desenvolvimento rural, processos sociais e produtos agroecológicos

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Esta obra traz em detalhe diversos assuntos importantes para o desenvolvimento social, ambiental e rural num âmbito regional, mas também que as propostas e experiências dos autores relatas nestes escritos possam surtir efeito tanto a nível estadual quando nacional para o desenvolvimento da agricultura de base sustentável e familiar.

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Adamastor Pereira Barros

Marcos Barros de Medeiros

(Organizadores)

DESENVOLVIMENTO RURAL, PROCESSOS SOCIAIS E

PRODUTOS AGROECOLÓGICOS

VOLUME I

BANANEIRAS – PARAÍBA

ADAMASTOR PEREIRA BARROS

2014

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

UFPB/ CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS SOCIAIS E AGRÁRIAS,

CAMPUS III, CIDADE UNIVERSITÁRIA, BANANEIRAS PB S/Nº

CEP 58220-000 -www.cchsa.ufpb.br

ILUSTRADOR/ CAPA

Maycown Douglas de Oliveira Miranda

REVISÃO DE TEXTO E NORMALIZAÇÃO BIBLIOGRÁFICA

Heriberto Francisco Xavier

Claudiane da Silva Ferreira

1ª EDIÇÃO

Versão digital (2014)

Ficha Catalográfica

O CONTEÚDO DOS CAPÍTULOS É DE INTEIRA RESPONSABILIDADE DOS AUTORES.

É PERMITIDA A REPRODUÇÃO PARCIAL OU TOTAL DESTA OBRA, DESDE QUE CITADA A FONTE E QUE NÃO SEJA PARA VENDA OU QUALQUER FIM

COMERCIAL.

B277d

Barros, Adamastor Pereira, Medeiros, Marcos

Barros 2014-

Desenvolvimento rural, processos sociais

e produtos agroecológicos- Adamastor Pereira

Barros, Marcos Barros de Medeiros-

Bananeiras-PB Edição do Autor, 2014.

124 p. ; E-book: pdf.

ISBN: 978-85-917035-1-7

1. Ciências Agrárias, 2. Agroecologia. 3

Tecnologias Sociais

I Título

CCD:630.36

CCU: 631.1

ORGANIZADORES

ADAMASTOR PEREIRA BARROS

Licenciado em Ciências Agrárias pelo Centro de Ciências Humanas Sociais e Agrárias da Universidade Federal da Paraíba – CCHSA/UFPB

Mestrando em Produção Vegetal no Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Espírito Santo – CCA/UFES, Alegre, Espírito Santo. [email protected]

MARCOS BARROS DE MEDEIROS

Licenciado em Ciências Agrárias pelo Centro de Ciências Humanas Sociais e Agrárias da Universidade Federal da Paraíba – CCHSA/UFPB

Mestre em Agronomia CCA/UFPB

Doutor Entomologia ESALQ/Universidade de São Paulo - USP

Coordenador do Curso de Graduação em Ciências Agrárias - Licenciatura a Distância - UFPB Virtual

Coordenador Chefe da Clínica Fitossanitária do CCHSA/UFPB

Universidade Federal da Paraíba - Centro Ciências Humanas Sociais e Agrárias, Bananeiras-PB. [email protected]

6

Apresentação

A Agroecologia vem a cada dia crescendo e ganhando espaço no cenário agrícola

nacional e internacional. O Brasil vem ano a ano desenvolvendo muitas pesquisas em

parcerias com institutos e universidades para fomentar a pesquisa e a pesquisação em

agroecologia voltado para a produção sustentável de alimentos sem deixar de lado os

valores sociais envolvidos no processo de produção de alimentos em um cenário mundial

que se demanda alta eficiência produtiva nas lavouras do Brasil.

É nesse cenário de desafios para a produção de alimentos que ainda existe uma

grande lacuna a ser preenchida que o Programa de Pós-graduação em Ciências Agrárias e

Agroecologia – PPGCAG do Centro de Ciências Humanas Sociais e Agrárias da UFPB, vem

desenvolvendo pesquisas e formação de recursos humanos de alta qualidade para o

ensino, pesquisa e extensão rural.

Esta obra é fruto de esforços coletivos do Dr. Marcos Barros de Medeiros e os

autores desta obra abaixo mencionados. No inverno de 2014 na região do Brejo

Paraibano, especificamente do município de Bananeiras –PB, onde o professor Medeiros

que é Docente vinculado ao programa, contou com a disposição de vários profissionais e

estudantes vinculados ao programa, estes autores abordam temas de alta relevância para

o desenvolvimento da Agroecologia e da Agricultura Familiar para serem trabalhados e

apresentados neste compilado de Ciências Agrárias

Não apenas torna-se importante por trazer em apenas uma obra diversos assuntos

importantes para o desenvolvimento social, ambiental e rural num âmbito regional, mas

também que as propostas e experiências dos autores relatas nestes escritos possam surtir

efeito tanto a nível estadual quando nacional para o desenvolvimento da agricultura de

base sustentável e familiar.

Adamastor Pereira Barros

Sumário

CAPÍTULO 01 ....................................................................................................................................... 9

CULTURA DO TOMATE (Solanum lycopersicum): O DESAFIO DE UM

PRODUTOR NO MANEJO AGROECOLÓGICO NA ZONA RURAL DE CAMPINA

GRANDE-PB

Renally Cardoso Farias

CAPÍTULO 02 .....................................................................................................................................20

SUCESSÃO RURAL: RETRATOS DA JUVENTUDE RURAL DE SERRARIA – PB

Gustavo José Barbosa

CAPÍTULO 03 .....................................................................................................................................26

INCENTIVO A SISTEMAS AGROFLORESTAIS NA REGIÃO SUL DO PARÁ

Leopoldo Oliveira de Lima

CAPÍTULO 04 .....................................................................................................................................37

A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO

José Romário Lacerda de Barros

Adamastor Pereira Barros

CAPÍTULO 05 .....................................................................................................................................50

APLICAÇÕES DO NONI (Morinda Citrifolia L.) NA MEDICINA POPULAR

Juliana Pontes Soares

Marcos Barros de Medeiros

Rejane Pontes Soares

CAPÍTULO 6 ........................................................................................................................................67

DIFUSÃO DE TECNOLOGIAS SOCIAIS AGROECOLÓGICAS PARA A

AGRICULTURA FAMILIAR

Antonio Cardoso

Murielle Magda Medeiros Dantas

Valter da Silva

CAPÍTULO 7 ........................................................................................................................................81

O MANDACARU (Cereus jamacaru P. DC.) COMO FONTE ALTERNATIVA

ALIMENTAR ANIMAL NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO

Juliana Ferreira Gonçalves

Gilberto Nunes de Souza

Marcos Barros de Medeiros

CAPÍTULO 8 ........................................................................................................................................96

TRABALHO, SEGURANÇA E SAÚDE NA AGRICULTURA FAMILIAR

Newton Alessandro Cavalcante de Albuquerque

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

8

João Maria Soares da Silva

Adamastor Pereira Barros

CAPÍTULO 9 ..................................................................................................................................... 114

ORGANIZAÇÃO DE UMA FEIRA DE PRODUTOS AGROECOLÓGICOS

Valter da Silva

Antônio Cardoso

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

9

CAPÍTULO 01

CULTURA DO TOMATE (Solanum lycopersicum): O

DESAFIO DE UM PRODUTOR NO MANEJO

AGROECOLÓGICO NA ZONA RURAL DE CAMPINA

GRANDE-PB

Renally Cardoso Farias

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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CULTURA DO TOMATE (Solanum lycopersicum): O DESAFIO DE UM

PRODUTOR NO MANEJO AGROECOLÓGICO NA ZONA RURAL DE

CAMPINA GRANDE-PB

Renally Cardoso Farias1

INTRODUÇÃO

O enfoque agroecológico traz consigo as ferramentas teóricas e

metodológicas que nos auxiliam a considerar, de forma holística e sistêmica, as

seis dimensões da sustentabilidade, ou seja: a Ecológica, a Econômica, a Social,

a Cultural, a Política e a Ética (CAPORAL; COSTABEBER, 2002). Com base

nisso, a compreensão da Agroecologia não pode ser vista apenas em relação

aos fatores ecológico e/ou social, de forma insolada, ela deve ser vista como um

todo, compreendendo e executando as seis dimensões de forma aninhada.

Para Moraes (1997), o tomateiro destaca-se entre as hortaliças cultivadas

por ser extremamente exigente em nutrientes, apresentando demandas

diferenciadas de acordo com os estágios de desenvolvimento, a duração do

ciclo de cultivo, o genótipo e a época do ano.

Diante da crescente comercialização da cultura do tomate (Solanum

lycopersicum), e o anseio que os consumidores que visam uma qualidade de

vida sustentável têm, surge a necessidade de que a mesma seja cultivada em

ambientes orgânicos, livre de agrotóxicos e fertilizantes químicos para o

consumo humano. Com base nisso, os produtores familiares têm focado na

produção de tomate livre de todos estes resíduos químicos. Porém, a cultura tem

apresentado bastante desafio para os produtores, visto que esta necessita de

cuidados com relação ao manejo, em razão dela ser mais suscetível à incidência

e proliferação de pragas maléficas.

1 Aluna especial no Programa de Pós-Graduação em Ciências Agrárias (Agroecologia)/UFPB,

Bananeiras, PB. E-mail: [email protected]

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

11

Segundo a EPAMIG2 (1992), o tomateiro é muito suscetível a doenças,

tais como mancha-de-estenfílio, murcha-de-fusário, e mosca-branca: Bemisia

tabaci(Gennadius) que dificultam seu cultivo, notadamente quando este cultivo

é realizado a céu aberto, sendo empregados, intensivamente, produtos químicos

para controlá-las.

Assim, tendo em vista conhecer mais de perto o desafio de produtores

rurais no que tange ao manejo agroecológico do tomateiro, realizou-se um

estudo de campo no período de três dias: 22(vinte e dois) 29(vinte e nove) de

Abril, e 05(cinco) de maio de 2014. Neste sentido, os objetivos deste estudo

foram: (1) abordar o manejo agroecológico do tomate (Solanum lycopersicum)

no Sitio Catolé de Boa Vista, município de Campina Grande-PB, e (2) analisar

os desafios, nesse manejo, através de uma produção realizada por um agricultor

do referido Sítio.

Neste Sitio, foram feitas tentativas de produção agroecológica da cultura

do tomate e, devido ela ser problemática em reação ao manejo e por ter grande

susceptibilidade a pragas e doenças, sua produção, em uma área selecionada

de 1 hectare (ha), apresentou forte incidência de pragas maléficas.

Portanto, mesmo com os significativos avanços observados na cadeia

produtiva do tomate, ainda existem entraves tecnológicos a serem solucionados

para permitir maior competitividade (VILELA et al., 2001) entre a produção

convencional e a agroecológica.

REFERENCIAL TEÓRICO

O SEMIÁRIDO

Para Silva (2006), o conceito técnico de Semiárido foi estabelecido a

partir de uma norma da Constituição Brasileira de 1988, que, no seu art.

159, institui o Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE). A

norma constitucional manda aplicar, no Semiárido brasileiro, 50% dos recursos

2 Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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destinados ao Fundo. A Lei 7.827, de 27 de setembro de 1989, regulamentando

a Constituição Federal, define como Semiárido a região inserida na área de

atuação da SUDENE3, com precipitação pluviométrica média anual igual ou

inferior a 800 mm.

Silva (2006) verifica que estão sendo formuladas três propostas ou

alternativas para a realidade do Semiárido brasileiro: combater as secas e os

seus efeitos; aumentar a produção e a produtividade econômica na região,

sobretudo com base na irrigação; e convivência, combinando a produção

apropriada com a qualidade de vida da população local.

CULTURA DO TOMATE (Solanum lycopersicon)

O tomate, originário da América do Sul, é cultivado em quase todo o

mundo, e a sua produção global duplicou nos últimos 20 anos. Um dos principais

fatores para a expansão da cultura é o crescimento do consumo. Entre 1983/85

e 2003/05, a produção mundial per capita de tomate cresceu cerca de 36%,

passando de 14 kg por pessoa por ano para 19 kg, de acordo com dados da

Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO/ONU).

Para Peres (2007), o tomate é classificado, na olericultura, como uma

solanácea herbácea, de cultura anual. É uma hortaliça que possui vitaminas

em sua composição (A, C e potássio). Seus frutos podem ser consumidos in

natura, saladas, extrato, tomate seco e condimentado.

Segundo Cardoso et al. (2010), o Brasil é um dos maiores produtores

mundiais de tomate (Solanum lycopersicon), junto com a China, os Estados

Unidos, a Itália, a Turquia, a Espanha, o Egito e o México.

Diante da crescente comercialização da cultura do tomate, e o anseio que

os consumidores que visam uma qualidade de vida sustentável têm, surge a

necessidade de que a mesma seja cultivada em ambientes orgânicos, livre de

agrotóxicos e fertilizantes químicos para o consumo. Com base nisso, os

produtores familiares têm focado na produção de tomate livres de todos estes

3 Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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resíduos químicos. Sendo que a cultura tem apresentado bastante desafio para

os produtores, visto que esta necessita de cuidados com relação ao manejo, em

razão dela ser mais suscetível à incidência e proliferação de pragas maléficas.

Dessa forma, a produção da cultura do tomate, manejado de forma

agroecológica, tem crescido significativamente em razão de que o produto se

destaca com relação a sua pouca demanda e por ser produzido com base nos

princípios da agricultura orgânica. Por esta cultura apresentar dificuldade diante

do manejo orgânico, os produtores têm produzido em pequena escala, porém, o

que é produzido tem agregado valor ao produto.

O tomateiro é muito suscetível a doenças, mancha-de-estenfílio, murcha-

de-fusário, que dificultam seu cultivo, notadamente quando a céu aberto, sendo

empregados, intensivamente, produtos químicos para controlá-las (EPAMIG,

1992).

Diante disso, vem-se produzindo a cultura do tomate sob o controle dos

fatores climáticos externos, ou seja, através de sombreamento por telas e/ou

viveiros de produção, onde esta prática tem controlado e minimizado a incidência

de pragas maléficas que atacam a cultura, tais como mosca-branca, (Bemisia

tabaci), tripés (Thrips palmi), traça-do-tomateiro (Tuta absoluta)

AGROECOLOGIA

Para Godoy e Anjos (2007), objetivando a busca pela qualidade de

alimentos, os conceitos de soberania alimentar e sistemas de produção

baseados na agroecologia, ganharam muita atenção nas duas últimas décadas,

influenciando os movimentos sociais no campo e originando as feiras

agroecológicas. Dessa forma, as feiras livres têm desempenhado um papel

muito importante na consolidação econômica e social, especialmente da

agricultura familiar sob o ponto de vista do feirante, representando também um

espaço público, socioeconômico e cultural, extremamente dinâmico e

diversificado sob o ponto de vista do consumidor.

Os consumidores dos produtos de origem agroecológica, ao priorizarem

sua saúde e bem-estar, estão conscientes de que também promovem a

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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qualidade de vida e saúde para os trabalhadores rurais e que contribuem para o

estabelecimento de um novo tempo (ASSIS et al,1996).

A agricultura com base ecológica, ou melhor, orgânica, a cada dia é

reconhecida pelo mercado consumidor que almeja uma qualidade tanto do

produto quanto para a saúde humana, qualidade está vindoura em estratégias

de produção com ênfase agroecológica e a preocupação em um manejo de um

solo, em tratos culturais. Uma autonomia para não se atrelar a insumos externos,

buscando ao máximo utilizar-se dos meios que sua propriedade oferece e, com

isto, gerando economia e uma produção com base ecológica.

Segundo Melo et al. (2009), a agricultura orgânica vem ganhando cada

vez mais reconhecimento social, político e científico em todo o mundo por estar

fundamentada na aplicação de estratégias agroecológicas, mediante o uso de

insumos locais, aumentando o valor agregado e propiciando uma cadeia de

comercialização mais justa.

MANEJO ORGÂNICO

Para Moraes (1997), o tomateiro destaca-se entre as hortaliças cultivadas

por ser extremamente exigente em nutrientes, apresentando demandas

diferenciadas de acordo com os estágios de desenvolvimento, com a

duração do ciclo de cultivo, com o genótipo e com a época do ano.

Diante das problemáticas que as pragas e doenças causam de forma

avassaladora na cultura do tomate, os produtores têm dado muita importância

em um cultivo sombreado, ou em estufas, visto que este método tende a impedir

e minimizar a disseminação e proliferação das pragas, no mais, o sombreamento

dá a possibilidade de controlar os fatores climáticos externos.

De acordo com Leal (2006), a principal vantagem do sombreamento é a

ausência de chuvas no interior das estufas, fazendo com que não haja lixiviação

dos nutrientes aplicados, os quais, com o tempo, tendem a se concentrar na

superfície do solo. Quando chove, a estufa funciona como uma espécie de

chaminé, fazendo com que a umidade a sua volta migre, por difusão, para o

interior da estufa, carregando sais e aumentando a salinização.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

15

Por esta razão, se faz necessário a utilização de manejos que venham a

maximizar o controle de pragas e doenças e, dessa forma, possa fortalecer a

produção tomateira no sentido de produzir em base orgânica e um produto de

boa qualidade para o mercado consumidor.

As principais medidas de controle de doenças bacterianas em tomateiro

são: plantar sementes de boa qualidade e/ou tratar previamente as

sementes; plantar cultivares resistentes; não plantar próximo a lavouras

velhas de tomate; evitar excesso de nitrogênio usando adubação equilibrada

(EMBRAPA, 2003).

Segundo Ferreira et al. (2003), a adição de matéria orgânica ao solo

aumenta a dose do adubo nitrogenado necessária à obtenção das máximas

produções total, comercial e extra de frutos de tomate, independente da

época de plantio.

Desta forma tem acontecido na zona rural do município de Campina

Grande-PB, mais precisamente no Sítio Catolé de Boa Vista. Nesta localidade,

tem se intensificado a produção de tomate orgânico para consumo familiar,

dando certa atenção à matéria orgânica do solo, segundo informações obtidas

por um associado do Assentamento Pequeno Richard. Este associado informou

que: “se o solo está nutrido, há diversos tipos de nutrientes, consequentemente,

diante disso, a possibilidade que não haja tamanha perca no cultivo é maior”.

Quando perguntado sobre a forma que tem produzido a cultura, o

associado informou “que tem feito um banco de sementes e vem semeando em

copos descartáveis sob o controle de temperatura, ou seja, usando uma pequena

tela, visto que das sementes que foram semeadas diretamente no solo, poucas

conseguiram germinar e crescer sem que houvesse percas, no sentido de que

logo houve ataque de pragas”.

Quando perguntado, ao associado, sobre as vendas da colheita que

obteve, este comentou que o fruto in natura é muito procurado, porém, devido

esta cultura ser de difícil manuseio, e por passar por um grande período de

estiagem no Semiárido Paraibano, este não conseguiu produção para a venda e

a tentava de produção orgânica foi feita apenas para consumo familiar.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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Com relação à rentabilidade na produção orgânica de tomate, o associado

informou que há uma grande possibilidade de recursos financeiros, porém, tem

sido um desafio muito grande produzir em longa escala a cultura do tomate,

sendo que já fez a tentativa em pequena escala com todos os métodos de

manejo que poderiam ser utilizado em grande produção e, infelizmente, só houve

percas. Enfatizando o manejo adequado para a produção satisfatória do tomate,

o mesmo respondeu que, até então, uma das possibilidades de evitar danos é o

controle da temperatura externa, pois acredita que, se a cultura está protegida

por uma tela, o ataque de pragas é reduzido. No mais, informou que um dos

fatores benéficos na produção é que, antes de tudo, se tenha um solo fértil, pois,

consequentemente, haverá nutrientes suficientes para o bom desenvolvimento

do tomateiro e facilitará o controle de pragas e doenças através do uso frequente

de caldas e repelentes naturais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do assunto discutido neste trabalho, pôde-se obter claras

informações a respeito da cultura do tomate e de seu manejo agroecológico.

Este manejo é rentável e há possibilidade de sucesso no quesito colheita de boa

qualidade, porém, esta cultura exige maiores cuidados por ser muito susceptível

a pragas e doenças.

A produção convencional é descartada, pois, segundo informações do

associado que foi entrevistado, existem 50 associados que acreditam que a

produção tomateira não seria viável para o local, nem rentável, mediante ao fato

da cultura ser muito exigente no manejo e por ser de custo elevado.

