desigualdades socioeconómicas na utilização de cuidados de...
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ESCOLA NACIONAL DE SADE PBLICA
UNIVERSIDADE NOVA DE LISBOA
Desigualdades Socioeconmicas na Utilizao de Cuidados de Sade
na Populao com 65 ou mais anos de idade em Portugal
Dados do 4. Inqurito Nacional de Sade 2005/2006
Ricardo Miguel Canhoto Rosado
Orientador: Professor Doutor Julian Perelman
Projecto de Investigao submetido para a obteno do
Grau de Mestre em Gesto da Sade
Ramo de Gesto das Organizaes
Lisboa, Julho de 2014
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A verdadeira generosidade para com o futuro consiste em dar tudo ao presente
Albert Camus
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Agradecimentos
Ao Professor Julian Perelman, por me ter orientado neste trabalho e com a partilha do seu
conhecimento e experincia me ter ajudado a compreender a complexidade e importncia das
questes da equidade nos sistemas de sade. Para alm da sua orientao, agradeo-lhe
sinceramente, mais do que alguma vez consiga verbalizar, todo o incentivo, conselhos,
confiana e o exemplo de humildade que sempre me transmitiu e que foram essenciais ao
culminar do meu percurso acadmico e profissional.
Aos meus colegas do Mestrado em Gesto da Sade, por ajudarem com o trabalho quando foi
necessrio e pela descontraco e amizade quando s isso importava.
Escola Nacional de Sade Pblica, na pessoa do seu corpo docente e demais funcionrios, o
apoio e condies disponibilizadas para a concretizao deste estudo.
Ao Filipe, ao Pedro, Andreia, Filipa, Marta, ao Andr, ao Lus, Isilda, ao Jos, ao Miguel,
ao Tiago, a amizade e companheirismo de sempre.
Ins, o amor e compreenso que pontuaram a redaco desta tese. Aos meus pais, e por
ltimo a todos os amigos e famlia que ajudaram das mais diversas formas
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NDICE GERAL
Resumo ................................................................................................................................................. ix
Abstract ................................................................................................................................................. x
1. INTRODUO .............................................................................................................................. 11
2. REVISO DA LITERATURA ............................................................................................................ 14
2.1 A SADE EM PORTUGAL EVOLUO HISTRICA E ENQUADRAMENTO SOCIODEMOGRFICO .... 14
2.2 SISTEMA DE SADE EM PORTUGAL ................................................................................................. 14 2.2.1 Caracterizao Geral do Sistema de Sade .............................................................................. 14 2.2.2 Enquadramento Legal e Normativo do Sistema de Sade ....................................................... 15 2.2.3 Oferta e Prestao de Cuidados de Sade ................................................................................ 17 2.2.4 O Financiamento da Sade em Portugal .................................................................................. 18 2.2.5 Orientaes regulamentares e estratgicas do Sistema de Sade ........................................... 19
2.3 EQUIDADE EM SADE E NOS CUIDADOS DE SADE ........................................................................ 20 2.3.1 Definio de conceitos .............................................................................................................. 20 2.3.2 Equidade e Igualdade ............................................................................................................... 21 2.3.3 Conceitos clssicos e modernos de equidade .......................................................................... 22 2.3.4 Equidade em Cuidados de Sade .............................................................................................. 26
2.3.4.1 Evidncia cientfica no plano internacional ....................................................................... 26 2.3.4.2 Equidade no acesso a cuidados de sade em Portugal ..................................................... 29 2.3.4.3 Equidade no acesso a cuidados de sade por parte de pessoas com mais de 65 anos .... 39 2.3.4.4 Equidade no acesso a cuidados de sade por parte de pessoas com mais de 65 anos em Portugal ......................................................................................................................................... 43
2.3.5 Polticas e Estratgias de Sade para a Populao Idosa ......................................................... 50 2.3.5.1 Equidade e Envelhecimento .............................................................................................. 50 2.3.5.2 Polticas Nacionais de Sade para a populao idosa em Portugal .................................. 50
3. METODOLOGIA DO ESTUDO ........................................................................................................ 56
3.1 TIPO DE ESTUDO .............................................................................................................................. 56
3.2 OBJECTIVOS DO ESTUDO .................................................................................................................. 56 3.2.1 Objectivo Geral ......................................................................................................................... 56 3.2.2 Objectivos Especficos ............................................................................................................... 56
3.3 AMOSTRA DO ESTUDO ..................................................................................................................... 56
3.4 VARIVEIS DO ESTUDO .................................................................................................................... 57 3.4.1 Variveis sociodemogrficas ..................................................................................................... 57 3.4.2 Variveis socioeconmicas ....................................................................................................... 57 3.4.3 Variveis de Utilizao de Cuidados de Sade.......................................................................... 59 3.4.4 Varivel Estado de Sade .......................................................................................................... 60
3.5 DESENHO DO ESTUDO ...................................................................................................................... 62
4. APRESENTAO DOS RESULTADOS ............................................................................................. 63
4.1 CARACTERIZAO SOCIODEMOGRFICA DA AMOSTRA .................................................................. 63 4.1.1 Distribuio por sexo ................................................................................................................ 63
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4.1.2 Distribuio por grupo etrio ................................................................................................... 63 4.1.4 Distribuio por rendimento em categorias ............................................................................. 64 4.1.5 Distribuio por estatuto face ao emprego .............................................................................. 64 4.1.6 Distribuio por seguro de sade ............................................................................................. 64 4.1.7 Estado de sade auto-reportado .............................................................................................. 65
4.2 UTILIZAO DE CUIDADOS DE SADE .............................................................................................. 65 4.2.1 Consultas, consultas de CSP e consultas de especialidade ....................................................... 65 4.2.2 Motivo principal para ter uma consulta ................................................................................... 66 4.2.3 Nmero de consultas ................................................................................................................ 66 4.2.4 Dias de espera pela consulta mdica ........................................................................................ 67 4.2.5 Tempo de espera no acto da consulta ...................................................................................... 67 4.2.6 Grau de Satisfao em relao s consultas ............................................................................. 68
4.3 ANLISE UNIVARIADA DAS DESIGUALDADES SOCIOECONMICAS NA UTILIZAO DE CUIDADOS DE SADE ............................................................................................................................................... 68
4.3.1 Probabilidade de ter alguma consulta ...................................................................................... 68 4.3.2 Probabilidade de ter uma consulta de CSP ............................................................................... 70 4.3.3 Probabilidade de ter uma consulta de especialidade ............................................................... 71 4.3.4 Dias de espera at obter consulta ............................................................................................ 73 4.3.5 Tempo de espera no acto da consulta ...................................................................................... 75 4.3.6 Grau de satisfao em relao s consultas ............................................................................. 78 4.3.7 Nmero de consultas ................................................................................................................ 80 4.3.8 Nmero de consultas de CSP .................................................................................................... 82 4.3.9 Nmero de consultas de especialidade .................................................................................... 83
4.4 ANLISE MULTIVARIADA DAS DESIGUALDADES SOCIOECONMICAS NA UTILIZAO DE CUIDADOS DE SADE MODELO DE REGRESSO LINEAR MLTIPLA ..................................................................... 85
4.4.1 Anlise multivariada da utilizao de consultas ....................................................................... 85 4.4.2 Anlise multivariada da utilizao de consultas de CSP ........................................................... 87 4.4.3 Anlise multivariada da utilizao de consultas de especialidade ........................................... 88
5. ANLISE E DISCUSSO DOS RESULTADOS .................................................................................... 90
5.1 DISCUSSO DAS DESIGUALDADES SOCIOECONMICAS NA UTILIZAO DE CUIDADOS DE SADE ANLISE UNIVARIADA ............................................................................................................................ 90
5.2 DISCUSSO DAS DESIGUALDADES SOCIOECONMICAS NA UTILIZAO DE CUIDADOS DE SADE ANLISE MULTIVARIADA ........................................................................................................................ 93
5.3 LIMITAES DO ESTUDO .................................................................................................................. 99
5.4 CONCLUSES E FUTURAS LINHAS DE INVESTIGAO .................................................................... 100
6. CONCLUSO .............................................................................................................................. 102
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .......................................................................................................... 104
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NDICE DE QUADROS E TABELAS
Quadro 1 Variveis e categorias do estudo ............................................................................................ 61 Quadro 2 - Quadro sntese da anlise univariada s desigualdades socioeconmicas na utilizao de
cuidados de sade (sexo masculino) ..................................................................................................... 90 Quadro 3 - Quadro sntese da anlise univariada s desigualdades socioeconmicas na utilizao de
cuidados de sade (sexo feminino) ........................................................................................................ 91 Quadro 4 Quadro sntese da anlise multivariada s desigualdades socioeconmicas na utilizao de
cuidados de sade (sexo masculino) ..................................................................................................... 93 Quadro 5 Quadro sntese da anlise multivariada s desigualdades socioeconmicas na utilizao de
cuidados de sade (sexo feminino) ........................................................................................................ 94
