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DESEMPENHO FINANCEIRO DAS COOPERATIVAS AGROPECUÁRIAS PARANAENSES: UMA ABORDAGEM DE DADOS EM PAINEL Luciano Ferreira de Lima Rosane Calgaro RESUMO: Esta pesquisa teve por objetivo avaliar o desempenho financeiro das cooperativas do ramo agropecuário do Paraná com o uso de dados em painel. São discutidos sucintamente conceitos do cooperativismo no Brasil e a participação das cooperativas no sistema agroalimentar, avaliação financeira de organizações cooperativas, bem como índices e indicadores de tal avaliação. O modelo de regressão e a amostra definida para análise encontram-se nos aspectos metodológicos do trabalho. Os resultados apontam boa capacidade explicativa do modelo adotado, a influência da capacidade de pagamento, no curto prazo, das cooperativas para o aumento do ROI e um impacto positivo da liquidez geral e capital de terceiros sobre o mesmo indicador de desempenho financeiro (ROI), ao longo do tempo. PALAVRAS-CHAVE: Desempenho financeiro; Cooperativas agropecuárias; Dados em painel. ABSTRACT: This study aimed to evaluate the financial performance of the agricultural cooperatives of Paraná (Brazil) using panel data.. Are briefly discussed concepts of cooperatives in Brazil and the participation of cooperatives in the agri-food system, financial evaluation of cooperative organizations, as well as indices and indicators of such evaluation. The regression model and the defined sample for analysis are shown in the methodological aspects of the work. The results indicate good explanatory power of the model adopted, the influence of ability to pay in the short term, of cooperatives to increase ROI and a positive impact of general liquidity and debt capital on the same indicator of financial performance (ROI), over time. KEY WORDS: Financial performance; Agricultural cooperatives; Panel data. 1. INTRODUÇÃO A trajetória das cooperativas demonstra que, mesmo se tratando de organizações de natureza diferenciada (sociedade de pessoas, não de capital) e influenciada por princípios doutrinários, a busca pela sobrevivência na economia de mercado conduziu à estruturação de grandes cooperativas voltadas à competitividade. Em um contexto marcado pela competição, empresas de capital e cooperativas, encontram-se na disputa por clientes e mercado atuando de forma semelhante em termos de modelos de gestão e ferramentas qualificadas de produção. Este olhar explica a adoção de modelos de avaliação financeira semelhantes (indicadores e índices) presentes em vários trabalhos acadêmicos citados na sequência deste texto. A gestão econômico-financeira das organizações, com ou sem fins lucrativos, orientada por objetivos, depende, em grande medida, das boas práticas econômicas, ou seja,

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DESEMPENHO FINANCEIRO DAS COOPERATIVAS AGROPECUÁRIA S PARANAENSES: UMA ABORDAGEM DE DADOS EM PAINEL

Luciano Ferreira de LimaRosane Calgaro

RESUMO: Esta pesquisa teve por objetivo avaliar o desempenho financeiro das cooperativas do ramo agropecuário do Paraná com o uso de dados em painel. São discutidos sucintamente conceitos do cooperativismo no Brasil e a participação das cooperativas no sistema agroalimentar, avaliação financeira de organizações cooperativas, bem como índices e indicadores de tal avaliação. O modelo de regressão e a amostra definida para análise encontram-se nos aspectos metodológicos do trabalho. Os resultados apontam boa capacidade explicativa do modelo adotado, a influência da capacidade de pagamento, no curto prazo, das cooperativas para o aumento do ROI e um impacto positivo da liquidez geral e capital de terceiros sobre o mesmo indicador de desempenho financeiro (ROI), ao longo do tempo.

PALAVRAS-CHAVE: Desempenho financeiro; Cooperativas agropecuárias; Dados em painel.

