desindustrialização precoce e sobrevalorização da taxa de cambio - marconi e rocha

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 1681 47 DESINDUSTRIALIZAÇÃO PRECOCE E SOBREVALORIZAÇÃO DA TAXA DE CÂMBIO Nelson Marconi Marcos Rocha

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  • 1681

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    DESINDUSTRIALIZAO PRECOCEE SOBREVALORIZAO DA TAXA DE CMBIO

    Nelson MarconiMarcos Rocha

  • TEXTO PARA DISCUSSO

    DESINDUSTRIALIZAO PRECOCE E SOBREVALORIZAO DA TAXA DE CMBIO*

    Nelson Marconi**Marcos Rocha***

    R i o d e J a n e i r o , d e z em b r o d e 2 0 1 1

    1 6 8 1

    * Este artigo produto do Projeto Regulao do Comrcio Global da Diretoria de Estudos e Relaes Econmicas e Polticas Internacionais (Dinte) do Ipea. Roberto Barbosa de Andrade Arago e Daniel Fejgelman contriburam decisivamente neste trabalho, auxiliando de forma muito competente no levantamento e elaborao de sries, tabelas e grficos. ** Professor da Escola de Economia de So Paulo da Fundao Getulio Vargas (EESP-FGV) e bolsista do Programa de Pesquisa para o Desenvolvimento Nacional (PNPD) do Ipea.*** Professor da PUC-SP, doutorando pela EESP-FGV e bolsista do PNPD/Ipea.

  • Governo Federal

    Secretaria de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica Ministro Wellington Moreira Franco

    Fundao pblica vinculada Secretaria de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica, o Ipea fornece suporte tcnico e institucional s aes governamentais possibilitando a formulao de inmeras polticas pblicas e programas de desenvolvimento brasileiro e disponibiliza, para a sociedade, pesquisas e estudos realizados por seus tcnicos.

    PresidenteMarcio Pochmann

    Diretor de Desenvolvimento Institucional Geov Parente Farias

    Diretor de Estudos e Relaes Econmicas e Polticas Internacionais, Substituto Marcos Antonio Macedo Cintra

    Diretor de Estudos e Polticas do Estado, das Instituies e da Democracia Alexandre de vila Gomide

    Diretora de Estudos e Polticas Macroeconmicas Vanessa Petrelli Corra

    Diretor de Estudos e Polticas Regionais, Urbanas e Ambientais Francisco de Assis Costa

    Diretor de Estudos e Polticas Setoriais de Inovao, Regulao e Infraestrutura, Substituto Carlos Eduardo Fernandez da Silveira

    Diretor de Estudos e Polticas Sociais Jorge Abraho de Castro

    Chefe de Gabinete Fabio de S e Silva

    Assessor-chefe de Imprensa e ComunicaoDaniel Castro

    URL: http://www.ipea.gov.br Ouvidoria: http://www.ipea.gov.br/ouvidoria

    Texto paraDiscusso

    Publicao cujo objetivo divulgar resultados de estudos

    direta ou indiretamente desenvolvidos pelo Ipea, os quais,

    por sua relevncia, levam informaes para profissionais es-

    pecializados e estabelecem um espao para sugestes.

    As opinies emitidas nesta publicao so de exclusiva e

    inteira responsabilidade do(s) autor(es), no exprimindo,

    necessariamente, o ponto de vista do Instituto de Pesquisa

    Econmica Aplicada ou da Secretaria de Assuntos Estrat-

    gicos da Presidncia da Repblica.

    permitida a reproduo deste texto e dos dados nele con-

    tidos, desde que citada a fonte. Reprodues para fins co-

    merciais so proibidas.

    ISSN 1415-4765

    JEL: O11, O14, O24, F43

  • SUMRIO

    SINOPSE

    ABSTRACT

    1 A DESINDUSTRIALIZAO PRECOCE NO BRASIL .................................................... 7

    2 REFERENCIAL TERICO .........................................................................................17

    3 A REDUO DA PARTICIPAO DA MANUFATURA NO PIB BRASILEIRO E AS VARIVEIS ASSOCIADAS A ESTE PROCESSO ..........................................................20

    4 O MODELO QUE FORMALIZA O COMPORTAMENTO DA COMPOSIO SETORIAL DA PRODUO .....................................................................................................47

    5 TESTES ECONOMTRICOS .....................................................................................50

    6 COMENTRIOS CONCLUSIVOS .............................................................................55

    REFERNCIAS ...........................................................................................................56

    ANEXOS ...................................................................................................................59

  • SINOPSE

    A motivao deste estudo avaliar o potencial processo de desindustrializao precoce no Brasil, ou a reduo da participao da manufatura no valor adicionado em um nvel de renda per capita que, segundo a literatura especializada, no justifica esse processo. Para isto, testado um modelo com os fatores que podem ter levado ao processo de reduo da participao da manufatura no valor adicionado, observado no Brasil desde a dcada de 1980. Nosso interesse maior avaliar se a sobreapreciao da taxa de cmbio no Brasil exerce alguma influncia neste processo, e os resultados parecem confirmar esta hiptese.

    ABSTRACTi

    The aim of this study is to evaluate the potential process of early deindustrialization in Brazil, or the reduction of the share of manufacturing in the added value, that occurred in a per capita income level that, according to the specialized literature, it is not justified. For this intent, we tested a model with the variables that could have lead to the reduction process of manufacturing share in the added value, which has been observed in Brazil since the 1980s. Our major interest is to evaluate if the overvaluation of the exchange rate in Brazil could exert some influence on this process and the results apparently confirm this hypothesis.

    i. The versions in English of the abstracts of this series have not been edited by Ipeas editorial department.As verses em lngua inglesa das sinopses (abstracts) desta coleo no so objeto de reviso pelo Editorial do Ipea.

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    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    1 A DESINDUSTRIALIZAO PRECOCE NO BRASIL

    A literatura econmica define que a estrutura produtiva (isto , a alocao dos recursos produtivos entre os diversos setores econmicos) de um pas tende a se alterar medida que este se desenvolve e ocorre um aumento da renda per capita. Nos estgios iniciais do processo de desenvolvimento, a tendncia seria uma elevao da participao relativa da indstria e reduo da agricultura; quando o pas se enriquece, a participao dos servios passa a predominar. Chenery, Sherman e Moshe (1986) vo atribuir esta mudana interao entre demanda e oferta: a demanda se altera em funo da Lei de Engel,1 o que leva a uma mudana na composio da produo, logo, da oferta. Essa reorientao na composio da oferta requer novos investimentos, os quais terminam provocando tambm um aprimoramento na tecnologia utilizada. A adoo de novas tecnologias implica a ocorrncia de rendimentos de escala crescentes, nos moldes da Lei de Verdoorn (1949), fato que termina estimulando a demanda por manufaturados (dado o impacto sobre os preos e a qualidade dos produtos) e por consequncia, um aumento dos investimentos neste setor. Desta forma, o processo autoalimentado, levando diversificao da estrutura produtiva.2 O aumento das exportaes e o processo de substituio de importaes (analisado por TAVARES, 2000) tambm vo contribuir neste processo. Na literatura brasileira, Furtado (1966) foi um dos pioneiros a analisar a mudana que ocorre na estrutura produtiva associada alterao na estrutura da demanda durante o processo de desenvolvimento, e coloca diversas condies para que o processo seja bem-sucedido: a eliminao das restries de balano de pagamentos (disponibilidade de divisas para importar); acesso a bens de capital; e tecnologias avanadas; e uma melhor distribuio da renda que propicie a ampliao do mercado consumidor e da decorrente demanda por manufaturados.

    A industrializao corresponde a esta mudana na estrutura produtiva que no decorrer do processo de desenvolvimento, quando a participao da indstria de transformao no Produto Interno Bruto (PIB) ou no emprego, como consideram

    1. A Lei de Engel afirma que o padro de consumo das famlias se modifica de acordo com alteraes no nvel de renda, pois as elasticidades-renda da demanda pelos diversos bens e servios seriam distintas e tambm variam medida que a renda se altera.2. Em um momento posterior, quando a renda per capita atinge um patamar mais elevado, o mesmo processo ocorre na direo do setor de servios. Rowthorn e Ramaswamy (1999) estimaram que este redirecionamento na estrutura produtiva ocorreu, no grupo de pases estudados em seu trabalho, quando a renda per capita atingiu entre US$ 8.300 e 11.000 (dependendo da metodologia adotada nos testes economtricos), em valores constantes de 1996, corrigidos segundo a paridade do poder de compra.

  • 8R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    Rowthorn e Ramaswamy (1999) e Palma (2005) crescente. J a alterao na estrutura produtiva que se observa em estgios posteriores do desenvolvimento, na direo da maior participao relativa dos servios no valor adicionado, decorre, segundo Clark (1957), da prpria Lei de Engel, enquanto Rowthorn e Ramaswamy (1999) vo acrescentar, a este fator, o crescimento mais rpido da produtividade na manufatura que nos servios.3 Tal crescimento resultante entre outros fatores da Lei de Verdoorn; da concorrncia com produtores com menor custo de fatores; e do declnio na taxa de investimento observado nos pases mais ricos, o que implica tanto a reduo imediata da demanda por manufaturados uma vez que os bens de capital so classificados nesta categoria como a reduo reflexa da demanda por outros bens derivada deste movimento inicial.

    Palma (2005), por sua vez, vai indicar que este processo de desindustrializao, inerente aos pases mais ricos, segundo os autores citados anteriormente, vem ocorrendo de forma precoce em diversas economias antes que estas atinjam o estgio de maturidade conforme definido por Rostow (1956) , em virtude de mudanas no paradigma tecnolgico, do deslocamento de etapas da cadeia produtiva para pases com mo de obra mais barata, da poltica econmica adotada a partir dos anos 1980 e da ocorrncia de doena holandesa. O autor destaca a ocorrncia deste cenrio na Amrica Latina. A hiptese de desindustrializao precoce de Palma reforada por Bresser-Pereira (2008) e Bresser-Pereira e Marconi (2010), neste caso para a economia brasileira. O processo de doena holandesa levaria a uma primarizao da pauta de exportaes e ao aumento das importaes de manufaturados nas economias que possuem significativas vantagens comparativas na produo de bens primrios, especializao na pauta de exportaes e no processo produtivo, ampliao da demanda por no comercializveis derivada da elevao da renda interna e reduo da participao da indstria no valor adicionado da economia (CORDEN; NEARY, 1982).

