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Cidade

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  • Desvelando a cidade

    Ivnia Marques

    Mestranda em Educao no Laboratorio de estudos Audiovisuais (OLHO)

    da Faculdade de Educao da UNICAMP, Campinas, So Paulo

    [email protected]

    Desafiada pelas ideias de pensadores Deleuze e Guattari, Massey, Oliveira Jr.,

    Orlandi, Wunder, Larrosa me props a experienciar com os alunos do ensino mdio da

    escola pblica imagens com cmeras pinhole. Oportunizar um momento de fugir do

    cotidiano e do fascnio do tecnolgico e mergulhar em mquinas singulares, sem lentes,

    promovendo desfoques, pausa pela longa exposio e espera pela revelao. Um

    momento distante do instantneo de imagens que so compartilhadas, curtidas e com

    uma rapidez que impressiona. Rapidamente expe, interage, saturam, fragmentam e so

    deletadas sem pensarmos a respeito do visto e do no visto e que procuram eternizar

    momentos vividos. Aprisionar sentimentos, sensaes e desejos. Aprisionamentos por

    padres j estabelecidos e segundo Oliveira Jr (2006) j apontou esses padres de

    enquadramento visuais e elementos que nos remetem a uma opinio j pronta,

    inquestionvel. Proponho rizomas.

    Todo rizoma compreende linhas de segmentaridade segundo as quais ele

    estratificado, territorializado, organizado, significado, atribudo, etc.; mas

    compreende tambm linhas de desterritorializao pelas quais ele foge sem

    parar. H ruptura no rizoma cada vez que linhas segmentares explodem numa

    linha de fuga, mas a linha de fuga faz parte do rizoma (DELEUZE; GUATTARI,

    1995, p. 18).

    Essas linhas de fuga (DELEUZE; GUATTARI, 1995) desafiam verdades e

    novos sentidos surgem ao perceberem novas maneiras de fotografar esperando pelos

    imprevisveis e imagens transformadoras. Uma multiplicidade de linhas. Linhas de fuga

  • ou de desterritorializao. (DELEUZE; GUATTARI, 1995, p. 32). Um rizoma de

    mltiplas linhas. Fugindo do esperado, desmontando imaginrios e levantando risos.

    Devires. Novas trajetrias.

    Neste ensaio procuro compor dpticos de pensamentos e imagens dos alunos que

    estabeleam algum tipo de relao. Os dpticos tambm so chamados de cones de

    viagem que neste caso prefiro cham-los de cones de pensamentos onde a combinao

    de pode ser feita pelas imagens, pensamentos e fragmentos da literatura que me

    acompanham nessa viagem.

    Desejo de oferecer oportunidades de pulverizao, de multiplicidade, de

    diferenciao, e a imagem como possibilidade de compreenses infinitas no e do

    espao em que se vive. Desejo de promover, com OLIVEIRA JR. (2009), um

    distanciamento e uma recusa das prticas que tornam os alunos refns de uma

    nica forma de imaginar o espao, aquela imaginada pelo estado, e eu

    acrescentaria: aquela das imagens prontas dos materiais didticos, que

    desconhecem as nossas comunidades e os locais onde (com)vivemos.

    (MARQUES, 2011).

  • Sensaes de pertencimento e vazios. Vazios cheios de sentidos e de silncios,

    mas o silncio que tem sua materialidade definida pela relao estabelecida entre dizer e

    no dizer. (Orlandi, 2008)

    Cmeras pinhole construdas artesanalmente e com imagens nebulosas que se

    contrape ao tecnolgico. As imagens criadas pelas cmeras so formadas pelo pequeno

    orifcio em filme. A impreciso, as distores, a profundidade de campo, as bordas no

    delineadas causam estranheza em observadores acostumados com as imagens digitais.

    Um tempo de exposio que pode durar alguns minutos e poucas imagens (ou nica

    quando feita pelo papel fotogrfico) tambm questionado pelos alunos.

    Vamos experienciar e ouvir

    os silncios das imagens.

    O que nos falam?

    Interrogam?

    Fabulam?

    Mesmo sendo um objeto produzido com a inteno de reter e aprisionar sentidos,

    a fotografia possui uma fora outra, efetua em sua superficialidade, em seu

    silncio, em dizeres balbuciantes, em tnues expresses e deixa um potente

    espao vazio para sentidos no determinados. (Wunder, 2008).

  • Um obturador que deva ser aberto e fechado depois de uns minutos. Uma

    imagem que se forma diferente do olhar atento dos alunos. Uma surpresa, um instante

    de pura expectativa. Uma pausa. Um vazio. Um vazio da espera pela imagem. Espera

    por impresses diferentes da viso realista e rpida das digitais. Espera de imagens,

    vazio e expectativas. Revelao!

