desenvolvimento sustentÁvel: decifra-me ou te devoro · país y el grupo banco mundial como agente...

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DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: DECIFRA-ME OU TE DEVORO Análise Sobre o Desenvolvimento Sustentável no Modo de Produção Capitalista GUILHERME MAGON WHITACKER Presidente Prudente Abril de 2017 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO”

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DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL:

DECIFRA-ME OU TE DEVORO

Análise Sobre o Desenvolvimento Sustentável no

Modo de Produção Capitalista

GUILHERME MAGON WHITACKER

Presidente Prudente

Abril de 2017

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA

“JÚLIO DE MESQUITA FILHO”

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GUILHERME MAGON WHITACKER

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL:

DECIFRA-ME OU TE DEVORO

Análise sobre o desenvolvimento sustentável

no modo de produção capitalista

Tese apresentada ao Conselho do Programa de

Pós-graduação em GEOGRAFIA da

Universidade Estadual Paulista – UNESP –

campus de Presidente Prudente-SP, como

exigência parcial para obtenção do título de

Doutor em Geografia

Orientador: Prof. Dr. Eduardo Paulon Girardi

Presidente Prudente

Abril de 2017

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FICHA CATALOGRÁFICA

Whitacker, Guilherme Magon.

W582d Desenvolvimento sustentável: decifra-me ou te devoro. Análise

sobre o desenvolvimento sustentável no modo de produção capitalista /

Guilherme Magon Whitacker. - Presidente Prudente : [s.n], 2017

365 f. : il.

Orientador: Eduardo Paulon Girardi

Tese (doutorado) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de

Ciências e Tecnologia

Inclui bibliografia

1. Desenvolvimento sustentável. 2. Modo de Produção Capitalista.

3. Processos Territoriais. I. Girardi, Eduardo Paulon. II. Universidade

Estadual Paulista. Faculdade de Ciências e Tecnologia. III. Título.

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CERTIFICADO DE APROVAÇÃO

Título da tese: Desenvolvimento sustentável: decifra-me ou te devoro. Análise sobre o

desenvolvimento sustentável no modo de produção capitalista.

Autor: Guilherme Magon Whitacker

Orientador: Prof. Dr. Eduardo Paulon Girardi

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Dedicatória

A pessoa que acreditou no momento em que falei: “eu vou fazer!”

Minha amada esposa,

Regina Carrion Whitacker.

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Agradecimentos

Agradeço a família que tenho e que me serve de exemplo em muitos aspectos, em

primeiro lugar, meu pai Arthur (in memorian) pelo exemplo de vida; minha mãe,

Helena pelo exemplo de amor; meus irmãos Ricardo (Fátima, Gustavo e Henrique) e

Arthur (Tânia e Arthur‘zinho’) pelo exemplo de dedicação e atenção. A todos vocês

meu muito obrigado, por isso e muito mais.

Minha amada esposa Regina... que tanto suportou minha preocupação e meus

aborrecimentos praticamente constantes, minha ausência em tantos momentos, a falta de

atenção... e mesmo assim se manteve ao meu lado acreditando e defendendo meus

ideais... Não tenho como escrever aqui o que sinto por você, meu agradecimento e amor

serão eternos, mesmo que essa eternidade seja estranha a um materialista.

Minhas filhas. Gabriela, que me ensina um pouco a cada dia sobre como se portar diante

das dificuldades que nos aparecem. Kauany, que com seu sorriso e carisma tira de mim

um pouco da acidez que enxergo nesse mundo. Katariny, a pequena que me faz ir pra

casa todos os dias mais cedo. A vocês três, minhas amadas filhas, meu muito obrigado e

meus pedidos de desculpas, pois entendo que vocês não precisam pensar como eu para

sermos felizes.

Ao orientador, Prof. Dr. Eduardo Paulon Girardi que com coragem e confiança aceitou

o desafio dessa orientação acreditando em meu potencial. Pessoa sempre presente que

se dedicou a leituras, correções e orientações, este singelo agradecimento é pouco para

demonstrar o quanto sou grato pelo seu trabalho e pela liberdade que me foi confiada.

A Prof. Dra. Maria Encarnação Beltrão Sposito e ao Prof. Dr. Jorge Montenegro Gómez

que, em muito, contribuíram participando de nossa qualificação. Ao Prof. Dr. Antonio

Nivaldo Hespanhol, que nos auxiliou durante a fase inicial desta pesquisa. A Prof. Dra.

Rosângela Aparecida de Medeiros Hespanhol, coordenadora do Programa de Pós

Graduação em Geografia da UNESP de Presidente Prudente. Os agradecimentos se

estendem da mesma forma aos membros do Conselho de Pós-graduação em Geografia

da UNESP de Presidente Prudente-SP e aos demais professores do departamento de

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Geografia que, de uma forma ou de outra, seja durante as disciplinas ou mesmo em

conversas informais, contribuíram em nossa formação.

Agradecemos, particularmente, ao Prof. Dr. João Osvaldo Rodrigues Nunes que, muito

além da contribuição técnica e profissional, com sua franqueza me apoiou em

momentos delicados, contribuindo com conselhos que me fizeram perder o formalismo

e chamá-lo apenas de João Osvaldo; da mesma forma agradeço o Prof. Dr. Carlos

Alberto Feliciano, outro que não consigo chamar de professor, meu caro amigo Cacá,

que, desde o início dedicou tempo e atenção nos propiciando calma e serenidade nos

momentos em que precisei. Sua atenção comigo será sempre lembrada. A vocês dois,

meus professores e amigos, muito obrigado.

Aos funcionários da secretaria do departamento de pós-graduação em Geografia por

todo o atendimento prestado, ao pessoal da biblioteca deste campus e aos demais

funcionários desta universidade.

Ao Prof. Dr. Leandro Dias de Oliveira, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

que respondeu prontamente a nossas correspondências nos enviando importante

material para leitura; da mesma forma agradeço ao Prof. Dr. João Márcio Pereira e ao

Prof. Dr. Antonio Bernardes que, com seus importantes trabalhos e indicação de

referências bibliográficas, contribuíram para a realização desta pesquisa.

Ao Prof. Dr. José Antonio Segrelles Serrano (Marisa e Carmen) que, com seu carisma e

generosidade nos recebeu na Universidade de Alicante-ES e nos propiciou a realização

de estágio naquela universidade. Seu apoio e atenção serão sempre lembrados. Estendo

estes agradecimentos aos demais professores do departamento de Geografia Humana da

Universidade de Alicante que nos auxiliaram na realização da pesquisa, em particular ao

Prof. Dr. Carlos Cortez Samper e Prof. Dr. Samuel Ortiz Pérez.

Aos novos, e já antigos amigos, pessoal do NERA, CEGeT, GEDRA, GADIS, GAIA e

GAsPPER. Em particular, agradeço a algumas pessoas que, cada um a sua maneira,

foram fundamentais para a execução deste trabalho, um forte abraço: Paulo Cesar

Zangali Junior, Guilherme Marini Perpétua, Estevan Bartoli, Guilherme Claudino,

Fernando Mendonça Hekc, Marcelo Custódio, Lindberg Junior, Mateus Monteiro

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Lobato, Sidney Cássio Todescato Leal (e demais amigos e amigas da Associação dos

Geógrafos Brasieliros – Seção Local de Presidente Prudente-SP), Nubia Beray Armond,

Janaina Antonio, e demais amigos e amigas dos cursos de graduação e pós-graduação

em Geografia da FCT Unesp.

Registro aqui meus agradecimentos a duas pessoas que senti falta durante esses últimos

anos, Anderson Marioto e Philippe Ferreira, os colóquios do GEMA fizeram falta.

Uma pessoa que conheci e se tornou muito mais que um amigo merece um

agradecimento especial, José Sobreiro Filho. Fomos aos poucos nos tornando mais do

que amigos e agora você é parte da minha família, meu compadre. Sou grato pela sua

sincera amizade e apoio, de todas as formas e em todos os momentos que precisei, e não

foram poucos os momentos e circunstâncias. Por tudo isso, minha gratidão meu querido

Nino.

Ao amigo de longa data, Maurício Bratifisch, pela ajuda na tradução do resumo.

Agradecemos também aqueles que propiciaram boa parte de realização desta pesquisa,

aos produtores rurais da microbacia do córrego da Onça II, membros da ASSCICAMP e

funcionários da CATI de Presidente Prudente que contribuíram com informações e

depoimentos.

Por fim, agradecemos a Coordenadoria de Aperfeiçoamento Profissional de Ensino

Superior (CAPES) pela bolsa concedida que nos permitiu a dedicação necessária para a

realização desta.

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Epígrafe

“A ciência seria desnecessária se toda essência coincidisse com sua aparência”.

Karl Marx

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Resumo

Esta pesquisa teve por escopo verificar a hipótese de que o desenvolvimento sustentável

está sendo utilizado como estratégia para a reprodução do modo de produção capitalista.

Para esta verificação elencamos como objeto de estudo uma política pública

implementada no estado de São Paulo com o objetivo de realizar ações de promoção do

desenvolvimento territorial rural sustentável - o Programa Estadual de Microbacias

Hidrográficas (PEMH). Esta política pública foi financiada pelo Grupo Banco Mundial,

um dos articuladores do processo de reprodução do modo de produção capitalista em

escala global. Para averiguarmos a hipótese, contrapomos a concomitância entre o

desenvolvimento do PEMH ao intenso processo de expansão do setor sucroenergético

no estado de São Paulo, significando profunda contradição. Utilizamos procedimentos

metodológicos que permitiram averiguar a materialidade do desenvolvimento

sustentável e também aspectos imateriais, especialmente a prática discursiva e

ideológica que permitiu que o desenvolvimento sustentável fosse amplamente aceito

sem maiores questionamentos. Implementar ações que utilizam a ideia de

desenvolvimento sustentável se tornou uma prática comum articulada à normatização,

monopolização do território e territorialização das relações sociais de produção

capitalista. Assim, o território se apresenta como lócus dos conflitos em torno da posse,

do uso e do controle de recursos naturais enquanto mercadoria essencial para a

reprodução do modo de produção capitalista. No caso estudado nesta tese, apesar de o

PEMH trazer resultados pontuais positivos em relação à proteção de mananciais, por

exemplo, se analisada a questão em uma perspectiva escalar e estrutural que considere o

agronegócio sucroenergético como uma das formas mais expressivas do capital no

campo e o Grupo Banco Mundial como agente articulador da reprodução capitalista em

escala global e que propõe políticas públicas baseadas um modelo de desenvolvimento

sustentável local, o desenvolvimento sustentável em nada altera a lógica predatória e

insustentável do modo de produção capitalista.

Palavras chave: Desenvolvimento sustentável. Grupo Banco Mundial. Programa

Estadual de Microbacias Hidrográficas. Setor Sucroenergético. Território.

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Resumen

Esta investigación se propuso de verificar la hipótesis de que el desarrollo sostenible

está siendo utilizado como una estrategia para la reproducción del modo de producción

capitalista. Para verificar la hipótesis hemos seleccionado como objeto de estudio una

política pública implementada en el estado de São Paulo con el fin de llevar a cabo

acciones para promover el desarrollo territorial rural sostenible – el Programa Estadual

de Microbacias Hidrográficas (PEMH). Esta política pública fue financiada por el

Grupo Banco Mundial, uno de los articuladores del proceso de reproducción del modo

de producción capitalista a escala global. Para averiguarmos la hipótesis frente a la

simultaneidad del desarrollo de PEMH el intenso proceso de expansión de la industria

de la caña de azúcar en el estado de São Paulo, lo que significa profunda contradicción.

Utilizamos procedimientos metodológicos que permitieron examinar la materialidad del

desarrollo sostenible y también aspectos inmateriales, en especial la práctica discursiva

e ideológica, lo que permitió que el desarrollo sostenible en general fuese aceptado sin

más cuestiones. Implementar acciones que utilizan la idea de desarrollo sostenible se ha

convertido en una práctica común articulada a la uniformidad del territorio y de los

procesos territoriales y la monopolización del território. Por lo tanto, el territorio se

presenta como lócus de conflicto por la propiedad, uso y control de los recursos

naturales como mercancia esencial para la reproducción del modo de producción

capitalista. En el caso estudiado en esta tesis, aunque lo PEMH traer resultados

puntuales positivos en relación a la protección de las fuentes de agua, por ejemplo, si

analizamos la cuestión en una escala y estructura desde la perspectiva de considerar la

agroindustria de caña de azúcar como una de las formas más expresivas de capital en el

país y el Grupo Banco Mundial como agente coordinador de la reproducción capitalista

a escala global y proponer políticas públicas basado en un modelo de desarrollo

sostenible, el desarrollo sostenible local no altera la lógica depredadora e insostenible

del modo de producción capitalista.

Palabras clave: Desarrollo sostenible. Grupo Banco Mundial. Programa Estatal de las

Micro Cuencas Hidrográficas. Territorio.

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Abstract

The research had the scope to verify the hypothesis that sustainable development is

being used as analternative for the reproduction of the capitalist means of production.

To check this we have listed as an object of study an implemented public policy in the

State of São Paulo in order to carry out actions that provide sustainable rural territorial

development, the “Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas” (State Program

of Watersheds). A public policy funded by the“Grupo Banco Mundial” (World Bank

Group), articulator of the reproduction of the capitalist mode of production process.To

find this hypothesis out, we remitted to methodological procedures that allowed us to

determine the materiality of sustainable development also seeking to understand

immaterial aspects, the ideological discursive practice that allowed sustainable

development was widely accepted without further questioning, that is, we left the

appearance and sought the essence of the same. Implementing actions that make use of

sustainable development Idea hás become a common practice articulated to the

standardization of the territory and the territorial processes and monopolization of the

territory. Thus, the territory is presented as the lócus of conflict over the ownership, use

and control of natural resources as na essential commodity for the reproduction of the

capitalist means of production. Although the program has brought positive punctual

results in relation to the protection of water sources, for example, on a scale perspective

that considers the “Grupo Banco Mundial” as a coordinating agent of capitalist

reproduction on a global scale, public policies, proposing a local model of sustainable

development,in no way alters the predatory and unsustainable logic of the capitalist

mode of production.

Keywords: Sustainable development. World Bank Group. State Program of Watersheds.

Territory. Capitalist Means of Production.

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Lista de siglas

APP – Área de Preservação Permanente

ASCICAMPP – Associação dos Cidadãos do Campo de Presidente Prudente

ASPREN – Associação de Produtores Rurais de Eneida

BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

BIRD – Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento

CAPES – Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CATI – Coordenadoria de Assistência Técnica Integral

CMDR – Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural

CMMAD –Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento

CNUMAD – Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento

CODASP – Companhia de Desenvolvimento Agrícola de São Paulo

CONDRAF – Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável

CEPAL – Comisión Económica para América Latina y el Caribe

ECOSOC – Conselho Econômico e Social da Organização das Nações Unidas

EDR – Escritório de Desenvolvimento Rural

EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

EPA – Enviromental Protect AAgency

EUA – Estados Unidos da América

FAO – Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura

FMI – Fundo Monetário Internacional

GEE – Gases de Efeito Estufa

GIECRYAL – Grupo Interdiciplario de Estudios Criticos y de América Latina

GRUPO BM – Grupo Banco Mundial

IAA – Instituto do Açúcar e Álcool

IICA – Instituto Iberamericano de Cooperação Internacional

IDA – Agência Internacional de Desenvolvimento

IEA – International Energy Agency

ILUC – Indirect Land Use Change

IPCC – International Painel of Climate Cange

IPEA – Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas

IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas

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LEADER – Liaison Entre Actions de Développement de l'Économie Rurale

MAB – Movimento dos Atingidos por Barragem

MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

MBH – Microbacia Hidrográfica

MDA – Ministério de Desenvolvimento Agrário

MMA – Ministério do Meio Ambiente

MPA – Movimento dos Pequenos Agricultores

MST – Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

NERA – Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos em Reforma Agrária

OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico

OMC – Organização Mundial do Comércio

ONG – Organização Não Governamental

ONU – Organização das Nações Unidas

PAC – Política Agrícola Comum

PCB – Partido Comunista Brasileiro

PEMH – Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas

PIP – Plano Individual de Propriedade

PLANALSUCAR – Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-açúcar

PNMH – Política Nacional de Microbacias Hidrográficas

PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

PNOT – Plano Nacional de Ordenamento Territorial

PNDR – Política Nacional de Desenvolvimento Regional

PROALCOOL – Programa Nacional do Álcool

PRONAF – Programa Nacional de Agricultura Familiar

SAA – Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo

SDT – Secretaria de Desenvolvimento Territorial

SMA – Secretaria de Meio Ambiente

UE – União Europeia

UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro

UNESP – Universidade Estadual Paulista

UNICA – União das Indústrias Canavieiras

UPA – Unidade de Produção Agropecuária

ZAE – Zoneamento Ambiental Econômico

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Lista de figuras

Figura 1: Áreas aptas e inaptas para a expansão do setor sucroenergético no estado de

São Paulo...................................................................................................................p. 102

Figura 2: Níveis de suscetibilidade à erosão por área de abrangência dos Escritórios de

Desenvolvimento Rural do Estado de São Paulo......................................................p. 114

Figura 3: Níveis de indigência por região de abrangência dos Escritórios de

Desenvolvimento Rural no Estado de São Paulo......................................................p. 115

Figura 4: Regiões prioritárias para a execução do Programa Estadual de Microbacias

Hidrográfica no Estado de São Paulo........................................................................p. 116

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Lista de fotos

Foto 1: Aragem para plantação de batatas. Microbacia do Córrego da Onça II........p. 129

Foto 2: Processos de formação de voçorocas. Microbacia do Córrego da Onça

II.................................................................................................................................p. 130

Foto 3: Trecho do córrego do Norte marcado por passagem de gado. Microbacia do

Córrego da Onça II....................................................................................................p. 132

Foto 4: Ponte de ligação com os Bairros 1º de Maio e Timburi. Microbacia do Córrego

da Onça II..................................................................................................................p. 135

Foto 5: Cultura de eucalipto na microbacia do Córrego da Onça II...........................p.138

Foto 6: Propriedade rural abandonada. Microbacia hidrográfica do córrego da Onça

II.................................................................................................................................p. 140

Foto 7: Propriedade reformada para aluguel. Microbacia hidrográfica do córrego da

Onça II.......................................................................................................................p. 141

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Lista de mapas

Mapa 1: Área plantada de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo..........................p. 103

Mapa 2: Município de Presidente Prudente e localização de seus

distritos......................................................................................................................p. 117

Mapa 3: Esboço pedológico do município de Presidente Prudente. Destaque para a

microbacia hidrográfica do Córrego da Onça II........................................................p. 122

Mapa 4: Uso da terra e cobertura vegetal no município de Presidente Prudente-SP,

destaque para a microbacia hidrográfica do Córrego da Onça II..............................p. 134

Mapa 5: Programas financiados por agências multilaterais no Brasil.......................p. 179

Mapa 6: Brasil. Ocupação de terras – 1988-2012………………………………….p. 180

Mapa 7: Ocupações de terras e programas financiados pelo Grupo BM (BIRD,

IDA)...........................................................................................................................p. 181

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Lista de gráficos

Gráfico 1: Atividades econômicas na microbacia hidrográfica do Córrego da Onça II em

2015...........................................................................................................................p. 139

Gráfico 2: Nível de preocupação com os recursos naturais dos produtores da microbacia

hidrográfica do Córrego da Onça II...........................................................................p. 143

Gráfico 3: Eventos e documentos internacionais relacionados ao desenvolvimento

sustentável.................................................................................................................p. 198

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Lista de tabelas

Tabela 1: Uso de água microbacia hidrográfica do Córrego Da Onça II..................p. 123

Tabela 2: Resultados do PEMH na microbacia hidrográfica do córrego da Onça II –

Perspectiva do produtor.............................................................................................p. 249

Tabela 3: Melhoria das condições de produção e produtividade após a implementação

do PEMH. Microbacia do córrego da Onça II...........................................................p. 253

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Lista de quadros

Quadro 1: Estrutura fundiária da microbacia hidrográfica do córrego da Onça II...p. 118

Quadro 2 – Identificação dos problemas, causas e atividades previstas na microbacia

hidrográfica do Córrego da Onça II...........................................................................p. 120

Quadro 3: Características do solo na microbacia hidrográfica do córrego da Onça

II.................................................................................................................................p. 121

Quadro 4: Explorações vegetais na microbacia hidrográfica do Córrego da Onça II –

2005...........................................................................................................................p. 123

Quadro 5: Força de trabalho na microbacia hidrográfica da Onça II........................p. 126

Quadro 6: Intervenções na microbacia hidrográfica do córrego da Onça II...............p.128

Quadro 7: Projetos financiado pelo Grupo Banco Mundial relacionados ao

desenvolvimento sustentável no Brasil......................................................................p. 262

Quadro 7: Ideologias e formas de relação de poder..................................................p. 305

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Lista de organogramas

Organograma 1: Think Tanks e o processo de formulação e legitimação de políticas

públicas......................................................................................................................p. 236

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Lista de anexos

Anexo 1: Questões e formulários aplicados..............................................................p. 357

Anexo 2: Mapa da microbacia hidrográfica do córrego da Onça II..........................p. 365

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SUMÁRIO

Dedicatória....................................................................................................................p. 5

Agradecimentos............................................................................................................p. 6

Epígrafe........................................................................................................................p. 9

Resumo.......................................................................................................................p. 10

Resumen......................................................................................................................p. 11

Abstract........................................................................................................................p. 12

Lista de siglas..............................................................................................................p. 13

Lista de figuras............................................................................................................p. 14

Lista de imagens..........................................................................................................p. 15

Lista de fotos...............................................................................................................p. 16

Lista de mapas.............................................................................................................p. 17

Lista de gráficos...........................................................................................................p. 18

Lista de tabelas............................................................................................................p. 19

Lista de quadros...........................................................................................................p. 20

Lista de organogramas.................................................................................................p. 21

Lista de anexos............................................................................................................p. 22

Introdução....................................................................................................................p. 25

Parte I – 1970: a década do alarde...........................................................................p. 45

Capítulo 1. A influência do Grupo Banco Mundial no processo de descentralização e

inserção da perspectiva territorial e sustentável em políticas públicas para o

desenvolvimento rural ................................................................................................p. 49

1.1. O Grupo Banco Mundial no processo de descentralização de políticas públicas de

desenvolvimento rural no Brasil..................................................................................p. 51

1.2. Recomendações e articulações do Grupo Banco Mundial para a institucionalização

do desenvolvimento territorial rural sustentável.........................................................p. 67

Capítulo 2. As recomendações do Grupo Banco Mundial sobre o desenvolvimento

sustentável e a articulação entre o local e o global a partir de políticas públicas para o

desenvolvimento territorial rural no Estado de São Paulo..........................................p. 87

2.1. A expansão do setor sucroenergético e o desenvolvimento sustentável..............p. 88

2.2. O desenvolvimento sustentável como objetivo para a estruturação do Programa

Estadual de Microbacias Hidrográficas no Estado de São Paulo..............................p. 105

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2.3. A microbacia do Córrego da Onça II: características anteriores e posteriores a

execução do Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas...............................p. 118

Resumo da parte I....................................................................................................p. 145

Parte II – A vocação geograficamente expansiva do modo de produção

capitalista..................................................................................................................p. 146

Capítulo 3. Subsídios teóricos sobre a produção do espaço, o território e a

territorialização no modo de produção capitalista sob a perspectiva da Geografia

crítica.........................................................................................................................p. 149

3.1. A produção desigual e dialética do espaço geográfico.......................................p. 150

3.2. Territórios, processos de territorialização, monopolização e normatização do

território no modo de produção capitalista................................................................p. 163

Capítulo 4. Entre crises e ciclos: a dinâmica do modo de produção capitalista e a falha

sociometabólica.........................................................................................................p. 183

4.1. A dinâmica espacial e territorial do modo de produção capitalista....................p. 185

4.2. A fissura sociometabólica entre a sociedade e a natureza e sua relação com a

dinâmica do modo de produção capitalista................................................................p. 199

Resumo da parte II..................................................................................................p. 213

Parte III – Da década do alarde ao imperialismo ecológico: o desenvolvimento

sustentável como alternativa de reprodução do modo de produção

capitalista..................................................................................................................p. 214

Capítulo 5. O poder simbólico de políticas públicas de desenvolvimento territorial rural

sustentável e a reprodução do modo de produção capitalista....................................p. 219

5.1. A prática discursiva ideológica e as contradições do desenvolvimento territorial

rural sustentável imposto pelo Grupo Banco Mundial..............................................p. 221

5.2. O desenvolvimento territorial rural sustentável na microbacia hidrográfica do

córrego da Onça II: entre a aparência e a essência....................................................P. 243

Capítulo 6. Sobre a ideologia do desenvolvimento sustentável, ou, sobre o

imperialismo ecológico..............................................................................................p. 270

6.1. Desenvolvimento sustentável e a continuidade da falha sociometabólica.........p. 273

6.2. Um conceito conveniente, para a reprodução do modo de produção

capitalista...................................................................................................................p. 289

Resumo da parte III................................................................................................p. 316

Conclusões finais......................................................................................................p. 317

Referências bibliográficas.......................................................................................p. 322

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Introdução

Santos (2009) sugeriu três possibilidades para a realização de estudos

geográficos que nos ajudaram a conduzir a estruturação desta tese, sem querer com isto

indicar que estamos buscando tais pressupostos como objetivos. A primeira é que o

saber possa permitir um conhecimento ampliado; a segunda, que as ciências sociais

sejam imprescindíveis de reflexão para o entendimento concreto de fatos, eventos e

ações e; a terceira, que a Geografia se desprenda de paradigmas antigos e possa inovar

em termos de métodos, teorias, categorias de análises e conceitos. Com estes escritos

Santos (2009) nos fez pensar sobre a renovação na Geografia ocorrida na década de

1970 que incluiu novos pressupostos visando, dentre outros objetivos, a função social

da Geografia e o posicionamento do geógrafo frente à determinada realidade.

Para colaborar com este propósito e com o debate em torno do

desenvolvimento sustentável no contexto de um processo maior no qual a dialética da

mobilidade espacial de capitais permite a produção de novos espaços de reprodução –

no sentido proposto por Harvey (2005) – do modo de produção capitalista que se

apresenta com tendência mundial e superar o idealismo empírico, a fragmentação

teórica e o grau de pouca concretude histórica que alguns trabalhos acadêmicos expõem

sobre o tema, apresentamos esta análise sobre o desenvolvimento sustentável que, sob a

égide do modo de produção capitalista, se apresenta como o enigma da esfinge:

decifra-me ou te devoro.

Tendo em vistas uma aproximação cognitiva a tal enigma, sem a pretensão de

esgotar o debate sobre o mesmo, mas sim colaborar para o entendimento deste por meio

da averiguação de sua materialidade enquanto modelo de desenvolvimento, fizemos uso

de uma linha de pensamento reflexiva e crítica, ancorados em uma perspectiva teórica

materialista e dialética que consideramos necessária à interpretação desta fração da

realidade que se apresenta demasiada complexa, onde o acelerar dos tempos e o tropel

dos eventos dilui o conhecimento científico e fortalece a exterioridade dos fatos, o que

permite que pesquisas geográficas não atentas a estes fatos estimulem a produção de

determinado conhecimento científico amparado na descrição, contudo, como alertou

Santos (2009) descrição e análise são inseparáveis.

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Partimos da aparência e buscamos a essência do desenvolvimento sustentável

pela análise de sua materialidade que, pelo seu potencial de interescalaridade1, nos

permitiu a utilização do território como categoria analítica, pois neste reconhecemos o

lócus de conflitos pelo uso, posse e controle de recursos naturais, base fundamental

para garantir o desenvolvimento sustentável do próprio modo de produção capitalista.

Primeiramente, porque através dos elementos extraídos à “primeira

natureza”, o que se garante não é a conversão da “despensa primitiva” em

meios de subsistência, mas a produção, sob a forma de matérias-primas

brutas e alimentos, de capital circulante. Em segundo lugar, porque através da

geração de “condições de reprodução”, o que se gera não são aquelas

condições de continuidade sem os quais os homens não repetem com

regularidade que a produção dos meios de sobrevivência, mas capital fixo.

Em terceiro lugar, porque através do uso desses meios de produção o que se

está gerando não são meios de sobrevivência dos homens, mas mercadorias,

veículos de transformação da mais-valia extraída ao operário, em lucros. Em

quarto lugar, porque através da reinversão da mais-valia o que se reproduzirá

não será o desenvolvimento econômico-social da humanidade, mas

acumulação de capital (MOREIRA, 1996, p. 43, aspas no original).

Com isso, negamos a concepção humanitária do desenvolvimento sustentável

apresentada no Relatório Brundtland (ONU, CMMAD, 1991) de garantir um futuro

para as gerações vindouras a partir do reconhecimento que o modo de produção

capitalista é a base da exploração, seja de recursos naturais ou da própria sociedade e

o entendemos enquanto ideologia2, exposta e controlada por determinada classe social

visando à manutenção do staus quo, que se materializa por uma diacronia histórica e

geográfica que permite sua constante espacialização por meio de crises e ciclos

demonstrando suas características de mutabilidade (MARX, ENGELS, 2007; MARX,

1 A opção interescalar se deu pela escala de atuação global do Grupo BM que permite a materialidade de

projetos em distintos países e em distintas escalas, desde a regional a local. Este fato não nos permitiu

analisar algumas de suas ações in loco, porém, isto não representa falta de empiria, mas sim,

demonstramos que o potencial analítico da tese amplia a perspectiva de estudo sem risco para os

resultados, justamente, pela opção intraescalar. No caso da expansão do setor sucroenergético no Estado

de São Paulo, identificamos documentos que comprovam o financiamento da instituição do IAA e do

Proálcool, no caso do PEMH, identificamos e demonstramos o financiamento do mesmo pelo Grupo BM,

portanto, ao nos referirmos a demonstração da materialidade dos fatos e ações, estamos indicando a

análise da influência e posterior materialização das ações do Grupo BM. 2 Utilizamos, nessa pesquisa, o termo ideologia no sentido proposto por Marx e Engels (2012a) de

falseamento da realidade. Com esta opção, não pretendemos realizar uma abordagem reducionista deste

importante conceito da teoria marxista, a opção deve-se aos nossos objetivos neste momento e não

descartamos outras formas de interpretação, como as defendidas por Lênin (2010); Löwy (1986) e

Mannhein (1993) por exemplo. A ideologia do desenvolvimento sustentável propicia a ilusão da

harmonia entre a sociedade e a natureza e entre esta e o modo de produção capitalista subordinando esta

mesma relação aos interesses das classes dominantes justificando a dominação de classes, ou escondendo-

a, o que torna a ideologia forma de materialização de um discurso perfeito com explicita conotação

política. Daí a necessidade de verificação do desenvolvimento sustentável além de sua fetichização, pois,

por meio do conehcimento crítico de sua estrtura é possível sua desmistificação expondo sua essência idealista.

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2013; ENGELS, 2015) e irreformabilidade (MÉSZÁROS, 2007, 2011) se adequando às

novas necessidades e impedindo um modelo de desenvolvimento que mantenha as bases

do sociometabolismo entre a sociedade e a natureza (FOSTER, 2005).

Tais características do modo de produção capitalista permitem que seus

articuladores criem novos espaços para reprodução de capitais (HARVEY, 2005; 2011).

Sob este aspecto lembramos que, na década de 1970, um evento histórico, no sentido

proposto por Santos (2009), potencialmente danoso colocou em risco a estabilidade

econômica e política causando alardes mundiais: o embargo árabe às exportações do

petróleo ao Ocidente debilitou o consumo de energia e desestabilizou os mercados

financeiros mundiais, incrustando na balança de poderes uma nova intempérie na

reprodução do modo de produção capitalista, expondo este à falta de matéria prima para

garantir sua reprodução (CARVALHO, 1997). Neste momento instaurou-se uma crise

no mercado mundial e foi exposta a fragilidade do capitalismo frente à dependência de

recursos naturais por seu potencial de uso (MORAES, 2009; MARX, 2011).

Consideramos que estes são alguns dos acontecimentos que levaram

organizações internacionais a se mobilizarem em relação à proteção dos recursos

naturais, como foi proposto na primeira conferência internacional voltada a questões de

preservação de recursos naturais em Estocolmo (ONU, 1972).

Deste modo foi estabelecida a ascensão de um temor mundial conduzida por

um grupo articulado no interior da Organização das Nações Unidas (ONU), o Clube de

Roma3, que publicou o relatório Nosso Futuro Comum (MEADOWS et al, 1973),

idealizador do desenvolvimento sustentável (OLIVEIRA, 2012). Esse think tank reuniu

esforços para apresentar-se como sujeito coletivo impulsionando a política internacional

sobre preservação, conservação e recuperação de recursos naturais, inexistente até então

(LE PRESTRE, 2002). Para tanto, foi necessário criar condições legais e institucionais

para a materialização de uma nova proposta de modelo de desenvolvimento e a

descentralização de políticas públicas demarcou a inserção do adjetivo sustentável em

programas e políticas de desenvolvimento para o campo tendo em vistas conduzir

Estados a um novo patamar na relação entre a sociedade e a natureza por meio do

desenvolvimento sustentável (RIBEIRO, 2001).

3 A estrutra e formação do Clube de Roma será demonstrada somente na Parte III desta tese. Isto porque,

de acordo com a estrutura textual estabelecida, é nesta parte que verificamos nossa hipótese, portanto, os

esclarecimentos detalhados e as críticas cabem naquele momento.

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Já na década de 1990 tornou-se usual em vários setores, principalmente após a

realização da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento

realizada no Rio de Janeiro em 1992 (ONU, CMMAD, 1992), a utilização do termo

proposto – desenvolvimento sustentável – pela ONU para expressar diversos objetivos

tanto do setor privado quanto público, dentre estes, nos importam aqui programas e

políticas públicas voltadas ao desenvolvimento do campo, no qual o território também

passa a ter forte conotação. Foram necessárias ações que permitissem um controle

adequado de reserva de territórios (antecipação espacial) e também uma organização

destes territórios (seletividade espacial) na forma de uma gestão protocolar sobre os

países periféricos para que assim se impedisse choques decorrentes da possível falta de

fornecimento de recursos naturais. Esta atividade foi articulada pelo Programa das

Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e pelo Grupo Banco Mundial (Grupo

BM) na perspectiva de constituir áreas estratégicas de reservas de recursos naturais por

meio do controle normativo do território (PORTO-GONÇALVES, 2008).

Diante deste quadro, questionamos: estaríamos diante de um momento em que

a reprodução do modo de produção capitalista se dá, dentre outras formas, ancorada no

desenvolvimento sustentável? Esta questão inicial nos conduziu à organização da tese.

Iniciar pela problematização significa a proposição de uma questão que se torna um

tema, se afastando do conhecimento comum. Nosso tema é o desenvolvimento

sustentável. Esta escolha não foi aleatória. Para Severino (2002) “[...] A escolha de um

tema de pesquisa, bem como a sua realização, necessariamente é um ato político”

(SEVERINO, 2002, p. 145). A partir deste posicionamento tencionamos práticas

acadêmicas idealistas e acríticas sobre o desenvolvimento sustentável no sentido

proposto por Ribeiro (1991), que critica a exaltação de determinados referenciais

bibliográficos e o domínio de autores sobre temas que, aparentemente estão debatidos e

exauridos, chamando atenção assim para a forma como esta prática tem debilitado a

produção científica crítica nas ciências humanas (RIBEIRO, 1991).

Ainda em relação ao tema, esclarecemos que o debate sobre o desenvolvimento

sustentável não se encontra esgotado e tem significativa importância para a o estudo da

Questão Agrária, pois distintos paradigmas disputam seu controle. Apesar de serem

várias as publicações, nossa intenção é colaborar para o debate e reforçar o mesmo na

Questão Agrária4, tendo em vista que o desenvolvimento sustentável foi apresentado ao

4 Sobre a Questão Agrária ver, por exemplo, Kautsky (1986), Fernandes (2005) e Girardi (2008).

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mundo sob a égide do modo de produção capitalista que intensificou a ruptura

sociometabólica entre a sociedade e a natureza5 e entendemos que, no campo, este

processo desigual e contraditório tem permitido novas formas de disseminação deste

modelo de desenvolvimento que têm suscitado dúvidas sobre o mesmo, como, por

exemplo, os debates em torno da economia verde, green grabbing e neoextrativismo,

por parte daqueles que defendem o Paradigma do Capitalismo Agrário, e a agroecologia

e a soberania alimentar no Paradigma da Questão Agrária6, por tanto, teorizamos sobre

uam detrminada situação concreta, a vulgarização na utilização do conceito de

desenvolvimento sustentável sem maiores considerações sobre as implicações

decorrentes deste fato.

A compreensão dos fatos realizados pela ONU que envolvem o tema tem

significação contundente quando se aborda questões relativas à proposição de modelos

de desenvolvimento para o campo, pois consideramos que as dinâmicas territoriais

condicionantes que incidem sobre distintas áreas modificam as formas produzidas por

forças econômicas e políticas (SANTOS, 2003) espacialmente consubstanciadas por

meio de um processo dominante que Raffestin (1993) define como o trunfo do poder, o

domínio da população e do território: “O poder visa o controle e a dominação sobre os

homens e as coisas” (RAFFESTIN, 1993, p. 20).

Destes reconhecimentos e buscando colaborar com o debate científico em

relação ao tema proposto, estabelecemos como objeto de estudo o Programa Estadual

de Microbacias Hidrográficas7 (PEMH), considerando que a primeira característica do

objeto científico, segundo Bachelard (2005), é que ele não é dado pela natureza, em

continuidade com esta, mas, ao contrário, é construído pelo pesquisador. A partir da

revisão bibliográfica (FLEISCHFRESSER, 1999; SABANÉS, 2002; HESPANHOL,

2005, 2007, 2008; CLEMENTE, 2011; NEVES NETO, 2009, 2013) reconhecemos esta

política pública implementada no Estado de São Paulo durante os anos 2000 a 20088,

5 É sabido que a relação entre a sociedade e a natureza é conflitante e contraditória por si só. Nos modelos

socialistas de produção tal relação não foi diferente, porém, é a partir da expansão do modo de produção

capitalista que, intensificando a busca por recursos naturais e novos espaços de reprodução e acumulação,

que a relação e a falha sociometabólica se intensificou. 6 Sobre os Paradigmas da Questão Agrária consultar, por exemplo, Fernandes (2005), Campos (2012) e

Camacho (2014). 7 Apesar do PEMH ter sido implementado no Estado de São Paulo no período exposto, esclarecemos que

a opção por esta política pública como objeto de estudo se deve ao fato do mesmo ter sido considerado

um exemplo para as mudanças no que diz respeito a ação da extensão rural e inserção das perspectivas

sustentável e territorial em políticas públicas de desenvolvimento para o campo no Estado de São Paulo. 8 Justificaremos o lapso temporal desde o término desta pública até a concretização desta tese no

momento em que descreveremos o PEMH.

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como potencialmente ativa sobre o desenvolvimento do campo principalmente a partir

da proposta de desenvolvimento territorial rural sustentável.

Consideramos ainda para a definição do objeto de estudo o fato do PEMH ser

financiada pelo Grupo Banco Mundial (Grupo BM), importante agência internacional

de fomento que, apesar de autonomia frente a suas ações, configura-se no rol das

agências internas da ONU e atua no centro do modo de produção capitalista como

agente voltado à reprodução deste modo de produção (PEREIRA 2006, 2010, 2011)

fato este que permite questionar a ambiguidade de uma proposta de modelo de

desenvolvimento que tende à contrariedade da expansão capitalista que, pela sua lógica,

é reconhecidamente predatório de recursos naturais e sociais (PORTO-GONÇALVES,

1989, 2015).

Esta contrariedade em relação à expansão do modo de produção capitalista

pode ser entendida nas entrelinhas do próprio relatório Brundtland (ONU, 1984) quando

este afirma a necessidade de prover as gerações futuras as condições de estabilidade

social e natural sem questionar que são os efeitos da própria intensificação das relações

sociais de produção capitalistas que causam o rompimento sóciometabólico entre a

sociedade e a natureza.

Sendo assim, levamos em consideração que a forma como a sociedade produz

o espaço no tempo histórico é influenciada por determinadas relações sociais de

produção e sabendo que a Geografia estuda a sociedade através da sua organização

espacial que é, também, forma de reprodução social, o que importou na construção do

objeto de estudo foi à possibilidade de apreendê-lo cientificamente a partir de um

ângulo imprevisto, como escreveu Bourdieu (1999). Ou seja, objetivamos desconsiderar

o aspecto humanista que o desenvolvimento sustentável traz em seu bojo e, com isto,

buscar a compreensão do interesse do Grupo BM em um modelo de desenvolvimento

voltado à harmonização.

Considerando o exposto, o Grupo BM é estudado aqui como o grande

articulador voltado à materialização do desenvolvimento sustentável. Desta definição

optamos por analisar o PEMH, que possui como objetivo declarado a implementação do

desenvolvimento sustentável (SÃO PAULO, CATI, 2005, 2009) articulado ao Grupo

BM, pois tal análise permite estabelecer relações com categorias e conceitos geográficos

centrais para esta tese, como produção do espaço e o território – em distintas

concepções e processos de territorialização e normatização – e escala, além de meta

conceitos como ideologia, discurso, poder e Estado.

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Este é o objeto de estudo que utilizaremos para verificação de nossa hipótese,

pois permite uma análise territorial do desenvolvimento sustentável a partir da

perspectiva normatizada e zonal, que será contraposta a concepção relacional. Este

objeto permite ainda a análise escalar entendendo esta, a escala, enquanto instrumento

de controle social como foi trabalhado por Gómez (2006), uma vez que analisamos e

entendemos que esta política pública representa uma escala de comando global –

composta por sua agência financiadora, o Grupo BM – e apresenta sua materialidade

em escala local – uma microbacia hidrográfica – assim, a partir da escala de comando

global o Grupo BM articula suas ações para a reprodução do modo de produção

capitalista com o financiamento de projetos voltados ao desenvolvimento territorial

rural sustentável. Neste sentido, consideramos a distinção entre a escala da realização

das ações e a de seu comando. A partir desta definição delimitamos como área de

estudo a microbacia hidrográfica do Córrego da Onça II, localizada no distrito de

Montalvão, município de Presidente Prudente-SP.

Reconhecendo a amplitude e complexidade da problemática em que estão

postos o tema e o objeto de estudo, a tese atenta sobre um componente central – o

território – e dimensões correlatas – análise dos processos de territorialização do modo

de produção capitalista e normatização do território fundamentados no discurso do

desenvolvimento sustentável – protagonizados pelo Grupo BM que, fazendo uso de seu

poder influencia decisões governamentais de países credores pressionando os mesmos

para que o desenvolvimento territorial rural sustentável faça parte de suas agendas

políticas de distintas formas. Para tal análise recorremos à perspectiva geográfica crítica

tendo por base o pensamento marxista indicando que, nesta perspectiva:

[...] o olhar marxista é que deve afeiçoar-se ao arsenal categorial, conceitual e

linguístico da geografia. Trata-se menos de fazer de Marx um geógrafo, ou

esperar ver-se uma geografia nos escritos de Marx, que fazer da geografia

uma forma de olhar pelos olhos de um referencial marxista, mas com as

formas e categorias de olhar próprias. O olhar do marxismo emprestaria o

foco (MOREIRA, 2004, p. 30).

Este modo de pensar e fazer Geografia possui como fundamentação o

materialismo dialético de Karl Marx e Friedrich Engels e consideramos que a principal

contribuição teórica ao campo da Geografia diz respeito à integração dialética entre a

análise das estruturas e processos espaciais e territoriais aos processos e relações

sociais, alimentada pela perspectiva da transformação social. Conforme escreveu Capel

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(2012): “El descubrimiento de esta amplia temática exigia nuevos marcos teóricos de

análises. Fue ése el momento en que el marxismo se reveló como un soporte adecuado

para un enfoque alternativo” (CAPEL, 2012, p. 391). Neste sentido, a aplicação a

Geografia do método materialista dialético e histórico propõe uma concepção da

realidade como totalidade social9 e dinâmica e, para obter o conhecimento dessa

totalidade, não se pretende conhecer o todo pelo todo; a totalidade a que nos referimos é

composta de partes internamente relacionadas por uma causalidade dialética entre si

que, por sua vez, se constitui como uma totalidade em si mesma dentro de uma

totalidade maior.

Para poder estudar a totalidade social real no sentido que estamos propondo

cabe, portanto, fragmentá-la em partes, entendendo este processo como uma

necessidade analítica sem perder a noção de integridade entre as partes e o todo, ou

seja, demonstrar10

como processos globais se materializam em escalas menores. Ao

escrever sobre totalidade, fazemos referencia a uma totalidade que, na concepção

marxista é composta de partes e estruturas dialeticamente dependentes e em constante

movimentação, portanto, tratamos do processo de totalização.

[...] devemos distinguir a totalidade produzida e a totalidade em produção,

mas as duas convivem, no mesmo momento e nos mesmos lugares. Para a

análise geográfica, essa convergência e essa distinção são fundamentais ao

encontro de um método. [...] Assim, toda totalidade é incompleta, porque está

sempre buscando totalizar-se. Não é isso mesmo o que vemos na cidade no

campo ou em qualquer outro recorte geográfico? Tal evolução retrata o

movimento permanente que interessa à análise geográfica: a totalização já

perfeita, representada pela paisagem e pela configuração territorial e a

totalização que se está fazendo, significada pelo que chamamos de espaço

(SANTOS, 2009, p. 119).

E aí, o espaço se concebe como parte e todo de uma realidade social maior, de

uma totalidade social que, lembrando Moreira (1982), atua na produção do espaço

9 “A totalidade social na teoria marxista é um complexo geral estruturado e historicamente determinado.

Existe nas e através das mediações e transições múltiplas pelas quais suas partes específicas ou complexas

– isto é, as “totalidades parciais” – estão relacionadas entre si, numa série de inter-relações e

determinações recíprocas que variam constantemente e se modificam. A significação e os limites de uma

ação, medida, realização, lei, etc. não podem, portanto, ser avaliados, exceto em relação à apreensão

dialética da estrutura da totalidade” (MÉSZÁROS, 2013, p. 596). 10

A forma de demonstrar certos processos remete ao esforço intelectual de interpretação teórica de

determinada realidade por considerarmos impossível, neste trabalho, representarmos a totalidade dos fatos

aqui apresentados, por este motivo, remetemos a interpretação interescalar dos fatos, o que, de forma

alguma, impede a demonstração dos processos espaciais e territoriais a partir do Grupo BM. Portanto, o

demonstrar não está relacionado apenas a dados empíricos.

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sendo, portanto, objeto de estudo geográfico. Corroborando com este pensamento

Moraes (2005) deixa claro que:

Dizer que a produção do espaço social é um processo teleológico significa

que ele envolve uma finalidade. Esta orienta o trabalho humano,

diferenciando-o da atividade animal Trata-se de ação dotada de um sentido,

atribuído pelo executante. Um movimento que necessariamente se realiza

através de sujeitos, individuais e/ou coletivos que, ao agirem,desencadeiam

séries causais. Isto coloca o imperativo de se compreenderem as motivações

envolvidas para dar conta da produção do espaço, pois são elas que

impulsionam os sujeitos. (MORAES, 2005, p. 16).

Sob o raciocínio materialista histórico e dialético, o espaço, como parte e

todo, é dinâmico, logo, é verdadeiramente relevante o estudo da produção do espaço,

pois é a partir desta compreensão que adentramos o estudo do território e dos

processos de territorialização do modo de produção capitalista, na perspectiva

trabalhada por Oliveira (2004), e normatização do território, conforme Steinberger

(2013), considerando estes processos sob o comando hegemônico do modo de produção

capitalista.

Em consequência, buscamos a identificação de categorias analíticas que

possuem como origem aqueles elementos (objetos) e fatos (ações) derivados do

concreto e observados na realidade, uma realidade estabelecida como síntese da

diversidade total procedente do materialismo dialético.

Deste modo, com o propósito de evitar cair em um exagerado empirismo, e na

determinação de elementos duais isolados, que supervaloriza as relações entre si e as

dinâmicas, torna-se necessário elencar os elementos da realidade – espacial – sob a

relação dialética entre as partes e o todo.

Desta concepção da realidade, consideramos o espaço geográfico não como

elemento neutro que existe independentemente da organização da sociedade, o espaço é

considerado como processo produtivo exercido pela sociedade por meio de suas ações

e transformações impostas sobre a natureza, conforme escreveu Moraes (2005): “Todos

sabemos que as formas espaciais são produtos históricos. O espaço produzido é um

resultado da ação humana sobre a superfície terrestre que expressa, a cada momento, as

relações sociais que lhe deram origem” (MORAES, 2005, p. 15).

Com a finalidade de analisar o contexto mais geral do modelo de

desenvolvimento no campo paulista, podendo assim entender o que é verdadeiramente

sustentável no modelo geral de desenvolvimento do campo no estado de São Paulo,

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contrapomos o PEMH com o concomitante processo de territorialização do agronegócio

sucroenergético11

que, apesar de ter estagnado sua produção, este fato ocorreu em

altíssimo patamar e seus impactos ainda surtem efeitos no campo paulista. Isso

demonstra contrariedades e ambiguidades em relação a esta proposta de

desenvolvimento para o campo, já que o governo do Estado de São Paulo atende a

recomendações do Grupo BM e atua tendo como base o discurso do desenvolvimento

territorial rural sustentável e, ao mesmo tempo em que profere uma política pública com

objetivos de levar o desenvolvimento sustentável ao campo, se articula na expansão de

um setor agrícola altamente concentrador de renda e terra, socialmente e naturalmente

degradante. Por meio destes dois processos concomitantes é que realizamos a análise

dos processos de territorialização do modo de produção capitalista – expansão do setor

sucroenergético – e normatização do território – PEMH.

Deste modo, temos uma delimitação analítica sobre território e processos

territoriais tendo por base estudos de Milton Santos a respeito de concepções de

território, bem como de sua relação com o espaço geográfico. Para Santos (2009), pode

ser objeto de investigação o uso dado ao território, por exemplo, por políticas públicas,

neste sentido, o território é usado na ação governamental para condicionar determinadas

políticas públicas. Para ele, “[...] essa ideia de território usado [...] pode ser mais

adequada à noção de um território em mudança, um território em processo” (SANTOS,

1999, p. 19). Milton Santos contrapõe esta reflexão aquela levantada pela ciência

política, afirmando que a mesma, “[...] de modo geral, ignora o território – dá conta da

divisão dos estados, dos municípios, mas não dos conteúdos –, como se ele não tivesse

um conteúdo social” (SANTOS, 1999, p. 19), e destaca que este conteúdo, por sua vez,

é excluído de muitas análises científicas. Corroborando neste aspecto, Santos e Silveira

(2011) acrescentam que:

O território usado aponta para a necessidade de um esforço destinado a

analisar sistematicamente a constituição do território. [...] O uso do território

pode ser definido pela implantação de infraestruturas, [...] mas também pelo

dinamismo da economia e da sociedade. São os movimentos da população, a

distribuição da agricultura, da indústria e dos serviços, o arcabouço

normativo, incluídas a legislação civil, fiscal e financeira, que, juntamente

11

Exemplo este que não é posto aqui de maneira idealista, como se procurássemos na materialidade

aquilo que serviria aos nossos propósitos, mas sim, pelo fato de considerarmos que este tenha sido

impulsionado pelo discurso ideológico do desenvolvimento sustentável no sentido da utilização da cana-

de-açúcar e seu produto final – etanol – como potencialmente ativo no combate a emissão de gás

carbônico.

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com o alcance e a extensão da cidadania, configuram as funções do novo

espaço geográfico (SANTOS; SILVEIRA, 2011, p. 19).

Os diferentes usos do território, os modos como estes usos são feitos e quem o

utiliza são aspectos reveladores das relações estabelecidas tanto no plano econômico

quanto social e político. Indicam, portanto, muito mais que questões perceptíveis apenas

no plano visual, pois demonstram intencionalidades, dinâmicas e interesses dos diversos

agentes que atuam no território, como no caso que demonstraremos do Grupo BM.

Assim, é considerado não um território estático, definitivo, imóvel, imutável, mas vivo e

capaz de criar transformações sociais que, por sua vez, modificam o próprio território,

seja em uma perspectiva de manutenção das condições de reprodução do modo de

produção capitalista ou não.

É a partir desta delimitação que tencionamos o exposto entre o tema, o objeto

de estudo e o Grupo BM interpretando o processo de expansão capitalista nos territórios

por meio da territorialização do modo de produção capitalista (OLIVEIRA, 2004) e

normatização do território – processo esse que entendemos a partir de Santos (2009) e

Steinberger (2013) como um sistema normativo voltado para o ordenamento territorial

– que resultam na espoliação de recursos naturais via propostas alternativas de

desenvolvimento, como a idealizada pela ONU denominada de desenvolvimento

sustentável. Isto nos indica o uso instrumentalizado de políticas públicas e

problematizamos nosso tema considerando que este vem sendo ideologicamente

utilizado, no sentido mesmo de falseamento da realidade (MARX; ENGELS, 2012a),

para a promoção de novos espaços de reprodução do modo de produção capitalista.

Portanto, estes são os fatos, eventos e ações que constituíram o eixo central da tese:

tema, objeto de estudo, exemplo e área.

A partir deste ponto definimos os objetivos considerando a questão formulada

inicialmente. Fiorentini e Lorenzato (2006) escreveram que “[...] uma vez definida a

questão/pergunta da investigação, os objetivos da pesquisa podem ser, então,

formulados [...]” (FIORENTINI; LORENZATO, 2006, p. 91). O objetivo geral foi

elaborado e remete a verificação da hipótese de que o desenvolvimento sustentável seja

uma estratégia voltada à reprodução do modo de produção capitalista. Esta é a

hipótese que será avaliada, que permite o direcionamento a conceitos, temas e teorias

que busquem averiguar esta realidade em diferentes escalas.

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Consideramos o desenvolvimento capitalista interpretando uma escala global,

a mundialização12

que remete ao estudo do Grupo BM enquanto articulador deste

processo, na escala regional a territorialização do setor sucroenergético no estado de

São Paulo e, na local, o modelo de desenvolvimento territorial rural sustentável a

partir da análise do PEMH.

Os objetivos específicos foram definidos buscando dar coerência ao plano de

redação. Apresentam função intermediária e permitem a instrumentalização de

categorias e conceitos a partir da determinação de ações a serem realizadas que

complementam o entendimento sobre o tema e estão inclusos no bojo da hipótese:

a) identificar a influência do Grupo BM no processo de descentralização e inserção da

perspectiva territorial e sustentável em políticas públicas para o desenvolvimento do

campo no Estado de São Paulo;

b) interpretar concepções de território sob as perspectivas da delimitação física – zonal

e normativa – e relacional – a partir de relações de poder – e os processos de

territorialização e normatização a partir do exemplo posto e do objeto de estudo;

c) demonstrar a prática discursiva ideológica em torno do desenvolvimento

sustentável;

d) significar o conceito de desenvolvimento sustentável.

Definidos os objetivos, nos detivemos na definição do método. Das

observações iniciais sobre a relação entre o marxismo e Geografia destacadas por

Moreira (1988) e Capel (2014), optamos pelo materialismo histórico e dialético

reconhecendo a possibilidade de refutar opiniões do senso comum e também

acadêmicas sobre o desenvolvimento sustentável. A opção por este método tem por base

as contradições nas quais a sociedade encontra-se imbricada. Um período de distúrbios

políticos e econômicos de escala internacional, daí a história da sociedade ser

comandada pelos conflitos de interesses (ANDRADE, 1995). Neste sentido, o modo de

12

Optamos pela utilização do termo mundialização nesta tese a partir do trabalho de Chesnais (1996). O

autor citado chama atenção para o processo de produção intelectual e ideológica constituído a partir da

grande mídia estadunidense que impulsionou universidades, sobretudo nas áreas de administração e

marketing, daquele mesmo país a utilização do termo globalização. A intensificação do uso deste termo

foi pautada pela mídia e influenciou a ciência. Com o termo mundialização, o processo foi inverso a partir

do estudo de Chesnais (1996) que passou a demonstrar o processo de transformação do capitalismo

industrial e financeiro, centrado principalmente nas economias nacionais, para um capitalismo centrado

na economia mundial, daí a proposição do termo mundialização do capital.

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pensarmos as contradições da realidade, o modo de compreendermos esta como

essencialmente contraditória e em permanente transformação (KONDER, 1981), são

relacionados ao condicionamento imposto pelo modo de produção capitalista no sentido

de criar seus próprios espaços de reprodução pela produção dialética e desigual do

espaço geográfico (HARVEY, 2005, 2011).

Deste ponto passamos à definição dos procedimentos metodológicos.

Consideramos pertinente o uso da metodologia de pesquisa qualitativa, que objetiva

interpretar e não descrever os fatos que contornam a sociedade (MATOS, PESSÔA,

2009). Portanto, suscitamos reflexões diferenciadas de acordo com a finalidade da tese

para averiguar a hipótese proposta e consideramos a metodologia definida potencial a

análise das contradições, pois esta permitiu identificar nos agentes atuantes na

implementação – funcionários da CATI – e nos contemplados pelo PEMH –

agricultores camponeses13

– o que estes entendem pelo desenvolvimento sustentável,

sendo assim, buscamos valorizar os aspectos descritivos e as percepções pessoais dos

mesmos (BOGDAN; BIKLEN, 1994).

É imprescindível considerar que os procedimentos metodológicos adotados

nesta investigação resultam de um planejamento a priori em face dos objetivos e

questões norteadoras de tese, mas, sobretudo, produto do caminhar e aprofundamento

da investigação que foi apresentando novos procedimentos e oportunidades de

produção de informações considerando que a problemática do tema é o eixo

fundamental e norteador da tese, deste modo, foram necessárias a adoção de

determinada postura teórico-metodológica coerente para decifrar os fatos e uma atenção

ao lidar com a produção de informações para que pudéssemos realizar um bom trabalho

e não algo que “[...] poderia ser feito por qualquer bom repórter para o caderno de

cultura do jornal de domingo” (WHITAKER, 2002, p.37).

Tendo em vistas apresentar consistência, adequação e pertinência,

estabelecemos procedimentos metodológicos que permitissem uma coerência interna e

externa, tal como propôs Santos (2009). Externamente tal coerência se apura em relação

à conexão necessária estabelecida com outras áreas do saber que subsidiam o estudo

13

A partir das leituras do Paradigma da Questão Agrária realizadas por Fernandes (2005) e Girardi

(2008), com base principalmente em Kautsky (1986), Lênin (1985) e Chayanov (1974), utilizamos o

conceito de camponês para designar os agricultores de base familiar beneficiários do PEMH. A utilização

do termo camponês/campesinato decorre do fato de que os agricultores beneficiados utilizam

majoritariamente a mão de obra familiar (ver quadro 5) e também pelo conceito de campesinato, assim

como definido em Fernandes (2005) e Girardi (2008), expressar o posicionamento crítico presente neste

trabalho. Ao identificá-los como camponeses estamos nos posicionando de forma contraditória aos

impactos negativos do desenvolvimento capitalista no campo.

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geográfico, mediante o fato de nosso objeto de estudo, o PEMH, relacionado ao tema

proposto, o desenvolvimento sustentável e ao Grupo BM, apresentarem-se, ao mesmo

tempo, como forma e conteúdo para a verificação de nossa hipótese e estes estão, em

uma perspectiva epistemológica, próximos à economia e a política. A coerência interna

se dá pela definição de categorias analíticas propriamente geográficas que, por um lado,

dessem conta de abranger a materialidade a partir de frações do saber e, por outro lado,

permitissem a produção de instrumentos de análise retirados do processo histórico no

qual o desenvolvimento sustentável está posto, ou seja, o próprio desenvolvimento do

modo de produção capitalista, portanto, de acordo com o método delimitado. Assim, os

procedimentos metodológicos e as técnicas utilizadas envolveram estudos partindo das

questões gerais para as mais específicas, conforme listamos abaixo.

a) revisão bibliográfica sobre o tema (desenvolvimento sustentável), agente financiador

(Grupo BM), objeto de estudo (PEMH) e exemplo utilizado (setor sucroalcooleiro);

temas correlatos: descentralização e políticas públicas; conceitos gerais: modo de

produção, ideologia, discurso, poder e Estado; categorias, conceitos e temas

geográficos: produção do espaço, concepções de território, processos de

territorialização do modo de produção capitalista e normatização do território e,

escala;

b) análise documental: sobre o Grupo BM foram analisados documentos oficiais desde

a década de 1980, a seleção destes foi feita a partir das referências bibliográficas

que se relacionam a programas e financiamentos para o desenvolvimento rural,

incluindo a perspectiva territorial e sustentável; sobre o PEMH foi realizada a

análise dos Manuais Operacionais, documentos oficiais do governo do Estado de

São Paulo que possuem informações referentes a estruturação e formas de

implementação do mesmo;e realizamos busca de informações nos sites da internet

da CATI e Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo;

c) pesquisa nos sites do Grupo BM, Secretaria de Agricultura e Abastecimento do

Estado de São Paulo, União das Indústrias Canavieiras do Estado de São Paulo

(UNICA) e outros;

d) realização de entrevistas junto a representantes da associação dos produtores rurais

de Presidente Prudente – Associação dos cidadãos do campo de Presidente Prudente

(ASCICAMP) e funcionários da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral

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(CATI) – Regional de Presidente Prudente tendo em vistas verificar os resultados do

PEMH;

e) sistematização e análise das informações referentes aos resultados da

implementação do PEMH na microbacia do Córrego da Onça II;

f) organização das informações obtidas na pesquisa de campo, na forma de produtos

finais: tabelas, quadros, gráficos, figuras e fotos

g) redação final da tese.

A seguir explicamos estes procedimentos. A revisão bibliográfica, conforme

indicou Vianna (2001), propiciou o conhecimento a partir do que já se tem publicado,

nesta etapa, objetivamos reunir o maior número de referências encontradas sobre o tema

e objeto de estudo, conforme indicaram Cervo e Bervian (2002), para contribuir com o

aprofundamento sobre os mesmos. Tal procedimento teve então dois propósitos: a

construção de uma contextualização e a análise das possibilidades de entendimento

presentes na literatura consultada para a concepção do referencial teórico da pesquisa

(ALVES-MAZZOTTI, 2002), incluindo as categorias e conceitos geográficos principais

e os conceitos e temas correlatos.

Como indicaram Vosgerau e Romanowski (2014), ao realizar o exame de

perspectivas, multiplicidade e pluralidade de enfoques foi possível esclarecer

problemáticas históricas, além de compreender aportes significativos sobre o interesse

dos agentes atuantes no Grupo BM em relação ao desenvolvimento sustentável e, por

meio deste, identificamos lacunas que por nós foram aproveitadas para, conforme

escreveram Lakatos e Marconi (2010), podermos contribuir por meio desta para o

debate sobre o tema e o objeto de estudo. Assim, conforme escreveram Medeiros e

Tomasi (2008) iniciamos pela leitura dos clássicos sobre o tema para entendermos os

conceitos e as ideias principais e buscamos referências críticas relacionadas aos

nossos objetivos, sem descartar teses e dissertações, artigos e anais de conferências

internacionais e nacionais. Neste procedimento, conforme indicam Medeiros e Tomasi

(2008), alguns trabalhos foram sendo selecionados (excluídos ou não) de acordo com

critérios que vão desde a relevância dada ao tema até o grau de abstração identificado

em alguns trabalhos (livros e artigos). Neste sentido, incluímos na revisão bibliográfica

teses e dissertações sobre o PEMH e a expansão do setor sucroenergético no Estado de

São Paulo.

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A análise documental foi realizada, principalmente em relação ao Grupo BM,

objetivando “[...] identificar informações factuais nos documentos a partir de questões e

hipóteses de interesse” (CAULLEY, 1986, p. 38). Ao optarmos por este tipo de

procedimento consideramos que “[...] o que determina o que são as fontes é exatamente

o problema problematizado” (LOPES; GALVÃO, 2011, p. 79). A opção pela análise

documental decorreu da dificuldade de produzir informações diretamente com

representantes do mesmo e tendo em vista que essa pode representar a perspectiva

histórica do Grupo BM, sua relação com o objeto de estudo e o tema definido, sem

detrimento da produção de informações, visto que são documentos oficiais. A análise

documental propiciou tanto a produção de informações quanto o complemento de outras

obtidas por meio da revisão bibliográfica desvelando novos aspectos em relação ao tema

e ao objeto de estudo (LUDKE; ANDRÉ, 1986). Os documentos analisados foram fonte

insubstituível e sua validade é inquestionável, uma vez que permanece como registro de

interesses, de ações e relações de poder de determinado grupo social (CELLARD,

2008) permitindo ainda acrescentar a dimensão temporal ao nosso resgate histórico a

favor da compreensão geográfica da expansão do modo de produção capitalista.

A realização de entrevistas foi definida a partir da constatação de que esta é

uma técnica adequada para a produção de informações (BOGDAN; BIKLEN, 1994)

sobre a opinião dos agentes envoltos na estruturação e implementação do PEMH a

respeito do que se entende por desenvolvimento sustentável – em relação aos

camponeses e técnicos da CATI – e desenvolvimento territorial rural sustentável – em

relação aos técnicos da CATI. Por meio da entrevista semiestruturada, que nos permitiu

falar abertamente utilizando vocabulário adequado e quando necessário alternando a

sequência das questões ou complementando-as de acordo com nossos objetivos,

objetivamos permitir que os agentes “[...] ficassem à vontade e falassem livremente

sobre os seus pontos de vista [...]” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 136) e considerando

também a entrevista como sendo “[...] uma conversa com um objetivo” (GHIGLIONE;

MATALON, 1994, p. 64), desta forma, produzimos informações verídicas sobre nosso

tema, objeto e área de estudo.

Outra observação importante refere-se à delimitação da tese. Considerando a

extensão e complexidade em que estão inseridos o tema, objeto de estudo e o agente

financiador, estes, ao serem transpostos para a análise científica, requereram uma

contextualização. Neste sentido, em relação ao tema e ao objeto de estudo aquilo que

nos importa é verificar sua validade enquanto modelo de desenvolvimento para o campo

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capaz de superar as desigualdades provenientes do modo de produção capitalista; em

relação ao Grupo BM, destacamos o interesse e as ações desta agência internacional de

fomento para a promoção do desenvolvimento territorial rural sustentável.

Iniciando a redação optamos por fragmentar nossa tese em partes

considerando a tríade dialética (tese, antítese e síntese) entendendo este processo como

uma proposta analítica coerente ao método sem perder a noção de integridade entre as

partes e o todo e tendo como categoria analítica central o território – a tese se

desenvolve a partir da operacionalização deste conceito –, deste modo, articulamos a

tríade dialética sobre o mesmo tendo em vistas demonstrar diferentes formas como este

é instrumentalizado.

Este modo de composição não representa o distanciamento entre as partes, ao

contrário, indicamos ao leitor que a fragmentação conduz a totalidade, pois entendemos

que os fatos apresentados possuem correlações que analisadas de forma fragmentada

permitem entender a totalidade de um só processo, a reprodução do modo de produção

capitalista que possui no território condições de expressar sua materialidade. Com isto,

a intenção foi demonstrar como processos globais se materializam em escalas menores

visando alcançar a essência do desenvolvimento sustentável: capturando a sua estrutura

e dinâmica por meio de procedimentos analíticos e operando a sua síntese. Esta opção

pela composição da tese em partes exigiu uma concatenação entre categorias analíticas

geográficas e conceitos gerais internos e externos ao tema e objeto de estudo e, ao

mesmo tempo, constitutivos e operacionais dos mesmos.

Assim, o empenho foi de tornar capaz a utilização dos mesmos, deste modo,

objetivamos uma aproximação à materialidade da reprodução dinâmica do modo de

produção capitalista e sua relação com o desenvolvimento sustentável desdobrando

esta perspectiva para os processos de territorialização do modo de produção

capitalista e normatização do território, sob a perspectiva de identificar a influência do

Grupo BM neste processo. Feitos estes esclarecimentos em relação à estruturação da

tese, a seguir, apresentamos as partes e seu conteúdo relacionando este a determinados

objetivos.

Na parte I, intitulada “1970 – a década do alarde”, expomos a forma como as

perspectivas territorial e sustentável foram introduzidas no Brasil a partir de distintos

processos influenciados pelo Grupo BM (objetivos “a” e “b”).

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O capítulo 1 está dividido em dois itens. No item 1.1 demonstramos a influência do

Grupo BM em processos como a descentralização administrativa ocorrida no Brasil.

No item 1.2 expomos um conjunto de ideias que exacerbam o positivismo lógico sem

embasamento teórico e conceitual e afirmam a materialidade do desenvolvimento

sustentável fazendo uso da normatização e delimitação física do território. Este

conjunto de ideias é o que entendemos como a tese que autores e pesquisadores

como Navarro (2001), Veiga (2002, 2005), Abramovay (2000a, 2002, 2004), Sachs

(1986, 2004) e outros desenvolvem sobre o conceito de território enquanto área

fisicamente delimitada a partir da normatização, considerando este apto para a

reprodução de capitais e desconsiderando que as relações sociais de produção

capitalistas influem na produção do espaço e gerem, consequentemente, processos

conflitantes de territorialização.

O capítulo 2 foi estruturado em três subitens para demonstrar a materialização da tese

defendida pelos autores anteriormente citados. No item 2.1 expomos à expansão do

setor sucroenergético. O item 2.2 demonstra a forma como foi estruturado o PEMH

tendo em vistas entender à lógica que permitiu que o Grupo BM articulasse sua

atuação global em escala local fazendo uso, também, do desenvolvimento

sustentável. O item 2.3 expõe os resultados dessa política pública na microbacia

hidrográfica do Córrego da Onça II, no município de Presidente Prudente-SP.

Na parte II, que recebeu o título de “A vocação geograficamente expansiva do modo

de produção capitalista”; apresentamos os elementos teóricos14

que formam a

antítese em relação à concepção de território normatizado, tendo por base a

concepção territorial a partir de relações de poder – a concepção relacional de

território (objetivo “b”) a partir do trabalho de Raffestin (1993) que nos permitiu

identificar com Santos (1999; 2009) o uso dos territórios e com Fernandes (2005;

2008), a conflitualidade e a multiescalaridade nos, e dos, territórios contrariando as

concepções apresentadas na Parte I desta tese.

No capítulo 3 demonstramos em que problemáticas geográficas estão envolvidas as

concepções de produção do espaço e os processos que concebem materialidade ao

território. No item 3.1 priorizamos o que se refere à produção desigual e dialética do

14

Pela forma de estruturação definida, nesta parte da tese, os aspectos materiais do objeto de estudo não

estão presentes. Tratamos neste ponto de criarmos, justamente, o arcabouço teórico que nos permitiu, na

parte III, a verificação de nossa hipótese.

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espaço e a influência que o modo de produção capitalista possui neste processo. No

item 3.2 a atenção se volta à concepção de território relacional e as relações de

poder que influem sobre os processos de territorialização do modo de produção

capitalista e normatização do território demonstrando, com base em autores como

Raffestin (1993), Haesbaert (2012), Saquet (2007), Oliveira (2004) e outros, que

priorizam as relações de poder a partir de centros de comando de reprodução do

modo de produção capitalista na formação de territórios.

No capítulo 4 evidenciamos que as crises do modo de produção capitalista são

etapas de um processo no qual as distinções geográficas combinadas à produção

espacial e territorial desigual contribuem para a criação de novos espaços de

reprodução capitalista enquanto necessidade histórica. No item 4.1 a dinâmica

espacial e territorial deste modo de produção ganha relevância, pois nos permite

explicar os meios pelos quais a desigualdade da reprodução do modo de produção

capitalista se estende a incorporação do desenvolvimento territorial rural sustentável.

No item 4.2 expomos como o capitalismo vem se reproduzindo com base no

desenvolvimento sustentável, seja por financiamento de projetos, programas ou

políticas públicas para o desenvolvimento do campo.

A parte III, intitulada “Da década do alarde ao imperialismo ecológico: o

desenvolvimento sustentável como alternativa de reprodução do modo de produção

capitalista” é nossa síntese, onde voltamos à materialidade da política pública

delimitada para análise verificando seus resultados, com isso objetivamos:

demonstrar o poder simbólico de políticas públicas de desenvolvimento territorial

rural sustentável pela descaracterização do conceito de território e; o falseamento da

realidade que o desenvolvimento sustentável traz em seu bojo (objetivos “c” e “d” –

verificação da hipótese).

No capítulo 5 descrevemos como foi estruturada a complexa relação de poder que se

materializa na prática discursiva ideológica do desenvolvimento sustentável. No item

5.1 verificamos com maior acuidade o fato de que o uso de políticas públicas de

desenvolvimento territorial rural sustentável representa, na verdade, a reprodução

do modo de produção capitalista. A partir da materialidade do PEMH, no item 5.2

demonstramos que o Grupo BM faz uso de seu poder de influência e do apelo

humanitário por de trás do desenvolvimento sustentável para ampliar sua escala de

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atuação fazendo uso de políticas públicas de desenvolvimento territorial rural

sustentável.

No capítulo 6 analisamos a ideologia do desenvolvimento sustentável reconhecendo

neste processo a normatização e delimitação territorial nos marcos da reprodução

capitalista do espaço. No item 6.1, demonstramos que o desenvolvimento sustentável

é parte dos mecanismos de reprodução do modo de produção capitalista que amplia a

falha sócio-metabólica na relação entre a sociedade e a natureza. No item 6.2

significamos o desenvolvimento sustentável como um conceito convenientemente

elaborado, considerando o fato que tem se tornado regra, sob a primazia ideológica

do modo de produção capitalista, compreendê-lo desarticulado do processo histórico

de formação das relações sociais de produção.

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Parte I

1970: a década do alarde

Na década de 1950 a revolução verde, projeto altamente financiado pelo Grupo

BM (PEREIRA, 2011), alterou as bases produtivas agrícolas por meio do uso intensivo

de fertilizantes químicos, máquinas, equipamentos, agrotóxicos e monoculturas

(MAZOYER, ROUDART, 2010). A ideia de desenvolvimento rural, neste período, se

restringia ao incremento da produção e produtividade e não foram poupados insumos

para alcançar esta proposta.

Nesta perspectiva o modelo de produção agropecuário praticado

posteriormente às décadas de 1960 e 1970, período conhecido, no Brasil, pelo termo

modernização conservadora15

, foi fortemente influenciado pela intensificação do capital

industrial internacional no campo adquirindo um caráter negativo, sobretudo pelas

comunidades rurais mais pobres, em relação ao modo de apropriação, exploração e

expropriação, tanto de recursos naturais, quanto da força de trabalho (EHLERS, 1999;

GRAZIANO NETO, 1984). Este acordo, político e econômico, acabou por condicionar

a formação de uma burguesia dependente de fatores externos, que não conseguiu

apresentar um projeto autêntico e autônomo, conduzindo o país para uma economia

dependente da dinâmica dos países centrais em termos estruturais e políticos.

Os sinais degradantes deste modelo agropecuário passam a ser relatados ainda

na década de 1960, por meio da identificação de problemas relacionados aos recursos

naturais e a sociedade, apesar deste reconhecimento a revolução verde continua sendo

intensificada até a contemporaneidade, porém, com novos traços, como a biotecnologia

e a transgenia. Com a publicação dos impactos negativos16

deste modelo de

desenvolvimento para o campo, tem início o questionamento sobre o uso indiscriminado

de produtos químicos e da mecanização respaldada pelo projeto desenvolvimentista

implementado na agropecuária17

. Ainda neste período, estes alardes soam em tom mais

15

Guimarães (1977), segundo Pires e Ramos (2009), foi quem introduziu o termo modernização

conservadora no Brasil indicando que esta etapa da agropecuária recebeu esta denominação porque, “[...]

tem por objetivo o crescimento da produção agropecuária mediante a renovação tecnológica, sem que seja

tocada ou grandemente alterada a estrutura agrária” (GUIMARÃES, 1977, p. 3). 16

Com destaque para os trabalhos de Carson (1962) e Hardin (1968). No Brasil, destacamos os trabalhos

de Graziano Neto (1984) e Lutzenberger (1980). 17

Reconhecemos que Marx, e outros autores em momentos distintos desde a publicação do Manifesto do

Partido Comunista, denuncia a prática exploratória de um modelo de produção agropecuário altamente

baseado nos imperativos da mecanização e quimificação, porém, reconhecemos também, que muito de

seu trabalho foi negligenciado durante décadas, daí nossa resalva sobre o momento de identificação dos

danos sociais e naturais deste modelo de produção agropecuário.

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agudo após a publicação do relatório Os Limites do Crescimento (MEADOWS, et al,

1972). De acordo com Oliveira (2012), este foi o mais impactante documento produzido

sobre a questão que envolve a preservação de recursos naturais e seu alcance

internacional causou certo pânico devido ao tom catastrófico.

Soado o alarde, a ONU promove a Conferência das Nações Unidas para o

Meio Ambiente Humano (ONU, CHE, 1972), considerada um marco histórico

internacional decisivo para o surgimento de recomendações, princípios e normas

internacionais (LE PRESTRE, 2005) cujas consequências políticas e econômicas ainda

estão provocando acontecimentos. Posteriormente e resultante da conferência anterior

(ONU, CHE, 1972), na década de 1980, foi criada pela ONU a Comissão Mundial sobre

Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD) presidida pela primeira ministra

norueguesa, Gro-Harlem Brundtland, a quem foi delegada a incumbência de organizar

um relatório para:

[...] propor estratégias ambientais de longo prazo para obter um

desenvolvimento sustentável por volta do ano 2000 e dai em diante;

recomendar maneiras para que a preocupação com o meio ambiente se

traduza em maior cooperação entre os países em desenvolvimento e entre

países em estágios diferentes de desenvolvimento econômico e social e leve à

consecução de objetivos comuns e interligados que considerem as inter-

relações de pessoas, recursos, meio ambiente e desenvolvimento; considerar

meios e maneiras pejos quais a comunidade internacional possa lidar mais

eficientemente com as preocupações de cunho ambiental; ajudar a definir

noções comuns relativas a questões ambientais de longo prazo e os esforços

necessários para tratar com êxito os problemas da proteção e da melhoria do

meio ambiente, uma agenda de longo prazo a ser posta em prática nos

próximos decênios, e os objetivos a que aspira a comunidade mundial (ONU,

CMMAD, 1988, p. 11).

Surge então, meio à necessidade do resgate teórico em torno do

desenvolvimento que, de acordo com Sachs (1986), Hirschmann (1996) e Krugman

(1997) estava em estagnação no debate acadêmico, o desenvolvimento sustentável. A

partir deste, outras instituições e agências internacionais, dentre elas o Grupo BM,

passam a colocar em seus discursos, documentos e recomendações esse modelo de

desenvolvimento18

– sustentável – como imprescindível para o futuro da humanidade.

Os projetos de desenvolvimento rural também passam por resignificações e recebem

18

Por modelos de desenvolvimento, consideramos as diferentes estratégias articuladas em torno da

expansão do modo de produção capitalista, desde sua fase monopolista, a partir de distintos focos,

estratégias de intervenção e ênfase, como, por exemplo, os modelos setoriais, endógenos, regionais e

sociais e modelos com base em ajustes estruturais.

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esses novos impulsos, sobretudo para a liberação de financiamentos por parte do Grupo

BM.

Outro fato de suma importância na década 1970, que possui relação com nosso

tema, foram as sequenciais crises no setor petroleiro e seus reflexos sobre o

desenvolvimento rural19

. Este foi o momento de estancamento do período expansivo da

economia capitalista que tornou os postulados neoliberais hegemônicos a partir da

posição tomada, sobretudo pelo Grupo BM, na imposição de medidas de cunho

neoliberais a países periféricos. Já na década de 1980, visando ampliar geograficamente

e estrategicamente seu poder20

de atuação e a linha econômica e política adotada, a

descentralização no planejamento, além de um apelo comunitário, se tornou

recomendação do Grupo BM para financiamentos de políticas públicas (WORLD

BANK, 1985).

Assim, consideramos que o atrelamento de distintos processos articulados em

escala global possibilitou a proposição de modelos de desenvolvimento com distintas

conotações, como: social, humano, regional, rural, local, territorial e sustentável. Dentre

essas abordagens de desenvolvimento, aquelas que nos importam nesta pesquisa são a

territorial e a sustentável. A primeira, pela relevância do conceito para a Geografia,

em particular no que nos possibilita compreender as dinâmicas envoltas nas políticas

públicas de desenvolvimento rural; a segunda, pela sua forte institucionalização sem

maiores preocupações sobre seu significado, fato este que acabou por fortalecer seu

uso, inclusive na Geografia, alcançando status de conceito, aceitação e referência direta

ou indireta por pesquisadores que se dedicam a políticas públicas e projetos de

desenvolvimento voltados ao campo ou outros setores. Portanto, justifica-se a atenção,

para que indevidos ajustes desenvolvimentistas não sejam realizados em prol de algo

ainda, indefinido. Evidenciando a situação exposta, nos capítulos 1 e 2, expomos:

19

Sobre esta relação, Mazoyer e Roudart (2010), por exemplo, escreveram que neste período a elevação

do preço do barril de petróleo fez com que insumos utilizados na agricultura e na pecuária, também

sofressem aumentos significativos e este fato fez com que o valor final dos produtos também sofresse

aumentos, o que acabou gerando uma crise interna devido à sobreprodução. 20

Sobre poder, nesta parte de nossa pesquisa, utilizamos o sentido de poder efetivamente exercido,

conforme escreveu Stoppino (1998). Ou seja, em relação ao Grupo BM, entendemos que o mesmo possua

a capacidade de exercer determinado poder que, quando posto em prática, exercido, influência

determinados comportamentos e é posto em prática, consiste em provocar intencionalmente determinado

comportamento em um grupo, também, determinado. Neste sentido, o que provoca o reconhecimento do

poder é o interesse de agir do Grupo BM sobre determinada área geograficamente delimitada sendo que,

esta potencialidade de poder é efetivamente exercida, materializada, pelos agentes da CATI.

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a influencia do Grupo BM no processo de descentralização de políticas públicas e

sua perspectiva territorial e sustentável para o desenvolvimento do campo;

a materialização das propostas do Grupo BM tendo como exemplos o PEMH, em

escala local e a expansão do setor sucroenergético, em escala regional.

Com isso, na primeira parte de nossa pesquisa (capítulos 1 e 2),

demonstraremos a tese21

defendida por autores e pesquisadores como Navarro (2001),

Veiga (2002, 2003, 2004), Abramovay (2000a, 2002, 2005), Sachs (2004) e outros que

consideram que as relações sociais de produção capitalistas podem ser materializadas

sem maiores implicações a produção do espaço por meio de processos de

territorialização do modo de produção capitalista e normatização do território, deste

modo, tornam o desenvolvimento sustentável, nos moldes da ONU e do Grupo BM, a

solução para o desenvolvimento do campo. Neste aspecto, estes autores levam em

consideração que o território, por meio de sua delimitação física, potencializa a

acumulação e reprodução do modo de produção capitalista e desconsideram as

implicações sociais e naturais deste processo fundando-se em aspectos paliativos

adequados com adjetivações ao processo de desenvolvimento, seja ele endógeno, local,

sustentável ou qualquer outro. O conflito e a conflitualidade não são considerados

nessa perspectiva, sendo assim, os problemas relativos ao desenvolvimento do campo

seriam resolvidos com o a integração produtiva ao mercado, tendo o Estado como

idealizador do processo desenvolvimentista.

Portanto, o território é visto apenas como área apta à implementação de

determinado projeto a partir de recomendações do Grupo BM. Nesta perspectiva

teríamos um “[...] território que se entende como instrumento base para a elaboração e

implementação de políticas públicas” (GÓMEZ, 2006, p. 4) na qual os agentes atuantes

na reprodução do modo de produção capitalista entendem que políticas públicas

voltadas ao desenvolvimento territorial rural sustentável podem e devem ser

implementadas como forma de resolução de questões envoltas na relação entre a

sociedade e a natureza.

21

Utilizamos aqui o termo tese para identificar e demonstrar o posicionamento de autores e pesquisadores

em relação ao desenvolvimento territorial rural sustentável como algo humanitário e, principalmente, a

concepção de território – área – que permite a materialização deste modelo de desenvolvimento, a partir

da normatização do território. Sobre a propositura da utilização do termo tese a apresentação do conjunto

de ideias destes autores, seguimos, por exemplo, o trabalho de Oliveira (2004).

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Capítulo 1. A influência do Grupo Banco Mundial no processo de descentralização

e inserção da perspectiva territorial e sustentável em políticas públicas para o

desenvolvimento rural

Reconhecidamente, um dos principais agentes globais que atua em espaços

sociais de poder é o Grupo BM, impondo um conjunto de políticas econômicas

neoliberais a distintos países como condição para a obtenção de créditos e credibilidade

frente ao capital internacional (PEREIRA, 2010). Esta agência internacional de fomento

tem contribuído para criar uma posição política coerente e unificadora cada vez mais

centrada no livre comércio, conformando uma instituição de recomendações políticas e

econômicas mundializada que tem se aproveitado das facilidades proporcionadas pelo

vasto alcance espacial de sua influência sobre países periféricos para difundir suas

estratégias por meio do desenvolvimento institucional de seus projetos (PEET, 2011).

Assim, a aceleração do processo de mundialização da economia capitalista a

partir da década de 1990 propiciou alterações fundamentais nas relações políticas e

econômicas exercidas pelo Grupo BM. Nesse sentido, ações desta agência internacional

produzidas na forma de recomendações para programas e políticas públicas de

desenvolvimento rural podem produzir eventos e esses produzirem normas que irão

conduzir padrões de desenvolvimento em distintas nações.

Nesse sentido toda teoria da ação é, também, uma teoria do evento e vice-

versa. Essa assimilação da ideia de evento e da ideia de ação é fundamental

para a construção de uma teoria geográfica. [...] os eventos sociais resultam

da ação humana, da interação entre os homens [...]. Aqui, é o movimento da

sociedade que comanda, através do uso diversificado do trabalho e da

informação. Os eventos históricos supõem a ação humana. De fato, evento e

ação são sinônimos. Desse modo, sua classificação é, também, uma

classificação das ações. Os eventos também são ideias e não apenas fatos.

Podemos admitir que, ao lado de uma duração natural, o evento também pode

ter uma duração organizacional. A duração natural deriva da natureza original

do evento, de suas qualidades individuais, de sua estrutura íntima. Mas,

podemos, também, prolongá-lo, fazendo-o durar além de seu ímpeto próprio,

mediante um principio de ordem. Em vez de ser deixado a si mesmo, altera-

se o seu processo natural. Como também é possível limitar ou reduzir sua

existência, amputando o seu período de ação, mediante um recurso

organizacional. Uma lei, uma decisão governamental, uma portaria de um

Banco Central, uma regra de um banco privado ou uma empresa são formas

organizacionais que interferem na duração dos eventos, quando não a

determinam diretamente. Os eventos não se dão isoladamente, mas em

conjuntos sistêmicos – verdadeiras "situações" – que são cada vez mais

objeto de organização: na sua instalação, no seu funcionamento e no

respectivo controle e regulação. Dessa organização vão depender, ao mesmo

tempo, a duração e a amplitude do evento. Do nível da organização depende

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a escala de sua regulação e a incidência sobre a área de ocorrência do evento

(SANTOS, 2009, p. 147, itálicos nossos).

E são as normas, políticas, técnicas e organizacionais, que orientam e

conduzem a forma como um conjunto de ações ocorre. Como escreveu Santos (2009):

[...] existem ações capazes de ter efeitos de abrangência mundial, no sentido

de que, num dado momento, sua eficácia se faz sentir além dos níveis local,

regional ou nacional, interessando pontos numerosos situados em diversos

países e continentes (SANTOS, 2009, p. 143, itálicos nossos).

As recomendações, estratégias e políticas difundidas pelo Grupo BM não são,

contudo, implementadas mecanicamente em distintos governos, existe uma complexa

engenharia instrumental que, há tempos, permeia este processo de acordo com as

relações de poder que se estabelecem no campo da formulação das políticas públicas.

Deste, ponderamos não mais ser possível se pensar na materialidade22

de

políticas de desenvolvimento rural no país sem levar em consideração a influência do

Grupo BM. Não há sinais de que ele deixará de elaborar estratégias e políticas neste

sentido. Pelo contrário, cada vez mais, ele tem se dedicado a este aspecto na busca da

construção de meios que possam favorecer o mercado com o objetivo de transformar o

campo em adequado instrumento de crescimento econômico, como ressalta o relatório

Agriculture, Rural Development, and Pro-poor Growth (WORLD BANK, 2005)23

ao

propor medidas e recomendações a países periféricos incluindo o financiamento de

políticas públicas em seus programas, menos por uma questão de justiça ou equidade

social e mais por uma estratégia política tendo em vista o receio de revoltas ou

manifestações contrárias a sua legitimidade. Mais recentemente a Organização Das

Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) atestou a contínua participação

22

Ao longo desta tese utilizamos o conceito de materialidade em distintas perspectivas, a primeira

relacionada ao método em uma perspectiva marxista com base em Lenin (1982) e Engels (2015) e, a

segunda, em relação à concretude dos fatos realizados e postos em práticas no contexto de nossa pesquisa

enquanto proposta de modelos de desenvolvimento. Por hora, esclarecemos que esta perspectiva de

método permite que nos afastemos de observações idealistas, deste modo, concordamos com os escritos

de Lenin (1982) sobre o conhecimento produzido no qual o pesquisador que conhece enfrenta o objeto

real em busca de sua essência pela abstração e que busca, a partir dessa suposição de um encontro direto

do pensamento com a realidade, de uma visão não mediada do objeto pelo sujeito, garantias externas da

verdade do conhecimento. Neste sentido, Lenin (1982) escreveu que: “O materialismo em geral

reconhece o ser objetivamente (a matéria), independente da consciência, da sensação, da experiência, etc.,

da humanidade. O materialismo histórico reconhece que é independente da consciência social da

humanidade. A consciência, tanto aqui como ali, é apenas um reflexo do ser, no melhor dos casos um seu

reflexo aproximadamente fiel (adequado, idealmente preciso).” (Lenin, 1982, p. 247). 23

Utilizamos a forma de referência World Bank quando os documentos originais estão em inglês, para

aqueles que foram traduzidos para o português ou espanhol, utilizamos a forma Banco Mundial.

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do Grupo BM em projetos de desenvolvimento rural (FAO, 2016) nas perspectivas

territorial e sustentável.

Nesse contexto está inserido o processo de descentralização política

administrativa no Brasil, que se relaciona a novos entendimentos sobre políticas

públicas a partir da abordagem de desenvolvimento rural com viés territorial e

sustentável a partir das recomendações do Grupo BM. As representações sociais

predominantes fornecem valores, normas e símbolos que estruturam as relações sociais

e, como tais, fazem-se presentes no sistema de dominação, atribuindo significados à

definição social da realidade que vai orientar os processos de decisão, formulação e

implementação destas políticas (JOBERT; MULLER, 1987) contornando o território e

tornando-o fisicamente delimitado e operacionável de acordo com interesses

determinados estrategicamente.

1.1. O Grupo Banco Mundial e o processo de descentralização de políticas públicas

de desenvolvimento rural no Brasil

Demonstraremos aqui a evidência de que, na conjuntura da mundialização

neoliberal, o Grupo BM representa uma espécie de poder hegemônico24

, ainda que

informal, que se articula em torno do controle de capitais, formado por agentes políticos

de governança global25

do qual se destaca o poder de interferência na formulação de

políticas globais (HAESBAERT, PORTO-GONÇALVES, 2006), considerando que a

política econômica internacional passou por transformações desde que as fronteiras

bipolares materiais entre o capitalismo e o comunismo foram minimizadas na década de

1990. Assim, consideramos que cada vez mais o exercício da governança global, por

meio de agentes como o Grupo BM, influência tomadas de decisões administrativas

com a sobreposição de relações de poder em variadas escalas espaciais.

Consideramos de suma importância demonstrar que o processo de

descentralização de políticas públicas no Brasil, durante as décadas de 1980 e 1990,

pode ser compreendido através de um amplo prisma que contemple, em seu bojo,

24

Ainda que Grupo BM não seja o único agente no processo de expansão das relações capitalistas, este

ainda é um dos principais agentes que definem as regras para países tomadores de empréstimos e interfere

no planejamento territorial autônomo e, este fato, nos permite escrever sobre relações de poder e

concepções territoriais de desenvolvimento devido a cooptação dos países credores. 25

Consideramos a possibilidade de uso do termo governança global, tendo o Grupo BM como articulador,

em sentido que expressa sua relação com a Geografia por meio da atuação de poderes supranacionais

sobre a gestão e regulação de investimentos a partir do gerenciamento de determinados recursos nos

territórios em direção a determinado modelo de desenvolvimento.

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elementos de natureza política, econômica e até de ingerência internacional sobre as

ações de poder do Estado brasileiro. Para Bobbio (1998):

[...] o valor fundamental da Descentralização é amplamente reconhecido, seja

no seio de uma única organização administrativa, seja com referência ao

relacionamento entre múltiplas estruturas, que fazem parte de uma

organização mais abrangente vista em sua totalidade. Os estudiosos da

ciência da administração, da ciência política e do direito costumam afirmar

que o problema da transferência das funções do "centro" para a "periferia" é

natural em qualquer administração que tenha ultrapassado certas dimensões,

compreendendo não apenas a administração estatal, mas também a de

entidades públicas menores e de grandes entidades empresariais privadas. Em

particular, há tempos foi esclarecida a conexão entre administração pública e

a mudança das estruturas sociais, com a conseqüente necessidade de que o

desenvolvimento das estruturas administrativas seja adequado a esta

mudança, ativando uma inteligente distribuição de funções e de tarefas,

obedecendo a critérios que, à luz das transformações sociais do momento,

permitam que as mudanças realizadas apresentem um substancial conteúdo e

uma operacionalidade real (BOBBIO, 1998, p. 330).

Colaborando com este entendimento e a título de esclarecimento,

conceitualmente, entendemos aqui descentralização como estratégia operacional que

conduz o modus operandi para uma nova concepção de políticas públicas, associada a

mecanismos também inovadores, como a abertura de canais de participação dos agentes

sociais envolvidos. Como assinala Buarque (1999):

A descentralização é a transferência da autoridade e do poder decisório de

instâncias agregadas para unidades espacialmente menores, entre as quais os

municípios e as comunidades, conferindo capacidade de decisão e autonomia

de gestão para as unidades territoriais de menor amplitude e escala

(BUARQUE, 1999, p. 16).