    Isto ocorre porque uma das caractersticas do processo de doena holandesa a valorizao da taxa de cmbio, em termos nominais e reais, em virtude do grande volume exportado de tais bens primrios, o que possibilita um equilbrio em conta corrente intertemporalmente sustentvel, mas inviabiliza a exportao de manufaturados produzidos no estado da arte, isto , de forma eficiente, aptos a concorrer no mercado

    3. Que, por um lado, estimula o crescimento maior em termos relativos do emprego nos servios, e por outro estimula a demanda por produtos manufaturados, em funo da reduo de seus preos relativos.

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    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    externo, pois reduz fortemente a rentabilidade dos produtores destes bens, que no dispem das mesmas vantagens comparativas que as observadas para os produtores de bens primrios (BRESSER-PEREIRA, 2008) abundantes na economia.

    Os grficos 1A e 1B comparam as trs maiores economias latino-americanas, cuja renda per capita classificada como intermediria para os padres internacionais (Brasil, Argentina e Mxico), com outras economias j consideradas desenvolvidas, com nvel de renda per capita bem mais elevado (a antiga Alemanha Ocidental, Frana, Itlia, Sucia, Reino Unido e Coreia),4 e duas economias asiticas (Tailndia e Malsia) cuja renda per capita tem crescido consideravelmente nos ltimos anos e se situa em patamares prximos aos observados nos pases latino-americanos includos nesta anlise. A fonte das informaes o Groningen Growth and Development Centre (GGDC),5 e os dados sobre a participao da manufatura no valor adicionado esto calculados a preos constantes da moeda do respectivo pas, enquanto os dados relativos renda per capita esto calculados a dlares constantes de 1990, segundo o mtodo de Geary-Khamis.6 Os grficos apresentam linhas pontilhadas para ressaltar o perodo em que a participao da manufatura no valor adicionado comeou a declinar e o correspondente nvel de renda per capita em que essa mudana ocorreu.

    Nos pases desenvolvidos relacionados, observa-se que a diminuio da participao relativa da manufatura no valor adicionado comeou a ocorrer quando a renda per capita se situava no intervalo entre US$ 10 mil e US$ 15 mil e, na maioria dos casos, na dcada de 1970. No Brasil e na Argentina esta reverso tambm se inicia na mesma dcada, porm com um nvel de renda per capita bem menor no caso do Brasil e tambm inferior no caso da Argentina (no Mxico esse processo se inicia apenas na dcada de 1990, porm tambm em um patamar de renda per capita bem inferior ao observado nos pases desenvolvidos).7

    4. Foi includa a antiga Alemanha Ocidental porque a participao da manufatura no valor adicionado comeou a declinar antes do processo de unificao com a ex-Alemanha Oriental.5. A referncia o GGDC, 10-sector database, June 2007, http://www.ggdc.net/, de Vries e Timmer (2007).6. A descrio deste mtodo de clculo, que baseado no critrio de paridade do poder de compra, se encontra em United Nations (1992).7. A metodologia de clculo da participao da manufatura no valor adicionado adotada pelo GGDC e considerada no gr-fico 1A distinta da utilizada na elaborao do grfico 2, a qual baseada nas variaes reais do PIB, e portanto os valores para o Brasil so ligeiramente distintos nos dois grficos; a diferena reside no nvel da participao, mas no na tendncia.

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    A. Pases latinos e asiticos

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    Brasil

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    Argentina

    Participao (%) da manufatura no PIB

    PIB per capita

    GRFICO 1Evoluo da renda per capita e da participao da manufatura no valor adicionado

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    Mxico

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    Coreia

    Participao (%) da manufatura no PIB PIB per capita

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    Malsia

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    Tailndia

    Participao (%) da manufatura no PIB

    PIB per capita

    Fonte: GGDC, 10-sector database, June 2007. Disponvel em: , de Vries e Timmer (2007).

    Obs.: O eixo da esquerda refere-se participao da manufatura no PIB; e o eixo da direita refere-se renda per capita (em milhares de dlares).

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    B. Pases europeus de alta renda

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    Alemanha Ocidental

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    Frana

    Participao (%) da manufatura no PIB PIB per capita

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    Itlia

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    Sucia

    Participao (%) da manufatura no PIB

    PIB per capita

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    Reino Unido

    Participao (%) da manufatura no PIB PIB per capita

    Fonte: GGDC, 10-sector database, June 2007. Disponvel em: , de Vries e Timmer (2007).

    Obs.: O eixo da esquerda refere-se participao da manufatura no PIB; e o eixo da direita refere-se renda per capita (em milhares de dlares).

    possvel argumentar que a participao da manufatura no valor adicionado (PIB) no Brasil e na Argentina estava superdimensionada quando atingiu seu pice, acima do razovel para padres histricos de desenvolvimento, e seria incompatvel com o nvel de renda per capita observado poca nestas economias. Tambm possvel argumentar que atualmente as economias so muito mais direcionadas para a produo de servios em funo do avano da informtica e das comunicaes e que a reduo precoce da participao da manufatura no PIB nos pases latino-americanos seria explicada por este fato.

    Para se contrapor a estes argumentos, baseamo-nos nos seguintes fatos apresentados nos grficos 1A e 1B: i) o Reino Unido e a ex-Alemanha Ocidental apresentavam uma participao da manufatura no PIB de aproximadamente 30% quando comearam a registrar um declnio nesta relao, demonstrando que no h motivo para se afirmar que tal patamar, observado nas economias brasileira e argentina na dcada de 1970, seria muito elevado para padres histricos de desenvolvimento; ii) nas economias asiticas ali consideradas, a participao da manufatura no PIB continua se elevando (na Coreia se estabilizou e reduziu-se muito pouco recentemente, retomando a trajetria de alta a seguir), superando o pico observado nas economias latino-americanas, e o atual nvel de

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    renda per capita na Malsia e Tailndia considerado mdio; logo, no podemos dizer que uma participao elevada da manufatura no PIB incompatvel com um estgio de desenvolvimento (mensurado pela renda per capita) intermedirio; iii) na Sucia, a participao da manufatura no valor adicionado reverteu a tendncia de declnio e passou a se elevar em meados da dcada de 1990, de forma concomitante ao aumento da renda per capita, cujo nvel muito mais elevado que o observado nos latinos ou asiticos; iv) o declnio da participao da manufatura no PIB comeou na dcada de 1970 nas economias brasileira e argentina, portanto muito antes de os setores de informtica e telecomunicaes assumirem a relevncia atual. Logo, estes argumentos contrrios hiptese de desindustrializao precoce so refutveis, e os dados parecem demonstrar que este processo realmente ocorreu na economia brasileira.

    Antes de prosseguir, importante ressaltar que a motivao do estudo do processo de desindustrializao precoce, ou de reduo da participao da manufatura no valor adicionado recentemente observado em economias que no atingiram o nvel de renda per capita que justificasse esse processo, nos moldes discutidos anteriormente, a relevncia da expanso deste mesmo setor para o processo de desenvolvimento econmico,8 dado o seu impacto no avano e na difuso tecnolgica, na produtividade, na produo de outros setores e na prpria renda per capita, conforme discutido por Rostow (1956), Kaldor (1966), Furtado (1966), Chenery, Sherman e Moshe (1986) e Rowthorn e Ramaswamy (1999), entre outros. Alm disso, conforme afirmado anteriormente, a produo manufatureira apresentaria rendimentos crescentes de escala, de modo que aumentos em sua produo levariam elevao de sua produtividade, conforme afirma a Lei de Verdoorn (1949), cuja validade para o caso brasileiro foi testada por Marinho, Nogueira e Rosa (2002).

    Em funo do exposto, o objetivo deste artigo testar se o processo de reduo da participao da manufatura no valor adicionado, observado no Brasil desde a dcada de 1980, pode ser explicado pelos fatores, ou parte deles, discutidos anteriormente. Nosso interesse maior avaliar se a sobreapreciao da taxa real de cmbio no Brasil exerce alguma influncia neste processo. Para tal, primeiramente faremos uma anlise descritiva dos dados que podem contribuir para explicar a evoluo da participao relativa da manufatura no valor adicionado no Brasil, para depois testarmos um

    8. Manufatura, neste artigo, entendida como sinnimo de indstria de transformao.

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    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    modelo que se baseia no utilizado por Rowthorn e Ramaswamy (1999), adaptado para a incluso da hiptese de desindustrializao precoce associada valorizao da taxa real de cmbio no caso brasileiro.

    Enquanto o modelo de Rowthorn e Ramaswamy (1999) busca explicar a motivao para a desindustrializao nos pases ricos, utilizando uma amostra destes ltimos, adequaremos o seu modelo para testar se as variveis que implicam a desindustrializao precoce nos mesmos tambm contribuem para explicar o processo de reduo da participao da manufatura no valor adicionado observado na economia brasileira, juntamente com outras variveis que possibilitem avaliar se a evoluo da taxa real de cmbio pode estar tambm influindo neste processo. Como estamos interessados em avaliar a participao da manufatura no PIB nacional, incluiremos os setores da indstria de transformao da economia brasileira em nosso painel em vez de incluir os diversos pases, como fizeram os autores antes mencionados, em seu modelo original.

    Este artigo est organizado da seguinte forma: inclui primeiramente esta discusso sobre o carter precoce da desindustrializao no Brasil e a motivao de nosso tema e introduz nossa metodologia de anlise; na seo 2, ser comentado o referencial terico do texto. Na seo 3, ser analisada, atravs de estatsticas descritivas e grficos, a evoluo da estrutura produtiva da economia brasileira, enfatizando a participao da manufatura e as motivaes da evoluo de tal participao. Esta discusso auxiliar na construo do modelo que ser apresentado na seo 4, seguido dos testes e da discusso dos resultados alcanados na seo 5.

