devialet d-premier - audio & cinema em casa · evoluir e, do mesmo modo, aguardar que muitos...

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2 Audio & Cinema em Casa TESTE Jorge Gonçalves Comungo com muitos leitores da Audio & Cinema em Casa uma vida já bem estendida no tempo em termos de experiências e audições de música, que me permitiram experimentar até hoje quase tudo o que se tem feito neste mundo no que se refere a novas tecnologias e/ou topologias de equipamentos de áudio. As surpresas, na grande maioria dos casos gratas, foram ocorrendo ocasionalmente, mas não é fácil que seja confrontado com algo que, se não deita abaixo muitas das minhas convicções consolidadas ao fim de todos estes anos, pelo menos me obriga a pôr em prática um olhar diferente que permita encarar muitas dessas convicções sob uma nova luz. Devialet D-Premier Uma dimensão radicalmente nova para a música Devialet D-Premier Uma dimensão radicalmente nova para a música

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2Audio & Cinema em Casa

TESTE Jorge Gonçalves

Comungo com muitos leitores da Audio & Cinema em Casa uma vida já bem estendida no tempo em termos de experiências e audições de música, que me permitiram experimentar

até hoje quase tudo o que se tem feito neste mundo no que se refere a novas tecnologias e/ou topologias de equipamentos de áudio. As surpresas, na grande maioria dos casos gratas,foram ocorrendo ocasionalmente, mas não é fácil que seja confrontado com algo que, se não

deita abaixo muitas das minhas convicções consolidadas ao fim de todos estes anos, pelo menos me obriga a pôr em prática um olhar diferente que permita encarar

muitas dessas convicções sob uma nova luz.

Devialet D-PremierUma dimensão radicalmente

nova para a música

Devialet D-PremierUma dimensão radicalmente

nova para a música

Como em quase todos os campos em quesejam colocados em prática critériossubjectivos que, quando reduzidos à sua ex-pressão ínfima, se reduzem a expressões dogénero «gosto» ou «não gosto», a audição demúsica criou em sua volta um conjunto demitos, nalguns casos ferrenhamente defen -didos ou atacados (conforme o lado da trin-cheira), que estabelecem critérios dequalificação para quem ouve uma deter -minada peça musical reproduzida numsistema de áudio. Há adjectivos, em muitoscasos retirados de metáforas estabelecidascom situações ou objectos do dia-a-dia, quepermitem qualificar aquilo que se ouve, há«avaliadores» mais ou menos profissionais deequipamentos de áudio que recorrem a esseléxico, infelizmente pouco frequen tementeactualizado, de termos mais ou menostécnicos, agora o que eu sei de há algunsanos a esta parte é que, por um lado, não éfácil encontrar palavras que retratem comfidelidade uma determinada situação ousensação e, por outro, mesmo que tal sejapossível em alguns casos, a leitura dessaspalavras não adquire por parte de quem lê aconotação intencionada por quem a escreveu.

De facto, independentemente de existiremmuitos e bons dicionários da nossa língua, adescrição do significado de um termo, se

bem que semanticamente e linguistica -mente possa ser considerada perfeita, vaiser sempre alvo de uma interpretação quetem a ver com o contexto, ou seja, com uma«conotação» sentimental e emocional queresulta do conjunto de experiências e doslaços culturais inerentes a quem faz a leitura.Quem não se sente impressionado quandolê um bom poeta ou um bom prosador e vêque este utiliza muitas vezes palavras quenós conhecemos de há muitos anos mas quenaquele caso parecem adquirir uma novaluz, uma nova vida? Exemplos disto hámuitos, mas reconheço que, embora nãoseja um adepto ferrenho da poesia, nomescomo Fernando Pessoa, Eugénio de Andradeou Mário de Sá Carneiro conseguiram ligaras palavras entre si de um modo tal queuma pequena partícula, um pouco de melou de sal, nos fazem deliciar perante umaquadra, uma rima, que numa análise maisligeira poderá ser considerada como sendoum conjunto de palavras bonitas com maisou menos significado, mas em que cadauma delas por si não tem assim nada deespecial. Numa outra óptica, temos deconsiderar que algumas das letras decanções brasileiras são um verdadeiro hino àsimplicidade, não deixando de transportarconsigo uma força imensa em termos desensações emocionais.

Tudo isto vem a propósito do Devialet D-Premier, um amplificador radicalmente novoque causou furor no último CES de Las Vegas,embora não estivesse presente oficialmente(!), e vem sendo mencionado por algumaimprensa especializada (pouca ainda) comosendo um projecto revolu cionário.

E a surpresa de que falei atrás deu-sequando, nos inícios de Março, o RicardoFranassovici, da Absolute Sounds, e oManuel Dias, da Imacústica, me pedirampara dar um saltinho ao Porto, que tinhamalgo muito especial para me mostrar. Aí voueu por aí acima no Alfa, o comboio da CPque não dispenso desde há muitos anos eque demonstra todos os dias a inutilidadedo TGV, para ser confrontado com uma caixaprateada de um design lindo, ligada àscolunas Magico V3 e que toda a gente megarantiu ser algo do outro mundo.

E não é que era mesmo! Foi uma surpresade ficar com o queixo no chão ver como o D-Premier pegou nas V3 e as fez tocar comopoucas vezes ouvi, com um controlomagnífico, um detalhe indescritível eatingindo níveis de pressão sonora incríveis.Passei algumas horas ouvindo esta máquinaverdadei ramente surpreendente, usando in-clusive alguns discos que conheço muito

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bem e que tinha levado comigo, e a cadanova faixa que ouvia mais aumentava aminha admiração por esta extraordináriaobra de engenharia, principalmente depoisdas muitas questões colocadas a MathiasMoronvalle, um dos seus projectistas, e quese tinha igualmente deslocado à Imacústicapara falar comigo.