    O que revela,

    v e desvela no papel?

    Ser que olhos viram?

    Para SONTAG (1993, p.176) novos desdobramentos e novas produes de

    imagens e realidades que e fundem e se modificam a partir de nossa percepo. Numa

    perspectiva transversal (MARQUES, MARQUES et alli 2010) compreendemos e

    permitimos diferentes caminhos e conexes em uma proliferao de ideias e mltiplas

    leituras de mundo.

  • Uma nova percepo esttica e do belo onde os erros, os borres, as

    imperfeies configuram o acaso da pinhole. Criao permitida, experimentada e

    vivenciada. Momento fotogrfico orgnico: livre do olhar, dos mecanismos e inteno.

    Que percorre caminhos diferentes de uma fotografia documental pensada at ento. Um

    convite ao pensamento.

    Um convite a enveredar por um

    pensamento que no busque

    preenchimentos, mas esvazie-se,

    silencie-se em paisagens planas e

    fragmentadas, a ceder ao desejo do

    desvelamento de um contedo

    escondido por detrs das formas. Entrar,

    simplesmente pela potncia de sua

    matria plana: justamente uma

    imagem. (PARASO, 2008).

    Nosso olhar, inclusive naquilo que

    evidente, muito menos livre do que

    pensamos. E isso porque no vemos

    tudo o que o constrange no prprio

    movimento que o torna possvel. Nosso

    olhar est constitudo por todos esses

    aparatos que nos fazem ver e ver de

    uma determinada maneira.

    (LARROSA, 1994, p. 83).

  • Essa poesia com a visualidade das imagens com pinhole podem ser tomadas

    como resistncia de imagens obvias e esperadas. As imagens da pinhole traz o acaso e

    nos remetem a uma nova cidade. Cidade desvelada.

    As geografias menores que lidam, burilam, fazem derivar o conceito de cidade

    para alm do pensamento habitual de serem estas formas geogrficas algo com

    movimento intenso, barulho incessante, alm de permanente e material em sua

    localizao no planeta e no mapa. (OLIVEIRA, 2010, p.172).

  • Bibliografia citada:

    ORLANDI, Eni P. Silncios: Presena e Ausncia . Revista Comcincia, n.101, 10 set.

    2008. http://www.comciencia.br/comciencia/?section=8&edicao=38&id=456 ,

    OLIVEIRA Jr., Machado W. Paisagens ao Fundo: Territrios No Mais Marginais na

    Fotografia e na Televiso in Imagens marginais, Bianca Freire Medeiros e Maria Helena

    Braga e Vaz da Costa (org.) Natal, RN: EDUFRN Editora da UFRN, 2006.

    _____. Apontamentos sobre a educao visual dos mapas: a (des)natureza da ideia de

    representao COLQUIO DE CARTOGRAFIA PARA CIANAS E ESCOLARES -

    Anais. Juiz de Fora: UFJF, 2009.

    _____. Vdeos, resistncias e geografias menores linguagens e maneiras de resistir.

    Revista Terra Livre. So Paulo. Volume 1, nmero 34. P. 161-76. Junho 2010.

    Disponvel em: http://www.agb.org.br/files/TL N34.pdf

    LARROSA, J. Tecnologias do eu e educao. In: SILVA, T. T. (Org.) O sujeito da

    educao: estudos foucaultianos. Petrpolis: Vozes, 1994, p. 35-86.

    MARQUES, D., MARQUES, I., SARRAIPA, L.., Por uma perspectiva transversal:

    conhecendo e produzindo o mundo em imagens, publicado na Revista ETD Educao

    Temtica Digital. Disponvel em: http://www.fae.unicamp.br/revista/index.php/etd/article/view/2122

    MARQUES, I. (no prelo). Imagear: o lugar, os viajantes e as imagens.

    MASSEY, Doreen. Pelo espao: uma nova poltica da espacialidade. (Trad. Hilda.

    Pareto Maciel; Rogrio Haesbaert) Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2008.

    PARAISO, Marlucy Alves. Imagens COMPOSIES CURRICULARES:

    CULTURAS E IMAGENS QUE FAZEMOS E QUE NOS FAZEM - ETD Educao

    Temtica Digital, Campinas, v.9, n. esp., p.108-125, out. 2008 ISSN: 1676-2592.

    SONTAG, S. Sobre fotografia. Traduo de Rubens Figueiredo. So Paulo: Arbor,

    1983.

    WUNDER, Alik . "A passagem de um vazio" em fotografias de escolas. Revista

    Comcincia, v. n. 101, p. 1-5, 2008.