determinantes do investimento: estudo sobre a indústria de transformação no brasiil

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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIAS E LETRAS DE ARARAQUARA PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM ECONOMIA STEPHANO HERTAL FARIAS NUNES ESTUDO SOBRE OS DETERMINANTES DO INVESTIMENTO NA INDÚSTRIA DE TRANSFORMAÇÃO BRASILEIRA: ANÁLISE SETORIAL PARA O PERÍODO DE 1996 A 2012 ARARAQUARA, SP 2015

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Em uma economia como a brasileira, cujo processo de estabilização não foi suficiente para engendrar uma trajetória estável de crescimento econômico, estudar formas de estimular o crescimento se faz necessário para ampliar e melhorar o padrão de vida presente e futuro da nação. Dada a capacidade de expansão limitada dos gastos públicos, o peso das exportações na demanda agregada, e o estável comportamento do consumo, o investimento é a variável chave para ser estimulada com vistas a elevar as taxas atuais de crescimento do PIB. O objetivo deste trabalho é construir um modelo que descreva o impacto de variáveis econômicas sobre a decisão de investir no período recente e estável da economia brasileira destacando-se pela diferenciação das heterogeneidades setoriais criadas ao longo da industrialização. Como será visto, a taxa de crescimento do produto e o câmbio desvalorizado, bem como a taxa de lucratividade da atividade, são fundamentais para os investimentos, principalmente dos setores de média-alta tecnologia agregada. A taxa de juros, acompanhando estudos da área, não foi significativa para determinação dos investimentos no período analisado.

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  • UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA JLIO DE MESQUITA FILHO

    FACULDADE DE CINCIAS E LETRAS DE ARARAQUARA

    PROGRAMA DE PS GRADUAO EM ECONOMIA

    STEPHANO HERTAL FARIAS NUNES

    ESTUDO SOBRE OS DETERMINANTES DO INVESTIMENTO NA

    INDSTRIA DE TRANSFORMAO BRASILEIRA: ANLISE SETORIAL

    PARA O PERODO DE 1996 A 2012

    ARARAQUARA, SP

    2015

  • STEPHANO HERTAL FARIAS NUNES

    ESTUDO SOBRE OS DETERMINANTES DO INVESTIMENTO NA

    INDSTRIA DE TRANSFORMAO BRASILEIRA: ANLISE SETORIAL

    PARA O PERODO DE 1996 A 2012

    Dissertao de mestrado apresentada ao Programa de

    Ps-Graduao em Economia da Faculdade de Cincias

    e Letras de Araraquara (PPGE/UNESP), como

    requisito parcial para obteno do ttulo de mestre em

    economia.

    Orientador: Prof. Dr. Andr Luiz Correa

    Bolsa: Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de

    Nvel Superior (CAPES).

    ARARAQUARA, SP

    2015

  • STEPHANO HERTAL FARIAS NUNES

    ESTUDO SOBRE OS DETERMINANTES DO INVESTIMENTO NA

    INDSTRIA DE TRANSFORMAO BRASILEIRA: ANLISE SETORIAL

    PARA O PERODO DE 1996 A 2012

    Dissertao de mestrado apresentada ao Programa de

    Ps-Graduao em Economia da Faculdade de Cincias

    e Letras de Araraquara (PPGE/UNESP), como

    requisito parcial para obteno do ttulo de mestre em

    economia.

    Orientador: Prof. Dr. Andr Luiz Correa

    Bolsa: Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de

    Nvel Superior (CAPES).

    Data da Defesa: ______/_______/______________

    Membros da Banca Examinadora:

    ______________________________________

    Orientador Professor Doutor Andr Luiz Correa

    UNESP Araraquara

    ______________________________________

    Professor Doutor Celio Hiratuka

    UNICAMP Campinas

    ______________________________________

    Professora Doutora Tatiana Massaroli Melo

    UNESP Araraquara

    ARARAQUARA, SP

    2015

  • AGRADECIMENTOS

    Com este trabalho concluo uma parte da jornada acadmica pela qual tive

    oportunidade de optar. Estamos sempre sujeitos aos nus e bnus de nossas escolhas e

    poder compartilhar nossas conquistas com pessoas queridas faz com que os nus fiquem

    mais suportveis e os bnus mais gratificantes. Aproveito esta seo para agradecer a

    todos que me acompanharam pela histria de vida ou por boa parte dela.

    Primeiramente, agradeo aos meus pais, Avelino e Ana, por todo apoio, confiana

    e dedicao. Dos recortes de jornais velhos da pr-escola esta dissertao nada seria

    possvel sem o apoio de vocs.

    Agradeo tambm toda minha famlia, em especial a minha irm e ao meu

    cunhado, Stephania e Diego, tios, tias e av.

    Gostaria de destacar algumas pessoas que ao longo da vida aprendi a admirar e

    respeitar e que se tornaram grandes amigos.

    Mesmo com o risco de esquecer de algum, agradeo, da poca de faculdade, ao

    Bruno e a Danizinha pela repblica em Maring. Ao Okado, Fran, Vnia e Pam, pela

    amizade, apoio e militncia poltica.

    Agradeo tambm aos grandes amigos Zi e Vini pelos profundos debates

    econmicos, muitos dos quais realizados na mesa do Afonsos.

    Agradeo, com carinho e boas recordaes, Tamires e Camila, amigas que me

    acompanham desde Ja. Aos amigos do mestrado, em especial ao povo do mal, meu

    muito obrigado. Thas, I will always love you.

    Pela amizade e apoio em Ponta Grossa, Ana Carolina, obrigado.

    Ao meu professor e orientador, Andr, meus mais sinceros agradecimentos.

    Independente de quantos projetos fossem apresentados e do desespero dos prazos que se

    findavam, sempre acreditou no desenvolvimento do trabalho, sempre!

    Tambm no posso deixar de mencionar duas oportunidades profissionais

    fundamentais para mim. Ainda na graduao, o estgio no setor de custos do GTFoods

    Group que me proporcionou conhecimentos do excel sem os quais boa parte dessa

    pesquisa no seria possvel. E a experincia como docente colaborador da UEPG,

    condio que me encontro atualmente.

  • 5

    Por fim, agradeo a todos os professores e equipe do Programa de Ps-Graduao

    em Economia da Unesp de Araraquara, aos professores do departamento de economia da

    UEM (em especial, Joaquim, Eliane e Alexandre exemplos para toda a vida de bons

    profissionais) e CAPES, pelo incentivo financeiro.

    Peo desculpa queles que por descuido no foram mencionados, saibam que

    moram em meu corao.

    Essa pesquisa uma contribuio de todos. Os erros so exclusivamente meus.

  • H um tempo em que preciso abandonar as roupas usadas, que j tem

    a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam

    sempre aos mesmos lugares. o tempo da travessia: e, se no ousarmos

    faz-la, teremos ficado, para sempre, margem de ns mesmos.

    Fernando Teixeira.

  • Aos meus pais.

  • RESUMO

    O Brasil passou por um processo de industrializao que visava substituir os produtos

    importados por mercadorias produzidas internamente. Esse fato, que ocorreu de forma

    deliberada pelo Estado ao longo de trs dcadas (de 1950 a 1970), recebeu o nome de

    Industrializao por Substituio de Importaes (ISI). A industrializao se sucedeu de

    forma gradativa: primeiro a instalao do parque industrial dos bens de consumo leves,

    bens de consumo durveis e, posteriormente, a instalao da indstria de bens de capital

    e intermedirios. Sem a relativa estabilidade para construo de expectativas

    minimamente confiveis quanto ao futuro, a dcada de 1980, conhecida como dcada

    perdida, tida como um perodo de desacelerao da atividade econmica e queda dos

    investimentos. A sucesso de planos econmicos implantados a fim de conter a inflao

    s obteve sucesso com o plano Real, em 1994. Principalmente a partir desse ano as taxas

    de investimento no Brasil tem se mantido abaixo de 20% do PIB, um dos motivos

    apontados para o fraco crescimento da economia. O objetivo deste trabalho construir

    um modelo que descreva o impacto de variveis econmicas sobre a deciso de investir

    no perodo recente e estvel da economia brasileira. Esta pesquisa faz parte de um

    pequeno, mas crescente grupo de estudos que se dedicam a compreender a indstria de

    transformao sob a tica setorial, destacando-se as heterogeneidades criadas ao longo da

    industrializao. Um longo processo de converso dos dados permitiu trabalhar com

    estatsticas da PIA (IBGE) de 1996 a 2012 minimizando o impacto da mudana de

    metodologia em 2007. A pesquisa est organizada em sees de carter terico, histrico

    e emprico. A primeira seo se encarrega de apresentar as principais teorias sobre os

    determinantes dos investimentos. A segunda seo apresentar o processo de

    industrializao do Brasil, alm da evoluo de variveis econmicas e do investimento

    setorial da indstria de transformao. Na terceira e ltima seo encontram-se os

    modelos empricos estimados para analisar a relao de determinantes macroeconmicos

    e microeconmicos sobre os investimentos setoriais da indstria. Como ser visto, a taxa

    de crescimento do produto e o cmbio desvalorizado, bem como a taxa de lucratividade

    da atividade ou setor, so fundamentais para os investimentos, principalmente dos setores

    de mdia-alta tecnologia agregada. A taxa de juros, acompanhando estudos da rea, no

    foi significativa para determinao dos investimentos no perodo analisado.

    Palavras-Chave: Determinantes dos Investimentos; Indstria de Transformao; Dados

    em Painel, Mark-up, Valor Bruto da Produo Industrial, Taxa de Cmbio, Taxa de Juros.

  • ABSTRACT

    Brazil experienced an industrialization process that aimed to replace imported products

    for goods produced domestically. This fact, which occurred deliberately by the state over

    three decades (1950-1970), named industrialization by import substitution (IIS).

    Industrialization ensued gradually: first the installation of the industrial park of consumer

    goods, durable consumer goods and subsequently the installation of capital and

    intermediate goods industry. No relative stability for the construction of minimally

    reliable expectations about the future, the 1980s, known as the lost decade, is seen as a period of slowing economic activity and falling investment. The succession of economic

    plans implemented in order to curb inflation only succeeded with the plan Real, in 1994.

    Mainly from this year investment rates in Brazil has remained below 20% of gdp, one of

    the reasons given for the weak economic growth. The objective of this work is to build a

    model that describes the impact of economic variables on the decision to invest in new

    and stable period of the brazilian economy. This research is part of a small, but growing

    number of studies dedicated to understanding the manufacturing sector in the optical

    industry, highlighting the heterogeneity created throughout the history of industrialization

    process. Through a long process of conversion of data, it was possible to work with

    statistics PIA (IBGE) from 1996 to 2012 (last year released until the preparation of the

    work). The research is organized into sections theoretical character, historical and

    empirical. The first section is in charge of presenting the main theories about the

    determinants of investment. The second section will present Brazil's industrialization

    process and the evolution of economic variables and sector investment in the

    manufacturing industry. In the third and final section are estimated empirical models to

    examine the relationship of macroeconomic and microeconomic determinants on sectoral

    investment industry. As will be seen, the growth rate of the product and the undervalued

    exchange rate, as well as the profitability rate of activity or sector, are critical for

    investment, mostly aggregate medium-high technology sectors. The interest rate,

    following studies of the area, was not significant for determination of investments during

    the period.

