segregação dos impactos somado à perspectiva de crescimento econômico do estado indicam ser

acertada a generosidade das previsões. O restante desocupado da área vai até as fronteiras

municipais, com a Serra, no rio Santa Maria, e com Santa Leopoldina, no córrego do Sabão.

Compreensivelmente, as instalações atualmente se dispõem ao longo da rodovia federal, mas sua

expansão deverá avançar sobre os morros até o vale do córrego do Engenho e chegar à várzea do

córrego do Sabão. Esta última tem sua maior extensão em território de Santa Leopoldina, o que

indica a oportunidade de ajustar com o vizinho os termos gerais da instalação da zona industrial.

O mais indicado seria a elaboração de um projeto completo para um distrito industrial de grande

porte na região, devidamente acompanhado dos respectivos estudos de impacto para a totalidade da

Zona Industrial definida, incluindo possíveis porções em terras de Santa Leopoldina. O termo de

referência seria produzido em conjunto pelos dois municípios e a elaboração correria por conta da

iniciativa privada e das agências estaduais de fomento econômico.

Deve ser dada especial atenção ao processo já detectado de terraplanagem de unidades inteiras do

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relevo – desmonte de morros – para o nivelamento da várzea ao abrigo das inundações. Embora

justificável para o aproveitamento econômico da área, deve ser controlado por um desenho

abrangente, que identifique as drenagens que devem ser mantidas e as faixas de domínio dos

principais cursos d’água que devem ser preservadas.

Além disso, um sistema viário compatível com os fluxos de carga previsíveis deve ser

completamente lançado como diretriz, ainda sobre as atuais pastagens, para servir de referência para

as futuras expansões. Do ponto de vista de Cariacica, seria prioritária a instalação de unidades

geradoras de emprego em proporções mais intensas, que absorveriam a mão-de-obra local e

influenciariam mais diretamente, e para melhor, os bairros mais próximos.

3.2.3.1 Evolução na Sede e em Porto Belo

Estas localidades estão no extremo norte da urbanização de Cariacica, limitada pela Zona Industrial

que interessa manter e expandir, principalmente com atividades empregadoras. A estratégia de gestão

da Sede e dos bairros vizinhos a Porto Belo dependerá, portanto, da criação mais intensa de postos de

trabalho na Zona Industrial vizinha.

Enquanto esta nova condicionante não se instala, deverá ser mantido o atual caráter suburbano

dependente do núcleo central, para minimizar a dispersão territorial das demandas pela atuação da

municipalidade. Devem valer as mesmas recomendações quanto à proibição de novos arruamentos e

de prioridade à ocupação de lotes vagos.

A rodovia José Sette, corredor arterial de conexão da região com o núcleo, assim como a ligação

secundária entre a Sede e Porto Belo, devem receber projetos de alinhamento e desenho urbano para

futuro alargamento, nos mesmos moldes propostos para o sul da cidade. Devem ser identificadas e

incluídas no projeto as estruturas de interconexão entre os diversos bairros vizinhos, desde Prolar e

Antônio Ferreira Borges, até Porto Belo, Nova Rosa da Penha e Vila Esperança.

Caso ocorra a instalação de unidades empregadoras na Zona Industrial, estarão presentes as

condições de um adensamento urbano dessas localidades, que serão o endereço preferencial de

residência da mão-de-obra empregada nas proximidades. Haverá, então, oportunidade de requalificar

a centralidade original da Sede do Município e de consolidar uma unidade suburbana mais

independente do núcleo central.

A expansão do tecido deverá ser rigorosamente controlada, estabelecendo uma ordem de prioridades

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para a ocupação dos vazios existentes entre os vários arruamentos, sempre subordinada à preferência

pela ocupação de lotes vagos. Uma operação de regularização da relação entre a propriedade privada

e as áreas de preservação das drenagens naturais completará as diretrizes para esta área, onde

praticamente não se observam arruamentos sub-normais.