Com relação ao associado entrevistado: “acredita na viabilidade da

produção tomateira realizada nos moldes agroecológicos” e afirma que “há

dificuldades na produção desta cultura” e vê esta produção como “um desafio

para agroecologia”.

Sobre as dificuldades e alternativas viáveis, precisa-se de mais incentivos

para a produção agroecológica no local, como por exemplo, uma assistência

técnica que venha a orientar os agricultores familiares de forma direta na

produção e dá subsidio à produção com práticas agroecológicas, visto que os

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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conhecimentos populares aliados aos técnicos se constituem como uma das

possibilidades de sucesso na produção do tomate.

Sobre a agroecologia e produção orgânica, o associado informa que: “é

viável, é rentável, e a única dificuldade de produzir nos dias de hoje é a questão

da escassez de água no local e a falta de profissionais que possam orientar os

pequenos produtores”.

Este trabalho indica que a produção do tomate orgânico estar a cada dia

crescendo no Brasil e sendo escolhido na mesa dos consumidores que prezam

pela saúde humana e por um consumo de qualidade. No distrito de Catolé de

Boa Vista, especificamente no lote do produtor Francinildo Filho Silva, a

produção do tomate ainda não é viável com base no manejo agroecológico, uma

vez que se nota a realização intensiva de praticas conservacionista, por parte

dos pequenos agricultores, e isso dificulta, por exemplo, a ministração de oficinas

e a difusão de ideias agroecológicas naquela localidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFIAS

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DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

18

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DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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CAPÍTULO 02

SUCESSÃO RURAL: RETRATOS DA JUVENTUDE

RURAL DE SERRARIA – PB

Gustavo José Barbosa

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

21

SUCESSÃO RURAL: RETRATOS DA JUVENTUDE RURAL DE SERRARIA -

PB

Gustavo José Barbosa4

INTRODUÇÃO

O Estatuto da Juventude sancionado pela Presidente da República, Dilma

Rousseff, com a Lei 12.852 de 05 de Agosto de 2013, afirma que: “são

consideradas jovens as pessoas com idade entre 15 (quinze) e 29 (vinte e nove)

anos de idade” (BRASIL, 2013). Na agricultura familiar, esta parcela significativa

da população passa por um momento de instabilidade, pois, não se vislumbra a

médio e longo prazo condições que lhes garantam uma vida financeira estável e

digna.

O êxodo rural é uma ameaça constante para o futuro do campesinato, e

ainda é uma temática pouco explorada pela academia e por organismos

governamentais que, ao tratar do tema “juventude” tende a generalizar a

discussão, não observando as especificidades desta parcela que habita no

campo (Castro, 2009). Por outro lado, entidades que representam o campesinato

brasileiro, como a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura

(CONTAG), tem apresentado ao Governo Federal uma pauta extensão em prol

da juventude de campo, que engloba ações que vão do acesso à terra até a

qualificação profissional (CONTAG, 2014).

Num estudo realizado por Brasil (2005), observou-se que os

pesquisadores que se arriscam a estudar esta problemática da juventude

campesina, se deparam com duas situações desafiadoras: a constante migração

e a falta de clareza da realidade desta fatia da população brasileira. Um dos

desafios dos órgãos que trabalham pela permanência do jovem no campo, é

identificar os motivos que os levam a migrar para zona urbana, e quais ações

podem ser construídas com os sujeitos deste contexto, para gerar condições

dignas de permanência na gleba (BRASIL, 2013).

4 Aluno do Programa de Pós-graduação em Ciências Agrárias (Agroecologia) da Universidade

Federal da Paraíba. E-mail: [email protected]

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

22

Nos últimos anos, o Governo Federal através do Ministério do

Desenvolvimento Agrário (MDA), tem promovido algumas políticas públicas com

o objetivo de manter o jovem camponês nas atividades que sua família

desenvolve há gerações. Entre estas ações, podemos citar a aquisição de

propriedades pelo Minha Primeira Terra do Programa Nacional de Crédito

Fundiário (PNCF), e o Crédito Rural através do Programa Nacional de

Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF Jovem).

Especialmente no Nordeste, o acesso a estas políticas públicas ainda é

tímido, pois a dinâmica de organização dos jovens campesinos (associação,

sindicato e cooperativa) ainda é pequena, logo, as conquistas alcançadas junto

ao Governo são pouco difundidas na base. Outro fator considerável, é a falta de

ação das entidades para planejar junto com os jovens a operacionalização das

atividades, sejam os órgãos de extensão rural públicos ou do terceiro setor.

Neste sentido, buscamos conhecer o perfil da juventude rural do município

de Serraria-PB, para que a partir deste desenho social, possamos vislumbrar

ações concretas que possibilitem construir um futuro de dignidade nas

comunidades rurais. Este desafio só será alcançado através da organização dos

jovens, mapeando seus problemas, buscando traçar caminhos que alcancem

bons resultados, através da interação dos órgãos que trabalham com esta

parcela vital para a sobrevivência da agricultura familiar, e o futuro do país.

PERFIL DA JUVENTUDE

Este trabalho foi realizado no município de Serraria-PB, inserido no

Território da Borborema, e organizado em diversas comunidades rurais e

assentamentos da reforma agrária. Foi aplicado um questionário previamente

elaborado com jovens rurais nas seguintes comunidades: Campineiro, Matinha,

Pau Barriga e Salamandra.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

23

Tabela 01. Frequência observada por região (%) e total (%) das características

sociais de jovens rurais no município de Serraria, Estado da Paraíba.

Variáveis Resultados

Idade (anos) (%)

Entre 15 e 20 50,00

Entre 20 e 25 25,00

Entre 25 e 29 25,00

Sexo (%)

Masculino 50,00

Feminino 50,00

Estado Civil (%)

Solteiro 62,50

Casado 12,50

União Estável 25,00

Escolaridade (%)

Alfabetizado 12,50

Fundamental Incompleto 43,75

Médio Incompleto 18,75

Médio Completo 12,50

Superior Incompleto 12,50

Integração

Igreja 43,75

Associação 18,75

Sindicato 18,75

Nenhum 18,75

Na tabela 01 são apresentados os dados relativos à idade, onde 50% dos

jovens estão na faixa de 15 a 20 anos, sendo um ponto importante a ser

analisado, pois neste período está sendo formada a consciência crítica do

indivíduo e seus planos para o próximo período. Com relação ao sexo, percebe-

se ainda na tabela 01 que há um equilíbrio entre jovens do sexo masculino e

feminino, demonstrando a necessidade de trabalhar ações afirmativas de

gênero, para que as mulheres tenham condições de desenvolver suas atividades

produtivas sem prejuízos presentes constantemente na sociedade.

Com relação ao estado civil, é possível visualizar que mais de 60% ainda

é solteiro, o que demonstra a tarefa de divulgar as políticas públicas que

garantam a permanência destes jovens no campo. No que trata da escolaridade,

conclui-se que houve um significativo avanço em relação a um passado recente

no Brasil, onde tínhamos uma população rural analfabeta, já que a pesquisa

mostra que mais de 70% dos entrevistados já ultrapassou a barreira do

analfabetismo e está ativo na dinâmica escolar.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

24

Um dos fatores que possibilitará a organização e a permanência do jovem

no campo será a sua participação efetiva em entidades que os represente.

Identificamos na pesquisa que mais de 40% frequenta com assiduidade a Igreja,

majoritariamente a Católica Romana. Após o Concílio Vaticano II, a Igreja

Católica Apostólica Romana (ICAR) iniciou um trabalho de base voltado para as

questões sociais, e hoje é possível visualizar inúmeros organismos que

trabalham a temática campesina, que podem contribuir com a juventude rural:

Pastoral da Juventude Rural (PJR), Serviço de Assistência Rural (SAR) e a

Comissão Pastoral da Terra (CPT); os religiosos ligados a Teologia da

Libertação, ao se aproximaram dos movimentos sociais, enaltecem a

convergência entre a religião e a luta campesina, atraindo assim a juventude

para a comunidade religiosa (BRASIL, 2009).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa nos aponta a existência de uma juventude que luta para ter

uma vida diferente dos seus pais, que na maioria das vezes não ultrapassou a

barreira do analfabetismo e, consequentemente não encontrou condições para

crescer na dinâmica organizacional da sua Unidade Familiar de Produção (UFP).

Logo, o panorama aponta a possibilidade de realizar um trabalho eficiente, que

através da inserção dos jovens nas políticas públicas voltadas para a agricultura

familiar, dê condições para que eles permaneçam no campo.

A agricultura familiar tem se apresentado na economia brasileira como

setor de grande importância na produção de alimentos, fazendo-se necessária a

garantia da sucessão rural, para que a população nas décadas vindouras não

enfrente uma crise na segurança alimentar. O trabalho com a juventude rural

garantirá ao País a estabilidade de milhares de cidadãos, a produção de base

familiar de qualidade utilizando tecnologias adaptadas e agroecológicas, e a

construção de uma pátria soberana que bem antes da chegada dos europeus no

século XVI já era agrícola.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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REFERÊNCIAS

Brasil. Antônio Maria Gomes de Castro (et al). Juventude rural, agricultura

familiar e políticas de acesso à terra no Brasil. Brasília: Mda, 2013. 56 p.

BRASIL. Elisa Guaraná de Castro. UFRRJ. Os jovens estão indo embora? :

Juventude Rural e a construção de um ator político. Rio de Janeiro: Mauad, 2009.

223 p

BRASIL. Nilson Weisheimer. Juventudes rurais: mapa de estudos

recentes. Brasília: Mda, 2005. 76 p.

BRASIL. Lei nº 12.852, de 05 de agosto de 2013. Institui o Estatuto da

Juventude e dispõe sobre os direitos dos jovens, os princípios e diretrizes das

políticas públicas de juventude e o Sistema Nacional de Juventude - SINAJUVE.

Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-

2014/2013/Lei/L12852.htm. Acesso em: 01/05/2014.

CASTRO, E. G. Juventude Rural no Brasil: processos de exclusão e a

construção de um ator político. Revista Latino-americana de Ciências Sociais. V.

7, p. 179-208, 2009.

CONTAG. Sobre a Sucessão Rural. Disponível em

http://www.contag.org.br/index.php?modulo=portal&acao=interna&codpag=387

&ap=1&nw=1. Acesso em: 01/05/2014.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

26

CAPÍTULO 03

INCENTIVO A SISTEMAS AGROFLORESTAIS NA

REGIÃO SUL DO PARÁ

Leopoldo Oliveira de Lima

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INCENTIVO A SISTEMAS AGROFLORESTAIS NA REGIÃO SUL DO PARÁ

Leopoldo Oliveira de Lima 5

INTRODUÇÃO

Sistemas Agroflorestais (SAF’s), segundo Rebraf (2007), podem ser

definidos como o cultivo de espécies agrícolas de ciclo curto, frutíferas, perenes

lenhosas (árvores, arbustos, palmeiras, bambus), florestais (madeireiras e não

madeireiras) e/ou criação de animais, quando manejados no mesmo espaço

físico e tempo, de forma intencional. Segundo Adbo (2008), para ser considerado

um Sistema Agroflorestal, necessariamente, deve haver uma espécie florestal

com utilização, madeireira ou não madeireira, neste sistema de produção.

No mesmo Módulo, deve-se procurar cultivar e manejar diferentes

espécies de vegetais de diferentes grupos ecológicos sucessionais (pioneira,

secundária e clímax) em diferentes estratos arbóreos. Os SAF’s possuem várias

vantagens, dentre elas podemos destacar: o melhoramento das condições físico-

químicas e biológicas dos solos devido a constante ciclagem de nutrientes entre

os seres vivos e o solo existentes nos sistemas.

Para Vasquez e Costas (2011), os SAF’s contribuem no controle da

erosão do solo devido a permanente cobertura do mesmo; possibilitando a

ocupação do solo com maior aproveitamento da luz, dos nutrientes e da água

presentes no sistema em virtude do cultivo, ao mesmo tempo de diferentes

espécies vegetais com exigências nutricionais divergentes.

Outra vantagem, segundo Abdo (2008), está na possibilidade de

recuperação de áreas degradadas e, por conseguinte, regularização ambiental

dos estabelecimentos familiares junto aos órgãos ambientais governamentais.

Do ponto de vista socioeconômico, as principais vantagens, conforme

Barreto [19-?], devem-se a uma melhor distribuição de mão-de-obra familiar, ao

5 ¹ Engenheiro Agrônomo, Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Ciências Agrárias

(Agroecologia), Universidade Federal da Paraíba - Campus III, Bananeiras - PB, e-mail: [email protected]

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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longo do ano, gerando renda e emprego, bem como maior variedade de

alimentos disponíveis, garantindo segurança alimentar e nutricional aos

agricultores familiares; outra característica de SAF’s consiste na redução dos

riscos de perda da produção, devido ao maior "equilíbrio" do sistema

diversificado com a produção de frutas, culturas brancas, produtos florestais não-

madeireiros e produtos florestais madeireiros.

A implantação de SAF’s está atrelada a vários princípios agroecológicos,

dentre os quais se destaca a diversificação específica e genética do

agroecossistema no tempo e no espaço. Segundo Altieri. et al. (1989), também

permite o aumento das interações biológicas, os sinergismos entre os

componentes do sistema, promove importante processos e serviços ecológicos.

Possibilita, ainda, condições de solo favoráveis para o crescimento das plantas,

particularmente, através do manejo de matéria orgânica, aumentando a atividade

biótica do solo.

Portanto, neste trabalho será discutido sobre os Sistemas Agroflorestais,

tomando por base uma experiência de incentivo à sua implantação no Projeto de

Assentamento Pecosa, na região Sul do Estado do Pará, no município de

Conceição do Araguaia. O processo de incentivo à implantação de SAF’s ocorreu

em três etapas, a primeira se inicia a partir de 1996, com implantação de módulos

demonstrativos de SAF’s em estabelecimentos familiares, com assessoria de

Organizações Não Governamentais de região. A segunda fase ocorreu em 2004

com a elaboração do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Assentamento,

onde se propõe a implantação de módulos de SAF’s como política pública de

desenvolvimento sustentável para região. E a terceira etapa, entre 2010 e 2013,

se dá a partir da contratação de operações de crédito rural através do Programa

Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar(PRONAF), tendo como

proposta de desenvolvimento a implantação de SAF’s e/ou sistemas de

fruticultura consorciados, quando a implantação de módulos SAF’s torna-se uma

política pública de desenvolvimento.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

29

RELATO DA EXPERIÊNCIA

O presente trabalho tem por objetivo relatar algumas experiências de

diversificação de sistemas de produção de agricultores familiares, no município

de Conceição do Araguaia, a partir da implantação de módulos demonstrativos

de Sistemas Agroflorestais, da elaboração de Planos de Desenvolvimento

Sustentáveis dos Assentamentos (PDSAs) e da implantação de algumas

propostas de desenvolvimento de SAF’s a partir do Programa Nacional de

Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF).

O município de Conceição do Araguaia, localizado na região Sul do

Estado do Pará, no bioma Amazônia, possui um clima tropica com uma estação

chuvosa e uma estação seca bem definidas. A vegetação, predominante na

região, é Floresta Amazônica, com algumas áreas de transição para o Cerrado.

O sistema de produção praticado na região, conhecido como "roça de

toco" ou agricultura migratória, consiste na derrubada e queima da mata nativa

e na implantação de culturas alimentares anuais, quase sempre acompanhadas

de gramíneas para a formação das pastagens. Este sistema baseia-se na

fertilidade natural dos solos e por meio das cinzas e possibilita que haja,

inicialmente, uma grande diversidade de espécies cultivadas, além de, durante

o período de pousio, permitir a regeneração de parte das espécies vegetais

presentes na área.

No entanto, na medida em que cresce a demanda pelo uso da terra,

percebe-se que este período de pousio não tem sido adotado por boa parte dos

agricultores familiares, que recorrem à implantação de pastagens logo no

primeiro ano. Tem-se verificado que esta prática contribui para o aumento da

degradação ambiental na medida em que aumentam as áreas de abertura e,

também, as áreas desgastadas pelo uso contínuo.

O processo de implantação de SAF’s na região do Sul do Pará teve início

na década de 1990, quando os agricultores familiares da região já haviam

conquistado as terras com luta, sangue e organização. Era necessário dar um

passo a mais: viver de forma digna na zona rural com desenvolvimento

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

30

econômico, gerando emprego e renda com conservação do meio ambiente.

Segundo o PDH e a DIOCESE DE CONCEIÇÃO DO ARAGUAIA (2000), a partir

de uma discussão entre o Sindicato de Trabalhadores Rurais (STR) de

Conceição do Araguaia-PA e o STR de Floresta do Araguaia-PA, com a

assessoria técnica do Projeto de Desenvolvimento Humano (PDH) - Diocese de

Conceição do Araguaia, e da Comissão Pastoral de Terra (CPT) foi avaliado que

a implantação de SAF’s ser uma alternativa aos agricultores familiares como

forma de diversificação da produção frente ao processo de pecuarização dos

estabelecimentos familiares da região.

Segundo Copatiorô (2004), entre 1995 e 1996, foram implantados no

Projeto de Assentamento Pecosa, em Conceição do Araguaia-PA, 09 (nove)

Módulos Demonstrativos de SAF’s. Neste processo, houve apoio do

Departamento Nacional de Cooperativismo (DENACOOP), recebendo, cada

família participante do Projeto, R$ 1.000,00 (um mil reais), sem devolução, para

iniciar as atividades produtivas (aquisição de mudas, sementes, saquinhos e

construção de viveiros). O local definido para desenvolver os módulos de SAF’s,

dentro do estabelecimento, foi discutido com a família observando as condições

edafoclimáticas, bem como, a topografia do lote.

De acordo com o PDH e a DIOCESE DE CONCEIÇÃO DO ARAGUAIA

(2000) e Copatiorô (2004), foram implantados módulos com as seguintes

espécies vegetais: banana (Musa spp), cupuaçu (Theobroma grandiflorum

Schum), café (Coffea arábica L.), ingá (Inga sp), manga (Mangifera indica L.),

citrus (Citrus spp), coco (Cocos nucifera L.), maracujá (Passiflora edulis Sims),

abacaxi (Ananas comosus L. Merril), caju (Anacardium occidentale L.), acerola

(Malpighia punicifolia L.), bacaba (Oenocarpus bacaba Mart.), cacau

(Theobroma cacao L.) e algumas espécies florestais nativas da região como

jatobá (Hymenaea courbaril L.), cedro (Cedrela fissilis Vell) e mogno (Swietenia

macrophylla King).

No início do processo de plantio das mudas, em cada módulo, foi

sugerido, nas entrelinhas, o cultivo de culturas anuais como arroz (Oryza Sativa

L.), milho (Zea mays L.) e mandioca (Manihot esculenta Crantz), visando a

segurança alimentar das famílias, podendo, também, aproveitar áreas de

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

31

capoeiras e enriquecê-las com as espécies frutíferas e florestais. Os Módulos

estavam se desenvolvendo bem nas condições locais, mas, em 1998, uma

queimada descontrolada dizimou a maioria dos módulos de SAF’s do Projeto de

Assentamento, segundo Copatiorô (2004).

A partir destes Módulos Demonstrativos de SAF’s, em 2004, a

Cooperativa de Serviço e Apoio ao Desenvolvimento Humano e Sustentável

Atiorô (COPATIORÔ) buscou incentivar a multiplicação destas experiências

como Políticas Públicas. Este processo se deu através da elaboração de Projeto

de Desenvolvimento Sustentável do Assentamento (PDSA) em convênio com o

INCRA (Instituto Nacional de Reforma Agrária), com a inclusão de módulos de

SAF’s como proposta de desenvolvimento para agricultores familiares

assentados da reforma agrária.

Com metodologia de pesquisa participativa, respeitando o histórico de

experiência passadas, as condições locais dos estabelecimentos familiares e os

saberes locais das populações durante o processo de construção do PDSA do

Projeto de Assentamento Pecosa, foram sugeridos, às famílias do Projeto, dois

tipos de Módulos. Para aquelas famílias que possuíam áreas mais secas e mais

altas foram sugeridos Módulos "Tipo Sol", isto é, aquelas que apresentassem

espécies vegetais que eram mais exigentes em luminosidade, com boa

aceitação comercial e que eram cultivadas por algumas famílias. Foram

propostos módulos com as seguintes culturas: citrus (Citrus spp), coco (Cocos

nucifera L.), acerola (Malpighia glabra L.), abacaxi (Ananas comosus L. Merril).