    Key-Word: Investment determinants; Manufacturing industry; Panel Data, Mark-up,

    Value of Industrial Production, Exchange Rate, Interest Rate.

  • SUMRIO

    INTRODUO .............................................................................................................. 11

    1. FUNDAMENTOS TERICOS SOBRE OS DETERMINANTES DO INVESTIMENTO

    Introduo ....................................................................................................................... 14

    1.1 O Investimento segundo Keynes ..................................................................... 16

    1.1.1 O multiplicador keynesiano ........................................................................... 21

    1.2 O Investimento a partir de Kalecki .................................................................. 23

    1.2.1 Consideraes sobre Keynes e Kalecki ......................................................... 25

    1.3 O Modelo do Acelerador do Investimento ...................................................... 26

    1.4 O Modelo de Investimento Neoclssico .......................................................... 28

    1.5 A Teoria q de Tobin ......................................................................................... 31

    Consideraes Finais ...................................................................................................... 32

    2. ECONOMIA BRASILEIRA E A INDSTRIA DE TRANSFORMAO

    Introduo ....................................................................................................................... 33

    2.1 Economia Brasileira Recente ........................................................................... 39

    2.2 Metodologia para compatibilizar os dados da Indstria de Transformao .... 44

    2.3 Investimento da Indstria: Setores ................................................................... 52

    2.4 Investimento da Indstria: Contedo Tecnolgico .......................................... 55

    Consideraes Finais ...................................................................................................... 60

    3. DADOS SETORIAIS EM PAINEL: INVESTIGAO EMPRICA SOBRE OS DETERMINANTES DO INVESTIMENTO

    Introduo ....................................................................................................................... 62

    3.1 Metodologia Economtrica .............................................................................. 62

    3.1.1 Estimao de Efeitos Fixos ............................................................................ 64

    3.1.2 Estimao de Efeitos Aleatrios .................................................................... 66

    3.1.3 Efeitos Fixos ou Aleatrios? .......................................................................... 67

    3.2 Definies das variveis e do modelo .............................................................. 68

    3.3 Resultados Obtidos e Discusso ...................................................................... 71

    Consideraes Finais ...................................................................................................... 75

    CONCLUSO ................................................................................................................ 77

    REFERNCIAS ............................................................................................................. 80

    APNDICE .................................................................................................................... 84

    ANEXO .......................................................................................................................... 85

  • INTRODUO

    Em uma economia como a brasileira, cujo processo de estabilizao no foi

    suficiente para engendrar uma trajetria estvel de crescimento econmico, estudar

    formas de estimular o crescimento se faz necessrio para ampliar e melhorar o padro de

    vida presente e futuro da nao.

    O investimento presente se relaciona com a produo futura potencial da

    economia, influenciando no padro de consumo de longo prazo da populao. Entender

    o que impacta a deciso de investir tem a inteno de contribuir com as pesquisas que

    formulam polticas pblicas para o crescimento robusto e sustentvel da economia.

    A capacidade de expanso limitada dos gastos pblicos, o peso das exportaes

    na demanda agregada, e o estvel comportamento do consumo, tornam o investimento a

    varivel chave para ser estimulada com vistas a elevar as taxas atuais de crescimento do

    PIB. Como ser visto, boa parte das flutuaes econmicas tem origens nas oscilaes do

    investimento. Se o Brasil quiser crescer, vai ter que investir.

    O investimento toda e qualquer aquisio que vise ampliar a capacidade

    produtiva, excetuando-se assim, portanto, os investimentos financeiros, tais como a

    poupana, que nada tem a ver com o investimento a ser investigado. Por investimentos,

    entende-se as aquisies de mquinas e equipamentos, terrenos e edificaes, veculos ou

    outros meios de transportes, realizados por empresas pblicas ou privadas, ou ainda, os

    investimentos realizados majoritariamente pelo Estado, tais como a construo de

    infraestrutura de transportes, energia ou telecomunicaes.

    O principal objeto de estudo desta pesquisa o investimento realizado pela

    indstria de transformao brasileira. Este setor se destaca nos estudos econmicos por

    seus conhecidos encadeamentos para frente e para trs da cadeia produtiva, seja no que

    se refere demanda/oferta de insumos e materiais acabados, seja no que se refere ao

    avano do progresso tecnolgico.

    A seguir ser visto que a rentabilidade esperada do capital a ser investido, o custo

    das mquinas e equipamentos a serem adquiridos ou barraces para serem construdos,

    alm dos custos e a disponibilidade de recursos para financiar os investimentos so,

  • 12

    teoricamente, exemplos de variveis capazes de afetar a deciso do empresrio de

    investir.

    de se esperar que tais variveis impactem de maneiras diferentes o investimento

    setorial. Setores ligados produo de bens de baixa tecnologia podem, por exemplo,

    reagir de forma diferente dos setores produtores de bens de alta tecnologia s mudanas

    macroeconmicas.

    Os setores industriais brasileiros so heterogneos, ou seja, esto condicionados a

    padres de concorrncia e competitividade, produo e comrcio diferentes entre si. O

    estudo dos determinantes do investimento deve considerar as diferenas de cada um

    desses setores.

    O objetivo desta pesquisa compreender como determinadas variveis

    econmicas tm impactado a deciso do empresrio de investir. A abordagem ser feita

    sob a tica setorial, a fim de destacar as diferenas entre os setores da indstria de

    transformao brasileira.

    Baseia-se na hiptese que o investimento no Brasil condicionado tanto s

    restries macroeconmicas, como taxa de juros elevada e cmbio apreciado, quanto por

    condicionantes internas do setor industrial. Estas condicionantes se manifestam, quando

    relativo estrutura de mercado, no mark-up, ou nas condies de mercado refletidas nas

    taxas de crescimento das vendas/produo de cada setor.

    Para cumprir o objetivo proposto a metodologia composta por trs partes:

    terica, histrica e emprica. A primeira parte busca explicar, do ponto de vista terico,

    luz das teorias de Keynes, Kalecki, Harrod-Domar, Solow e Tobin os determinantes do

    investimento.

    A segunda parte composta por dois eixos principais: i) um eixo histrico,

    encarregado de apresentar um breve relato do processo de industrializao brasileiro,

    destacando o desempenho de algumas variveis econmicas do passado recente e ii) um

    eixo analtico descritivo, que ir explicar a metodologia para correspondncia dos dados

    referente indstria de transformao e a evoluo dos investimentos setoriais do perodo

    de 1996 a 2012.

  • 13

    Por fim, na terceira parte da metodologia prevalecem os trabalhos empricos. Por

    meio de modelos economtricos com dados em painel, esta pesquisa buscar identificar

    como e quanto determinadas variveis econmicas impactaram na deciso de investir da

    indstria de transformao, se destacando pela tica setorial aplicada.

  • 1. FUNDAMENTOS TERICOS SOBRE OS DETERMINANTES DO

    INVESTIMENTO

    Introduo

    Esta seo tem por objetivo apresentar as principais teorias sobre os determinantes

    do investimento desenvolvidas ao longo da histria econmica recente. Sero

    apresentadas cinco teorias: as teorias de investimento de Keynes e Kalecki, o modelo

    acelerador de Harrod-Domar, o modelo neoclssico e o modelo do q de Tobin.

    A apresentao dos modelos seguir, na medida do possvel, a ordem cronolgica

    de seus desenvolvimentos. Inicialmente ser apresentado o modelo keynesiano, baseado,

    principalmente, na Teoria Geral de Keynes (1936). Logo aps, na subseo seguinte, ser

    demonstrado o modelo de Kalecki consolidado em 1954, porm desenvolvido de forma

    independente e quase que concomitantemente com o modelo keynesiano. O terceiro

    modelo ser o desenvolvido por Harrod-Domar, conhecido como modelo do acelerador

    do investimento (e o modelo do acelerador flexvel). E por fim sero apresentados o

    modelo neoclssico de crescimento, referncia na dcada de 1960 e o modelo proposto

    por Tobin em 1969.

    O investimento , segundo Keynes (1936), o componente da demanda agregada

    mais instvel, pois a deciso de investir do empresrio est sujeita s expectativas, riscos

    e incertezas que rondam o mercado e o ambiente econmico. Para o empresrio tomar a

    deciso de investir ele precisa de um ambiente estvel de longo prazo para fazer previses

    relativamente seguras em relao as suas receitas futuras. O retorno esperado do

    investimento comparado com a taxa de desconto o principal fator que influencia na

    deciso de investir.

    Para Kalecki (1954) os principais determinantes do investimento so: a) os lucros

    retidos pela empresa (espcie de poupana privada capital prprio que pode servir, por

    exemplo, de garantia para facilitar o acesso aos fundos de financiamento de

    investimentos); b) a taxa de lucro mdia corrente no mercado; c) o estoque acumulado de

    capital produtivo e d) um termo autnomo, d, relativo s mudanas de longo prazo, tais

  • 15

    como taxa de juros de longo prazo, avano tecnolgico e valorizao nos preos das

    aes.

    Kalecki e Keynes esto muito prximos no campo terico, principalmente no que

    diz respeito importncia atribuda ao princpio da demanda efetiva e a relao entre

    renda, a poupana e investimento. Como Possas (1999) afirma, Kalecki se destaca pela

    concepo de um modelo dinmico, enquanto, por sua vez, Keynes recebe o mrito pelo

    desenvolvimento de um modelo mais completo no sentido de considerar, em sua

    elaborao, variveis do sistema financeiro e monetrio da economia.

    O modelo de Harrod-Domar, tambm conhecido como Modelo do Acelerador do

    Investimento, busca atribuir projeo de longo prazo s conjecturas apontadas por

    Keynes. O investimento passa a ser descrito por equaes de produo de propores

    fixas na relao capital/produto. Nesse sentido, o investimento definido por uma funo

    linear da variao do produto/renda nacional; mudanas na taxa de crescimento do pas

    impactam no montante de capital fixo produtivo desejado pelos capitalistas.

    Os modelos neoclssicos voltam a analisar o crescimento econmico pelo lado da

    oferta. As hipteses sobre investimento so formuladas a partir das concepes de

    equilbrio e escolha tima derivadas de funes de maximizao de lucros pelas firmas.

