desenvolvimento, calibraÇÃo e validaÇÃo de...

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1 DESENVOLVIMENTO, CALIBRAÇÃO E VALIDAÇÃO DE MODELOS DE MARKOV APLICADOS A CLASSES DE SECA, CONDICIONADOS POR REGIMES DE CIRCULAÇÃO ATMOSFÉRICA DE GRANDE ESCALA Carlos A. L. Pires 1 , João M. B. B. Sousa 2 Resumo Neste trabalho calibram-se e validam-se dois modelos de previsão de classes do SPI mensal na região do Alentejo. No primeiro modelo é usada uma cadeia de Markov sobre 4 classes de SPI. No segundo, essa cadeia é condicionada pela fase, positiva ou negativa da Oscilação do Atlântico Norte (NAO) e/ou da Oscilação Ártica (AO). A fase positiva está fortemente correlacionada com a precipitação em Portugal. As probabilidades das fases positiva e negativa são modeladas por uma cadeia de Markov (2x2) acoplada à cadeia de Markov do SPI. Quantifica-se então a qualidade média das previsões do SPI aos prazos de 1,2 3 meses através do Heidke Skill Score (HSS) e da Proporção Correcta (PC). Calculam-se ainda e para cada classe SPI: a) o tempo médio de residência, b) o tempo médio até à primeira passagem e c) o tempo de recorrência. Os modelos de previsão são avaliados nas versões homogénea e não homogénea, isto é dependente do mês. Abstract Two formulations of drought forecasting are implemented and compared. Firstly a Markov chain model is tested, by using monthly-mean precipitation data alone transformed into the monthly-Standard Precipitation Index (monthly-SPI). Then, the previous Markov chain is coupled with a Markov chain governing atmospheric regime transitions between positive and negative phases of NAO or AO. Then, we produce deterministic forecasts of the monthly-SPI at 1, 2 and 3 months of forecast lag. The probabilistic character of the Markov chain allowed also to compute useful items such as: 1) the expected permanence time in each class of drought severity, 2) expected transition time between classes, 3) recurrence time in each class. These items are compared for both formulations. The forecast skills are evaluated in the Potuguese Alentejo region using categorical scores: the Heidke Skill Score (HSS) and Correct Proportion (PC). 1 Instituto Dom Luiz (Laboratório Associado), DEGGE, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Campo Grande, 1749-016 Lisboa, Portugal. Email: [email protected] 2 Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Campo Grande, 1749-016 Lisboa, Portugal. Email: [email protected]

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DESENVOLVIMENTO, CALIBRAÇÃO E VALIDAÇÃO DE MODELOS DE MARKOV APLICADOS A CLASSES DE SECA,

CONDICIONADOS POR REGIMES DE CIRCULAÇÃO ATMOSFÉRICA DE GRANDE ESCALA

Carlos A. L. Pires1, João M. B. B. Sousa2

Resumo Neste trabalho calibram-se e validam-se dois modelos de previsão de classes do SPI mensal na região do Alentejo. No primeiro modelo é usada uma cadeia de Markov sobre 4 classes de SPI. No segundo, essa cadeia é condicionada pela fase, positiva ou negativa da Oscilação do Atlântico Norte (NAO) e/ou da Oscilação Ártica (AO). A fase positiva está fortemente correlacionada com a precipitação em Portugal. As probabilidades das fases positiva e negativa são modeladas por uma cadeia de Markov (2x2) acoplada à cadeia de Markov do SPI. Quantifica-se então a qualidade média das previsões do SPI aos prazos de 1,2 3 meses através do Heidke Skill Score (HSS) e da Proporção Correcta (PC). Calculam-se ainda e para cada classe SPI: a) o tempo médio de residência, b) o tempo médio até à primeira passagem e c) o tempo de recorrência. Os modelos de previsão são avaliados nas versões homogénea e não homogénea, isto é dependente do mês.

Abstract

Two formulations of drought forecasting are implemented and compared. Firstly a Markov chain model is tested, by using monthly-mean precipitation data alone transformed into the monthly-Standard Precipitation Index (monthly-SPI). Then, the previous Markov chain is coupled with a Markov chain governing atmospheric regime transitions between positive and negative phases of NAO or AO. Then, we produce deterministic forecasts of the monthly-SPI at 1, 2 and 3 months of forecast lag. The probabilistic character of the Markov chain allowed also to compute useful items such as: 1) the expected permanence time in each class of drought severity, 2) expected transition time between classes, 3) recurrence time in each class. These items are compared for both formulations. The forecast skills are evaluated in the Potuguese Alentejo region using categorical scores: the Heidke Skill Score (HSS) and Correct Proportion (PC).

1 Instituto Dom Luiz (Laboratório Associado), DEGGE, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Campo Grande, 1749-016 Lisboa, Portugal. Email: [email protected] 2 Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Campo Grande, 1749-016 Lisboa, Portugal. Email: [email protected]

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A seca é um fenómeno natural que resulta da persistência de valores de precipitação abaixo da média com impactos do deficit de água ao nível hidrológico, ecológico, agrícola e económico (Pereira et al. (2009)). A sua frequência, duração e severidade são irregulares e incertas, o que a tornam num fenómeno pouco preditivo, e por isso também, perigoso e desastroso. Os impactos negativos da sua ocorrência, poderão ser minimizados ou mitigados por via de um melhor conhecimento do fenómeno, das suas causas e da sua possível evolução. O carácter estocástico da severidade da seca justifica a calibração de modelos probabilistas para a previsão temporal dos índices de seca, os quais podem ser usados como ferramentas na tomada de decisões em sectores sócio-económicos em que a seca tem mais impacto tais como a agricultura, a saúde pública, os transportes etc. (AMS, 2004; Wilhite et al. 2000).