ABSTRACT: This study aimed to evaluate the financial performance of the agricultural cooperatives of Paraná (Brazil) using panel data.. Are briefly discussed concepts of cooperatives in Brazil and the participation of cooperatives in the agri-food system, financial evaluation of cooperative organizations, as well as indices and indicators of such evaluation. The regression model and the defined sample for analysis are shown in the methodological aspects of the work. The results indicate good explanatory power of the model adopted, the influence of ability to pay in the short term, of cooperatives to increase ROI and a positive impact of general liquidity and debt capital on the same indicator of financial performance (ROI), over time.

KEY WORDS: Financial performance; Agricultural cooperatives; Panel data.

1. INTRODUÇÃO

A trajetória das cooperativas demonstra que, mesmo se tratando de organizações de natureza diferenciada (sociedade de pessoas, não de capital) e influenciada por princípios doutrinários, a busca pela sobrevivência na economia de mercado conduziu à estruturação de grandes cooperativas voltadas à competitividade. Em um contexto marcado pela competição, empresas de capital e cooperativas, encontram-se na disputa por clientes e mercado atuando de forma semelhante em termos de modelos de gestão e ferramentas qualificadas de produção. Este olhar explica a adoção de modelos de avaliação financeira semelhantes (indicadores e índices) presentes em vários trabalhos acadêmicos citados na sequência deste texto.

A gestão econômico-financeira das organizações, com ou sem fins lucrativos, orientada por objetivos, depende, em grande medida, das boas práticas econômicas, ou seja,

deve-se buscar a otimização dos recursos materiais, humanos, tecnológicos e financeiros objetivando tornar-se competitiva. Neste sentido, para as cooperativas agrícolas e pecuárias o recurso financeiro oriundo do crédito rural constitui fator de vital importância no que diz respeito à manutenção e à expansão dos sistemas agroalimentares no modelo cooperativista.

A alocação dos recursos financeiros de forma eficiente por uma organização contribui para sua sobrevivência e crescimento. No que se refere às fontes financeiras de terceiros deve-se existir, também, adequação entre prazos e custos, bem como planejamento no uso dos fundos para alcançar a rentabilidade desejada nos projetos de longo prazo e garantir a capacidade de pagamento dos compromissos de curto prazo (BRAGA, 2009, p. 26–27).

Diante destas considerações, este trabalho objetiva uma análise do desempenho financeiro das Cooperativas Agropecuárias Paranaenses, a partir do Modelo de Regressão de Dados em Painel. Para tal propõe investigar os resultados econômico-financeiros, no período 2010-2013, das Cooperativas Agropecuárias Paranaenses através da referida Regressão e descrever as possíveis variações das unidades de observação ao longo do tempo. Na sequência, encontra-se breve revisão da literatura sobre cooperativismo e avaliação econômico-financeira no Brasil e no Paraná. A terceira parte apresenta os aspectos metodológicos utilizados no estudo seguidos dos resultados alcançados e das considerações finais.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 O COOPERATIVISMO NO BRASIL

No entendimento de Pereira (2010), bem como de Ritossa; Ferreira e Predebon (2010, p. 202) o movimento cooperativista tem suas origens ligadas à Inglaterra:

[...] mais especificamente a Rochdale, uma cidade de trabalhadores de tecelagem, em 1844. Passados mais de 160 anos, o conjunto de princípios que norteou os fundadores, continua sendo a diretriz do cooperativismo praticado em todos os países. Por seu intermédio, os valores de ajuda mútua, responsabilidade, democracia, igualdade, equidade e solidariedade são levados a efeito [...]. Com o passar do tempo, foram revistos e atualizados por sucessivos congressos da Aliança Cooperativa Internacional (ACI) e, desde 1995 podem ser assim listados: adesão livre voluntária; gestão democrática pelos membros; participação econômica dos membros; autonomia e independência; educação, formação e informação; cooperação entre cooperativas; e, compromisso com a comunidade.