Mas, antes de falar sobre os aspectostecnológicos – e muito há a dizer sobre isso–, vou abordar a estória do modo como foicriado este bombástico Devialet D-Premier.O nome do fabricante pode parecer estra-nho, mas existem duas explicações, umaoficial e outra menos oficial, para estadesignação. A explicação oficial é que «de

Vialet» foi um conceito utilizado pelofilósofo e enciclopedista francês do séculoXVIII, Denis Diderot, para criar algo comoque um heterónimo e colocar as suas pala-vras escritas nas memórias inéditas na bocade outra pessoa, tal como, por exemplo,Fernando Pessoa o fez bastante mais tarde;a explicação oficiosa, digamos assim, é queDevialet é um termo que em francês fazuma ligação em termos de sentido comalgo de luxo, de elevada qualidade.

Mathias Moronvalle e Pierre Calmel traba-lhavam um nas telecomunicações e outrona indústria espacial, embora tivessem sidodurante alguns anos colegas de trabalho nogabinete de pesquisa e desenvolvimento daNortel, quando se resolveram juntar outravez, mas agora para trabalhar um conceitocompletamente diferente – a amplificaçãode áudio. O projecto do D-Premier levoucinco anos a ser concretizado, sendo atecnologia ADH, seminal a todo o conceito,patenteada em 2004, e começou quando sesentaram os dois a uma mesa, definindoqual seria o amplificador ideal: amplificaçãoperfeita de tensão, amplificação perfeita, eindependente desta, de corrente, impe -dância de saída nula, distorção ínfima econstante ao logo da frequência, e assimpor diante.

Rapidamente concluíram que, se erapossível desenvolver circuitos electrónicoscapazes de cumprirem por si só um, nomáximo dois, destes desideratos, seriaimpossível conceber um só circuito quetivesse todas estas qualidades emsimultâneo.

A fase seguinte implicou preencher nadamenos de 165 páginas de conceitos sobre oque pode influenciar o som final de um am-plificador, incluindo muitos conceitos obs-curos, que alguns consideram quasebruxaria, e começar as investigaçõestécnicas em torno deles. Encontraramresposta científica para 82% deles! É in-teressante verificar que, afinal, muitas dascoisas que alguns de nós vêm defendendo,tais como condensadores de teflon, elec-trolíticos de construção especial, resistências«audiófilas» e muito mais, têm uma ex-plicação perfeitamente válida do ponto devista científico, o que demonstra que, afinal,as explicações sempre estavam lá, só nãotínhamos olhado para a questão do pontode vista correcto. A ciência acaba porconseguir explicar muitas coisas, é apenasuma questão de lhe darmos tempo para

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evoluir e, do mesmo modo, aguardar quemuitos dos preconceitos existentes em voltadas questões que num determinadomomento não podem ser cientificamenteexplicáveis sejam postos de lado. Aliás, senão fosse assim, nunca a ciência teriaavançado e estaríamos hoje em dia aindanos tempos ptolomaicos, em que seacreditava que a Terra era o centro imutáveldo mundo e tudo girava em torno dela,muito em especial o Sol. E, no entanto, elamove-se!

Não se pode dizer que exista um conceitoúnico para o D-Premier, mas sim que este éum resultado final de um somatório deconceitos diferentes, diria mesmoradicalmente diferentes daquilo que éconsiderado o mainstream da electrónica deáudio. Senão vejamos: quem se lembraria,por exemplo, de criar uma topologia de am-plificação na qual tensão e correntes sãoamplificadas em módulos totalmentedistintos e os resultados dessas am-plificações independentes são somadosnum ponto comum que não é mais que aligação ao altifalante? E ainda que a tensãoé amplificada numa configuração de ClasseA, quase isenta de distorção, somada coma corrente, que é amplificada numa outrasecção independente, e daqui resulta umsinal de áudio quase perfeito, como se fosseao mesmo tempo um gerador de tensãocom impedância interna nula e um geradorde corrente, com uma impedância internainfinita, com uma impedância de saídaconstante de 0,001 Ohm! Este éseguramente o sonho de muitos enge-nheiros de áudio mas, como tal, sendo umsonho, é extremamente difícil de concretizar

e exigiu olhar para o problema utilizandoaproximações altamente inovadoras.

De facto, o D-Premier foi desenhado quasecomo se fosse um Lego, na perspectiva emque cada bloco foi desenvolvido de modoindependente, embora tendo queresponder a um «caderno de encargos» ex-tremamente rígido e exigente. Depois dedesenvolvido, cada um desses blocos erainserido no conjunto e verificava-se entãose ele satisfazia completamente aquilo quese lhe tinha pedido inicialmente. Desta es-trutura complexa resulta que no interior doD-Premier são utilizados nada menos deoito microprocessadores independentes,com software próprio desenvolvido paraassegurar o cumprimento dos requisitos, in-cluindo ao nível da fonte de alimentaçãocomutada, cuja tensão de saída é controlada

em função do nível de sinal que se pretendeter na saída, mais um feito de grandemonta, uma vez que qualquer projectista deelectrónica sabe que sempre que se varia atensão de alimentação de um amplificadoras suas polarizações internas alteram-se, eisso implica uma mudança bastantepronunciada no seu desempenho.