Os Módulos "Tipo Sombra" (Figura 1) foram propostos para agricultores

familiares com espécies vegetais que necessitavam de sombreamento. O

objetivo desses módulos era a reposição florestal das áreas derrubadas, além

de enriquecer as áreas de mata remanescentes com culturas comerciais. Nestes

módulos foram propostas as seguintes culturas: cupuaçu (Theobroma

grandiflorum Schum), café (Coffea spp L.), banana (Musa spp), e castanha-do-

pará (Bertholettia excelsa H.B.K.).

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

32

Figura 1 - Módulo de sombra com cultivo de banana e cupuaçu – Foto: Leopoldo

Oliveira de Lima

A partir destas experiências, várias propostas de crédito do PRONAF

(Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) foram

contratadas na Agência do Banco da Amazônia de Conceição do Araguaia-PA.

Entre 2010 e 2013, foram efetivadas 38 (trinta e oito) operações de crédito rural

do PRONAF-A para agricultores familiares do Projeto de Assentamento Pecosa.

Todas as operações de crédito possuíam como elemento e proposta de

desenvolvimento a implantação de SAF’s e/ou sistemas de fruticultura

consorciados, totalizando um valor de R$ 761.478,85 em investimentos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Existem alguns desafios para implantação dos SAF’s na região Sul do

Estado do Pará: o primeiro consiste na dificuldade para realizar a irrigação das

mudas de espécies florestais e frutíferas na primeira estação seca após o plantio

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

33

das mesmas. Muitas vezes por haver carência de rede de energia na zona rural

da região, ou por não haver recursos financeiros para aquisição dos

equipamentos de irrigação (canos, bombas). Assim, a irrigação é feita de cova

em cova com regadores manuais, demandando muito tempo e esforço físico das

famílias. Muitas vezes, os Módulos não se desenvolvem de forma satisfatória,

chegando, algumas plantas, a morrerem por deficiência hídrica (Figura 2).

Figura 2- Frutífera morta devido a déficit hídrico- Foto: Leopoldo Oliveira de

Lima

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

34

Outro desafio, difícil de ser superado e que desestimula muitas pessoas

que desejam trabalhar com SAF’s, são as queimadas descontroladas que

geralmente, ocorrem todos os anos no período de julho a setembro, matando e

destruindo pomares, casas (Figura 3), animais silvestres e domésticos,

pastagens, matas, além dos módulos de Sistemas Agroflorestais.

Figura 3- Moradia destruída pelo fogo- Foto: Leopoldo Oliveira de Lima

É necessário, também, que os profissionais de ciências agrárias, a

maioria formada para trabalhar e difundir tecnicamente os conceitos da chamada

Revolução Verde, principalmente os envolvidos com a Assistência Técnica e a

Extensão Rural (ATER), mudem suas mentalidades, transformando o paradigma

de desenvolvimento que possuem e passem a incentivar a implantação de SAF’s

aos agricultores familiares campesinos, como instrumento para transição

agroecológica dos sistemas agrários.

Apesar destas dificuldades, já existem agricultores familiares com

experiências bem sucedidas de SAF’s na região Sul do Pará, onde os mesmos,

além de produzirem frutos, lenha, óleos essências, madeira, também fazem a

integração de seus sistemas de produção vegetal com a criação de abelhas,

peixes, bovinos e suínos, gerando renda, trabalho e segurança alimentar para

as famílias.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

35

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABDO, Maria Teresa Vilela Nogueira; VALERI, Sérgio Valiengo; MARTINS,

Antônio Lúcio Mello. Sistemas Agroflorestais e Agricultura Familiar: Uma

Parceira Interessante. Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária, [si], v. 1,

n. 2, p.53-59, dez. 2008.

ALTIERI, Miguel et al. Agroecologia: As Bases Científicas da Agricultura

Alternativa. 2. ed. Rio de Janeiro: AS-PTA, Assessoria e Serviços & Projetos em

Agricultura Alternativa, 1989. 237 p.

BARRETO, George Thomas Pacheco. SAF’s (A Castanheira Feliz). Marituba:

Emater-Pará, [19-?]. 14 p.

COOPERATIVA DE SERVIÇO E APOIO AO DESENVOLVIMENTO HUMANO E

SUSTENTÁVEL ATIORÔ - COPATIORÔ (Pará). Plano de Desenvolvimento

Sustentável do Projeto de Assentamento Pecosa. Conceição do Araguaia,

2004. 97 p.

PROJETO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO (PDH) - DIOCESE DE

CONCEIÇÃO DO ARAGUAIA/COMISSÃO PASTORAL DA TERRA - CPT

(Org.). Sistemas agroflorestais como uma alternativa para a agricultura

familiar do Sul do Pará: Relato de Experiência em Conceição do Araguaia e

Floresta do Araguaia -Pará. Conceição do Araguaia, 2000. 28 p.

REBRAF. Manual Agroflorestal para a Mata Atlântica. [si], 2007. 53 p.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

36

UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL (UAB). Cadernos de Licenciatura em

Ciências Agrárias, Universidade Federal da Paraíba; Centro de Ciências

Humanas Sociais e Agrárias; Organizadores: Marcos Barros de Medeiros,

Geralda Macedo, Luís Felipe de Araújo – Autores: Silvestre Fernandez Vásquez

e José Roberto da Costa. Sistemas Agroflorestais. Bananeiras: Editora

Universitária/UFPB, 2011. v.7. Caderno Especial 04.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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CAPÍTULO 04

A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO

SEMIÁRIDO BRASILEIRO

José Romário Lacerda de Barros

Adamastor Pereira Barros

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO

José Romário Lacerda de Barros6

Adamastor Pereira Barros

INTRODUÇÃO

Cerca de um terço da superfície terrestre está emersa pela água deste

volume 97,5% constituem-se águas salgadas disponíveis nos oceanos e que não

se adéquam para a maior parte das atividades humanas devido às elevadas

taxas de sais encontradas em sua composição, já os outros 2,5% constitui-se

como água doce essencial para os diferentes usos, deste valor 68,9%

encontram-se em forma de geleiras; 29,9% são as águas subterrâneas; 0,3%

são os rios e lagos e 0,9% são os demais reservatórios.

O Brasil abriga 13% dos recursos hídricos do todo o total disponível do

planeta, só que estes se encontram geograficamente distribuídos de forma

heterogênea. Mais de 68,5% do volume de água está na região norte onde vivem

cerca de 6,98% da população; na região centro oeste o volume é de 15,7 para

6,41% da população; na região sudeste onde vive quase a metade da população

brasileira cerca de 42,65% detém apenas um volume de 6% na região sul possui

um volume de 6,5% para uma população de 15,05% e a região nordeste possui

um valor de apenas 3,3% para uma população de 28,91%.

A região nordeste é caracterizada pela ocorrência de duas estações, a

chuvosa que advém em poucos meses do ano e a seca que sobrevém na maioria

dos meses, altas temperaturas, distribuição heterogenia das chuvas e pela baixa

umidade.

Cirilo et al (2005, p. 82) destaca que “o clima do semiárido é marcado por

um regime de chuvas intensamente limitado em quatro meses fevereiro a maio,

6 Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Ciências Agrárias (Agroecologia)/UFPB,

Bananeiras, PB. E-mail: [email protected]

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

39

e por uma grande variabilidade interanual”. Exclusivamente em todo semiárido,

a precipitação média ocorre entre 300 e 800 mm/ano (REBOUÇAS, 1997). A

evaporação da região nordeste atinge 3000 mm/ano (ROBERTO, 2007).

Carvalho (2013, p. 3) ressalva que “o subsolo rico em rochas cristalinas, de baixa

permeabilidade, dificulta a infiltração de água no subsolo, contribuindo para que

seja inibida a formação de aquíferos subterrâneos”.

Este capítulo objetiva contribuir para a conscientização da problemática

da escassez hídrica e promover o envolvimento da sociedade nos debates e

ações decisórias relativas à gestão dos recursos hídricos, com ênfase na região

semiárida.

Sua elaboração foi baseada em pesquisa bibliográfica, fundamentadas

em partes de trabalhos de autores da área afim e em consenso com a política

ambiental do país e com isso espera-se colaborar para a evolução do

conhecimento dessa temática que é de suma importância para todos.

ASPECTOS SOCIAIS

Águas urbanas, disponibilidade e impactos

Segundo Mucelin e Bellini (2008, p. 111) “a criação das cidades e a

crescente ampliação das áreas urbanas têm contribuído para o crescimento de

impactos ambientais negativos”. A dinâmica das cidades depende de uma série

de fatores relacionados a eventos severos ou indesejáveis, que podem repercutir

nas atividades e na vida da sociedade causando transtornos devido à

distribuição do espaço urbano (RIGHETTO et al, 2009). Com o processo de

urbanização os impactos sobre os corpos de água tende a alargar em volume e

velocidade o escoamento superficial, reduzindo a recarga de aquíferos,

deteriorando os mananciais e aumentando a vazão de pico, se comparadas às

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

40

vazões observadas para a bacia em seu estado natural (JUNIOR, 2009).

Com o avanço industrial o número de fabricas aumentou

progressivamente e com isso os materiais trabalhados não são tratados e são

lançados diretamente nos rios e córregos, esses materiais podem ser metais

pesados que quando em contato com os corpos hídricos podem causar

mortandade de várias espécies na vida marinha, e assim causar um grande

abalo no ecossistema.

Águas rurais e acessibilidade

A água também traz

dificuldades para os moradores das

zonas rurais quanto a sua

acessibilidade, uma vez que no

semiárido nordestino em

decorrência da falta de tecnologias

poupadoras de água, a população

rural enfrenta um caos nos períodos secos.

Os reservatórios no campo são em sua grande maioria de pequeno porte

e estes se esgotam muito precocemente, como a região devida suas

características geológicas não permitem a perfuração de poços com grandes

vazões, sobrevêm nas propriedades de uma maneira homogenia a perca das

plantações, falta de alimentação para o gado e consequente queda de produção

agropecuária acarretando a falta de renda e migração dos habitantes para as

zonas urbanas.

O fornecimento de água pelas companhias de abastecimento ainda são

muito incomuns nas zonas rurais, a população continuamente fica prendida o

assistencialismo simples do abastecimento por carros-pipa e a qualidade destas

águas é desconhecida na maioria dos casos.

Figura 1: Semiárido da Paraíba. Foto: JRL Barros.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

41

Açudagem, transposição e programa 1 milhão de cisternas

Os terrenos nordestinos dificultam a retenção de água no solo a qual se

perde rapidamente devidos estas características e também ao fato das chuvas

locais serem de alta intensidade em um curto período de tempo favorecido pelo

rápido escoamento superficial. Com isso tornou-se necessário a fim de guardar

a água nessas extensões, a construção de obras hídricas, como barreiros,

cisternas, açudes e barragens. Barbosa e Ponzi Jr. (2006, p. 32) destacam que

“a construção de grandes açudes públicos pelo Departamento Nacional de

Obras Contra as Secas (DNOCS) veio acompanhada de uma proposta de

reordenação da estrutura fundiária”.

O Programa 1 Milhão de Cisternas (P1MC) visa a articulação e a

convivência sustentável com o Semiárido. A finalidade do P1MC é favorecer

cerca de 5 milhões de pessoas no semiárida, com água potável pelo meio das

cisternas de placas. As bases para criação do P1MC foram à experiência por

parte da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) foi a captação de água de chuva

por iniciativa familiar (CASTRO, 2011).

A integração da bacia do rio São Francisco tema mais discutido no

nordeste, mira transpor parte das águas a jusante do lago de Sobradinho através

de aquedutos e bombeamento por dois eixos até rios e açudes dos estados de

Ceará, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte. O assunto é cercado de

polêmicas, pois tem grande importância para o abastecimento da região

nordeste, mas tem entraves ambientais devido à dimensão da obra. Becker

(2010, p. 3) destaca que “para o governo federal, este projeto representa a

redenção do Semiárido, uma vez que tem por objetivo beneficiar até 2025, 390

municípios e 12 milhões de sertanejos que enfrentam a seca”.

Usos da água

1) Agricultura

A agricultura é responsável por 70 % do uso da água no mundo. A maioria

dos sistemas de irrigação atuais não são eficientes e assim desperdiçam a água

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que ultrapassa os limites de demanda adequados para cada cultura. Outra

dificuldade é a diminuição do estoque de água refletem na própria atitude em

reflexos negativos, a escassez prejudica no caso da agricultura irrigada no

abastecimento de alimentos provocando aumento dos preços dos alimentos.

2) Industrial

O uso da água no setor industrial se caracteriza por ser realizado de

variadas formas, a citar o uso como insumo no processo produtivo a exemplo do

que é mostrado na figura abaixo, o uso em sistemas de utilidades (resfriamento,

caldeiras etc.) e para fins sanitários.

3) Consumo urbano e rural

A crescente e continuada urbanização alarga a demanda de água para

tratamento e fornecimento, assim como as ações antrópicas nas cidades para a

realização das necessidades diárias, nas cidades os desperdícios com lavagem

de calçadas e de veículos. É muito comum à água que abastece as cidades

prover de regiões circunvizinhas. É necessário um esforço ambiental educativo

da população para a utilização de metodologias eficientes como o reuso da água

que consiste no uso de água residuária ou água de qualidade inferior tratada ou

não.

O consumo rural continua sendo um dos que menos consume água no

nordeste em virtude da diminuição da população rural e da ausência de

abastecimento por companhias de abastecimento no campo, o consumo rural é

baseado na captação da água da chuva através das cisternas para utilização

das principais atividades normalmente beber e preparação de alimentos.

4) Hidrelétricas

A energia hidrelétrica é a obtenção de energia elétrica através do

aproveitamento do potencial hidráulico de um rio. Para que esse processo seja

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

43

realizado é necessária à construção de usinas em rios que possuam elevado

volume de água e que apresentem desníveis em seu curso.

Os impactos ambientais ocasionados pelo represamento da água para a

formação de imensos lagos artificiais são: destruição de extensas áreas de

vegetação natural, matas ciliares, o desmoronamento das margens, o

assoreamento do leito dos rios, prejuízos à fauna e à flora locais, alterações no

regime hidráulico dos rios e extinção de algumas espécies de peixes.

ASPECTOS DE LEGISLAÇÃO

A Lei 9433 de 08 de janeiro de 1997

A Lei Nº. 9.433, institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o

Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, com o objetivo de

assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água,

em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos, com vistas ao

desenvolvimento sustentável; a prevenção e a defesa contra eventos

hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do uso inadequado dos

recursos naturais (BRASIL, 1997).

O atual modelo de gerenciamento de recursos hídricos é discutido em três

modelos: modelo burocrático, modelo econômico-financeiro e modelo sistêmico

de integração participativa.

No primeiro modelo, Borsoi e Torres (1997, p. 9) destacam que “a

administração pública tinha como objetivo predominante cumprir e fazer cumprir

os dispositivos legais sobre águas. Havia extensa legislação a ser obedecida,

relativa a concessões e autorizações de uso, licenciamento de obras, ações de

fiscalização, interdição e multa etc.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

44

O segundo modelo levava a obediência aos princípios legais vigentes,

não conseguiu levar a utilização social e econômica da água, gerando conflitos

entre os setores (PIZAIA et al., 2007).

O mais contemporâneo modelo de gerenciamento de recursos hídricos é

o sistêmico de integração participativa, caracterizado pela criação de uma

estrutura sistêmica, responsável pela execução de funções gerenciais

específicas e pela adoção de três instrumentos: o primeiro é o planejamento

estratégico por bacia hidrográfica, o segundo é a tomada de decisão através de

deliberações multilaterais e descentralizadas e o terceiro refere-se ao

estabelecimento de instrumentos legais e financeiros (SILVA, 2006).

OS INSTRUMENTOS DE GESTÃO

1) Os planos de recursos hídricos

Os planos de Recursos Hídricos são diretores e de longo prazo e visam a

fundamentar e orientar a implementação da Política Nacional de Recursos

Hídricos e o gerenciamento dos recursos hídricos com horizonte de

planejamento compatível com o período de implantação de seus programas e

projetos.

2) O enquadramento dos corpos hídricos segundo os usos preponderantes

De acordo com a Resolução CONAMA 20/86, “o enquadramento dos

corpos d’água deve considerar não necessariamente seu estado atual, mas os

níveis de qualidade que deveriam possuir para atender às necessidades da

comunidade e garantir os usos concebidos para os recursos hídricos”.

3) A outorga de direito dos usos de recursos hídricos

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

45

Segundo Almeida (2003, p.3) “a outorga é um instrumento discricionário

através do qual o proprietário de um recurso natural estipula quem pode usá-lo

e as respectivas limitações”.

4) A cobrança pelo uso dos recursos hídricos

Para Pedras et al. (2003, p. 6), “a cobrança pelos usos dos recursos

hídricos sugerirá um estímulo econômico à racionalização desses usos através

de refinamentos nos sistemas produtivos, quer seja reduzindo os volumes

captados e consumidos, quer seja melhorando a qualidade dos efluentes

lançados procurando assim a recomendação da importância do uso sustentável

dos recursos hídricos”. A cobrança pela retirada de água bruta é tratada como

um instrumento de gestão que visa a atingir objetivos sociais, financeiros,

econômicos ou ambientais (RIBEIRO E LANNA, 1997).

5) O sistema de informação sobre recursos hídricos

Rocha et al (2002) destaca que “ o Sistema de Informações sobre

Recursos Hídricos é um dos instrumentos da Política de Recursos Hídricos,

tendo sido instituído com o objetivo de reunir, consolidar e divulgar os dados e

informações relacionados à gestão dos recursos hídricos otimizando o

planejamento e aumentando a eficiência do uso da água”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do abordado pode-se obter as seguintes considerações:

A escassez hídrica é uma ameaça para a população que habita o semiárido

devido suas características naturais e o modelo de desenvolvimento utilizado.

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46

O acesso à água e sua utilização nas zonas urbanas e rurais podem ter

impactos ambientais de enormes dimensões em aspectos quantitativos e

qualitativos.

Os transtornos que ocorrem no nordeste são decorrentes da falta de políticas

públicas de combate ao desperdício da água e de sua acessibilidade.

O Programa 1 Milhão de Cisternas é uma tecnologia de convivência com o

semiárido responsável por garantir água potável para consumo humano e a

transposição do rio São Francisco surge como uma alternativa em épocas de

estiagens prolongadas.

Entre os usos da água devem ser mais trabalhados em relação a uma utilização

mais racional: a agricultura, o uso industrial e o urbano.

A legislação nacional ainda é pouco utilizada na pratica e deve aprimorar-se em

alguns aspectos como a fiscalização, estabelecimento de liberação de

demandas, cobrança pelo uso dos recursos hídricos a fim de inibir o desperdício

dentro da bacia hidrografia.

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Recursos Hídricos, regulamenta o inciso XIX do art. 21 da Constituição

Federal, e altera o art. 1º da Lei nº 8.001, de 13 de mar. de 1990, que

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CAPÍTULO 05

APLICAÇÕES DO NONI (Morinda Citrifolia L.) NA

MEDICINA POPULAR

Juliana Pontes Soares

Marcos Barros de Medeiros

Rejane Pontes Soares

APLICAÇÕES DO NONI (Morinda Citrifolia L.) NA MEDICINA POPULAR

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Juliana Pontes Soares7

Marcos Barros de Medeiros

Rejane Pontes Soares

INTRODUÇÃO

O uso de plantas medicinais para o tratamento de doenças vem desde os

primórdios da civilização. A difusão do conhecimento empírico permitiu que as

plantas fossem positivamente selecionadas para sanar a necessidade de cura

de determinadas enfermidades. Sendo assim, a transmissão destes

conhecimentos, muitas vezes de forma oral, permitiu que várias gerações

tivessem acesso a diversas formas de tratamento (FLORES, 2005).

O avanço da medicina convencional não inibiu o progresso das práticas

curativas populares, pois estas trazem a possibilidade de uma melhor relação

custo – benefício para a população, promovendo saúde a partir de plantas

produzidas localmente.

A Morinda citrifolia é uma planta que tem sido usada por mais de 2000 anos

pelos povos polinésios. Conhecida como Noni, popularizou-se devido sua

infinidade de nutracêuticos e vem sendo utilizada no tratamento de várias

enfermidades dentre as mais citadas estão câncer, diabetes, hipertensão, dor,

problemas respiratórios, problemas digestivos, stress, dentre outros (MATOSO

et al., 2013).