A monitorização da seca é baseada em índices dados como funções compostas de variáveis hidrometeorológicas. A transversalidade dos impactos da seca a vários níveis justifica a criação de índices mais ou menos sofisticados apropriados para caracterizar, quer as secas meteorológica, agrícola, hidrológica ou sócio-económica (e.g. SPI, PDSI, WPDSI) (Hayes, 2006). Um dos índices de maior comparabilidade entre diferentes climas é o índice estandardizado de precipitação SPI (Standard Precipitation Index), desenvolvido por (McKee et al., 1993 e 1995). Este índice é unicamente baseado na precipitação acumulada num dado período (escala temporal) e numa dada região (escala espacial). O SPI tem por base as probabilidades de ocorrência da seca (Vogt e Somma, 2000), sendo dado pelo quantil da precipitação acumulada, transformada por anamorfose numa variável aleatória Gaussiana standard. Desse modo o SPI é um índice de seca relativizado ao clima regional em questão, seja ele muito ou pouco pluvioso.

As previsões probabilistas dos índices de seca seguem duas metodologias. Numa delas são corridos modelos físicos de circulação geral atmosférica ou de modo mais geral ‘Earth models’, acoplando atmosfera, hidrosfera, solos, criosfera e biosfera. Esses modelos são integrados em modo ‘multi-condições iniciais’ e em modo ‘perturbações estocásticas da física do modelo’, de modo a produzir ensembles de previsões com prazos desde mensal-sazonal a anual-decadal. Desses ensembles inferem-se probabilidades de classes de seca, além de muitos outros produtos. Tal é objecto de projectos envolvendo dezenas de instituições (projecto DEMETER (http://ecmwf.int/research/demeter) e projecto ENSEMBLES (http://ensemble.jrc.ec.europa.eu).

A segunda metodologia recorre a modelos estatísticos pesquisando relações estatísticas espacio-temporais robustas da precipitação consigo própria, ou então da precipitação com outros preditores locais ou remotos, tais como índices de circulação atmosférica (Kim e Kim, 2010), perturbações nos fluxos radiativo, de calor sensível ou latente, induzidas por anomalias térmicas no oceano e nos solos, da quantidade de água nos solos e ainda da quantidade de neve ou do gelo de mar; anomalias da circulação estratosférica etc. (Barnston, 1994; Almeira e Scian, 2006). Neste contexto são de assinalar, para Portugal Continental, a elevada correlação negativa entre a precipitação e a Oscilação do Atlântico Norte (NAO) isto é a maior probabilidade de deficit relativo de chuva ou de condições de seca

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para valores positivos do índice da NAO, quando o anticiclone dos Açores está anomalamente mais intenso ou com o seu centróide mais deslocado a Norte (Hurrell, 1995; Trigo et al. 2004). Essa correlação é assimétrica ou seja ela é particularmente intensa durante o regime NAO- que é o regime favorável a maior precipitação em Portugal (Pires e Perdigão, 2007). A correlação referida observa-se, quer a nível mensal, quer a nível decadal. Em particular assinale-se a tendência decadal positiva da NAO nos anos 1980-2000 (Trigo et al. 2002) a que tem está associado um deficit pluvioso na Primavera em Portugal (Trigo et al. 2008). A seca está ligada em muitos pontos do globo às teleconexões atmosférico-oceânicas, tais como o El Niño Southern Oscillation (ENSO) (Cordery e McCall, 2000).

Os modelos estatísticos de previsão dos índices de seca incluem igualmente modelos estocásticos (inlar, 1975) tais como cadeias de Markov simples com classes do SPI (Paulo et al., 2005, Paulo e Pereira, 2006, 2007) e outras em que as probabilidades esperadas de transição de classes seguem modelos log-lineares (Moreira et al. 2006).

Neste artigo pretende-se acoplar cadeias de Markov de classes de SPI com modelos estatísticos de previsão de índices de circulação atmosférica, com elevada capacidade preditiva da precipitação em Portugal Continental à escala mensal e para prazos até alguns meses (Sousa, 2009). É comparada a qualidade média das previsões de classes do SPI à escala mensal quando as cadeias são ou não condicionadas por preditores meteorológicos. As previsões são obtidas para o SPI regional do Alentejo. Desenvolvem-se versões, homogénea e não homogénea dos modelos, isto é, em que as matrizes de transição de classe, respectivamente, dependem e não dependem do mês ou da fase do ciclo anual.

No SPI mensal, as transições mensais entre diferentes classes são muito mais frequentes que no SPI-3 (acumulado em 3 meses) e que no SPI-12 (acumulado em 12 meses), nos quais há uma elevada persistência da classe (Paulo, 2004). As raras transições mensais do SPI-12, assinalando o começo, fim, agravamento ou atenuação de seca devem-se a alterações mensais bruscas do SPI mensal. Por essa razão optou-se em testar a predictabilidade do SPI mensal em vez de um SPI com maior escala temporal.