Desta delimitação, chamamos atenção para o processo histórico que vai

fortalecer o movimento a favor da descentralização de políticas públicas no Brasil com

vistas a demonstrar que este processo, além das atribuições acima demonstradas nas

citações de Bobbio (1998) e Buarque (1999) teve em vistas beneficiar a entrada do país

no contexto neoliberal tendo em vista que, de acordo com Grant (1996):

[...] o neoliberalismo tem sido, de longe, a mais influente nos governos

(mesmo em alguns governos socialistas e comunistas). Figuras eminentes

incluem F.A. Hayek, Karl Popper e Milton Friedman. [...] Todos apreciam a

“ordem espontânea” supostamente exemplificada nos mercados livres, no

direito consuetudinário e (os mais conservadores acrescentariam) na tradição,

e deploram qualquer política (mormente o socialismo) que alegue um

conhecimento definitivo das necessidades humanas. Tal conhecimento

absoluto não é acessível a nenhum observador central e, por conseguinte, a

nenhum governo. Não obstante, ele existe, mas somente difundido na miríade

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de transações imprevisíveis entre indivíduos que vivem em uma

SOCIEDADE ABERTA ou livre. Portanto, o maior número possível de

decisões deve ser transferido para o mercado, o qual, em uma opção

maximizante, é a única democracia genuína (GRANT, 1996, p. 526, aspas e

maiúsculas no original).

Normalmente, pesquisas indicam que a descentralização ocorreu após intenso

processo de mobilização da sociedade civil em prol da democratização e este se deu

após a promulgação da Constituição Federal de 1988 e este é um fato que deve ser

levado em consideração, porém, não foi o único motivo. Neste sentido:

É afirmação constante e generalizada que existe uma estreita conexão entre

os conceitos de Descentralização e de democracia, também em relação ao

fato de que a luta pela Descentralização consistiu, principalmente, na luta

pelas autonomias locais a fim de perseguir, além da Descentralização,

objetivos de democratização (BOBBIO, 1998, p. 332).

Neste item, demonstraremos que a descentralização não foi somente o

resultado da mobilização civil que ansiava o término do regime ditatorial, mas sim, que

existiam interesses externos neste processo relacionados ao período de expansão do

neoliberalismo revelando um processo histórico que expõe desdobramentos sobre o

entendimento de políticas públicas, especificamente, relacionadas ao desenvolvimento

para o campo em suas perspectivas territorial e sustentável. Assim, demonstraremos que

a descentralização emerge na agenda do Grupo BM como peça fundamental com a

premissa de desonerar o orçamento estatal e promover maior controle social por meio

do domínio desta agência internacional que, por meio de seu poder, influência na

elaboração e execução de políticas públicas (ROMANO, 2007).

Iniciamos com uma aproximação a obra seminal publicada em 1946 por Josué

de Castro, intitulada: Geografia da fome: o dilema brasileiro, pão ou aço (CASTRO,

1984) como forma de exemplificar que os problemas relacionados ao desenvolvimento

desigual do campo no Brasil não são exclusivamente brasileiros. Neste trabalho, Castro

(1984) chama atenção para diversos fatores relacionados à fome, bem como aponta

formas de dominação que prolongam e intensificam os processos de apropriação e

concentração fundiária e de capital e, a centralização política do modelo de

desenvolvimento aquela época, correlacionando estes temas à questão alimentar como

estratégia de poder na geopolítica internacional (PORTO-GONÇALVES, 2004).

Posteriormente, em 1951 publica Geopolítica da fome (CASTRO, 1987), neste

observamos a ampla crítica sobre o desenvolvimento e esta perspectiva nos permite

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entender parte dos motivos que levaram a desigualdade do campo no Brasil, dentre eles,

a interferência externa na elaboração e implementação de políticas públicas de

desenvolvimento para o campo, revelada já na década de 1950. Como escreveu Andrade

(2003) se referindo aos trabalhos de Josué de Castro:

[...] ele afirmava que o subdesenvolvimento não era consequência de uma

diferença na rapidez do desenvolvimento entre o país desenvolvido e o

subdesenvolvido, mas de uma distorção realizada no país, hoje

subdesenvolvido, pelo sistema colonial. O país que submetia um outro ao seu

domínio procurava dirigir-lhe a economia tendo em vista atender aos

interesses do país dominante, impedindo que o dominado se voltasse para o

atendimento das necessidades de sua população (ANDRADE, 2003, p. 80).

A partir deste exemplo sobre o processo desigual do desenvolvimento do

campo brasileiro, discorremos aqui sobre a influência do Grupo BM no Brasil,

considerando que, desde sua fundação na década de 1940, esta agência internacional de

fomento atua como forte agente político, intelectual e financeiro (PEREIRA, 2010) em

escala global. Este fato é notável devido a sua condição singular de emprestador,

formulador de políticas e produtor e veiculador de práticas discursivas estabelecidas a

partir de recomendações em suas publicações oficiais, sobretudo em seus relatórios

anuais, muitas vezes ideológicas, sobre questões diversas a partir de definições do que e

como, Estados credenciados devem atuar (PEREIRA, 2010).

Ao longo de sua história, esta instituição financeira sempre explorou a questão

da sinergia entre produção e circulação de dinheiro, prescrições políticas e

conhecimento econômico, para ampliar sua influência e institucionalizar sua pauta de

políticas por distintas formas de uso de poder, como a coerção (constrangimento junto a

outros financiadores e bloqueios de empréstimos) e a persuasão (diálogo com governos

e assistência técnica) (PEREIRA, 2011). Sobre a questão dos empréstimos e

financiamentos realizados pelo Grupo BM, é importante lembrar que duas são as

agências responsáveis por essas operações.

O Grupo do Banco Mundial é uma organização internacional com mais de

180 países membros. Seu objetivo é a redução da pobreza. O Grupo usa os

seus recursos e colabora com outras organizações para ajudar os países

clientes alcançar o desenvolvimento sustentável e o crescimento equitativo. O

Grupo do Banco oferece aos seus países membros em desenvolvimento e de

economias em transição toda uma série de serviços – tais como empréstimos,

assistência técnica e assessoria – dimensionados para as suas necessidades.

Este folheto descreve os instrumentos de empréstimo do Banco Internacional

para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) e da Associação Internacional

de Desenvolvimento (AID) que, juntos, formam o Banco Mundial. O BIRD

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realiza operações de empréstimos e de assistência ao desenvolvimento a

países de renda média e a países de baixa renda com boa reputação creditícia.

A AID faz empréstimos a juros baixos aos países mais pobres. Os

empréstimos do BIRD e da AID são feitos a países membros. O BIRD

também empresta a mutuários de um país membro, com garantia dada por

aquele país (GRUPO BM, 2001, p. 11).

Cabe ainda uma observação importante em relação às fontes de recursos do

Grupo BM, sob este aspecto, Pereira (2009), esclarece:

Os recursos financeiros do BIRD têm origem em três fontes. A primeira é a

subscrição de capital efetuada pelos Estados-membros, que corresponde a

aproximadamente vinte por cento do total. Na prática, porém, somente uma

pequena parcela desse montante é efetivamente desembolsada. O restante é

considerado “capital reclamável”, i.e., uma garantia dada pelos Estados-

membros para uma situação eventual de não pagamento pelos devedores, o

que jamais ocorreu. A segunda fonte corresponde a cerca de oitenta por cento

do total dos recursos. Trata-se da tomada de empréstimos e da intermediação

financeira em mercados internacionais de capital mediante a emissão de

bônus, com prazos de desconto e taxas de juros variados. Como o capital do

Banco é, na prática, garantido politicamente pelos Estados-membros, os

bônus que emitem gozam de solidez notável, expressa pela qualificação de

risco AAA, a máxima outorgada por agências especializadas do mercado

financeiro. Por essa razão o BIRD pode tomar emprestado de fontes privadas

a custo moderado e emprestar aos seus clientes em condições mais favoráveis

do que aquelas vigentes no mercado internacional de capital. A reprodução

desse esquema depende da preservação da segurança máxima de seus títulos,

a qual é assegurada pelos Estados-membros. É por isso que o BIRD goza do

status de credor preferencial. A terceira fonte, bastante menos expressiva,

advém dos ganhos que a instituição obtém com os pagamentos de

empréstimos e créditos, a intermediação bancária e os investimentos que

realiza com a sua receita. Em suma, as operações financeiras do BIRD são

asseguradas pela combinação da garantia política que o sistema interestatal

lhe confere, ao lado da inserção plena nos mercados internacionais privados,

de onde capta a maioria esmagadora dos recursos que financiam suas

operações (PEREIRA, 2009, p. 13).

Dedicando atenção ao desenvolvimento do campo no Brasil, nas décadas de

1950 e 1960, com base no discurso da necessidade de aumento da produtividade

agrícola e da melhoria da qualidade dos alimentos para a redução do problema da fome,

proferido pela FAO e publicado no documento El estado mundial de la agricultura y la

alimentación (FAO, 1960), o Grupo BM passa a incentivar projetos de desenvolvimento

para o campo além da dimensão de infraestrutura e dedicando atenção a questões

produtivas por meio da utilização de técnicas experimentadas durante a 2ª Grande

Guerra Mundial que ficou conhecida como revolução verde.

Até o início dos anos 1960, o programa do Banco para a agricultura havia

sido modesto e fazia parte da sua ênfase em infraestrutura, resumindo-se a

grandes projetos de irrigação e drenagem intensivos em capital. Em certos

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casos, projetos de irrigação e energia eram a mesma coisa. Contudo,

proporcionalmente, os empréstimos para agricultura foram os que mais

cresceram durante a gestão Woods. O principal fator que empurrou o Banco

nessa direção foi a “revolução verde” (PEREIRA, 2014, p. 519, aspas no

original).

Pereira (2014) identifica que, sob a gestão McNamara (1968 – 1981), as formas

de atuação desta agência, em relação à disseminação da revolução verde, foram

intensas, principalmente, em países da America Latina, tendo como pano de fundo para

tal ação o combate à pobreza:

[...] sob McNamara, o Banco estenderia a sua gravitação para toda a periferia

capitalista, na condição de principal financiador público internacional da

revolução verde e líder intelectual e político do “combate à pobreza” no

mundo (PEREIRA, 2014, p. 526).

Neste período, o governo brasileiro, na década de 1960 sob a gerência de João

Goulart, implementa o Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social (1963 –

1965), posteriormente, no governo ditatorial de Humberto de Alencar Castelo Branco,

foi criado o Programa de Ação Econômica do Governo (1964 – 1966), já adentrando a

década de 1970, sob as diretrizes, também ditatoriais, do governo de Artur da Costa e

Silva que, juntamente com a elaboração do Programa Estratégico de Desenvolvimento,

resulta no Plano Trienal (1968 – 1970). Esses modelos de desenvolvimento visavam e

estimulavam o aumento da produtividade, a mecanização, o crédito agrícola e outras

perspectivas que, quando observadas às recomendações da FAO (1960) e do Grupo

BM, em relação ao descrito por Pereira (2014), já indicam a proximidade das ações

nacionais com agências internacionais de fomento.

Na década de 1970, com os alardes provocados pelo relatório Os Limites do

Crescimento (MEADOWS, et al, 1972), que trouxe em seu bojo diversos temas como a

incerteza sobre a capacidade de alimentar a crescente população, aliado a crise do

petróleo e o estancamento do ciclo expansivo econômico baseado no Keynesianismo26

,

todos esses temas relacionados à questão sobre os recursos naturais, foi sendo criado um

arcabouço ideológico com o intuito de difundir novos modelos de desenvolvimento,

inclusive para o campo e, além destes fatos, providenciar a instauração de regimes

26

“A ideia fundamental do pensamento keynesiano é que as economias capitalistas sistematicamente

fracassam no que se refere a gerar crescimento estável ou utilizar plenamente os recursos humanos e

físicos; os mercados, que são os principais mecanismos econômicos de auto regulação e ajuste da

sociedade civil, não conseguem eliminar as crises econômicas, o desemprego e nem, em versões

posteriores, a inflação (HARRIS, 1996, P. 408)”.

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políticos baseados no liberalismo econômico27

e na democracia participativa

(OLIVEIRA, 2012) tendo o EUA como liderança neste processo, considerando que:

[...] era preciso modernizar o Terceiro Mundo, estimulando o crescimento

econômico, a realização de reformas sociais preventivas e a constituição de

regimes liberal-democráticos, a fim de impedir a gravitação soviética e evitar

a emergência de regimes políticos que, mesmo não alinhados à URSS,

pudessem de algum modo descambar para uma posição hostil aos EUA

(PEREIRA, 2014, p. 507).

Deste modo, consideramos que por meio de apoio internacional para a

concessão de empréstimos, o Grupo BM foi ampliando suas funções técnicas,

financeiras e, principalmente, cada vez mais, políticas, mediante recomendações para a

formulação de políticas globais, setoriais e locais. Tais recomendações influenciaram a

agenda dos países credenciados para financiamento, respaldadas por uma base

conceitual que imprime uma diretriz redutora e espacialmente seletiva às políticas

sociais de distintos países revelando uma incrível capacidade de articular suas práticas

internas a processos de territorialização que impulsionam o modo de produção

capitalista e, desta maneira, permitem alterações em configurações socioespaciais

determinadas.

Ainda na década de 1970, o Estado nacional, influenciado pela política

desenvolvimentista, desempenhava a função de promover a reprodução ampliada do

capital28

(FURTADO, 1974). Por conseguinte, o governo fomentou, subsidiou créditos

e promoveu financiamentos com taxas de juros abaixo do mercado, atendendo a grupos

de médios e grandes produtores rurais já capitalizados. Buscava com a modernização no

campo, gerar o desenvolvimento no setor industrial brasileiro, não somente isso, mas

articular as ações do setor agrícola com o setor industrial29

e, ao mesmo tempo,

desenvolver e tecnificar a agropecuária brasileira por meio de incentivos ao projeto que

27

“A doutrina política conhecida como liberalismo afirma que o propósito do estado como associação de

indivíduos independentes é facilitar os projetos (ou a “felicidade”) dos seus membros. Os estados não

devem impor os seus próprios projetos.[...] dentro da efetiva política da Europa e da América, liberalismo

refere-se a um conjunto específico de ideias, que, de tempos em tempos, destacam seus adeptos dos

conservadores e dos socialistas. Exatamente o que constitui essa forma específica de liberalismo muda de

uma geração para a seguinte” (MINOGUE, 1996, p. 421). 28

Entendida aqui, de acordo com Sandroni (1996) com a necessidade do modo de produção capitalista

expandir-se para regiões ou países subdesenvolvidos, não capitalistas, ou para setores não capitalistas de

produção dentro dos próprios países capitalistas. 29

Sobretudo com a institucionalização do Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR), em 1965, e dos

Complexos Agroindustriais (CAIs). Neste sentido, ver, Delgado (1985), Müller (1989) e Graziano da

Silva (1999).

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ficou conhecido como modernização conservadora30

. Para Bacelar (2003), tais ações

realizadas no setor agropecuário pelo Estado eram direcionadas para alavancar o

desenvolvimento no campo, ancoradas por uma ideia de crescimento econômico,

acelerado pela difusão do processo de industrialização, porém, sem promover alterações

na estrutura agrária. Neste caso, a descentralização funcionaria como forma de erradicar

a centralização do poder e o autoritarismo da decisão do gasto público, traço marcante

da forma de ação administrativa da ditadura militar (BACELAR, 2003).

A crise nas economias latino-americanas, na década de 1980, geradas pelo alto

endividamento junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI) levou ao esgotamento

deste modelo centralizado e intervencionista que persistia até então e, este fato,

fortaleceu a ação do Grupo BM no que tange a suas recomendações sobre ajustes

estruturais aos países credores, principalmente via políticas restritivas impostas à

importação e redução do poder do Estado (FURTADO, 1974). Neste sentido, as

políticas de desenvolvimento para o campo, financiadas pelo Grupo BM, passam por

alterações, visando seguimentos vinculados à área social, como a redução da pobreza

(Grupo BM, 1992). No caso brasileiro, este modelo foi típico na elaboração e

implementação de políticas públicas, até porque, naquele período, o governo, com

preocupações desenvolvimentistas e intervencionistas, marcou sua intensa presença na

vida do país e a longa ditadura militar que dominou o cenário político neste período

reforçou sua tradição centralista.

Mas esses traços não eram só brasileiros. O Welfare State, de base Keynesiana,

teve características centralistas em muitos países (ARAÚJO, 1988). Harvey (2010)

identifica na rigidez dos aparatos centralizados e dos mecanismos e modelos

organizacionais então dominantes, uma das dificuldades que os agentes atuantes no

controle do modo de produção capitalista se deparavam para adaptar o mesmo e

responder aos novos requisitos e características flexíveis da economia política

internacional que começavam a se apresentar com o esgotamento do modelo

intervencionista, daí a necessidade e intensificação nos ajustes estruturais (HARVEY,

2010). Deste modo, ainda na década de 1980, tem início à aproximação mais intensiva

do Grupo BM com o processo de descentralização31

no Brasil, especificamente, com a

publicação do relatório sobre o Desenvolvimento Mundial em 1983 (WORLD BANK,

30

Para maiores detalhes dos resultados desta fase da agricultura nacional, ver, por exemplo:

(GUIMARÃES, 1997), (PIRES; RAMOS, 2009) e (DELGADO, 2010). 31

Apesar de suas ações terem se iniciado, no Brasil, na década de 1940 (MARTINS, 2009).

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1983) indicando que a forma mais comum de descentralização, nos países periféricos,

seria a desconcentração, entendida, segundo o relatório (WORLD BANK, 1983) como:

“[...] deconcentration: transferring resources and decision making from headquarters to

other branches of central government [...]” (WORLD BANK, 1983, p. 120).

Deste modo, observamos que ao longo da experiência do Grupo BM, a

temática da descentralização político-administrativa ganha destaque no início da década

de 1980, com a publicação do referido relatório (WORLD BANK, 1983). De acordo

com Guimarães (1993), o assunto usualmente permeou as políticas e projetos da

instituição, visto que seria incompleta a discussão sobre propostas de intervenção na

economia sem considerações a respeito. Até por isto, o Grupo BM estruturou áreas

voltadas especificamente para o estudo dos arranjos institucionais alternativos, como,

por exemplo, o Public Sector Management Issues. Há que se notar, porém, que a

inserção das preocupações em torno da descentralização em sua agenda de prioridades

era modesta até 1983, para afirmar-se o mínimo. A partir da divulgação do relatório

citado (WORLD BANK, 1983), tornou-se relevante à análise dos processos de

implementação das políticas públicas, para verificarem-se os reais impactos e óbices

enfrentados pelos empréstimos concedidos.

Para Borges (2003), o balanço das políticas de ajuste estrutural a partir das

recomendações do Grupo BM (WORLD BANK, 1983) indica uma reorientação na

agenda e no conteúdo das políticas formuladas por esta agência para os países

periféricos, em função das transformações conjunturais de escala global e do fracasso de

políticas em termos de impulso ao crescimento econômico, estabilização política e

redução da pobreza. Para o autor:

[...] a agenda de políticas do Banco Mundial deslocou-se das reformas

macroeconômicas stricto sensu para as reformas do Estado e da

administração pública, objetivando promover a ‘boa governança’ e fortalecer

a sociedade civil (BORGES, 2003, p. 125).

Com tal iniciativa do Grupo BM a favor da descentralização, a mesma torna-se

tão proeminente que até mesmo o relatório Nosso Futuro Comum (ONU, CMMAD,

1988), que projeta o desenvolvimento sustentável, traz manifestações a respeito

indicando que:

Uma boa administração municipal requer a descentralização de recursos, de

poder político e de pessoal- em favor das autoridades locais, que estão em

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melhor situação para avaliar e prover as necessidades de sua área (ONU,

CMMAD, 1988, p. 91).

No Brasil, a promulgação da Constituição Federal de 1988 conduziu o processo

de descentralização aumentando a responsabilidade dos estados e municípios em relação

à formulação e gestão de políticas públicas por meio daquilo que Ortega (2007)

escreveu sobre arranjos sociais locais, ou seja, conselhos nos mais variados setores de

administração pública com poderes consultivos, e, às vezes, também deliberativos

(ORTEGA, 2007).

Paralelo à promulgação da Constituição Federal de 1988, que trouxe os

mecanismos descentralizadores para o Brasil, o discurso da participação comunitária

ganha destaque no Grupo BM e, neste sentido, Grisa e Schneider (2015), em estudo

sobre o desenvolvimento no campo brasileiro, identificam a primeira intervenção direta

do Grupo BM no processo de descentralização no Brasil. Segundo os autores, foi em

1994 que o Grupo BM indica ao governo brasileiro que este deveria atuar, dentre outras

esferas, no combate a pobreza rural, por meio de ações sociais e assistenciais, seguindo

orientações técnicas internacionais onde o Estado deveria intervir nas possíveis falhas

de mercado e “[...] promover a inserção econômica destes grupos sociais” (GRISA,

SCHNEIDER, 2015, p. 29). Deste modo, consideramos que este receituário passa a ser

internalizado amplamente no Brasil, tanto no que concerne às práticas discursivas de

descentralização e maior participação popular, como na concretização do poder de

influência na elaboração de políticas de desenvolvimento para o campo.

No documento do Grupo BM (WORLD BANK, 1994) citado por Grisa e

Schneider (2015) encontramos as referências às quais os autores se expressam,

resumidamente, na forma de recomendações para o desenvolvimento do campo no

Brasil nas seguintes especificidades: reforma do comércio de importação e exportação;

políticas para açúcar e etanol; finanças públicas; pesquisa e extensão agrícola; crédito

rural; comércio de terras; agricultura familiar, desenvolvimento rural e serviços sociais

para a pobreza rural; conservação, floresta e biodiversidade e agricultura sustentável

(WORLD BANK, 1994), no resumo do documento, podemos ler:

This report is about the management of agriculture in Brazil, the natural

resources of Brazil, and the people who live in rural Brazil. It surveys and

analyses the policies that the government has adopted touard this interactive

complex. And it suggests modifications in those policies that would better

achieve the three goals that the government wishes to achieve with its

policies. These goals are: vigorous growth in agriculture; reduction in rural

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poverty; sustainable use of natural resources. Brazil has undertaken major

institutional and economic reforms over the last few years. Many in

agriculture and natural resource management. But the process is incomplete

and the hard-won gains are in danger of reversal if reforms are not

completed. Further, a number of policies put in place in the past have

outlived their usefulness or are having unintended side effects that are costly

to agricultural growth and rural development. In other cases the type of

intervention seems inappropriate (WORLD BANK, 1994, s.p.)

Portanto, a partir da década de 1990, com o aprofundamento das ações dos

governos de Margareth Thatcher e Ronald Reagan, que impulsionaram o processo

neoliberal e a mundialização do modo de produção capitalista a partir de fatos como o

desmantelamento do bloco socialista europeu, a ideologia do Estado mínimo, o livre

trânsito internacional de mercadorias e capitais especulativos e o tratamento rígido e

austero, via FMI, os países periféricos endividados, imersos em crônicos déficits

públicos e assolados por processos hiperinflacionários ficam a mercê das

recomendações do Grupo BM e, consideramos que a adoção e a incorporação

sistemática, pelos governos brasileiros que se sucedem do ideário neoliberal, não

fugiram a regra.

Assim, com o país alinhado politicamente ao plano neoliberal e, no plano

democrático, com uma Constituição Federal com direitos políticos, civis e sociais, o

Estado brasileiro começou uma reforma em sua base administrativa. Bresser Pereira

(1997) destaca que o Estado passa de uma estrutura burocrática, construída ainda na

década de 1930, para uma base gerencial. Vieira (2001) define essas estruturas e destaca

que a burocrática é baseada num serviço civil profissional, na dominação racional-legal;

enquanto na gerencial considera o cidadão como um usuário de serviços públicos ou

cidadão cliente.

O modelo administrativo burocrático, resultado da crise de 1929, já era

executado por países europeus desde o final do século XIX. Para Vieira (2001), o

modelo burocrático brasileiro não chegou a ser consolidado, já passando a um modelo

administrativo gerencial que, dentre outros fatores, envolve o Estado na regulação da

produção, circulação e consumo de produtos e mercadorias.

Diante deste cenário global, a direita conservadora no Brasil prega em sua

cartilha a existência do estado mínimo, em que os problemas econômicos e sociais

seriam resolvidos pelo mercado. Para tanto, seria necessário privatizar serviços e

empresas públicas, desregular a economia, abrindo seu mercado interno para a

concorrência externa e flexibilizar o mercado de trabalho, diminuindo direitos

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trabalhistas. Essas medidas tinham sido levadas a cabo nos EUA, Inglaterra, Argentina e

Chile, por exemplo, com amplo apoio, nestes dois últimos países, do grupo de

economistas conhecido como Chicago Boys32

. Já a esquerda liberal seguiu a cartilha do

neoliberalismo, mas, alertando para o fato que o mercado não garante o equilíbrio

financeiro e nem o desenvolvimento social, e que para corrigir essas distorções era

necessário à intervenção do Estado (BRESSER PEREIRA, 1997). A corrente neoliberal

foi firmada junto aos partidos de centro-direita que consolidaram um modelo de reforma

do aparelho do Estado e de seus órgãos de intervenção internacional, como o Grupo

BM, além do FMI, que passaram a financiar empréstimos a países que aderissem a essa

nova forma de administração pública de caráter gerencial.

A descentralização em apreço toma contornos ideológicos a partir da

incorporação cada vez mais enfática, na década de 1990, de pressupostos neoliberais de

funcionamento da economia e atuação do Estado. A onda neoliberal se espalha por

diversos países e, na América Latina, aparece com destaque o Brasil que, a partir de

1992, com o governo Fernando Collor de Melo, desencadeia um processo amplo de

abertura financeira e mercantil da economia e marca efetivamente a inserção nacional

no neoliberalismo. Nesta nova fase do capitalismo, o Brasil incorpora, principalmente a

partir do Governo de Fernando Henrique Cardoso, um dos pilares daquela escola de

economia: a concepção de Estado mínimo. Em 1994, com a reforma administrativa, tem

início o ajuste fiscal que envolveu a privatização de bancos públicos, mineradoras e

terceirizações de serviços, por exemplo, na tentativa de diminuir os gastos públicos.

Com o Consenso de Washington33

, as prescrições em torno da ideologia

neoliberal passam a ser amplamente difundidas. Nesse sentido, Pereira (2009) destaca

que o Grupo BM fez uso de três táticas para consolidar suas estratégias e poder de

influência: o modelo de aliviamento compensatório da pobreza; a mudança do papel do

Estado na economia; e, a redefinição da forma pela qual as reformas estruturais

32

Grupo de economistas oriundos da Escola de Economia de Chicago influenciados pela linha de

pensamento monetarista veiculada por Milton Friedman. Responsáveis por tornar o Chile o primeiro país

a seguir a doutrina neoliberal fazendo uso de políticas econômicas destinadas a estabilizar o nível de

preços dando ao mercado um papel maior na regulação da vida econômica do país reduzindo o poder de

interferência estatal na economia do país. 33

Encontro realizado no final da década de 1980, na cidade de Washington, em que foram convidados

vários economistas de perfil liberal, funcionários do FMI, do Banco Mundial, do Banco Interamericano

de Desenvolvimento (BID) e do governo norte-americano. O tema do encontro foi Latin Americ

Adjustment: how much has happened? Este encontro visava a avaliar as reformas econômicas adotadas

nos países da América Latina. Foram discutidas e apresentadas práticas isoladas utilizadas por diversos

países. Estas práticas foram sintetizadas, agrupadas e resultaram, no que o economista inglês John

Willianson, um dos diretores do Institute for International Economic, organização responsável pela

organização da reunião, chamou de “Consenso de Washington" (FRIEDEN, 2006).

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deveriam ser governadas. Especialmente no que tange a terceira estratégia, Pereira

(2009) chama atenção para a difusão da ideia de governança, intimamente associada ao

protagonismo da sociedade civil na esfera da elaboração, implementação e avaliação de

políticas públicas, portanto, da descentralização. Neste contexto, consideramos que a

nova face do processo de descentralização de políticas sociais no Brasil é condicionada

também pelas decisões impostas por organismos internacionais de financiamento,

representantes do interesse do capitalismo central, acreditando que, descentralizar

seria uma forma de desoneração do governo central, dando às funções de Estado uma

espécie de caráter menor, de municipalidade.

Revestido dessas recomendações e lembrando que neste período a ineficiência

do Estado como provedor social não era uma realidade, são estimuladas condições para

a intensificação da cooperação internacional (PEREIRA, 2009) e as recomendações do

Grupo BM para o processo de descentralização passam, então, a serem intensificadas.

Especificamente para o desenvolvimento do campo, tais recomendações podem ser

identificadas no documento: Descentralization: a new strategy for rural development

(WORLD BANK, 1995).

New iniciatives are now being attempted in several countries as well as by

WB and other lenders, based on decentralizing decision-making and

financing, and improving beneficiary participation in rural programs. The

initial results of such experiments heve been encouraging in several

countries, and have uncovered substantial organizational capacity in local

bodies (Brazil, Colombia, India, Mexico). (WORLD BANK, 1995, p. 1)

Neste documento (WORLD BANK, 1995), as recomendações do Grupo BM

surgem como estimulo para países em desenvolvimento da América Latina, dentre eles

o Brasil, apontando resultados do processo de descentralização em outros países, com

características muito distintas, como a Índia, Costa do Marfim e Ghana (WORLD

BANK, 1995). Apesar da não verificação nessa desconexão de realidades entre distintos

países, as recomendações do Grupo BM conseguem respaldo, demonstrando o poder de

influencia desta organização. Neste sentido, Thomaz Júnior e Gómez (2005) asseveram

que, sob os governos de Fernando Henrique Cardoso e Luis Inácio Lula da Silva:

Na mesma linha que o Banco Mundial e o do governo Fernando Henrique

Cardoso, o governo Lula insiste na redução do papel do Estado, consolidando

o paradigma neoliberal que domina o discurso e a prática, tanto dos

organismos internacionais de regulação e controle (Banco Mundial, Fundo

Monetário Internacional, Organização das Nações Unidas, e outros), como

dos governos locais. Em todo caso, adotando algumas correções e exibindo

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preocupações que sob o pretexto de imporem limites à lógica do capital, na

realidade, legitimam uma prática que se insiste em que é a única possível

(THOMAZ JUNIOR, GOMÉZ, 2005, p. 35).

Já na década de 2000, o Grupo BM reconhece as distorções e desigualdades

geradas pelas estratégias anteriores que, apesar dos apelos, não conseguiram deter o

processo de desenvolvimento desigual que havia sido estimulado a partir da década de

1970 com a modernização conservadora da agricultura brasileira, que se apresentou de

forma seletiva e diferenciada, pelo fato de não atingir a todos os agentes sociais nele

envolvidos e, no qual, foram privilegiados produtos, produtores e regiões, conforme

escreveram Delgado (1985), Müller (1989) e Graziano da Silva (1998), dentre outros.

Essa mudança de estratégia realizada após intensa pressão social (PEREIRA, 2011)

culmina com a aparente consolidação de estratégias destinadas a dar voz à população

carente, para que ela mesma buscasse alternativas para contrapor suas necessidades.

Estes fatos conduziram a alterações no entendimento conceitual sobre políticas

públicas que, de acordo com Souza (2006), foi introduzido como produto da Guerra

Fria, devido às ações decorridas da participação de governos na tomada de decisões

políticas. Essa medida contribuiu com a ampliação nos métodos científicos visando

melhorar as ações governamentais nos territórios. As primeiras iniciativas públicas

permitiram identificar problemas públicos e, deste reconhecimento foram formuladas

ações distintas para diferentes setores administrativos relacionados ao planejamento e

execução, inclusive para a área social (SOUZA, 2006) além da organização estatal, que

perdurava em períodos anteriores a descentralização, ou seja, o distanciamento do

Estado na elaboração e condução de políticas públicas fez com que surgissem

transformações significativas em relação a sua significação.

De todo este processo, o conceito de políticas públicas foi se tornando mais

evidente, dentre outros fatos, devido às transformações decorrentes de ações estatais,

principalmente com a implantação do planejamento. Para tanto, os agentes estatais

buscavam adequar às novas estruturas organizacionais aos problemas condicionados às

mudanças de ordem econômica e social.

Conforme Secchi (2011), não há concordância quanto à explicação precisa do

significado de política pública. O autor salienta que a essência da política pública está

contida no problema público, e, por problema público, Secchi (2011), entende

determinada situação considerada inadequada, por algum agente observador, para

determinada coletividade que pode vir a ser melhorada através de ações práticas visando

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à possibilidade de atingir uma melhoria significativa, em distintas concepções, para

determinado grupo social.

O que define se uma política pública é ou não pública é a sua intenção em

responder a um problema público, e não se o tomador de decisão tem

personalidade jurídica estatal ou não estatal. São os contornos da definição de

um problema público que dão à política o adjetivo de “pública” (SECCHI,

2012, p. 4).

Assim, para Secchi (2011):

Uma política pública é uma diretriz elaborada para enfrentar um problema

público [...] a razão para o estabelecimento de uma política pública é o

tratamento ou a resolução de um problema entendido como coletivamente

relevante (SECCHI, 2011, p. 2).

Neste sentido, Di Giovanni (2009) considera:

[...] política pública como uma forma contemporânea de exercício do poder

nas sociedades democráticas, resultante de uma complexa interação entre o

Estado e a sociedade, entendida aqui num sentido amplo, que inclui as

relações sociais travadas também no campo da economia. Penso, também,

que é exatamente nessa interação que se definem as situações sociais

consideradas problemáticas, bem como as formas, os conteúdos, os meios, os

sentidos e as modalidades de intervenção estatal (DI GIOVANNI, 2009, p.

05).

Muller e Surel (2004) consideram que política pública é, simultaneamente, um

objeto social e de pesquisa. Deste modo, com base em Muller e Surel (2004),

entendemos política pública em uma perspectiva de orientação operacional que passa a

ser considerada como o Estado em ação:

[...] a ação do Estado pode ser considerada como o lugar privilegiado em que

as sociedades modernas, enquanto sociedades complexas, vão colocar o

problema crucial de sua relação com o mundo através da construção de

paradigmas ou referenciais, sendo que este conjunto de matrizes cognitivas e

normativas intelectuais determina, ao mesmo tempo, os instrumentos graças

aos quais as sociedades agem sobre elas mesmas e os espaços de sentido no

interior das quais os grupos sociais vão interagir (MULLER; SUREL, 2004,

p. 11).

Deste, consideramos então que políticas públicas de desenvolvimento para o

campo podem ser entendidas por meio da relação proposta entre saber e poder. Neste

sentido, Romano (2007) chama atenção ao fato destas serem relativamente autônomas,

ou seja, sua elaboração (saber) e implementação (poder) estão fortemente influenciadas

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por agentes externos ao Estado, portanto, entendemos que na concepção de Romano

(2007), tais políticas públicas estão relacionadas à exploração de grupos internacionais

sobre agentes que atuam na formulação destas (ROMANO, 2007) e este fato acaba por

dificultar seu entendimento, pois excluí-se das análises os fatos políticos (relações de

poder) intrínsecos a sua elaboração.

Em termos de produção de conhecimentos, a análise de políticas públicas na

agricultura, como área específica dos estudos setoriais, apresenta mais

fragilidades ainda que o próprio campo geral das políticas públicas. A maior

fragilidade dá-se em termos do volume de pesquisas específicas, do

desenvolvimento e reflexão de metodologias, da formulação de uma agenda

de pesquisa e da própria acumulação de conhecimentos. O requerimento de

saberes específicos sobre o setor tem marcado tensões entre disciplinaridade

e interdisciplinaridade na produção de conhecimento sobre políticas públicas,

com predomínio de trabalhos levados a cabo por economistas e agrônomos

sobre cientistas políticos, sociólogos e antropólogos. Esse predomínio tem

limitado a análise das políticas como processos políticos, desconsiderando-se

o foco em aspectos políticos da política pública que se manifestam nas

distintas fases tradicionais da política (a identificação do problema, a

definição da agenda, a formulação da própria política, a gestão e

implementação, a avaliação). Os estudos, pelo geral, tem prestado mais

atenção à avaliação do impacto das políticas nos âmbitos econômicos e

sociais (e até ambientais) (ROMANO, 2007, p. 142).

O exercício do poder, em relação a políticas públicas, pode significar uma

influência à forma como as decisões são tomadas (ROMANO, 2007). Assim,

consideramos que, apesar de autonomia em determinados casos (vide programas e

políticas públicas formuladas e implementadas durante o governo do Partido dos

Trabalhadores), a formulação destas consiste numa sequência de decisões inter-

relacionadas tomadas sob a influência de grupos externos, como o Grupo BM.

Portanto, a descentralização das políticas públicas, ocorrida nos últimos vinte

anos do século XX no Brasil, deve ser compreendida através de uma perspectiva ampla,

aonde agentes e condicionantes de várias matrizes vão forjando, por uma gama de

razões diferentes, um processo de transferência de atribuições e desoneração do governo

da União, em detrimento dos entes subnacionais, que nos parece mais afeto e

determinado pelas condições conjunturais de cada agente e fenômeno descentralizador

do que uma política planejada e bem executada no sentido de dar maior participação

democrática nas decisões sobre os gastos públicos sociais, combater as significativas

desigualdades regionais e dar melhor e mais adequada alocação às dotações de recursos

públicos.

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Destes escritos, podemos considerar a descentralização como produto de novas

práticas adotadas, muitas delas apoiadas ou fomentadas por agências internacionais de

desenvolvimento, como o Grupo BM. Os resultados do processo de descentralização se

materializam, dentre outras formas, como políticas públicas e já podem ser objeto de

análise e torna-se evidente que, por meio da transferência de competências e por meio

da fragmentação do processo político, estima-se que a descentralização cumpra a função

de adaptar a regulamentação estatal às novas condições de acumulação do capital

mundial dentro de um marco de crise econômica e fiscal.

Nessa perspectiva, a descentralização contribui não tanto com o aumento da

legitimidade do ordenamento político, mas com a diminuição da presença legitimadora

do Estado, em um sentido instrumental de governabilidade tendo no território,

normatizado, sua condição de existência.

1.2. Recomendações e articulações do Grupo Banco Mundial para a

institucionalização do desenvolvimento territorial rural sustentável

Sem a pretensão de nos determos excessivamente em considerações sobre o

conceito de desenvolvimento, tanto etimologicamente como epistemologicamente,

estruturamos este item para compreender a forma como o Grupo BM influenciou na

formulação de modelos de desenvolvimento nas perspectivas territorial e sustentável.

Esta opção se deve ao fato de consideramos que muitas das aproximações a

este conceito acabam em redundâncias quando não relacionados a estudos que visam

mensurar o desenvolvimento, como os relatórios publicados pelo Grupo BM, por

exemplo. Na própria literatura histórica e econômica, não encontramos consenso devido

à dualidade de significados do que pode ser considerado desenvolvimento. No plano

nacional e internacional, autores como Abramovay (1998, 2000a), Veiga (2002a, 2005),

Sen (2001) e Sachs (2004), por exemplo, não abandonam a ambiguidade em torno deste

conceito preocupando-se em descrever um processo histórico, articulado a adjetivações

em torno de possíveis entendimentos, deste modo, o próprio desenvolvimento gera

novas questões.

Assim, consideramos que a amplitude deste conceito tem impedido uma

definição além do ponto apresentado, portanto, seguimos o raciocínio de Peet (2009)

que escreveu:

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Many people might agree that a better life for all is a desirable goal and that

development as its theory is time and thought well spent. But not everyone

thinks development is universally realizable at the present time (“we are not

quite there yet”). And among those who think that the goal of a better life for

all is practicable, there are broad disagreements on how to get there.

Development understood as a better life is a powerful emotive ideal because

it appeals to the best in people. What might be called the “discourse of

development” (the system of statements made about development) has the

power to move people, to affect and change us forever. Hence, development

can be used for many different political purposes, including some, and

perhaps most, that conflict with its essentially egalitarian ethic (“a better life

for all”). Indeed, the idea of development can be used to legitimate what in

fact amounts to more money and power for a few. So, putting all this

together, development is a contentious issue around which swirl bitter

arguments and fierce debates (PEET, 2009, p. 1).

Desta resalva em relação à definição conceitual de desenvolvimento,

consideramos válidas para nossa análise as estratégias políticas de desenvolvimento

implantadas, ou em fase de implementação, em escala de abrangência global e, em

grande medida, norteadas pelo modo de produção capitalista com base em

recomendações do Grupo BM, dentre outros agentes. A esta perspectiva, das estratégias

políticas de desenvolvimento, dedicaremos atenção por reconhecermos nessa a

possibilidade de aproximação a Geografia do desenvolvimento na perspectiva

apresentada por Peet (2009) de considerar que a existência humana está relacionada a

determinado modo de produção e, a produção se dá espacialmente localizada (PEET,

2009). Deste modo, consideramos nesta pesquisa e neste ponto, ainda que de forma

simplificada, com base em Smith (1998) e Harvey (2013), o desenvolvimento como um

processo histórico e geográfico, desigual e contraditório, atrelado a etapas evolutivas do

capitalismo e a transformações espaciais e territoriais.

Portanto, consideramos que os debates em torno do desenvolvimento tiveram

seu auge e crise num período relativamente curto de tempo, mais precisamente entre as

décadas de 1950 e 1980. Neste momento, o arcabouço teórico sobre o desenvolvimento

avançou rapidamente no campo da Economia, numa associação muito estreita com o

conceito de crescimento econômico. Contudo, a escassez e a crise de modelos e projetos

nacionais e internacionais – como o fim da URSS e ostracismo do comunismo – no

último quarto do século passado lançaram o desenvolvimento num certo isolamento,

como bem ressaltam autores como Hirschmann (1996), Krugman (1997) e Furtado

(2000).

Paralelo a esses fatos, ganha corpo no cenário internacional o debate sobre a

relação entre a sociedade e a natureza, em particular seus efeitos negativos sobre os

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recursos naturais publicados pelo Clube de Roma (MEADOWS et al., 1972) que causou

alarde global na década de 1970 com seu tom catastrófico (OLIVEIRA, 2012). O

atrelamento destes processos (debate conceitual em torno do desenvolvimento e

reconhecimento dos problemas relacionados à preservação de recursos naturais) é aqui

considerado, em parte, responsável pela retomada do estudo teórico na década de 1990

adjetivado de diversas formas que passam a expressar, tanto como qualidade quanto

explicação para a necessidade do desenvolvimento.

Consideramos que o desenvolvimento sustentável vem sendo, há tempos,

impulsionado como modelo de desenvolvimento de distintas formas, como o PEMH e a

expansão do setor sucroenergético, por exemplo. Neste processo, que

convencionalmente foi denominado de desenvolvimento territorial rural sustentável, foi

estruturada uma tese que vem se amparando em estudos que entendem e planejam o

desenvolvimento territorial a partir de sua delimitação física e pela implementação de

normas, deste modo, o próprio desenvolvimento sustentável se tornou norma, sendo

imposta de distintas formas, desde publicações oriundas de conferências da ONU sobre

o tema até as recomendações do Grupo BM para a liberação de financiamentos.

Destes escritos, dedicamos atenção às concepções de desenvolvimento que nos

importam, territorial e sustentável. Primeiro, esclarecemos que o que apresentamos

neste ponto da tese como território está relacionado ao posicionamento de autores

como Ricardo Abramovay e José Eli da Veiga, dentre outros, que, por seus escritos

apresentam uma interpretação, em nosso entendimento, limitada em relação ao

conceito de território interpretando este enquanto área fisicamente delimitada e apta à

normatização. Esta delimitação, devido à influência destes autores, interfere na

elaboração de políticas públicas em diferentes escalas, desde a federal a municipal.

Portanto, ao apresentarmos considerações sobre o desenvolvimento territorial rural

sustentável, interessa-nos demonstrar os modos de elaboração e institucionalização de

políticas públicas subsidiadas pelo Grupo BM e a dinâmica territorial que garanta a

operacionalização destas.

Para demonstrarmos a complexidade deste processo (elaboração e

institucionalização), consideramos fundamental analisarmos as influências externas que

orientam a ação de grupos locais que, uma vez organizados, agem para superar uma

dada situação presente, uma realidade que, a partir de um diagnóstico elaborado,

pretende-se alterar. Deste modo, ao definir determinada área como território de atuação

e implementação de uma política pública o Ministério do Desenvolvimento Agrário

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(MDA) por meio da Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), por exemplo.

Deste modo, consideramos que o Estado atua estimulando ações que podem levar, ao

mesmo tempo, a normatização do território (definindo regras, normas e

institucionalidades desejadas) e instituição de territorialidades, que se sobrepõem e

interagem com outras já constituídas.

Ou seja, entendemos que esta perspectiva de desenvolvimento territorial atua

no sentido exposto por Steinberger (2013) de normatização do território34

, entendendo

este – o território – como recurso estratégico aos agentes envoltos em determinada

política pública que delimita fronteiras e, por sua vez, afeta o acesso da população local

a recursos e supostos benefícios da ação pública territorial, ou seja, a normatização é

aqui entendida como resultado da influência do Grupo BM que faz com que o podutor

rural passe a produzir de acordo com determinadas recomendações técnicas tendo em

vista sua inserção no mercado capitalista.

Assim, estabelece-se um conjunto de regras, por meio das agências que

operacionalizam a política pública e pela pluralidade de agentes que vivem e atuam no

território, ao qual o próprio Estado delega poder relativo a agentes locais para realizar a

governança dos recursos disponíveis e alocados. Deste modo, pretendemos demonstrar

que a concepção de território apresentada por aqueles autores anteriormente citados se

relaciona áquilo que Haesbaert (2012) escreveu sobre o fato de este conceito estar

imerso em relações de dominação e/ou de apropriação, que assumem caráter jurídico e

político e tornam o território funcional, governável e apto à intervenção burocrática.

Reconhecemos que estudos geográficos acerca do território como lócus para a

articulação de agentes no intuito de promover estratégias de desenvolvimento

articuladas a políticas públicas não são recentes. Saquet (2007) esclarece, com base em

diversos autores como Giuseppe Dematteis, Maximo Quaini, Yves Lacoste, Claude

Raffestin, e outros, que, a partir da década de 1970, abre-se um debate acerca de

experiências europeias e norte-americanas, dentre outras, que aprofundam a ideia de que

o desenvolvimento depende, parcialmente, do nível de organização de determinada

sociedade, territorialmente limitada, em relação aos objetivos que lhes são comuns.

Estas experiências fundamentaram, inicialmente, a abordagem territorial do

desenvolvimento, esta, definida por Saquet e Sposito (2009) como sendo:

34

Voltaremos à análise desta perspectiva na parte III deste trabalho.

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[...] uma nova forma de ver e compreender o espaço, a sociedade e a

natureza, ou a dinâmica socioespacial, destacando-se as redes de articulação e

comunicação, as características e a importância da natureza exterior ao

homem, as relações de poder e as identidades historicamente construídas

(SAQUET, SPOSITO, 2009, p. 16).

Um dos principais35

pontos de partida dessa abordagem consiste nas pesquisas

sobre a análise da dinâmica regional italiana. De fato, tais estudos levam em conta a

experiência de uma nova realidade territorial a que denominaram Terceira Itália, que

apresentava elevadas taxas do emprego industrial e bom desempenho em exportações,

sendo que estes resultados não eram oriundos de políticas regionais efetuadas no estilo

top down, mas sim de articulações entre as empresas internas à própria região.

O avanço desses estudos e dessas experiências começou a ser levantado por

organismos nacionais e supranacionais, o que ajudou a difundir esta literatura e a

incentivar experiências para outras localidades. Os estudos italianos são continuamente

tomados como referência, na medida em que, desde logo, destacaram a importância do

desenvolvimento competitivo que determinadas localidades haviam alcançado a partir

de aglomerações de pequenas e médias empresas, contrastando com o modelo fordista

da grande indústria de massa, em Turim e Milão. Deste modo a abordagem territorial foi

construindo um respaldo, principalmente político e econômico.

No meio acadêmico a proposta territorial encontra suporte em estudos e

pesquisas, como, por exemplo, os realizados por Bagnasco (1977). Na contramão do

Norte desenvolvido, que estava passando por uma grave crise econômica, e o Sul

atrasado, o Nordeste do país (Terceira Itália), caracterizado por um conjunto de

pequenas e médias empresas, estava apresentando elevadas taxas de crescimento

econômico e motivando a investigação das causas desse processo (ORTEGA, 2007) e,

conforme destaca Bagnasco (1977), tal fato ocorreu sem a indução de políticas públicas,

mas sim, residiram na questão cultural, na confiança e reciprocidade, na flexibilização

da relação capital-trabalho, no crescimento da demanda mundial por bens de consumo,

no progresso tecnológico, na interação rural urbano e outras (SAQUET, 2007).

Observe-se, portanto, que as discussões acerca da especificidade da dinâmica

diferenciada observada em diferentes espaços perduraram ao longo da década de 1970

até meados da década de 1980, mas, ao final desse período, esse debate passou a ter

uma menor exposição. A partir daí, no cenário econômico passa a dominar a vertente

35

Esses dizem respeito a descrições de casos bem-sucedidos de desenvolvimento de regiões, sendo que o

último analisa experiências de aglomerações de empresas em distritos industriais na Itália, Alemanha,

Japão e Estados Unidos (SAQUET, 2007).

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dos modelos ortodoxos e o debate das especificidades regionais perde espaço, sendo que

a ideia da não intervenção do Estado é um dos motes centrais.

Surge um novo paradigma de desenvolvimento, associado ao processo de

mundialização do modo de produção capitalista, fundamentado numa forma de

organização da sociedade que privilegia o livre mercado, a descentralização e a não

intervenção, o neoliberalismo.

Na década de 1990 é notável o debate em torno do papel do Estado na

promoção do desenvolvimento regional. Veiga (2002) considera como marco o fato de

que a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em 1991

analisou estudos que levantaram as relações entre as políticas nacionais, regionais e

locais, concluindo que havia um perigo na abordagem do desenvolvimento local tal

como estava sendo enfocada; a conclusão foi que a estratégia de desenvolvimento local

deveria ser considerada um complemento ao desenvolvimento regional.

Considerava-se, neste contexto, importante a adoção de uma estratégia maior,

baseada no conceito de desenvolvimento territorial. A ideia era que se deveria efetuar

uma combinação de políticas governamentais descendentes (up down) com iniciativas

de desenvolvimento endógeno (down up), sendo que o conceito de endogenia passaria a

ter um caráter mais limitado.

Nesta condição, a abordagem territorial de desenvolvimento para o campo

ganha destaque e pressupõe a análise dos problemas concretos do espaço de ação em

que transcorrem as relações sociais, econômicas, políticas e institucionais, a partir dos

trabalhos desenvolvidos pela OCDE quando assumiu o desafio de elaborar uma

abordagem que permitisse entender e comparar o campo entre os 24 países membros da

organização (VEIGA, 2002b).

Além destes aspectos, a abordagem territorial é, também, resultado da

interferência de instituições multilaterais que passam a analisar novas dinâmicas

espaciais e à própria necessidade de reavaliação dos instrumentos governamentais até

então utilizados na promoção do desenvolvimento (BONNAL; MALUF, 2007).

Portanto, tal proposta de modelo de desenvolvimento, como outras, não é neutra de

intencionalidade.

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No final da década de 1990, organizações internacionais reformularam a ideia

de desenvolvimento e incorporam a ideia de capital social36

que, para Abramovay

(2000) “[...] representa uma trama de relações com raízes históricas, configurações

políticas e identidades” (ABRAMOVAY, 2000b, p. 6).

A proximidade social, neste sentido, permite uma forma de coordenação entre

os agentes, na forma de redes, que podem valorizar o conjunto do ambiente em que

atuam (ABRAMOVAY, 2000b). Ainda de acordo com Abramovay (2002), as

vantagens do modelo de desenvolvimento territorial para o campo, respaldadas no

capital social, permitem que se abandone um horizonte estritamente setorial; impede a

confusão entre crescimento econômico e processo de desenvolvimento; estimula a

pesquisa sobre governança e processos de cooperação; e, coloca ênfase na maneira

como determinada sociedade utiliza os recursos que dispõe em sua organização

produtiva (ABRAMOVAY, 2002).

A partir disso, o desenvolvimento territorial rural surge como perspectiva de

melhorias do nível de vida e de transformação social e econômica, pois o campo37

insurge como espaço multifuncional a partir da introdução de novas possibilidades de

geração de renda. Inserindo, então, a dimensão natural na concepção de

desenvolvimento territorial, o território vem sendo tratado como estratégia de ação para

a materialização de políticas públicas visando o desenvolvimento pautado no

protagonismo dos agentes locais. Nesta fórmula, quase mágica, bastaria que eles se

mobiliassem para que as vantagens do território fossem aproveitadas (mercantilizadas).

No entanto, nestas análises, não se faz nenhuma menção à estrutura de classes sociais,

aos interesses divergentes e ao poder das elites locais que, por vezes, pode neutralizar

ações para preservar seus privilégios.

As políticas territoriais neste enfoque, aceitando a conceituação da SDT,

tentam definir, dessa forma, uma posição de apoio ao planejamento enquanto uma

tecnicidade, como escreveu Escobar (2000), uma idealização que destaca a condição de

encaixar o cidadão em determinadas normas e, assim padronizar a realidade. Deste

modo, as políticas territoriais acabam inserindo as pessoas em uma falsa realidade que,

nesta perspectiva, pode ser controlada pelo Estado. Este movimento é resultado da

36

Para Putnam (1996), que dedica especial atenção a questão do capital social, foi este o fator que

contribuiu para aumentar a eficiência da sociedade e facilitar as ações coordenadas, fatos estes

determinantes para o desenvolvimento da Terceira Itália. 37

Esta revisão conceitual esta relacionada ao debate sobre o novo rural, desenvolvido no Brasil

especialmente a partir do Projeto Rurbano, liderado por Graziano da Silva (1999), mas também defendido

por Veiga (2002b), no que se refere à delimitação dos espaços rurais.

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utilização de instrumentos de planejamento econômico, como é o caso das políticas de

desenvolvimento territorial rural sustentável que, ao tentar alocar os meios de produção

no território, o faz de forma tecnicista e racionalista, porém, diferente do que faz

parecer, nunca de forma apolítica (ESCOBAR, 2000).

Essa tendência faz uso essencialmente funcional, no âmbito econômico e

político, do conceito de território com vistas ao planejamento e execução de políticas

públicas. Faz-se, nesta perspectiva, opção por uma ação de gestão operacional da

realidade (SCHNEIDER, 2004). Este posicionamento demonstra certa fragilidade

teórica e conceitual, em relação ao conceito de território, que se observa na abordagem

do desenvolvimento territorial rural que, como demonstraremos posteriormente,

repercute na Geografia.

A adoção da abordagem territorial para o desenvolvimento do campo resulta,

portanto, da congruência de uma série de fatores que se tornaram expressivos a partir

das duas últimas décadas do século XX: as crescentes preocupações da sociedade com

as questões relativas a recursos naturais, principalmente a partir da década de 1970 que,

no caso da agricultura, foi ressaltada pelos resultados deletérios da revolução verde; o

êxito das políticas territoriais em escala europeia, como o Programa Ligações Entre

Ações do Desenvolvimento da Economia Rural38

(LEADER), o vigoroso

desenvolvimento da Terceira Itália e, a emergência da nova ruralidade, com o

crescimento e o aumento da importância das atividades não agrícolas no campo.

Esta perspectiva chegou à América Latina e, no âmbito do Brasil, os estudos

avançaram ao longo da década de 1990, a ponto de as políticas públicas começarem a

ser geradas considerando-se esse arcabouço teórico. Deste modo, o foco da discussão de

desenvolvimento territorial passou a destacar a importância dos agentes locais,

construindo um projeto capaz de gerar sinergias positivas de forma articulada às

políticas públicas implantadas pelo Estado nacional. Cada vez mais passavam a ser

incentivadas experiências de desenvolvimento territorial, buscando replicar experiências

europeias, perspectiva esta, trabalhada e defendida por Abramovay (1999) que propõe a

dinamização econômica e a geração de postos de trabalho no campo como resultado

direto de uma “[...] dinâmica territorial específica que valoriza a identidade regional, o

clima favorável ao espírito empreendedor, à existência de redes públicas e privadas ou a

atração do meio ambiente cultural e natural” (ABRAMOVAY, 1999, p. 2).

38

Liaisons Entre Actions de Développement de l’Economie Rurale, no original.

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Da mesma forma, Favareto (2007) argumenta que os novos discursos sobre

ruralidade acabaram tomando forma de consensos e orientação, a que foram

incorporados, por agências internacionais de apoio à cooperação e ao desenvolvimento,

como a FAO, a Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL), o

Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) e a OCDE, por

exemplo, e, como apresentado por Favareto (2007), é forte a influência de tais

organismos sobre a definição das políticas públicas de desenvolvimento para o campo.

Com base nessas propostas, a abordagem territorial do desenvolvimento,

incorporando o enfoque do novo rural, toma força e forma. A tese defendida, por

pesquisadores, autores e pelas agências internacionais, é que a lógica de atuações

coletivas deveria também ser adotada nas políticas públicas que envolvem transmissão

de recursos, sendo que o direcionamento e a utilização dos mesmos deveriam envolver a

lógica local, a partir de uma perspectiva de descentralização de decisões. Então, caso se

tenha uma concepção de desenvolvimento centrada na melhoria das condições de vida

das comunidades e na maior inserção dos grupos excluídos, indica-se a importância de

que as políticas adotadas partam de um pacto territorial, mediado e impulsionado a

partir da articulação de cooperativas, organizações de produtores, associações

empresariais, sindicatos, poder público, igrejas, bancos e outros (ABRAMOVAY, 1999;

ECHEVERRI, 2002; VEIGA, 2000, 2001).

Nesta concepção, as reflexões sobre o desenvolvimento rural passam a ser

idealizadas fora da lógica das atividades produtivas setoriais, espaço de variadas

atividades e de relações sociais entre distintos agentes. Por consequência, passou-se a

valorizar a conjuntura social, natural, política e econômica no processo de

desenvolvimento dos territórios rurais. Isso porque “[...] as vantagens das palavras

espaço e território são evidentes: não se restringem ao fenômeno local, regional,

nacional ou mesmo continental, podendo exprimir simultaneamente todas estas

dimensões” (VEIGA, 2002, p. 286).

Buscando fortalecer esta concepção territorial pesquisadores indicam avanços

em pelo menos três grandes pontos: superação da visão setorial do desenvolvimento

(NAVARRO, 2001); importância da governança social e seus mecanismos locais de

funcionamento (VEIGA, 2005); entendimento do território como o “[...] resultado da

maneira como as sociedades se organizam para usar os sistemas naturais em que se

apoia sua reprodução” (ABRAMOVAY, 2000b, p. 2), o que pressupõe uma maior

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aproximação na relação entre a sociedade e a natureza, porém, levando em

consideração, principalmente a rentabilidade capaz de ser obtida desta relação.

Sobre a perspectiva da abordagem territorial e o uso do conceito de território

em políticas públicas de desenvolvimento para o campo, no contexto brasileiro,

Schneider e Tartaruga (2004) destacam:

A diferença fundamental entre o uso e o significado conceitual e instrumental

do território é que o sentido analítico requer que se estabeleçam referências

teóricas e mesmo epistemológicas que possam ser submetidas ao crivo da

experimentação empírica e, depois, reconstruídos de forma abstrata e

analítica. O uso instrumental e prático não requer estas prerrogativas e, por

isso, pode-se falar em abordagem, enfoque ou perspectiva territorial quando

se pretende referir a um modo de tratar fenômenos, processos, situações e

contextos que ocorrem em um determinado espaço (que pode ser demarcado

ou delimitado por atributos físicos, naturais, políticos ou outros) sobre o qual

se produzem e se transformam (SCHNEIDER, TARTARUGA, 2004, p. 107).

Schneider e Tartaruga (2004) levam em conta duas razões para se compreender

porque o recurso às abordagens territoriais se tornou uma referência recorrente para a

interpretação de processos e, ao mesmo tempo, uma ferramenta para a intervenção: a

primeira razão que estimula fortemente o interesse crescente pelos enfoques e

abordagens territoriais está relacionada à profusão da literatura que interpretou as

transformações societárias como sendo o resultado da crise do fordismo e do processo

de reestruturação do capitalismo contemporâneo; a segunda razão está associada aos

aspectos políticos e institucionais que derivam, basicamente, da crise do Estado e da

perda crescente de seu poder de regulação. A crise do Estado, dentre distintas

perspectivas, refere-se à sua incapacidade crescente de regular e interferir na economia

privada, especialmente a partir da ampliação de capacidade da economia capitalista de

ajustar, em escala global, a interdependência entre as condições de tempo e espaço no

processo global de produção de mercadorias, deste modo, Schneider e Tartaruga (2004)

escreveram e entendem que o território pode ser definido, para fins de

operacionalização de políticas públicas:

[...] como a nova unidade de referência e mediação das ações do Estado e o

enfoque no desenvolvimento territorial torna-se, portanto, um modo de ação

que valoriza os atributos político e culturais das comunidades e dos atores

sociais ali existentes. Governança local e participação social tornam-se, neste

sentido, atributos do desenvolvimento territorial. Desse modo, assiste-se a

uma verdadeira instrumentalização do território, quer seja através da

abordagem das transformações produtivas que partem das mudanças na

economia industrial para mostrar que estes processos possuem uma

territorialidade, ou através do enfoque político e institucional que busca

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mostrar que o território torna-se a nova unidade de mediação entre o espaço

e os atores locais e as demais esferas regionais e nacionais. Tanto num caso

como noutro, o território deixa de ter um sentido heurístico e conceitual,

conforme apontado anteriormente, e assume a condição de uma abordagem

ou um enfoque (SCHNEIDER, TARTARUGA, 2004, p. 109, itálico nosso).

Para Veiga (2006) condicionar o território a este processo se torna de suma

importância:

Ordenar territórios. Esse novo requisito exige a superação de ultrapassadas

concepções do desenvolvimento: a sustentabilidade ambiental do crescimento

e da melhoria da qualidade de vida. Trata-se de um imperativo global que

chegou para ficar, em virtude da percepção de que a biosfera, em nível

global, regional, nacional e local, está sendo submetida a pressões

insuportáveis e prejudiciais para o próprio desenvolvimento e as condições de

vida. (VEIGA, 2006, p. 1, itálico nosso).

E, destes escritos, pontuamos: qual foi a interferência direta do Grupo BM

neste processo? No Brasil, experiências em políticas públicas no âmbito do

desenvolvimento territorial rural passam a ser estimuladas e defendidas, sobretudo por

parte de agências estatais, a partir da década de 1990, com a aceitação do viés neoliberal

imposto pelo Grupo BM, como escrevemos no item anterior. Não obstante, os objetivos

traçados pelas políticas orientadas a partir do Consenso de Washington e recomendadas

pelo Grupo BM, a gravidade da situação de desigualdade e pobreza exigiu respostas

sobre as recomendações sugeridas. Entendemos, portanto, que as políticas públicas

voltadas ao desenvolvimento territorial rural enquadravam-se na lógica daquelas

recomendadas pelo referencial neoliberal e visavam, em última instância, delegar aos

mercados a resolução dos problemas. É nesse contexto que o desenvolvimento

territorial é institucionalizado no Brasil na década de 1990 como conceito operacional e

normativo (FAVARETO, 2007; HESPANHOL R. 2010).

Ortega (2007) enumera quatro motivos que fortaleceram a inserção da

perspectiva territorial ao desenvolvimento do campo no Brasil: o fortalecimento das

forças locais na luta pela redemocratização do país; a promulgação da Constituição

Federal de 1988; a desregulamentação da economia; e as orientações das agências

multilaterais, principalmente por recomendarem “[...] a indução de arranjos

socioprodutivos locais, que, de maneira autônoma e endógena, deveriam buscar o

desenvolvimento, desobrigando o Estado de ações intervencionistas” (ORTEGA, 2007,

p. 281).

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Assim, foram criadas as condições para atuação do Grupo BM, que,

intensificando suas estratégias para o desenvolvimento do campo e reforçando sua

atuação em relação a políticas públicas de desenvolvimento territorial rural no Brasil, o

Grupo BM, focando a escala local, passou a intensificar as políticas de desenvolvimento

tendo como foco, a partir de então, o combate à pobreza, o que não significa que esta

perspectiva não estava presente em recomendações anteriores, como atesta o

documento: Brazil: The Management of Agriculture, Rural Development and Natural

Resources (WORLD BANK, 1994)

Brazil has a long hstory of intervention in agriculture. Out puts were taxed

(explicidy and implicitly) and inputs were protected by import substtution.

Large credit subsidies were used to offset these disincentives. Rapid

agricutural growth, however, has neither reduced rural poverty nor stimulated

employment. Rather, agricultural policy interventions, other policy

distortions, and poor allocation of public expenditures have aggravated both

(WORLD BANK, 1994, p, 23).

Com isso, a pobreza passa a ser vista como a privação de capacidades que

impossibilita o seu desenvolvimento.

La pobreza absoluta es una condición de vida tan degradada por la

enfermedad, el analfabetismo, la malnutrición y la insalubridad, que niega a

sus víctimas necesidades humanas básicas [...] es una condición de vida tan

limitada que impide la realización del potencial de los genes con los cuales

uno nace [...] el problema es más severo en el campo (GRUPO BM, 2002, p.

1).

Consideramos que a opção pela questão de enfrentamento a pobreza tenha sido

fortemente influenciada pelas ideias do economista indiano Amartya Sen. De acordo

com Sen (2001):

[...] o desenvolvimento pode ser visto como processo de expansão das

liberdades reais que as pessoas desfrutam. O enfoque nas liberdades humanas

contrasta com visões mais restritas de desenvolvimento, como as que

identificam desenvolvimento como crescimento do Produto Nacional Bruto

(PNB), aumento de renda pessoal, industrialização, avanço tecnológico ou

modernização social. O crescimento do PNB das rendas individuais

obviamente pode ser muito importante como um meio de expandir as

liberdades desfrutadas pelos membros da sociedade (SEN, 2001, p. 16).

Ao analisar o desenvolvimento na perspectiva centrada na dimensão social,

Sen (2001) considera que as liberdades dependem, também, de outros determinantes,

como disposições sociais, econômicos e direitos civis e destaca a questão da pobreza.

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O desenvolvimento requer que se removam as principais fontes de privação

de liberdade: pobreza e tirania, carência de oportunidades econômicas e

destituição social sistemática, negligência dos serviços públicos e

intolerância ou interferência excessiva de estados repressivos. Às vezes a

ausência de liberdades substantivas relaciona-se diretamente com a pobreza

econômica, que rouba das pessoas a liberdade de saciar a fome, de obter uma

nutrição satisfatória ou remédios para doenças tratáveis, à oportunidade de

vestir-se ou morar de modo apropriado, de ter acesso à água tratada ou

saneamento básico (SEN, 2001, p. 17).

Ao aprofundar sua análise sobre renda e pobreza, Sen (2001) argumenta que

uma renda inadequada é, com efeito, uma forte condição predisponente a uma vida

pobre. Nessa perspectiva, enfatiza que a pobreza pode sensatamente ser identificada em

termos de privação de capacidades. Favareto (2007), examinando a ideia de Sen (2001),

assevera:

A ideia central é que a expansão das liberdades humanas é a um só tempo, o

fim e o meio dos processos de desenvolvimento. Essa á a grande definição

cunhada por Sen e que permite sair do unidimensionamento e da armadilha

representada pela oposição entre meios e fins (FAVARETO, 2007, p. 70).

De sorte a buscar um desenvolvimento para além de uma visão alicerçada na

conduta ou no emprego de normas impostas por agentes externos (Grupo BM) e

transformá-las em recursos e instrumentos que beneficiem os agentes territoriais, é

preciso transformar uma visão de desenvolvimento definido na atuação do poder

heterônomo para uma perspectiva alternativa que considere o desenvolvimento como

processo de libertação, em amplo sentido (SEN, 2001). Conforme Sen (2001) essa

perspectiva:

[...] [é] principalmente uma tentativa de ver o desenvolvimento como um

processo de expansão das liberdades reais que as pessoas desfrutam. Nesta

abordagem, a expansão da liberdade é considerada (1) o fim primordial e (2)

o principal meio do desenvolvimento (SEN, 2001, p. 55).

Nesse contexto, o Grupo BM fortalece seu discurso e suas práticas para o

desenvolvimento rural considerando principalmente o potencial de superação da

pobreza. No documento Llegando a los pobres de las zonas rurales: estrategia de

desarrollo rural para América Latina y el Caribe (Grupo BM, 2002), a instituição

consolida um discurso que há tempos estava sendo propalado de forma um pouco

dispersa. Nesse documento, termos como pobreza, descentralização, democratização,

produtividade, competitividade, território e desenvolvimento sustentável, são adotados

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amplamente e de forma bastante naturalizada. Deste modo, o Grupo BM difunde seu

discurso como mecanismo de distribuição de poder, obtendo aceitação por parte da

sociedade beneficiada de forma indireta.

En la región [América Latina y Caribe] se observa una creciente tendencia

hacia la democratización y la descentralización. El ritmo y la forma del

proceso de descentralización es probable que sea uno de los factores más

importantes para determinar oportunidades y limitaciones al desarrollo

regional. Esta tendencia significa que la sociedad civil intensificará la presión

sobre el organismo público a fin de que éste sea más responsable y formule

políticas más igualitarias e inclusivas. [...]. Esto también impone la imperiosa

necesidad de procurar una coordinación más eficaz entre los programas

gubernamentales y una mayor transparência mediante la adopción de

enfoques participativos y una divulgación de la información más eficiente

(GRUPO BM, 2002, p.15).

Portanto, consideramos que com a descentralização, as políticas públicas de

desenvolvimento territorial rural foram se constituindo um aparente consenso no que diz

respeito à abordagem territorial. Pois do ponto de vista político, este enfoque, em

especial o seu componente de descentralização, foi fomentado pelas recomendações das

agências multilaterais, sobretudo pelo Grupo BM.

A abordagem do desenvolvimento territorial rural, portanto, passa a valorizar a

espacialização do desenvolvimento, pois o território passa a ser um componente dessa

perspectiva de análise e, acreditando no desenvolvimento territorial rural, o Governo

Federal, na década de 2000, passa a conduzir as políticas agrícolas pelo Ministério da

Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e MDA, onde foi criada a SDT. Sobre

a criação desta secretaria, é importante lembrarmos, levando em consideração a questão

dos vínculos criados pelo Grupo BM para a disseminação da outra perspectiva que nos

importa, a dimensão sustentável do desenvolvimento, que o IICA “[...] vem trabalhando

em estreita aliança com o Banco Mundial.” (IICA, 2003, p. 26), e foi um dos

responsáveis pela criação da SDT:

[...] a partir del trabajo de cooperación técnica del IICA en apoyo a los

Gobiernos de los Estados del Nordeste y con el financiamiento del Banco

Mundial. Uno de los resultados más importantes de este trabajo es la reciente

creación (febrero de 2003) de la Secretaría de Desarrollo Territorial, dentro

del Ministerio de Desarrollo Agrario (IICA, 2003, p. 61).

Estes fatos demonstram a articulação do Grupo BM em torno da proposta de

desenvolvimento territorial rural sustentável, pois, consideramos que a SDT teve como

objetivo reorientar (ou adequar suas estratégias as recomendações do Grupo BM)

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estratégias das políticas de desenvolvimento rural no âmbito territorial e sustentável,

isto é, integrar e articular as políticas públicas do governo federal, estadual e municipal,

além de associações civis, em prol do desenvolvimento sustentável de territórios rurais.

Neste aspecto, o conceito de território é normativamente definido para sua

operacionalização pela SDT da seguinte forma:

Espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, caracterizado

por critérios multidimensionais, tais como o ambiente, a economia, a

sociedade, a cultura, a política e as instituições, e uma população, com grupos

sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por

meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos

que indicam identidade e coesão social, cultural e territorial (BRASIL –

MDA / SDT, 2003, s/p).

O que estamos argumentando, até esse ponto, é que essa concepção territorial

voltada à operacionalização é marcada pela existência de um regime de tecnicidade e

cientificidade na reprodução social (SANTOS; SILVEIRA, 2003) que facilita o

estabelecimento de uma determinada garantia de estabilidade das trocas e da produção,

entre elas e o dinheiro (SANTOS, 2007). Para que isto aconteça, o Estado necessita

territorializar o mercado capitalista, ou seja, regular as relações mercantis que ocorrem

dentro do território nacional garantindo sua reprodução adequada (ANDRADE, 1987).

Com a passagem do desenvolvimento territorial rural para o desenvolvimento

territorial rural sustentável, este modelo de desenvolvimento ganha adeptos por seu

apelo humanitário, porém, sem maiores preocupações em relação a sua definição e

materialidade e, este aspecto, colaborou no fortalecimento de políticas públicas e

programas voltados a multifuncionalidade, ao turismo rural e outras atividades não

agrícolas, indo assim, ao encontro das propostas sobre o novo rural e a prática territorial

do desenvolvimento, onde encontra suporte (NAVARRO, 2001; VEIGA, 2005;

ABRAMOVAY, 2005).

Cabe ressaltar, sobre a relação entre o Grupo BM e o desenvolvimento

sustentável, que consta no relatório Brundtland (ONU, CMMAD, 1988) um

considerável número de recomendações e orientações a esta agência internacional para

aplicar metodologias, programas e financiamentos em vários países. O Grupo BM é

utilizado ainda como fonte de informações – por meio de seus relatórios de

desenvolvimento – para a comissão Brundtland. No relatório, podemos ler:

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[...] cabe ao Banco Mundial e à Associação Internacional de

Desenvolvimento a maior parcela de responsabilidade, já que constituem o

principal canal de financiamento multilateral para países em

desenvolvimento. No que respeita a fluxos financeiros constantemente

ampliados, o Banco Mundial pode custear projetos e políticas que sejam

benéficos ao meio ambiente. No tocante ao financiamento para ajustes

estruturais, o Fundo Monetário Internacional deveria apoiar objetivos de

desenvolvimento mais amplos e de mais longo prazo que os atuais:

crescimento, metas sociais e efeitos sobre o meio ambiente (ONU, CMMAD,

1988, p. 20).

As agências internacionais de desenvolvimento - o Banco Mundial e outros

grandes bancos de crédito, as agências da ONU e as agências bilaterais -

deveriam atentar, de modo detido e sistemático, para os problemas e as

oportunidades de conservação das espécies. Embora já exista um grande

comércio internacional de espécies e produtos da vida selvagem, até boje não

se deu a devida importância ao valor econômico inerente à variabilidade

genética e aos processos ecológicos. Entre as possíveis medidas a serem

tomadas estão a análise dos efeitos de projetos de desenvolvimento sobre o

meio ambiente, dando-se especial atenção a habitatis de espécies e sistemas

de manutenção da vida; a identificação dos locais onde existem

concentrações excepcionais de espécie. com níveis muito elevados de

endemismo e de perigo de extinção; e as oportunidades de vincular a

conservação das espécies à assistência ao desenvolvimento (ONU, CMMAD

1988, p. 121).

[...] há necessidade urgente de fluxos muito maiores de financiamento

concessional e não-concessional por meio das agências multilaterais. Sob

esse aspecto, o papel do Banco Mundial é de especial importância, tanto por

ele ser a maior fonte de empréstimos para o desenvolvimento quanto por sua

liderança no tocante a políticas, tendo grande influência junto aos países em

desenvolvimento e aos doadores. O Banco Mundial lidera de modo

significativo a reorientação dos programas de empréstimos, demonstrando

grande sensibilidade para com problemas ligados ao meio ambiente e ao

apoio ao desenvolvimento sustentável. Isso já é um bom começo. Mas não é

o bastante, a menos que seja acompanhado pelo empenho básico, por parte do

Banco Mundial, no sentido do desenvolvimento sustentável e por uma

transformação de sua estrutura e processos internos, de modo a garantir a

concretização desse empenho. O mesmo vale para outros bancos e agências

multilaterais de desenvolvimento (ONU, CMMAD, 1988, P. 377).

Uma pessoa de suma importância no processo que fortaleceu a perspectiva

sustentável do desenvolvimento foi Ignacy Sachs. Maurice Strong, secretário geral da

Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano (ONU, 1972),

introduziu a proposta de ecodesenvolvimento pela primeira vez na história a partir das

contribuições de Ignacy Sachs, sendo este o grande responsável pela sua difusão e

aprofundamento teórico até que passasse a ser chamado de desenvolvimento sustentável

(MONTIBELLER FILHO, 1993).

Como descrito, e com base nos autores citados (ABRAMOVAY, 1999,

VEIGA, 2002, 2005), a concepção de desenvolvimento rural por eles defendida não

implica, necessariamente, em atividades predominantemente agropecuárias. A partir

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desta definição, o governo nacional amplia a dimensão territorial e incorpora o

desenvolvimento sustentável em políticas públicas.

O apoio ao desenvolvimento da agricultura familiar, à reforma agrária e ao

reordenamento agrário harmoniza-se perfeitamente com o desenvolvimento

territorial, assim como este se ajusta perfeitamente às prioridades de combate

à pobreza e à fome, e ao desenvolvimento e integração regional, na medida

em que estabelecem condições do florescimento de uma dinâmica de

desenvolvimento descentralizado, interiorizado, participativo e sustentável

(BRASIL – MDA / SDT, 2005b, p.11).

A partir dessa nova visão, o uso do termo desenvolvimento territorial rural

sustentável se faz presente. Crescimento fora definido como um objetivo intermediário,

ou como meio de alcançar o objetivo final de aliviar a pobreza em projetos centrados no

alívio à pobreza rural e na preservação de recursos naturais, como, por exemplo, o

PEMH, como demonstraremos. Isto representou uma significativa mudança se

comparado com as políticas agrícolas adotadas nos períodos anteriores, especialmente

aquelas da modernização agrícola, cujo foco estava na mudança da base técnica, no

aumento da produção e da produtividade.

A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento

(CNUMAD, ONU, 1992) foi o evento que colocou no âmago das discussões o combate

à pobreza e sua relação com a preservação de recursos naturais. A partir dai, e,

sobretudo no decorrer dos anos 2000, o Estado brasileiro introduziu, pelo menos no

nível de concepção e de operacionalização, novos aportes à parte das políticas públicas

direcionadas ao campo brasileiro, destacando-se as implementadas sob a coordenação

do MDA. Dentre essas inovações foi incorporada a dimensão espacial do

desenvolvimento rural em substituição à dinâmica setorial até então adotada

(HESPANHOL, R. 2010). A incorporação da dimensão espacial, estruturada por meio

da abordagem territorial, consolidou-se institucionalmente pela criação da SDT, ligada

ao MDA (SCHNEIDER, 2004).

A proposta de uma política nacional, focada no desenvolvimento sustentável

dos territórios rurais foi resultado de reivindicações de setores públicos e de

organizações da sociedade civil, mas, sobretudo, das recomendações do Grupo BM,

pois caso estas não fossem atendidas não haveria financiamento. Estes agentes, em

conjunto, levaram os formuladores de políticas públicas a perceberem a necessidade de

articulação de políticas nacionais com iniciativas que aconteciam no âmbito local

(BRASIL, MDA, 2005a) e, paralelo a estes fatos, à emergência da concepção de

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desenvolvimento territorial rural sustentável, aparece um elemento central no processo:

a participação social.

Sob essa trajetória, instituiu-se, em 1996, o Programa Nacional de

Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), e com ele proliferam os Conselhos

Municipais de Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDR), considerados um marco

em termos de descentralização das políticas públicas para o meio rural e participação

social. Para Abramovay (2004), a missão principal desses conselhos seria descobrir os

potenciais de desenvolvimento que os mecanismos convencionais de mercado são

incapazes de revelar, sobretudo em regiões menos favorecidas. Esta perspectiva da

participação da sociedade civil na gestão dos recursos públicos é fundamental à política

de desenvolvimento territorial do MDA, caracterizando-se como política

descentralizada.

A decisão do governo brasileiro em propor uma política nacional que apoiasse

o desenvolvimento sustentável dos territórios rurais além de resultar do processo de

acúmulos e de reivindicações de setores públicos e organizações da sociedade civil, que

avaliaram como sendo necessária a articulação de políticas nacionais com iniciativas

locais, segundo uma abordagem inovadora, foi fortemente influenciada pelo Grupo BM

(ROMANO, 2007). Portanto, como mencionamos, a decisão não foi espontânea.

É importante salientar que, com a criação da SDT, a influência dessas

organizações ainda continua grande, seja em termos de parcerias, seja em termos de

financiamentos de projetos. E, como consta no decreto 5.033 de 5 de abril de 2004,

artigo 3°, parágrafo VI, cabe ao MDA participar na negociação, com organismos

internacionais e multilaterais, de programas e projetos a serem desenvolvidos por

instituições governamentais e privadas, relacionados com a política nacional fundiária e

do desenvolvimento agrário.

Destarte, o MDA abriu caminhos legais de relacionamento com estas agências

internacionais. A influência não recai apenas na delimitação da escala territorial, mas

também no público alvo destas políticas. A visão de agricultor familiar esteve sempre

embutida nas orientações e referências. O problema está exatamente em considerar ou

não a diferença e a heterogeneidade desse público, ou de considerar as diferentes

demandas que eles apresentam. Esta decisão teve como resultado a proposta de criação

da SDT e a formulação do programa apresentado, e acolhido, no âmbito do Plano

Plurianual do Brasil de 2004 a 2007, Rede de Organismos Colegiados para o

Desenvolvimento Rural Sustentável, reunindo órgãos da administração pública federal

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com ações confluentes no desenvolvimento sustentável, os governos estaduais e

municipais, e um vasto número de organizações da sociedade civil e movimentos

sociais, além das próprias populações dos territórios rurais constituem a base política,

institucional e humana desta proposta.

Análises fundamentadas apontam para um fato: as políticas públicas

implementadas nas últimas décadas para promoção do desenvolvimento rural

no Brasil ou foram insuficientes, ou não foram efetivamente focadas no

objetivo de generalizar melhorias substanciais na qualidade de vida e nas

oportunidades de prosperidade das populações que habitavam o interior

brasileiro. A maior evidência é o aumento da pobreza é a persistência das

desigualdades regionais, setoriais, sociais e econômicas. Mesmo com

avanços em espaços conquistados pelos movimentos sociais, os efeitos

conseguidos ainda estão muito aquém das necessidades. Alguns poucos

resultados ainda podem ser considerados restritos a determinadas regiões ou

setores. As assimetrias quanto às oportunidades de desenvolvimento ainda

produzem, no meio rural, o maior contingente de pobres e de excluídos.

(BRASIL – MDA / SDT, 2005C, p. 10).

Fica notável que, de acordo com a SDT, a pobreza seria o empecilho para se

alcançar o desenvolvimento territorial rural sustentável, deste modo, retoma-se o

receituário do Grupo BM.

Para enfrentar esses problemas, mudanças substanciais deverão ocorrer no

escopo e na forma de encarar o desafio de resgatar da pobreza e do abandono

a vasta população que atualmente enfrenta os velhos problemas que sempre

assolaram o meio rural brasileiro. Mudanças essenciais deverão ser

assumidas pelos formuladores e operadores das políticas públicas, o que

significa, fundamentalmente reconhecer a importância da agricultura familiar

e do acesso à terra com dois elementos capazes de enfrentar a raiz da pobreza

e da exclusão social no campo, mas também compreender que uma nova

ruralidade está se formando a partir das múltiplas articulações inter-setoriais

que ocorrem no meio rural, garantindo produção de alimentos, a integridade

territorial, a preservação da biodiversidade, a conservação dos recursos

naturais, a valorização da cultura e a multiplicação de oportunidades de

inclusão. (BRASIL – MDA, SDT, 2005b, p. 10, 11).

Esta perspectiva, defendida e estimulada no Brasil a partir das recomendações

do Grupo BM, da interferência técnica do IICA e do apoio institucional da SDT aponta

para alguns elementos fundamentais no desenvolvimento territorial rural sustentável,

como:

[...] a valorização e fortalecimento da agricultura familiar, a diversificação

das economias dos territórios (sobretudo através do estímulo aos setores de

serviços e à pluriatividade), o estímulo ao empreendedorismo local e o

empurrão que viria do Estado para formação de arranjos institucionais locais

como os elementos-chave para a nova estratégia de desenvolvimento rural

sustentável no Brasil. (NAVARRO, 2008, p. 98).

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Assim, o desenvolvimento rural afirma as bases econômicas, sociais e naturais

de forma integrada. Baseado nas limitações e capacidades locais em direcionar pressões

externas no sentido de fortalecimento da autonomia dos agentes, “[...] para promover a

inclusão social e o aumento da capacidade de regenerar e conservar o meio ambiente.”

(SCHNEIDER, 2004, p. 98). O desenvolvimento territorial rural sustentável, de acordo

com este posicionamento, implica, portanto, na construção de justiça social em sintonia

com a segurança econômica e com a adequada exploração de recursos naturais. Para

isso seria necessário uma nova forma de enxergar a complexidade dos processos

envolvidos.

Essa nova racionalidade reorientaria os processos produtivos e econômicos,

sobretudo no que tange à comercialização e distribuição da produção, de forma a que a

viabilidade econômica caminhe pari passu com o desenvolvimento social dos

indivíduos e coletividades. A afirmação da identidade e diversidade cultural dos que

praticam a agricultura são pilares essenciais desta construção. Enxerga-se que

iniciativas de organização social são importantes no sentido de reunir forças e

reconhecer os agentes como atuantes na esfera política e social de suas comunidades.

Com a incorporação de novos agentes no cenário das políticas de

desenvolvimento rural, a criação da SDT e as novas diretrizes elaboradas, o MDA sofre

algumas mudanças organizacionais, como por exemplo, a criação do Conselho Nacional

de Desenvolvimento Rural Sustentável (CONDRAF). Esse conselho priorizou como

temática a questão das economias locais e também o debate da estratégia da abordagem

territorial como foco das políticas de desenvolvimento rural no país.

As propostas do CONDRAF giravam em torno de um desenvolvimento para

além de crescimento econômico, baseado na expansão das liberdades humanas. Esses

direcionamentos abrangiam uma tentativa de delimitar as responsabilidades do governo

federal (e também o estadual) no que tange às estratégias políticas para o

desenvolvimento das regiões rurais. Por iniciativa do CONDRAF foi elaborado um

Plano Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável.

Contundo as experiências acadêmicas que deram suporte ao desenvolvimento

territorial não deram suporte em relação aos potenciais da abordagem que propuseram e,

tão pouco, sobre quais os significados do conceito de território que tornam possível sua

operacionalização.

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De acordo com Favareto (2007) o que os resultados de projetos de

desenvolvimento territorial demonstram é que, quanto mais diversificada e

desconcentrada a distribuição de recursos sociais e naturais, maiores as possibilidades

de interação social na direção de uma dinamização econômica e coesão social num

processo, entendido como, de desenvolvimento. Na opinião de Albagli (2004), se

manejado de uma perspectiva meramente instrumental:

[...] o território constitui peça-chave para a reprodução do capital que, se hoje

em dia exige ser globalizado, necessita também de ancoragens físicas para os

empreendimentos produtivos, ao mesmo tempo em que requer uma fronteira

em constante movimento que atenda às contínuas transformações nas

condições de sua reprodução. Diferenciação e especificidades territoriais são

vistas aqui, fundamentalmente, como formas de atrair investimentos e gerar

novas lucratividades, e a territorialidade é valorizada como mero objeto de

interesse mercantil e especulativo (ALBAGLI, 2004, p. 63).

Podemos considerar com base nos autores citados, dentre eles destacando os

trabalhos de Abramovay (2004; 2005), Veiga (2005; 2006), Navarro (2008) e Favareto

(2007) que o desenvolvimento territorial rural sustentável prevê mudanças

institucionais e no processo produtivo no campo. As mudanças produtivas têm o

propósito de articular competitivamente à economia dos territórios com mercados

dinâmicos, promovendo assim a diminuição da pobreza rural, e, esta é considerada o

grande dilema para que se alcance o desenvolvimento territorial rural sustentável, a

partir da perspectiva do Grupo BM.

Capítulo 2. As recomendações do Grupo Banco Mundial sobre o desenvolvimento

territorial rural sustentável e a articulação entre o local e o global a partir de

políticas públicas no Estado de São Paulo

Neste capítulo vamos expor o processo que resulta na materialização de

políticas públicas de desenvolvimento territorial rural sustentável demonstrando, em um

primeiro momento, o apoio governamental a expansão do setor sucroenergético que,

fazendo uso do desenvolvimento sustentável e com apoio do Grupo BM39

, expande sua

territorialização no Estado de São Paulo, posteriormente, demonstramos a forma como

39

Neste aspecto, alertamos o leitor que os fatos demonstrados aqui sobre o apoio do Grupo BM a

expansão do setor sucroenergético remetem ao período de institucionalização do IAA e do programa

Proálcool, porém, entendemos que o Grupo BM, ao aderir e intensificar propostas de desenvolvimento

sustentável, influi, ainda que indiretamente, sobre o setor.

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foi estruturado o PEMH tendo em vistas entender à lógica que permitiu que o Grupo

BM articulasse sua atuação global em escala local fazendo uso, também, do

desenvolvimento sustentável, por fim, demonstraremos os resultados dessa política

pública na microbacia hidrográfica do Córrego da Onça II, no município de Presidente

Prudente-SP.

Neste sentido, ponderamos que ações de financiamento realizadas pelo Grupo

BM são demonstrações sobre o controle do território em distintas áreas com

características comuns como a concentração de pobreza, expansão do agrobusiness,

implementação de mineradoras, construção de obras de infra-estrutura, e outras

atividades que são facilitadas tendo em vista a quantidade de mão-de-obra barata

disponível e, sobretudo, o interesse de poderes locais e regionais na arrecadação

proveniente de tais atividades, destacando a produção agroindustrial destinada à

exportação (BONANNO, CAVALCANTI, 2011). Constata-se ainda, de acordo com

Porto-Gonçalves (2015) o interesse na disponibilidade de recursos naturais, o que

acarreta na potencialidade de conflitualidade (FERNANDES, 2005).

O controle do território coloca-se como fundamental para garantir o

suprimento da demanda sempre em ascensão por recursos naturais, apesar

dos avanços assinalados dos novos materiais. [...] Assinalemos que a

natureza com suas qualidades – a vida e os quatro elementos, terra, ar, água e

fogo – é o que se oferece a apropriação da espécie humana, o que se dá por

meio da cultura e da política. Tornar própria a natureza é, rigorosamente, se

apropriar da matéria na sua espaço-temporalidade, conformando territórios

diversos cujos limites, essência da política, resolvem temporariamente, como

a história da geografização do mundo revela (PORTO-GONÇALVES, 2015,

p. 287, itálico no original).

Portanto, o controle do território ao qual nos referimos está intimamente

relacionado à apropriação, uso e controle de recursos naturais como estratégia de

expansão territorial do modo de produção capitalista (WHITACKER, 2015).

2.1. A expansão do setor sucroenergético e o desenvolvimento sustentável

Consideramos que a questão energética perpassa fronteiras nacionais,

compreendendo desde processos integracionistas até conflitos que emanam de

negociações mal sucedidas e apropriações iméritas de recursos energéticos. Na década

de 1970, o temor de uma possível retração espaço temporal na acumulação e reprodução

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capitalista pela elevação do preço do barril do petróleo colocou este recurso na pauta de

discussões políticas e econômicas mundiais.

Portanto, quando, ainda em 1972, o Think Tank Clube de Roma publica o

relatório Os Limites do Crescimento (MEADOWS et al., 1972) tem início uma nova

perspectiva de mercado que passa a incorporar a variável capital natural, demonstrando

uma aparente mudança de articulações estruturadas sob tendências de mercado frente a

novas exigências de uma economia capitalista propícia a criação de novos espaços para

expansão, isto, considerando o desenvolvimento sustentável como estratégia mercantil

para expandir a territorialização do modo de produção capitalista, na atualidade e dentre

outros, por meio do setor sucroenergético.

De acordo com a International Energy Agency (IEA) a substituição dos

derivados do petróleo por uma única fonte energética é pouco provável, visto que o

consumo de combustíveis fósseis e seus derivados vêm crescendo nos últimos anos, se

tomarmos por comparação os volumes absolutos da demanda (IEA, 2013). A extração

do petróleo convencional torna-se cada vez mais difícil e, este fato, aliado ao

esgotamento de campos petrolíferos gigantes e super gigantes, levou a IEA a declarar

que o pico da produção do petróleo convencional ocorreu em 2006 (IEA, 2010). Todos

estes fatos, aliados aos crescentes alardes em torno do aquecimento global, tem

estimulado setores energéticos na busca de fontes, ditas renováveis, objetivando

colaborar com o desenvolvimento sustentável.

Tendo em mente que o elemento central capaz de direcionar o crescimento de

um setor é a sua capacidade de produzir lucro por meio de suas atividades e seguindo a

lógica mercantil, diversos setores da economia mantêm a sua rentabilidade a partir de

intervenções estatais na tentativa de criar condições produtivas propícias ao avanço e à

consolidação de determinado setor.

O Estado, dessa forma, atende a recomendações de agências que atuam

diretamente ou indiretamente na reprodução do modo de produção capitalista como, por

exemplo, o Grupo BM, o FMI e a Organização Mundial do Comércio (OMC),

realizando ações no intento de permitir ganhos cada vez mais significativos com o

capital aplicado.

Na atualidade, de acordo com Houtart (2010), vivemos um período de déficit

energético. Para Houtart (2010), o desenvolvimento capitalista continuará em expansão

a partir de fontes energéticas suficientes para garantir a ampliação da produção e do

consumo. A elevação dos padrões de consumo, impulsionada pela volatilidade de

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capitais, somente pode ser satisfeita se estiver a disposição recursos naturais, em

quantidade e qualidade suficientes, para que a produção, a circulação e o consumo de

bens industrializados se realizem nos mais variados contextos, o que coloca

determinados recursos naturais, cada vez mais, como alvo de cobiça e disputa entre

povos e nações (HOUTART, 2010).

O déficit energético, o alarde sobre a escassez e degradação de determinados

recursos naturais e a crise econômica que se estende desde a década de 1970, são fatos

que justificam a realização de investimentos em setores que se apresentam com

capacidade de garantir alternativas a estes impasses e o setor sucroenergético, de acordo

com Goldemberg (2007), Sachs (2007; 2005) e Veiga (2005), possui características

capazes de atender essas demandas tendo em vistas a competitividade internacional e o,

também, o aceite nacional.

Diante da inexistência de uma fonte com potencial para a substituição dos

combustíveis fósseis, Castro (2007) aponta para a diversificação da matriz energética

mundial, através da entrada e do crescimento da participação de fontes energéticas

renováveis, como tendência para as próximas décadas. De acordo com Veiga e Ehlers

(2009):

Em 2006, apenas 1% do transporte terrestre mundial era movido por etanol

ou biodiesel, porém as preocupações ambientais e o elevado custo do

petróleo devem aumentar a ebulição desse mercado nas próximas décadas.

Além disso, nos EUA, principal consumidor mundial, a substituição de

George Bush por Barak Obama pode marcar, também, a transição da matriz

fóssil para a renovável. O primeiro passo foi a nomeação de um especialista

em fontes alternativas, Nobel em física, como secretário de energia, e de um

entusiasta dos biocombustíveis como secretário de agricultura (VEIGA;

EHLERS, 2009, p. 14).

Dentre as diversas opções de produção de energia a partir de fontes renováveis,

o etanol se apresenta como fonte potencialmente capaz de ser incorporada à matriz

energética mundial, por sua característica de combustível renovável e pela possibilidade

de sua produção a partir de diferentes matérias-primas. O setor sucroenergético

brasileiro, neste contexto, foi impulsionado à expansão.