Praticamente todas as partes da planta são utilizadas, e a cada uma delas são

atribuídas propriedades medicinais diferentes. A planta consegue se adaptar às

mais diversas situações de clima e solo, produzindo frutos durante todo ano

(SALOMON, 1999).

O fruto é a parte mais utilizada no preparo do suco, o qual vem sendo alvo de

pesquisas na atualidade pela busca de benefícios que o mesmo possa oferecer.

Apesar do uso crescente no Brasil, a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância

7 Enfermeira, Especialista em Enfermagem do Trabalho e Saúde da Família, aluna do

programa de pós-graduação em Ciências Agrárias (Agroecologia)-UFPB. E-mail: [email protected]

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

52

Sanitária) levanta dúvidas sobre a finalidade e a segurança dos produtos obtidos

a partir do Noni, proibindo assim a comercialização dos mesmos no País. A

comercialização de qualquer alimento contendo esse ingrediente só será

permitida após a comprovação de sua segurança de uso e registro na ANVISA,

conforme determinam a Resolução nº. 16/1999 e a Resolução RDC nº.

278/2005.

Levando em consideração a relevância que tem alcançado os estudos sobre

as propriedades medicinais da M. citrifolia (Noni), é de fundamental importância

a realização de pesquisas que avaliem os reais benefícios que este fruto pode

trazer à saúde. Diante do exposto, o presente trabalho teve como objetivo

realizar um levantamento sobre o uso da M. citrifolia (Noni) para fins terapêuticos

na medicina popular, verificar as partes da planta utilizadas no processo de

produção dos medicamentos populares, formas de preparo e posologia desses

medicamentos, identificar a ocorrência de eventos adversos e identificar as

possíveis patologias que ocasionaram o seu uso.

ORIGEM E IMPORTÂNCIA DO USO DAS PLANTAS MEDICINAIS

O conhecimento e o uso das plantas medicinais há milhares de anos

atravessa gerações, e a cada dia, as pessoas vêm descobrindo novas espécies

e diferentes formas de uso empregadas para cura de enfermidades.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) define plantas medicinais como

sendo todo ou qualquer vegetal, cultivado ou não, que possa ser utilizado para

fins terapêuticos, como também considera que as mesmas sejam as melhores

fontes para obtenção de novas drogas. A referida organização estima que 80%

da população mundial utilizam plantas medicinais como medicação básica, não

obstante, este uso apresenta uma taxa anual de crescimento de 7%. Atualmente,

70% das drogas disponíveis foram desenvolvidas direta ou indiretamente a partir

de fontes naturais, subdivididos em plantas, microrganismos e animais (BRASIL,

2006).

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53

O emprego das plantas é bastante comum no uso tradicional/popular devido

a seus benefícios medicinais. Dessa forma, torna-se imprescindível o

conhecimento sobre a dose adequada a ser utilizada pelo paciente e a parte da

planta apropriada para a produção do medicamento, além de suas propriedades

terapêuticas, pois existem aquelas que são altamente tóxicas, mesmo se usada

em pequenas doses, podendo ocorrer efeitos colaterais como aborto, tontura,

cefaleia, diarreia, hipotensão, taquicardia, vertigem ou até mesmo a morte

(SILVA, 2003).

No Brasil, a cultura de uso de plantas medicinais deve-se inicialmente aos

índios, depois aos negros e europeus. Na ausência de médicos, os mesmo

recorriam ao uso de plantas medicinais para curar ou amenizar suas

enfermidades. Esse conhecimento foi enriquecido através da observação dos

animais, que também buscam nos vegetais o alívio para seus males. A soma de

toda essa diversidade de saberes populares trouxe à atualidade tudo o que se

sabe sobre as propriedades medicinais de diversas plantas presentes em nossas

florestas e nos quintais das residências, principalmente, das famílias campesinas

(SERAFINI, 2013).

A diversidade de espécies vegetais nativas existentes no Brasil e o fácil

acesso que se tem a essas plantas, bem como o baixo custo e a dificuldade de

acesso da população à assistência médica convencional, fez com que

aumentasse o número de pessoas fazendo uso de tratamento à base de plantas

medicinais. Na maioria das vezes, essas plantas são utilizadas in natura na

forma de chás preparados por decocção ou infusão, maceração, como

lambedores/xaropes, sucos ou formas de uso externo como cataplasma.

Dentre as diversas espécies conhecidas e utilizadas está a M. Citrifolia com

sua riqueza de propriedades medicinais, a qual é popularmente conhecida como

Noni.

ORIGEM E CARACTERÍSTICAS DA Morinda Citrifolia (Noni)

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

54

A Morinda Citrifolia, popularmente conhecida como Noni, é uma planta

pertencente à família Rubiaceae. A mesma é originária do sudoeste da Ásia e

da Austrália. Há mais de 2.000 anos tem sido utilizada com sucesso na Polinésia

Francesa tanto como alimento como para fins medicinais e como tintura no

tingimento de tecidos, e em outros países como China e Índia. Os habitantes

dessas regiões levaram o Noni para as ilhas do Pacífico Sul, Taiti, Havaí e

Malásia (SILVA et al., 2009).

A planta chega a medir de 3 a 7 metros de altura, apresenta flores e frutos

durante todo ano, conforme ilustrado na Figura 1. O fruto possui um formato

ovalado, como mostra a Figura 2, apresentando várias sementes, tal como pode

ser visualizado na Figura 3, e sua coloração muda de acordo com o

amadurecimento, variando desde verde até esbranquiçado, como mostra a

Figura 4, quando está pronto para consumo. A polpa também sofre mudanças

de coloração com o período de maturação, passando da cor branca para

amarelada e, nesse ponto, o fruto está pronto para consumo (SILVA, 2010;

SOUZA et al., 2010).

Figura 1 Detalhe da Inflorescência do Noni. Figura 2 Aspecto do fruto do Noni .

Figura 3: Detalhe das sementes do Noni.

Figura 4: Variação de cores do fruto de acordo com a maturação.

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55

O fruto apresenta diferentes estádios de maturação em uma mesma planta e

ao mesmo tempo, conforme a Figura 5. No período de amadurecimento, o fruto

exala um odor bútrico forte bastante característico (CALIXTO, 2001). A planta se

adapta a clima tropical e temperado e, frequentemente, cresce em áreas

florestais com cerca de 400 metros acima do nível do mar e em regiões costeiras

ao nível do mar. Desenvolve-se bem em solos vulcânicos ricos em minerais,

apesar de também se desenvolver em solos arenosos ou com grande umidade.

Apresenta também tolerância para cultivo a céu aberto ou com 80% de

sombreamento, em condições de encharcamento por certo período de tempo, e

muito resistente e tolerante a solos salinos chegando a se beneficiar dos

minerais contidos na água do mar (FERNANDO et al., 2010).

ESTUDO DE CASO: APLICAÇÕES POPULARES DO NONI NO MUNICÍPIO

DE SERTÃOZINHO-PB

Com a finalidade de conhecer a concepção da população acerca do uso da

Morinda citrifolia (Noni) como planta medicinal realizou-se uma pesquisa, a qual

se caracterizou como um estudo descritivo e exploratório com abordagem

quantitativa, realizado no Município de Sertãozinho-PB. De acordo com o IBGE

(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), no ano de 2013, sua população

Figura 5: Frutos em diferentes estádios de maturação

em uma mesma planta.

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56

foi estimada em 4.728 habitantes e sua área territorial é de aproximadamente 33

Km2. A amostra foi composta por 40 pessoas que estavam em uso da Morinda

citrifolia (Noni), maiores de 18 anos, independente de sexo. Os dados foram

coletados através de entrevistas individuais na residência do entrevistado,

utilizando um questionário semiestruturado, elaborado para esta pesquisa. Para

análise dos dados utilizou-se como ferramenta auxiliar uma planilha eletrônica.

Os resultados obtidos seguem apresentados, com as ilustrações de gráficos e

tabelas.

Em relação à faixa etária, das 40 pessoas que compuseram a amostra, 35%

eram maiores de 60 anos, com predominância de pessoas do sexo feminino,

67,5%, conforme apresentados nos Gráficos 1 e 2.

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Todos os entrevistados responderam utilizar o fruto do Noni como produto

medicinal. Esta parte da planta parece possuir vasta atividade terapêutica, sendo

a mais preferida e utilizada no preparo dos remédios caseiros, principalmente

sobre a forma de suco. O suco tornou-se um suplemento alimentar bastante

consumido, na medicina popular vem sendo utilizado no tratamento de uma série

de doenças. Por outro lado, a literatura é bastante conclusiva sobre as

substâncias presentes nas folhas, que são utilizadas como analgésico e em

casos de inflamações externas, e das flores, que são empregadas no tratamento

de inflamações oculares, raízes, utilizadas na redução da pressão sanguínea,

sementes, que possuem efeito laxativo, casca, que possui propriedade

adstringente e é utilizada no tratamento da malária, por exemplo (MANACH;

DONOVAN, 2004).

Quanto ao preparo do suco, ainda não se sabe ao certo uma receita para o

preparo e uma dosagem estabelecida para seu uso diário. Mas cada pessoa

possui uma maneira particular de preparar o suco e uma dose de consumo,

conforme apresentado nas Figuras 6A; 6B; 6C e 6D.

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A receita mais citada na entrevista foi a que utiliza 3 frutos 52,5% para 1 litro

de suco de uva 70%, conforme apresentado nas Tabelas 1 e 2. O suco de uva,

segundo os entrevistados, tem por finalidade “mascarar” o sabor forte que o fruto

possui, facilitando assim a aceitação por parte das pessoas.

Tabela 1: Número de frutos utilizados no preparo do suco.

n= frequência de respostas

Nº de frutos n %

½ fruto 2 5

1 fruto 8 20

2 frutos 6 15

3 frutos 21 52,5

4 frutos 3 7,5

Figura 6A - Preparo do suco do Noni Figura 6B - Preparo do suco do Noni

Figura 6D - Preparo do suco do Noni Figura 6C - Preparo do suco do Noni

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Tabela 2 : Substância adicionada no preparo do suco. n= frequência de resposta

COMPOSIÇÃO (n) %

SUCO DE UVA

500 ml 8 20

1 litro 28 70

ÁGUA

500 ml 2 5

VINHO

1 litro 2 5

Com relação à posologia, 35% afirmaram fazer uso do preparo apenas 1 vez

ao dia, conforme apresentado no Gráfico 3.

Atualmente, tem sido identificado no Noni 160 compostos fitoquímicos, dentre

os principais estão fenólicos, ácidos orgânicos e alcaloides. Entre os compostos

fenólicos mais importantes estão as antraquinonas, acubina, ácido asperuloside

e escopoletina (SU et al., 2005). Os principais ácidos orgânicos são o caproico

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e caprílico, e o principal alcaloide é a Proxeronina que, após ser ingerida, é

absorvida no trato digestivo e armazenada no fígado, a cada 2 horas é lançada

gradativamente na corrente sanguínea, onde sofre a ação da Proxeroninase,

transformando-se em Xeronina, a mesma provoca reações no núcleo celular

fazendo com que os nutrientes sejam absorvidos mais facilmente melhorando

assim a capacidade dos órgãos humano (ULLOA et al., 2012).

Quando questionados sobre as possíveis categorias de enfermidades que

levaram ao uso do Noni, os entrevistados destacaram como sendo as mais

comuns: problemas gastrintestinais, seguido dos problemas endócrinos,

problemas geniturinários, problemas músculo-esquelético, câncer, problemas

circulatórios, problemas respiratórios, problemas neurológicos/psicológicos,

conforme apresentado na Tabela 3.

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Tabela 3 – Categorias de doenças que ocasionaram o uso do Noni

DOENÇAS n %

Câncer 4 10

Problemas músculo-esquelético 6 15

Problemas endócrinos 8 20

Problemas gastrointestinais 10 25

Problemas neurológicos/psicológicos 1 2,5

Problemas geniturinários 6 17,5

Problemas circulatórios 2 5

Problemas respiratórios 2 5

n= frequência de respostas

O Noni popularizou-se devido suas propriedades medicinais e por auxiliar na

melhora de uma gama de enfermidades. Sua introdução no Brasil é recente,

mesmo assim o seu uso tomou uma proporção grandiosa, devido relatos de

pessoas que usaram o fruto e sentiram, mesmo que gradativamente, uma

melhora significativa nos sintomas de algumas doenças (WANG et al., 2002).

Quanto aos problemas gastrointestinais, a maioria dos entrevistados referiu

sentir alívio nos sintomas da Gastrite nas primeiras semanas de uso, passando

a não mais sentir azia, náuseas e dor na região epigástrica. A literatura mostra

que o Noni é capaz de inibir o crescimento de algumas bactérias, dentre elas

está o Helicobacter pylori, responsável por infectar a mucosa do estômago

humano.

Em relação aos problemas no sistema endócrino, o Noni tem sido bastante

utilizado pela maioria dos entrevistados em casos de diabetes. Os mesmos

realizaram exames de glicemia antes de iniciar o tratamento com o fruto e

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

62

compararam com exames feitos após algum tempo de uso, observando uma

redução significativa na taxa de glicose.

Os entrevistados também referiram sentir melhora em problemas do sistema

geniturinário, tais como: corrimento vaginal, irregularidade menstrual e infecção

urinária.

Dentre os diversos problemas que pode apresentar o sistema músculo-

esquelético, o reumatismo foi o mais citado pelos entrevistados. Os mesmos

referiram um alívio nos sintomas após o uso do Noni, passando a exercer suas

atividades diárias normalmente, devido ao desaparecimento das fortes dores

causadas por esta patologia.

Quanto ao câncer, um dos entrevistados estava em tratamento, há alguns

anos, de um nódulo na tireoide, mas não apresentava resultado. Após conhecer

o Noni, através de um médico do Hospital Universitário em João Pessoa, passou

a fazer uso do mesmo e, após 1 ano e 3 meses de uso, o nódulo reduziu de

tamanho, não necessitando de intervenção cirúrgica. Também foi citado por

outros entrevistados por reduzir os efeitos colaterais ocasionados pela

quimioterapia.

Em relação aos problemas circulatórios, a hipertensão arterial foi a mais citada

nas entrevistas. A literatura mostra que o Noni vem sendo comumente usado em

casos de hipertensão arterial, pois um dos seus componentes é a escopoletina.

Essa substância promove a vasodilatação, fazendo com que o sangue possa

fluir mais facilmente por onde antes estava ocorrendo a vasoconstricção. Esse

mecanismo faz com que haja uma redução na força de bombeamento do

coração levando a pressão arterial para níveis considerados como normais, ou

seja, promovendo um equilíbrio, não deixando que fique abaixo do nível normal

(ZHAN; ZHOU, 2003).

Os problemas do aparelho respiratório também estavam presentes entre as

categorias de doenças mais citadas. Uma das patologias que apareceu com

mais frequência foi a asma brônquica. Um dos entrevistados encontrava-se em

uso do Noni há 6 meses e afirmou sentir o alívio dos sintomas da asma a partir

da primeira semana de uso, não apresentando mais crises asmáticas.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

63

Quanto aos problemas neurológicos/psicológicos, a insônia foi citada por um

dos entrevistados. Há algum tempo, o mesmo sofria de insônia e após começar

o tratamento com Noni, a partir das primeiras semanas de uso, passou a

perceber que estava conseguindo dormir mais cedo, bem como não acordava

mais durante a noite.

Quanto ao início dos resultados após o uso, 62,5% relataram notar um alívio

dos sintomas entre 1 e 3 semanas, conforme apresentado na Tabela 4.

Tabela 4 – Tempo de tratamento até a remissão dos sintomas, após inicio das

aplicações do Noni.

Período de tratamento n %

1 a 3 semanas 25 62,5

1 a 2 meses 10 25

Acima de 2 meses 5 12,5

n = frequência de respostas

Quando questionados sobre a ocorrência de efeitos adversos, um dos

entrevistados referiu ter apresentado edema nos membros inferiores e na face

durante o período que fez uso do Noni, desaparecendo logo após ter suspendido

o uso, conforme apresentado no Gráfico 4.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

É crescente o interesse de pesquisadores na área das plantas medicinais,

pois sente-se uma necessidade de reconhecer o verdadeiro benefício para a

saúde proporcionado por esses vegetais. Há alguns anos, o Noni vem sendo

alvo de inúmeras pesquisas que, em sua maioria, revelam as qualidades

benéficas do mesmo, mas, apesar de existir pesquisas já concluídas, pouca

informação se tem sobre os seus constituintes, sendo necessário um maior

aprofundamento nas pesquisas no que diz respeito às suas propriedades

medicinais, bem como elucidações sobre prescrições do produto, dose diária,

indicações, contraindicações e seus efeitos adversos. Dentre todos os benefícios

expostos anteriormente, segue-se um alerta para gestantes. Estudos concluíram

que o suco não deve ser utilizado por mulheres em estado gestacional, pois pode

ocasionar uma má formação congênita, trazendo sérias complicações ao feto.

Se faz necessário uma maior realização de estudos nesta área para que

futuramente o fruto do Noni possa ser utilizado com segurança pela população.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

65

BIBLIOGRAFIA

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CAPÍTULO 6

DIFUSÃO DE TECNOLOGIAS SOCIAIS

AGROECOLÓGICAS PARA A AGRICULTURA

FAMILIAR

Antonio Cardoso

Murielle Magda Medeiros Dantas

Valter da Silva

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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DIFUSÃO DE TECNOLOGIAS SOCIAIS AGROECOLÓGICAS PARA A

AGRICULTURA FAMILIAR

Antonio Cardoso8

Murielle Magda Medeiros Dantas

Valter da Silva

INTRODUÇÃO

O desenvolvimento tecnológico da agricultura permitiu a incorporação de

um conjunto de tecnologias “avançadas” ou “modernas” que, indubitavelmente,

aumentaram a produção e a produtividade das atividades agropecuárias,

havendo alterações nas relações sociais no campo. Contudo, a incorporação

dessas tecnologias frequentemente ocorreu de forma inadequada à realidade do

meio rural, seja pela maneira como se deu esta implantação, seja pela natureza

mesma das tecnologias introduzidas (CAPORAL; COSTABEBER, 2000).

Desse modo, objetiva-se solidificar e disseminar tecnologias sociais de

baixo custo e menos dependentes do sistema externo, construindo grupos de

interesses com capacitação continuada, antes, durante e depois da implantação

dessas tecnologias, na perspectiva de fortalecimento de um processo

pedagógico diferenciado, além do acompanhamento técnico e de apoio às

famílias de agricultores familiares, assentados da Reforma Agrária,

comunidades quilombolas, dentre tantas outras, caracterizando estes espaços

em ambientes ativos de troca e construção de saberes.

A implantação de tecnologias adaptadas ao semiárido brasileiro é uma

proposta de reflexão e de aprendizado sobre a Extensão Rural e o seu papel na

transição agroecológica e o fortalecimento das famílias envolvidas. As

tecnologias alternativas proporcionam uma melhor compreensão pedagógica da

realidade local por parte dos atores envolvidos.

8 Engenheiro Agrônomo/UFPB, Mestrando em Ciências Agrárias (Agroecologia)

PPGCAG/UFPB, Coordenador Técnico da AGEMTE - Assessoria de Grupo, Especializada

Multidisciplinar em Tecnologia e Extensão. E-mail: [email protected]

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

69

Como isso, algumas tecnologias sociais foram implantadas nas Unidades

Demonstrativas Pedagógicas da Agricultura Familiar – UDPAF, promovidas pela

Assessoria de Grupo, Especializada Multidisciplinar em Tecnologia e Extensão

– AGEMTE, através de contrato com o Instituto Nacional de Colonização e

Reforma Agrária – INCRA, junto ao Programa de Assessoria Técnica Social e

Ambiental – ATES em Assentamentos da Reforma Agrária.

As Unidades Demonstrativas Pedagógicas da Agricultura Familiar,

UDPAF, são utilizadas de forma educativa para intercâmbio, capacitação e

oficinas, por permitirem as observações, experimentação e reflexão coletiva

sobre as questões tecnológicas, econômicas, sociais e ambientais que envolvem

o manejo dos recursos naturais e a gestão da unidade produtiva.

Tecnologia Social, aliada à Agroecologia, compreende produtos, técnicas

ou metodologias reaplicáveis desenvolvidas na interação com a comunidade e

que representam efetivas soluções de transformação social.

O processo de implantação de tecnologias sociais, como planejado,

ocorreu de acordo com as potencialidades e características de cada uma das

Unidades Demonstrativas Pedagógica da Agricultura Familiar, observando-se os

ciclos produtivos, desde a segurança alimentar da família ou do grupo de

interesse até a produção de excedentes visando à geração de renda.