Os tempos característicos das cadeias de Markov são quantificadas e comparadas nas várias formulações. Avalia-se ainda a qualidade média das previsões deterministas de classes, obtidas pelo critério da classe prevista mais provável. Para tal usam-se medidas de score apropriadas tais como a PC (Proporção correcta) e o HSS (Heidke Sill score).

Dados do SPI, classes de seca e índice da NAO e AO Neste estudo foram usadas séries do SPI à escala mensal, acumulado na região do Alentejo numa sequência de 805 meses entre Setembro de 1932 e Setembro de 1999, obtidas a partir de dados mensais de precipitação em 49 estações udométricas do INAG sujeitas a prévia análise de aleatoriedade, homogeneidade e preenchimento de falhas. A acumulação espacial recorre à técnica dos polinómios

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de Thiessen (Paulo, 2004). As classes usadas de SPI ou de severidade de seca são apresentadas na Tabela 1, usando uma terminologia adaptada de Mckee et al., 1993.

Tabela 1. Classificação das classes de seca segundo o SPI.

Código Classes de seca Valores SPI1 Não-seca SPI ≥ 0 2 Ligeira -1 < SPI < 03 Moderada -1.5 < SPI ≤ -1 4 Severa/Extrema SPI ≤ -1.5

As probabilidades das classes são facilmente obteníveis das funções de distribuição da distribuição Gaussiana standard. Essas probabilidades Pr(i), i=1,2,3,4, são os valores esperados das frequências relativas de observação de cada classe i. Assim Pr(1)=0.50, Pr(2)=0.34, Pr(3)=0.09, Pr(4)=0.07. Foram também usados valores mensais do índice da Oscilação do Atlântico Norte (NAO) e do Índice da Oscilação Ártica (AO), ambos no período entre Janeiro de 1950 até Dezembro de 2005, disponíveis a partir do CPC (Climate Prediction Center) no sítio: http://www.cpc.ncep.noaa.gov. O índice NAO é obtido em dois passos: Toma-se a diferença entre os valores standardizados (centrados e de variância unitária) da pressão ao nível do mar nos Açores e na Islândia. Essa diferença é então standardizada para obter o índice NAO em cada mês. Na fase positiva (NAO>0), o anticiclone dos Açores está mais intenso (maior pressão) e a depressão da Islândia mais cavada (menor pressão), o que leva a uma migração anómala para norte da rota Atlântica das perturbações sinópticas instáveis que produzem precipitação frontal, gerando anomalias negativas de precipitação e seca na zona Sul da Europa, incluindo Portugal e anomalias positivas de precipitação no Norte da Europa. Na fase negativa verifica-se a migração para Sul daquelas perturbações (Hurrell, 1995), conducentes a maior pluviosiadade que o normal em Portugal. Este resultado é coerente com um valor negativo da ordem de (-0.6) (Figura 1) da correlação simultânea entre o índice NAO mensal e a precipitação mensal em Portugal nos meses de Inverno (Dezembro a Fevereiro - DJF). Tal é visível através do mapa de correlação na região Euro-Atlântica entre o SPI mensal e o índice NAO mensal (Fig. 1), avaliada no período DJF. O índice NAO tende a manter uma certa persistência ao longo de 1-2 meses, o que justifica alguma predictabilidade quando é usado um modelo auto-regressivo AR (Stephenson et al., 2000). As correlações entre a NAO num mês genérico t e a precipitação num mês t+p meses (p=1,2,3) assume valores que justificam o uso da NAO como preditor (precursor) de anomalias da precipitação e da seca.

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Fig. 1. Mapa de correlação entre o SPI mensal e o índice mensal da NAO avaliado no período Dezembro-Fevereiro. Os valores do SPI obtiveram-se dos dados mensais de precipitação no período Jan. 1950- Dez. 2005, na grelha 2.5º (lat)x2.5 º(long) das reanálises do NCEP-NCAR (Khistler et al., 2001).

A Oscilação Ártica (AO - Arctic Oscillation) é um modo hemisférico de variabilidade que representa as variações dominantes do campo da pressão a Norte do paralelo 20ºN sendo caracterizada por anomalias de pressão no Ártico, simultâneas com anomalias da intensidade do jacto polar e correspondentes anomalias simétricas numa faixa de latitudes médias no intervalo 37ºN-45ºN. Existe uma forte correlação positiva entre os índices da NAO e da AO podendo a NAO ser observada como a contrapartida na região Norte-Euro-Atlântica da Oscilação Ártica. A AO apresenta teleconexões com o campo da precipitação e da temperatura (Thompson e Wallace, 1998), o que justifica, tal como para a NAO, a sua utilização como preditor do SPI.