O Brasil é um dos países que se encontra em estágio mais avançado na busca

por fontes energéticas limpas. A competitividade do etanol produzido a partir

da cana-de-açúcar no Brasil é significativamente maior do que a dos demais

produtores, destacando-se em relação ao etanol de milho dos EUA, tanto na

questão dos custos de produção, como do balanço energético. O sucesso do

setor e a tendência de crescimento da área destinada à atividade canavieira,

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bem como o aumento de sua demanda por trabalho, têm suscitado

preocupações e mitos. O principal deles refere-se à preocupação quanto à

disponibilidade de terra agricultável no país que possa abrigar a expansão da

cultura da cana-de-açúcar e, aliada a esta preocupação, o mito de que a

expansão se fará em terras hoje empregadas na produção de alimentos, o que

pressionará o preço destes com impactos negativos sobre a distribuição de

renda (CHAGAS; TONETO-JÚNIOR; AZZONI, 2008, p. 57).

Historicamente, a produção da cana-de-açúcar figura entre as atividades

agrícolas da economia nacional já no Brasil Colônia (PRADO JUNIOR, 2012). Por ser

uma atividade que vem sendo desenvolvida desde o século XVI, e por ter passado por

mudanças em sua estrutura, é possível identificar o setor por diferentes denominações,

dependendo da época e do contexto em que a atividade é abordada. Principalmente por

força da ação estatal, aliada ao setor agroindustrial, o setor evoluiu de açucareiro para

sucroalcooleiro e, posteriormente, para agroenergético ou sucroenergético.

A dimensão espacial do setor também foi alterada e intensificada expandindo-

se da zona da mata nordestina e norte fluminense para o interior paulista. Szmrecsányi

(1979), Szmrecsányi e Moreira (1991) e Ramos (1999 e 2007), apontam para a

existência de uma regionalização do território brasileiro, quanto à produção de cana-de-

açúcar. A região Nordeste e a região Centro-Sul eram tratadas de maneiras distintas

quanto ao estabelecimento de políticas públicas, de metas e cotas de produção, por parte

das unidades de produção de matéria-prima e por processadoras da cana-de-açúcar.

As grandes mudanças da economia brasileira agroindustrial, num primeiro

período compreendido entre 1930 e 1945, foram, em boa parte, induzidas por políticas

federais, que inicialmente estavam voltadas para a sustentação das atividades

agroexportadoras, e, num segundo momento, para o fomento (SUZIGAN;

SZMRECSÁNYI, 2002).

O setor sucroenergético conta com apoio estatal desde o início de suas

atividades e passou a ser contemplado formalmente por políticas públicas após a década

de 1930, com a criação do Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA). Desde então, o

Estado vem participando ativamente do setor por meio de seus órgãos de gestão. Como

forma de incentivar o setor sucroenergético, o IAA, junto ao governo federal, criou o

Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-açúcar – (PLANALSUCAR) para

renovar as variedades de cana produzidas no país. Nesse sentido, a importância da

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relação indústria e agricultura40

permitiu o sucesso da produção do etanol graças aos

subsídios creditícios e incentivos fiscais.

O processo de integração indústria e agricultura não se deu à margem das

relações entre as grandes empresas, os grupos econômicos e o Estado. Este

último atuou, sobretudo, através de subsídios creditícios, incentivos fiscais e

toda uma bateria de políticas incentivadoras das exportações (MÜLLER,

1989, p. 18).

A atuação do IAA na criação e execução de políticas públicas setoriais pode

ser identificada através da elaboração de planos e programas, além do já mencionado

PLANALSUCAR, são exemplos, o Programa de Racionalização da Agroindústria

Açucareira (1971), Programa de Apoio a Agroindústria Açucareira (1973) e Programa

Nacional do Álcool (1975).

Ainda na década de 1970, a partir dos desdobramentos economicamente

positivos da união entre indústria e agricultura, o Estado brasileiro, por meio do IAA,

criou o Programa Nacional do Álcool (PROÁLCOOL) (1975-1985), como forma de

aumentar a produção de etanol e incentivar o seu uso.

Preocupado com o cenário internacional, o governo brasileiro recorreu à

experiência tecnológica com o uso do álcool carburante para fomentar a indústria

automotiva e atender às metas do plano nacional de desenvolvimento41

. O documento

intitulado “Fotossíntese como fonte de energia”42

foi a origem do programa

PROÁLCOOL. Este documento resulta de um estudo entre setores empresariais

relacionados à produção de cana-de-açúcar, acadêmicos e especialistas em tecnologia de

produção de álcool (DORETTO, 2015).

O marco regulatório instituído pelo Decreto Lei n. 25.174-A, de 3 de julho de

1948, pelo qual foram estabelecidos inicialmente os incentivos pelo governo Federal à

fabricação de álcool para uso em motores de combustão, pode ser considerado como

sendo o início oficial da operacionalização do PROÁLCOOL (MENEZES, 1980),

40

Para Müller (1989), esta relação é expressada pela formação dos complexos agroindustriais: “[...] uma

forma de unificação das relações interdepartamentais com os ciclos econômicos e as esferas da produção,

distribuição e consumo, relações essas associadas as atividades agrárias. Vale dizer que o complexo

agroindustrial é considerado como uma unidade analítica da acumulação de capital no país” (MÜLLER,

1989, p. 23). 41

II Plano Nacional de Desenvolvimento (1975-1979), que tinha por objetivos: “Manter o crescimento

acelerado dos últimos anos; reafirmar a política gradualista de contenção de inflação; manter em relativo

equilíbrio o balanço de pagamentos; realizar política de melhoria da distribuição de renda; preservar a

ordem social e política; realizar o desenvolvimento sem deterioração da qualidade de vida e devastação

dos recursos naturais”. 42

Sobre este documento, não encontramos fontes que revelam exatamente sua origem e publicação, para

informações mais detalhadas consultar, por exemplo, Doretto (2015).

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porém a fabricação em grande escala de veículos automotores com uso de álcool só foi

desencadeada na década de 1970, pelo então presidente Ernesto Geisel.

Com o Proálcool, o governo lançou uma grande operação de financiamento,

contando, mesmo, com recursos do Banco Mundial, o que possibilitou o

aumento das áreas plantadas com cana-de-açúcar. As usinas de açúcar

existentes receberam financiamentos para instalar aparelhos de destilarias

maiores, ao mesmo tempo em que foram criadas as destilarias autônomas –

unidades de produção voltadas exclusivamente para a produção de álcool.

Cerca de 180 unidades autônomas foram criadas em vários estados

brasileiros, para descentralizar a produção e utilizar novas áreas mais

próximas dos centros de consumo (VIEIRA, 2014, p. 212).

Sobre a participação financeira do Grupo BM, é importante notar que, em

relação ao desenvolvimento rural seu apoio já é, há tempos, significativo, como

escrevemos nos itens 1.1 e 1.2, mas, e em específico em relação à consolidação do setor

sucroenergético brasileiro, esta agência de fomento também contribuiu para sua

formação e inserção no mercado internacional.

The time period studied overlapped with the Brazil Alcohol and Biomass

Energy Development Project funded by the World Bank from 1981 to 1987.

The main objective of the loan, amounting to more than US$200 million, was

to support Proálcool to develop an economic, renewable liquid fuel energy

source to substitute for imported gasoline (WORLD BANK, 2005, p. 117).

De acordo com Goldemberg (2007) a estratégia de inserção no mercado

internacional relaciona-se, também, ao papel desempenhado pelo aprimoramento das

chamadas tecnologias de geração de energia limpa, com a implantação de ciclos a vapor

mais avançados dentro das unidades sucroalcooleiras, a fim de aprimorar seu parque

gerador, aumentando a energia excedente e evitando consumo externo.

Técnicas estas, dentre outras, que alçaram o setor sucroenergético no debate

em torno do desenvolvimento sustentável devido ao seu possível potencial de gerar

energia renovável a partir da cana-de-açúcar (GOLDEMBERG, 2007) que além de seu

potencial energético, colabora na redução de gazes poluentes, como aqueles

responsáveis pelo efeito estufa (GEE).

Para se destacar no debate sobre o desenvolvimento sustentável e ser

reconhecido internacionalmente, é enfatizado por autores, como, por exemplo, Sachs

(2005; 2007) e Veiga (2005), dentre outros, que o setor sucroenergético é capaz de

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ampliar suas ações em torno de distintas dimensões do desenvolvimento sustentável43

sendo estas beneficiadas simultaneamente, evitando que os ganhos em determinada

dimensão represente perdas em outros.

De certa forma, amparado pelo discurso do desenvolvimento sustentável, pela

competitividade internacional e pelo potencial de gerar desenvolvimento rural, o setor

se mantém estável durante as décadas de 1980 e 1990, porém, na década de 2000, no

momento em que a produção nacional de etanol se encontrava em ascendência devido

às leis americanas44 e diretivas europeias45 sobre uso de biocombustíveis em sua matriz

energética, um elemento não previsto para o setor surgiu como ameaça significativa à

suposta capacidade de colaboração ao desenvolvimento sustentável, trata-se da

controvérsia entre a produção de combustível e a de alimentos, alimentada pelo

aumento global do preço dos alimentos em 2008.

Governos, empresários, acadêmicos, movimentos sociais e o público em geral

viram-se confrontados com questionamentos sobre a expansão do setor. A

argumentação a favor ou contra os biocombustíveis ficou cada vez mais acalorada e as

consequências fizeram-se sentir.

Sobre este aspecto, o World Bank (2008) se posiciona questionando a relação

entre a expansão do setor sucroenergético e o aumento dos preços de alimentos

argumentando, dentre outros fatos, que a elevação dos preços se deu por conta do

aumento do custo da produção energética.

43

Para Sachs (2007) o desenvolvimento sustentável deve incorporar, resumidamente, as seguintes

dimensões: social: na qual a meta é construir uma civilização com maior equidade na distribuição de

renda e de bens, de modo a reduzir o abismo entre os padrões de vida dos ricos e dos pobres; econômica:

a eficiência deve ser avaliada em termos macrossociais, e não apenas por meio do critério da rentabilidade

empresarial de caráter microeconômico; ecológica: que ser melhorada a partir da ampliação da

capacidade de carga, substituição de combustíveis fósseis por produtos renováveis e/ou abundantes

usados de forma não agressiva ao meio ambiente, redução do volume de resíduos, poluição e do consumo,

e a partir da definição de normas para proteção ambiental; espacial: na qual deve haver uma configuração

rural-urbana mais equilibrada e uma melhor distribuição territorial de assentamentos humanos e

atividades econômicas, com ênfase na promoção de práticas modernas e regenerativas de agricultura e

agrossilvicultura, envolvendo os pequenos agricultores e empregando adequadamente pacotes

tecnológicos, crédito e acesso a mercados; e na criação de oportunidades de emprego não agrícola nas

áreas rurais, com referência especial às indústrias de biomassa; na proteção de áreas para proteção da

biodiversidade, entre outros e, por fim, cultural: que deve incluir a procura de raízes endógenas de

modelos de modernização e de sistemas agrícolas integrados, processos de mudanças que resguardem a

continuidade cultural e que traduzam o conceito normativo de ecodesenvolvimento numa pluralidade de

soluções, ajustadas à especificidade de cada contexto socioecológico (SACHS, 2007). 44

Em 2005 foi criada a Energy Policy Act (EPAct 2005), regulamentação que estabeleceu o Renewable

Fuel Standard (RFS1), mandato de mistura de biocombustíveis à gasolina por refinarias produtoras,

distribuidores e importadores. No entanto, em 2007, foi lançado o Energy Independence and Securiry Act

(EISA) que substituiu a EPAct e também criou a RFS2 (OECD, 2011). 45

COMISSÃO EUROPEIA. Diretiva 2009/28/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23de abril

de 2009: relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis que altera e

subsequentemente revoga as Diretivas 2001/77/CE e 2003/30/CE, 2009.

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Rising production of biofuels has important implications for food security in

many developing countries. Sugar’s importance in food consumption is

limited because it does not contain vital nutrients and is not used as animal

feed. In contrast, diversion of maize and oilseeds to the biofuel sector has had

a significant effect on global food prices in recent years. The link between the

rising demand for biofuels and surging food prices has prompted a debate

about the potential conflict between food and fuel. Among the statistics cited

is that it takes the same amount of grain to fill a sport utility vehicle’s tank

with ethanol as it does to feed one person for a year. Rising energy prices,

among several factors, have contributed to food price increases, but biofuel

production has also pushed up feedstock prices. [...] The increased demand

for feedstock crops by biofuel industries, by some estimates, has accounted

for about 20 percent of the overall increase in real rice and wheat prices and

around 40 percent for maize from 2000 to 2007. Rising food prices have hit

many food importing countries hard, causing significant welfare losses for

the poor, many of whom are net buyers of staple crops. In the near term,

cereal supply is likely to remain constrained. Prices are subject to upward

pressure from further supply shocks. However, unless there is another major

surge in energy prices, the pace of increases in feed stock prices should ease

over the long term. Farmers will respond to higher prices by increasing the

planted areas and supply of these feed stocks (WORLD BANK, 2008, p. 75).

No Brasil, o setor sucroenergético rapidamente sentiu os impactos desta nova

conjuntura e fez tentativas para derrubar os argumentos contra o setor. A União das

Indústrias Canavieiras (UNICA) obteve uma significativa vitória quando a United

States Environmental Protection Agency (EPA), em 2010, classificou o etanol brasileiro

como combustível avançado, considerando o potencial de redução na emissão de CO² e,

deste modo, fortaleceu a inserção nacional no mercado norte-americano, já que a EPA

estabeleceu que o etanol brasileiro seja capaz de reduzir a emissão de gases de efeito

estufa em 62% com relação à gasolina.

Apesar dessa vitória, os questionamentos continuaram sobretudo na União

Europeia onde o entendimento, para muitos, era que, embora os canaviais não se

expandissem causando novos desmatamentos, por exemplo, eles estariam empurrando

outras atividades (como a pecuária e a sojicultura), para o bioma amazônico e para o

Pantanal, causando mudanças no uso da terra e danos aos recursos naturais (PORTO-

GONÇALVES; ALENTEJANO, 2010).

A UNICA, a época, ameaçou levar à União Europeia ante a OMC, caso o bloco

continuasse a aplicar restrições ao comércio de etanol (consideradas como uma barreira

não tarifária) sobre bases facilmente contestáveis (UNICA, 2010) em relação ao debate

sobre a expansão do setor sucroenergético e a produção de alimentos. Visando amenizar

este debate e, ponderamos, potencializar o setor sucroenergético, em 2008 surge a

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proposta sobre o Indirect Land Use Change (ILUC), tanto nos Estados Unidos quanto

na Europa.

Com referencia ao ILUC, a teoria reza que o aumento de produção de

biocombustíveis, em um determinado país, pode levar à redução da sua área

de produção de alimentos. Em consequência, como a demanda pelo produto

original se mantém, outra área com uso não agrícola é convertida para a

agricultura. No limite, em uma sequência de eventos encadeados para

equilibrar oferta e demanda de produtos agrícolas, outro país, que pode estar

situado a 20.000 km de distância, desmataria a floresta para substituir a área

de alimentos que desapareceu no país que passou a produzir biocombustíveis

(EMBRAPA, 2014, p. 11).

Em 2014, o Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre Mudança

Climática (IPCC), embasado por estudos encomendados para este fim, divulgou o

relatório Renewable Fuel Standard Program (IPCC, 2014) no qual afirma que o debate

ao redor das mudanças indiretas no uso do solo, com relação aos biocombustíveis,

carece de fundamentação adequada e não pode ser verificado empiricamente que exista

uma conexão entre a produção de biocombustíveis e a substituição de lavouras

alimentares e/ou desmatamento de regiões florestais.

The nature and extent of the impacts of implementing bioenergy depend on

the specific system, the development context, and on the size of the

intervention (Section 11.4.5). The effects on livelihoods have not yet been

systematically evaluated in integrated models (Davis et al., 2013; Creutzig et

al., 2012b; Creutzig et al., 2013; Muys et al., 2014), even if human geography

studies have shown that bioenergy deployment can have strong distributional

impacts (Davis et al., 2013; Muys et al., 2014). The total effects on

livelihoods will be mediated by global market dynamics, including policy

regulations and incentives, the production model and deployment scale, and

place-specific factors such as governance, land tenure security, labour and

financial capabilities, among others (Creutzig et al., 2013) (IPCC, 2014, p.

883).

Esta publicação do IPCC pode ser considerada como significativo apoio à tese

brasileira, amparada pelos grupos corporativos e o governo, sobre o potencial de

desenvolvimento sustentável do setor sucroenergético levando em consideração a

necessidade de este setor manter seu potencial de produção e exportação.

Neste cenário de controvérsias, o governo brasileiro impulsionou uma

iniciativa tendente a contestar os questionamentos levantados contra os impactos da

expansão do setor sucroenergético, cuja promoção internacional ocupou um lugar

central na agenda de comércio e relações exteriores do segundo governo Luis Inácio

Lula da Silva.

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Em 2009 é lançado o Zoneamento Agroecológico da cana-de-açúcar para a

produção de etanol e açúcar no Brasil (ZAE), com a finalidade de “[...] fornecer

subsídios técnicos para formulação de políticas públicas visando o ordenamento da

expansão e a produção sustentável de cana-de-açúcar no território brasileiro”

(MANZATTO, 2009, p. 8).

O ZAE levou em consideração a vulnerabilidade das terras, o risco climático, o

potencial de produção agrícola e a legislação vigente para discriminar quais áreas

seriam aptas para a expansão da lavoura canavieira, deixando por fora aquelas com

declividade superior a 12% (não aptas para colheita mecanizada), as áreas com

cobertura vegetal nativa, os biomas Amazônia e Pantanal, terras indígenas e a Bacia do

Alto Paraguai. As áreas indicadas para a expansão estariam compreendidas em áreas de

produção agrícola intensiva e semi-intensiva, lavouras especiais (perenes, anuais) e

pastagens. Para Manzatto (2009) dentre as principais conclusões das pesquisas,

conduzidas pelo MAPA e pelo MMA, destaca-se a seguinte:

As estimativas obtidas demonstram que o país dispõe de cerca de 64,7

milhões de ha de áreas aptas à expansão do cultivo com cana-de-açúcar [...]

As áreas aptas à expansão cultivadas com pastagens, em 2002, representam

cerca de 37,2 milhões de ha. Estas estimativas demonstram que o país não

necessita incorporar áreas novas e com cobertura nativa ao processo

produtivo, podendo expandir ainda a área de cultivo com cana-de-açúcar sem

afetar diretamente as terras utilizadas para a produção de alimentos.

(MANZATTO, 2009, p. 7).

Desta forma, o governo colocava-se à frente dos questionamentos, elaborando

e divulgando estudos técnicos que embasem a defesa do setor em relação à questão da

produção de alimentos e também reconhecia o apoio do setor sucroenergético ao

desenvolvimento sustentável. Por meio deste mecanismo, político, foram elaboradas as

bases para que o governo brasileiro continuasse com a defesa e promoção do setor

sucroenergético e a produção de etanol no cenário internacional, estabelecendo critérios

territoriais e estruturando as atividades setoriais a partir de práticas tendentes a eliminar

o efeito ILUC, neutralizando em parte os argumentos da União Europeia e dos Estados

Unidos.

Embora para algumas Organizações Não Governamentais (ONGs) o ZAE

ainda tivesse vulnerabilidades de fundo que limitariam sua efetiva aplicação

(REPÓRTER BRASIL, 2009), com sua aprovação, o governo conseguiu apresentar a

nova política como prova inequívoca de apoio ao desenvolvimento sustentável e da

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preocupação do país com uma agenda de redução dos GEEs em nível global. Graças ao

ZAE, o governo e os produtores puderam sinalizar a potenciais compradores e

investidores externos que o etanol brasileiro:

[...] contribui para a mitigação das mudanças climáticas globais e que os

passivos ambientais não serão ampliados. Em outras palavras: que a

expansão dos canaviais não destruirá vegetação primária, especialmente a

floresta amazônica, liberando gases de efeito estufa para a atmosfera

(REPÓRTER BRASIL, 2009, p. 1).

Houve neste momento uma clara compreensão entre os produtores e suas

organizações representativas da necessidade de fortalecer este discurso e potencializar

suas práticas para o desenvolvimento sustentável como estratégia competitiva para o

mercado internacional, na medida em que este se torna o cerne do discurso empresarial.

Não restrito a este setor, na defesa da produção de etanol, é possível

considerarmos que grande parte dos investimentos registrados a partir de 2008, quando

se acelerou o processo de fusões e aquisições no setor, foi possível graças ao ZAE, pois

foi este o instrumento político que garantiu aos investidores que não haveria problemas

na comercialização internacional de um produto anteriormente rejeitado por

questionamentos relativos à preservação de recursos naturais.

A “saída”, portanto, seria estimular um tipo de empreendedorismo capaz de

gerar empregos e, simultaneamente, conservar a biodiversidade. Os

empreendedores são os principais agentes da mudança econômica, pois são

eles que geram, disseminam, e aplicam as inovações. Ao procurarem

identificar as potenciais oportunidades de negócios e assumirem os riscos de

suas apostas, eles expandem as fronteiras da atividade econômica. Mesmo

que muitos não tenham sucesso, é sua existência que faz com que uma

sociedade tenha constante geração de novos produtos e serviços (VEIGA;

EHLERS, 2009, p. 17, aspas no original).

Goes e Marra (2002) escreveram que o cultivo e expansão do setor

sucroenergético era caluniado por movimentos de proteção aos recursos naturais e que o

desenvolvimento sustentável do setor é um fator real. Segundo os autores:

Entre as várias evidências que podem ser apresentadas para derrubar essa

falácia criada por fortes lobbies internacionais sobre os pseudos malefícios

atribuídos à produção dos biocombustíveis (tendo como foco o etanol

brasileiro) e da expansão da cultura da cana-de-açúcar destacamos as

seguintes: dados do IBGE sobre a disponibilidade e ocupação de terras

agricultáveis com as várias culturas e inclusive com cana-de-açúcar, mostram

que existe área disponível para aumentar 30 vezes a área atual plantada com

cana-de-açúcar sem prejuízos ambientais ou substituição de áreas destinadas

à produção de alimentos; de acordo com a estimativa mais recente do IBGE o

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Brasil vai colher em 2008 144,3 milhões de toneladas de grãos (a maior safra

até hoje colhida ); a elevação do preço das commodities no mercado

internacional, é uma consequência direta da elevação exagerada do preço do

petróleo, que em pouco tempo saltou de 30 para 130 dólares o barril

continuando a sua escalada de preço, já chegando praticamente a 140 dólares;

a baixa verificada nos estoques mundiais de alimentos deve-se ao aumento da

renda e portanto do consumo em alguns países, com China e Índia e perdas

de safra em virtude de problemas climáticos ocorridos na Austrália e na

Europa Central. Mas, o ponto fundamental a ser considerado é a

sustentabilidade interna da cana-de-açúcar. O melhoramento genético é a

grande ferramenta para garantir a sustentabilidade da cultura da cana. Ele

reduz custos, traz eficiência e aumenta a produtividade. O equilíbrio entre a

sustentabilidade e produtividade da cana acontece por meio de novas

variedades de plantas adaptáveis às condições de cada região. (GOES;

MARRA, 2002, p.2)

Neste mesmo sentido e buscando incentivar o setor, a Empresa Brasileira de

Pesquisas Agropecuárias (EMBRAPA) publica, em 2014, estudo onde indica que:

[...] é largamente conhecida à contribuição positiva, ao meio ambiente, da

produção de biocombustíveis produzidos com base na cana-de-açúcar,

atestados internacionalmente. Praticas reconhecidamente nocivas, como o

despejo de vinhoto nos rios, são coisas do passado (EMBRAPA, 2014, p. 18).

Sobre esta polêmica, Sachs (2010) escreveu que:

Seja como for, está no auge à controvérsia sobre os limites e as perspectivas

da agroenergia, contestada e até mesmo combatida por certos ecologistas.

Eles imaginam que a agroenergia privará o agroalimentar de superfícies

indispensáveis à segurança alimentar, e de quebra provocará o corte rente ou,

pior, o incêndio das florestas nativas. Aliás, elas já sofrem por causa da

retirada predatória de lenha e da produção selvagem de carvão vegetal. Esse

perigo existe, mas em vários países a agroenergia pode aspirar a um belo

futuro contribuindo, além disso, para o desenvolvimento rural virtuoso, isto é,

criador de inúmeras oportunidades de trabalho decente (SACHS, 2010, p.

31).

Neste cenário, a UNICA fortalece seu discurso sobre o potencial deste

segmento para o desenvolvimento sustentável:

Hoje podemos dizer que esta planta extraordinária não pode mais ser descrita

apenas pelo nome de cana-de-açúcar, mas também poderia ser chamada de

cana-de-etanol e cana-de-bioeletricidade. Amanhã ela será também descrita

como a cana-de-bioplásticos, a cana-de-biorefinarias e, quem sabe, a cana-

do-meio-ambiente (JANK, 2007, s.p.).

A UNICA, por meio de seus dirigentes, detalha as áreas de atuação indicando

controle dos aspectos naturais e como se dá o aproveitamento de insumos, o uso de

defensivos agrícola, a perda do solo, o uso da água e autossuficiência em energia:

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Consumo de Fertilizantes: a utilização de fertilizantes na cultura de cana-de-

açúcar no Brasil é baixa (aproximadamente 0,425 tonelada por hectare). Isto

se deve principalmente à utilização de resíduos industriais da produção do

etanol e açúcar, como a vinhaça e a torta de filtro, como fertilizantes

orgânicos. Além disso, o uso da palha da cana deixada sobre o solo após a

colheita, principalmente nas áreas mecanizadas, vem a otimizar todo este

processo em termos de reciclagem de nutrientes e proteção do solo. Consumo

de Defensivos: o uso de inseticidas na cana-de-açúcar no Brasil é baixo e o

de fungicidas é praticamente nulo. As principais pragas da cana são

combatidas através do controle biológico de pragas e com a seleção de

variedades resistentes, em grandes programas de melhoramento genético.

Perdas de Solo: a cultura da cana no Brasil é reconhecida hoje por apresentar

relativamente pequena perda de solo (cerca de 12,4 toneladas por hectare).

Esta situação continua melhorando com o aumento da colheita sem queima

da palha de cana e com técnicas de preparo reduzido, levando a perdas e

valores muito baixos, comparáveis ao plantio direto em culturas anuais. Uso

de Água: a cana-de-açúcar no Brasil praticamente não é irrigada. As

necessidades hídricas, na fase agrícola, são sanadas naturalmente pelo regime

de chuvas das regiões produtoras, principalmente no centro-sul do país, e

complementadas pela aplicação da vinhaça (sub-produto da produção do

etanol que é rica em água e nutrientes orgânicos) em processo chamado de

fertirrigação. Os níveis de captação e lançamento de água para uso industrial

têm sido reduzidos substancialmente nos últimos anos, de cerca de 5 metros

cúbicos por tonelada para cerca de 1 metro cúbico por tonelada processada.

Auto-suficiência Energética: toda energia utilizada no processo industrial da

produção de etanol e açúcar no Brasil é gerada dentro das próprias usinas a

partir da queima do bagaço da cana. Este processo, chamado de cogeração,

consiste na produção simultânea de energia térmica e energia elétrica a partir

do uso de biomassa, capaz de suprir as necessidades da usina e prover energia

excedente para a rede pública de energia elétrica (UNICA, 2008, s.p.).

Neste mesmo raciocínio o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e

Social (BNDES), importante órgão financiador de projetos do setor sucroenergético

coordenou um estudo, em parceria com a FAO, Grupo BM, CEPAL, e CGEE (Centro

de Gestão e Estudos Estratégicos), para difundir o setor sucroenergético como produtor

de energia para o desenvolvimento sustentável (BNDES, 2008), no qual indica que:

Diversos países têm mostrado interesse no desenvolvimento da produção e no

uso de bioetanol. Além de procurar cobrir suas próprias necessidades

energéticas, em muitos casos busca-se constituir um mercado mundial para

esse biocombustível, que aproxime países em condições de produzi-lo

sustentavelmente do mercado de países potencialmente importadores, com

vantagens para ambos. Na atualidade, tal mercado ainda é incipiente, mas as

demandas crescentes por um combustível renovável e ambientalmente

adequado, associadas ao potencial que o bioetanol de cana-de-açúcar

apresenta para atender a critérios objetivos de sustentabilidade, sinalizam a

existência de perspectivas interessantes (BNDES, 2008, p. 221).

No estado de São Paulo, que concentra 72,7% da produção de cana-de-açúcar

do Brasil, 47,5% da produção de álcool combustível e 193 das 414 usinas e destilarias

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do país, destaca-se que 85% dos investimentos públicos realizados pelo BNDES, no

período de 2001 a 2008, equivalentes a cerca de US$ 14,3 milhões, foram para o setor

sucroenergético, sendo que, aproximadamente, US$ 4,3 milhões para o estado de São

Paulo, concentrados apenas no ano de 2008 (BORGES; COSTA, 2009). Neste sentido,

ponderamos que, frente a outros motivos, a expansão do setor sucroenergético a nível

nacional, e de interesse neste momento, no estado de São Paulo, ocorre fortemente

atrelada ao discurso em torno do apelo ao desenvolvimento sustentável.

Visando atenuar os debates a cerca dos impactos da expansão deste setor no

estado de São Paulo, a Secretaria Estadual do Meio Ambiente (SMA) criou em parceria

com a Secretaria de Agricultura e Abastecimento (SAA) o Protocolo Agroambiental do

Setor Sucroalcooleiro do Estado de São Paulo, com o objetivo de incentivar a adoção de

práticas de desenvolvimento sustentável no setor sucroenergético.

O Protocolo Agro-Ambiental foi firmado em 2007 entre os usineiros e a

Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Secretaria da Agricultura e

Abastecimento, antecipando o limite de eliminação gradativa da queima da

palha da cana-de-açúcar de 2031, que foi determinado por lei estadual, para o

ano de 2017, com a produção sustentável de etanol respeitando: os recursos

naturais como a proteção de nascentes e dos remanescentes florestais, o

controle das erosões e o adequado gerenciamento das embalagens de

agrotóxicos; controlando a poluição, com responsabilidade social,

antecipando os prazos de eliminação da queima da palha da cana; e

certificando as empresas sucroalcooleiras, que aderirem a protocolo de

conduta agroambiental (OLIVETTE, NACHILUK, FRANCISCO, 2010, p.

56).

O Protocolo Agroambiental tem, portanto, por objetivo incentivar a adoção de

boas práticas no setor sucroenergético paulista, a fim de atender diretrizes a serem

cumpridas progressivamente. O documento inclui, ainda, compromissos de apoio

governamental e foi criado na SMA, como parte do projeto Etanol Verde (SMA, 2011).

Além disso, são ações previstas no protocolo, articular e subsidiar o órgão licenciador

nos procedimentos de licenciamento e na padronização de dados enviados nos estudos

relacionados aos recursos naturais, e colaborar para o Sistema Estadual de Informações

Ambientais, com informações sobre cobertura florestal e áreas de recuperação florestal

do Estado.

Na figura 1, temos a visualização das áreas consideradas aptas e inaptas, de

acordo com o protocolo lançado pelo governo do Estado de São Paulo para a expansão

do setor.

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Figura 1: Áreas aptas e inaptas para a expansão do setor sucroenergético no estado de São Paulo.

Fonte: Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SMA, 2011).

Além de diretrizes a serem cumpridas pelos signatários, o documento inclui

também compromissos de apoio governamental (SMA, 2011). Para tanto, foram

elaborados protocolos de cooperação, primeiro com a indústria, firmados junto à

UNICA, e posteriormente junto aos fornecedores de cana-de-açúcar, representados pela

Organização dos Plantadores de Cana-de-açúcar da Região Centro-Sul (ORPLANA).

Mesmo tendo a UNICA como representante da categoria, há participação também de

usinas não filiadas a essa entidade.

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No estado de São Paulo, com apoio governamental, o setor sucroalcooleiro se

territorializa e se consolida em áreas onde já marcava presença em meados da década de

1980. Os Governos estadual e municipal (sobretudo os do Oeste paulista) apostaram no

setor sucroenergético como gerador de riqueza e emprego, não medindo esforços para a

atração das plantas industriais para suas áreas. Este processo criou municípios

economicamente e socialmente dependentes em vários aspectos, principalmente em

relação à saúde, segurança e educação, tendo em vista que estes foram

sistematicamente, estruturados para a produção da cana-de-açúcar (GIRARDI, 2013).

No mapa 1, podemos ter uma visualização da expansão da cana-de-açúcar

nesta região corroborando assim com as informações inicialmente expressadas no item

anterior sobre a contrariedade nas ações do governo do estado de São Paulo em relação

ao desenvolvimento sustentável que, por um lado contribui com o PEMH, que possui o

desenvolvimento sustentável como objetivo, e expande uma atividade agrícola de

tendência homogeneadora, e todos os seus impactos decorrentes.

Mapa 1: Área plantada de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo (ESBOÇO)

Fonte: Girardi, 2013

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Como demonstraremos, na mesma área elencada pela SAA como prioritária

para execução do PEMH, devido principalmente aos níveis de erosibilidade e

indigência, o governo estadual, desde a década de 1980, sobretudo pelo programa PRÓ-

OESTE, intensificou as condições de territorialização da cana-de-açúcar nesta área, que

se fortaleceu e mantém suas características até os dias atuais (GIRARDI, 2013)

favorecendo a concentração de terras, o desmatamento, o uso intensivo de agrotóxicos e

outras ações igualmente impactantes sobre os recursos naturais e sobre a população em

geral, agindo, deste modo, de forma ambígua, pois, ao mesmo tempo que promove

políticas públicas visando o desenvolvimento sustentável, promove, também, o

desenvolvimento do modo de produção capitalista, predatório e desigual.

Disto, com base no discurso impulsivo de alterações climáticas e na

inconstância mundial na oferta de petróleo, muitos países, em maior ou menor grau,

dependentes de abastecimento externo deste combustível, têm buscado formas

alternativas de energia. Este discurso da eficácia e eficiência dos agrocombustíveis está

nas declarações do presidente da UNICA: “Enquanto o petróleo é cada vez mais escasso

e o maior responsável pela emissão de gases de efeito estufa, o etanol é renovável (e,

portanto, infinito) reduzindo fortemente as emissões em relação à gasolina” (JANK,

2010, s.p.).

No Brasil, há um crescente envolvimento de empresas transnacionais com o

setor do agronegócio dos agrocombustíveis, tanto que em 2007 a participação

do capital estrangeiro no agronegócio dos agrocombustíveis representava

apenas 7% e, em 2010 este percentual chegou a 22%. A previsão é de que

chegue a 40% nos próximos anos. (JANK, 2010, s.p.).

Deste modo, o setor sucroenergético se enaltece por produzir um combustível

com potencial de reduzir a emissão de CO², o etanol. Portanto, devido a pressões,

econômicas e políticas, este setor, ao perceber que maquiar a realidade e negar as

críticas seria algo que colocaria em risco suas atividades, busca maneiras de promover o

desenvolvimento sustentável por meio da expansão territorial do setor sucroenergético

que ganha ares de espetáculo em relação à criação e difusão de fontes energéticas

alternativas e a consequente implantação de políticas públicas de desenvolvimento do

campo relacionadas com os agrocombustíveis, considerando a possibilidade de

transição para o desenvolvimento sustentável por meio da expansão de uma nova matriz

energética que visa o solo, e não o subsolo como base de combustíveis renováveis.

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2.2. O desenvolvimento territorial rural sustentável como objetivo para a

estruturação do Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas no Estado de

São Paulo

A leitura dos documentos do Grupo BM apresentadas no capítulo 1 revelou,

em termos gerais, que o Grupo BM postula a necessidade de um olhar ampliado sobre o

rural, não restrito à agricultura, estimulando o envolvimento do público beneficiário na

promoção do desenvolvimento sustentável e da perspectiva territorial como delimitação

para execução de projetos legando a prática agropecuária a grandes produtores, como,

por exemplo, no caso do setor sucroenergético.

Disto, consideramos que a partir da década de 1990, impulsionado pelas

recomendações do Grupo BM, o movimento de discussão sobre quais seriam os

modelos mais adequados para o desenvolvimento do campo surge em distintas

perspectivas. Graziano da Silva (1998), Navarro (2001) e Veiga (2002), dentre outros,

tomam posicionamento defendendo que o novo rural, no Brasil, poderia ser trabalhado a

partir de experiências como a Política Agrícola Comum (PAC) implementada na União

Europeia que trouxe em seu bojo o Programa LEADER46

e atende as especificações do

Grupo BM, sobretudo, no que diz respeito à multifuncionalidade, ao desenvolvimento

sustentável e a perspectiva territorial (SARACENO, 1996; SEGRELLES-SERRANO,

2010).

O governo do Estado de São Paulo, indo ao encontro das tendências territorial

e sustentável executou, entre 2000 e 2008, o PEMH. Esta política pública teve como

objetivo efetuar ações que possibilitassem o desenvolvimento territorial rural

sustentável por meio da recuperação de recursos naturais, sobretudo solo e água, do

reflorestamento de áreas de voçoroca e de recuperação de áreas de preservação

permanente (SÃO PAULO, CATI, 2000a) e, aparentemente, ignorando a

conflitualidade dos distintos interesses entre os produtores rurais.

Nesta perspectiva a SAA inseriu o desenvolvimento sustentável nos trabalhos

da CATI e, especificamente, no PEMH (FONTES, 2008). Consideramos que este fato

46

Apesar de termos realizado estágio de doutorado na Espanha, especificamente com o fim de

conhecermos esta política pública e as influências externas sobre a elaboração e implementação da

mesma, e sua proposta de multifuncionalidade, também defendida pela ONU (ONU, CMMAD, 1992) e

que se articula com o desenvolvimento sustentável, por não estarmos realizando uma análise comparativa

acreditamos ser mais prudente evitarmos maiores comentários para não perdermos a coerência necessária

em relação aos nossos objetivos. Sobre os resultados do estágio, que incluíram a análise dos resultados do

Programa LEADER, consultar Whitacker (2016). Sobre as relações entre a PAC, desenvolvimento

sustentável e a influência de organizações externas, consultar Segrelles Serrano (2007 2010).

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indica uma tentativa de ressignificação de atividades tradicionalmente rurais a partir da

introdução de elementos de ordem natural e social, não setorializados, que sugerem

dinâmicas complexas e conflitivas para o estabelecimento de novas categorias de

interpretação e intervenção rural, estimulado por pesquisadores em consonância com os

ditames internacionais, como Abramovay (2000; 2001; 2004), Veiga (2002; 2005) e

Navarro (2001; 2008), sobre as novas ruralidades, na qual problemas relativos ao campo

brasileiro seriam suprimidos com a inserção dos pequenos produtores rurais na esfera da

produção e circulação de mercadorias, suprimindo a questão da reforma agrária e

demais conflitos territoriais.

O histórico do PEMH no estado de São Paulo revela que o pedido de

empréstimo foi submetido à avaliação do Grupo BM em 1992, porém, o acordo

esbarrou na existência de dívidas por parte do estado de São Paulo junto à União,

impedindo sua assinatura. Com a rolagem das dívidas, o estado passou a ter capacidade

para endividamento e abriu-se novamente a possibilidade de negociação junto ao Grupo

BM (SÃO PAULO, CATI, 2000a; 2000b).

Oficialmente, o PEMH possui como marco inicial no Estado de São Paulo o

Decreto N° 27.329 de 3 de setembro de 1987 que o instituiu e delimitou a microbacia

como unidade de planejamento e intervenção do estado de São Paulo. Deste modo,

mudanças estruturais foram implementadas na SAA como a responsabilização do estado

pela conservação do solo (SÃO PAULO, CATI, 2009). Inicialmente o programa foi

executado com recursos do governo, entre os anos de 1987 e 1999, e as suas ações se

restringiram à conservação dos solos por meio da construção de terraços e a adequação

de estradas rurais. Tais ações foram realizadas pela Companhia de Desenvolvimento

Agrícola do Estado de São Paulo (CODASP).

Durante este período, a CATI, solicitou recursos junto ao Grupo BM e, após

cinco anos de tramitação foi aprovado o crédito para implementação do programa entre

2000 e 2006 (HESPANHOL, 2008). A busca de recursos externos para financiamento

conta com a Lei Nº 8.331, de 1º de julho de 1993, que autoriza o estado a contrair

financiamento junto ao Grupo BM e determina que o produto da operação de crédito

seja obrigatoriamente aplicado na execução do PEMH.

A CATI estabeleceu como metas abranger 4,5 milhões de hectares, executar

1.500 projetos de microbacias e atender 90.000 produtores rurais (30 por

cento do total do estado) entre os anos de 2000 e 2006, período de vigência

do financiamento concedido pelo BIRD. O orçamento do programa para o

referido período foi de US$ 124.740.200,00, dos quais US$ 69.392.000,00

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foram financiados pelo BIRD e US$ 55.392.000,00 se constituíram

contrapartida do governo estadual (HESPANHOL, 2008, p. 05).

A época do pedido de financiamento, a estratégia de financiamento do Grupo

BM para o Brasil rural tinha como principais componentes:

reformas estruturais para consolidar a estabilidade e impulsionar o crescimento

dirigido pelo setor privado;

alívio da pobreza, inclusive rural;

expansão da infraestrutura;

promoção do desenvolvimento sustentável (WORLD BANK, 2009).

Com estas linhas definidas para o Brasil, e com as diretrizes já desenhadas para

a atuação desta agência financiadora internacional no setor rural, a abertura para

negociação do PEMH entre a CATI e o Grupo BM era relativamente limitada, se

restringindo à adaptação de um modelo para as condições locais.

Ainda em relação ao histórico do PEMH no estado de São Paulo, além da

influência indireta exercida pelo Programa LEADER em sua estruturação, não no

sentido de transferência de política pública, mas no que se refere à questão de ações em

relação a recursos naturais e abordagem territorial, com caráter multifuncional

(HESPANHOL, 2005), identificamos, também, políticas das décadas de 1930, 1960,

1970 e 198047

(NEVES NETO, 2009).

O programa, antes de ser implementado no Estado de São Paulo, foi elaborado

com base nos resultados de políticas públicas implementadas no Estado do Paraná e,

posteriormente, em Santa Catarina (HESPANHOL, 2008). No Paraná, a experiência

neste tipo de política pública recebeu o nome de Paraná Rural sendo executado a partir

de 1986. Este programa possuía caráter conservacionista e também produtivista,

levando em consideração a difusão de tecnologias apropriadas às necessidades locais

(FLEISCHFRESSER, 1999).

No Paraná, data de 1986 uma das primeiras tentativas de implementar

programas de desenvolvimento regional, com base em bacia hidrográfica. A

Proposta de Desenvolvimento Integrado da Bacia do Rio Ivaí foi elaborada

47

Como o Código das Águas; a criação do Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica; o

estabelecimento da Coordenadoria dos Estudos Integrados de Bacias Hidrográficas e a delimitação das

microbacias hidrográficas como unidade de planejamento em políticas públicas voltadas ao campo

(NEVES NETO, 2009).

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pelo governo do Estado do Paraná, em julho de 1986, durante o Seminário

Técnico sobre Elementos de Estratégias e de Programação do

Desenvolvimento Regional, promovido pela Sudesul. Esse projeto, todavia,

não foi realizado "[...] em função de restrições técnicas e financeiras".

Apenas foi implementado, na parte do Baixo Ivaí, um projeto de irrigação.

Em 1991, o governo do Paraná negociou com o Banco Internacional para a

Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) o Programa de Saneamento

Ambiental da Região Metropolitana de Curitiba (Prosan), que tem por

objetivo a resolução dos problemas ambientais dos municípios que

circundam a capital do Estado, "[...] com ênfase naqueles que se articulam a

partir da interseção entre o processo de urbanização e a dinâmica dos

recursos hídricos da Bacia do Rio Iguaçu" (FLEISCHEFREEZER, 1999, P.

8).

Em Santa Catarina, visto que o estado já possuía uma forte característica de

trabalhar com políticas públicas descentralizadoras, como, por exemplo, o Programa

Estadual de Conservação de Solos (1965 – 1970) e o Programa de Conservação e Uso

da Água e do Solo (1979 – 1983) a implementação de um projeto com as características

do que aqui estamos apresentando foi mais fácil e o programa recebeu o nome de

Microbacias (SABANÉS, 2002).

No Estado existe uma antiga e consolidada tradição de ações dirigidas à

conservação dos solos; Em 1957, começaram as primeiras ações de

conservação dos recursos naturais através da constituição dos primeiros

escritórios locais do recém formado serviço estadual de extensão rural (então

chamado de Acaresc), que desenvolveu a implantação de práticas mecânicas

de manejo de solos, especialmente terraceamentos. Entre 1965 e 1970,

implementou-se o Programa Estadual de Conservação de Solos que, pela

primeira vez, um conjunto mais amplo de práticas conservacionistas para os

estabelecimentos rurais. Tais práticas posteriormente foram ampliadas, entre

1979 e 1983, com o Programa de Conservação e Uso da Água e do Solo,

iniciado em 1986 e que, pela primeira vez, implementou a ação operacional

do programa através das microbacias hidrográficas como o lócus privilegiado

de ação (SABANÉS, 2002, p. 103).

Cabe a observação que ambos os projetos, no Paraná e Santa Catarina,

contaram com apoio do Grupo BM que somam, em conjunto, o total de U$$

93.000.000,00 (WORLD BANK, 2009) e, por conta do considerável êxito, por parte do

Grupo BM, destes programas a nível estadual, durante a presidência de José Sarney

(1985 – 1990), houve o lançamento do Programa Nacional de Microbacias

Hidrográficas (PNMH – BRASIL, 1987) com a implementação de projetos pilotos em

todos os estados da federação. Este programa sucedeu o Programa Nacional de

Conservação de Solos, instituído em 1975 que apresentou resultados pouco expressivos

e com curta duração, de 1987 a 2000.

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A meta do PNMH era atuar em 4.000 microbacias hidrográficas em todo o país

(uma por município), equipar 26 bacias piloto (uma por estado), treinar 1000 técnicos

anualmente e equipar 1000 oficinas locais de serviços de extensão e planificação de

microbacias (BRASIL, 1987). A falta de recursos humanos e financeiros, sobretudo dos

estados e municípios, comprometeu a sua continuidade e suas ações foram

interrompidas durante o governo de Fernando Collor de Melo, em 1990, por conta da

extinção da Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMBRATER)

e da consequente desativação da extensão rural em âmbito nacional (HESPANHOL,

2005).

No estado de São Paulo, o programa teve como premissa e objetivos

proporcionar aos proprietários rurais condições para que se estabeleça o

desenvolvimento sustentável (SÃO PAULO, CATI, 2009). Isto porque a própria SAA

reconheceu que:

O processo de modernização da agricultura brasileira tomou grande impulso

a partir da década de 60. Ao lado dos inegáveis aumentos na produção e

produtividade gerados por esse processo, surgiram graves problemas sociais e

ambientais. Esse desenvolvimento, caracterizado pela elevada utilização de

insumos químicos e tração motomecanizada, causou um intenso processo de

erosão e contaminação química das terras, dos produtos e das pessoas,

diminuindo a cobertura florestal e degradando os recursos hídricos. [...] No

Estado de São Paulo, além dos aspectos acima citados, a agricultura

apresentou profundas transformações no seu desenvolvimento após 1970,

fruto do processo de urbanização, associado à abertura da economia nacional

para o mercado exterior, à implementação de um complexo agroindustrial de

transformação e insumos e a uma indústria de máquinas e equipamentos

agrícolas, que viabilizaram ampla diversificação agropecuária, visando

atender à crescente demanda interna e externa. Essas demandas foram

fortemente induzidas por políticas agrícolas que subsidiaram

substancialmente a utilização de insumos químicos e maquinaria agrícola,

através da ampla oferta de créditos subsidiado na década de 70 (CATI, 2005,

p. 1).

Esta citação demonstra uma falta de observação em relação à questão da

recuperação de recursos naturais que, considerando a realidade da devastação ocorrida

no estado de São Paulo, principalmente em relação ao interior do Oeste paulista, foi

muito grave, sobretudo no que diz respeito à supressão de cobertura vegetal e

consequente impacto sobre os recursos hídricos ocasionados por processos de

lixiviação, conforme descreveram muito bem Abreu (1972), Monbeig (1984,) e Leite

(1985; 1999). Em relação ao Oeste do Estado de São Paulo, o documento acrescenta:

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Predominantemente, as regiões do Oeste de São Paulo são aquelas mais

prejudicadas na comparação de rendimento, uma vez que enfrentam

restrições maiores, especialmente decorrentes dos problemas causados por

erosão e perda de fertilidade, advindos das características dos solos, na sua

maioria podzolizados e do uso agrícola no sentido de manejo inadequado dos

recursos naturais, este último generalizado no Estado com efeitos

indesejados, sendo maiores nessas regiões (SÃO PAULO, CATI, 2005, p. 2).

Deste modo, o PEMH baseia-se nas premissas do desenvolvimento sustentável

elaboradas no relatório Os Limites do Crescimento (MEADOWS, et al, 1972), e

difundidos a partir das considerações do documento Nosso Futuro Comum (ONU,

CMMAD, 1988) considerando:

[...] a necessidade de viabilização de um modelo de produção agrícola que

apresente produtividade compatível com a segurança alimentar, que seja

economicamente viável, que não agrida o meio ambiente e que aperfeiçoe as

formas de organização social no campo para que os agricultores participem

ativamente da vida social e política das comunidades. Esse modelo constitui

o que chamamos “agricultura sustentável” (SÃO PAULO, 1997, p. 2, aspas

no original).

Por esses motivos o Estado de São Paulo, por meio da SAA, justificou a

implementação do PEMH, visto que este possuía como objetivo reverter o quadro de

degradação através de ações voltadas ao manejo adequado de recursos naturais, “[...]

especialmente solo e água [...]” (SÃO PAULO, CATI, 2009, p. 11) o que,

convencionou-se chamar de práticas de agricultura sustentável, porém, sem maiores

preocupações em relação à definição e abrangência deste termo e seu uso em políticas

públicas passa a ser relacionado com as recomendações do Grupo BM, tais como a

descentralização das ações, atribuindo aos beneficiários das mesmas às

responsabilidades e atribuições em sua elaboração, operacionalização e implementação

(NAVARRO, 2001). Para atingir os objetivos propostos, o PEMH foi implementado

para que os produtores rurais adotassem práticas conservacionistas com a liberação de

subvenções econômicas, amparado pela Lei 11.970/05 (Lei de uso do solo), para a

aquisição de implementos agrícolas e de recursos para construção e difusão de

conhecimento dos sistemas de produção que privilegiam o desenvolvimento rural

sustentável, acreditando que:

Quando se dedicam esforços em busca da sustentabilidade através de ações

locais, no caso uma microbacia hidrográfica, os resultados são mais rápidos e

evidentes, pois há maior visualização dos problemas e participação da

comunidade e do município na solução e equacionamento das questões

ambientais (BRAGAGNOLO e PAN, 2001, p. 184).

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O PEMH, inicialmente, estava planejado para ser implementado no período de

2000 a 2006, porém, foi prorrogado por mais 2 anos e finalizado em novembro de 2008,

sendo que, em novembro de 2007, encerrou-se o financiamento do Grupo BM.

A CATI, nos primeiros anos de vigência do financiamento concedido pelo

BIRD, ainda não havia adaptado a sua cultura institucional para gerir um

programa desta envergadura e com tais características, o que retardou a

execução das ações do programa. A excessiva burocracia exigida pela própria

natureza do programa também comprometeu a sua implantação.

(HESPANHOL, 2008, p. 9).

A implementação desta política no Estado de São Paulo acarretou em debate

entre órgãos do governo e representantes da sociedade civil a respeito da questão da

recuperação dos recursos naturais no campo pelo reconhecimento dos danos causados

por conta de políticas que estimularam o setor à adoção de pacotes tecnológicos e

planos desenvolvimentistas sem maiores preocupações em relação aos seus impactos e,

ainda, em relação ao desenvolvimento desigual que, economicamente, desfavoreceu

parcelas consideráveis da população rural.

Concordando com esta capacidade da política pública, Abramovay (2004)

assevera a importância do mesmo para os segmentos mais pobres. “Este debate

estimulou uma significativa discussão a respeito do modelo tecnológico utilizado,

emprestando maior força política ao discurso da sustentabilidade” (SABANÉS, 2002, p.

70). Segundo o órgão executor do programa (SÃO PAULO, CATI, 2000a, s.p.):

O Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas, implantado no Estado de

São Paulo em 2000, com financiamento parcial do Banco Mundial, tem por

objetivo programar ações efetivas que resultem em melhor qualidade de vida

no meio rural, por meio da ampliação das oportunidades de ocupação,

melhoria dos níveis de renda, maior produtividade geral das unidades de

produção, redução dos custos e uma reorientação técnico-agronômica,

visando o aumento do bem-estar das populações rurais, seja pela implantação

de sistemas de produção agropecuária que garantam a sustentabilidade, como

a recuperação das áreas degradadas e preservação permanente, bem como a

melhoria na qualidade e a quantidade das águas, com plena participação e

envolvimento dos beneficiários (produtores amparados pelo projeto) e da

sociedade (SÃO PAULO, CATI, 2000a, s.p.).

Dessa forma, para Abramovay (2004), o PEMH se destaca como política

pública inovadora pela “[...] virtude de se apoiar numa forma de governança

descentralizada que barateia seus custos e aumenta suas chances de sucesso”

(ABRAMOVAY, 2004, p. 2), ainda de acordo com o autor citado, as vantagens do

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PEMH seria a inovação nos métodos de trabalho agronômico incorporando o cuidado

em relação aos recursos naturais e a participação dos beneficiários visando a integração

das condições para o desenvolvimento sustentável, na perspectiva de Sachs (2005).

Portanto, consideramos que o PEMH foi baseado numa estratégia de

desenvolvimento territorial rural sustentável, buscando parceria e mobilizando os

agentes locais na promoção do mesmo, com o anseio de valorizar os aspectos culturais,

econômicos e naturais dos territórios e procurando diversificar as atividades econômicas

locais, via propostas de desenvolvimento endógeno. Este fato revela a confiança da

CATI na perícia técnica que envolve o Grupo BM no que tange ao desenvolvimento

sustentável, pois esta perspectiva se apresentava coerente para a CATI em vários

aspectos, inclusive porque correspondia ao momento político que o Brasil vivenciava na

época48

. Sobre este aspecto, Fontes (2008) escreveu que a questão da participação dos

produtores rurais era fundamental, pois viria garantir princípios democráticos como

participação e transparência (FONTES, 2008), aspectos tão difundidos e defendidos no

período relativo à descentralização de políticas públicas não somente pela sociedade,

mas também pelo Grupo BM, como escrevemos no item 1.2.

Assim o desenvolvimento sustentável, proposto pelo PEMH, se alinhava aos

modelos de desenvolvimento territorial rural sustentável que vinham sendo discutidos

no âmbito acadêmico e nas agências internacionais de cooperação e fomento e era

inserido aos objetivos de atuação do Grupo BM no estado de São Paulo, sendo

considerado operacionável por meio de intervenções técnicas (SÃO PAULO, CATI,

2005) onde o território aparece em programas oficiais como delimitação física, no qual

se torna possível reunir os interesses da comunidade em torno da microbacia

hidrográfica, possibilitando o monitoramento e aproveitamento racional do uso dos

recursos naturais mitigando os impactos negativos em relação aos mesmos.

Dessa forma, “[...] os temas de natureza passam a ser encarados não como

restrição, mas como oportunidade para a melhoria das condições de vida dos

agricultores” (ABRAMOVAY, 2004, p.3) e, nesta perspectiva, consideramos que o

território e os recursos naturais passam a ser importantes economicamente, sob o ponto

de vista de reunir as vantagens locacionais (identidades, cultura, aprendizagens,

cooperação, recursos naturais e patrimoniais), que podem ser aproveitadas para

48

No Brasil, o declínio das ditaduras militares acende a discussão acerca da redemocratização do país.

Participação e descentralização surgem como estratégias – ao menos discursivas - para a construção

democrática e conferem legitimidade a um complexo processo de reorganização política.

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dinamizar economicamente determinada região, que nos permite considerar que tal

proposta de desenvolvimento possa ser estendida, simultaneamente, para distintos

territórios, desde que eles se organizem social e institucionalmente para isso.

Em relação à execução do PEMH, este programa foi fisicamente executado em

um território delimitado a partir das normas da SAA (SÃO PAULO, CATI, 2001). Cada

microbacia teve seu próprio projeto, baseado em suas características socioeconômicas e

naturais, sendo sempre norteado pelos objetivos e definições próprias. Esta política

pública foi composta por instrumentos voltados a implementação de ações a começar

pelo Plano Global da Microbacia, constituído de seu Projeto Técnico e de seu Plano

Anual de Trabalho para o primeiro ano (NEVES NETO, 2011). Esse Plano Global teve

que ser elaborado de forma participativa, com base no diagnóstico socioeconômico e

nas condições dos recursos naturais da microbacia e, conter as ações propostas para a

solução dos problemas que dificultam o desenvolvimento da comunidade e que

provocam a degradação dos recursos naturais (RASCHIATORI e MOREIRA, 2006).

Apesar de apresentar alguma limitação em relação ao caráter pontual de suas

ações esta política pública, após a municipalização da agricultura pelo governo Estadual

em 1990 foi a única direcionada à assistência aos pequenos produtores rurais a receber

verbas destinadas a ações voltadas à preservação dos recursos naturais, daí, a referida

importância de sua efetivação e atenção de pesquisadores anteriores (HESPANHOL,

2005, 2008).

Destas informações sobre o PEMH no estado de São Paulo, passamos ao

exemplo de estudo de caso específico visando demonstrar a materialidade das ações em

prol do desenvolvimento territorial rural sustentável, na perspectiva trabalhada a partir

das recomendações do Grupo BM. Neste sentido, a organização das informações aqui

apresentadas visa estabelecer a estratificação dos ambientes naturais, procurando

correlacioná-los com as atividades produtivas neles desenvolvidas.

O PEMH foi iniciado oficialmente em Presidente Prudente em 2005

(MACIEL, 2005) e ofereceu benefícios individuais e coletivos49

aos produtores rurais

que possuíam propriedades com até 50 hectares e, no mínimo 70% de sua renda

proveniente das atividades agropecuárias (SÃO PAULO, CATI, 2001).

49

Individuais – aquisição de sementes para adubação verde; compra de materiais para a edificação de

cercas para a proteção de APP e controle de voçorocas; fornecimento de calcário e de sistemas de divisão

de pastagens; pagamento de mão-de-obra para o cercamento de mananciais; fossas sépticas biodigestoras

– coletivos – abastecedouros comunitários, máquina de plantio direto, escarificador, distribuidor de

calcário, triturador de palha, roçadeira e subsolador (NEVES NETO, 2009).

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Para amenizar a situação de degradação natural e fortalecer práticas como o

associativismo rural e o desenvolvimento territorial rural sustentável em Presidente

Prudente, o programa ofereceu mudas para o plantio de mata ciliar; cercas para o

isolamento das Áreas de Proteção Permanente; máquina de plantio direto; estimulou a

prática do terraceamento e buscou fortalecer e estimular a organização dos produtores

em associações, doando kit de informática, semeadora de plantio direto, roçadeira e

triturador de palha para estas associações de produtores rurais (SÃO PAULO, CATI,

2005). Sua operacionalização foi decidida a partir da priorização de regiões no Estado

de São Paulo pela CATI. Na figura 2 são indicadas as regiões que representam maior

suscetibilidade à erosão de acordo com o estudo do Instituto de Pesquisas Tecnológicas

da Universidade de São Paulo (IPT, 1986).

Figura 2: Níveis de suscetibilidade à erosão por área de abrangência dos Escritórios de Desenvolvimento

Rural do Estado de São Paulo

Fonte: extraído de FONTES, 2008.

Segundo o órgão executor do programa, CATI, entende-se por suscetibilidade à

erosão “[...] a predisposição do solo, devido a suas características próprias, em sofrer,

em maior ou menor intensidade, processo erosivo” (SÃO PAULO, CATI, 2005, p. 7).

Neste sentido, podemos localizar na figura 2 o Escritório de Desenvolvimento Rural

(EDR) de Presidente Prudente e sua abrangência, que, segundo os critérios de

priorização, localiza-se em área de alta suscetibilidade a erosão. Outro critério

estabelecido para a implementação do programa é o nível de indigência que “[...]

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caracteriza a pobreza familiar, traduzida na falta de emprego, fome e miséria (renda

menor que 2 salários mínimos/família/mês)” (SÃO PAULO, CATI, 2005, p. 7). Este

critério esta demonstrado na figura 3, que demonstra as regiões consideradas, de acordo

com o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA, 1993), como de menor

renda no Estado de São Paulo.

Figura 3: Níveis de indigência por região de abrangência dos Escritórios de Desenvolvimento Rural no

Estado de São Paulo

Fonte: extraído de FONTES, 2008.

Sob estes aspectos, a política pública aqui estudada – PEMH – propôs reverter

o quadro de degradação de recursos naturais e pobreza no espaço rural em que se

encontra grande parte das propriedades rurais no Estado de São Paulo, sobretudo, na

região do EDR de Presidente Prudente, indo assim, ao encontro das recomendações do

Grupo BM e as perspectivas analíticas de Navarro (2001) e Abramovay (2004), se

sobrepormos as figuras 2 e 3 podemos notar que o município de Presidente Prudente-SP

encontra-se dentro dos dois parâmetros apresentados pela CATI para a execução do

PEMH – suscetibilidade de erosão e níveis de indigência.

Visualizamos na figura 4, as regiões definidas como prioritárias pela SAA e

pela CATI, tendo por base os estudos anteriores do IPT (1986) e IPEA (1993) que

definiram municípios prioritários para o recebimento de verbas para a execução do

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PEMH tendo em vista a execução de melhorias para reverter os quadros identificados de

degradação natural e pobreza por meio do desenvolvimento territorial rural sustentável.

Figura 4: Regiões prioritárias para a execução do Programa Estadual de Microbacias Hidrográfica no

Estado de São Paulo.

Fonte: extraído de FONTES, 2008.

Definidos e esclarecidos os critérios que remeteram a implementação do

PEMH no estado de São Paulo, identificamos, na região prioritária em relação aos

índices de indigência e suscetibilidade a erosão, o Pontal do Paranapanema, no sudoeste

do Estado de São Paulo tendo como delimitadores bem definidos ao sul o Rio

Paranapanema e a oeste o Rio Paraná, na qual está localizado o município de Presidente

Prudente50

que está situado no planalto sedimentar paulista, apresentando uma paisagem

monótona, marcada por relevo de colinas amplas (LEITE, 1972). Os seus limites

político-administrativos são: ao norte, os Municípios de Flora Rica e Flórida Paulista;

ao sul, Pirapozinho e Regente Feijó; a leste, Caiabú e Mariápolis; e, a oeste, Alfredo

Marcondes, Álvares Machado e Santo Expedito. Além da sede municipal, abrange

quatro distritos na porção norte: Ameliópolis, Floresta do Sul, Montalvão e Eneida. No

50

Sobre o processo de formação do município e os impactos recorrentes, consultar, principalmente,

Abreu (1972), Monbeig (1982) e Leite (1985; 1999).

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mapa 2 apresentamos a localização de Presidente Prudente, seu limite municipal e os

distritos.

Mapa 2: Município de Presidente Prudente e localização de seus distritos

Fonte: FUSHIMI; NUNES. 2014.

Para um melhor detalhamento51

da área de execução desta política pública, as

informações apresentadas estão organizadas de acordo com os principais problemas

relacionados pelos técnicos e produtores rurais envolvidos no planejamento e execução

do PEMH e nas informações produzidas em nosso trabalho de campo realizado na área

de estudo localizada ao norte do município de Presidente Prudente entre os distritos de

51

Este detalhamento foi realizado confrontando as informações do Plano de Manejo da microbacia

(MACIEL, 2005), com a pesquisa realizada in loco.

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Montalvão e Floresta do Sul. Integra a bacia hidrográfica do Rio Aguapeí – Peixe e

possui área de 1.936,8 ha (MACIEL, 2005). Destas informações, no item seguinte,

apresentaremos as condições anteriores e posteriores a implementação do PEMH nesta

área tendo em vistas demonstrar as alterações e resultados obtidos com a execução desta

política pública.

2.3. A microbacia do Córrego da Onça II: características anteriores e posteriores a

execução do Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas

Sem a pretensão de realizar uma análise crítica neste momento sobre os

resultados do PEMH neste momento, demonstrarmos neste subitem as características

anteriores e posteriores52

à execução do PEMH. Esta será realizada com base,

principalmente, nas informações produzidas durante o trabalho de campo e

reconhecimento em documentos da CATI sobre os principais problemas, causas e

atividades previstas para o planejamento e execução do PEMH, sendo expostas as

atividades previstas e executadas na microbacia com a finalidade de realizar uma

interpretação descritiva53

que nos permita, posteriormente, a interpretação analítica e

crítica54

.De início, esclarecemos que tendo em vista estabelecer critérios para a

concessão dos benefícios, a CATI realizou o levantamento fundiário da microbacia do

córrego da Onça II que se apresenta de acordo com o quadro 1.

Quadro 1: Estrutura fundiária da microbacia hidrográfica do córrego da Onça II

Estratificação Propriedades Área

N.º % ha %

ATÉ 10 ha 28 35,5 161,3 8,3

10 50 41 51,9 882,8 45,6

50 100 08 10,1 595,1 30,7

100 200 02 2,5 297,6 15,4

TOTAL 79 100 1.936,8 100

Fonte: MACIEL (2005)

Organizador: Guilherme Magon Whitacker, 2016

52

No momento de apresentar as características posteriores a implementação do PEMH, algumas opiniões

expressam a volta as condições anteriores, porém, entendemos que este fato não altera os resultados

esperados, tendo em vista que complementam as informações expostas com base na documentação da

CATI sobre as condições anteriores. 53

Para uma completa análise descritiva do PEMH, indicamos, por exemplo, a leitura dos manuais

operacionais da CATI (2000, 2001 e 2005) e os trabalhos de Neves Neto (2009, 2011), dentre outros. 54

Apresentada no capítulo 5, item 5.3 da parte III desta pesquisa.

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Deste modo, os técnicos do escritório regional da CATI de Presidente

Prudente, responsáveis pela execução desta política pública, seguindo as orientações da

SAA, estipularam que poderiam participar do PEMH, proprietários rurais que

possuíssem propriedades com área inferior a 200 ha. Esta classificação considerou que

grandes proprietários, com área superior a 200 ha segundo a classificação da CATI

(2005), teriam condições próprias para realizar as melhorias, não dependendo,

exclusivamente, de ações do Estado (MACIEL, 2005).

Portanto, das 79 propriedades rurais que constavam no cadastro do plano de

manejo integrado da microbacia hidrográfica do Córrego da Onça II55

(MACIEL, 2005),

67 foram beneficiadas com as ações do PEMH e 12 não, por que seus proprietários não

apresentaram o Projeto Individual da Propriedade56

(PIP), deste modo, não tiveram

condições de acompanhamento das reuniões de elaboração para a execução do PEMH

(Agricultor camponês entrevistado, trabalho de campo, abril de 2015).

Segundo Maciel (2005) as condições da microbacia do Córrego da Onça II, em

relação aos recursos naturais, sociais e econômicos, apresentavam uma série de

problemas quando da elaboração de seu plano de manejo, esta situação fez com que o

governo do estado de São Paulo, por meio da SAA, justificasse a implementação desta

política pública, visto que a mesma possuía como objetivo reverter às situações

identificadas como inadequadas ao desenvolvimento territorial rural sustentável (SÃO

PAULO, CATI, 2009).

A época da execução do PEMH em Presidente Prudente-SP (2005 – 2008), a

análise da microbacia hidrográfica do Córrego da Onça II trouxe à tona aspectos que

foram considerados como fatores limitantes para a implementação de projetos voltados

para o desenvolvimento territorial rural sustentável – PEMH – daquela área em sua

totalidade (SÃO PAULO, CATI, 2005), conforme exposto no quadro 2 elaborado a

partir do plano de manejo da microbacia do Córrego da Onça II.

55

De acordo com técnico extensionista da CATI, a microbacia do Córrego da Onça possui área maior do

que a aqui apresentada, por critérios da CATI, esta microbacia foi desmembrada, ficando uma área a

direita da rodovia Raimundo Maiolini, e, a que estudamos, a margem esquerda. Daí a denominação de

Córrego da Onça II. 56

Para o acesso a benefícios individuais do PEMH, para cada propriedade rural localizada na microbacia

selecionada, foi elaborado um Projeto Individual da Propriedade – PIP, com a indicação da necessidade

da adoção da prática solicitada. Este projeto, elaborado juntamente com o técnico executor, deveria conter

informações sobre o sistema produtivo da propriedade, as condições socioeconômicas do produtor e

propostas técnicas de preservação de recursos naturais (SÃO PAULO, CATI, 2005).

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Quadro 2 – Identificação dos problemas, causas e atividades previstas na microbacia hidrográfica do

Córrego da Onça II

PROBLEMAS CAUSAS ATIVIDADES/AÇÕES

1 – Degradação Ambiental

1.1. Solo erodido

e degradado

Prática de conservação

inadequada por

desconhecimento do

produtor rural.

Capacitação dos produtores rurais; correção de

terraceamento dentro da técnica; controle correto

de voçorocas; capacitação do produtor em plantio

direto; cessão de uma máquina de plantio direto.

1.2. Poluição do

córrego

Esgoto da Penitenciária,

Parque dos Pinheiros,

Novo Mundo e Bairro

Montalvão.

Conscientização da população dos Bairros;

conscientização dos responsáveis da área da

Prefeitura e da SABESP; gestão junto aos órgãos

competentes para tratamento de esgoto.

1.3. Ausência de

mata ciliar,

infringindo a

Legislação.

Desconhecimento da

Legislação. Despesa

extra sem retorno

financeiro direto ao

produtor rural.

Conscientização dos produtores; plantio de mudas

pelo programa; construção de 40 Km de cercas de

proteção; capacitação do monitor ambiental; ações

de educação ambiental do monitor ambiental.

1.4. Estradas

com dificuldade

de trânsito.

Desconhecimento e

inexistência de sistema

de drenagem superficial

de técnicas alternativas.

Práticas

conservacionistas

erradas.

Conscientização dos produtores e responsáveis

pelas estradas das Prefeituras Municipais;

capacitação dos responsáveis pela estrada da

Prefeitura Municipal e produtores rurais das áreas

adjacentes à estrada; elaboração de projeto técnico

de adequação de estradas; adequação do trecho de

estradas selecionadas.

2 – Atividade econômica - Pecuária

2.1. Pastagem

degradada

Desconhecimento de

calagem, adubação e

manejo de pastagem.

Conscientização dos produtores; aquisição de

distribuidor de calcário; calagem, adubação e

manejo realizado tecnicamente.

2.2. Plantel de

baixo padrão

genético

Desconhecimento da

prática de

melhoramento do

plantel. Custo alto para

aquisição de

reprodutores.

Capacitação sobre melhoramento genético;

introdução de reprodutores de qualidade;

capacitação sobre Inseminação Artificial.

3 – Infra-estrutura

3.1.

Comunicação

deficiente do

produtor

Falta de telefone Gestão junto á Cia Telefônica para instalação de 8

Km de linha.

3.2. Dificuldade

de travessia nos

córregos

Falta ponte Gestão junto aos órgãos competentes para

construção de 2 pontes na estrada dos Bairros 1º de

Maio (vão de 15m) e Timburi (vão de 20m).

3.3. Problemas

trabalhistas

(Bóia fria)

Falta de conhecimento

sobre Legislação

Trabalhista.

Capacitação dos produtores sobre Legislação

Trabalhista; gestão junto aos Sindicatos dos

Trabalhadores Rurais e Prefeitura Municipal para

instalação da Casa do Produtor Rural no Bairro.

Fonte: Maciel (2005)

Organização: Guilherme Magon Whitacker (2016)

Destas definições, e após reuniões com os proprietários e técnicos da CATI

responsáveis pela execução da política pública, teve início à execução do PEMH em

março de 2005. Apresentaremos a seguir as condições anteriores à realização do PEMH

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na microbacia do Córrego da Onça II57

seguindo a ordem estabelecida no quadro 2 para

melhor interpretação. Com base nos dados e informações expostos no quadro 2, foram

sistematizadas as informações e os técnicos executores e produtores rurais chegaram a

conclusões sobre as atividades a serem realizadas, os critérios para execução das ações

previstas foram definidos após a avaliação dos PIP (Agricultor camponês entrevistado,

trabalho de campo, abril de 2015).

Em relação à degradação de recursos naturais (item 1), a questão da erosão

(subitem 1.1) foi considerada como resultante da descapitalização e desinformação dos

produtores rurais a respeito de práticas de manejo (MACIEL, 2005).

Verificou-se durante a reunião com os produtores da MBH a preocupação

com as baixas produtividades nas culturas anuais como a batata-doce, o

milho e a melancia, justificando o fato principalmente pela sua

descapitalização, o que impede investimentos na melhoria da tecnologia de

produção, conservação do solo e adubação. O desgaste do solo ao longo dos

anos teve como consequência o aumento dos processos erosivos e a redução

de matéria orgânica (MACIEL, 2005, p. 20).

A respeito deste item, na microbacia, a característica física natural do solo, que,

segundo a CATI (2005), conforme o quadro 3, apresenta textura arenosa, solo raso, com

baixa fertilidade e suscetível à erosão dificultava a produtividade. Estes fatos, aliados ao

processo histórico de ocupação desta área que não poupou a cobertura vegetal, falta de

políticas públicas anteriores que incentivassem o manejo e práticas adequadas não

propiciou uma formação agrícola rentável que pudesse ser mantida, tendo em vista a

instabilidade econômica em que estão envoltas as atividades agrícolas e pecuárias.

Quadro 3: Características do solo na microbacia hidrográfica do córrego da Onça II

Erosão Área (Ha) % sobre a área total da

MBH

Tipos de solo

(grandes grupos)

Laminar 968,7 50 Podzólico variação Lins

Sulcos 387,3 20 Podzólico variação Lins

– Marília

Ravinas / Voçorocas 193,6 10 Podzólico variação Lins

– Marília

Fonte: CATI (2005)

Organizador: Guilherme Magon Whitacker, 2016

No mapa 3 podemos visualizar a distribuição espacial do solo na microbacia,

destaque em vermelho, no qual predominam os solos rasos (FUSHIMI, NUNES, 2014).

57

No anexo 2 disponibilizamos o mapa original da CATI onde estão identificadas as propriedades

beneficiadas pela execução de benfeitorias.

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Mapa 3: Esboço pedológico do município de Presidente Prudente. Destaque para a microbacia

hidrográfica do Córrego da Onça II

Fonte: Fushimi, Nunes (2014).

Destaque: Guilherme Magon Whitacker (2015).

Segundo a CATI (UPA – intranet58

) a ocupação do solo na microbacia,

apresentava certa heterogeneidade no que diz respeito às culturas predominantes, com

variação entre atividades relacionadas às práticas pecuária e agrícola. Ainda no que diz

respeito ao solo, foi constatado que a cobertura vegetal e o uso da terra, em 2005,

apresentava variedade entre as culturas temporárias e as perenes, conforme se verifica

no quadro 4, porém, a conversão das áreas que anteriormente eram utilizadas para

lavouras em pastagens para dar suporte a uma atividade pecuária extensiva, que

apresentava ao lado do cultivo de batata doce, as principais atividades econômicas na

58

UPA – Unidade de Produção Agrícola. Documento interno da CATI que tivemos acesso durante a

realização das entrevistas neste departamento.

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microbacia, resultou no prosseguimento do processo de exaurimento de recursos

naturais, especificamente do solo, ainda que em ritmo menos intenso e de maneira

localizada (MACIEL, 2005).

Quadro 4: Explorações vegetais na microbacia hidrográfica do Córrego da Onça II – 2005

Exploração

Agrícola

Área (ha) N.º Produtores Produção Produtividade

Manga 20 4 100.000 kg 5.000 kg/ha

Milho 100 12 4.200 kg 2.500 kg/ha

Abóbora 2,4 1 1.000 cx/20kg 400 cx/ha

Amendoim 50 1 2.000 sc/ha 40 sc/ha

Feijão 20 2 200 sc/60kg 10 sc/ha

Batata-doce 60 30 24.000 cx/25 kg 400 cx/ha

Olerícolas 2 1 - -

Melancia 15 2 375.000 kg 25.000 kg/ha

Pastagem 1412,4 70 - -

Fonte: Maciel (2005).

Organizador: Guilherme Magon Whitacker, 2016

Os Itens 1.2 e 1.3 indicam problemas relacionados à poluição e a ausência de

mata ciliar nos córregos da onça e norte. Sobre a utilização de água dos córregos do

Norte59

e da Onça pelos produtores rurais residentes na área de pesquisa, estes, quando

questionados pelos técnicos da CATI, antes da execução do PEMH, informaram que

utilizavam da água para algumas atividades, conforme o exposto na tabela 1.

Tabela 1: Uso de água microbacia hidrográfica do Córrego Da Onça II.

Uso do curso de água na microbacia

Questão Número %

Utiliza o curso de água para abastecimento de instalações

animais?

9 1,4

Utiliza água para irrigação de culturas? 8 1,4

Utiliza água para animais diretamente? 62 79,7

Fonte: CATI – (intranet).

Organizador: Guilherme Magon Whitacker (2016)

Sobre a cobertura vegetal nativa em torno dos córregos, esta era composta

originalmente por espécies como santa bárbara, angico, figueira, jatobá, ingá, goiabeira,

coqueiro, farinha seca, amendoim e embaúba, basicamente, estava reduzida, em 2005, a

59

O córrego do Norte, ou “nortinho”, como chamam os produtores, é o principal córrego que cruza a

microbacia e serve as necessidades dos produtores. O córrego da Onça II é o delimitador físico da área de

implementação do PEMH.

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alguns trechos de mata ciliar no Córrego do Norte (afluente do Córrego da Onça), “[...]

sendo estimada a necessidade de recuperação de 80% das áreas de margens deste

córrego para recomposição das matas ciliares” (MACIEL, 2005, p. 11). Esta escassa

presença de mata ciliar, a época do início da execução do PEMH, vinha comprometendo

os recursos hídricos, onde os cursos de água apresentavam-se em progressivo processo

de degradação.

Os córregos da microbacia estão bastante assoreados sendo que ao longo dos

anos vem reduzindo suas vazões. Isso acontece pela má conservação do solo

e falta de mata ciliar, ocorrendo mudança no curso dos rios. Os córregos se

encontram poluídos, sendo que um deles é pelo dejeto do Abastecedouro de

Bovinos e o outro pelo esgoto urbano, tornando sua água imprópria para uso

na irrigação de culturas e consumo de animais (MACIEL, 2005, p. 11).

Ainda sobre os recursos hídricos, Maciel (2005) escreveu que:

A poluição do Córrego da Onça pelo lançamento do esgoto urbano é uma das

principais preocupações dos moradores da microbacia. Os problemas

ocasionados pela poluição causam a redução da quantidade e qualidade da

água. Esses mesmos problemas ocorrem no Córrego do Norte com os dejetos

que transbordam dos tanques de decantação do abatedouro de bovinos que

fica próximo a nascente deste córrego. Os produtores demonstram grande

preocupação na recomposição da mata ciliar onde vários trechos se

apresentam com intenso processo erosivo, contribuindo com o assoreamento

dos córregos. A cobertura nativa foi praticamente eliminada ao longo dos

anos, proporcionando uma flora e fauna pouco diversificada e maiores riscos

de desequilíbrios ambientais (MACIEL, 2005, p. 22).

Visando atenuar a situação de assoreamento, os produtores, após extensas

reuniões com os técnicos da CATI que informavam que, além da necessidade de

proteger as condições naturais dos córregos, estes corriam o risco de serem autuados

pela Polícia Militar Ambiental por crime ambiental, concordaram sobre a recuperação

das matas ciliares e passaram a demonstrar preocupação na recomposição nos trechos

do Córrego do Norte que apresentavam processo erosivo (Agricultor camponês

entrevistado, trabalho de campo, abril de 2015).

Antes da fase de execução do PEMH e a implementação das técnicas de

terraceamento e curvas de nível, a recomposição era realizada de forma inadequada,

muitas vezes não suportando os volumes de água em épocas de chuva e a manutenção

era irregular devido à falta de maquinário disponível para tal ação, ficando os

produtores dependentes da utilização de máquinas de produtores vizinhos e da

prefeitura municipal (Agricultor camponês entrevistado, trabalho de campo, janeiro de

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2014). Á época, eram desconhecidas técnicas de controle vegetativo (plantio de

gramíneas ou recomposição de mata) devido ao nível de instrução dos produtores, falta

de assistência técnica e também aos métodos tradicionais utilizados (MACIEL, 2015).

O subitem 1.4 diz respeito às condições das estradas indicando dificuldades

com o trânsito além da questão da preservação do solo, uma vez que, em época de

chuvas, as estradas não pavimentadas do interior da microbacia, sofrem com o processo

de erosão e o solo levado pela força da água acaba contribuindo com o processo de

assoreamento.

Uma das principais reivindicações dos produtores é o problema da

conservação das estradas. Com uma malha viária de 23,56 km, com vários

trechos críticos com saída de água da propriedade para a estrada causando

erosão nas laterais, e também a saída da água da estrada para a propriedade

causando grandes estragos em propriedades, principalmente nas adjacências

da estrada pavimentada. Isto acontece pelo desconhecimento e inexistência

de sistema de drenagem superficial e técnicas alternativas por parte dos

produtores e da Prefeitura (MACIEL, 2005, p. 21).

No item 2 passam a ser destacados os problemas, causa e ações possíveis

referentes a condição socioeconômica, destacando a pecuária, dos produtores rurais na

microbacia do córrego da Onça II. Os subitens 2.1 e 2.2 indicam como principal

problema em relação a esta atividade econômica a degradação das pastagens e, como

causa da baixa produtividade. Maciel (2005) indica que a justificativa se dá pelos

seguintes fatos: “[...] produtor descapitalizado, poucos investimentos em melhoramento

genético, alimentação do rebanho, recuperação de pastagens, além do problema da

desorganização rural, produtores isolados e com pouca informação” (MACIEL, 2005, p.

20).Diante desta situação, os produtores, na época da implementação do PEMH,

sentiam a necessidade de treinamento e capacitação a fim de enfrentar a nova realidade

do campo, alta competitividade e aperfeiçoamento tecnológico, e, principalmente, como

condição para permanência na atividade agrícola (MACIEL, 2005).

Verificou-se durante a reunião com os produtores da MBH a preocupação

com as baixas produtividades nas culturas anuais como a batata-doce, o

milho e a melancia, justificando o fato principalmente pela sua

descapitalização, o que impede investimentos na melhoria da tecnologia de

produção, conservação do solo e adubação. O desgaste do solo ao longo dos

anos teve como consequência o aumento dos processos erosivos e a redução

de matéria orgânica. Grande número de produtores são alheios às mudanças

no setor agrícola, principalmente no processo de modernização, tornando

muitas vezes inadequado os sistemas de produção empregados por eles nas

propriedades. [...] Encontra-se também muitas propriedades com pequenas

áreas de reflorestamento como eucalipto, cuja produção é destinada

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basicamente ao consumo interno das propriedades. Atividades não agrícolas

como artesanato e turismo rural não existem na microbacia (MACIEL, 2005,

p. 20).

O item 3 do plano de manejo aponta a questão da infraestrutura como outro

problema para o desenvolvimento rural, no subitem 3.1, fica indicada a dificuldade de

comunicação do agricultor de base camponesa por falta de linha telefônica que atenda a

todos os produtores, sendo assim: “[...] uma das reivindicações é a extensão de 8 km da

linha que irá abranger um maior número de produtores.” (MACIEL, 2005, p. 22); o

subitem 3.2 indica a dificuldade de travessia dos córregos que compõem a microbacia.

Deste subitem, foi reivindicada a: “[...] construção de duas pontes que ligam a

microbacia a outros bairros, uma na qual, pela sua falta os usuários da estrada passam

pelo curso da água com seu veículo o que acabou em um trágico acidente com um

produtor que ali passava [...]” (MACIEL, 2005, p. 21); o subitem 3.3 indica problemas

com a legislação trabalhista por falta de reconhecimento das mesmas pelos proprietários

rurais o que acarretava problemas em relação à contratação de funcionários temporários,

neste aspecto, foi planejada a realização de cursos de capacitação e gestão junto aos

sindicatos dos trabalhadores rurais e a parceria com a Prefeitura Municipal de

Presidente Prudente-SP para instalação da casa do produtor rural (local onde seria

possível fazer o cadastro e cuidar da documentação dos mesmos) na microbacia do

córrego da Onça II (MACIEL, 2005).

O quadro 5 mostra que a mão de obra familiar era predominante nos

estabelecimentos agropecuários da microbacia hidrográfica analisada quando

consideramos o trabalho em dias/homem. Corrobora para a definição de uma área de

maioria camponesa o quadro 1, que mostra o pequeno estabelecimento agropecuário

também como predominante. Desta forma, como já afirmamos, os beneficiários do

programa são majoritariamente camponeses.

Quadro 5: Força de trabalho na microbacia hidrográfica da Onça II

Descrição Quantidade Unidade Nº UPAs

Familiares trabalhando no

imóvel

131 Pessoas 79

32.750* Dias/homem 79

Mão de obra temporária 1.147 Dias homem 16

Trabalhadores permanentes

contratados

28 Pessoas 21

*Resultado da multiplicação dos trabalhadores da família (131) das UPAs (79) por 250 dias úteis no ano.

Fonte: CATI (2005) – (intranet)

Organizador: Guilherme Magon Whitacker, 2016

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No que concerne à adoção do conceito de campesinato, tomamos como

subsídio para este posicionamento a discussão paradigmática desenvolvida por

Fernandes (2005), Girardi (2008), Campos (2011) e Felício (2011). De acordo com

estes autores existe duas grandes correntes para a análise do campo no Brasil, o

Paradigma do Capitalismo Agrário (PCA) e o Paradigma da Questão Agrária (PQA). O

primeiro paradigma vê os problemas no campo como resultado de um desenvolvimento

parcial do próprio sistema capitalista, de forma que seriam conjunturais e com solução

possível com o próprio desenvolvimento do capitalismo no campo. Ao contrário, o PQA

concebe os problemas no campo como estruturais; característicos do próprio modo de

produção capitalista e somente solúveis com a substituição do próprio modo de

produção. Para o PQA a conflitualidade é um processo constante e inerente ao

desenvolvimento do capitalismo no campo, podendo ser minimizado, mas não

totalmente superardo.

O PCA separa os agricultores de base familiar (aqueles cuja mão de obra

predominante no estabelecimento é a familiar) em agricultores familiares e camponeses.

Os agricultores familiares seriam aqueles que conseguem sucesso econômico,

integração completa ao mercado; por outro lado, para o PCA o camponês estaria

vinculado à pobreza e não integração/integração parcial ao mercado, sendo

caracterizado como atrasado. O camponês deve metamorfosear-se em agricultor

familiar, segundo Abramovay (1998). Já para o Paradigma da Questão Agrária não há

diferença conceitual entre camponês e agricultor familiar, sendo a sua essência a base

familiar do trabalho, mesmo assim, há uma preferência dos autores vinculados a esse

paradigma em utilizar o termo camponês, por sua filiação marxista e por conter o termo

a referência ao conteúdo histórico dessa classe. Para o PQA o conceito principal é o de

diferenciação do campesinato, proposto por Lênin (1986), que reconhece que ele pode

ser rico, médio ou pobre e também o princípio da recriação do campesinato,

reconhecido por Kautsky (1985). Para este autor, o camponês:

[...] vende produtos agrícolas, mas não emprega assalariados, senão em

pequeno número, por vezes algum camponês que não seja capitalista, mas

simples produtor de mercadorias. Este é um trabalhador que não vive da

renda que traz sua propriedade; vive do seu trabalho [...]. Ele necessita da

terra como meio de transformar o seu trabalho em garantia de sua existência

e não para a obtenção de lucro ou renda fundiária. Posto que o resultado de

sua produção lhe reembolse as despesas e também lhe pague o trabalho

investido, ele terá a sua condição de existência garantida. (KAUTSKY, 1986,

p.151).

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Feita esta breve demarcação necessária, voltamos a análise das informações.

Deste levantamento geral da microbacia do córrego da Onça II, após reuniões e

balanços orçamentários, as atividades efetivamente realizadas em relação à preservação

de recursos naturais, condições socioeconômicas e infraestrutura podem ser assim

apresentadas: recomposição florestal de 90 ha de área de preservação permanente,

adequação de 3,4 Km de estradas rurais, construção de uma unidade de tratamento de

esgoto, aumento da renda de 40 produtores, construção de um armazém comunitário de

10 x 20m no Bairro Km 18, instalação de 8 Km de linha telefônica, construção de 1

ponte no Bairro 1º de Maio (vão de 15m) e uma ponte no Bairro Timburi (vão de 20m),

capacitação de 40 produtores sobre legislação trabalhista (MACIEL, 2005). Destas

metas estabelecidas, a realização de todas as benfeitorias previstas e ações executadas

são as demonstradas no quadro 6.

Quadro 6: Intervenções na microbacia hidrográfica do córrego da Onça II

Município: Presidente Prudente

Microbacia: MBH Córrego da Onça II

Práticas

executadas

Produtores

Beneficiados

Quantidade Unidade Valor

Total

Valor

Apoiado

Abastecedouro

comunitários

5

1

Un

31.509,00

24.362,20

Cercas para proteção de

mananciais

7

4,4

Km

15.986,70

11.153,36

Controle de voçoroca 8 159,3 hs 9.098,14 9.098,14

Distribuidor de calcário 5 1 Un 1.980,00 1.386,00

Mudas de espécies

florestais nativas

10

17.128

Un

17.128,00

17.128,00

Roçadeira costal 5 1 Un 1.865,00 1.492,00

Roçadeira tratorizada 5 1 Un 3.050,00 2.135,00

Trecho crítico de

estrada adequada

79

4,6

Km

228.550,00

228.550,00

Total - - - 309.111,84 295.304,70

Fonte: CATI, 2005

Organizador: Guilherme Magon Whitacker, 2016

Apresentadas as condições anteriores à implementação do PEMH e as

atividades previstas e realizadas, passamos a demonstrar as características posteriores à

implementação desta política pública dando continuidade a ordem anteriormente

estabelecida, ou seja, a partir dos itens e subitens exposto no quadro 2 (p. 114).

Em relação às condições de degradação de recursos naturais (item 1), as

informações produzidas durante o trabalho de campo sobre a questão da degradação do

solo (subitem 1.1) constatam que no preparo para o cultivo, principalmente da batata,

prevalece o sistema tradicional através de atividades de aragem e gradagem, ações

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mecânicas que implicam na movimentação do solo, mesmo em áreas de declividade, o

que facilita o processo de lixiviação, conforme a foto 1.

Foto 1: Aragem para plantação de batatas. Microbacia do Córrego da Onça II

Fonte: Trabalho de campo, 2015

Foto: Guilherme Magon Whitacker, 2015

Esta prática, atualmente, não é considerada adequada, pois ao movimentar o

solo expõem-se à radiação solar intensa os microorganismos responsáveis pela

decomposição do material orgânico que vai garantir sua fertilidade. Deste modo, devido

à radiação intensa pode ocorrer a diminuição da capacidade de fertilidade do solo,

forçando o agricultor de base camponesa a investir em insumos químicos para

recuperação, porém esta ainda é uma prática muito utilizada.

Dentre os 23 produtores rurais entrevistados, 8 (34%) não possuí planejamento

para rotação de culturas e desconheciam a prática do plantio direto, lembrando que esta

técnica era uma das atividades previstas na execução do PEMH (CATI, 2005), técnicas

estas que podem ser utilizadas e que contribuem com o melhoramento, a longo prazo,

das condições produtivas (ELHERS, 1999).

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Eu não conheço ninguém daqui que uso plantio direto. É mais fácil passar o

arado mesmo, isso foi até falado lá atrás, mas não sei se teve o curso, acho

que não né? Por que se tivesse, a gente até podia fazer desse jeito. É por isso

que eu falo, o pessoal até veio com vontade, mas depois a turma deixa as

coisa de lado... e vai seguindo mesmo, só mexe alguma coisa se vem multa,

ai todo mundo fica de olho, que nem as mata que tem que deixar em volta

dos córrego, ali o povo cuida (Agricultor camponês entrevistado, trabalho de

campo, fevereiro de 2014).

O que verificamos na atualidade é a continuidade, apesar de pontual, do

processo de erosão laminar que ainda ocorre em algumas propriedades, conforme

demonstramos na foto 2.

Foto 2: Processos de formação de voçorocas. Microbacia do Córrego da Onça II

Fonte: Trabalho de campo, 2015

Foto: Guilherme Magon Whitacker, 2015

De acordo com o relato de um produtor entrevistado:

Depois que eles fizeram os terraços diminuiu bem as voçoroca por aqui, eles

fizeram as curvas de nível. Tem lugar que ainda tem um pouco, mas se

comparado com o que era antes melhorou sim... o que tem hoje, eu acho que

é um pouco por causa do dono, tem um pessoal que depois dos terraço feito

foi e arou a terra pra plantar as batata ou pra formar pasto de qualquer jeito,

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ai estragou (Agricultor camponês entrevistado, trabalho de campo, fevereiro

de 2014).

Sobre as condições dos córregos (item 1.2) e ausência de mata ciliar (item 1.3)

no interior da microbacia, apesar do cercamento das áreas de preservação permanente,

com o passar do tempo, o descomprometimento dos executores e de parte dos

proprietários, não foram suficientes para impedir o assoreamento dos córregos. Apesar

do diagnóstico e identificação dos problemas relacionados, de acordo com uma

entrevista, as ações realizadas pelos executores do PEMH, não foram suficientes:

Não, os esgotos foram tratados sim, mas não acho que foi por causa do

programa não, é que a polícia começou a ir lá e multar o pessoal do

matadouro, e lá no presídio também teve multa, acho que do ministério

público, agora, falar que as cercas acabaram com o pisoteio nos córrego não

dá. Do que adianta eu cercar aqui se lá na cabeceira do rio ninguém faz nada?

Não tem outro jeito de criar o gado se não for abrindo pra eles passa de um

pasto pra outro e toma água, como é que eu vou fazer? Eu tenho terra que

arrendei de outros sítio que ficam do outro lado, então abro. Na época eles

vinham aqui e andaram bastante mesmo, fizemos as reuniões, corremos atrás

do pessoal e tudo, mas não era todo mundo que queria participar, é isso que

eu falo, se tivesse uma participação de todo mundo da microbacia, ai podia

até dar certo, mas se não, só dois ou três não faz diferença (Agricultor

camponês entrevistado, trabalho de campo, fevereiro de 2014).

Esta informação constituiu item importante para a execução desta política

pública, pois uma das ações previstas (quadro 2, p. 114) seria o cercamento de áreas de

preservação permanente e a “[...] conscientização dos responsáveis da área da prefeitura

e da SABESP, gestão junto aos órgãos competentes para tratamento do esgoto.”

(MACIEL, 2015, p. 25) além de conscientizar os produtores rurais sobre a importância

da preservação dos recursos hídricos.