Os Assentamentos onde as UDPAFs estão localizadas e onde estas

tecnologias foram implantadas são: Projeto de Assentamento Margarida Maria

Alves I, no município de Juarez Távora; Projeto de Assentamento Margarida

Maria Alves II, Projeto de Assentamento Maria da Penha I, ambos localizados no

município de Alagoa Grande e Projeto de Assentamento Vazante, localizado no

município de Tacima. Todos os municípios citados estão localizados no estado

da Paraíba.

As principais tecnologias abordadas, dentro de cada unidade, foram:

cisterna de ferro e cimento, geodésica, painéis solares, biodigestor e defumador

artesanal.

Construção e implantação da cisterna alternativa

Este tipo de cisterna normalmente é construído na superfície. Ela tem uma

altura de até dois metros. Antes de concretar o fundo, só é preciso retirar a terra

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

70

fofa. O chão é nivelado a uma profundidade de cerca de 20 cm e uma camada

de cascalho e areia grossa é colocada debaixo da camada de concreto.

Para a construção dessa cisterna é preciso colocar papelão em volta da

mesma para que se possa rebocá-la.

A cisterna em destaque (Figuras 1 a 4) foi construída, dentro de um

enfoque pedagógico, nos Assentamento Margarida Maria Alves I, Maria da

Penha I e Vazante, onde foi dado início com a montagem da estrutura de ferro

em formato tubular, fixação da tela e do papelão em toda estrutura. Feito isso, a

armação recebeu uma camada de cimento na parte externa para isolar e garantir

que o material a ser colocado não vaze. A parte interna também foi rebocada,

constituindo-se, desta forma, um produto final de alta qualidade e de baixo custo.

O valor da cisterna alternativa de ferro e cimento com capacidade para 12 mil

litros é em torno de R$ 750,00.

Figuras 01 a 04. Construção da cisterna alternativa de ferro e cimento

01 02

04 03

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71

Construção e implantação da Geodésica frequência 02 com raio de

03 m

A Domos Geodésica ou simplesmente Geodésica é uma estrutura

arquitetônica utilizada pelas mais diversas civilizações desde a antiguidade,

apresentando extraordinária resistência e leveza (NOSSA TERRA, 2013). A

construção efetuada teve como matéria prima canos de PVC de 32’, com um

diâmetro de 6 m (raio de 3 m). Para a montagem desta estrutura serão utilizados

72 metros de cano, divididos em 35 pedaços de 1,8541 m e 74,14 m, utilizando

30 pedaços de 1,6396 m. Para os pedaços maiores, utiliza-se um ângulo de 18°

nas extremidades para o encaixe das peças, conseguidos através de uma

máquina artesanal. Para os pedaços menores, ângulos de 16°, conforme quadro

abaixo. A fixação das peças ocorre com parafusos, arruela e porcas de ferro. Se

a estrutura for bem manejada e com os cuidados necessários, terá uma longa

durabilidade.

O objetivo desta estrutura é a montagem de uma estufa para a produção

de mudas de hortaliças e frutíferas, além de servir como uma sala de aula

itinerante, onde se possa repassar e transferir conhecimentos teóricos para

serem aplicados na prática. Nas questões produtivas, pode servir como uma

estrutura para criação de galinhas caipiras e/ou capoeira, podendo acomodar em

torno de 20 a 30 aves. O custo para implantação desta estrutura é em torno de

R$ 350,00.

Esta estrutura foi implantada nos Assentamentos Margarida Maria Alves

I, Margarida Maria Alves II e Maria da Penha I, com a finalidade de produção de

mudas de hortaliças e espécies frutíferas, como maracujá, caju e manga.

Tipo Quantidade Comprimento Ângulo Metros

A 35 1,8541 m 18° 72

B 30 1,6396 m 16° 74,14

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

72

Figuras 03 a 08. Construção e implantação da geodésica para produção de mudas

Construção e manufatura de painéis solares

Painéis solares fotovoltaicos são dispositivos utilizados para converter

a energia da luz do Sol, abundante na natureza, em energia elétrica. Os painéis

solares fotovoltaicos são compostos por células solares, assim designadas já

que captam, em geral, a luz do Sol. Estas células são, por vezes, e com maior

propriedade, chamadas de células fotovoltaicas, ou seja, criam uma diferença de

potencial elétrico por ação da luz do sol. Na sua maioria, estas células solares

baseiam-se no semicondutor de silício (Si) que é muito utilizado na

microeletrônica. O fato da tecnologia das células fotovoltaicas não ter uma

06

07 08

05

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

73

grande utilização na produção direta de eletricidade, deve-se aos elevados

custos de produção (NEOSOLAR ENERGIA, 2013).

Para minimizar estes entraves, a Assessoria de Grupo, Especializada

Multidisciplinar em Tecnologia e Extensão – AGEMTE, em parceria com o

Instituto Federal de Educação Superior da Paraíba – IFPB, vem realizando

oficinas de construção de painéis solares nos Assentamentos da Reforma

Agrária da Zona da Mata Norte, Brejo e Curimataú paraibanos, áreas de atuação

da AGEMTE.

As oficinas têm como objetivo capacitar os participantes para confeccionar

seus próprios painéis solares, sendo divididas em duas etapas, a teórica e a

prática. Na etapa teórica, foram trabalhados os seguintes conceitos e princípios:

conceitos fundamentais de Eletricidade (tensão, corrente e resistência elétrica);

princípios fundamentais da eletrônica; ligações em série e em paralelo; o que é

e como utilizar um multímetro; os diversos tipos de ferro de solda, qual utilizar e

como utilizar; como identificar as polaridades das baterias; como interconectar

geradores e cargas; como conectar interruptores; outros conceitos fundamentais

de eletricidade e de eletrônica necessários para a correta confecção do painel

solar e para sua instalação e operação (AGEMTE, 2013).

Como resultados destas oficinas, os participantes já estão aptos a

reaplicar as habilidades e competências adquiridas, de construção de painéis

solares, nos Assentamentos, contribuindo para a ampliação da produção

agrícola, de forma sustentável e autônoma, diminuindo sua dependência das

condições externas e reduzindo custos com energia elétrica convencional.

Foi feito um teste na UDPAF do Assentamento Maria da Penha II, em

Alagoa Grande, com um painel solar de 1 m2 manufaturada em uma dessas

oficinas, com uma bomba de porão de 12 w, utilizadas em embarcações. O

Resultado foi que, a 30 metros de altura, a bomba impulsionada pela energia

captada do painel solar, colocou água a 180 m da área de implantação do

experimento. A manufatura das placas resulta em uma economia significativa no

custo da tecnologia, barateando o valor em cerca de 40%, se comparado a

painéis solares da mesma potência comercializados no mercado. Fazendo um

comparativo, um painel solar convencional custa em torno de R$ 1.600,00

enquanto que o painel manufaturado custa em torno de R$700,00. Já a bomba

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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de porão varia de R$ 60,00 a R$ 240,00, dependendo da vazão que se quer

chegar.

Recentemente a AGEMTE desenvolveu, através de seu Diretor Técnico,

Flavio Luna, um kit móvel com painel solar e bateria recarregável adaptado a um

carro de mão para que o agricultor possa locomover esta tecnologia da

residência da família até o lote onde trabalha, facilitando o manuseio e o seu

trabalho. Este kit custa em torno de R$ 1.800,00. A iniciativa oferece ao agricultor

um novo meio de produção a partir de energia renovável e contribui para a

melhoria da qualidade de vida das famílias do campo e sua inclusão no mundo

das novas tecnologias.

Figuras 09 a 11 – Oficina de Construção de painel solar fotovoltaico

09 10

11 12

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Construção e implantação do biodigestor

Biodigestor anaeróbico é um equipamento usado para o processamento

de matéria orgânica, como, por exemplo, fezes e urina de animais, e vegetais da

produção agrícola em biogás.

O biogás é uma mistura de vários tipos de gases. O metano, principal

componente do biogás, não tem cheiro, cor ou sabor, mas outros gases da

mistura podem conferir um ligeiro odor de alho ou de ovo podre que, através de

um processo simples de filtragem, podem ser facilmente eliminados da

composição do biogás. Pode-se afirmar com segurança que o uso do biogás na

cozinha é higiênico, não desprende fumaça e não deixa resíduos nas panelas

(MATTOS; JUNIOR, 2011).

Um biodigestor funciona como um reator químico em que as reações

químicas têm origem biológica, ou seja, são feitas por bactérias que digerem

matéria orgânica em condições anaeróbicas (isto é, em ausência de oxigênio).

O digestor anaeróbico produz 02 produtos:

Biogás, que é uma mistura de gases – cerca de

75% metano e 25% CO2 e

Fertilizantes de ótima qualidade (bem melhores do que os

fertilizantes químicos), muitas vezes misturados à água e, portanto, em

forma líquida, mas em alguns processos também sólidos.

Além de fornecer estes 02 produtos, o uso dos biodigestores proporciona

outras importantes vantagens:

Evita a poluição do meio ambiente com os dejetos orgânicos,

sobretudo das águas, que tradicionalmente foi o seu principal destino,

mas também do solo.

Combate o aquecimento global, pela queima do gás metano,

9 vezes mais causador do efeito estufa do que o Co2 resultante da sua

queima

Reduz significativamente o espaço utilizado para o

tratamento dos dejetos animais, em relação a outro método mais

atrasado, as lagoas de decantação.

Elimina os maus odores dos dejetos animais

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O biodigestor foi construído no Projeto de Assentamento Margarida Maria

Alves II, na parcela do Sr. José de Arimatéia, onde a UDPAF está Instalada. O

primeiro passo para a construção foi a escavação do buraco - uma contra partida

do Sr. José de Arimatéia, logo após, técnicos, assentados e os estagiários do

SERTA, Servico de Tecnologia Alternativa, deram início a montagem da

estrutura de ferro em formato tubular, fixação da tela e do papelão em toda

estrutura. Feito isso, a armação recebeu uma camada de cimento na parte

interna para isolar e garantir que o material que será colocado não vaze. A parte

externa também foi rebocada. Em seguida, após todas as instalacões dos canos,

mangueira e registro, acoplou-se uma caixa d`água de 3 mil litros emborcada,

sendo esta a câmara do gás. Todos os custos para implantação dessa estrutura

giram em torno de R$ 1.800,00.

Além da economia do gasto com gás de cozinha, a familia está fazendo

uso de uma tecnologia limpa, economicamente viável, reciclando dejetos

considerados poluientes, melhorando, desta forma, sua qualidade de vida.

Figuras 13 a 16 – Construção e implantação do Biodigestor – UDPAF do PA

Margarida Alves II

13

16 15

14

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Construção e implantação do defumador

A coloração, o aroma e o sabor desejados pelo consumidor são

determinados pela presença de certos componentes químicos constituintes da

fumaça.

A fumaça tem um efeito conservante que, associado ao calor, resulta na

redução da umidade, essencial no controle do desenvolvimento de

microrganismos.

Conhecido como “Chaminé defumadora”, sua construção é bem simples

e barata. É um defumador médio indicado para uma produção de até 35 Kg de

defumado por dia. Sua fonte de calor e fumaça é oriunda da saída de um fogão

a lenha. Também pode ser utilizada serragem, queimando-a diretamente na

base do defumador.

A construção deste se deu com a colaboração dos estagiários do

SERTA e o auxílio da equipe da AGEMTE, utilizando estrutura de alvenaria

obedecendo aos princípios da permacultura. O defumador foi construído com

tijolos, cimento, varões de ferro e chapa de alumínio. Esta tecnologia serve

para agregar valor à carne, principalmente a suína.

Foram construídos dois defumadores: um na UDPAF do Projeto de

Assentamento Margarida I e outro na UDPAF do Projeto de Assentamento

Margarida II. Os custos para construção desta estrutura gira em torno de R$

100,00

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Figuras 17 a 20 – Construção e implantação do defumador alternativo

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As cinco tecnologias apresentadas se adaptam à agricultura familiar por

terem viabilidade prática e serem de baixo custo para implantação.

Entendendo que os processos de implantação dessas tecnologias são

dinâmicos e sistêmicos, são realizados momentos sequenciados e construtivos

com monitoramento e avaliação permanente, capacitando, nos processos

técnicos e pedagógicos, os beneficiários para investigar os procedimentos e

rumos das ações, provocando correções quando necessário.

Em todas as tecnologias, o processo ocorreu de forma participativa, em

que as famílias envolvidas serão multiplicadoras dos conhecimentos teóricos e

práticos para outras comunidades, de forma que possa divulgar as tecnologias

adaptadas a cada realidade.

17 18

19 20

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

79

Por tudo que foi apresentado, conclui-se que esse processo visa o acesso

e divulgação de novas tecnologias alternativas, ocasionando a mudança de

comportamento dos atores envolvidos, provocando o interesse dos mesmos por

tecnologias sociais de baixo custo, onde possa gerar renda e conhecimento para

as famílias assentadas da Reforma Agrária.

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DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

81

CAPÍTULO 7

O MANDACARU (Cereus jamacaru P. DC.) COMO

FONTE ALTERNATIVA ALIMENTAR ANIMAL NO

SEMIÁRIDO BRASILEIRO

Juliana Ferreira Gonçalves

Gilberto Nunes de Souza

Marcos Barros de Medeiros

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O MANDACARU (Cereus jamacaru P. DC.) COMO FONTE ALTERNATIVA

ALIMENTAR ANIMAL NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO

Juliana Ferreira Gonçalves 9

Gilberto Nunes de Souza

Marcos Barros de Medeiros

INTRODUÇÃO

A região semiárida do nordeste brasileiro é constituída de várias sub-

regiões onde predominam uma grande diversidade de clima, vegetação, solo,

água e aspectos socioeconômicos. Estas áreas formam um bioma denominado

caatinga.

As regiões semiáridas apresentam características edafoclimáticas com

baixa precipitação de chuva, ocasionando o longo período de estiagem e

afetando a produção de forragem, causando baixo desempenho aos sistemas

de produção, pois a produção forrageira se dá num espaço de tempo muito curto,

ficando os animas por longo período em regime de pasto, repercutindo na baixa

produção de leite, carne, poucas crias e levando até a morte de animais. Neste

cenário, em que o balanceamento nutricional é afetado, o Mandacaru (Cereus

jamacaru P. DC.) vem superar as necessidades e se contrapor a práticas que

ameaçam a sustentabilidade ambiental, sobretudo a saúde animal, a exemplo

do uso da cama de galinha na dieta dos animais.

Segundo Moreira (2005), há muito tempo se busca uma espécie forrageira

capaz de suportar as longas estiagens que ocorrem no semiárido e ainda assim

ser produtiva. Neste aspecto, o Mandacaru (Cereus jamacaru P. DC.) merece

atenção especial por sua grande adaptação, valor nutritivo e produtividade.

9 Coordenadora Pedagógica – Secretaria Municipal de Educação (Educação do Campo) de

Cacimbas-PB. E-mail: [email protected]

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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O Mandacaru tem uma representação social na Região Nordeste do

Brasil. Segundo Albuquerque (2001), no bioma Caatinga, é a espécie que

caracteriza as áreas denominadas de cariris e cerrados, marcante fitofisionomia

da região, o verde chama a atenção em meio à vegetação sem cor da caatinga,

é uma espécie adaptada ao clima semiárido da região, desenvolve-se nos mais

adversos tipos de solos e suporta até três anos de seca. O surgimento de suas

flores simboliza o “fim da seca” nas regiões semiáridas, conforme expresso, por

exemplo, na música Xote das Meninas, do poeta Luiz Gonzaga:

“Mandacaru quando fulora na seca É o sinal que a chuva chega no sertão Toda menina que enjoa da boneca É sinal que o amor já chegou no coração [...]”

Por ser uma planta que tem durabilidade, resistência, adaptabilidade e

beleza, é tida como o slogan que identifica o povo nordestino e sua cultura. O

Mandacaru vai além dos domínios geográficos da caatinga e quebra o tabu de

sua utilidade apenas para a alimentação dos rebanhos, chegando a ser

cultivada, inclusive, como planta ornamental e medicinal, já que possui

propriedades terapêuticas.

Durante muito tempo, o homem do campo substituiu o Mandacaru

(Cereus jamacaru P. DC.) pela Palma Forrageira (Opuntia fícus indica Mill e

Napolea cochinillifera salm-Dych) para alimentação de seus rebanhos, porém,

nos últimos anos a Cochonilha do Carmim (Dactylopius opuntiae) dizimou os

palmares da região, provocando a volta do uso do Mandacaru como forragem

animal. Segundo Andrade Lima (1965), o número de espécies de cactáceas no

Nordeste brasileiro não é grande, todavia, na paisagem da zona seca, que

representa a maior parte da área total da região, algumas espécies são

numerosas, chegando a ser dominantes da formação vegetal. Algumas dessas

espécies são: Coroa de frade (melocactus), mandacaru (Cereus jamacaru),

facheiro (Pilosocereus); palma (Tacinga); catingueira (Caesalpinia pyramidales),

sabiá (Mimosa caesalpiniifolia), angico (Anadenanthera colubrina), juremas preta

e branca (Mimosa tenuiflora e M. artemisiana); ipê roxo (Tabebuia impetiginosa),

cumaru (Amburana cearensis), aroeira (Myracroduon urundeuva), marmeleiro

(caearia canmbessedisia) (DRUMOND et al., 2004).

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

84

No município de Cacimbas-PB, nos anos de 2012 e 2013, houve

prolongados períodos de seca e os criadores utilizaram o Mandacaru como fonte

de alimento para seu rebanho. No entanto, fizeram isso de forma predatória,

queimando, cortando toda a planta e sem fazer a reposição, surgindo a

necessidade de um trabalho de mobilização dos criadores para utilização do

Mandacaru de forma racional, estimulando tal cultura através do uso dos campos

de Mandacaru como reservas estratégicas para a ração animal nos períodos de

estiagem prolongada e, dessa forma, garantindo o equilíbrio do bioma Caatinga.

Lima e Sidersky (2002), estudando o papel das plantas nativas nos

sistemas agrícolas familiares do Agreste da Paraíba, constataram que algumas

cactáceas, de modo especial o Mandacaru, são utilizadas como planta forrageira

pelos agricultores no período de seca.

Diante do exposto, ressaltamos que a abordagem desse tema foi

escolhida após observações feitas durante algumas visitas à comunidade de

Monteiro, município de Cacimbas-PB, realizadas nos meses de agosto e

setembro, período em que as pastagens tornam-se escassas na comunidade.

Nestas visitas, foi possível perceber que, entre tantas experiências exitosas,

aquelas envolvendo o Mandacaru foram as que mais chamavam atenção no

momento, pelo fato de a maioria dos criadores terem vendido seus rebanhos por

baixos valores e outros rebanhos terem morrido por falta de alimento durante a

seca que se prolongou nos dois últimos anos (2012 e 2013).

Oliveira (1996) relatou que, em razão das incertezas climáticas e do

fenômeno das secas periódicas no Nordeste do Brasil, as cactáceas, graças às

suas características fisiológicas de economia no uso da água, representam uma

fonte de suprimento de água e uma alternativa alimentar para os rebanhos do

semiárido. Neste sentido, fundamentados em diversos conceitos levantados e

em experiências vivenciadas durante o período de construção deste artigo,

buscamos avaliar os níveis de conhecimentos dos criadores da comunidade de

Monteiro, município de Cacimbas-PB, acerca do manejo adequado e da

quantidade de forragem produzida por pés/planta de acordo com o seu

desenvolvimento, analisando-se o Mandacaru pode garantir a nutrição dos

rebanhos.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

85

Nessa postura, reconhecemos que os movimentos sociais e a educação

popular são importantes vias de manutenção, perpetuação e agregação de

valores à cultura de um povo, ela se configura em uma importante ferramenta

quando há o desejo de se manter vivas as riquezas culturais. Desta forma,

buscamos parceria com a CAMEC (Central das Associações do Município de

Cacimbas-PB), que muito contribuiu na mobilização e no desenvolvimento do

Projeto Salve Minha Vaquinha, projeto este que oferece cursos e estratégias

para que os criadores do município de Cacimbas-PB produzam forragens e se

conscientizem da importância da sustentabilidade como um processo contínuo

ao longo da vida e para que a temática fosse sendo aprofundada com mais

naturalidade de forma interdisciplinar.

