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DESCONSTRUINDO PRÁTICAS SEXISTAS NO AMBIENTE ESCOLAR

Gisele Dalagnol de Oliveira1

Dennison de Oliveira 2

Resumo

Este artigo procura fazer uma discussão sobre as práticas sexistas presentes no cotidiano escolar e como estas estão relacionadas com a desigualdade de gênero. Os estudos bibliográficos, estudos documentais e os registros de campo realizados com a comunidade escolar foram utilizados como base na elaboração desse trabalho. É o trabalho final do PDE – Programa de Desenvolvimento Educacional que contempla e socializa todas as produções feitas: Projeto de Intervenção Pedagógica; Produção da Unidade Didática; Implementação do Projeto de Pesquisa na escola e as contribuições das discussões do Grupo de Trabalho em Rede – GTR. O trabalho aqui apresentado teve como perspectiva o enfrentamento aos problemas do cotidiano escolar no que se refere às práticas sexistas, entendendo que a escola pode atuar como promovedora de uma educação mais igualitária entre os gêneros e acima de tudo não sexista. O conhecimento da realidade na qual a escola está inserida é condição indispensável de qualquer atividade docente envolvendo temáticas sobre a desigualdade de gênero e práticas sexistas, pois é necessário ter cuidado com as questões culturais que possam gerar resistências. Tentar desconstruir algo que foi consolidado através de muitos anos não é uma tarefa fácil, mas é necessária se quisermos uma sociedade mais humana e igualitária.

Palavras - chaves: gênero, desigualdade de gênero, práticas sexistas, sexismo.

1. Introdução Este artigo é o resultado final do Programa de Desenvolvimento Educacional

(PDE) desenvolvido pela Secretaria de Educação (SEED) em parceria com algumas

IES públicas do estado do Paraná, ele foi desenvolvido atendendo as diversas

etapas do programa: elaboração do Projeto de Intervenção Pedagógica, construção

da Unidade Didática e sua implementação na escola e as discussões do Grupo de

Trabalho em Rede (GTR).

O objetivo é apresentar os resultados e discussões feitas durante todas essas

etapas. O Projeto de Intervenção surgiu a partir de constatações feitas no Colégio

Estadual Chico Mendes – EFM no município de São José dos Pinhais – PR. As

observações realizadas permitiram que mesmo sem um estudo mais elaborado

pudéssemos perceber que, a desigualdade de gênero é cotidianamente percebida

nas ações, nas atitudes, comportamentos, falas e discursos vivenciados no

ambiente escolar, e consequentemente, isso reflete em práticas sexistas

habitualmente percebidas no ambiente escolar. O referencial teórico possibilitou

1 Professora da Rede Pública Estadual de Ensino no Paraná

2 Orientador PDE da Universidade Federal do Paraná - UFPR

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observar que o sexismo foi construído ao longo da nossa história. Nesse sentido, o

ensino da História nos permite investigar em quais contextos e momentos tais

práticas foram sendo fortemente consolidadas em nossa sociedade. É também nas

aulas de História que podemos propor discussões que possibilitem a construção de

uma sociedade menos sexista.

A escola é um espaço de relações, onde indivíduos de diversos meios se

socializam e manifestam seus diferentes modos de pensar e agir.

Tendo como princípio de que a escola é um espaço naturalmente educativo

deveria prevalecer no ambiente escolar à igualdade de gênero, sem diferenciação

entre os sujeitos. Reconhecemos que essa é uma tarefa bastante difícil, entendendo

que o ser humano é uma construção do meio, identificadas por seus movimentos,

gestos, conversas, forma de organização, atitudes, valores. Os alunos levam para a

escola as vivências do seu dia a dia.

Observa-se que a escola, ainda permite que atitudes praticadas pela

comunidade escolar venham reforçar o preconceito e a discriminação por meio de

práticas sexistas advindas do ambiente cultural e familiar onde aluno está inserido.

Diante disso, o Projeto de Intervenção Pedagógica: desconstruindo práticas

sexistas no cotidiano escolar, foi implementado na escola com uma turma do 2º ano

do Ensino Médio da manhã, com 33 alunos. Foi elaborado para essa implementação

uma Unidade Didática contendo várias atividades. Concomitante a implementação

do projeto na escola, desenvolveu-se também um Grupo de Trabalho em Rede

(GTR) com 15 professores, que teve como objetivo apresentar, socializar, contribuir

e discutir com outros professores da rede estadual a temática do projeto.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 Sociedade Patriarcal

Ao estudarmos a questão do gênero no Brasil atual, é importante que

entendamos o contexto histórico que trouxe e permanece com desigualdades.

Nossa história é marcada por uma sociedade patriarcal, baseada no modelo

europeu, devido ao processo de colonização. Na organização dessa sociedade o

poder é exercido pelo patriarca da família, ou a outros homens a quem ele tenha

delegado este poder, cabendo à mulher um papel subordinado e dependente,

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restrito apenas ao espaço doméstico e familiar.

Assim "a posição da mulher, na família e na sociedade em geral, desde a

colonização até hoje, demonstra que a família patriarcal foi uma das matrizes de

nossa organização social. As mulheres brasileiras, nas primeiras décadas do século

XX, não haviam conquistado os direitos civis garantidos ao homem". (NARVAZ e

KOLLER, 2006, p.51).

Acostumadas a vida doméstica, desde pequenas as meninas aprendiam que

deviam obedecer ao pai e consequentemente ao marido, (escolhido pelo pai) já que

este era o seu destino. Na vida cotidiana, as mulheres aprendiam a ser boas

esposas, e futuras mães que educariam seus filhos nos mesmos moldes, e assim

esse tipo de sociedade se perpetuou por longos anos.

Nesta sociedade onde o homem manda em todos, a mulher não tinha voz.

