diacronia e sincronia.pdf
TRANSCRIPT
Atividade 3 – Diacronia e sincronia
Nesta atividade você vai conhecer o passado e o presente da história de sua
língua. Verá, por exemplo, como certas palavras que ontem tinham um significado, hoje
têm outro. O tempo passa, a ‘língua’ se movimenta, logo está sujeita a sofrer
modificações. Assim, num passado não tão distante, a palavra “marechal” significava
‘criado que cuida dos cavalos’; hoje significa ‘alta patente do exército’.
1. Saussure
Não se deve confundir a história da língua com a gramática histórica, disciplina
que, aliás, não corresponde a uma realidade precisa. De fato como frisa Saussure:
comme aucum système n´est à cheval sur plusieurs époques à la fois, il n’y a pas por
nous de “grammaire historique”; ce qu’on apelle ainsi nést en realité que la linguistique
diachronique.– (Serafim da Silva Neto – História da língua portuguesa); Como nenhum
sistema cobre diversas épocas ao mesmo tempo, não existe para nós gramática histórica,
o que assim se designa não é em realidade, senão a lingüística diacrônica.
2. Bechara
Estado da língua real e a sincronia Convém distinguir entre estado de língua real e sincronia, considerada de modo absoluto. No estado de língua também está implícita uma dimensão diacrônica, já que os falantes, principalmente de comunidades com larga tradição de língua escrita, têm consciência de que certas formas são mais antigas que outras; que algumas já não se usam e que outras são recentes. Todavia essa “diacronia dos falantes” - que pode ser bem diferente da diacronia do historiador – não importa em relação ao funcionamento da língua, porque todo fato de “diacronia” subjetiva tem que ser descrito no seu funcionamento, isto é na sua própria sincronia. (Evanildo Bechara)
3. Valente
Linguagem e Significação (Noções básicas de semântica)
A semântica é o estudo da significação das palavras. Divide-se em Semântica
Descritiva (sincrônica) e semântica histórica (diacrônica), Esta trata das alterações de
sentido no decorrer do tempo (cromos = tempo); dia = através de); aquela aborda a
significação num determinado estado da língua (sin = simultaneidade, conjunto)
UNIDADE 1 – ORIGEM E FORMAÇÃO DA LÍNGUA PORTUGUESA
LÍNGUA PORTUGUESA E GRAMÁTICA HISTÓRICA
A Semântica Histórica, ao estudar as mudanças de sentido por que passa a
palavra, leva em conta algumas espécies de alterações semânticas, tais como:
a) enobrecimento de sentido
Ex: “marechal” significava “criado de cavalos”; hoje significa “alta patente do exército”;
b) degradação de sentido
Ex: “vilão” significava “habitante da vila”; hoje significa “bandido, mau- caráter”;
c) ampliação de sentido;
Ex: “embarcar” significava “entrar na barca”; hoje significa “entrar em qualquer condução”;
d) restrição de sentido:
Ex: “fortuna” significava “bom ou mau destino”; hoje apresenta apenas o sentido positivo.
Cabe observar que existem causas diversas – históricas, sociais, psicológicas,
culturais – para mudança de sentido. (VALENTE, André. A linguagem nossa de cada dia.
São Paulo: Vozes, 1997)
Este assunto você complementará lendo os verbetes diacronia e sincronia no
Dicionário de lingüística, de Jean Dubois, publicado pela Cultrix, São Paulo.
Passatempo:
Leia as crônicas que se seguem e veja o comportamento das palavras:
a) há palavras que, provavelmente, você nem as escutou, e, muito menos, as leu;
b) outras, você conhece, mas não com o significado que o autor está empregando.
Aproveite o momento, volte ao dicionário, procure o significado das palavras
desconhecidas para você, pois desta forma sua leitura se tornará mais interessante e
você ampliará seu vocabulário, conseqüentemente, seus conhecimentos.
Antigamente (Carlos Drummond de Andrade)
Antigamente, os pirralhos dobravam a língua diante dos pais, e se um se
esquecia de arear os dentes antes de cair nos braços de Morfeu, era capaz de entrar no
couro. Não devia também se esquecer de lavar os pés, sem tugir nem mugir. Nada de
bater na cacunda do padrinho, nem de debicar os mais velhos, pois levava tunda. Ainda
cedinho, aguava as plantas, ia ao corte e logo voltava aos penates. Não ficava mangando
na rua nem escapulia do mestre, mesmo que não entendesse patavina da instrução moral
e cívica. O verdadeiro smart calçava botina de botões para comparecer todo liró ao copo
d’água, se bem que no convescote lambiscasse, para evitar enjôos. Os bilontras é que
eram um precipício, jogando com pau de dois bicos, pelo que carecia muita cautela e
caldo de galinha. O melhor era pôr as barbas de molho diante de um treteiro de topete:
depois de fintar e engambelar os coiós, e antes que se pusesse tudo em pratos limpos,
ele abria o arco. O diacho eram os filhos da Candinha: quem somava a candongas
acabava na rua da amargura, lá encontrando, encafifada, muita gente na embira, que não
tinha nem para matar o bicho; por exemplo, mão-de-defunto.