Objetivou-se com o projeto incentivar a utilização do Mandacaru de forma

sustentável, analisando possíveis fatores que contribuam para que criadores do

município de Cacimbas-PB façam uso do Mandacaru para forragem, além de

enfatizarmos a importância da reposição através do plantio planejado dos

campos de Mandacaru como reservas estratégicas nos períodos de estiagem e

equilíbrio do bioma Caatinga.

O Mandacaru

O Mandacaru (Cereus jamacaru), planta típica do bioma Caatinga,

conhecida popularmente como cardeiro, pertence à família das cactáceas, mais

precisamente de porte arbóreo (pode atingir de 3 a 5 metros de altura),

ramificado, com flores brancas, compridas que se abrem à noite ostentando suas

belezas. O fruto é de cor violeta forte, tem polpa branca com muitas sementes

pretas, saboroso, servindo de alimento para diversas aves típicas da caatinga.

Seu caule é cladódio: modificado, acumulando água e exercendo função

fotossintética, rico em nutrientes, proteínas, fibras e água, o que garante a

nutrição animal no período de estiagem e escassez de pastagens.

O Mandacaru tem uma representação social na Região Nordeste do

Brasil, No bioma Caatinga, é a espécie que caracteriza os cariris e cerrados,

marcante fitofisionomia da região, o verde que chama a atenção em meio à

vegetação sem cor da caatinga, são espécies adaptadas ao clima semiárido da

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

86

região, desenvolve-se nos mais adversos tipos de solos e suporta até três anos

de seca. O surgimento de suas flores simboliza o “fim da seca” nas regiões

semiáridas.

O Mandacaru, entre outras cactáceas nativas da caatinga, tem sido

utilizado nos períodos de seca prolongada, como um dos principais suportes

forrageiros dos ruminantes (SILVA et al., 2005).

Por ser uma planta que tem durabilidade, resistência, adaptabilidade e

beleza, é tida como o slogan que identifica o povo nordestino e sua cultura, e vai

além dos domínios da caatinga e de alimentação para o rebanho, chegando a

ser cultivado como planta ornamental e medicinal, pois possui propriedades

terapêuticas. Existe uma variedade de Mandacaru, sem espinhos, usada na

alimentação de animais. A variedade comum predominante no Nordeste é

altamente espinhenta e também é usada na alimentação de animais, quando

seus espinhos são queimados ou cortados. É preciso alguns cuidados ao servir

o Mandacaru ao rebanho, pois o material precisa ser queimado até que o fogo

derreta os espinhos, evitando assim machucar os animais.

Quanto à composição química bromatológica da planta, os valores,

encontrados por Barbosa (1997) e Lima (1998), variaram entre 11,01 e 12,91%.

Outras pesquisas mostram resultados entre os limites de 5,08 a 10,18%, e o teor

de cinzas encontrado na planta foi de 23,07%.

As técnicas simples para o plantio e manejo do Mandacaru favorecem a

implantação dos cultivos nas propriedades do Semiárido. Segundo o biólogo

Gilberto Nunes, os criadores podem cultivar um grande número de plantas

consorciando com outros tipos de plantas e aproveitando terrenos com pedras e

lajedos. Uma novidade na região é o plantio do Mandacaru sem espinho, mas,

segundo relatos dos criadores que o cultivam, tal espécie é mais sensível à seca

do que as espécies com espinhos, porém, facilita a vida do criador pelo fato de

ser melhor de manejar pela falta de espinhos. O mandacaru possui um grande

teor de proteína, resiste à falta de chuvas e o primeiro corte acontece no primeiro

ano. O plantio em áreas cercadas é uma alternativa de exploração que aumenta

a capacidade de suporte das propriedades.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

87

MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho de intervenção teve como finalidade mobilizar

agricultores/criadores, do município de Cacimbas-PB, para vivenciar um

intercâmbio de experiências com intuito de incentivar o uso do mandacaru de

forma sustentável. O mesmo desenvolveu-se na Área de Experimento da Central

das Associações do Município de Cacimbas-PB (CAMEC), no período de

novembro de 2013 a janeiro de 2014, no qual contamos com a participação de

agricultores/criadores, presidente de algumas associações e do presidente da

CAMEC, o biólogo Gilberto Nunes. A Central é composta por 14 associações

comunitárias, que totalizam uma média de 253 criadores associados. A média

anual de chuvas no município de Cacimbas-PB é de 750 mm, sendo que 82%

do total é concentrada entre os meses de fevereiro e maio. A temperatura média

é de 24 °C.

A área experimental analisada representa um importante espaço de

aprendizado, de compartilhamento de conhecimentos como fonte de inspiração

para reais possibilidades de aproveitamento dos recursos naturais e, por

conseguinte, uma convivência sustentável com a realidade da caatinga a partir

de práticas alternativas.

Os objetivos do trabalho foram: debater sobre vários aspectos envolvendo

o mandacaru, focando sempre a importância da sustentabilidade; fortalecer as

ações do Projeto Salve Minha Vaquinha, já mencionado anteriormente, além de

enfatizarmos a importância da reposição através do plantio planejado dos

campos de Mandacaru como reservas estratégicas nos períodos de estiagem e

equilíbrio do bioma Caatinga.

O percurso metodológico escolhido, para o alcance dos objetivos

propostos, foi configurado através de levantamentos bibliográficos para obter

subsídios sobre a escolha do tema e do assunto que serviram como elemento

para a fundamentação teórico-prática do trabalho e, ainda, para a realização da

pesquisa de campo.

No decorrer do trabalho, realizaram-se visitas em lócus na área de

experimento da CAMEC para conhecimento da realidade e levantamento de

dados, onde conhecemos mais detalhadamente várias estratégias criadas para

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

88

convivência com a seca, tais como as cisternas de captação de água da chuva

e os plantios alternativos. Uma das entidades envolvidas no trabalho/projeto foi

a CAMEC, organização que atua no município de Cacimbas-PB e em outros

municípios da região do semiárido, mais especificamente no médio sertão

paraibano, desenvolvendo ações que fomentam o desenvolvimento rural

sustentável. Suas ações capacitam agricultores/as para o desenvolvimento de

tecnologias sociais, sustentáveis, capazes de facilitar a convivência com o

semiárido. A comunidade conta com um acervo de tecnologias sociais

sustentáveis, entre tantas observamos quintais produtivos de hortaliças e vários

projetos de convivência com semiárido, dos quais destacamos o de Estocagem

de Alimentos para Período de Estiagem. Para intervenção na comunidade de

Monteiro, buscamos conhecer mais detalhadamente a plantação de Mandacaru

existente na área de experimento da CAMEC e nas propriedades vizinhas.

Na Figura 1, pode-se observar o porte e quantidade de mandacarus

existentes na área de experimento da CAMEC.

Figura 1 – Levantamento das plantas de Mandacaru existentes na área de

experimento da CAMEC.

Como ferramenta de coleta de informações, realizaram-se coletas de

dados por meio de entrevistas e observações e registros das

participações/intervenções dos entrevistados durante quatro encontros/oficinas

com os criadores. No primeiro encontro, apresentou-se o projeto e realizou-se

uma breve explanação sobre o uso do Mandacaru como forragem animal.

Levantamos, através de rodas de conversa, os conhecimentos prévios dos

mesmos quanto ao uso sustentável do Mandacaru para forragem e deixamos

como tarefa para cada criador planejar uma forma de implantar ou manter em

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

89

sua propriedade uma área de cultivo de Mandacaru, bem como representar

através de desenho seu campo de Mandacaru atual.

Na Figura 2, pode-se observar o envolvimento dos participantes

interagindo e contextualizando as questões levantadas.

Figura 2 – Encontro com os criadores na Central das Associações no Sítio

Monteiro, município de Cacimbas-PB

No encontro seguinte, cada criador apresentou seu projeto de campo de

Mandacaru, e foram observadas as distâncias e áreas de plantio existentes a

serem implantadas, além de orientarmos quanto à forma de plantio para que não

se torne uma monocultura de mandacaru. Na oportunidade, foram levantados

alguns questionamentos em relação ao valor nutricional do Mandacaru.

Na Figura 3, pode-se observar que os criadores têm uma visão de

monocultura para constituir seus campos de mandacarus, onde fizemos a

interferência.

Figura 3 – Plantio e manejo do mandacaru de forma simples

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

90

Na ocasião, destacaram-se, pelos agricultores, algumas observações que

chamaram a atenção, entre elas o sistema radicular bem desenvolvido,

acumulando bastante água e a cutícula protetora sobre a casca, a qual impede

a evapotranspiração da água da planta, conforme mostra a Figura 4.

Figura 4 – Cutícula protetora que faz com que não ocorra a evapotranspiração.

O terceiro encontro contou com a colaboração do biólogo e veterinário

Gilberto Nunes, que fez uma explanação sobre importância, cultivo, identificação

e manipulação do Mandacaru. Na ocasião, foram feitas provocações a fim de

que os agricultores participassem de forma entusiasmada do processo, seja com

dúvidas ou com relatos de experiências próprias. Na Figura 5, pode-se observar

a grande aceitação e motivação dos agricultores.

Figura 5 – Encontro com os

produtores na Central das

Associações no Sítio

Monteiro, município de

Cacimbas-PB

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

91

O quarto encontro foi realizado com trabalhos práticos e iniciado com a

preparação do que batizamos como biomassa de Mandacaru. A matéria-prima

utilizada foram plantas de Mandacaru, adquiridas na área de abrangência do

campo de estudo desta pesquisa. Após o corte, as mesmas foram medidas,

pesadas e trituradas em forrageira e postas para secar, por meio da secagem

natural, para desidratação e armazenamento em fenos. Percebemos na

pesagem que plantas com 4 metros pesam em média de 800 a 900 quilos,

conforme mostra a Figura 6.

Figura 6 – preparação da biomassa de Mandacaru.

Após o corte do material fresco e selecionado, e triturado em máquina

forrageira, este pode ser ofertado imediatamente para alimentação dos animais,

processo mais indicado uma vez que no período de seca busca-se forragem com

alto teor de água. Para fenação, os materiais excedentes foram espalhados

sobre lona plástica, exposta ao sol para desidratação, até atingir o ponto de feno.

Quanto mais rápida for essa secagem, menores serão as perdas. O ponto para

fenação se dá quando o material chega de 15 a 20% de umidade, podendo ser

acondicionado em fardos para guardar. Pode-se observar que o processo de

fenação do Mandacaru melhora o paladar e elimina princípios tóxicos,

aumentando o seu consumo pelos animais.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

92

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O trabalho foi realizado a partir de quatro encontros com

agricultores/criadores do município de Cacimbas-PB para vivenciar um

intercâmbio de experiências com intuito de incentivar o uso do mandacaru de

forma sustentável. O mesmo desenvolveu-se na Área de Experimento da

Central das Associações do Município de Cacimbas-PB (CAMEC). Dos

participantes dos encontros, 34,5% são do sexo masculino e 65,5 % do sexo

feminino, diferença bem significativa que chama atenção, pois as mulheres

participam mais ativamente dos trabalhos socioeducativos, enquanto os homens

são menos interessados.

De acordo com os dados evidenciados na Figura 8, podemos perceber a

importância do Mandacaru como forragem animal, constatando a sua

importância como alternativa alimentar para sustentação do rebanho nos

períodos de seca.

Figura 8 – Porcentagem do uso do Mandacaru pelos criadores para Forragem

Animal

Quando indagados sobre a importância do uso de forma sustentável, 90%

dos participantes afirmaram ser de suma importância a revitalização e produção

de campos de Mandacaru, salientando que o mesmo não precisa de muitos

cuidados como as demais forragens e ainda resistem às secas que assolam a

região, o que requer iniciativas que trabalhem e disseminem a prática do uso do

mesmo de forma sustentável.

66,9% fazem uso em

ano de seca

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

93

Os encontros com os criadores nos fez perceber a necessidade de uma

reestruturação das instituições de pesquisa e extensão e das políticas públicas

de assistência técnica aos criadores do município de Cacimbas-PB, uma vez que

a EMATER não funciona no município por falta de uma equipe técnica

qualificada, ficando os agricultores familiares com os conhecimentos populares,

mas com a necessidade dos conhecimentos técnicos que precisam ser somados

para gerar soluções inovadoras. Percebemos também que os espaços

acadêmicos precisam proporcionar esse tipo de vivência.

CONCLUSÃO

Em função do grande período de estiagem na região e pela inviabilidade

econômica de se alimentar o rebanho comprando-se alimentos e suplementos

industriais, bem como a escassez da Palma Forrageira devido às devastações

ocasionadas pela Cochinilha do Carmim, o Mandacaru constitui-se como uma

excelente alternativa para a produção de forragem e também como suplemento

alimentar para os animais do semiárido.

A partir dessa interação com os agricultores/criadores, que são os atores

do sistema alimentar em questão, podemos perceber a importância dos

conhecimentos prévios que os agricultores possuem e que, a partir do segundo

encontro, tivemos mais facilidade de discussão acerca do tema, já que fomos

bem acolhidos e alguns criadores que resistiam às discussões, no primeiro

encontro, já começaram a interagir no grupo. Sentimos a necessidade de dar

continuidade ao trabalho de mobilização acerca do tema alimentação animal e

de outros temas que surgiram no decorrer dos encontros uma vez que o

município tem uma necessidade de assistência aos criadores/produtores.

A convivência com os agricultores/criadores, com o mandacaru como

alimentação animal e com estudos sobre o semiárido nos proporcionou

oportunidades de colocar em prática as teorias estudadas e adquirir novos

conhecimentos enquanto estudantes e profissionais das ciências agrárias,

principalmente através do processo de construção do conhecimento a partir da

valorização de experiências concretas.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

94

REFERÊNCIAS

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EMBRAPA. Centro de Pesquisa Agropecuária do Trópico Semiárido

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LIMA, J. L. S. Plantas forrageiras das caatingas: usos e potencialidades.

Petrolina-PE: Embrapa-CPATSA/PNE/RBG-KEW. 1996. 44p. Il

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95

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LEITE NO NORDESTE: alternativas tecnológicas e perspectivas de mercado,

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MOREIRA, J. M. Produção de leite de vacas guzerá e girolando utilizando a

caatinga, no período chuvoso e pasto de capim buffel diferido, no período

seco, no sertão de Pernambuco. 2005. 91f. Tese (Doutorado em Zootecnia) -

Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, 2005.

OLIVEIRA, E. R. Alternativas de alimentação para pecuária do semiárido

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UTILIZAÇÃO E MANEJO DO XIQUEXIQUE E MANDACARU COMO

RESERVA ESTRATÉGICA DE FORRAGEM. Disponível em:

www.emparn.rn.gov.br/Acesso em: 21 de junho de 2014.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

96

CAPÍTULO 8

TRABALHO, SEGURANÇA E SAÚDE NA

AGRICULTURA FAMILIAR

Newton Alessandro Cavalcante de Albuquerque

João Maria Soares da Silva

Adamastor Pereira Barros

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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TRABALHO, SEGURANÇA E SAÚDE NA AGRICULTURA FAMILIAR

Newton Alessandro Cavalcante de Albuquerque10

João Maria Soares da Silva

Adamastor Pereira Barros

INTRODUÇÃO

O Brasil, campeão de exportações de

grãos e produtos agroindustriais, é um país

de imensas extensões territoriais onde é

muito comum encontrarmos grandes e

pequenas porções de terra onde é praticado

o cultivo do solo como atividade econômica

sendo assim de massiva representação a

agricultura de base familiar. Portanto, na

sequência discutiremos sobre Legislação

vigente, o uso de EPI´s, produtos

fitossanitários e equipamentos agrícolas, de

forma adequada e com segurança.

Nesse sentido surge a necessidade de divulgação dos procedimentos,

equipamentos e normas relativas à profissão mais antiga da humanidade, a do

agricultor, onde os profissionais competentes como Técnicos Agrícolas,

Agrônomos, Veterinários e também Agentes Comunitários de Saúde da Própria

comunidade façam orientações onde o profissional do campo possa ter uma

melhor instrução sobre sua segurança e de sua família ao exercer sua profissão.

A ergonomia e o trabalhador rural

10 Técnico Administrativo em Educação-CCHSA-UFPB, Aluno Especial do PPGCAG

(Agroecologia)-Mestrando em Ciências Agrárias – Agroecologia, Centro de Ciências Humanas

Sociais e Agrárias CCHSA/ Universidade Federal da Paraíba- UFPB, Bananeiras-PB. E-mail:

[email protected]

Imagem 1: Luís Moreira de Araújo Júnior (2014)

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

98

Muitos dos profissionais desse setor agrário são comumente acometidos

por problemas como dores e doenças no seu sistema músculo-esquelético,

geralmente com o passar dos anos, desenvolvendo tais trabalhos de campo de

forma incorreta, operando equipamentos e maquinário e manuseando

determinados insumos sem proteção e de forma inadequada. Assim, essas

enfermidades pesam mais ao ponto de atrapalhar o desenvolvimento de suas

atividades de trabalho e, consequentemente, afeta sua qualidade de vida.

O homem do campo doente é uma pessoa improdutiva e, por essa razão,

chega até a assumir uma postura desmotivada perante a vida familiar e social.

Partindo deste princípio, prosseguiremos com a explicitação de alguns conceitos

e recomendações acerca da saúde e segurança do agricultor familiar. Para tanto,

tomaremos por base a Norma Regulamentadora 31 - Segurança e Saúde no

Trabalho na Agricultura, Pecuária Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura

MAPA (BRASIL, 1997) A Recomendação supracitada estabelece os preceitos a

serem observados na organização e no ambiente de trabalho, de forma a tornar

compatível o planejamento e o desenvolvimento das atividades da agricultura,

pecuária, silvicultura, exploração florestal e aquicultura com a segurança, a

saúde e o meio ambiente do trabalho. Em 2005, a NR 31 foi criada pelo Ministério

do Trabalho e Emprego (MTE) para preservar a segurança e a saúde do

trabalhador rural, esteja ele inserido no contexto das pequenas, médias ou

grandes propriedades rurais.

Com o avanço tecnológico da agricultura no Brasil e também com o

maior acesso, por exemplo, a linhas de financiamentos e de créditos agrícolas,

não só o grande produtor, mas também o médio e o pequeno têm a possibilidade

de adquirir equipamentos e máquinas que facilitam o trabalho com produtos

agrícolas, contudo, isso acaba também por impor um determinado ritmo

acelerado ao trabalho do homem do campo.

Tal exigência, das máquinas e dos equipamentos, acaba submetendo o

homem a praticar posturas inadequadas na execução de determinados

movimentos corporais que, por sua vez, são muito repetitivos e, por

consequência, acarretam enfermidades, casos clínicos de lesões no sistema

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

99

muscular e esquelético do agricultor, distúrbios osteomusculares relacionados

ao trabalho (DORT).

Riscos e limitações da atividade agrícola no campo

No ponto de vista de Luiz (2006), sobre algumas limitações da

ergonomia no setor agrário:

A aplicação da ergonomia na agricultura ainda não ocorre

com a intensidade desejável, devido ao caráter

relativamente disperso dessa atividade e ao pouco poder

de organização e reivindicação dos trabalhadores rurais. É

na agricultura, onde se concentra a maior parte dos

trabalhos mais árduos que se conhecem. (LUIZ, 2006,

p.39)

Partindo desse sentido, observamos um dos maiores gargalos da

economia agrícola em nosso país e

concluímos que muito ainda se tem por

fazer no que diz respeito à organização

social dos Agricultores e à oferta de

educação profissional aos agricultores para

que haja uma melhor efetivação da

produtividade nas unidades familiares.

Em todo o mundo, a agricultura é

apontada como uma das atividades cujo

risco de acidentes e contaminação é iminente e, por conta disso, muitas vezes o

produtor acaba se envolvendo em

acidentes com máquinas e também se

contaminando com produtos químicos, tais como: Fungicidas, Acaricidas,

herbicidas dentre outros produtos fitossanitários que são adquiridos e

indiscriminadamente. Como resultado dessa contaminação, muitos produtores

rurais chegam a adoecer e a perder sua capacidade de trabalhar saudavelmente.

Em trabalhos que são realizados, por exemplo, com máquinas e motores

barulhentos, por um longo período de horas diárias, é indispensável o uso de

Agricultor Operando maquinário agrícola sem uso de EPI. Foto: Luís Moreira de Araújo Júnior(2014

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

100

protetores auriculares. A exposição do trabalhador a longas horas de ruídos,

além de trazer danos diretos à audição, afeta indiretamente o sistema nervoso

central, altera o metabolismo e eleva os níveis de estresse do mesmo.