Suas vontades desejos e aspirações não eram levadas em consideração já que não

tinha nenhum tipo de instrução formal: “ao homem todas as oportunidades de

iniciativa, de ação social, de contatos diversos, limitando as oportunidades da mulher

ao serviço e artes domésticos, ao contato com os filhos, a parentela, as amas, as

velhas, os escravos.” (FREYRE, 1977.p.93).

Eram, pois, desprovidas de direitos, pois como não iam a escola era difícil um

questionamento sobre suas vidas. As funções que desempenhavam, suas

obrigações eram reforçadas pela igreja católica, que realimentava a importância da

mulher estar em casa, para cuidar da casa e dos filhos, assim também estava

servindo a Deus, cumprindo com o dever de cuidar da família, instituição sagrada,

para os interesses da ordem vigente.

Na sociedade colonial, patriarcal e escravista, as mulheres são marcadas

pelas condições de respeito e submissão aos homens, sendo pouca a sua

visibilidade na sociedade. Saiam de casa somente acompanhadas, para atividades

festivas religiosas, sendo que estavam sempre acompanhadas de um homem. As

esferas públicas e privadas se entrelaçavam: interesse político de subordinação e

opressão para o gênero feminino, situação que começaria mudar algum tempo

depois.

2.2 Lutas feministas e Estudos Feministas

O Movimento feminista, que surgiu no ocidente no século XIX, foi um

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momento de contestação da situação de desigualdade em que viviam, e ainda vive

grande parte das mulheres. Num primeiro momento, as feministas surgem como um

grupo que luta por direitos civis, que até então era negado a elas e as outras

mulheres como cidadãs. Sabe-se que ações isoladas ou coletivas, dirigidas contra a

opressão das mulheres, podem ser observadas em muitos e diversos momentos da

história. Louro (1997) salienta sobre a visibilidade e expressividade que o

Sufragismo, movimento voltado para estender o direito ao voto, teve na virada do

século, as manifestações contra a discriminação feminina ganham (...) "uma

amplitude inusitada, alastrando-se por vários países ocidentais (ainda que com força

e resultado desiguais), o Sufragismo passou a ser reconhecida, posteriormente,

como a “primeira onda” do feminismo”.

O movimento feminista assume no Brasil dos anos 60 uma luta com maior

intensidade, pois nesse período se estabelece a ditadura militar no país.

Aproveitando esse momento de rebeldia, contestação e insatisfação da sociedade

contra o governo militar ressurge com todo vigor. Ao seu lado vão aparecer outros

movimentos, que se juntam a ele com o intuito de provocar discussões e debates em

defesa de seus direitos, denunciado desigualdades e opressões, que as deixam

excluídas da sociedade. Soares (1994) coloca que o movimento feminista começa

ao poucos transcenderem seu cotidiano doméstico, despontando um novo sujeito

social, a invisibilidade dá espaço à visibilidade, o que ela chama de novas atrizes,

inteiras múltiplas, (...) “elas estavam nos movimentos contra a alta do custo de vida,

pela anistia política, por creches. Criaram associações e casas de mulheres,

entraram nos sindicatos, onde reivindicaram um espaço próprio. Realizaram seus

encontros. Novos temas entraram no cenário político, novos práticas surgiram”.

Nas últimas décadas do século XX, os Estudos Feministas, baseados em

pesquisas, levantamento de dados, depoimentos orais, discussões polêmicas com

outros setores da sociedade, participação em congressos nacionais e internacionais,

cuja pretensão é dar visibilidade as mulheres, marcam um momento de

transformação do discurso do movimento feminista, que agora ganha espaço nas

instituições de ensino de nível superior e passam a ser interpretados de uma

maneira muito mais ampla.

É relevante que estes estudos feministas, tiveram acrescido nos últimos anos

a uma diversidade muito grande de sujeitos. Quando surgiu como movimento, era

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composto unicamente por mulheres brancas, agora se fazem ouvidas outras vozes

de mulheres como exemplo: as mulheres pobres, as mulheres negras, as mulheres

do campo, trabalhadoras urbanas e também mulheres lésbicas e mais recentemente

mulheres transexuais. Rompendo assim fronteiras e barreiras, que muitas vezes

distanciava um grupo do outro.

2.3 Discussões sobre Gênero

Sendo observada, em nossa prática cotidiana, uma discrepância de gênero, é

pertinente a discussão que iremos propor sobre essas desigualdades. Nosso

propósito até aqui, foi fazer uma análise baseado em textos relevantes sobre o

movimento feminista, para que pudéssemos chegar ao foco da questão, reflexões

sobre relações de gêneros presentes na sociedade e refletidas na escola através de

práticas sexistas que discriminam as mulheres.

Louro (1997) explica que a diferença entre os gêneros sempre serviu para

explicar e justificar as diferenças e distinções entre mulheres e homens. Baseado no

princípio das disposições biológicas, estas sempre foram utilizadas para provar

distinções físicas, psíquicas e comportamentais. Em consequência serviu (...) “para

indicar diferentes habilidades sociais, talentos ou aptidões; para justificar os lugares

sociais, as possibilidades e os destinos “próprios” de cada gênero. O movimento

feminista vai, então, ocupar centralmente dessa diferença - e de suas

consequências”.

Para Vera Soares (1994) é necessário criticar as formas de democracia que

esconde a profundidade da diversidade humana, o bem comum deve ser pensado a

partir das distintas formas da construção dos sujeitos, (...) “certamente é um grande

desafio repensarmos as formas para o feminismo se reinstalar nesse público,

traduzindo, por sua vez, o que isso quer dizer para as mulheres".