Tabela 1 - Distribuio por sexo ................................................................................................................. 63 Tabela 2 - Distribuio por grupo etrio segundo o sexo ........................................................................... 63 Tabela 3 - Nvel de escolaridade ................................................................................................................ 63 Tabela 4 - Distribuio por rendimento em categorias ............................................................................... 64 Tabela 5 - Estatuto face ao emprego ......................................................................................................... 64 Tabela 6 - Cobertura de seguro de sade .................................................................................................. 64 Tabela 7 - Estado de sade auto-reportada ............................................................................................... 65 Tabela 8 - Probabilidade de ter consultas .................................................................................................. 65 Tabela 9 - Motivo principal para ter consulta .............................................................................................. 66 Tabela 10 - Outro motivo para ter consulta ................................................................................................ 66 Tabela 11 - Nmero de consultas ............................................................................................................... 66 Tabela 12 - Dias de espera at obter consulta ........................................................................................... 67 Tabela 13 - Motivo da espera em obter consulta........................................................................................ 67 Tabela 14 - Tempo de espera no acto da consulta .................................................................................... 67 Tabela 15 - Grau de satisfao aps a consulta ........................................................................................ 68 Tabela 16 - Probabilidade de ter alguma consulta por nvel de escolaridade ............................................ 68 Tabela 17 - Probabilidade em ter alguma consulta por rendimento em categorias .................................... 69 Tabela 18 - Probabilidade em ter alguma consulta em funo do estatuto face ao emprego .................... 69 Tabela 19 - Probabilidade de ter uma consulta de CSP por nvel de escolaridade .................................... 70 Tabela 20 - Probabilidade de ter uma consulta de CSP por rendimento em categorias ............................ 70 Tabela 21 - Probabilidade em ter uma consulta de CSP em funo do estatuto face ao emprego ............ 71 Tabela 22 - Probabilidade de ter alguma consulta de especialidade por nvel de escolaridade ................. 71 Tabela 23 - Probabilidade em ter uma consulta de especialidade por rendimento em categorias ............. 72 Tabela 24 - Probabilidade de ter uma consulta de especialidade em funo do estatuto face ao emprego .................................................................................................................................................................... 72 Tabela 25 - Dias de espera at obter consulta em funo do nvel de escolaridade na populao masculina .................................................................................................................................................... 73 Tabela 26 - Dias de espera at obter consulta em funo do nvel de escolaridade na populao feminina .................................................................................................................................................................... 73 Tabela 27 - Dias de espera at obter consulta em funo do rendimento em categorias na populao masculina .................................................................................................................................................... 74 Tabela 28 - Dias de espera at obter consulta em funo do rendimento em categorias na populao feminina ...................................................................................................................................................... 74 Tabela 29 - Dias de espera at obter consulta em funo do estatuto face ao emprego na populao masculina .................................................................................................................................................... 74 Tabela 30 - Dias de espera at obter consulta em funo do estatuto face ao emprego na populao feminina ...................................................................................................................................................... 75 Tabela 31 - Tempo de espera no acto da consulta em funo do nvel de escolaridade na populao masculina .................................................................................................................................................... 75 Tabela 32 - Tempo de espera no acto da consulta em funo do nvel de escolaridade na populao feminina ...................................................................................................................................................... 75 Tabela 33 - Tempo de espera no acto da consulta em funo do rendimento em categorias na populao masculina .................................................................................................................................................... 76
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Tabela 34 - Tempo de espera no acto da consulta em funo do rendimento em categorias na populao feminina ...................................................................................................................................................... 76 Tabela 35 - Tempo de espera no acto da consulta em funo do estatuto face ao emprego na populao masculina .................................................................................................................................................... 77 Tabela 36 - Tempo de espera no acto da consulta em funo do estatuto face ao emprego na populao feminina ...................................................................................................................................................... 77 Tabela 37 - Grau de satisfao pela consulta em funo do nvel de escolaridade na populao masculina .................................................................................................................................................................... 78 Tabela 38 - Grau de satisfao pela consulta em funo do nvel de escolaridade na populao feminina .................................................................................................................................................................... 78 Tabela 39 - Grau de satisfao pela consulta em funo do rendimento em categorias na populao masculina .................................................................................................................................................... 79 Tabela 40 - Grau de satisfao pela consulta em funo do rendimento em categorias na populao feminina ...................................................................................................................................................... 79 Tabela 41 - Grau de satisfao pela consulta em funo do estatuto face ao emprego na populao masculina .................................................................................................................................................... 79 Tabela 42 - Grau de satisfao pela consulta em funo do estatuto face ao emprego na populao feminina ...................................................................................................................................................... 80 Tabela 43 - Nmero mdio de consultas em funo do nvel de escolaridade .......................................... 80 Tabela 44 - Nmero mdio de consultas em funo do rendimento em categorias ................................... 81 Tabela 45 - Nmero mdio de consultas em funo do estatuto face ao emprego .................................... 81 Tabela 46 - Nmero mdio de consultas de CSP em funo do nvel de escolaridade ............................. 82 Tabela 47 - Nmero mdio de consultas de CSP em funo do rendimento ............................................. 82 Tabela 48 - Nmero mdio de consultas de CSP em funo do estatuto face ao emprego ...................... 83 Tabela 49 - Nmero mdio de consultas de especialidade em funo do nvel de escolaridade ............... 83 Tabela 50 - Nmero mdio de consultas de especialidade em funo do rendimento em categorias ....... 84 Tabela 51 - Nmero mdio de consultas de especialidade em funo do estatuto face ao emprego ........ 84 Tabela 52 - Anlise multivariada da utilizao de consultas ...................................................................... 85 Tabela 53 - Anlise multivariada da utilizao de consultas de CSP ......................................................... 87 Tabela 54 - Anlise multivariada da utilizao de consultas de especialidade ........................................... 88
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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
ACSS Administrao Central do Sistema de Sade, I.P. ARS Administrao Regional de Sade CSP Cuidados de Sade Primrios EUA Estados Unidos da Amrica F Feminino INE Instituto Nacional de Estatstica INS Inqurito Nacional de Sade ISCED - International Standard Classification of Education M Masculino MCDT Meios Complementares de Diagnstico e Teraputica OCDE Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico OMS Organizao Mundial de Sade PIB Produto Interno Bruto SNS Servio Nacional de Sade UE Unio Europeia USF Unidade de Sade Familiar
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Resumo INTRODUO: A equidade em cuidados de sade constitui uma prioridade das polticas de sade, tendo vrios estudos descrito uma iniquidade que geralmente favorece os indivduos
com maior rendimento e nvel educacional. Este estudo visa caracterizar as desigualdades
socioeconmicas na utilizao de cuidados de sade na populao com 65 ou mais anos de
idade, dadas as suas caractersticas, maior vulnerabilidade e crescente peso demogrfico na
populao.
METODOLOGIA: Atravs de dados do INS, procedeu-se anlise univariada e multivariada por regresso linear mltipla para avaliao das desigualdades socioeconmicas na utilizao
de cuidados de sade em 8698 indivduos.
RESULTADOS: Identifica-se um padro de desigualdade na utilizao de cuidados de sade indivduos com maior rendimento e nvel de escolaridade utilizam em mdia mais consultas de
especialidade; ocorrendo o inverso nas consultas de CSP. Com ajustamento pela necessidade,
atravs do estado de sade auto-reportado, observa-se um padro de iniquidade no sexo
masculino relativamente s consultas em geral e consultas de CSP.
DISCUSSO E CONCLUSES: A iniquidade na utilizao de cuidados de sade, apesar de no constituir a nica causa, pode determinar maior iniquidade em sade, pelo que relevante
o seu estudo. Os resultados alcanados podem ser justificados pelas caractersticas do SNS,
assim como pelas isenes de taxas moderadoras, rede social, outros indicadores econmicos,
ou ainda pelo prprio contexto de vida do individuo. Torna-se fundamental prosseguir a
investigao acerca da equidade, assim como promover uma ampla reflexo sobre os desafios
futuros do sistema de sade, que permitam preservar a sua sustentabilidade e princpios
fundadores.
PALAVRAS-CHAVE: desigualdades socioeconmicas, equidade, equidade horizontal, polticas de sade, idosos, Inqurito Nacional de Sade.
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Abstract
INTRODUCTION: Healthcare equity is considered a major goal in respect of health policies. Many researchers have analyzed health equity and healthcare equity, describing the existence of horizontal inequality that favors the individuals with higher income and education level. This study aims to characterize socioeconomic inequalities in healthcare utilization among population aged 65 or over given its characteristics, higher vulnerability and increasing demographic weight in the population. METHODS: It was carried out both univariate analysis and multivariate analysis by multiple linear regression using National Health Survey data in order to assess socioeconomic inequalities in healthcare utilization in 8698 individuals. RESULTS: Main results demonstrate an inequality pattern in healthcare utilization individuals with higher income and education have more specialist visits and individual with lower incomes and education have more general practice visits. After risk-adjustment, towards self-perceived health status, is observed an horizontal inequality pattern between male individuals concerning GP visits and overall visits. DISCUSSION AND CONCLUSIONS: Healthcare inequality, despite not being the only cause, can determine higher health inequality, which recommends further research on this field. The results obtained may be justified by National Health Service features, exemption of user charges, social network, other socioeconomic figures, as well as the individual life context. Thus, it is essential to carry on with the research on the issue of equity, while promoting a wide discussion on the future challenges of the health system to ensure its sustainability and founding principles. KEY-WORDS: socioeconomic inequalities, equity, horizontal equity, health policies, elderly, National Health Survey.