3.2.4 O eixo quarta ponte

Este item da dinâmica urbana de Cariacica, apesar de estar entre os de formulação menos nítida e

explícita, poderá desencadear processos que dependerão de ações que consideraremos prioritárias

para a cidade. A rigor, é somente uma intenção, algumas vezes declarada e, outras tantas, registrada

em mapas, de ligação direta entre o núcleo metropolitano na região da Praia do Canto, em Vitória,

com o sistema de rodovias federais, evitando atravessar justamente Cariacica e o núcleo original do

Centro de Vitória.

Ou seja, é mais uma manifestação da idéia de que esta cidade é um obstáculo a ser, no mínimo,

contornado por novos caminhos. No entanto, neste caso, trata-se de providenciar um novo caminho

para o principal centro metropolitano e de evitar o caminho atual, a BR-262, onde Cariacica pretende

que se instale o seu centro urbano.

Se a mobilidade intermunicipal com Vitória é a mais expressiva da região metropolitana, e aquela

com a região da Praia do Canto não é a maior de Cariacica, podemos concluir que a nova ligação

afetará pouco a vida urbana atual da cidade. No entanto, a ligação, como tem sido desenhada,

atravessará as terras da Fazenda do Estado, vazio urbano no platô imediatamente a norte do vale do

rio Itanguá.

Assim, se houver um novo caminho regional para Vitória, atravessará Cariacica em terrenos, em

sua maior parte, sem ocupação, nem mesmo com arruamentos. Parece ser a oportunidade de

implementar uma base fundiária de padrão mais amplo do que a média municipal, estruturada pela

nova via, e atrair para ela segmentos de renda mais alta no mercado imobiliário.

Esta estratégia passa, portanto, inicialmente, pela articulação com o governo estadual, para a

definição de um traçado definitivo para a ligação da BR-101 com a nova ponte e de uma gradual

redefinição dos usos da área da fazenda do estado, que seriam revertidos para o tipo urbano misto.

No interesse do município, esta via deverá ter caráter suburbano de estruturação regional, restrição

de usos lindeiros, conexões em desnível com a arterial José Sette, com o conector secundário Itacibá-

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Santana e com a Avenida Vale do Rio Doce de Cariacica; e ter a possibilidade de prolongamento a

oeste da BR-101, até a região do Vale dos Reis.

3.2.4.1 A operação urbana Itanguá

Aqui está a estratégia prioritária da prefeitura de Cariacica, dadas as condições em que os elementos

da dinâmica urbana se apresentam à cidade. Os vetores Vitória e Vila Velha, bem como o Distrito

Industrial no extremo norte, se afiguram como processos em curso, que pouco dependem de ações do

próprio município e que, principalmente, praticamente não encontrarão obstáculos em seu

desenvolvimento.

O eixo da quarta ponte, ao contrário, precisará ainda de mais consistência para adquirir o status de

probabilidade assegurada, e, neste caso, a oportunidade que apresenta a Cariacica depende de que o

município tome algumas providências estratégicas.

Além da interação com os segmentos externos que efetivamente poderão decidir implementar o novo

acesso regional a Vitória, será necessário remover os obstáculos internos à plenitude dos benefícios

que ele possa trazer a Cariacica. Especificamente, o novo eixo fica no limite norte do núcleo central

da cidade, separado do centro em Campo Grande e seu crescimento pela BR-262 pela topografia

acidentada e pelos assentamentos sub-normais do vale do Itanguá.

Faltam conexões viárias entre o principal eixo urbano da cidade e o possível novo acesso a Vitória,

além de existir, entre um e outro, uma grande concentração de tecido urbano incompatível com

qualquer perspectiva de crescimento e prosperidade. Será prioritário atuar nesta região para

completar a qualificação do núcleo central, otimizar a infra-estrutura nele instalada e preparar a

possível conexão com o eixo da quarta ponte.