Cadeias de Markov homogénea e não homogénea Representemos por SPIt, a classe de SPI no mês t, neste caso pertencente ao conjunto das N=4 classes listadas na tabela 1. O vector probabilidade correspondente é: Pr , 1, 2,3, 4t tSPI i i N X . Neste artigo é calibrada uma

cadeia de Markov, aqui designada por Markov-SPI-homogénea (MSh), inferida a partir da tabela de contingência 4X4 com os número ni,j de ocorrências (SPIt=i, SPIt+1=j), dentre todos os pares de meses consecutivos. A partir dos ni,j estimam-se as probabilidades condicionais de transição de SPIt para SPIt+1 no mês seguinte, independentemente de t. Representando por M, a matriz de transição entre classes e assumindo tX como um vector linha, tem-se então a representação algébrica de

MSh na forma:

1t t X X M , (1a)

com os elementos da matriz dados pelas probabilidades condicionais:

6

,, 1

,1

Pr | ; , 1, 2,3, 4i ji j t t N

i kk

nSPI j SPI i i j N

n

M (1b)

A matriz M é então dada em síntese pela matriz de probabilidades:

Pr(1 1) Pr(1 2) Pr(1 3) Pr(1 4)

Pr(2 1) Pr(2 2) Pr(2 3) Pr(2 4)

Pr(3 1) Pr(3 2) Pr(3 3) Pr(3 4)

Pr(4 1) Pr(4 2) Pr(4 3) Pr(4 4)

M

, (2)

onde Pr(ij)=Pr(SPIt+1=j|SPIt=i). Os valores da matriz triangular superior (inferior) indicam probabilidades de agravamento (desagravamento) da seca.

Um dos objectivos do artigo é o de obter previsões do SPI com uma boa qualidade média, que é aferida por medidas apropriadas que apresentaremos à frente. As cadeias de Markov permitem obter previsões probabilistas de classes. Em todos os esquemas de previsão que apresentamos, toma-se como classe prevista aquela que é mais provável. Assim a previsão probabilista de SPIt+p (p1) a p meses de prazo a partir de SPIt vem dada pela multiplicação matricial à direita de p vezes a matriz de transição. No caso de MSh tem-se o correspondente vector de probabilidade:

... pt p t t

p vezes X X M M X M (3)

onde , , 0 se ; 1 sett i i SPI t ti SPI i SPI X , atribuindo o valor 1 à classe

observada. A classe mais provável obtida de Xt+p é a classe prevista. Deste modo começando numa classe inicial SPIt=1,2,3,4 e aplicando a cadeia MSh, obtém-se uma sequência de classes previstas para 1,2 ou 3 meses de prazo. Abaixo é indicada essa sequência assim como as probabilidades da classe mais provável.

0.58 0.53 0.53 0.53 0.53 0.53 0.44 0.52 0.53 0.42 0.49 0.521 1 1 1; 2 1 1 1; 3 2 1 1; 4 2 1 1t t t tSPI SPI SPI SPI

(4) Há em geral uma probabilidade para a seca terminar atingindo SPI=1, após um ou dois meses. Outra característica é a de que as classes extremas 3 e 4 nunca são previstas por este esquema embora se prevejam probabilidades não nulas de estas ocorrerem. Deste modo a frequência relativa das classes previstas está enviesada em relação à frequência relativa das classes observadas em direcção às classes climatologicamente mais prováveis, o que significa que o esquema de previsão determinista pelo critério da classe mais provável é um esquema probabilisticamente descalibrado. Assimptoticamente prevê-se sempre a classe mais provável ou seja a de não-seca (1), o que é uma característica comum das cadeias de Markov. É igualmente calibrada uma cadeia de Markov não homogénea do SPI, aqui

7

designada por Markov-SPI-não homogénea (MSnh), em que M depende do mês precedente (Janeiro até Dezembro). Seja assim ( ) 1 .,...,12 .m t Jan Dez , a

ordem do mês associada ao mês t da série temporal de SPI. A cadeia de Markov MSnh é representada algebricamente por:

1 ( )t t m t X X M , (5a)

com as probabilidades condicionais calculadas para cada mês na forma:

( ) , 1Pr | , ( ) ; , 1, 2,3, 4 , 1,...,12k i j t tSPI j SPI i m t k i j N k M (5b)

Esta cadeia de Markov é ciclo-estacionária e caracteriza melhor a série do SPI que a MSh dado haver dependência do ciclo anual como em qualquer variável climática. No caso de MSnh a previsão probabilista de SPIt+p obtém-se do produtório à direita de p matrizes de transição relativas a p meses consecutivos:

( ) ( 1) ( 1)...t p t m t m t m t p X X M M M (6)

Cadeias de Markov de SPI forçadas por regimes atmosféricos

O valor de SPIt está associado à quantidade de precipitação registada. As condições favoráveis ou desfavoráveis de precipitação estão associadas a padrões de circulação atmosférica ou regimes de tempo atmosférico, que se podem classificar usando uma partição finita de classes ou categorias disjuntas. A divisão em regimes pode ser obtida por várias técnicas tal como análise multivariada de clusters (Michelangeli et al., 1995) ou por repartição univariada em quantis. A evolução temporal do escoamento atmosférico pode ser caracterizada por uma sequência discreta de classes. Alguns autores modelam essa sequência por processos estocásticos nomeadamente cadeias de Markov (Kondrashov et al., 1993; Kondrashov et al., 2007). No caso de Portugal Continental, a precipitação é fortemente influenciada pela Oscilação do Atlântico Norte (NAO) e pela Oscilação Ártica (AO). A fase de qualquer das oscilações é representada por um índice temporal em cada instante t. No caso presente usamos valores médios mensais desse índice em cada mês t. Os índices têm média temporal nula, pelo que se escolheu a seguinte partição minimal de Nr=2 classes: regime positivo (+) ou negativo (-), respectivamente quando o índice é positivo ou negativo. Seja então It a classe observada do índice no mês t. Representemos por Yt o vector de probabilidades no mês t de cada uma das Nr classes:

Pr , ,t tI i i Y (7)

As probabilidades climatológicas dos regimes positivo e negativo da NAO são respectivamente 0.51 e 0.49, enquanto que para a AO são de 0.45 e 0.54, o que é

8

compatível com o valor positivo do skewness e mediana negativa. Existe uma relação física causal do índice It sobre a precipitação e o SPIt. As variáveis estocásticas It e SPIt são mutuamente dependentes, como é confirmado pelos valores não nulos das correlações entre precipitação em Portugal e qualquer dos índices escolhidos (NAO, AO). Uma tentativa de melhorar as previsões das classes do SPI poderá ser obtida através do acoplamento das cadeias de Markov do SPI e do índice I. Como primeira tentativa poderia calibrar-se uma cadeia de Markov para a partição dada pelo produto cartesiano das N classes de SPI pelas Nr classes de I, com um número NxNr de classes no total. No entanto, sendo por opção escolhido um índice I com elevada informação mútua com o SPI, algumas daquelas classes serão consequentemente pouco prováveis e portanto o produto cartesiano de partições não é muito satisfatório. Assim, admite-se que o vector de probabilidades Yt de It é regido por uma cadeia de Markov independente do SPI com uma matriz de transição R de NrxNr componentes:

1t t Y Y R , (8a)

com os elementos da matriz dados pelas probabilidades condicionais:

, 1Pr | ; , , ;i j t t

R RI j I i i j R

R R

R (8b)

No caso do índice NAO, a matriz R vale:

0.57 0.43

0.45 0.55NAO NAO NAO NAO

NAONAO NAO NAO NAO

R R

R R

R , (9)

o que mostra que há uma maior probabilidade para ao fim de um mês o regime se manter em vez de se alterar e portanto tal justifica a tendência para a permanência da classe NAO e da classe de SPI. Os resultados para o índice AO são similares. Usando o teorema de Bayes tem-se que o vector probabilidade Xt+1 do SPI vem:

1 1 1 1 1

1 1 1

1 1 1

Pr , Pr ,

Pr | , Pr

Pr | , Pr

t t t t t

t t t t t

t t t t t

SPI I SPI I

SPI SPI I I

SPI i SPI I I

M

M

X

X

X

(10)

onde M+ e M- são matrizes de transição de SPIt para SPIt+1, condicionadas a classes, respectivamente positiva e negativa do índice It+1 em t+1. Desenvolvendo as probabilidades 1 1Pr , Prt tI I e usando a matriz de transição R vem:

9

1 1 1 1 1

1 1 1 1 1 1

Pr , Pr ,

Pr | Pr Pr | Pr

Pr Pr

t t t t t

t t t t t t

t t t t

t t t t

SPI I SPI I

SPI I I SPI I I

R R I R R I

R R

R R

X

X M M X M M

M MX Y X Y R

M M

(11)

Assim o vector de probabilidade Xt é regido por uma cadeia de Markov cuja matriz de transição é uma média de matrizes pesadas pelas probabilidades de cada regime do índice de circulação. A cadeia de Markov homogénea assim obtida é designada por MSh-I. A previsão a p meses é obtida por aplicação recursiva da cadeia MSh-I.

,1 , ,.... com ... ( 1); ...t p t t t p t k t t p tk vezes p vezes

k

MX X W W W Y R R Y X R R

M (12)

No caso do índice NAO as matrizes M+ e M- valem respectivamente:

0.44 0.24 0.04 0.03

0.48 0.31 0.08 0.03;

0.38 0.44 0.04 0.44 0.05 0.05

0.13 0.13 0.32 0.18 0.09

NAO NAOM M

0.38 0.09 0.08 0.70

0.33 0.12 0.07 0.58

0.15 0.46

0.56 0.19 0.41

(13) Para cada componente, o maior dos dois valores, correspondes a NAO positiva ou negativa, estão indicados a negrito. Da leitura das matrizes tira-se a seguinte conclusão. As probabilidades de agravamento ou manutenção da seca (matriz triangular superior) são maiores no caso de surgimento de NAO positiva que no caso de NAO negativa. Tal é compreensível dado que esse regime é favorável à escassez de pluviosidade. Por outro lado, a probabilidade de saída de seca (SPI=1,2,3) para não seca (SPI=1) são muito maiores quando se instala um regime negativo da NAO, do que quando se instala um regime positivo de NAO, conforme se verifica pelos maiores valores da primeira coluna de MNAO- em relação aos da primeira coluna de MNAO+. Deste modo, a instalação de NAO negativa é um precursor de términus de seca. Em seguida indicam-se as sequências de classes previstas, homólogas às apresentadas em (4), para uma classe inicial SPIt e um determinado regime NAOt+1 (positivo ou negativo), bem como as probabilidades associadas. Para NAO positiva:

1

0.44 0.43 0.42 0.48 0.43 0.42 0.44 0.41 0.42 0.56 0.40 0.421 1 1 1; 2 1 1 1; 3 2 1 1; 4 2 1 1

t

t t t t

NAO

SPI SPI SPI SPI

(14a) Para NAO negativa:

10

1

0.70 0.65 0.64 0.58 0.63 0.64 0.46 0.62 0.64 0.41 0.59 0.631 1 1 1 ; 2 1 1 1 ; 3 1 1 1 ; 4 1 1 1

t

t t t t

NAO

SPI SPI SPI SPI

(14b) Conclui-se pois que uma vez instalado o regime negativo de NAO, há tendência para regressar rapidamente a ou manter uma situação de não seca. As sequências equivalentes para as fases positiva e negativa da AO são apresentadas de seguida. Para AO positiva:

1

0.42 0.42 0.42 0.42 0.42 0.42 0.48 0.41 0.42 0.50 0.42 0.421 1 2 2; 2 1 2 2; 3 2 2 2; 4 2 2 2

t

t t t t

AO

SPI SPI SPI SPI

(15a) Para AO negativa:

1

0.70 0.66 0.65 0.61 0.64 0.65 0.48 0.63 0.65 0.39 0.60 0.641 1 1 1 ; 2 1 1 1 ; 3 1 1 1 ; 4 1 1 1

t

t t t t

AO

SPI SPI SPI SPI

(15b) Como esperado, há um favorecimento da não-seca para a fase negativa da AO. Em relação à utilização do índice NAO, há uma maior probabilidade para a tendência de seca ou seu agravamento quando se dá a fase positiva da AO relativamente à fase positiva da NAO. A versão não homogénea da cadeia de Markov acoplada com informação de um índice meteorológico, aqui designada por MSnh-I, é condicionada pelo ciclo anual dos 12 meses e recorre às matrizes mensais de transição M(k)+,M(k)- e R(k) cujas componentes são dadas de forma equivalente, respectivamente às de M+, M- e R ou seja, na forma compacta:

( ) , 1 1

( ) , 1

Pr | , , ( ) ; , 1, 2,3,4 , 1,...,12

Pr | , ( )

k i j t t t

k i j t t

SPI j SPI i I m t k i j N k

I j I i m t k

M

R

(16) A previsão a p meses de antecedência com a cadeia MSnh-I vem dada por:

( 1)

( ), ,1 ( ), , ( ), , ( ) ( 1)( 1)

( ) ( 1)

.... com ... ( 1)

...

m t k

t p t m t t m t t p m t t k t m t m t km t k

t p t m t m t p

k

MX X W W W Y R R

M

Y X R R

,

(17) inicializando os vectores Xt e Yt, respectivamente na classe de SPI e regime observados em t.

11

Tempos característicos das cadeias de Markov

Nas cadeias de Markov do SPI podem definir-se vários tempos característicos (Paulo, 2004). A saber, o tempo médio de permanência Tp(i) numa classe i, o tempo médio de transição Tt(i,j) entre uma classe i e uma classe j, o tempo de recorrência Tr(i) de uma classe i ou seja desde a saída até nova ocorrência de i. Para a cadeia de Markov MSh de matriz de transição M tem-se, segundo Paulo (2004):

1, ,

1

1ki i i i

k

Tp i kM M

,, 1 , , , 1,...i kk j

Tt i j M Tr k j i j N

(18)

,Tr i Tt i i

De igual modo podem definir-se tempos homólogos para as cadeias MSh-I, acopladas com os índices meteorológicos recorrendo às matrizes M+ e M-, bem como para as versões não homogénea (Sousa, 2009).

Medidas da qualidade média das previsões Nas várias versões das cadeias de Markov, a saber: MSh, MSnh, MSh-I, MSnh-I, com os índices I=NAO e I=AO, executaram-se previsões deterministas da classe de SPI mensal para prazos de p=1,2 e 3 meses. Para cada esquema de previsão avaliaram-se duas medidas de qualidade média (scores) das previsões, usualmente utilizadas em previsões categóricas: PC (Proporção Correcta) e HSS (Heidke Skill Score) (Jolliffe e Stephenson, 2003). As duas medidas obtêm-se através das tabelas de contingência NxN (neste caso, 4x4), com os números mi.j de casos de previsão em que se observa a classe i e se prevê a classe j (i,j=1,…N). As proporções correspondentes são dadas por pi,j=mi,j/kl(mk,l). Assim PC é dado por:

1

0,1N

iii

PC p

, (19)

assumindo o valor PCperf=1 para previsão perfeita. Para definir HSS é necessário

fornecer a fracção 1

N

i ijj

p p

de casos observados em i e a fracção 1

ˆN

i jij

p p

, de

casos previstos em i. O valor de PC quando as previsões são puramente aleatórias

e portanto independentes das observações é dado por 1

ˆN

ind i ii

PC p p

. Se o

esquema de previsão estiver probabilisticamente descalibrado, como é o caso das previsões deterministas por cadeias de Markov, então diferem as frequências relativas de classes observadas e previstas ou seja ˆi ip p (Jolliffe e Stephenson,

2003).