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1. INTRODUO
O presente trabalho de investigao insere-se no mbito da Unidade Curricular de
Projecto de Investigao, referente ao segundo ano do VIII Curso de Mestrado em Gesto da
Sade da Escola Nacional de Sade Pblica da Universidade Nova de Lisboa.
Intitulado sob a forma de Desigualdades Socioeconmicas na Utilizao de Cuidados de Sade na populao com mais de 65 ou mais anos de idade em Portugal, faz com se tenham constitudo como objectivos acadmicos primordiais ao presente estudo a reflexo crtica sobre
a utilizao de cuidados de sade por parte desse segmento especfico da populao e a
construo de hipteses explicativas para as tendncias de consumo deste bem especfico que
a sade. Alicerado sobre a escolha criteriosa de evidncia cientfica diversificada e
pluridisciplinar, pretende-se consubstanciar o caso particular em estudo com outras
publicaes e anlises de diferentes domnios, incidindo sobre outros nveis de cuidados,
outras realidades sociodemogrficas, e inclusivamente outras perspectivas metodolgicas.
A eliminao das desigualdades em cuidados de sade e, consequentemente, no estado
de sade das populaes tem sido uma finalidade major dos sistemas de sade modernos
(ANAND, S.; 2002; BORREL, C.; et al.; 2000; MACKENBACH, J.P.; et al.; 2008). A temtica do processo de envelhecimento tem alertado cada vez mais os profissionais de diferentes reas
de investigao cientfica, bem como da prpria sociedade, uma vez que ao longo das ltimas
dcadas, o mundo tem assistido ao aumento significativo do nmero de idosos, motivado pelo
aumento da esperana mdia de vida, entre outros factores de natureza demogrfica (INE;
2012; PORDATA; 2013). O envelhecimento consiste num fenmeno biopsicossocial que se
manifesta de vrias formas, passando pelo envelhecimento fsico, psicolgico ou social. Este
conjunto de modificaes ir afectar o funcionamento humano em diferentes reas e contextos,
repercutindo-se nas actividades dirias, na autonomia, na sade fsica e mental, entre outros
domnios (FERNANDEES, A. A.; 2005; SANTANA, P.; 2002).
O envelhecimento, para alm dos aspectos relacionados com alteraes biolgicas e
psicolgicas, um processo desencadeado pela cultura e contexto social, pelo que entendido
como uma alterao de atitudes e mentalidade que resulta das interaces que se vo
estabelecendo entre os diversos grupos etrios e as suas condies de vida (FERNANDEES,
A. A.; 2005; SANTANA, P.; 2002).
Em Portugal, e semelhana dos restantes estados europeus, observa-se um marcado
envelhecimento da populao devido conjugao simultnea de determinados
comportamentos de tendncia demogrfica, tais como a diminuio significativa da taxa de
natalidade, o decrscimo generalizado das taxas de mortalidade e o aumento gradual da
esperana mdia de vida nascena. Assim, surge a necessidade de uma abordagem
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multidimensional e compreensiva dos problemas dos idosos em funo da sua condio fsica
e funcional, mental e socioeconmica (CAMPOS, A. C.; 2001; FERNANDES, A. C.; et al.; 2012).
Actualmente assiste-se a uma profunda alterao do tecido econmico, social e cultural,
mas sobretudo a uma persistente transio demogrfica, traduzida pela acentuada inverso da
pirmide etria, o que configura, por si s, novos paradigmas no que concerne s relaes
intergeracionais, familiares e comunitrias. Portugal tem vindo a tornar-se um pas cada vez
mais envelhecido, onde o peso dos idosos face percentagem de jovens est a aumentar
exponencialmente, em parte devido aos factores demogrficos anteriormente expostos (INE;
2012; PORDATA; 2013).
Assim, e considerando que a populao idosa apresenta uma tendncia
proporcionalmente crescente a nvel nacional, impe-se uma reformulao de estratgias que
visem mitigar as desigualdades socioeconmicas em sade e no acesso aos cuidados de
sade, pelo que o seu conhecimento e futuras investigaes revestem-se de particular
importncia. Torna-se claro e relevante que este seja um autntico desafio de futuro, no
meramente acadmico mas sobretudo geracional pelo impacto social e econmico que estes
fenmenos implicam a mdio e longo prazo (MENDES, F. R.; 2011). Deste modo, e por
conseguinte, torna-se pertinente uma abordagem mais detalhada sobre as questes das
desigualdades socioeconmicas e iniquidade ao nvel do segmento populacional mais idoso,
considerando o seu crescente peso demogrfico no caso dos pases desenvolvidos, tentando
compreender e enquadrar socialmente este fenmeno. Actualmente, unnime a existncia de
um padro de iniquidade em cuidados de sade em termos da populao em geral, no entanto
persistem algumas dvidas, e estudos menos consistentes, acerca da populao idosa,
nomeadamente em Portugal. A temtica da equidade na utilizao de cuidados de sade
hoje, mais do que um mero imperativo acadmico, uma responsabilidade social,
consubstanciada pelas condies intrnsecas ao envelhecimento e respectiva situao de
extrema vulnerabilidade em que se encontram muitos destes indivduos, em resultado de
constrangimentos relacionados com contextos de maior isolamento, a ruralidade decorrente de
movimentos migratrios e particularidades geogrficas, a maior dependncia de mecanismos
de suporte social, ou ainda um quadro acentuado de comorbilidades que geralmente se lhe
encontra associado.
A equidade em sade e na utilizao de cuidados de sade, vector central de reflexo
deste trabalho, traduz-se por um valor de justia distributiva e consiste na preocupao em
reduzir as desigualdades de oportunidades para ser saudvel, associado principalmente a grupos sociais menos privilegiados como as pessoas com menores recursos financeiros e materiais, os grupos raciais, tnicos ou religiosos, mulheres e residentes em reas rurais (BRAVEMAN; GRUSKIN; 2003). Tambm seria pertinente, do ponto de vista da investigao, e
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face aos pressupostos apresentados, acrescentar o subgrupo populacional dos idosos, ou
pessoas com mais de 65 anos, dada a sua representatividade demogrfica e influncia
exercida em termos de sustentabilidade social e econmica para o sistema de sade em geral.
Em Portugal existe registo de alguma evidncia acerca de equidade na utilizao de
cuidados de sade em termos genricos. Consolidou-se a noo de que o pas apresentou
uma evoluo significativa ao nvel dos principais indicadores de sade ao longo das ltimas
dcadas, mas regista-se alguma inconsistncia no conhecimento relativo a desigualdades
socioeconmicas inerentes a esses mesmos indicadores. Sob uma perspectiva global, pode
afirmar-se que o pas apresenta um padro de iniquidade que tende a favorecer os grupos
socioeconmicos mais elevados, dos grandes centros urbanos e com maiores ndices de
escolaridade (BAGO DUVA, T.; 2010; FURTADO, C.; PEREIRA, J.; 2010; VAN DOORSLAER,
E.; MASSERIA, C.; 2004; VAN DOORSLAER, E.; MASSERIA, C.; KOOLMAN, X.; 2006).
Todavia, e no que diz respeito equidade em cuidados de sade por parte da populao idosa
em Portugal, o conhecimento neste domnio escasso e praticamente inconsistente, o que
refora a pertinncia de uma anlise mais pormenorizada e com um foco particular neste grupo
populacional, pela sua representatividade demogrfica e pelas questes de sustentabilidade e
adaptao de cuidados que devem ser asseguradas e monitorizadas pelo sistema de sade
portugus
A fonte de dados para o desenvolvimento deste estudo foi o 4. Inqurito Nacional de
Sade 2005/2006. Os objectivos gerais consistem em comparar a utilizao de cuidados de
sade entre a populao idosa, ou seja, com 65 ou mais anos de idade, por nvel de cuidados
e de acordo com parmetros socioeconmicos. A anlise do estudo incidir sobre quais os
constrangimentos na utilizao para cada nvel de cuidados de sade cuidados de sade
primrios, e cuidados secundrios ou consultas de especialidade, de acordo com alguns
parmetros sociodemogrficos que se consideram relevantes do ponto de vista da
investigao. Os objectivos especficos remetem para a caracterizao do subgrupo
populacional preconizado pelo estudo em termos de rendimento, nvel de escolaridade e
estatuto face ao emprego, assim como a verificao de uma possvel associao entre nvel
socioeconmico e grau de utilizao de cuidados de sade em Portugal; ou ainda a anlise do
grau de equidade na utilizao de cuidados de sade por parte deste segmento populacional.