Um projeto urbano para todo o vale do Itanguá, desde a nascente em Mucuri, até o manguezal em

Itacibá, contemplaria os projetos de alinhamento do corredor sobre o traçado da antiga ferrovia

Vitória a Minas, bem como das arteriais de travessia do vale em Vila Capixaba, Nova Brasília,

Itanguá e Itacibá. Além disso, demarcaria uma grande operação de redesenvolvimento urbano e

reajuste fundiário em Itanguá, com financiamento externo – possivelmente internacional, dadas as

condições do local – para o reassentamento da ocupação das áreas de risco e/ou preservação,

ocupação de vazios e instalação de um parque municipal.

A concentração de esforços prioritariamente nesta área será acertada, mesmo que a quarta ponte não

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venha a se confirmar no horizonte de tempo desta Agenda. Antes de aproveitar as oportunidades

oferecidas por uma iniciativa externa como esta, a própria conformação urbana da cidade indicaria

que qualificar o núcleo central e manter o caráter dependente dos outros centros é a melhor

estratégia de espera por aquelas chances.

No caso do aproveitamento de oportunidades que se concretizem, a preparação de uma continuidade

do tecido urbano regular, entre a centralidade instalada e a novidade junto ao novo acesso, poderá

evitar a conhecida sucessão urbana. Quando um novo centro deixa para trás um antigo, na condição

de ‘degradação’, ou seja, perda de renda, observa-se o que ocorreu, por exemplo, no centro original

de Vitória, e que não deveria ocorrer no centro que Cariacica mal começou a expandir.

3.2.4.2 Evolução em Porto de Santana, Flexal e Planeta

Estas localidades ficam ainda mais ao norte, depois da fazenda do estado e antes do rio Bubu. Porto

de Santana tem o maior volume de viagens para o núcleo central da cidade, bem como para Vitória,

dentre as localidades fora daquele núcleo. Esta mobilidade foi recentemente incrementada pela

abertura da Avenida Vale do Rio Doce, que leva diretamente a uma travessia do rio Marinho e a

Itacibá, por conexões sobre a ferrovia Vale, junto ao mangue do Itanguá. Flexal e Planeta são bairros

a meio caminho entre o núcleo e a Sede, repartindo a dependência desses dois centros pela rodovia

José Sette.

A gestão dessa região dependerá dos acontecimentos relacionados com a quarta ponte. Antes da sua

concretização, o caráter suburbano dependente do núcleo central deverá ser mantido, e as conexões

internas e com os centros vizinhos deverão ser melhoradas, com projetos de alinhamento e desenho

urbano. Devem ser contemplados a própria rodovia José Sette, os conectores secundários Porto de

Santana-Flexal, Porto de Santana-Planeta e Planeta-Nova Brasília; e deve ser lançado, através da

fazenda do estado, o conector secundário Porto de Santana-Itacibá.

Após a eventual concretização da quarta ponte, e da ocupação da fazenda do estado nos moldes aqui

delineados, poderá ser desencadeado um processo de crescimento urbano controlado na região,

sempre estabelecendo a hierarquia de prioridades da ocupação dos vazios entre os arruamentos,

depois ocupação dos lotes vagos existentes.

Poderá ser lançada uma operação urbana de requalificação dos arruamentos nos morros Presidente

Médici e Aparecida e de reajuste da interação do tecido urbano com as áreas de preservação das

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drenagens naturais. Ao cabo deste processo, poderão ser consolidadas, ao menos, duas centralidades

suburbanas menos dependentes do núcleo, em Porto de Santana e Flexal ou Planeta.

3.2.4.3 A evolução no Vale dos Reis e Novo Horizonte

O Vale dos Reis é uma região francamente rural, que começa entre a serra do Anil e o monte

Mochuara e que pode ser acessada pelo prolongamento da ligação à quarta ponte a oeste da BR-101.

Antes da efetivação deste prolongamento, deverá ser mantido exatamente como se encontra, com

fortes restrições à urbanização de qualquer espécie.

Depois da efetivação do novo acesso – que dependerá de diretrizes específicas para ele na área

demarcada como ZE 1/04 – poderá ser desencadeado um processo de crescimento pela permissão de

atividades de lazer e turismo, combinadas com condomínios horizontais de baixa densidade e

potencial atração de renda mais alta.