De acordo com Lopes (2001, p. 114) o movimento cooperativo chegou ao Brasil no final dos anos de 1840 através do imigrante Benoit Jules de Mure, o qual fundou uma colônia de produção e consumo com base nos ideais cooperativos, chamada de Vila da Glória, na localidade de Palmital, no município de São Francisco do Sul em Santa Catarina. A colônia foi extinta pouco tempo depois da sua fundação, pois não possuía mercado amplo e próximo. Algumas décadas depois, por volta de 1889, uma experiência efetiva se deu pela criação da cooperativa de consumo criada em Ouro Preto (MG) denominada Sociedade Cooperativa Econômica dos Funcionários Públicos de Ouro Preto (OCB, 2014).

Somente no início do século XX, na busca por resolver problemas de consumo, crédito e produção, que os ideais cooperativos começaram a ter maior divulgação em função, principalmente, da imigração de alemães e italianos, no sul do Brasil (LOPES, 2001, p. 115).

Nas duas últimas décadas, com a abertura econômica, a reestruturação produtiva industrial, a desregulamentação dos mercados, a integração econômica regional e as crises internacionais, segundo Ritossa; Ferreira e Predebon (2010, p. 200), o desenvolvimento do agronegócio brasileiro sofreu mudanças estruturais profundas e, consequentemente, as cooperativas agrícolas e pecuárias nacionais. O que, de certo modo, possibilitou maior competitividade e inserção das cooperativas agrícolas e pecuárias no processo de internacionalização.

As cooperativas agropecuárias são responsáveis por, aproximadamente, 40% do Produto Interno Bruto (PIB) agrícola nacional. Tais organizações podem auxiliar no desenvolvimento do país, por outro lado, também, necessitam de modelos, estudos e apoio tanto da iniciativa privada quanto do setor público (RITOSSA; FERREIRA e PREDEBON, 2010).

No caso paranaense, o estado possui tradição e vocação para a atividade rural, 18% (dezoito por cento) do PIB advém do cooperativismo agropecuário que corresponde por, aproximadamente, 53% (cinquenta e três por cento) da economia agrícola (RITOSSA; FERREIRA e PREDEBON, 2010).

As cooperativas, dadas as suas características como natureza e princípios doutrinários, enfrentam dificuldades na captação de recursos de terceiros para financiar as atividades. Devido a isso, normalmente os recursos são oriundos de duas fontes principais, quais sejam, fornecedores ou instituições financeiras que, pelos riscos envolvidos em empréstimos para sociedade de pessoas, impõe encargos financeiros elevados às cooperativas. Menegário (2000) analisa a evolução das cooperativas paranaenses no período 1995 a 1998 e a evolução da dependência do capital de terceiros e cita consequências de tal avanço. Entre elas o potencial para elevação da inadimplência, queda da qualidade dos serviços prestados e perda de credibilidade pela evasão dos cooperados.

2.2 O SISTEMA AGROALIMENTAR E O COOPERATIVISMO

Os sistemas agroalimentares (SAGs) não podem ser entendidos como lineares, mais parecem redes de relações técnicas, econômicas e contratuais dos agentes (produtor de matéria prima, fornecedor, produtor, processador, atacadista, varejista e consumidor) (ZYLBERSZTAJN, 2000, p. 13–15). Ainda no entendimento de Zylbersztajn (2000, p. 15) os “agentes atuantes nos SAGs estarão mantendo uma relação intensa de cooperação e de conflito. Terão de cooperar, pois daí poderá depender o seu sucesso individual, mas também estarão disputando margens, uma vez que o consumidor final deverá irrigar todo o sistema com um fluxo monetário.”

Para Bialoskorski Neto (2000, p. 240) “há vantagens potenciais de coordenação dos sistemas agroindustriais pela organização cooperativa, uma vez que é possível de modo rápido coordenar a produção agrícola dos produtores.” A coordenação pode ocorrer através do controle da qualidade dos insumos, processamento e distribuição (BIALOSKORSKI NETO, 2000, p. 240).