Outro aspecto para o qual não tem sido fácilencontrar explicações que descrevamexactamente o que é o D-Premier é emrelação ao modo como são utilizadas no seuinterior as tecnologias digitais. Claro que aamplificação de corrente assenta naassociação de quatro amplificadores digitaisde Classe D e que a fonte de alimentação écomutada, logo utiliza igualmentetecnologias digitais, ou numéricas, comodizem os franceses, mas isso não descrevede modo nenhum a topologia do am-plificador. Mathias prefere dizer que é umamplificador híbrido, e eu concordo, já queesta é a palavra que talvez descreva melhoro modo como as várias áreas se articulamno seu interior. Os seus projectistas quasedizem que neste caso design industrial eelectrónico estão de mãos dadas e que aforma dita o facto, ou seja, só se poderiadesenhar um amplificador esteticamentetão atraente e colocado numa caixa dedimensões tão reduzidas se se utilizassemtecnologias que permitissem reduzir adimensão de componentes volumosos, taiscomo o transformador de alimentação e,em simultâneo, a dissipação de potência.Todos os que gostam de electrónica sabemque as tecnologias digitais são perfeitaspara este fim, já que possibilitam que oscircuitos trabalhem a frequências bem mais

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«Testemunhas» do grande evento na Imacustica.Da esquerda para a direita - Manuel Dias, Mathias Moronvalle,Ricardo Franassovici, Jorge Gonçalves, Luís Campos.

Este é um dos primeiros exemplaresdo D-Premier e foi apresentado emante-estreia no Porto.

elevadas que a do sector (50 Hz) ou mesmoas audíveis, que vão no máximo até 20 kHz.Deste modo, e uma vez que a modulaçãoPWM do D-Premier trabalha a umafrequência base próxima dos 300 kHz, ostransformadores e condensadores podemver o seu volume baixar várias ordens demagnitude e a potência dissipada noscomponentes activos e passivos éigualmente bem menor do que se elestrabalhassem com correntes contínuas, poisneste caso eles estão a conduzir apenas porbreves períodos de tempo.

Está, assim, explicado o recurso à am-plificação digital para corrente, emborarestem por explicar alguns outros conceitosinteressantes, tais como é que se soma umatensão com uma corrente, ambas de origemdigital, como é que se consegue que essacorrente e essa tensão estejam per-manentemente em fase quando sãofornecidas por amplificadores diferentes, eassim por diante. Mais à frente dareialgumas respostas (parciais) a estas per-guntas, mas as respostas nunca poderãoocorrer de um modo absoluto, e isso é com-preensível pois, embora não tenha quaseparado de fazer perguntas a Mathias desdeque nos encontrámos pela primeira vez no

Porto, duas semanas antes do Audioshow, in-cluindo vários e-mails e duas conferênciastelefónicas, tenho que aceitar que váriosaspectos inerentes à tecnologia do D-Premierestão protegidos por patentes, e isso significaque não podem ser tornados públicos senãoem termos muito genéricos. Para quem temcomo formação de base a electrónica nãodeixa de ser de algum modo um sacrifício sersujeito a este secretismo. Ainda fui consultara patente original solicitada nos EstadosUnidos para a tecnologia ADH, mas nãofiquei muito mais esclarecido, como serianatural, já que a própria patente não podedesvendar todas as intrincâncias tecnológicasdo conceito que está a ser patenteado, sobpena de o tornar facilmente copiável. Mascreio que o que aqui vai ficar em termos dedescrição satisfará a esmagadora maioria dosmeus leitores. Aconselho-os agora a daremuma olhadela à descrição técnica, desta vezum pouco mais breve do que é normal, jáque uma boa parte da tecnologia do D-Premier já ficou descrita atrás.

Descrição técnicaCorrendo um pouco o risco de repetir algodo que disse atrás, gostaria de explicar emtermos simples o funcionamento do D-Premier e da tecnologia ADH.

O sinal de entrada, caso seja analógico, éconvertido para digital através de umconversor D/A que actualmente tem umaresolução de 24 bit/96 kHz, embora nofuturo possa ver a sua frequência de amos-tragem passar para 192 kHz. A partir daquientramos no domínio do processamentodigital, idêntico para sinais de entradaanalógicos depois de convertidos paradigital, ou para sinais de entrada digital, osquais podem ter uma resolução até 24bit/192 kHz. Em seguida, caso sejanecessário, faz-se o up-sampling dessessinais para 192 kHz e procede-se àconversão deste sinal para analógico atravésde um conversor D/A, baseado no Burr-Brown PCM-1792, na saída do qual não seencontra o convencional conversorcorrente/tensão, ou seja, temos umacorrente que varia em função do sinalanalógico de entrada.

A corrente de saída desse conversor éaplicada então a um amplificador em ClasseA de alta qualidade, no interior do qual seencontra uma resistência que faz aconversão da corrente amplificada para atensão de saída, ou seja, este amplificadorfornece a amplitude global da tensão desaída, embora possa fornecer por breves

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MedidaslaboratoriaisVou incluir aqui alguns dos gráficos elaborados por Paul Miller,da Miller Audio Research, gentilmente cedidos. Os gráficos comas medições completas do D-Premier podem ser consultadosem www-hifinews.co.uk.

O equipamento sujeito a estes testes laboratoriais tinha a suapotência de saída limitada a 165 W (como explicado no texto,a potência de saída máxima pode ser ajustada para um valorsituado entre 160 e 240 W).

Apenas algumas indicações gerais: o ganho global deste am-plificador é bastante elevado (22,5 dB para 0 dB de atenuaçãono controlo de volume ou 52,5 dB) e daí a razão para apossibilidade de as entradas de linha serem parametrizadaspara poderem funcionar como entrada de gira-discos MM.

O excelente controlo da fonte de alimentação possibilita que apotência de saída seja aritmeticamente multiplicada por dois sem-pre que a impedância desce para metade: 165 W a 8 Ohm; 330W a 4 Ohm e 650 W a 2 Ohm. Este é para todos os efeitos umfuncionamento perfeito em termos de fornecimento de potência

a cargas de diferentes valores. Ao mesmo tempo, o D-Premiermostrou ser virtualmente indestrutível em qualquer situação deteste, protegendo-se eficazmente contra qualquer carga ligada nasaída, mesmo quando de um curto-circuito directo.