A exposição do trabalhador a ambientes com temperatura elevadas e

com umidade do ar reduzida ou muito elevada, durante muitas horas, reduz

drasticamente a produtividade e eleva os riscos de acidentes no campo. Em dias

quentes, com temperatura e umidade do ar elevadas, não se recomendam a

execução de trabalhos braçais, como os de manejo do solo, e/ou atividades com

uso de roupas que dificultem a mais ainda a troca de calor da pele com o

ambiente, pois elas dificultam a refrigeração do corpo humano, Almeida & Viega

(2008).

A presença de mais vapor de água no ambiente dificulta a evaporação

das gotículas de suor da pele do trabalhador. Podemos tomar como exemplos

de ocorrência de altas temperaturas e altos índices de umidade relativa do ar

alguns estados do Norte do Brasil, a exemplo do Acre que possui elevada

umidade relativa do ar em dias quentes. Logo, a recomendação é para que se

realizem pequenas pausas durante a jornada de trabalho diária e para que o

trabalhador tome bastante líquido para a hidratação do corpo. Além disso,

recomenda-se o uso de roupas leves, o que ajuda a melhorar o desempenho dos

trabalhos de campo e a proteger contra a irradiação solar. Estas roupas devem

ser bem arejadas e com comprimento considerável (que cubra todo o braço) para

proteção contra queimaduras.

O uso indiscriminado de defensivos alternativos como caldas, inseticidas

naturais e biofertilizantes, mesmo estes sendo de procedência ambiental, sem

considerar a devida recomendação técnica e sem a utilização de equipamentos

de proteção por parte do manipulador, é capaz de expor o agricultor a sérios

problemas de saúde, doenças graves e sequelas devido à contaminação

biológica por fungos bactérias nocivos ao homem. A contaminação pode se dar

por inalação de gases (metano, gás-carbônico), aspiração de poeira (pós-

vegetais, calcário, cinzas), e contato com líquidos fitossanitários alternativos

(absorção cutânea, com olhos, mucosas, e ferimentos na pele).

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

101

Quando falamos de fitoquímicos, como os defensivos químicos

(agrotóxicos), estamos, na verdade, chamando a atenção para o uso

indiscriminado dos mesmos, pois são capazes de provocar sérios danos por

contaminação à saúde do ser humano, dos animais de produção, das abelhas e

de outros insetos importantes para a manutenção da biodiversidade. Tal uso vem

acarretando a simplificação da biodiversidade e provocando a contaminação do

meio ambiente terrestre e aquático visto que a solubilidade, dessas substâncias,

é de fácil disseminação, ficando, portando, a recomendação de evitar o seu uso

e substituí-lo por caldas naturais, extratos vegetais, óleos essenciais e

biofertilizantes alternativos, mas sem deixar de usar os Equipamentos de

proteção individuais-EPI’S para evitar exposição do produtor a esses produtos,

mesmo que sejam de origem natural.

Manuseio de cargas e postura corporal

Ao longo de anos de trabalho com atividades agropecuárias, o homem

do campo geralmente é acometido com um dos mais comuns problemas no

campo, que são as dores e problemas no sistema músculo-esquelético,

principalmente dores nas costas que são uma das principais reclamações dos

trabalhadores como mostram Luiz (2006) e Costa (2010). Muitas podem ser as

precauções que vêm a corrigir a postura do trabalhador rural em suas árduas

tarefas diárias, tais como os programas de educação postural, organizados pelo

Serviço Nacional de Aprendizagem Rural -SENAR, que trazem muitas

orientações aos trabalhadores que manuseiam cargas, trabalham com tratores

e realizam atividades diárias que exigem do aparelho locomotor (coluna

vertebral, músculos, tendões) bastante resistência e flexibilidade como, por

exemplo, o plantio, tratos culturais, colheita, dentre outras atividades

relacionadas com a agricultura.

Ao executar práticas de plantio, o trabalhador deve agachar-se, se

apoiando sobre as pernas, distribuindo o peso do tronco sobre as pernas, desta

forma a coluna vertebral não fica sobrecarregada, pois tal atividade demanda

vários minutos na mesma posição. Ao manusear máquinas pesadas, como

tratores, por longas horas, o operador deve manter postura ereta ao dirigir,

usando os respectivos EPI’s (Equipamentos de Proteção Individual)

recomendados para tal prática, tais como os protetores auriculares. Não apoiar-

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

102

se no volante, e manter a postura com a coluna formando um ângulo de 90º com

o assento da máquina, e sempre que se sentir muito cansado realizar pausas de

poucos minutos seguidos de alongamentos dos braços e pernas com a finalidade

de aliviar a tensão sobre os músculos.

Ao preparar produtos fitossanitários, caldas, diluição de agroquímicos,

proceder com o máximo de segurança em tal atividade com finalidade de se

evitar acidentes de contaminação. Usar todos os EPI’s necessários para

manuseio desses produtos, avental, jaleco, máscara, óculos, touca árabe, luvas,

botas, não deixando de lado que esses produtos devem ser preparados em local

específico para tal finalidade para se evitar contaminação de animais, alimentos

e de fontes de água. Deve providenciar uma bancada com altura considerável

(com no mínimo de 1 metro de altura) para evitar lesões na coluna e acidentes

ao vestir a bomba de pulverização, também é interessante deixar este ambiente

exclusivo para o preparo de produtos fitossanitários.

Para o levantamento de caixas com cargas, por exemplo, caixas de

tomates, cenouras, hortaliças de um modo geral, fazer tal procedimento

abaixando-se com a coluna ereta e flexionando os joelhos e assim o

levantamento das cargas estrará sendo feito de forma suave, ou seja, quem faz

o esforço do levantamento são as pernas e não a coluna vertebral. Quando se

desejar fazer o carregamento destas caixas em carrinhos de mão, não se deve

rotacionar o tronco com cargas suspensas para evitar torções na coluna. O mais

Importante de tudo isso é o alongamento dos braços e pernas antes e depois

dos trabalhos e, desta forma, alivia-se a tensão e o estresse de toda a

musculatura requerida nessa atividade.

Procedimentos e normas para a segurança do trabalhador rural

Apesar de o nosso mundo contemporâneo estar baseado em uma série de

avanços científicos e dominado pelas novas tecnologias, no que se refere à

segurança e saúde do trabalho, observar-se que ainda são consideráveis as

causas de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho em seus diversos

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

103

ambientes como nas fábricas, nas construções civis, nos hospitais e,

indispensavelmente, na agricultura.

Geralmente, o que se pode verificar é que, de um modo geral, a falta de

concepção e resistência do próprio trabalhador a fazer uso de Equipamentos de

Proteção Individual (EPI’s) originam as causas acidentais e os problemas de

saúde acarretados pela ausência do conhecimento das Normas de Segurança e

Saúde do Trabalho. O cumprimento destas normas serve para almejar uma

qualidade de vida mais saudável e, consequentemente, duradoura.

Segundo Boigues et al. (2006), os fatores de segurança, saúde e

qualidade de vida no trabalho são primordiais dentro de uma empresa, pois se

deve considerar que o homem, que está por trás dos trabalhos, é a essência do

universo. No Brasil, o problema de segurança, saúde e qualidade de vida

relacionado diretamente ao trabalho, durante mais de três séculos, não foi motivo

de preocupação, já que a mão-de-obra era constituída basicamente, em sua

maioria, por escravos.

A falta de conhecimento do homem do campo sobre seus direitos e deveres

aliada a deficiência na prestação de serviços por alguns órgãos públicos,

cooperados e/ou cooperativas e sindicatos rurais proporcionam, juntos, uma

deficiência na extensão de conhecimentos ao trabalhador rural, que deveria ser

melhorado o serviço de assistencialismo técnico, formando-os em cursos de

capacitação e gerando novos horizontes e compreensões no tocante as normas

de segurança.

É justamente nesses aspectos que órgãos e/ou instituições de ensino,

pesquisa e extensão devem disponibilizar a oferta de conhecimentos aos

trabalhadores, sejam estes do campo ou da cidade, propondo a realização de

cursos de capacitação, oficinas, palestras e campanhas de conscientização, por

exemplo. Nestes pode-se especificar a importância do desenvolvimento de suas

tarefas com mais segurança e saúde.

Equipamentos de Proteção Individual (EPI’S)- NR 6

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

104

Segundo a Portaria SIT11 nº. 194, de 07 de dezembro de 2010 (BRASIL,

2010), para os fins de aplicação, considera-se Equipamento de Proteção

Individual (EPI), todo dispositivo ou produto, de uso individual, utilizado pelo

trabalhador, destinado à proteção de riscos suscetíveis de ameaçar à segurança

e à saúde no trabalho.

Referindo-se a Norma Regulamentadora (NR) n°. 6, inserida pela Portaria

SIT n.º 107, de 25 de agosto de 2009, alterada pela portaria SIT/TEM nº

194/2010, todo empregador deverá dar plenas condições para que o empregado

venha a ter a possibilidade de obter os EPI’s e fazer uso destes de forma correta.

Ainda segundo a NR n°. 6, cabe ao empregador: adquirir o EPI adequado ao

risco de cada atividade, exigir seu uso, fornecer ao trabalhador somente o EPI

aprovado pelo órgão nacional competente em matéria de segurança e saúde no

trabalho, orientar e treinar o trabalhador sobre o uso adequado do EPI, guarda e

conservação do mesmo, substituir imediatamente, quando danificado ou

extraviado, responsabilizar-se pela higienização e manutenção periódica,

comunicar ao Ministério do Trabalho e Emprego qualquer irregularidade

observada e registrar o seu fornecimento ao trabalhador, podendo ser adotados

livros, fichas ou sistema eletrônico.

Quanto à responsabilidade do trabalhador, de acordo com NR 06, cabe

ao empregado quanto ao EPI: usar, utilizando-o apenas para a finalidade a que

se destina, responsabilizar-se pela guarda e conservação, comunicar ao

empregador qualquer alteração que o torne impróprio para uso e cumprir as

determinações do empregador sobre o uso adequado.

A NR n°. 6 classifica uma vasta lista de EPI’s, podendo ser usados na

indústria, construção civil, hospital, agricultura, pecuária e etc. São exemplos de

EPI’s que podem ser utilizados na agropecuária os itens listados no Quadro 1.

Quadro 1. Lista de Equipamentos de Proteção Individual (EPI’s) Utilizados na

Agricultura

EXEMPLOS DE EPI’s PROTEÇÃO

INDIVIDUAL

1-Capacete; 2-Capuz ou balaclava Proteção da cabeça

11 SIT: Secretaria de Inspeção do Trabalho – Ministério do Trabalho e Emprego

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

105

1-Óculos; 2-Protetor facial; 3-Máscara de Solda Proteção dos olhos e face

1-Protetor auditivo e/ou auricular Proteção auditiva

1-Respirador purificador de ar não motorizado

2-Respirador purificador de ar motorizado

3-Respirador de adução de ar tipo linha de ar

comprimido

4-Respirador de adução de ar tipo máscara

autônoma

5-Respirador de fuga

Proteção respiratória

1-Vestimentas

2-Coletes para proteção do tronco contra riscos de

origem mecânica e/ou físicos, batas e/ou aventais

de proteção química, entre outros

Proteção do tronco

1-Luvas; 2-Creme protetor; 3-Manga; 4-

Braçadeira; 5-Dedeira

Proteção dos membros

superiores

1-Calçado 2-Meia; 3-Perneira; 4-Calça Proteção dos membros

inferiores

1-Macacão; 2-Vestimenta de corpo inteiro; Proteção do corpo inteiro

1-Dispositivo trava-queda 2-Cinturão Proteção contra quedas

com diferença de nível

Dentre estes EPI’s ainda pode-se recomendar alguns específicos

utilizados na agropecuária, como: luvas de borracha e/ou couro, máscaras

respiratórias de carvão ativado, viseira facial, jaleco, calça repelente, boné ou

touca árabe, avental e bota de couro e/ou borracha. Todos estes materiais

devem conter o certificado de aprovação (CA) do MTE.

Além de usá-los de forma correta, também se precisa de uma boa higiene.

Após serem usados, devem ser guardados em um local apropriado que os

mantenham limpos e conservados para o uso seguinte. Com relação à limpeza

da touca árabe, luva, jaleco, calça repelente, avental e bota de borracha, estes

devem ser colocados em um recipiente com um produto para retirar os resíduos

incrustados. Quando se tratar do respirador, devemos efetuar a limpeza

retirando o filtro de carvão ativado para, eventualmente, lavarmos a máscara e,

depois de usá-la, se faz necessário passar álcool 70% (v/v) para sanitizar a

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

106

viseira facial, limpando-a, antes disto, com sabão neutro e uma esponja macia,

para não causar ranhuras na viseira.

Independentemente de qualquer produto ou trabalho que seja executado

com os EPI’s, deve-se alertar pelo cuidado da higienização e a conservação dos

mesmos, observando quando estiverem com algum defeito para o uso, para que

possam ser trocados de forma imediata. Os EPI’s são materiais usados para

proteção de nossa saúde, respeitando as normas prescritas pela Norma

Regulamentadora n°. 7, inserida pela Portaria GM-MTE n.º 3.214, de 08 de junho

de 1978 e alterada pela Portaria SIT-MTE n.º 236, de 10 de junho de 2011

(BRASIL, 2011). Portanto, sem uma higienização e conservação correta poderá

ser acarretada uma eventual fonte de contaminação prejudicial à saúde. Devido

a essas causas é que o conhecimento e o cuidado de como fazer uso destes

equipamentos é de fundamental importância para o desenvolvimento seguro de

suas tarefas e bem estar para a saúde do agricultor.

SEGURANÇA, HIGIENE E SAÚDE DOS ORDENHADORES

Conhecendo a Norma Regulamentadora (NR) N°. 31

Com o objetivo de estabelecer os preceitos a serem observados na

organização e no ambiente de trabalho, de forma a tornar compatível o

planejamento e o desenvolvimento de diversas atividades, dentre elas a

agricultura e pecuária, foi publicada a Norma Regulamentadora (NR) n°. 31

(2005) com a finalidade de estabelecer as normas sobre SEGURANÇA E

SAÚDE NO TRABALHO.

É importante ressaltar que responderão solidariamente pela aplicação

desta regulamentação as empresas, empregadores, cooperativas de produção

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

107

ou parceiros rurais que se congreguem para desenvolver tarefas ou que

constituam um grupo econômico. Segundo a NR-31 (2005), sempre que haja

dois ou mais empregadores rurais ou trabalhadores autônomos que exerçam

suas atividades em um mesmo local, estes deverão colaborar na aplicação das

prescrições sobre segurança e saúde. As demais regras e proposições

prescritas poderão ser vistas na íntegra nesta norma regulamentadora.

Segurança Individual dos Ordenhadores

Para uma ordenha segura há necessidade de alguns materiais, tais como:

detergente neutro, álcool (70° INMP) e o

papel toalha descartável. Também são

exigidas pelas normas regulamentadoras

as vestimentas necessárias para ordenha

higiênica e garantia da segurança

individual, sendo: jaleco, avental, botas e

gorro. Para Silva et al. (2013), estes

materiais são essenciais para higiene

pessoal e comportamento dos ordenhadores. Estes materiais devem ser de cor

clara, preferencialmente de cor branca.

Outra característica, de acordo com a

Portaria n°. 326 (BRASIL, 1997) do

Ministério da Saúde (MS), citado por Silva et

al. (2013), é a lavagem das mãos, devendo

ser realizada sempre que iniciar os trabalhos; antes de iniciar a ordenha de cada

animal e após o ordenhador utilizar o sanitário, manipular material contaminado

e realizar a lavagem e desinfecção das mãos após a manipulação de qualquer

material contaminante que possa transmitir doenças. Outra característica trata-

Figura 3: Procedimento de ordenha realizado de forma incorreta pelo ordenhador, sem o uso de EPI e em ambiente impróprio. Foto: Luiz Moreira de Araújo Júnior(2014).

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

108

se da proibição ao uso de adornos (anéis, alianças, brincos, relógio, pulseira,

colar, piercing, etc.).

Algumas diretrizes devem ser explicadas aos ordenhadores objetivando

oferecer qualificação em matéria higiênico-sanitária e de higiene pessoal,

conforme serão mostradas na sequência.

Figura 5: EPI´s utilizados na prática da ordenha.

FOTO: JOÃO MARIA SOARES DA SILVA (2013)

Figura 4: Procedimento Correto para Realização da ordenha. FOTO: JOÃO MARIA SOARES DA SILVA (2013)

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

109

Normas Higiênico-Sanitárias dos Ordenhadores

A ordenha é a atividade oriunda da obtenção do leite, realizada em

animais lactantes. Esta pode ser realizada manual e/ou mecanicamente. Para

realização desta atividade, existem normas funcionais que permitem a correta e

adequada manipulação higiênico-sanitária do leite obtido e comportamento

higiênico dos ordenhadores, fatores que originam as Boas Práticas de Higiene

Figura 6: Ordenhador praticando atos errados: comer, beber, fumar, Manusear cédulas no ambiente passível de contaminação dos alimentos. FOTO: JOÃO MARIA SOARES DA SILVA (2013)

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

110

na Ordenha (BPHO’s), garantindo a inocuidade da matéria-prima e a saúde dos

ordenhadores.

Nestes preceitos, a Portaria n°. 368 (BRASIL, 1997) adverte que nas

áreas de manipulação do leite não devem ser realizados atos que possam

originar uma contaminação, como: comer, fumar, tossir ou outras práticas anti-

higiênicas. Ainda ressalva que devem ser exigidos hábitos higiênicos de todo o

pessoal que trabalhe na ordenha, como também a proibição de fumar durante a

manipulação do leite.

Segundo Silva et al. (2013), diversas regras higiênicas são estabelecidas

pela Portaria n°. 216 (BRASIL, 2004), destacando-se os itens que regulamentam

a higiene e o comportamento dos ordenhadores. O ordenhador deve tomar

banhos diários e, sempre que iniciar as atividades da ordenha, deve estar bem

uniformizado. Também é preciso que o ordenhador evite espirrar, cantar,

assobiar e/ou falar, manipular dinheiro, fumar, conversar/cumprimentar, passar

os dedos no nariz, orelhas, boca e/ou coçar a cabeça e/ou qualquer parte do

corpo.

Observamos, com este exemplo, que se deve ter cuidados com a higiene

pessoal para que a saúde dos ordenhadores não seja comprometida e também

para não afetar a higiene na obtenção e qualidade do leite.

Saúde dos Ordenhadores

A garantia e acompanhamento da saúde e comportamento dos

ordenhadores são pontos fundamentais para a correta realização da ordenha

nas instalações familiares das propriedades rurais produtoras de leite.

A Instrução Normativa n°. 62 (BRASIL, 2011) define outros importantes

fatores tais como: ter carteira de saúde, renovada anualmente ou quando

necessário; usar macacão e avental plástico ou similar de cor branca, gorro e

botas de borracha, dividir os trabalhos no estábulo, de maneira que o ordenhador

se restrinja à sua função, cabendo a outros as demais operações (limpeza do

curral, preparo da ração ou soltura dos animais no pasto, por exemplo).

Durante as atividades, os ordenhadores deverão manter-se

uniformizados, protegidos, calçados adequadamente e com os cabelos cobertos,

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

111

unhas, bigode e barbas aparados e não apresentarem feridas infectadas,

infecções cutâneas, chagas ou diarreias. Um ponto muito importante para a

melhoria da saúde dos ordenhadores é a participação em cursos de qualificação

e exames de rotina.

Ainda será preciso verificar a situação de saúde, não apresentando riscos

de contaminação ao leite e serem advertidos sobre a importância de

submeterem-se aos exames médicos e laboratoriais que avaliem a sua condição

de saúde antes do início de sua atividade e/ou periodicamente e após o início

das mesmas.

CONCLUSÃO

Diante da temática abordada neste capítulo é de grande importância que

os profissionais das ciências agrárias possam desenvolver orientações,

recomendações das técnicas adequadas para o bom desempenho das atividade

agropecuárias por parte dos agricultores, desta forma reduzindo os números de

acidentes e prejuízos no campo seguindo as normas como recomenda as

instruções normativas citadas neste capítulo.

Vale a pena ressaltar que existem muitas dificuldades para fazer com que

esse conhecimento chegue aos agricultores e seus empregadores portanto é

bastante importante que sejam desenvolvidas pesquisas e estudos mais

aprofundados que levem a uma divulgação efetiva destas informações.