De acordo com Maciel (2005), o desmatamento na microbacia é antigo e está

relacionado à preservação dos córregos60

.

Os produtores demonstram grande preocupação na recomposição da mata

ciliar onde vários trechos se apresentam com intenso processo erosivo,

contribuindo com o assoreamento dos córregos. A cobertura nativa foi

praticamente eliminada ao longo dos anos, proporcionando uma flora e fauna

pouco diversificada e maiores riscos de desequilíbrios ambientais (MACIEL,

2005, p. 22).

60

Apesar de não constar no quadro 2, a questão do assoreamento está presente no plano de manejo da

microbacia hidrográfica do córrego da Onça II (MACIEL, 2005, p. 21). De acordo com informações

fornecidas durante o trabalho de campo, entende-se que o assoreamento contribui com a degradação dos

córregos, daí a inclusão deste tema para demonstrar as condições após a implementação do PEMH.

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Esta preocupação expressa no Plano de Manejo (MACIEL, 2005), na

atualidade, conforme observamos em nosso trabalho de campo, têm aumentado por

força de lei e a recomposição tem sido realizada, pois, dentre os produtores rurais

entrevistados, cinco deles relataram ter recebido multas aplicadas pela Polícia Militar

Ambiental do estado de São Paulo, principalmente sobre a supressão e permissibilidade

de avanço de gado em áreas de preservação permanente – foto 3.

Foto 3: Trecho do córrego do Norte marcado por passagem de gado. Microbacia do Córrego da Onça II

Fonte: Trabalho de campo, 2015

Foto: Guilherme Magon Whitacker, 2015

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Porém, constatamos também que, apesar do cercamento e recomposição de

áreas de preservação permanente, as condições de assoreamento continuam

comprometendo os recursos hídricos, onde os córregos da Onça e Norte apresentam-se,

ainda, em processo de assoreamento devido à ocorrência de voçorocas nas propriedades

a direita de sua margem e, principalmente, pela condução de gado próximo a reserva de

área de preservação permanente de uma propriedade para outra.

Quando o pessoal ia pras reuniões, tinha toda aquela conversa sobre a

preservação dos córregos, eu até desconfiava da boa vontade de alguns

porque já conhecia eles, sei como é que fazem, eu moro aqui a muito tempo

sabe... aí, depois do microbacia, eu falei pro A.C.P. que as coisas não iam ser

bem daquele jeito, ele era novo aqui e ainda não entendia direito... dito e

feito, passou um tempo, depois que a CATI parou de trabalhar lá, voltou tudo

do mesmo jeito (Agricultor camponês entrevistados, trabalho de campo,

fevereiro de 2014).

Deste modo, a soltura do gado e o consequente pisoteamento nas margens do

córrego do Norte e da Onça II (foto 3) acabou por piorar a situação de assoreamento,

pois o pisoteio remove a cobertura vegetal gramínea e a passagem do gado, por áreas

que deveriam ser de preservação permanente, pode acentuar o processo de lixiviação em

épocas de chuva além de causar a morte de espécies arbóreas que poderiam colaborar

para a formação natural da área de preservação permanente.

Sobre esta situação, um representante da Associação dos Cidadãos do Campo

de Presidente Prudente (ASICAMP61

), relatou que:

A gente sempre conversa sobre isso, mas a associação ta fraca. Como não

tem muita gente lá na Onça, os que tão lá continuam fazendo as coisas como

sempre fizeram. Desde que eu te conheci, lembra, a gente conversava sobre

isso e minha briga sempre foi por causa disso... mas o pessoal é teimoso. O

que interessa pra eles, ainda mais pros que não tem mais interesse em

continuar trabalhando, não sei se pela idade ou porque não tem mais ninguém

da família por lá, é só tocar o gado pra vender, de qualquer jeito mesmo

(Representante da ASCICAMP, trabalho de campo, fevereiro de 2014).

Ainda durante o trabalho de campo realizado na área delimitada para estudo,

pudemos verificar a situação da cobertura vegetal na microbacia do córrego da Onça II,

que possui relação direta com as questões de preservação do solo e assoreamento dos

córregos, no mapa 4 podemos identificar que a cobertura vegetal predominante é a

61

A Associação dos Cidadãos do Campo de Presidente Prudente representa, atualmente, os produtores

rurais do município de Presidente Prudente-SP. (representante da ASCICAMP , trabalho de campo,

fevereiro de 2014).

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pastagem. Não se distinguindo da cobertura vegetal restante do município, percebe-se

ainda, ao Norte do município de Presidente Prudente, o avanço da área de plantação de

Cana-de-açúcar promovido pela empresa Alto Alegre S.A. que atinge os limites do

distrito de Ameliópolis.

Mapa 4: Uso da terra e cobertura vegetal no município de Presidente Prudente-SP, destaque para a

microbacia hidrográfica do Córrego da Onça II

Fonte: Extraído de: Fushimi; Nunes (2014)

Destaque: Guilherme Magon Whitacker, 2016

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Durante o trabalho de campo exploratório, realizado entre setembro e

novembro de 2013, período de pouca chuva, constatamos que as estradas principais e

secundárias, não pavimentafas, (subitem 1.4.), bem como a ponte principal de ligação

entre o bairro Timburi e 1º de Maio, apresentavam condições de tráfego permitindo o

escoamento da produção, transporte de pessoas e produtos e demais necessidades dos

produtores residentes na microbacia – foto 4.

Foto 4: Ponte de ligação com os Bairros 1º de Maio e Timburi. Microbacia do Córrego da Onça II

Fonte: Trabalho de campo, 2015

Foto: Guilherme Magon Whitacker, 2015

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O interior da microbacia é formado por uma malha viária de 23,56 km, com

trechos críticos com saída de água da propriedade para a estrada causando erosão nas

laterais, e também a saída da água da estrada para as propriedades que ficam na parte

mais baixa, causando problemas de conservação de solo.

Isto acontecia pelo desconhecimento e inexistência de sistema de drenagem

superficial e técnicas alternativas por parte dos produtores e da prefeitura municipal de

Presidente Prudente. Os pontos críticos das estradas estavam localizados em quatro

trechos somando 3,4 km. Sendo 1,9 km o total da extensão da estrada do Talialenha, 0,5

km de trecho da estrada para o bairro Timburi, 0,3 km da estrada para o bairro 1º de

Maio e a extensão total da estrada da Máquina de Batata com 0,7 km (MACIEL, 2005).

Porém, cabe lembrar que, durante o período de implementação do PEMH a situação era

distinta:

[...] era triste de vê, a gente tinha que se virá pra poder levar as coisas pra

qualquer lugar. Quando chovia então [...] ai na rodovia teve gente que já

morreu, ali perto da fundição mesmo, naquela curva, teve um aqui de

Floresta que morreu esses tempos, quero ver agora com essas casinha62

ai se

eles vão fazer alguma coisa (Agricultor camponês entrevistado, trabalho de

campo, fevereiro de 2014).

Em relação ao item 2, que se refere à situação socioeconômica dos produtores

rurais, salientamos que, com a expansão da pecuária, a agricultura aparece com

variedade economicamente insignificante nesta área. Portanto, consideramos que o

pequeno produtor, predominante nesta microbacia, devido as limitações naturais

relativas ao desgaste do solo, dificuldades econômicas e consequentemente falta de mão

de obra, não consegue se manter na atividade agrícola e acaba por abandonar e/ou

arrendar sua propriedade.

Constatamos que 83 % das propriedades em que realizamos entrevistas são

utilizadas para pecuária, seja pelo próprio produtor ou arrendando as terras (foram 27

visitadas, destas, realizamos entrevistas com 23 proprietários e, destes, 19 se dedicam a

pecuária) tendo, no interior daquelas na qual o proprietário cuida do gado e reside na

propriedade, pequenas lavouras ou hortas para consumo próprio e, o restante, 17 %,

dedicam-se ao cultivo de batatas em suas propriedades.

62

Referindo-se ao conjunto habitacional João Domingos Netto, do programa do Governo Federal Minha

casa, minha vida, que totalizou 2,3 mil casas as margens da rodovia Raimundo Maiolini, cerca de 10 Km

de distância do acesso principal a microbacia do Córrego da Onça II.

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Em relação ao subitem 2.2 e 2.3, a falta de recursos financeiros dos produtores

muitas vezes reflete os baixos índices de produtividade, uma vez que os mesmos não

encontram condições para investimento em formas alternativas de melhoramento

genético e na recuperação e adubação das pastagens.

Portanto, a maioria dos produtores caracteriza-se pela exploração pecuária de

forma extensiva, acreditando nas formas tradicionais capitalistas de produção, o que

acaba refletindo no baixo nível de especialização, suprindo seu consumo e

comercializando seu excedente.

De acordo com um representante da ASCICAMPP, as atividades agrícolas

nesta microbacia tem sido gradativamente abandonada devido à descapitalização, o que

impede investimentos na melhoria da tecnologia de produção, conservação do solo e

adubação e, consequentemente, abandono da cultura (Representante da ASSCICAMP,

trabalho de campo, fevereiro de 2014).

Constatamos durante a pesquisa que esta questão foi prevista e identificada

como um dos motivos da baixa rentabilidade na microbacia, porém, segundo

informações fornecidas não foram realizados cursos sobre melhoramento genético ou

recuperação e adubação de pastagens (Agricultor camponês entrevistado, trabalho de

campo, fevereiro de 2014). Dos produtores rurais entrevistados – oito (35 %) –

informaram que desistiram da atividade agrícola e dedicam-se somente à pecuária.

Os motivos variam entre a falta de recursos econômicos para a contratação de

mão de obra o empobrecimento do solo na microbacia e o abandono da atividade rural

pelos mais jovens. “É muito caro para manter uma horta boa, a terra não dá mais, a

gente não da conta do serviço e não tem dinheiro pra contratar alguém de fora, então

compensa mais arrendar pra boi” (Agricultor camponês entrevistado, trabalho de

campo, fevereiro de 2014).

Posteriormente, durante nosso trabalho de campo realizado entre julho e

setembro de 2015, pudemos verificar a continuidade e até mesmo uma intensificação

destes problemas, como é o caso da queda de produtividade na pastagem (subitem 2.1.),

que reflete na expansão das voçorocas e queda na qualidade do capim.

Apesar das dificuldades que os camponeses encontram para manter esta

atividade na área de estudo, a pecuária extensiva continua a ser a atividade econômica

predominante na microbacia do córrego da Onça II, com apenas 21% dos produtores

entrevistados dedicando-se a produção agrícola, sendo que, o principal cultivo é o de

espécies de batatas.

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Em relação ao tipo de gado (corte/leite), constatamos que os produtores

entrevistados na microbacia abandonaram a atividade leiteira, pelo motivo de baixa

produtividade e má condição genética do gado, já verificado em 2005 (CATI, 2005) e

trabalham, na atualidade, exclusivamente com gado de corte.

Sobre outras atividades econômicas, pudemos identificar ainda uma área de

cultivo da cultura do eucalipto – foto 5 – que, segundo informações produzidas durante

o trabalho de campo, são vendidas, principalmente, para seguimentos da construção em

Presidente Prudente e região (Agricultor camponês entrevistado, trabalho de campo,

outubro de 2013). O que demonstra, em uma perspectiva futura, que o eucalipto, como

forma alternativa de renda, possa representar alternativa e passe a se contrapor a

produção pecuária naquela área.

Foto 5: Cultura de eucalipto na microbacia do córrego da Onça II

Fonte: Trabalho de campo, 2015

Foto: Guilherme Magon Whitacker, 2015

Das informações expostas sobre as culturas predominantes e economicamente

rentáveis, descartando aquelas direcionadas ao auto consumo, organizamos o gráfico 1

para demonstrar o perfil atual do uso do solo. Levamos em consideração para a

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organização deste perfil dados referentes às propriedades visitadas em que realizamos

entrevistas63

(24,05 % do total das propriedades).

Estas informações foram obtidas após analisarmos os dados extraídos dos

formulários que aplicamos junto aos proprietários na microbacia durante a realização do

trabalho de campo. Em relação ao item “outras atividades”, incluímos aí o cultivo de

eucalipto que, apesar de representar grande extensão (foto 5), é realizada em apenas

duas propriedades da microbacia do Córrego da Onça II, localizadas as margens da

rodovia Raimundo Milani.

Gráfico 1: Atividades econômicas na microbacia hidrográfica do Córrego da Onça II em 2015

68,42 %

21,06%

10,52 %

Atividades econômicas - 2015

Pecuária

Lavoura

Outras

Fonte: Trabalho de campo, 2015

Organizador: Guilherme Magon Whitacker, 2016

Do total dos produtores rurais da área estudada 29,11 % residem no distrito de

Montalvão ou na sede do município. Assim, os produtores que residem na microbacia

são idosos e com relativo apego ao trabalho agrícola e pecuário, durante o trabalho de

campo constatamos a presença de poucos jovens nas atividades rurais, segundo os

entrevistados, alguns ainda moram ali, mas não ajudam nas tarefas diárias e ocupam o

tempo com outras atividades.

[...] os menino tão ai, mas não querem saber de nada do sítio não [...] vão pra

escola e depois é celular e internet, essas coisas, vão pra cidade, pra

Montalvão, é isso, às vezes ajuda alguma coisa, mas é pouco e me chateia

que não parte deles entende, a gente tem que ficar pedindo, coisa que meus

pais e depois nós cuidamos tanto, agora os menino não quer saber [...] mas,

63

Lembrando que foram 27 propriedades visitadas, das quais, foram realizadas 23 entrevistas.

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fazer o que né, quem sabe um dia. (Agricultor camponês entrevistado,

trabalho de campo, fevereiro de 2014).

Em relação ao arrendamento das terras, atividade presente e executada

principalmente pelos camponeses ricos que se aproveitando da situação de proletariação

dos camponeses pobres da microbacia analisada expandem suas áreas de

produtividades, cabe observação: foram realizadas entrevistas na sede do distrito de

Montalvão (5), pois entre os proprietários entrevistados, 13 praticamente abandonaram

as sedes das propriedades conforme verificamos pela foto 6.

Foto 6: Propriedade rural abandonada. Microbacia hidrográfica do córrego da Onça II

Fonte: Trabalho de campo, 2015

Foto: Guilherme Magon Whitacker, 2015

Outros, que já atingiram um patamar econômico diferenciado e possuem vida

mais estabilizada devido a possibilidade de realizar outras atividades econômicas fora64

da microbacia ou possuem aposentadoria rural complementada por alguma outra fonte

de renda, preferem utilizar os sítios apenas nos fins de semana para lazer da própria

64

Durante o trabalho de campo constatamos que 3 proprietários deixaram a atividade agropecuária para

dedicarem-se a atividades comerciais no distrito de Montalvão.

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família ou alugando a sede para grupos de pessoas – foto 7. Deste modo ampliam a

renda, pois os pastos ou áreas de lavoura passaram a ser arrendadas para outros

proprietários como constatamos em uma das propriedades visitadas durante o trabalho

de campo que arrenda áreas de sítios vizinhos para engorda de gado.

Um proprietário, além de alugar a sede (reformada) e arrendar o pasto,

conseguiu se estabelecer como comerciante de carnes no distrito de Montalvão e relatou

que mesmo sendo dono de pastagem e de casa de carnes “[...] ainda prefiro arrendar as

terras, sai mais barato comprar a carne pra revender do que cuidar do gado” (Agricultor

camponês entrevistado, trabalho de campo, fevereiro de 2014).

Foto 7: Propriedade reformada para aluguel. Microbacia hidrográfica do córrego da Onça II

Fonte: Trabalho de campo, 2015

Foto: Guilherme Magon Whitacker, 2015

Durante a realização das entrevistas notamos ainda que antigos produtores,

hoje aposentados e ex-produtores, preferem utilizar a propriedade com outros fins. Um

desses entrevistados que arrendou as terras nos afirmou:

[...] nem sei mais como é que tá aquilo lá, a casa ta lá mas faz tempo que eu

não vou, só recebo notícias do moço do sítio quando ele vem aqui me pagar

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pelo arrendamento, prefiro assim, to sozinho, os menino tão na cidade e a

velha já se foi, não aguento mais a lida não, prefiro ficar aqui, com minha

aposentadoria e a pensão, se ainda posso arrenda as terras, melhor.

(Agricultor camponês entrevistado, trabalho de campo, fevereiro de 2014).

Outro proprietário, que vive de aposentadoria no distrito de Montalvão,

preferiu deixar a terra parada, como forma de especulação imobiliária, conforme

informação concedida durante a realização do trabalho de campo:

[...] já me ofereceram dinheiro pela propriedade, mas não vou vender ainda

não, prefiro a terra lá parada do que entregar por qualquer preço, meus filhos

já tão criados e não moram mais por aqui e eu não preciso mais dela pra

viver, tenho minha aposentadoria e minha mulher montou essa lojinha aqui,

ai vivo disso e da aposentadoria, daqui um tempo, se não vende, eu passo pro

nome dos meus filhos e eles fazem o que quiserem, por enquanto deixa lá

(Agricultor camponês entrevistado, trabalho de campo, fevereiro de 2014).

Em relação ao item 3, infraestrutura, verificamos que a extensão da linha

telefônica (subitem 3.1) foi realizada, este fato:

[...] ajuda bastante, porque antes a gente tinha dificuldade de falar com os

vizinhos [...] tinha que sair daqui e ir até a casa de alguém quando queria

saber de alguma coisa, ligar pra parente, essas coisas [...] e também ajuda na

segurança né, porque com o presídio ai perto começou a vir muita gente de

fora pra cá, ai a gente fica assustado quando fica passando gente estranha por

aqui [...] agora, qualquer coisa um liga pro outro e sai avisando. E também é

bom pra muita coisa, se precisa de ambulância, bombeiro e polícia [...]

Quando precisa chamar um veterinário, alguém pra ver alguma coisa aqui no

sítio, é bom sim (Agricultor camponês entrevistado, trabalho de campo,

fevereiro de 2014).

Em relação ao subitem 3.2, verificamos que as pontes estão em boas condições

de tráfego e facilitam tanto o transporte de produtos e mercadorias quanto o tráfego de

pessoas. Uma das principais reivindicações dos produtores a época da elaboração dos

PIP foi a resolução deste problema.

Atualmente constatamos que as estradas da microbacia apresentam condições

regulares de trânsito, isto porque, segundo depoimento do representante da

ASCICAMPP, em 2008, através de emenda parlamentar foi viabilizada a quantia de

R$780.000,00 usados na aquisição de cinco tratores e outros implementos agrícolas,

que, entre outras atividades, são utilizados na recuperação das estradas internas, e

também a Prefeitura Municipal, através de sua Secretaria de Desenvolvimento

Econômico em parceria com a CATI, realizou obras de melhoria nas estradas e

conservação das pontes na microbacia (Representante da ASCICAMP, trabalho de

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campo, janeiro de 2014). Deste modo, a recuperação das estradas que cruzam esta

microbacia não foram ações exclusivas do PEMH e, as condições das estradas, contudo,

não se mantém em épocas de chuvas, quando trechos se tornam de difícil trânsito

prejudicando o escoamento da produção, transporte e insumos (Agricultor camponês

entrevistado, trabalho de campo, fevereiro de 2014).

Em relação ao item 3.3 constatamos que 82% dos proprietários entrevistados

dedicam-se atualmente a pecuária, o que reflete no perfil das propriedades da

microbacia, portanto, aquele contingente de trabalhadores que eram contratados para

trabalhar nas lavouras, foram dispensados, minimizando assim os problemas

relacionados a legislação trabalhista.

Destas informações, pudemos identificar que a preocupação dos produtores

rurais entrevistados, em relação à preservação de matas ciliares e assoreamento do

Córrego do Norte, lembrando que este era um dos objetivos do PEMH, agrupando-os

em três categorias representadas no gráfico 2. Esta é uma informação relevante para a

pesquisa, pois demonstra a capacidade de impacto que esta política pública exerceu em

relação à tomada de consciência sobre o desenvolvimento sustentável, o objetivo

principal do PEMH (CATI, 2005).

Gráfico 2: Nível de preocupação com os recursos naturais dos produtores da microbacia hidrográfica do

Córrego da Onça II

29,99%

18,48%

51,53%

Preocupação em Relação a Preservação de Matas Ciliares e Assoremento do Córrego do Norte

Baixa Preocupação

Média Preocupação

Alta Preocupação

Fonte: CATI (2005) – (intranet)

Organizador: Guilherme Magon Whitacker, 2016

Destes dados podemos perceber que a preservação de recursos naturais naquela

área não é uma prática comum entre os produtores. Quando questionados sobre a

questão da preservação dos recursos naturais em suas propriedades, fomos informados

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por 66% dos entrevistados que estes possuem, hoje, consciência desta necessidade,

porém, 78% dos produtores entrevistados possuem fossa comum (fossa negra) e 100%

dos entrevistados afirmaram já terem realizado queima em suas propriedades para

“limparem” o terreno, 100% dos entrevistados afirmaram que já queimaram resíduos em

valas abertas e depois cobriram com terra novamente. Portanto, em relação à

conscientização sobre a necessidade de preservação de recursos naturais, notamos que

esta é restrita a preservação das Áreas de Preservação Permanente e se desenvolveu não

a partir de atividades realizadas pela CATI na execução do programa, mas sim, por

imposição legal.

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Resumo da parte I

Iniciamos demonstrando que:

o Grupo BM articula suas ações para influenciar países tomadores de recursos a

adotarem as perspectivas territorial e sustentável para políticas públicas de

desenvolvimento rural.

autores e pesquisadores como Navarro (2001), Veiga (2002, 2003, 2004),

Abramovay (2000, 2002, 2005), Sachs (2004) e outros, defendem a tese de que a

concepção de território área é justificada pela possibilidade de normatização, o que

permite a materialização do desenvolvimento territorial rural sustentável.

Estes fatos foram demonstrados a partir da:

influencia do Grupo BM no processo de descentralização de políticas públicas e sua

perspectiva territorial e sustentável para o desenvolvimento do campo;

materialização das propostas do Grupo BM tendo como exemplos o PEMH, em

escala local e a expansão do setor sucroenergético, em escala regional.

Isto nos permitiu identificar:

a concepção territorial adotada – delimitação física – e o uso do território a partir do

desenvolvimento sustentável como premissa para implementação de políticas

públicas;

historicamente, a evolução do Grupo BM e as mudanças na concepção de políticas

públicas no Brasil;

geograficamente, a evolução da inserção da perspectiva territorial em modelos de

desenvolvimento rural;

a expansão territorial do setor sucroenergético e a relação deste processo com o

desenvolvimento sustentável no Estado de São Paulo;

a forma como foi estruturado o PEMH no Estado de São Paulo tendo em vistas

entender a lógica que permitiu que o Grupo BM articulasse sua atuação global em

escala local fazendo uso, também, do desenvolvimento sustentável;

os resultados do PEMH.

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Parte II

A vocação geograficamente expansiva do modo de produção capitalista

A complexidade encerrada no tema de estudo delimitado, o desenvolvimento

sustentável, requer uma postura investigativa que permita reconhecer que a execução de

políticas públicas atua sobre a produção do espaço e vai representar sua materialidade

no território, sobretudo quando as mesmas são influenciadas por agentes atuantes na

reprodução do modo de produção capitalista.

Nesse sentido, pretendemos demonstrar a superaração da segmentação dos

conteúdos que não favorecem a compreensão integral da realidade e dificulta seu

entendimento enquanto processo dinâmico e dialético, pois analisamos que isto permita

uma ampliação acerca dos mecanismos que interferem na organização espacial e

consideramos as materializações espaciais produto das inter-relações dialéticas entre

sociedade e natureza; com efeito, as políticas públicas empreendidas sobre determinado

território (re)constroem práticas socioespaciais, que tomam corpo nas formas e

conteúdos do mesmo. Nos estudos sobre políticas públicas, a Geografia pode contribuir

com o estudo das espacialidades das ações humanas e, é nessa perspectiva, de

compreender a produção do espaço, o território e a territorialização do modo de

produção capitalista que organizamos este capítulo.

Deste raciocínio, demonstraremos como o modo de produção capitalista, em

seu desenvolvimentismo, foi estudado pela Geografia no que diz respeito à

compreensão sobre a produção do espaço e o território. Tratamos, neste capítulo, da

análise da categoria espaço e do conceito de território para compreender como os

processos e agentes envoltos na expansão capitalista impactaram o campo a partir da

incorporação normativa do modelo de desenvolvimento territorial rural sustentável em

políticas públicas, onde se ressalta o aspecto econômico e político, sobretudo, a

reprodução do modo de produção destacado. Portanto, sob este ponto de vista, está

implícita a necessidade de se considerar a historicidade, pois:

No início do período capitalista, os modelos de utilização de recursos ainda

eram múltiplos, sobretudo em escala mundial. À medida que o capitalismo se

desenvolveu, o número de modelos reduziu, a margem de escolha se mostrou

cada vez mais estreita. Depois da Segunda Guerra Mundial, com a

instauração do capital tecnológico, nem sequer se pode falar da continuação

de uma escolha: impõe-se um só modelo de tecnologia, de organização, de

utilização do capital, etc. É indubitável que este modelo se impõe de forma

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diferente segundo o nível das forças produtivas de cada país, mas ele é

dominante em toda parte (SANTOS, 2003, p. 138).

Estes fatos, considerados na perspectiva histórica e geográfica, remetem à ideia

de processos65

(SANTOS, 2009) e práticas espaciais (CORREA, 2006) que, quando

exercidas do ponto de vista da lógica capitalista, resultam em desigualdades

geográficas, referem-se tipicamente à exploração das condições sob as quais ocorre o

processo de acumulação e, o que nos importa entender, o processo de reprodução66

,

aproveitam-se da dialética constituída pelo capitalismo, sua contrariedade intrínseca,

por meio de práticas multifacetadas monopolistas, espacialmente articuladas, vinculadas

com fluxos de capitais restritos. Sobre a reprodução do modo de produção capitalista

Luxemburgo (1988) escreveu que:

Reprodução, tomada literalmente, é simplesmente reiteração, repetição,

renovação do processo de produção. À primeira vista, não se percebe em que

se diferencia o conceito de reprodução do conceito de produção

universalmente entendido como tal, e por que motivo seria necessária aqui

uma expressão nova e estranha. Mas é exatamente na repetição, na constante

retomada do processo de produção, que se coloca um aspecto importante. Em

primeiro lugar, a repetição regular do processo de produção é o pressuposto

geral e fundamento de um consumo regular; com isso, constitui a condição

prévia para a existência cultural da sociedade humana sob todas as formas

históricas. Nesse sentido, o conceito de reprodução inclui um aspecto

histórico-cultural. A produção não pode ser retomada e a reprodução não

pode ocorrer, se não existirem condições prévias resultantes de período

produtivo anterior: ferramentas, matérias-primas e mão-de-obra

(LUXEMBURGO, 1988, p. 7).

Estas condições geográficas desiguais são também, o que é relevante,

produzidas pelas maneiras desiguais em que riqueza e poder tornam-se altamente

concentrados em certas áreas como decorrência de relações assimétricas de troca,

contradições e tensões e é, ainda, respectivamente instável, influenciando e atuando na

produção do espaço e no território para o domínio de recursos naturais. Portanto,

analisamos que para a garantia de continuidade deste modo de produção, é necessário

que se criem arranjos espaciais e territoriais para que seja possível sua acumulação,

pois, caso haja uma estagnação nesse processo, o sistema, como um todo, entra em

65

O termo processo é utilizado neste trabalho com o significado de sucessão de fatos históricos, em

movimento e ininterruptos, que pressupõem determinado fim a ser alcançado. 66

Importa-nos o processo de reprodução do modo de produção capitalista, pois consideramos que o

desenvolvimento sustentável venha sendo utilizado no sentido de produzir novos espaços para sua

acumulação que vai ser revelada na materialidade deste enquanto modelo de desenvolvimento capaz, ou

não, de exercer impactos significativos enquanto tal. Ou seja, a materialidade do desenvolvimento

sustentável vai ser analisada no território, daí a importância de entender a influência do modo de

produção capitalista sobre a produção do espaço e passar do espaço ao território.

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colapso. Neste sentido, o conceito de reprodução: “[...] significa algo mais do que a

simples repetição: ele já pressupõe determinado grau de domínio da Natureza pela

sociedade ou, em termos econômicos, determinado grau de produtividade do trabalho”

(LUXEMBURGO, 1988, p. 8). É justamente esse empenho na reflexão sobre a

compreensão do processo de desenvolvimento do capitalismo que permite entender a

noção de desenvolvimento territorial rural sustentável enquanto estratégia de ação

planejada (BERSTEEIN, 1996) por, e para, continuidade da reprodução capitalista no

campo (DELGADO, 2012).

Neste sentido, consideramos que exista uma relação entre a expansão do

capitalismo e o desenvolvimento territorial rural sustentável que é revelada nos

processos de territorialização do modo de produção capitalista e na normatização do

território sob o domínio do capital em sua acepção do discurso do desenvolvimento para

superação de modelos que se tornaram obsoletos com a implantação de tecnologias que

configuram o campo na atualidade, e, todos esses processos resultaram em alterações

sociais e naturais (MAZOYER, ROUDART, 2011; DELGADO, 2012). O

reconhecimento desses processos por nossa parte permite que iniciemos a análise a

partir do reconhecimento da influência exercida pelo modo de produção capitalista

sobre a produção do espaço e nos territórios. Esta é a razão pela qual consideramos

pertinente iniciarmos com a análise sobre a vocação geograficamente expansionista do

capitalismo, pois isto nos permite entender:

como a Geografia, em uma perspectiva influenciada pelo pensamento marxista,

entende a produção do espaço, o território e o processo de territorialização;

a dinâmica territorial do modo de produção capitalista que se reproduz em momentos

de crise intensificando a falha sociometabólica na relação entre a sociedade e a

natureza.

Deste modo, a segunda parte de nossa pesquisa está estruturada como base

teórica fundamental para que possamos demonstrar à antítese em relação ao

tratamento dado ao desenvolvimento territorial rural sustentável no modo de produção

capitalista onde o território é normatizado para fins operacionais (parte I desta

pesquisa) sem considerar a questão das conflitualidades. Assim, com base em autores e

pesquisadores que se alinham ao pensamento geográfico crítico, como Harvey (2005,

2010, 2011), Smith (1988), Peet (2006), dentre outros não geógrafos, demonstraremos

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que a reprodução do modo de produção capitalista influi na produção do espaço a

partir de suas dinâmicas territoriais caracterizadas intrinsecamente pela necessidade

de produzir, destruir e reconstruir novos espaços para sua própria reprodução. Deste

modo, afastamo-nos da compreensão anterior que defende o desenvolvimento territorial

rural sustentável como processo harmonioso entre a sociedade e entre esta e a natureza

desconsiderando a conflitualidade, fato este, a conflitualidade, inerente ao capitalismo

que se expressa concomitantemente no desenvolvimento territorial rural

(FERNANDES, 2013) por meio de um ardiloso processo internacionalmente articulado

para sustentar a territorialização do modo de produção capitalista.

Capítulo 3. Subsídios teóricos sobre a produção do espaço, território,

territorialização do modo de produção capitalista e normatização do território sob

a perspectiva da Geografia crítica

Buscando analisar em que problemáticas geográficas estão envolvidas as

concepções de produção do espaço e os processos que concebem materialidade ao

território, objetivamos nos itens seguintes interpretar a perspectiva teórica no qual estes

estão inseridos levando em consideração e concordando com Moreira (1982), que a

sociedade é o tema central da Geografia, entretanto, esta ciência possui um modo

particular de estudá-la (CORREA, 2006), visto que a reprodução da sociedade é

analisada por meio de categorias de análise e conceitos específicos, tais como: espaço,

paisagem, lugar, região e território.

Destas categorias e conceitos, priorizamos no item 3.1 o que se refere à

produção do espaço, isto porque, entender este processo nos permitirá, no item 3.2,

entender a concepção de território por meio das relações de poder que intensificam o

processo de territorialização do modo de produção capitalista e a normatização do

território.

Consideramos ainda que sob os influxos da financeirização econômica

mundial, o capitalismo busca constantemente suporte à sua realização por meio de

relações sociais de produção e, diante disso, poder-se-ia então escrever sobre uma

Geografia, ou mesmo uma geograficidade no sentido proposto por Moreira (2004) de

existência do capitalismo, no qual o capital financeiro em vertiginosa expansão sob a

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influência da própria crise, que se repetem em momentos cíclicos67

, encontra no espaço

e, sobretudo, nos territórios seu lócus privilegiado e preferencial de existir, de

realização, acumulação e reprodução.

Desta feita, levamos em consideração que “[...] as sociedades produzem o

espaço, conforme seus interesses em determinados momentos históricos [...]”

(OLIVEIRA, 2003, p. 142), portanto a produção do espaço e dos territórios não se faz

de maneira aleatória, consideramos que devem ser enfatizados nesse processo, com base

na interpretação dialética da realidade, as crises e ciclos do modo de produção

capitalista como elementos intrínsecos e potencializadores da produção do espaço e da

territorialização e reprodução do capitalismo enquanto totalidades dinâmicas e

contraditórias, produzidas histórica e geograficamente na relação entre a espacialização

da sociedade mediada por relações sociais distintas.

Portanto, se o desenvolvimento sustentável, vem sendo apresentado e

implementado, dentre outras formas, por meio de políticas públicas articuladas e

financiadas no bojo de organizações internacionais notadamente reconhecidas como

articuladoras da expansão do modo de produção capitalista e este é um fator

determinante, não no sentido do determinismo geográfico, mas sim como algo capaz de

induzir ações, na produção do espaço e no entendimento deste processo, temos a relação

pretendida entre a compreensão da análise sobre a produção do espaço relacionada ao

tema de nossa tese. Pois, conforme exposto na parte I desta pesquisa, o

desenvolvimento territorial rural sustentável, conforme as recomendações do Grupo BM

seria a solução para os problemas de ordem econômica, social e natural, facilitando a

inserção de produtores rurais no mercado capitalista.

3.1. A produção desigual e dialética do espaço geográfico

A produção do espaço é, para Moreira (1982) e Moraes (2005), fato produzido

pela própria necessidade de reprodução da sociedade e, visto que o espaço geográfico é

constituído por objetos sociais e naturais e são estes que permitem a reprodução da

sociedade, em constante conflitualidade, constituindo territórios, portanto, o que nos é

relevante, é a produção social do espaço e do território, ou seja, a representação de sua

materialidade e, nesta perspectiva, a Geografia crítica é a que nos serve de instrumentos

67

As crises e os ciclos do modo de produção capitalista serão analisados com maior acuidade no capítulo

4 como subsídio a interpretação da reprodução capitalista com ênfase no desenvolvimento sustentável.

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e ferramentas, no sentido proposto por Souza (2013), para a árdua tarefa de

operacionalização da categoria espaço.

Para Harvey (2005), “Do ponto de vista da circulação do capital, portanto, o

espaço aparece, em primeiro lugar, como mera inconveniência, uma barreira a ser

superada” (HARVEY, 2005, p. 145) e entendemos que Harvey (2005) faz alusão ao

espaço não somente como extensão física68

, mas sim considerando a macroescala na

qual a mobilidade inconstante do capital no espaço ocorre, o que leva a uma leitura que

relacione a mobilidade espacial como uma forma de reprodução do modo de produção

capitalista por meio do deslocamento das suas contradições pelo espaço geográfico, o

que, em contrapartida, engendra a sua tendência universalizante de deslocamento

(PERPÉTUA, 2013) e, com a superação desse obstáculo por intermédio do que Santos

(2009) denominou de meio técnico-científico-informacional, criam-se oportunidades de

novos investimentos ao capital ocioso. Daí a importância da superação, constante, do

espaço. Como observou Harvey (2005), trata-se do movimento contraditório do

capitalismo em sua inflexível produção espacial que vai apresentar sua materialidade.

Deste raciocínio, consideramos a relevância dada às crises desde a década de

1970 por pesquisadores de várias áreas. Na literatura geográfica podemos relacionar as

crises como eventos potencializadores da formação de novos espaços para acumulação e

reprodução do modo de produção capitalista a partir, principalmente, da introdução do

pensamento marxista na Geografia que trouxe contribuições a ambos os campos como

muito bem demonstrou Moreira (2004), Harvey (2005) e Mitidiero Junior (2016) ao

escrever sobre a necessidade de retroalimentação do modo de produção capitalista para

o seu próprio desenvolvimento.

As evoluções no campo epistemológico geográfico crítico deram aporte à

compreensão da produção do espaço e ao território no capitalismo, sobretudo, pela

introdução do método e categorias de análise marxistas que permitem a interpretação da

teoria das crises e dos ciclos econômicos na análise geográfica da realidade

socioespacial.

Ao considerarmos o espaço, como constructo social, estamos nos referindo à

estrutura que define as determinações do modo de produção considerando, também, o

68

Sob este aspecto, Oliveira (1996) realizou profunda análise onde considera “O espaço como ordem,

princípio e lei da coexistência dos fenômenos” e reconhece, com base principalmente em Leibiniz que,

apesar da extensão física estar contida no entendimento sobre o espaço, em relação a suas três dimensões

(comprimento, altura e largura), que a coexistência de determinados fenômenos no espaço ocorre pela

movimentação dialética da matéria, e este movimento não se restringe a superação da extensão física, mas

sim, a própria produção de novos espaços que permitam essa coexistência.

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que se refere à ação de agentes em associação com grupos de atuação, muitas vezes de

âmbito global. Neste sentido, o espaço produzido pode contribuir mais para ocultar sua

estrutura do que revelar. Isso porque, em geral, não percebemos, ou não é desvelado no

olhar o processo de produção espacial tal qual a mercadoria, o que nos remete ao

esforço reflexivo. Contudo, a afirmação de que o espaço é socialmente construído não

significa a negação de que ele esteja centrado na materialidade do mundo. O que

realmente nos importa é perceber que o pensamento dialético enfatiza a compreensão

dos processos e das relações, para, a partir de então entender os elementos, a estrutura e

os sistemas organizados. Deste modo, concordamos com o argumento de Harvey (2005)

sobre a dialética, que nos força sempre a questionar, em relação a um evento, qual

processo constitui o objeto a analisar e como ele é amparado. Assim, o espaço como

produto social é resultado de um processo histórico e geográfico que o dota de uma

existência objetiva.

[...] uma coisa é a percepção individual do espaço, outra é a sua objetividade.

O espaço não é nem a soma nem a síntese das percepções individuais. Sendo

um produto, isto é, um resultado da produção, o espaço é um objeto social

como qualquer outro. Se, como para qualquer outro objeto social, ele pode

ser apreendido sob múltiplas pseudoconcreções, isto de nenhuma forma o

esvazia de sua realidade objetiva (SANTOS, 2008a, p. 161).

Com isto, consideramos que o conhecimento da realidade espacial não deve ter

por base sensações ou percepções sujeitas à experiência ou a aparência, mas sim a

essência. A produção do espaço é considerada produto da organização social que tem

transformado o entorno natural ao longo da história, e este, o espaço, sobrevêm da

capacidade (técnica e intelectual) do ser humano de organizar-se e evoluir; em

consequência, “[...] o espaço testemunha a realização da história, sendo a um só tempo,

passado, presente e futuro” (SANTOS, 2008a, p. 156). Neste sentido, a materialidade do

espaço geográfico é entendida como resultado ativo de um processo produtivo das

relações sociais de produção no tempo, o que reafirma seu caráter de produto social.

Fator fundamental da evolução social, em que todas as instâncias (políticas, econômicas

e sociais) se inter-relacionam, fato que implica uma imbricação entre as mesmas. Por

conseguinte, o espaço se apresenta como categoria geográfica explicativa central da

realidade social.

Uma contribuição para a Geografia compreender o espaço por este raciocínio,

ou seja, produto social, apoiada no materialismo histórico e dialético, foi o estudo

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realizado por Lefebvre (2013) que vai influenciar o pensamento geográfico sobre a

produção do espaço e alterar matrizes epistemológicas da Geografia. Para Lefebvre

(2013), referindo- se ao espaço enquanto produto social, a estruturação organizacional

do espaço não é uma estrutura independente com leis de funcionamento e transformação

próprias, tampouco, mera expressão da estrutura de classes emergindo das relações de

produção. A organização espacial é elemento das relações totais de produção, que são

concomitantemente sociais e espaciais, dialeticamente intrínsecas, compondo o

materialismo histórico-geográfico69

. Deste modo, a proposição de uma dialética

socioespacial pode ser localizada na ideia de Lefebvre (2013) onde o espaço tanto

expressa as relações sociais de determinado modo de produção quanto reage

diretamente a elas.

El concepto de espacio social se desarrolla mediante su ampliación. Se

introduce en el seno del concepto de producción, lo invade incluso, llegando

a hacerse parte (quizá una parte esencial) de su contenido. De ahí engendra

un movimiento dialéctico muy específico que no abole ciertamente la

relación “producción-consumo” aplicada a las cosas (bienes, mercancias,

objetos de cambio), pero que se modifica mediante su ampliación.

(LEFEBVRE, 2013, p. 141).

Consideramos que o pensamento de Lefebvre (2013) resulta, portanto, na

concepção de uma intricada e abrangente teoria do espaço social, analisando este não

como fato acabado, nem tampouco como um meio vazio e passivo, mas sim como

produto que intervém na própria produção e como aspecto basilar da segunda natureza

(produzida pela ação humana), decorrência da ação produtiva e transformadora das

sociedades sobre a primeira natureza.

Ampliando e aportando seu raciocínio em formas de percepção da tradição

marxista, na qual o espaço social pode ser avaliado como uma superestrutura70

(MARX,

69

O materialismo histórico e geográfico foi objeto de discussão de Soja (1993) e vem sendo desenvolvido

por Harvey (2005, 2010, 2011). Daí, dentre outros aspectos, a influência de Lefebvre (2013) sobre

geógrafos e sobre a Geografia. 70

A partir da formulação de Marx e Engels (2009) “[...] na produção social da própria existência, os

homens entram em relações determinadas, necessárias, independentes de sua vontade; essas relações de

produção correspondem a um grau determinado de desenvolvimento das suas forças produtivas materiais.

A totalidade dessas relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a

qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e à qual correspondem formas sociais determinadas de

consciência. O modo de produção da vida material condiciona o processo da vida social, política e

espiritual em geral. Não é a consciência do homem que determina o seu ser; ao contrário é, o seu ser

social é que determina a sua consciência” (MARX; ENGELS, 2009, p. 47). De acordo com Larrain

(2013), a superestrutura, no sentido proposto por Marx e Engels, “[...] apresenta a ideia de que a estrutura

econômica (a base ou infra estrutura) da sociedade condiciona a existência e as formas do estado e da

consciência social (a superestrutura)” (LARRAIN, 2013, p. 27).

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2013), Lefebvre (2013) argumenta que, assim como o tempo, o espaço não se situa a

determinados níveis ou planos distinguidos e hierarquizados.

[...] en la estricta tradición marxista, el espacio social podia considerarse

como una superestructura, resultado de las fuerzas de producción y de las

estructuras, de las relaciones de propriedad entre otras. Ahora el espacio entra

en las fuerzas productivas, en la división del trabajo. Sus relaciones con la

propriedad están claras; también con los intercambios, com las instituciones,

con la cultura, con el saber. Se vende y compra (LEFEBVRE, 2013, p. 56).

Portanto, entendemos que Lefebvre (2013) argumenta que a produção do

espaço, ainda que não dominante no modo de produção capitalista, religa os aspectos da

prática, coordenando-os, reunindo-os. Deste modo, determinado modo de produção

motiva, ao mesmo tempo, relações sociais e o espaço onde essas acontecem, e é assim

que ele se realiza, sem que haja correspondência exata entre as relações sociais e

espaciais, portanto, uma dinâmica constante e conflitante entre o que determina a base,

ou infraestrutura, e a superestrutura. Se o espaço social intervém no modo de produção,

ele também sofre alterações de acordo com a dinâmica evolutiva dos modos de

produção. Deste modo, consideramos que o espaço não se estabelece no modo de

produção capitalista como meio passivo das relações sociais, mas sim ativo (operatório

e instrumental) e ao exercício da hegemonia.

Lefebvre (2013) proporciona uma adequada teoria social de base marxista do

espaço capaz de conceber uma unidade teórica entre campos distintos: o espaço físico,

mental e social. Para tanto, traz à tona conceitos da economia política marxiana, como

produção e produzir e, a partir destes, apregoa a produção do espaço como conceito

teórico e realidade prática onde este é, portanto, produto social: meio de produção e de

domínio que escapa parcialmente aos que dele se servem quando este não mais se

confunde com o espaço mental (dos filósofos e matemáticos) e com o espaço físico

(definido pelo prático-sensível e pela percepção da natureza). O que importa,

ponderamos, para Lefebvre (2013), é o espaço como totalidade71

, não reduzido aos

objetos localizados no, ou sobre, o espaço.

De acordo com Lefebvre (2013), produzir um espaço social adequado, no qual

a sociedade causadora toma forma apresentando-se e representando causalidades de

determinado modo de produção, é um processo onde estão imbricadas relações sociais

de produção e de reprodução.

71

Neste ponto, no sentido proposto por Santos (2009) que ao indicar, fazendo uso de Sartre, a distinção

entre totalidade e totalização, entende a primeira enquanto resultado de determinado processo.

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Assim, é estabelecida uma respeitável triplicidade do espaço: a prática espacial

– produção e reprodução que assevera a continuidade numa relativa coerência

produzindo e dominando o espaço, o que corresponde ao espaço percebido; as

representações do espaço – vinculadas as relações de produção, aos conhecimentos,

signos e códigos específicos, que correspondem ao espaço concebido dos especialistas

no qual as concepções espaciais tendem para um sistema de signos verbais elaborados

intelectualmente com tendência dominante e; os espaços de representação – que

apresentam simbolismos complexos relacionados à vida social e correspondem ao

espaço vivido, trata-se do espaço dominado que tende, também, para sistemas mais ou

menos coerentes de signos não verbais (LEFEBVRE, 2013).

Esta triplicidade percebido-concebido-vivido (LEFEBVRE, 2013), supera o

binarismo das relações a dois termos, do espaço mental e físico, e não corresponde a um

modelo abstrato. Para Lefebvre (2013), é imprescindível que o vivido, o concebido e o

percebido sejam reunidos, de modo que o sujeito, membro de determinado grupo social,

possa passar de um a outro polo desta triplicidade espacial sem se perder. Os agentes

que atuam na produção do espaço seguem uma representação, enquanto os usuários

suportam o que lhes é imposto, inserido ou justificado em seu espaço de representação

(espaço vivido).

Pode-se supor, portanto, que a prática espacial, as representações do espaço e

os espaços de representação, interferem de modo distinto na produção do espaço,

conforme suas qualidades e propriedades, conforme as sociedades e as épocas, porém, o

fazem de maneira aleatória (LEFEBVRE, 2013). Desta forma, as inclusões entre esses

três momentos nunca são simples ou estáveis, e mais do que essa instabilidade,

apresentam uma contrariedade imanente, a invariável sobreposição desta triplicidade

espacial mediada pela relação de interesses entre aqueles que atuam nas esferas de

poder e os que a estes se submete, neste caso, considerando o espaço enquanto produto

social submetido ao modo de produção capitalista.

Para Lefebvre (2013), não há um espaço social, mas vários espaços sociais,

uma multiplicidade. “No hay un espacio social, sino vários espacios sociales e incluso

podríamos decir que una multiplicidad ilimitada; el término espacio social denota un

conjunto innumerable” (LEFEBVRE, 2013, p. 142). Tomados isoladamente tornam-se

abstração, mas eles existem realmente para redes de relações sociais. Esses espaços

sociais se compenetram e/ou se superpõem, já que não são fatos ou objetos limitados

uns pelos outros, ou chocando-se por seu contorno e por sua inércia. Assim, as

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fronteiras visíveis disfarçam um isolamento entre espaços, delimitando apenas o espaço

físico.

O espaço social de Lefebvre (2013) pode ser compreendido segundo uma dupla

determinação: conduzido pelos grandes movimentos, e atravessado pelos pequenos

movimentos, ou seja, unidades individuais e particularidades, fixidades relativas,

movimentos, fluxos e ondas, uns se compenetrando, outros se afrontando. A forma do

espaço social é o encontro, a simultaneidade, a reunião de tudo que há no espaço, de

tudo que é produzido, seja pela natureza, seja pela sociedade (LEFEBVRE, 2013).

Com estas interpretações, a influência do pensamento de Lefebvre (2013) na

Geografia torna-se mais frequente. Para Quaini72

(1979), que discute a utilização das

teorias e metodologias marxistas no estudo da Geografia, a preocupação das

consequências do capitalismo na sociedade, portanto na produção do espaço, devem

estar nos objetivos desta ciência, o discurso acerca da suposta missão civilizadora do

capital contribuiu para a naturalização da lógica de reprodução do modo de produção

capitalista pautada na produção e no consumo, como escreveu Marx (2011).

A produção é também imediatamente consumo. Duplo consumo, subjetivo e

objetivo: o indivíduo que desenvolve suas capacidades ao produzir também

as despende, consome-as no ato da produção, exatamente como a procriação

natural é um consumo de forças vitais. Em segundo lugar: consumo dos

meios de produção que são usados e desgastados e, em parte (como, por

exemplo, na combustão), transformados novamente nos elementos gerais.

Assim como o consumo da matéria-prima, que não permanece com sua forma

[Gestalt] e constituição naturais, sendo, ao contrário, consumida. Por isso, o

próprio ato de produção é, em todos os seus momentos, também um ato de

consumo (MARX, 2011, p. 63).

Para Quaini (1979) esta visão, apesar de parecer inicialmente um desvio

historicista, é justificada pela necessidade de reconhecer a produção social do espaço,

tendo a visão de história marxiana do ser humano realizando-se socialmente (QUAINI,

1979). Entre as questões ressaltadas por este autor, uma das principais diz respeito à

dominação do espaço geográfico como algo superior a relação, também de dominação,

entre a sociedade e a natureza (primeira).

De acordo com Quaini (1979) a relação de transformação da natureza em

história, uma natureza social (segunda), é um processo de dominação espacial e

72

Apesar de não encontrarmos em Quaini (1979) referências a obra de Lefebvre, consideramos que este

autor, ao perceber a relevância do pensamento marxiano para o aprimoramento da Geografia, permite que

façamos a aproximação entre os autores, sem a pretensão de indicar que Quaini seja adepto de Lefebvre,

mas sim da teoria marxiana e do reconhecimento de sua importância para a crítica geográfica sobre a

produção do espaço.

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consideramos que este processo pode ser relacionado ao espaço social de Lefebvre

(2013) a partir da inserção da tecnologia e da ciência no território, o que gerou

possibilidades de uma produção e utilização desigual do espaço.

Esta paradoxal reviravolta da natureza em história e da história em natureza

se realiza na sociedade capitalista, que enquanto amplia a esfera do domínio

científico e tecnológico sobre as forças naturais cria uma natureza social ou

uma sociedade natural que se opõe e domina os homens muito mais que a

natureza natural dominava as próprias sociedades pré-capitalistas (QUAINI,

1979, p. 48).

Ampliando este debate, Smith (1988) escreve sobre a relação dialética entre

diferenciação e equalização geográficas contribuindo, deste modo, na compreensão

sobre a dialética da produção do espaço no modo de produção capitalista trazendo à

tona a questão da desigualdade do desenvolvimento e sua tendência a igualização.

Smith (1988) focaliza o caráter político e econômico do desenvolvimento desigual73

do

capitalismo voltando-se a autores clássicos do pensamento marxista, como Lênin74

(1982) e Trotsky75

(1985), que, de acordo com Löwy (1985) fornecem as bases teóricas

sobre desenvolvimento desigual.

Nestas perspectivas, está presente o entendimento de que o capitalismo

hierarquiza a diferença em desigualdade e assim desenvolve-se (LÊNIN, 1985)

combinando formas contemporâneas, capitalistas, com outras obsoletas, não

capitalistas, evoluindo desigualmente (TROTSKY, 1985). Smith (1988) demonstra que

73

Foi o geógrafo anarquista Élisée Reclus quem tomou a categoria desenvolvimento desigual como um

dos fundamentos da Geografia. “A primeira categoria de acontecimentos que o historiador constata nos

mostra como, pelo efeito de um desigual desenvolvimento nos indivíduos e nas sociedades, todas as

coletividades humanas, com exceção dos povos que permaneceram no naturismo primitivo, se

desdobram, por assim dizer, em classes ou em castas, não apenas diferentes, mas também opostas em

interesses e em tendências, até mesmo francamente inimigas em todos os períodos de crise” (RECLUS,

1985 apud, ANDRADE, 1985, p. 39). 74

Lênin (2010) nos fornece o exemplo das estradas de ferro mostrando o desenvolvimento desigual do

capitalismo: “As estradas de ferro nos dão o balanço dos ramos chaves da indústria capitalista, da

indústria hulhífera e siderúrgica, o balanço e os índices mais significativos do desenvolvimento do

comércio mundial e da civilização democrática burguesa. [...] A desigual repartição da rede ferroviária, a

desigualdade do seu desenvolvimento constitui, à escala mundial, o balanço do moderno capitalismo

monopolista. E este balanço mostra que, com tal base econômica, as guerras imperialistas são

absolutamente inevitáveis durante e enquanto existir a propriedade privada dos meios de produção”

(LÊNIN, 2010, p. 10). 75

Segundo Löwy (1995): “A teoria do desenvolvimento desigual e combinado de Trotsky [...] é uma

tentativa de [...] dar conta da lógica das contradições econômicas e sociais dos países do capitalismo

periférico ou dominados pelo imperialismo”. “Contrariamente a Lênin que examinava o desenvolvimento

do capitalismo na Rússia sobretudo a partir das contradições internas da agricultura, Trotsky o aborda sob

o ângulo da inserção da economia russa no sistema capitalista. A formação social russa era tomada como

um subconjunto periférico do capitalismo mundial, que formava, de forma determinante, sua estrutura

econômica e social” (LÖWY, 1985, p. 73).

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o desenvolvimento desigual é marcadamente espacial na exata medida em que tende

para a diferença, concordando com Trotsky (1985), e para a igualização76

.

Isso significa que a tendência geograficamente expansiva do modo de produção

capitalista reúne para si as diferenças geográficas e as toma como premissas dialéticas

para seu desenvolvimento, lembrando a mobilidade espacial deste modo de produção.

Se o desenvolvimento desigual transpõe a história, ele constitui uma Geografia própria

sob o capitalismo. Essa Geografia do capitalismo assenta-se em uma base natural que

comina, juntamente com a divisão internacional (territorial) do trabalho, na tendência

para a diferenciação.

A divisão do trabalho na sociedade é a base histórica da diferenciação

espacial de níveis e condições de desenvolvimento. A divisão espacial ou

territorial do trabalho não é um processo separado, mas está implícito, desde

o início, no conceito de divisão do trabalho. [...] Sob condições naturais

diferentes, o mesmo gasto de trabalho resultará em diferentes qualidades de

uma dada mercadoria, e isto implica a possibilidade (mas somente a

possibilidade) de produção excedente em um lugar, embora não em outro.

Além disso, a diferenciação qualitativa da natureza coloca certos limites para

que os processos de produção possam ocorrer numa dada área. Assim, o

algodão não pode naturalmente ser cultivado no Ártico e o carvão não pode

ser extraído de camadas geológicas que não o contenham. Esta é a base

natural para produção excedente (SMITH, 1988, p.152).

Smith (1988) observa, ainda em Marx (2011, 2013), o conceito de modo de

produção para identificar uma sociedade dominante/dominada e entender a produção do

espaço como desigual, onde este não é imutável, suas estruturas (infraestrutura e

superestrutura) materiais, imateriais e organizacionais mudam de feição articulando o

sistema produtivo a elementos de produção, consumo e circulação. Elementos estes que

estão processualmente relacionados entre si e moldam o espaço, não só porque se

realizam mediante estruturas fixas locais, mas também pelas relações de fluidez que

mantêm entre si associadas às dinâmicas econômicas.

Por sua vez, Soja (1993) reconhece que as procedências da aproximação entre

o marxismo e a Geografia encontram-se na Geografia francesa e anglosaxônica devido,

principalmente, a forma como o marxismo desenvolveu-se naqueles países, atribuindo a

Lefebvre (2013) grande importância neste processo ao afirmar que:

76

A tendência para igualização é o nivelamento ao plano do capital. Um exemplo fornecido pelo geógrafo

escocês é a relação cidade-campo. De acordo com o raciocínio do autor, o capitalismo aproximou as

relações entre cidade-campo via industrialização da agricultura. Ele exemplifica dizendo que a

acumulação de capital avança não simplesmente através do desenvolvimento da divisão do trabalho, mas

pelo nivelamento dos modos de produção pré-capitalistas ao plano do capital (SMITH, 1988).

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[...] nos últimos trinta anos, Lefebvre recorreu seletivamente a esses

movimentos, numa tentativa de recontextualizar o marxismo na teoria e na

práxis; e é nesta recontextualização que podemos descobrir muitas das fontes

imediatas de uma interpretação materialista da realidade e, por conseguinte,

do desenvolvimento da Geografia marxista e do materialismo histórico-

geográfico. (SOJA, 1993, p. 63).

Neste sentido, para Soja (1993) a relação entre o marxismo e a Geografia teve

muitas vezes pensamento unilateral, posteriormente houve um movimento de renovação

que confere a ambos uma fecundidade de análise ao, por um lado, relativizar a

característica fortemente historicista presente no marxismo e, por outro, conferir

autonomia epistemológica a Geografia. Este é um elemento relevante porque o

pensamento geográfico, no século XIX e no século XX, pode ser considerado de

maneira inscipiente em relação ao pensamento marxista. Isto porque havia no

marxismo, notadamente o ocidental77

, o predomínio do pensamento historiográfico

como elemento explicativo, em detrimento da Geografia e do espaço, constituindo-se no

que seria uma espécie de historicismo (SOJA, 1993).

Uma contextualização histórica hiperdesenvolvida da vida social e da teoria

social, que obscurece e periferializa ativamente a imaginação geográfica ou

espacial. Essa definição não nega o poder e a importância da historiografia

como modalidade de discernimento emancipatório, mas identifica o

historicismo com a criação de um silencio crítico, com uma subordinação

implícita do espaço ao tempo (SOJA, 1993, p. 23).

Soja (1993), no entanto, evita uma dicotomização improdutiva entre tempo e

espaço e afirma que a leitura estritamente historicista nas obras marxianas só pode ser

superada por uma reconfiguração realizada dentro dos próprios limites do marxismo e

que ela não poderá ser operada por quem optar por anular o tempo pondo em relevância

apenas o espaço.

[...] em resposta, os intrusos decididos tendem, muitas vezes, a enfatizar

demais suas colocações, criando uma alma contraproducente de anti-história

77

Hobsbawn (1985) e Bottomore (2013) Identificam distintos eixos do marxismo, o ocidental, soviético,

na Europa oriental, o austromarxismo e outras definições. Em Anderson (1989) o marxismo ocidental

aparece como o deslocamento das questões centrais do marxismo clássico, da I e II Internacional, de

cunho mais político e econômico altamente relacionado à teoria e a prática revolucionária, para a

filosofia, epistemologia e teoria do conhecimento. Esta distinção ocorreu a partir da década de 1920 com

os intensos debates que se sucederam ao aparecimento das obras História e consciência de classe, de

György Lukács, e Marxismo e filosofia, de Karl Korsch. A tradição clássica será concluída, segundo

Anderson (1989) com uma série de reveses históricos: a derrota da revolução proletária no Ocidente, a

ascensão do fascismo e do nazismo na Europa Ocidental e a consolidação do stalinismo na URSS, que,

segundo o historiador inglês e livre de qualquer julgamento nosso, levará a uma regressão do marxismo

na URSS. Será justamente esse conjunto de derrotas que dará lugar a uma nova tradição marxista.

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e exagerando inflexivelmente o privilégio crítico da espacialidade

contemporânea, isolada de uma abrangência temporal que é cada vez mais

silenciada (SOJA, 1993, p. 19).

Superar este historicismo foi a argumentação no período moderno para o

pensamento crítico. Para Soja (1993), este fato consiste na superação da separação

infrutífera do ser, do tempo e do espaço, e no rompimento com o isolamento

protagonizado por geógrafos, no século XIX e início do século XX, em relação a outros

campos do saber científico (SOJA, 1993).

Esta ligação entre o ser, o tempo e o espaço é a matriz ontológica do ser no

mundo, sendo assim, para Soja (1993), a instituição do pensamento crítico marxista, por

meio do método dialético, categorias e conceitos, é a reconfiguração pretendida do

pensamento geográfico a partir do reconhecimento da espacialização do ser junto a sua

temporalização no processo de devir social, reconstruindo a capacidade explicativa da

teoria crítica.

[...] o modo como esse nexo ontológico de espaço-tempo-ser é

conceitualmente especificado e recebe um sentido particular na explicação

dos eventos e ocorrências concretas é a fonte geradora de todas as teorias

sociais, sejam elas críticas ou outras (SOJA, 1993, p. 35).

Contrariando teses de supressão da relevância do espaço ante o avanço da

mundialização capitalista, Soja (1993) observa nas últimas décadas do XX uma

reinserção da problemática espacial na teoria social crítica. De espaço receptáculo e

palco dos acontecimentos, passa-se cada vez mais ao entendimento do espaço como

elemento ativo e dinâmico na constituição e transformação da sociedade, conforme

escreveu Lefebvre (2013).

Santos (2008a) contribui a estruturação da Geografia crítica brasileira trazendo

a consideração do espaço em perspectiva semelhante à de Lefebvre (2013), como

produto social, resultado das práticas espaciais da sociedade, e não reflexo social, ou

seja, o espaço enquanto produto socialmente constituído é subordinado e, ao mesmo

tempo subordinante, constantemente submetido à totalidade, mas dotado de certa

autonomia em relação a determinado modo de produção, que por sua vez também torna

subordinada e subordinante determinada sociedade.

Portanto, o espaço do homem, espaço social, geográfico, condiciona então a

sociedade, compartilhando do complexo processo de existência e reprodução social,

pois, “[...] não há e jamais houve formação social independente do espaço (SANTOS,

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2008a, p. 243). Ainda para Santos (2008a), o espaço pode ser analisado a partir das

categorias estrutura, processo, função e forma, considerados como termos disjuntivos

associados em suas relações dialéticas.

Outro autor que colabora, na atualidade, com o adensamento do marxismo na

Geografia, sobretudo para a compreensão da produção do espaço sob o modo de

produção capitalista é David Harvey, que teoriza sobre a apropriação histórica da

dimensão espacial pelo capital e como as suas dinâmicas, entre crises e ciclos, causam

certa racionalidade que assevere, mesmo reconhecendo suas contradições, a reprodução

e ampliação das condições basilares para a acumulação capitalista.

[...] a história da mudança social é em parte apreendida pela história das

concepções de espaço e de tempo, bem como dos usos ideológicos que

podem ser dados a essas concepções [...] todo o processo de transformação da

sociedade deve apreender a complexa estrutura e transformação das

concepções e práticas espaciais e temporais (HARVEY, 2010, p.201).

Para Harvey (2005), mesmo que o processo de acumulação capitalista em nível

global caracterize um desenvolvimento geográfico desigual, a palavra chave para

compreender este fato não é desenvolvimento, mas espaço. Deste modo, este autor da

ênfase a dimensão geográfica incorporando as análises espaciais ao materialismo

histórico preconizado por Marx. De acordo com Harvey (2011) a categoria espaço,

enquanto fato social (LEFEBVRE, 2013), sempre esteve presente na teoria social

marxista no que se refere ao seu papel para o desempenho da acumulação e reprodução

do capitalismo, ou mesmo nos processos de crises e de superação destas.

Harvey (2005), em seus estudos sobre a Geografia histórica do capitalismo, se

posiciona sobre a elaboração de uma teoria geral das relações espaciais e do

desenvolvimento geográfico no modo de produção capitalista a partir da teoria social

marxista como forma a contribuir, também, para a explicação posterior (HARVEY,

2010) das transformações das funções do Estado enquanto agente atuante na reprodução

do modo de produção capitalista por meio de distintas atuações que fortaleceram o

neoliberalismo (HARVEY, 2010).

Deste modo, consideramos que o que Harvey (2005) afirma, anteriormente,

autores como Luxemburg (1985) e Lênin (1982) organizaram em suas obras teorias

sobre as dinâmicas capitalistas, na perspectiva de abranger o processo pelo qual o

capitalismo se desenvolvia historicamente enquanto relação social e modo de produção

e, ainda, suas consequências na organização espacial da sociedade. Não obstante,

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Harvey (2005) demonstra inquietação em desvelar como o espaço tem papel categórico

sem desconsiderar o tempo na obra marxiana, e na criação das condições necessárias à

reprodução do capital. Para Harvey (2005):

Marx não estava necessariamente equivocado ao priorizar o tempo sobre o

espaço. Na circulação do capital, o propósito e o objetivo dos envolvidos

deve ser controlar o tempo do trabalho excedente e transformá-lo em lucro,

dentro do tempo de rotação socialmente necessário. (HARVEY, 2005,

p.145).

Neste sentido, conceber o espaço como totalidade é entender o espaço

geográfico como um elemento híbrido formado por “[...] sistema de objetos e sistema de

ações” (SANTOS, 2009). Ou seja, objetos naturais e objetos sociais em relação

dinâmica com a sociedade. Corroborando nesse sentido, Straforini (2004) afirma que a

ciência geográfica:

[...] deve buscar a compreensão do espaço geográfico, esse entendido como

um sistema indissociável de sistema de objetos e sistema de ações. Para que

os objetos e ações permaneçam indissociáveis o espaço não pode perder o

sentido de totalidade-mundo (STRAFORINI, 2004, p. 175).

Deste modo, os movimentos da sociedade, ao atribuírem às formas geográficas

novas funções, transformam a organização do espaço. Essas formas, tornadas formas-

conteúdo, participam então de uma dialética com a sociedade. Somente a sociedade

anima as formas espaciais, atribuindo-lhes um conteúdo. Apenas a forma utilizada,

tornada forma-conteúdo, constitui o espaço. Na medida em que não existe dialética

possível entre formas, a dialética que se dá é sempre entre sociedade e espaço, já que a

sociedade está agindo sobre ela mesma, e não sobre a sua materialidade exclusivamente.

Destes, levamos em consideração, portanto, que na perspectiva geográfica

crítica, teorizar sobre a produção do espaço geográfico relaciona-se com considerar as

implicações do capitalismo como modo de produção categórico, mais especificamente,

como processo determinado pela circulação e acumulação de capital. Caso não ocorra

esta relação, consideramos que o intento desta teorização estaria incompleta, já que o

capitalismo se converteu em fator de valorização do espaço e no espaço (MORAES;

MESSIAS, 1996). O capitalismo, portanto, se converteu em decisivo protagonista do

espaço, como escreveu Harvey (2007), relacionando a teoria marxiana com a estrutura

espacial.

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La teoría marxiana sobre el crecimiento en el capitalismo sitúa la

acumulación de capital en el centro de las cosas. La acumulación es el motor

que mueve el crecimiento bajo el modo de producción capitalista. El sistema

capitalista es, por consiguiente, fuertemente dinámico y expansivo, forma una

fuerza permanentemente revolucionaria que remodela de manera continua

constante el mundo en que vivimos (HARVEY, 2007, p. 256).

No mesmo sentido consideramos a racionalidade de Santos (2009), em que o

capitalismo impõe sua hegemonia aos sistemas de objetos e ações que se instalam no

espaço. Desta forma, em uma perspectiva marxista, o capitalismo pode ser entendido

como processo produtivo do espaço, o que corrobora com a afirmação de que o espaço

é produto histórico e geográfico materializado baixo relações sociais e técnicas

concretas geograficamente expansivas. Esta lógica impõe uma organização específica

dos processos produtivos e de trabalho, com o objetivo principal de gerar mais valor e

se apropriar da mesma, uma lógica baseada na acumulação continua de capital como

mecanismo vital para sua reprodução.

A partir daí se projeta o espaço geográfico como espaço do capital (HARVEY,

2007), um espaço cada vez mais de tendência global e propício a criação de novos

espaços de reprodução em seu interior, como a proposta de desenvolvimento sustentável

que permite que organizações internacionais articulem redes globais de sistemas

peritos78

e influenciem tomadas de decisões, seja no âmbito privado, por meio de selos

internacionais de garantia de contribuição para o desenvolvimento sustentável, seja no

setor público, por meio da coação financeira que vai permitir a territorialização do

desenvolvimento sustentável.

E, é neste contexto, que localizamos a atenção sobre ações que projetam um

modelo de desenvolvimento que se propõe sustentável, sobre a dinâmica derivada da

racionalidade espacial do capitalismo, posicionando normativamente o território no

espaço geográfico baixo a configuração do modo de produção capitalista, ou seja, a

territorialização deste modo de produção e a normatização do território.

3.2. Territórios, processos de territorialização e normatização do território no

modo de produção capitalista

Na interpretação da teoria sobre a produção do espaço, consideramos que

Lefebvre (2013) estabeleceu uma rica problematização crítica para a abordagem

78

Sobre os sistemas peritos apresentaremos maiores considerações na parte III desta pesquisa.

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dialética espacial que permite adentrar o estudo sobre os territórios e reconhecemos que

este é um conceito chave para a Geografia e nossa pesquisa. A triplicidade espaço

percebido-concebido-vivido (LEFEBVRE, 2013) procura dar conta de abarcar a

multiplicidade característica do espaço social, mas consideramos que não há como

reduzir esta triplicidade a categorias de análise do real quando passamos da análise da

produção do espaço ao território.

Deste modo, por avaliarmos que exista certa dificuldade epistemológica de

nossa parte para transformar sua teorização em categorias formais de análise que

serviriam para segmentar o espaço e visando nossos objetivos, consideramos que o

modo de análise geográfica mais coerente à compreensão do território é aquela a partir

de relações de poder79

, na perspectiva de Raffestin80

(1993). Assim, quando escrevemos

sobre a concepção de território neste item, estamos nos referindo a um espaço – sem

confundi-lo com o mesmo – definido e delimitado por e a partir de relações de poder,

portanto, relacional. Esta opção se dá pela possibilidade de, por meio da mesma,

compreender os processos de territorialização do modo de produção capitalista e

normatização do território influenciado pelo Grupo BM, que traz em seu bojo relações

de poder que podem ser analisadas, por exemplo, por meio de políticas públicas de

caráter neoliberal, como o PEMH que podem induzir novas práticas produtivas

voltadas à reprodução de capitais. Esta concepção representa, portanto, parte do

próprio processo evolutivo do pensamento geográfico e leva em consideração a

existência de múltiplas concepções de territórios.

A Geografia, tanto a Alemã quanto a Francesa, abordou durante certo período,

o território numa perspectiva clássica de território-nação, ou seja, área fisicamente

delimitada e politicamente controlada por determinado governo (LACOSTE, 2012). A

ideia de território homogêneo era legitimada por essa definição, em que tudo e todos

79

A partir deste ponto, passamos a conceber poder na perspectiva trabalhada por Raffestin (1993)

relacionando este a conflitualidade (FERNANDES, 2009). Neste sentido nos referimos às práticas e as

relações cotidianas da sociedade exercidas sobre uma determinada porção do espaço geográfico que, para

Raffestin (1993), pode ser traduzidas pelo poder, sugerindo suprimir expressões como influência e

autoridade. Assim, o poder é multidimensional, manifestando-se numa relação de força, troca ou

comunicação, entre sujeitos diferentes, gerando campos de poder e, são nestes campos de poder que a

conflitualidade, no sentido proposto por Fernandes (2009) vai se manifestar por meio de conflitos que, em

nosso caso, dizem respeito à concepção de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento territorial rural

sustentável que impõem o uno sobre o diverso, o consenso sobre a crítica e padronização sobre a

variedade. 80

Reconhecemos, assim como Girardi (2016), que a obra de Raffestin (1993) apresenta limitações em

relação a produção do espaço, concebendo este enquanto algo pronto, dado a sociedade. No entanto, não

utilizar esta proposição de Raffestin (1993) não significa a impossibilidade de dialogar com o mesmo a

respeito da abordagem relacional do conceito de território.

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eram igualmente pertencidos e pertencentes, o que possibilitou a formação de modelos

de desenvolvimento regional com foco em determinada área que, por sua vez, reunia um

conjunto de fatores políticos, econômicos e sociais que se buscava mudar (SAQUET,

2007), ou mesmo, manter.

O território era assim apreendido pela sua definição clássica de área delimitada

politicamente, conhecida como abordagem areal (LACOSTE, 2012). Na Geografia

Ratzeliana, de acordo com Moraes (1990) a referência ao uso do conceito de território é

político. Para este autor, Ratzel, o poder de organização de uma área era inteiramente do

Estado (MORAES, 1990), sob este aspecto, Raffestin (1993) assevera que:

Só existe o poder do Estado. Isso é tão evidente que Ratzel só faz alusão, em

matéria de conflito, de choques entre dois ou vários poderes, à guerra entre

Estados [...] A ideologia subjacente é exatamente a do estado triunfante, do

poder estatal. (RAFFESTIN, 1993, p. 16).

O Dictionary of Human Geography (DEREKY et al, 2009), descreve o

território como uma porção do espaço social ocupado e utilizado por diferentes grupos

sociais, ou, o campo de forças exercitado pelas instituições dominantes sobre o espaço.

A unit of contiguous space that is used, organized and managed by a social

group, individual person or institution to restrict and control access to people

and places. Though sometimes the word is used as synonymous with place or

space, territory has never been a term as primordial or as generic as they are

in the canons of geographical terminology (AGNEW, 2009, p. 746).

Tradicionalmente, portanto, o território refere-se à base geográfica de um

Estado, sobre o qual ele exerce sua soberania. Esse conceito de território, que tem

origem na Geografia política e no conceito de espaço vital de Ratzel (MORAES, 1990),

refere-se geralmente a uma circunscrição do espaço através do poder.

No período posterior a Segunda Guerra Mundial, surge à necessidade de se

refletir sobre distintos paradigmas científicos, dentre eles os geográficos, que norteavam

as ciências desde o final do século XIX em relação a concepções de territórios, como

escrevemos anteriormente com base em Quaini (1979), a partir da aceitação de

conceitos e categorias do pensamento marxista pela Geografia, vale lembrar que em

uma perspectiva que leve em consideração os aspectos da mundialização do modo de

produção capitalista:

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Provavelmente, o primeiro grande autor que deu uma ênfase clara à

fundamentação econômica do processo global-desterritorializador foi Karl

Marx. Em seu discurso, a ausência do termo não impede a profunda análise

das formas com que o modo de produção capitalista “desterritorializa” os

modos de produção pré-existentes para reterritorializar segundo sua própria

dinâmica. A expropriação do campesinato, transformado em trabalhador

“livre” em meio a fenômenos como a apropriação privada da terra e a

concentração fundiária, e, no outro extremo da pirâmide social, a velocidade

com que os estratos mais privilegiados da burguesia destroem e reconstroem

o espaço social, sob o famoso dito de que “tudo que é sólido se desmancha no

ar, tudo que é sagrado é profanado”, seriam as referências mais marcantes do

movimento de des-territorialização capitalista (HAESBAERT, 2012, p. 174,

175).

Buscando contrapor o entendimento clássico, e consideramos que

reconhecendo a importância social do geógrafo e da Geografia, Yves Lacoste publica

ainda em 1976, a primeira obra geográfica que busca superar este entendimento,

Lacoste (2012), escreveu:

Em nossos dias, a abundância de discursos que se referem ao aménagement

do território em termos de harmonia, de melhores equilíbrios a serem

encontrados, serve sobretudo para mascarar as medidas que permitem às

empresas capitalistas, principalmente às mais poderosas aumentar seus

benefícios. É preciso perceber que o aménagement do território não tem

como único objetivo o de maximizar o lucro, mas também o de organizar

estrategicamente o espaço econômico, social e político, de tal forma que o

aparelho de Estado possa estar em condições de abafar os movimentos

populares. Se isto é bem pouco nítido nos países há muito industrializados, os

planos de organização do espaço são manifestamente bastante influenciados

pelas preocupações policiais e militares nos Estados em que a

industrialização é um fenômeno recente e rápido (LACOSTE, 2012, p. 30,

itálicos no original).

A partir de então houve a possibilidade de entendimento para a definição de

território diferente da ideia de Estado-Nação, abrindo caminho para uma compreensão

relacional, pois, se o território é mediado pelas relações de poder de determinada classe,

é coerente que haja a contestação desse poder, portanto, relações sociais conflituosas e

heterogêneas que vão além da delimitação física de determinada área e/ou estado

(SAQUET, 2007) e até mesmo da normatização do território como exposto na parte I

desta tese.

Os territórios podem, então, ser entendidos como resultado das relações

sociais, produto social, não mais como elemento natural ou artificial e, tão pouco,

como palco de acontecimentos fisicamente delimitado por normas, distinguindo-se da

abordagem areal, contribuindo para as transformações de antigas definições e

recuperando maior protagonismo, na Geografia, a partir de trabalhos sobre a

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territorialidade (RAFFESTIN, 1993), processos de territorialização e

desterritorialização (OLIVEIRA, 2004; SAQUET, 2007; HAESBAERT, 2012) e

normatização do território (STEINBERGER, 2013) com análises eminentemente

geográficas, vinculadas a dinâmica territorial, integrada a realidade espacial total, onde

se encontram inseridas as complexas dinâmicas de territorialidades81

, entendidas como

processos diferenciadores de múltiplos territórios que coexistem (FERNANDES, 2009)

em um mesmo movimento unitário do processo de produção do espaço.

O espaço e o território são vistos como ligados e indissociáveis. O processo

de territorialização é um movimento historicamente determinado; é um dos

produtos socioespaciais do movimento e das contradições sociais, sob as

forças econômicas, políticas e culturais, que determinam as diferentes

territorialidades, no tempo e no espaço, as próprias desterritorialidades e as

reterritorialidades (SAQUET, 2007, p. 127).

Haesbaert (2012) problematiza a que ponto espaço e território, erroneamente

empregados como sinônimos quando da referência à dimensão geográfica de fatos

sociais, devem ser tratados como concepções distintas, argumentos esses que se

fundamentam, principalmente, a partir da obra de Raffestin (1993), onde espaço é

considerado como categoria analítica, enquanto território, conceito que permitiria maior

precisão na formalização e/ou na quantificação (RAFFESTIN, 1993). Assim, espaço e

território não seriam equivalentes, o primeiro antecedendo o segundo. O território

resulta da produção do espaço, consideração esta que se fundamenta nos escritos

anteriores com base em Lefebvre (2013), e demais autores citados no item 3.1, no qual

espaço é entendido como produzido socialmente, não se tratando de um dado a priori,

uma primeira natureza sobre o qual se desdobra o trabalho humano.

Para Haesbaert (2012), com quem concordamos, ainda que espaço e território

sejam considerados distintos, como propôs Raffestin (1993), eles não podem jamais ser

separados, na medida em que sem espaço não há território: o espaço não como outro

tipo de recorte ou objeto empírico (como expresso na noção de matéria prima

preexistente ainda não apropriada), mas, num olhar epistemológico, com distinto nível

81

Saquet (2007) expressa à territorialidade em termos de relações diárias, um acontecer de todas as

atividades cotidianas e formas de vida, como as relações com a casa, trabalho, família, escola, dentre

outras relações. Trata-se, não obstante, de um processo construtivo de grande complexidade social e de

relações de dominação entre indivíduos e grupos sociais que se desenvolvem em uma parcela do espaço

geográfico. Não se trata aqui de compreender de forma isolada os processos territoriais e os territórios,

mas sim de explicar suas relações causais de existência, seu dinamismo e sua forma de materialização na

realidade (social, política e econômica) da dinâmica espacial, como escreveu Saquet (2007).

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de reflexão, amplo e abstrato cuja problemática se confunde com a dimensão espacial da

sociedade (HAESBAERT, 2012).

Deste modo, o território não é estranho à dialética espacial, porém, apresenta

dinâmicas assimétricas e diferenciadas que respondem a mesma lógica da produção do

espaço e, portanto, na perspectiva que estamos desenvolvendo, do modo de produção

capitalista e, no território, se materializam determinadas relações entre a sociedade e a

natureza por meio, por exemplo, da efetivação de políticas públicas, que fortalecem a

representação específica e singular do espaço geográfico em distintas escalas que

permitem ao capitalismo territorializar-se.

Territorializar-se, desta forma, significa criar mediações espaciais que nos

proporcionem efetivo poder sobre nossa reprodução enquanto grupos sociais

(para alguns também enquanto indivíduos), poder este que é sempre

multiescalar e multidimensional, material e imaterial, de dominação e

apropriação ao mesmo tempo (HAESBAERT, 2012, p. 97).

A formação dos territórios pode ser então concebida a partir da sobreposição de

múltiplas relações de poder das relações econômicas e políticas (RAFFESTIN, 1993;

HAESBAERT, 2012). Mas também no desdobrar do território em espaço percebido,

concebido e vivido. Nessa leitura, avaliamos positivamente que o que aproximaria os

conceitos de território em Haesbaert (2012) e de espaço em Lefebvre (2013) seria a

dimensão política e econômica que os perpassa, ainda que Haesbaert (2012) parta da

dimensão relacional do poder de Foucault82

(1979), no qual este emana de uma

autoridade superior, como o Estado, consideramos manifesto o reconhecimento de que

os territórios são constituídos a partir de relações sociais de poder (RAFFESTIN, 1993).

E é nesta perspectiva que consideramos que o território se constitui elemento

indissociável da produção do espaço e, mesmo que estes representem uma dinâmica

própria em relação à totalidade espacial, estão sujeitos as interelações dialéticas que

predominam na produção do espaço sob o modo de produção capitalista e, assim,

espaço e território interagem dialeticamente onde as partes identificam-se com o todo.

Portanto, a formação dos territórios representa a materialização das práticas conduzidas

por determinado ator sintagmático, portanto, o território se apresenta, também, como

82

A distinção entre estas concepções de poder pode ser explicitada a partir do entendimento de que, para

Foucault a concepção marxista geral do poder se restringe a esfera econômica, pois considera apenas a

funcionalidade econômica do poder onde seu papel é “[...] manter relações de produção e reproduzir uma

dominação de classe que o desenvolvimento e uma modalidade própria da apropriação das forças

produtivas tornaram possível” (FOUCAULT, 1979, p. 124).

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produto social de determinadas relações de poder (RAFESTIN, 1993). De acordo com

Oliveira (2004):

A construção do território é, pois, simultaneamente,

construção/destruição/manutenção/transformação. É, em síntese, a unidade

dialética, portanto contraditória, da espacialidade que a sociedade tem e

desenvolve. Logo, a construção do território é, contraditoriamente, o

desenvolvimento desigual, simultâneo e combinado, o que quer dizer:

valorização, produção e reprodução (OLIVEIRA, 2004, p. 40).

Deste, resulta o território como decorrência da espacialização dialética do

desenvolvimento do modo de produção capitalista e todos seus impactos.

Estes foram como que pré-requisitos para o gradativo processo de

globalização que vai se definir, antes de tudo, pela ruptura de fronteiras, de

limites e condicionantes locais, pela expansão de uma dinâmica de

concentração e acumulação de capital a nível mundial, numa integração e

num cosmopolitismo generalizados (HAESBAERT, 2012, p. 176).

Impactos esses que podem ser compreendidos pelo condicionamento da

produção do espaço ao modo de produção vigente sendo o território igualmente

influenciado pela vinculação entre o poder político e econômico. É sobre a base

territorial que o modo de produção também se torna concreto aos agentes que permitem

realizar a produção e a circulação de capitais.

Se o território é espaço de relações políticas e econômicas, instância de poder,

o próprio processo de estruturação da sociedade – para produzir e consumir – encerra,

também, uma natureza política e econômica. Por conseguinte, os territórios têm por

característica essencial ser dinâmico e contraditório. Sendo assim, podemos considerar

que o território configura-se como produto e condição da reprodução da sociedade, que,

sob o modo de produção capitalista, pode significar reprodução ampliada83

de capital.

Pensando o território nessa concepção, a partir das relações de poder, não

devemos negligenciar a importância dos agentes que o produzem, ou seja, “[...] homens

concretos (os homens em suas conformações de classe social) travando relações

concretas (contradições de classes)” (MOREIRA, 1985, p. 70). Dessa forma, os

territórios compreendem relações de poder que se expressam em nosso período por

uma sociedade que age determinada pelos agentes que controlam a reprodução do

modo de produção capitalista, seja em forma de resistência ou articulação com este,

83

Reprodução ampliada, de acordo com Giussani (2013) significa acumulação de capital.

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seja pelo processo de territorialização do modo de produção capitalista ou pela

normatização do território. Deste, consideramos que, sociedade “[...] não é uma

sociedade de homens iguais: é uma sociedade de classes sociais”. (MOREIRA, 1985, p.

68).

Dessa maneira, o território não existe em si, mas resulta historicamente das

relações sociais de produção no interior da lógica, dinâmica e contraditória, do modo de

produção vigente.

[...] são as relações sociais de produção e a lógica contínua/contraditória de

desenvolvimento das forças produtivas que dão a configuração histórica

específica ao território. Logo, o território não é um prius ou um a priori, mas

a contínua luta da socialização da natureza (OLIVEIRA, 2004, p. 40).

Segundo Raffestin (1993), conforme escrevemos no item anterior, o espaço

antecede ao território. É importante reforçar esta ideia para dar maior significação ao

poder dos agentes que atuam diretamente no controle dos processos de reprodução do

modo de produção capitalista, por exemplo, aqueles que atuam diretamente no que

Harvey (2011) denomina de sete esferas do capital84

. Este processo é o que pode ser

denominado de territorialização do espaço (RAFFESTIN, 1993). Neste caso, para

Raffestin (1993) a humanização da natureza não cria um espaço geográfico ou uma

organização espacial e, sim, um território85

.

O território se forma a partir do espaço, é o resultado de uma ação conduzida

por um ator sintagmático (ator que realiza um programa) em qualquer nível.

Ao se apropriar de um espaço, concreta ou abstratamente (por exemplo, pela

representação), o ator “territorializa” o espaço. [...]. (RAFFESTIN, 1993, p.

143).

Para Lefebvre (2013), em posicionamento oposto a Raffestin (1993), a

territorialização do espaço ocorre na medida em que esse espaço é humanizado, ou seja,

é modificado e contém, por isso, relações de poder que denotam conflitualidades que

84

Para Harvey (2011) as evoluções necessárias para a acumulação e reprodução do modo de produção

capitalista ocorrem por inter-relações entre [...] tecnologias e formas de organização; relações sociais;

arranjos institucionais e administrativos; processos de produção e de trabalho; relações com a natureza;

reprodução da vida cotidiana e da espécie; e concepções mentais de mundo. Nenhuma das esferas é

dominante, e nenhuma é independente das outras. Cada esfera evolui por conta própria, mas sempre em

interação dinâmica com as outras (HARVEY, 2011, p. 104) 85

Daí a diferença do conceito utilizado por Raffestin de território e o conceito de espaço geográfico

utilizado por Lefebvre (2013), Santos (2009), Moreira (1984) e Corrêa (1986), dentre outros, para

denominarem o mesmo objeto de estudo, pois para esses o processo de humanização da natureza cria a

sociedade e sua espacialização é o espaço geográfico, ou organização espacial, que seria a forma

geográfica de estudar a sociedade.

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geram “[...] territorialidades de dominação” (FERNANDES, 2009, p. 87). Isto significa

que as instalações dos fixos e fluxos no espaço, bem como todas as alterações no

processo de organização espacial incitados pelo desenvolvimento do modo de produção

capitalista, como a agroindústria do setor sucroenergético, por exemplo, representam a

territorialização do modo de produção capitalista (OLIVEIRA, 2004) que

desterritorializa camponeses e pequenos produtores rurais.

Sem a pretensão de nos aprofundarmos sobre estes aspectos neste momento,

consideramos importante apenas assinalar, também com base em Harvey (2007, 2013),

que os agentes decisórios que atuam de forma direta no modo de produção capitalista,

como o Grupo BM, possuem aptidão em selecionar territórios para acumulação e

reprodução de capitais, seja por meio do incentivo dos processos de territorialização ou

normatização, como estamos propondo, segundo preferências determinadas articulando-

se em torno de práticas espaciais, hierarquizando deste modo o espaço geográfico, por

meio da seletividade socioespacial (CORREA, 2006).

Deste, emerge a essência da diversidade de territórios “[...] produtores e

produzidos por relações sociais distintas, que são disputados cotidianamente”

(FERNANDES, 2009, p. 197), em uma mesma dinâmica espacial geográfica

multiescalar, onde global e local se tornam evidência e ramificação de relações de

poder. Escrevemos, portanto, sobre uma das principais contradições espaciais do modo

de produção capitalista, ou seja, “[...] tanto la expansión geográfica como la

concentración geográfica se consideran producto de la misma lucha por crear nuevas

oportunidades de acumular capital” (HARVEY, 2007, p. 264).

Desta característica seletiva capitalista deriva a existência de territórios centro

e territórios periferia, obviamente não desde uma referência geográfica, mas sim, da

lógica da acumulação de capital, o que supõe uma acentuação na hierarquização do

espaço mediante a geração de novas centralidades territoriais capitalistas, daí a

diversidade de territórios que podem ser entendidos na distinção entre territórios

empobrecidos e enriquecidos, integrados na organização capitalista do espaço.

De todo, o relevante é que esta relação dialética, entre a universalidade e

particularidade dos fatos, a relação entre as partes e o todo, corresponde à interrelação

atual multiescalar entre o local e o global, que implica o momento recente de expansão

do modo de produção capitalista, no qual este “[...] se estabelece com a consolidação do

território capitalista” (FERNANDES, 2009, p. 201).

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Neste sentido, o centro de acumulação e reprodução de capitais atua na

dispersão do poder global de comando e a periferia como escala de materialização de

poder a nível local, nos referindo a políticas públicas, portanto, a escala se apresenta

como relação de controle social a serviço de políticas hegemônicas de desenvolvimento

territorial rural sustentável “[...] que possuem desdobramentos territoriais evidentes

[...]” (GÓMEZ, 2006, p. 41).

Portanto, é pelo espaço que determinado modo de produção é escrito e

interpretado pelos agentes nos territórios. Buscando interpretar este processo e incluindo

o território como infraestrutura – ou base – para a acumulação e reprodução do modo de

produção capitalista, Oliveira (2004) interpretou em Marx (2011) a questão da renda da

terra86

e apresentou dois conceitos que julgamos essenciais para o entendimento destas

relações de dominação territorial sobre o campo: a territorialização do modo de

produção capitalista e o monopólio do território pelo capital.

Ocorrendo a territorialização do modo de produção capitalista, o território é

produzido pela ação dos agentes em um processo de reprodução material e simbólica,

historicamente, condicionados pela lógica dinâmica e contraditória do modo de

produção capitalista que tende essencialmente a territorialização constante de suas

próprias contradições que, sistematicamente, impõe a concentração, seja dos meios de

produção, da força de trabalho ou dos recursos naturais.

Considerando que esse processo, indeterminado no espaço e no tempo, avança

respaldado por vetores de coesão de poderes (como o Grupo BM) e de fragmentação

(políticas públicas locais, como o PEMH), ele não só estimula a ideia simplista e

reducionista de uma suposta homogeneização do espaço e do território, como autoriza

generalizações apressadas acerca de suas implicações no processo social, portanto,

territorial. Haveria assim, uma relação de complementaridade, dado que a

mundialização avança com a fragmentação, objetivando-se nos territórios seletiva e

contraditoriamente, entabulando disparidades cada vez mais pronunciadas.

O cenário que ora parece afirmar-se sob esta condição de territorialização

capitalista de tendência mundializante é de um descompasso entre as transformações

políticas, econômicas e sociais, realizadas ao mesmo tempo em distintos territórios, o

86

Este conceito se dá partir de Ricardo (1996) que define renda da terra como a parcela do produto total

que fica para o proprietário da terra depois de pagas todas as despesas, de qualquer tipo, referentes a seu

cultivo, inclusive os lucros do capital empregado, estimados segundo a taxa usual e ordinária de lucro do

capital agrícola no período considerado. A renda da terra é o excedente do preço sobre o que é necessário

para pagar os salários do trabalho e os lucros do capital empregados no cultivo da terra.

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que representa a tentativa constante de implementação de uma lógica capitalista em

distintas escalas espaciais e períodos históricos, e as instituições que deveriam ordená-

las, o que, inequivocamente, impõe perturbações entre estas duas instâncias,

pressionadas por demandas de regulação e, entendemos que é preciso esclarecer o que

se territorializa e o outro que se desterritorializa.

Torna-se evidente que as variações histórico-geográficas e a dinâmica

territorial da acumulação capitalista atribuem materialidade ao espaço, conformando

territórios, por isso entendemos a territorialização como relação indissociável da

condição humana (HAESBAERT, 2004). Deste modo, segundo Haesbaert (2004),

podemos conceber a territorialização:

[...] como o processo de domínio (político-econômico) e/ou de apropriação

(simbólico-cultural) do espaço pelos grupos humanos. Cada um de nós

necessita, como um “recurso” básico, territorializar-se. Não nos moldes de

um “espaço vital” darwinistaratzeliano, que impõe o solo como um

determinante da vida humana, mas num sentido muito mais múltiplo e

relacional, mergulhado na diversidade e na dinâmica temporal do mundo

(HAESBAERT, 2004, p. 17, aspas no original).

Atendendo a esta concepção da construção social do território, no espaço

produzido sobre influência do modo de produção capitalista o que se territorializa é a

própria lógica deste modo de produção com o objetivo de facilitar a circulação de

capitais e a criação de oportunidades de acumulação e reprodução.

Ainda que, da mesma forma, se territorializem crises como partes de um

mesmo processo dialético. A territorialização de determinadas dinâmicas nas quais

estão inseridas pessoas, coletivos ou classes sociais que possuem a propriedade de

capitais e se beneficiam de sua vocação de acumulação, implica, potencialmente, a

desterritorialização de outras.

Como é o caso dos processos nos quais estão inseridas as indústrias do setor

sucroenergético, neste sentido, conforme escreveu Oliveira (2004), quando o modo de

produção capitalista se territorializa:

Capitalista da indústria, proprietário de terra e capitalista da indústria têm um

só nome, são uma só pessoa ou uma só empresa, Para produzir, utilizam o

trabalho assalariado dos bóias-frias que moram/vivem nas cidades. [...] ele

varre do campo os trabalhadores, concentrando-os nas cidades, quer para ser

trabalhadores para a indústria, comércio ou serviços, que para ser

trabalhadores assalariados no campo (bóias-frias). Nesse caso, a lógica

especificamente capitalista se instala, a reprodução ampliada do capital se

desenvolve na sua plenitude. O capitalista/proprietário da terra embolsa

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simultaneamente o lucro da atividade industrial e da agrícola (da cultura da

cana, por exemplo) e a renda da terra gerada por essa atividade agrícola. A

monocultura se implanta e define/caracteriza o campo, transformando a terra

num “mar” cana, de soja, de laranja, de pastagem etc. (OLIVEIRA, 2004, p.

42, aspas no original).