Ao mesmo tempo, a análise do gráfico mostra que a variação dadistorção ao longo da frequência é igualmente quase perfeita,mantendo-se essa distorção quase constante e igual a 0,001%entre 20 Hz e 20 kHz para níveis de potência de saída entre 1e 150 W. Quase inacreditável!

Ao mesmo tempo, as entradas digitais garantem uma respostaem frequência em potência de 0,1 Hz até 90 kHz e até resoluçõesde 24 bit/192 kHz. Novamente os gráficos de jitter a 48 kHz/24bit e a 96 kHz/24 bit mostram valores extraordinariamente baixosde jitter. Este foi quase garantidamente o melhor amplificador quePaul testou nos seus laboratórios em muitos anos de trabalho.

Variação da distorção com o nível de sinal digital desde 0 dB (165 W) até -120 dB(0,17 nW) com dados de 24 bit para 0 dB de atenuação no controlo de volume (preto:f = 1 kHz; azul: f = 20 kHz).

Gráfico de alta resolução com os níveis de jitter a 48 kHz/24 bit (preto) e 96 kHz/24bit (vermelho), medidos para 10 W sobre 8 Ohm na saída. Os valores de jitter são ex-cepcionalmente baixos.

Distorção em função da potência dinâmica para cargas de 8 Ohm (negro), 4 Ohm(vermelho), 2 Ohm (azul) e 1 Ohm (verde).

Gráfico combinado ilustrando a variação da impedância de saída (curva a azul) e a respostaem frequência do D-Premier (linha a negro) para uma potência de saída de 10 W sobre8 Ohm e um sinal de entrada digital de 192 kHz. O resultado é um valor praticamenteconstante e igual a 0,006 Ohm ao longo de praticamente toda a gama audível.

Variação da distorção com a frequência a 10 W/8 Ohm (a negro o canal esquerdo e a vermelhoo direito), ilustrando uma performance excepcionalmente constante ao longo da gama audível.

instantes picos de corrente de até 5 A (jávamos ver para quê). Esta tensão de saída ésomada nos terminais de ligação às colunascom a corrente de saída dos amplificadoresem Classe D, sendo esta corrente de algummodo «filtrada» pelo amplificador emClasse A, ou seja, o que se passa é quetemos dois amplificadores a funcionar emarticulação perfeita um com o outro, em queo amplificador de tensão é mestre (master)e o de corrente o escravo (slave). Já vi umacomparação feita entre esta tecnologia deamplificação e um sistema de direcçãoassistida: o controlo é feito no volante (am-plificador em Classe A), sem esforço; aacção ocorre nas rodas/colunas através deuma actuação que necessita de um esforçoenergético muito maior que o exercido pelocondutor no volante, e essa actuação é con-cretizada pelo amplificador em Classe D.

Claro que pode parecer estranho que se sigauma topologia em que entra um sinaldigital e este é depois convertido paraanalógico e se receba um sinal analógico naentrada, ele seja convertido para digital edepois para analógico. Mas este é um dosaspectos fundamentais do funcionamentodo D-Premier e foi uma escolha inicial doprojecto para garantir que se tem umaarquitectura com perdas de sinal mínimas(percurso mínimo) e que é igual para sinaisanalógicos e digitais, e isso implica que oproduto se torna universal em termos de es-trutura e torna-o completamente universale parametrizável. Além disso, para se terum sinal de saída com uma distorção tãobaixa, tem que se recorrer a técnicas poucousuais de correcção/realimentação. Ascorrecções a fazer têm lugar no domínio

analógico, sendo a realimentação im-plementada em termos de corrente, umatécnica designada por feedforward pelosanglo-saxónicos e que tão bem foi posta emprática por Peter Walker, da Quad, no seuQuad 405. As correcções têm lugar sob aforma da injecção de uma corrente de erroque contém em si, em oposição de fase, aspequenas incorrecções que o amplificadorintroduz, pelo que na saída temos um sinalquase perfeito. No domínio digital, uma vezque os circuitos foram aperfeiçoados aomáximo para evitar distorções, não éefectuada qualquer correcção.

Já que se fala no domínio digital, devemdestacar-se os oito microcontroladores eprocessadores DSP, com ofirmware defuncionamento de cada um deles a serdesenvolvido integralmente na Devialet.

A fim de estabelecer um equilíbrio térmicoquase perfeito, a dissipação nos pontos demais elevado fornecimento de corrente,como é caso dos amplificadores de Classe D,deve ser igualmente contida. Isso implicaque a tensão de saída da fonte dealimentação comutada seja controladaatravés de um microcontrolador específico,que faz com que essa tensão tenha sempreo valor óptimo em correspondência com osinal saído do controlo de volume/posiçãodeste. Uma vez que o equilíbrio térmico foiestudado para se manter quase perfeitopara valores de atenuação entre -infinito e-12 dB, entre estes dois valores não éefectuado qualquer ajuste na tensão dealimentação. Entre -12 dB e 0 dB procede-sea uma variação progressiva da tensão dealimentação. De 0 dB para cima não seefectua qualquer ajuste na tensão dealimentação porque já estamos no valormáximo. Mais uma vez temos aqui umasolução muito engenhosa e com que muitosengenheiros sonham, mas que só foipossível implementar no D-Premier graçasao recurso a um microcontrolador específico,uma vez mais programado pela Devialet.