Portanto, é nesse contexto que começamos a pensar a escola como um

espaço que reforça as diferenças entre os sujeitos, não possibilitando nesse

ambiente, um lugar propicio a discussão acerca da desigualdade de gênero,

marcado por posturas, comportamentos e ações por parte de seus sujeitos, que

continuam reforçando conceitos que foram constituídos, tendo como cerne a

sociedade patriarcal, onde aos homens cabia o domínio sobre as mulheres, e a

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estas a obediência, sem resistência, de uma forma geral. Mas o ponto de partida é,

porque e como essa discriminação de gênero continua tão presente na família, na

escola, na sociedade e quase sempre é mascarada, acontecendo de forma

considerada natural e normal, sendo intrínseco tanto aos homens quanto as

mulheres.

Montserrat Moreno afirma que:

A escola tem marcada uma dupla função: a formação intelectual e a formação social dos indivíduos, ou seja, seu adestramento nos próprios modelos culturais. Porém caso se limite a isto terá feito um pequeno favor a sociedade. Não será mais que um aparelho reprodutor de vícios e virtudes, de sabedorias e mediocridades. Sua missão pode ser diferente. Em lugar de ensinar o que os outros pensaram, pode ensinar a pensar; em lugar de ensinar a obedecer, pode ensinar a questionar, a buscar os porquês de cada coisa, iniciar novos caminhos, novas formas de interpretar o mundo e organizá-lo. (MORENO, 1999, p.17).

A escola muitas vezes expressa através do currículo, do Projeto Político

Pedagógico, uma visão pouco transformadora, no sentido de formação intelectual

dos alunos, já que é uma mera reprodutora de discursos elaborados e que não

ensina os alunos a pensar. Cultua uma educação que diferencia meninos e meninas

na prática educativa. Citando aqui como exemplo, os espaços físicos, que não são

divididos de forma justa, cabendo, a eles, os meninos a quadra de futebol, enquanto

que elas, as meninas, ficam em lugares menos adequados para as atividades ao ar

livre. Nesse mesmo contexto observa-se que, os meninos também são incentivados

desde pequenos a tarefas mais competitivas, jogos que exigem força, resistência

física, alguns até certa agressividade, já elas são comuns que pratiquem atividades

que exigem menos resistência física e mais delicadeza.

Nesse sentido, Guacira afirma que (...) “observamos, então que eles parecem

“precisar” “de mais espaços do que elas” parecem preferir “naturalmente” as

atividades ao ar livre. Registramos a tendência nos meninos de “Invadir” os espaços

das meninas e interromper suas brincadeiras.” (LOURO, 1997.p. 60).

Na educação atual brasileira, nota-se em muitos momentos que não existe

uma preocupação em educar para a igualdade de gênero, pois sabemos que até

mesmo no uso de linguagens, alguns autores de livros didáticos ainda não tem a

preocupação em escrever um discurso que não discrimine as mulheres, mesmo

tendo conhecimento do movimento feminista que trouxe visibilidade para aquelas

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que há muito tempo a história ocultou, e que muitas dessas lutas foram

acompanhadas de conquistas, já sacramentadas na legislação brasileira.

Alguns livros didáticos, como por exemplo, os livros de História, trazem nos

seus textos escritos quase sempre no discurso masculino, excluindo as mulheres da

história, como se elas não tivessem participação na construção da sociedade. Por

outro lado, as mulheres aparecem fazendo trabalhos considerados "atividades de

mulheres", como: cozinheiras, babás professoras das séries iniciais, enquanto que

ao homem as atividades são sempre mostradas como atividades que demonstram

poder.

Essas colocações podem ser observadas, na seguinte afirmação:

a maioria das imagens de personagens representam, no entanto, homens realizando diversas ações: jogando, correndo, estudando, comendo ou exercendo profissões como médicas, arquitetos, astronautas, etc., consideradas frequentemente como masculinas, enquanto naquelas poucas, em que aparecem meninas e mulheres, estas estão, costurando, lavando, cozinhando ou realizando atividades “próprias de seu sexo” para que tudo permaneça na ordem. (MORENO, 1999, p.43).

Relatamos aqui sobre algumas de nossas ações, enquanto educadores (as),

mas é certo que, ações como essas que refletimos nos parágrafos anteriores, não

estão desacompanhadas de discursos, ações e atitudes comportamentais, que não

são neutros e ajudam a desenvolver nas meninas e meninos, práticas sexistas que

agridem as mulheres enquanto pessoas.

Portanto, ao falarmos de uma educação democrática é preciso que ela

realmente aconteça, de forma efetiva no cotidiano escolar e na sala de aula, não

usando uma linguagem sexista quando nos referimos aos meninos e meninas,

sempre no masculino e esperamos que as meninas entendessem e imediatamente

respondam. Não oportunizando as mesmas atividades para meninos e meninas,

enfatizando que meninos são melhores em raciocínio lógico, enquanto que meninas

são melhores em Arte, convidando meninas para organizar a sala entre outras,

enquanto que os meninos ficam olhando. Só assim não escutaremos frases mais de

caráter preconceituoso vindas de meninos e meninas, como exemplo relaciono

algumas: “homem não chora”, se não chora é porque não pode expressar

sentimentos. Enfatiza-se a ideia do machão, durão só que numa dicotomia, cobra-se

desse mesmo homem porque ele não é afetivo. Outra que sempre ouvimos: lugar de

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mulher é na cozinha. Como se as mulheres não fossem capazes de sair dos

afazeres domésticos. Lugar de mulher é na cozinha, na sala, na universidade, nos

cargos políticos, etc.

Nesse mesmo sentido afirma Moreno (1999, p.75), "se acreditamos que

deixando que meninas e meninos façam o que querem” estamos deixando-os em

liberdade, equivocamos, porque tenderão a reproduzir os esquemas e modelos de

seu meio, ou seja, estarão à mercê do ambiente.”