Assim, territorialização e desterritorialização se encontram entrelaçadas a partir

de numerosas referências que permitem a configuração do espaço por e para a lógica de

expansão territorial do modo de produção capitalista e derivam da dinamização de

fluxos financeiros, comerciais e de circulação de capitais sem necessidade de

materialização física, seja dos agentes envoltos neste processo, seja do próprio capital

(CAMACHO, 2012).

A territorialização do modo de produção capitalista pode ser representada pela

liberalização econômica e privatização de serviços sociais públicos; a despolitização e

minimização das responsabilidades estatais; deslocação e flexibilização do trabalho

produtivo; tomada de decisões políticas e econômicas globais com efeitos

socioespaciais em diferentes escalas; guerras imperialistas; migrações forçadas;

contenção territorial; expulsão de comunidades campesinas, indígenas, ribeirinhas,

quilombolas; a configuração de redes de cidades com novos nós e pontos (RAFESSTIN,

1993) estratégicos para a acumulação de capital (bolsas de Tókio, Londres, Paris, São

Paulo ou Nova York), lugares que mudam sua feição em relação à conjuntura de uma

economia mundializante onde a tomada de decisões políticas e econômicas são geradas

em locais distantes donde seus resultados incidem (ARRIGHI, 2014) e outras tantas

realidades desse admirável mundo novo87

de mundialização do modo de produção

capitalista.

Neste sentido o termo desterritorialização, em relação à abordagem relacional

de território, faz alusão à volatilidade do modo de produção capitalista e toda a

influência decorrente desse processo, no qual a noção de poder está intimamente

relacionada. O modo de produção capitalista territorializa suas próprias contradições de

acumulação de capital, adquirindo uma dinâmica que, potencialmente, desterritorializa

até mesmo o ser de sua própria natureza, alienando-o, convertendo o ser humano ao

patamar de homo economicus, uma concepção que não é compartilhada por todos

agentes sociais que compõem a realidade.

87

Parafraseando Aldous Huxley.

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[...] todo o esforço que o homem vinha desenvolvendo até o capitalismo para

dominar a natureza, para plasmar o mundo natural a sua feição, para dar uma

feição humana aos objetos naturais, é invertido e negado pelo

estabelecimento da relações capitalistas de produção. Dentro do todo

constituído por estas relações de produção, o homem é assimilado a um

mundo de coisas (de vez que as próprias relações inter-humanas, no plano

geral da sociedade, assumem a feição de coisas). E as coisas a cujo mundo o

homem é assimilado, ao se tronarem diretoras do movimento da história e da

atividade humanas, se desindividualizam e perdem as suas qualidades

concretas ante os olhos dos homens, compondo um mundo desprovido de

existências singulares, um mundo indiferenciado, um mundo desumano, onde

o humano – especificamente humano – se vê triturar e inapelavelmente diluir

(KONDER, 2009, p. 146).

Por tanto, consideramos que quando Haesbaert (2012) estuda o processo de

desterritorialização na época contemporânea, entende que este obedece ao processo de

exclusão social, ou melhor, de exclusão socioespacial (HAESBAERT, 2012) dentro de

um contexto histórico e geográfico mundializado, onde existem elementos básicos de

territorialização e desterritorialização.

Especificamente em relação ao processo de normatização dos territórios rurais,

Steinberger (2013) explicou que:

O Estado, junto com os agentes e os atores sociais que os representam, detém

o poder de intervir não sobre o território em si, e sim sobre como o território

é usado. Esse poder de intervenção está ligado ao fato de as políticas públicas

mais do que implementadas no território, indicam, direcionam e redirecionam

os usos do território, evidenciando o potencial político da categoria “território

usado” (STEINBERGER, 2013, p. 63, aspas no original).

Na materialidade, podemos compreender o processo de normatização do

território pelos agentes capitalistas nas formas impostas pelo Grupo BM em relação à

implementação e formas de execução de determinadas políticas públicas, como a aqui

estudada – o PEMH –, pois, o Estado, ao aceitar as recomendações técnicas do Grupo

BM submete trabalhadores rurais a relações de subordinação, ainda que de forma

indireta devido ao apelo humanitário e genérico que o desenvolvimento sustentável traz

em seu bojo, como veremos na parte III desta pesquisa.

Deste modo, Estado e Grupo BM se tornaram parceiros na expansão do modo

de produção capitalista, pois: “O Estado é essencial para o desenvolvimento econômico

e social, não como promotor direto do crescimento, mas como parceiro, catalisador e

facilitador” (Grupo BM, 1997, p. 1).

Logo, e não contraditoriamente, faz-se necessário colocar que, neste caso o

território em evidência é um território capitalista, ou seja, permanecem as relações de

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dominação, subordinação e espoliação. Neste sentido o território se constitui como uma

fração apropriada e controlada por agentes externos, deste modo, o modo de produção

capitalista não se territorializa, mas sim, adéqua aos seus interesses a renda da terra

gerada, e posteriormente a renda do trabalho não pago da unidade familiar, que é

sorvido e subordinado às necessidades e aos interesses do capital.

Assim, a concepção de território área e normatizado aqui apresentado se

aproxima, mas não se confunde a monopolização do território que é efetuada por

empresas e conglomerados agroindustriais na compreensão teórica de Oliveira (2000),

que significa que “[...] o capital monopoliza o território sem, entretanto, territorializar-

se, criando e se recriando, definindo e se redefinindo nas relações de trabalho e

produção camponesa”, sujeitando a renda da terra ao capital. (OLIVEIRA, 2000, p.

478).

Para fundamentar esta teoria, o autor citado baseia-se na acumulação primitiva

continuada88

de Rosa Luxemburgo (1988), entendendo que no processo produtivo, os

capitais estão envolvidos em dois processos distintos: na reprodução do capital, através

do trabalho assalariado, e na produção do capital com a sujeição da renda da terra

gerada através do trabalho familiar camponês (LUXEMBURGO, 1988). “O capitalismo

é, em si, uma contradição histórica viva; seu movimento de acumulação expressa a

contínua resolução e, simultaneamente, a potencialização dessa contradição”

(LUXEMBURGO, 1988, p. 87).

Ao tratarmos da monopolização do território pelo modo de produção capitalista

consideramos importante evidenciar que, na atualidade, este processo se desenvolve

atrelado a mundialização do capitalismo que, ao se desenvolver, permite sua reprodução

de forma ampliada, desigual e contraditória no espaço produzindo territórios que,

embora específicos nos lugares, estão articulados com o seu movimento mais geral.

A mundialização assumiu, portanto, as características básicas do capitalismo

monopolista no final do século XX, integrando o capital na escala mundial,

88

Luxemburgo (1988) expande conceitos marxianos como valor e mais-valor oferecendo uma

interpretação diferente da costumeira sobre a produção de valor em sociedades capitalistas e alertando

para que o sistema de produção capitalista – que não se constitui apenas de capitalistas e trabalhadores – é

um sistema aberto que se vê sempre às voltas com o problema da reprodução da sociedade como um todo.

Assim, o conceito de acumulação se desprende ainda mais das ideias de dinheiro, riqueza e concentração

para se definir enquanto mecanismo abstrato de exploração de classes, o que significa que a exploração

capitalista pode dispor de diferentes meios para acumular, tanto de maneira especificamente capitalista –

como na exploração do trabalho assalariado, dos mecanismos de remuneração do capital etc – quanto sob

formas essencialmente espoliativas que em O Capital (MARX, 2013) aparecem ligados à ideia da

Acumulação Primitiva.

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criando as empresas mundiais. Ou seja, a ordem é produzir em "qualquer

lugar do mundo" onde as possibilidades de redução de custo e acesso ao

patamar tecnológico vigente seja possível. Sua hegemonia se deu pelo

processo de consolidação dos oligopólios internacionais denominados

empresas multinacionais, sejam elas cartéis, trustes ou monopólios industriais

e/ou financeiros. Esse processo histórico teve como sujeitos principais, a

emergência dos Estados Unidos como praticamente, única potência militar e

econômica no mundo (OLIVEIRA, 2012, p. 3, aspas no original).

Sendo assim uma manifestação concreta do processo contraditório de

desenvolvimento das forças produtivas do capitalismo, o território não se apresenta

então, como algo isolado, e pode ser entendido como:

[...] síntese contraditória, como totalidade concreta do processo/modo de

produção/distribuição/consumo e suas articulações e mediações

supraestruturais (políticas, ideológicas, simbólicas, etc.) onde o Estado

desempenha a função fundamental de regulação. É, pois, produto concreto da

luta de classes travada pela sociedade no processo de produção de sua

existência [...]. Desta forma, são as relações sociais de produção e o processo

contínuo/contraditório de desenvolvimento das forças produtivas que dão a

configuração histórica específica ao território (OLIVEIRA, 2004, p. 72).

Neste contexto, entendemos então que o território, produto concreto da luta de

classes, manifesta-se em suas várias configurações territoriais. Desta forma, as relações

impostas pelo Grupo BM constitui expressão deste processo. Para compreender o

processo de normatização do território pelo modo de produção capitalista, é preciso

entender este processo à luz das transformações políticas, econômicas e territoriais

ocorridas, onde o Estado, ainda desempenha importante papel, no que se refere à

determinação de políticas públicas de desenvolvimento territorial rural sustentável89

.

Consideramos ainda que, em relação à normatização do território, o Grupo BM

vem atuando nesta perspectiva de várias formas. Como escrevemos no capítulo 1, sua

influência perpassa as esferas políticas e econômicas e, por meio de financiamentos,

facilitam esse processo com anuência do Estado que, apesar da aparente neutralidade

atende a interesses internacionais ao mesmo tempo em que procura prestigiar os

interesses conflitantes através de políticas que atendem aos interesses hegemônicos que,

conforme escreveu Paulino (2010):

89

Nesse sentido, na parte III desta pesquisa, buscaremos compreender as transformações territoriais a

partir do processo de normatização do território pelo capital financeiro na agricultura, tendo por base a

ação territorial do Grupo BM que financiou o PEMH e que, na teoria, funcionaria como estratégia de

desenvolvimento territorial rural sustentável.

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[...] é uma ficção ao gosto das classes dominantes, porque a apropriação

desigual da riqueza requer o mínimo de consenso e esse se constrói no plano

ideológico, transformando conveniências de classe em verdade para toda a

sociedade. É por isso que associar o Estado à busca do bem comum é ignorar

sua profunda vinculação com os interesses hegemônicos de um dado

momento histórico, em torno dos quais emergem projetos de gestão pública

que não são meramente econômicos, mas sim territoriais, porque impõem

determinadas correlações de forças que darão o tom das assimetrias.

(PAULINO, 2010, p. 119).

Ponderamos ser importante destacar que a maior parte das ações de

financiamento realizadas pelo Grupo BM são ações que visam o controle fazendo uso

concomitantemente da territorialização do modo de produção capitalista e da

normatização do território. Constata-se ainda, de acordo com Porto-Gonçalves (2015),

o interesse na disponibilidade de recursos naturais e é neste sentido que consideramos

a relevância do processo de normatização do território, como no caso de nosso objeto

de estudo, pois não ocorre a desterritorialização das famílias de produtores rurais.

O controle do território coloca-se como fundamental para garantir o

suprimento da demanda sempre em ascensão por recursos naturais, apesar

dos avanços assinalados dos novos materiais. [...] Assinalemos que a

natureza com suas qualidades – a vida e os quatro elementos, terra, ar, água e

fogo – é o que se oferece a apropriação da espécie humana, o que se dá por

meio da cultura e da política. Tornar própria a natureza é, rigorosamente, se

apropriar da matéria na sua espaço-temporalidade, conformando territórios

diversos cujos limites, essência da política, resolvem temporariamente, como

a história da geografização do mundo revela (PORTO-GONÇALVES, 2015,

p. 287, grifos originais).

Portanto, a normatização do território está intimamente relacionada à

apropriação, uso e controle de recursos naturais como estratégia de expansão territorial

do modo de produção capitalista.

Cabe esclarecer que ambos os processos aqui tratados, a territorialização do

modo de produção capitalista e a normatização do território podem acontecer de forma

concomitante, porém, com resultados diversos devido a suas características próprias.

Como exemplo identificamos no mapa 5 programas financiados pelo BIRD (Banco

Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento) e IDA (Agência Internacional de

Desenvolvimento) – ambas as agências internacionais de fomento que fazem parte do

Grupo BM –, como instrumento para demonstrarmos aonde esta agência vem atuando e

garantindo a potencialidade da acumulação e reprodução do modo de produção

capitalista no espaço rural brasileiro pela subordinação da terra.

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Mapa 5: Programas financiados por agências multilaterais no Brasil em 2014

Fonte: SOBREIRO FILHO, José; WHIRACKER, Guilherme Magon (2014)

Organizador: José Sobreiro Filho (2014)

É fundamental destacar que a maior parte das ações são realizadas em áreas de

concentração de pobreza; expansão do agronegócio; quantidade de mão-de-obra barata;

produção para exportação (BONANNO; CAVALCANTI, 2011) e recursos naturais

pouco utilizados e em abundância, como, por exemplo, o Aquífero Guarani; associados

ainda a mega- projetos como, por exemplo, a transposição do Rio São Francisco no

nordeste brasileiro (SOBREIRO FILHO; WHITACKER, 2014).

Outro elemento importante relacionado a relações de poder, portanto a

territorialização do modo de produção capitalista, é demonstrado no mapa 6. Neste

identificamos os territórios onde o conflito contra a subordinação da terra ao modo de

produção capitalista tem se tornando mais acentuados. Notamos que, aonde existem

projetos financiados pelo Grupo BM (BIRD; IDA) existe uma maior concentração de

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ocupações de terras pelos movimentos sociais de luta pela terra (SOBREIRO FILHO;

WHITACKER, 2014).

Mapa 6: Brasil. Ocupação de terras – 1988-2012

Fonte: SOBREIRO FILHO, José; WHIRACKER, Guilherme Magon (2014)

Organizador: José Sobreiro Filho, 2014

Podemos, portanto, a partir das considerações apresentadas, relacionar a

disputa territorial existente entre dois modelos de desenvolvimento que possuem como

discurso central a preocupação com a preservação de recursos naturais, porém,

abordando o mesmo tema por enfoques diferenciados. O primeiro, financiado e

articulado pelo Grupo BM baseia-se na subordinação, acumulação e expansão do modo

de produção capitalista sem considerar seus impactos sociais e naturais; por sua vez o

segundo, tendo como protagonistas os movimentos sociais de luta pela terra, incorpora

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aquela dimensão – a consideração sobre os impactos sociais e naturais da expansão do

modo de produção capitalista – em suas táticas e ações.

Buscando demonstrar a realização conflitante e concomitante dos processos de

territorialização do modo de produção capitalista, normatização do território e disputas

territoriais elaboramos o mapa 7.

Mapa 7: Ocupações de terras e programas financiados pelo Grupo BM (BIRD, IDA)

Fonte: SOBREIRO FILHO, José; WHIRACKER, Guilherme Magon (2014)

Organizador: José Sobreiro Filho, 2014

Através de sua interpretação, podemos verificar que em alguns locais aonde o

Grupo BM atua ocorrem os maiores conflitos pela forma de uso, legitimidade jurídica,

controle e monopólio de terras e recursos naturais. Considerando os recursos naturais

como fonte vital para a permanência de atividades agrícolas e pecuárias e estratégica

para a expansão da produção, ponderamos que a maior territorialização do modo

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capitalista e normatização do território reforça as ações contra hegemônicas que se

apresentam como resistência a estas práticas, tendo em vista que os movimentos

socioterritoriais de luta pela terra expressam seus anseios por meio de manifestações e

ocupações estrategicamente localizadas.

Assim, os agentes atuantes no controle do modo de produção capitalista

incorporam terras por distintas formas, seja fazendo uso de arrendamentos ou

controlando os processos de produção e circulação de mercadorias subordinando

pequenos produtores capitalistas as relações de dominação territorial, expressas pelas

relações de poder, onde o Estado, no caso de políticas públicas, atua com

consentimento.

Salientamos que isto remete ao processo anteriormente citado de

descentralização de políticas públicas que resultou em um conjunto de ações na

rearticulação de forças conservadoras que realinham seus interesses na debilidade dos

governos trabalhistas e na capitulação de suas lideranças políticas via discurso

desenvolvimentista que avançou vertiginosamente com as transformações no

ordenamento jurídico brasileiro, desde os mandatos de Fernando Henrique Cardoso e as

diversas emendas constitucionais90

, que atingiram elementos fundamentais da

democracia brasileira e que têm viabilizado os processos de normatização do território

(STEINBERGER, 2013).

Desta forma, a leitura territorial não deve deflagrar visões da realidade em

purismos que pouco auxiliam na compreensão da complexa trama territorial envolta nas

esferas políticas e econômicas, pois determinadas políticas públicas, por exemplo,

vislumbram autonomias que são sempre relativas, em virtude de o sociometabolismo do

modo de produção capitalista91

instalar-se em múltiplas dimensões da vida em

sociedade, desta forma, consideramos que exista uma territorialização do modo de

produção capitalista no caso da expansão do setor sucroenergético, conforme tratamos

no item 2.1 e uma normatização do território, no caso do PEMH que, devido a sua

característica de política pública compensatória pode propiciar à expansão das relações

capitalistas de produção no campo, ambas perspectivas que, por meio das

recomendações do Grupo BM a partir da proposta de incorporação da perspectiva

90

Ver, por exemplo, Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012 (Código Florestal Brasileiro) e, Oliveira

(2010). 91

Nos dedicaremos com atenção ao sociometabolismo do modo de produção capitalista no item 4.2 desta

pesquisa.

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territorial e sustentável permitem a reprodução do modo de produção capitalista, como

verificaremos na parte III desta pesquisa.

Assim, o território sempre carecerá de constante revisão histórica e geográfica,

bem como política e econômica, sua compreensão deve se pautar em seu uso, isso

propõe uma abordagem multidimensional e também multiescalar. Deste modo,

consideramos que o principal elemento que move sua base de explicação são as relações

sociais mediadas pelo poder, pois, “[...] o exercício do poder e processos de

territorialização são coisas indissociáveis [...]” (SOUZA, 2013, p. 291), seja o território

enquanto área, rede, material, simbólico, integrado e seu movimento indissociável de

territorialização, desterritorialização e reterritorialização, também multidimensional e

multiescalar.

Entendemos então, os territórios, a territorialização do modo de produção

capitalista e a normatização do território como produtos, ou seja, constituídos na

totalidade das relações sociais que envolvem múltiplas formas de poder subjacentes ao

modo de produção capitalista atuando no espaço geográfico. Porém, de forma geral, há

um predomínio do poder econômico e político como condicionante principal dessas

relações.

Dessa maneira, apesar de considerarmos que o poder está impregnado no

tecido social, perpassando todas as relações humanas, a conexão entre o poder

econômico e o político é a essência dos territórios. Os processos de territorialização,

desterritorialização e normatização do território representam continuidade de expansão

do modo de produção capitalista. Daí, consideramos pertinente uma análise sobre a

dinâmica deste modo de produção que, historicamente, se desenvolve entre períodos de

estabilidade e oscilação.

Capítulo 4. Entre crises e ciclos: a dinâmica do modo de produção capitalista e a

falha sociometabólica

O estudo da dinâmica do modo de produção capitalista é o das fases históricas

desde o período da acumulação primitiva (SWEEZY, 1982; MARX, 2013). Neste

processo de desenvolvimento a dinâmica espacial ganha relevância na medida em que

se coloca como necessária a reprodução do modo de produção capitalista indicando a

necessidade de mobilidade espacial e materialidade territorial nos momentos de

estruturação do capitalismo, deste modo esta análise nos permite explicar os meios

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pelos quais a desigualdade da reprodução do modo de produção capitalista se estende a

incorporação do desenvolvimento sustentável e, entender esse processo nos permite

analisar e verificar como o capitalismo vem se reproduzindo com base no

desenvolvimento sustentável, seja por financiamento de projetos, programas ou políticas

públicas para o desenvolvimento do campo.

Neste capítulo, escrevemos sobre as crises do modo de produção capitalista

como parte integrante de sua espacialização e territorialização. Um processo histórico e

geográfico (HARVEY, 2011) que permite a criação de novos espaços de reprodução

capitalista subordinados às necessidades gerais das relações sociais de produção que o

constituem e que possuem uma lógica interna de transformação que permita superar

momentos de crise, portanto, dinâmica é a forma de reorganização das relações internas

deste modo de produção enquanto sistema (BOMTEMPO, 2012).

Desta, ponderamos que o desenvolvimento do modo de produção capitalista

não corresponde a comportamentos lineares e contínuos nos quais setores modernos vão

paulatinamente tomando o lugar de atividades tradicionais levando ao crescimento

econômico, tal como é estabelecido nas teorias de base dualista92

que há muito foram

questionadas pelo pensamento crítico latino-americano (OLIVEIRA, 1981, TAVARES,

1971).

O modo de produção capitalista, movido pela acumulação e reprodução, além

de incorporar espaços e territórios de forma desigual e combinada (TROTSKY, 1985)

no qual as atividades com níveis elevados de produtividade e conteúdo tecnológico

crescem ao lado das atividades econômicas periféricas, cria e recria suas próprias

condições de desenvolvimento de acordo com a reprodução de suas próprias

contradições (MARX, 2013).

92

“Concepção segundo a qual as economias encontram-se divididas em dois setores que de certa forma se

opõem, como, por exemplo, a indústria e a agricultura, ou um setor moderno e um arcaico, um avançado e

outro atrasado, um rural e outro urbano. Esta concepção origina-se em Malthus (Thomas Robert, 1766-

1834), o qual considerava a economia constituída de dois setores: a agricultura e a indústria. Essa

metodologia era utilizada para facilitar a compreensão do todo. No Brasil, o dualismo desenvolveu-se a

partir dos anos 50 com as concepções estruturalistas (os Dois Brasis ou o Dualismo Estrutural), sendo que

as estruturas atrasadas do meio rural seriam um impedimento ao desenvolvimento dos setores dinâmicos

como a indústria, na medida em que não eram capazes de proporcionar alimentos e matérias-primas

baratas para a indústria, provocando de um lado a inflação (oferta inelástica de alimentos) e de outro uma

pressão sobre as importações desses produtos, contribuindo para os déficits comerciais. A solução seria a

reforma agrária, para quebrar essa estrutura arcaica, modernizando-a” (SANDRONI, 1999, p. 189).

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Portanto, a lógica que motiva este processo não é a da dualidade que se explica

pela lógica formal, mas sim a lógica dialética93

que permite elucidar as contradições das

relações sociais capitalistas.

Ponderamos válida esta análise da dinâmica do modo de produção capitalista,

pois esta pode ser caracterizada, dentre outras formas, pelo esforço permanente de

superação do espaço pelo tempo, como escreveu Harvey (2005), “[...] o imperativo da

acumulação leva ao imperativo da supressão da barreira espacial pela redução do tempo

de circulação do capital” (HARVEY, 2005, p. 50), isto pressupõe o arranjo institucional

de agências de fomento internacional que controlam esse processo em uma escala global

e materializam suas ações, de diversas formas, em escala local.

4.1. A dinâmica espacial e territorial do modo de produção capitalista

Como escreveram Marx e Engels (2007) o “[...] capital necessita estabelecer-se

em toda a parte, explorar em toda a parte, criar vínculos em toda parte” (MARX;

ENGELS, 2007, p. 97). Consideramos que a reprodução do capitalismo adquire formas

diversas em diferentes momentos históricos superando crises e se expandindo em ciclos,

devendo se readequar a mudanças globais se reorganizando para garantir a produção

sobre novos eixos de acumulação e, ou, novos valores de uso. Por este motivo,

reiteramos que movido pela lógica da valorização, o capitalismo destrói, cria e recria

espaços numa dinâmica marcada por avanços e retrocessos contraditórios e cíclicos,

próprios da natureza deste modo de produção.

Portanto, por dinâmica espacial e territorial do modo de produção capitalista

consideramos a potencialidade de mobilidade, marcada por contradições, que são

superadas ainda dentro da lógica de valorização do capital pela reprodução capitalista

através da incorporação de novos espaços, bem como do aprofundamento da

exploração, tanto de recursos naturais quanto humanos.

Deste, evidencia-se que a materialidade espacial e territorial do modo de

produção capitalista utilizada para a análise da realidade social nos permite identificar o

movimento das relações sociais, por este motivo, a reprodução ganha respaldo quando

93

No sentido proposto por Konder (2011) que, com base em Lefebvre (2005), considera a lógica dialética

não somente como a realidade social em sua dimensão histórica, mas também a teoria do conhecimento

como história da prática social, o resultado vivo da experiência humana vinculada a concepção racional

da história. (KONDER, 2011).

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vinculada a maneira como o ser humano, vivendo em sociedade, produz e reproduz

espaços e territórios, sendo esse um processo contínuo (BOMTEMPO, 2012).

O reproduzir permite a continuidade deste processo, tornando-o diretamente

relacionado à dinâmica da vida social, remete-nos, portanto, à dinâmica da acumulação

capitalista, fonte de contradições e conflitos reproduzidos no espaço e no território e a

partir destes.

La dinâmica, sin embargo, es etimológicamente el estudio de las fuerzas. Ha

de construirse una “temporalidad” que sea la característica de un

movimiento. El estudio de un movimiento es el de los cambios de estado.

Para poder hablar de un sistema dinámico es menester que las relaciones que

constituyen el sistema tengan una lógica interna de transformación.

Considerar la regulación de un sistema que se transforma es suponer que las

transformaciones que se producen en las relaciones identificadas (y que

constituyen, por lo tanto, procesos o relaciones en movimiento) son tales que

siempre es posible concebir una organización de las relaciones en cuanto

sistema (AGLIETTA, 1979, p. 3, aspas no original).

Para Mészáros (2012a), o que caracteriza a dinâmica do modo de produção

capitalista hoje é sua incontrolabilidade e irreformabilidade, ou seja, a forma como o

capital se reproduz como sistema organizador da sociedade sem que se possa, de forma

consciente e autônoma, por parte dos indivíduos ou de coletivos organizados em escala

local, frear o processo degradante vinculado a mundialização da reprodução de capitais.

Por esse motivo, Horkheimer (2000) já ha tempos, escreveu que o capitalismo

é um sistema totalitário, pois estrutura dimensões pragmáticas da vida dos indivíduos

(sobretudo a produção da própria existência) e por criar racionalidades baseadas na

lógica instrumental.

Karl Marx e Friedrich Engels, ao longo de seus trabalhos, registraram a

mutabilidade incessante dos fatos e da sociedade como um todo orgânico e,

principalmente Marx (2013), transmite esta relação ao permanente movimento

contraditório do capitalismo demonstrando que este sistema situa a produção de riqueza

no centro das relações sociais, alterando sua dinâmica e afirmando a mutabilidade do

existente.

Marx (2013) critica radicalmente a suposta estabilidade da sociedade com base

no estudo sobre o desenvolvimento histórico do modo de produção capitalista

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reconhecendo a existência de crises sistêmicas, caracterizadas, naquele período, como

crises de superprodução94

(MARX, 2011, 2013).

Marx (2013), ao escrever sobre o processo de produção do capital, desenvolve

sua teoria sobre as crises sinalizando a ocorrência destas devido principalmente a um

momento de superprodução, no momento em que a oferta de trabalho se encontrava no

ponto máximo e os salários no patamar mais alto possível, portanto, no momento em

que, supostamente, ocorre grande circulação de dinheiro, a recessão e a depressão se

apresentavam, portanto, as crises eram devidas a uma superprodução de capital fixo

(equipamentos, máquinas, instalações, por exemplo) e, consequentemente, uma

superprodutividade relativa de capital circulante (aquele destinado a aquisição do

anterior).

De acordo com Marx (2013), as crises não se seguiam a uma queda de

consumo, o subconsumo na economia capitalista existe, de acordo com Marx (2013) em

estado crônico, uma vez que a exploração da mais-valia impossibilita ao operário a

aquisição do produto de seu trabalho no mercado, mas sim, de acordo com um processo

cíclico95

.

Portanto, entendemos que a aproximação à teoria dos ciclos é possível com a

reunião de menções de Marx sobre as crises e levando em consideração ainda a

oposição, do autor citado, à Lei de Say96

, pois, para Marx (2013), a demanda não

94

Principalmente a partir do Grundrisse (MARX, 2011) Marx desenvolve sua teoria sobre as crises do

modo de produção capitalista dedicando atenção, naquele momento, as crises de superprodução, que, para

o mesmo, parte da relação entre a circulação de produtos, e não da produção em geral, tendo como

efetivação da circulação o dinheiro. “Portanto, se o produto ofertado é invendável, isso é prova de que se

produziu muito da mercadoria ofertada e pouco da mercadoria que o ofertante demanda. Logo, não

haveria superprodução geral, mas superprodução de um ou alguns artigos e subprodução de outros. Com

isso, mais uma vez se esquece que aquilo que exige o capital produtivo não é um valor de uso

determinado, mas valor por si, portanto, dinheiro – dinheiro não na determinação de meio de circulação,

mas como forma universal da riqueza, ou forma de realização do capital, de um lado, e retorno ao seu

estado dormente original, de outro. No entanto, a afirmação de que foi produzido pouco dinheiro nada

mais significa, de fato, que se afirmar que a produção não coincide com a valorização, logo, que é

superprodução, ou, o que dá na mesma, que ela não é convertível em dinheiro, produção não convertível

em valor; que não se confirma na circulação.” (MARX, 2011, p. 336) 95

Essas informações estão distribuídas ao longo dos vários capítulos que compõem sua obra principal,

encadeados como um desenvolvimento lógico a partir dos aspectos fundamentais da política econômica

capitalista, identificados desde o Manifesto do Partido Comunista, onde Marx observa características das

grandes empresas para driblar momentos de crises e evidencia o caráter cíclico do modo de produção

capitalista; nos Grundrisse, apresenta elementos primários sobre a teorização das crises que permitem

uma aproximação sobre a teoria dos ciclos do capitalismo, argumentação que irá se tornar mais sólida, em

sua obra seminal, O Capital; no Livro I, onde se dedica ao processo de produção e no Livro II, sobre o

processo de circulação. 96

Sob a perspectiva da economia política clássica, na “Lei de Say” haveria um equilíbrio natural entre

produção e demanda, ou seja, a produção criaria sua própria demanda, sendo que qualquer desequilíbrio

só poderia vir de fora do sistema, da mesma forma que, de acordo com a mecânica clássica, os corpos se

encontrariam em equilíbrio até que uma força exterior lhes demovesse deste estado (COGGIOLA, 1982).

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necessariamente se iguala à produção, mais ainda, a produção tende naturalmente a ser

maior que a demanda, fato que, ocasionaria as crises de superprodução e acumulação e,

posteriormente, revelaria o aspecto cíclico do modo de produção capitalista.

É fato, portanto, que durante o seu processo de desenvolvimento, o modo de

produção capitalista passou por diversas fases e superou três grandes crises econômicas;

a primeira em 1873 – a crise de sobreprodução; a segunda em 1929 – período que ficou

marcado como fase da Grande Depressão; já a terceira tem início na década de 1970 e,

para autores como Harvey (2011, 2013), Mészáros (2009, 2012) e Coggiola (2009),

entre outros, se estende até a contemporaneidade.

Sobre as crises, Marx, ao estruturar O Capital (MARX, 2013), inicia o estudo

do modo de produção capitalista por sua manifestação mais elementar, a mercadoria.

Partindo da contradição essencial presente neste primeiro item97

, o autor amplia sua

teoria seguindo de uma perspectiva abstrata para o real.

Em movimentação análoga, a contradição básica se estende também da

abstração para o concreto e, ao fim, transparece o caráter contraditório do sistema que

explica a possibilidade de ocorrência de crises: a decorrência de uma relação social em

que a produção é feita para troca, e não para aplacar as necessidades sociais.

Bottomore (2013) escreveu que crise é um processo que pode ser considerado

como geral ou parcial; o primeiro corrompe as relações políticas e econômicas de

reprodução levando a sociedade ao colapso, é, portanto, denominada crise da sociedade

capitalista; o segundo demonstra os limites e a necessidade de readaptação do

capitalismo frente ao processo de acumulação e reprodução, demonstrando

características de crises que se repetiriam no desenvolvimento histórico da economia

capitalista, este processo, é considerado como crise econômica.

Visando nossos objetivos concordamos com Bottomore (2013) e analisamos as

crises sob o enfoque de crise econômica, pois, esta opção nos permite entende-las como

eventos potencializadores da formação de novos espaços para acumulação e reprodução

do modo de produção capitalista, esta opção se desenvolve a partir do trabalho,

principalmente, de David Harvey (2005, 2011, 2013).

Optamos por esta perspectiva por estarmos considerando a possibilidade de

readaptação do modo de produção capitalista frente a suas próprias contradições

(re)criando espaços de acumulação e reprodução.

97

Sobre esta contradição, referimo-nos ao que Marx esclarece sobre o processo de troca de mercadorias, a

qual inclui relações contraditórias sobre o valor de uso e o valor de troca (MARX, 2013).

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Para considerarmos as crises nesta perspectiva, concordamos com Harvey

(2005) que escreveu sobre a natureza e desdobramentos das crises no modo de produção

capitalista com base nos estudos de Karl Marx, afirmando que este possui em seu

âmago uma diacronia histórica e geográfica que permite sua constante espacialização

por meio de ciclos, fato este que demonstra suas características de mutabilidade

(MARX; ENGELS, 2007, MARX, 2013; ENGELS 2015) e irreformabilidade

(MÉSZÁROS, 2007, 2012).

Estas características – mutabilidade e irreformabilidade – vão permitir a

agências internacionais articuladas na reprodução e expansão deste modo de produção,

como o Grupo BM, adequar à expansão capitalista a novas necessidades por meio do

uso de estratégias formuladas por Think Tanks de tal forma que este modo de produção

apresenta, na atualidade, uma volatilidade ampliada pela mundialização do capital

financeiro98

(CHESNAIS, 1996; 2005).

Compreendemos que este processo permite que agências financeiras

internacionais incorporem novas dimensões ao desenvolvimento do modo de produção

capitalista, como as perspectivas territorial e sustentável e, estas agências, como

escrevemos nos capítulos 1 e 2, influenciam a tomada de decisões em países periféricos

sobre políticas públicas de desenvolvimento rural garantindo, de forma ideológica, a

potencialidade de novos espaços para sua própria reprodução (PEREIRA, 2014;

HARVEY, 2010, 2011).

Para Harvey (2005, 2011), com base em Marx (2013, 2014) os agentes que

atuam na esfera de controle do capitalismo, no intuito de superar barreiras espaciais,

criam condições visando suprimir o espaço pelo tempo fazendo uso de seu poder de

influência e, também, por meio do avanço tecnológico que permite novas estruturas

materiais e imateriais.

Como escreveu Harvey (2005, 2011), trata-se do movimento contraditório do

capital em sua constante busca por novos espaços. Aí encontramos o que consideramos

como a essência da dinâmica do modo de produção capitalista – as crises – que se

tornam motivadoras do desenvolvimento desigual, forçando o surgimento de novas

propostas de desenvolvimento, como o desenvolvimento sustentável que surge como

98

Hilferding (1985), Bukhárin (1988) e principalmente Lênin (2010) definiram o capital financeiro como

a fusão do capital bancário com o capital industrial, o que marcaria a passagem do capitalismo de livre-

concorrência para o capitalismo dos monopólios. Nessa fase ocorreria a formação de grandes excedentes

de capitais nos países industriais adiantados, capitais esses que precisariam ser exportados, tornando a

exportação de capitais mais importante que a exportação de mercadorias.

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promessa para cumprir a lacuna, por diversos meios e mecanismos, da falha metabólica

criada pelo próprio avanço deste modo de produção.

O capitalismo apenas consegue escapar de sua própria contradição por meio

da expansão. A expansão é, simultaneamente, intensificação (de desejos e

necessidades sociais, de populações totais e assim por diante) e expansão

geográfica. Para o capitalismo sobreviver, deverá existir ou ser criado espaço

novo para sua acumulação. Se o modo capitalista de produção prevalecer em

todos os aspectos, em todas as esferas e em todas as partes do mundo, haverá

pouco ou nenhum espaço restante para acumulação adicional (o crescimento

populacional e a criação de novos desejos e necessidades seriam as únicas

opções) (HARVEY, 2005, p. 42).

Esta concepção de Harvey (2005, 2011) parte da análise de Marx (2013), que

integra nas suas análises a técnica as relações sociais de produção. Há, de fato, uma

concentração de preocupações sobre técnicas e relações sociais de produção nos

capítulos XI, XII e XIII do Livro I (MARX, 2013), que envolve assuntos diretamente

afeitos ao aperfeiçoamento tecnológico, ao menos no que tange a sua vinculação com a

produção de mercadorias.

Essa base, meio técnico, causaria a periodicidade da inovação de capital fixo,

por exigência da deterioração sofrida e da obsolescência, influenciando a periodicidade

de novas crises de acordo com novas técnicas.

O revolucionamento do modo de produção numa esfera da indústria que

condiciona seu revolucionamento em outra. Isso vale, antes de mais nada,

para os ramos da indústria isolados pela divisão social do trabalho – cada um

deles produzindo, por isso, uma mercadoria autônoma –, porém entrelaçadas

como fases de um processo global. Assim a fiação mecanizada tornou

necessário mecanizar a tecelagem, e ambas tornaram necessária à revolução

mecânica-química no branqueamento, na estampagem e no tingimento

(MARX, 2013, p.457).

Para Marx (2013), as melhorias técnicas aliadas ao desenvolvimento capitalista

têm uma contradição que se torna explicita ao constatar que este processo poupa mão de

obra em um primeiro momento e, apenas secundariamente, insumos e capital fixo.

Afinal, o operário é o oposto do capitalista.

De outro lado, os instrumentos técnicos e as instalações são a expressão de sua

riqueza. A industrialização idealizada pelos possuidores dos meios de produção seria,

assim, plenamente automatizada, rica em tecnologias que seriam operadas por um

número diminuto de trabalhadores (MARX, 2013) aumentando a concentração da

propriedade e da renda.

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De acordo com Coggiola (2009):

[...] os efeitos mais notáveis das inovações técnicas foram o rebaixamento

dos custos e o aumento do volume da produção, mas não necessariamente o

aumento da taxa de lucros. Sendo o lucro considerado como a renda da classe

dominante, os fatores que o propiciavam adquiriram relevância. Qualquer

alteração nos lucros poderia exercer uma grande influência sobre os

acontecimentos. Dentro desta perspectiva, o problema da taxa de lucro surgiu

como o primeiro elemento teoricamente causador das crises modernas

(COGGIOLA, 2009, p. 107).

Marx (2013), portanto, considerou que as inovações técnicas (que garantem

vantagens competitivas e lucros áqueles que os introduzem primeiramente) e as crises

frequentes levariam ao aprofundamento da concentração de capital até o ponto em que

só existiriam grandes empresas no mercado e seriam estas as que conseguiriam

sobreviver às crises mais profundas.

Impelida pela necessidade de mercados sempre novos, a burguesia invade

todo o globo terrestre. Necessita estabelecer-se em toda parte, explorar em

toda parte, criar vínculos em toda parte. Pela exploração do mercado

mundial, a burguesia imprime um caráter cosmopolita à produção e ao

consumo em todos os países. Para o desespero dos reacionários, ela roubou

da indústria sua base nacional. As velhas indústrias nacionais foram

destruídas e continuam a ser destruídas diariamente. São suplantadas por

novas indústrias, cuja introdução se torna uma questão vital para as nações

civilizadas – indústrias que já não empregam matérias-primas nacionais, mas

sim matérias-primas vindas das regiões mais distantes, e cujos produtos se

consomem não somente no próprio país mas em todas as partes do mundo.

[...] Com o rápido aperfeiçoamento dos instrumentos de produção e o

constante progresso dos meios de comunicação, a burguesia arrasta para a

torrente da civilização todas as nações, até mesmo as mais bárbaras. Os

baixos preços de seus produtos são a artilharia pesada que destrói todas as

muralhas da China e obriga à capitulação os bárbaros mais tenazmente hostis

aos estrangeiros (MARX; ENGELS, 2008, p. 43).

Harvey (2013) nota nesta estratégia uma das alternativas criadas pelos agentes

de controle de capitais, como aqueles que atuam nos quadros do Grupo BM, FMI e

OMC, por exemplo, para driblar momentos de crise e permitir que o caráter histórico,

que se manifesta de forma cíclica, se expanda geograficamente e se torne

preponderantemente hegemônico, demonstrando a insuficiência da crença na auto

regulação do mercado.

Marx (2013) analisando a mecanização da indústria algodoeira realça a

tendência do modo de produção capitalista em gerar crises de acumulação devido a

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composição orgânica do capital promover a tendência à queda da taxa de lucro99

, esta

disposição é considerada por Marx (2013) uma crise periódica de acumulação e

entendida aqui como manifestação de movimentos cíclicos, próprias deste modo de

produção em sua enérgica atividade de criação, destruição e recriação de novos espaços,

isto significa dizer que dentro de cada momento de recessão há uma depressão

econômica e política estrutural que se retroalimenta por crises sistêmicas que vão

permitir sua constante dinâmica.

Para Marx (2013), a razão deste fato está na lógica deste modo de produção o

conduzir constantemente a novas crises, provocadas por causas distintas, porém,

conforme Altvater (2011), endógenas a este sistema, na busca constante de

espacialização e territorialização via produção de mercadorias, circulação de capitais e

acumulação de lucro. Como bem observou Harvey (2011), as crises são:

[...] de fato, não apenas inevitáveis, mas também necessárias, pois são a única

maneira em que o equilíbrio pode ser restaurado e as contradições internas da

acumulação do capital, pelo menos temporariamente, resolvidas. As crises

são, por assim dizer, os racionalizadores irracionais de um capitalismo

sempre instável (HARVEY, 2011, p. 65).

Consideramos assim que os limites do modo de produção capitalista possam

ser levados ao máximo possível da continuidade do crescimento e da acumulação. Esta

dualidade revela o caráter de mutabilidade cíclica do modo de produção capitalista que,

na atualidade, se apresenta com maior potencialidade do que Marx projetava, revelando

que a periodicidade das crises seria determinada pelo próprio movimento cíclico do

capitalismo.

Desde já está claro que, em virtude desse ciclo de rotações conexas, que

abarca uma série de anos e no qual o capital está preso por uma parte fixa,

tornam-se uma base material para as crises periódicas em que os negócios

passam por fases sucessivas depressão, animação média, auge, crise. São bem

diversos e díspares os períodos em que se aplica capital. Entretanto, a crise

constitui sempre o ponto de partida de grandes investimentos novos e forma

99

Conceito formulado por Marx (2013) ao analisar o processo de produção capitalista. Consiste na

relação entre o valor do capital constante e do capital variável, cujas variações se fazem sentir na

modificação da taxa de lucro. Neste sentido, ver, Bottomore (2013) sobre composição orgânica e

composição técnica do capital. Aqui, composição orgânica é entendida como a maior utilização de

maquinarias e utensílios e um consumo maior de matérias-primas (elementos que compõem o capital

constante) que provoca, em contrapartida, uma queda relativa no volume de mão de obra utilizada (capital

variável). Deste modo, a relação da composição orgânica do capital com a taxa de lucro pode ser

considerada a partir da circulação de capital e a taxa de mais valor, portanto, quanto mais alta for a

composição orgânica do capital, menor será a taxa de lucro, e quanto mais alta for o mais valor e mais

intensa a circulação e o capital, maior será a taxa de lucro.

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assim, do ponto de vista de toda a sociedade, com maior ou menor amplitude,

nova base material para o novo ciclo de rotações (MARX, 2014, p. 194).

Deste modo, no livro II, Marx (2014) escreveu que as crises periódicas não

eram exceção dentro do capitalismo, mas sim seu principal elemento. É a partir da

definição mais geral da produção capitalista, como produção de valor, que Karl Marx

determina o caráter de mutabilidade do capitalismo em momentos de superação de

crises constatando o aumento irrestrito da produtividade e concentração de riqueza em

detrimento da população em geral aos meios de subsistência, a subalternidade (MARX,

2014).

Destes escritos, podemos considerar Marx como um dos precursores da análise

dos limites da produção capitalista, interpretando este fato como algo que lhe fosse

imanente e, deste modo, lhe denunciasse sua historicidade, transitoriedade e

mutabilidade, ou, sua constante necessidade de espacialização e territorialização.

O verdadeiro limite da produção capitalista é o próprio capital, isto significa

que o capital e o aumento do seu valor surgem como o ponto de partida e o

termo, a causa e a finalidade da produção. A produção não passa de uma

produção para o capital e não o contrário; os meios de produção não são

apenas meios para alargar constantemente o processo vital da sociedade dos

produtores, os limites fora dos quais não se pode realizar a conservação e o

aumento do capital – valor – assente na expropriação e no empobrecimento

de vastas massas de produtores entra constantemente em conflito com os

métodos de produção aos quais o capital recorreu para atingir os seus fins,

métodos que continuam o alargamento ilimitado da produção que, de certo

modo, reduzem esta última a ser a sua própria finalidade e que também

tendem para o desenvolvimento absoluto da produtividade social do trabalho.

O meio – desenvolvimento ilimitado das forças produtivas – entra em

conflito permanente com a finalidade – crescimento do valor do capital

existente (MARX, 2014, p. 231).

Porém, a característica de mutabilidade do modo de produção capitalista o

permite superar suas próprias contradições e potencializar sua dinâmica. Portanto,

consideramos que seja através das crises, geradas pelo próprio sistema onde está inclusa

toda a política econômica internacional, que a capacidade de mutação do modo de

produção capitalista que se materializa naquilo que Mészáros (2012) apresenta como

irreformabilidade ocorre, na atualidade, dentre outras maneiras, via disputas de poder

que envolvem acumulação por espoliação (HARVEY, 2012).

O modo natural de existência do capital são maneiras de progredir para além

de suas barreiras imediatas e, desse modo, estender com dinamismo cruel sua

esfera de operação e dominação. Nesse sentido, a última coisa que o capital

poderia desejar seria uma superação permanente de todas as crises, mesmo

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que seus ideólogos e propagandistas frequentemente sonhem com (ou ainda,

reivindiquem) a realização de exatamente isso (MÉSZÁROS, 2012, p. 795).

Portanto, as crises aparecem como fator de regulação (HARVEY, 2011;

MÉSZÁROS, 2012) e os ciclos permitem identificar fases do processo de expansão e

retração, neste sentido e considerando que nossa interpretação sobre o modo de

produção capitalista partiu, em termos metodológicos, do dispositivo teórico que

descreve o mecanismo reprodutivo deste sistema fazendo uso da crítica a economia

política formulada por Marx (2008, 2011, 2013), ponderamos que um conjunto acurado

de leis de movimento e reprodução norteia e conduz o funcionamento do modo de

produção capitalista por meio de uma irregularidade particular compendiada na

formulação dos ciclos econômicos, os quais, por sua vez, incorporam a crise como uma

de suas formas básicas.

Dessa maneira, no modo de produção capitalista, produção, realização do

excedente e acumulação de capital, ao tempo em que estão relacionados entre si,

também se articulam de acordo com ritmos, volumes e proporções desiguais no tempo e

no espaço, decorrendo dessa dimensão a manifestação da crise (MARX, 2013).

Portanto, os ciclos, são identificados com a dinâmica do capitalismo e, em sua

formulação clássica, representam a composição de um procedimento lógico, ainda que

irregular, perpassado em determinado período de tempo.

A intermediação dessa cadeia de processos econômicos é representada, nos

ciclos, pelas suas determinadas fases. O desenlace deste processo se dá com a abertura

da crise em si mesma (KATZ, 2000), aspecto primordial do movimento cíclico do

capitalismo abordado por Marx (2013) que revela que a natureza cíclica tem a sua razão

fundamental no impulso irrefutável à valorização, levando-o a chocar-se periodicamente

com as barreiras que a própria valorização cria para o aprimoramento das forças

produtivas.

Raciocinar e interpretar as formulações de Marx sobre o modo de produção

capitalista, as crises e seu comportamento cíclico, relacionando estes fatos a eventos

históricos pautados sobre os recursos naturais, nos permite uma primeira aproximação

para entender o desenvolvimento sustentável como forma de reprodução do modo de

produção capitalista em que novas necessidades são impostas frente ao período de

crise multifacetada e multiescalar que vivenciamos, e, considerando a relevância dada

à questão da preservação de recursos naturais por agências internacionais, como a

ONU (1972, 1992, 2012) e o Grupo BM (2012, 2014), dentre outras, como a FAO e o

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próprio FMI, surge à necessidade de um novo modelo de desenvolvimento, o

sustentável, como alternativa perpetrada por agências de fomento internacional para

driblar momentos de crise e permitir que novos espaços, para investimentos e

acumulação, surjam no mercado internacional.

Com isto, consideramos que nenhuma crise é um evento estático no tempo e no

espaço, mas sim remete a processos (COGGIOLA, 2009), para os nossos objetivos,

podemos identificar o momento da realização de eventos relacionados à proteção de

recursos naturais, para nossa aproximação inicial sobre a hipótese aqui levantada,

como articulação que os agentes do sistema capitalista internacional fomentaram para a

continuidade da sua expansão, pois o capitalismo foi, ao longo do seu processo,

histórico e geográfico, moldando um sistema de produção que acarretaria naquilo que

Foster (2005), com base em Marx (2012), escreveu sobre a não regeneração natural de

nutrientes básicos aos ecossistemas, rompendo com o metabolismo sócioecológico

(FOSTER, 2005).

Marx empregou o conceito de “falha” na relação metabólica entre os seres

humanos e a terra para captar a alienação material dos seres humanos dentro

da sociedade capitalista das condições naturais que formaram a base de sua

existência – o que ele chamou “a[s] perpétua[s] condição[ões] da existência

humana imposta[s] pela natureza” (FOSTER, 2005, p. 229, aspas no

original).

Ou seja, aqueles que personificaram o modo de produção capitalista criaram

um modelo no qual a natureza é instrumentalizada para a comodidade daqueles que

detêm os meios de produção. Assim, aqueles que possuem o controle destes

mecanismos passam a ter, também, a possibilidade de controle sobre territórios

(MOREIRA, 2014).

Portanto, não negligenciar esta instrumentalização e rompimento

sóciometabólico entre a sociedade e a natureza em determinado momento entre as crises

permite a compreensão da superação de momentos instáveis da lógica capitalista.

Em específico, em relação a nossa pesquisa, este fato pode ser notado

detalhadamente, por exemplo, em atividades comerciais e financeiras relacionadas a

créditos de carbono e ao princípio do poluidor pagador, ambos ajustes voltados a

arranjos técnicos, como demonstra May (2003) . Isto porque, as evoluções técnicas

permitiram à humanidade:

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[...] uma notável capacidade de comando da natureza, através das técnicas

que descobriam e aperfeiçoavam. Tal sucessão não implicava em herança,

mas, frequentemente, em recriação. Tratava-se de sucessão sem continuidade,

nem relação de dependência. Com o sistema capitalista, começa o processo

de unificação das técnicas, ainda que a diversidade no seu uso continuasse

gritante, segundo os lugares. O fato de que os interesses do capital iam pouco

a pouco se tornando mais universais conduzia igualmente a que o

aperfeiçoamento técnico pudesse ser mais rápido e o uso das técnicas

emprestadas mais difuso (SANTOS, 2008a, p. 53).

Aprimorando a tecnologia e intensificando o uso de recursos naturais, agentes

do sistema capitalista possibilitam a transformação dos mesmos para garantir a essência

do capitalismo – o lucro. Deste modo, se tornou necessário fomentar todo um aparato

ideológico cujo discurso é fazer crer que os recursos naturais, que são finitos, podem ser

utilizados e forma que não sejam esgotados.

A partir da década de 1970, lembrando a parte I de nossa pesquisa, foram

fomentadas ações voltadas ao desenvolvimento sustentável pela ONU. Este

desenvolvimento que seria capaz de garantir “[...] as necessidades do presente sem

comprometer a capacidade de as gerações futuras atenderem também às suas” (ONU,

CMMAD, 1988, p.9).

Este processo de articulação para a expansão do desenvolvimento sustentável

teve reflexos sobre diversos setores, entre eles a agricultura e pecuária que, desde

aproximadamente a década de 1960, acentuou as diferenças sociais por meio da

concentração da propriedade da terra e o acirramento da pobreza por parte daqueles

produtores com menor renda, como também gerou problemas relativos à contaminação

e degradação de recursos naturais.

Este modelo de produção agropecuária, espacialmente seletivo, altamente

concentrador de renda e terra “[...] representou uma profunda modificação no espaço

rural brasileiro” (GRAZIANO NETO, 1984, p. 12) direcionando-o para o mercado

externo e compreendendo extensas áreas de monocultura que resultaram em passivos

sociais e naturais.

Deste modo, demonstrar a periodização cíclica permite uma justa aproximação

de eventos históricos e geográficos que demonstram o caráter dinâmico e adaptativo

frente a períodos de recessão e depressão do capitalismo e à consequente espacialização

e posterior territorialização do modo de produção capitalista, utilizando o

desenvolvimento sustentável como alternativa ao enfrentamento das crises

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econômicas100

, afinal: “O capitalismo criou uma poderosíssima força de articulação

oriunda de suas tendências seculares, capaz de incorporar em grande parte a natureza e

os processos sociais.” (MARTINS, 2011, p. 246).

Relacionando este aspecto a nossa hipótese disposta a interpretar a utilização

do desenvolvimento sustentável para a reprodução do modo de produção capitalista

trazemos a tona, com o exemplo dos ciclos de Kondratieff101

, à questão da importância

da periodização.

[...] as chamadas ondas longas ou ciclos de Kondratieff, que duram em média

cinquenta anos na história do desenvolvimento capitalista e são fundadas em

inovações tecnológicas que se agregam em um determinado lugar e momento

para definir o estágio de desenvolvimento estável e de difusão até que um

novo pacote de inovações venha substituí-lo. É possível olhar para trás e

definir “eras” do desenvolvimento capitalista, que correspondem

aproximadamente às ferrovias, navios a vapor, indústria do carvão e do aço e

telégrafo; ao automóvel, petróleo, indústria da borracha e plásticos e rádio; ao

motor a jato, geladeiras, condicionadores de ar, indústrias de metais leves

(alumínio) e TV; e ao chip de computador e nova indústria eletrônica que

sustentou a “nova economia” da década de 1990. [...] a percepção de que

formas tecnológicas e organizacionais tornam-se, por assim dizer,

paradigmáticas por um tempo, até se esgotarem suas possibilidades, apenas

para serem substituídas por outra coisa, é importante. [...] Onde a quantidade

crescente de capital encontraria oportunidades de investimento rentável se

não fosse por essas ondas de inovação? (HARVEY, 2011, p. 84).

No gráfico 3 demonstramos fases de desenvolvimento do capitalismo e suas

principais doutrinas a partir do capitalismo industrial ao neoliberalismo, neste, podemos

identificar períodos que revelam à passagem do meio técnico para o meio técnico-

científico-informacional que sucede a momentos de inovação (I), progresso (P),

recessão (R) e depressão (D). Para demonstrar esse processo durante os diferentes

períodos de crises e as diversas fases do desenvolvimento do modo de produção

capitalista, destacamos alguns eventos históricos102

: os círculos amarelos e vermelho

representam as principais crises do modo de produção capitalista; em preto e vermelho

100

Não no sentido de que o desenvolvimento sustentável seja a saída única para a crise atual, mas sim,

que este seja um dos arranjos institucionais e comerciais para alavancar novas formas de reprodução do

modo de produção capitalista. 101

Utilizamos aqui os ciclos de Kondratieff como forma didática de exemplificar as fases do modo de

produção capitalista, os momentos em que ocorreram as principais crises e os mais importantes eventos

na história da política internacional sobre a preservação de recursos naturais. Consideramos esta

representação, ainda que com limitações gráficas, de importância para podermos demonstrar as relações

que aqui estamos propondo. Com isso, não queremos induzir o leitor que esta seja a única forma de

representação, porém, para os nossos objetivos e de acordo com nossos escritos, consideramos a

adequada. 102

Optamos por não datar exatamente tais eventos pois entendemos que estes são resultados de acúmulos

históricos de diferentes processos que culminam em momentos contínuos não pontuais historicamente.

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destacamos a criação da ONU, do Grupo BM e da FAO; em azul e vermelho estão

representados os principais eventos e documentos relacionados com o desenvolvimento

sustentável e, em verde e vermelho a criação do Conselho Mundial para o

Desenvolvimento Sustentável do Grupo BM (WBCSD) e o Conselho Empresarial

Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), isto nos permite demonstrar a

relação entre o desenvolvimento sustentável enquanto uma das alternativas de

enfrentamento a crises103

pelo modo de produção de capitalista.

Gráfico 3: Eventos e documentos internacionais relacionados ao desenvolvimento sustentável

Fonte: Kondratieff (1935); ONU (1972, 1992, 2012)

Organizador: Guilherme Magon Whitacker, 2016

Utilizamos os ciclos de Kondratieff (1935) como instrumento didático que

permite a identificação visual da temporalidade e espacialidade de processos, fatos e

eventos que permitem a superação de crises e expansão do modo de produção

103

Cabe a referência de que, de acordo com Rebelo Junior (2002) as duas grandes crises internacionais,

1873 e 1928, possuíram como estratégia de superação a intervenção estatal que não buscaram

alternativas, apontaram soluções (o imperialismo e a guerra) de caráter transitório, que permitiram o

surgimento de uma nova crise, porém, com um caráter diferenciado das anteriores devido ao nível de

flexibilidade que o modo de produção capitalista adquiriu e os distintos impactos decorrentes da crise

iniciada na década de 1970.

1815 1873 1920 1972

WBSDC CEBDS

Liberalismo Keynesianismo Neoliberalismo

1790 1º Ciclo 1848 2º Ciclo 1896 3º Ciclo 1948 4º Ciclo 2017

Conferências e Documentos Limites do Crescimento 1ª Conferência Nosso Futuro Comum 2ª Conferência 3ª Conferência

Crises Parciais de Superprodução (Inglaterra / EUA) Crise Agrícola (França) 1ª Grande Depressão 2ª Grande Depressão Crise do Petróleo Crise Financeira Internacional

Crises Econômicas Fundação da ONU Clube de Roma

I P R D I P R D I P R D I P R D ?

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P á g i n a | 199

capitalista, ou seja, sua dinâmica espaço-temporal e entendendo a espacialização deste

modo de produção como algo inerente a sua própria existência.

Com isto, podemos considerar, em uma segunda aproximação de nossa

hipótese, que o desenvolvimento sustentável vem sendo utilizado, ideologicamente,

como alternativa de reprodução deste modo de produção, pois, foi somente a partir da

década de 1970, momento em que instaura a crise, que os alardes sobre a proteção de

recursos naturais passam a ser institucionalizados no interior da ONU e as agências de

fomento do modo de produção capitalista, como o Grupo BM, passam a se dedicar a

sua normatização e articulam ações, como a descentralização de políticas públicas,

para que a concepção sustentável de desenvolvimento passe a ser aceita e utilizada,

dentre outras ações, em políticas publicas de desenvolvimento para o campo.

4.2. A falha sociometabólica entre a sociedade e a natureza e sua relação com a

dinâmica do modo de produção capitalista

Na contemporaneidade se tem uma ordem de reprodução sociometabólica do

modo de produção capitalista (MÉSZÁROS, 2012) apoiada na exploração social e de

recursos naturais. Autores como Barbieri (2007), Foladori (2001), Mendonça (1998),

Porto-Gonçalves (2002) e Ribeiro (2005), relacionam a gênese da questão que envolve a

preservação de recursos naturais com eventos que impactaram, em escala global, a

percepção da dependência, social e econômica, destes recursos.

A certeza da capacidade de destruição macroescalar dos países mais poderosos

do centro do sistema capitalista, demonstrado pelas explosões nucleares em Hiroshima e

Nagasaki, e é sintomático que termos como limites e gerações estejam, a partir de então,

constantemente presentes no léxico da problemática que envolve os recursos naturais

(OLIVEIRA, 2012).

Smith (2009) escreveu que estamos vivendo um período no qual o núcleo da

relação entre a sociedade e a natureza está sendo transformada. Consideramos que esta

formulação expressa que os recursos naturais se transformaram em espaço de

acumulação da capital, que a natureza tem sido constantemente (re)produzida e, deste

modo, podemos considerar que assim como o trabalho, os recursos naturais passaram da

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subsunção formal para a real subsunção ao modo de produção capitalista104

, seguindo o

mesmo raciocínio de Marx (2013):

[...] o modo de produção capitalista se apresenta, por um lado, como uma

necessidade histórica para a transformação do processo de trabalho num

processo social, essa forma social do processo de trabalho se apresenta, por

outro lado, como um método empregado pelo capital para explorá-lo de

maneira mais lucrativa (MARX, 2013, p. 410).

Ou seja, de acordo com Smith (2009) os recursos naturais foram transformados

pelos capitalistas em espaço de acumulação financeira expresso, de maneira nítida, no

momento histórico do imperialismo, no qual os bancos (sem diminuir o papel dos

estados nacionais) funcionam como instituições reguladoras da atividade econômica,

como é o caso do Grupo BM, ao propor regulações a países tomadores de empréstimos

utilizando o argumento de cooperação para o desenvolvimento sustentável.

For these and other environmental capitalists nature has indeed become a

new frontier, and not unlike earlier ‘frontiers’, that frontier became almost

instantaneously financial. An ‘environmental derivatives’ market very

quickly sprang up whereby ecological credits are bundled together and sold

in bulk to speculative financiers banking on the increased price of already

established credits. The World Bank opened its BioCarbon Fund in 2004,

capitalized with an initial $30 million and aiming for $100 million, which

allows investors (minimum investment US$2.5 million) to contribute to

carbon sequestration in return for an income generated by the sale of credits.

Since 2005, in line with Kyoto targets, the European Union has begun trading

in and regulating carbon credits (SMITH, 2009, p.5, aspas no original).

Deste modo, compreendemos que é justamente este poder econômico e político

que, no exemplo citado, o Grupo BM, possui de fazer investimentos diretos ou

emprestar dinheiro para a realização de determinadas atividades econômicas, ou seja, os

agentes capitalistas criaram um mercado financeiro de produtos e mercadorias rotuladas

de sustentáveis que asseguram seu desenvolvimento. Nesse sentido, o desenvolvimento

do capitalismo tem alterado profundamente a relação entre a sociedade e a natureza que

104

O termo subsunção, etimologicamente, se refere à ação de subsumir, inserir algo em um contexto mais

amplo. Marx (2013), em O Capital, utiliza o termo para descrever a forma como o capitalismo insere o

trabalho em sua lógica, o autor faz uso das significações formal e real para diferenciar o momento em que

ocorre a apoderação total do capital sobre o processo de trabalho. Deste, consideramos que, da mesma

forma, o processo de mercantilização da natureza ocorre a partir do momento em que se estabelece um

valor de uso sobre a mesma, assim, esta deixa de ser considerada como primeira natureza e se transfigura,

ou, é resignificada, em segunda natureza a partir da possibilidade de produção de mais valor, ou seja, no

momento em que a mesma é apropriada por setores ou agentes atuantes na personificação do modo de

produção capitalista.

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é expressa na forma de uma interação metabólica105

, seu núcleo, o que lhe garante, ou

garantiria, estabilidade. Consciente disso, Smith (2009) elabora um paralelo com a

subsunção do trabalho, conforme Marx (2013) formulou para distinguir a transição da

subsunção formal para subsunção real dos recursos naturais.

With the formal subsumption of nature, capital accumulation is facilitated

predominantly by a continual expansion in the conversion of extracted

material into objects of production. More and more oil and wood, cotton and

coal are extracted for production. Colonialism functioned as a primary

strategy for, among other things, this formal subsumption of nature (SMITH,

2009, p.13).

A subsunção formal dos recursos naturais ocorreu no momento em que os

agentes capitalistas passaram a ter o controle sobre a exploração dos mesmos nos mais

distintos territórios. Já em relação à transição para subsunção real da natureza:

The transformation to real subsumption is marked not simply by an in-

tensification of this dependence of capital accumulation on nature. Rather, a

two-sided shift takes place. First, while capital has always circulated through

nature, whether in agricultural production or in land ‘improvement’ of myr-

iad kinds, the real subsumption of nature not only intensifies this circulation

but transforms it from an incidental effect of capital accumulation to an

intended strategy: what were once unintended consequences become strategic

goals. The production of nature becomes capitalized ‘all the way down’.

Second, the reverse process, namely the circulation of nature through capital,

is similarly transformed from an incidental to a strategic process (Smith,

2009, p.13).

A diferença entre a subsunção formal e real é explicada: quando da subsunção

formal da natureza os agentes capitalistas controlavam os recursos naturais e os

territórios como uma necessidade de produção, já com a subsunção real, tais agentes

passam a (re)produzir natureza(s), na forma de produtos dos mais variados, como uma

105

Na teoria marxista, a natureza e o homem, em sua fase primitiva, possuiriam um metabolismo único,

uma troca, ou interação entre os mesmos. A natureza seria o corpo inorgânico desse, todavia, com o

processo de alienação do próprio ser no capitalismo, ocorre o distanciamento visceral entre ambos,

estabelecendo a denominada fratura, ou falha metabólica. Marx e Engels, enquanto primeiros a aplicarem

o conceito de metabolismo à sociedade a partir de Liebig, associaram o referido termo à relação cidade-

campo, grande indústria-grande agricultura, homem-natureza. “O modo de produção capitalista consome

a ruptura do laço familiar original que unia a agricultura à manufatura e envolvia a forma infantilmente

rudimentar de ambas. Ao mesmo tempo, porém, ele cria os pressupostos materiais de uma nova síntese,

superior, entre agricultura e indústria sobre a base de suas configurações antiteticamente desenvolvidas.

Com a predominância sempre crescente da população urbana, amontoada em grandes centros pela

produção capitalista, esta, por um lado, acumula a força motriz histórica da sociedade e, por outro lado,

desvirtua o metabolismo entre o homem e a terra, isto é, o retorno ao solo daqueles elementos que lhe são

constitutivos e foram consumidos pelo homem sob forma de alimentos e vestimentas, retorno que é a

eterna condição natural da fertilidade permanente do solo. Com isso, ela destrói tanto a saúde física dos

trabalhadores urbanos como a vida espiritual dos trabalhadores rurais” (MARX, 2013, p. 572).

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política pública, para sustentar a reprodução do modo de produção capitalista e, esta

relação, vai ser intensificada de acordo com a evolução da dinâmica do modo de

produção capitalista a partir do século XX que, de acordo com Hobsbawm (1995): “[...]

não acabou bem” (HOBSBAWM, 1995, p. 26).

Consideramos que a crise que irrompe a contemporaneidade qualifica-se por

um grau de multiplicidade e intensidade que a torna distinta das antecessoras. Destaca-

se, nesse contexto, o fato problemático sobre a questão da preservação, recuperação e

conservação, ou mesmo, uso e distribuição de recursos naturais. A problemática em tela

atinge variados grupos e classes sociais de forma desigual, uma vez que reflete as

contradições inerentes ao capitalismo e a própria distribuição geográfica de recursos

naturais fundamentais como a água, que tem gerado conflitos pelo agrohidronegócio

(THOMAZ JÚNIOR, 2010, 2012) e os relacionados à produção de energia, como o

petróleo e todas as questões geoeconômicas e geopolíticas daí decorrentes, conforme

escreveu, por exemplo, Lins (2011). A mundialização do capital e os novos contornos

adquiridos pela economia acentuam ainda mais tais contradições, fomentando e

mundializando, também, o cenário de crise.

Consideramos que a crise atual represente resultados daqueles momentos

extremos sobre os quais Hobsbawm (1995) escreveu como tentativas para manter a

reprodução do modo de produção capitalista de forma ilimitada. O’Connor (2002)

escreveu que este modo de produção pressupõe a reprodução ilimitada das condições de

produção, incluindo a força de trabalho e recursos naturais com potencial, por exemplo,

energético, como no caso da produção de Etanol, fato este que coloca em risco sua

própria reprodução, gerando, o que ele chamou de segunda contradição do capitalismo.

Expresada de manera sencilla, la segunda contradicción plantea que los

intentos de los capitales individuales por defender o restaurar sus ganancias

recortando o externalizando sus costos producen, como un efecto no deseado,

la reducción de la “productividad” de las condiciones de producción, lo cual

a su vez eleva los costos promedio. Los costos pueden aumentar para los

capitales individuales en cuestión, para otros capitales, o para el capital en su

conjunto (O’CONNOR, 2002, p. 45).

As violações dirigidas à força de trabalho, concomitante à exploração de

recursos naturais em larga escala, ocasionaram a redução, ou mantiveram os custos do

processo produtivo, pois o capitalista necessariamente incorpora tais externalidades

negativas, o que conduz a um aumento do lucro. A crise das condições de produção

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seria por assim dizer, justamente, a contradição latente entre a busca excessiva pelo

lucro e a degradação das bases naturais e sociais de sua própria reprodução.

Chesnais e Serfati (2003), por sua vez, escreveram que a exploração do homem

e de recursos naturais não reflete outra contradição do capitalismo, pois as verdadeiras

contradições do capital repousam nos mecanismos clássicos de criação e extração de

mais valor, conforme apontado por Marx (2013). No plano econômico, o próprio modo

de produção capitalista se incumbe de transformar a degradação de recursos naturais

em novos espaços de acumulação e reprodução, no político, os agentes capitalistas

encontram novas formas de transferir para grupos sociais e/ou países periféricos o

ônus do processo produtivo, sem que de fato este se torne uma ameaça real à própria

reprodução do modo de produção capitalista.

Concordando com Chesnais e Serfati (2003), consideramos que a crise atual

reflete as contradições clássicas inerentes ao modo de produção capitalista. Deste fato,

ponderamos válida a realização de uma breve interpretação sobre o desenvolvimento do

modo de produção capitalista, principalmente em relação ao imperialismo e a fase de

expropriações, para termos maior embasamento e, posteriormente, entendermos a fase

do imperialismo ecológico tendo o desenvolvimento sustentável como estratégia de

reprodução do modo de produção capitalista106

.

O capitalismo foi ao longo do seu desenvolvimento instituindo um sistema de

reprodução próprio, não condizente com ciclos de regeneração natural de nutrientes

(MARX, 2013). Criou um modelo no qual a natureza é instrumentalizada para a

comodidade daqueles que detêm os meios de produção. O desenvolvimento da ciência,

das técnicas e da tecnologia, proporcionou o fortalecimento e a consolidação da grande

indústria e da agricultura em detrimento de recursos naturais, sua própria sustentação.

Na atualidade, setores relacionados à agricultura, capitalista ou não107

,

incorporaram em seus discursos e slogans a temática da preocupação com recursos

naturais sob o título de desenvolvimento sustentável. Reconhecemos aqui que o avanço

nas tecnologias permitiu que grandes corporações adquirissem equipamentos que

causam o menor impacto (negativo) possível. Porém, a questão que emerge com a

propagação de novos modelos de desenvolvimento não se limita a intervenções técnicas

106

Parte III desta pesquisa. 107

Por exemplo, movimentos sociais de luta pela terra, como o MST, o MPA e outros incorporaram a

temática por meio da agroecologia, o MAB, atuando também na questão agrária, defende a produção

sustentável de energia contra os mega empreendimentos que se relacionam a privatização e produção de

energia elétrica, por meio das grandes barragens, sob estes aspectos, ver os trabalhos de Francine (2013),

Maggi (2013) e Orzekovski (2014), dentre outros.

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que minimizam os impactos sobre os recursos naturais tendo em vistas a concepção

proposta pelo desenvolvimento sustentável. Se levarmos em consideração o avanço na

legislação ambiental e as novas exigências para a instalação e o funcionamento de

complexos agroindustriais, veremos que muitos são excluídos deste processo, pois, são

poucos aqueles que possuem condições de se adequarem as exigências legais.

Ao mesmo tempo em que o debate público sobre a sustentabilidade tem

impulsionado a criação de novos arranjos institucionais, novos regimes

ambientais de negociação e fóruns de debate, investimentos significativos na

ciência e pesquisa ambiental, assim como a consolidação de um movimento

ambientalista transnacional; o sistema político, tanto no nível internacional,

quanto no nacional e local, tem-se mostrado incapaz ou insuficientemente

preparado para traduzir e transformar as crescentes demandas de cunho

ambientalista em políticas públicas capazes de promover um modelo

alternativo de desenvolvimento (FREY, 2001, p. 7).

Ao considerarmos o debate sobre o desenvolvimento sustentável, devemos

levar em consideração, ainda, a formulação apresentada por Mészáros (2007, 2012)

sobre a irreformabilidade do capitalismo, pois as alterações propostas a partir o

desenvolvimento sustentável apresentam-se fisicamente limitadas, ou seja, seu poder de

alcance, até o momento, não chegam a romper com a lógica produtivista capitalista, pois

possuem esfera de atuação local, enquanto a tendência do modo de produção capitalista

continua sendo sua espacialização e territorialização global.

O que podemos considerar disto é que, inevitavelmente, o modo de produção

capitalista, pode, a qualquer momento, expandir seus limites. Porém, não o faz

justamente para que as crises possam ocorrer e nestes momentos torna-se necessária a

criação de novos espaços para a reprodução deste modo de produção, de acordo com

sua lógica contraditória de criação, destruição e recriação. Pois, se entendermos, e

entendemos e, portanto, concordamos com Harvey (2011) e Mészáros (2007, 2012) o

modo de produção capitalista ainda está longe de ser contornado. Sua tendência para

expansão, espacialização e territorialização, continua ilimitada.

A história passada demonstra muitos casos não apenas de nobres esforços

dedicados a introduzir mudanças sociais significativas com o intuito de

superar algumas contradições maiores, mas também de alguns êxitos parciais

na direção originalmente visada. Contudo, muito frequentemente, os êxitos,

mais cedo ou mais tarde, retrocederam pela restauração subsequente das

relações de dependência do status quo anterior. A razão primordial para tais

desenvolvimentos foi a inércia da desigualdade estrutural reproduzida de

uma forma ou de outra ao longo da história, a despeito de algumas mudanças

de pessoal, de tempos em tempos, no topo da sociedade. Pois a desigualdade

estrutural agiu como uma âncora tão pesada que não se pode erguer, atada a

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correntes mais curtas ou mais longas, arrastando o barco invariavelmente de

volta a uma posição da qual parecia não haver possibilidade de maiores

progressos na jornada, por mais bem intencionados que fossem alguns

membros do próprio navio durante uma grande tempestade histórica. E, para

piorar as coisas, essa situação de apuro historicamente determinada e

humanamente alterável do povo dominado pela ordem existente foi

conceituada e ideologicamente racionalizada de forma regular como uma

fatalidade da natureza, mesmo quando era preciso admitir que a

desigualdade estrutural predominante estava muito longe de ser globalmente

benéfica (MÉSZÁROS, 2012, p. 226).

As crises, portanto, fazem parte do processo de dinâmico de expansão do modo

de produção capitalista e Marx (2013), ao analisar o momento histórico que corresponde

à transição do feudalismo e a consolidação da sociedade capitalista, chama a atenção

para o processo de acumulação primitiva do capital. Tal processo, na análise marxiana,

foi responsável por redefinir as relações entre a sociedade e a natureza, pois representa a

separação do trabalhador, expropriado de suas terras, dos seus meios de produção.

Assim, camponeses expulsos de suas terras foram transformados em proletários

destituídos dos seus instrumentos de trabalho, e sua força de trabalho transformada em

mercadoria. Este processo, Marx (2013) denominou de falha metabólica do modo de

produção capitalista, que de acordo com o autor, decorre da ruptura provocada pelas

relações capitalistas de produção, que separam o homem da natureza mediante a relação

entre capital e trabalho assalariado (MARX, 2013). Este fato impactou tanto o campo

quanto a cidade, no tocante ao metabolismo com a natureza, pois apartou, de forma

aguda, “[...] as fontes de produção de alimento e a matéria prima de seu consumo”

(FOLADORI, 2001, p.111).

Já no início do século XX, perpassadas duas grandes crises econômicas

mundiais (1845 e 1873) o processo de desenvolvimento do modo de produção

capitalista atinge novas dimensões com a divisão de territórios já colonizados em

associações capitalistas, tendo em vista que, naquele momento, os grandes

conglomerados industriais passaram a ter intensa atuação nas políticas coloniais.

Decorre dessa política à procura por novas fontes de recursos naturais e mercados

consumidores. A primeira Grande Guerra Mundial eclode como um resultado extremo

deste cenário (HOBSBAWM, 1995).

Lênin (2010), atento às mudanças ocorridas na escala de expansão de capitais,

identifica um processo de transformação no modo de produção capitalista, para ele,

neste período, teve início à fase superior do capitalismo, o imperialismo. Lênin (2010)

destaca que a concentração da produção em empresas cada vez maiores, ao atingirem

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determinado grau de desenvolvimento baseado na centralização e controle de distintos

ramos da produção, culmina na formação de monopólios. Ao perceberem a

possibilidade de redução dos custos e consequente aumento do lucro no processo

produtivo, empresas capitalistas, anteriormente concorrentes, passam a organizar-se em

cartéis e trustes e, deste modo, provocam a transformação radical a esfera política da

economia (LENIN, 2010).

Para Lênin (2010), o fator determinante para a transição para o imperialismo

está na junção do capital industrial ao bancário, o que possibilitou a concentração de

uma enorme massa de capitais e proveu a condição para que os conglomerados

industriais pudessem expandir a sua produção e atuar para além de territórios nacionais.

Neste processo, os bancos passam a recolher rendimentos em dinheiro de todo o gênero,

tanto dos grandes capitalistas como dos empregados, pequenos patrões e, até mesmo, de

uma reduzida camada superior de operários. Com isso, intensifica-se, com grande

rapidez, o processo de concentração de capital e de constituição de monopólios, uma

vez que os bancos passam a ocupar lugar central na economia disponibilizando, a classe

capitalista, grandes montantes de capital para investimento nas atividades produtivas.

Surge assim uma oligarquia financeira capaz de impor, por meio do seu poderio

econômico, os rumos dos investimentos capitalistas, engendrando uma dependência

crescente em decorrência dos empréstimos concedidos. Do ponto de vista político,

destaca-se uma articulação de tais grupos na atuação dos estados e em suas políticas

econômicas.

Ainda de acordo com Lênin (2010) as expropriações constituem parte

fundamental do processo de expansão capitalista. É apenas sob tal condição que se pode

dar a extração de mais valor a partir da exploração do trabalho e de recursos naturais. A

privatização dos meios de produção ocasiona a apropriação privada da riqueza

produzida. Assim como a terra, o trabalho transformava-se em mercadoria à medida que

os trabalhadores eram apartados de suas condições de produção, contribuindo para a

divisão da sociedade em classes, ou seja, aquela detentora dos meios de produção, do

capital e das extensas propriedades de terras, e aquela que, por não ser dona dos meios

de produção, dispunha apenas de sua força de trabalho para sobreviver.

Neste momento cabe uma observação sobre os escritos de Marx, apesar de

encontrarmos em sua obra várias passagens que remetem a uma preocupação com

recursos naturais, esta não era sua preocupação central, que está relacionada à análise da

realidade social, política e econômica, e não pretendemos criar aqui um perfil sobre e

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para Karl Marx, mas sim, levar em consideração seus escritos e a partir destes

compreender como o modo de produção capitalista interfere na relação sociedade e

natureza, concordamos que existam observações sobre a relação sociedade e natureza

em Marx (FOSTER, 2005), mas não que ele fosse, há seu tempo, um ecologista avant la

lettre.

Portanto, entendemos que Marx e o marxismo possibilitam interpretações sobre

a questão relativa à preservação de recursos naturais ao propor uma crítica ao modo de

produção capitalista. Mesmo que a relação sociedade e natureza não tenha sido

discutida como ponto central nos escritos de Marx (e também nos de Marx e Engels),

encontramos nestas obras referências ao uso indiscriminado de recursos naturais e os

danos causados por este uso efetivado a partir da expansão do capitalismo. Neste

sentido, Foster (2005) escreveu que:

Os insights tantas vezes brilhantes de Marx não foram meras centelhas de

gênio. Os insights dele nesta área são antes derivados de um compromisso

sistemático com a revolução científica do século XVII e o meio ambiente do

século XIX mediante um profundo entendimento filosófico da concepção

materialista de natureza. Assim, desde a sua juventude (por exemplo, nos

Manuscritos econômicos e filosóficos, de 1844), Marx analisou com

sofisticação e sensibilidade ecológica a alienação humana em relação à

natureza. Esta tendência foi reforçada pelas preocupações dele com a

subsistência humana e a relação com o solo, e com todo o problema da

agricultura capitalista (FOSTER, 2005, p. 38).

Ponderando esta observação, reconhecemos, portanto, que Marx (2012)

escreveu que a natureza é o corpo inorgânico do homem (MARX, 2012) e por isso é

que, na abordagem sobre as questões relativas à preservação de recursos naturais

orientadas por um viés marxista, percebemos que fica evidente na obra de Marx, como

escreve Foster (1997), era que: “[...] a humanidade e a natureza estavam inter-

relacionadas e que a forma específica das relações de produção constituía o âmago

dessa inter-relação em qualquer dado período” (FOSTER, 1997, p.165).

O homem vive da natureza, isto é, a natureza é o seu corpo, e tem que manter

com ela um diálogo ininterrupto se não quiser morrer. Dizer que a vida física

e mental do homem está ligada à natureza significa simplesmente que a

natureza está ligada a si mesma, porque o homem dela é parte (MARX, 2012,

p. 84).

Assim, a produção marxiana e as análises críticas acerca dos meios de

produção, relações de trabalho, consumo, expansão da grande indústria e da agricultura

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intensiva, dentre outros, são de grande valia para a discussão da temática proposta em

nosso trabalho. Em decorrência disso, autores envolvidos com a temática ambiental,

principalmente a partir da década de 1990108

iniciaram o debate sobre a continuidade e

expansão deste modo de produção e os possíveis riscos daí decorrentes, uma vez que

este vem sendo considerado como o principal destruidor de recursos naturais (LÖWY,

2000).

Para compreendermos esta relação, voltamos à análise de Marx (2013) que, se

apropria do conceito de metabolismo social, originário das ciências naturais, para

especificar a relação do homem com a natureza através do trabalho (FOSTER, 2005).

Tal conceito busca expressar o processo por meio do qual a sociedade humana

transforma a natureza externa e, ao fazê-lo, transforma a própria natureza interna. Esta

transformação só é possível mediante a ação do trabalho e das relações sociais de

produção. Portanto, consideramos, com base em Marx (2012, 2013), que é por meio do

trabalho que o ser humano atua sobre a natureza externa e a modifica, e assim,

simultaneamente, altera sua própria natureza:

O processo de trabalho, como expusemos em seus momentos simples e

abstratos, é atividade orientada a um fim – a produção de valores de uso –,

apropriação do elemento natural para a satisfação de necessidades humanas,

condição universal do metabolismo entre homem e natureza perpétua

condição natural da vida humana e, por conseguinte independente de

qualquer forma particular dessa vida, ou melhor, comum a todas as suas

formas sociais (MARX, 2013, p. 261).

Esta concepção corresponde ao conceito de trabalho produtivo, isto é, aquele

trabalho voltado para a produção de valores de uso que, ao se apropriar dos elementos

naturais, satisfaz as necessidades humanas. O processo de trabalho, ao transformar a

natureza externa, converte-se em riqueza material, ou seja, em riqueza pronta para ser

desfrutada pelo conjunto da sociedade, com potencial financeiro para tal. Na sociedade

capitalista, a relação entre a sociedade e a natureza se define pela produção de mais

valor, a qual só é possível obter a partir do trabalho excedente, isto é, de certo grau de

produtividade do trabalhador superior ao que lhe é necessário (MARX, 2013). Além

disso, consideramos que a riqueza social produzida pela sociedade capitalista se

encontra personificada no dinheiro.

108

Ao compreenderem que o capitalismo, hoje, em sua forma mundializada pode ser considerado como o

predador voraz que após ter consumido grande parte de recursos naturais se volta para a natureza, que já

não é natural, e se apropria desta através de aprimoramentos técnicos e da lógica da (re)construção de

espaços para expansão deste sistema.

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É importante salientar que Marx não compreende o processo de trabalho

desassociado das condições naturais, isto é, o suporte físico, recursos naturais, está para

o trabalho assim como o trabalho está para os recursos naturais. Portanto, quando se

estabelece a relação entre capital e trabalho assalariado ocorre também um

distanciamento do homem em relação ao seu meio, uma vez que tanto a sua natureza

interna quanto externa se modificam drasticamente.

Ainda sobre o desenvolvimento desse modo de produção, cabe lembrar que as

expropriações constituem um processo permanente na lógica de reprodução capitalista

que, no entanto, não se limita a sua forma originária. Conjugadas às novas modalidades

surgidas no bojo do capitalismo contemporâneo, as expropriações avançam ferozmente

sobre a natureza na busca pela produção de valor. Sobre este processo, que Harvey

(2012) vai chamar de acumulação por espoliação, entendendo este enquanto

continuidade da etapa primitiva de acumulação capitalista, os recursos naturais não

passam despercebidos: “[...] muitos recursos antes partilhados, como a água, têm sido

privatizados (com frequência por insistência do Banco Mundial) e inseridos na lógica

capitalista da acumulação [...]” (HARVEY, 2012, p. 121).

De todo esse processo de expropriação e espoliação, Foster (2005) atenta para

as implicações das relações sociais capitalistas sobre os recursos naturais, com efeitos

depredadores em escala sempre crescente. A busca ilimitada pelo abastecimento

constante dos meios de produção e a amplitude cada vez maior das relações de produção

capitalistas impõem um ritmo frenético de produção e consumo, incompatível com a

capacidade regenerativa natural.

Este fato pode ser analisado, por exemplo, quando nos deparamos com

processos como o Green Grabbing. De acordo com Sauer e Borras (2016) este termo

pode ser traduzido como grilagem verde e remete ao processo maior de extrangeirização

de terras estudado, dentro outros, por Oliveira (2010). Neste contexto, o Green

Grabbing segue os preceitos difundidos por Harvey (2012) sobre a espoliação de

recursos naturais. Ainda com base em Sauer e Borras, a titulo de ilustração, o Green

Grabbing está:

[...] associado diretamente a problemáticas relacionadas à criação de

mecanismos que seriam ambientalmente mais sustentáveis, incluindo a

criação de reservas florestais via a compra de créditos de carbono (LEACH,

FAIRHEAD e FRASER, 2012), acordos de Redução de Emissões por

Diminuição do Desmatamento (REDD+), investimentos para a produção de

energia limpa (HOLTGIMÉNEZ, 2012), ecoturismo (GARDNER, 2012),

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entre outros mecanismos verdes. Em outros termos, apropriação verde vem

sendo usada para caracterizar casos de apropriação de territórios em que as

“[...] agendas ambientais [são] a motivação fundamental” (FAIRHEAD,

LEACH e SCOONES, 2012, p. 239), especialmente relacionada com as

narrativas de mudanças do clima ou crise climática (CORSON e

MacDONALD, 2012). (SAUER; BORRAS, 2016, p. 26).

Destes escritos, com base em autores como Löwy (2000), Foladori (2001,

2003), Foster (2005), Harvey (2012), dentre outros, podemos relacionar a falha

sociometabólica e a dinâmica do modo de produção capitalista. De acordo com

Mészáros (2009), à medida que os sintomas de crise se multiplicam e sua severidade é

agravada, o conjunto do sistema capitalista parece estar se aproximando de certos

limites estruturais do capital. Para o autor, tal crise se dá mediante a lógica perversa do

sistema sociometabólico engendrado pelo capitalismo, que, por não impor limites à

expansão do capital, uma vez que este se funda no valor de troca, converte-se numa

processualidade incontrolável e destrutiva. Marx já havia chamado a atenção para o

caráter contraditório e destrutivo do sistema capitalista no tocante à utilização e

degradação de recursos naturais colocando em xeque a sua própria sobrevivência.

Segundo a formulação do autor (MESZÁROS, 2009), a crise contemporânea é

crônica e permanente, isto é, desde meados da década de 1970 os ciclos de expansão,

que conformaram a história do capitalismo, encontram-se mergulhados em uma

profunda depressão. Uma vez que se intensifica a dicotomia entre a produção visando à

satisfação das necessidades humanas e aquela voltada para a própria valorização do

capital, graves consequências podem ser identificadas como, por exemplo, a

precarização estrutural do trabalho e a deterioração das condições naturais em escala

global. Para Mészáros (2009), a adoção do padrão norte-americano de alto consumo de

energia e matéria por todas as nações determinaria a exaustão dos recursos naturais.

Nem mesmo a onipotência tecnológica seria capaz de solucionar os problemas e

desafios derivados da expansão das relações sociais de produção capitalistas.

Na medida em que novas tendências são ditadas pelo mercado financeiro,

novos mecanismos de transferência das externalidades negativas do processo produtivo

são postos em prática. Portanto, a ameaça à reprodução do sistema significa, na verdade,

a ameaça à reprodução de determinados grupos sociais. Ou seja, o que estaria em

questão seria a sobrevivência de determinados grupos sociais vulneráveis, por exemplo:

as populações pobres, os negros, os grupos tradicionais (indígenas, quilombolas,

ribeirinhos e outros), e não o modo de produção capitalista em escala mundial.

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É importante fazer menção, ainda, ao papel do Estado na reconfiguração da

crise econômica, pois é ele o encarregado de direcionar o ônus da degradação de

recursos naturais para as camadas mais vulneráveis da sociedade, e também de arcar

com os custos do desemprego estrutural. Desta maneira, os impactos sociais e naturais

são transferidos para os países mais vulneráveis econômica e politicamente mediante as

relações geopolíticas de poder entre ambos. Nesse sentido, o estágio atual em que se

encontra o sistema de acumulação de capital se expande sob um conjunto de relações,

complexas e contraditórias, pois na tentativa de tudo capitalizar, o capital humaniza a

natureza e cria uma segunda natureza, que, ao mesmo tempo em que é mercantilizada e

valorizada, é também degradada (O’CONNOR, 2002). Portanto, se a crise do trabalho

redefiniu todo o rumo do século XX, é a questão sobre os recursos naturais, conjugada à

crise do capital, que parece redefinir o futuro do século XXI, colocando novos desafios

para a humanidade.

A configuração contemporânea da dinâmica do capitalismo, baseada na

generalização do capital portador de juros e na expansão do mercado financeiro via

oferta infinita de crédito (HARVEY, 2013), expressa o acirramento da concentração e

internacionalização do capital observadas anteriormente, porém numa escala jamais

antes constatada. Reforçando antigos métodos de expropriação, como a expulsão de

populações camponesas seguida da privatização de suas terras, observadas em ritmo

intenso atualmente em países como Índia e México (HARVEY, 2013), o capitalismo, na

sua presente forma, nutre-se de novos mecanismos de expropriação e produção de mais

valor baseado na exploração dos recursos sociais de produção. Para tal, demanda a

criação e abertura de novos mercados onde existam oportunidades de exploração

lucrativa. Esta necessidade vem sendo crescentemente viabilizada pelas privatizações e

liberalização do mercado resultantes da implementação das teorias neoliberais, a partir

de fins da década de 1970.

As antigas e novas formas de expropriação, de maneira combinada, atingem

ainda o conjunto de recursos naturais necessários à sustentação do modo de produção

capitalista, seja na forma de matéria prima, seja enquanto recursos básicos para a

sustentação da vida, em especial no que tange aos principais recursos que servem à

redução dos custos de produção e, portanto, permitem o incremento do lucro pelo

capitalista. Neste sentido, assistimos à nova “[...] mercantilização da natureza por

atacado” (HARVEY, 2012, p.123). Nova, no sentido proferido por Altvater (2011) que

concordando com Marx (2011), reconhece na mercantilização da natureza a primeira

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forma de apropriação de recursos naturais e a sua ressignificação como capital, em

detrimento de diversos outros significados a ela atribuídos por grupos sociais pautados

em lógicas distintas (ZHOURI, OLIVEIRA, 2005). Originalmente observadas na

questão da terra e de outros recursos considerados estratégicos para a exploração, as

expropriações primárias hoje se somam à exploração e mercantilização da

biodiversidade; privatização direta e indireta de recursos outrora abundantes para a

exploração e consumo, como a água ou o ar, por meio da privatização de aquíferos e

venda de créditos de carbono; patenteamento de processos e técnicas diversas

aprendidas e transmitidas através de gerações por populações tradicionais e indígenas,

assim como de materiais genéticos resultantes da domesticação milenar de plantas e

sementes; dentre outras múltiplas formas de incorporação da natureza a partir do seu

valor econômico.

Todos esses processos compartilham a progressiva privatização dos recursos

naturais e a concentração da riqueza gerada a partir da sua exploração, compreendem,

no seu bojo, uma determinada racionalidade das práticas produtivas fundada na

especialização e homogeneização da natureza, e maximização do benefício econômico,

que se traduz, de forma direta, na sua exploração a ritmos crescentes. As consequências

mais imediatas da imposição de leis de mercado sobre as condições naturais de

reprodução social são a degradação e esgotamento dos recursos naturais. Esta dinâmica

se estabelece a partir da hegemonia exercida pelo modo de produção dominante,

calcado na necessidade de expansão crescente, expressa na contínua abertura de

mercados e disposição de populações expropriadas em distintos níveis, detentoras

apenas da sua força de trabalho. O resultado é a generalização de práticas consideradas

ecologicamente corretas, porém, o problema, consideramos que continue sendo a

concentração destas nas mãos daqueles que detêm condições de desenvolvê-las e

implementá-las, ou seja, a concentração.

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Resumo da parte II

A análise geográfica sobre a vocação geograficamente expansionista do capitalismo nos

permitiu entender:

como a Geografia, em uma perspectiva influenciada pelo pensamento marxista,

entende a produção do espaço, o território e o processo de territorialização;

a dinâmica espacial e territorial do modo de produção capitalista que se reproduz em

momentos de crise intensificando a falha sociometabólica na relação entre a

sociedade e a natureza.

A partir destes demonstramos à antítese em relação ao tratamento dado ao

desenvolvimento territorial rural sustentável no modo de produção capitalista pelo

entendimento:

da produção do espaço, do território e do processo de territorialização no modo de

produção capitalista na perspectiva da Geografia crítica;

da dinâmica espacial e territorial do modo de produção capitalista e sua relação com

a falha sociometabólica entre a sociedade e a natureza.

Com isto, demonstramos:

que a produção do espaço e o território, no modo de produção capitalista e na

perspectiva geográfica e crítica, possuem contornos contraditórios e desiguais devido

a influência deste modo de produção;

a concepção de território a partir das relações de poder;

historicamente, que o modo de produção capitalista, devido a suas características de

irreformabilidade e incontrolabilidade, vem conseguindo se manter diante de crises;

geograficamente, a relação entre estes processos e a falha sociometabólica entre a

sociedade e a natureza.

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Parte III

Da década do alarde ao imperialismo ecológico: análise do desenvolvimento

sustentável como alternativa de reprodução do modo de produção capitalista

Na tradição marxista, o imperialismo é considerado um conceito amplamente

utilizado na forma de instrumental teórico que, no âmbito da II Internacional109

, está

relacionado a tentativas de interpretação da realidade corrente. No início do século XX,

com Rudolf Hilferding, Rosa Luxemburgo, Karl Kautsky, Nicolai Bukharin e Vladimir

Ilitch Lenin110

, surgem distintas vertentes dentro do marxismo, que debatem e se

empenham na tarefa de interpretar o desenvolvimento do modo de produção capitalista.