    2 REFERENCIAL TERICO

    As exportaes de manufaturados tambm desempenham papel relevante no processo de desenvolvimento econmico por serem um importante componente da demanda agregada e gerarem encadeamentos produtivos e externalidades para outros setores (dada a necessidade de se adaptar aos padres internacionais de produo), segundo, entre outros, Razmi, Rapetti e Skott (2009) e Johnson, Ostry e Subramanian (2006). Uma condio relevante para o sucesso de uma estratgia de exportaes de manufaturados de um pas seria a manuteno da taxa real de cmbio em um patamar competitivo,

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    R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    conforme discutido por Rodrik (2008), Razmi, Rapetti e Skott (2009), Johnson, Ostry e Subramanian (2006) e, no caso brasileiro, por Bresser-Pereira (2011) e Gala (2007), entre outros. A elevao das exportaes e a manuteno da taxa de cmbio em um patamar competitivo (que possibilite aos exportadores de manufaturados eficientes competirem no exterior) tambm proveem a economia das divisas necessrias para financiar tanto a elevao das importaes que ocorrem em virtude da elevao da renda sem causar o endividamento externo, como afirmam McCombie e Roberts (2002), como o processo de substituio de importaes caracterstico de algumas etapas do processo de desenvolvimento econmico (CHENERY; SHERMAN; MOSHE, 1986; TAVARES, 2000).

    Rowthorn e Ramaswamy (1999) vo testar a dinmica de desindustrializao dos pases desenvolvidos e definir que os fatores explicativos deste processo seriam, em consonncia com a discusso anterior, a elevao da renda per capita (supondo elasticidades-renda da demanda distintas para os diversos setores, e menor que 1 para a manufatura), os diferenciais nas taxas de crescimento da produtividade, as mudanas nos preos relativos e a composio da balana comercial do pas. A estes fatores seria somado o investimento, j que sua elevao implica maior produo de manufaturados, como mquinas e equipamentos, e efeitos multiplicadores que geram sobre o restante da economia, alm de alterar os coeficientes tcnicos de produo e a produtividade, conforme assinalado por Chenery, Sherman e Moshe (1986). Considerando que para Palma (2005) e Bresser-Pereira (2008) a desindustrializao estaria ocorrendo de forma prematura nos pases em desenvolvimento, portanto antes de alcanar um nvel de renda que justificasse a alterao na composio da demanda agregada na direo dos servios, outras variveis deveriam ser tambm includas neste teste. Para estes autores, a sobrevalorizao da taxa real de cmbio termina desestimulando as exportaes de manufaturados, incrementando suas importaes e contribuindo para reduzir a participao da indstria de transformao no valor adicionado. Assim, a incluso da taxa real de cmbio no modelo de Rowthorn e Ramaswamy (1999) ajudaria a avaliar se sua sobrevalorizao contribui para esta dinmica de desindustrializao precoce no testada por estes ltimos, e defendida por Palma (2005) e Bresser-Pereira (2008).

    Esta discusso sobre o papel da taxa de cmbio na definio da participao da manufatura no valor adicionado est fortemente ligada aos argumentos apresentados por Bhaduri e Marglin (1990), que vo analisar as possibilidades de crescimento com a

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    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    adoo de um modelo wage-led ou profit-led (que se transforma em export-led, em uma economia aberta). O primeiro fortemente baseado na expanso do consumo de massa, decorrente do aumento dos salrios reais, e seria bem-sucedido em um cenrio no qual o investimento menos sensvel a mudanas na margem de lucro e responderia de forma significativa expanso do consumo interno. O cenrio da economia brasileira dos ltimos anos, de elevao dos salrios e valorizao cambial (que eleva o poder de compra dos assalariados), compatvel com uma estratgia wage-led. O segundo modelo, profitled, implica uma forte elasticidade do investimento em relao s margens de lucro que, em uma economia aberta, podem se elevar, entre outros fatores, devido desvalorizao do cmbio, que eleva a receita e diminui os custos salariais em moeda estrangeira. O investimento, neste caso, seria altamente sensvel aos efeitos da desvalorizao cambial sobre as exportaes e aumento dos custos de importaes. O cenrio observado no perodo em que as exportaes mais crescem na economia brasileira, dentro do intervalo que analisaremos na prxima seo (entre 1999 e 2004) , por sua vez, compatvel com uma estratgia profit-led.

    Adicionalmente, cabe ressaltar que uma estratgia wage-led, em uma economia aberta, pode resultar em restries ao balano de pagamentos e ao crescimento, como afirmam, entre outros, McCombie e Roberts (2002) e Razmi, Rapetti e Skott (2009), caso as exportaes no evoluam em ritmo semelhante (ou prximo) ao das importaes, o que se constitui em cenrio bastante factvel. Em uma economia aberta, os salrios reais podem se elevar tanto por uma poltica deliberada de aumento dos salrios nominais como pela valorizao da taxa real de cmbio; e qualquer um destes eventos provoca uma reduo, no curto prazo, na competitividade dos exportadores.

    Bresser-Pereira e Gala (2007) vo chegar a concluso semelhante adotando outros argumentos: a atrao de poupana externa para um pas com taxa de juros elevada leva valorizao do cmbio e, consequentemente, elevao do poder de compra dos assalariados e de consumo, reduzindo a poupana interna. O investimento no responde de forma significativa a este aumento do consumo devido ao patamar elevado da taxa de juros9 e, assim, o que ocorre na prtica, em termos dos agregados macroeconmicos, uma substituio de poupana interna por externa sem uma alterao relevante na

    9. Este cenrio corresponderia, no modelo de Bhaduri e Marglin, a uma estratgia wage-led em que o investimento no sensvel ao aumento do consumo decorrente do crescimento da massa salarial.

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    taxa de investimentos, com o consequente aumento do endividamento externo que pode levar a uma crise do balano de pagamentos.

    Assim, temos na economia brasileira uma combinao de efeitos da valorizao cambial que atuam em sentidos opostos, estimulando e desestimulando a demanda, a produo de comercializveis e a sua participao no valor adicionado; o efeito final no claro, e tentaremos analis-lo em nosso modelo ao incluir a taxa de cmbio como uma varivel explicativa do comportamento da estrutura produtiva da economia, mais especificamente do comportamento da participao relativa da manufatura no valor adicionado, que o foco deste trabalho.

    3 A REDUO DA PARTICIPAO DA MANUFATURA NO PIB BRASILEIRO E AS VARIVEIS ASSOCIADAS A ESTE PROCESSO

    Para analisar a evoluo da estrutura produtiva da economia brasileira e, mais atentamente, da participao relativa da manufatura no valor adicionado, adotamos um agrupamento dos setores de atividades que integram as Contas Nacionais que visa destacar os setores manufatureiros dos demais, bem como os comercializveis dos no comercializveis, a fim de possibilitar posterior discusso a respeito da influncia do desempenho do comrcio exterior e da taxa de cmbio e sobre a participao da manufatura no valor adicionado global da economia. Em relao aos setores que produzem bens manufaturados, mais especificamente, a classificao segue a definida por Lall (2000) e Hatzichronoglou (1997), com exceo dos produtos siderrgicos, pelos motivos explicitados a seguir. O agrupamento dos setores e os critrios que os definiram so os seguintes, sendo o detalhamento de sua composio encontrado no anexo A:

    1) Comercializveis, subdivididos em quatro grupos:

    a) commodities agrcolas e extrativas: so os produtos primrios, cuja produo est fortemente associada existncia de recursos naturais abundantes e a diferenciais de produtividade que geram rendas ricardianas, as quais podem dar origem a um processo de doena holandesa que, por seu turno, tambm pode resultar em desindustrializao;

    b) commodities industrializadas derivadas dos produtos agrcolas e extrativos (isto , derivadas dos primrios ou processadas a partir deles), correspondem a bens

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    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    manufaturados cuja produo fortemente associada ao uso de insumos classificados como commodities agrcolas e extrativas e, portanto, tambm usufruiriam das vantagens comparativas derivadas da abundncia de recursos naturais; so, por exemplo, o refino e derivados de petrleo, os alimentos industrializados em geral e a siderurgia;

    c) manufaturados que utilizam contedo tecnolgico de mdia e mdia-baixa intensidade, logo resultantes de processos de trabalho menos sofisticados e, muitas vezes, associados ao uso intensivo de mo de obra; e

    d) manufaturados que utilizam contedo tecnolgico de mdia-alta e alta intensidade: so aqueles cujo processo de trabalho possui maior contedo tecnolgico e, logo, sua produo deve estar associada a inovaes que geram externalidades positivas para o restante da economia, alm de gerarem maior valor adicionado per capita. Assim, o seu papel no incremento da produtividade mdia da economia deve ser relevante.

    Os grupos b, c e d compem a indstria de transformao (ou manufatura).

    2) No comercializveis, que incluem o restante da indstria, isto , a construo e servios industriais de utilidade pblica, alm de todo o setor de servios.

    A partir da observao dos dados contidos no grfico 2, nota-se que a participao percentual da manufatura no valor adicionado vem declinando desde o incio da dcada de 1980, e de forma mais intensa em alguns intervalos deste perodo.10

    10. Em funo de seguidos aprimoramentos na metodologia de clculo das pesquisas relativas ao valor da produo dos diversos setores e ao clculo do PIB pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), as sries histricas, princi-palmente das Contas Nacionais, sofreram mudanas estruturais relevantes que impossibilitam comparaes setoriais para um perodo mais extenso. A principal ruptura ocorreu em relao aos dados anteriores a 1995, e por isso a maior parte das bases de dados utilizadas neste artigo refere-se ao perodo que se inicia em tal ano. Mas, especificamente em relao participao da indstria de transformao no PIB, foi possvel montar uma srie para um perodo maior com base no encadeamento das variaes de volume, considerando para 1992 a 1995, 2009 e 2010 a variao observada na srie das Contas Trimestrais, o que possibilitou calcular a participao da manufatura no PIB desde o incio da srie em 1947, a preos constantes, baseados em valores de 1995 (ano inicial da nova srie das Contas Nacionais). Como regra geral, ado-taremos sempre valores constantes em nossas tabelas para tentar neutralizar o impacto das mudanas de preos relativos na composio setorial da produo, nos indicadores de comrcio exterior e no investimento. Para o perodo entre 1970 e 2010, a srie de valor adicionado total foi construda a partir do encadeamento das variaes de volume a preos bsicos (sem considerar os impostos e subsdios). E para o perodo 1947-1969, foram utilizadas as variaes de volume a preos de mercado (considerando os impostos e subsdios), dada a indisponibilidade de informaes sobre a evoluo do PIB a preos bsicos e valores constantes para este ltimo intervalo. As variaes referentes ao valor adicionado da indstria de transformao foram, para todo o perodo, consideradas a preos bsicos. Logo, existem algumas diferenas na metodo-logia de clculo para cada um dos perodos, mas no so relevantes a ponto de inviabilizar o encadeamento entre ambos.