Não podemos contribuir para que uma sociedade formada pela organização

patriarcal com presença marcante do endocentrismo, onde movimentos feministas

surgiram e juntaram-se a outros numa luta unificada para conseguir direitos

igualitários aos dos homens na legislação, não inclua nesta luta, as discussões

sobre gênero de uma maneira mais ampla, e que se difunda uma educação centrada

na igualdade entre todos e todas.

3. Implementação do projeto na escola

Elaborado o Projeto de Intervenção na escola: desconstruindo práticas

sexistas no ambiente escolar, delimitamos o espaço e público alvo: Colégio Estadual

Chico Mendes, São José dos Pinhais – PR. Turma do 2º A ano do Ensino Médio do

turno da manhã. Propomos através da Unidade Temática algumas atividades que

possibilitassem algumas discussões no âmbito de todo o espaço escolar. Louro

(1997) discute a possibilidade que a escola pode trabalhar o que ela chama de

“afinamento” da sensibilidade. Sensibilidade que supõe informação, conhecimento e

também desejo e disposição política. Para ela, as desigualdades de gênero só

poderão ser percebidas, desestabilizadas e subvertidas, à medida que estivermos

atentos para sua forma de produção e reprodução.

Foi com essa intenção, que as atividades foram organizadas, procurando

discutir a literatura existente sobre o sexismo, contextualizando com práticas

sexistas que acontecem dentro da escola e são reforçadas, difundidas e vistas como

naturais. Questões como brigas de meninas, que tomam cada vez mais visibilidade

nos espaços escolares, vem frequentemente sendo tratadas de forma erroneamente

contrária ao que se define como igualdade de gênero. O texto abaixo retirado de

uma matéria, expressa essa situação: “Brigas entre meninas nas escolas aumentam”

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Antes, “entrar em vias de fato” – que nada mais é do que cair no tapa – era quase uma situação que só ocorria com ‘meninos’. Mas as coisas mudaram, as pessoas mudam e as mulheres, junto com a sonhada “igualdade” que nem sempre é tão igual assim, vem tomando espaços antes exclusivos dos homens. Desta forma, na ânsia de aceitação e de busca pelo respeito, muitas se sujeitam a coisas que ao invés de se orgulharem, deveriam se sentir envergonhadas. (GAZETA DO PARANÁ, 2012).

Os fatos mencionados na notícia acima retrata fatos reais das escolas, no

colégio, espaço de intervenção desse projeto, é registrado frequentemente nos

documentos escolares episódios de brigas envolvendo meninas. É importante

observar que, as brigas são corriqueiras entre meninas, e relativamente maior do

que entre meninos. O que é preocupante, não é fato de ter mais ou menos, não é

essa a questão principal, é preocupante quando observamos que, o espaço que as

mulheres tão bravamente lutaram, esteja se transformando em banalização, isso

não é visibilidade e muito menos igualdade de direitos. Não podemos ser coniventes

com essas banalizações nas escolas. Assim como, é dever da escola ser contrária a

qualquer forma de exposição que denigrem a imagem da mulher e do homem.

Nesses casos, as intervenções pedagógicas poderiam ser em favor da não

violência, tanto entre meninos e meninas, ela independe do gênero. Mas a

repressão vem sempre aliado a afirmações sexistas: “essas meninas estão piores

que os meninos”; “meninas brigando que feio”; “além de vocês estarem brigando, o

que já é feio, por meninos ainda”. Sim, a uma concordância que brigar é realmente

feio, mas a visibilidade do conflito é tão grave quanto uma briga de meninos. Há uma

distorção do foco: violência, para o foco: gênero.

Outro fato importante a ser analisado é que ainda hoje, a maioria das meninas

não consegue desprender-se do poder que a figura masculina exerce sobre elas, os

registros de atas na escola mostram que a maioria das brigas acontecem por

questões ligadas aos meninos, como disputa, distorcendo igualdade de gênero e

respeito, para a banalização da figura da mulher.

Foi a partir dessa, e de outras constatações feitas na escola, que achamos

necessário propor um trabalho que possibilitasse intervenções, nesse sentido, em

dezembro de 2011, com a oportunidade de participar do PDE, delimitamos essa

temática para estudo. Com auxílio do professor orientador, elaboramos o Projeto de

Intervenção entre os meses de fevereiro a julho. E, a partir do projeto, elaboramos a

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Unidade Didática, entre os meses de julho a dezembro de 2012, com várias

atividades, entre as quais: discussões de conceitos sobre o tema com referencial

teórico, fragmentos de músicas e poesias, teatro, trabalho de campo e análise dos

resultados.

Partindo dessa construção, ocorreram à implementação do Projeto de

Intervenção na Escola, com uma carga horária de 62 horas, dessas 32 horas

desenvolvendo as atividades com os alunos em sala de aula, as demais, com

atividades referentes ao projeto, mas podendo ser feito em contra turno com os

alunos, entre os meses de fevereiro a julho. Concomitante à intervenção realizamos

a tutoria do GTR – Grupo de trabalho em rede, com a carga horária de 60 horas.

A primeira atividade objetivou fazer um diagnóstico da turma, apresentando

algumas frases, o critério para a seleção dessas frases, foi a habitualidade com que

ouvimos na sociedade e na escola, em encontros com amigos, nas brincadeiras dos

alunos, nos corredores do colégio quando um tira sarro do outro, nas brincadeiras

em sala de aula, entre outras situações. Frases como: “homem não chora”; “trair é

de natureza masculina”; “as mulheres devem ser responsáveis pela casa e os

homens pelo sustento da família”; “as mães são mais importantes na educação dos

filhos que os pais”; “as mãe tem mais direito na guarda dos filhos que os pais”;

“mulher no volante perigo constante”, fofocar é coisa de mulher”, “menino que pega

muitas é o cara”, “menina que fica com muitos meninos é periguetes, biscatinha,

puta, entre outras frases”.