O caráter desta área se mostra bastante adequado ao tipo de parcelamento que resulta em pequeninos

sítios ou mesmo em lotes grandes, que se pode encontrar na região serrana do estado: pitorescas

paisagens montanhosas, clima ameno e vida no campo para os fins de semana. Se isto puder ser

mantido assim e providenciado um acesso minimamente confortável, Cariacica poderá instalar uma

“região serrana de baixo”, aos pés do Mochuara, e, mais importante, a um terço da distância até

Domingos Martins, por exemplo.

O corredor de Novo Horizonte é o prolongamento a oeste da via arterial que percorre a antiga

ferrovia Vitória a Minas, a partir de Itacibá. É uma autêntica transição entre o tecido urbano comum e

a zona rural, uma vez que acompanha as drenagens naturais dos afluentes do rio Formate, que

conduzem às encostas do maciço da parte alta do Município.

Esta região terá sua estratégia de gestão condicionada à evolução do crescimento no Vale dos Reis.

Antes dela, deverá ser mantido o caráter suburbano dependente do núcleo central nas duas

localidades. Os novos arruamentos devem ser proibidos e a ocupação de lotes vagos deve ter

prioridade total. A estrada de Novo Horizonte deve receber um projeto de alinhamento que

possibilite o futuro alargamento e qualificação do desenho urbano como via arterial, simultâneo com

a fiscalização rigorosa das novas edificações.

Um outro fator de crescimento em Novo Horizonte seria derivado da construção do ramal da ferrovia

Centro Atlântica, previsto para as imediações. Sobre os morros até a várzea do rio Formate, está

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proposta a instalação de um segundo distrito logístico/industrial, que seria fomentado pela presença

da nova ferrovia.

Em que pese a racionalidade da indução ferrovia + área livre = indústria, há que considerar a posição

contrafeita deste enclave na transição para área rural do município. Sua presença seria

completamente estranha a todas as imediações, por mais que se argumente com a proximidade – 2

km – do esboço para o traçado do novo contorno metropolitano.

Esta região é a continuação do Vale dos Reis, que se divide subindo o rio Formate e o córrego Roda

d’Água, para onde se poderiam expandir as atividades de lazer, turismo e residência de alta renda

já mencionadas. Dadas as condições ainda remotas da concretização da nova ferrovia e do novo

contorno, seria recomendável manter o zoneamento rural, até que uma conjuntura mais definida se

apresente.

Depois da possível conexão do Vale dos Reis com a quarta ponte, Novo Horizonte estará sob a

influência dos novos assentamentos de lazer, turismo e residência, dos quais poderá funcionar como

centralidade urbana mais próxima. A partir desse momento, deverá ser monitorada cuidadosamente a

nova conexão, com especial atenção ao controle da expansão do tecido, que deverá ser contida, em

favor da ocupação dos lotes vagos nos arruamentos existentes.

As mesmas recomendações valem para o caso da instalação de atividades geradoras de emprego em

função da ferrovia e do novo contorno, cuja residência preferencial se daria obviamente em Novo

Horizonte e suas imediações.

Em paralelo, estará presente a oportunidade de viabilizar a conseqüente instalação de uma

centralidade suburbana mais independente do núcleo central da cidade, a depender da vitalidade com

que se instalem os novos usos no Vale dos Reis.

3.3 Uso do solo – o Zoneamento de uso misto

A análise da normativa urbanística de Cariacica para o uso do solo aponta em duas direções:

desatrelar o desenho das permissões de uso daquele das intenções de planejamento, e dar, a cada um

deles, um desenho mais compatível com seus objetivos.

O desenho das intenções de planejamento pode facilmente ser derivado das recomendações

apresentadas para a gestão estratégica dos vetores da dinâmica urbana. Isto implicará em alguma

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revisão das atribuições de ‘Ocupação preferencial’ atualmente contidas no PDM, mas a maior parte

do zoneamento de planejamento deverá ser mantida.