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    A tabela 1, que analisa tal participao de forma mais desagregada, de acordo com o agrupamento definido, indica primeiramente que o setor produtor de primrios ganhou espao em nossa estrutura produtiva enquanto a indstria de transformao (manufatura) reduziu sua participao.11 Adicionalmente, demonstra que o comportamento no uniforme dentro da indstria de transformao: a participao do setor que produz manufaturados de mdia-alta e alta tecnologia se recuperou nos ltimos anos, fundamentalmente devido indstria de veculos e peas (incluindo

    GRFICO 2Participao % da indstria de transformao no valor adicionado(A preos bsicos de 1995)

    14%

    15%

    16%

    17%

    18%

    19%

    20%

    21%

    22%

    23%

    24%

    47 49 51 53 55 57 59 61 63 65 67 69 71 73 75 77 79 81 83 85 87 89 91 93 95 97 99 01 03 05 07 09Fonte: Contas Nacionais, estimao a partir das variaes reais por setor.

    11. Os dados utilizados no texto que foram extrados das Contas Nacionais esto todos calculados a preos de 1995, para neutralizarmos o efeito da inflao e das mudanas de preos relativos sobre a evoluo das variveis. Para tal, foi calculada a variao real em cada ano, para cada varivel (valor de um ano a preos do ano anterior dividido pelo valor do ano anterior a preos correntes), e as variaes foram aplicadas sobre o valor corrente de 1995, sucessivamente. Este mtodo gera melhores resultados quanto mais desagregado for o clculo (conforme FEIJ; RAMOS, 2004), assim buscamos seguir este critrio na elaborao destas sries. Somente a srie da evoluo da participao da indstria de transformao agregada no PIB (grfico 1) foi estruturada a partir das variaes reais constantes do Ipeadata.

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    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    aeronaves),12 o que constitui um fato contrrio tendncia de desindustrializao precoce, enquanto os demais (mesmo as commodities derivadas dos primrios, e as manufaturas de baixa e mdia-baixa tecnologia) diminuram sua participao.13

    12. Se descontarmos a produo de veculos e peas do agrupamento das indstrias de mdia-alta e alta tecnologia, a participao relativa deste ltimo no valor adicionado se situava em 4,6% em 1995; caiu constantemente at atingir 3,8% em 2001, mantendo-se estvel neste patamar at 2003; no ano seguinte se elevou para 4% e neste patamar (em 2008, 4,1%) permaneceu at o ltimo ano disponvel da srie. Assim, as indstrias automobilstica e area contriburam forte-mente para impedir um desempenho tambm insatisfatrio para o setor de bens de mdia-alta e alta tecnologia. A anlise sem considerar tais setores se justifica pelo fato de os mesmos terem registrado um desempenho bastante diferenciado dos demais da indstria de mdia-alta e alta tecnologia nos ltimos anos, tanto no tocante produo como s vendas. Uma tabela que demonstra a evoluo especfica dos dados relativos manufatura de mdia-alta e alta tecnologia, incluindo e excluindo os setores de veculos e peas, encontra-se no anexo B.13. As variaes reais do valor adicionado de cada setor da economia brasileira, integrantes das Contas Nacionais, esto includas na tabela do anexo D.

    TABELA 1Participao setorial no valor adicionado(Em %)

    Commodiities agrcolas e extrativas

    Indstria de transformao

    Commodiities derivadas agrcolas e extrativas

    Manufaturados baixa e mdia-baixa tecnologia

    Manufaturados mdia-alta e alta tecnologia

    ComercializveisNo

    comercializveis

    1995 6,6 18,6 5,6 6,9 6,1 25,2 74,8

    1996 6,7 18,3 5,6 6,8 5,9 24,9 75,1

    1997 6,5 18,2 5,6 6,6 6,0 24,8 75,2

    1998 6,8 17,3 5,4 6,4 5,5 24,1 75,9

    1999 7,1 17,0 5,4 6,4 5,2 24,0 76,0

    2000 7,0 17,3 5,4 6,5 5,4 24,4 75,6

    2001 7,3 17,3 5,6 6,4 5,3 24,6 75,4

    2002 7,6 17,1 5,6 6,2 5,3 24,7 75,3

    2003 8,0 17,2 5,7 6,1 5,4 25,2 74,8

    2004 7,8 17,7 5,6 6,3 5,8 25,5 74,5

    2005 7,6 17,6 5,5 6,2 5,9 25,2 74,8

    2006 7,7 17,1 5,3 6,0 5,8 24,8 75,2

    2007 7,6 17,0 5,1 5,9 6,0 24,7 75,3

    2008 7,7 16,8 5,0 5,7 6,1 24,5 75,5

    Variao % 08/95 16,9 10,0 11,5 17,9 0,4 2,9 1,0

    Fonte: IBGE/Contas Nacionais.

    J a participao dos diversos setores na composio do emprego na economia brasileira no segue o mesmo ritmo da evoluo da composio relativa do valor adicionado, conforme se observa na tabela 2. Os setores de no comercializveis exibiram uma maior capacidade de gerar emprego (mensurada pelo aumento de sua

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    participao relativa), o que seria compatvel com um processo de desindustrializao, precoce ou no; porm, o comportamento do emprego no setor de manufaturas de mdia-alta e a alta tecnologia se sobrepe a este argumento.14

    14. E, no caso do emprego, os dados mostram que subtrair os setores de veculos e peas no altera o comportamento da srie de forma substancial.

    TABELA 2Participao setorial no emprego(Em %)

    Commodiities agrcolas e extrativas

    Indstria de transformao

    Commodiities derivadas agrcolas e extrativas

    Manufaturados baixa e mdia-baixa tecnologia

    Manufaturados mdia-alta e alta tecnologia

    ComercializveisNo

    comercializveis

    1995 26,3 13,0 3,3 7,2 2,5 39,3 60,7

    1996 24,9 12,8 3,2 7,2 2,4 37,7 62,3

    1997 24,8 12,3 3,2 6,7 2,3 37,1 62,9

    1998 24,1 11,6 3,1 6,3 2,2 35,7 64,3

    1999 24,5 11,7 3,0 6,5 2,2 36,2 63,8

    2000 22,6 12,0 3,0 6,7 2,3 34,6 65,4

    2001 21,5 11,8 3,0 6,6 2,2 33,3 66,7

    2002 21,3 11,7 3,0 6,5 2,2 33,0 67,0

    2003 21,3 11,9 3,1 6,5 2,3 33,2 66,8

    2004 21,7 12,2 3,2 6,6 2,4 33,9 66,1

    2005 21,2 12,8 3,4 7,0 2,5 34,0 66,0

    2006 20,0 12,5 3,3 6,7 2,5 32,5 67,5

    2007 18,9 12,8 3,3 6,8 2,6 31,7 68,3

    2008 18,1 13,0 3,4 6,8 2,8 31,1 68,9

    Variao % 08/95 31,3 0,4 4,8 5,6 11,9 20,8 13,5

    Fonte: IBGE/Contas Nacionais.

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    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    TABELA 3Produtividade mdia setorial (valor adicionado/emprego)(Em R$ de 1995)

    Commodiities agrcolas e extrativas

    Indstria de transformao

    Commodiities derivadas agrcolas e extrativas

    Manufaturados baixa e mdiabaixa tecnologia

    Manufaturados mdiaalta e alta tecnologia

    ComercializveisNo

    comercializveis

    1995 2.097 12.028 14.370 8.029 20.641 5.374 10.320

    1996 2.328 12.470 15.192 8.277 21.468 5.767 10.513

    1997 2.334 13.120 15.464 8.693 22.671 5.904 10.564

    1998 2.494 13.262 15.500 9.046 22.253 5.996 10.487

    1999 2.443 12.281 15.315 8.269 20.182 5.618 10.097

    2000 2.663 12.306 15.458 8.231 20.215 6.011 9.874

    2001 2.920 12.619 15.939 8.405 20.681 6.344 9.707

    2002 3.034 12.449 16.100 8.090 20.570 6.368 9.557

    2003 3.152 12.220 15.533 7.922 20.031 6.398 9.461

    2004 3.039 12.303 14.775 8.067 20.752 6.382 9.585

    2005 3.058 11.629 13.814 7.501 20.468 6.293 9.650

    2006 3.307 11.802 13.741 7.720 20.263 6.570 9.599

    2007 3.626 11.983 13.816 7.751 20.602 6.996 9.906

    2008 3.946 11.939 13.431 7.725 20.496 7.289 10.161

    Var. % entre 08 e 95 88,2 0,7 6,5 3,8 0,7 35,6 1,5

    Fonte: IBGE/Contas Nacionais.

    TABELA 4Preo relativo (deflator implcito do setor/deflator implcito geral)(Base = 1995)

    Commodiities agrcolas e extrativas

    Indstria de transformao

    Commodiities derivadas agrcolas e extrativas

    Manufaturados baixa e mdiabaixa tecnologia

    Manufaturados mdiaalta e alta tecnologia

    ComercializveisNo

    comercializveis

    1995 1,000 1,000 1,000 1,000 1,000 1,000 1,000

    1996 0,984 0,957 0,979 0,947 0,942 0,961 1,024

    1997 0,970 0,943 0,972 0,918 0,932 0,947 1,033

    1998 0,960 0,931 0,955 0,899 0,931 0,935 1,040

    1999 0,968 0,972 1,010 0,920 0,973 0,971 1,018

    2000 1,008 1,027 1,064 0,978 1,029 1,024 0,985

    2001 1,016 1,037 1,076 0,968 1,052 1,034 0,979

    2002 1,083 1,045 1,085 0,960 1,070 1,050 0,969

    2003 1,142 1,120 1,231 0,993 1,105 1,124 0,923

    2004 1,155 1,142 1,264 1,008 1,121 1,144 0,910

    2005 1,092 1,132 1,274 1,003 1,087 1,126 0,921

    2006 1,059 1,116 1,269 0,970 1,071 1,107 0,933

    2007 1,058 1,110 1,265 0,995 1,041 1,102 0,936

    2008 1,157 1,138 1,318 0,993 1,066 1,141 0,912

    Var. % entre 08 e 95 15,7 13,8 31,8 0,7 6,6 14,1 8,8

    Fonte: IBGE/Contas Nacionais.