O presente trabalho desenvolver-se- segundo quatro blocos principais: inicialmente
ser feito o enquadramento terico e reviso da literatura sobre as principais referncias
cientficas disponveis e quadro conceptual que norteia a abordagem a esta problemtica;
segue-se a componente metodolgica que alicerou o processo de investigao; a
apresentao dos resultados decorrentes das inferncias estatsticas; e por ltimo uma
discusso crtica dos principais resultados produzidos pelo estudo.
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2. REVISO DA LITERATURA
2.1 A SADE EM PORTUGAL EVOLUO HISTRICA E ENQUADRAMENTO SOCIODEMOGRFICO
Ao longo das ltimas quatro dcadas, e na sequncia de uma fase de consolidao
democrtica, foi iniciado um perodo de reestruturao dos servios de sade, em que Portugal
registou progressos notrios em termos da sade da sua populao por via da ampliao da
oferta de cuidados de sade e pelo acrscimo de recursos alocados ao sistema de sade
(BARROS, P.; MACHADO, S.; SIMES, J.; 2011). Durante este perodo temporal, o pas
registou concomitantemente um elevado padro de desenvolvimento ao nvel dos principais
indicadores do seu sistema de sade, como por exemplo a esperana mdia de vida
nascena ou a taxa de mortalidade infantil. Nesta fase observou-se algum paralelismo em
termos de polticas de sade, expressas em medidas como a transferncia generalizada de
hospitais para a esfera do estado, a criao do Servio Nacional de Sade (SNS), a publicao da Lei de Bases da Sade, entre outras. Assim, desde 1979, o sistema de prestao de
cuidados de sade baseia-se na estrutura de um SNS, com seguro pblico, cobertura universal, acesso tendencialmente gratuito no momento de utilizao de servios e cujo
financiamento assegurado atravs da cobrana de impostos (OLIVEIRA, M.; 2010).
2.2 SISTEMA DE SADE EM PORTUGAL 2.2.1 Caracterizao Geral do Sistema de Sade
Segundo a Constituio da Repblica Portuguesa, o SNS assenta a sua matriz fundacional num sistema de organizao descentralizado, pautado pela oferta pblica da
maioria de cuidados de sade primrios e hospitalares (OLIVEIRA, M.; 2010).
Outro enquadramento jurdico relevante prende-se com a Lei de Bases da Sade, a qual
pressupe um SNS universal quanto populao abrangida; a prestao integral de cuidados globais ou a garantia da sua prestao; a gratuitidade tendencial para os utentes de acordo
com as suas condies econmicas e sociais; a garantia de equidade no acesso com o
propsito normativo de atenuar os efeitos das desigualdades econmicas, geogrficas e
quaisquer outras no acesso aos cuidados de sade; e um modelo de organizao regional com
gesto descentralizada e participada (BARROS, P.P.; 2007).
Embora o princpio da equidade, patente nos principais documentos legislativos que
caracterizam o sistema de sade portugus, esteja sublinhado atravs dos princpios
normativos da universalidade, generalidade e gratuitidade tendencial, o desempenho do
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sistema de sade tem merecido a ateno por parte de algumas organizaes internacionais
como a Organizao Mundial de Sade, a Comisso Europeia ou a Organizao para a
Cooperao e Desenvolvimento Econmico. Pelas repercusses que a iniquidade no acesso e
utilizao de cuidados de sade pode representar em termos dos resultados em sade nas
populaes, torna-se importante reforar as linhas de investigao nesta rea do
conhecimento, permitindo o suporte de deciso no plano das polticas de sade (CAMPOS, A.
C.; SIMES, J.; 2011; FURTADO, C.; 2013; MACKENBACH, J. P.; 2006; WHO; 2010)
Actualmente, o sistema de sade portugus caracteriza-se pela coexistncia de trs
sistemas sobrepostos: o Servio Nacional de Sade, planos de seguros pblicos e privados
especficos para determinadas profisses (subsistemas de sade), e que cobrem cerca de um
quarto da populao, e seguros de sade privados cuja cobertura se estima entre os 10 e os 20% da populao (BARROS, P.; MACHADO, S.; SIMES, J.; 2011)
Em termos gerais, o sistema de prestao de cuidados de sade em Portugal consiste
numa rede mista entre prestadores pblicos e privados, cada um dos quais ligado ao Ministrio
da Sade e aos pacientes de um modo prprio. A maioria da populao tem o direito de
escolha entre dois mecanismos de seguros de sade, SNS ou seguro privado, podendo utilizar ambos simultaneamente. De acordo com os dados mais recentes do Inqurito Nacional de
Sade, entre 20% a 25% da populao encontra-se protegida por um outro seguro de sade e/ou um subsistema de sade determinado a partir da ocupao ou profisso do indivduo. Os
prestadores de cuidados de sade podem ser de natureza pblica ou privada, com diversos
protocolos, relativamente ao seu financiamento, e que variam desde os tradicionais oramentos
baseados no histrico at pagamentos prospectivos. Devem considerar-se ainda os
pagamentos directos, do acrnimo ingls out of pocket, e que se estimam representar uma parte significativa dos fluxos financeiros no que concerne aos cuidados de sade (BARROS,
P.; MACHADO, S.; SIMES, J.; 2011, INS 2008; OECD; 2013).
2.2.2 Enquadramento Legal e Normativo do Sistema de Sade
luz do enquadramento legal em vigor em Portugal, e segundo a Constituio da
Repblica Portuguesa, ningum pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razo de ascendncia, sexo, raa, lngua, territrio de origem, religio, convices polticas ou ideolgicas, instruo, situao econmica, condio social ou orientao sexual (Art. 13, n. 2). Ainda de acordo com o mesmo documento constitucional todos tm o direito proteco da sade e o dever de a
defender e promover (Art. 64, n. 1).
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Os princpios orientadores da Lei de Bases da Sade estipulam que a proteco da sade constitui um direito dos indivduos e da comunidade, que se efectiva pela responsabilidade conjunta dos cidados, da sociedade e do estado, em liberdade de procura e de prestao de cuidados, nos termos da Constituio e da lei, e que o estado promove e
garante o acesso de todos cidados aos cuidados de sade, nos limites dos recursos humanos, tcnicos e financeiros disponveis. A Lei de Bases da Sade (Lei 48/90) defende ainda que o estado promove e garante o acesso de todos os cidados aos cuidados de sade
e que o Servio Nacional de Sade deve garantir a equidade no acesso, de modo a atenuar os
efeitos das desigualdades econmicas, geogrficas e quaisquer outras no acesso aos cuidados. Por analogia, depreende-se que a equidade e o acesso universal aos cuidados de
sade so salvaguardados em Portugal atravs do Servio Nacional de Sade e pela Lei de
Bases da Sade (Lei 56/79; Lei 48/90).
Ainda de acordo com este diploma, o sistema de sade assenta nos Cuidados de Sade
Primrios, devendo localizar-se junto das populaes, em permanente articulao com os
diferentes nveis de cuidados de sade.
De acordo com a Constituio da Repblica Portuguesa, todos tm direito proteco da sade e o dever de a defender e promover. Por outro lado, incumbe prioritariamente ao Estado garantir o acesso de todos os cidados, independentemente da sua condio econmica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitao (...), garantir uma racional e eficiente cobertura de todo o pas em recursos humanos e unidades de sade e orientar a sua aco para a socializao dos custos dos cuidados mdicos e medicamentos (Art. 64.).
Esta relevncia atribuda pelo quadro normativo legal em vigor, enfatizada atravs da
Lei de Bases da Sade, Lei n. 48/90, de 24 de Agosto, ao estabelecer que objectivo fundamental obter a igualdade dos cidados no acesso aos cuidados de sade, seja qual for a sua condio econmica e onde quer que vivam, bem como garantir a equidade na distribuio de recursos e na utilizao de servios.
Em forma de concluso, pode afirmar-se que embora o sistema de sade em Portugal,
sobretudo na forma do Servio Nacional de Sade, assuma o princpio da equidade, estima-se
que o mesmo pode nem sempre estar assegurado no domnio da equidade de acesso e
financiamento dos cuidados de sade, pelo que tem constitudo objecto de estudo das mais
diversas organizaes.
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2.2.3 Oferta e Prestao de Cuidados de Sade
At ao incio da dcada de oitenta, a prestao de cuidados de sade em Portugal era
realizada essencialmente por organizaes pblicas, designadamente por hospitais e centros
de sade pblicos. No entanto, a iniciativa privada de prestao de cuidados de sade
desenvolveu-se e aumentou a sua capacidade de prestao de modo a responder
necessidade de cuidados dos utentes, consolidando a sua posio no sector (DINIS, A.; 2008).
Actualmente, a prestao de cuidados de sade caracteriza-se por ser um processo em
permanente mudana, em consequncia dos constantes avanos tecnolgicos, das
modificaes sociais e polticas e dos constrangimentos econmicos. Assim, reconhece-se que
o impacto econmico global da prestao de cuidados de sade tem sido condicionado por
inmeros factores, de entre os quais se destacam o envelhecimento, a incorporao de novas
tecnologias, ou a repartio dos recursos por um nmero cada vez maior de prestadores e de
consumidores (BARROS, P.; MACHADO, S.; SIMES, J.; 2011; FERREIRA, J; 2009; SIMES,
J.; et al.; 2010)
O acesso prestao de cuidados de sade de qualidade populao de uma
respectiva rea geogrfica garantido atravs das Administraes Regionais de Sade (ARS), adequando os recursos disponveis s necessidades em sade (BARROS, P.; MACHADO, S.;
SIMES, J.; 2011).