As permissões de uso, por sua vez, poderão ser muito simplificadas, de modo a otimizar a demanda

pela tutela municipal e potencializar a prosperidade da iniciativa privada. Uma vez estabelecida a

segregação dos usos de impacto na Zona Industrial e ao longo da BR-101, todo o restante do tecido

urbano seria considerado de uso misto, com o comércio e os serviços preferencialmente localizados

sobre a malha de ruas principais. Não é demais salientar que os usos residenciais devem ser

proibidos na Zona Industrial e fortemente desencorajados ao longo da BR-101.

Assim, ao poder público caberia a ação coercitiva da segregação dos impactos e a ação indutora da

organização da mistura de usos com a malha viária. Esta última inclui, sem dúvida, a intervenção de

qualificação, identificação, conexão e mesmo de abertura dos segmentos que comporão o sistema

viário principal.

No entanto, será também preciso levar à população o conhecimento de que instalar comércio e

serviços nas ruas principais – e também nas que se tornarão principais – é uma atitude desejável

para todos, porque potencializa a rentabilidade individual dos negócios e contribui para a

organização geral da cidade.

Mapa 17 – Município de Cariacica Uso do Solo e Sistema Viário Propostos

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Esta organização permitirá células formadas por grupos de ruas exclusivamente residenciais, com

pouco tráfego e/ou ruído, circundadas por ruas onde estará a oferta das comodidades urbanas ao

alcance do pedestre, incluindo o transporte coletivo até as centralidades principais.

Esta malha de ruas de atividades dinâmicas deverá ser objeto de um departamento específico de

projeto urbano na prefeitura, integrado por quadros de carreira. Sua função é literalmente desenhar a

cidade, desde a intervenção nas áreas consolidadas até o desenho das diretrizes para as possíveis

expansões sobre glebas rurais.

Este departamento deverá produzir os projetos de alinhamento e desenho urbano recomendados nos

itens anteriores para os corredores principais da cidade. Deverá também demarcar detalhadamente as

áreas de preservação ambiental do município, com especial atenção às encostas muito inclinadas e

aos leitos de drenagem natural dentro do tecido urbano.

Todas essas áreas devem ter seu perímetro delimitado por servidões públicas, que podem ser

utilizadas como vias de tráfego ou não, a depender da conveniência do sistema viário da cidade. Mas

a presença do acesso público ao longo das fronteiras das áreas de preservação é um princípio

altamente desejável ao controle e à manutenção da própria preservação. As áreas preservadas assim

demarcadas devem ser objeto de representação em um mapa escolar do município, com grande

destaque visual ao formato assumido pelas áreas de preservação. A familiaridade com a conformação

espacial da natureza preservada é um item essencial da educação.

Do mesmo modo, o mapa geral da área urbanizada e mapas setoriais da cidade contendo

claramente indicadas as ruas mais adequadas à instalação do comércio e serviços devem ser

publicados e disponibilizados à população, para que internalize as recomendações ali contidas e se

integre mais conscientemente ao processo de produção da cidade.

3.3.1 Indústria, instituições e serviços

Como observado antes, as atividades industriais, institucionais e de serviços deverão ser classificadas

de acordo com seus impactos sobre a natureza e sobre as vizinhanças urbanas. Estes impactos poder

ser gerados por efluentes da atividade em si, por fluxos de acesso de matérias primas, rejeitos,

mercadorias e/ou clientes; ou ainda simplesmente pelo porte físico das instalações.

Podemos imaginar três categorias: a) as atividades que podem se misturar ao tecido urbano; b) as que

necessariamente deverão ser segregadas numa Zona Industrial e c) as que poderão se localizar ao

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longo da malha viária de maior alcance – as rodovias federais.

O município deve publicar uma classificação inicial das atividades – baseada no Cadastro Nacional

das Atividades Econômicas, CNAE, por exemplo – que será complementada á medida em que novas

atividades se apresentem para licenciamento e recebam a respectiva classificação de impacto, a cargo

do Conselho gestor do Plano Diretor Municipal.