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No presente caso de N=4 classes de SPI, o valor de PCind num esquema calibrado

vale 2 2 2 2

1

0.50 0.34 0.09 0.07 0.38N

i ii

p p

. Assim define-se HSS como:

1 1 1

ˆ ˆ1N N N

indii i i i i

i i iperf ind

PC PCHSS p p p p p

PC PC

. (20)

Para previsão perfeita, HSS=1 e para previsão aleatória HSS=0. Deste modo um esquema de previsão é útil ou seja melhor que o esquema aleatório se HSS>0. As duas medidas de score foram avaliadas em 3 períodos de validação em função dos meses correspondentes às previsões, a saber: período 1: Janeiro a Dezembro ou seja m(t+p)[1,…,12] referente a todo o ano; período 2: Outubro a Março ou seja m(t+p)[10,11,12,1,2,3], referente a Outono-Inverno e período 3: Abril a Setembro ou seja m(t+p)[4,5,6,7,8,9], ou seja referente a Primavera-Verão. Resultados e Discussão – Tempos Característicos

Apresentam-se de seguida na tabela 2, o tempo médio de permanência Tp(i) numa classe i, o tempo médio de transição Tt(i,1) entre uma classe i e a classe de não seca e o tempo de recorrência Tr(i) de uma classe i. Os valores são dados em meses para as cadeias de Markov homogéneas MSh e as cadeias correspondentes a permanência de fase positiva ou negativa dos índices: MSh-NAO(+), MSh-NAO(-), MSh-AO(+) e MSh-AO(-).

Tabela 2. Valores de Tp(i), Tt(i,1) e Tr(i) para os vários modelos homogéneos. Os valores de Tr(i) são dados para a cadeia média estacionária das fases positiva e negativa

dos índices.

Tp(1) Tp(2) Tp(3) Tp(4) Tt(2,1) Tt(3,1) Tt(4,1) Tr(1) Tr(2) Tr(3) Tr(4)

MSh 2.34 1,47 1.04 1.15 1.99 2.23 2.52 1.90 3.04 12.43 15.68

MSh-NAO(+) 1.80 1.49 1.04 1.23 2.28 2.55 3.20 1.91 3.02 12.44 15.63

MSh-NAO(-) 3.29 1.44 1.05 1.10 1.76 1.97 2.11

MSh-AO(+) 1.73 1.65 1.10 1.18 2.54 2.73 3.15 1.90 3.04 12.41 15.64

MSh-AO(-) 3.29 1.35 1.00 1.12 1.69 1.93 2.12

Conclui-se que os tempos de permanência da classe de não seca são maiores nas fases negativa da NAO e da AO. Os tempos Tr(i,1) de transição entre classe i de seca e não seca aumentam com a severidade da seca sendo estes tempos menores na fase negativa da NAO e da AO. O tempo de recorrência Tr(i) é tanto maior quanto maior o grau de severidade da seca.

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Resultados e Discussão - Previsões Apresentam-se de seguida as tabelas dos scores PC (Tabela 3) e HSS (Tabela 4) e e de previsão do SPI a 1,2 e 3 meses de prazo para os diversos modelos de previsão: cadeias de Markov homogéneas MSh, MSh-NAO, MSh-AO no período Janeiro-Dezembro; cadeias de Markov não homogéneas MSnh, MSnh-NAO, MSnh-AO nos períodos Janeiro-Dezembro, Outubro-Março e Abril-Setembro. Tabela 3. Valores do score de previsão PC (Proporção Correcta) para os vários modelos, prazos de previsão e períodos. O modelo que produz maiores valores de score vêm com os valores a negrito.

Período Janeiro-Dezembro Janeiro-Dezembro Modelo

Prazo(meses) MSh MSh-NAO MSh-AO MSnh MSnh-NAO MSnh-AO

1 0.54 0.54 0.54 0.57 0.57 0.58 2 0.53 0.53 0.53 0.54 0.53 0.53

3 0.53 0.53 0.53 0.54 0.54 0.54

Tabela 3(cont.). Período Outubro-Março Abril-Setembro Modelo

Prazo(meses) MSnh MSnh-NAO MSnh-AO MSnh MSnh-NAO MSnh-AO

1 0.56 0.56 0.58 0.58 0.59 0.57 2 0.51 0.51 0.51 0.56 0.56 0.55 3 0.51 0.51 0.51 0.56 0.56 0.56

Tabela 4. Valores do score de previsão HSS (Heike Skill Score) para os vários modelos, prazos de previsão e períodos. O modelo que produz maiores valores de score vêm com os valores a negrito.