    Os modelos so concebidos para atender falhas encontradas no modelo do acelerador

    como ausncia de preos e custos. Os neoclssicos excluem as expectativas dos agentes,

    exaustivamente enfatizadas nos modelos keynesianos e atribuem poupana importncia

    fundamental para concepo do modelo.

    Por fim, a abordagem do q de Tobin mostra uma relao entre o valor de mercado

    do estoque de capital acumulado na empresa e o custo de reposio desse estoque. De

    cunho monetrio, busca modelar o investimento a partir de valores expectacionais. No

    parmetro q, conforme ser visto, muitas variveis que impactam a deciso de investir

    so sumarizadas.

    Aps esta discusso inicial sobre os determinantes do investimento, na sequncia

    do captulo sero apresentados os modelos mencionados de forma mais detalhada e

    especificada. Obviamente cada um dos modelos que sero apresentados so compostos

    por inmeras limitaes oriundas do alto nvel de abstrao em que so concebidos.

    Conforme destacado por Bresser-Pereira (1975) esses modelos ao buscarem a

  • 16

    generalidade eliminam ou ignoram aspectos sociais, polticos e culturais envolvidos na

    deciso de investir e do processo de crescimento e desenvolvimento econmico. Esses

    modelos no conseguem nem mesmo considerar todos os aspectos estritamente

    econmicos da realidade, mas ajudam, cada um a seu modo e do seu ponto de vista, a

    explicar como as decises de investir so tomadas.

    1.1 O Investimento segundo Keynes

    Para apresentar a teoria sobre investimento desenvolvida por Keynes alguns

    pontos so essencialmente importantes e devem ser devidamente abordados. Seria

    impossvel discutir tal teoria sem expor adequadamente, por exemplo, o papel da taxa de

    juros sobre a deciso de investir, as expectativas em relao atividade econmica no

    futuro e o conceito de Eficincia Marginal do Capital (EMgC). Outro fator importante

    que diferencia Keynes e marca sua ruptura com a escola clssica a relao da poupana

    com o investimento, totalmente invertida em comparao com a literatura predominante

    a poca.

    Quando uma pessoa realiza um investimento ela visa se apropriar das receitas

    futuras que o empenho do capital lhe proporcionar. A essa srie de receitas futuras,

    Keynes (1936, p. 149) denomina de renda esperada do investimento. No oposto renda

    esperada do investimento h o preo de oferta do bem de capital. Como destaca Keynes

    (1936), o preo de oferta o preo mnimo capaz de induzir o empresrio a investir, no

    refletindo necessariamente o preo de mercado do bem. O clculo para se chegar ao

    retorno esperado do investimento e, por conseguinte, a deciso de investir, so derivados

    da comparao entre o preo de oferta do investimento e o preo de demanda do

    investimento. A relao entre o preo de oferta do bem de capital e sua renda esperada

    determina a Eficincia Marginal do Capital.

    Considerando, a realizao de um investimento a fim de expandir a produo, o

    montante a ser desembolsado no presente para tal aquisio definido como Preo de

    Oferta do Investimento (PoI). Por sua vez, o valor presente do fluxo de receita esperada

    chamado de Preo de Demanda do Investimento (PdI) e tipicamente definido pela

    matemtica financeira como a somatria dos fluxos futuros de receita esperada divididos

  • 17

    por uma taxa de desconto (r) determinada. Keynes (1936) calcula os rendimentos do

    capital a partir de quatro termos, a saber: Apreciao esperada do capital (A); quase-renda

    ou lucro lquido (Q); prmio pela liquidez (L) e, o nico com sinal negativo, o custo de

    carregamento do ativo (C)1. Algebricamente, com (i) representando o nmero de

    perodos de vida econmica til do ativo, tem-se:

    = + +

    (1+)=1 (1.1)

    Assim, se PdI > PoI, ento a taxa de retorno esperada do investimento maior que

    a taxa de juros, portanto, vivel a realizao do investimento. Por outro lado, se PdI <

    PoI, ento a taxa de retorno esperada do investimento menor que a taxa de juros, e no

    vivel investir.

    Quando o investimento, em dado tipo de capital, aumenta durante certo

    perodo, a eficincia marginal desse capital diminui medida que o

    investimento aumenta, em parte, porque a renda prospectiva baixar

    conforme suba a oferta desse tipo de capital e, em parte, porque a

    presso sobre as fbricas produtoras daquele dado tipo de capital

    causar, normalmente, uma elevao de seu preo de oferta (KEYNES,

    1936, p 150).

    O que Keynes (1936) quer dizer que existe uma relao inversa entre montante

    de investimento e a eficincia marginal do capital. Essa relao inversa dada por dois

    motivos. Primeiramente, o aumento do investimento elevar a quantidade de bens

    ofertados no mercado, reduzindo seus preos e consequentemente a renda esperada do

    investimento. Do outro lado, o aumento do investimento eleva a demanda por bens de

    capital e insumos, causando uma presso de alta sobre seus preos, e consequente

    aumento do preo de oferta do capital. O investimento se realiza sempre que a EMgC se

    igualar ou for superior a taxa de juros. Conforme ilustrado na figura 1.1, estes movimentos

    fornecem eficincia marginal do capital formato decrescente sempre que comparada ao

    montante de investimento.

    1 Para maiores detalhes sobre as caractersticas de cada termo ver suas especificaes em Keynes (1936)

    captulo 17.

  • 18

    Figura 1.1: Eficincia Marginal do Capital (EMgC)

    Fonte: Elaborado pelo autor.

    A Eficincia Marginal do Capital o elo do futuro com o presente, pois o clculo

    da renda esperada do investimento influenciado pelas expectativas frente a um futuro

    incerto.

    A diviso das expectativas feita por Keynes (1936, p. 159) em dois grupos. O

    primeiro refere-se as expectativas construdas sobre fatos existentes que se pode supor

    que sejam conhecidos mais ou menos com certeza, essas expectativas dizem respeito ao

    o que, como e quanto produzir e esto associadas s decises de curto prazo. Neste

    perodo de curto prazo a estrutura de mercado, tcnicas de produo e estoque de capital

    so conhecidos e estveis. O segundo grupo de expectativas refere-se a eventos futuros

    que podem ser previstos com um maior ou menor grau de confiana onde o estoque de

    bens de capital acumulado pode se alterar e mudanas nas preferncias dos consumidores

    so possveis. Este segundo grupo refletido no estado de expectativa de longo prazo.

    A capacidade limitada de conhecimento torna desprezvel a habilidade de se

    prever com exatido as receitas futuras de um investimento frente a eventos diversos e

    incertos de um futuro distante. Porm, Keynes (1936) argumenta que na sociedade

    prevalece um estado de confiana de que no futuro sejam mantidas as condies do

    presente, at que fatos inesperados aconteam e abalem o estado comum das coisas. No

    uma esperana cega num futuro estritamente estvel, mas uma conduta comum de

    avaliao baseada no comportamento da maioria (ou da mdia), denominado conveno.

    O acompanhamento dirio do comportamento dos diversos agentes na bolsa de valores,

    por exemplo, poderia fornecer informaes quanto ao futuro dos mercados e balizar as

    tomadas de decises no presente. A tendncia de longo prazo do mercado (refletida nas

  • 19

    aes) so mantidas a menos que fatos inesperados aconteam e causem modificaes

    significativas na srie.

    Dado que o consumo, ainda que com peso relativamente grande na composio

    da demanda agregada, apresenta um comportamento quase inerte ao longo do tempo, e a

    exogeneidade ou reduzido peso dos demais componentes dos gastos, encontra-se no

    investimento (componente autnomo) a responsabilidade tanto pelo crescimento da renda

    quanto por suas flutuaes (POSSAS, 1986).

    Deste modo, ganha relevncia o estado de confiana fixado nas expectativas

    criadas sobre o futuro. O estado de confiana a representao coletiva da sensibilidade

    dos indivduos em assumir compromissos de longo prazo com ativos produtivos durveis

    de baixa ou nula liquidez. Suas aes so tomadas mediante anlise de fatos e/ou a partir

    de seu estado de esprito, entusiasmo e otimismo. Muitas vezes o estado de confiana

    instvel; um simples sinal mal interpretado, ainda que desprovido de fundamentos

    slidos, gera um efeito manada com abruptas distores no mercado. Conforme apontado

    por Keynes:

    Uma avaliao convencional, fruto da psicologia de massa de grande

    nmero de indivduos ignorantes, est sujeita a modificaes violentas

    em conseqncia de repentinas mudanas na opinio suscitada por

    certos fatores que na realidade pouco significam para a renda provvel,

    j que essa avaliao carece de razes profundas que permitam sua

    sustentao (KEYNES, 1936, p. 164).

    Possas (1986) refere-se ao estado de confiana como algo frgil e precrio, fonte

    de forte e no eliminvel potencial de instabilidade, sujeito a sbitas e violentas

    alteraes por ser constitudo sobre expectativas coletivas de longo prazo que contam

    com baixssimo poder de prescincia.

    Em momentos de turbulncia econmica, num ambiente de incertezas crescentes

    quanto ao futuro, a sociedade sente a queda do produto agregado. Qualquer adversidade

    que afete o estado de confiana ir afugentar os investimentos. Dependendo das condies

    da economia internacional ou das finanas pblicas, a queda do investimento pode no

    ser possvel de ser compensada. Por outro lado, a construo de um ambiente econmico

    estvel se torna prspero por viabilizar o investimento. O investimento no curto prazo

  • 20

    um componente da demanda agregada, e no longo prazo tem impactos importantes na

    produo, produtividade, emprego e renda do pas.

    Dando continuidade na anlise dos fatores que afetam a deciso de investir, pode-

    se deduzir da equao (1.1) que a relao do investimento com a taxa de juros

    inversamente proporcional. Quanto maior a taxa de juros, menor ser o investimento, pois

    haver um menor nmero de projetos cuja EMgC supere a taxa de juros.

    Conforme expe Keynes (1936) a taxa de juros determinada no pelo equilbrio

    entre oferta e demanda de fundos emprestveis, mas por um fenmeno monetrio

    derivado da preferncia pela liquidez a partir de uma determinada quantidade de moeda

    em circulao na economia. Ou seja, no o custo de emprstimo ou financiamento, to

    pouco custo de oportunidade frente s oportunidades alternativas oferecidas pelo mercado

    financeiro. A taxa de juros , na realidade, uma medida de averso daqueles que possuem

    dinheiro em abrir mo de seu controle pleno (liquidez). O juro a remunerao por se

    abrir mo de determinada quantia em moeda no presente e optar por um futuro incerto

    (POSSAS, 1986).

    Os fatores que afetam a preferncia pela liquidez esto associados aos motivos

    que os regem: a) o motivo da transao, operaes correntes do dia a dia, b) o motivo

    precauo, ou seja, um resguardo de segurana proporcional aos recursos totais e c) o

    motivo especulao, com o propsito de obter lucro (KEYNES, 1936, p. 176-177). Todos

    estes fatores, cada um a seu modo, so afetados pela quantidade de moeda disponvel na

    economia. Assim sendo, as variaes no estoque de moeda em circulao tendem a alterar

    a preferncia pela liquidez (medida pela taxa de juros) gerando, por sua vez, impactos no

    investimento.