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    R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    A produtividade da indstria de transformao (mensurada em sua forma mais ampla, qual seja, dividindo o valor adicionado pelo emprego) praticamente no se altera no perodo analisado, porm a anlise desagregada demonstra mais uma vez que o comportamento do setor de manufaturados de mdia-alta e alta tecnologia destoa do observado nos demais componentes da indstria de transformao.15

    Chama a ateno a elevao da produtividade no setor de primrios, que est associada a uma queda no emprego e, logo, a uma possvel alterao em seu processo produtivo, que vem se tornando menos intensivo em trabalho. Assim, a sua modernizao no implicou maior capacidade direta de gerao de emprego, o que de toda forma era esperado em relao a este setor, segundo a teoria, durante o processo de desenvolvimento econmico. Os maiores absorvedores de mo de obra, de acordo com nossa anlise para o perodo no comercializveis e manufaturados de mdia-alta e alta tecnologia diminuram sua produtividade e recuperaram ligeiramente o patamar inicial ao final do perodo analisado, indicando que apesar de terem gerado empregos, provavelmente no passaram por um processo de modernizao relevante.

    O comportamento da produtividade na indstria de transformao, que exibe pequenas oscilaes ao longo do perodo, parece indicar que este no foi um fator preponderante para a evoluo da participao relativa da manufatura no valor adicionado. A relao entre a produtividade e os preos relativos tambm aparenta no ser relevante. Mas o comportamento da srie dos preos relativos, por sua vez, parece estar negativamente correlacionado com a da participao setorial no valor adicionado, o que parece lgico: a queda no preo relativo, ao influir sobre a demanda, contribuiria para elevar a participao de um setor no valor adicionado.16

    Seria importante que os aumentos da produtividade, se ocorressem, implicassem reduo dos preos e aumento da produo que, por sua vez, resultariam em maior participao relativa no valor adicionado. Este encadeamento parece no ter ocorrido na economia brasileira nos ltimos anos: alm de o vnculo entre produtividade e preos no ter aparentemente prevalecido, os aumentos de produtividade tambm no foram relevantes no caso da manufatura.

    De fato, quando observamos no grfico 3 a evoluo do investimento setorial na indstria, a partir dos dados da Pesquisa Industrial Anual (PIA), do IBGE, observamos

    15. Novamente, se desconsiderada a indstria de veculos e peas, o comportamento da produtividade das indstrias de mdia-alta e alta tecnologia distinto do observado na tabela, pois comea a cair em 1999, e segue uma tendncia de queda at 2008, amenizada por pequenas elevaes no perodo. A reduo observada entre 1995 e 2008 chega a 9,3%.16. Estas suposies sobre a produtividade e o preo relativo sero testadas na seo com os testes economtricos.

  • Texto paraDiscusso1 6 8 1

    27

    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    17. A srie das Contas Nacionais no inclui o clculo da taxa de investimento setorial, que somente pode ser calculada a partir da matriz insumo-produto, que est disponibilizada para poucos anos. Assim, optamos por utilizar as informaes da PIA/IBGE, que incluem os valores de investimento setorial (aquisies + melhorias (-) baixas do ativo imobilizado). Entretanto, esta pesquisa inclui dados apenas da indstria extrativa mineral e de transformao, logo, apenas dos setores comercializveis, descontada a agropecuria; adicionalmente, a sua amostra, alm de ser menor, passa por uma srie de ajustes antes de ser considerada no clculo das Contas Nacionais. O deflator que utilizamos o da formao bruta de capital fixo (FBCF) das Con-tas Nacionais, pois o nico disponvel. Assim, estes dados no possibilitam estimar a participao do investimento de todos os setores da economia no PIB, mas permitem observar, resguardadas as observaes anteriores, a evoluo do investimento setorial na indstria de bens comercializveis, em termos absolutos e relativos. Cabe ressaltar que a partir de 2008 a srie passou a ser divulgada com base na classificao setorial da Classificao Nacional de Atividades Econmicas (CNAE) 2.0., o que nos obrigou a realizar uma srie de ajustes para agregar os dados nos setores correspondentes das Contas Nacionais.18. Mesmo que descontemos os dados referentes aos investimentos no setor de refino de petrleo, relevantes para a composio do grupo de commodities derivadas, a sua evoluo no perodo permanece significativa diminui de 322% para 220% entre 1995 e 2008.

    GRFICO 3Investimento (Valores constantes em R$ milhes de 1995)

    0

    10.000

    20.000

    30.000

    40.000

    50.000

    60.000

    70.000

    1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

    Extrativa mineral Commodities derivadas de agrcolas e extrativas

    Manufaturados de baixa e mdia-baixa tecnologia Manufaturados de mdia-alta e alta tecnologia

    Indstria de transformaoFonte: PIA/IBGE.

    que o montante de investimentos na manufatura que se constitui em uma varivel fundamental para a modernizao do processo produtivo e, por consequncia, do aumento da produtividade permaneceu praticamente estvel no perodo analisado, elevando-se consideravelmente apenas nos dois ltimos anos da srie.17 Os setores que apresentaram maior evoluo do investimento at 2007, ano anterior significativa elevao observada em 2008, foram os associados produo de commodities primrias ou derivadas destas.18

  • 28

    R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    Por consequncia, o crescimento da produo foi fortemente baseado na ocupao de capacidade ociosa (grfico 4), que evoluiu consistentemente a partir de 2003 a 2008 nos setores que produzem commodities derivadas dos primrios e na manufatura de mdia-alta e alta tecnologia. Portanto, os empresrios parecem ter optado por ocupar a capacidade ociosa primeiramente, antes de retomar os investimentos. Explicaes possveis para esta estratgia podem ser tanto a existncia de espao para expandir a produo com a capacidade existente poca como a predominncia de um cenrio macroeconmico no qual as expectativas sobre a demanda futura, que poderiam levar os empresrios a tomar decises de investimento, no eram suficientemente positivas e de baixo risco.19

    19. Para calcular as sries utilizadas no grfico 3, utilizamos os dados da srie de nvel de utilizao da capacidade (NUC), fornecida pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundao Getulio Vargas (Ibre-FGV). Consideramos o valor mdio anual para cada setor da srie com ajuste sazonal, classificamos os setores para os quais o Ibre calcula o indicador em nossos agrupamentos e calculamos uma mdia simples para estes ltimos. Assim, este um clculo apenas ilustrativo do com-portamento do NUC para os grupos predefinidos em nosso trabalho, dado que a metodologia de clculo que adotamos demasiadamente simples.

    GRFICO 4Nvel de utilizao da capacidade ociosa(Em %)

    65

    70

    75

    80

    85

    90

    95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10

    Commodities derivadas de agrcolas e extrativas

    Manufaturados de baixa e mdia-baixa tecnologia

    Manufaturados de mdia-alta e alta tecnologiaFonte: Ibre-FGV, com clculo dos autores.

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    29

    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    Aps avaliarmos algumas motivaes pelo lado da oferta investimento, produtividade e capacidade produtiva para as oscilaes na participao relativa dos diversos setores no valor adicionado (e, consequentemente, na estrutura produtiva) da economia brasileira, sero analisados os componentes da demanda que esto contribuindo para tais variaes e a origem da produo que atende a tal demanda. O objetivo identificar as principais fontes de demanda e oferta, e logo as variveis que podem explicar seu comportamento, a fim de consider-las em nossos testes. Cabe ressaltar novamente que um de nossos objetivos estudar o comportamento do comrcio exterior neste processo e, por decorrncia, da taxa real de cmbio sobre a evoluo da produo de manufaturados. Para tal, sero utilizados os dados das Tabelas de Recursos e Usos das Contas Nacionais e nos basearemos nas seguintes identidades macroeconmicas:

    Opc = Y + M + T (1)

    Dt = X + C

    g + C

    f + I + VE + CI, como O

    pc = D

    t (2)

    Logo:

    Y VE + M + T = X + Cg + C

    f + I + CI (3)

    onde:

    Dt = demanda final

    X = exportao de bens + exportao de servios

    Cg = consumo da administrao pblica + consumo das instituies sem fins

    lucrativos a servio das famlias (ISFLSF)

    Cf = consumo das famlias

  • 30

    R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    I = formao bruta de capital fixo

    VE = variao de estoques

    CI = total de produtos de consumo intermedirio

    M = importao de bens + importao de servios + ajuste CIF/FOB

    T = margem de comrcio + margem de transporte + total de impostos lquidos de subsdios

    Opc = oferta total a preo de consumidor

    Y = oferta total a preo bsico

    Na equao (1), relativa oferta total, temos as fontes dos recursos utilizados na economia, ou seja, a origem dos produtos produo interna ou importao que, por estarem considerados a preos do consumidor, esto somados s margens de comercializao e aos impostos; na equao (2), relativa demanda total, esto explicitados os diversos destinos da produo. A equao (3), decorrente da identidade entre as duas primeiras, considera a variao de estoques uma fonte de recursos, apesar de nas equaes das Contas Nacionais esta varivel ser considerada um destino da produo. De fato, seu valor positivo significa que o estoque do final de um perodo superior ao de seu incio e, logo, que uma parcela da produo se destina formao de estoques; porm, quando negativo, significa que houve uma reduo dos estoques entre o incio e o final do perodo que se destinou a suprir a demanda. Assim, optamos por este ltimo enfoque, que nos parece mais interessante quando os estoques se constituem em uma fonte de recursos para atender demanda, fato que constantemente observado nos diversos setores no perodo analisado e possibilita minimizar os efeitos, na srie encadeada a valores constantes, da grande varincia do valor da variao dos estoques.