De acordo com Del-Roio (2012), impulsionado pelo advento do capital

financeiro, o capitalismo ingressara num segundo estágio de acumulação, caracterizado,

sobretudo, pela substituição da livre concorrência pelos monopólios e pelo ganho de

importância relativa da exportação de capitais em detrimento à exportação de

mercadorias.

Tratava-se de um segundo estágio de acumulação capitalista, em substituição

ao estágio do capitalismo concorrencial111

, que ficou conhecido como o estágio do

capitalismo monopolista, o imperialismo.

Na atualidade, autores como Chesnais (1996; 2005), Robinson e Harris (2000),

Hardt e Negri (2001), Harvey (2012), e Boron (2006), entre outros, se lançam no

mesmo desafio colocado à teoria marxista clássica do imperialismo no empenho de

109

“[...] fundada no Congresso Internacional de Trabalhadores, organizado pelos marxistas em Paris no

mês de julho de 1889. A exemplo da Primeira Internacional, tinha sua base essencialmente no movimento

dos trabalhadores europeu, mas foi muito mais ampla do que a sua antecessora. Em grande parte

dominada pela Social-Democracia alemã, os partidos que lhe eram filiados tinham conseguido – ou

estavam em vias de conseguir – uma base de massas. [...] A Segunda Internacional foi, essencialmente,

uma federação livre de partidos e sindicatos. Em 1900, o Bureau Socialista Internacional, com função

mais técnica e coordenadora do que diretiva, foi estabelecido em Bruxelas, tendo Camille Huysmans

como seu secretário de tempo integral. Na maior parte dos partidos filiados, com a exceção destacada do

Partido Trabalhista Britânico (admitido em 1908), o marxismo era a ideologia predominante, embora

outras tendências e influências também estivessem presentes, entre as quais os anarquistas, que, depois de

derrotados na questão da luta política nos congressos de 1893 e de 1896, foram excluídos da Internacional

(JOHNSTONE, 2013, p. 317). 110

Hilferding (1985) ergue a infraestrutura teórica sob a qual Luxemburgo (1988), Kautsky (2002a,

2002b), Bukharin (1988) e Lenin (2010) irão desenvolver conceitualmente o imperialismo. 111

Em sua crítica ao capitalismo, Hilferding (1985) demonstrou como a concentração do capital conduziu

a um papel decisivo dos bancos no processo de crescimento industrial, fenômeno que não se manifestara

ainda nas condições do capitalismo concorrencial observado por Marx (2013).

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caracterizar o atual estágio de acumulação capitalista e, a partir disso, entender sua

natureza, limites e implicações do conceito de imperialismo na contemporaneidade112

.

Consideramos que o atual momento de crise não representa uma estagnação

definitiva, mas sim uma fase no processo cíclico de expansão capitalista como

momento, também, de expansão imperialista no qual ocorre uma acelerada destruição

de ecossistemas e redução da biodiversidade (WILSON, 2002) como resultado direto da

conversão de recursos naturais básicos a existência de vida em mercadoria, em fim, da

lógica inerente ao modo de produção capitalista e sua tendência à acumulação ao custo

da destruição.

Esta dualidade não é resultado de certa disposição natural, mas sim um dos

objetivos do que Harvey (2012) escreveu sobre o atual estágio do novo imperialismo e

da acumulação por espoliação, que, em sentido estrito, tem impactos na relação entre a

sociedade e a natureza.

As transferências espaço-temporais dos investimentos de capitais a fim de

garantir a lucratividade se traduzem pela exploração de recursos naturais que

transformam e determinam as relações entre os países periféricos e centrais, e este

processo, é aqui considerado como imperialismo ecológico. Termo utilizado pela

primeira vez em 1986 por Alfred Crosby e representa, na perspectiva do autor, o

impacto resultante do processo de expansão das populações europeias.

O foco de seu trabalho concentra-se na invasão biológica lançada pelos

imigrantes em outras regiões do planeta (CROSBY, 1986). Na atualidade, o termo foi

retomado, principalmente por Foster (2004, 2005, 2011) e representa novas formas de

imperialismo que se materializam:

[...] mediante o saque de recursos de certos países por outros e pela

consequente transformação de ecossistemas inteiros dos quais estados e

nações dependem; movimentos massivos de trabalho e população vinculados

à extração e transferência de recursos; a exploração das vulnerabilidades

ecológicas de certas sociedades para promover um maior controle

imperialista; a descarga de dejetos ecológico que amplia a fenda entre centro

e periferia; e em conjunto, a criação de uma “descontinuidade metabólica”

global que caracteriza a relação do capitalismo com o meio-ambiente ao

mesmo tempo em que limita o desenvolvimento capitalista (FOSTER, 2004,

p. 226).

112

É importante destacar que, além das influências teóricas do marxismo clássico, estes autores utilizam

matizes diversas de pensamento. Além disso, reconhecemos que dentro da teoria marxista sobre o

imperialismo existe um amplo leque de perspectivas teóricas, como a teoria da dependência e do sistema-

mundo, defendida por Wallerstein (1999), por exemplo.

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Colaborando com este entendimento, Porto-Gonçalves (2008) denomina a atual

fase do imperialismo de capitalismo fossilista, tendo por base a necessidade constante

de maior aquisição, neste caso, do recurso natural petróleo.

Deste modo, considerando que a partir da década de 1970, quando a crise se

lança no mercado mundial, o debate sobre a relação entre a sociedade e a natureza

atinge escala global e são criados arranjos institucionais para que o mesmo atingisse o

ápice com base no discurso ideologicamente proposto de desenvolvimento sustentável,

com tanta precisão, que sua contestação passou a ser considerada inadmissível.

Afinal, quem seria contra um modelo de desenvolvimento capitalista e

harmonioso? Esta ideia nos remete aos escritos de Zizek (2009) para quem as crises

possuem a capacidade de sacudir:

[...] o povo para fora de sua complacência, forçando-o a questionar os

aspectos fundamentais da vida, a primeira reação, a mais espontânea, o

pânico, o que leva ao “retorno ao básico”: as premissas básicas da ideologia

dominante, longe de ser questionadas, são reafirmadas com ainda mais

violência. O perigo, portanto, que a crise atual seja usada de modo análogo ao

que Naomi Klein chamou de “doutrina do choque” (ZIZEK, 2009, p. 28).

Deste modo, consideramos que ao pesquisador envolvido com a Geografia,

sobretudo em sua vertente crítica, cabe refutar opiniões do senso comum, e muitas

vezes até mesmo acadêmicas, por meio da superação de determinada realidade, saindo

da aparência e buscando a essência, em nosso caso, a ampla aceitação do

desenvolvimento sustentável como algo materializado. Lefebvre (1991) colabora com

esse entendimento ao escrever:

Só atingimos as realidades físicas e humanas mediante os “fenômenos”, mas,

se nos ativermos a esses fenômenos, se pensarmos que nada existe por trás

deles, como podemos tentar conhecer? Na história da filosofia, os

“empiristas” que se ativeram às impressões imediatas, foram sempre

“nominalistas”. Para eles, as ideias gerais, os tipos, os conceitos, as

essências, não são mais que abstrações. Mas, nesse caso, trata-se apenas de

constatar a diversidade dos fenômenos. Não existe mais ciência nem

conhecimento; estamos, por conseguinte, no reino do ceticismo! Mas, se

pusermos “essências” e colocarmos essas essências “além” das aparências e

dos fenômenos, sem relações com eles, como então atingi-las? Tampouco há

conhecimento e ciência para o racionalismo metafísico... A ciência supõe, por

um lado, que é possível distinguir entre o aparente e o essencial; e, por outro,

que há uma ligação entre eles [...] A ciência, desse modo, supõe que seja

possível estabelecer uma hierarquia entre os fenômenos; que seja possível

distinguir entre os que não têm fundamento e os que têm fundamento na

essência. [...] A essência aparece em suas relações reais como algo diverso

de si mesma, com as outras coisas com as quais se encontra e pelas quais é

limitada. [...] A aparência, manifestação ou fenômeno, portanto, é apenas um

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aspecto da coisa, não a coisa inteira. [...] A coisa difere da aparência; e, com

relação a aparência, a coisa é em si mesma a diferença, negação, contradição.

Ela não é a aparência, mas sua negação. [...] É por isso que podemos atingir

a essência a partir dos fenômenos. A essência é apenas uma corrente mais

profunda no fluxo das aparências e dos fenômenos. Nem todos os fatos se

situam no mesmo plano; e a essência, a lei, encontra-se abaixo da superfície,

na parte calma e profunda do rio. A questão consiste em atravessar a

superfície a fim de imergir nas águas profundas (LEFEBVRE, 1991, p. 218,

219, aspas no original, itálicos nossos).

Assim, entendemos que o desenvolvimento sustentável foi apresentado,

primeiro como oportunidade a partir de sua aparência humanitária, depois, como farsa

pela sua essência ideológica e alienante e, para demonstrarmos essa ideologia trazemos

à tona a questão da importância do papel social desempenhado pelo pesquisador na

Geografia, entendendo esta como ciência com potencialidade de profunda significação

contrária ao processo de massificação das aparências, no sentido anteriormente proposto

por Lefebvre (1991), onde pesquisas ignoram o potencial deturpador do conceito de

desenvolvimento sustentável. Deste modo, concordamos com Oliveira (1978) que

escreveu que, fazendo uso do status de cientista e buscando com isso se manter no

patamar da neutralidade científica em relação ao posicionamento político, pesquisadores

e geógrafos:

[...] engajam-se no establisbment, outros criticam-no. Uns fazem da ciência

instrumento de ascensão social e envolvimento político, outros procuram

colocar o conhecimento científico a serviço da transformação e da justiça

social. (OLIVEIRA, 1978, p. 30)

Este fato chama atenção para o que Burawoy (2011) escreveu sobre a

sociologia produzida para a academia que ele chamou de conhecimento instrumental

“[...] que toma como dados os fins e os meios, preocupando-se simplesmente com os

meios mais eficazes para atingir os fins” sem questionar os objetivos destes meios e

fins.

Fazendo uma analogia com Burawoy (2011), podemos escrever de uma

Geografia reprodutiva para políticas públicas, levando em consideração o tratamento

ideológico dado, no sentido proposto por Anderson (1975), ao trabalho de

pesquisadores na ciência geográfica que se dedicaram ao estudo do mesmo tema que

propomos a análise, porém, não dedicando a mesma atenção.

Este fato permite que o desenvolvimento sustentável passe a ser aceito como

algo materializado inibindo estudos críticos sobre o mesmo considerando sua

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potencialidade em relação à reprodução do modo de produção capitalista, o que inibe

sua utilidade, este fato nos permite questionar, assim como Anderson (1975)113

se:

“Were they immune from ideology, or so under its in influence that they were unawere

of the fact?” (ANDERSON, 1975, p.1).

Assim, consideramos que, da maneira como vem sendo proposto, articulado e

materializado, o desenvolvimento sustentável se apresenta como uma proposta

desenvolvimentista apoiada na lógica territorial de domínio capitalista, no sentido

proposto por Arrighi (2014) que assim escreveu: “[...] identifica el poder com el grado

de control sobre recursos escasos y considera las adquisiciones territoriales como medio

y subproducto de la acumulación de capital” (ARRIGHI, 2014, p. 49).

Neste raciocínio, a produção do espaço e o território se encontram de tal forma

imbricados no modo de produção capitalista, que o almejado desenvolvimento territorial

rural sustentável não escapa de sua lógica. Portanto, as recomendações do Grupo BM

são entendidas aqui como formas de se difundir o imperialismo ecológico e, nesta

última parte de nossa pesquisa, elaboramos nossa síntese e verificamos a hipótese de

que o desenvolvimento sustentável esteja sendo utilizado com forma de reprodução do

modo de produção capitalista. Para tanto, voltamos à materialidade da política pública

delimitada para análise – Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas –

verificando seus resultados.

Com isso objetivamos:

demonstrar o poder simbólico de políticas públicas de desenvolvimento territorial

rural sustentável pela descaracterização do conceito de território;

evidenciar o falseamento da realidade que o desenvolvimento sustentável traz em

seu bojo;

verificar nossa hipótese e;

classificar o conceito de desenvolvimento sustentável.

113

Anderson (1975), se refere ao papel da ideologia em distorcer a realidade e ocultar os interesses de

classe, adotando a perspectiva marxiana clássica de falsa consciência tendo por base, de acordo com

Pedrosa (2014) Lefebvre para chegar à concepção de fetichismo espacial. De todo modo, consideramos

que a frase aqui reproduzida não foge do contexto que estamos propondo, pois, assim como Anderson

(1975) está se referindo a concepção clássica de autores que se dedicam ao estudo da produção do espaço,

aqui, nos referimos à questão da influência do modo de produção capitalista na produção do espaço e da

ideologia que se materializa em parte das pesquisas acadêmicas que não consideram este processo.

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Esta verificação remete ao reconhecimento do desenvolvimento sustentável

como uma poderosa armadilha conceitual que, por meio de um influente discurso

ideológico, oculta sua materialidade e, neste ponto, é fundamental a análise da relação

multiescalar, pois a partir desta verificaremos se o desenvolvimento sustentável pode ser

entendido como modelo de desenvolvimento – que possui elementos estruturais – ou

uma proposta, prática local – que representa algo paliativo, conjuntural, sem alterar a

estrutura no seu todo – e esta verificação nos permite questionar que o desenvolvimento

sustentável possa ser implementado em escala local, pois consideramos que sua

validade frente ao processo maior de mundialização do modo de produção capitalista

seja nula, pois não representa possibilidade de enfretamento frente à totalidade social

maior da expansão global do desenvolvimento do modo de produção capitalista e sua

lógica dialética e predatória.

Capítulo 5. O poder simbólico de políticas públicas de desenvolvimento territorial

rural sustentável e a reprodução do modo de produção capitalista

De início, podemos analisar este processo – a existência de um poder simbólico

– a partir da proposição de Fernandes (2015), para quem:

O processo de construção do conhecimento é uma práxis intelectual e política

que através de coletivos de pensamento se organiza para produzir seus estilos

de pensamento, seus paradigmas (Fleck, 2010; Kuhn, 1978). Nenhum

trabalhador intelectual está fora deste processo, nem os que trabalham em

grupos de pesquisas, em redes nacionais e internacionais, e nem mesmo

aquele que trabalha sozinho. É através da práxis intelectual que adentramos

nos territórios das teorias conduzidos pelo método e utilizamos conceitos

produzidos e produzimos outros. A discussão sobre os conceitos tem um

papel importante dentro do debate paradigmático, porque traz à luz as

intencionalidades dos pensadores e revelam suas posições políticas

(FERNANDES, 2015, p. 386).

Considerando ainda que o desenvolvimento territorial rural sustentável vem

sendo reproduzido por meio de políticas públicas que consideramos compensatórias,

Fernandes (2015) acrescenta que:

As palavras política pública podem ser compreendidas de acordo com as

premissas selecionadas. Quando utilizamos a expressão política pública,

estamos nos referindo a um programa, projeto ou plano de desenvolvimento

elaborado pelos governos ou por estes com organizações da sociedade civil

que transformam espaços e territórios. A partir deste pensamento, as políticas

públicas são elaboradas em determinados espaços e territórios por

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instituições públicas e privadas que defendem diferentes modelos de

desenvolvimento do país. Além da relação entre as instituições, seus espaços

e territórios, temos políticas públicas elaboradas de cima para baixo, ou seja,

a partir de um setor do governo para atender uma demanda da população,

sem contar com sua participação. Também são elaboradas políticas públicas

de baixo para cima, que conta com ampla participação da sociedade

organizada (FERNANDES, 2015, p. 393).

O controle dos meios de produção que imprimem transformações à primeira

natureza fortalece a degradação de recursos naturais. É fato que a apropriação, uso e

controle de tais recursos ampliam a distinção entre as classes sociais e, deste domínio de

relação social desigual, surgem benefícios e prejuízos.

As soluções a este fato são apresentadas e impostas na forma de discursos

ideológicos denominados de recomendações114

para a execução de políticas públicas por

agências multilaterais, como o Grupo BM, e são técnicas. Busca-se, através destas,

solucionar a questão sobre a recuperação de recursos naturais de forma que as estruturas

de classe da sociedade atual não sejam alteradas e haja uma valorização econômica de

tais recursos com vistas à acumulação e reprodução de capital ampliando a alienação

entre a sociedade e a natureza. Assim, temos a materialização de um pensamento que

reconhece os problemas do desenvolvimento predatório, mas não caracteriza um ideal

de descentralização de poder e capital.

Dentro desta concepção economicista o que se busca é estender a

regulamentação financeira sobre a natureza, fazendo com que a luta social sobre o

controle de recursos naturais passe pelos mecanismos de mercado, ao invés da política.

Incluso no prisma do imperialismo ecológico, o desenvolvimento sustentável é o que

podemos denominar como ideologia técnica-desenvolvimentista-ecológica.

A partir deste esclarecimento, neste capítulo verificaremos com maior acuidade

o fato de que o uso de políticas públicas de desenvolvimento territorial rural sustentável

representa, na verdade, a reprodução do modo de produção capitalista, para tanto, a

partir da materialidade do PEMH, realizaremos nossa terceira aproximação sobre a

hipótese lançada e demonstraremos que o Grupo BM faz uso de seu poder de influência

e do apelo humanitário por de trás do desenvolvimento sustentável para ampliar sua

escala de atuação fazendo uso de políticas públicas de desenvolvimento territorial rural

sustentável.

114

A partir deste ponto, não nos referimos mais a ‘recomendações’, utilizaremos o termo ‘normas

impostas’ ou ‘imposição’ sempre que nos referirmos a ações planejadas pelo Grupo BM.

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5.1. A prática discursiva ideológica e as contradições do desenvolvimento

territorial rural sustentável imposto pelo Grupo Banco Mundial

Consideramos a ideologia como a criação de uma falsa consciência sobre a

realidade, de acordo com Marx e Engels (MARX; ENGELS, 2009), que serve para

mascarar as contradições entre a sociedade e entre a sociedade e a natureza, mantendo

esta dominação e fazendo com que não seja perceptível que esta ideologia tem sua

gênese nos grupos dominantes daquilo que Bourdieu (2009) vai denominar de poder

simbólico: “[...] esse poder invisível o qual só pode ser exercido com a cumplicidade

daqueles que não querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo que o exercem”

(BOURDIEU, 2009, p.8).

O estudo de Bourdieu (2009), a partir de sua proposição teórica sobre o poder

simbólico, lança luz para a importância em se desnaturalizar construções sociais

considerando que o processo contemporâneo de mundialização da economia capitalista

tem provocado mudanças fundamentais nas relações entre política e economia

revelando formas de imperialismo exercidas pelo Grupo BM.

São práticas que fortalecem o processo de mundialização por meio da escala de

atuação, segundo a força de quem os gerou. Nesse sentido, sistemas de ações como

agências de fomento internacional, como o Grupo BM, podem produzir eventos e esses

produzirem normas que irão conduzir padrões de desenvolvimento em distintas nações.

E são as normas – políticas, técnicas e organizacionais – que orientam as ações humanas

e conduzem a forma como um conjunto de ações irá ocorrer. Como escreveu Santos

(2009):

[...] existem ações capazes de ter efeitos de abrangência mundial, no sentido

de que, num dado momento, sua eficácia se faz sentir além dos níveis local,

regional ou nacional, interessando pontos numerosos situados em diversos

países e continentes (SANTOS, 2009, p. 143).

Neste contexto estão inseridas as políticas públicas e consideramos que estas

deveriam ser articuladas a partir de aspectos sociais desenvolvidos por determinada

sociedade em consonância com o sistema de significações que é próprio de determinada

realidade. As representações sociais predominantes fornecem valores, normas e

símbolos que estruturam as relações sociais e, como tais, fazem-se presentes no sistema

de dominação, atribuindo significados à definição social da realidade que vai orientar os

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processos de decisão, formulação e implementação das políticas (JOBERT; MULLER,

1987 apud AZEVEDO, 2001). Para Bourdieu (2009), estas representações e símbolos

são objeto de disputas e conflitos entre agentes sociais pela conservação ou pela

transformação de suas posições no mundo social.

Essas disputas assumem a forma de uma luta pelo poder propriamente

simbólico de ver e fazer crer, de predizer e de prescrever, de dar a conhecer e

de fazer reconhecer, que é ao mesmo tempo uma luta pelo poder sobre os

“poderes públicos” (BOURDIEU, 2009, p. 174).

Porém, os agentes políticos internacionais não são marionetes das forças

econômicas e sociais locais, como escreveu Peet (2007):

[...] as ideias por trás das práticas institucionais, tais como elaborar e

implementar políticas, não são concebidas de forma neutra, como finge a

ciência, nem são elas pensadas no interesse de todos, como espera o

humanismo moderno, mas, ao invés disso, políticas são feitas para servir aos

interesses político-econômicos dominantes (PEET, 2007, p. 23).

As normas impostas e difundidas estrategicamente pelo Grupo BM não são

implementadas mecanicamente, existe uma complexa engenharia social que permeia

este processo de acordo com as relações de poder que se estabelecem no campo de

formulação das políticas públicas na atualidade.

Considerando que o Estado é gerado pelas contradições da sociedade, é

possível escrever que as políticas públicas deveriam ser formuladas nas, e a partir das

lutas das classes e grupos sociais pela defesa de seus interesses, e não a partir de

imposições de agentes financeiros internacionais muitas vezes externos e alheios a

essência de questões locais. Portanto, a política pública objeto de nosso estudo – PEMH

– é analisada como produto tecnicamente concebido que não leva em consideração o

protagonismo de pessoas que, sem notarem, vivem em caráter subalterno em relação ao

sistema hegemônico do capitalismo. Elas, as normas impostas pelo Grupo BM sob o

título de recomendações, são criadas para atender a um problema que ganhou relevância

pública, o desenvolvimento sustentável, porém, as estratégias previstas não visam gerar

sequer uma autonomia relativa das pessoas em relação aos recursos naturais que por ela

são beneficiadas.

Importa-nos aqui demonstrar a relação entre a materialidade, ou não, do

desenvolvimento sustentável e o modo de produção capitalista. Materialidade esta que

se expressa nesta pesquisa por meio da efetivação do PEMH, que consideramos como

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proposta/prática de desenvolvimento sustentável, mas não representa a totalidade do que

podemos considerar como modelo de desenvolvimento, na perspectiva que escrevemos

anteriormente. Assim, consideramos o PEMH como política pública de característica

compensatória, conforme propôs Fernandes (2015). Isto significa que, na perspectiva do

desenvolvimento territorial rural sustentável, devemos ter em mente a intencionalidade

com que a mesma foi planejada e possibilitou sua legitimidade.

O que nos importa compreender para considerarmos o desenvolvimento

sustentável como alternativa para a reprodução do modo de produção capitalista, não

é o estudo sobre a sua delimitação conceitual, mas sim a sua materialidade, portanto, o

que verificamos é o seu uso no território, nesta perspectiva, vamos ao encontro do que

Haesbaert (2012) escreveu sobre a verificação de um conceito, assinalando que, mais do

que sua significação, o que importa é sua funcionabilidade, ou seja, verificaremos sua

materialidade para, a partir deste identificá-lo – ou não – como conceito

(HAESBAERT, 2012).

Deste modo nos detemos sobre a verificação da materialidade do

desenvolvimento sustentável no território. Na perspectiva defendida que garante a

materialidade do desenvolvimento sustentável por meio de políticas públicas de

desenvolvimento territorial rural, o território passa a se constituir como uma unidade de

referência, ou seja, um nível de operação e agregação visto como adequado para operar

o planejamento de ações governamentais e políticas públicas (SCHNEIDER, 2004).

Nas abordagens territoriais predominam análises da dimensão econômica e

da dimensão social numa acepção de território como uma unidade geográfica

determinada, quase sempre como espaço de governança. A definição de

território por órgãos governamentais e agências multilaterais não consideram

as conflitualidades dos diferentes tipos de territórios contidos no “território”

de um determinado projeto de desenvolvimento territorial. Ao se ignorar

propositalmente os distintos tipos de território, perde-se a multiescalaridade,

porque estes territórios estão organizados em diversas escalas geográficas,

desde a local até a escala internacional. O conceito de território passa a ser

instrumentalizado para atender aos interesses de instituições e expressa, então

sua mais cara propriedade: as relações de poder (FERNANDES, 2008, p.

278).

Dessa forma, levando-se em conta a limitação normativa e operacional do

conceito de território apresentado na Parte I, consideramos que ocorre a

descaracterização do mesmo, tendo em vista que os conflitos estão presentes desde a

formulação até a implementação das políticas públicas como salientamos na Parte II.

Isso porque, o jogo de interesses é inerente ao processo em que esta envolta

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determinada política pública, no caso o PEMH, e, esta disputa, ou conflito por

interesses, está presente em todas as etapas, uma vez que seus agentes não pertencem à

mesma categoria política nem a mesma classe social e, por isso mesmo, cada segmento

terá suas próprias prioridades e interesses.

O reducionismo que sofre o conceito de território, naquela perspectiva

trabalhada por Abramovay (2000, 2001), Veiga (2005, 2013) e Navarro (2001, 2008),

induz à elaboração de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento territorial rural

sustentável que tomam o território como área, depositário da intervenção, receptor de

uma ação direcionada e intencionada. Mero receptor, porque o território definido a

partir da normatização não é um território carregado de interações entre a sociedade e

a natureza e não considera que o território está no cerne da dinâmica das relações

sociais de produção, sobretudo, sob a égide do modo de produção capitalista.

Buscando contrapor estas normatizações, do território e do desenvolvimento

sustentável, encontramos em autores e pesquisadores que trabalham na vertente crítica

da Geografia o arcabouço teórico que nos permite entender o território a partir de

relações de poder e da conflitualidade. Este reconhecimento, geográfico e crítico, é a

base teórica fundamental que trazemos para desconstruir a tese de que o

desenvolvimento sustentável possa se materializar e se propor enquanto alternativa ao

modo de produção capitalista. Pois, na perspectiva geográfica elencada, entendemos que

a produção do espaço e o território sofrem determinações dos agentes que atuam na

reprodução do modo de produção capitalista, com isto, demonstramos, por meio da

análise de uma política pública voltada ao desenvolvimento territorial rural sustentável

que este, apesar de se materializar, atua, na verdade, como instrumento ideológico

voltado a reprodução do modo de produção capitalista sendo, portanto, incapaz de

atenuar as diferenças na relação entre a sociedade e a natureza contrariando sua própria

concepção.

Ao introduzir a dimensão territorial em políticas públicas de desenvolvimento

rural a partir de recomendações do Grupo BM, não foi levada em consideração a

questão das relações de poder que, segundo Raffestin (1993) são intrínsecas ao mesmo,

este fato provocou uma descaracterização do território, levando o mesmo a ser

entendido como área delimitada fisicamente e apta a intervenções pré-determinadas.

Este entendimento foi apoiado por autores como Abramovay (2000; 2001), Veiga

(2005; 2013) e Navarro (2001; 2008), pela SAA, CATI (2005; 2009) e pelos próprios

produtores rurais que, diante de uma postura hegemônica, optaram por se adequar a

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determinadas normas acreditando em uma suposta melhoria e contribuição para com os

recursos naturais.

Assim, diferentemente da abordagem do conceito de território adotada,

sobretudo na Geografia crítica, em que este é apreendido e delimitado por e a partir de

relações de poder engendradas por grupos sociais num determinado espaço-tempo,

sendo os conflitos considerados um componente fundamental da sua constituição e

lógica, na perspectiva normativa e operacional adotada pelo estado brasileiro, o enfoque

territorial é considerado apenas como uma ferramenta para se pensar o planejamento e a

intervenção estatal na sociedade a partir de diferentes escalas de atuação. Todavia, faz-

se necessário enfatizar que uma categoria essencial para a compreensão do território,

que é o poder e as relações de conflito daí derivadas entre os diferentes agentes e

instituições não é considerada no âmbito das políticas públicas que procuram incorporar

essa perspectiva.

De tal modo, a questão sobre a materialidade territorial do desenvolvimento

sustentável e a lógica de reprodução do modo de produção capitalista remete a relação

entre o mesmo (desenvolvimento sustentável) e a dinâmica escalar deste modo de

produção e ao recorte espacial em que as ações e estratégias são definidas e

implementadas.

Para isso, a análise escalar entre o global e o local se torna referência para a

averiguação da materialidade das atuações que remetem ao desenvolvimento territorial

rural sustentável. É a partir desta articulação, que faz uso da escala como forma de

controle social (GÓMEZ, 2006) que vão se desenhando formas e normas a fim de

garantir controle territorial permitindo a acumulação e reprodução do modo de produção

capitalista.

O controle do território via extensão do poder das personificações do capital –

sejam empresas privadas ou organismos multilaterais – é fundamental para a

apropriação dos recursos naturais a fim de normatizar a organização territorial, como

ressalta Porto-Gonçalves (2006) é “[...] a questão política e toda geopolítica que está

implicada no cerne do desafio ambiental por meio do território” (PORTO-

GONÇALVES, 2006, p. 291). Com isso, Mészáros (2003) destaca a importância desse

jogo escalar entre global e local afirmando que o modo de produção capitalista “[...]

torna-se totalmente vazio sem as complexas relações com as comunidades nacionais”

(MÉSZÁROS, 2003, p. 48), o que, para Ponte (2014): [...] representa uma forma de

apropriação e domínio do local e de suas particularidades para o processo de

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acumulação ampliada do capital, principalmente no momento de sua crise estrutural

(PONTE, 2014, p. 193).

Embora esta articulação espacial não se faça sem obstáculos, pois há um “[...]

antagonismo entre a tendência globalizante do capital transnacional no domínio

econômico e a dominação continuada dos Estados nacionais como estrutura abrangente

de comando da ordem estabelecida” (MÉSZÁROS, 2003, p. 53), ou seja, é a limitação e

a contradição do próprio modo de produção capitalista, que, para realizar a

interpenetração das ações globais na estruturação local, articula suas relações com

estados.

Um ponto central desta perspectiva para nossa análise é a negação do acúmulo

conquistado pela Geografia, que tem o território como um de seus principais conceitos

de interpretação da realidade (SAQUET, 2007), no processo de formulação do

referencial que define os parâmetros da abordagem territorial. Deste modo, o território

sendo usado de forma instrumental visando a operacionalização de determinado recorte,

perde a relação com o real, descaracteriza o conflito e as relações de poder.

[...] o planejamento para o desenvolvimento leva embutida a consolidação de

certa ordem social, o que requer certa estabilidade. Para traçar uma política

de desenvolvimento, é preciso (ou como mínimo desejável) esterilizar os

conflitos que possam questionar a legitimidade e a absurdidade da lógica

capitalista. O território instrumental da abordagem territorial está cortado à

medida das necessidades de controle social e reprodução capitalista

(GÓMEZ, 2006, p. 8).

Consideramos que estes fatos possuem íntima articulação com o

desenvolvimento sustentável, pois induz a determinada simplificação que não aborda

questões estruturais, ou seja, em nossa concepção, os principais problemas relacionados

à relação entre a sociedade e a natureza decorrem dos impactos negativos da expansão

do modo de produção capitalista, em particular, sua acumulação e constante reprodução,

que promove o desenvolvimento desigual e, forçosamente leva a criação de novos

espaços para acumulação e posterior reprodução, como o desenvolvimento sustentável.

Deste, enfatizamos que o elemento central para compreender a questão do

desenvolvimento sustentável, não é o desenvolvimento, nem tampouco entender todo o

processo histórico da adjetivação sustentável, mas, sim, o território, ou melhor, o uso do

território, e, é isto que nos permite escrever sobre territórios do desenvolvimento

sustentável em distintas concepções.

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A primeira concepção foi apresentada na Parte I desta pesquisa. Naquela,

autores e pesquisadores que se articulam em torno de políticas de desenvolvimento

territorial rural sustentável, como o PEMH, defendem a materialidade do

desenvolvimento sustentável por meio da implementação de políticas públicas voltadas

ao campo por meio de normas e nesta perspectiva está inclusa a concepção areal de

território.

Interpretamos este posicionamento como uma visão reducionista sobre o

território, sendo o mesmo acessório para o desenvolvimento, acumulação e reprodução

do modo de produção capitalista e o desenvolvimento sustentável se equivalendo a um

instrumento para a realização deste processo.

Esta concepção de território responde ao discurso ideológico oficial do

desenvolvimento sustentável, que detém a hegemonia sobre o campo, e que, para muitos

efeitos, atua como a verdade sobre o tema devido ao caráter representativo de suas

instituições mães, como a ONU e o Grupo BM. Compreende o desdobramento da

proposta originada nos trabalhos da Comissão Brundtland e reproduzida nas grandes

conferências internacionais e nos programas governamentais sobre recursos naturais e

desenvolvimento.

A argumentação econômica e técnico-científica ocupa uma posição

privilegiada nessa concepção que tende a deixar em segundo plano outras características

que compõem o território, deste modo, entendemos que o Grupo BM faz uso do

território por meio de suas normas como recurso, tanto em termos de recursos naturais

propriamente ditos e se referindo a reserva dos mesmos, quanto, e especificamente, para

a reprodução do modo de produção capitalista, garantindo seus interesses particulares,

deste modo, o Grupo BM se articulou em torno do desenvolvimento sustentável

buscando adaptar suas estratégias.

A segunda concepção sobre os territórios do desenvolvimento sustentável está

ancorada na parte II. Naquela concepção que tem o território relacional como resultado

de relações de poder que se realizam por meio da conflitualidade, na qual o modo de

produção capitalista apresenta forte influência.

Nesta perspectiva, situamos o desenvolvimento sustentável como uma

armadilha teórica conceitual com profundo poder simbólico devido a sua característica

de apelo humanitário, mas que não contém materialidade enquanto modelo de

desenvolvimento, pois o que prevalece são as relações sociais conflituosas que se

materializam nos processos de territorialização do modo de produção capitalista e na

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normatização do território. Sem a pretensão de adiantar nossos resultados,

demonstraremos melhor esta relação no item seguinte (5.2), ainda que estes processos

venham adjetivados por práticas sustentáveis, como nos casos apresentados do Etanol e

de nosso próprio objeto de estudo.

Estes escritos nos remetem ao confronto entre o posicionamento de autores e

pesquisadores que defendem o território como norma, área delimitada e apta à gestão

descentralizada e a implementação de projetos com viés territorial e sustentável, na

perspectiva de Abramovay (2000, 2007), Veiga, (2005), Navarro (2001, 2008) e Sachs

(2005), por exemplo, e outros que, em uma perspectiva crítica, entendem o território a

partir de relações de poder, como Raffestin (1993), Peet (2007), Smith (1988) e a

influência do modo de produção capitalista sobre as práticas espaciais que dão contorno

ao território.

Isto porque o que nos é de relevância nesta pesquisa não é compreender o

processo de desenvolvimento, mas sim relacioná-lo ao modo de produção sob o qual

este ocorre e como podemos, pela Geografia, compreender a materialização, ou não, do

desenvolvimento sustentável no território.

Do ponto de vista teórico-conceitual, para Gameiro (2013) a noção weberiana

de legitimidade é útil, pois permite a interpretação das relações de poder que sustentam

um programa de gestão descentralizada e normativa do território, como o PEMH.

Segundo Weber (1994), legitimidade relaciona-se ao reconhecimento da autoridade de

uma norma levando-a a ser respeitada por adesão ou respeito à determinada autoridade,

e não por coação.

A obediência de um indivíduo ou de grupos inteiros pode ser dissimulada por

uma questão de oportunidade, exercida na prática por interesse material próprio

(WEBER, 1994). Porém, concordamos com Outhwaite (2013) que nos lembra que:

Embora a dominação ou autoridade possa basear-se, diz Weber, no costume,

no interesse, em motivos emocionais ou “racionais com relação a valor”, uma

ordem segura em geral se caracteriza por uma crença em sua legitimidade.

Esta pode basear-se na tradição, no CARISMA do(s) governante(s) ou em

uma aceitação “racional” da legalidade e da ordem. Como sempre ocorre com

os tipos ideais de Weber, essas formas puras de legitimidade são encontradas

em diferentes combinações, mas seria possível tomar a Arábia Saudita, a

Alemanha nazista e a Suíça como ilustrativas dos respectivos tipos. Como em

outras áreas da vida social, o carisma tende a se tornar rotinizado ou

objetificado, transformando-se em domínio tradicional ou constitucional, ou

em alguma combinação dessas duas formas (OUTHWAITE, 2013, p. 413).

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Aspectos que revelamos sobre o planejamento e execução do PEMH trazem

elementos importantes sobre a construção da legitimidade/domínio de seus pressupostos

e formas de condução junto aos agentes envolvidos. No estudo encomendado pela FAO

para avaliação dos resultados dos PEMH no estado de São Paulo (NAVARRO, 2008),

encontramos a descrição de fatos que nos permitiu a reflexão sobre a aceitação legítima

desta política pública a partir da atenção destinada a questões que envolvem a

recuperação de recursos naturais.

Fato determinante para que o Grupo BM se posicionasse na qualidade de

articulador político detendo o poder global de influenciar decisões, em particular, sobre

políticas públicas de desenvolvimento territorial sustentável. Esta posição privilegiada

do Grupo BM em relação à proteção de recursos naturais revela que o movimento de

mundialização capitalista e o processo de descentralização, entendidas aqui como

estratégias centradas e articuladas pelo Grupo BM, não são conflitantes ao

desenvolvimento local, ao contrário, o local e o global podem ser consideradas escalas

predominantes, desde que consideremos uma de comando (Grupo BM) e outra de

execução (CATI – microbacia do Córrego da Onça II).

Brandão (2007) entende que agentes atuantes no modo de produção capitalista,

como o Grupo BM, articulam e manejam recomendações em distintas escalas de acordo

com as necessidades, deste, ponderamos que ocorra a supervalorização do local a partir

do receituário de descentralização e normatização territorial proposto pelo Grupo BM

desde a década de 1990, como demonstramos nos documentos citados anteriormente

(WORLD BANK, 1995, 2003, 2008; GRUPO BM 2002), para atrair investimentos e

beneficiar o grande capital.

Deste modo, ações consideradas estratégicas, que garantem ou suportam,

determinada economia local, por exemplo, não sejam afetadas e a descentralização

possa garantir aspectos mais heterogêneos das atividades rurais. Consideramos ainda

que essa é a articulação promovida pelo Grupo BM que tende a distanciar o foco de

questões estruturais115

por meio do processo de descentralização de ações e

normatização voltada ao desenvolvimento territorial rural sustentável.

115

Aqui, no sentido proposto por Mészáros (2012), que, ao fazer crítica a movimentos e partidos

reformistas, como o Partido Verde, que ao estabelecer como “questão única” as preocupações com os

recursos naturais, se afastam de outras como a diferença de classes sociais.

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Em uma escala macro, percebe-se que é na mobilidade do desenvolvimento

capitalista116

que é acentuada a desigualdade territorial, devido à concepção areal e

normatizada que as agencias de fomento especializadas trazem em seu bojo. Deste

modo, temos que considerar que o desenvolvimento do modo de produção capitalista

possui reflexos que alteram, em ritmos distintos, o desenvolvimento do campo que

ressignifica a formação socioespacial que resulta desta dinâmica para romper com

padrões estruturados e hierarquizados117

.

Tal orientação fortalece o papel compensatório das políticas públicas

(FERNANDES, 2015) assumindo uma perspectiva focalista, na medida em que visa a

atender os segmentos populacionais mais vulneráveis. Essa lógica do Grupo BM

decorre de teses relativas à ineficácia das políticas sociais e da sua incidência nos

estratos de maior renda, cabendo aos governos corrigir tais desequilíbrios ancorados em

recomendações e financiamentos de agências internacionais.

Desta forma, cabem críticas ao Grupo BM. Para Vainer (1998), por exemplo,

esta instituição se constituía no principal “[...] centro de elaboração e difusão de

modelos de organização e promoção do desenvolvimento capitalista nos países

periféricos” (VAINER, 1998, p.24). Vianna Junior (1998), ao discorrer sobre o papel do

Grupo BM afirmou que “[...] ele têm atuado como uma ‘inteligência’ auxiliar do

Governo na elaboração de programas e projetos” (VIANNA JUNIOR, 1998, p. 82).

Coraggio (2000) destaca também o papel do Grupo BM como provedor de ideias e

propõe que se analise a produção e legitimidade das mesmas.

Se o que o Banco Mundial oferece são principalmente ideias, e estas ideias

vão contribuir para dar forma a políticas estratégicas que preparam nossas

sociedades para um futuro sobre o qual somente podem ser feitas conjecturas,

é preciso analisar em detalhe como essas ideias são produzidas e qual sua

validade [...] (CORAGGIO, 2000, p. 75).

116

Sobre mobilidade espacial do modo de produção capitalista, ver, por exemplo, Perpétua (2013). 117

Neste sentido, demonstramos, na parte I desta pesquisa, as transformações rurais no Brasil após o

período de modernização nas décadas de 1960 e 1970, ao processo de descentralização e a normatização

do território, dedicando atenção ao Grupo BM, lembramos que, a década de 1990 revela um período de

ampla revisão das suas políticas de ajustamento estrutural, situação que levou o Grupo BM a apresentar à

comunidade internacional um discurso de mudança de postura em relação às estratégias implementadas

até aquele momento (PEREIRA, 2009). No entanto, esta revisão de atuação é aqui compreendida, de

acordo com Chomsky (2004), não como uma mudança, mas como estratégia de adaptações às pressões e

transformações na economia política internacional devido ao avanço do neoliberalismo.

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O Grupo BM assevera que o processo de descentralização gera mudanças nas

relações de poder e autoridade118

, que mascaram as relações entre as classes sociais. No

entanto, acreditamos que este processo tem produzido formas mais sutis de legitimar as

relações de poder na qual a influência governamental ainda permanece, mas

apresentando mudanças em suas formas de agir, desempenhando funções como

coordenador, facilitador e regulador de ações, como verificamos por meio da análise

documental, em relação à atuação do governo do estado de São Paulo, por meio da

SAA.

Em relação ao desenvolvimento territorial rural sustentável, entendemos o

Grupo BM como espaço de planejamento e articulação política capaz de estruturar um

processo social global de comunicação, resultado de uma ação tecnicamente coordenada

com potencial de propagar a submissão por meio do gerenciamento científico de

informações (PEREIRA, 2009) que projetam o discurso na forma de signos

(MARCUSE, 1941) que trazem em seu bojo um profundo poder simbólico

(BOURDIEU, 2009) com potencial de estruturar uma ordem ambiental internacional

(RIBEIRO, 2010).

Neste caso, temos uma planificação racional onde os interesses dominantes

representados pelo Grupo BM tornam-se categóricos, dominando os conflitos no campo

das ideias e definindo técnicas de atuação global conforme seus interesses. Ou seja, o

Grupo BM possui condições materiais, intelectuais, operacionais e também simbólicas

do poder de impor instrumentos de conhecimento e de expressão arbitrários, embora

ignorados ou não reconhecidos como tais, sobre a realidade socioespacial, que é,

também, um espaço de luta (BOURDIEU, 2009), no qual o trabalho intelectual

organizado nos documentos oficiais elaborados nos quadros do Grupo BM são produtos

finais, neste sentido, são considerados como objetos técnicos “[...] criados para fazer

parte da vida real [...]” (SANTOS, 2009, p. 126), portanto, constituídos por meio de atos

técnicos de acúmulo de conhecimento que ambicionam adaptar o meio as necessidades

e vontades de determinados sujeitos ante o temor do desconhecido (ORTEGA Y

GASSET, 1933) e, o desconhecido, é entendido aqui na forma de crise e seus impactos,

nas suas mais variadas denominações.

118

Neste sentido, concordamos com Arendt (2007) que identifica que o exercício da autoridade implica

uma obediência na qual as pessoas conservam sua liberdade, distinguindo-a de poder, força e violência, e

também de persuasão, pois nesta as pessoas são iguais.

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Actos técnicos – decíamos – no son aquéllos en que el hombre procura

satisfacer directamente las necesidades que la circunstancia o naturaleza le

hace sentir, sino precisamente aquéllos que llevan a reformar esa

circunstancia eliminando en lo posible de ella esas necesidades, suprimiendo

o menguando el azar y el esfurzo que exige satisfacerlas [...] (ORTEGA Y

GASSET, 1933, p. 13).

Santos (2009) incorpora a questão das normas técnicas impostas como um

dado fundamental da compreensão das dinâmicas territoriais. Diferentes arranjos

socioespaciais desses complexos organizacionais refletem os modos de ação possíveis

inscritos em cada um. Em sentido amplo, as agências especializadas no interior do

Grupo BM, por meio de seus agentes, impõem normas, por declarações, princípios e

recomendações, às regras com o objetivo único de aumentar o mais valor.

Essas imposições, para Castro (2003), seguem interesses globais que se

exercem por meio de agências internacionais que moldam as relações sociais por

normas e procedimentos organizacionais estruturados e aplicados, em muitas vezes, na

forma de políticas públicas, sendo que as mesmas estruturam os comportamentos

porque, paralelamente, moldam a identidade, o poder e a estratégia dos agentes

(FERNANDES, 2015). Portanto a autora (CASTRO, 2003), tendo por base Putnam

(1996), considera que as instituições estatais que aderem estas normas são também

moldadas pela história, ou seja, são constituídas de acordo com os interesses daquelas

organizações em direção a fins específicos, em espaços e tempos particulares.

Nas condições atuais, as lógicas do dinheiro impõem-se àquelas da vida

socioeconômica e política, forçando mimetismos, adaptações, rendições. Tais

lógicas se dão segundo duas vertentes: uma é a do dinheiro das empresas que,

responsáveis por um setor da produção, são, também, agentes financeiros,

mobilizados em função da sobrevivência e da expansão de cada firma em

particular; mas, há, também, a lógica dos governos financeiros globais,

Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial, bancos travestidos em

regionais como o BID. É por intermédio deles que as finanças se dão como

inteligência geral (SANTOS, 2007, p. 49).

Isto significa, também, considerar o Grupo BM, enquanto Think Tank no

sentido proposto por Bourdieu (2001) de Think Tank conservador, que são aqueles que

dissimulam a realidade vigente mediante a defesa da ruptura com o Estado de Bem

Estar e restauração do liberalismo com sua roupagem neo, propondo um caminho único

e sem retorno apto a produção de um conhecimento que tenha o objetivo de controlar

determinado campo social e determinar uma compreensão da realidade.

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Neste sentido é que situamos o Grupo BM enquanto agência de poder global,

um Think Tank de produção de fluxos de conhecimento que irão se materializar, em

nosso caso, na forma de políticas públicas que interferem localmente na forma de

políticas públicas compensatórias que, de acordo com Fernandes (2015), revelam

disputas territoriais sobre modelos de desenvolvimento, sobretudo, no campo.

Políticas emancipatórias são formuladas pelo protagonismo e pela

participação. Parte da coerência entre as relações sociais e a produção

territorial. Políticas de subordinação são elaboradas por representantes ou

ideólogos de uma classe para a outra classe, como forma de manter o

controle, de possibilitar a manutenção de uma condição de existência. Isso

não significa que políticas de subordinação não contribuam para o

desenvolvimento, sim contribui para o desenvolvimento desigual.

(FERNANDES, 2015, p. 393).

E estas, as normas impostas na forma de políticas públicas. são

instrumentalizadas e reproduzidas por meio de agentes sociais específicos.

O sistema de produção que se serve desse espaço de fluxos é constituído por

redes – um sistema reticular –, exigente de fluidez e sequioso de velocidade.

São os atores do tempo rápido, que plenamente participam do processo,

enquanto os demais raramente tiram todo proveito da fluidez. Tais espaços de

fluxos vivem uma solidariedade do tipo organizacional, isto é, as relações

que mantêm a agregação e a cooperação entre agentes resultam em um

processo de organização, no qual predominam fatores externos às áreas de

incidência dos mencionados agentes. Chamemos macroatores àqueles que de

fora da área determinam as modalidades internas de ação. É a esses

macroatores que, em última análise, cabe direta ou indiretamente a tarefa de

organizar o trabalho de todos os outros, os quais de uma forma ou de outra

dependem da sua regulação. O fato de que cada um deva adaptar

comportamentos locais aos interesses globais, que estão sempre mudando,

leva o processo organizacional a se dar com descontinuidades, cujo ritmo

depende do número e do poder correspondente a cada macroagente

(SANTOS, 2007, p. 52).

A partir deste, reconhecemos que a influência do Grupo BM se relaciona

diretamente com programas e fundos e com comissões técnicas relacionadas à temática

do desenvolvimento territorial rural sustentável que permitem uma nova etapa no

processo de reprodução do modo de produção capitalista que por suas características de

mutabilidade (MARX, 2011) e irreformabilidade (MÉSZÁROS, 2012) vem permitindo

novos arranjos espaciais para garantir sua manutenção através das crises (HARVEY,

2012).

Portanto, considerando ainda que os meios coercitivos para essa subjugação

dos estados incluem atos bélicos e econômicos, no nosso entendimento, é no campo das

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ideias que são travados os embates que legitimam suas recomendações. Desse modo,

valores fundamentais como a salvação da humanidade são usados metaforicamente,

produto produzido e apropriado coletivamente, servindo interesses particulares

apresentados como universais.

O pensamento dominante contribui para a integração real da classe

dominante (assegurando uma comunicação imediata entre todos os seus

membros e distinguindo-os das outras classes); para a integração fictícia da

sociedade no seu conjunto, portanto, à desmobilização (falsa consciência) das

classes dominadas; para a legitimação da ordem estabelecida por meio do

estabelecimento das distinções (hierarquias) e para a legitimação dessas

distinções (BOURDIEU, 2009, p. 10).

Sobre a expansão do poder do Grupo BM, um evento trouxe à tona a

possibilidade de realização desta por meio do discurso do desenvolvimento sustentável.

A crise do petróleo na década de 1970 representou o início de uma fase de recessão na

história da economia mundial que fortaleceu o surgimento de blocos econômicos de

poder internacional (HAESBAERT, 1991; FRIEDEN, 2006), como já demonstramos

nesta pesquisa.

[...] a noção de bloco de poder pode ser estendida a diferentes escalas

geográficas de análise, respeitadas as suas especificidades e a dinâmica de

inter-relacionamento entre elas; no caso da escala internacional, apesar de

raramente se manifestarem vínculos formais de hegemonia (como propõem

os grupos dominantes na Comunidade Econômica Europeia), os blocos de

poder se expressam através de organizações e acordos supranacionais (além

de laços comerciais, político-militares e culturais menos formais) que, pelo

menos na atualidade, parecem em pleno fortalecimento (HAESBAERT,

1991, p. 19).

Deste, surgem experiências de políticas públicas relacionadas à questão da

preservação de recursos naturais e o início da política internacional ambiental (PORTO-

GONÇALVES, 1989; RIBEIRO, 2001; LE PRESTRE, 2005), porém, tendo em vistas o

comércio internacional (DRUMMOND, 2014), por meio do imperialismo ecológico

(FOSTER; CLARK 2004) utilizando como pano de fundo estratégias

desenvolvimentistas articuladas por Think Tanks como o Clube de Roma e difundidas e

financiadas sob os ditames do Grupo BM.

Guivant (2002) situa essa relação em Beck (1992), que postula o potencial

catastrófico de degradação de recursos naturais a nível global e afirma a transformação

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da sociedade numa sociedade de risco119

, movida pela emergência de níveis profundos e

historicamente incomparáveis de perigos para a humanidade (GUIVANT, 2002). Deste

temor causado a partir da década do alarde (1970) surgem as relações de poder político

contemporâneas, que servem para ocultar as origens desta degradação e proteger os

perpetradores destas por meio de políticas criadas no interior das mesmas instituições

que a promovem por meio da massificação do discurso do medo, no caso, o Grupo BM.

[...] o medo e a fantasia. Sempre houve épocas de medo. Mas esta é uma

época de medo permanente e generalizado. A fantasia sempre povoou o

espírito dos homens. Mas agora, industrializada, ela invade todos os

momentos e todos os recantos da existência, a serviço do mercado e do

poder, e constitui, juntamente com o medo, um dado essencial de nosso

modelo de vida (SANTOS, 2008b, p. 22).

Deste modo, a mídia exerce seu papel ideológico.

É a mídia o grande veículo desse processo ameaçador da integridade dos

homens. Virtualmente possível, pelo uso adequado de tantos e tão

sofisticados recursos técnicos, a percepção é mutilada quando a mídia,

através do sensacional e do medo, julga necessário captar a atenção. Muitos

movimentos ecológicos, cevados pela mídia, destroem, mutilam ou reprimem

a natureza... Quando o meio ambiente, como Natureza-espetáculo, substitui a

Natureza histórica, lugar de trabalho de todos os homens, e quando a natureza

cibernética ou sintética substitui a natureza analítica do passado, o processo

de ocultação do significado da História atinge o seu auge. É também desse

modo que se estabelece uma dolorosa confusão entre sistemas técnicos,

natureza, sociedade, cultura e moral (SANTOS, 2008b, p. 22).

Os Think Tanks são, portanto, a melhor expressão do que Foucault (2009)

escreveu sobre o monopólio do poder e do saber, pois se constituem como núcleos de

intelectuais donos de um saber próprio, especializado. Ao interagir diretamente com o

campo das tomadas de decisão, os Think Tanks assumem uma posição importante na

confirmação de políticas, valores e ideais, estabelecendo-se no lócus da política mundial

119

Beck (1992) com a teoria da sociedade de risco faz uma representação do perigo que, de acordo com

Veyret e Richemond (2007) “[...] designa, ao mesmo tempo, tanto um perigo potencial quanto sua

percepção e indica uma situação percebida como perigosa na qual se está ou cujos efeitos podem ser

sentidos” (VEYRET; RICHEMOND, 2007, p. 26), neste sentido, Beck (1992) defende que, na

contemporaneidade, passamos por um momento de ruptura histórica de reconfiguração da sociedade

industrial clássica, caracterizada pela produção e a distribuição de riquezas, em uma chamada sociedade

de risco, na qual a produção dos riscos domina a lógica da produção de bens. Dentro dessa concepção

produtiva, os riscos seriam igualitariamente distribuídos, deste modo, Beck (1992) não concebe mais as

ameaças como situações de classe no qual ricos são beneficiados, nesta forma de sociedade, todos

estariam potencialmente expostos aos riscos, assim, os riscos são produtos, ao mesmo tempo, reais e

irreais.

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privilegiando a produção120

de saberes ideologicamente arquitetados. Esta relação está

expressa no organograma 1.

Organograma 1: Think Tanks e o processo de formulação e legitimação de políticas públicas

Materialidade

Relação Saber - Poder

Sociedade

Think Tank

Estado

Organograma 1: Think Tanks e o processo de formulação e legitimação de políticas públicas

Organizador: Guilherme Magon Whitacker, 2016

No organograma 1 relacionamos três esferas que consideramos fundamentais

para entender o processo de formulação e legitimação de políticas por parte dos Think

Tanks:

esfera da política, na relação saber-poder entre os Think Tanks e os demais atores;

esfera da sociedade, através da relação dos Think Tanks com esta por meio da mídia,

buscando a legitimação de suas concepções;

esfera do Estado, através da relação entre este e os Think Tanks no processo de

formulação de políticas.

Tendo a esfera política como base, os Think Tanks estabelecem uma relação

dual (estado e sociedade) para a concretização de suas acepções ideológicas,

culminando em uma determinada política pública.

120

Em uma perspectiva que aborde a análise da luta de classes, consideramos que os Think Tanks são

produtores de conhecimento, mas, enquanto resultado, quer dizer, produzidos como resultado da luta de

classes. Porém, neste momento dedicamos atenção a questão da produção do conhecimento por este

grupo.

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Esta relação se torna possível graças à força da narrativa discursiva (CAROU,

2006), levando a um processo de elucidação de ideais através da valoração moral a uma

determinada causa, seja esta uma intervenção em âmbito internacional, ou a aprovação

de uma política pública, por exemplo. O papel da comunicação midiática neste processo

também se apresenta como fundamental, daí o destaque as tecnologias informacionais,

uma vez que estas são capazes de ampliar a força das narrativas e consolidar discursos.

Neste processo:

[...] não há propriamente interlocutores, porque só existe comunicação

unilateral. Não há diálogo, porque as palavras nos são ditadas e as respostas

previamente catalogadas. Trata-se de uma fala funcional, e o caráter

hipnótico da comunicação é a contrapartida do estiolamento da linguagem

pela perda progressiva da criatividade (SANTOS, 2008b, p. 20).

Carou (2006) utiliza Giddens (1991, 2002) e Foucault (2000, 2008) para

explicitar a relação entre estruturas espaciais que, para Carou (2006), representam

formas de dominação, e o discurso, colocando que o espaço onde se articulam estes

embates antecede as narrativas, mas estas resignificam as relações neste espaço, daí a

interferência na realidade socioespacial.

A importância em se compreender as formas de dominação e sua relação com

as narrativas está na posição de que as formas expressas de dominação se dão por meio

da defesa de um determinado saber, dinâmica da qual os Think Tanks fazem parte como

polos privilegiados na estruturação do saber.

Esta característica traz à tona o papel de influência enraizada que estas

organizações exercem no campo governamental e no seio da própria humanidade,

legitimando ações políticas que tiveram base também em ideias por elas formuladas.

Nesse sentido, há uma profunda relação dialética entre conhecimento e poder, uma vez

que os Think Tanks são capazes de instituírem-se como polos múltiplos dentro de uma

mesma dinâmica que se apresenta como um nível diferenciado de poder, ou mais

precisamente, como um nível elitizado de poder (SMITH, 1988).

Do ponto de vista analítico, convém uma observação, sobre a influência

exercida pelo Grupo BM em relação à inserção do desenvolvimento sustentável em

políticas públicas de desenvolvimento para o campo.

Consideramos a relação deste fato com os sistemas peritos (GIDDENS, 2002) e

o poder dos discursos (FOUCAULT, 2000, 2008). Os sistemas peritos são, por

definição (GIDDENS, 2002), sistemas de excelência técnica ou competência

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profissional que organizam áreas do saber, influenciando a percepção coletiva de

maneira contínua, proporcionando o desencaixe das relações sociais, ou seja, seu

deslocamento dos contextos locais de interação, com sua reestruturação através de

extensões indefinidas de tempo e espaço (GIDDENS, 2002).

Por sistemas peritos quero me referir a sistemas de excelência técnica ou

competência profissional que organizam grandes áreas dos ambientes

material e social em que vivemos hoje. A maioria das pessoas leigas consulta

"profissionais" – advogados, arquitetos, médicos etc. – a apenas de modo

periódico ou irregular. Mas os sistemas nos quais está integrado o

conhecimento dos peritos influencia muitos aspectos do que fazemos de uma

maneira contínua (GIDDENS, 2002, p. 30, aspas no original).

Para Foucault (2009), toda sociedade controla e seleciona o que pode ser dito

numa certa época, determinada situação temporal na qual os sujeitos estão envoltos;

quem pode dizer o que e em quais circunstâncias como meio de filtrar ou afastar os

perigos e possíveis subversões que daí possa advir (FOUCAULT, 2009).

Os discursos são entendidos como práticas geradoras de significados, na forma

de códigos, que se apoiam em regras históricas para estabelecer o que pode ser dito,

num certo campo discursivo e num dado contexto histórico. O discurso, portanto,

relaciona-se simultaneamente, com suas origens de formação, com outros discursos e

com organizações internacionais e o poder que elas expressam, portanto, os discursos

podem representar, ou expressar, o papel institucional de determinadas organizações

que atuam em distintas escalas.

Ao sujeito lhe é fornecida a temporalidade, que servirá para validar a

dominação da lógica capitalista que tenta respaldar o seu interesse específico, fazendo-o

se tornar interesse da sociedade. A temporalidade é explicada: o discurso deve ser

localizado no tempo, buscando responder previamente aos possíveis questionamentos

de uma problemática que emerge da sociedade, dentro de um contexto histórico

capitalista, a quem o próprio capital previamente instituiu. Tem por base uma ideologia,

que, apesar de ser atemporal, fornece a ele (o discurso) o tempo e o espaço, a fim de dar

veracidade e coerência à abstração. Esse discurso previamente trabalhado é designado,

então, como competente. Para compreendermos a totalidade de uma prática discursiva

precisamos inseri-la na totalidade “[...] da realidade social como um todo orgânico,

estruturado, no qual não se pode entender um elemento, um aspecto, uma dimensão,

sem perder a sua relação com o conjunto” (LÖWY, 1985, p. 16).

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As últimas décadas do século XX testemunharam a manifestação do desejo de

mudanças no modelo desenvolvimentista através de uma voz que se fez, e faz ouvir em

alto e bom som. O discurso do desenvolvimento sustentável surge como expressão

dominante no debate que envolve questões relativas ao meio natural, social, econômico

e político em amplo sentido.

Em pouco tempo, o desenvolvimento sustentável tornou-se aceito. Assim,

discursos peritos sobre o desenvolvimento rural e a necessidade de regulação sobre

recursos naturais formulados no interior do Grupo BM, são utilizados como recurso de

poder, de tal sorte que agentes sociais envoltos na dinâmica de formação e

implementação, consciente ou inconscientemente, escolhem entre as possibilidades

concorrentes de ação que tais políticas oferecem.

A variabilidade do uso do discurso técnico como recurso de poder dependerá

da tessitura de relações de poder forjadas entre os agentes individuais e em contextos

espaço-temporais definidos.

Sobre o poder, concordamos com Arendt (2007) que o entende como um

exercício multirrelacional que não pode ser exercido de forma isolada. A autora não

concebe que o poder esteja presente nos grupos, instituições ou organizações, estes, não

possuem, senão, a potencialidade de exercê-lo quando se encontram em uma posição

que favoreça a manifestação desse poder.

O poder é sempre, como diríamos hoje, um potencial de poder. O único fator

material indispensável para a geração do poder é a convivência entre os

homens: todo aquele que, por algum motivo, se isola e não participa dessa

convivência, renuncia ao poder e se torna impotente, por maior que seja a sua

força e por mais válidas que sejam suas razões... Se o poder fosse algo mais

que essa potencialidade de convivência, se pudesse ser possuído como a força

ou exercido como a coação, ao invés de depender do acordo frágil e

temporário de muitas vontades e interesses, a onipotência seria uma

possibilidade humana concreta (ARENDT, 2007, p. 212).

Nesse sentido, a potencialidade de exercício de poder só se materializa por

meio do coletivo, pois sem essa condição, o poder não passa de uma possibilidade.

Portanto, o que sustém uma relação de poder entre os envolvidos em determinada

relação social, é o consenso, não a submissão.

Concordamos, portanto, que o poder só pode se manifestar através de relações

sociais e, de acordo com Raffestin (1993) e Fernandes (2008), estas representam, por

vezes, vontades institucionais que defendem interesses privilegiados.As situações de co-

presença envolvendo representantes de sistemas peritos, como técnicos e/ou delegações

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do Grupo BM, e trabalhadores rurais não atentos às práticas técnicas discursivas, podem

facilitar a imposição discursiva dos primeiros favorecendo o consenso.

As relações entre peritos e senso comum podem ser adequadamente abordadas

em suas implicações como recursos discursivos de poder. Ou seja, se é pertinente

destacar o valor do saber (FOUCAULT, 2008) perito, não é menos significativo buscar

seu uso como recurso de poder, que situa os agentes no espaço social e hierarquiza as

modalidades de saber.

Estes elementos dão credibilidade e poder a instituições cuja atuação abrange

vastas distâncias e depende de mecanismos de coordenação espacial e temporal novas,

baseadas na confiança irrestrita destas instituições que são arquitetadas pelos sistemas

peritos que estão permanentemente e conscientemente relacionados à sociedade. Neste

sentido, Giddens (1991) observou que sob as influências da mundialização do modo de

produção capitalista, diversos aspectos da vida cotidiana ficaram esvaziados de

habilidades desenvolvidas localmente, fato este que já havia sido relacionado pelo autor

anteriormente.

Poucas pessoas no mundo, podem continuar sem consciência do fato de que

suas atividades locais são influenciadas, e às vezes até determinadas por

acontecimentos ou organismos distantes [...] As ações cotidianas de um

indivíduo produzem consequências globais [....] Esta extraordinária – e

acelerada – relação entre as decisões do dia-a-dia e os resultados globais,

juntamente com o seu reverso, a influência das ordens globais sobre a vida

individual, compõem o principal tema da nova agenda. As conexões

envolvidas são frequentemente muito próximas. Coletividades e

agrupamentos intermediários de todos os tipos, incluindo o estado, não

desaparecem em consequência disso, mas realmente tendem a ser

reorganizados ou reformulados (GIDDENS, 1991, p.75).

Entendemos que Giddens (1991) demonstra assim, como pessoas se adaptam

às novas realidades construídas pelo capitalismo em face da dinâmica imposta com o

desenvolvimento progressivo da ciência e da tecnologia, materializado na produção e no

consumo como fontes de prazer individual e coletivas, transformando, também, a

relação entre conhecimento e experiência, com a sobreposição dos sistemas peritos

sobre a experiência, fomentando, dessa forma, a alienação na relação entre a sociedade e

a natureza.

Deste modo, o tema desenvolvimento sustentável foi oficialmente introduzido

nas políticas públicas voltadas ao campo sob os auspícios do Grupo BM, considerando a

relação de poder hegemônico que esta organização possui sobre relações políticas e

econômicas internacionais, o desenvolvimento sustentável é disseminado, primeiro,

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definindo o consumo como o mal do século e, posteriormente, como salvador da

humanidade.

O documento final da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e

Desenvolvimento (ONU, CMAD, 1992) assim dispõe no capítulo 14:

14.4. Este capítulo inclui as seguintes áreas de programas: (a) revisão,

planejamento e programação integrada da política agrícola, à luz do aspecto

multifuncional da agricultura, em especial no que diz respeito à segurança

alimentar e ao desenvolvimento sustentável; (b) obtenção da participação

popular e promoção do desenvolvimento de recursos humanos para

agricultura sustentável; (c) melhora da produção agrícola e dos sistemas de

cultivo por meio da diversificação do emprego agrícola e não - agrícola e do

desenvolvimento da infraestrutura; (d) utilização dos recursos terrestres:

planejamento, informação e educação; (e) conservação e reabilitação da terra;

(f) água para a produção sustentável de alimentos e o desenvolvimento rural

sustentável; (g) conservação e utilização sustentável dos recursos genéticos

vegetais para a produção de alimentos e a agricultura sustentável; (h)

conservação e utilização sustentável dos recursos genéticos animais para a

agricultura sustentável; (i) manejo e controle integrado das pragas na

agricultura; (j) nutrição sustentável das plantas para aumento da produção

alimentar; (k) diversificação da energia rural para melhora da produtividade;

(1) avaliação dos efeitos da radiação ultravioleta decorrente da degradação da

camada de ozônio estratosférico sobre as plantas e animais (ONU, CMMAD,

1992, p. 175. Itálicos nossos).

E posteriormente, no mesmo documento:

14.11. As agências das Nações Unidas, como a FAO, o Banco Mundial, o

FIDA e o GATT, juntamente com as organizações regionais, as agências

doadoras bilaterais e outros organismos devem; no âmbito de seus

respectivos mandatos, assumir um papel em seu trabalho junto aos Governos

nacionais nas seguintes atividades: (a) implementar, no plano sub-regional,

estratégias de desenvolvimento agrícola e segurança alimentar integradas e

sustentáveis, que façam uso dos potenciais regionais de produção e comércio,

inclusive de organizações que fomentem a integração econômica regional,

para promover a segurança alimentar, (b) estimular, no contexto da obtenção

de um desenvolvimento agrícola sustentável e de acordo com os princípios

pertinentes internacionalmente aceitos sobre comércio e meio ambiente, um

sistema comercial mais aberto e não-discriminatório, bem como a rejeição de

barreiras comerciais injustificáveis, que, juntamente com outras políticas,

venha facilitar uma maior integração entre as políticas agrícola e ambiental,

de modo a tomá-las complementares; (c) fortalecer e estabelecer sistemas e

redes nacionais, regionais e internacionais para uma melhor compreensão da

interação entre a agricultura e a situação do meio ambiente, identificar

tecnologias ecologicamente saudáveis e facilitar o intercâmbio de

informações sobre fontes de dados, políticas e técnicas e instrumentos de

análise (ONU, CMMAD, 1992, p. 178. Itálico nosso).

Após esta conferência (ONU, 1992), a ONU, por meio de suas agências

especializadas relacionadas ao Conselho Econômico e Social (ECOSOC), como o

Grupo BM, OMC e FAO, insere em suas práticas políticas o tema e passa a pressionar

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governos a adotar tal proposta visando regular o comércio internacional fazendo uso de

processos de organização do espaço que objetivam a gestão do território e as

organizações internacionais encontram nas formas organizacionais destas instituições

financeiras um dos meios que possibilitam a expansão do atual estágio do sistema

capitalista (BENKO, 1996).

A questão da relação entre o meio ambiente e o comércio internacional

ganhou importância a partir da Conferência sobre o Meio Ambiente e

Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992. [...] Ao mesmo

tempo em que se discutiam formas e mecanismos por meio dos quais se

pudesse preservar o meio ambiente e promover o desenvolvimento

sustentável, buscava-se também, com grande intensidade, a dinamização do

comércio internacional, com a abertura de mercados e o livre comércio, no

contexto de vários foros negociadores internacionais, como a Rodada

Uruguai da Organização Mundial do Comércio (OMC); o Tratado Norte-

Americano de Livre Comércio (North American Free Trade Agreement –

NAFTA); o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL)[...] (DRUMONND,

2014, p. 4)

Desta forma, novos mecanismos políticos são articulados e procuram formas

de relacionar a produção agrícola e pecuária às exigências de comércio internacional,

daí a relevante estruturação e ressignificação socioespacial, principalmente a partir da

década de 1990, em políticas públicas rurais que objetivam o desenvolvimento

sustentável.

Para Gil (2003), “[...] a crença no real não é uma ilusão, mas é alucinatória.

Nós cremos no mundo e no eu sem esperar justificação nem confirmação, a aparente

auto-suficiência da sua realidade dispensa verificação.” (GIL, 2003, p. 95). O processo

de exercício de influência e de interatividade com a política, com a academia e com a

mídia, funciona, principalmente, pela repetição e porque a ONU, aliada ao Grupo BM e

suas agências especializadas tiveram todas as condições favoráveis para o surgimento,

para a consolidação e para a manutenção da existência deste discurso.

Em nenhum outro lugar, encontra-se, até hoje, ambiente político em que o

conjunto de condições favoráveis seja tão impressionante com os fatores atuando de

forma simultânea. Isso inclui o amplo interesse governamental em desenvolvimento e

pesquisa, o apoio do setor privado, a multiplicidade dos centros de poder, a

independência entre academia e política, a porosidade de um sistema político dinâmico,

o forte voluntarismo cívico e um regime jurídico fiscal propício.

Deste modo, entendemos o discurso como meio de identificar a perícia técnica

do Grupo BM na construção da ideologia do desenvolvimento sustentável, neste

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sentido, a confiança depositada nesta renomada agência internacional não questiona a

veracidade das políticas públicas de desenvolvimento territorial sustentável devido ao

crédito concedido ao Grupo BM. Porém, nos cabe verificar se ele transforma uma

realidade abstrata em uma realidade histórica.

5.2. O desenvolvimento territorial rural sustentável na microbacia hidrográfica do

córrego da Onça II: entre a aparência e a essência

Neste item faremos uso do mesmo procedimento metodológico que nos foi útil

para demonstrarmos, na parte I, a tese de que o desenvolvimento territorial rural

sustentável possui materialidade no território normatizado, área, porém, no sentido de

demonstrar que aquela materialidade evidenciada anteriormente por pesquisadores que

se dedicaram ao estudo do PEMH, não levaram em consideração em suas pesquisas o

papel ideológico do desenvolvimento sustentável como estamos propondo121

.

Entendemos que, mesmo não sendo este o foco de suas pesquisas, este deveria ter sido

proposto ao debate, dessa forma, se evitaria a generalização e banalização deste

conceito, inclusive na Geografia.

Lima (2003) afirma que as interpretações sobre o desenvolvimento sustentável

são influenciadas por duas grandes matrizes que considera como o discurso oficial e o

discurso não oficial. A matriz oficial compreende que o modo de produção capitalista é

capaz de conciliar o aumento da produção industrial, agrícola e de serviços com a

preservação de recursos naturais, por sua vez, a não oficial busca articular a dimensão

social em torno do desenvolvimento sustentável a partir do fortalecimento da

democracia e da participação da sociedade civil na definição de estratégias de ação,

como políticas públicas, que colaborem para o desenvolvimento de uma sociedade

sustentável.

Consideramos que o PEMH está inserido em ambos os contextos, pois parte da

normatização internacional que pressiona a sociedade para se ajustar as suas demandas,

isto nos remete ao que escrevemos na parte I (capítulos 1 e 2) sobre a atuação de

instituições internacionais e organizações multilaterais na recomendação para que

governos insiram o desenvolvimento sustentável em determinadas políticas públicas, no

121

Sem querer colocar em descrédito as valiosas contribuições a respeito de toda a história, estruturação e

execução desta política pública, reforçamos que, o que questionamos é o tratamento dado por aqueles

pesquisadores e autores sobre o desenvolvimento sustentável.

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caso, o Grupo BM e o PEMH. Neste sentido, recuperamos também os escritos de Stone

(2005) que discute a emergência e atuação dos Think Tanks, como o Clube de Roma, ao

estimular ações, determinados comportamentos e procedimentos, por meio do discurso

do medo.

A produção de informações após o trabalho de campo teve como base os

problemas diagnosticados na microbacia e as possíveis soluções (conforme

apresentamos no quadro 2, p. 114) e estas nos permite demonstrar as ambiguidades e

contradições em relação ao desenvolvimento sustentável.

Para transcrevermos as informações produzidas nos atentamos aos resultados

do PEMH na microbacia delimitada para esta pesquisa buscando identificar o que se

entende por desenvolvimento territorial rural sustentável, tanto na perspectiva dos

produtores rurais beneficiados quanto dos técnicos executores.

Deste modo, buscaremos apresentar questões e respostas sobre a promoção do

desenvolvimento territorial rural sustentável, por meio de informações de caráter mais

geral até as específicas sobre: a) políticas de desenvolvimento rural do governo do

estado de São Paulo; b) o PEMH; e, c) o desenvolvimento territorial rural sustentável.

Estas informações foram requisitadas junto a representantes da ASCICAMP, de

técnicos executores do programa e demais produtores rurais beneficiados.

Como escrevemos, o PEMH foi elaborado em torno de uma agenda otimista,

prevendo melhorias em relação à extensão rural e a descentralização política

administrativa, porém, de acordo com Hespanhol (2005), “O Programa de Microbacias

Hidrográficas do Estado de São Paulo demorou em deslanchar por causa da cultura

institucional da CATI e do excesso de burocracia” (HESPANHOL, 2005, pg. 9).

Por outro lado, o “[...] programa propiciou o acúmulo de conhecimento da

realidade pelos técnicos da CATI e provocou significativas mudanças qualitativas na

extensão rural no Estado de São Paulo” (HESPANHOL, 2008, p. 11). Ainda segundo

Hespanhol (2008):

De acordo com um dos consultores do Banco Mundial houve forte resistência

da CATI para efetuar a inclusão de elementos ambientais mais amplos e,

principalmente, para incluir os elementos de ordem social no programa,

exigências básicas do Banco Mundial para o seu financiamento

(HESPANHOL, 2005).

Esta informação nos levou a confrontá-la com o relatório final de avaliação do

PEMH realizada pelo Grupo BM (WORLD BANK, 2009) que afirma que a estrutura e

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a capacidade da CATI, no início, eram inconsistentes com suas complexas

responsabilidades.

Estas informações nos revelam que, desde o início, existia uma subordinação,

por parte da SAA e da CATI, as exigências do Grupo BM. Buscando verificar esta

situação produzimos informações preliminares sobre políticas públicas de

desenvolvimento rural do governo do estado de São Paulo tentando identificar alguma

forma de influência de agências internacionais, como o Grupo BM, FAO ou outras, em

relação, principalmente, proteção de recursos naturais (Questões 1.5 e 1.6 – Anexo 1).

Bom, não sei se existe influência, no sentido de eles mandarem fazer as

coisas e a secretaria aceitar, sei que tem algumas recomendações,

principalmente quando o governo pede financiamento que devem ser

seguidas se não o recurso não é liberado, mas acho que isso não significa

influência, é um acordo entre o governo e quem financia [...] como foi no

microbacias [...] que tinha as delegações do Banco Mundial que vinham em

algumas reuniões. Você tava naquela reunião lá em Campinas né? Lembra do

pessoal que tava lá? Então, era assim, algumas reuniões, como aquela em

Campinas, que foi de avaliação, eram abertas pra todo mundo, mas tinha

outras que era só com os diretores da CATI para verificação das

recomendações. Então [...] nesse caso, acho que tinha sim essa influência, até

porque eles que estavam financiando e queriam saber se as recomendações

estavam sendo aceitas (Funcionário da CATI, trabalho de campo, 2015).

Esta informação foi verificada quando questionamos funcionários da CATI

sobre a autonomia do governo do estado de São Paulo frente a organizações

internacionais (Questão 1.6 – Anexo 1).

Autonomia [...] não sei dizer com certeza [...] sei que algumas normas tem

que ser seguida, por exemplo, a FAO exige que alguns produtos tenham tal

qualidade pra poder entrar no mercado, a OMC a mesma coisa [...] mas não

posso falar que tem autonomia do governo ou não. Sobre o Banco Mundial

posso falar do microbacias. Esse eu sei que tinha que seguir as

recomendações deles por conta do financiamento, e eles queriam sempre

relatórios [...] isso foi um problema também porque a gente não tava

acostumado a fazer esse tipo de coisa e isso tomava um tempão nosso. Sobre

o meio ambiente sei que o governo segue a linha da ONU [...] PNUMA né

[...] que é o que todo mundo faz e não acho que o governo deva ir contra isso

(Funcionário da CATI, trabalho de campo, 2015).

Apesar destas informações, a falta de familiaridade com o Grupo BM e a

necessidade de reorientar seu modelo de trabalho para acomodar mecanismos

participatórios e descentralizados aplicados à delimitação física territorial, por normas, e

a necessidade de adaptar uma abordagem tradicional, por parte da CATI em relação aos

aspectos de ordem natural, para integrar preocupações sociais sobre a pobreza

causaram, na análise do Grupo BM, sérios problemas, inclusive entre a instituição, a

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SAA e o Grupo BM, gerando exaustão e desilusão em uma parte sobrecarregada da

equipe da CATI.

Durante a fase de planejamento foi considerada, pelo Grupo BM, a

possibilidade de contratar uma empresa privada para administrar o PEMH, ou contratar

o IICA para formar uma estrutura administrativa paralela à CATI (WORLD BANK,

2009) e isto: “[...] sem nenhuma preocupação em relação a modernizar e fortalecer à

CATI enquanto agência promotora do desenvolvimento territorial rural sustentável”

(Funcionário da CATI, trabalho de campo, 2015).

Assim, instaurou-se uma polêmica. A solução foi contratar consultores

especializados para trabalhar junto com a instituição (WORLD BANK, 2009). O Grupo

BM pondera suas críticas, na sequência, afirmando que os desafios foram catalisadores

do crescimento institucional da CATI, que acabou desenvolvendo tecnologias, métodos

e parcerias cujos reflexos foram muito positivos para o saldo final do programa

(WORLD BANK, 2009), indo assim ao encontro da perspectiva apresentada

anteriormente por Hespanhol (2005) sobre a demora na operacionalização do PEMH,

portanto, revelou-se a influência, ou seja, se a CATI não adequasse sua estrutura e

funcionamento as normas do Grupo BM, o financiamento poderia ser cancelado, deste

modo, quem estava na escala superior de comando não era nem a SAA nem a própria

CATI, mas sim o Grupo BM.

Pudemos verificar, em 2008122

, a participação de uma delegação de avaliadores

e técnicos do Grupo BM que, em constantes debates, afirmavam a necessidade do

desenvolvimento sustentável e da perspectiva territorial para o campo. Deste modo, a

situação de co-presença com representantes de sistemas peritos (Grupo BM) e leigos

sobre suas formas de atuação, pode significar a imposição discursiva dos primeiros, seja

através da resistência rigorosa dos que se tornam alvo da perícia, ou através de

concorrências, mediações e trocas assimétricas entre os partícipes da relação.

Reforçando a questão sobre a influência externa, Fleischfresser (1999) e

Sabanés (2002) afirmam a necessidade de participação do Grupo BM, deste,

consideramos que apesar das relevâncias de seus trabalhos de pesquisa, os mesmos

desconsideram as relações sociais que permeiam tais negociações. Em outra perspectiva

Clemente (2011) assevera que: “Todos estes ajustes ‘estruturais’ delegados pelo FMI e

122

Campinas-SP; seminário – Manejo de recursos naturais e desenvolvimento rural: os projetos

microbacias em São Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina. Promovido pela CATI e organizado por

Zander Navarro, consultor do Grupo BM.

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Banco Mundial, têm a meta primordial de garantir o controle e o acesso à exploração de

seus trabalhadores e, sobretudo, dos seus recursos naturais” (CLEMENTE, 2011, p. 34).

Por outro lado Neves Neto (2013), mesmo reconhecendo que o PEMH não atingiu seus

objetivos, escreveu que:

[...] deve-se reconhecer que organismos financeiros internacionais, como o

Banco Mundial e o FMI, começaram a exigir que qualquer projeto, para obter

financiamento externo, deve contemplar a preocupação com equidade social,

eficiência econômica e manejo adequado dos recursos naturais,

características essenciais do desenvolvimento sustentável (NEVES NETO,

2013, p. 46).

Em outro trecho, o mesmo pesquisador escreveu que:

Problemas ambientais, como o aumento do desmatamento e a poluição de

corpos d’água, assim como problemas sociais decorrentes do êxodo rural e do

aumento das desigualdades levaram instituições internacionais, como a

Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e o

Banco Mundial, a incentivar políticas territoriais de desenvolvimento rural,

as quais incluíam a dimensão ambiental e uma visão mais ampla e integrada

do rural, incorporando as noções da pluriatividade das famílias residentes no

campo e da multifuncionalidade dos espaços rurais (NEVES NETO, 2013, p.

63).

Apesar deste não ser o foco da pesquisa de Neves Neto (2013) – reconhecer ou

não a influência do Grupo BM em processos de elaboração de políticas públicas –

podemos considerar, adicionalmente a essas considerações que, com estas afirmações,

que reconhecem a intervenção de agências internacionais sobre a problemática sem

reconhecer que estas, no caso o Grupo BM, são as mesmas que articulam a reprodução

do modo de produção capitalista e os reflexos alienadores sobre a relação entre a

sociedade e a natureza, nos parece evidente o potencial ideológico, no sentido proposto

por Marx (2011) e como escreveu Anderson (1975) a respeito da influência de tais

organizações na produção do conhecimento científico, também como escreveu

Mészáros (2012) a ciência pode atuar como legitimadora de interesses ideológicos.

Nestes termos, entendemos que as relações entre perícia e senso comum podem ser

adequadamente abordadas em suas implicações como recursos de poder.

De maneira a entender o discurso do governo do estado de São Paulo

especificamente em relação ao PEMH, analisamos documentos e questionamos técnicos

envolvidos na execução desta política pública sobre esta perspectiva (Questão 2.1 –

Anexo 1).

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Em documentos oficiais pudemos identificar que o discurso governamental

considera que um dos principais impactos do PEMH foi o fortalecimento da rede de

assistência técnica e extensão rural, formado pela CATI e pelos municípios, com

investimentos em infraestrutura, equipamentos, capacitação (técnicos, membros de

conselhos municipais, dirigentes e membros de associações de produtores, agentes

ambientais, professores), o que teria permitido dotar os municípios de capacidade para

garantir a integração e eficácia de políticas públicas para o desenvolvimento rural

sustentável (SÃO PAULO, 2010).

O discurso institucional, por sua vez, considera que a consolidação dos

processos participativos, tanto na elaboração dos diagnósticos, quanto na implantação

das atividades da microbacia, foram passos significativos para garantir os avanços do

PEMH, considera ainda que esta política pública fortaleceu a rede de assistência técnica

e extensão rural através de investimentos em infraestrutura, equipamentos e capacitação

de diferentes agentes com o intuito que estes dessem continuidade aos planos de

desenvolvimento sustentável (CATI, 2009).

Antes da implantação do Programa de Microbacias, a CATI tinha seu foco de

trabalho voltado para a assistência técnica tradicional, solucionando

demandas de informações técnicas pontuais dos produtores que procuravam a

instituição. A atuação no PEMH provocou a mudança de foco, de assistência

técnica para a extensão rural propriamente dita, a qual passa a estender ao

público rural conhecimento e habilidades sobre as várias atividades

agropecuárias, preocupando-se também com a qualidade de vida dos

produtores. Foi enfatizada a questão educacional, promovendo mudanças no

comportamento dos produtores, sempre com o objetivo de estimular o

desenvolvimento sustentável, ambiental e econômico (CATI, 2009, p. 15).

Sobre o discurso oficial sobre o desenvolvimento territorial rural, (Questão 2.1

– Anexo 1) fomos informados que:

A inclusão da perspectiva territorial parte lá do Programa LEADER [...] foi

depois dele que o que antes agente chamava área, ou de região, passou a ser

chamado de território. A mudança está no enfoque dado, quando tínhamos

projetos voltados pra tal área ou região, era sempre limitado a intervenções

práticas, o social e o ambiental não apareciam [...] os delegados do Banco

Mundial quando vinham pras reuniões traziam esta ideia de desenvolvimento

que o Zander já estava trabalhando [...] como ele era o consultor do

programa, e também tinha outras pessoas que trabalhavam com esta ideia, o

programa acabou sendo incluindo nesta perspectiva, a ideia de trabalhar com

o conceito de território partia deles e acho que veio pra ajudar. Quer dizer,

não é um conceito que parte da extensão rural entende? Na extensão rural

isso não estava sendo discutido, isso veio da academia, existia uma discussão

por fora, e isso acabou dificultando nosso trabalho também [...] nos cursos

que fizemos os consultores sempre falavam da necessidade de atualização e

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davam o exemplo da Europa que a partir desta perspectiva tirava aquela ideia

de área onde a gente só trabalhava com o meio físico, aí veio à ideia de

incluir desde a parte econômica até o meio ambiente [...] aí o discurso, como

você falou, sempre foi esse, até o pessoal do Banco Mundial quando vinha

sempre falava isso, era o desenvolvimento territorial sustentável mesmo,

cuidar do meio ambiente e melhorar a produção e a produtividade

(Funcionário da CATI, trabalho de campo, 2015).

Estas informações nos são extremamente importantes. Além de reafirmar a

influência externa tanto na elaboração quanto execução do PEMH, a questão territorial

se torna evidente. Apesar dos órgãos oficiais trazerem em seu bojo uma perspectiva

territorial ampla, o que observamos confirma o exposto na parte I, o território torna-se

normatizado. Feitas estas observações passamos a produção de informações sobre os

resultados do PEMH (Questão 2.5 – Anexo 1).

No geral? Em Prudente acho que não foi bom não, o melhor resultado foi na

microbacia da Onça mesmo, foi difícil aqui em Prudente, o pessoal mesmo

não ajudou muito [...] e o pior foi depois né, que não teve continuidade. Hoje

quando o pessoal saí nas propriedades que participaram do programa e vê

tudo com erosão de novo, se você for lá no Timburi, você vai ver. Ah, lá

mesmo na onça... você viu como tá o córrego? Então né, isso que é difícil, eu

mesmo as vezes nem entendo pra que gastar e depois não poder continuar

com as coisas, volta tudo, o pessoal lá de cima não entende isso (Membro da

ASCICAMP, trabalho de campo, 2015).

Em relação aos objetivos e resultados do PEMH na microbacia do córrego da

Onça II (Questão 2.6 – Anexo 1), as respostas que obtivemos dos produtores foram

agrupadas na tabela 5 para demonstrar o conhecimento deste tema pelos agricultores.

Através destas informações podemos identificar o nível das informações que foram

transmitidas durante as reuniões para a execução do programa.

Tabela 2: Resultados do PEMH na microbacia hidrográfica do córrego da Onça II – Perspectiva do

produtor

Pergunta Sim Não Total de

entrevistados

Sabe o que é desenvolvimento sustentável? 23,69% 76,31% 28

O PEMH colaborou para preservação de

recursos naturais?

19,75%

80,25%

28

A qualidade da água melhorou depois do

programa?

23,48%

76,52%

28

Os problemas com o assoreamento (controle

de voçorocas) diminuíram após o programa?

42,00%

58,00%

28

Foram criados agentes ambientais após o

término do programa?

0,0%

100,0%

28

Houve outras ações de caráter ambiental por

parte da CATI após o término do programa

0,0%

100,0%

28

Fonte: Trabalho de campo, 2015

Organizador: Guilherme Magon Whitacker, 2016

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Com essas informações, consideramos que apesar do desenvolvimento

sustentável ser o objetivo declarado, conforme disposto nos manuais de

operacionalização e avaliação do PEMH (CATI, 2000; 2005 e 2009), em nenhum

momento identificamos o que a SAA e a CATI, órgão executor do programa, entendem

por desenvolvimento sustentável.

O que pudemos notar foi a utilização da proposta de desenvolvimento

sustentável estabelecida oficialmente pela ONU (CMMAD, 1988) além de novas

denominações, porém, não constatamos uma definição ou um entendimento sobre estas.

Conforme consta no manual do PEMH – Seção Operativa (CATI, 2005):

A busca de novos padrões de desenvolvimento tem como marco de referência

o amplo estudo realizado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e

Desenvolvimento, conhecido como relatório Brundtland, onde o

Desenvolvimento Sustentável é o rumo apontado para o estabelecimento das

bases para o futuro da humanidade. Conceitua-o como “aquele que atende às

necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações

futuras atenderem a suas próprias necessidades” (CATI, 2005, p. 1, o grifo é

nosso).

Com esta demonstramos como a ideia de desenvolvimento sustentável foi

aceita sem maiores preocupações pelo governo do Estado de São Paulo. Lembrando

ainda a relação entre o Grupo BM, o governo estadual e a expansão do setor

sucroenergético concomitantemente a implementação da política pública a aqui

analisada. Em relação às novas adjetivações, os documentos publicados pela CATI com

normas técnicas para a execução do PEMH (CATI, 2005), indicam que:

As premissas básicas para que o P.E.M.B.H. atinja seus objetivos,

coincidentes com as diretrizes do Governo Estadual são: [...] a busca da

sustentabilidade socioeconômica e ambiental na microbacia. [...] O objetivo

do P.E.M.B.H. é promover o desenvolvimento rural do Estado de São Paulo,

entendendo-se por desenvolvimento rural a ampliação das oportunidades de

ocupação, melhorias dos níveis de renda, maior produtividade geral das

unidades de produção, redução dos custos e uma reorientação técnico

agronômica. Tudo para propiciar o aumento do bem-estar das populações

rurais, através da implementação de sistemas de produção agropecuária que

garantam a sustentabilidade socioeconômica e ambiental, com plena

participação e envolvimento dos beneficiários e da sociedade civil organizada

(CATI, 2005, p. 4, itálicos nossos).

Estas adjetivações aparecem ainda nos objetivos específicos do programa.

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Objetivos específicos: contribuir para a conscientização de toda a

comunidade sobre a necessidade de conservação dos recursos naturais como

condição básica para o desenvolvimento rural sustentável; contribuir para

viabilizar a recuperação de solos e áreas degradadas, através do manejo e uso

sustentável dos recursos naturais, baseados em alternativas tecnológicas que

aumentem a produção, produtividade e renda do produtor rural (CATI, 2005,

p. 5, itálicos nossos).

Buscamos entender também, o sistema de gestão de políticas públicas

implementado com o processo de descentralização, o sistema bottom up (Questões 2.13

e 2.14 – Anexo 1), pois, de acordo com o Manual Operacional (CATI, 2005) do

programa, foram criados mecanismos para sua operacionalização: “[...], a comunidade

juntamente com o técnico executor identificará as áreas críticas em relação à degradação

dos recursos naturais” (CATI, 2005, p. 7).

A partir da identificação dos problemas e das áreas críticas foi realizado o

plano de intervenção (MACIEL, 2005), com a participação de produtores e técnicos

executores do programa, que buscasse identificar, priorizar e apontar soluções para a

microbacia do córrego da Onça II123

. Em relação a este sistema de gestão, um membro

da ASCICAMP respondeu que:

Era descentralizado em certo ponto. As reuniões com a gente vinha sempre a

partir deles. Quando a gente não concordava com alguma coisa era marcada

outra reunião ou a conversa ia se estendendo pra eles convencerem a gente.

Isso é descentralizado? A descentralização tem que incluir a tomada de

decisão, o PEMH veio pronto, tinham os itens, os benefícios né, que seriam

oferecidos e a gente tinha que aceitar [...] Só chamar a gente pra reunião e

não ouvir o que a gente precisa não é descentralização. Quando a gente

queria, por exemplo, tomar parte na discussão sobre um ou outro benefício

individual eles sempre batiam o pé e diziam: não, é melhor ser assim, a gente

tá no controle do projeto e entende a necessidade de vocês [...] aí eles iam até

convencer (Membro da ASCICAMP, trabalho de campo, 2015).

Outro entrevistado, Agricultor camponês entrevistado beneficiado, respondeu

que:

Aqui na onça o programa ajudou sim. Teve alguns produtores que depois do

terraciamento puderam aumentar a área de produção, tipo a gente que

trabalha com batata, os abastecedouros ajudaram com a distribuição de água,

aí alguns aumentaram as hortas [...] e isso tudo veio com as reuniões que a

gente participava, isso aumentou a renda de uma turma aqui, antes eu não

tinha muita coisa, o que eu tinha gastava pagando as máquina pra tentar

corrigir as coisas, curva de nível [...] agora tá melhor [...] e foi por isso que

você falou mesmo, se só tivesse as reuniões deles, sem conversar com a

gente, is ser difícil. (Agricultor camponês entrevistado beneficiado pelo

PEMH, trabalho de campo, 2015).

123

Quadro 2, p.114.