    Em resumo, tem-se que

    (...) a taxa de juros como limite ao investimento produtivo apenas

    representa, de forma condensada, o trade-off do investidor, enquanto

    aplicador de capital numa ampla carteira de ativos, entre o investimento

    (ativos de capital produtivo) e a liquidez (ativos de capital monetrio).

    na verdade, uma verso muito compacta e simplificada de uma teoria

    de aplicao financeira em portfolio, onde um ativo de capital fixo de

    grande durabilidade apenas a extremidade ilquida de um espectro de

    ativos que contm, no extremo oposto, saldos monetrios (POSSAS,

    1986, p. 301).

  • 21

    Por fim, o ponto menos importante dos determinantes do investimento para

    Keynes (1936), porm de fundamental importncia por demarcar a separao da teoria de

    keynesiana da clssica: a poupana. Keynes (1936) promove a inverso na determinao

    de renda e poupana. Para os clssicos, conforme ser discutido adiante, a poupana

    que viabiliza, ao liberar recursos para financiamento, o investimento. Para Keynes (1936)

    o investimento independe da poupana. No financiado por ela por que ele a precede.

    O que financia o investimento o crdito. Nas palavras de Possas (1986) a poupana

    meramente residual e involuntria. Ao contrrio do investimento a poupana no

    constitui um ato de deciso e apenas o excedente da renda disponvel no consumida, a

    renda, por sua vez, determinada pelo investimento. Desse modo, o investimento gera a

    poupana e no o contrrio.

    A irracionalidade da lgica clssica fica por conta da indagao feita por Keynes:

    Ora, se os consumidores buscam consumir cada vez menos a fim de aumentar suas

    poupanas e ampliar os fundos emprestveis para financiar o investimento, que

    empresrio ter incentivos para ampliar sua capacidade produtiva e sua produo em um

    mercado com consumo em declnio? Neste ponto, o excesso de poupana para Keynes se

    torna, inclusive, nocivo economia capitalista ao desfalcar parcialmente a demanda

    agregada.

    As incertezas sobre as expectativas criadas em relao ao futuro (fragilidade do

    estado de confiana) tornam o investimento instvel e a instabilidade transpassa

    economia refletindo no comportamento da demanda agregada afetando emprego e

    renda. Como Possas (1986) afirma, o investimento varivel-chave para determinao

    do nvel de renda, como tambm de suas variaes, flutuaes e instabilidades.

    Compreender melhor o comportamento do investimento indispensvel para explicar as

    tendncias e ciclos no desenvolvimento da economia capitalista.

    1.1.1 O multiplicador keynesiano

    O multiplicador keynesiano representa a variao no montante da renda agregada

    atribuda alterao do montante investido. Pode ser calculado a partir da suposio de

  • 22

    uma economia fechada e sem governo em que a Renda (Y) determinada pelo Consumo

    (C) e o Investimento (I), assim:

    Y = C + I (1.2)

    Decompondo o Consumo em Consumo Autnomo (A), efetivado

    independentemente da existncia de renda, e uma propenso marginal a consumir (b),

    sendo 0 < b < 1, e substituindo em (1.2), obtm-se:

    Y = A + bY + I (1.3)

    Tendo o Investimento (I) como exgeno, ou seja, dependente de variveis no

    presentes no modelo, tais como taxa de juros e expectativas, busca-se encontrar o nvel

    de renda de equilbrio (YE) que faz com que a Renda e a Demanda Agregada se igualem.

    Tem-se:

    Y bY = A + I (1.4)

    YE = (A + I) / (1 b) (1.5)

    Percebe-se, portanto, que a renda de equilbrio ser tanto maior quanto maiores

    forem os gastos autnomos (A e I) e a propenso marginal a consumir (b). Qualquer

    variao no Investimento gerar uma variao mais que proporcional na renda

    determinando uma nova renda de equilbrio. A variao total ser dada pelo multiplicador

    que o inverso da propenso marginal a consumir subtrada de 1. Assim, o multiplicador

    dado por:

    multiplicador = 1

    (1 ) =

    1

    (1) (1.6)

    Sempre que o investimento variar, a renda se alterar em valor igual variao

    inicial do gasto vezes o multiplicador.

  • 23

    1.2 O Investimento a partir de Kalecki

    Para Kalecki (1954) o montante de investimento est subordinado

    disponibilidade de recursos financeiros prprios, s variaes no estoque de capital fixo

    e s variaes dos lucros. Junto, acrescido um fator referente ao progresso tecnolgico

    considerado relativamente constante ao longo do tempo. Este fator faz com que,

    independente das trs variveis determinantes, exista certo montante de investimento no

    perodo.

    A importncia do capital prprio da empresa para realizao do investimento

    justificada por Kalecki (1954) como condio necessria para acesso, com maior

    facilidade, ao mercado de crdito. Por sua vez, a taxa de juros no recebe papel

    fundamental na determinao do investimento. Kalecki (1954) separa as taxas de juros

    em dois grupos, as de longo prazo e as de curto prazo. Os investimentos so realizados

    baseados nas taxas de longo prazo que, ao contrrio das taxas de curto prazo que oscilam

    bastante, permanecem relativamente estveis durante perodo de tempo razoavelmente

    longo. Sua estabilidade no a torna fator fundamental para o investimento.

    importante notar que o determinante do investimento deve levar em

    considerao tanto a variao do lucro bruto quanto do estoque de capital fixo. Se em um

    dado momento as empresas atuam com capacidade produtiva ociosa e veem suas margens

    de lucro aumentarem, so capazes de continuar a produzir sem necessariamente ter de

    ampliar seu estoque de capital fsico (investir). a interao entre os dois termos que no

    fornece ao investimento um carter explosivo.

    O modelo desenvolvido por Kalecki (1954), afirma que entre a deciso de investir

    e a efetividade do investimento existe um hiato de tempo. Algebricamente o modelo pode

    ser representado como segue:

    Ft + = Dt (1.7)

    Tal que:

    F: Investimento em capital fsico

    D: Deciso da quantidade de investimento

    : hiato temporal entre a deciso de investir (D) e sua efetividade (F)

  • 24

    A quantidade de investir (D) ser afetada pela: a) acumulao bruta de capitais

    pelas firmas a partir dos lucros correntes, S. Uma espcie de poupana empresarial

    privada, que expande o acesso ao mercado de capitais e b) modificao nos lucros brutos,

    P, e modificao no estoque de capital fsico, K.

    Vale ressaltar que quanto maior o capital investido maior o lucro bruto obtido,

    porm, conforme o estoque de capital acumula-se, menos incentivos so gerados para

    novas aquisies. Um dos motivos o aumento da oferta de bens finais que afetar o

    preo e a atratividade dos novos investimentos. Outro motivo, conforme defendido por

    Kalecki (1954), que o aumento dos investimentos eleva o grau de endividamento das

    empresas, dificultando-lhes o acesso ao mercado de capitais.

    A limitao do tamanho da firma pela disponibilidade de capital da

    empresa chega ao mago do sistema capitalista. Muitos economistas

    supem, pelo menos em suas teorias abstratas, um estado de democracia

    econmica onde qualquer pessoa com o dom da habilidade empresarial

    pode obter capital para iniciar um negcio. Esse quadro das atividades

    do empresrio puro no , para pr a coisa em termos modestos, realista. O pr-requisito mais importante para algum se tornar

    empresrio a propriedade de capital (KALECKI, 1954, p. 116).

    Em resumo, a deciso de investimento D funo crescente da poupana bruta

    (S) e da taxa de modificao do montante dos lucros (P/t), e funo decrescente da

    taxa de modificao do estoque em equipamentos, (K/t). Suponha uma relao linear

    com os parmetros a e b, positivos e c, negativo, tem-se:

    = +

    + (1.8)

    Onde d representa uma constante sujeita a modificaes a longo prazo. Nessa

    constante encontram-se, segundo Kalecki (1954) as inovaes, as pequenas oscilaes da

    taxa de juros de longo prazo e os rendimentos das aes, por exemplo.

    Substituindo (1.8) em (1.7) obtm-se:

    F+ = +

    + (1.9)

  • 25

    A equao (1.9) mostra que o investimento funo da poupana acumulada pela

    empresa, da relao da taxa de lucro e o montante investido e o termo aleatrio d.

    sempre bom ressaltar que a presena de um termo referente poupana, S, no

    afirma que a poupana seja determinante do investimento. O termo S, aparece mais como

    restrio do que como determinante do investimento, atribuindo ao modelo noes de

    risco (endividamento) contratao de novos emprstimos. Como demonstrado nos

    captulos iniciais de Kalecki (1954) o investimento que gera renda e a renda no

    consumida recebe o nome de poupana.

    1.2.1 Consideraes sobre Keynes e Kalecki

    Keynes e Kalecki tm em comum a teoria da determinao da renda nacional com

    base na demanda efetiva e impulsionada pelo investimento. Tanto para Keynes (1936)

    quanto para Kalecki (1954) a poupana no financia o investimento, pelo contrrio, por

    ser um fluxo de rendimentos, ela determinada por ele. O que financia o investimento

    o crdito.

    Para Kalecki o investimento depende da relao dos lucros com o estoque de

    capital e o montante de capital prprio da empresa (que a permite acesso ao crdito). Ao

    contrrio de Keynes, a rentabilidade do investimento no um conceito marginal

    derivado dos fluxos de caixas futuros descontados a uma determinada taxa, mas uma

    proporo mdia da taxa de lucro atual projetada para o futuro (ponto em que se pode

    considerar a incluso de forma indireta das expectativas). Para Keynes o investimento

    dependente da Eficincia Marginal do Capital e da Taxa de Juros Corrente. As

    expectativas formam o estado de confiana do empresrio que, diante das incertezas

    quanto ao futuro, define sua preferncia pela liquidez e decide na composio do seu

    portfolio pela incluso de ativos menos lquidos (NUTI, 2004).

    Ambas as teorias tm contribuies singulares ou compartilhadas entre si que

    foram fundamentais para o avano da cincia econmica, em especial da macroeconomia.

    Ainda que a teoria do investimento de Kalecki no seja to completa quanto a de Keynes,

    devido a abrangncia desse ltimo dos temas monetrios e financeiros, Kalecki merece o

  • 26

    mrito por ter formulado sua teoria diretamente voltada para seus efeitos dinmicos.