Deste modo, segundo Bialoskorski Neto (2000, p. 240) “a organização cooperativista é um interessante instrumento de coordenação de relações de contrato que possibilita a agregação de valor às atividades produzidas pelos produtores rurais, e por esta razão é que estas organizações passam a ser muito importantes na agropecuária.”

Em relação à integração vertical do sistema agroalimentar, conforme Sexton apud Zylbersztajn (1994, p. 26) “a integração vertical em cooperativas é estimulada pelos fatores: redução de custos através de melhor poder de barganha na aquisição de insumos; melhoria da posição de barganha no mercado, em especial quando se trata de produtos perecíveis; ganhos de eficiência advindos da capacidade coordenadora das cooperativas; redução de riscos associados a ações conjuntas.” Cabe ressaltar que, a redução de tempos e custos no processo integrado de produção constitui fator preponderante na melhoria da eficiência e da eficácia no Sistema Agroalimentar Cooperativo, através da otimização dos recursos. Bem como, normalmente, ocorre à maximização dos resultados.

Para Zylbersztajn (1994, p. 25–26) as “cooperativas agroindustriais desempenham importante papel na coordenação de sistemas agroindustriais. As cooperativas podem ser vistas como formas de integração vertical dos produtores agrícola e pecuário, em direção a atividades de comercialização, industrialização e produção de insumos.” Através da participação ativa dos cooperados no processo de industrialização da produção repassada à cooperativa e da tomada de decisão no momento da venda do produto com valor agregado, há maior geração de conhecimento econômico e administrativo do cooperado e consequente fortalecimento das cooperativas agrícolas e pecuárias.

Entretanto, “deve-se considerar que os produtores, em cooperativas estruturadas verticalmente, se posicionam cada vez mais distantes do processo de tomada de decisões de negócios, o qual demanda treinamento especializado. Algumas cooperativas vêm buscando criar uma separação clara entre o negócio da cooperativa e as atividades industriais, gerando com frequência linha divisória entre a cooperativa e as empresas processadoras das quais os cooperados passam a ser acionistas comuns. Estão emergindo, no mundo do agribusiness cooperativo, formas intermediárias de organização, em parte cooperativa e em parte sociedade de capital.” (ZYLBERSZTAJN, 1994, p. 26).

2.3 COOPERATIVAS AGROPECUÁRIAS: DESEMPENHO FINANCEI RO

A gestão financeira em organizações cooperativas tem sido discutida em diversos trabalhos que abordam o tema desde uma preocupação de nível estratégico (LAZZARINI, BIALOSKORSKI NETO e CHADDAD, 1999; MACHADO FILHO; MARINO e CONEJERO, 2004) até aspectos mais operacionais relacionados aos índices e aos indicadores de avaliação econômico-financeira (GIMENES e GIMENES, 2008; CARVALHO e BIALOSKORSKI NETO, 2008). Independentemente do âmbito ao que se direciona o trabalho, os autores mencionam as particularidades inerentes às organizações cooperativas.

As discussões no nível estratégico de decisão consideram o fato da organização cooperativa ser uma sociedade de pessoas, não de capital, e as implicações disso na sua atuação e gestão. As principais limitações no desempenho das cooperativas, quando analisadas equiparadas às empresas de capital, estão relacionadas à carência de profissionais de gestão, complexidade da governança e ausência de foco nos negócios (MACHADO

FILHO; MARINO e CONEJERO, 2004). Na cooperativa, a gestão financeira necessita conciliar a maximização da riqueza organizacional, o atendimento dos interesses do cooperado e as condições do mercado em que se encontra. Estas características fazem surgir o questionamento sobre como e onde investir. Neste sentido, os autores alertam que nem sempre é compensador a cooperativa optar pela estratégia de diversificação que conduz à necessidade de investimento em infraestrutura, especialização produtiva e maior habilidade para inserção no mercado. O atendimento dos interesses do cooperado na distribuição de sobras e outras alternativas de investimento tornam relevante a análise do custo de oportunidade do capital.