Em todo o caso, discutir a questo do papel do estado no captulo da oferta de servios
e prestao de cuidados de sade constitui um domnio complexo e de abordagem
multifactorial. Neste mbito, observa-se que a oferta de cuidados de sade em Portugal sofreu
grandes alteraes e tem sido influenciada por factores to diversos como a legislao que
define a estrutura do SNS portugus, o sistema de financiamento, a evoluo demogrfica e as caractersticas da populao, o crescimento econmico, o investimento pblico e privado no
sector da sade e a dinmica do sector privado (BARROS, P. P.; 2007).
De acordo com os pressupostos jurdicos que regulam o sistema de sade, a Lei de
Bases da Sade compreende um sistema de cuidados de sade misto, com prestadores
pblicos e privados na prestao de cuidados de sade, o que permite definir o sistema de
sade como uma rede nacional de oferta de cuidados de sade.
A prestao de cuidados de sade no nosso pas beneficiou nas dcadas recentes de
um aumento aprecivel dos nveis de produo e qualidade, mas apresenta ainda registos
inferiores mdia da OCDE e da UE-27, quer em matria de produtividade, quer de qualidade, disponibilidade e acessibilidade. Hoje em dia, Portugal apresenta indicadores de sade e bem-
estar (esperana mdia de vida nascena, taxas de mortalidade e de mortalidade infantil)
muito satisfatrios, o que configura o sistema de sade portugus como um caso de boas
prticas a nvel internacional. Todavia, os nveis de eficincia-custo na prestao de cuidados
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hospitalares apresentam-se desfavorveis face a pases de rendimento per capita prximo do nosso pas (Eslovnia, Israel, Coreia do Sul), apesar de favorveis em relao a pases de
elevado rendimento per capita (EUA, Itlia, Frana, Canad, Sucia). Ocorreu no pas um reforo claro dos recursos humanos, equipamentos e tecnologias (em quantidade e qualidade)
disponveis para a prestao de cuidados de sade, num contexto de progressiva
integrao/racionalizao, concentrao e qualificao das unidades hospitalares e de sade
(HEALTH CLUSTER PORTUGAL; 2010)
2.2.4 O Financiamento da Sade em Portugal
O financiamento do SNS processa-se segundo as caractersticas de fundos da
populao, designadamente a cobrana de impostos, a despesa privada familiar, os seguros
privados e o seguro social (SIMES, J.; et al.; 2000).
O fundo de financiamento dos subsistemas pblicos e privados muito semelhante entre
si, baseando-se a sua contribuio no rendimento dos seus beneficirios e apresentando
simultaneamente um financiamento directo e indirecto do estado (SIMES, J.; et al.; 2007).
Em Portugal, a percentagem dos gastos com a sade no PIB era, em 1980, de 5,6%, ao passo que em 2004 era j de 10%. Esta percentagem superior ao valor mdio da UE15 (9%) e da OCDE (8,9%). No perodo compreendido entre 1980 e 2004, Portugal duplicou o peso dos gastos pblicos com sade face ao PIB (3,6% em 1980, 7,2% em 2004). Os ritmos de crescimento da despesa em sade criaram, na passada dcada, instabilidade nas
transferncias oramentais para o SNS. A manuteno dos ritmos histricos das ltimas dcadas configura uma situao de insustentabilidade financeira e, face s necessidades
crescentes de cuidados de sade, exige uma adequada organizao na captao de fundos
(COMISSO PARA A SUSTENTABILIDADE DO FINANCIAMENTO DO SNS; 2007).
As despesas privadas dos cidados residentes em Portugal com entidades privadas
representaram cerca de 22,5% da despesa total em sade em 2004. Este valor contrasta fortemente com os pagamentos directos das famlias em sede de prestao pblica, inferiores
a 1%. Ressalta daqui que os co-pagamentos exigidos s famlias na prestao pblica tm uma muito reduzida expresso em termos de contribuio para o financiamento. no sector do
medicamento que a participao dos utentes relativamente elevada, o que se deve, por um
lado, a taxas de comparticipao comparativamente baixas, com poucas isenes de
pagamento, e por outro lado, a nveis de utilizao de frmacos relativamente elevados. A
anlise dos dados de inquritos aos oramentos familiares demonstrou ainda que os
pagamentos directos, na sua globalidade, so altamente regressivos no financiamento do
sistema (COMISSO PARA A SUSTENTABILIDADE DO FINANCIAMENTO DO SNS; 2007).
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O financiamento da sade ao longo dos ltimos tem sido marcado pela persistncia em
oramentos reconhecidamente insuficientes do ponto de vista operacional, dfices acumulados
e uma certa ausncia de instrumentos de gesto e responsabilizao com capacidade de
inverter esta tendncia (SIMES, J.; et al.; 2007). No que concerne aos gastos relacionados com a sade, importante reconhecer que estes tm crescido a um ritmo superior ao
crescimento econmico, e acerca do qual se podem apontar alguns factores conducentes a
este aumento das despesas em sade, nomeadamente os factores demogrficos e do
envelhecimento, presso de natureza tecnolgica e desenvolvimento da medicina, induo da
procura, crescimento econmico e o aumento dos recursos de cuidados de sade (CASTILHO,
A; 2008; SIMES, J.; 2007).
Em suma, e como forma de aferir o peso especfico do sector pblico no financiamento
dos cuidados de sade em Portugal, importa registar dois factos a despesa corrente pblica
diminui significativamente desde 2011 e a despesa corrente privada assume uma tendncia contrria. De acordo com os dados disponibilizados pelo INE, durante os anos de 2011 e 2012 a despesa corrente em sade diminuiu a um ritmo muito superior ao do PIB, invertendo a tendncia de crescimento registada anteriormente. Por seu turno, a despesa corrente privada
apresentou uma taxa de crescimento mdio anual de 2,7% entre 2007 e 2012. No mesmo perodo, a despesa corrente pblica decresceu, em mdia, 1,6%. Assim, pode concluir-se que a despesa pblica em sade tem vindo a acentuar a sua perda de importncia relativa face
despesa corrente privada, atingindo no final do ano de 2012 os 62,6% da despesa corrente total (INE; 2012).
Pode deste modo concluir-se que o Estado continua a ser responsvel pela maioria das
despesas registadas em sade, seja em matria da operacionalizao do SNS e/ou dos subsistemas de sade, mas tem vindo a perder alguma significncia estatstica face s
despesas correntes privadas em virtude do aumento das taxas moderadoras, das diminuies
de comparticipaes em medicamentos e do menor investimento pblico na gesto dos
equipamentos e organizao dos cuidados de sade.
2.2.5 Orientaes regulamentares e estratgicas do Sistema de Sade
Qualquer sistema de sade assenta o seu regular funcionamento, no mbito da
prestao de cuidados de sade, num quadro estvel e participado de princpios e valores, que
em parte derivam dos pressupostos constitucionais pelos quais o mesmo se regula, mas por
outro lado em funo de um conjunto de estratgias e planos de aco inscritos num conjunto
de documentos orientadores e que visam a execuo das polticas de sade. Como exemplo
destas premissas, podem destacar-se o Plano Nacional de Sade e a Carta de Direitos de
Acesso ao Servio Nacional de Sade.
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O Plano Nacional de Sade define as linhas gerais de actuao das polticas de sade e
constitui o instrumento de execuo do planeamento em sade, enquadrador dos seus
objectivos principais, aplicando planos e estratgias com vista melhoria e recuperao da
sade de indivduos e populaes em Portugal. Assim, o Plano Nacional de Sade estabelece
metas, indicadores e programas prioritrios que visem a sua operacionalizao e
desenvolvimento. De acordo com este documento, constitui objectivo principal do mesmo a
maximizao dos ganhos em sade atravs do alinhamento e da integrao de esforos sustentados de todos os sectores da sociedade e a utilizao de estratgias assentes na cidadania, na equidade e no acesso, na qualidade e nas polticas saudveis (DGS PLANO NACIONAL DE SADE 2012/2016).
Por outro lado, a Carta dos Direitos de Acesso, e enfatizando os princpios da equidade
e do acesso da matriz fundacional do SNS, tem por missiva enunciar um conjunto de premissas que visem salvaguardar os direitos de acesso dos utentes aos cuidados de sade
no mbito do SNS.
2.3 EQUIDADE EM SADE E NOS CUIDADOS DE SADE
A sade constitui uma aspirao universal e necessidade humana bsica. O
desenvolvimento social pode ser avaliado atravs da sade da sua populao, como os
recursos alocados ao sector se encontram distribudos, ou ainda, pelo grau de proteco social
destinada aos grupos do espectro social mais desfavorecido (BRAVEMAN, P.; 2006; CULYER,
A. J.; WAGSTAFF, A.; 1993; MARMOT; M., 2007). Assim, a equidade nos cuidados de sade
constitui um eixo central para esta premissa, assim como um objectivo imprescindvel e
transversal a qualquer sistema de sade (GODDARD; M.; SMITH, P.; 2001; MARMOT; M.;
2008; WATERS; H. R.; 2000).