    Keynes muitas vezes criticado pela dificuldade de se desvencilhar da anlise esttica e

    da busca pelo equilbrio. J a principal crtica ao modelo de Kalecki refere-se ausncia

    de tratamento mais contundente sobre a taxa de juros e a formao de expectativas de

    longo prazo. As teorias de maneira alguma se sobrepem, mas, pelo contrrio, se

    completam (POSSAS, 1999).

    1.3 O Modelo do Acelerador do Investimento

    Para Herscovici (2006, p. 30) Harrod tentou construir um modelo dinmico a

    partir dos elementos estticos da Teoria Geral de Keynes. Sendo o modelo de Harrod

    um modelo keynesiano, o equilbrio automtico e necessrio da economia atravs dos

    mecanismos de mercado no garantido.

    O modelo estabelece o investimento, I, como uma relao linear da variao do

    produto nacional, Y. O investimento, tambm compreendido como a variao no estoque

    de capital (K), a varivel de fluxo resposta ao desvio do estoque de capital desejado

    (K*). O estoque de capital desejado depende do nvel do produto, sendo que elevadas

    taxas de crescimento fazem com que as firmas desejem ampliar seus estoques de capital

    (KAMMLER e ALVES, 2005; HERSCOVICI, 2006; ALVES e LUPORINI, 2010;

    BRITO, 2010; GONZALES, 2014).

    Assumindo que o estoque de capital desejado da economia (K*) tem uma relao

    estvel () com o nvel de produto (Y), tem-se que:

    K* = Y (1.10)

    Nesse caso, em (1.10) representa a razo capital/produto (K/Y) desejada. Essa

    razo supostamente constante. Para cada variao de uma unidade monetria do produto

    ter-se- uma variao de unidades monetrias no investimento a fim de manter a

    estabilidade da relao.

  • 27

    O modelo do acelerador do investimento pressupe que a variao no produto

    interfere no montante desejado de estoque de capital, assim, o modelo pode ser

    representado conforme segue:

    I = K*t+1 Kt = Yt+1 Yt = (Yt+1 Yt) = Y (1.11)

    Desse modo:

    I = K = Y (1.12)

    Este modelo em conjunto com a hiptese do efeito multiplicador implica que um

    choque no crescimento do produto causaria uma alterao nos investimentos com efeitos

    multiplicadores sobre o nvel do produto de equilbrio (BRESSER-PEREIRA, 1975, p.

    12).

    Quando h um crescimento no produto a reduo na diferena observada entre o

    estoque desejado e o efetivo implica na realizao de investimento. Uma extenso do

    modelo procura considerar que existe uma defasagem no ajuste do estoque de capital ao

    seu nvel desejado. A insero de variveis defasadas alm da varivel renda no modelo

    original criou o Modelo de Acelerador Flexvel. Segundo esse novo modelo:

    K Kt-1 = I = (K* Kt-1) (1.13)

    Tal que 0 < < 1, indica a velocidade de ajustamento do estoque de capital. O

    parmetro influenciado por disponibilidade de crdito, taxa de juros, polticas

    tributrias, etc. A equao de investimento obtida dada por:

    I = [Y Kt-1] (1.14)

    Comparando (1.14) com (1.11) nota-se que o modelo do acelerador simples alm

    da relao (K/Y) constante, tambm pressupe um ajustamento instantneo, tal que = 1,

    tornando o modelo mais voltil no curto prazo do que o modelo representado por (1.14).

    As principais crticas feitas ao modelo so as que ele no considera a existncia

    de capacidade produtiva ociosa o que inibiria o aumento dos investimentos mediante

    aumento do produto; uso reduzido de variveis explicativas e a no distino entre

    mudanas transitrias ou permanentes na produo (JACINTO, 1997). H carncia de

    variveis que representem os fatores que afetam a deciso de investimento, destacados,

  • 28

    por exemplo, o custo de aquisio do capital e as expectativas sobre sua rentabilidade

    futura das aquisies realizadas.

    Os economistas neoclssicos criticaram o modelo de Harrod-Domar, pois

    acreditam que os mecanismos de preos fariam a economia tender automaticamente

    condio de equilbrio. Isso faz com que a hiptese de relao constante entre

    capital/produto seja relaxada. A seguir ser apresentado o modelo desenvolvido por

    Solow que se aproxima da viso marshalliana de concorrncia perfeita em que se admite

    uma funo de produo com substituio plena de capital por trabalho ou vice-versa.

    1.4 O Modelo de Investimento Neoclssico

    A Teoria de Solow a melhor forma de descrever a relao neoclssica entre o

    investimento e o crescimento econmico, tratando do equilbrio existente no longo prazo.

    Um de seus objetivos fundamentais demonstrar que uma economia de mercado pode

    crescer no longo prazo de forma permanente, sustentada, e exibindo uma trajetria

    relativamente estvel, inclusive sem interveno direta do governo.

    Entretanto a teoria clssica no apresenta um modelo independente para

    investimento. Uma vez definida a funo consumo obtm-se diretamente a funo

    investimento. Isto , todo rendimento que no consumido poupado (por definio), e

    todo rendimento poupado automaticamente canalizado para investimento, de acordo

    com a hiptese imposta pelo prprio modelo (MENDES e VALE, 2001).

    O modelo de Solow desenvolvido sob seis hipteses sintetizadas por Mendes e

    Vale (2001, p. 2), da seguinte forma:

    (H1) Em relao aos fatores de produo acumulveis ao longo do tempo

    (capital, K; e trabalho, L) eles apresentam rendimento constante escala. O

    trabalho pode ser medido em termos de eficincia (E), com E = AL; A o nvel

    de conhecimento tecnolgico;

    (H2) Os fatores de produo apresentam rendimentos marginais decrescentes;

  • 29

    (H3) A fora de trabalho (L) cresce a uma taxa constante, positiva e exgena;

    (H4) O conhecimento tecnolgico (A) cresce tambm a uma taxa constante,

    positiva, exgena. Este fator tido como um bem pblico, ou seja, disponvel

    em todo o mundo livre de custos ou barreiras de acesso.

    (H5) A taxa de poupana constante, positiva e exgena (0 < s < 1)

    (H6) Os fatores de produo so remunerados a partir de suas respectivas

    produtividades marginais.

    O modelo de Solow parte de uma funo de produo baseado numa economia

    que produz um nico bem homogneo a partir de trs fatores de produo: Capital Fsico

    (K), Trabalho (L) e um termo relativo tecnologia disponvel (A) que acompanha o fator

    trabalho. Tem-se ento que a produo, Q da economia no momento t dada por:

    Qt = F (Kt, AtLt) (1.15)

    Devido a existncia dos rendimentos marginais decrescentes dos fatores

    assumido as condies que:

    FK > 0, FK < 0, FAL > 0 e FAL < 0

    O aumento produtivo sucedido do acrscimo dos fatores expresso pela primeira

    derivada e positivo. E o fato dos aumentos serem cada vez menores conforme os fatores

    aumentam definido pela segunda derivada com sinal negativo. Assim, a produo cresce

    conforme aumentam-se os fatores envolvidos, porm aumenta a taxas decrescentes.

    A fim de se poder fazer comparaes entre economias de diferentes pases se faz

    necessrio deixar de trabalhar com (1.15) em termos absolutos e trabalhar com termos

    relativos. Nesse sentido, divide-se ambos os lados de (1.15) por AL. Obtm-se dessa

    forma o estoque de capital e produo por trabalhador efetivo. Assim:

    qt = f (kt, 1) (1.16)

    Tal que: =

    e =

  • 30

    Como a constante 1 no varia ao longo do tempo pode-se reescrever a funo

    como:

    qt = f (kt) (1.17)

    A equao (1.17) fornece a produo por trabalhador efetivo obtida devido ao

    montante de capital por trabalhador da economia. Derivando a referida equao em

    funo de k encontrar-se- o produto marginal do capital por unidade de trabalho. Essa

    medida fornece o quanto o produto marginal por trabalhador varia quando realizado o

    investimento em uma unidade extra de capital por trabalhador.

    A produo (Qt) desta economia se divide em duas partes: uma o consumo (Ct)

    e a parte no consumida denomina-se poupana, (St). Assim:

    Qt = Ct + St (1.18)

    Qt Ct = St (1.19)

    Uma das hipteses fundamentais dos modelos clssicos que toda poupana

    convertida automaticamente, independente do comportamento das demais variveis

    econmicas, em investimento. Como mencionado, no modelo de Solow no h uma

    equao independente para a determinao do investimento. Uma vez determinada a

    funo consumo, atravs da equao de produo (1.19) deduz-se, considerando uma

    economia fechada e sem governo, a seguinte equao:

    It = St (1.20)

    Portanto, substituindo em (1.18)

    Qt = Ct + It (1.21)

    Se b denotar a propenso marginal a consumir e s a propenso marginal a poupar,

    e sendo 0 < b < 1 e b + s = 1, a funo de consumo dada por:

    Ct = bQt = (1 s)Qt (1.22)

    A funo investimento do modelo encontrada quando se substitui (1.22) em

    (1.21), obtendo assim:

  • 31

    It = sQt (1.23)

    Percebe-se que o investimento , portanto, proporcional ao produto da economia,

    sendo sua parcela determinada pela taxa de poupana, s.

    Para os clssicos, quanto maior a renda e quanto maior a parcela destinada

    poupana, maior ser o investimento e mais prspera e produtiva ser a economia.

    1.5 A Teoria q de Tobin

    A teoria desenvolvida por Tobin (1969) sobre a deciso de investir se baseia na

    relao entre o valor de mercado da empresa e o custo de reposio dos seus ativos.

    O custo de reposio refere-se ao desembolso monetrio necessrio para a firma

    adquirir uma unidade extra de unidade produtiva com a mais moderna tecnologia

    disponvel e ao menor custo possvel. E, sobre o valor mdio da empresa, Santos et al.

    (2011) destacam que so diversas as proxies utilizadas para esta varivel, sendo a mais

    comum, o valor mdio das aes daquelas empresas que possuem capital negociado em

    bolsas de valores.

    A teoria afirma que se o valor de mercado da empresa for maior que o custo de

    reposio do capital, a empresa deve realizar o investimento, caso contrrio no. A letra

    escolhida para representar essa relao o q, assim:

    =Valor Mdio de Mercado da Empresa

    Custo de Reposio do Capital (1.24)

    Analisando os valores de q, se q > 1, a empresa deve investir, pois o mercado

    atribui ao capital da empresa um valor maior do que o seu custo de reposio. E caso q <

    1 a empresa deve declinar da deciso de investir, pois o valor atribudo pelo mercado ao

    capital da firma inferior ao custo de reposio do capital.

    Diversos fatores podem impactar ao valor mdio de mercado das empresas, dentre

    eles o aumento da renda ou a queda da taxa de juros, ambos os movimentos aumentariam

  • 32

    a demanda por aes das empresas ampliando seu valor de mercado e estimulando novos

    investimentos (da firma, do setor e da economia como um todo).