Possivelmente, a quase totalidade dos usos institucionais poderá se misturar ao tecido urbano, pela

regra da localização sobre a malha de vias principais. Os serviços tenderão a se dividir entre as três

categorias de impacto e possivelmente as indústrias deverão predominar nas categorias de

segregação.

3.3.2 Zonas Especiais

A localização da indústria e dos usos de maior impacto é controlada pelas ‘Zonas Especiais’ no

PDM. É possível identificar um caráter específico para cada uma delas, como a seguir:

As ZE 1/01 e 1/02 são, sem dúvida, a Zona Industrial Norte já consolidada e sua reserva de

expansão, merecedoras do projeto completo já mencionado.

A ZE 1/03 corresponde às instalações do Educandário Alzira Bley e da antiga Colônia Pedro Fontes

para leprosos, que hoje funciona como unidade estadual de saúde aberta à população. Apesar de

vizinha, seu caráter deve ser completamente diverso da Zona Industrial, tanto pelas atividades

existentes, quanto pela localização, na margem esquerda do manguezal do rio Bubu. Deve ser objeto

de um projeto para toda a área, que deve equacionar a transição entre a ZI e o manguezal, a sua

possível travessia por um novo ramal ferroviário, a manutenção das atividades existentes e o possível

remanejamento de algumas instalações da fazenda do estado, como o Centro de Treinamento da

Polícia Militar e o IDAF.

A ZE 1/04 é vizinha ao norte da pedreira Brasitália, instalada junto à BR-101. Compreende terrenos

nivelados com a rodovia, onde já existem instalações em tudo compatíveis com a localização, e parte

de um leito de drenagem, que a estrada atravessou elevada, dificultando o acesso lindeiro. Sua

destinação deveria ser modificada para a Contenção Urbana – ou ‘zona rurbana’ – restando a

permissão de usos de impacto com acesso exclusivo pela rodovia, com atenção para a manutenção

das condições de implantação da conexão da quarta ponte com o Vale dos Reis.

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A ZE 1/05 poderia ser denominada ‘Zona Industrial Oeste’, prevista para aproveitar o novo ramal

ferroviário e o novo contorno metropolitano na região de Novo Horizonte. Como visto antes, as

condicionantes da sua instalação ainda são remotas, o que indicaria mudar o zoneamento para

atividades rurais. No caso da possível viabilização dos acessos estruturais, bem como do

esgotamento da capacidade da Zona Industrial Norte, seria admissível alguma instalação de impacto

nesta região, mediante um projeto cuidadoso acompanhado dos respectivos estudos de impacto.

As ZE 1/06 e 1/07 correspondem a duas pequenas áreas, uma vizinha à pedreira Brasitália e a outra

nos terrenos da antiga fábrica Braspérola e outros vizinhos desocupados. Deveriam passar a ser

zonas de Contenção Urbana, com permissão para usos de impacto de acesso exclusivo pelas

rodovias.

A ZE 1/08 é a região desocupada no caminho do corredor Padre Gabriel, que o PDM classifica como

potencial receptora de atividades de impacto. Como mencionado anteriormente, é uma área rural

circundada por tecido urbano em Cariacica e Viana, que se estende até a várzea do rio Jucu.

A julgar pela presença de um loteamento industrial iniciado, já se configuram interesses públicos e

privados na instalação da ZE 1/08 conforme o previsto no PDM. No entanto, há que considerar a

delicadeza da inserção desta área na cidade, que contra-indicaria os usos de impacto mais intenso, e

que deveriam ficar restritos às ZE 1/01 e 02 no norte.

Se os usos industriais e logísticos já se apresentam como demandas consolidadas, o interesse

municipal mais adequado a esta região deveria ser por um projeto completo, estruturado pela BR-

447 e pela via da margem esquerda do rio Formate. As permissões de uso seriam as mesmas

aplicadas aos lotes lindeiros à BR-101, condicionadas às demais dinâmicas do desenvolvimento

vizinho, principalmente a instalação do vetor Vila Velha.