2.3.1 Definio de conceitos
Do ponto de vista histrico, o termo equidade em sade encontra a sua primeira
referncia na dcada de oitenta, com a avaliao s desigualdades no servio de sade ingls
(BLACK, D.; 1980). De acordo com a Organizao Mundial de Sade (2010) e Marmot (2008),
entende-se equidade em sade como a ausncia de diferenas evitveis, injustas e passveis de modificao do estado de sade de grupos populacionais de contextos sociais, geogrficos
ou demogrficos diversos. Expressa-se como a igual oportunidade de cada cidado atingir o
seu potencial de sade. O acesso aos cuidados de sade consiste numa dimenso da
equidade e define-se como a obteno de cuidados de qualidade necessrios e oportunos, no
local apropriado e no momento adequado. As desigualdades em sade remetem para a
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existncia de diferenas no estado de sade e nos respectivos determinantes entre diferentes
grupos da populao. Algumas so inevitveis, no sendo possvel alterar as condies que as
determinam. Outras classificam-se como desnecessrias e evitveis, potenciando injustias
relativas, socialmente concebidas e mantidas, e que traduzem efectivas iniquidades em sade,
pelo que se torna, pelo menos do ponto de vista tico e social, tomar medidas que as permitam
atenuar ou eliminar.
Por equidade pode entender-se a distribuio justa de determinado atributo populacional.
O conceito de equidade no necessariamente equivalente a igualdade, embora os dois
termos sejam por vezes usados como sinnimos. Quando se define equidade na prestao de
cuidados de sade em termos de igualdade, o conceito envolve duas dimenses importantes: a
equidade horizontal - tratamento igual de indivduos que se encontram numa situao de sade igual; e equidade vertical - tratamento apropriadamente desigual de indivduos em situaes de sade distintas. Por outro lado, a equidade tem a ver com justia, tem uma
dimenso tica relacionada com a redistribuio de algo de acordo com as necessidades
referentes a esse algo, um conceito relativo. Ao invs da igualdade, que se traduz por um
conceito mais absoluto, no tem necessariamente uma conotao tica, e que compara nveis
de sade, de recursos, de acesso, por exemplo, entre indivduos e comunidades,
independentemente de critrios associados s necessidades desses indivduos ou
comunidades. Algumas desigualdades so esperadas e fceis de prever, sem
necessariamente reflectirem iniquidade (PEREIRA, J.; 1992)
Em suma, pode concluir-se que persiste a falta de um consenso em torno do significado
do conceito de equidade, quer no mbito da economia da sade, quer noutro domnio mais
abrangente. Deste modo, importa, ao nvel da reviso da literatura, situar esta heterogeneidade
de definies num enquadramento histrico, poltico, social e econmico mais preciso e que as
tornem mais fidedignas.
2.3.2 Equidade e Igualdade A equidade e os quadros conceptuais onde esta se insere tm sido discutidos por
diversas correntes do pensamento e estudados em diversos ramos da cincia. Trata-se de um
conceito complexo, de abordagem heterognea e multidisciplinar, no sendo consensual a sua
definio. Ocorre que ao nvel da literatura, encontram-se muitas vezes as noes de equidade
e igualdade, sendo necessria a sua distino.
A igualdade remete para um domnio mais redutor e objectivo no que concerne
distribuio de bens ou recursos entre os indivduos, ao passo que a equidade transporta em si
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um conceito subjacente de moral, contendo inclusivamente um determinado vnculo subjectivo
associado ideia de justia (SEN, A.; 2002; LE GRAND, J.; 1987).
Ainda assim, possvel sistematizar a abordagem em torno do conceito de equidade em
funo das abordagens clssicas ao mesmo. Segundo estas, a sade consiste num produto
complexo e multifactorial, indispensvel concretizao dos objectivos pessoais dos
indivduos, pelo que enquadrado numa sociedade onde a escassez de recursos uma
evidncia efectiva, a sua distribuio em funo das necessidades deve ser orientada por
padres de justia na sua distribuio (BARROS, P.P.; 2007; BRAVEMAN, P; GRUSKIN, S.;
2003).
2.3.3 Conceitos clssicos e modernos de equidade
Assim, lgico que, e no existindo uma definio consensual de equidade em sade,
seja particularmente til ensaiar um exerccio de anlise em funo das diversas
conceptualizaes clssicas e modernas que o domnio da equidade encerra em si mesmo. De
acordo com Pereira (1989), podemos compartimentar as diversas definies entre abordagens
clssicas e abordagens modernas (PEREIRA, J.; 1989).
De entre as abordagens clssicas, sobressai numa primeira anlise a igualdade (egality), a qual foi assumida como uma perspectiva de equidade. O objectivo de cada indivduo com a mesma necessidade de cuidados de sade dever receber o mesmo tratamento
atractivo. Isto resulta, em grande parte, da sua implicao principal: que a distribuio de
cuidados de sade deva ser independente da distribuio do rendimento, riqueza ou qualquer
outra forma de poder econmico ou poltico. Com efeito, pode considerar-se como injusto se
dois indivduos com a mesma doena um receba melhor tratamento do que o outro,
simplesmente porque economicamente mais favorecido, tem um melhor nvel educacional ou
tem conhecimentos mais influentes. No entanto, existem na prtica dificuldades bvias na
interpretao desta concepo. O que que se entende por tratamento? O que se entende por
necessidade? Estas questes, pese embora a sua relevncia, no so centrais para esta
discusso. Em vez disso, pretende levantar-se a questo se o igual tratamento para igual
necessidade, seja como for definido, ser sempre consistente com a equidade; se tratamento
desigual para igual necessidade poder, por vezes, promover a equidade e vice-versa
(PEREIRA, J.; 1990)
A igualdade pode ser percepcionada mediante duas perspectivas: igualdade de recursos
ou igualdade de bem-estar (DWORKIN, E.; 1981). A igualdade de recursos implica que a
distribuio dos mesmos seja processada de modo a que todos os indivduos tenham um
conjunto de bens o mais igualitrios entre si. Por outro lado, a igualdade de bem-estar assume
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que a distribuio de recursos ser optimizada de modo a que os indivduos possuam um nvel
de bem-estar o mais idntico entre si, no sendo obrigatrio que estes possuam o mesmo
conjunto de recursos. Em suma, na primeira viso o foco est centrado ao nvel dos recursos,
ao passo que na segunda abordagem centra-se a viso ao nvel dos resultados, sendo o
critrio para ambos a equalizao, ou num sentido mais lato, a harmonizao.
A igualdade de acesso pode ser definida como o requisito de que os indivduos
enfrentem os mesmos custos pessoais de receber tratamento mdico. A igualdade de acesso e
a igualdade de tratamento para igual necessidade so frequentemente confundidos embora
sejam diferentes (MOONEY; G.; et al.; 1991). O acesso ao tratamento um fenmeno do lado da oferta, enquanto a quantidade de tratamento recebido, efectivamente, depende da
interaco entre a oferta e a procura. A igualdade de acesso, contudo, apresenta tal como a
igualdade de tratamento para igual necessidade o problema da interpretao prtica: como se
dever medir o custo pessoal? (LE GRAND, J.; 1989; PEREIRA, J.; 1993). A questo
fundamental prende-se com a equidade, ou a igualdade de acesso, como objectivo das
polticas de sade (LE GRAND, J.; 1989)
Esta definio consiste no referencial terico a ser utilizado na anlise e discusso dos
resultados deste trabalho, isto , compreender em que medida so disponibilizados os mesmos
recursos para uma situao ou necessidade idntica. Trata-se da abordagem conceptual que
rene maior consenso, em funo igualmente do que se pretende aferir com este estudo de
natureza acadmica.
Uma outra abordagem, distribuio de acordo com os direitos (Entitlement), rejeita em absoluto as teorias da igualdade. O foco principal desta abordagem incide no facto de o
indivduo ter o direito ao que possui, desde que adquirido de forma lcita. Assim, rejeita-se a
redistribuio de recursos, conferindo inclusivamente uma determinada sensao de injustia
moral e tica. Seguindo um ngulo de anlise mais pragmtico, pode concluir-se que esta
teoria falha ao no admitir que indivduos mais vulnerveis ou menos capacitados no devem
beneficiar de uma proteco adicional em matria de promoo da sade (PEREIRA, J.; 1989).
A teoria do Mnimo Decente estipula que deve existir um padro mnimo em termos de segurana, abaixo do qual a sociedade no dever permitir que os indivduos caiam. Alguns
tericos liberais sugerem este conceito, sendo possvel de ser aplicado em sistemas de sade
que visem a cobertura geral e universal. No entanto, torna-se quase que impraticvel dada a
dificuldade em definir o tal mnimo de sade, da mesma forma que seria praticamente
impossvel determinar o nmero de anos que ser razovel para uma pessoa viver, ou a
quantidade e natureza de cuidados de sade a que se deve ter acesso (PEREIRA, J.; 1989).