    Consideraes Finais

    Numa tentativa de sintetizar as teorias apresentadas nessa seo alguns

    semelhanas e diferenas podem ser destacadas.

    De Keynes a Tobin, com exceo dos clssicos que refutam o uso da poltica

    monetria e Kalecki que no a desenvolveu ou abordou contundentemente, o uso de uma

    poltica monetria ativa pode expandir os investimentos ao aumentar a liquidez no

    mercado. Isso por que a maior oferta de moeda diminui a taxa de juros, aumentando a

    atratividade de alguns projetos de investimentos outrora inviveis ou, na viso de Tobin,

    aumenta a procura por aes das empresas, elevando seus valores de mercado e

    ampliando a diferena deste e o custo de reposio do capital.

    A taxa de retorno do mercado tambm fundamental para a deciso de investir.

    A expectativa quanto a retornos positivos no futuro motiva os empresrios a optarem por

    aquisio de ativos produtivos no presente. Nesse sentido, no s a taxa de lucro (como

    destacado em Kalecki), como tambm o mercado em expanso (ampliao da

    renda/produto) fornece aos empresrios um estado de confiana otimista para a realizao

    de investimentos. Tanto no modelo do acelerador como o modelo neoclssico a renda tem

    papel fundamental, seja ao definir o montante de investimento necessrio para manter

    constante a relao capital/produto, seja para criar fundos emprestveis (poupana) que

    se acumularo na forma de capital produtivo.

    Diante destas consideraes a seo seguinte se destinar a um breve histrico

    sobre o processo de industrializao da economia brasileira com enfoque especial no

    perodo recente (ps Plano Real). O contexto discutido e os dados apresentados ajudaro

    a responder seguinte pergunta: como que determinadas variveis econmicas

    (selecionadas a partir dos apontamentos tericos) impactaram no total investido pela

    indstria de transformao nos ltimos anos?

  • 2. ECONOMIA BRASILEIRA E A INDSTRIA DE TRANSFORMAO

    Introduo

    Mudanas internas, iniciadas em meados do sculo XIX, favoreceram a criao

    de um ambiente propcio para o desenvolvimento da indstria no Brasil. A mo de obra

    assalariada estava em expanso, estimulando o mercado de bens manufaturados, e a

    economia contava com certa infraestrutura de comunio e transporte, expandida no auge

    do perodo agroexportador. No princpio do sculo XX uma indstria incipiente j existia

    e buscava atender s necessidades bsicas de vesturio, alimentao e calados (bens de

    consumo), da tmida massa assalariada crescente (UNGER, 1977).

    De acordo com o Censo Industrial de 1920, Versiani e Suzigan (1990) destacam

    que 60% do Valor Adicionado na Indstria de Transformao era composto pelos setores

    Txtil e Produtores de Alimentos. Esse nmero atingia 70% se adicionados outros setores

    produtores de bens de consumo no durveis como Vesturio, Calados e Bebidas.

    No final da dcada de 20 algumas polticas que visassem estimular a indstria

    nascente foram tomadas, porm a industrializao de fato se inica aps os anos 30. E

    somente com o Plano de Metas do governo Kubitschek que vivesse a primeira

    experincia efetiva de planejamento do desenvolvimento industrial como elemento

    central de uma estratgia abrangente de desenvolvimento econmico (SUZIGAN, 1996,

    p. 8).

    A dcada de 1950 marca a primeira poltica indstrial2 no Brasil, com adoo

    simultnea de um abrangente conjunto de medidas e programas que direta ou

    indiretamente afetaram o setor industrial.

    22 O conceito de poltica industrial amplo e indefinido. Pode ser sintetizado como (...) um emprenho governamental em fomentar setores avaliados como importantes para o crescimento econmico do pas (CORONEL et al., 2014, 104). Como tambm (...) consideram-se como parte de uma poltica (ou estratgia) industrual os seguintes elementos: planejamento geral indicativo, formalizao de diretrizes e

    objetivos, organizao institucional especfica, articulao com a poltica macroeconmica, targeting de

    indstrias ou tecnologias especficas, instrumentos e polticas auxiliares (polticas de comrcio exterior,

    fincanciamento, polticas de fomento, polticas de regulao e competio), investimentos em infra-

    estrutura econmica e de cincia e tecnologia, sistema educacionale treinamento de mo-de-obra e

    formao de recursos humanos especializados (SUZIGAN, 1996, p. 6).

  • 34

    O incio da dcada de 1960 foi marcado por crise econmica, poltica e pela

    imposio do regime autoritrio. Os planos econmicos nacionais da poca (PAEG,

    principalmente) assumiram a caracterstica predominante de planos de estabilizao. De

    1968 a 1973, perodo conhecido como o milagre econmico brasileiro, o planejamento

    do desenvolvimento econmico volta a ter relevncia e passa, inclusive, a ser

    institucionalizado (nos Planos Nacionais de Desenvolvimento PND). Nesse primeiro

    momento, Suzigan (1996) destaca que a influncia do Conselho Monetrio Nacional

    (CMN) fez com que a estratgia macroeconmica fosse priorizada em detrimento de um

    projeto de desenvolvimento industrial/tecnolgico.

    O II PND marca a retomada das metas setoriais e a segunda experincia

    coordenada de investimentos pblicos e privados na indstria e na infra-estrutura

    brasileira.

    (...) desde os anos 30 alguns setores ou indstrias foram objeto de aes

    especficas visando seu desenvolvimento. Em linhas gerais, as metas

    nos anos 30 e 40 eram indstrias produtoras de insumos bsicos

    (siderurgia, papel e celulose , minrio de ferro, lcalis); a partir dos anos

    50 passam a incluir tambm as indstrias qumica pesada, mecnica e

    eltrica pesada, material de transporte e construo naval. (...)

    Posteriormente, aps um perodo de abandono de objetivos setoriais,

    voltou-se nos anos 70 a estabelecer metas setoriais, particularmente

    durante o II PND, que ampliou o leque de setores para incluir outras

    indstrias produtoras de insumos bsicos (petroqupimica, metais no-

    ferrosos), bens de capital e indstrias de tecnologia avanada

    (telecomunicaes, aeronaves, armamentos, energia nuclear,

    informtica) (SUZIGAN, 1996, p. 9).

    Um imenso aparato de proteo indstria foi estabelecido para a construo dos

    incentivos necessrios para proteger e estimular investimentos. Manipulao da taxa de

    cmbio, tarifas aduaneiras, emisses de guias de importao e outras diversas barreiras

    tarifrias e no tarifrias garantiram o ambiente favorvel ao processo de industrializao

    brasileiro.

    O protecionismo excessivo cobrou sua fatura. As polticas industriais implantadas

    at as dcadas de 1970 e 1980 tinham como objetivo expandir a produo interna via

    restrio s importes. Essa poltica acomodou a indstria num ambiente de baixa

    concorrncia, baixa produtividade e padres tecnolgicos relativamente atrasados. A alta

    relao capital/trabalho dos setores estimulados e a elevada dependncia cientfica-

    tecnolgica fizeram com que, conforme a produo desses setores se expandissem,

  • 35

    ampliassem-se as necessidades de importaes de bens intermedirios e de capital. O final

    do processo culminou no colapso do balano de pagamentos, uma grave situao relativa

    concentrao de renda, inflao e crise fiscal do Estado (UNGER, 1977; CORONEL et

    al., 2014).

    O agravamento do processo inflcionrio e o desequilbrio do setor

    externo da economia recolocaram em primeiro plano o ajuste

    macroeconmico e a estabilizao da economia, afastando da agenda

    poltica e de poltica econmica, pelo resto da dcada, as preocupaes

    com o longo prazo (SUZIGAN, 1996, p. 15).

    A sucesso de planos econmicos implantados a fim de conter a inflao s obteve

    sucesso com o plano Real, em 1994. Principalmente a partir desse perodo, as taxas anuais

    de investimentos tm se mantido abaixo de 20% do PIB. Este fato apontado como uma

    das causas do crescimento fraco e no sustentvel da economia brasileira (BONELLI,

    2010).

    A primeira seo deste trabalho se encarregou de abordar os determinantes

    tericos do investimento. O objetivo desta segunda seo apresentar os investimentos

    setoriais da indstria de transformao e analisar como que determinadas variveis

    evoluram no passado recente e estvel da economia brasileira, e mais adiante entender a

    relao entre essas variveis e as taxas de investimento.

    O processo de industrializao do Brasil pode ser dividido em dois perodos. O

    primeiro perodo marcado pela fase de expanso da indstria de transformao que parte

    de aproximadamente 12% do PIB, em 1947, at atingir seu maior patamar, 21,6%, em

    1985. Esse perodo compreendido pelas sucessivas polticas industriais relacionas ao

    processo de ISI orientado pela grande presena do Estado.

    No segundo perodo, com incio em 1986, observa-se uma expressiva perda de

    participao da indstria na produo agregada do pas. Como pode ser notado na Figura

    2.1, apesar de momentos de recuperao, no ano de 2014 a participao da indstria de

    transformao sobre o PIB retorna ao nvel de 1949, 10,9%. Esse segundo perodo,

    compreende, por sua vez, um perodo em que as relaes mundiais de produo e

    comrcio foram amplamente abaladas pelo processo de globalizao.

  • 36

    Figura 2.1: Participao da Indstria de Transformao no PIB, em %

    Fonte: FIESP (2015).

    A participao da indstria de transformao no PIB, que j superou 20% h trs

    dcadas, representa hoje metade dessa participao. Em 2014 a participao da indstria

    de transformao no PIB foi de 10,9%, contra 17,9%, em 2004. O declnio do setor

    industrial brasileiro preocupante.

    Em 2004 o PIB cresceu 5,7% e a indstria de transformao 8,5%. Dez anos

    depois, em 2014, o PIB cresceu mseros 0,1% em comparao com 2013. A indstria

    recuou 1,2% como um todo, e o destaque negativo foi a indstria de transformao que

    puxou o desempenho do setor para baixo e amargou uma queda de 3,8%. A perda em 10

    anos de 7 pontos percentuais da participao da indstria brasileira no PIB, representa um

    grave e acelerado processo de desindustrializao.

    O que tem restringido o avano da indstria de transformao nos ltimos anos?

    Como as mudanas econmicas tm definido as opes de investimento pelos

    empresrios? Todos os setores esto reagindo igualmente s mudanas econmicas?

    Evidentemente, para responder a estas perguntas as anlises de um banco de dados

    que retratam um longo perodo histrico seriam preferveis aos bancos de dados menores.

    Enquanto os ltimos ampliam os impactos de oscilaes no curto prazo, o primeiro mostra

    mais claramente as tendncias de longo prazo das sries analisadas.