  • Texto paraDiscusso1 6 8 1

    31

    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    Os grficos 5A a 5D demonstram a distribuio percentual da demanda total entre seus componentes ou, dito de outra forma, da alocao da oferta total (descontada a variao dos estoques), em termos relativos, entre os seus destinos, de acordo com a demanda. Cada um deles se refere a um de nossos agrupamentos de setores produtores de bens comercializveis definidos a priori.20,21

    20. Analisaremos o grupo dos produtos comercializveis mais atentamente por ser aquele em que est inserida a manufa-tura e que sofre maior impacto das oscilaes do volume de comrcio exterior e do patamar da taxa de cmbio, ainda que esta ltima, conforme discutiremos mais frente, tambm influa sobre a demanda por no comercializveis.21. Cabe notar que as anlises anteriores baseavam-se nas informaes relativas aos setores de atividades, e nos grficos 4 e 5A a 5D a anlise baseada nos grupos de produtos, pois assim est organizada a Tabela de Usos e Recursos das Contas Nacionais. Anlise semelhante a esta, organizada por setores de atividades, implica clculo da matriz insumo-produto e este se constitui em componentes da etapa seguinte deste projeto de pesquisa. De toda forma, a avaliao dos dados desagregados mostra que a maior parcela dos produtos associados a um setor produzida dentro do prprio setor, logo que h uma coincidncia entre ambos, e possibilita a comparao, com as devidas ressalvas, de agregaes de dados relativos a grupos de produtos com as agregaes de dados relativos a setores de atividades.

    GRFICO 5ACommodities extrativas e agrcolas: demanda total, descontada a variao dos estoques (Participao % de seus componentes, a partir do clculo dos valores em R$ milhes de 1995)

    Fonte: Contas Nacionais.

    0%

    10%

    20%

    30%

    40%

    50%

    60%

    70%

    80%

    1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

    Exportaes Consumo das famlias Investimento Consumo intermedirio

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    R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    GRFICO 5BCommodities derivadas de agrcolas e extrativas: demanda total, descontada a variao dos estoques(Participao % de seus componentes, a partir do clculo dos valores em R$ milhes de 1995)

    Fonte: Contas Nacionais.

    GRFICO 5CManufaturas de baixa e mdia-baixa tecnologia: demanda total, descontada a variao dos estoques(Participao % de seus componentes, a partir do clculo dos valores em R$ milhes de 1995)

    Fonte: Contas Nacionais.

    0%

    10%

    20%

    30%

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    50%

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    1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

    Exportaes Consumo das famlias Investimento Consumo intermedirio

    0%

    10%

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    30%

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    50%

    60%

    1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

    Exportaes Consumo das famlias Investimento Consumo intermedirioInvestimento

  • Texto paraDiscusso1 6 8 1

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    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    Note-se que as exportaes se constituram em um fator relevante para o crescimento da demanda agregada, pois sua participao relativa enquanto destino da produo se eleva, em todos os grupos de comercializveis considerados, at 2005 (com menor destaque para os manufaturados de baixa e mdia-baixa tecnologia); depois declina em todos, com exceo das commodities primrias. Este movimento ocorreu mesmo com a grande oscilao da taxa real de cmbio registrada no perodo.

    A participao relativa do investimento enquanto componente da demanda (ou uso, destino da produo) relevante apenas no grupo dos manufaturados de mdia-alta e alta tecnologia, pois nele que se concentra a produo dos bens de capital. Tal participao cai ao longo do perodo, mas eleva-se razoavelmente nos ltimos anos, o que compatvel com as informaes constantes no grfico 3 sobre a evoluo deste componente da demanda.22

    GRFICO 5DManufaturas de mdia-alta e alta tecnologia: demanda total, descontada a variao dos estoques(Participao % de seus componentes, a partir do clculo dos valores em R$ milhes de 1995)

    Fonte: Contas Nacionais.

    22. Logo, como os bens de investimento esto concentrados primordialmente no grupo de produtos de mdia-alta e alta tecnologia, este o grupo que apresenta maior variao na participao relativa dos investimentos enquanto componente da demanda (ou destino da produo) nos ltimos anos da srie.

    0%

    5%

    10%

    15%

    20%

    25%

    30%

    35%

    40%

    45%

    1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

    Exportaes Consumo das famlias Investimento Consumo intermedirio

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    R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    J a participao relativa do consumo das famlias enquanto destino da produo se reduz no perodo para todos os grupos de produtos, menos para os classificados como de mdia-alta e alta tecnologia, nos quais se concentram os bens de consumo durveis. Porm, nos ltimos anos, o consumo final se recupera ligeiramente para os dois grupos de manufaturados, indicando que a demanda por estes produtos foi, possivelmente, bastante beneficiada pela ampliao da renda per capita que ocorreu na economia brasileira durante o perodo recente.

    A participao relativa dos bens destinados ao consumo intermedirio tambm cai ao longo do perodo analisado, com exceo do grupo de produtos de baixa e mdia-baixa tecnologia. Esta reduo, mais significativa dentre os produtos de mdia-alta e alta tecnologia, pode ser decorrente da expanso da importao de bens, fato que diminuiria, em termos relativos, a demanda por insumos produzidos internamente que seriam utilizados no processo produtivo.

    Uma caracterstica comum aos dois grupos de manufaturados a reduo, nos ltimos anos, da participao relativa das exportaes na composio da demanda, em contraposio a um ligeiro crescimento da participao do consumo das famlias (e no caso dos manufaturados de mdia-alta e alta tecnologia, tambm a um aumento significativo dos investimentos). Este fato ser retomado em nossa discusso adiante.

    J os grfico 6A a 6D demonstram as fontes dos recursos que supriram a demanda na economia, isto , os componentes da oferta total, descontada a variao de estoques dos valores da produo. Tambm seguem a mesma diviso por agrupamentos de setores produtivos adotada para os grficos anteriores.23

    23. O acmulo de estoques pode ser decorrente no apenas da produo no vendida, mas tambm do acmulo de produtos importados no vendidos durante o perodo. Semelhante raciocnio se aplica reduo de estoques. Porm, foi necessrio subtra-lo de uma das sries para evitar que suas oscilaes com elevada varincia prejudicassem o clculo da srie encadeada a preos constantes. Optamos por subtra-lo da produo, que a varivel com maiores valores, para provocar a menor distoro possvel nos dados apresentados. Logo, uma parcela da variao nas importaes, que pode ser decorrente da variao de estoques, est computada nas variaes da produo mas, de toda forma, o montante da variao de estoques no significativo a ponto de alterar a tendncia das sries aqui apresentadas.

  • Texto paraDiscusso1 6 8 1

    35

    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    GRFICO 6ACommodities agrcolas e extrativas: oferta total a preos do consumidor(Participao % de seus componentes, a partir do clculo dos valores em R$ milhes de 1995)

    Fonte: Contas Nacionais.

    GRFICO 6BCommodities derivadas de agrcolas e extrativas: oferta total a preos do consumidor(Participao % de seus componentes, a partir do clculo dos valores em R$ milhes de 1995)

    Fonte: Contas Nacionais.

    0%

    10%

    20%

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    95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08

    Importaes Tributos e margens Produo (-) variao dos estoques

    0%

    10%

    20%

    30%

    40%

    50%

    60%

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    95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08

    Importaes Tributos e margens Produo (-) variao dos estoques

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    R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    GRFICO 6CManufaturados de baixa e mdia-baixa tecnologia: oferta total a preos do consumidor(Participao % de seus componentes, a partir do clculo dos valores em R$ milhes de 1995)

    Fonte: Contas Nacionais.

    Fonte: Contas Nacionais.

    GRFICO 6DManufaturados de mdia-alta e alta tecnologia: oferta total a preos do consumidor(Participao % de seus componentes, a partir do clculo dos valores em R$ milhes de 1995)

    0%

    10%

    20%

    30%

    40%

    50%

    60%

    70%

    80%

    95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08Importaes Tributos e margens Produo (-) variao dos estoques

    0%

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    20%

    30%

    40%

    50%

    60%

    70%

    95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08

    Importaes Tributos e margens Produo (-) variao dos estoques

  • Texto paraDiscusso1 6 8 1

    37

    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    O dado mais relevante dos grficos referentes oferta (6A a 6D) indica que a participao dos importados na oferta de produtos comercializveis se elevou consideravelmente, principalmente a partir de 2004, com exceo das commodities primrias, e principalmente para os dois grupos de manufaturados. O crescimento da demanda agregada nos ltimos anos (que pode ser comprovado pela taxa de crescimento do PIB per capita, que demonstraremos mais frente) poderia ter resultado em uma elevao maior da produo de comercializveis (e principalmente manufaturados), visto que uma parcela crescente do consumo e do investimento foi atendida pelas importaes. Logo, um dos fatores responsveis pela reduo da participao da manufatura no valor adicionado da economia brasileira pode ter sido o crescimento da participao relativa de importados enquanto fonte de suprimento da demanda.

    Combinando a anlise dos dados referentes demanda com os da oferta, podemos afirmar que aps exercerem um papel importante na maior parte do perodo analisado (principalmente a partir de 1999, justamente o ano em que ocorreu uma significativa desvalorizao cambial), as exportaes diminuram, nos ltimos anos, sua relevncia na determinao do crescimento da demanda agregada dos grupos de produtos classificados como commodities derivadas de primrios e manufaturados (tanto de baixa e mdia-baixa como de mdia-alta e alta tecnologia), tendo sido compensadas por uma elevao da demanda interna (consumo das famlias, alm do investimento) que, se tivesse sido atendida em sua plenitude pela produo interna, poderia ter compensado a perda de dinamismo das exportaes de manufaturados e impedido a queda, ou at mesmo propiciado a elevao, da participao da manufatura no valor adicionado. Porm, como uma parcela crescente da demanda interna tem sido atendida por importados, este movimento de elevao, ou estabilidade de participao da manufatura no PIB, terminou no ocorrendo.