REFERÊNCIAS

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corporal no uso de equipamento de proteção individual. XXVIII Encontro

Nacional de Engenharia de Produção. Rio de Janeiro, 2008

BOIGUES, C. C. A.; CARVALHO, E. P.; CORREIA, G. B.; BAUMGARTEN, J. D.;

PAIVA, V. M. SEGURANÇA E QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO: UMA

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

112

ANÁLISE QUALITATIVA EM EMPRESAS DE MÉDIO PORTE DA REGIÃO DE

PRESIDENTE PRUDENTE. 2006. 118f. Monografia (Bacharel em

Administração) - Faculdades integradas “Antônio Eufrásio de Toledo” Faculdade

de Ciências Econômicas e Administrativas de Presidente Prudente. Presidente

Prudente/SP, 2006.

BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego- MTE. NORMA

REGULAMENTADORA 6 - EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL.

Publicada pela Portaria GM n.º 3.214, de 08 de junho de 1978. Atualização mais

recente dada pela Portaria SIT n.º 194, de 07 de dezembro de 2010. (2010).

BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego-MTE. NORMA

REGULAMENTADORA 7 - PROGRAMAS DE CONTROLE MÉDICO DE

SAÚDE OCUPACIONAL. Publicada pela Portaria GM n.º 3.214, de 08 de junho

de 1978. Atualização mais recente dada pela Portaria SIT n.º 236, de 10 de junho

de 2011. (2011).

BRASIL. Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA). Portaria

n°. 368 de 08 de setembro de 1997. Aprova o regulamento técnico sobre

condições higiênico-sanitárias e de boas práticas de fabricação para

estabelecimentos produtores/industrializadores de alimentos. Diário Oficial da

República Federativa do Brasil, Brasília, 04 set. 1997.

COSTA, C.K.L.; LUCENA, N.M.G.;TOMAZ, A.F.; MÁSCULO, F.S.. AVALIAÇÃO

ERGONÔMICA DO TRABALHADOR RURAL: ENFOQUE NOS RISCOS

LABORAIS ASSOCIADOS À CARGA FÍSICA. GEPROS- Gestão da produção,

Operações e Sistemas – Ano 6, nº 2, p.101-1012, abril-Junho/2011.

_________. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Departamento

de Inspeção de Produtos de Origem Animal. Instrução Normativa nº. 62, de 29

de dezembro de 2011. Regulamento Técnico de Produção, Identidade e

Qualidade do Leite tipo A, o Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade de

Leite Cru Refrigerado, o Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade de

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

113

Leite Pasteurizado e o Regulamento Técnico da Coleta de Leite Cru Refrigerado

e seu Transporte a Granel. D.O.U., 30/12/2011 - Seção 1. 24p.

_________. Ministério da Saúde. Portaria n°. 326, de 30 de julho de 1997.

Estabelece regulamento técnico condições higiênico-sanitárias e de boas

práticas de fabricação para estabelecimentos produtores/industrializadores de

alimentos. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 01 ago.

1997.

_________. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária

(ANVISA). Resolução RDC nº. 216, de 15 de setembro de 2004 . Dispõe sobre

Regulamento Técnico de Boas Práticas para Serviços de Alimentação. Diário

Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, p. 25, 16 set. 2004.

Seção 1, p. 25.

NR31 -Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho na

Agricultura, Pecuária, Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura – NR 31,

aprovada pela Portaria nº. 86 do Ministério do Trabalho e Emprego em

03.03.2005.

LUIZ, G.S., ANÁLISE DO TRABALHO AGRÍCOLA: UM ENFOQUE

ERGONÔMICO. FACULDADE ASSIS GURGACZ – FAG, Cascavel-PR, 2006;

SILVA, J. M. S.; SANTOS, E. P.; SANTOS, A. F. C. BOAS PRÁTICAS DE

HIGIENE NA ORDENHA (BPHO’S). Bananeiras: UFPB, 2013. 47p. : il.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

114

CAPÍTULO 9

ORGANIZAÇÃO DE UMA FEIRA DE PRODUTOS

AGROECOLÓGICOS

Valter da Silva

Antônio Cardoso

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

115

ORGANIZAÇÃO DE UMA FEIRA DE PRODUTOS AGROECOLÓGICOS

Valter da Silva12

Antônio Cardoso

INTRODUÇÃO

Dentre muitos desafios da agricultura familiar, a comercialização é sem

dúvidas um problema secular, presente nas comunidades rurais. Pensando

nisso o governo brasileiro através do Pronaf – Programa Nacional de

Fortalecimento da Agricultura Familiar, liberou linhas de créditos para a compra

de insumos agrícolas, escoamento da produção e comercialização. Sendo a

comercialização o resultado da produção agrícola em que o agricultor familiar

investe todo seu recurso financeiro e, ainda o seu trabalho braçal e de membros

de sua família; havia a necessidade de se criar uma ponte de ligação entre o

agricultor e o consumidor final, evitando assim, os atravessadores. Por isso, o

governo federal criou o PAA – Programa de Aquisição de Alimentos da

Agricultura Familiar e o PNAE – Programa Nacional de Alimentação Escolar, que

são formas diretas de o produtor rural fornecer alimentos para instituições

públicas e associações rurais e de bairro.

Com o advento e a expansão das chamadas feiras de produtos orgânicos

ou agroecológicos, foi preciso também através de editais ou chamadas públicas

liberar o aporte financeiro, oriundo do Ministério do Desenvolvimento

Agrários/Secretaria de Agricultura Familiar – MDA/SAF, com o objetivo de

incentivar a implantação dessas feiras nos vários municípios brasileiros. Foi

neste contexto que diversos municípios paraibanos foram contemplados com a

feira. Além de ser mais uma forma direta de comercialização de produtos da

agricultura familiar, a feira agrega valores socioambientais em todos os itens

comercializados. Logo, quando se fala de agricultura sustentável, se está falando

de estilos de agricultura de base ecológica que atendam a requisitos de

12 Engenheiro Agrônomo –CCA/UFPB, Mestrando em Ciências Agrárias( Agroecologia) –PPGCAG/ CCHSA UFPB. E-mail: [email protected]

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

116

solidariedade entre as gerações atuais e destas para com as futuras gerações,

o que alguns autores chamam de uma “ética da solidariedade (Caporal e

Costabeber, 2004). Segundo Santos et al., (2011), é preciso aprimorar os

tradicionais sistemas agrícolas existentes, na busca de produtividade e

qualidade do produto final destinado ao consumo in natura. Portanto o uso de

tecnologias adequadas é o único meio para se promover a preservação do meio

ambiente e da saúde humana, lembramos ainda, que a conscientização

socioeducativa do produtor rural também contribui para esse propósito.

O objetivo deste trabalho é informar ao leitor quanto à implantação de

feiras de produtos agroecológicos em seu município.

Agricultura Familiar e Agroecologia

Agricultura Familiar é a agricultura praticada pelo pequeno agricultor rural;

o mesmo se dispõe de sua força braçal e de seus familiares dependentes, para

produzir em sua pequena propriedade rural o sustento da família. A agricultura

familiar é entendida como uma forma social particular de organização da

produção, tendo como base a unidade de produção gerida pela família

(Hinterholz e Ribeiro, 2011).

A agricultura familiar nos últimos anos vem passando por uma transição

em seu sistema de produção convencional, por um sistema de produção de base

ecologicamente sustentável. A agricultura familiar por muitas décadas foi refém

do pacote tecnológico vendido pela revolução verde. Segundo Hinterholz e

Ribeiro (2011), A chamada Revolução Verde surgiu logo após a Segunda guerra

Mundial e tinha como pressuposto o aumento de produção e da produtividade

agrícola. Foi à ideia vendida pela Revolução Verde que trouxe para o Brasil as

indústrias de fertilizantes e adubos químicos, as indústrias de herbicidas e outros

agroquímicos e ainda as montadoras de máquinas pesadas (caminhões, tratores

agrícolas e seus implementos). Atualmente percebe-se que, apenas, os

latifundiários responsáveis pelos grandes monocultivos conseguiram lucrar com

o pacote tecnológico vendido pela Revolução verde. E que a agricultura familiar

no Brasil sempre foi detentora de poucas terras; chegando até mesmo existir

unidade de produção familiar com três hectares ou menos, não tinha como os

mesmos lucrar já que era preciso de altos investimentos.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

117

Segundo Caporal e Costabeber (2004, p.7): Desde muito

tempo a sociedade vem buscando estabelecer estilos de

agricultura que sejam menos agressivos ao meio ambiente

e capazes de proteger os recursos naturais, assegurar maior

longevidade, tentando fugir do estilo convencional de

agricultura que passou a ser hegemônico a partir dos novos

descobrimentos da química agrícola, da biologia e da

mecânica ocorridos a partir do final do século XIX. Em

diversos países, surgiram versões destas agriculturas

alternativas, com diferentes denominações: orgânica,

biológica, ecológica, biodinâmica, regenerativa,

permacultura, etc., cada uma delas seguindo determinados

princípios, tecnologias, normas, regras e filosofias, segundo

as correntes a que estão aderidas.

Então, para sair do sistema de produção agrícola vendido pela Revolução

verde, que além de caro, era deletério do meio ambiente e do homem foi preciso

chegar ao conceito de Agroecologia. A Agroecologia é uma ciência que engloba

todos os princípios fundamentais das chamadas agricultura alternativas, porém

de forma multidisciplinar, visando encontrar soluções adaptáveis para um

sistema de produção agropecuário que seja mantenedor de recursos naturais e

protetores da biodiversidade e da saúde humana.

Resumindo, a Agroecologia se consolida como enfoque

científico na medida em que este campo de conhecimento

se nutre de outras disciplinas científicas, assim como de

saberes, conhecimentos e experiências dos próprios

agricultores, o que permite o estabelecimento de marcos

conceituais, metodológicos e estratégicos com maior

capacidade para orientar não apenas o desenho e manejo

de agroecossistemas sustentáveis, mas também processos

de desenvolvimento rural sustentável, Caporal e Costabeber

(2004, p.13).

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

118

É neste contexto de transição de um sistema de produção agropecuário

convencional para um sistema de produção agropecuário de base ecológica e

sustentável; que as feiras de produtos agroecológicos vêm incentivar a produção

agrícola e pecuária dentro dos preceitos da Agroecologia e, educando e

estimulando o consumidor final para uma alimentação saudável oriunda de um

sistema de produção sustentável.

Comercialização da Agricultura Familiar

O governo federal instituiu políticas públicas para a comercialização

institucional através dos Programas de Aquisição de Alimentos (PAA) e do

Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que são formas diretas de

o produtor rural fornecer alimentos para as escolas da rede pública de ensino,

no caso do PNAE; e fornecer alimentos aos hospitais públicos, aos presídios, as

associações rurais e de bairro e ainda as instituições filantrópicas, no caso PAA.

Sem dúvida essa iniciativa do governo federal vem estimulando a geração de

emprego e renda. Mas as oportunidades do agricultor familiar não param por aí;

a possibilidade do mesmo vender a produção excedente em feira livre existe.

Principalmente se ele quer agregar valor à sua produção, nesse caso a feira de

produtos agroecológicos atende essa expectativa.

É bom lembrar que a agricultura familiar sempre tentou procurar uma

maneira de comercializar seus produtos. No entanto, não existiam as

oportunidades que se encontra hoje, e por muitas vezes a produção era vendida

a pessoa do atravessador, nas feiras livres ou nas Centrais de Abastecimento

(CEASAS). O atravessador adquiria a produção por preços muito abaixo do que

era praticado no mercado local, ficando com todo o lucro do agricultor. Para

vender nas centrais de abastecimento o agricultor deveria dispor de pelo menos

um caminhão e às vezes de motorista habilitado e ainda comprar um ponto de

venda nessas centrais. A venda feita nas feiras livres sempre foi a alternativa

mais viável para o agricultor familiar, já que ele poderia vender na feira livre de

seu município e de municípios vizinhos.

Quando o agricultor familiar é proprietário de um sacolão no comércio da

cidade, ele pode vender diretamente a sua produção ao consumidor final, por

um preço justo para ambas as partes. Mas sabemos que nem todo agricultor

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familiar tem um ponto de comércio; por isso, a venda da produção familiar nas

feiras livres é talvez, depois do PAA e do PNAE, a única alternativa vantajosa

para o agricultor. A venda da produção familiar em feira livre dá um bom

rendimento principalmente quando a feira local ou da região é grande.

O sistema de comercialização compreende diversas etapas,

e cada uma exige a atuação de agentes executando

determinadas funções ou serviços. Tais funções adicionam

utilidades e, consequentemente, valor ao produto. Conforme

sua natureza, as utilidades podem ser de lugar, de tempo e

de forma. Por exemplo, uma dona-de-casa vai ao sacolão

(lugar), aos sábados pela manhã (tempo), para adquirir

pequenas quantidades de hortaliças que são escolhidas e

acondicionadas a sacos plásticos (forma). Note-se que tais

produtos foram escolhidos em quantidades muito maiores,

em propriedades rurais distantes e há alguns dias. Então,

são as utilidades adicionadas ao produto, desde a fonte

produtora até o momento em que ele é colocado no porta-

malas do carro da família, que possibilitam a satisfação do

consumidor, Filgueira (2007).

Pelo que foi exposto, logo acima, o agricultor também tem que ficar

antenado com as novidades e o surgimento de possíveis nichos de mercado.

Com o advento da agricultura orgânica e da Agroecologia como ciência, o

consumidor final busca por alimentos saudáveis, mesmo que para isso ele tenha

que pagar um pouco mais.

Atualmente a produção orgânica ou nos preceitos da Agroecologia tem

conquistado um mercado consumidor exigente, que está disposto a pagar mais,

por um produto livre de agrotóxico e que respeite o meio ambiente. Para atender

essa demanda os agricultores familiares devem se organizar para poder

implantar em seus municípios e em municípios da região, feiras de produtos

agroecológicos e até mesmo se agruparem em associação rural para poder

vender a produção para as grandes redes de supermercados da capital e região

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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metropolitana. É nos grandes centros urbanos que se encontra o maior mercado

consumidor de produtos agroecológicos.

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Figuras 1 a 4 - Feira de produtos Agroecológicos de Bananeiras/PB.

Foto: Antonio Cardoso – AGEMTE

Mobilização e Formação da Associação

Na formação da feira de produtos agroecológicos os “agentes envolvidos”

devem ser os primeiros a ser mobilizados e convocados para as reuniões e

debates acerca da implantação da feira. Entende-se aqui por agentes

envolvidos: os agricultores familiares, os mini pecuaristas, os pecadores

artesanais, os artesões rurais e de modo geral os mini produtores rurais. O

sindicato, os associados e cooperados de comunidade rurais devem se fazer

presentes; sendo aconselhável que o Conselho Municipal de Desenvolvimento

Rural Sustentável (CMDRS), conduza os encaminhamentos para a formação da

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DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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feira. No entanto, a instância máxima e deliberativa para o funcionamento da

feira deve ser deve ser construída pelos próprios agricultores.

Para se chegar à formação da feira serão necessárias pelo menos cinco

etapas. A primeira será uma reunião informando aos interessados, o que venha

a ser uma feira de produtos agroecológicos. E na oportunidade é preciso levar

ao conhecimento de todos os presentes, o entendimento sobre Agricultura

Familiar, Agroecologia, Associação e comercialização. Temas brevemente

discorridos neste trabalho. É bom lembrar que alguns desses temas é do

cotidiano do agricultor, e por isso não haverá dificuldades do agente mobilizador

prestar os devidos esclarecimentos. Devendo o mesmo reforçar, apenas, o que

venha a ser agroecologia e as diversas formas de comercialização. A segunda

etapa será outra reunião, desta vez para cadastrar os agricultores interessados

em participar da feira e anotar em fichas individuas o que eles produzem. A

terceira etapa seria fazer uma visita técnica nas propriedades dos agricultores

cadastrados para ver o que realmente eles produzem e se produzem e, se está

dentro do preceito da Agroecologia. Lembrando que esta terceira etapa deverá

ser periódica, como forma de fiscalizar se o que eles produzem está dentro da

ideologia da agroecologia. A quarta reunião seria para decidir questões sobre a

criação de uma associação de agricultores familiares da feira de produtos

agroecológicos. Quinta etapa seria para organizar a implantação da feira. Nessa

etapa decidiria questões sobre:

Em que dia(s) da semana a feira deveria ocorrer;

Quantos bancos de venda deveriam compor a feira;

Que produtos seriam vendidos;

Como seria feita o escoamento da produção para feira (individual

ou coletiva);

Onde a feira ficaria localizada, a prefeitura cederia o espaço;

A feira teria seu reconhecimento na Lei Orgânica do Município;

Quem ficaria responsável pela montagem e desmontagem da

estrutura da feira, entre outros assuntos a tratar.

A quarta reunião como já foi dito, trata de questões sobre a criação da

associação da feira. Não cabe aqui neste trabalho desdobrar todo o

procedimento para finalizar essa etapa. No entanto, passaremos os passos

necessários para se chegar a esse objetivo.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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Primeiro é preciso saber que a associação de produtores rurais é uma

sociedade de pessoas sem fins lucrativos, regido por um Estatuto Social

(regimento interno);

O estatuto diz tudo sobre a associação e seus sócios: seus

direitos e deveres e seu funcionamento. Tudo que estiver

escrito nele deverá ser cumprido; por isso, tudo deve ser

bem discutido entre os futuros sócios. O estatuto deve estar

pronto para ser lido e aprovado na primeira reunião da

associação, Embrapa (2006 p.14).

Segundo, a associação será criada por um grupo de associados, os

assim, chamados fundadores, formado por pessoas físicas (agricultores

familiares ou mini produtores rurais). Terceiro, a associação deve ser registrada

no Cartório de Registro de Títulos e Documentos, no Cadastro Geral de

Contribuinte - CGC da Receita Federal na Receita Estadual, na Prefeitura

Municipal e no Instituto Nacional de Seguridade Social-INSS. Quarto é a diretoria

quem homologa o pedido de ingresso de novos associados. Quinto, o valor da

jóia, ou seja, da taxa de inscrição é a Assembleia Geral quem decide, assim

como, a taxa mensal a ser cobrada. É preciso que o(s) agente(s) mobilizador

(es), seja orientado por um advogado nessa etapa da criação da associação.

Maiores informações obtêm-se na Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 que

disciplinam o associativismo no código civil e na Lei nº 11.127, de 28 de junho

de 2005 que alterou alguns artigos da lei nº 10.406.

DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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Figuras 6 a 8 - Organização da feira de produtos agroecológicos de Bananeiras

e Alagoa Grande/PB.

Foto: Antonio Cardoso – AGEMTE

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a criação da feira de produtos agroecológicos é preciso forma uma

comissão com os integrantes da associação e se possível da sociedade civil

organizada para fazer a fiscalização dos alimentos que é produzido no campo

pelos agricultores. Isso é importante para garantir a fidelidade do sistema de

produção nos moldes da Agroecologia. E assim, garantir ao consumidor final, a

qualidade dos alimentos que é vendido na feira. Tem-se que diversificar a

produção de alimentos para que o consumidor tenha mais opções no momento

de levar o(s) produto(s) para casa. Deve-se fazer um calendário de plantio e

colheita junto aos agricultores para que se tenham sempre alimentos

diversificados a disposição o ano inteiro.

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DESENVOLVIMENTO RURAL PROCESSOS SOCIAIS E PRODUTOS AGROECOLÓGICOS - 2014

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REFERÊNCIAS

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princípios. Brasília: MDA/SAF/DATER-IICA, 2004. 24 p.

SANTOS, E. S. dos; LACERDA, J. T. de; MATIAS, E. C.; BARBOSA, M. M.

Cultivo do inhame em base agroecológica. João Pessoa-PB: Emepa, 2011.

60p.

HINTERHOLZ, B.; RIBEIRO, V. de M. Feira Agroecológica: uma alternativa

para comercialização de produtos oriundos da agricultura familiar orgânica

no município de medianeira-PR: o caso da AAFEMED. Pato Branco: UTFPR,

2011.7p. Disponível

em:<http://revistas.utfpr.edu.br/pb/index.php/SysScy/article/view/1379/852>,

Acesso em: 25/04/2014.

FILGUEIRA, F. A. R. Novo Manual de Olericultura: Agrotecnologia moderna

na produção e comercialização de hortaliças. 3. ed. rev. e ampl. Viçosa, MG:

Ed. UFV, 2007. 421p.

EMBRAPA. ABC da Agricultura Familiar: Como organizar uma associação.

Brasília-DF, 2006. 45p.