Desigualdades socioeconmicas na utilizao de cuidados de sade na populao com 65 ou mais anos de idade em Portugal Dados do 4. Inqurito Nacional de Sade 2005/2006
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O utilitarismo como corrente relativa ao conceito de equidade deve ser interpretada como um princpio decisor que requer recursos para serem distribudos por forma a aumentar o
somatrio do bem-estar individual ou das utilidades, e maximizando a utilidade agregada (LE
GRAND, 1989) Aplicando sade ou aos cuidados de sade, uma distribuio ser
considerada como equitativa se for o resultado de um processo de maximizao da utilidade
agregada. No entanto, o utilitarismo no se preocupa em fornecer definies de equidade ou
regras de qualquer tipo para a distribuio de recursos. Seja qual for a distribuio que deriva
da aplicao de princpios de utilitarismo, constitui apenas um produto secundrio da
maximizao do somatrio das utilidades individuais, no sendo o resultado de uma aplicao
conscienciosa de uma noo de equidade ou de justia entre indivduos (LE GRAND, J.; 1989;
PEREIRA, J.; 1993)
O princpio do Maximin de Rawls, por ele designado como princpio da diferena o de que as desigualdades sociais e econmicas devem ser ultrapassadas de forma que sejam tanto para o benefcio dos menos favorecidos e ligadas a posies abertas a todas as condies de justa igualdade de oportunidades. Aplicando estas premissas rea da sade,
depreende-se que a desigualdade em sade ou em cuidados de sade se possa justificar
apenas se essa desigualdade funcionar em prol dos menos favorecidos, isto , uma
distribuio equitativa de sade ou cuidados de sade aquela que potencia o bem-estar dos
que menos possuem ou carecem de cuidados de sade (LE GRAND, J.; 1989; RAWLS, J.;
1972).
A abordagem Envy-Free assume que uma distribuio equitativa se cada pessoa no estiver disposta a ter o mesmo consumo de recursos de qualquer outra. Esta teoria surge na
base dos problemas metodolgicos relacionados com o utilitarismo e a teoria de Rawls, conduzindo necessidade de reformular as bases conceptuais para actuar sobre a
problemtica da equidade. Em termos prticos, esta teoria, tambm conhecida pelo critrio da
no-inveja, pressupe que uma determinada distribuio equitativa se cada indivduo no invejar o conjunto de recursos detido por outros. Contudo, esta teoria de equidade no leva em
considerao necessidades distintas ou diferenas acentuadas ao nvel do estado de sade
dos indivduos, tal como contm em si mesma uma subjectividade que torna complexo de ser
justificada a sua implementao (PEREIRA, J.; 1993).
Tendo por base as discrepncias metodolgicas e critrios de aplicabilidade destas
abordagens mais tradicionais de equidade, foram desenvolvidas outras abordagens tericas
especificamente dirigidas ao sector da sade a equidade como escolha e a maximizao da
sade (LE GRAND, J.; 1987; PEREIRA, J.; 1989).
A teoria da equidade como escolha tem por princpio base a dependncia ou no de factores externos para gerar situaes de iniquidade, isto , quando uma doena resulta de
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factores externos a mesma deve ser considerada como iniquidade, caso contrrio, e a mesma
dependa de factores controlveis ento considera-se dentro de um padro de equidade (LE
GRAND, J.; 1987). Esta conceptualizao introduz variveis que extravasam o domnio do
indivduo, introduzindo assim factores externos, ou seja, determinantes de sade.
Por outro lado, surge a teoria da maximizao da sade, defendendo que uma distribuio apenas ser equitativa caso consiga maximizar o potencial de sade da
comunidade (PEREIRA, J.; 1989). De acordo com esta definio, esto subjacentes princpios
de justia social, o que efectivamente contribui para a redistribuio de recursos de forma a
potenciar o estado de sade geral na comunidade (PEREIRA, J.; 1989; PEREIRA, J.; 1993; LE
GRAND, J.; 1987).
Tendo em conta estes considerandos, torna-se pertinente, do ponto de vista conceptual,
clarificar o conceito de equidade, as suas vrias dimenses e a representao que pode
assumir no mbito deste trabalho. Assim, uma ideia central e condutora do percurso de
investigao a de que a equidade no acesso e utilizao de cuidados de sade
fundamental para a obteno de equidade em sade.
A utilizao dos cuidados de sade constitui um dos principais determinantes do estado
de sade das populaes, pelo que as iniquidades na prestao de cuidados podem reflectir-se
em iniquidades no estado de sade (DAHLGREN, G.; WHITEHEAD, M.; 2006).
Existe uma multiplicidade de definies em torno do conceito equidade, existindo
inclusivamente pouca uniformidade quanto forma de se medir a equidade. Por outro lado,
consensualizou-se que esta consiste num princpio bsico de qualquer sistema de sade,
estando consagrada ao nvel do enquadramento legal portugus, pelo que identificada como
sendo uma dimenso relevante ao nvel da qualidade dos cuidados de sade (CLARK, 2007;
GIRALDES, M. R.; 2001; GIRALDES, M. R.; 2005).
Pese embora a equidade constitua um primado essencial da poltica de sade da maioria
dos pases e deva assumir-se como um princpio norteador da aplicao dessas mesmas
polticas, com monitorizao permanente, existe alguma variao ao nvel do quadro
conceptual deste atributo em termos dos diferentes sistemas de sade. A avaliao das
implicaes dos valores da equidade em matria de polticas de sade deve ser feita com base
na interpretao do seu significado mas sem negligenciar o enquadramento legal e normativo
que suporta o sistema de sade.
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2.3.4 Equidade em Cuidados de Sade
Conforme foi possvel abordar no captulo anterior, nomeadamente em termos do
conceito de equidade como igual tratamento para igual necessidade, torna-se particularmente
oportuno dedicar alguma reflexo questo das potenciais fontes de iniquidade na utilizao
de cuidados de sade. Numa primeira fase ser discutida genericamente a questo da
equidade em cuidados de sade em termos da evidncia cientfica disponvel ao nvel
internacional, seguidamente centrar-se- a abordagem no plano nacional por parte da
populao em geral e da forma como processada a utilizao dos cuidados de sade em
geral. Posteriormente, torna-se pertinente apontar o foco da discusso utilizao de cuidados
de sade pela populao idosa, ou seja, procurar encontrar diferenas significativas no que
concerne evidncia cientfica disponvel e aquilo que torna este conceito de equidade
especfica numa rea distintiva das restantes situaes de acesso a cuidados de sade.
2.3.4.1 Evidncia cientfica no plano internacional
Os cuidados de sade primrios constituem uma primeira linha de actuao de qualquer
sistema de sade. Deste modo, e por forma a avaliar o acesso a este nvel de cuidados, foi
desenvolvida uma anlise de equidade com factores demogrficos, rendimento, estado de
sade e cobertura de seguro de sade. Os resultados mais relevantes mostram que ao nvel
dos mdicos de famlia e cuidados de enfermagem no se observam disparidades
significativas, sendo estes equitativos para a generalidade da populao, quando comparados
com outras especialidades clnicas (FERRER, R. L.; 2007).
Uma das principais concluses desta avaliao consiste no reforo do papel que os
cuidados de sade primrios, designadamente os mdicos de famlia, assumem na assistncia
mdica aos grupos social e economicamente menos favorecidos (FERRER, R. L.; 2007).
Por outro lado, a consulta de especialistas encontra-se altamente associada educao,
uma vez que se considera esta varivel como indutora de estilos de vida saudveis e como
tendo um efeito positivo ao nvel do estado geral de sade (GRUBER, S.; KIESEL, M.; 2010).
Os resultados deste estudo sugerem a existncia de algumas iniquidades quanto s consultas
de especialidade, nomeadamente em desfavor dos trabalhadores por conta prpria, dadas as
condicionantes da sua situao profissional, e revelam ainda que os homens recorrem a este
nvel de cuidados de sade de acordo com factores predisponentes ou facilitadores, ao passo
que nas mulheres as variveis sociodemogrficas apresentam menor grau de influncia na
utilizao de cuidados de sade (GRUBER, S.; KIESEL, M.; 2010).
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Ainda segundo a mesma fonte, denota-se a existncia de um sistema de sade
bipolarizado e com iniquidades bem patentes, uma vez que providencia cuidados de sade
primrios aos beneficirios da cobertura pblica e cuidados de sade mais especializados aos
utilizadores de unidades de sade privadas (GRUBER, S.; KIESEL, M.; 2010). Outras
iniquidades podem ser referidas, tais como por exemplo a observao de um gradiente
educacional transversal ao sistema de sade alemo e que correlaciona uma maior utilizao
de cuidados de sade com habilitaes literrias superiores; ou ainda a associao entre
consultas de clnica geral com reas mais rurais e um maior grau de diferenciao de cuidados
de sade em zonas mais urbanas (GRUBER, S.; KIESEL, M.; 2010).