Também sob o olhar da competitividade das cooperativas, Rodrigues apud Uliana e Gimenes (2014) defende a adoção de estratégias de capitalização pelas cooperativas agropecuárias, entre elas está a possibilidade de abertura indireta do capital. A partir da definição de um foco nos negócios as cooperativas podem efetivar parcerias ou alianças estratégicas com outras cooperativas que juntas podem chegar à verticalização via criação de empresas não cooperativas, ou seja, capitalistas. Tal estratégia resultaria na criação de tradings, holdings ou bancos pertencentes a uma ou mais cooperativas.

O estudo em cooperativas do ramo agropecuário brasileiro no período de 1999 a 2004 para verificar os ganhos em termos do valor econômico agregado (EVA) revelou ineficiência das cooperativas pesquisadas para atender o percentual determinado na legislação cooperativista (ULIANA e GIMENES, 2014). O desempenho foi negativo em quatro dos seis períodos analisados. Em direção semelhante Lazzarini; Bialoskorski e Chaddad (1999) exemplificam a efetivação da estratégia usada pela cooperativa canadense Wheat Pool como alternativa para captação de recursos para investimento via abertura de capital e parcerias estratégicas com empresas de capital.

Carvalho e Bialoskorski Neto (2008) argumentam que, apesar de se tratar de organização sem fins lucrativos e de gestão democrática realizada pelos associados, as informações sobre o desempenho econômico das cooperativas são fundamentais tanto para cooperados quanto para stakeholders. A questão da produtividade é importante nas cooperativas, pois influencia diretamente na distribuição das sobras aos cooperados.

Priorizando a perspectiva econômica os autores defendem que o benefício social da cooperativa aos cooperados é resultante do aspecto econômico. Por isso, sugerem a inserção de indicadores sociais na análise de desempenho das cooperativas. Diante do número de indicadores e variáveis inerentes ao desempenho econômico os autores, através da técnica de análise fatorial em duas etapas, chegaram ao quadro composto por 4 (quatro) fatores que agruparam 9 (nove) indicadores de desempenho econômico para cooperativas. Trata-se dos fatores de solvência, atividade, margem e alavancagem. A solvência indica a capacidade de pagamento das contas indicando a probabilidade de evitar futuras limitações desta competência. O fator atividade representa a capacidade de gestão do giro dos ativos (total e realizável a longo prazo) da organização. A margem, terceiro fator encontrado no estudo, demonstra a habilidade de geração de sobras das cooperativas que implica na sustentabilidade da organização. O fator alavancagem reflete o nível de uso dos recursos, próprios ou de terceiros, indicando a possibilidade da organização saldar compromissos firmados (CARVALHO e BIALOSKORSKI NETO, 2008).

A trajetória das cooperativas do ramo agropecuário revela participação econômica expressiva (55% do setor agrícola no caso do Paraná) sendo um dos ramos com maior número de cooperativas e associados (OCEPAR, 2014). O contexto de atuação das cooperativas e a necessidade de sobrevivência diante das condições de mercado conduziram o movimento cooperativista, assim como as cooperativas, à busca da competitividade e a adoção de ferramentas de gestão semelhante às empresas de capital. Embora apresentem naturezas diferentes, uma sociedade de pessoas e a outra sociedade de capital, cooperativas e empresas capitalistas fazem parte do “jogo” das regras de mercado e disputam espaço usando ferramentas semelhantes (heterogestão, gestão da qualidade, etc).

Neste sentido, torna-se pertinente a classificação das cooperativas sugerida por Faria (2009) que identifica como do tipo I as cooperativas com atuação mercadológica e de estrutura administrativa equiparada a empresas de capital. A diferença está nos aspectos legais inerentes à estrutura de gestão das cooperativa representadas pela assembleia geral e o conselho fiscal. Considerando a ênfase da avaliação do aspecto financeiro proposta por esse trabalho, a seguir são brevemente definidos os índices usados na análise tendo como variável dependente o Retorno sobre o investimento (ROI) e como variáveis independentes: liquidez geral, capital de terceiros, grau de endividamento e margem líquida.