A ZE 2 é unicamente a área da Fazenda do Estado, que já recomendamos como área preferencial

para o uso urbano misto com arruamento mais generoso para atração de renda e remanejamento dos

usos incompatíveis.

As ZE 3/01 a 3/05 correspondem a empreendimentos de impacto localizados previamente à edição

do PDM. Respectivamente, são a pedreira Brasitália, duas áreas da Vale em Itaquari e Jardim

América e duas áreas da siderúrgica Belgo em Jardim América e Bela Aurora.

A atividade da pedreira deve ser monitorada até o esgotamento da jazida, quando deverá ser objeto

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de remanejamento de uso, com atenção para a manutenção das condições de implantação da

conexão da quarta ponte com o Vale dos Reis. Os limites do zoneamento devem coincidir exatamente

com os limites da licença de mineração, restringindo o zoneamento ao acesso exclusivo pela BR-101.

As instalações da Vale e da Belgo merecem o mesmo monitoramento cotidiano, com algum

remanejamento pontual dos atuais limites para complementar a infra-estrutura urbana das

vizinhanças.

3.4 Modelo de Ocupação do solo

Demonstramos que é possível multiplicar e vender razoavelmente o solo em Cariacica, através de um

modelo de Ocupação que controla a qualidade do tecido urbano pela forma das edificações. Este

modelo funciona a partir das dimensões básicas do arruamento Q (largura da quadra) e R (largura da

rua), e das proporções H/E (espaços externos) e L/P (espaços internos) e resulta em Gabaritos e

Afastamentos.

Figura32: Parâmetros do Modelo de Ocupação.

Ou seja, dada uma configuração fundiária representada por Q e R, o ajuste das proporções H/E e L/P

resultará nos índices de dimensionamento dos volumes edificados em altura, pelo Gabarito, e

espaçamento, pelos Afastamentos. A rentabilidade imobiliária, por sua vez, pode ser facilmente

derivada dos mesmos índices, que poderão ser manipulados para firmar um compromisso entre a

cidade-lar salubre e confortável e a cidade-negócio rentável e próspera.

3.4.1 A Autoconstrução

A autoconstrução predomina largamente em Cariacica e sua prioridade não é o rendimento

financeiro, mas o atendimento às demandas práticas da habitação. A tradição local e o padrão

dimensional dos arruamentos indicam o modelo sem afastamentos laterais para este segmento.

A aplicação rigorosa dependeria da verificação das condições de cada arruamento, mas pode ser

simplificada como a seguir:

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Tabela 4: Modelo simplificado para a Autoconstrução

Rua Lote Gab. AFR AFD Poço

- 20m 3 pav. 0m 3m 3m

- 20 3 0 3 3

- 25 4 0 4 5

- 25 4 0 4 5

8m 30 7 2 6 8

10m 30m 7 pav. 1m 6m 8m

A gestão pública da aplicação de um modelo como este, num lugar como Cariacica se reveste de um

caráter muito mais formativo do que propriamente normativo. Já assinalamos a propriedade das

ações oferta de oportunidades de treinamento aos mestres construtores locais, assim como a

publicação do conteúdo do modelo, para capilarizar sua aceitação pela população em geral e

especificamente pelos que constroem.

3.4.2 O Modelo imobiliário

Para a esperada instalação do mercado imobiliário, o modelo sem afastamentos deve ser empregado

nos lotes convencionais. Nos lotes maiores, e nos remembramentos, poderá ser empregado o modelo

com afastamentos laterais, como simplificado a seguir:

Tabela 5: Modelo simplificado para o Mercado Imobiliário.

Rua Lote Gab. AFR AL CACar TO

8 40m 13 pav. 10m 14m 6,7 50%

10 40 14 10 15 7,4 50

8 50 17 15 19 7,5 40

10 50 18 15 20 8,1 40

8 60 21 20 24 8,1 30

10m 60m 21 pav. 20m 25m 8,1 30%

A aplicação, neste caso, dependerá mais diretamente das dimensões do lote e da rua, para as quais

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poderão ser feitos cálculos automatizados do gabarito e dos afastamentos que maximizem cada

empreendimento. Esta rotina pode perfeitamente ser absorvida pelo mercado formal, bem como

pelos mecanismos institucionais de análise e aprovação de projetos.