Como a relação de fornecimento de correntedo amplificador em Classe A para o am-plificador em Classe D é mais ou menos de1 para 100, isso significa que existe umaresistência sensora, embora não no percursodirecto do sinal, que detecta o nível decorrente que as colunas estão a pedir efornece esta informação para o amplificadorem Classe D, que em seguida irá fornecer acorrente extra necessária. A leitura destadescrição poderia dar a entender que existeum atraso entre o aparecimento da tensão

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na saída e o da corrente que lhe devecorresponder para uma determinadapotência na saída. Isso não ocorre porque oamplificador em Classe A pode fornecer ins-tantaneamente, tal como eu disse atrás,correntes de até 5 amperes, mais quesuficientes para garantir as necessidadesimediatas resultantes dos transientes e dartempo a que o amplificador em Classe Dvenha em seu socorro com a corrente totalnecessária. Este é realmente um dos se-gredos do funcionamento do D-Premier, efico muito satisfeito por ter suscitado asdúvidas que fizeram com que Mathiasquase se sentisse obrigado a explicar estepormenor, tal foi a minha insistência,porque nunca o vi abordado em nenhumada numerosa literatura que consultei.

Sobre o interior irei falar já de seguida, maso Devialet D-Premier começa por im-pressionar pela estética: como é que sepode imaginar que um amplificador cujapotência de saída por canal (configurável)pode ir a até mais de 200 W cabe numacaixa prateada com pouco mais de 4centímetros de altura? E ainda por cima comuma estética arrebatadora, de umdesarmante minimalismo – o painel frontalapenas apresenta na sua zona central o in-

terruptor de ligação, sendo todos oscomandos implementados através doelegantérrimo controlo remoto (sobre elefalarei um pouco mais adiante).

Nas traseiras já a situação é um pouco maisconvencional, embora não em absoluto: osquatro terminais para as colunas nãoestarão longe daquilo que seria de esperar(embora obriguem ao uso de bananas, jáque a distância entre eles é demasiadocurta para a colocação de forquilhas), masjá a ligação HDMI não o é tanto. Claro que setrata de uma entrada digital de áudio, quepermitirá em breve a ligação do D-Premiera um leitor universal, aproveitando aqueleapenas o fluxo de dados digitais de áudio. Ohandshaking, um protocolo que faz parte danorma HDMI, estabelecido de modoautomático entre os dois equipamentos,garante que o sinal digital de áudio queentra no D-Premier tem sempre a resoluçãomáxima possível em relação ao sinaloriginal. De modo a permitir que o D-Premier seja inserido num sistemaaudiovisual, embora conservando sempre amáxima qualidade do áudio digital em PCMde dois canais, este amplificador foiequipado com esta entrada HDMI, querecebe em geral áudio e vídeo (embora

possa receber apenas áudio no caso dealguns leitores topo-de-gama que possuemduas saídas HDMI, uma dedicada apenas aoáudio de dois canais e outra que faz a saídade sinais de áudio e sinais de vídeo), e umasaída que, no caso de um sinal HDMIconvencional, transportaria para o exteriorapenas o sinal de vídeo.

Cinco outras conexões – uma AES/EBU, duasópticas e duas coaxiais – aceitam sinaisdigitais provenientes do exterior, comresoluções possíveis até 24 bit/192 kHz.Duas outras fichas RCA funcionam comosaídas digitais ou como entrada de gira-discos MM/MC, ou ainda como saída paraum subwoofer. Esta descrição parece poucológica mas a verdade é que a função decada uma destas ligações RCA pode ser pro-gramada, dependendo do uso exacto que oseu comprador lhes queira atribuir. No meucaso tinha uma entrada analógica, uma en-trada de gira-discos e duas entradas digitais.No site da Devialet poderá encontrar umsoftware de configuração que lhe permitiráescolher as características que mais lhe in-teressam para o seu D-Premier, desde afinalidade ao nome de cada entrada e indoaté à potência máxima de saída, quepoderá ser ajustada para um valor entre 160

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W e 240 W, sendo o valor por defeito de 200W. Depois de ter a configuração totalmentedefinida, basta transferir os dadoscorrespondentes para uma memória SD einserir esta na traseira do D-Premier. Nadamais fácil!

Mas os pormenores de requinte não seficam por aqui: uma vez que o D-Premiervem fornecido com um suporte paraeventual fixação vertical à parede, as in-dicações do mostrador LCD circular rodamconforme a posição do amplificador, demodo a estarem sempre perfeitamentelegíveis. Por outro lado, se se deixar o am-plificador sem sinal na entrada durante umdeterminado período de tempo (igualmenteprogramável), ele entra em standby, comum consumo mínimo de cerca de 5 W.Continuando: acima de 0 dB o controlo devolume entra numa zona de amplificação enão de atenuação, e isso poderia implicarque uma rotação inopinada do botão devolume produzisse níveis de potência desaída excessivos para os circuitos digitais oumesmo perigosos para as colunas – o D-Premier contorna muito sabiamente essasituação introduzindo níveis de compressãosuave para os valores de volume entre 0 dBe +30 dB. No entanto, essa compressão sóentra em acção quando se tenta ultrapassara potência máxima de saída. O sistema deprotecção funciona de modo que não hajaqualquer interferência no sinal em termosde tensão, sendo apenas corrente de saídalimitada a um máximo de 30 A.