2.4 ÍNDICES DE AVALIAÇÃO FINANCEIRA

Considerando uma visão geral da gestão de finanças, alguns índices influenciam diretamente na avaliação do aspecto financeiro organizacional, entre eles estão o retorno sobre os investimentos, a liquidez, o grau de endividamento e a margem líquida. No caso do retorno do investimento sobre o ativo total, trata-se do índice que possibilita mensurar a eficiência integral da gestão para gerar lucros a partir da disponibilidade dos ativos. É um indicador considerado de longo prazo para avaliação financeira das organizações podendo servir de elo entre o plano estratégico (longo prazo) e o orçamento anual. Entre as vantagens deste indicador estão a facilidade de cálculo e entendimento, a relação entre giro, alavancagem e margem. Entretanto o ROI apresenta limitações como o fato de ser suscetível a vários critérios contábeis, a simplicidade implica na não consideração do risco na avaliação. Além disso, não inclui a necessidade de investimento e captura somente um exercício na avaliação (FREZATTI, 2001; GITMAN, 2002).

A liquidez indica a capacidade organizacional para cumprimento dos compromissos ou obrigações de Curto prazo. A análise de tal capacidade (liquidez) pode ocorrer através dos índices de capital de giro, liquidez corrente e liquidez seca. Obtido pelo valor do capital circulante líquido, o capital de giro resulta da subtração do passivo circulante do valor do ativo circulante. A liquidez corrente é obtida por meio divisão do ativo circulante pelo passivo circulante, liquidez seca subtrai o valor dos estoques do ativo circulante antes da divisão pelo passivo. Considera-se bom um índice de liquidez no valor acima de 1,0 que sugere capacidade positiva de pagamento das obrigações no curto prazo, entretanto o valor médio e indicado apresenta variações de acordo com a atividade e o mercado de atuação da organização (GITMAN, 2002).

Sob o ponto de vista do longo prazo, os índices de avaliação das finanças se concentram na verificação do grau de endividamento da organização ou, seja, na alavancagem

fixo aleatório

Fonte: Adaptado de Prates e Serra (2009, p. 106).

A Tabela 1 permite inferir qual é o modelo adequado para representar a regressão. Sendo que, o Teste F de Chow indica que, quando significativo, é preferível o modelo de EF ao Pooled. O raciocínio é o mesmo com relação ao Teste de Breusch e Pagan, onde, caso seja significativo, o modelo de EA é preferível ao Pooled. Caso o modelo Pooled seja descartado em função dos testes supracitados o Teste de Hausman auxilia na decisão entre os modelos de EF e EA, sendo que, quando significativo, deve-se optar pelo modelo de EF.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Utilizando o modelo de dados em painel, de acordo com a metodologia proposta, as variáveis foram analisadas, no primeiro momento, considerando a amostra das Cooperativas Agropecuárias Paranaenses como um todo, procurando identificar padrões de comportamento das referidas variáveis.

Tabela 2: Estimação do Modelo Geral

Variáveis ExplicativasModelo de Regressão

Pooled Efeito Fixo Efeito Aleatório

Liquidez Geral0,0128685

(1,04)

0,0941156(a)

(7,19)

0,0148467

(1,16)

Capital de Terceiros0,1124118(a)

(6,45)

0,5963867(a)

(19,27)

0,1201369(a)

(6,66)

Grau de Endividamento Omitido(b) Omitido(b) Omitido(b)

Margem Líquida0,000511

(1,18)

-0,001765(a)

(-8,27)

0,0003272

(0,78)

Constante-0,077615(a)

(-3,18)

-0,5521396(a)

(-17,21)

-0,0858646(a)

(-3,39)