    Os dados especficos de exportao e importao, por setores de atividade, oriundos da Fundao Centro de Estudos de Comrcio Exterior (Funcex) e calculados pelos autores a valores de 1995, considerando as variaes de quantum sobre os valores observados naquele ano, demonstram que quando isolamos o efeito-preo podemos observar que as exportaes crescem a uma taxa maior at 2005, conforme se observa no grfico 7, o que compatvel com as informaes constantes dos grficos anteriores. Ressalte-se tambm que mesmo a exportao de manufaturados de mdia e mdia-

  • 38

    R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    alta tecnologia, que teoricamente sofreria um impacto maior da valorizao cambial,24 exibe, em termos percentuais, uma variao considervel.25

    24. Por no possurem as mesmas vantagens comparativas observadas para os produtos primrios abundantes em nossa economia.25. Optamos por exibir a srie com um nmero maior de observaes em funo da disponibilidade de informaes para um perodo mais abrangente que o disponvel para as sries discutidas anteriormente.

    GRFICO 7Valor FOB das exportaes a preos de 1995(Em US$ milhes)

    Fonte: Funcex, a partir de dados da Secretaria de Comrcio Exterior do Ministrio do Desenvolvimento, Indstria e Comrcio Exterior (Secex/MDIC).

    0

    10.000

    20.000

    30.000

    40.000

    50.000

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    74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10

    Commodities agrcolas e extrativas Commodities derivadas de agrcolas e extrativas

    Manufaturados de baixa e mdia-baixa tecnologia Manufaturados de mdia-alta e alta tecnologia

    Em relao s importaes (grfico 8), notamos um comportamento bem distinto do observado para as exportaes: as compras externas de manufaturados de mdia-alta e alta tecnologia disparam aps a abertura comercial, e voltam a se elevar consideravelmente aps 2004. As importaes de commodities derivadas e de manufaturados de baixa e mdia-baixa tecnologia tambm se elevam, porm exibem uma variao bem menor.

  • Texto paraDiscusso1 6 8 1

    39

    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    Alguns fatores que concorrem para explicar o comportamento do quantum de exportaes e importaes so os seus preos, o nvel da taxa de cmbio26 (bem como a sua varincia), a demanda externa (para as exportaes), a demanda interna (para as importaes) e as barreiras tarifrias e no tarifrias, alm da hiptese de ocorrncia de histerese e de adoo de uma estratgia de hedge produtivo.27 Neste trabalho, consideraremos dentre estes fatores a renda interna, a demanda externa (mundial) e a taxa de cmbio. A hiptese de histerese precisa ser testada em modelo especfico e distinto do que visamos testar, enquanto a de hedge produtivo ser alvo de etapa futura deste projeto de pesquisa, bem como a discusso sobre as barreiras tarifrias e no tarifrias.28

    26. Ainda que exista uma relao de causalidade em ambos os sentidos para estas duas variveis, pois as variaes das vendas e compras externas tambm podem influir sobre o comportamento dos preos e da taxa de cmbio.27. O hedge produtivo, conforme definido por Marconi e Barbi (2010), corresponde estratgia que os empresrios podem desenvolver para reduzir o custo mdio de produo com a finalidade de compensar a queda na receita unitria, em mo-eda nacional, causada pela sobrevalorizao cambial. A reduo de custos ocorre atravs da maior utilizao, em termos relativos, de insumos importados, tornados mais baratos em funo da prpria sobrevalorizao cambial. 28. A hiptese de histerese descrita por Krugman (1989) e, para o caso brasileiro, testada, dentre outros, por Kannebley Jr., Prince e Scarpelli (2010), que demonstraram existir este componente nas exportaes brasileiras.

    GRFICO 8Valor FOB das importaes a preos de 1995(Em US$ milhes)

    Fonte: Funcex, a partir de dados da Secex/MDIC.

    0

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    80.000

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    74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10

    Commodities agrcolas e extrativas Commodities derivadas de agrcolas e extrativas

    Manufaturados de baixa e mdia-baixa tecnologia Manufaturados de mdia-alta e alta tecnologia

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    R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    Tambm consideraremos que as variaes de preos so fundamentalmente derivadas do comportamento da demanda externa, assim optamos por esta ltima varivel em nossa anlise.29

    A demanda externa se elevou bastante no perodo considerado (levada em conta apenas a evoluo em quantum), fato que certamente estimulou as exportaes. Os grficos 9 e 10 mostram que o grupo que apresentou maior crescimento foi o das manufaturas de mdia-alta e alta tecnologia, o que ajuda a explicar o crescimento das exportaes brasileiras dos produtos destes setores de atividades, a despeito das oscilaes da taxa real de cmbio observadas no perodo, conforme veremos mais frente. interessante observar que, quando controlamos o efeito-preo, as variaes na demanda externa por commodities primrias so menores que as observadas nos demais grupos (ver grfico 10).30 Complementando o argumento, o grfico 11 demonstra que a evoluo mais significativa dos preos ocorreu, para tais produtos, superior em termos percentuais sua evoluo em quantum.31

    J a taxa real de cmbio (grfico 12) oscilou consideravelmente ao longo do perodo em estudo em nossas anlises anteriores (1995-2008), e no perodo posterior a 2003 apresentou uma forte tendncia valorizao. Levando-se em conta uma taxa de cmbio especfica para os manufaturados, produtos teoricamente mais afetados pela suas variaes (seguindo argumento j apresentado), a tendncia a mesma.32 Assim, uma anlise preliminar indica que a taxa real de cmbio, ao contrrio da demanda externa, no parece ter sido uma varivel relevante para explicar a evoluo favorvel das exportaes que predominou durante o perodo analisado.

    29. Os fatores aqui relacionados esto discutidos, para o caso brasileiro, por Carvalho e Parente (1999) e Castro e Caval-canti (1997), entre outros.30. A demanda externa foi calculada a partir das informaes de exportaes mundiais da Conferncia das Naes Unidas para Comrcio e Desenvolvimento United Nations Conference on Trade and Development (UNCTAD) , por grupos de produtos. Tais grupos foram agregados de forma compatvel com os quatro grupos de comercializveis que estamos ado-tando em nossa anlise, e o efeito-preo foi descontado considerando como deflator uma mdia dos preos de exportao e importao calculados pela Funcex para a economia brasileira. Em seguida, as variaes de quantum encontradas foram aplicadas sobre osvalores observados para 1995.31. O grfico 10 demonstra qual seria a evoluo da demanda mundial considerando as quantidades exportadas em 1995 e, nos anos seguintes, apenas a correo de tais quantidades pela variao dos preos.32. No discutiremos, neste artigo, as motivaes para a valorizao da taxa real de cmbio observada na economia brasileira.

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    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    GRFICO 9Exportaes mundiais (demanda externa)(Estimadas em valores de 1995, em US$ milhes)

    Fonte: UNCTAD.

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    1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009

    Commodities derivadas de agrcolas e extrativas Manufaturados de baixa e mdia-baixa tecnologia

    Manufaturados de mdia-alta e alta tecnologia Commodities agrcolas e extrativas (eixo da direita)

    GRFICO 10Exportaes mundiais (demanda externa)(Estimadas em valores de 1995, base: 1995 = 100)

    Fonte: UNCTAD.

    0

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    1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009

    Commodities agrcolas e extrativas Commodities derivadas de agrcolas e extrativas

    Manufaturados de baixa e mdia-baixa tecnologia Manufaturados de mdia-alta e alta tecnologia

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    R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    GRFICO 11Exportaes mundiais (demanda externa)(Evoluo somente a partir das variaes de preos, sem considerar a evoluo em quantum, base: 1995 = 100)

    Fonte: UNCTAD.

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    1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009

    Commodities derivadas de agrcolas e extrativas Manufaturados de baixa e mdia-baixa tecnologia

    Manufaturados de mdia-alta e alta tecnologia Commodities agrcolas e extrativas (eixo da direita)

    GRFICO 12Taxa de cmbio real efetiva deflatores: INPC-BR e IPA outros pases (Mdia mvel dos 12 meses, mdia de 2005 = 100)

    Fonte: Ipea.

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    1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

    Manufaturados Geral

  • Texto paraDiscusso1 6 8 1

    43

    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    Para reforar nosso argumento sobre os prejuzos que uma valorizao cambial pode causar ao exportador, calculamos o custo unitrio do trabalho (CUT), que um importante indicador da evoluo do custo mdio de um fator de produo muito relevante e que, quando calculado em dlar, mensura sua variao para o exportador.33 No grfico 13, estamos analisando a evoluo do CUT sob dois critrios de clculo, em reais e em dlares, para identificar o seu comportamento considerando (no primeiro caso) ou no (no segundo) a influncia das oscilaes cambiais sobre o mesmo. A evoluo do CUT em dlares bem superior observada em relao calculada em reais, mostrando que o aumento de custos observado deve-se mais valorizao cambial que ao crescimento dos salrios, que acompanharam proximamente a evoluo da produtividade nos ltimos anos, dado que o crescimento da srie calculada em reais no perodo recente foi bem mais discreto. Assim, sob o ngulo dos custos da mo de obra, a valorizao cambial tambm teria contribudo negativamente para as exportaes, mas provavelmente em uma magnitude insuficiente para neutralizar o efeito positivo decorrente da expanso da demanda mundial. plausvel afirmarmos que se a taxa real de cmbio e o CUT tivessem se situado em um patamar mais competitivo para a manufatura, possivelmente as exportaes teriam aumentado. No caso da economia brasileira, no houve queda das exportaes, mas reduo de sua importncia relativa na demanda, conforme discutido a partir das informaes do grfico 5.

    Adicionalmente, a valorizao da taxa real de cmbio deve ter estimulado, juntamente com o aumento da renda interna (representada no grfico 14 pela renda per capita), a evoluo do quantum das importaes. O perodo no qual ocorre a maior elevao das importaes (a partir de 2003) justamente aquele em que registrado o maior crescimento da renda per capita e a valorizao da taxa real de cmbio.

    Porm, os impactos da valorizao da taxa real de cmbio sobre a demanda agregada e a produo e, consequentemente, sobre a estrutura produtiva da economia,

    33. O custo CUT calculado atravs da diviso do salrio mdio pela produtividade. Na srie que calculamos, adotamos o salrio mdio contratual da Pesquisa Industrial Mensal-Dados Gerais (PIM-DG) para a indstria de transformao e poste-riormente a evoluo da folha de pagamento mdia da Pesquisa Industrial Mensal de Emprego e Salrio (Pimes) (a partir de fevereiro de 2001) para o mesmo setor, encadeando as sries a partir de suas variaes. A produtividade corresponde diviso entre a produo fsica da indstria de transformao, levantada pela Pesquisa Industrial do IBGE, e o nvel de emprego na indstria de transformao, cuja fonte a mesma do salrio mdio. O custo unitrio em dlares obtido atravs da frmula (salrio mdio/(produtividade *taxa nominal de cmbio de final do perodo)).