Passemos agora à descrição do interior doD-Premier, uma verdadeira jóia de per-feição, como se pode ver nas fotos. Um

circuito impresso principal ocupapraticamente todo o interior da caixa, tendosobre ele montados diversos módulos.Olhando de frente, e de baixo (posição deabertura da caixa), do lado esquerdo temosa placa de interface HDMI e, ocupandoquase todo o extremo direito, a fonte dealimentação comutada, sobredimensio -nada, pois tem uma potência de saída quepode ir até 600 W, valor mais que suficientepara alimentar os dois canais, uma vez queo rendimento de um amplificador digitalatinge facilmente os 90%. Ao centrosituam-se os oito amplificadores de ClasseD, contidos num módulo separadoaparafusado directamente à caixa, para re-frigeração dos transístores de saída. Maisjunto ao painel frontal temos, do ladoesquerdo, os condensadores de filtragemdas alimentações estabilizadas de correntecontínua para os diversos blocos do circuito,ao centro um vasto conjunto de bobinas defiltragem do tipo SMD, que filtram asharmónicas de alta frequência das tensõesde saída da fonte comutada antes de elachegar aos condensadores que citei.

O controlo remoto é em si próprio uma peçaque nos encanta, não só pela sua visão massobretudo pelo seu manuseamento. Trata-se de uma caixa de formato próximo doquadrado, mas com várias arestasarredondadas para que o seu manuseio setorne mais agradável e, acima de tudo, umbotão central que se manobra como umconvencional controlo de volume e temuma ergonomia sublime. Combinando estecontrolo rotativo com quatro teclas, estecontrolo remoto permite fazer quase tudo oque se queira: ligar/desligar, seleccionar a

fonte de entrada, inverter a fase, ajustar oroll-off dos graves para um subwoofer(numa configuração 2.1) e muito mais quese queira, em função da configuraçãopossível. Para além de tudo isto, o controloremoto não é direccional, já que funcionapor radiofrequência, tendo eu mesmoconfirmado facilmente uma gama dealcance até 15 metros, o que aumentaainda a sua versatilidade, pois permiteajustar o volume a partir da sala ao lado.

As opções de configuração do D-Premier sãotão alargadas que abrem potencialidadesquase intermináveis em termos do seuâmbito de utilização. Pensem apenas numsistema de colunas multiamplificadas oumesmo num sistema 7.1 amplificadototalmente pelo D-Premier. Ou ainda naleitura directa de originais de alta resoluçãoa partir da placa de streaming que está aser desenvolvida, já com a localização daantena Wi-Fi prevista no interior do D-Premier. Só de imaginar fico com arrepiospela antecipação do desempenho sónico detais combinações.

AudiçõesCesse tudo o que a musa antiga canta queum valor mais alto se levanta, assim dizia oimortal bardo português que algunspseudo-intelectuais dizem quase desde-nhosamente «estar na moda». A questãonão está em estar agora na moda – é quesempre esteve, só que esses que dizemdesdenhar nunca deram por tal.

Mas aquilo de que estou seguro é que esteD-Premier não é do mesmo modo umamoda fugaz e etérea, mas sim algo perene

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que rasga novos mundos no mundo desco-nhecido (espero que me desculpem estademasiado vincada veia poética, mas a ins-piração vem das musas e eu tive uma emminha casa que ultrapassa em arte ins-piracional quase tudo o que já experimenteiaté hoje). E, conjugado com o que disseatrás que já não é pouco, quase que mepoderia quedar por aqui que muito ficariadito. Mas isso seria não prestar a devidajustiça a este objecto tão valoroso ediferente de tudo o resto.

Começo por dizer que combinei o D-Premiercom uma vasta quantidade de electrónica ecolunas: as fontes foram desde o MarantzCD12 ao Accuphase DP85, Marantz UD9004,servidor de música Olive 4HD, e mesmo umtransporte Proceed PMDT, já algo vetustomas que ainda faz bem a sua função; ascolunas alternaram entre dois conceitosbastante diferentes mas de algum modocomplementares: as Quad ESL63 de sempree as B&W Nautilus 802, bem como ainda,numa experiência muito interessante, asLS3-5a, na versão Raymond Cooke SpecialEdition, da Kef. O cabo de coluna foi sempreo Kimber Select KS-3035, alternando o cabodigital entre o Nordost Valhala balanceado eo Kimber digital de prata para nãobalanceado. No caso de sinais analógicosusei o cabo de ligação Black RhodiumRequiem.

Lembra-me de o Ricardo Franassovici dizerdurante as demonstrações que fez noúltimo Audioshow que o baixo das MagicoQ5 é sexy. Pois eu diria o mesmo do baixoobtido nas B&W 802 quando combinadascom o D-Premier. E isto porquê? Bom, paracomeçar porque a noção de sexy é algo quetem a ver com cada um de nós. Rubensgostava muito de modelos bem «cheii-nhos», plenos de curvas. Os modelos dosdesfiles de moda actuais atingem níveis demagreza quase extremos, tentando agradaràquilo que lhes fizeram crer ser umestereótipo dos tempos modernos. Quemestará certo? Seguramente todos e nenhum.Cada um de nós é agradavelmentedespertado por aspectos da beleza que têma ver com tudo aquilo que temos visto eaprendido ao longo da nossa vida, podendochamar-se a isto tudo «referênciasculturais», porque não?

Então porque digo eu que o baixo das 802com o D-Premier é sexy? Pois, uma vezmais, não é fácil encontrar palavras paradefinir esse conceito em absoluto. Mas

ouçam a primeira faixa do CD especial quefaz parte da colecção em mono dos Beatles,com o título Mono Masters e tomematenção ao trabalho da guitarra baixo, porvolta dos 48 segundos e, cerca de umminuto mais à frente, e vão perceber o queeu quero dizer. Sentem-se como que osrequebros de uma dançarina do Carnaval doRio de Janeiro, combinados com osmovimentos sensuais de Elvis Presley nassuas actuações ao vivo (e num ou noutrofilme), e está tudo dito. O grave é forte,presente, está lá quando necessário e, aomesmo tempo, todas as evoluções dasnotas são sentidas não apenas pelo som emsi mas igualmente por algo mais. Não queeu não conheça palavras suficientes paraaqui colocar, o problema é que o DevialetD-Premier, pela primeira vez em muitosanos, cria um novo paradigma dentro dosconceitos audiófilos tradicionais. Temos queolhar para este equipamento como paraalgo que rompe com uma série de conceitosestereotipados e abre uma nova janela parao futuro.