R2 Ajustado 0,3040

Within

R2 Between

Overall

0,7899

0,3189

0,2950

0,4295

0,3920

0,3179

Observações 140 140 140

Teste F (Chow) 127,84(a)

Teste de Breusch e Pagan 17,01(a)

Teste de Hausman 893,61

(a) Denota significância a 1%.(b) Omitido por causa da colinearidade.Fonte: Elaborado pelos autores.Nota 1: Entre parênteses a estatística t de Student ou a estatística z equivalente.Nota 2: Para estimação e avaliação do modelo de regressão foi utilizado o software Stata 12.

De acordo com o Teste de Hausman o modelo mais indicado para a amostra é o de Efeito Fixo. Portanto, é possível indicar que 3 (três) variáveis foram significativas a 1% (um por cento) com exceção da variável Grau de Endividamento, a qual foi omitida por causa da multicolinearidade. Cabe destacar, também, que o R2 ajustado de 30,40%, pode ser considerado razoável, sendo, portanto, boa à capacidade explicativa e preditiva do modelo adotado.

O impacto positivo da variável independente Liquidez Geral explica que o ROI, no Cooperativismo Agropecuário Paranaense, de acordo com a literatura, aumenta com a capacidade de pagamento aos credores no curto prazo.

A variável Capital de Terceiros constitui fator de fundamental importância, visto que, na estrutura de capital das cooperativas, o custo de capital pode, obviamente, aumentar ou diminuir conforme a composição de capital próprio e de terceiros para financiar seus investimentos de longo prazo. Logo, a variável Capital de Terceiros é estatisticamente significativa e impacta positivamente no modelo de regressão.

No que se refere à Margem Líquida, chama a atenção o coeficiente negativo da referida variável, mesmo coeficiente sendo muito próximo de 0 (zero). Pois, do ponto de vista da literatura financeira, esperava-se que quanto maior a Margem Líquida nos períodos analisados maior seria o ROI. Isto, de fato, demonstra que a variável Margem Líquida, apesar de significativa, tem pouco impacto sobre o ROI no longo prazo.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após a realização deste estudo foi possível tecer algumas constatações acerca das organizações cooperativas nos aspectos discutidos anteriormente. No caso brasileiro e no estado do Paraná destacam-se as grandes cooperativas do ramo agropecuário com participação expressiva na produção e industrialização de alimentos. Esta condição insere tais organizações em um contexto de competitividade com atuação assemelhada às empresas de capital, apesar das diferentes naturezas e a influência dos princípios inerentes ao movimento cooperativista.

O contexto da competição exige que, também as cooperativas, adotem modelos de gestão estratégias de atuação observando critérios de desempenho financeiro. Entre as formas

possíveis de avaliação deste desempenho estão os indicadores de curto prazo como a liquidez corrente e os de longo prazo como retorno sobre o investimento e o grau de endividamento da organização. Além disso, a mensuração da lucratividade através da margem líquida viabiliza a análise da lucratividade, para empresas de capital, ou sobras, no caso das cooperativas, resultantes das vendas.

No que se refere ao uso do método de dados em painel, adotado neste estudo, a combinação de dados transversais com dados temporais permite visualizar o comportamento das variáveis delimitadas no período 2010-2013. Considerando a amostra das Cooperativas Agropecuárias Paranaenses como um todo, o estudo procurou identificar padrões de comportamento das referidas variáveis.

Logo, pode-se inferir através do modelo de regressão que, a variável Grau de Endividamento foi excluída porque apresentou multicolinearidade, bem como as variáveis Liquidez Geral e Capital de Terceiros, significativas estatisticamente a 1% (um por cento), impactam positivamente a variável dependente ROI ao longo do tempo. E a variável Margem Líquida, apesar de significativa estatisticamente a 1% (um por cento) não corrobora, no período analisado, com a hipótese de que a margem líquida está diretamente relacionada com o ROI no longo prazo.

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