3.5 A Zona Rural

Na rural do município, poderão ser seguidos os mesmos princípios empregados na Zona Urbana, de

segregação dos usos incompatíveis e de mistura dos demais. Neste caso, no entanto, a

incompatibilidade se traduz no caráter intangível de algumas áreas de reserva natural, já

satisfatoriamente identificadas pelo planejamento instituído. Restaria somente a sua demarcação

detalhada, assistida pelos recursos de geoprocessamento cada vez mais disponíveis.

A mistura dos usos rurais que podem compartilhar espaços vizinhos estará condicionada à perícia dos

empreendedores, quanto às atividades agropecuárias em si, e à identificação e demarcação das áreas

de preservação, especialmente as encostas com declividade acentuada e os leitos da drenagem

natural.

Estas áreas deverão ser todas identificadas e inteiramente demarcadas com servidões de acesso

público, ressalvadas as exceções pontuais das ocupações pré-existentes e de difícil remanejamento.

Algumas dessas servidões poderão servir para compor um sistema de estradas vicinais que melhor

articule as diversas partes dos assentamentos rurais e a sua interação com a cidade.

Figura 33: Zoneamento Rural: áreas de preservação delimitadas por servidões de acesso público.

As estradas vicinais deverão seguir os vales dos principais cursos d’água e providenciar a suas

interconexões a intervalos regulares de não menos do que 2 km, de acordo com as condicionantes

pontuais do relevo e da drenagem. As estradas já existentes ao longo dos córregos do Sabão,

Cachoeirinha e do Engenho, dos rios Duas Bocas e Bubu, dos córregos Montanha e Roda d’Água e

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do rio Formate devem ser complementadas por interligações que configurem uma rede de

mobilidade e acesso compatível com as atividades dos assentamentos.

4. Considerações finais

Este trabalho tenta lançar alternativas ao planejamento que tem sido recorrentemente proposto para

Cariacica, sempre voltado para interesses e objetivos externos ao município, e que consideram a

cidade que lá existe um obstáculo a transpor ou contornar.

Procuramos as feições desta cidade ditadas pelas suas peculiaridades e dinâmicas internas de

configuração urbana, de mobilidade e acesso, de Uso e de Ocupação do Solo. A organização com um

núcleo central, em que suas partes interagem intensamente, e cinco corredores suburbanos – Novo

Horizonte, Sede-Porto Belo, Santana, Caçaroca e Padre Gabriel – se afigurou como novidade até

mesmo aos pesquisadores, já condicionados ao desenho que resume Cariacica às rodovias federais e

à rodovia José Sette.

Procuramos os indícios de movimentos e interesses externos que possam trazer oportunidades de

desenvolvimento ao município no horizonte de tempo da Agenda e indicamos estratégias de

acompanhamento e participação na concretização de cada proposta. Se todas elas se viabilizarem,

Cariacica poderá ser verdadeiramente outra cidade, sem deixar de ser ela mesma. No entanto,

aconteça o que acontecer, a maior parte da cidade que existirá daqui a vinte anos já está pronta e

funcionando.

Selecionamos propostas para a gestão cotidiana do Uso e da Ocupação do Solo que apostam na

legibilidade da cidade pelos seus habitantes. A forma das áreas de preservação – inclusive

consubstanciada num mapa escolar – será a base para a responsabilidade ambiental urbana e rural.

A forma da estrutura do tecido urbano – representada pela malha de ruas principais – será a base para

organizar a mistura funcional, salubre e confortável dos Usos do Solo e para a multiplicar a

prosperidade da iniciativa privada. E, finalmente, a forma das edificações – descrita por indicadores

mensuráveis e inteligíveis pelo cidadão comum – será a base para a qualidade dos espaços públicos e

privados do tecido urbano, seja ele um negócio imobiliário ou um lar.