Dentre as frases colocadas para as discussões, percebeu-se que há uma

forte tendência entre as meninas em aceitar a igualdade de gênero quando estas

não se referem a maternidade e educação dos filhos. Algumas colocações

pontuadas por eles/as referentes a frase sobre o direito a guarda dos filhos:

ALUNA 1: “não acho que eles tem o mesmo direito, as mães são mais

importantes para a educação dos filhos, tem maior laço, maior ligação”.

ALUNA 2: “a mãe tem mais ligação com filho desde que nasce, é uma ligação

biológica, de afeto, separar a mãe de um filho é uma baita crueldade, os pais não

estão nem aí”.

Já no que se refere a frase: “mulher no volante perigo constante”

ALUNA 3: “somos tão iguais a eles ou melhores, somos atenciosas e

prudentes, muito mais cuidadosa”.

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O apontamento feito pela aluna 3 merece uma consideração, à medida que as

estatísticas realmente comprovam sua afirmação. Homens pagam 9,8% mais caro

por seguro de caro na mesma faixa etária que as mulheres, podendo esse valor

elevar-se dependendo da diferença etária. Segundo pesquisa, levantamentos

apontam que homens se envolvem em 80% de todo o total dos acidentes. (Folha de

São Paulo, agosto de 2013).

Durante toda a condução da atividade, as meninas ficaram em dualidade

entre o que realmente significa a igualdade de gênero. Observou-se que, abrir mão

das construções feitas não é tão simples assim, reconhecer a igualdade de gênero

implica em descontrair práticas fortemente solidificadas nas raízes da sociedade

patriarcal. Moreno afirma (1999) (...) que a escola pode ensinar a pensar, a

questionar e com isso apontar novas formas de ver e interpretar o mundo”. Diante

disso, a escola pode contribuir para desvelar atitudes e práticas sexistas, ou pode

continuar contribuindo para reforçar atitudes impregnadas de preconceitos e

estereótipos sobre homens e mulheres construídas como base nas diferenças de

sexo.

Foi nesse sentido que propomos a próxima atividade, trazendo para o debate

os conceitos teóricos que fundamentassem uma compreensão de como a

desigualdade de gênero foi ao longo da nossa sociedade sendo construída. Os

conceitos permitiram trabalhar com os alunos as concepções do que é biológico e o

que é construção social e cultural. Toda a sociedade, inclusive a mulher, participa na

construção de tais pensamentos. Hoje se tem a oportunidade de desconstruir tais

concepções, quando analisamos que de acordo com o IBGE (2010) 38,7 % dos

lares brasileiros, são chefiado por mulheres, esse número é o dobro do último censo.

Apesar desse aumento, elas se deparam com um problema crucial no Brasil,

somente 21% de acordo com o Censo Escolar (2011) das crianças entre 0 a 3 anos

são atendidas em creches.

As construções sociais e culturais que vem transformando a sociedade em

relação a mulher devem contribuir para acabar com os mecanismos que ainda

reforçam as concepções baseadas em questões biológicas. Moreno (1999, p.23)

traz uma discussão sobre o andocentrismo e argumenta sobre a força que tal

pensamento ainda possuí em nossa sociedade e no ambiente escolar “o

andocentrismo consiste em considerar o ser humano do sexo masculino como o

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13%

22%

65%

Questão 1

Nunca

Algumas Vezes

Com frequência

9%

35%

56%

Questão 2

Nunca

Algumas Vezes

Com frequência

centro do universo, como a medida de todas as coisas, como o único observador

válido de tudo o que ocorre em nosso mundo, como o único capaz de ditar leis, de

impor justiça, de governar o mundo”. É importante considerarmos que a autora

destaca que esse pensamento acontece tanto na sociedade como no ambiente

escolar, destacamos aqui, a nossa construção como sujeitos tanto da educação

formal, como resultados também da educação informal.

O Ensino da História pode possibilitar esse entendimento à medida que

apresenta como a mulher foi historicamente desconsiderada e colocada a segundo

plano da sociedade, relegando a ela papéis bem definidos: de mãe, esposa e do lar.

Freyre (1999) descreve sobre isso (...) “ao homem todas as oportunidades”.

Entendendo um pouco da história da mulher na sociedade, e como suas atribuições

e características foram sendo construídas, parece-nos um pouco justificável a

posição das meninas da turma em defender o papel da mãe em relação a educação

dos filhos, e se mostrarem tão contrárias a guarda dos filhos/as ao pai. Resquícios

de uma sociedade patriarcal, que ainda hoje possui forte influência nas decisões

judiciais na guarda dos filhos. Discutimos conceitos de gênero, sexo, sexualidade,

sexo fisiológico, sociedade patriarcal, papel do gênero.

Os estudos possibilitaram a organização e aplicação da próximo atividade, o

questionário. O trabalho em campo objetivou levantar dados referentes aos

pensamentos sexistas no ambiente escolar. Foram selecionadas 10 questões e

aplicadas com 978 pessoas na escola, entre as quais: alunas e alunos, funcionários

e funcionárias, professores e professoras.

Figura 1 – Você já ouviu piadinhas que discriminam Figura 2 – Você já ouviu dizer que lugar da mulher

as mulheres? é na cozinha?

Fonte: questionário aplicado no C E Chico Mendes – PR – Fonte: questionário aplicado no C E Chico Mendes – PR - Turma do 2º ano do Ensino Médio- Turma A Turma do 2º ano do Ensino Médio – Tuma A.

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Figura 3 – Você observa se, os espaços para as Figura 4 – Você já ouviu a afirmação: que isso é

práticas esportivas são ocupados mais pelos meninos coisa de menina?

nos intervalos na sua escola?