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Ainda sobre a questão da descentralização de políticas públicas, outro produtor

beneficiado pelo programa, esclarece que:

A gente começou a fazer parte de associação pra aprender mais sobre os

cuidados com o sítio, plantar as coisas nos lugar certo [...] antes era tudo

meio de qualquer jeito, do jeito que a gente sempre fazia mesmo, e as vezes a

gente não percebia que tava fazendo errado e fazia assim mesmo. Teve uma

vez que eu perdi quase tudo minhas batata, porque eu fiz as curva de nível

muito alta e aí veio uma dessas chuva fora de época e a curva de nível ficou

parecendo uma bacia, apodreceu quase tudo que eu tinha plantado, ai quando

veio o microbacias, o pessoal da associação começou a correr de novo,

porque a gente tinha que apresentar os projetos e ele, da associação, falava

que a gente não podia perder o dinheiro, porque era importante pra fortalecer

a gente [...] ai eu fui vendo essa descentralização quando a turma da CATI

começou a vim aqui, pensa se eu to certo [...] eles vinham e explicavam tudo

direitinho, falavam que era um projeto com a participação de todo mundo

aqui da onça, mas que tinha que tá associado pra participar. Pra ta associado

tinha que pagar, o rapaz da associação tava sempre com o pessoal da CATI,

tinha vez que eles chegavam junto, ai, quando foi pra fazer a distribuição das

benfeitoria, o primeiro a ser chamado era ele, pra falar onde ia e onde não ia

ter as coisas, ai eu comecei a desconfiar, se é pra todo mundo participar ou

não, até hoje não entendi direito isso, mas eu desconfio [...] (Agricultor

camponês entrevistado beneficiado pelo PEMH, trabalho de campo, 2015).

Essas informações nos revelam um conflito. Não temos elementos para

escrever sobre um conflito de interesses, mas, nos fica evidente que existe uma relação

de conflitualidade.

O que contradiz aquilo que escrevemos sobre o desenvolvimento territorial

rural sustentável na parte I, a tese defendida por autores e pesquisadores como

Navarro (2008; 2001), Abramovay (1998; 2000; 2004), Sachs (2004) e outros, que

garantem a materialidade do desenvolvimento sustentável no território normatizado e

delimitado fisicamente, vai aos poucos sendo desvelada, pois o território área não

exclui a problemática do conflito e das relações de poder que são subjacentes ao modo

de produção capitalista.

Neste ponto a dialética se instaura, pois, se consideramos o desenvolvimento

sustentável como forma de reprodução do modo de produção capitalista, o território vai

representar sua materialidade e sem conflitualidade, consideramos que, a materialidade

se torna ideológica a partir da consideração de que o desenvolvimento sustentável possa

ser, simplesmente, encaixado em determinada área, fato este que, pelos relatos, indica

ainda que o PEMH pode, neste caso, acirrar o processo de desenvolvimento desigual na

microbacia.

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Representa uma construção simbólica calcada em interesses particulares que

em nada alteram a relação entre a sociedade e a natureza, a falha sociometabólica

permanece inalterada, o processo de alienador demonstra sua força, uma vez que, por

meio de um poderoso discurso ideológico baseado em uma forma de desenvolvimento

harmônica, instaura a desigualdade do desenvolvimento.

Pudemos verificar ainda se o PEMH contribuiu para aumentar a

competitividade e controle na degradação de recursos naturais (Questões 2.15, 2.16 e

2. 17 – Anexo 1), o que levaria a uma melhor produtividade e consequente aumento de

renda familiar, os entrevistados responderam que as ações propiciaram uma maior

produtividade, mas não consideraram as ações realizadas pelo programa como

significativas neste aspecto, conforme a tabela 3 que traduz estas informações.

Tabela 3: Melhoria das condições de produção e produtividade após a implementação do PEMH.

Microbacia do córrego da Onça II

Pergunta Sim Não Respostas

(% do total de

entrevistados)

As ações executadas através do Programa Estadual de

Microbacias Hidrográficas colaboraram para a melhoria

na renda familiar?

27%

73%

100%

As ações executadas através do Programa Estadual de

Microbacias Hidrográficas foram suficientes para

melhorar a produção na propriedade?

46%

54%

100%

Fonte: Trabalho de campo, 2015

Organizador: Guilherme Magon Whitacker, 2016

Após estas questões a intenção foi produzir informações que permitissem

entender, após a execução desta política pública, os benefícios gerados, tanto

individualmente, quanto coletivamente, e, mais importante, no aspecto de nossa

pesquisa, identificar elementos que nos permitissem escrever sobre a relação entre o

PEMH e o desenvolvimento sustentável. Isto porque consideramos que as prerrogativas

do desenvolvimento territorial rural sustentável adentraram com facilidade a esfera

política, conforme escrevemos, por diversos fatores, dentre eles, o viés econômico.

Porém, consideramos que o desenvolvimento sustentável, enquanto modelo de

desenvolvimento, não possui materialidade124

.

Buscando, a partir da análise discursiva, reconhecer o que os beneficiários e

executores entendem por desenvolvimento sustentável, comprovamos que os produtores

124

Lembrando que não realizamos aqui uma análise descritiva nem argumentativa sobre a totalidade desta

política pública, a mesma é referenciada como exemplo ilustrativo daquilo que nos importa, as relações

globais e locais na materialidade do desenvolvimento sustentável.

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rurais que receberam benefícios pelo PEMH não consideraram esta como uma política

voltada a melhorias nas áreas social, econômica e voltada à proteção de recursos

naturais, portanto, voltada ao desenvolvimento sustentável125

.

O que produzimos na forma de informações a este respeito revelam, na opinião

dos produtores, um programa relacionado, de forma ampla, á questões de preservação

de recursos naturais, “[...] de melhoria do meio ambiente” (Agricultor camponês

entrevistado beneficiado pelo PEMH, trabalho e campo, 2015). Os depoimentos a

seguir, realizados após o questionamento direto sobre o que se entende por

desenvolvimento sustentável (Questão 3.1 – Anexo1) afirmam esta prerrogativa.

Sobre isso ai eu aprendi na época do programa, com o pessoal da CATI

mesmo. No começo eu não entendia, sabia que tinha que protege as árvores,

cuidar dos rios, essas coisas, mas eu também nem imaginava que podia

melhorar com isso [...] é [...] quer dizer, eu queria ajudar mas tinha medo de

que ia te que parar com minhas coisas e deixar tudo virar mato de novo, ai o

pessoal vinha, fazia reunião e falava “olha, tem que proteger o rio, se não vai

faltar água pra vocês”[...] aí que eu fui entender que se a gente não cuidar

quem ia sair perdendo era a gente mesmo né. Então, acho que é isso o

desenvolvimento sustentável [...] (Agricultor camponês entrevistado

beneficiado pelo PEMH, trabalho de campo, 2015).

Eu lembro que eles falavam que era pra proteger o rio, não deixar a erosão

tomar conta do pasto, essas coisas cuidar da natureza, e isso tudo era melhor

pra nós também [...] não sei te falar se isso é desenvolvimento pra gente, o

microbacias fazia isso ai, cuidava do meio ambiente e desse jeito a gente

ajudava, fazendo as coisas que eles falavam porque a gente recebia os

benefícios pra fazer a cerca lá na parte baixa do rio e os terraços (Agricultor

camponês entrevistado beneficiado pelo PEMH, trabalho de campo, 2015).

O desenvolvimento sustentável foi institucionalizado na CATI da mesma

maneira que eu falei sobre o desenvolvimento territorial, na época da

conferência do Rio, em 1992, tava começando o debate interno na extensão

rural sobre o meio ambiente. Ele já existia, claro, mas não na forma como é

hoje, quer dizer, as coisas eram separadas, ou se falava em meio ambiente ou

em produção. Aí, com a conferência veio a ideia maior de desenvolvimento

sustentável que, como eu te falei do território, a CATI abraçou e começou a

fazer treinamento e capacitação pra poder trabalhar nesse sentido, então,

quando começou o microbacias, esse já era um tema institucionalizado, o

pessoal já tava por dentro do que precisava ser feito (Funcionário da CATI,

trabalho de campo, 2015).

Outro técnico atuante na execução do PEMH, defendendo o desenvolvimento

sustentável nos relatou que:

O desenvolvimento sustentável veio pra ajudar. Se antes o produtor não tinha

conhecimento, hoje ele não pode mais falar isso, porque a sustentabilidade

125

Conforme as dimensões do desenvolvimento sustentável presentes no relatório Brundtland (ONU,

1984) e desenvolvida por Sachs (2005).

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está em tudo, se ele melhorar sua prática de manejo, melhora sua

propriedade. Eu acho que o desenvolvimento sustentável é a saída pra eles

[...] é produzir com cuidado ao meio ambiente. (Funcionário da CATI,

trabalho de campo, 2015).

Ainda buscando compreender o que os agentes executores do PEMH entendem

por desenvolvimento sustentável, questionamos se o mesmo pode ser entendido

enquanto alternativa ao modo de produção capitalista ou uma forma que os agentes

atuantes em agências de fomento, no caso o Grupo BM, encontraram para reproduzir o

capitalismo, tendo por base, as declarações da ONU (Questão 3.2 – Anexo 1).

Como a ONU? Quer dizer aquela ideia de preservar pro futuro? Olha, não sei

o que tem a ver com o capitalismo? Não sei se é alternativa [...] porque se a

gente ajuda o pessoal a trabalhar com sustentabilidade e pra eles isso é

melhor e pros outros também, não é alternativa, porque é do mesmo jeito, só

que cuidando do meio ambiente[...] e a outra, se reproduz o capitalismo, acho

que é a mesma coisa [...] Não sei se tem a ver porque, veja bem, o

capitalismo tá ai, é o que a gente vive certo? E se o pessoal consegue ter na

sua propriedade um jeito de produzir e cuidar do meio ambiente e continuar

vivendo, tá bom pra todo mundo, isso é ajudar o capitalismo? Não sei [...]

Mas e se não for o capitalismo vai fazer o que? Viver na pobreza ninguém

quer (Funcionário da CATI, trabalho de campo, 2015).

Esta informação nos permite reflexões maiores sobre a reprodução do modo de

produção capitalista e o desenvolvimento sustentável. Consideramos que, se os agentes

executores do PEMH não reconhecem o poder de agências internacionais como a ONU

e o Grupo BM na reprodução do capitalismo, não há maneiras do mesmo reconhecer os

impactos gerados a partir da mundialização deste modo de produção e seu processo

alienador em relação à sociedade e a natureza e este acaba por realizar seu trabalho,

enquanto extensionista rural, de forma alienada e ideológica, reproduzindo um discurso

sem nexo, “[...] o capitalismo tá ai [...] viver na pobreza ninguém quer [...]”

(Funcionário da CATI, trabalho de campo, 2015), isto nos revela que, se o

desenvolvimento sustentável pode ser compatível com o capitalismo, o é de forma

ideológica somente.

Neste ponto buscamos identificar a relação da CATI com o desenvolvimento

sustentável, na forma proposta por esta política pública, apresentamos uma declaração

da FAO, ao funcionário da CATI entrevistado, que afirma que o desenvolvimento

sustentável pode ser um novo modelo para a produção agropecuária (FAO, 2002) e

questionamos se esse posicionamento pode estar relacionado com o fato de que a ONU

se articula em torno do desenvolvimento sustentável com distintos fins e expusemos ao

entrevistado as possíveis respostas: a) para defender interesses capitalistas, ou, b)

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humanitários (Questão 3.5 – Anexo 1). A resposta foi precisa: “A ONU se articula para

defender interesses humanitários”, e o entrevistado acrescenta: “É a mesma coisa que eu

te falei, porque o pessoal pode produzir e ter sua APP, cuidar do rio, é a mesma coisa”

(Técnico extensionista da CATI, trabalho de campo, 2015).

As informações apresentadas até o momento nos demonstram que houve a

aceitação das proposições sustentável e territorial pela CATI, a partir de recomendações

do Grupo BM. Deste modo, percebemos que esteja subentendida uma relação de poder,

no sentido de submissão, que revela as relações de poder e interesse que existem por

trás das tomadas de decisão governamentais. Para Gameiro (2013), isto revela:

[...] que as representações individuais e coletivas acerca dos recursos naturais

não são homogêneas ou absolutas, se relacionando mais ao circulo das

crenças tecidas ao seu redor, a disputa pela construção de sentidos sobre o

Programa de Microbacias resultou fragmentada, e a consciência discursiva

revelou os traços de suas rotinas e experiências concretas [...] (GAMEIRO,

2013, p. 117).

Neste sentido Frey (2001), considera que:

Apesar da comunidade internacional se reportar unanimemente favorável à

concepção do desenvolvimento sustentável, dificilmente consegue-se

reconhecer esse suposto compromisso com a defesa do meio ambiente e das

gerações futuras nas ações e medidas atuais. Pelo menos os resultados

referentes às determinações de metas concretas nas conferências

internacionais e às políticas públicas adotadas em boa parte dos países ficam

significativamente aquém das recomendações que boa parte dos cientistas e

ambientalistas consideram indispensáveis a fim de alcançar a estabilização do

clima mundial e um desenvolvimento ecologicamente sustentável. Ou seja, o

reconhecimento de um déficit de ação não leva necessariamente a

correspondentes acordos e medidas. Evidentemente, existem fatores inerentes

aos sistemas políticos e econômicos impedindo que a orientação para o bem

comum possa se impor no momento da negociação de acordos, como também

na fase da implementação das estratégias de políticas públicas (FREY, 2001,

p. 2).

O fato da reflexão sobre a relação sociedade e natureza ter sido inserida nos

debates políticos e econômicos internacionais resultou no surgimento da proposta de

desenvolvimento sustentável, e, com o tempo, esta passou a ser incorporada

definitivamente em vários setores, como os que se relacionam a elaboração e

implementação de políticas públicas e como no exemplo que trouxemos sobre a

expansão do setor sucroenergético e a territorialização do modo de produção capitalista.

Esta incorporação, da perspectiva sustentável, ao desenvolvimento territorial

rural em diversos setores da economia foi reforçada, de acordo com Pepper (2000),

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principalmente a partir da década de 1990 como forma de socializar a responsabilidade

pela destruição de recursos naturais pelo discurso e práticas articuladas no

ecocapitalismo126

.

Considerando que o rumo seguido pela moderna agricultura faz parte de um

processo mais amplo de expansão capitalista, que inclui a articulação crescente da

agricultura com a indústria, torna-se fundamental evidenciar que um modelo alternativo

de agricultura, com base nas premissas do desenvolvimento sustentável, tem sua

viabilidade condicionada a um jogo de forças global cujo comando escapa aos

segmentos defensores do desenvolvimento sustentável, na forma que Mészáros (2012)

escreveu sobre os movimentos de questão única. Em verdade, se a agropecuária

moderna traz como um de seus pressupostos a superação dos limites impostos pela

natureza, seria, no mínimo, paradoxal que, dentro dela mesma ou do segmento ao qual

se subordina (a agroindústria moderna), pudesse ter lugar a reflexão quanto aos danos

sociais e naturais causados por esta atividade na contemporaneidade. Este fato se torna

relevante quando analisados a partir do que Mészáros (2012) escreveu sobre os

movimentos e partidos políticos que se articulam em torno do desenvolvimento

sustentável entendendo este enquanto questão única127

. Isto revela a capacidade

126

O ecocapitalismo entende o desenvolvimento sustentável como atrelado a políticas que enquadram a

natureza em normas e leis desde a lógica capitalista que visa assegurar o provento contínuo de matérias

para seu processo produtivo. Deste modo, diversos segmentos industriais e comerciais passam a adotar

padrões de certificação internacional, por exemplo, que somente aqueles mais privilegiados

economicamente podem usufruir, direcionando suas ações para o mercado devido ao atrativo para o

consumidor do produto ecologicamente correto, ignorando a conexão existente entre o produtivismo e o

capitalismo, o que leva a uma ilusão do capitalismo limpo (LÖWY, 2005). Reconhece os problemas

relativos ao meio natural, mas acredita de uma forma irrestrita, que a atual forma de sociedade sempre os

resolverá e alcançará um crescimento ilimitado (a visão da cornucópia) ou, mais conservadoramente, que

as mesmas podem ser contornadas com uma gestão cuidadosa da economia e do ambiente sem alteração

nas relações de produção (PEPPER, 2000). Assim, temos um pensamento estritamente relacionado à

dimensão econômica, o qual reconhece os problemas de um desenvolvimento predatório, mas, não se

caracteriza um ideal de descentralização de poder e capital, a verdadeira causa das questões sobre um

novo modelo desenvolvimentista. A relação sociedade e natureza é administrada dentro da esfera da

economia, sendo com essa referência pensado o social. Incorpora-se, ainda, a natureza à cadeia de

produção: a natureza passa a ser, definitivamente, um bem do capital. O discurso ecocapitalista vem

atrelado a erradicação da fome e da melhoria na qualidade de vida, da necessidade de gerar rendas e

empregos no campo e nas cidades, mas, a nosso ver, defende os privilégios e o capital daqueles que

representam estas situações em busca de lucro e da produção ampliada. 127

Por questão única, Mészáros (2012), entende a disposição de movimentos sociais, como o

ambientalismo politicamente organizado do Partido Verde europeu, de dedicarem atenção a questões

relacionadas aos recursos naturais desprezando as demais relações sociais de produção no qual estão

inseridas aquelas questões. “O fato de que, em prazo relativamente curto, todos esses partidos tenham se

marginalizado, apesar do espetacular sucesso inicial em todos os países, acentua o fato de serem as causas

da destruição ambiental muito mais profundamente enraizada do que admitiam os líderes desses

movimentos reformistas que ignoravam programaticamente a questão das classes, inclusive aqueles que

imaginaram poder instituir uma alternativa viável ao projeto socialista, convidando seus adeptos a mudar

do vermelho para o verde” (MÉSZÁROS, 2012, p. 94).

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integradora deste modo de produção, pois: “[...] o sistema de capital global é obrigado a

frustrar todas as tentativas de interferência, até mesmo as mais reduzidas em seus

parâmetros estruturais” (MÉSZÁROS, 2012, p. 95). Com isso, os próprios movimentos

que atuam em defesa do desenvolvimento sustentável acabam integralizados ao modo

de produção capitalista.

O ambientalismo, por sua própria natureza (assim como a grande causa

histórica da liberação das mulheres), é não integrável. Consequentemente, e

apesar de sua inconveniência para o capital, nenhuma causa desse gênero

desaparecerá, não importa quantos tropeços e derrotas as formas

politicamente organizadas dos movimentos de ‘questão única’ tenham de

sofrer no futuro previsível. Entretanto, a não integrabilidade definida em

termos históricos e de época, apesar de sua importância para o futuro, não

pode, por si só, ser garantia de sucesso. Portanto, a transferência da lealdade

dos socialistas desiludidos da classe trabalhadora para os chamados ‘novos

movimentos sociais’ (hoje valorizados em oposição ao trabalho e

desprezando todo o seu potencial emancipador) deve ser considerada

prematura e ingênua. Os movimentos de questão única, mesmo quando lutam

por causas não integráveis, podem ser derrotados e marginalizados um a

um, porque não podem alegar estar representando uma alternativa coerente

e abrangente à ordem dada como modo de controle sociometabólico e

sistema de reprodução social. (MÉSZÁROS, 2012, p. 96, itálicos nossos).

A questão maior, a nosso ver, é saber discernir quando existe um verdadeiro

interesse de órgãos de fomento internacional, no caso o Grupo BM, pela conservação ou

preservação de recursos naturais, ou quando existe uma tentativa de, ideologicamente,

mascarar o problema, transformando a questão em marketing.

Entendemos que o modo de produção capitalista, pelas suas próprias

contradições internas, já demonstrou a incapacidade de qualquer intenção ou

possibilidade de um modelo de desenvolvimento que seja sustentável.

As perguntas seguintes foram formuladas buscando entender a possível

coexistência entre o desenvolvimento sustentável e a reprodução do modo de produção

capitalista (Questões 3.10, 3.11 e 4.4 – Anexo 1). As respostas obtidas asseveram que o

desenvolvimento sustentável não diz respeito a formas de comercialização e/ou

produção, portanto, pode ser compatível com o modo de produção capitalista (Questão

4.5 – Anexo 1) e nem tão pouco revela, na visão do entrevistado, alguma forma de

ideologia, porque: “[...] é uma necessidade, não está relacionado a um partido político...

que vai mudando sua maneira de pensar” (Funcionário da CATI, trabalho de campo,

2015).

Até pode, porque a vontade de todo mundo, todo agricultor, é cuidar da sua

propriedade [...] ter o cuidado com o solo na hora de plantar, tudo o que ajuda

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o meio ambiente e a produção de uma boa fruta, uma boa verdura, e é claro

que com isso o produtor consegue agregar valor na sua mercadoria. Aí você

volta em tudo o que te já te falei sobre o desenvolvimento sustentável, é tudo

a mesma ciosa, entende? Não tem problema se o produtor consegue aumentar

sua renda e proteger o meio ambiente (Técnico extensionista da CATI,

trabalho de campo, 2015).

Esta resposta traz à tona a questão da percepção sobre ideologia, lembrando

que nosso posicionamento sobre este conceito remete ao proposto por Marx e Engels

(2011) de falseamento da realidade. Em nenhum momento identificamos no

entrevistado esta perspectiva, o que notamos foi o entendimento de ideologia como uma

maneira pessoal de posicionamento, o que o entrevistado relaciona a questão partidária

Reconhecemos que o entrevistado não tem noção da concepção adotada neste trabalho

sobre ideologia, e nem tem a obrigação de ter e cobrar isso dele não faz sentido.

Porém, o que podemos afirmar é que o pensamento dele confirma o

funcionamento da ideologia capitalista. Deste modo, o entrevistado, que não é um

pesquisador e sim um técnico extensionista que está sob a égide da ideologia do modo

de produção capitalista, não existe discrepância entre o desenvolvimento capitalista e o

desenvolvimento sustentável, o que ocorre, nesta perspectiva, é somente a idealização

de um modo de produção que, de certa forma, respeite os espaços considerados naturais.

Foladori (2001) demonstra que o modo de produção capitalista e o

desenvolvimento sustentável são incompatíveis, havendo sérios limites para atingi-lo.

As propostas de desenvolvimento sustentável encontram-se limitadas a soluções pelo

viés técnico e tecnológico, evitando questionar as relações sociais de produção. De

acordo com o autor, “[...] é a forma social de produção e não seu conteúdo material e

técnico que determina o comportamento em relação à natureza” (FOLADORI, 2001, p.

108). Além disso, em virtude da existência de uma sociedade classista no capitalismo, o

poder de intervenção sobre os recursos naturais encontram-se nas mãos dos detentores

dos meios de produção e de capital.

Paralelamente à criação de novas necessidades, a indústria capitalista foi

transitando até produtos de qualidade cada vez pior, cuja vida útil mais curta

permite a rotação mais rápida do capital. As modas se abreviaram no tempo,

os novos produtos passaram a obsoletar os mais antigos com maior rapidez, e

o lixo e a poluição começaram a se amontoar também rapidamente

(FOLADORI, 2001, p. 178).

Neste mesmo sentido, Montibeller Filho (2008) escreveu que:

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Sabe-se que o capitalismo avançado é um sistema que tende à produção de

uma quantidade enorme de mercadorias. É ele impulsionado por uma

dinâmica – sintetizada no avanço tecnológico, aumento da produtividade e

investimentos [...] – que implica produzir volumes sempre maiores de

mercadorias como forma de obter lucro e garantir a valorização e acumulação

de capital [...] (MONTIBELLER FILHO, 2004, p. 257).

Destas informações, podemos considerar que as entrevistas com os produtores

rurais na microbacia, membros da ASCICAMP e com os técnicos executores da CATI

nos permitiram identificar dois diferentes tipos de discursos. O primeiro é caracterizado

por aqueles que ainda se dedicam a atividade agropecuária através de arrendamento e,

quando necessário, dispõem de alguns momentos para discutir questões relacionadas à

organização social. Não expressam muito conhecimento sobre as questões propostas na

entrevista, não foram objetivos, apresentaram-se evasivos e frequentemente recorrem a

exemplos práticos para responder as perguntas.

O segundo tipo de discurso é observado naqueles que não realizam mais

atividades produtivas, ou seja, aqueles que não moram mais em suas propriedades e

dedicam-se preferencialmente a atividades comerciais ou vivem de aposentadoria rural.

Nesses depoimentos observamos uma capacidade de discussão sobre os temas

propostos, significativamente melhor do que os representantes do primeiro tipo. A

diferenciação entre os dois tipos de discurso, no nosso entendimento, está relacionada

ao conhecimento sobre o tema e a participação em espaços de discussão.

A construção de uma noção sobre um determinado termo não evidencia

somente expressões de poder, mas traduz, relativamente, visões de mundo e percepções

de futuro, elementos necessários para a compreensão do atual estágio do processo de

desenvolvimento e da identificação da posição (autor ou espectador) do formulador da

concepção. O desenvolvimento sustentável, tal como proposto pela ONU, implica a

atenção simultânea de diversos setores ou dimensões para formar um projeto de futuro

envolvendo aspectos sociais e naturais. Conseguir a articulação da economia, a

produção e a competitividade geradora de rendas privadas, com desenvolvimento social

ou político e ainda preservar os recursos naturais exige uma articulação que se traduz na

busca de mecanismos de integração entre as políticas econômicas e as políticas de tipo

social, que compreendem estratégicas redistributivas ou de busca de equidade e, ainda,

de preservação e recuperação de recursos naturais.

As estratégias de continuidade (formação de agentes de educação ambiental)

(CATI, 2005) do programa não permitiram ao produtor desta microbacia um novo modo

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de produção e relacionamento com a natureza como estava previsto inicialmente. Além

deste fato, a que frisar que o PEMH, em sua totalidade, foi realizado paralelamente ao

avanço da cana-de-açúcar no Estado de São Paulo como demonstramos anteriormente

(item 2,1) e este fato pode ter inibido os resultados desta política pública tendo em vista

o avanço territorial do setor sucroenergético no Estado de São Paulo.

De acordo com as informações produzidas durante o trabalho de campo,

percebemos que houve abandono das práticas agrícolas em algumas propriedades que

passaram a ser alugadas para eventos festivos e o arrendamento de terras é uma

realidade, como já mencionamos neste trabalho, levando esta microbacia a uma

condição de precariedade. Desta forma, considerando e interpretando o que já

escrevemos até o momento, relacionando a teoria com o empírico, somos levados a

considerar que as políticas que se apresentam com o título, ou objetivo, de

desenvolvimento sustentável, em específico o PEMH (ao menos no caso estudado)

estão ainda longe de realmente contribuírem para um modelo de desenvolvimento que

se possa intitular de sustentável.

Concordamos quando se rotula tais propostas como conservadoras de

recursos naturais, mas, lembrando que trabalhamos aqui com a perspectiva de

desenvolvimento sustentável criada pela ONU, a partir do Clube de Roma, aquela

capaz de garantir às gerações futuras as mesmas oportunidades das gerações atuais,

tais políticas estão, ao menos, equivocadas em relação aos seus objetivos. Isto nos leva

a nossa terceira aproximação sobre a nossa hipótese a partir dos resultados do PEMH

que, de acordo com nossa pesquisa e com Neves Neto (2013), não apresentou resultados

satisfatórios. Mas, consideramos também que, apesar deste resultado não satisfatório, o

Grupo BM não deixou de investir em projetos voltados ao desenvolvimento territorial

rural sustentável que variam de financiamento de construção de rodovias, auxilio a

povos indígenas até combate a erosão em territórios rurais e preservação de

mananciais128

. De acordo com o site oficial do Grupo BM, existem na atualidade 40

projetos financiados no Brasil somando um total de “[...] 40 projects, totalling $6.67b,

operating in 533 locations” (WORLD BANK, 2016). Com isto, o que evidenciamos é

que a função do Grupo BM está sendo cumprida a risca, ou seja, um banco, qualquer

banco, seja privado ou público, tem como função propiciar a circulação financeira. No

128

Os projetos podem ser consultados no link:

http://maps.worldbank.org/p2e/mcmap/map.html?org=ibrd&level=country&code=BR&title=Brazil

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quadro 7, apresentamos os projetos atualmente financiados pelo Grupo BM, o setor a

qual está relacionado e o montante financiado, em milhões de dólares.

Quadro 7: projetos financiado pelo Grupo Banco Mundial relacionados ao desenvolvimento sustentável

no Brasil.

Projeto Setor Financiamento BR ABC Cerrado (P143184) Environment & Natural Resources $10.62M

BR APL SP Integrated Wtr Mgmt

(P006553)

Water $104.00M

BR Bahia Sustainable Rural

Development (P147157)

Agriculture $150.00M

BR Ceara Rural

Sustainb&Competitiveness

(P121167)

Agriculture $100.00M

BR DGM for Indigenous People

(P143492)

Environment & Natural Resources $6.50M

BR Energy & Mineral Sctr

Strengthening (P126537)

Energy & Extractives $49.60M

BR ES Integrated Sust. Water Mgt

Project (P130682)

Water $225.00M

BR FIP Environmental Cadastre

(P143334)

Environment & Natural Resources

$32.48M

BR GEF Amazon Region Prot

Areas Phase 2 (P114810)

Environment & Natural Resources $15.89M

BR Marine Protected Areas Project

(P128968)

Environment & Natural Resources

$18.20M

BR MST Acre Social Economic

Inclusion (P107146)

Agriculture $120.00M

BR MST Federal Integrated Water

Sector (P112073)

Water

$107.33M

BR MST Rio Grande do Norte

Regional Dev (P126452)

Agriculture

$360.00M

BR Municipal APL3: Teresina

(P088966)

Water $31.13M

BR Pernambuco - Rural Economic

Inclusion (P120139)

Agriculture $100.00M

BR Pernambuco Sustainable Water

(P108654)

Water $190.00M

BR Sergipe Water (P112074) Water $70.28M

BR SP Sust Rural Dev & Access to

Markets (P108443)

Agriculture $78.00M

BR SP Water Reagua (P106703) Water $64.50M

BR-FIP: Cerrado Monioring

Systems (P143185)

Environment & Natural Resources $9.25M

BR-RJ Sustainable Rural

Development (P101508)

Agriculture $39.50M

Sao Paulo Sustainable Transport

Project (P127723)

Transport & ICT $300.00M

Strengthening PM and Int

Territorial Dev (P126735)

Social, Urban, Rural and Resilience

Global Practice

$48.00M

Fonte: World Bank, 2016

Organizador: Guilherme Magon Whitacker

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Destas observações, o que nos é importante destacar é a função do Grupo BM.

Mesmo o PEMH não tendo resultados expressivos em relação aos seus objetivos, o que

destacamos é o montante que esta agência internacional é capaz de fazer circular

utilizando o desenvolvimento sustentável como estratégia para esta circulação, de

acordo com o quadro 6 temos um total de U$$ 2.230.028,00 circulando sob a ênfase do

desenvolvimento sustentável.

Deste ponto, lembrando Luxemburgo (1988), o que torna possível a reprodução

do modo de produção capitalista é a circulação. Portanto, essas informações tornam a

verificação de nossa hipótese válida, ou seja, confirmamos que o desenvolvimento

sustentável vem sendo utilizado como alternativa para a reprodução do modo de

produção capitalista fazendo uso, dentre outros meios, da territorialização do modo de

produção capitalista, no caso da expansão do setor sucroenergético, e da normatização

do território, como na política pública aqui apresentada.

Demonstraremos na sequencia que os fatos e processos aqui já evidenciados,

desde os escritos sobre a crise do petróleo, as primeiras conferências internacionais

sobre o tema até a institucionalização do mesmo no Grupo BM e a influência deste em

estados membros para aceitar suas imposições, corroboram para a validade da hipótese.

Os empréstimos para investimentos financiam uma ampla variedade de

atividades voltadas para a criação da infraestrutura física e social necessária

para a redução da pobreza e para o desenvolvimento sustentável. O

financiamento de investimentos evoluiu com o tempo. Concentrados a

princípio em obras, serviços de engenharia e construção, o financiamento de

investimentos veio a se concentrar mais no fortalecimento institucional, no

desenvolvimento social e na política pública de infraestrutura necessária para

facilitar a atividade do setor privado. Os projetos vão desde a redução da

pobreza urbana (envolvendo, por exemplo, empreiteiras em projetos de

habitação) ao desenvolvimento rural (formalização da posse da terra para

aumentar a segurança dos pequenos agricultores); passando por água e

saneamento (aumento da eficiência das empresas de saneamento); manejo de

recursos naturais (provisão de treinamento em silvicultura e lavoura

sustentável); reconstrução após conflito armado (reintegração de soldados nas

comunidades); educação (incentivando a educação de meninas); e saúde

(criação de postos de saúde rurais e formação de agentes de saúde) (BANCO

MUNDIAL, 2001, p. 17).

Considerando que no documento Nosso Futuro Comum (CMMAD, 1988)

estão elencadas as diretrizes para que se estabeleça um novo rumo para humanidade,

quais sejam, as dimensões, política, econômica, social, cultural e ecológica, entendemos

que o PEMH não contempla estas esferas, ficando restrito a questões naturais e de

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organização social estritamente locais, portanto, fora dos anseios preconizados pela

ONU.

Consideramos e acreditamos na importância de suas ações, repetimos. Porém,

para ações futuras, compreendemos ser necessária uma maior cautela ao definir

objetivos de políticas públicas que trabalhem com a conservação de recursos naturais

em espaços rurais. Pois é neste sentido, e somente neste, que reconhecemos a validade

das ações do PEMH.

As ações desenvolvidas pela CATI e pela ASCICAMP não conseguiram

alcançar os objetivos propostos inicialmente. Não esquecendo que avaliamos este

programa sob a perspectiva daquilo que entendemos por desenvolvimento sustentável.

Pela nossa interpretação, as dimensões que englobam o ideal do desenvolvimento

sustentável (política, cultural, econômica, social e cultural), não foram atingidas.

Estas informações nos levam a considerar o que Santos (2009) escreveu sobre

os principais processos dominantes em nossa sociedade. De acordo com o autor citado,

estes são articulados em redes que ligam lugares diferentes e atribuem a cada um deles

um papel e um peso em uma hierarquia de geração de riqueza, processamento de

informação e poder.

Coadunando com esta perspectiva Castells (1999) entende que estruturas

sociais dominantes determinam os procedimentos de organizações cuja lógica interna é

estratégica para a formulação de práticas sociais. Para Castells (1999), a teoria do

espaço de fluxos parte da suposição implícita de que as sociedades são organizadas de

maneira assimétrica em torno de interesses dominantes específicos a cada estrutura

social.

O espaço de fluxos é a lógica espacial dominante do modo de produção

capitalista em nossa sociedade, numa dominação não apenas estrutural, mas sim

estabelecida, concebida, decidida e implementada por agentes que determinam as

relações de poder baixo o manto do modo de produção capitalista. Portanto, a lógica do

poder global escapa ao controle sociopolítico das sociedades locais historicamente

específicas.

Daí a ingerência do global ao local que nos auxilia na interpretação dos fluxos

de poder que circulam no PEMH, partindo da analogia de que o Grupo BM encontra-se

no espaço de fluxos globais e os beneficiários e executores do programa em uma escala

local. Segundo Castells (1999), como a função e o poder em nossas sociedades estão

organizados no espaço de fluxos globais, a dominação estrutural de sua lógica altera o

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significado e a dinâmica dos locais. O espaço de fluxos pode ser preliminarmente

revelado pelas exigências feitas, na forma de recomendações, pelo Grupo BM para a

adaptação desta política pública ao campo no estado de São Paulo (GAMEIRO;

MARTINS, 2011).

Conforme declarado pelo Grupo BM, a estratégia da instituição perante o

Brasil consistia no apoio: a) a reformas estruturais que consolidassem a estabilização e

impulsionassem o crescimento dirigido pelo setor privado; b) à redução da pobreza

através de programas de crescimento de base ampla e socialmente focados, incluindo

aqueles para o meio rural; c) à expansão da infraestrutura; d) à promoção de

desenvolvimento sustentável (WORLD BANK, 2009).

Outra indicação do espaço de fluxos pode ser encontrada nas mudanças

operacionais e institucionais exigidas pelo Banco Mundial à CATI, frente ao

que o banco caracterizou como incompetência da instituição. Aparentemente,

a negociação das condições exigidas pelo Grupo BM adquire legitimidade

perante os responsáveis pela execução do PEMH por meio de códigos

implícitos e compartilhados presentes nas relações entre as instituições,

revelando a dominação dos espaços de fluxos (GAMEIRO, MARTINS,

2011, p. 193).

A dominação através dos espaços de fluxos pode também ser reconhecida

através do discurso do Grupo BM. Em seu relatório final de avaliação do programa, o

Grupo BM também afirma que o PEMH só ganhou força depois de algumas mudanças

na equipe de alto escalão do governo e dos esforços mais intensivos feitos para explicar

os princípios e justificativas do projeto aos membros novos do governo (WORLD

BANK, 2009).

O discurso sugere que o Grupo BM acredita que sua capacidade técnico-

administrativa foi estrategicamente imprescindível para o que o PEMH atingisse algum

sucesso em seu desenvolvimento. Os códigos embutidos neste jogo de forças pertencem

à estrutura social e transitam pelos nós das redes na forma de fluxos, de modo que a

dominação decorrente disso não seja explicitamente marcada como tal.

As entrevistas realizadas com técnicos executores do PEMH revelam que,

mesmo estes, apesar dos treinamentos e cursos de capacitação realizados, não

conseguiam explicar com precisão o que entendiam por desenvolvimento territorial

rural sustentável, suas respostas eram sempre genéricas e indicavam a preocupação em

relação às normatizações e objetivos estabelecidos nos manuais operacionais da CATI.

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Desta dimensão do PEMH emerge a preponderância dos sistemas peritos

(GIDDENS, 1991), ou seja, identificamos que a excelência técnica, ou competência

profissional por de trás desta política pública, tem suas matrizes fortemente relacionadas

à confiança aos membros do Grupo BM. Esta confiança, que se traduz em influência,

não seria depositada apenas nos profissionais em si, mas majoritariamente na

autenticidade do conhecimento perito que eles aplicam, algo que o leigo não pode, em

geral, conferir exaustivamente sozinho (GIDDENS, 1991).

A confiança no sistema perito seria legitimada pelos agentes que compartilham

das crenças daquele sistema. Fazendo a correlação desta abordagem conceitual com o

desenvolvimento prático do PEMH, pode-se considerar que o consentimento voluntário

dos beneficiários do projeto à presença e às sugestões dos técnicos da CATI, quando

ocorre, pode decorrer do fato de confiança no sistema perito, os eventuais guardiões da

tradição em nível local.

Desta, consideramos que a não consideração sobre os impactos negativos, na

nossa perspectiva de trabalho, favorece a disseminação do desenvolvimento territorial

rural sustentável levando em consideração a perspectiva normatização, pois, ao aceitar

as recomendações do Grupo BM sobre a descentralização, exclui-se o estado de sua

obrigação em relação à proteção de recursos naturais e melhorias em relação ao

produtor rural e, atribuindo a este, exclusivamente, sua condição precária e a

degradação de recursos naturais em algumas propriedades, pois, com o processo de

descentralização ocorreu à supervalorização da escala local no processo de

desenvolvimento, transferindo a este nível a responsabilidade de formular estratégias,

ainda que orientadas segundo recomendações, que garantissem a inserção dos mercados

locais difundindo uma premissa dissonante: pensar globalmente, agir localmente. Isso

reforçou a noção de que as escalas úteis para articular estrategicamente o

desenvolvimento territorial rural sustentável, por meio de relações de poder (GÓMES,

2006), sejam as locais e a global.

Com isso, ofusca-se e desvia-se o debate das questões estruturais que

predominam no modo de produção capitalista, que deveriam ser efetivamente motivo de

preocupação da sociedade, de maneira que os enormes limites estruturais colocados à

regulação local são subestimados, como “[...] a política, os conflitos, as classes sociais,

o papel da ação estatal, a nação e o espaço nacional. [...]” (BRANDÃO, 2007, p. 36,

37).

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Neste mesmo aspecto de mascaramento das questões estruturais, é preciso

salientar que não é em escala local que são determinados os agentes dominantes de

ordem macroeconômica, como taxas de juros, relação salarial, câmbio, políticas

monetárias e financeiras, e isto é o que impede que sejam estabelecidas políticas

efetivas de desenvolvimento.

Compreendemos que, para o efetivo desenvolvimento é necessário a

mobilização dos agentes sociais locais. Porém, há que se destacar que isso deve ocorrer

juntamente com ações e políticas emanadas e coordenadas por um estado forte e atuante

na correção das distorções e desigualdades. Aliás, deve-se ressaltar que essa

coordenação dos agentes locais, em prol do desenvolvimento, não é harmônica, pois,

mesmo no plano local, os objetivos dos indivíduos que pertencem às classes sociais

distintas têm ações distintas e, muitas vezes, opostas, fato este que gera conflitos e

tensões, já que existem fortes assimetrias na apropriação do poder, recursos e capital por

parte dos indivíduos.

É nesse bojo que se inscrevem a descentralização e a concepção de

participação centrada no território que fortalece as perspectivas localistas e reforçam o

individualismo, ou seja, a supremacia do indivíduo sobre a sociedade. Os mecanismos

de participação estão assentados na formação de conselhos deliberativos e comitês

populares, a fim de conhecer seus pontos de vista e preferências, estimulando, quando

possível, a participação direta dos usuários.

Ao mesmo tempo em que se estabelece essa possibilidade de participação na

esfera pública, de longa data reivindicada pelos segmentos progressistas da sociedade

civil, as orientações alertam, entretanto, sobre a necessidade de imposição de limites nas

reivindicações que podem chegar ao Estado.

Estas informações produzidas durante o trabalho e com base também em

revisão bibliográfica sobre o tema e a política estudada, nos permite escrever que a

aceitação do discurso sobre o desenvolvimento territorial rural sustentável, por

pesquisadores e autores, vai depender do grau de abstração do indivíduo, que, segundo a

concepção marxista, tem sua consciência determinada por sua atividade de produção na

sociedade (MARX; ENGELS, 2009).

O indivíduo tem consciência de si quando tem consciência do que produz,

como produz, para quem produz, pois ele está inserido num sistema econômico. A sua

abstração vai depender da sua consciência, da criação das ideias que estão vinculadas à

sua base de sobrevivência, ligadas ao seu modo de produzir e reproduzir, de como está

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inserido no processo. Ou seja, é o discurso cuja linguagem sofre limitações, e cujo

público já foi previamente escolhido, fazendo dele o espaço da opinião replicada, em

lugares e momentos previamente determinados, com conteúdo e forma também

previamente elaborados.

Portanto, as recomendações do Grupo BM são documentos técnicos,

portadores de informações que servem como meio para determinados fins de

implementação, também técnica, na forma de manuais operacionais (CATI, 2001). A

análise documental, restrita ao Grupo BM no contexto de nossa pesquisa, nos permitiu

extrair evidências e confrontar afirmações, pois estes foram organizados em

determinado contexto e fornecem significados sobre o mesmo (LUDKE; ANDRÉ,

1986).

Deste modo, consideramos que o Think Tank aqui anteriormente relacionado, o

Clube de Roma, não é apenas o simulacro de um lócus produtor e difusor de saber. Ele

realmente produz conhecimento. O que acontece é que um discurso enunciado por um

especialista que, para o senso comum, é aquele que parece saber sobre o que está

falando, algo que soa mais crível e legítimo. Afinal, a instituição à qual está vinculado

acaba por credenciá-lo. Com isso, passa a existir um agente que institucionaliza essas

metáforas que se apresentam carregadas de cientificidade e, sobretudo, intencionalidade

(BOURDIEU, 2009).

O desenvolvimento sustentável e a construção de vários mitos mostram como e

o quanto isso funciona. Isso não quer dizer que o discurso de um determinado operador

de crenças não seja verdadeiro, mas a versão que se apresenta, ainda que inexata, torna-

se absolutamente real e, durante um tempo, inquestionável.

Como afirma Goodman (1995), nosso próprio conhecimento da realidade se dá

por meio da construção de versões de mundo, versões essas que, segundo o autor,

funcionam como sistemas de símbolos que ordenam, organizam e classificam as coisas

que existem e que estão diretamente ligadas às escolhas que fazemos, com base em

convenções estabelecidas.

Para esse autor, todas as diferentes visões da realidade são visões de mundo

que compõem a realidade em que vivemos e são igualmente válidas, porque criamos e

recriamos, a todo instante, o mundo à nossa volta. Aos incautos, Goodman (1995) alerta

que:

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[...] o cientista que supõe estar ingenuamente dedicado à procura da verdade

engana-se a si próprio [...] Ele procura sistema, simplicidade, escopo; e

quando satisfeito com estes resultados talha a verdade de modo a que esta se

ajuste [...] Ele tanto decreta como descobre as leis que apresenta, tanto

desenha como discerne os padrões que delineia (GOODMAN, 1995, p. 56).

Deste modo, a verdade é um processo, uma construção. A mesma observação é

feita por Cassirer (2005). Ao mesmo tempo em que aponta que o valor da ciência “[...]

que nos proporciona a garantia de um mundo constante [...] Em um universo mutável, o

pensamento científico fixa os pontos de apoio, os polos inamovíveis [...]” (CASSIRER,

2005, p. 338), o autor afirma que, no fim das contas, sua suposta objetividade é

inalcançável, já que seus operadores são, por definição, de natureza intrinsecamente

subjetiva.

É esta restrição das qualidades subjetivas que marca o modo geral da ciência.

A ciência delimita a objetividade delas, mas não pode destruir por inteiro sua

realidade. Pois cada aspecto da nossa experiência humana tem uma

reivindicação à realidade (CASSIRER, 2005, p. 130).

Entre algumas das funções que os Think Tanks exercem no sistema político e

econômico nos quadros do Grupo BM, são relevantes os esforço em traduzir o

conhecimento mais acadêmico e teórico para uma linguagem acessível para seu público-

alvo, sejam os políticos, seja o governo, seja a imprensa; capacitar futuros funcionários

do governo, que manterão essa ponte de comunicação entre um setor e outro de modo

permanente, além de filtrar o excesso de informações em uma realidade cada vez mais

complexa, ágil e interdependente e de desenvolver pensamento estratégico e elaborar

programas de governo, em todos os níveis do Poder Executivo (TEIXEIRA, 2007).

No que pode ser um dilema pessoal, ou não, dependendo de como cada

pesquisador vê sua função e seu lugar na sociedade, os Think Tanks também atuam para

dar sentido, legitimar e justificar políticas, lançando mão de efeitos retóricos, o que

torna pouco nítida a natureza do discurso científico e aumenta a opacidade de uma

determinada agenda.

O limite entre o crédito ou o descrédito dado ao Clube de Roma é, de fato,

tênue. O trabalho deste Think Tank, realmente, funcionou, pois, no momento em que

seu público internalizou suas análises e sugestões, tomando-as como plausíveis e

verdadeiras, creditaram o que foi descrito em seu relatório (MEADOWS, et al, 1972).

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Capítulo 6. Sobre a ideologia do desenvolvimento sustentável, ou, sobre o

imperialismo ecológico

O Relatório Brundtland (CMMAD, 1988) é referência para a maioria dos

estudos sobre desenvolvimento sustentável e, também, para o direcionamento de ações

estratégicas no contexto de formulação e implementação de políticas públicas voltadas a

esse fim. Seu arcabouço discursivo tem bases políticas e conceituais no Think Tank

Clube de Roma e na publicação do relatório Os Limites do Crescimento (MEADOWS,

et al 1972) que surgiu no bojo da crise econômica da década de 1970. Cole (1973),

dentre outros, faz criticas a este documento, pois, a partir deste a crise do modo de

produção capitalista e seus reflexos sobre o projeto desenvolvimentista de então,

passaram a ser entendidos, planejados e trabalhados a partir da ótica dos limites físicos:

matérias primas, combustíveis fósseis e nucleares (COLE, et al, 1973).

Deste modo, o desenvolvimento sustentável, segundo o Relatório Brundtland

(CMMAD, 1984), coaduna com a harmonização de um pacto transclassista, sem

formulação teórica necessária para tratar a questão a que foi elaborado, a relação entre a

sociedade e a natureza por meio do desenvolvimento sustentável. Entendemos que este

visa, sim, compatibilizar o crescimento econômico com a recuperação e preservação de

recursos naturais, porém, sem referendar um projeto de superação do modo de produção

capitalista por ter sido elaborado com base em seus próprios fundamentos, o que

permite a coexistência com o mesmo.

Para Montibeller Filho (2001) essa coexistência não é possível, o

desenvolvimento sustentável constitui-se como mito. Montibeller Filho (2001) explica

que o capitalismo necessita aproveitar-se dos custos sociais e ecológicos e incorporá-los

como lucro, por isso, inviabiliza as propostas contidas no desenvolvimento sustentável

de combater a pobreza e anular a falha sociometabólica, pois explorar mão de obra e

recursos naturais é inerente à lógica do sistema na sua busca pelo lucro. Porém,

consideramos que é sobre esta mesma lógica que o desenvolvimento sustentável vem se

territorializando, afinal, não é este o objetivo de setores vinculados à produção

sucroenergética, por exemplo?

Portanto, a coexistência não somente é possível como existe, possui

materialidade em diversos setores tendo sida elaborada no coração do modo de

produção capitalista não poderia, de nenhuma maneira, ter sido criada para colocá-lo em

risco. A partir deste, a teoria marxista problematiza contundentemente a alienação

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provocada pelas relações produtivas estabelecidas no capitalismo. De acordo com este

posicionamento teórico, as soluções paliativas no tratamento de questões entre a

sociedade e a natureza constituem-se estratégias de reprodução ao próprio capitalismo

(FOLADORI, 1997, 2002).

A partir da década de 1970, há uma crise do padrão de acumulação do capital,

com o declínio da taxa média de lucro que se propalou pelo mundo do trabalho. Para

alçar as taxas de lucro do apogeu fordista, ou para ir além delas, os agentes capitalistas

começaram a discordar da destinação de frações dos recursos detidos pelo Estado com

as políticas públicas de bem-estar social (ZIZEK, 2011). A crítica neoliberal acentuou

tal aspecto, revitalizando os discursos de déficit fiscal acarretado pelos compromissos

que o pacto impunha ao Estado (HARVEY, 2005). Nesse processo, surgiram vários

movimentos que questionaram os impactos negativos, tanto sobre a sociedade quanto

sobre a natureza, do modo de produção capitalista (PORTO-GONÇALVES, 1989). Eles

eclodiram de situações particulares, como as vividas por jovens, mulheres, negros,

minorias étnicas, ambientalistas, feministas e outros, que almejavam transformações

anteriormente prometidas e não realizadas plenamente (MÉSZÁROS, 2012).

Destes apontamentos, esclarecemos o porquê de considerarmos o

desenvolvimento sustentável como ideologia, aqui, entendida como falseamento da

realidade (MARX; ENGELS, 2009). Posicionamento este que nos implica em

reconhecer que existem “[...] complexos processos sociais de ‘interpelação’ ou alusão a

nós dirigidos” (THERBORN, 1991, p.3). Entendemos, a partir de Marx e Engels (2009)

e Therborn (1991) que as ideologias, a partir de sua forte formação, possuem a

capacidade de interpelar129

distintos agentes “[...] fazendo com que estes compreendam

o mundo em diversos graus de significatividade” (THERBORN, 1991, p. 4). O autor

citado (THERBORN, 1991) demonstra que existem três formas de interpelação

ideológica, a primeira indica “[...] o que existe e seu corolário, o que não existe, quem

somos, o que é o mundo, como são a natureza e a sociedade [...]”; a segunda elas, as

interpelações, em cada tempo e lugar, “[...] [afirmam] o que é bom, correto, justo, belo e

todos os seus contrários [...]”; e, por fim, a terceira afirma o que seria “[...] possível e

impossível”, permitindo a construção dos sentidos de permanência e mutabilidade de

determinada ordem/condição/sociedade (THERBORN: 16).

129

Interpelação corresponde a “[...] uma ilustração, um exemplo adaptado a um modo específico de

exposição, suficientemente ‘concreta’ para ser reconhecida, mas abstrata o bastante para ser pensável e

pensada, dando origem a um conhecimento” (PÊCHEUX, 1996, p. 149).

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Portanto, se, inicialmente, questionamentos sobre o modo de produção

capitalista e sua influência na relação entre a sociedade e a natureza advieram dos

movimentos que contestavam o modo de vida dominante, a partir da elaboração

ideológica orquestrada por Think Tanks e agências de fomento internacional, neste

momento consideramos que ocorre, inevitavelmente, sua captura pelos circuitos de

valorização de capitais proporcionando a crescente apologia ao desenvolvimento

sustentável e sua mercantilização (MÉSZÁROS, 2012). Foi necessário fundar uma falsa

alternativa, ardilosa, que propusesse a reconciliação entre as formas altamente

exploratórias de produção e reprodução social no modo de produção capitalista e a

preservação de recursos naturais para revigorar a economia mundial.

Se para Therborn (1991) as ideologias submetem e qualificam os sujeitos,

entendemos que o desenvolvimento sustentável, como ideologia, exerce o mesmo papel

ao possibilitar situar, por exemplo, a questão da relação entre a sociedade e a natureza

do possível e do impossível, em outras palavras, de uma economia política capitalista

mundializada capaz de estabelecer relações harmoniosas entre a sociedade e a natureza,

fato este que, se posto em prática, alteraria radicalmente o processo que permeia a

relação entre a sociedade e a natureza, o trabalho, e, com esta alteração, consideramos a

possibilidade de que as relações sociais de produção, que permeiam a disputa de classes,

seriam reduzidas, e entendemos que não é este o objetivo dos agentes atuantes no

processo de mundialização do modo de produção capitalista.

As interpelações ideológicas provocadas pelo desenvolvimento sustentável

ocasionam a aceitação das propostas de resolução de indefinidas crises afeitas às classes

dominantes, tais como a instituição de novas formas de valorização de capital por meio

do comércio de carbono, dos mecanismos de desenvolvimento limpo, pelas certificações

e também, por políticas públicas de desenvolvimento territorial rural sustentável. Deste,

é gerado um pensamento crescente e asfixiante sobre o esgotamento de recursos naturais

culpando distintos agentes induzindo, desde o adestramento ambiental (BRÜGGER,

2004) ao imperialismo ecológico (FOSTER; CLARK, 2004).

Por meio dessa ideologia, elabora-se uma representação do espaço que tende a

homogênea e, a partir deste processo, uma normatização e delimitação territorial nos

marcos da reprodução capitalista do espaço, impondo práticas espaciais sociais que

(re)colonizam, inclusive, os espaços de representação. Temos, portanto, territórios do

desenvolvimento sustentável.

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Na parte I – capítulo 1 – escrevemos sobre uma perspectiva que entende o

desenvolvimento territorial como delimitação física de determinada área

desconsiderando a influência das relações capitalistas de produção, que tendem a

conflitualidade, na mesma. Nesta perspectiva, que entende o território como algo

abstrato, apesar de levar em consideração a participação social, ainda que de forma

alienada, o desenvolvimento sustentável pode existir. Pois este mesmo se torna, também,

norma. E, a partir da implementação de determinada norma, técnica, se atinge

determinado objetivo e este é o desenvolvimento sustentável pretendido e materializado,

ainda que idealizado.

Na parte II – capítulo 3 – apresentamos a concepção de território relacional.

Nesta perspectiva o território se forma a partir de relações de poder, no qual a

conflitualidade é fato e esta, dentre outras causas, resulta da influência das relações

sociais capitalistas de produção. Nesta, consideramos que o desenvolvimento

sustentável não se materializa, não passa de uma perspectiva de desenvolvimento

idealizada e que não atinge sua materialidade, de acordo com os preceitos de

desenvolvimento sustentável sugeridos pela ONU (CMMAD, 1984). Isto porque seria

completamente contraditório com a conflitualidade inerente as relações capitalistas de

produção.

Portanto, os territórios do desenvolvimento sustentável coexistem entre a

norma, o uso e a ideologia e, a partir deste confronto, entre a ideologia do

desenvolvimento sustentável que se materializa, por um lado, em um território

normatizado e o território enquanto resultado indissociável de conflito e poder no qual

o desenvolvimento sustentável não apresenta materialidade, demonstraremos que o

desenvolvimento sustentável é parte dos mecanismos de reprodução do modo de

produção capitalista almejando a verificação de nossa hipótese.

6.1. Desenvolvimento sustentável e a continuidade da falha sociometabólica

Atrelada às condições materiais de reprodução do modo de produção capitalista

como desenvolvimento histórico, instituiu-se a ideologia que se torna cada vez mais

importante para a reprodução sociometabólica do capital. Neste sentido, o poder da

ideologia (MÉSZÁROS, 2012b) consiste em criar sistemas econômicos e políticos, por

meio de seus Think Tanks com potencial de fomentar ilusões e alienar os indivíduos em

relação às formas e forças destrutivas, assim como o modo de produção capitalista se

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reproduz explorando recursos naturais e a sociedade, destruindo e eliminando as

possibilidades de que as relações humanas sejam de fato a centralidade do processo

civilizatório. Nesse caso, sobressai que uma das formas ideológicas de reprodução deste

modo de produção possa ser considerada o desenvolvimento sustentável.

A crise que estende desde a década de 1970 é insuperável uma vez que seja

mantida a sua determinação – a expansão da taxa de lucro. Significa dizer que os

limites absolutos do modo de produção capitalista possam ter sido ativados, diante da já

reduzida margem de deslocamento de suas contradições seja no espaço ou no tempo,

enfim, uma reduzida margem espaço/temporal. Neste sentido, concordamos com

Mészáros (2012) quando argumenta que: “Todo sistema de reprodução sociometabólica

tem seus limites intrínsecos ou absolutos, que não podem ser transcendidos sem que o

modo de controle prevalecente mude para um modo qualitativamente diferente [...]”

(MÉSZÁROS, 2012, p. 175). Portanto, tais limites são transcendíveis, mas: “[...]

exigiria adoção de estratégias que mais cedo ou mais tarde, enfraqueceriam inteiramente

a viabilidade do sistema do capital em si [...]” (MÉSZÁROS, 2012, p. 216).

No desenvolvimento sustentável não se discute a produção sob o pretexto de

criar valores de troca com todas as suas implicações, o modo de produção capitalista

não aparece no relatório Brundtland como um modo de produção capaz de influenciar,

se não até mesmo determinar, formas de produção do espaço e, a partir deste, de

normatização do território, este reconhecimento nos permite dialogar com Mészáros

(2012) no sentido de entender que o desenvolvimento sustentável busca soluções para

questões criadas no interior do modo de produção capitalista a partir do modo de

produção capitalista.

O aspecto mais problemático do sistema do capital, apesar de sua força

incomensurável como forma de controle sociometabólico, é a total

incapacidade de tratar as causas como causas, não importando a gravidade de

suas implicações a longo prazo. Esta não é uma dimensão passageira

(historicamente superável), mas uma irremediável dimensão estrutural do

sistema do capital voltado para a expansão que, em suas necessárias ações

remediadoras, deve procurar soluções para todos os problemas e contradições

gerados em sua estrutura por meio de ajustes feitos estritamente nos efeitos e

nas consequências (MÉSZÁROS, 2012, p. 175).

Diante disso, ponderamos estar diante de uma poderosa ideologia que se

assenta no desenvolvimento sustentável mediante um potente discurso de proteção à

natureza, aliás “[...] peça indispensável para o funcionamento do mercado capitalista”

(LÖWY, 2005, p. 58), com a aparência de bula para salvação do mundo, que confere a

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ilusão de um discurso menos agressor das ações humanas que se refletem sobre recursos

naturais. Este modelo de desenvolvimento, sustentável, no contexto do modo de

produção capitalista representa a “[...] manutenção da reprodução do capitalismo e sua

consolidação global no controle da natureza enquanto recurso e manutenção da pressão

Centro/Periferia através da gestão dos recursos naturais dos países dependentes”

(OLIVEIRA, 2005, p. 8).

Logo, não estamos diante de uma proposta alternativa, pois o

desenvolvimento sustentável, abordado neste sentido, significa um ajuste da ordem

vigente sem que se ataque os pilares da conjuntura hegemônica atual, pois mantém o

sistema e as disposições em vigor. Ao absorver inclusive as classes dominadas, a

ideologia do desenvolvimento sustentável configura-se como um mecanismo de

dominação. Descaracteriza interesses distintos e incute uma fantasia de que os dogmas

propostos são universais. Com esta plataforma bem alicerçada, hoje, dificilmente se

permanece imune aos seus reflexos e, deste modo, a ideologia se torna,

indubitavelmente, senso comum. Neste sentido, o desenvolvimento sustentável não está,

de maneira alguma, comprometido com a satisfação das necessidades humanas

presentes ou futuras, mas sim com as necessidades do modo de produção capitalista.

Lutar pela implementação do desenvolvimento sustentável nesse contexto é trabalhar

pela sustentação do status quo (OLIVEIRA, 2005) e o mantenimento da falha

sociometabólica na relação entre a sociedade e a natureza (FOSTER, 2005).

Historicamente e geograficamente foi, e é, através da relação metabólica do

homem com a natureza, mediada pelo trabalho, que o homem busca suprir suas

necessidades e modifica os recursos naturais por meio da produção de artefatos úteis,

que permitam ao homem suprir suas necessidades e, ainda, produzir valor, afinal, sem

estas características, a vida, tal qual a conhecemos, talvez não fosse possível, pois “[...]

essas necessidades e seus modos de satisfazê-las são, no nível mais geral, os

determinantes da natureza humana” (SMITH, 1988, p. 72).

Assim, ao realizar e alterar a interação metabólica com a natureza, o homem

não somente produz suas necessidades materiais, mas se constrói enquanto sujeito, por

isso a importância sobre o processo de consciência. Portanto, consideramos que o ser

social é fundado na medida em que funda o trabalho, e é a partir deste que o homem

engendra a história humana na sua relação com a sua base material, a natureza. Marx

(2012) constata que esta é, em suma, a extensão do corpo humano. Nessa perspectiva,

compreendemos a relação indissolúvel, em forma de uma espécie de metabolismo entre

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homem e natureza, sendo o trabalho o ato em que essa indissociabilidade se

consubstancia em processo metabólico, controlado intencionalmente pelo homem.

Neste sentido:

[...] considerar homem e natureza como elementos dicotômicos relegando à

natureza somente os aspectos inorgânicos e físicos e ao homem como fator

externo e produtor de mercadorias pelo trabalho é desconsiderar a totalidade

do processo no qual homem e natureza são elementos integrantes e não como

partes segmentadas, mas que se interligam dialeticamente em um movimento

de (re)transformação, (re)produção, (re)combinação, pois como enfatiza

Moreira (2006, p. 73) que “a natureza evolui em espiral e não em ciclos que

se fecham sobre seu próprio ponto inicial de partida”. Assim, a natureza

representa uma face múltipla que participa tanto o movimento físico

(inorgânico, mecânico) quanto biológico (orgânico, vivo) e o humano através

do metabolismo homem e natureza (PONTE, 2014, p. 186).

Dentre os muitos méritos que apresenta o trabalho de Foster (2005),

consideramos o maior deles a recuperação, para a discussão teórica, do conceito de

metabolismo social desenvolvido por Karl Marx. A importância deste resgate, para

Foladori (2005), consiste que “Todo o método do materialismo histórico parte desse

conceito”. Marx (2013) entende por metabolismo social o processo por meio do qual a

sociedade humana transforma a natureza externa e, ao fazê-lo, transforma sua natureza

interna. A ação de transformar a natureza externa constitui o processo de trabalho, e seu

efeito sobre a natureza interna se manifesta na forma como se estabelecem as relações

sociais de produção. No início do capítulo V de O capital, sobre o processo de trabalho,

Marx (2013) escreveu:

O trabalho é, antes de tudo, um processo entre o homem e a natureza,

processo este em que o homem, por sua própria ação, media, regula e

controla seu metabolismo com a natureza. Ele se confronta com a matéria

natural de uma forma útil para sua própria vida, ele põe em movimento as

forças naturais pertencentes a sua corporeidade: seus braços e pernas, cabeça

e mãos. Agindo sobre a natureza externa e modificando-a por meio desse

movimento, ele modifica, ao mesmo tempo, sua própria natureza. Ele

desenvolve as potências que nela jazem latentes e submete o jogo de suas

forças a seu próprio domínio (MARX, 2013, p. 255).

Deste, concordamos com Ponte (2014) quando escreveu:

Portanto, é através da relação metabólica homem/natureza que se (re)criam os

valores de uso, ou seja, é uma relação dialética de produção das necessidades

materiais e ao mesmo tempo a (trans)formação do próprio indivíduo

enquanto ser através de sua corporalidade e de sua subjetividade. Nesse

sentido, é através dessa articulação metabólica homem/natureza que se

constrói a autonomia do sujeito frente à sua vida em seu território. Assim, no

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processo de controle do capital sobre esse metabolismo, além de

metamorfosear o trabalho enquanto condição de existência para o trabalho

estranhado, retiram-se também as possibilidades dessa construção dialética e

ainda subtraem a condição de autonomia dos sujeitos frente à condução de

sua vida. Com isso, a desestruturação da autonomia passa a significar a perda

do autocontrole da sociedade pelo capital, pois é através do controle do

metabolismo social pelo capital que o homem perde a direção de sua forma

de organização de vida e de trabalho, já que esse cerceamento da autonomia é

condição essencial para se estabelecer a lógica do capital sobre os territórios

(PONTE, 2014, p. 193).

A despeito de muito ter sido escrito e discutido, sobretudo a partir da década de

1990, acerca da necessidade de uma teoria interdisciplinar, multidisciplinar, ou mesmo

de uma filosofia holística para a análise das relações entre a sociedade e a natureza, no

sentido de considerar o ser humano em suas inter-relações130

, entendemos e

consideramos que a teoria marxista pode contribuir de maneira mais acentuada. Pois o

desenvolvimento sustentável tornou-se um tema central na agenda pública e privada na

tentativa de criar normas que possibilitem harmonizar o desenvolvimento no modo de

produção capitalista com a preservação e recuperação de recursos naturais tendo, seus

defensores e movimentos sociais que seguem a base nesta vertente holística, como

potenciais agentes na materialização do mesmo.

Por consideramos esta linha de raciocínio potencialmente produtora de normas

em escala global, por meio da ação de seus Think Tanks e agências financiadoras, que

permitem a materialização do desenvolvimento sustentável pela normatização do

território, tornando, também norma o desenvolvimento sustentável, optamos pela teoria

marxista entendendo que esta se contrapõe aquela que centraliza as análises sobre a

relação entre a sociedade e a natureza nos sujeitos individuais, sendo que todos os

indivíduos são apontados como responsáveis na mesma proporção por danos aos

recursos naturais e por suas possíveis soluções, por meio de ações individuais,

emanadas da construção, através de uma educação ambiental que toma, por exemplo, a

responsabilidade individual pelo consumo de água durante um banho com o mesmo

consumo do setor agroindustrial, enquanto sabemos, a discrepância é enorme, desta

forma, por meio do temor e do imperialismo ecológico, responsabiliza-se

individualmente por ações coletivas a continuidade da falha sociometabólica entre a

sociedade e a natureza.

130

Neste sentido, ver, por exemplo, os trabalhos de Fritjof Capra, Edgar Morin, Enrique Leff, Francisco

Maturana e outros que abordam a questão.

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Deste, consideramos que o conceito marxista de sóciometabolismo oferece

grandes perspectivas para nossos objetivos, sobretudo porque, sem fugirmos de nossa

opção nesta pesquisa, nos permite compreender a materialidade dos processos sociais de

reprodução do modo de produção capitalista que tem como subterfúgio o

desenvolvimento sustentável.

Em relação ao conceito de metabolismo, podemos pensar, para exemplificação,

a partir de uma célula como unidade elementar de vida que cria uma membrana e a

separa do entorno, mas, ao mesmo tempo, mantém um fluxo de energias e matéria com

o externo. Neste processo, a célula cresce, metaboliza, pode reproduzir-se e até

especializar-se em seres multicelulares. O termo metabolismo não é gratuito, tem sua

origem nas ciências naturais e busca ilustrar o comportamento humano como parte

desse mundo natural131

. Para Foster (2005) os estudos de Marx, em distintos

momentos132

, sobre o desenvolvimento do modo de produção capitalista, em específico

na agricultura, se centraram na análise deste conceito que implica uma noção de troca

material.

O fluxo circular econômico estava, pois intimamente atrelado, na análise de

Marx, à troca material (fluxo circular ecológico) associada à interação

metabólica entre os seres humanos e a natureza. [...] Marx, portanto

empregava o conceito tanto para se referir a real interação metabólica entre a

sociedade e a natureza através do trabalho humano (contexto em que o termo

era normalmente utilizado nas suas obras) quanto, num sentido mais amplo

(sobretudo nos Grundrisse), para descrever o conjunto complexo, dinâmico,

interdependente, das necessidades e relações geradas e constantemente

reproduzidas de forma alienada no capitalismo, e a questão da liberdade

humana suscitada por ele – tudo podendo ser visto como ligado ao modo

como o metabolismo humano com a natureza era expresso através da

organização concreta do trabalho humano. O conceito de metabolismo

assumia assim tanto um significado ecológico específico quanto significado

social mais amplo (FOSTER, 2005, p. 222).

A partir deste, consideramos que Karl Marx estabelece como o critério

metodológico para compreender a relação entre a sociedade e a natureza o conceito de

metabolismo e, desta definição, Marx (2011) analisa, em As formas que precederam à

produção capitalista, como a membrana da célula, a sociedade, vai se materializando

historicamente, se tornando mais espessa de acordo com as relações com o mundo

131

Segundo Foster (2005), o termo metabolismo era utilizado pelos fisiólogos alemães durante os anos de

1830 e 1840 para se referir aos intercâmbios materiais no interior do corpo e com relação à respiração. No

início de 1840, Justus Von Liebig estende seu significado para considerar a degradação dos tecidos. 132

“Marx utilizou o conceito de metabolismo em todas as suas obras da maturidade, embora o contexto

variasse” (FOSTER, 2005, p, 222).

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externo vão se tornando cada vez mais mediadas por instrumentos e coisas previamente

produzidos, ao mesmo tempo em que, em seu interior, os elementos que a compõem se

separam em uma progressiva divisão social e territorial do trabalho.

[...] em todas essas formas em que a propriedade de terra e a agricultura

constituem a base da ordem econômica e, por conseguinte, em que a

produção de valores de uso é a finalidade econômica, a reprodução do

indivíduo nas relações determinadas com sua comunidade e nas quais ele

constitui a base da comunidade – em todas essas formas existe: 1)

apropriação da condição natural do trabalho, da terra – tanto como

instrumento original do trabalho, laboratório, quanto depósito das matérias-

primas – não pelo trabalho, mas como pressuposto do trabalho. O indivíduo

simplesmente se relaciona às condições objetivas do trabalho como sendo

suas [próprias] condições; relaciona-se a elas como a natureza inorgânica de

sua subjetividade, em que esta realiza a si própria; a principal condição

objetiva do trabalho não aparece, ela própria, como produto do trabalho, mas

está dada como natureza; de um lado, o indivíduo vivo, de outro, a terra

como a condição objetiva de sua reprodução; 2) mas esse comportamento em

relação ao território, à terra, como propriedade do indivíduo trabalhador – o

qual, por isso, não aparece de antemão, nessa abstração, unicamente como

indivíduo trabalhador, mas tem na propriedade da terra um modo de

existência objetivo, que está pressuposto à sua atividade e da qual não

aparece como mero resultado, e que é um pressuposto de sua atividade da

mesma maneira que sua pele ou seus órgãos sensoriais, os quais ele de fato

também reproduz e desenvolve etc. no processo vital, mas que, por sua vez,

são pressupostos desse processo de reprodução – é imediatamente mediado

pela existência originada natural e espontaneamente, mais ou menos

historicamente desenvolvida e modificada, do indivíduo como membro de

uma comunidade – a sua existência natural como membro de uma tribo etc.

(MARX, 2011, p. 1285)

Assim, o que requer explicação, conforme escreveu Marx (2013), não é a

unidade do ser humano com a natureza, pois isso é parte da natureza física e química,

mas o que se deve explicar é o processo histórico por meio do qual o ser humano aliena-

se a existência humana dos condicionantes naturais necessários para reproduzir-se, o

que consideramos como o processo histórico e geográfico de desenvolvimento, mas, em

uma concepção Geográfica que coaduna com o que escreveu Harvey (2005): o que

importa realmente entender, não é o desenvolvimento em si, mas sim como determinado

modo de desenvolvimento influencia na produção do espaço (HARVEY, 2005) e deste,

na formação e concepção dos territórios, como escrevemos na parte II. Com este

raciocínio e entendendo a produção do espaço e os processos de territorialização do

modo de produção capitalista e de normatização do território que promovem a

separação entre o trabalhador e o meio de produção, seja pela espoliação ou alienação,

concordamos com o que Marx (2013) explicou sobre as formas como foi sendo

modificado e rompido o metabolismo com a natureza:

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Não é a unidade do ser humano vivo e ativo com as condições naturais,

inorgânicas, do seu metabolismo com a natureza e, em consequência, a sua

apropriação da natureza que precisa de explicação ou é resultado de um

processo histórico, mas a separação entre essas condições inorgânicas da

existência humana e essa existência ativa, uma separação que só está posta

por completo na relação entre trabalho assalariado e capital. (MARX, 2011,

p. 1285, itálicos nossos).

Deste modo, consideramos que o interesse de Karl Marx, a partir destes

fragmentos sobre o contexto apresentado, se torna nítido em desvelar as formas de

ruptura do metabolismo com a natureza e as peculiares modalidades que adquire essa

ruptura com o sistema capitalista pode ser considerado como o desejo de

estabelecimento de outra sociedade que restabeleça o metabolismo com a natureza

externa.

Com esta definição, Marx (2013) trouxe à liça acadêmica a teoria da falha

metabólica. O conceito de falha no metabolismo social é essencial à noção de que,

sendo o metabolismo a conjunção de vários processos sistêmicos, a existência e a

perpetuação da falha implicam na alienação das condições da existência humana como

uma das conjunções do processo. Assim, a falha metabólica na relação entre a sociedade

e a natureza resulta das relações sociais de produção no modo de produção capitalista.

Ainda que os princípios fundamentais do conceito de falha metabólica tenham sido

construídos a partir do uso da terra, pela agricultura modernizada, tendo assim relação

com a forma de cultivo e a exaustão do solo.

Portanto, sob a lógica do capital, o intercâmbio socioecológico segue os

imperativos da acumulação, desenvolvendo formas complexas de estranhamento e

degradação do trabalho e da natureza na sociedade capitalista, pois há a “[...] alienação

da força de trabalho humana (ela própria um agente natural) e, por meio disso, da

alienação inteira do metabolismo da natureza humana” (FOSTER, 2010, p. 23). Ou seja,

o capitalismo rompeu o equilíbrio da interação metabólica homem/natureza,

ocasionando a degradação tanto da natureza humana ao explorar o homem que

trabalha através de sua subjetividade como também de sua força de trabalho que passa

a ser parte integrante do capital. Do mesmo modo, a natureza, primeira, que compõe os

recursos naturais também sofre com o processo de degradação e exploração comandada

pelos desígnios do capital e sua lógica reprodutiva e destrutiva de acumulação. Nesse

sentido, Foster (2010) enfatiza que:

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[...] o metabolismo social do capitalismo é cada vez mais divorciado do

natural, produzindo várias cisões metabólicas e formas de degradação

ecológica nos ciclos e processos naturais, o que leva à violação das leis

naturalmente postas de regulação da produção social que mantém as

condições da natureza (FOSTER, 2010, p. 25).

A despeito de em todas as formas de organização econômica e social pré-

capitalista ser considerada a existência de maior proximidade – ainda que relativa e

variável – entre o trabalhador e seus meios de vida, ou seja, o trabalhador e sua natureza

externa, esta mesma organização, a partir do desenvolvimento do modo de produção

capitalista separa de forma absoluta o trabalhador de seus meios de vida (FOLADORI,

2001).

O trabalhador assalariado cumpre com todos os requisitos de ruptura do

metabolismo com a natureza: está separado da terra como condição natural

de produção; está separado dos instrumentos como intermediários de seu

corpo em relação à natureza externa; está separado de um “fundo de

consumo” prévio ao trabalho – depende de vender sua força de trabalho para

comer –; e está separado do próprio processo de produção como atividade

transformadora – à diferença, por exemplo, do servo feudal. É livre, mas essa

liberdade deve ser entendida como isolamento, alienação com respeito à

natureza externa; é livre porque foram esgarçados os laços do metabolismo

com o meio ambiente. É livre no sentido de isolado. O proprietário, ao

contrário, passa a usufruir de uma natureza que deveria corresponder a todos

os habitantes do planeta (FOLADORI, 2001, p. 108).

A teoria da renda da terra, desenvolvida por Marx (2013), possui tom

significativo nesse processo de conhecer a ruptura do metabolismo com a natureza. A

razão que consideramos para esta importância é que, para Marx (2013) os modos pré-

capitalistas de produção eram agrícolas, o modo de produção capitalista cria a indústria

e, com ela, redimensiona as relações com a terra. Quando Marx (2013) elabora sua

teoria da renda da terra, ele é cuidadoso ao falar da moderna propriedade do solo “[...] o

capital é o criador da moderna propriedade da terra” (MARX, 2011), para mostrar que a

renda capitalista é essencialmente diferente de todas as formas de renda pré-capitalistas.

As rendas anteriores, comunitárias, em tempo, em trabalho, em produto, ou, inclusive,

em dinheiro, estavam reguladas pelo próprio trabalho agrícola. A renda capitalista do

solo está regulada pelo lucro industrial.

Isso interfere diretamente na plenitude da ordem sociometabólica do capital, na

qual a ciência colaborou (e colabora) decisivamente para retirar o controle decisório

daqueles que trabalham e atuam diretamente no mundo da produção material,

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objetivando intensificar e salvaguardar os interesses capitalistas, conforme escreveu

Mészáros (2012a).

As práticas de produção e distribuição do sistema do capital na agricultura

não prometem, para quem quer que seja, um futuro muito bom, por causa do

uso irresponsável e muito lucrativo de produtos químicos que se acumulam

como venenos residuais no solo, da deterioração das águas subterrâneas, da

tremenda interferência nos ciclos do clima global em regiões vitais para o

planeta, da exploração e da destruição dos recursos das florestas tropicais etc.

Graças à subserviência alienada da ciência e da tecnologia às estratégias do

lucrativo marketing global, hoje as frutas exóticas estão disponíveis durante o

ano inteiro em todas as regiões – é claro, para quem tem dinheiro para

comprá-las, não para quem as produz sob o domínio de meia dúzia de

corporações transnacionais. Isso acontece contra o pano de fundo de práticas

irresponsáveis na produção, que todos nós observamos impotentes. Os custos

envolvidos não deixam de colocar em risco – unicamente pela maximização

do lucro – as futuras colheitas de batata e safras de arroz. Hoje, o “avanço de

métodos de produção” já coloca em risco o escasso alimento básico dos que

são compelidos a trabalhar para as “safras de exportação” e passam fome

para manter a saúde de uma economia “globalizada” paralisante

(MÉSZÁROS, 2012a, p. 255).

Outra importante contribuição marxiana que nos permite entender a maneira

como o desenvolvimento sustentável, enquanto ideologia territorialmente imposta e

transformado em mercadoria pela lógica da normatização, colabora com a continuidade

da falha sociometabólica na relação entre a sociedade e a natureza é o duplo conceito de

riqueza, valor de uso e valor de troca. Para Foladori (2001):

No processo do metabolismo social, ocorre uma transformação da natureza

externa em relação à célula social, ao mesmo tempo em que há uma

transformação em seu interior. O processo de transformação da natureza

externa implica sua conversão em riqueza material, ou seja, em natureza apta

para ser consumida, desfrutada, apropriada pela sociedade humana. Por sua

vez, o processo de transformação de seu próprio ser social interior implica,

além de formas determinadas de divisão social do trabalho, de relações de

produção e outras formas de organização e consciência, a conversão daquela

riqueza material em riqueza social, isto é, riqueza segundo os critérios

históricos de cada sociedade em questão. O ouro é ouro, mas, em um

momento determinado de sua história, a sociedade o “converte” em dinheiro.

Uma pessoa é uma pessoa, mas a sociedade a reconhece hoje como cidadão

ou escravo, amanhã como proprietário de terra, depois como trabalhador

assalariado etc. (FOLADORI, 2001, p.109).

A importância de retomar estes dois conceitos clássicos do pensamento de Karl

Marx está na possibilidade de compreender, a partir destes, como o desenvolvimento

sustentável está sendo utilizado como mecanismo de reprodução do modo de produção

capitalista. O objetivo articulado por detrás deste modelo de desenvolvimento é

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possibilitar que os recursos naturais sejam a mercadoria essencial para o

desenvolvimento sustentável dele próprio, do modo de produção capitalista. Vejamos.

Deste modo podemos considerar que exista uma determinação material

intrínseca e uma determinação social, que é a forma como a sociedade a reconhece e a

assume, sobre a natureza. A característica da sociedade capitalista é que essa conversão

da riqueza material se cristaliza em uma riqueza social chamada dinheiro. Daí que no

primeiro parágrafo de O capital lemos: “A riqueza das sociedades onde reina o modo de

produção capitalista aparece como uma enorme coleção de mercadorias, e a mercadoria

individual como sua forma elementar” (MARX, 2013, p. 113).

Segundo Marx (2013) a mercadoria tem um duplo caráter: é um objeto externo

que satisfaz necessidades, ou seja, é riqueza material, e tem a capacidade de ser trocada

por outros objetos úteis, tem valor de troca. O dinheiro não é mais que a expressão

universal do valor de troca. Longe de negar o valor da natureza Marx (2013) começa

mostrando como a riqueza é, em primeira instância, natureza adaptada às necessidades

humanas.

“A natureza é valorizada em função da história particular que a sociedade tem

com o seu ambiente” (FOLADORI, 2001, p. 110). A natureza, adaptada às necessidades

humanas, Marx (2013) atribui o valor de uso. Trata-se de um conceito a-histórico,

intrínseco à natureza humana. A natureza tem valor genericamente, como valor de uso,

como riqueza material que satisfaz necessidades sociais. Como resultado do processo de

metabolismo social, que transforma o exterior, ao mesmo tempo em que modifica o seu

interior, o valor dessa natureza, como supridora de necessidades sociais, é subsumido

pelo valor que a sociedade humana lhe atribui por meio de suas relações sociais de

produção:

[...] está completa a mistificação do modo de produção capitalista, a

reificação das relações sociais, a aglutinação imediata das relações materiais

de produção com sua determinação histórico-social: o mundo encantado,

distorcido e posto de cabeça para baixo, no qual Monsier le Capital e

Madame la Terre exercem suas fantasmagorias ao mesmo tempo como

caracteres sociais e imediatamente como meras coisas (MARX, 2013, p.

427).

O valor de uso se expressa somente por meio do valor de troca na sociedade

capitalista. A natureza é valorizada no capitalismo somente se puder ser trocada por

outra mercadoria, ou, mais comumente, por dinheiro. Daí a necessidade de ajustes

institucionais e mercadológicos em torno do desenvolvimento sustentável. Seja na

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forma de criação de novos produtos ecologicamente corretos, na cobrança pelo direito

de poluir, no estímulo ao turismo sustentável, no asfalto produzido a partir de resíduos

de pneus, ou, em nosso caso, em políticas públicas de desenvolvimento territorial rural

sustentável. A lógica não está nas mínimas entre linhas dos exemplos acima, mas sim

no olhar acurado que identifica nestes produtos, serviços e políticas públicas novos

nichos de mercado.

Especificamente no campo, a produção capitalista se caracteriza pela grande

propriedade, como exemplo do setor sucroenergético. Se considerarmos as fases do

desenvolvimento do capitalismo na agricultura, poderemos distinguir uma primeira de

amplo avanço da produção capitalista. Esse desenvolvimento extensivo se caracteriza

pela introdução de relações capitalistas no interior de formas mercantis simples de

produção, ou melhor, pela colonização de novas áreas. Durante esses primeiros

momentos, a produção capitalista pode contratar trabalho assalariado, chegando

inclusive a aumentar o número de pessoas vivendo no meio rural.

Assim que o capital introduz a mecanização na agricultura de forma sustentada,

surge uma segunda fase, de desenvolvimento do capitalismo intensivo. Isso significa a

inversão de volume cada vez maior de capital sobre a mesma extensão de solo. Do

ponto de vista da população, ocorrem duas grandes consequências. Por um lado, e como

tendência, desloca-se força de trabalho em termos absolutos, não obstante as diferenças

que possam haver entre cultivos; por outro, acontece a destruição acelerada das

explorações de produção mercantil simples, que não podem suportar a concorrência

imposta pelos custos de produção da agricultura mecanizada capitalista (MAZOYER,

ROUDART, 2011).

A soma dos acontecimentos é negativamente impactante, tanto sobre a

sociedade, como para os recursos naturais. Porém, é a lógica dominante, e ai surge o

desenvolvimento sustentável como alternativa para amenizar os problemas. Ora, se o

mesmo foi criado no bojo das relações sociais de produção do modo de produção

capitalista, como seriam amenizados estes problemas? Estariam seus idealizadores

realmente convencidos da necessidade de um novo sistema ou seria mais uma forma

ideológica de permitir a reprodução deste modo de produção? Acreditamos na segunda

questão e continuamos em sua verificação, pois, não devemos ignorar que, sob a lógica

atual, dominante, a primeira questão a ser levantada é o que deve ser sustentável.

Consideramos que a taxa de lucro deva ser. Deste modo, não é possível o

desenvolvimento sustentável nos moldes da ONU sem que seja revista profundamente

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as bases estruturais do modo de produção capitalista, já que a lógica mercadológica, que

sustenta este modo de produção, é, por si mesma, predadora e degradadora de recursos

naturais e sociais.

Observando os impactos sobre os recursos naturais, os impactos apontados

anteriormente por Mazoyer e Roudart (2011) sobre a exacerbada dominância do modo

de produção capitalista sobre a agropecuária pode ser considerada a causa de alguns dos

efeitos mais nocivos da poluição e da depredação. Pela primeira vez na história,

separam-se, de forma massiva, as fontes de produção de alimento e a matéria prima de

seu consumo. As trocas de materiais e energia se modificam radicalmente. O mesmo

Marx (2013) já havia alertado sobre o fato:

[...] a grande propriedade rural reduz a população agrícola a um mínimo em

decréscimo constante e lhe contrapõe uma população industrial em constante

crescimento, amontoada em grandes cidades; gera, com isso, condições que

provocam uma insanável ruptura no contexto do metabolismo social,

prescrita pelas leis naturais da vida, em decorrência da qual se desperdiça a

força da terra e esse desperdício é levado pelo contrário muito além das

fronteiras do próprio país (MARX, 2013, p, 587).

Nesta citação, Marx (2013) faz referência a Justus Von Liebig. Como aponta

Foster (2005), Liebig havia mencionado esse fato como um dos mais nocivos da

produção capitalista, como um sistema de roubo dos nutrientes do solo, sem restituição

alguma. Marx (2013) retoma essa análise em seu estudo sobre a renda capitalista do

solo133

. Era preocupação de Liebig entender a composição química do solo e os

nutrientes necessários para a agricultura, de forma a devolver ao solo o que a agricultura

capitalista não tinha (tem) condições de fazer devido à excessiva utilização e

decomposição pelo uso de produtos químicos, deste modo, Marx (2013) retoma essa

perspectiva e se refere à mesma como a ruptura radical do metabolismo com a natureza.

Dantas (2011) afirma, que o problema das práticas atuais voltadas a uma

possível solução para a falha sócio metabólica, por meio do desenvolvimento

sustentável, “[...] vem a ser precisamente o da ilusão a respeito de reformas profundas

contra a acelerada crise ambiental, nos marcos do capitalismo”. Ou seja, por meio de

normas, técnicas, ilude-se a respeito de uma possível harmonização no modo de

133

A renda do solo é a retribuição que recebe o proprietário de terra por permitir a inversão de capital em

sua propriedade. Essa renda provém do rendimento do solo. Assim, tal produto deve cobrir, uma vez

vendido, os custos de produção, o lucro do capitalista que comandou a produção e, ainda, uma renda para

pagar o proprietário da terra.

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produção capitalista em seu trato com os recursos naturais. Um pensamento ideológico

que:

[...] cumpre um papel nefasto ao desviar os trabalhadores e sua vanguarda do

único caminho e da única estratégia que, pode colocar a ciência a favor da

sociedade e fazer com que esta venha a se rearticular, em equilíbrio

dinâmico, com a natureza (o chamado desenvolvimento sustentável).

(DANTAS, 2011, p. 24)

Logo, o problema que relacionamos a estas normas que excessivamente

impulsionam o desenvolvimento sustentável, mesmo reconhecendo a relevância de

algumas ações134

, é que estas não conseguem ir além de proposições locais que não

ultrapassam o campo reformista. Não questionam a produção desenfreada das grandes

empresas, não ponderam o fato de que, no modo de produção capitalista a natureza e o

homem são tomados, por meio de normas pelo estado, grandes empresas e agências

internacionais, como o Grupo BM, como mercadorias, utilizadas para produzir, como

escreveu Marx (2013), a “[...] mercadoria das mercadorias” (MARX, 2013), o dinheiro.

Deste modo, políticas públicas voltadas ao desenvolvimento territorial rural

sustentável, como o PEMH, por exemplo, giram nos contornos da ciranda das próprias

relações sociais de produção capitalistas. Da mesma forma, o setor sucroenergético faz

o uso que a ele interessa do desenvolvimento sustentável. Pior ainda, quando estes dois

processos ocorrem concomitantemente, políticas públicas e setores privados fazendo o

uso do desenvolvimento sustentável, temos a perfeita possibilidade de exemplificação

da alienação proporcionada por este discurso ideológico. Ora, se temos o financiamento

de políticas públicas, como o PEMH, que objetiva o desenvolvimento sustentável, é

possível considerar totalmente contraditório que o governo Estadual estimule, ao

mesmo tempo, a expansão de área plantada com cana-de-açúcar.

Este modo de idealizar o desenvolvimento sustentável sem levar em conta que

estas mesmas apresentam limites estruturais, insuperáveis e, desse modo, permite que as

práticas espaciais desenvolvimentistas e sustentáveis estendam um silencioso manto

ideológico sobre a necessidade de superação estrutural deste modo de produção

(MÉSZÁROS, 2009).

134

Lembrando que em nenhum momento nos posicionamos contra a preservação de recursos naturais, o

que nos importa aqui, é demonstrar a lógica perversa por detrás das mesmas que provocam a alienação

coletiva a respeito dos reais impactos negativos do modo de produção capitalista.

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A tendência à produção ilimitada é o resultado direto e necessário de uma

organização econômica que gira em torno da produção de lucro e não da

satisfação das necessidades. Por isso, é impossível entender a crise ambiental

sem partir da compreensão da dinâmica econômica da sociedade capitalista.

Por isso, também, resultam fúteis as críticas à produção ilimitada que não

encaram, ao mesmo tempo, as críticas à organização capitalista da sociedade

humana. (FOLADORI, 2007, p.86).

Deste modo, assevera-se a falha sócio metabólica entre a sociedade e natureza,

pois, de acordo com Dantas (2007):

No capitalismo, a “interação” (melhor: metabolismo) dos homens com a

natureza se dará mediada pelo objetivo da acumulação de mercadorias,

acumulação do capital. A produção será um meio para valorizar o capital. O

objetivo da atividade econômica será aplicar um montante de capital para

valorizar este mesmo capital. (DANTAS, 2007, p.87)

Ao se estabelecer a sociedade de classes, o trabalho livre, protoforma do ser

social, é eliminado, logo a relação do homem com a natureza- metabolismo - passa por

uma alteração. O homem torna-se alienado de si mesmo e da natureza, a extensão de seu

corpo, dessa maneira, de acordo com Dantas (2007), “a produção – ou relação dos

homens com a natureza através do trabalho – se recompõe, tendo como objetivo a

acumulação de capital, de mercadoria” gerando assim, a “falha metabólica”. Logo, é

possível demonstrar, baseando-se em Dantas, que a falha metabólica, ou a relação

alienada entre homem-natureza é inerente a uma sociedade que tem como objetivo

crucial, no seu modo de produção, a acumulação do capital e não a de atender as

necessidades humanas. Destarte, “não se trata estritamente de um problema que nasce

da lógica ou da cultura, mas das relações materiais de produção fundadas na exploração

do trabalho humano” (DANTAS, 2007).

A análise aqui apresentada se situa no materialismo histórico e dialético,

partindo, do fato que os problemas relacionados à sociedade e a natureza são

consequências da organização social em que os recursos naturais estão assentados à

categoria de mercadoria. E que estes problemas surgem das relações materiais sociais de

produção, fundadas na acumulação de capital.

Entendemos, por conseguinte, que o materialismo histórico e dialético permite

ultrapassar a imparcialidade dos discursos ideológicos contemporâneos e desvela

radicalmente que a organização social que se encontra instalada atualmente desenvolve-

se, em forma de crises, sobre uma dupla degradação, do homem e da natureza,

destruindo todas as possibilidades de uma relação equilibrada e consciente entre estes,

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pois a necessidade de expansão, produção, acumulação e reprodução contínua torna a

dinâmica do modo de produção capitalista, de certa forma, irracional, ainda que lógica

aos seus princípios. Portanto, consideramos qualquer análise que não estabeleça a

ligação da questão entre a sociedade e a natureza com a forma de organização das forças

produtivas que transforma tudo em mercadoria, na qual o pressuposto para o acesso aos

bens materiais e imateriais essenciais a vida humana é o dinheiro, e não a necessidade

será uma análise superficial e limitada, mistificará a mesma realidade, cairá no discurso

abstrato e idealista, e perpetuará a exploração da natureza pelo ser humano e do ser

humano pelo mesmo. A ideologia dominante lança mão de inúmeras teorias baseadas no

idealismo, para garantir que o desenvolvimento desigual, mantido pela divisão de

classes, seja considerada como um fenômeno inerente ao mundo dos homens.

Mészáros (2012) demonstra que quando a tríplice contradição do modo de

produção capitalista atinge determinadas proporções, o sistema, como um todo, é

inevitavelmente inserido em um período de intensa crise evidenciando a falha

sociometabólica.

Mas, este modo de produção encontra em sua dinâmica espacial e territorial

estratégias que, até o momento, impediram sua derrocada final, o que faz com que este

adquira uma espécie de sobrevida, pelo fato de que as reais contradições nunca são

atacadas, como escrevemos no capítulo 4, e este fato garante uma momentânea calmaria

até o momento de eclosão de uma nova crise.

[...] o capitalismo contemporâneo atingiu um estágio em que a disjunção

radical entre a produção genuína e autorreprodução do capital não é mais

uma remota possibilidade, mas uma realidade cruel com as mais devastadoras

implicações para o futuro. Ou seja, as barreiras para a reprodução capitalista

são, hoje, suplantadas pelo próprio capital de formas que asseguram

inevitavelmente sua propria reprodução – em extensão já grande e em

constante crescimento – como autorreprodução destrutiva, em oposição

antagônica à produção genuína. Nesse sentido, os limites do capital não

podem mais ser considerados como meros obstáculos materiais a um maior

aumento da produtividade e da riqueza sociais, enfim como uma trava ao

desenvolvimento, mas como um desafio direto a sobrevivência da própria

humanidade. Em outro sentido, os limites do capital podem se voltar contra

ele, como mecanismo controlador todo-poderoso do sociometabolismo, não

quando seus interesses vierem a colidir com o interesse social geral de

aumentaras forças da produção genuína – o primeiro impacto de tal colisão

pôde ser sentido, de fato, há muito tempo –, mas somente quando o capital

não for mais capaz de assegurar, por quaisquer meios, as condições de sua

autorreprodução destrutiva, causando assim o colapso do sociometabolismo

global (MÉSZÁROS, 2012, p. 699).