Relativamente aos seguros de sade, pblicos ou privados, estes desempenham um
forte valor preditivo no que diz respeito ao tempo de espera por consultas, e por conseguinte
na equidade no acesso a cuidados de sade. Um estudo acerca da utilizao de cuidados de
sade na Alemanha revelou que os indivduos com seguro de sade pblico esperavam, em
mdia, trs vezes mais por uma consulta de especialidade do que os utentes de uma
seguradora privada (LUNGEN, M.; et al.; 2008).
No caso do sistema de sade britnico, foram investigadas potenciais iniquidades
socioeconmicas no acesso a consultas de clnica geral, consultas de ambulatrio, episdios
dirios e estadias de internamento. Assim, foram identificadas algumas fontes de iniquidade na
utilizao dos cuidados de sade supracitados, designadamente no que respeita ao
rendimento, etnia, estatuto profissional e educao. Os indivduos com menor instruo e/ou
pertencentes a minorias tnicas apresentam um menor ndice de utilizao de cuidados
hospitalares, pese embora observem taxas de utilizao superiores ao nvel dos cuidados de
sade primrios (MORRIS, S.; SUTTON, M.; GRAVELLE, H.; 2008). Estes resultados so
ainda corroborados pelo estudo da equidade horizontal a nvel europeu, que sublinha existir
uma iniquidade a favor das classes economicamente mais favorecidas ao nvel dos cuidados
hospitalares ou especialistas, e uma iniquidade que favorece os indivduos mais
desfavorecidos ao nvel das consultas de clnica geral (BAGO DUVA, T.; 2007). Ainda neste
estudo foi salientado o facto de, analogamente iniquidade revelada a favor dos mais ricos no
acesso a consultas de especialidade, tambm ser possvel observar uma iniquidade
semelhante ao nvel dos indivduos que apresentam um maior crescimento ao nvel dos seus
rendimentos (BAGO DUVA, T.; 2007).
Numa outra dimenso, e que releva a importncia social e econmica das polticas
pblicas de sade, encontra-se a questo do enquadramento social, cultural e poltico do
prprio pas. De acordo com Espelt (2008), a opo poltica e ideolgica de um determinado
estado pode implicar, a mdio-longo prazo, alteraes no mercado de trabalho e nas polticas
sociais e, consequentemente, induzir efeitos no mbito das iniquidades e principais indicadores
de sade. Assim, e comparando as iniquidades em sade registadas em trs tipologias de
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regime social-democracia, democracias crists ou democracias recentes pode aferir-se
uma maior distino das mesmas ao nvel das mulheres nas democracias mais recentes. As
iniquidades so deste modo mais marcadas ao nvel das habilitaes literrias quando
comparadas com as restantes dimenses sociais (ESPELT, A.; et al.; 2008). Poucos so os estudos que se ocupam em enquadrar as caractersticas polticas na anlise s iniquidades em
sade, porm pode ainda destacar-se que as mesmas so mais evidentes na auto-percepo
do estado de sade do que nos indicadores de cuidados de longa-durao, assim como uma
maior significncia nos indivduos do sexo feminino (ESPELT, A.; et al.; 2008).
Em forma de sntese, pode concluir-se, com base nos principais estudos internacionais
neste domnio, que relativamente utilizao de consultas existe uma maior necessidade
concentrada junto da populao com menores recursos econmicos, porm, quando efectuado
um ajustamento pela necessidade, observa-se um padro de iniquidade horizontal que
favorece os indivduos com maior rendimento na maior parte dos pases, quer em termos de
probabilidade de ter uma consulta, quer inclusivamente no nmero mdio de consultas. Este
padro particularmente elevado, entre outros, em Portugal. (VAN DOORSLAER, E.; et al.; 2000). Mais a mais, se feita a anlise em funo da natureza dos cuidados de sade obtidos,
observa-se um padro distinto entre consultas de clnica geral, que tende a favorecer os
indivduos mais pobres, e as consultas mdicas de especialidade, que favorecem os indivduos
com maiores rendimentos. Uma vez mais, verifica-se um padro acentuado de iniquidade
horizontal neste mbito em Portugal (VAN DOORSLAER, E.; et al.; 2000; 2006). Apesar de no existir um consenso claro relativamente ao padro de iniquidade ao nvel dos pases
estudados, bvio que estes padres derivam, em parte, das prprias caractersticas de cada
sistema de sade.
Num estudo que se debruava sobre a utilizao de cuidados de sade em pases em
via de desenvolvimento, foram corroboradas concluses produzidas por estudos anteriores, ou
seja, as classes com maiores rendimentos registam uma utilizao superior de recursos de
sade, apresentando inclusivamente maiores despesas em sade (MAKINEN, M.; et al.; 2000).
Uma outra anlise do espectro internacional relativamente utilizao de servios de
sade em 19 pases da OCDE, revela uma iniquidade horizontal idntica relativamente s consultas mdicas. Aps ajustamento pela necessidade de cuidados de sade, os indivduos
com maiores rendimentos apresentam maior probabilidade em ter consultas mdicas,
sobretudo ao nvel das especialidades mdicas. Porm, se centrarmos a anlise ao nvel dos
CSP o cenrio altera-se, sendo que na maioria dos pases analisados, para o mesmo nvel de necessidade, os indivduos de menor rendimento apresentam probabilidade semelhante em ter
consultas de clnica geral, fazendo inclusivamente uma utilizao mais frequente das mesmas
(DEVAUX, M.; DE LOOPER, M.; 2012). Adicionalmente, esta mesma publicao observa
outros padres de iniquidade, nomeadamente no campo da medicina dentria e algumas
Desigualdades socioeconmicas na utilizao de cuidados de sade na populao com 65 ou mais anos de idade em Portugal Dados do 4. Inqurito Nacional de Sade 2005/2006
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tcnicas de diagnstico (DEVAUX, M.; DE LOOPER, M.; 2012). Assim, so mltiplas as
comparaes internacionais aos diversos sistemas de sade que vm sublinhar a ideia de
iniquidades persistentes na utilizao dos servios de sade, com especial enfoque ao nvel
das especialidades mdicas e da medicina dentria derivadas do rendimento (VAN
DOORSLAER, E.; MASSERIA, C.; 2004), mas igualmente padres de iniquidade resultantes do
nvel educacional (OR, Z.; JUSOT, F.; YILMAZ, E.; 2008). No que respeita s consultas de
clnica geral, no mbito dos CSP, no existe um consenso mas so diversos os autores a apontar no sentido de iniquidades que tendem a favorecer os indivduos de menor rendimento
na utilizao deste gnero de cuidados (BAGO DUVA, T.; et al.; 2008).
2.3.4.2 Equidade no acesso a cuidados de sade em Portugal
A maioria dos estudos que se ocupam do sistema de sade em Portugal observa a
existncia de factores, para alm da condio clnica intrnseca dos doentes, que determinam a
utilizao de cuidados de sade, evidenciando a existncia de iniquidades a favor dos grupos
com rendimentos superiores (PEREIRA, J.; 2002; LOURENO, O.; et al.; 2007; PEREIRA, J.; LOPES, S.; 2006). Esta tendncia corroborada pelo estudo realizado pela OCDE, e que permite contextualizar o desempenho de Portugal com outros 21 pases, revelando um dos ndices de iniquidade mais elevados (VAN DOORSLAER, E.; MASSERIA, C.; 2004).
Assim, e como metodologia de abordagem s iniquidades socioeconmicas e
geogrficas no acesso aos cuidados de sade, optou-se pela sistematizao de evidncia
cientfica nos diferentes sectores de actuao: cuidados de sade primrios, cuidados de
sade secundrios ou hospitalares e meios complementares de diagnstico e teraputica.
Cuidados de Sade Primrios A relevncia deste nvel de cuidados traduz-se pela importncia que os mesmos
assumem no acompanhamento do doente ao nvel dos cuidados primrios e posteriormente
por uma eventual referncia para um nvel de cuidados mais especializados ou,
inclusivamente, para a realizao de exames complementares de diagnstico e teraputica
(FURTADO, C.; PEREIRA, J.; 2010).
Em Portugal, a probabilidade de ter uma consulta de clnica geral continuava a
apresentar um ndice de iniquidade na prestao estatisticamente significativo, podendo ter
ocorrido um agravamento a favor dos mais ricos ao longo do tempo, o que sugere que as
iniquidades so maiores no acesso inicial consulta (VAN DOORSLAER, E.; MASSERIA, C.;
2004). Comparativamente com os restantes pases europeus includos no estudo, Portugal
dos que apresenta uma maior iniquidade favorecendo os grupos de maior rendimento (VAN
DOORSLAER, E.; MASSERIA, C.; 2004).
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Um outro estudo, em que se procedia a uma anlise longitudinal (1995-2001) da equidade na prestao de cuidados de sade, apresentou ndices de iniquidade favorecendo
os grupos de maior rendimento para o nmero total de visitas aos mdicos de clnica geral,
padro idntico ao observado na ustria e Finlndia, e que contraria os restantes pases onde
se observa um ndice de iniquidade na prestao, que favorece os grupos de rendimento
inferior (BAGO DUVA, T.;