Fonte: questionário aplicado no C E Chico Mendes – PR – Fonte: questionário aplicado no C E Chico Mendes – PR - Turma do 2º ano do Ensino Médio- Turma A Turma do 2º ano do Ensino Médio – Tuma A.

Figura 5 – Você já ouviu a afirmação que as meninas Figura 6 – Você já ouviu a afirmação que: futebol é

são mais “caprichosas”, mais “organizadas” e tem a coisa de meninos?

letra "mais bonita" do que os meninos?

Fonte: questionário aplicado no C E Chico Mendes – PR - Fonte: questionário aplicado no C E Chico Mendes - PR - Turma do 2 º ano do Ensino Médio – Turma A. Turma do 2º ano do Ensino Médio – Turma A

Figura 7 – As tarefas domésticas da casa são divididas Figura 8 - Você já ouviu a expressão: é do homem a

igualmente entre as meninas e os meninos? Entre os responsabilidade e o sustento da família?

homens e as mulheres?

Fonte: questionário aplicado no C E Chico Mendes – PR – Fonte: questionário aplicado no C E Chico Mendes – PR -

Turma do 2º ano do Ensino Médio- Turma A Turma do 2º ano do Ensino Médio – Tuma A.

18%

34%

48%

Questão 3

Nunca

Algumas Vezes

Com frequência

14%

37%

49%

Questão 4

Nunca

Algumas Vezes

Com frequência

7%

28%

65%

Questão 5

Nunca

Algumas Vezes

Com frequência

11%

23%

66%

Questão 6

Nunca

Algumas Vezes

Com frequência

25%

52%

23%

Questão 7

Nunca

Algumas Vezes

Com frequência

14%

37%

49%

Questão 8

Nunca

Algumas Vezes

Com frequência

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Figura 9 - Você já ouviu a expressão: “brincar com Figura - 10 - Você concorda que, em casos de

boneca é coisa de menina”? divórcio, a mãe tenha mais direitos sobre os filhos?

Fonte: questionário aplicado no C E Chico Mendes – PR – Fonte: questionário aplicado no C E Chico Mendes – PR -Turma do 2º ano do Ensino Médio – turma A. Turma do 2º ano do Ensino Médio – Turma A

A pesquisa dos alunos apontou que as expressões sexistas são ainda muito

frequentes no ambiente escolar. Manifestadas muitas vezes nas brincadeiras, na fala

do alunado, dos professores e professoras e demais profissionais que trabalham

escola.

A atividade seguinte foi pensada considerando a afirmação de Oliveira

(2010), “tomar o cinema como fonte para a História implica numa série de

considerações de ordem teórica e metodológica, cujo alcance e complexidade via de

regra são maiores do que aqueles usualmente aplicadas à análise de outros tipos de

fontes”. A apresentação do filme: Vida Maria, objetivou trazer para análise a

reprodução do papel feminino na sociedade. Ead (2006) ressalta que as relações de

gênero, da forma como elas estão organizadas em nossa sociedade, são o ponto

chave para produzir desigualdades, para ela as visões naturalistas sobre mulheres e

homens, representam o que ela chama de travas para a superação dessa situação.

O caminho segundo ela é (...) “considerar que as relações de gênero como

socialmente construídas”, desta forma (...) “percebemos que uma série de

características consideradas ‘naturalmente’ femininas ou masculinas corresponde às

relações de poder”. Tais características são na verdade construídas ao longo dos

séculos, levando em consideração as relações de poder existente entre o feminino e

o masculino.

Retomo as ideias de Oliveira (2010) quando destaca que a linguagem

cinematográfica consegue sintetizar amplos períodos da história em poucas cenas,

4% 18%

78%

Questão 9

Nunca

Algumas Vezes

Com frequência

19%

37% 44%

Questão 10

Nunca

Algumas Vezes

Com frequência

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(...) “o desafio que é colocado ao historiador é, nestes termos, tentar perceber quais

elementos da conjuntura histórica são contemplados – ou esquecidos – com que

intensidade e frequência, e de que forma a história do filme é por eles influenciada

ou não”. Nessa atividade percebeu-se que alunos e alunas conseguiram observar e

refletir quem foram os contemplados da história, e quem foram os esquecidos, e

com qual intensidade e frequência. Percebeu-se também, que a maioria deles/as

são contrários/as ao papel da mulher retratado no filme, quando questionados em

quais momentos podemos perceber a reprodução do papel da mulher no filme

apresentado? Eles relatam:

Aluna 5 – (...) “As atividades que a menina faz são domésticas ela tem um

montão de irmãos, mas é a ela que cabe os serviços de casa, a mãe não deixa seus

irmãos ajudarem”.

Aluno 6 – (...) “Há uma clara divisão de papéis, a Maria faz as atividades

domésticas, limpa, varre casa, tem filhos e continua repassando essa mesma vida

para as outras Marias”.

Em todas as questões, e posicionamentos, a turma demonstrou perceber que

apesar do filme retratar um fato em um determino tempo e espaço, o papel da

mulher é claro e objetivo. Outra questão pontuadas por eles, é que apesar das

transformações e das conquistas da mulher na sociedade, não existe ainda hoje,

uma plena igualdade entre homens e mulheres. Isso nos acontece mais diferentes

setores: política, economia, no esporte, na religião, entre outros.

Outra forma de trabalhar com os alunos foi através de leitura de imagens e

fragmentos de músicas. Por meio destas atividades pode-se discutir com os alunos

sobre gênero no contexto de suas representações, mas principalmente na

publicidade. Objetivando um instrumento de análise que evidenciasse uma leitura

crítica relacionada aos estereótipos preconceituosos e discriminatórios em relação a

figura da mulher, que se escondem no processo de captura e edição de imagens e

letras de músicas.