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A crise na qual o modo de produção capitalista está inserido apresenta-se em

uma escala extensiva e permanente e suas consequencias já não se apresentam como

aquelas da década de 1970. Na atualidade, possui disfunções e complicações presentes e

inerentes ao próprio funcionamento das relações sociais de produção, deste modo,

buscar alternativas como o desenvolvimento sustentável seria o mesmo que

desconsiderar a existência sistemica, cíclica e tendencionalmente propícia a crises deste

modo de produção, pois, o que estamos evidenciando, é qua a falha metabólica na

relação entre a sociedade e a natureza, ou falha sociometabólica, para utilizar o termo

proposto por Mészáros, é obra do próprio sistema em crise.

Portanto, quando escrevemos na parte I sobre o território norma, ou a

normatização do território, por meio de recomendações do Grupo BM, desde a

descentralização até a inserção das perspectivas territorial e sustentável, demonstramos

que é somente nesta perspectiva que se pode falar, ou escrever sobre o desenvolvimento

sustentável, pois ele também foi normatizado e lançado sobre determinada base

fisicamente delimitada como a solução para a falha metabólica, quando, na verdade, se

entedermos, e é esta nossa proposta, o território a partir das relações de poder e da

conflitualidade na perspectiva de Geografia crítica, o território não admite o

desenvolvimento sustentável pelas suas características intrinsecas de formação, por mais

que o mesmo receba a influência do modo de produção capitalista em seu contorno, a

conflitualidade sempre está presente.

6.2. Um conceito conveniente, para a reprodução do modo de produção capitalista

Consideramos que o debate e à grande produção teórica sobre o

desenvolvimento sustentável não se encontra no campo marxista e este fato o desloca da

base material no qual foi produzido, o modo de produção capitalista, e isto o torna um

conceito idealizado e a-histórico.

Uma questão inicial a assinalar é a disputa entorno do termo desenvolvimento

que, como já escrevemos, consideramos infrutífera. Em relação ao desenvolvimento

sustentável, Loureiro (2012) examina de forma crítica esta adjetivação conceitual

explicitando a contradição entre dois conceitos que não são complementares,

desenvolvimento e sustentabilidade. Loureiro (2012) aponta que a promessa integradora

de desenvolvimento, na medida em que se baseia na perspectiva de um crescente

industrialismo voltado para o consumo, tendo como modelo, o modo de produção

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capitalista urbanoindustrial, intensivo em uso de energia e matérias primas, não pode ser

expansível para toda a humanidade, sob pena do rápido esgotamento das fontes de

energia e recursos materiais. Nessa medida, fica evidente a insustentabilidade de uma

sociedade marcada pela desigualdade social e que não considera a capacidade

generativa de recursos naturais, em termos temporais. Nessa mesma direção, Mézáros

(2007) busca desqualificar o caráter humanitário do conceito desenvolvimento

sustentável e demonstrar sua importância econômica quando escreveu:

Sustentabilidade significa estar realmente no controle dos processos sociais,

econômicos e culturais vitais, pelos quais os seres humanos não apenas

sobrevivem, mas também encontram realização, de acordo com os desígnios

que estabeleceram para si mesmos, ao invés de ficarem à mercê de forças

naturais imprevisíveis e determinações socioeconômicas quase naturais

(MÉSZÁROS, 2007, p.190).

Mészáros (2007) reitera suas preocupações quanto às bases materiais e sociais

em que se assenta o atual modelo socioetário ao escrever:

Mas a maneira significativamente economizadora de regular nosso processo

de reprodução sociometabólica, com base no controle interno/autodirigido,

como oposto ao controle externo/de cima para baixo, que prevaleceu hoje, é

radicalmente incompatível com a desigualdade e a

conflitualidade/adversidade estruturais (MÉSZÁROS, 2007, p.191).

O que procuramos expressar até aqui é o contexto de crise em que incentivos

governamentais fomentados pelo Grupo BM se realizam ao considerar o compromisso

social de que se revestem, no sentido de problematizar as relações que temos

estabelecido historicamente com a natureza. Ainda que o modelo desenvolvimentista

apregoado pela ONU e defendida por suas organizações de fomento internacional não

represente a materialidade de um modelo de desenvolvimento, o desenvolvimento

sustentável está presente no cotidiano na forma de ações locais, portanto, negar sua

existência seria também uma visão idealizada, no sentido de nos preocuparmos em

encontrar na realidade aquilo que pretendemos.

Portanto consideramos que o desenvolvimento sustentável seja aceito como

conceito a partir da perspectiva marxista e este procedimento demanda um esforço

teórico no sentido de relacioná-lo com a historicidade e geograficidade do modo de

produção capitalista na perspectiva de não o desvincularmos das relações sociais de

produção.

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Como já evidenciamos, o uso do desenvolvimento sustentável como conceito

tornou-se prática tanto pela esquerda quanto direita política e também na academia.

Deste reconhecimento fomos levados a questionar a ambiguidade em torno do

desenvolvimento sustentável considerando o fato que, tem se tornado regra sob a

primazia ideológica do modo de produção capitalista compreendê-lo desarticulado do

processo histórico de formação das relações sociais de produção e, entendemos que

esta análise desarticulada, a-histórica, como escreveu Rebelo Junior (2002) remete a

alienação. Sobre a relação entre a alienação e o modo de produção capitalista, Konder

(2009) escreveu:

Por isso, ao encararem o movimento da história de fora dela, ao assumirem

uma postura contemplativa a partir da qual o movimento histórico concreto

lhes aparecia como algo exterior, os intelectuais especializados começaram a

se servir, em proporção cada vez mais elevada, de conceitos e critérios cada

vez mais desprovidos de conteúdo histórico e, por conseguinte, de caráter

concreto. Criaram esquemas teóricos de cuidadosa elaboração lógica e

procuraram enquadrar a fluidez da realidade dentro da fixidez destes

esquemas. Sempre com esta ambição de enquadrar a realidade dentro de

esquemas a-históricos, foi-se desenvolvendo a maneira metafísica de pensar

(KONDER, 2009, p. 121, itálicos no original).

Especificamente em relação ao desenvolvimento sustentável, Rebêlo Junior

(2002) chama atenção para o subtítulo do relatório Os Limites do Crescimento (Um

relatório para o projeto do Clube de Roma sobre os dilemas da humanidade)135

(MEADOWS, et al, 1973) e escreveu que: “Nesse texto, não existe capitalismo”

(REBÊLO JUNIOR, 2002, p. 33). Essa observação, ainda segundo o autor citado,

continua se repetindo em documentos da ONU sobre o desenvolvimento sustentável e

assevera:

O que estamos querendo dizer é que, ao não situar a busca do

desenvolvimento sustentável dentro da lógica do próprio capitalismo, a ideia

perde as referências e surge e se difunde de forma a-histórica, onde não

existem agentes sociais nem relações humanas, e sim, produtores e

consumidores [...] (REBÊLO JUNIOR, 2002, p. 36).

Forma-se, desse modo, uma concepção teórica a-histórica vazia de conteúdo e

extremamente genérica que, a princípio, beneficia a todos e valoriza o futuro subjetivo

prejudicando a compreensão das conexões e relações existentes entre o modo de

135

Lembrando que, conforme escrevemos, o Clube de Roma é considerado um Think Tank articulado por

intelectuais especializados, conforme Konder (2009) capaz de articular informações e práticas discursivas

ideológicas em torno daquilo que Giddens (2009) define como sistemas peritos.

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produção capitalista e suas assimetrias pela capacidade de alienação constante no

discurso ideológico do desenvolvimento sustentável.

Neste sentido, a partir da incorporação do desenvolvimento sustentável em

suas recomendações, o Grupo BM, por exemplo, o utiliza como forma de adaptar a

reprodução do modo de produção capitalista a novas tendências. Ao considerar o

desenvolvimento sustentável como constructo do próprio modo de produção capitalista,

expresso no processo de mercantilização da natureza e edificado sob a valorização dos

recursos naturais. Assim reconhecemos, como também o fez Ponte (2014), que existe

uma nítida relação entre o desenvolvimento sustentável e o próprio desenvolvimento

histórico deste modo de produção.

Expusemos esta aproximação na parte I desta pesquisa tendo como referência a

década do alarde, 1970, e consideramos que questões que envolvem recursos naturais

vêm sendo oficialmente planejadas desde aquele período e este processo revela, de

acordo com Rebêlo Junior (2002), a projeção de escolas formulativas e operativas em

torno de uma mesma questão, controle territorial sobre recursos naturais, daí a

conveniência do desenvolvimento sustentável, aliado à perspectiva territorial.

A primeira escola, que estamos chamando de formulativa, aparece de forma

clara nos anos 70. Via Clube de Roma e agências internacionais da ONU,

lança a questão para o debate oficial, mas ao mesmo tempo, começa a

formular os parâmetros onde a mesma deve se situar. [...] Essa escola,

formula os conceitos, promove sua discussão e possui os meios para

implementá-los, por meio de agências internacionais. [...] A outra escola,

operativa, bem mais ampla, abrangendo correntes de vários matizes, na

verdade faz um só papel. [...] As escolas operativas são as que mais

aparecem, via difusão de suas ideias por meio de livros, folhetos, revistas,

ensino nos mais diferentes graus e outros meios de massificação da

informação [...]. Na verdade, esta última é muito mais perigosa do que a

primeira, principalmente pelo aspecto de aparente neutralidade. Ou seja, ela

vai conquistando “corações e mentes”, via uma grande causa comum: a

salvação do planeta [...]. (REBÊLO JUNIOR, 2002, p. 2, aspas no original).

Para podermos escrever sobre os interesses estratégicos e convenientes desse

conceito consideramos necessário esclarecer, primeiro, quem foram os principais

agentes atuantes no Think Tank responsável pela formulação do desenvolvimento

sustentável para que nossas considerações não sejam baseadas apenas em indagações.

O secretário geral das conferências da ONU de 1972 e 1992 – Maurice Strong

– foi consultor da Rockefeller Foundation e possuía participação rentável na exploração

de petróleo, promovida pela Petro Canadá, dentre outras inúmeras atribuições tanto no

governo canadense como estadunidense, além de ocupar cargos privilegias na OCDE e

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também no Grupo BM (ASSMANN, 1986), “Maurice Strong, the Mr. Maggo –

Canadian oilman” (BAILEY, 1992, p. 47). Maurice Strong foi a pessoa responsável por

introduzir a temática referente aos recursos naturais no debate econômico e político

internacional (LEPRESTE, 2000) vindo a se tornar o primeiro diretor do PNUMA.

Estes fatos indicam certa intencionalidade em torno da proteção de recursos

naturais, pois, apesar dos alardes enunciados pela ONU e suas agências especializadas

devemos ter em mente que, por trás destes existentes pessoas, e estas estão sempre

carregadas de intenções. É neste contexto que entendemos o Clube de Roma e o papel

representado pela ONU desde as primeiras preocupações com a questão em debate e,

suas intenções se tornam claras se considerarmos que:

[...] o fundador do Clube de Roma, Aurelio Peccei, industrial italiano, era o

então presidente do Comitê Econômico do Instituto Atlântico da OTAN. Seu

co-fundador, Alexander King, era alto funcionário da OCDE. As discussões

iniciais para a fundação do mesmo (entre a OTAN e a OCDE, no seio da

OCDE), contaram com o apoio financeiro da Fundação Ford (metade), Royal

Dutch Shell (parte substancial), Fundação Rockfeller e outras empresas

industriais (REBÊLO JUNIOR, 2002, p. 144).

Como também escreveu Porto-Gonçalves (2008):

Grandes corporações (IBM, Remington-Rand, Fiat, Xérox, Olivetti entre

outras) à época chegaram a patrocinar um importante relatório, “Os Limites

do Crescimento”, também conhecido como Relatório Meadows do M.I.T. -

Massachusstes Institute of Technology - onde, pela primeira vez, se fala

abertamente dos limites dos recursos naturais para o crescimento econômico

(PORTO-GONÇALVES, 2008, p. 329).

Buscar grandes empresas multinacionais e agências internacionais e

transformá-las em defensores dos recursos naturais, em prol da humanidade, sem levar

em consideração que muitas delas possuem longo histórico de apropriação e espoliação

de recursos humanos e naturais, têm sido uma conveniente e constante prática. Aqui se

explica a conveniência. Grupos privados como a Dow Química, Coca Cola, Shell,

Exxon, Nestlé, Unilever e tantas outras, de caráter público, como o Grupo BM, atuam

como financiadores de eventos da ONU ou como parceiros em projetos de agências

especializadas (MAUREL, 2014).

O que importa nesse ponto é destacar a influência da ONU e do Grupo BM

que, atendendo e atento a exigências de mercado, na reestruturação da geografia dos

fluxos e fixos econômicos que comportam a mobilidade e centralidade de capital,

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alteram configurações territoriais ao submeter governos a suas recomendações, por

exemplo, atribuindo prerrogativas a concessão de financiamentos. Isto por que

consideramos que os basilares instrumentos econômicos e políticos de regulação

internacional encontram-se nas mãos de organismos internacionais de financiamento

relacionados à ONU e o Grupo BM, ou seja, nas mãos do capital financeiro

internacional comandado pela maldita trindade (PEET, 2011), destes, podemos entender

o papel do Grupo BM no financiamento de projetos voltados ao desenvolvimento

territorial rural sustentável, como o PEMH e a expansão do setor sucroenergético.

Estamos diante, pois, de um momento onde o modo de produção capitalista

apresenta seu caráter de mutabilidade de tal forma que muitos deixam passar

despercebido que a própria criação do desenvolvimento sustentável visa o

aprofundamento da mercantilização de recursos naturais em diversos – e por diversos –

setores industriais, pois faz parte da lógica do capitalismo transformar em mercadoria

tudo aquilo que está ao seu alcance e, sobretudo, aquilo que fornece sua capacidade de

reprodução e circulação, por tanto, energia. Mas, por que ocorre essa mercantilização e,

como? Para respondermos a estas questões, sem a pretensão de encerrarmos o debate,

recorremos ao marxismo reconhecendo que este exerceu influência significativa no

pensamento geográfico. É dentro desse contexto que reconhecemos a incorporação do

pensamento marxista na Geografia relacionando ao tema desta pesquisa –

desenvolvimento sustentável –, neste sentido, Smith (1988) escreveu que:

Debaixo da ordenação do processo de acumulação, o capitalismo, como um

modelo de produção deve-se expandir continuamente para sobreviver. [...]

Para este fim, o capital se volta para a superfície do solo em busca de

recursos naturais; a natureza torna-se um meio universal de produção, de

modo que ela não somente provê o sujeito, o objeto e os instrumentos de

produção, mas ela é em sua totalidade um acessório para o processo de

produção (SMITH, 1988, p. 88).

Ainda nesta perspectiva, Ponte (2014) confirma, com base em Smith (1988),

que o conceito de natureza – sem a pretensão de debater o mesmo, apenas fazendo um

link para melhor demonstrarmos a questão, representa “[...] um produto social com

intenção política, por representar a experiência prática de cada classe social em

determinado momento histórico” (PONTE, 2014, p. 183), nas palavras de Smith (1988).

O conceito de natureza é um produto social e nós vimos que, em conexão

com o tratamento da natureza na frente pioneira americana, esse conceito

tinha uma clara função social e política. A hostilidade da natureza exterior

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justificava sua dominação e a moralidade espiritual da natureza universal

fornecia um modelo para o comportamento social. Isso é o que queremos

dizer com "ideologia" da natureza. Eu considero a ideologia como sendo uma

reflexão "invertida, truncada e distorcida da realidade". A ideologia não é

simplesmente um conjunto de ideias erradas, mas sim um conjunto de ideias

radicadas na experiência prática, embora seja a experiência prática de uma

dada classe social que vê a realidade através da sua própria perspectiva e,

ainda assim, de forma parcial. Embora seja, dessa forma, uma reflexão

parcial da realidade, a classe tenta universalizar sua própria percepção do

mundo (SMITH, 1988, p. 45).

E, é neste mesmo pensamento que escrevemos sobre a mercantilização do

desenvolvimento sustentável e a utilização do discurso protecionista para a expansão

do modo de produção capitalista, lembrando o escrito no item anterior com base no

conceito de renda da terra e da teoria do valor de Karl Marx. Dentro dessas

circunstâncias de racionalidade instrumental capitalista, consideramos o controle sobre

recursos naturais elemento basilar: “Não basta, pois, produzir. É indispensável pôr a

produção em movimento. Em realidade, não é mais a produção que preside à circulação,

mas é esta que conforma a produção” (SANTOS, 2009, p. 275).

Portanto, em relação ao por que do questionamento anterior, é necessário

compreender as propriedades de mercadoria existentes nos recursos naturais. Para

Marx (2013), a mercadoria é “[...] antes de tudo, um objeto externo que, por meio de

suas propriedades, satisfaz necessidades humanas de um tipo qualquer” (MARX, 2013,

p. 113) e “Toda coisa útil deve ser considerada sob um duplo ponto de vista: o da

qualidade e da quantidade” (MARX, 2013, p. 113). Isso permite considerar que toda

mercadoria possui pelo menos duas dimensões, externa e interna. A dimensão externa

seria aquela como a mercadoria se apresenta no mundo de maneira concreta

(quantidade) tendo em vista atender as necessidades humanas, ao que ele chamou de

valor de uso (BAUER, 2013).

A utilidade de uma coisa faz dela um valor de uso. Mas essa utilidade não

flutua no ar. Condicionada pelas propriedades do corpo da mercadoria

[Warenköper], ela não existe sem esse corpo. Por isso, o próprio corpo da

mercadoria, como ferro, trigo, diamante etc., é um valor de uso ou bem. Esse

seu caráter não depende do fato de a apropriação de suas qualidades úteis

custar muito ou pouco trabalho aos homens. Na consideração do valor de uso

será sempre pressuposta sua determinidade [Bestimmtheit] quantitativa

(MARX, 2013, p. 114).

Por sua vez, a dimensão interna seria a que torna todas as mercadorias

equivalentes (qualidade) e que Marx chamou de valor de troca (MARX, 2013). Para que

as mercadorias possam ser trocadas entre si, é necessário encontrar algo em comum

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entre elas e reduzir todas elas a esse elemento, o valor. Algo que não está expresso

diretamente, mas contido nela e, para Marx (2013) é o tempo de trabalho socialmente

necessário para produzir um valor de uso qualquer em condições dadas de produção

socialmente normais e com grau social médio de habilidade e intensidade do trabalho.

As mercadorias vêm ao mundo na forma de valores de uso ou corpos de

mercadorias, como ferro, linho, trigo etc. Essa é a sua forma natural

originária Porém, elas só são mercadorias por que são algo duplo: objetos

úteis e, ao mesmo tempo suportes de valor. Por isso, elas só aparecem como

mercadoria ou só possuem a forma de mercadorias na medida em que

possuem dupla forma: a forma natural e a forma de valor (MARX, 2013, p.

124).

Assim, empresas do setor sucroenergético, por exemplo, investem no comércio

de créditos de carbono, negociado nas bolsas de valores, em nome do desenvolvimento

sustentável permitindo, deste modo, o acréscimo de mais valor a determinada

mercadoria, ou seja, o desenvolvimento sustentável é a mola propulsora da maior

mercantilização de recursos naturais. Esse processo de intensificação da

mercantilização da natureza via desenvolvimento sustentável gera uma aceleração pela

apropriação, transformação, organização e distribuição dos fatores de produção –

recursos naturais. Isso, porque o capitalista ao investir seu dinheiro inicial deseja um

retorno acrescido de valor (D’). Esta é a fórmula geral que, de acordo com Marx (2013),

permite transformar dinheiro em capital:

D – M – D’

Todavia, a dinâmica acumulativa no modo de produção capitalista não implica

apenas a produção de mercadorias e valor de troca. A realização dos fenômenos sociais

personifica-se sob os alicerces do meio técnico-científico-informacional no qual a

ciência, a tecnologia e a informação se constituíram nas mais marcantes forças

produtivas (MOREIRA, 2007) de modo que o ser humano passou a ter o poder de

induzir os progressos técnicos e imprimir intensa velocidade estabelecendo poder de

interferência na natureza. Portanto, o como, nossa segunda proposição, se apresenta

pela necessidade de circulação do capital produtivo que, como salienta Marx (2014),

representa um estágio do processo total do modo de produção capitalista, o qual se

revela como unidade de circulação (MARX, 2014).

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Sob o capitalismo, consideramos que as ações para a personificação do

capital devem ser entendidas sob este aspecto, a interação entre os fixos e fluxos que

permitem a circulação, e não restritas somente a produção e consumo. Marx (2014) é

enfático sobre a importância da circulação. O mais valor só se realiza quando a forma

dinheiro é reincorporada pelo capital. Isso é condição para um novo ciclo, fato que

subjaz à assertiva de que, no processo acumulativo, “[...] a circulação não é menos

necessária do que a própria produção” (MARX, 2014, p. 206). E isso é tanto mais

verdade quanto mais distantes entre si se mostram as conversões D — M. Considerando

a dinâmica e as exigências do capital, referindo-se ao comércio e a circulação, Marx

(2011) escreveu que o comércio: “[...] não aparece mais aqui como uma função

operando entre as produções autônomas para a troca do seu excedente, mas como

pressuposto e momento essencialmente universais da própria produção” (MARX, 2011,

p. 332). Portanto, a criação de condições físicas fixas, é condição de manutenção da

fluidez da dinâmica acumulativa. Essa não prescinde do crescimento da demanda

efetiva e o alcance de mercados distantes e os transportes são instrumentos estratégicos

do modo de produção capitalista. Assinale-se que, como suportes da circulação, estes

meios influenciam a produção das estruturas espaciais e territoriais, deste, consideramos

a importância com que Correa (2006) situa as práticas espaciais em escala e abrangência

crescentes no vértice das relações entre a teoria da acumulação e a produção de

estruturas espaciais ou da organização territorial.

Karl Marx, no livro II (MARX, 2014), dedica-se a fluidez de capital. Daí o

relevo liminarmente conferido às metamorfoses nos diferentes estágios que integram o

circuito que descrevemos a partir da fórmula geral do ciclo produtivo do capital

elaborada por Marx (2014):

P... M – D' – M'... P

Onde lemos, (P...) significa produção e interrupção do movimento capital

dinheiro, (M – D’ – M’) significa consumo e retomada do movimento do capital

dinheiro possibilitando nova produção (...P) e, nesse aspecto, os recursos naturais

possuem contribuição fundamental no processo produtivo, ou seja, a retomada do

movimento do capital dinheiro tem que ser acelerada para garantir constantemente a

recuperação de mais valia, a transformação de M – M’.

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Este atributo – necessidade de circulação – alça os recursos naturais ao ápice

dos elementos indispensáveis ao funcionamento do modo de produção capitalista. Daí a

necessidade de demonstrarmos sua formulação. Mas sua importância vai além, pois

integram igualmente o que Marx (2014) denomina capital constante circulante,

referindo ao valor de “[...] materiais de produção tais como matérias-primas [...].”

(MARX, 2014, p. 499). Os recursos naturais são “[...] matérias auxiliares, que ou são

consumidos pelos próprios meios de trabalho durante seu funcionamento, tal como o

carvão pela máquina a vapor, ou apenas auxiliam no processo, como o gás de

iluminação etc. [...].” (MARX, 2014, p. 241), ou seja, energia necessária à produção.

Portanto, consideramos que quando os agentes personificadores do modo de

produção capitalista se referem a recursos naturais entendem estes como elementos

indispensáveis para produção, circulação, acumulação e reprodução de capitais, e é

nessa perspectiva que entendemos a constante imposição normativa do

desenvolvimento sustentável. Lembrando que, as primeiras conferências internacionais

relacionadas à preservação de recursos naturais datam da década de 1970. Período em

que o petróleo, então a maior fonte de energia para a indústria capitalista, teve seu valor

aumentado pela OPEP, o que, consideramos despertou a atenção sobre outras formas de

obtenção de energia.

A partir destes reconhecimentos e entendendo a mercantilização em torno do

desenvolvimento sustentável e visando compreende-lo como conceito, faz-se necessário

retomar a discussão inicial sobre conceito e entender o que é um conceito. Esta

necessidade surge da constatação que muitas pesquisas, mesmo abordando a teoria

marxista136

, fazem referência, ainda que de forma crítica, ao desenvolvimento

sustentável como conceito e consideramos que este fato se relaciona a diversidade de

usos dado ao mesmo, o que remete a possibilidade do uso por mais distintos

seguimentos sem qualificar a quem serve este modelo de desenvolvimento.

Para realizarmos esta análise foi necessário atenção ao tratamento teórico desta

pesquisa para não gerarmos incoerência teórico-metodológica, o que incorreria em

interpretações inconsistentes da realidade e a criação de uma própria armadilha teórico-

conceitual. Para Bernardes (2011) “[...] conceito indica algum objeto real pela

determinação de alguns dos seus aspectos.” (BERNARDES, 2011, p. 166, itálicos

nossos). Deste, podemos escrever que conceito indica a determinação de certo aspecto

136

Neste sentido, ver: Rebêlo Junior (2002), Oliveira (2011) e Fonseca (2012), por exemplo.

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singular do real, ao qual, nesta pesquisa, atribuímos valores a partir das categorias

essência e aparência.

De acordo com Hardy-Vallée (2013) um conceito difere de ideia, sendo que

esta pertence à linguagem comum. Neste sentido, conceito é um termo técnico, para

Hardy-Vallée “[...] um conceito representa uma categoria de objetos, de eventos ou de

situações e pode ser expresso por uma ou mais de uma palavra” (HARDY-VALLÉE,

2013, p. 16). Ainda segundo o autor, a forma de representação do mesmo pode ser

mental, linguística e pública, considerando que “[...] o conceito é a unidade primeira do

pensamento e do conhecimento: só pensamos e conhecemos na medida em que

manipulamos conceitos” (HARDY-VALLÉE, 2013, p. 21). É nesta concepção que

trabalhamos com a palavra conceito.

O que realmente nos importa para entendermos o desenvolvimento sustentável

como conceito é o que Abbagnano (2007) escreveu sobre o que pode ser um conceito:

[...] todo processo que torne possível a descrição, a classificação e a previsão

dos objetos cognoscíveis. Assim entendido, esse termo tem significado

generalíssimo e pode incluir qualquer espécie de sinal ou procedimento

semântico, seja qual for o objeto a que se refere, abstrato ou concreto,

próximo ou distante, universal ou individual, etc. [...] Embora o Conceito seja

normalmente indicado por um nome não é o nome, já que diferentes nomes

podem exprimir o mesmo Conceito ou diferentes conceitos podem ser

indicados, por equívoco, pelo mesmo nome. O Conceito, além disso, não é

um elemento simples ou indivisível, mas pode ser constituído por um

conjunto de técnicas simbólicas extremamente complexas, como é o caso das

teorias científicas que também podem ser chamadas de Conceito (o Conceito

da relatividade, o Conceito de evolução, etc.). O Conceito tampouco se refere

necessariamente a coisas ou fatos reais, já que pode haver Conceito de coisas

inexistentes ou passadas, cuja existência não é verificável nem tem um

sentido específico. Enfim, o alegado caráter de universalidade subjetiva ou

validade intersubjetiva do Conceito na realidade é simplesmente a sua

comunicabilidade de signo linguístico: a função primeira e fundamental do

Conceito é a mesma da linguagem, isto é, a comunicação. (ABBAGNANO,

2007, p. 164, itálicos no original).

Indo ao encontro do escreveu Bernardes (2011), Hardy-Vallée (2013) e

Abbagnano (2007), encontramos em Deleuze e Guattari (1997) a afirmação de que todo

conceito remete a determinado fato material, e o desenvolvimento sustentável apresenta

determinada materialidade a nível local de acordo com os fins e propósitos para o qual

foi criado: “Os conceitos não nos esperam inteiramente feitos, como corpos celestes.

Não ha céu para os conceitos. Eles devem ser inventados, fabricados, ou antes, criados,

e não seriam nada sem a assinatura daqueles que os criam”. (DELEUZE; GUATARI,

1997, p. 12), como demonstramos por meio dos processos de territorialização do modo

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de produção capitalista – expansão do setor sucroenergético – e normatização do

território – PEMH. Por mais estranho que isto possa soar, no contexto de nossa

pesquisa, essa é a materialidade do desenvolvimento sustentável.

Ora, apesar de datados, assinados e batizados, os conceitos tem sua maneira

de não morrer, e, todavia, são submetidos à exigências de renovação, de

substituição, de mutação, que dão a filosofia uma história e também uma

geografia agitadas, das quais cada momento, cada lugar, se conservam, mas

no tempo, e passam, mas fora do tempo (DELEUZE; GUATARI, p. 16,

itálicos nossos).

Estes elementos destacados nos permitem afirmar a condição de conceito ao

desenvolvimento sustentável. O desenvolvimento sustentável está presente enquanto

ação, fato e, principalmente, forma de comunicação daqueles que ideologicamente

assumem a postura de defendê-lo frente aos momentos de mutabilidade que o modo de

produção capitalista necessita para escapar a períodos de crises.

Portanto, o conceito – desenvolvimento sustentável – possui em si

generalidades e especificidades à medida que abarca maior número de pessoas e passou

a existir por si só, a ter significado próprio, o que, aparentemente desqualificou o debate

sobre o mesmo. A partir do momento em que o desenvolvimento sustentável adquiriu

seu próprio significado se tornou um conceito em si, fechando-se em si mesmo e

perdendo as características daquilo que corresponderia – o sentido humanitário –,

passando a ter significação própria e sendo utilizado de forma comum. O

desenvolvimento sustentável perdeu em si mesmo seu aspecto material e se tornou

puramente formal. Isto é, possui implícito em seu conteúdo generalidades que dizem

respeito aos objetos da classe que seu conteúdo representa. Desta forma, quando se diz

desenvolvimento sustentável, este, enquanto conceito implica em si todas as

características gerais do desenvolvimento enquanto ente real e também as suas

possibilidades.

Desta forma, quando se diz que determinado modelo de desenvolvimento é

sustentável, se está levando em conta que este possua atributos que o identificam como

tal, possui características que permitem o identificar como sustentável. É feito, assim,

um recorte no objeto desejado a se conceituar desenvolvimento destacando somente o

que interessa – o adjetivo sustentável.

Como ressaltado, os conceitos possuem um conteúdo que se, de certa forma,

fundamentam no real ou se adéquam a realidade (ABBAGNANO, 2007). Assim, ao

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escrever de forma genérica sobre desenvolvimento sustentável um pesquisador pode ter

como conceito do mesmo somente o modelo de desenvolvimento vigente; entretanto,

quando do conhecimento de que existiram e podem existir outros modelos de

desenvolvimento haverá, portanto, uma ampliação do conceito. Ao se aumentar a

extensão do conceito, se diminui a sua compreensão, pois o conceito perde em

significado, no sentido de seu significado original, daí a banalização do

desenvolvimento sustentável.

Portanto, temos que, o desenvolvimento sustentável revela sua aparência na

materialidade de distintas formas, porém, mascara sua essência. Isto, entendemos a

partir do raciocínio sobre a crítica de Marx e Engels (2012) a Feuerbach onde estes

escreveram que:

[...] na realidade, e para o materialista prático, isto é, para o comunista, trata-

se de revolucionar o mundo, de enfrentar e de transformar praticamente o

estado de coisas por ele encontrado. Se, em certos momentos, encontram-se

em Feuerbach pontos de vista desse tipo, eles não vão além de intuições

isoladas e têm sobre sua intuição geral muito pouca influência para que se

possa considerá-los como algo mais do que embriões capazes de

desenvolvimento. A “concepção” feuerbachiana do mundo sensível limita-se,

por um lado, à mera contemplação deste último e, por outro lado, à mera

sensação; ele diz “o homem” em vez de os “homens históricos reais”. “O

homem” é, na realidade, “o alemão”. No primeiro caso, na contemplação do

mundo sensível, ele se choca necessariamente com coisas que contradizem

sua consciência e seu sentimento, que perturbam a harmonia, por ele

pressuposta, de todas as partes do mundo sensível e, sobretudo do homem

com a natureza. Para remover essas coisas, ele tem, portanto, que buscar

refúgio numa dupla contemplação: uma contemplação profana, que capta

somente o que é “palpável”, e uma contemplação mais elevada, filosófica que

capta a “verdadeira essência” das coisas. Ele não vê como o mundo sensível

que o rodeia não é uma coisa dada imediatamente por toda a eternidade e

sempre igual a si mesma, mas o produto da indústria e do estado de coisas da

sociedade, e isso precisamente no sentido de que é um produto histórico, o

resultado da atividade de toda uma série de gerações, que, cada uma delas

sobre os ombros da precedente, desenvolveram sua indústria e seu comércio e

modificaram sua ordem social de acordo com as necessidades alteradas

(MARX; ENGELS, 2012, p. 30, aspas no original).

Da interpretação desta passagem temos que o desenvolvimento sustentável traz

a sua aparência como ampliação de desenvolvimento em concepções humanísticas, em

uma contemplação romântica da natureza e, por outro lado, oculta sua essência que,

como estamos demonstrando, é a reprodução do modo de produção capitalista.

Portanto, em sua essência, o desenvolvimento sustentável não possui a capacidade de

transformação, é tão contraditório como o próprio modo de produção capitalista.

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Isto nos permite, de acordo com o método aqui delimitado e buscando a

coerência teórico-metodológica necessária, com Lenin (2011), identificar dialeticamente

o caráter ideológico negativo de captar e comunicar a aparência e subjulgar a essência

do desenvolvimento sustentável, pois, de acordo com Lenin (2011).

Nem a pura negação, nem a negação vazia, nem a negação cética, nem a

hesitação, nem a dúvida são características e essenciais na dialética - a qual,

bem entendido, contém em si um elemento de negação e até mesmo como o

elemento mais importante -, mas a negação como momento da conexão,

momento do desenvolvimento; que mantém o positivo, isto é, sem qualquer

hesitação, sem ecletismo (LENIN, 2011, p. 188).

Empenhando-nos em ir além das aparências superficiais e suas contradições –

o que exige a compreensão da materialidade da realidade que não se manifesta de

maneira imediata na aparência, dos fatos ou das coisas – torna-se necessário utilizar o

método proposto para apreender a essência sobre o que se observa partindo de fatos

empíricos, entendidos como as aparências dadas pela realidade para, então, superá-las e

chegar à essência. O ponto de chegada, portanto, não mais serão as representações do

empírico ponto de partida, mas, do concreto pensado no sentido em que escreveu Marx

(2011):

O concreto é concreto porque é a síntese de múltiplas determinações,

portanto, unidade da diversidade. Por essa razão, o concreto aparece no

pensamento como processo da síntese, como resultado, não como ponto de

partida, não obstante seja o ponto de partida efetivo e, em consequência,

também o ponto de partida da intuição e da representação. Na primeira via, a

representação plena foi volatilizada em uma determinação abstrata; na

segunda, as determinações abstratas levam à reprodução do concreto por

meio do pensamento (MARX, 2011, p. 1285).

Esta perspectiva de pensamento, de atribuir importância à essência do

desenvolvimento sustentável pode contribuir para que geógrafos desvendem a realidade

removendo as ideologias que nos impedem de ver as essências e ir além das aparências

arquitetadas no modo de produção capitalista, como também explica Moreira (2007).

Neste sentido, Horkheimer (1986) colabora com a opção tomada nesta pesquisa sobre a

concepção de ideologia quando escreveu que: “A ideologia – aqui entendida como ente

imaginário unificado – tornou-se ela mesma um recurso de poder e controle do capital

[...] isso porque ela intervém implicitamente em todos os juízos filosóficos da sociedade

humana” (HORKHEIMER 1986, p. 14).

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Assim advém o poder de persuasão, conformando tanto o pensamento como o

sentimento dos indivíduos. Por isso, a ideologia pode ser considerada como parte do

processo que envolve, pela alienação, os limites das racionalidades instituídas.

Justamente, a teoria crítica procura examinar as ideologias para tentar compreender de

que forma as racionalidades podem aprisioná-lo ao invés de emancipá-lo.

Conforme Thompson (2011), na teoria social e política há vários conceitos de

ideologia que podem ser agrupados em duas categorias gerais: “[...] concepções neutras

de ideologia” e “[...] concepções críticas de ideologia” (THOMPSON, 2011, p. 72). A

concepção neutra retira qualquer sentido negativo do termo ideologia, e significa

sistemas de pensamento (de crenças e sistemas simbólicos) pertencentes às ações sociais

e políticas. Nessa perspectiva, a ideologia pode estar tanto nas tentativas de manutenção

como nas de subversão da ordem social; é utilizada por dominantes ou dominados sem,

necessariamente, expressar revolução, restauração ou reforma de determinado sistema

econômico e político. As acepções críticas de ideologia assemelham-se por

considerarem que os acontecimentos denominados ideológicos são ilusórios.

Tal esquema indica que as concepções de ideologia desenvolvidas por

Destutt de Tracy, Lenin, Lukacs e Mannheim (na sua formulação geral da

concepção total) compartilham, entre si, uma característica importante, apesar

das muitas diferenças que separam esses pensadores. Todas essas concepções

de ideologia são concepções neutras, no sentido de que elas não possuem,

necessariamente, um sentido negativo, pejorativo, e não implicam,

necessariamente, que ideologia é um fenômeno que deve ser combatido e, se

possivel, eliminado. Em contraste a isso, as concepções de ideologia

oferecidas por Napoleão, Marx e Mannheim (a concepção que eu descrevi

como a concepção restrita de Mannheim) são todas concepções críticas.

Todas elas possuem um sentido negativo e supõem que os fenômenos

caracterizados como ideologia são suscetíveis de critica (THOMPSON, 2011,

p. 73).

Thompson (2011) filia-se a concepção crítica de ideologia, para o autor:

[...] o conceito de ideologia pode ser usado para se referir às maneiras como o

sentido (significado) serve, em circunstâncias particulares, para estabelecer e

sustentar relações de poder que são sistematicamente assimétricas – que eu

chamarei de “relações de dominação”. Ideologia, falando de uma maneira

mais ampla, é sentido a serviço do poder. (THOMPSON, 2011, p. 16, aspas e

itálico no original).

Do nosso posicionamento inicial, entendendo ideologia como forma de

obscurecimento da realidade, especificamente em relação ao desenvolvimento

sustentável que se subverte em forma de dominação por meio da reprodução do modo

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de produção capitalista, afastando-se assim de sua concepção humanitária original,

concordamos com Thompson (2011), quando escreve sobre a concepção epifenômenica

da ideologia:

Embora o conceito de ideologia fosse, inicialmente, empregado por Marx e

Engels no contexto de sua critica aos jovens hegelianos, ele adquiriu,

subsequentemente, um papel mais geral na caracterização, feita por eles, da

estrutura social e da mudança histórica. Esse papel mais geral esta já evidente

em A ideologia alemã, na medida em que Marx e Engels começam a ligar à

produção e difusão das ideias a relação entre classes. "As ideias da classe

dominante", dizem eles a certa altura, "são, em cada época, as ideias

dominantes, isto é, a classe que tem a força material na sociedade é, ao

mesmo tempo, a sua força intelectual dominante”. Essa passagem deixa

entrever o desenvolvimento de uma nova concepção de ideologia, uma

concepção que emerge mais claramente, do prefácio a Uma contribuição a

crítica da economia política, de 1859, e em outros lugares. Podemos

descrever esta nova concepção como a "concepção epifenomênica", pois ela

vê a ideologia como dependente e derivada das condições econômicas e das

relações de classe e das relações de produção de classe. Ideologia, de acordo

com a concepção epifenomênica, é um sistema de ideias que expressa os

interesses da classe dominante, mas que representa relações de classe de

uma forma ilusória. A ideologia expressa os interesses da classe dominante

no sentido que as ideias que compõem a ideologia são as ideias que, num

período histórico particular, articulam as ambições, os interesses e as

decisões otimistas dos grupos sociais dominantes, à medida que eles lutam

para garantir e manter sua posição de dominação. Mas a ideologia representa

relações de classe de uma forma ilusória, pois que estas ideias não

representam acuradamente a natureza e as posições relativas das classes

interessadas; ao contrário, elas representam mal estas relações, de uma

maneira tal que favorecem os interesses da classe dominante (THOMPSON,

2011, p. 54, itálicos e aspas no original).

Neste sentido é que as relações entre o Grupo BM e o desenvolvimento

territorial rural sustentável são entendidas. Pois é sobre o desenvolvimento do modo de

produção capitalista que a classe dominante, expressa em nosso trabalho por aqueles

personificadores do capital atrelados ao Grupo BM, irá arquitetar sua ideologia

dominante, ou seja, se o desenvolvimento sustentável apresenta os ideais de

determinada classe – seja de forma mais explicita, como no caso da expansão do setor

sucroenergético, ou implícita, no caso de política pública – , ele não pode, ao mesmo

tempo, favorecer as condições de outra para que a dominação não seja interrompida, daí

o caráter conveniente, e ideológico, deste conceito.

Destes, com base em Thompson (2011) podemos relacionar a ideologia com

formas de dominação e mantenimento de poder. Poder este que, segundo Thompson

(2011), é representado por determinados modos de operação, esta relação,

demonstramos no quadro 8, de forma sintética.

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Quadro 8: ideologias e formas de relação de poder

Modos gerais Algumas estratégias típicas de construção simbólica

Legitimação: Relações de

dominação podem ser mantidas

se forem apresentadas como

legítimas

Racionalização: O falante constrói um raciocínio para mostrar

que relações ou instituições sociais devem ser aceitas

Universalização: Interesses de uns são apresentados como

interesses de todos

Narrativização: Na narração de histórias, o presente é

apresentado como integrante de uma tradição eterna e aceitável

Dissimulação: Relações de

dominação podem ser

estabelecidas e mantidas pelo

fato de serem ocultadas,

negadas ou obscurecidas ou por

serem apresentadas de modo

imperceptível

Deslocamento: Termos geralmente usados para menção a

pessoas ou objetos são usados para se referir a outros, dessa

forma, os sentidos bons ou ruins são transferidos para o novo

referente

Eufemização: A descrição acrescenta uma valoração positiva

Tropo: É o uso de figuras da linguagem. As formas mais

comuns de tropo são sinédoque, metáfora, metonímia

Unificação: Relações de

dominação podem ser

estabelecidas e sustentadas por

meio da construção de unidade

entre indivíduos,

independentemente das

diferenças que os separam

Estandardização: Formas simbólicas são adaptadas a um

referencial padrão, por exemplo, desenvolvimento de uma

linguagem nacional sem levar em conta as diferenças sociais e

linguísticas

Simbolização da unidade: Construção de símbolos de unidade,

de identidade e de identificação coletivas

Fragmentação: Relações de

dominação são estabelecidas e

mantidas através da

segmentação de indivíduos e

grupos que possam ser uma

ameaça aos dominantes

Diferenciação: Ênfase às distinções entre pessoas e grupos

Expurgo do outro: Construção de um inimigo para a sociedade

Reificação: Relações de

dominação são criadas e

sustentadas quando uma

situação transitória é

apresentada como se fosse

permanente, natural, atemporal

Naturalização: Apagamento da história dos fenômenos, que

são apresentados como naturais

Eternalização: Fenômenos são apresentados como

permanentes, imutáveis e recorrentes

Nominalização: Ações e participantes são transformados em

nome

Fonte: Thompson (2011)

Organização: Guilherme Magon Whitacker, 2016

Nesse âmbito, Eagleton (2011) explica que a acepção de ideologia mais

amplamente aceita é a de legitimação do poder de uma classe ou grupo social

dominante, tal como propõe Thompson (2011). Para manter este posicionamento e

negar a ampliação do conceito de ideologia137

, Eagleton (2011) se reporta a um conceito

correlato que nos é extremamente útil: poder. E, para relacionar estes conceitos recorre

a Michel Foucault.

Eagleton (2011) reconhece que a compreensão do poder como exterminado,

presente nas mais ínfimas ações, é um ganho político; contudo traz um problema quanto 137

Para Eagleton (2011) a ampliação do conceito de ideologia, em acepções amplas e restritas, permite

entender que tanto os movimentos de contestação como os de dominação seriam ideológicos e aceitar as

duas significa ser por demais complacente. Resultaria em estender a tal ponto o conceito de ideologia que

ele se tornaria “[...] politicamente desdentado” (EAGLETON, 2011, p. 20) e essa aceitação renega

aspectos ligados à ideologia enfatizados por filósofos radicais, por exemplo, “o obscurecimento e a

‘naturalização’ da realidade social, bem como a resolução ilusória das contradições reais” (EAGLETON,

2011, p. 20).

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ao significado da palavra ideologia. Conforme o autor, se o poder está disseminado,

então a ideologia, compreendida enquanto legitimação de poder estaria também

proliferada. Sendo assim, a palavra ideologia corre o risco de difundir-se demais a ponto

de perder seu significado. O autor justifica sua posição alegando que qualquer palavra

que abranja tudo perde seu valor, pois não se opõe a nenhum outro signo. Portanto, é

preciso especificar sempre o outro, isto é, para determinar o que é ideológico é preciso

também saber o que não é (EAGLETON, 2011, p. 21). Eis o segundo motivo para a

contestação da acepção mais ampla de ideologia, defendida por Thompson (2011).

Deste modo, o conhecimento sobre a ideologia do desenvolvimento sustentável

irá possibilitar que expliquemos as formas ideológicas mostrando, por exemplo, que

declarações sobre os propósitos, objetivos e a santidade do desenvolvimento sustentável

são expressões de interesses particulares de uma classe cujo domínio e sobrevivência

dependem do controle ideológico de tal modelo de desenvolvimento e assim podemos,

também, desmascarar esta ideologia. Neste ponto, voltamos a Thompson (2011) e

esclarecemos que:

Desmascarar uma forma de consciência e mostrar que ela é ilusória, errada,

sem justificação racional; implica não apenas que ela pode ser explicada com

referência a condições sócio-econômicas, mas também que ela interpreta mal

essas condições, ou que ela não tem outra justificação a não ser o fato,

empiricamente demonstrável, de expressar os interesses particulares de

grupos cujas posições são determinadas por essas condições. A

caracterização específica de uma forma de consciência como "ideológica", de

acordo com essa concepção, implica que pode ser explicada, e por isso

desmascarada, como uma expressão dos interesses da classe dominante. Por

isso uma investigação que se apresente a si mesma como ciência, interessada

na investigação das condições econômicas da vida social e explicando formas

de consciência a partir daí, pode ser posta a serviço de uma critica que

desmascare formas de consciência – e, mais especificamente, as teorias e

conceitos de filósofos e de outros – como ideológicas (THOMPSON, 2011,

p. 56, itálico e aspas no original).

Marx e Engels (2012) entendem que a ideologia não é um pensamento

equivocado, mas aquele que apanha os elementos da realidade tal qual ela se encontra,

não apreendendo seus nexos constitutivos, os elementos que permitem entender a

essência do objeto pensado, assim sendo, acaba naturalizando aquilo que é a-histórico e

a-social. O objetivo fundamental de Marx e Engels (2012), consideramos, é mostrar que

não é no plano das ideias que as coisas são produzidas, na verdade são questões

materiais que produzem essa realidade. Isso significa que a consciência é produzida pela

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materialidade e não o contrário. Esta inversão é para evidenciar que as ideias são

produzidas pela realidade histórica (MARX; ENGELS, 2012).

A questão fundamental abordada é que a realidade é uma forma histórica que

tem relação com seu desenvolvimento histórico e, a análise da essência – se desprovida

dessa compreensão – não permite perceber o que está posto na realidade dificultando a

apreensão da materialidade velando-a, escondendo e legitimando o que está posto. Esse

processo que naturaliza e mantém os fatos interessa somente a determinada classe

social, daí a importância da verificação da concepção conceitual de desenvolvimento

sustentável e sua conveniência.

Portanto, torna-se indispensável à produção científica que se detenha a

explicação dos nexos constitutivos materiais revelando-os além da forma imediata da

aparência material do desenvolvimento sustentável, apreendendo aquilo que

essencialmente a realidade é afastamo-nos de compreensões harmonicistas que

permitem relacionar a reprodução do modo de produção capitalista a uma perspectiva

humanitária. Neste sentido, Marx (2013) escreveu que na sociedade capitalista os

objetos materiais possuem características que lhes são conferidas pelas relações sociais

de produção dominantes (essência), mas que aparecem como se lhes pertencessem

naturalmente (aparência). Este fato, presente no processo de reprodução do modo de

produção capitalista, é por ele denominada fetiche, e sua forma elementar é o fetichismo

da mercadoria enquanto repositório ou portadora do valor.

A analogia é com a religião, na qual as pessoas conferem a alguma entidade

um poder imaginário. Mas a analogia é inexata, pois, como Marx sustenta, as

propriedades conferidas a objetos materiais na economia capitalista são reais

e não produto da imaginação. Só que não são propriedades naturais. São

sociais. Constituem forças reais, não controladas pelos seres humanos e que,

na verdade, exercem controle sobre eles; são as “formas de aparência”

objetivas das relações econômicas que definem o capitalismo. Se essas

formas são tomadas como naturais, isso se deve a que seu conteúdo ou

essência social não é visível imediatamente e só pode ser revelado pela

análise teórica (GERAS, 2013, p. 149, aspas no original).

Deste modo, consideramos que as relações sociais de produção influenciadas

pelos agentes que atuam nas forças de comando do modo de produção capitalista, como

o Grupo BM, passam a existir como aparência mistificadora cuja expressão suprema é a

capacidade que o capital tem de gerar lucro, e aí está a essência do desenvolvimento

sustentável, sua capacidade de reprodução do modo de produção capitalista.

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Assim, as propriedades conferidas às agências internacionais de domínio deste

processo são como uma espécie de máscara para as relações sociais de produção no

modo de produção capitalista. Isso dá lugar às ilusões quanto à origem natural dessas

forças. Mas a máscara não é ilusão.

As aparências que mistificam e deturpam a percepção espontânea da ordem

capitalista são reais; são formas sociais objetivas que, simultaneamente, são

determinadas pelas relações subjacentes e as obscurecem. É desta maneira que o

desenvolvimento sustentável aparece no modo de produção capitalista: como ideologia,

ou seja, esta é sua essência, o porquê de existir. E, a essência vai buscar sua

materialidade no território, assim, território e desenvolvimento sustentável estão numa

relação de aparência e essência, onde o território revela a aparência material do

desenvolvimento sustentável.

Deste modo, território e desenvolvimento sustentável encontram-se imbricados

numa relação dialética, onde consideramos que o território, normatizado, passa a ser

entendido não apenas como produto do modo de produção capitalista, mas como

condição para este. Portanto, o conceito de desenvolvimento sustentável assume

definitivamente seu caráter ideológico de negatividade, ou seja, de realidade ilusória,

provocadora de falsa consciência que acaba refletindo em contradições sociais.

Identificada e relacionada com o poder político, entende-se que a ideologia transforma-

se de acordo com os interesses de quem esta no poder político, ou seja:

[...] cada nova classe que ocupa o lugar da que dominava anteriormente, vê-

se obrigada, para atingir seus fins, a apresentar seus interesses como sendo o

interesse comum de todos os membros da sociedade; ou seja, para expressar

isso em termos ideais; é obrigada a dar às suas ideias a forma de

universalidade, a apresentá-las como as únicas racionais e universalmente

legítimas (MARX e ENGELS, 2009, p. 80).

Entendendo a ideologia como uma forma de orquestrar a sociedade através de

programas ou políticas, eleva-se ainda mais a categoria de ideologia. Podemos

relacionar esta elevação à condição de hegemonia, uma “[...] produção cultural de

sistemas inteiros de valores, atitudes, crenças e moralidades que dão suporte para a

ordem social existente e o modo de vida prescrito” (PEET, 2007, p. 25). Neste sentido,

a ideologia do desenvolvimento sustentável, segundo Löwy (2005), pode ser descrita:

[...] segundo a qual, graças ao processo tecnológico e as energias leves, o

desenvolvimento das forças produtivas pode ter uma expansão ilimitada, que

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vise satisfazer “cada qual segundo as suas necessidades”. Essa escola não

leva em conta os limites naturais do planeta, e acaba por reproduzir, sob a

etiqueta de “desenvolvimento durável”, o modelo de produção atual (LÖWY,

2005, p. 56, aspas no original).

As ideologias devem a sua estrutura e as funções mais específicas às condições

sociais da sua produção e circulação, quer dizer às funções que elas cumprem: em

primeiro lugar, para os especialistas em concorrência pelo monopólio da competência

considerada e; em segundo lugar e por acréscimo, para os não especialistas. Portanto,

entendemos que o poder da ideologia influencia na formulação de planos e políticas

governamentais que tendem a reproduzir, ainda que isto não esteja explícito, o modo de

produção capitalista por meio do desenvolvimento sustentável.

Vale também lembrar as circunstâncias específicas de quando se elegeu o

desenvolvimento sustentável como alternativa para o futuro da humanidade, conforme

já descrevemos nesta pesquisa. Enfim, o relatório Nosso Futuro Comum (CMMAD,

1988), que estabeleceu os parâmetros e projetou o debate sobre o desenvolvimento

sustentável, parte de uma concepção subjetiva de desenvolvimento e direciona este para

outra perspectiva ainda mais subjetiva, denominada por sustentável, pois este modelo

deveria, por si só, garantir a perpetuação da espécie sobre o planeta, mas, em nenhum

momento ele o define.

A humanidade é capaz de tornar o desenvolvimento sustentável – de garantir

que ele atenda as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de

as gerações futuras também atenderem as suas. O conceito de

desenvolvimento sustentável tem, é claro, limites, não limites absolutos, mas

limites impostos pelo estágio atual da tecnologia e da organização social, no

tocante aos recursos ambientais e pela capacidade da biosfera de absorver os

efeitos da atividade humana. Mas tanto a tecnologia quanto a organização

social podem ser geridas e aprimoradas a fim de gerar uma nova era de

crescimento econômico. Para a comissão, a pobreza generalizada já não é

inevitável. A pobreza não é apenas um mal em si mesma, mas para haver um

desenvolvimento sustentável é preciso atender as necessidades básicas de

todos e dar a todos a oportunidade de realizar suas aspirações de uma vida

melhor. Um mundo onde a pobreza é endêmica estará sempre sujeito a

catástrofes, ecológicas ou de outra natureza. (CMMAD, 1988, p. 09 e 10, os

grifos são nossos).

Resta-nos aqui, esclarecer de que forma a ideologia do desenvolvimento

sustentável se materializa e permite, portanto, seu caráter conceitual. Ainda em

Thompson (2011), encontramos a seguinte explicação sobre a relação entre ideologia e

discurso.

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Foi no espaço aberto da esfera publica que o discurso das ideologias

apareceu, constituindo sistemas organizados de crenças que ofereciam

interpretações coerentes dos fenômenos sociais e políticos e que serviam para

mobilizar movimentos sociais e justificar exercícios de poder. As ideologias,

então, propiciaram marcos referenciais de sentido, por assim dizer, que

possibilitaram as pessoas se orientarem num mundo caracterizado por certo

sentimento de latta de fundamento, uma sensação produzida pela destruição

de estilos de vida tradicionais e pela morte de cosmovisões religiosas e

míticas (THOMPSON, 2011, p. 110).

Deste modo, relacionando os escritos anteriores sobre a influência do Grupo

BM no processo de descentralização e inserção do desenvolvimento sustentável em

políticas públicas voltadas ao desenvolvimento rural, podemos escrever que esta

ocorreu como forma de controle e exercício de poder. Entendemos que muitas vezes os

discursos podem representar, ou expressar, o papel institucional das organizações (neste

caso, o Grupo BM e a ONU – especificamente em relação à projeção do

desenvolvimento sustentável), mas, também podem trazer opiniões pessoais

(julgamentos ora favoráveis ora divergentes com o que defendem institucionalmente).

Comportamento este legítimo, já que as pessoas (sujeito) devem expressar maneiras de

examinar seus pontos de vista através do exercício de crítica e autocrítica, objetivando

aprimorar concepções sobre determinado tema ou assunto.

Deste modo, entendemos o discurso como meio de identificar a perspicácia

capitalista na construção de uma ideologia do desenvolvimento sustentável, neste

sentido, cabe verificar se ele transforma uma realidade abstrata, considerando o que

escrevemos anteriormente sobre a materialidade de um conceito, no caso o

desenvolvimento sustentável em uma realidade histórica. Ao sujeito lhe é fornecida a

temporalidade, que servirá para validar a dominação da lógica capitalista que tenta

respaldar o seu interesse específico, fazendo-o se tornar em interesse da sociedade.

A temporalidade é explicada: o discurso deve ser localizado no tempo,

buscando responder previamente aos possíveis questionamentos de uma problemática

que emerge da sociedade, dentro de um contexto histórico capitalista, a quem o próprio

capital previamente instituiu. Tem por base uma ideologia, que, apesar de ser atemporal,

fornece a ele (o discurso) o tempo e o espaço, a fim de dar veracidade e coerência à

abstração. Esse discurso previamente trabalhado é designado, então, como competente.

Neste sentido Chauí (1989) define o discurso competente como o instrumento de

dominação no mundo contemporâneo:

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O discurso competente é o discurso instituído. É aquele no qual a linguagem

sofre uma restrição que poderia ser resumida assim: não é qualquer um que

pode dizer qualquer coisa a qualquer outro em qualquer ocasião e em

qualquer lugar (CHAUÍ, 1989, p.7).

A aceitação do discurso capitalista vai depender do grau de abstração do

indivíduo, que, segundo a concepção marxista, tem sua consciência determinada por sua

atividade de produção na sociedade (MARX; ENGELS, 2009). E, o indivíduo tem

consciência de si quando tem consciência do que produz, como produz, para quem

produz, pois ele está inserido num sistema econômico. A sua abstração vai depender da

sua consciência, da criação das ideias que estão vinculadas à sua base de sobrevivência,

ligadas ao seu modo de produzir e reproduzir, de como está inserido no processo.

Um discurso pode ser identificado e definido. Não é algo que acontece de

maneira aleatória ou espontânea. Neste subitem, pretendemos relacionar a ideologia do

desenvolvimento sustentável com a forma que julgamos ser o que dá o tom de sua

materialização, o discurso do desenvolvimento sustentável. Pois entendemos que a

ideologia se cria internamente; em outras palavras, na mente e nas relações de poder

daqueles que detêm o poder e, somente posteriormente, ela, a ideologia, se materializa

através de um canal discursivo.

Para compreendermos a totalidade de uma prática discursiva precisamos inseri-

la na totalidade “[...] da realidade social como um todo orgânico, estruturado, no qual

não se pode entender um elemento, um aspecto, uma dimensão, sem perder a sua

relação com o conjunto” (LÖWY, 1985, p. 16). Neste sentido, é interessante

lembrarmos, relacionando com o item anterior, que as ideologias, segundo Peet (2007)

podem ser produzidas intencionalmente e que:

Na modernidade, a arena política é povoada por indivíduos altamente

treinados e experientes – “experts” – e as instituições bem estabelecidas,

abundantemente financiadas – departamentos de governo, Think Tanks,

institutos de pesquisa, associações financeiras etc. – que são de caráter mais

econômico-institucional do que civil-institucional (PEET, 2007, p. 27).

Deste modo, as instituições responsáveis por este ou aquele discurso, após

criarem o referente, ou assunto, ideologicamente programado para intensificar uma

propagação falsa sobre a realidade, elaboram seus códigos e sua mensagem.

Importante mencionarmos neste momento que, em relação a discurso,

entendemos aquilo que Foucault (2008) vai nos apresentar como, não necessariamente,

algo dito, falado, expressado através da linguagem, mas, também, e especificamente em

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nosso caso neste momento, do discurso político escrito, pois, lembrando, trabalhamos

aqui com a proposta oficial da ONU, que articulou a proposta de desenvolvimento

sustentável.

Para compreender esta proposta optamos por tratá-la como um discurso, no

sentido empregado por Foucault (2008) no contexto, principalmente, da arqueologia do

saber, no sentido de entender como se constroem os discursos e como o poder, imanado

do discurso, é capaz de construir significados. Segundo esse autor, toda sociedade

controla e seleciona o que pode ser dito numa certa época; quem pode dizer o que e em

quais circunstâncias como meio de filtrar ou afastar os perigos e possíveis subversões

que daí possam advir (FOUCAULT, 2009). São sob estas observações que iremos

trabalhar: “[...] segundo que regras um enunciado foi construído” (FOUCAULT, 2008,

p. 30).

Os discursos são entendidos como práticas geradoras de significados, na forma

de códigos, que se apoiam em regras históricas e ideológicas para estabelecer o que

pode ser dito, num certo campo discursivo e num dado contexto histórico. O discurso,

portanto, relaciona-se simultaneamente, com suas origens de formação, com outros

discursos e com as instituições sociais e o poder que expressam ideologias como

sistemas simbólicos isolados que se concretizam, sobretudo na escrita, e que servem,

enquanto algo escrito, enquanto discurso racional, para informar projetos públicos de

reconstrução social. Neste sentido, Foucault (2008), escreve que a análise discursiva

busca:

[...] compreender o enunciado na estreiteza e singularidade de sua situação;

de determinar as condições de sua existência, de fixar seus limites da forma

mais justa, de estabelecer suas correlações com os outros enunciados a que

pode estar ligado, de mostrar que outras formas de enunciação exclui

(FOUCAULT, 2008, p. 31).

Todo discurso contém procedimentos de seleção e exclusão que estabelecem os

limites do permitido e do proibido na arte da comunicação, do que é aceito e rejeitado,

do que é considerado verdadeiro ou falso. Sendo assim, o modo como falamos e

escrevemos afeta profundamente a vida social, condicionando comportamentos e

experiências, nossa visão de mundo e, por fim, o próprio mundo que ajudamos a criar

(FOUCAULT, 2009).

Em seu momento de formação, o discurso do desenvolvimento sustentável já

vem carregado daquilo que Foucault (2008) vai chamar de regras de deformação, ou

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seja, possui “palavras demasiado carregadas de condições e consequências

inadequadas” (FOUCAULT, 2008, p. 43), consequentemente, apresenta-se inteiramente

diferente da realidade em que se acentua.

Para Foucault, portanto, não há discurso neutro ou desinteressado. Ele nos traz

a ideia de que toda linguagem e todo discurso expressa uma vontade de poder e de

dominação (FOUCAULT, 2000). Para realizar esta aspiração de conquista, o poder

investido nos discursos se associa ao saber, em especial àquele saber concebido

intencionalmente pelos experts (PEET, 2007) o que torna o conhecimento e

consequentemente o discurso reconhecido como verdadeiro.

O discurso do desenvolvimento sustentável apresentado ao debate público,

apesar de padecer de diversos problemas que tentaremos apontar ao longo da análise,

não é uma construção ingênua. Revela, ao contrário, uma hábil operação ideológica e,

portanto, política, aparentemente empenhada em sanar um conjunto de contradições

expostas e não respondidas pelos modelos anteriores de desenvolvimento. Ou seja,

trata-se de um discurso que busca a alienação da relação sociedade e natureza, um

discurso que não permite a compreensão da realidade através da teoria e do empirismo;

portanto, entendemos que seus maestros tiveram o cuidado ao formular este discurso

ideológico, pois se tratou de pensar e elaborar:

[...] um discurso que não fosse nem da ordem da redução nem da ordem da

promessa: um discurso cuja tensão mantivesse separados o empírico e o

transcendental, permitindo, no entanto, visar a um e outro ao mesmo tempo

(FOUCAULT, 2000, p. 441).

Tratava-se, em primeiro lugar, de gerenciar a reprodução econômica do capital

ante os efeitos de degradação natural, tanto do ponto de vista da oferta de recursos

naturais essenciais à continuidade do sistema produtor de mercadorias, quanto da

perspectiva dos resíduos da produção e da poluição, contaminação e degradação daí

decorrentes. Implicava também em responder aos questionamentos sobre os limites do

crescimento, intensamente discutidos na década de 1970 em todos os fóruns, direta ou

indiretamente, relacionados à temática do desenvolvimento. Sobre este aspecto,

Carvalho (1991) observa que:

Desde a Conferência de Estocolmo, em 1972, ficou claro que a preocupação

dos organismos internacionais quanto ao meio ambiente era produzir uma

estratégia de gestão desse ambiente, em escala mundial, que entendesse a sua

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preservação dentro de um projeto desenvolvimentista (CARVALHO, 1991,

p. 79).

À parte a própria contradição semântica do termo, a definição de

desenvolvimento sustentável veiculada pelo relatório Nosso Futuro Comum permite

uma pluralidade de leituras que oscila, desde um sentido avançado de desenvolvimento,

associado à justiça ambiental (aquela condição de conceber direitos à natureza) e

renovação ética, até uma perspectiva conservadora de crescimento econômico ao qual se

acrescentou uma variável ecológica.

"Uma agenda global para mudança" - foi o que se pediu à Comissão Mundial

sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento que preparasse. Tratava-se de um

apelo urgente da Assembleia Geral das Nações Unidas para: propor

estratégias ambientais de longo prazo para obter um desenvolvimento

sustentável por volta do ano 2000 e daí em diante; recomendar maneiras para

que a preocupação com o meio ambiente se traduza em maior cooperação

entre os países em desenvolvimento e entre países em estágios diferentes de

desenvolvimento econômico e social e leve à consecução de objetivos

comuns e interligados que considerem as inter-relações de pessoas, recursos.

meio ambiente e desenvolvimento; considerar meios e maneiras pejos quais a

comunidade internacional possa lidar mais eficientemente com as

preocupações de cunho ambiental; ajudar a definir noções comuns relativas a

questões ambientais de longo prazo e os esforços necessários para tratar com

êxito os problemas da proteção e da melhoria do meio ambiente, uma agenda

de longo prazo a ser posta em prática nos próximos decênios, e os objetivos a

que aspira a comunidade mundial (CMMAD, 1987, p. 11, aspas no original).

Esta polissemia revela o curioso paradoxo de reunir, ao mesmo tempo, a força

e a fraqueza do discurso, a depender do olhar e dos interesses de quem observa. Assim,

à medida que o discurso vai se tornando mais complexo e é difundido socialmente, ele

vai sendo apropriado por diferentes forças que passam a lhe imprimir o significado que

melhor expressa seus valores e interesses particulares. Nos interesses da ONU, e nas

palavras da primeira ministra norueguesa, isto se torna uma possibilidade:

[...] de encarar o futuro e de proteger os interesses das gerações vindouras.

Pois uma coisa era perfeitamente clara: precisávamos de um mandato para a

mudança. [...] Talvez nossa tarefa mais urgente hoje seja persuadir as nações

da necessidade de um retorno ao multilateralismo. O desafio da reconstrução

após a II Guerra Mundial foi a verdadeira motivação que levou ao

estabelecimento de nosso sistema econômico internacional do pós-guerra. O

desafio de encontrar rumos para um desenvolvimento sustentável tinha de

fornecer o ímpeto – ou mesmo o imperativo – para uma busca renovada de

soluções multilaterais e para um sistema econômico internacional de

cooperação reestruturado (CMMAD, 1987, p. 12).

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Portanto, de todo o escrito até este ponto, entendemos o desenvolvimento

sustentável como um conceito claramente programado para determinado fim – ainda

que esta leitura dependa de um ajuste em nossas lentes para observamos as entrelinhas

narrativas – reproduzir o modo de produção capitalista. Este entendimento nos permite

escrever que o conceito desenvolvimento sustentável é tão amplo que não tolera que

seja estabelecida uma relação direta com nenhum objeto específico, ficando, pois,

dependente de uma nova adjetivação, expressa neste trabalho como desenvolvimento

territorial rural sustentável.

Assim sendo, sua função ideológica, de acordo com Thompson (2011), seria de

legitimação de poder, no caso do poder do Grupo BM que por meio da normatização do

desenvolvimento sustentável e do território mantém seu poder de dominação por meio

das estratégias de racionalização, na qual o Grupo BM, enquanto sujeito ativo na

relação de incorporação do desenvolvimento sustentável nas políticas públicas, constrói

um raciocínio capaz de demonstrar quais ações, entre a sociedade e a natureza, devem

ser legitimadas para que alcance o desenvolvimento sustentável, deste modo, por meio

do discurso, exprime a universalização de seus interesses como interesses de todos.

Dentro dessa perspectiva desenvolvimentista, portanto produtivista de acordo

com o tratamento dado a este conceito, o que se queria preservar de fato era um modelo

de acumulação de riquezas onde o patrimônio natural passava a ser um bem. O apelo à

humanidade e ao bem-estar dos povos era usado como álibi, sempre citado ao lado dos

objetivos de crescimento econômico, emprestando uma preocupação humanista a

intenções não tão nobres (CARVALHO, 1991, apud, RIBEIRO, 1991).

Dirigia-se, igualmente, à pacificação de conflitos na relação entre os países do

norte e do sul, separados por assimetrias sociais, econômicas e políticas que

tencionavam historicamente as relações internacionais. Os debates sobre os limites do

crescimento já reconheciam que as aspirações de todos os povos e países do mundo ao

desenvolvimento não podiam seguir os modelos do norte industrializado, pois isto

levaria a uma sobrecarga dos ecossistemas. Deste modo se apresentou a ideologia

discursiva do desenvolvimento sustentável. A partir desta análise, os operadores do

capital financeiro encontram na relação entre a sociedade e a natureza a maneira

adequada de dar continuidade ao ciclo de expansão do modo de produção capitalista,

criam o espaço necessário para expandir suas formas de dominação através daquilo que

chamamos de prática discursiva da ideologia do desenvolvimento sustentável.

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Resumo da parte III

A síntese realizada nesta última parte partiu do entendimento de que a produção do

espaço e os territórios encontram-se de tal forma imbricados no modo de produção

capitalista que o desenvolvimento territorial sustentável não escapa de sua lógica

predatória. A partir do retorno a materialidade de nosso objeto de estudo e do exemplo

elencado visando demonstrar a contrariedade das ações estatais em prol do

desenvolvimento sustentável – nosso tema central –, e do confronto teórico entre

distitnas concepções de território – areal e relacional – demonstramos:

O poder simbólico de políticas públicas;

a ideologia que o desenvolvimento sustentável traz em seu bojo.

A partir destes comprovamos nossa hipótese:

o desenvolvimento sustentável vem sendo utilizado como alternativa de reprodução

do modo de produção capitalista.

A partir da verificação e confirmação de nossa hipótese demonstramos:

a diferença entre a essência e a aparência do desenvolvimento sustentável;

a característica conveniente do conceito desenvolvimento sustentável.

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Considerações finais

Esta tese levou em consideração a materialidade histórica do modo de

produção capitalista considerando que todo evento possui condições determinantes.

Nenhum evento na história pode ser considerado inteiramente irrelevante em relação a

qualquer outro subsequente; ignorar tal fato limita o aprender e o fazer científico. Os

intricados fatos com os quais tivemos de tratar referem-se à própria historicidade e

geograficidade humana e, embora o entendimento jamais seja completo, ainda assim,

consideramos que pudemos contribuir para o estudo dos processos que, sob a égide do

desenvolvimento sustentável, contribuem para a reprodução do modo de produção

capitalista e, a Geografia é uma Ciência com riquíssimo aparato teórico-conceitual que

nos permitiu compreender alguns dos processos de reprodução do modo de produção

capitalista.

Consideramos que, no transcorrer deste trabalho, apresentamos um conjunto de

considerações relevantes para análise do desenvolvimento sustentável. O desafio posto,

de demonstrar como imbricadas relações articuladas em escala global incidem em

outras escalas possuem nexo de causalidade, que se configurou a partir dos estudos

realizados e aqui sintetizados na compreensão de que o modo de produção capitalista

infere na produção do espaço e nos territórios por meio dos processos de

territorialização e normatização em uma multiescalaridade que nos permitiu transitar

desde a aparência até o essência do desenvolvimento sustentável.

Assim, o objetivo principal de nossa tese – verificação da hipótese de que o

desenvolvimento sustentável esteja sendo utilizado como forma de reprodução do modo

de produção capitalista – foi atingido confirmando tal hipótese e reafirmando nossa

tese, seja por meio do processo de territorialização do modo de produção capitalista, no

caso da expansão do setor sucroenergético, seja pela normatização do território, no caso

do PEMH.

Observando os objetivos específicos verificamos que o processo de

descentralização de políticas sociais no Brasil foi condicionado por decisões impostas

por organismos internacionais de financiamento, representantes do interesse do

capitalismo central, acreditando que descentralizar seria uma forma de desoneração do

governo central, dando às funções de Estado uma espécie de caráter menor, de

municipalidade. Os resultados do processo de descentralização se materializam, dentre

outras formas, como políticas públicas por meio da transferência de competências e

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recursos e pela fragmentação do processo político cumprindo, assim, função de adaptar

a regulamentação estatal às novas condições de acumulação do capital mundial dentro

de um marco de crise econômica e fiscal.

Em relação ao desenvolvimento sustentável, partimos do afastamento de sua

concepção humanitária e pudemos verificar que este vem sendo, há tempos,

impulsionado como modelo de desenvolvimento para o campo por meio do que

convencionalmente foi denominado de desenvolvimento territorial rural sustentável.

Neste aspecto, demonstramos a tese que vem se amparando em estudos que entendem e

planejam o desenvolvimento territorial a partir de sua delimitação física e pela

implementação de normas, sendo imposto de distintas formas, desde publicações

oriundas de conferências da ONU sobre o tema até as recomendações do Grupo BM

para a liberação de financiamentos. O Estado, dessa forma, atende a recomendações de

agências que atuam diretamente ou indiretamente na reprodução do modo de produção

capitalista como, por exemplo, o Grupo BM, realizando ações no intento de permitir

ganhos cada vez mais significativos com o capital aplicado.

A leitura dos documentos do Grupo BM revelou que esta agência de fomento

internacional postula a necessidade de um olhar ampliado sobre o rural, não restrito à

agricultura, estimulando o envolvimento do público beneficiário na promoção do

desenvolvimento sustentável e da perspectiva territorial como delimitação para

execução de projetos legando a prática agropecuária a grandes produtores, como, por

exemplo, no caso do setor sucroenergético que, na perspectiva proposta nesta tese,

representa a contrariedade do desenvolvimento sustentável.

Demonstramos as características anteriores e posteriores à execução do PEMH

na área de estudo delimitada por meio de informações produzidas durante o trabalho de

campo e documentos da CATI sobre os principais problemas, causas e atividades

previstas para o planejamento e execução do PEMH, sendo expostas as atividades

previstas e executadas na microbacia com a finalidade de realizar uma interpretação

descritiva. Posteriormente demonstramos como o modo de produção capitalista, em seu

desenvolvimentismo, foi estudado pela Geografia no que diz respeito à compreensão

sobre a produção do espaço e o território. Tratamos da análise da categoria espaço e do

conceito de território para compreender como os processos e agentes envoltos na

expansão capitalista impactaram o campo a partir da incorporação normativa do modelo

de desenvolvimento territorial rural sustentável em políticas públicas, onde se ressalta o

aspecto econômico e político, sobretudo, a reprodução do modo de produção destacado.

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Ao considerarmos o espaço, como constructo social, nos referimos à estrutura

que define as determinações do modo de produção capitalista considerando, também, o

que se refere à ação de agentes em associação com grupos de atuação, muitas vezes de

âmbito global. A partir desta delimitação, quando escrevemos sobre a concepção de

território nos referimos a um espaço – sem confundi-lo com o mesmo – definido e

delimitado por e a partir de relações de poder, portanto, relacional. Esta opção

possibilitou compreender os processos de territorialização do modo de produção

capitalista e normatização do território influenciado pelo Grupo BM, que traz em seu

bojo relações de poder que podem ser analisadas, por exemplo, por meio de políticas

públicas de caráter neoliberal, como o PEMH que podem induzir novas práticas

produtivas voltadas à reprodução de capitais.

Demonstramos que as crises do modo de produção capitalista fazem parte de

sua espacialização e territorialização. Um processo que permite a criação de novos

espaços de reprodução capitalista subordinados às necessidades gerais das relações

sociais de produção que o constituem e que possuem uma lógica interna de

transformação permitindo a superação de momentos de crise por meio da dinâmica

espacial e territorial, marcada por contradições, que são superadas ainda dentro da

lógica de valorização do capital pela reprodução capitalista através da incorporação de

novos espaços, bem como do aprofundamento da exploração, tanto de recursos naturais

quanto humanos. Deste, evidenciamos a materialidade espacial e territorial do modo de

produção capitalista utilizada para a análise da realidade social.

Consideramos que estamos vivendo um período no qual o núcleo da relação

entre a sociedade e a natureza está sendo transformada por meio da criação de novos

espaços de reprodução do modo de produção capitalista onde os recursos naturais se

transformaram em espaço de acumulação do capital. Nesse sentido, o desenvolvimento

do capitalismo tem alterado profundamente a relação entre a sociedade e a natureza que

é expressa na forma de uma interação metabólica, seu núcleo, o que lhe garante, ou

garantiria, estabilidade. Neste sentido, demonstramos que o controle dos meios de

produção que imprimem transformações à primeira natureza fortalece a degradação de

recursos naturais. É fato que a apropriação, uso e controle de tais recursos ampliam a

distinção entre as classes sociais e, deste domínio de relação social desigual, surgem

benefícios e prejuízos.

Evidenciamos a relação entre a materialidade do desenvolvimento sustentável e

o modo de produção capitalista. Materialidade esta que foi demonstrada por meio da

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efetivação do PEMH, que consideramos como proposta/prática de desenvolvimento

sustentável, mas não representa a totalidade do que podemos considerar como modelo

de desenvolvimento, na perspectiva que escrevemos anteriormente. Assim,

consideramos o PEMH como política pública de característica compensatória.

Demonstramos que a materialidade evidenciada por autores e pesquisadores

que se dedicaram ao estudo da concepção areal e normativa do território, em relação ao

PEMH, não levaram em consideração em suas pesquisas o papel ideológico do

desenvolvimento sustentável como propusemos. Entendemos que, mesmo não sendo

este o foco de suas pesquisas, este deveria ter sido proposto ao debate, dessa forma, se

evitaria a generalização e banalização deste conceito, inclusive na Geografia. Deste

modo, o desenvolvimento sustentável coaduna com a harmonização de um pacto

transclassista, sem formulação teórica necessária para tratar a questão a que foi

elaborado, a harmonização da relação entre a sociedade e a natureza. Entendemos que

este visa, sim, compatibilizar o crescimento econômico com a recuperação e

preservação de recursos naturais, porém, sem referendar um projeto de superação do

modo de produção capitalista, por ter sido elaborado com base em seus próprios

fundamentos, o que permite a coexistência com o mesmo.

Concluímos que a institucionalização normativa do desenvolvimento

sustentável é um modelo pragmático baseado no contexto político e econômico vigente

que atende às demandas do mercado global recentemente, em termos históricos,

adequado aos alardes globais em relação ao cuidado com os recursos naturais que

oferece mecanismos técnicos, políticos e econômicos de regulação para aproveitamento

máximo dos recursos. Assim, tendo por base uma estrutura econômica e política pré-

estabelecida, apresenta importante caráter legitimador e intimador geoeconômico e

geopolítico por meio de uma espécie de logística de ordenamento territorial articulada

pelo Grupo BM tendo em vistas a maior eficácia na gestão das riquezas naturais –

consideradas como capital – e a manutenção do status quo, uma ordem hegemônica que

implica na constante vigilância para com o território voltada a manutenção do domínio

econômico e político.

Atrelada às condições materiais de reprodução do modo de produção capitalista

como desenvolvimento histórico, instituiu-se a ideologia que se torna cada vez mais

importante para a reprodução sociometabólica do capital. Neste sentido, demonstrando

que o poder da ideologia consiste em criar sistemas econômicos e políticos, por meio de

seus Think Tanks, é capaz de alienar os indivíduos em relação às formas e forças

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destrutivas, assim como o modo de produção capitalista se reproduz explorando

recursos naturais e a sociedade, destruindo e eliminando as possibilidades de que as

relações humanas sejam de fato a centralidade do processo civilizatório.

Deste modo, não há materialidade além da aparência de um modelo de

desenvolvimento criado e articulado no cerne do modo de produção capitalista. As

únicas necessidades das gerações futuras são criadas por aqueles que dominam este

modo de produção, cotidianamente. Ainda que o modelo desenvolvimentista apregoado

pela ONU e defendida por suas organizações de fomento internacional não represente a

materialidade total de um modelo de desenvolvimento, o desenvolvimento sustentável

está presente no cotidiano na forma de ações locais que aparentam uma totalidade,

portanto, negar sua existência seria também uma visão idealizada, no sentido de nos

preocuparmos em encontrar na realidade aquilo que pretendemos. E é ai que

encontramos sua essência. As ações locais revelam estratégias estanques, que não

compreendem uma totalidade de ações concatenadas para a edificação de um modelo

alternativo.

Por fim, a Geografia e algumas de suas categorias e conceitos foram

fundamentais e povoaram as reflexões aqui sistematizadas apresentando-se enquanto

componente imprescindível para a compreensão das formas como o modo de produção

capitalista promove sua reprodução no tempo e no espaço. Fato que nos permitiu

analisar o desenvolvimento sustentável, geograficamente, levando em consideração não

o desenvolvimento em si, mas sim, como este modo de produção interfere na produção

do espaço e nos territórios no diálogo com a totalidade que o compreende, pressupondo

nada menos que uma reflexão complexa porque, tão logo, as respectivas relações

espaço-temporais que o envolve e que o mesmo realiza assim também são em diferentes

configurações. Com isso, buscamos estabelecer princípios próprios que nortearam este

estudo: apresentar o conceito e sua realidade; superar a singularidade isolada e

estabelecer os nexos indissolúveis entre a aparência e a essência; apresentar a

materialidade em sua totalidade internamente contraditória; ter em conta a prioridade

ontológica da essência em relação à aparência entendendo esta como específica de um

conteúdo nomeadamente sedimentado; desfetichizar a aparência e revelar a essência da

materialidade sobre aquilo a que nos propusemos: demonstrar que o desenvolvimento

sustentável é um instrumento ideológico voltado à reprodução do modo de produção

capitalista.

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Anexo I – Questões e formulários aplicados

Informações requisitadas junto a representantes da ASCICAMPP, CATI e

produtores rurais da microbacia hidrográfica do Córrego Da Onça II138

Informações gerais do entrevistado.

Formação:

Profissão atual:

1. Informações sobre Políticas de Desenvolvimento Rural do Governo do Estado de

São Paulo

1.1 - Qual o discurso oficial do Governo do Estado de São Paulo sobre a agropecuária?

1.2 - A agropecuária é tratada como um tema relevante?

( ) Muito ( ) Pouco ( ) Irrelevante

1.3 - Existe planejamento sobre diversificação agrícola e pecuária?

( ) Sim ( ) Não

1.4 - Existe incentivo ao aprimoramento técnico?

( ) Sim ( ) Não

1.5 - Existe poder de influência por parte de organizações internacionais de

financiamento na elaboração de políticas públicas?

( ) *Sim ( ) Não ( ) Não soube responder

*Pode dar exemplos?_____________________________________________________

1.6 - Comente o poder de autonomia do Governo do Estado de São Paulo frente à:

FAO, em relação à produção e qualidade de alimentos__________________________

OMC, em relação ao comércio de produtos de gênero alimentício__________________

Grupo BM, em relação à adoção de suas diretivas______________________________

PNUMA, em relação à preservação de recursos naturais_________________________

( ) Não soube responder

1.7 - A crise econômica que se alastrou por diversos países desde meados de 2008

interferiu no planejamento de políticas públicas para o campo no Estado de São Paulo?

( ) *Sim ( ) Não ( ) Não soube responder

Por quê?__________________________________________________________

1.8 - A distribuição de recursos pelo Governo do Estado de São Paulo é realizada de

maneira correta?

( ) Sim ( ) Não

Por quê?______________________________________________________________

138

As questões aqui apresentadas foram aplicadas a todos os entrevistados, respeitando o conhecimento,

principalmente em relações aos produtores, em questões relativas as agências de fomento internacional. A

intenção foi obter informações referentes a todo o processo que envolve o PEMH, desde a sua formulação

a execução visando entender e reconhecer o nível de interação entre os distintos agentes sociais

envolvidos e, sobretudo, a influência externa e o entendimento sobre desenvolvimento sustentável.

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1.9 - Sobre a atenção aos recursos naturais pelo Governo do Estado de São Paulo,

considera que essas são:

( ) Boas ( ) Ruins

Por quê? ______________________________________________________________

1.10 - As políticas do Governo do Estado de São Paulo tem colaborado para que a

produção agrícola e pecuária em Presidente Prudente represente competitividade?

( ) Sim ( ) Não

De que forma?__________________________________________________________

1.11 - Qual o principal problema, relacionado à agropecuária em Presidente Prudente?

( ) Acesso a terra ( ) Acesso a água

( ) Problemas com o clima ( ) Tecnologia

( ) Disponibilidade de Mão de obra ( ) Disponibilidade de área agricultável

1.12 - Qual(ais) a(s) principal(ais) atividade(s) agropecuária(s) em Presidente Prudente?

1.13 - Como é a comercialização da produção?

1.14 - Entre os agricultores em Presidente Prudente existe:

Perda de rentabilidade e necessidade de diversificação?( ) Sim ( ) Não

Resistência a introdução de novas tecnologias?( ) Sim ( ) Não

Excessiva dependência de políticas públicas e ajuda técnica? ( ) Sim ( ) Não

Desenvolvimento de mercado local de consumidores? ( ) Sim ( ) Não

Visão comercial? ( ) Sim ( ) Não

1.15 - Em relação à estruturação do setor agropecuário em Presidente Prudente o

governo estadual contribui de alguma forma, para a existência de:

Cooperativas: ( ) Sim ( ) Não

Associações: ( ) Sim ( ) Não

Sindicatos: ( ) Sim ( ) Não

Redes de colaboração de trabalho voluntário: ( ) Sim ( ) Não

1.16 - As limitações para preservação de áreas naturais interferem na produção

agrícola?

( ) Sim ( ) Não

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2 - Informações referentes ao PEMH

2.1 - Qual o discurso oficial sobre o PEMH dos órgãos responsáveis pela sua

implementação?

2.2 - Quantos produtores associados foram beneficiados pelo PEMH em Presidente

Prudente?

2.3 - Quantos na microbacia hidrográfica do Córrego da Onça II?

2.4 - Quais os incentivos recebidos do PEMH pelos produtores rurais associados?

2.5 - Como você vê, de maneira geral, os resultados do PEMH?

2.6 - Os resultados do PEMH foram:

Em relação aos aspectos sociais: ( ) Positivos ( ) Negativos

Em relação aos aspectos políticos: ( ) Positivos ( ) Negativos

Em relação aos aspectos econômicos: ( ) Positivos ( ) Negativos

Em relação aos aspectos naturais: ( ) Positivos ( ) Negativos

2.7 - Você conhece o processo de implementação do PEMH na microbacia do Córrego

da Onça II?

( ) Sim ( ) *Não

* Desconsiderar as perguntas 2.8, 2.9, 2.10 e 2.11.

2.8 - Na Microbacia do Córrego da Onça II, como foram organizados os trabalhos de

mobilização dos produtores?

2.9 - Como eles participaram do programa?

2.10 - Quais foram os principais desafios?

2.11 - Em relação à questão “desenvolvimento rural” o PEMH pode ser classificado

como:

( ) Local ( ) Regional ( ) Territorial

2.12 – Quais os principais problemas do PEMH?

( ) Considerar a homogeneidade rural ( ) Todos

( ) Implementação homogênea ( ) *Outros

( ) Não manter a população rural ( ) Nenhum

*Especificar____________________________________________________________

2.13 - O sistema de organização e gestão bottom up funcionou:

( ) Bem ( ) Mal

Por quê?_______________________________________________________________

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2.14 - O PEMH contribuiu para melhorar a gestão do campo, incluindo a gestão dos

recursos naturais?

( ) Sim ( ) Não

2.15 - Em que medida o PEMH contribuiu para aumentar a competitividade do setor

agrícola e/ou pecuário na Microbacia do Córrego da Onça II?

2.16 - Houve implementação de práticas de manejo e conservação do solo e da água,

executadas pelos produtores com incentivo do PEMH?

( ) Sim ( ) Não

2.17 - Na sua opinião, a implementação do PEMH contribuiu, de alguma forma, para o

desenvolvimento rural na Microbacia do Córrego da Onça II?

( ) Sim ( ) Não

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3 - Informações referentes ao desenvolvimento sustentável

3.1 - O que você entende por desenvolvimento sustentável?

3.2 - Considera o desenvolvimento sustentável, tal como defendido pela ONU:

( ) alternativa ao desenvolvimento capitalista

( ) nova forma de reprodução do capitalismo

Por quê?_______________________________________________________________

3.3 - Considera o desenvolvimento sustentável:

( ) *Conceito ( ) *Proposta ( ) Não soube responder

*Por quê?______________________________________________________________

3.4 – O Governo do Estado de São Paulo segue os princípios da ONU em relação ao

desenvolvimento sustentável?

( ) Sim ( ) Não ( ) Não soube responder

3.5 - A ONU afirma que o desenvolvimento sustentável pode ser um modelo para a

produção agropecuária. Esse posicionamento pode estar relacionado com o fato de que:

( ) a ONU se articula para defender interesses capitalistas

( ) a ONU se articula para defender interesses humanitários

( ) a ONU entende o campo como reserva de recursos naturais

( ) a ONU entende o campo como produção de bens humanitários

( ) *Outro

*Especificar____________________________________________________________

3.6 - É possível a coexistência de dois modelos para o desenvolvimento rural, um

capitalista e outro sustentável?

( ) Sim ( ) Não

Por quê?_______________________________________________________________

3.7 - Os projetos de desenvolvimento sustentável funcionam em escala:

( ) Local ( ) Global ( ) Local

Por quê?_______________________________________________________________

3.8 - Você acredita que os projetos de desenvolvimento sustentável podem de alguma

forma romper com a mundialização do capitalismo?

( ) Sim ( ) Não

3.9 - Trabalhar com o desenvolvimento sustentável no campo, em nível local, pode ser

entendido como um estilo de vida?

( ) Sim ( ) Não

Por quê?_______________________________________________________________

3.10 - O desenvolvimento sustentável se tornou instrumento comercial?

( ) Sim ( ) Não

3.11 - O desenvolvimento sustentável pode ser entendido como ideologia?

( ) Sim ( ) Não

Por quê?______________________________________________________________

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4 - Informações referentes a desenvolvimento territorial rural sustentável

4.1 - Existe um modelo de desenvolvimento apropriado ao campo na atualidade?

( ) *Sim ( ) Não

*Qual seria?____________________________________________________________

4.2 - Qual sua opinião por políticas públicas voltadas ao desenvolvimento territorial

rural sustentável.

4.3 - Como você vê a questão do desenvolvimento alicerçado em bases territoriais como

forma de organização e planejamento para o campo?

4.4 - A incorporação capitalista de propostas, antes alternativas, como a agroecologia,

não demonstra que o capitalismo pode se adequar a novas demandas de consumidores

de produtos agrícolas?

4.5 - O PNUMA intensifica ações em prol da economia verde chamando produtores a

trabalharem com preservação de recursos naturais. Comente sobre isso.

4.6 - Qual o tipo de política pública necessária para o desenvolvimento rural na

Microbacia do Córrego da Onça II?

( ) Geração de emprego ( ) Educação

( ) Saúde ( ) Preservação natural

4.7 - É possível um modelo de desenvolvimento rural que compartilhe as necessidades

de produção e conservação de recursos naturais?

( ) Sim ( ) Não

4.8 - Qual a relação entre o desenvolvimento no campo e a preservação de recursos

naturais?

4.9 - O desenvolvimento no campo está relacionado a melhorias tecnológicas?

( ) Sim ( ) Não

4.10 - O espaço rural pode contribuir para o enfrentamento de crises?

( ) Sim ( ) Não

4.11 - A internacionalização do mercado favorece o desenvolvimento rural?

( ) Sim ( ) Não

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Informações solicitadas junto a representantes da CATI139

1 – No município de Presidente Prudente, quantos projetos de microbacias foram

implementados?

2 - Quais os critérios que levaram a escolha da microbacia hidrográfica do Córrego Da

Onça II?

3 - Em que ano foram iniciados e concluídos os trabalhos na microbacia hidrográfica do

Córrego da Onça II?

4 - Quais os objetivos estabelecidos pelo PEMH no projeto de microbacia hidrográfica

do Córrego Da Onça II?

4.1 - Os objetivos foram atingidos?

4.2 - Por quê?

5 - Como foram mobilizados os produtores da microbacia em relação à participação no

programa?

6 - Como foi a participação dos produtores da microbacia?

7 - Quais os incentivos adquiridos pelo PEMH para os produtores rurais?

7.1 - Individuais:

7.2 - Coletivos:

8 - Quais ações do PEMH foram implementadas?

9 - Houve o envolvimento de outras instituições no PEMH?

10 - Em sua opinião, quais os pontos positivos do PEMH?

11 - Em sua opinião, quais os pontos negativos do PEMH?

12 - Como os produtores rurais se mobilizaram para conseguir os incentivos coletivos?

13 - Com relação às Áreas de Preservação Permanente, no momento de execução do

PEMH, existia o cumprimento da legislação por parte dos produtores rurais?

14. O programa estimulou o fortalecimento da associação de produtores rurais?

Sim ( ) – de que forma?

Não ( ) – por quê?

Local da entrevista: Casa da Agricultura de Presidente Prudente. Av. Coronel José

Soares Marcondes 2447. Presidente Prudente-SP.

139

Formulário aplicado a integrantes da equipe de execução do Programa Estadual de Microbacias

Hidrográficas na microbacia do Córrego da Onça II, distrito de Montalvão, município de Presidente

Prudente-SP.

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Informações solicitadas junto ao representante da ASCICAMPP140

1.1 - Existe, no estatuto da associação, alguma referência à:

( ) preservação de recursos naturais nas propriedades dos associados

( ) melhoria de renda dos associados

( ) estimulo ao envolvimento político dos associados

1.2 - Quais os maiores problemas enfrentados pela associação?

1.3 - Quais os maiores problemas enfrentados pelos produtores associados?

1.4 - Quais ações são realizadas para conscientizar os trabalhadores em torno de seus

direitos?

1.5 - Quais ações são realizadas para aumentar o número de associados?

1.6 - Qual a relação da associação com órgãos de desenvolvimento rural do Estado de

São Paulo?

1.7 - Qual a importância das políticas públicas do governo do Estado de São Paulo na

visão da associação?

1.8 - De quais programas do governo do Estado de São Paulo a associação já

participou?

1.8 - Participa de algum atualmente?

1.9 - Qual das ações do governo do Estado de São Paulo possui mais importância na

visão da associação:

( ) Apoio aos jovens;

( ) Garantia de produção de alimentos;

( ) Garantir competitividade;

( ) Distribuição de recursos de forma equitativa;

( ) Proteger os recursos naturais;

( ) Manter a população rural no campo;

( ) *Outra

*Especificar

__________________________________________________________________

Locais das entrevistas: Propriedades rurais na microbacia do Córrego da Onça II,

distrito de Montalvão.

140

Formulário aplicado junto a dirigentes da ASCICAMPP.

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Anexo II – Mapa original (reduzido) das intervenções na microbacia hidrográfica

do Córrego da Onça II (CATI, 2005)