Período Janeiro-Dezembro Janeiro-Dezembro Modelo

Prazo(meses) MSh MSh-NAO MSh-AO MSnh MSnh-NAO MSnh-AO

1 0.08 0.08 0.08 0.15 0.18 0.19 2 0.00 0.00 0.00 0.06 0.06 0.05

3 0.00 0.00 0.00 0.05 0.05 0.05

Tabela 4 (cont.) Período Outubro-Março Abril-Setembro Modelo

Prazo(meses) MSnh MSnh-NAO MSnh-AO MSnh MSnh-NAO MSnh-AO

1 0.13 0.15 0.20 0.16 0.21 0.17 2 0.00 0.00 0.01 0.12 0.13 0.08 3 0.00 0.00 0.00 0.11 0.11 0.11

Em ambas as tabelas de score (PC ou HSS), e para qualquer dos modelos ou períodos de validação, o score de previsão decresce com o prazo de previsão com consequente perda progressiva de predictabilidade. Dada a dominância da classe prevista de não-seca (SPI=1), o valor de PCind é próximo da frequência observada da classe mais frequente (SPI=1) ou seja próximo de Prmax=0.50, o que significa que o esquema de previsão só é melhor que uma previsão aleatória ou que uma previsão constante na classe mais frequente quando PC assume valores maiores que Prmax. Tal verifica-se comparando a tabela 2 de PC com a tabela 3 de HSS, por exemplo nos prazos p=2 ou 3 meses para MSh em que HSS=0 ou seja PC=PCind. Apenas um valor de PC acima de PCind pode produzir valores de HSS úteis, ou seja acima de 0.

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Observando a tabela 3 de HSS concluímos que para MS há apenas predictabilidade útil ao prazo de 1 mês. As versões não homogéneas, i.e. dependentes do mês em qualquer modelo (MSnh, MSnh-NAO e MS-AO) são sempre melhores ou similares em termos de HSS que as versões homogéneas. Nas versões homogéneas há predictabilidade útil (HS>0) até aos 3 meses de prazo. Os modelos não homogéneos em que há acoplamento com os índices meteorológicos: MSnh-NAO e MSnh-AO são ligeiramente superiores em termos de HSS ao modelo MSnh que usa apenas o SPI, pelo menos no prazo a 1 mês. Para prazos de 2 e 3 meses a utilização da NAO e da AO é quase irrelevante. No entanto, dado o elevado poder descriminatório do SPI pela NAO e pela AO, a utilização de um melhor esquema preditivo do índice de circulação meteorológica produziria um aumento dos scores de MSnh-NAO e MSnh-AO. Em alternativa a previsões deterministas de categorias, as cadeias de Markov fornecem directamente previsões probabilistas para as quais se definem scores probabilistas aproriados tais como o ‘Brier score’, ‘Brier Skill score’, ‘Ranked Probability score’ (Jollikke e Stephenson, 2003). A capacidade preditiva relativa dos índices meteorológicos pode assim ser também avaliada por esse tipo de scores. Outra possibilidade de aumentar a qualidade de previsão da precipitação mensal é o recurso a preditores descorrelacionados da NAO com poder descriminatório não nulo da precipitação. A este respeito refira-se que as 3 primeiras componentes principais (Pcs) do campo médio mensal da pressão à superfície na região Euro-Atlântica durante o trimestre Dezembro-Fevereiro (Pires, 2006) possuem correlações de -0.5, -0.4 e -0.1 com a precipitação em Portugal (Pires, 2006). Os padrões associados a essas Pcs são respectivamente a NAO, um padrão do tipo ‘Crista Atlântica’ e um padrão ‘Dipolo Groonelândia-Escandinávia’. Desse modo poder-se-á construir uma partição de regimes baseada nesses padrões e usar a mesma metodologia aqui usada de cadeias de Markov forçadas. Conclusões A utilização de cadeias de Markov para a modelação e previsão de classes do SPI mensal na região do Alentejo revelou-se satisfatória. Calibraram-se a versão homogénea e não homogénea da cadeia de Markov, em que a matriz de transição, é, respectivamente permanente e dependente do mês. Construiram-se previsões deterministas a prazos de 1,2 e 3 meses da classe de SPI pelo critério da classe mais provável. A qualidade média das previsões é avaliada pelo HSS (Heidke Skill score), que vale 1 no caso de previsões perfeitas e maior que zero no caso de um esquema preditivo ser melhor que o das previsões aleatórias. As previsões efectuadas com a versão não homogénea, dependente do ciclo anual fornece HSS>0, da ordem de 5%-20% até ao prazo de 1 a 3 meses sendo a predictabilidade decrescente com o prazo de previsão. Foram igualmente calibradas cadeias de Markov do SPI, forçadas por classes de índices meteorológicos, a NAO (Oscilação do Atlântico Norte) e a AO (Oscilação Ártica), quer na formulação homogénea, quer na não-homogénea. A fase positiva da NAO

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e da AO favorece a permanência ou o agravamento da seca enquanto que a fase negativa favorece o desaparecimento ou desagravamento da seca por essa fase ser especialmente pluviosa na região de Portugal. As cadeias de Markov não homogéneas, forçadas pela NAO e pela AO forneceram os melhorias ligeiras dos scores de previsão em relação aos da cadeia de Markov simples não homogénea. Os tempos de permanência da seca são maiores quando é instalado um regime NAO (AO) positivo sendo a fase NAO (AO) negativa um precursor do fim de seca em 1-2 meses, em termos do SPI mensal.

Agradecimentos

Este estudo foi financiado pela FCT através do projecto PTDC/AGR-AAM/71649/2006 “Gestão do risco em secas: Identificação, monitorização, caracterização, predição e mitigação”. Os dados meteorológicos foram fornecidos pelo INAG e a Drª Ana Paulo o que se agradece.

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