  • 37

    Porm, no Brasil, sries histricas de pesquisas contnuas se limitam a um nmero

    reduzido de variveis. Estudos econmicos recentes, principalmente ligados indstria,

    geralmente focam trs perodos marcante da economia brasileira. O ps-1990 ano que

    marca a entrega do pas s ordens neoliberais orquestradas pelo FMI, num processo de

    desmonte do Estado e do aparato de proteo indstria. O ps-1994, ano em que a ltima

    moeda, o Real, foi adotada. E, por fim, o ps-1999, ano que o Brasil adota o Regime de

    Metas de Inflao em lugar do sistema de ncora cambial, e a taxa de cmbio passa a ser

    flutuante. Perodos anteriores a estes referem-se diferentes estruturas de concorrncia,

    preos e produo. na primeira dcada de 1990 que se assiste a ruptura definitiva entre

    o processo de industrializao por substituio de importaes e a entrada do Brasil como

    player na grande cadeia produtiva global que se formava.

    A Pesquisa Industrial Anual (PIA), desenvolvida pelo Instituto Brasileiro de

    Geografia e Estatstica (IBGE), base desse trabalho, coleta e publica dados sobre a

    indstria, anualmente, desde 1996. De 1996 a 2006 o IBGE adotou uma classificao para

    as atividades e setores da economia chamada de Classificao Nacional das Atividades

    Econmicas (CNAE 1.0). A partir de 2007 a PIA seguiu uma segunda classificao, a

    CNAE 2.0.

    Com a Tabela de Converso disponibilizada pelo IBGE e um grande esforo na

    compatibilizao dos dados, o perodo de anlise deste trabalho se estende de 1996 a 2012

    (ltimo ano divulgado da PIA).

    O problema de pesquisa : Como a evoluo de determinadas variveis

    econmicas, tais como taxa de cmbio, taxa de juros e outras, impactaram na deciso de

    investir dos setores industriais brasileiros no perodo de 1996 a 2012?

    O enfoque setorial importante devido as diferenas produtivas e comerciais entre

    os setores. Alguns setores contam com macia participao de empresas estatais (como o

    setor de petrleo e a Petrobrs) enquanto outros setores so majoritariamente compostos

    por empresas privadas. Ainda dentre os setores existem os formados por empresas

    pequenas, mdias ou grandes ou uma mistura com a coexistncia de empresas de

    diferentes escalas.

    Setores que demandam elevada quantidade de insumos importados em sua

    produo podem ver seus lucros se exaurindo devido ao aumento dos custos provocados

  • 38

    pela desvalorizao cambial. J setores que tm parte significativa de suas receitas

    provindas do exterior reforaro seus caixas com receitas cambiais extras no caso de

    enfraquecimento da moeda local. Por fim, os setores tambm podero ter incremento em

    seus caixas caso o novo patamar cambial implique em alteraes das condies de

    concorrncia e permita um aumento dos preos internos. Uma desvalorizao cambial

    encarece os produtos importados promovendo a proteo do mercado domstico para os

    produtores locais.

    Variveis como o cmbio, os juros e a lucratividade impactam de maneira distinta

    a deciso de investir dos diversos setores. As diferenas nas estruturas produtivas e

    comerciais no podem ser negligenciadas. A anlise setorial da indstria de

    transformao se faz prefervel aos estudos que se dedicam a explicar o investimento em

    sua forma agregada e ignoram tais diferenas.

    Este estudo se diferencia de duas maneiras dos demais relacionados ao

    investimento. Primeiramente, a anlise feita sob a tica setorial, obtendo ganhos na

    explorao das peculiaridades setoriais. Em segundo lugar, a pesquisa se distingue pelo

    horizonte temporal, de 1996 a 2012. A maioria dos trabalhos setoriais analisam os

    perodos de 1996 a 2006 e/ou 2007 a 2012 devido dificuldade para se converter o grande

    nmero de dados disponveis na PIA.

    Esta pesquisa de fundamental importncia, pois ajudar a entender quais, como

    e quanto determinadas variveis impactaram, ainda que parcialmente, nas decises de

    investir. No futuro, este trabalho poder subsidiar e auxiliar no desenvolvimento de

    polticas de crescimento pr-indstria, que considerem, inclusive, as disparidades

    setoriais.

    O prximo tpico se encarregar de apresentar a evoluo recente da economia

    brasileira e os dados relativos aos investimentos setoriais. Como visto, mudanas na

    conjuntura macro e microeconmicas, provindas da abertura econmica (1990), da

    implantao do plano Real (1994) e da adoo do cmbio flutuante (1999) inibem ou

    dificultam anlises de perodos muito anteriores a estes.

  • 39

    2.1 Economia Brasileira Recente

    O horizonte temporal de anlise desta pesquisa compreende os anos de 1996 a

    2012. Inicia-se, portanto, dois anos aps a implantao do Plano Real, num sistema de

    taxa de cmbio semifixa e supervalorizada (utilizada como ncora cambial para controle

    dos preos) e taxa de juros elevadas, que tinha por propsito atrair capitais estrangeiros

    (e saldar os dficits crescentes em transaes correntes), alm de mitigar qualquer

    tentativa de descontrole inflacionrio.

    O PIB de 1996 e 1997 apresentou elevadas taxas de crescimento motivadas pelo

    aumento do poder de compra conferido demanda interna via estabilizao dos preos.

    Porm, em 1997, a fase de recuperao do crescimento econmico foi abortada por

    medidas restritivas do governo frente crise asitica eclodida em julho.

    O impacto dessas medidas foi sentido quase que imediatamente nos

    investimentos. A partir do ltimo trimestre de 1997 observou-se uma

    contrao nas taxas de crescimento da FBKF, e da por diante o cenrio

    tornou-se mais crtico ainda com a sequncia de taxas negativas

    apresentadas por essa varivel durante o 2, 3 e 4 trimestres de 1998 e

    por todo o ano de 1999, recuperando-se apenas no comeo de 2000

    (RIBEIRO E JUNIOR, 2005, p. 87-88).

    Este cenrio recessivo dos investimentos foi agravado em 1998 pelas polticas

    restritivas (taxa de juros) que buscaram atenuar o pnico e a fuga de capitais decorrente

    da crise Russa. Conforme pode ser verificado pelo grfico 2.1, o crescimento do PIB em

    1998 e 1999 foi quase nulo, de apenas 0,4% e 0,5%, respectivamente.

    Em 1999, com o temor de perda de reservas, e com sucessivos ataques

    especulativos abandonado o regime de ncora cambial vigente desde 1995 e adotado

    o regime de cmbio flutuante. A taxa de cmbio nominal foi submetida a uma presso de

    alta e, para se evitar a volta da inflao, ocorreu a elevao das taxas de juros e adotou-

    se medidas de conteno fiscal (POHLMANN e TRICHES, 2008).

    A desvalorizao cambial deu novo nimo aos investidores. O setor exportador

    revitalizou sua competitividade internacional enquanto os setores voltados para o

  • 40

    mercado interno viram a concorrncia com bens importados diminuir, criando, assim, um

    cenrio otimista que se refletiu na taxa de crescimento de 2000.

    Grfico 2.1. Taxa de crescimento do PIB

    Fonte: Elaborao Prpria. IBGE.

    Se no bastassem as sucessivas crises financeiras internacionais no primeiro

    mandato, o presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC), no segundo mandato,

    enfrentou a crise Argentina, os atentados de 11 de setembro (que resfriou a economia

    americana) e a crise energtica no Brasil, que colocou em dvida a capacidade de

    manuteno no fornecimento de energia eltrica para produo e consumo residencial

    durante o ano de 2001.

    O capital financeiro internacional manifestou seu desagrado opo feita pela

    maioria dos brasileiros em 2002. Sob o risco da iminente vitria de Luiz Incio Lula da

    Silva, candidato da esquerda presidncia da repblica, a taxa de cmbio disparou, como

    pode ser verificado no grfico 2.2. O efeito na taxa de cmbio, dos juros e do risco Brasil

    ficou conhecido como efeito Lula e representa a averso dos investidores estrangeiros

    vitria da frente progressista no pas (COUTO E COUTO, 2010).

    Lula passa o primeiro mandato com relativa estabilidade internacional. V,

    durante seus mandatos (2003 a 2006 e 2007 a 2010), a elevao dos preos das

    commodities que amplia as exportaes brasileiras conferindo maior conforto nas

    2,2%

    3,4%

    0,4% 0,5%

    4,4%

    1,3%

    3,1%

    1,2%

    5,7%

    3,1%

    4,0%

    6,0%

    5,0%

    -0,2%

    7,6%

    3,9%

    1,8%

    -1,00%

    0,00%

    1,00%

    2,00%

    3,00%

    4,00%

    5,00%

    6,00%

    7,00%

    8,00%

    1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

    PIB Real

  • 41

    restries externas. E internamente v o aumento do mercado consumidor provocado pelo

    aumento real da renda, queda contnua da taxa de desemprego e forte expanso do crdito.

    Esse perodo marcado pela recuperao dos indicadores financeiros, fiscais e de risco

    do Brasil (TEIXEIRA E PINTO, 2012).

    Grfico 2.2. Taxa de Cmbio Nominal (R$/US$)

    Fonte: Elaborao Prpria. Taxa de Cmbio Comercial, compra, mdia. Banco Central do Brasil

    A recuperao em 2004 faz com que a ala mais conservadora da poltica

    econmica, receosa com a volta da inflao, optasse pelo uso de polticas restritivas que

    estabelecessem a taxa de crescimento prxima a uma taxa natural, que no envolvesse

    presso sobre os preos. O movimento contracionista visivelmente verificado no ano de

    2005 do grfico 2.3 que mostra a elevao da taxa de juros e tambm pelo grfico 2.1

    onde o vigoroso crescimento de 5,7% em 2004 abortado e em 2005 apresenta um

    aumento de 3,1%.

    Quando observamos o crescimento econmico dos anos 2000, notamos

    claramente que at (e incluindo) o ano de 2003 as taxas de crescimento

    eram muito baixas, e logo depois elas comearam a crescer.

    Inicialmente, a expanso foi liderada pelo boom de exportaes e as

    taxas de crescimento do PIB no aumentaram tanto, mas a partir de

    2006 o crescimento das exportaes perde influncia e o mercado

    interno comea a crescer mais rpido, devido a uma poltica

    macroeconmica mais expansionista (SERRANO E SUMMA, p. 10,

    2011).

    1,00 1,08 1,16

    1,81 1,83

    2,35

    2,92 3,08

    2,93

    2,43

    2,18 1,95

    1,83 2,00

    1,76 1,67

    1,95

    -

    0,500

    1,000

    1,500

    2,000

    2,500

    3,000

    3,500

    1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

    Taxa de Cmbio

  • 42

    A reduo progressiva das metas de supervit primrio abriu espao no oramento

    para uma recuperao (inicialmente modesta) do investimento pelo governo e pelas

    empresas estatais (sobretudo a Petrobrs) aps 2007.