Uma retomada na história da mídia sobre as representações da mulher

vamos perceber que as estratégias de comunicação tem incorporado inúmeras

mudanças ocorridas na sociedade, a emergência de novos valores, representações

relações e práticas sociais. Contudo, para Ono; Silveira; Correia (2009) “consta-se

pelos resultados das investigações que as representações do feminino e masculino,

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na ciência, tecnologia e sociedade, por meio dos meios de comunicação, seguem

reproduzindo visões binárias e dicotômicas da questão de gênero”.

Essa constatação em que se referem os autores é notada pelos alunos em

seus registro quando solicitado nas atividades a analisar as imagens apresentadas:

Aluna 7- (...) as três imagens são para vender produtos, na maioria das vezes

a distinção do produto a ser vendido e feito baseado no que se considera ser

feminino ou masculino, e também no que é de menino ou menina. O universo

feminino é rodeando de bonecas, princesas e o dos meninos carrinhos vídeos

games.

Aluna 8 - (...) A 3 é a mais interessante, eles associam a vontade, o desejo da

mulher. É uma sacanagem: uma máquina de lavar e um homem, e dizem:

EXATAMENTE DO QUE AS MULHERES GOSTAM, forte quando elas precisam

gentil quando elas querem. Quem disse que quero uma máquina, quem disse que

quero um homem gentil e forte, aliás, quem disse que quero um homem.

Essa atividade permitiu que os alunos tentassem olhar como as

representações do feminino e masculino são representadas por meio dos meios de

comunicação, no caso específico do recurso audiovisual. É relevante considerar que

as orientações para a leitura da imagem deve ser voltada para a desconstrução

desse binarismo e dessa dicotomia entre o feminino e o masculino.

Concluídas as atividades da Unidade Didática com os alunos do 2º A em sala,

esses socializaram seus conhecimentos para os outros alunos da escola,

organizando oficinas teatrais e apresentação de Rap.

O Rap foi produzido pelo alunos e retratou algumas falas sexistas do dia a dia

deles na escola, os alunos organizaram a apresentação por turma e teve grande

aceitação por todos/as.

LETRA: DIGA NÃO AO SEXISMO

Joice - E aí mano o que acontece se toca moleque vê se cresce! Anderson - Que você tá fazendo aí minha filha, teu lugar não é na lavanderia? Joice - Vê se toca playboyzinho metido a bosta, seja homem põe esse boné na cabeça! Tailise - Ha, ha, olha, olha, quem está aqui meu amigo, essa otária de novo, não acredito, só falta o nariz vermelho, porque a cara já é pintada, daí vira de vez uma palhaça! Renata - Vixe, vixe, esse play boizinho de novo? Tá tentando virar homem fofo? Colocou o boné pra dizer que comanda, mas quando chega a casa vai direto pro colo da mama!

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Dheuliane - Pior você com seu grupinho se achando as maravilhas, mais na verdade não passam de um bando de vádias. Que isso amiga a vaca lambeu seu cabelo? Isso é disputa de rap's e Mc's e não concurso de modelo. Anderson - Modelo de filme de terror isso que ela é só não dá pra saber se é homem ou mulher. Ana Paula - Não! Para aí, eu não to acreditando, esse povinho de novo, só pode tá brincando? Conheço seu tipo de gangue, que gosta de arranjar briga, mais são todos aqueles que só agita, quero te ver sozinho, pra enfrentar a luta, a não, tu não aguenta, é melhor chamar os truta! Anderson - Conheço essa figura esse tipo de mano, jeito de maloqueiro deve ser Corintiano! Joice - Ah! Meu amor, teu time eu até imagino, mó cara de viado, deve ser São Paulino. Anna - Não! Peraí. O que tá acontecendo, essa treta de novo o que, que tá havendo? Vocês parecem animais brigando por comida, ficam se atacando, se humilhando com práticas sexistas. Tailise - É, foi-se, até que ela tem razão. Anna - É claro que eu tenho, então vem cá, presta atenção, neste momento vocês poderiam estar se divertindo, mais não, preferem estar aí discutindo, não tem o mínimo de respeito pelo sexo oposto, só querem saber de ofender os outros. Acham que humilhando alguém vocês vão ser o tal? Não, não, vocês vão é se dar mal. Então vamos lá, venham cá, vamos todos se divertir.

Em outro momento, os alunos organizaram oficinas teatrais, na ocasião, eles

apresentaram uma peça adaptando a música: pega isso, pega aquilo da cantora

Ellens. A adaptação da música em forma de teatro retratou que a mulher hoje na

sociedade, na luta por visibilidade e igualdade, enfrenta um novo desafio, a

ampliação da jornada de trabalho, ela faz parte da população economicamente ativa,

e ao mesmo tempo é responsável por todos os afazeres domésticos. Algumas fotos

ilustram esse momento na escola. (ANEXO 1).

Muitas outras atividades foram produzidas pelos alunos, como: cartazes,

exposição dos gráficos para a comunidade, charges e ilustrações, entre outras, mas

devido ao número limitado de páginas, não permitem socializar todas as produções.

4. Grupo de Trabalho em Rede – GTR: considerações para além da escola

O Grupo de Trabalho em Rede - GTR é um curso de formação dos

professores na modalidade EaD online. É oferecido a todos os professores da rede

estadual, tendo como tutor o professor PDE. O curso teve o total de 60 horas em

grupos de 15 professores, entre os meses de março à maio. As atividades são

realizadas na plataforma moodle. O objetivo é socializar o Projeto de Intervenção e a

Produção Didática com os demais professores e oportunizar momentos de

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discussões. O curso foi organizado em etapas, compreendendo momentos distintos

de discussões. A primeira etapa foi discutida com base na apresentação e reflexão

do Projeto de Intervenção. A participação do professores foi expressiva e instigante

com várias contribuições.