O desempenho superlativo do D-Premiernão é válido apenas para música maisdinâmica – mesmo um quarteto de câmaraé reproduzido com toda a beleza e sou-plesse que poderíamos esperar de umaaudição ao vivo! Este não é um amplificadorque gosta deste ou daquele tipo de música.O D-Premier é um amplificador para todasas «estações»!

Agora, muito cuidado! Tal como nemmesmo um cozinheiro de um restaurantecom três estrelas no famoso Guia Michelinconsegue fazer pratos divinais a partir degéneros menos bons, também o D-Premieré muito franco e sincero em relação ao querecebe da fonte: descreve de maneira im-placável o que se passa daquele lado e oque ocorreu na gravação ou masterização, eoriginais de menor qualidade sãoapresentados como tal sem adições que«doirem» a pílula. Mas desde quando asinceridade e franqueza são defeitos? Paramim nunca o foram.

Buddy Bolden Blues, pertencente ao CD TestRecord 1, da Opus, é uma faixa na qual osmetais aparecem com um notável realismo,e isso é bem evidente igualmente na faixa12 do mesmo disco – Ole Miss –, cuja re-produção nos transmite uma alegriagenuína e, ao mesmo tempo, algumaemoção, tal como acontece com a músicade New Orleans quando bem interpretadae, neste caso, bem gravada. Muito poucosamplificadores conseguem este nível de re-produção, diria mesmo que bastam algunsdedos de uma mão para os contar, mas éexactamente assim que se distinguem osque são apenas bons dos que sãosuperlativamente bons. Algo como que umarevelação aconteceu igualmente na faixa 11do mesmo disco, com o título A NewGround, em que o cravo atinge um nível derealismo verdadeiramente assombroso. E

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isto não é fácil, porque o cravo é dos ins-trumentos mais difíceis de se tocar, uma vezque o seu som apresenta sempre um mistoentre mestria técnica e virtuosismo e, aomesmo tempo, é muito difícil encontrarboas gravações deste instrumento, devidoao seu som algo metálico, sendo a que citeiuma das mais bem conseguidas.

As vozes neste D-Premier são algo quasesobrenatural, ou seja, literalmente do outromundo. Soam com as harmónicas quedevem ter, nem mais nem menos, mas tãohumanas que trazem o intérprete até nósem vez de nos levar ao local de audição.

Brincando um pouco com as palavras e como conceito de «em casa», diria que este éum verdadeiro equipamento para «músicaem casa», ao trazer até nós quer o intér-prete vocal quer os músicos e colocá-los alina nossa frente, sempre disponíveis para in-terpretarem a música ao seu mais alto nível.

E quem não gostará de ter como convidadosem sua casa uma Filarmónica de Berlim, umMiles Davis, uma Ami Fujita, uma RebeccaPidgeon ou um Oscar Peterson a deliciarem-nos com o seu virtuosismo? Este éseguramente o maior elogio que possofazer a este D-Premier!

A inexistência de distorção a qualquer nívelde volume (veja o gráfico da distorção emtermos da frequência e perceberá melhor oque digo) faz-nos facilmente atingir níveisde reprodução que noutros casosseguramente consideraríamos excessivos,mas com este D-Premier nunca se tem asensação de distorção ou dureza inerentesaos níveis extremos com outros am-plificadores – o som não muda de carácter,tudo continua igual, só a pressão sonora émaior. Chega a ser desarmante e obriga-nosmesmo seguramente a criar novos hábitosde audição. Temos aqui um amplificadorque está finalmente ao nível daquilo quehoje em dia é tão raro, de tanta inflação demestres e doutorados que por aí existem: odo verdadeiro magister, fonte de co-nhecimento, que apenas com a suapresença enche uma sala e deixa toda umaplateia ansiosa por beber as suas palavras.

Tive a felicidade de conhecer dois mestresdeste nível e agora, alguns anos decorridos,eis que me deparo com um equipamentoque, por si próprio e não necessariamentepor tudo aquilo que eu possa dizer dele, pormais elogioso que seja, se alcandora a essaposição invulgar de se transformar numacorreia de transmissão natural de novos co-nhecimentos.

Experimentar o D-Premier com originais dequalidade master (24 bit/96 kHz),descarregados directamente da HDT racks ereproduzidos no Olive ou ainda, surpresadas surpresas que guardo para um teste apublicar no próximo número, um pequenoDAC USB da HRT (HRT Music Steamer II+)que faz verdadeiras maravilhas a um preçode cerca de 300 euros, sendo o sinal trans-mitido para o exterior através da saídadigital com o formato original, é como quesermos sujeitos a um momento deascensão directa ao paraíso musical, onde,tal como na Terra Prometida, jorrava leite emel em permanência, neste caso jorrarámúsica de uma qualidade e naturalidadetais que só ouvindo se acredita ser possívelexistir. Recordo-me muito em especial daaudição da peça de Rimsky-Korsakov TheSnow Maiden: Dance of the Tumblers, inter-pretada pela Minnesota Orchestra, dirigidapor Eiji Oue. Esta é uma das gravações maisfamosas efectuadas pelo reputado professorKeith Johnson e, seja ou não repetição, nãoposso deixar de dizer que me senti como seestivesse na sala de concerto: asreverberações eram extremamente reais, aespacialidade notável, a perfeição tímbricadas madeiras e metais atingiu níveis queseguramente me emocionaram. Pareciadifícil suplantar o que tinha ouvido até