    Grfico 2.3. Taxas de Juros no Brasil: Selic.

    Fonte: Elaborao Prpria, a partir das Sries Histricas do Banco Central do Brasil.

    No cenrio internacional Lula observou a consolidao da China como provedora

    de bens industriais para o mundo e importante parceiro comercial para o Brasil. Observou

    tambm a crise financeira e seus impactos sobre a distribuio de foras econmicas e

    polticas entre economias avanadas e emergentes.

    Apesar da crise financeira internacional no ano de 2008, os efeitos na economia

    brasileira foram relativamente tnues, queda no PIB em 2009 de 0,2% e expanso de 7,6%

    j em 2010. Isso resulta em uma mdia de crescimento do PIB de 4,1% no perodo 2003-

    2010, quase o dobro dos 2,2% de mdia para o perodo 1996-2002.

    Especialmente a partir 1999 a taxa de cmbio nominal apresenta uma tendncia

    de desvalorizao, como mostrado no grfico 2.2, que se segue at 2003. A partir de ento

    uma reverso, com apreciao quase contnua at 2011, sendo interrompida, nos anos de

    2009 e 2012, observada.

    24,4%

    22,8%24,3%

    24,8%

    17,6%

    17,5%

    19,2%

    23,5%

    16,4%

    19,1%

    15,3%

    12,0%

    12,5%

    10,1%

    9,9%

    11,8%

    8,6%

    0,00%

    5,00%

    10,00%

    15,00%

    20,00%

    25,00%

    30,00%

    1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

    SELIC

  • 43

    A taxa de juros tem apresentado uma tendncia de queda desde o efeito Lula em

    2003. Com os j mencionados momentos de elevao, a taxa de juros apresenta, em 2012,

    a menor mdia diria desde o incio da srie em 1996.

    Sobre as taxas de investimento, a indstria de transformao apresentou

    comportamento semelhante ao do PIB. No movimento conhecido como stop and go a

    taxa de crescimento da indstria de transformao tem apresentado taxas de crescimento

    elevadas e moderadas intercaladas entre os anos da anlise. Como o grfico 2.5 permite

    visualizar os anos cujas taxas de crescimento da indstria de transformao foram

    melhores so: 2000, 2004, 2007 e 2010. Todos os anos com crescimento robusto da

    indstria refletiram em crescimento robusto do PIB, reforando a relao da indstria com

    o crescimento econmico.

    Tambm possvel verificar uma relao inversa entre a taxa de juros e as

    variaes nos investimentos. Nesses mesmo anos citados visualiza-se pontos de mnimos

    da taxa bsica de juros, demonstrando que nos anos em que a Taxa Selic esteve em queda

    os investimentos mostraram tendncia positiva.

    Grfico 2.5. Taxa de crescimento da Indstria de Transformao

    Fonte: Elaborao Prpria. IBGE.

    Nos anos de 2010, 2011 e 2012 o crescimento foi sustentado parte pelos

    investimentos realizados na indstria de bens de consumo, voltada para a expanso do

    0,1%

    2,5%

    -4,8%

    -1,9%

    5,7%

    0,7%

    2,4% 1,9%

    8,5%

    1,3% 1,0%

    5,6%

    3,0%

    -8,7%

    10,1%

    0,1%

    -2,4%

    -10,00%

    -5,00%

    0,00%

    5,00%

    10,00%

    15,00%

    1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

    Indstria de Transformao

  • 44

    mercado domstico e parte pelos projetos de investimentos em infraestrutura e petrleo,

    atravs da estatal Petrobras, devido s melhores condies das finanas pblicas. As taxas

    de crescimento desses anos s no foram maiores devido s polticas restritivas de

    controle inflacionrio, exigidas, principalmente, pelos aumentos em energia e alimentos.

    O ano de 2011 marcado pela adoo de medidas restritivas ao crdito, elevao

    dos juros e conteno dos gastos do governo, esse movimento afetou a confiana da

    indstria e provocou a desacelerao econmica. Os resultados no foram piores devido

    ao desemprego baixo e os investimentos necessrios para recepo de eventos esportivos

    e o pr-sal.

    Com relao ao cmbio em 2011, as incertezas do mercado externo, com aumento

    da averso ao risco dos investidores estrangeiros, causaram desvalorizaes das moedas

    dos pases emergentes. O fim do programa de rolagem dos swaps cambiais pelo BACEN

    acentuou a desvalorizao da moeda brasileira, que situou-se num patamar mais elevado

    no ano de 2012.

    A fim de dar continuidade na pesquisa analisar-se- a forma como os

    investimentos setoriais da indstria de transformao evoluram nos ltimos anos e mais

    adiante ser investigado como que variaes das variveis econmicas impactaram na

    deciso de investir. Por hora se faz necessrio apresentar a forma como foram coletados

    e manipulados os dados relativos aos setores industriais.

    2.2 Metodologia para compatibilizar os dados da Indstria de Transformao

    A pesquisa relativa indstria no Brasil denominada Pesquisa Industrial Anual

    (PIA) e divulgada anualmente pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa e Geografia (IBGE)

    desde 1996. A PIA observa empresas industriais com 30 ou mais pessoas ocupadas e/ou

    que atingiram determinada receita bruta de vendas de produtos e servios industriais no

    ano anterior ao da pesquisa. As demais empresas, ainda que maior em nmero, pela baixa

    expressividade no agregado da atividade econmica, so objetos de seleo amostral

    (IBGE, 2012).

  • 45

    A fim de permitir que as estatsticas reflitam a estrutura produtiva do pas e sejam

    comparveis internacionalmente, as metodologias de diversas pesquisas sofrem revises

    de tempos em tempos. Se por um lado essas revises melhoram a qualidade da pesquisa

    ao torn-la mais atual e abrangente, por outro quebram sries de dados histricas

    inviabilizando, muitas vezes, as anlises de longo prazo.

    As atividades da PIA seguem a Classificao Nacional de Atividades Econmicas

    (CNAE) que apresenta duas metodologias. Uma relativa ao perodo de 1996 a 2006 e

    outra a partir de 2007.

    Desde 2007 a CNAE 2.0, como passou a ser chamada, estruturada

    hierarquicamente em 21 sees; a seo C referente Indstria de Transformao.

    Dentro desta seo tem-se 24 divises (Setores Industriais) e diversos agrupamentos com

    nvel mais elevados de detalhes relativos ao grupo e classe das atividades desenvolvidas.

    O exemplo da Tabela 2.1 mostra como as sees da CNAE so estruturadas.

    Tabela 2.1: Exemplo de Estrutura da CNAE 2.0

    Agrupamento Cdigo Descrio

    Seo C Indstria de Transformao

    Diviso 11 Fabricao de Bebidas

    Grupo 11.1 Fabricao de Bebidas Alcolicas

    Classe 11.11 Fabricao de Aguardente e Outras Bebidas Destiladas

    A CNAE 2.0 rediscutiu a classificao nacional para refletir com maior exatido

    a realidade da estrutura produtiva do Brasil ao mesmo tempo que buscou alinh-la aos

    mecanismos de classificao internacionais.

    Nas indstrias de transformao (seo C), novas divises foram

    criadas para representar segmentos que se destacam pelo dinamismo

    recente, tais como a diviso 21 Fabricao de produtos farmoqumicos

    e farmacuticos e a diviso 26 Fabricao de equipamentos de

    informtica, produtos eletrnicos e pticos. Esta ltima abrange as

    divises 30 (parte dos computadores), 32 (material eletrnico e de

    comunicao e 33 (aparelhos mdicos, de preciso e pticos) da verso

    1.0, de forma a torn-la uma melhor ferramenta para as estatsticas da

    produo de alta tecnologia. Outras novas divises, tais como a diviso

    11 Fabricao de bebidas e 31 Fabricao de mveis, resultaram de

    desmembramento de divises existentes previamente, elevando,

    portanto, seus componentes, que existiam no nvel de grupo na verso

    anterior, para o nvel de diviso.

    Ainda na seo C Indstrias de transformao, as atividades de

    reparao, manuteno e instalao de mquinas e equipamentos

    realizadas (...), passaram, na verso 2.0, a formar a nova diviso 33. .

  • 46

    A maior parte das demais divises na seo C Indstrias de

    transformao permaneceu sem alteraes, salvo pelo deslocamento,

    em parte substancial ou totalmente, de duas divises da verso 1.0, as

    divises 22 Edio, impresso e reproduo de gravaes e 37

    Reciclagem, para outras sees na CNAE 2.0 (seo J Informao e

    comunicao e seo E gua, esgoto, atividades de gesto de resduos

    e descontaminao, respectivamente) (IBGE, 2007, p. 35).

    Na CNAE 2.0, mesmo que o contedo das categorias da CNAE 1.0 tenham sido

    mantidos, todos os cdigos so novos. Com o auxlio da Tabela de Correspondncia entre

    as duas verses fornecida pelo IBGE, boa parte dos dados da PIA referente ao perodo de

    1996 a 2006 pode ser convertida para a CNAE 2.0.

    Em pesquisas econmicas amostras coletadas por um perodo de tempo maior,

    muitas vezes fornecem maior robustez aos resultados. O processo de converso permite

    as pesquisas analisarem a totalidade do perodo de 1996 a 2012 (ltimo ano da PIA

    divulgado), com efeitos reduzidos da mudana de metodologia e significativos ganhos

    estatsticos.

    Ainda que o objetivo do trabalho seja analisar a indstria por seus setores (2

    dgitos), todo o processo para compatibilizar os dados da PIA foi realizado 4 dgitos

    (Atividades). As classes da Tabela de Converso podem ser divididas em duas categorias,

    a saber: O grupo de classes da CNAE 1.0 que passaram a ter uma nica referncia na

    CNAE 2.0 e o grupo das classes da CNAE 1.0 que se desmembraram ou se fundiram para

    formar uma nova classe na CNAE 2.0.

    O processo de converso pode ser descrito por trs etapas: Correspondncia 1x1;

    classes da mesma diviso; e sistema de propores.

    Cada uma dessas etapas ser melhor explorada a seguir:

    a) Correspondncia 1x1

    O primeiro passo do processo de compatibilizao foi a reclassificao do

    primeiro grupo de classes. As classes desse grupo recebiam um cdigo na CNAE 1.0 e

    passaram a receber um novo cdigo na CNAE 2.0 sem que as bases de referncia fossem

    alteradas.

  • 47

    Conforme verificado pela tabela 2.2, um grande nmero de classes pode ser

    reclassificado nessa etapa. Estas classes correspondem, aproximadamente, a 70% dos

    dados da CNAE 1.0.

    Tabela 2.2: Classes do processo de classificao 1x1.

    1.0 2.0 1.0 2.0 1.0 2.0 1.0 2.0 1.0 2.0 1.0 2.0

    11.10 06