Bom era ter costas quentes, dar as cartas com a faca e o queijo na mão;
melhor ainda, ter uma caixinha de pós de perlimpimpim, pois isso evitava de levar a lata,
ficar na pindaíba ou espichar a canela antes que Deus fosse servido. Qualquer um
acabava enjerizado se lhe chegavam a urtiga ao nariz, ou se o faziam de gato-sapato.
Mas que regalo, receber de graça, no dia-de-reis, um capado! Ganhar vidro de cheiro
marca barbante, isso não: a mocidade dava o cavaco. Às vezes, sem tirte nem guarte,
aparecia um doutor pomada, todo cheio de nove horas; ia-se ver, debaixo de tanta farofa
era um doutor da mula ruça, um pé rapado, que espiga! E a moçoila, que começava a
nutrir xodó por ele, que estava mesmo de rabicho, caía das nuvens. Quem queria lá fazer
papel pança? Daí se perder as estribeiras por uma tutaméia, um alcaide que o caixeiro
nos impingia, dando de pinga um cascão de goiabada.
Em compensação, viver não era sangria desatada, e até o Chico vir de baixo
vosmecê podia provar uma abrideira que era o suco, ficando na chuva mesmo com bom
tempo. Não sendo pixote, e soltando arame, que vida supimpa a do degas! Macacos me
mordam se estou pregando peta. E os tipos que havia: o pau-para-toda-obra, o vira-
casaca, sabe-com-quem-está-falando, o sangue-de-barata, o Dr. Fiado que morreu
ontem, o Zé-povinho, o biltre, o peralvinho, o salta-pocinhas, o alferes, a polaca, o
passador de nota falsa, o mequetrefe, o safardana, o maria-vai-com-as-outras ... Depois
de mil peripécias, assim ou assado, todo mundo acabava mesmo batendo com o rabo na
cerca, ou simplesmente a bota, sem saber como descalçá-la.
Mas até aí morreu o Neves, e não foi do Dia de São Nunca de Tarde: foi vítima
de pertinaz enfermidade que zombou de todos os recursos da ciência, e acreditam que a
família nem sequer botou fumo no chapéu?
Bárbaro (Nestor de Holanda)
Tenho para mim que nossos amigos gramáticos devem andar pelos cabelos.
Cada dia surgem novas denominações. Palavras diversas vão ganhando outros
significados. Não pretendo fazer qualquer estudo de semântica, mas é curioso observar
com a gente “pra frente” vem mexendo o nervo de ilustres vernaculistas de nossa praça.
Chegam a extremo de escrever “pra frente” com o acento no “prá”.
Até outro dia, bárbaro era desumano, inculto, rude, grosseiro, sem civilização.
Dizia meu tio Xandu que a palavra vinha do grego “bárbaros”, pelo latim “barbaru”. E,
helênico até a última gota, explicava aos antonenses curiosos, que iam à feira no sábado
para comprar mantimentos, mas acabavam sofrendo lições na porta da farmácia de meu
avô.
– Bárbaro qualifica o sujeito que não era grego, e, por conseguinte, não tinha civilização.
E, para elogiar a terra de onde viemos ao mundo, acrescentava:
– Bárbaro, hoje, é quem não nasceu em Vitória de Santo Antão ... (V. S. A. foi o maior centro civilizado que Xandu conheceu).
Agora o significado de Bárbaro é outro.
Quer dizer: legal ...
Legal, por sua vez, era, até outro dia, qualquer coisa conforme ou
relativamente à lei; certo, regular, em ordem. Agora, passou a ser o mesmo que enxuto ...
Enxuto também tinha outro conceito, não faz muito tempo. Significava: seco,
que perdeu a umidade; abrigado da chuva. Com a onda pra frente levou uma “fubecada
em regra”. Passou o mesmo que bacana.
Bacana, gíria dos ladrões, de origem platina, nasceu do dialeto genovês. A
delinqüência nacional, sobretudo a que vive em função nos morros cariocas, chamava de
bacano o indivíduo endineirado, rico, em condições de ser roubado. Agora, as mocinhas
“pra frente” adotaram o termo dos nossos ladrões. E bacana é o pão.
Pão era, desde os tempos de Cristo, alimento feito de farinha de trigo
amassada e cozida. Agora, não é mais nada disso. Passou a ser o mesmo que bacana,
enxuto, legal, bárbaro ...
Todos sabem que não sou nem quero ser pra frente. De tudo o que vejo por aí
só acho pra frente mesmo os modelos em desfile nas butiques. E talvez por isso eu tenha
estranhado o elogio da mocinha que me chamou de cronista bárbaro, na vista de todo
mundo.
Lembrei-me de Xandu e respondi:
– Não sou bárbaro não, senhorita. É engano seu. Nasci em Vitória de Santo Antão ... Na a verdade é que não há, hoje em dia, quem não goste de ser chamado de bárbaro ...
Você já leu, já observou o comportamento lingüístico das palavras, então vamos fazer um trabalho de campo, para por em prática o que você aprendeu.
Pesquisar:
⇒ palavras que caíram em desuso;
⇒ palavras que surgiram na língua, mas com outra acepção. ⇒⇒⇒⇒ palavras novas introduzidas na língua.