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TESTE Devialet D-Premier

àquele momento, mas o D-Premier temaquela qualidade que eu já mencionei:dêem-lhe o melhor sinal de entrada queconseguirem encontrar e ele fará tudo para,e vou aqui dizer uma heresia, melhorarainda mais esse sinal. Isto é que é mesmomestria! A somar a isto, e como se não fossejá tanto, quem comprar o D-Premier devededicar algum tempo a tentar encontrar omelhor cabo de sector que conseguir encon-trar e que dê os melhores resultados no seusistema. Como sempre, fiz várias ex-periências, desde Supra a van den Hul, maso que realmente deu resultados sur-preendentes foi um cabo-mistério (mais ummistério porque não vou já revelar o nomenem a origem, fica para mais tarde) que,desde a imagem à recuperação de detalhese ao impacte dinâmico, tudo melhorou. Aquiestá mais um desafio, para quem gostadeles.

Terei que utilizar o termo competente, serealmente tiver que criticar alguma coisa,fundamentalmente com o significado deque poderá ser melhorado para chegar aonível do resto, como qualificativo para oandar de entrada MM/MC, ao menosquando utilizado com a Benz LP. O que sepassa é que o resto é tão superlativamentebom que este andar de entrada de gira-discos não pode ser classificado comoapenas muito bom. Tem muito boadinâmica, os timbres são bonitos, só nãotem o nível de detalhe, aquele je ne saisquoi que se pode encontrar num grandeandar phono como um Aesthetix Signatureou o mítico Vendetta Research (queconfesso, nunca ouvi). Mas também temosque pensar que um já não se fabrica hámuitos anos e o outro custa tanto como oD-Premier, por isso é melhor manter ascoisas no enquadramento correcto.

Depois de tantos ditirambos sobre estemaravilhoso amplificador, quase que sepoderia pensar que a partir de agora nãovão existir outros tipos de amplificadores.Não é bem assim. Tomando apenas umexemplo, continuarão sempre a existirapreciadores da amplificação a válvulas – eupróprio sou um deles e não desisto do meusonho de projectar e construir o meu pró-prio amplificador a válvulas, em Classe A ecom 200 W por monobloco –, tal como nãoperderemos nunca os apreciadores dediversos outros grandes projectos queexistem no mercado. Apenas como umoutro exemplo, o vinilo não deixa de ter oseu alargado séquito de seguidores, mas

isso não coloca em causa todos os queapreciam a música reproduzida a partir deoutras fontes e que podem gostar de ambosao mesmo tempo.

Um corpo destes, tão elegante e bonito,com uma alma destas (em bom portuguêsdiria Alma até Almeida), é algo que desafiatudo aquilo que tomámos como dogmaabsoluto durante tantos anos. Mas essa éuma das definições possíveis para«revolução», não é?

Poderá faltar algo ao D-Premier porcomparação com algum outro grande am-plificador integrado? É possível, mas comoé que eu o comparo com outros, se ele é oúnico exemplar de uma nova espécie? Estátão avançado para além de determinadosparâmetros que torna extremamente difícilo sempre inevitável exercício dacomparação. E olhem que eu sou umtécnico, dou valor às medições que, nestecaso, são soberbas, mas nunca descuro osresultados sónicos, igualmente fabulosos.Certamente que muitos dos meus leitores,alguns dos quais me seguem há mais devinte anos, vão perceber facilmente queesta é a primeira vez que estousimultaneamente eufórico e, quase diria,perplexo, perante um equipamento que nãosó é extraordinário em praticamente todosos aspectos no momento em que escrevo,como irá certamente definir novas vias/per-cursos/parâmetros de avaliação para ofuturo. E quantas vezes acontece isto a cadaum de nós ao longo da vida? Pois quasenunca, e sinto-me feliz por ter ocorridocomigo, já que nada melhor que estarmossempre atentos, despertos e prontos aaprender novas coisas. Os portugueses sãoconhecidos por ter dado novos mundos aomundo, temos aqui uma parelha defranceses que se arrisca a concretizar o

mesmo desiderato no mundo da alta-fidelidade. Bem-vindos sejam.

Termino esta análise, que já vai bem longa,com um pedido: seria interessante existirum pequeno mostrador no painel frontal(embora isso estragasse a estética) ou(alternativa que parece estar a serseriamente considerada pela Devialet) nocontrolo remoto. Será que serei ouvido?

ConclusãoQue mais se poderia esperar de uma em-presa cuja sede se situa orgulhosamente naPlace Vendôme, seguramente o local deParis onde existem mais lojas de luxo pormetro quadrado? Pois nada menos que umproduto Premier, não exactamente por ser oprimeiro desta jovem empresa, mas muitomais por pertencer àquela elite única dosequipamentos superlativos de excelsasqualidades. A beleza estética é in-questionável, o desempenho desafia autilização das palavras mais encomiásticas,as páginas que este teste acabou por ocuparneste número da Audio & Cinema em Casasão prova suficiente de que estamosperante algo de notável. Não é costumefazermos reservas para os prémios deProduto do Ano, mas neste caso tenhodefinitivamente que abrir uma excepção –o Amplificador Integrado do Ano 2010 estáencontrado! Ouvir este Devialet D-Premieré entrarmos na quinta dimensão musical esentirmos que estamos a tomar parte activanuma revolução, tranquila mas inevitável.Se gosta realmente de música, será umcrime não comungar deste acontecimentoúnico. Que mais poderei eu dizer?

Preço: 10.000 eDistribuidor: ImacústicaTelefone: 225 194 180Internet: www.imacustica.pt

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