Cursista 1: (...) "durante muito tempo, a mulher no Brasil tinha como função ser

esposa e mãe, ou seja, seu existir, resumia-se no existir do homem, tudo girava em

torno deste. (..), todavia, estamos longe de uma sociedade igualitária, a dominação

masculina prevalece no poder político, nas grandes corporações, na economia, nas

instituições religiosas e nas relações afetivas".

A segunda etapa do curso discute e propõe a Produção Didático - Pedagógica

e a possível aplicabilidade na escola de atuação. Nesse sentido, destaco uma

colocação de um participante:

Cursista 2 - (...) "Ao ler cada proposta de atividade vislumbrei as possibilidades na

prática, sem dúvida esse material pode ser aplicado na minha realidade, desenvolvo

esse trabalho com meus alunos e incluo também o conceito de

heteronormatividade".

A terceira etapa objetivou socializar a aplicabilidade das ações de

implementação do Projeto de Intervenção na escola, permitiu que pudéssemos

contar um pouco de como estava sendo realizado o projeto, os desafios, e as

perspectivas na escola. Importantes contribuições surgiram. Cursista - 3

(...) "Tive a mesma dificuldade que você, quando trabalhei essa temática na escola, os alun@s são abertos, mostram-se interessad@s no assunto, aos poucos percebemos que vão desconstruindo, questionam, corrigem-se. No entanto, quando se refere ao mesmo trabalho com professores, é desanimante". (...) Entrei em parafuso! Ouvi frases do tipo: ' tem mulher gosta de apanhar, por isso continuam com o marido violento'; 'se apanhou é por que merece'; 'tem menina que pede para ser estuprada'. Como trabalhar essa temática com os alun@s, se aquel@s que deveriam estar a frente das discussões são os que mais alimentam o machismo e o sexismo nosso de cada dia?"".

A colocação exposta pelo cursista 3 foi sem dúvida, uma das principais

preocupações dos cursistas. É difícil trabalhar com essa temática com os alunos,

mas é com os professores e funcionários que encontramos a maior resistência. A

última etapa constituía a avaliação, inúmeras possibilidades e sugestões surgiram.

Foi gratificante e permitiu algumas considerações importantes, entre as quais: esse

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é um trabalho na escola moroso; devem ser trabalhados em projetos contínuos e

precisa da colaboração de todos e todas.

5. Considerações finais

A aquisição de um novo conhecimento implica muitas vezes, uma

desconstrução daquilo que se caracteriza como "verdade". O processo de

desconstrução nem sempre ocorre com facilidade. Certas práticas sexistas foram ao

longo do tempo construídas, e ainda são utilizadas, dificultando a consolidação da

equidade de gênero em diversos campos sociais, políticos, e tecnológico da

sociedade.

Esse trabalho permitiu levar algumas dessas discussões para o âmbito

escolar, provendo uma educação não sexista e mais igualitária entre os gêneros. No

entanto, concordamos que esse não é um trabalho fácil, mas da mesma forma

enfatizamos a sua extrema necessidade. É necessário que não se conclua as

intervenções na escola e expanda as atividades para todo o coletivo da escola, pois

é um trabalho que exige contínuos estudos e insistentes práticas.

6. REFERÊNCIAS BRANT, D. Seguro de carro varia até 112% em SP; calcule seu risco. Folha de São Paulo. São Paulo, agosto de 2013. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2013/08/1324315-calcule-seu-risco-para-o-seguro-de-carro-quanto-menor-mais-barata-a-apolice.shtml.

FREYRE, G. Sobrados e mocambos. 5. ed. Rio de Janeiro: Olympio, 1977. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. IBGE, censo 2010. Disponível em http://www.ibge.gov.br/home/. KNAPIK. K.J (Org.) ET al. Movimento popular de mulheres no Paraná: 10 anos construindo vida. Curitiba: Gráfica Popular: CEFURIA, 2005. LOURO, G.L. Gênero, sexualidade e educação. Uma perspectiva pós estruturalista. 6. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.

LUZ, S. N. Violência contra a mulher: um desafio a concretização dos direitos humanos. In: LUZ, N.S; CARVALHO, G.M; CASAGRANDE, S.L. (orgs.). Construindo a igualdade na diversidade: gênero e sexualidade na escola. UTFPR, 2009.

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MORENO, M. Como se ensina a ser menina: o sexismo na escola. Coordenação Ulisses Ferreira de Araújo; tradução Ana Venite Fuzatto. – São Paulo: Moderna; Campinas, SP: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 1999. OLIVEIRA, D. Cinema e Moral Sexual no Brasil (1950-1970) Projeto de pesquisa apresentado ao CNPq como pré – requisito da candidatura a bolsa de produtividade em Pesquisa (PQ). Curitiba: UFPR, 2010. REPORTAGEM brigas entre meninas nas escolas aumentam. Disponível em: <cgn.oul.com.br/noticias/22737/brigas-entre-meninas-nas-escolas-aumentam>. Acesso em 08/04/2012. RONCAGLHIO, C. Pedidos e recusas mulheres, espaço público e cidadania (Curitiba 1890-1934). 177 f. Dissertação de mestrado em História – Setor de Ciências, Letras e Artes da Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 1994.

TEXTO de Vera Soares: as muitas faces do feminismo no Brasil. Disponível em: <ww2.fpa.org.br/uploads/vera.pdf>. Acesso em 31/03/2012.

TRINDADE, E.M.C. Clotildes ou Marias: Mulheres de Curitiba na Primeira República. Curitiba: Fundação Cultural de Curitiba, 1996.

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ANEXO I

Figura 1 - Apresentação do teatro

Fonte: DALAGNOL, Gisele, 2013

Figura 2 - Turma do 2º A, participante do Projeto de Intervenção

Fonte: DALAGNOL, Gisele, 2013