  • 44

    R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    podem no ser todos negativos, como parecem consistir quando analisamos sua influncia sobre a balana comercial. Por um lado, a valorizao da taxa real de cmbio se constitui em um fator que desestimula as exportaes e pode inibir a produo de comercializveis, principalmente daqueles que so exportados com uma margem de lucro (em reais) mais estreita. Em economias que sofrem de doena holandesa, as vantagens comparativas residem na produo de bens primrios e este cenrio pode gerar um movimento de desindustrializao. Os dados mostram que houve uma reduo da importncia relativa das exportaes enquanto componente da demanda (principalmente para os manufaturados) nos anos mais recentes, em que a valorizao da taxa real de cmbio e o aumento do custo unitrio do trabalho em dlares foram mais significativos, fato discutido anteriormente.

    GRFICO 13Custo unitrio do trabalho (salrio mdio/produtividade)(Em R$ e em US$, ndice: 1995 = 100)

    Fontes: IBGE e Ipea, com clculos dos autores.

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    95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10

    Custo unitrio do trabalho em US$ Custo unitrio do trabalho em R$

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    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    Por outro lado, tal valorizao resulta na elevao do salrio real em dlares (ver grfico 15), pois torna os produtos comercializveis mais baratos no mercado interno, elevando a renda disponvel, e termina estimulando a demanda agregada, o que poderia contribuir para a elevao da produo. Porm, este aumento da demanda agregada, no caso dos comercializveis, pode ser atendido, tambm devido valorizao, por um crescente volume de importaes, fato que vem ocorrendo na economia brasileira, e j aqui.

    Assim, a valorizao da taxa real de cmbio exerce um efeito restritivo sobre a demanda agregada, atravs de seu impacto sobre as exportaes e importaes de manufaturados, e ao mesmo tempo outro impacto expansionista, em funo do aumento do poder de compra que provoca. Ao testar a relao entre a taxa de cmbio e participao da manufatura no PIB, indiretamente avaliaremos qual destes efeitos dever estar predominando na economia brasileira.

    GRFICO 14PIB per capita (Em R$ mil de 2007)

    Fonte: Ipea, com clculos dos autores.

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    R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    Nesta anlise descritiva, buscamos demonstrar que a evoluo da demanda agregada esteve associada ao crescimento das exportaes durante boa parte do perodo considerado, mas que posteriormente o mercado interno assumiu maior relevncia no impulso ao crescimento. O desempenho das importaes, nos anos mais recentes, tambm est influenciando a composio da oferta e, por consequncia, o volume de produo. Discutimos alguns fatores que podem ter contribudo para o cenrio descrito anteriormente, visando compatibilizar aqueles inseridos no modelo de Rowthorn e Ramaswamy (1999), que de certa forma sintetiza os argumentos de vrios outros autores tambm discutidos na apresentao deste trabalho, com os associados ao mercado externo e que possam gerar um processo de desindustrializao, conforme discutido por Palma (2005) e Bresser-Pereira (2008), levando em considerao na anlise da economia brasileira o perodo ps-Plano Real, para o qual os dados esto disponibilizados em uma metodologia padronizada e na classificao necessria anlise.

    Na prxima seo, iremos apresentar o modelo de Rowthorn e Ramaswamy (1999) que nortear nossos testes, com as devidas adaptaes ao nosso foco de pesquisa.

    GRFICO 15Relao salrio/cmbio efetivo (Mdia mvel dos 12 meses, ndice: mdia de 2005 = 100)

    Fonte: Ipea.

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    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    4 O MODELO QUE FORMALIZA O COMPORTAMENTO DA COMPOSIO SETORIAL DA PRODUO

    Nesta seo, formalizaremos a discusso anterior, com base no modelo apresentado por Rowthorn e Ramaswamy (1999) e realizando as adaptaes necessrias para incluir nossa discusso sobre o papel da taxa real de cmbio e do comrcio exterior no processo de determinao da participao da manufatura no valor adicionado. Todas as variveis esto consideradas a preos de um determinado ano-base.

    A produo subdividida em trs setores (agropecuria, manufatura e servios):34

    Y = Ya + Y

    s + Y

    m

    E os componentes da demanda so o consumo, o investimento e a balana comercial:

    Y = C + I + B

    No caso da manufatura, esta identidade corresponde a:

    Ym = C

    m + I

    m + B

    m

    E a participao da manufatura no valor adicionado corresponder a:

    = + + = + + 1m m m m m m m m

    Y C l B C l C BC B IY C Y Y Y C Y I C Y Y

    pois

    = 1C I BY Y Y

    34. Apenas para simplificar, o modelo desconsidera o restante da indstria.

  • 48

    R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    e

    A participao de cada setor no consumo total depender da renda per capita e dos preos relativos. Porm, as variaes na taxa real de cmbio provocam alteraes tanto nos preos relativos como no poder de compra, em moeda nacional, dos consumidores e produtores.35

    = =

    , , , , ,i a si

    m m

    C P Pf y i a s m

    C P P

    onde:

    fm (.) = 1 f

    a(.) f

    s(.)

    =Y

    yN

    y = f (Z, e)

    = ( , ),ij

    Pf W e i j

    P

    Z, W so vetores que compreendem as demais variveis que influem sobre, respectivamente, a renda per capita e os preos relativos; e corresponde taxa real de cmbio.

    A partir de um determinado patamar do nvel de renda per capita, a participao da manufatura no consumo real comea a se estabilizar e posteriormente a cair, em virtude da Lei de Engel e, segundo Rowthorn e Ramaswamy (1999), tambm devido

    35. As variaes nos preos, em funo das alteraes na taxa real de cmbio, podem no ser uniformes entre os setores, em funo das elasticidades-preo distintas para os diversos produtos ofertados na economia. Desta forma, mudanas na taxa real de cmbio podem provocar alteraes nos preos relativos mesmo entre os comercializveis.

    = m mI I IY I Y

  • Texto paraDiscusso1 6 8 1

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    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    ao crescimento mais rpido da produtividade na manufatura que nos servios e queda na taxa de investimento, tambm na manufatura, associados elevao na renda.

    Logo,

    > y*

    A participao do investimento na manufatura no investimento total tambm seria uma funo dos preos relativos, sendo que estes ltimos, da mesma forma que no caso do consumo, podem ser influenciados pela taxa real de cmbio:

    =

    ( ,m a sm

    m m

    l P Pg

    I P P

    E a balana comercial de manufaturados depende da taxa real de cmbio, da demanda externa por manufaturados e da renda per capita:

    = ( , , )m m mB

    h e DE yY

    Os preos relativos, por seu turno, dependem da produtividade relativa e de outras variveis, como o mark-up e o custo unitrio da mo de obra (ambas em termos relativos):36

    >

    = + +

    0 11

    log logm

    mi i

    i

    YLPm

    ZYP L

    Assim, a participao da manufatura no valor adicionado depender da renda per capita, dos preos relativos, do investimento relativo, da taxa real de cmbio e da demanda

    36. A funo logartmica neste caso devido ao formato da funo de produo adotada no modelo por Rowthorn e Ramaswamy (1999).

  • 50

    R i o d e J a n e i r o , d e z e m b r o d e 2 0 1 1

    externa, alm de outros fatores que tambm podem influir no comportamento destas variveis (Z). Dentre estes ltimos, destacaremos em nossa funo a produtividade relativa, por ser uma varivel citada frequentemente e relevante nos argumentos apresentados pelos autores discutidos neste trabalho. Este o nosso modelo terico, adaptado a partir do definido por Rowthorn e Ramaswamy (1999) com o intuito de agregar outras variveis contempladas na discusso anterior:

    =

    , , , , , ,m

    m m mmY

    Y I Lf y e DE ZYY I L

    Pp

    5 TESTES ECONOMTRICOS

    Seguindo o modelo terico anterior, a equao que utilizaremos em nossos testes a seguinte:

    >

    = + + + + 20 1 22

    ln ( ) ,it it it it itt t ti

    OUTSHARE Y Y Z u

    onde lnOUTSHAREit o logaritmo da participao dos setores manufatureiros no

    valor adicionado; Y e Y so o produto per capita em nvel e o produto per capita ao quadrado; S

    i>2diZ

    i so as demais variveis que influenciam na participao dos setores

    manufatureiros no valor adicionado; e ut o termo erro estocstico. No caso, nossa

    equao estimada ser:

    = + + + + +

    + + + +

    20 1 2 3 4

    7 85 6

    ln ( ) ln(investimento relativo) (demanda externa)(produtividade relativa) ln( ) (preco relativo), t

    OUTSHARE Y Y

    TCRE u

    onde TCRE a taxa de cmbio real efetiva para cada setor. As definies de todas as variveis includas nos testes esto relacionadas no anexo C.

    Estamos considerando como varivel explicativa no apenas a renda, mas tambm a renda ao quadrado, pois se o coeficiente desta ltima resultar negativo nos testes, a funo que representa a relao entre a participao da manufatura no valor adicionado e o nvel de renda exibe concavidade negativa. Isso significaria que a partir de um

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    Desindustrializao precoce e sobrevalorizao da taxa de cmbio

    determinado nvel de renda a participao da manufatura no valor adicionado cresceria a taxas decrescentes e, quando a renda se elevasse ainda mais, tal participao passaria a declinar. Assim, poderemos avaliar se a hiptese de que a participao da manufatura no valor adicionado se reduz medida que a economia se torna mais rica pode ser confirmada no caso brasileiro, no perodo considerado nos testes.

    Iremos utilizar em nossos testes a tcnica de painel em que consideraremos como indivduos os 28 setores das Contas Nacionais do IBGE classificados como manufaturados, ao longo de 13 anos, entre 1995 e 2008 (a partir do ano em que os dados das Contas Nacionais esto disponibilizados sob a mesma metodologia). Inclumos apenas os setores manufaturados na anlise porque nosso foco testar a relao entre a participao destes no valor adicionado e as variaes na taxa de cmbio.

    As variveis esto todas calculadas a