desafios da diversidade na escola da diver… · estes são os desafios permanentes da educação e...

20
DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA Neusa Maria Mendes Gusmão C omo pensar o Brasil e suas muitas imagens ou faces? Na tentativa de buscar alguns caminhos, lembro Manuela Carneiro da Cunha, afirmando que " ... ainda são as diferenças o que move as sociedades desse planeta." (1998, p.80). Por sua vez, Tarsila do Amaral, com o magnífico quadro "Os operários" e os muitos rostos que nos olham, revela um pouco de nossa diversidade social e cultural, apontando para diferentes formas de ser, estar e se pensar como parte dessa realidade chamada Brasil. 34 Operários {Workers}, 1933 Óleo sobre tela {oil in eanvas}, 150 x 205 em Pensar, portanto, o Brasil, me leva a buscar algumas vozes. Diz Marcos Terena, da nação indígena Terena: Revista Mediações, Londrina, v.5, n,2, p, 9-28, jul./dez, 2000 9

Upload: others

Post on 21-Jul-2020

6 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

DESAFIOS DA

DIVERSIDADE NA ESCOLA

Neusa Maria Mendes Gusmatildeo

Como pensar o Brasil e suas muitas imagens ou faces Na tentativa de buscar alguns caminhos lembro Manuela Carneiro da Cunha

afirmando que ainda satildeo as diferenccedilas o que move as sociedades desse planeta (1998 p80) Por sua vez Tarsila do Amaral com o magniacutefico quadro Os operaacuterios e os muitos rostos que nos olham revela um pouco de nossa diversidade social e cultural apontando para diferentes formas de ser estar e se pensar como parte dessa realidade chamada Brasil

34 Operaacuterios Workers 1933 Oacuteleo sobre tela oil in eanvas 150 x 205 em

Pensar portanto o Brasil me leva a buscar algumas vozes Diz Marcos Terena da naccedilatildeo indiacutegena Terena

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28juldez 2000 9

Durante muito tempo na minha vida eu comecei a ter vergonha de mim

mesmo de minha origem das minhas tradiccedilotildees do meu povo ateacute mesmo de meus pais Mas depois eu aprendi que sem eles eu nunca seria nada

eu nunca seria um branco vamos dizer assim um branco no sentido de

pessoa da cidade porque eu nasci iacutendio Tereno e tambeacutem morrerei um

Terena Entatildeo com esses princiacutepios eu procurei trabalhar a minha

fonnaccedilatildeo de coacutedigo indiacutegena Ao mesmo tempo eu procurei mostrar

pra sociedade envolvente que de fato por exemplo de natildeo estar com

orelha furada de natildeo estar usando o beiccedilo de pau de natildeo estar usando

cabelo comprido natildeo significava que eu tinha deixado de ser iacutendio mas

sim que as caracteriacutesticas de meu povo eram um princiacutepio proacuteprio de meu povo e que natildeo me identifica na minha pessoa aquela generalizaccedilatildeo que eacute ser iacutendio uma coisa que na verdade natildeo existe Entatildeo eu peccedilo que

os educadores eles contribuam com a formaccedilatildeo do respeito muacutetuo

desde as crianccedilas As crianccedilas brasileiras elas tecircm uma sede muito

grande de conhecer o iacutendio mas muitas vezes os professores erram ao

afirmar que os iacutendios satildeo selvagens ou satildeo preguiccedilosos criando um

preconceito estabelecido no proacuteprio aprendizado do professor na

formaccedilatildeo do professor(Terena 1996)

Dinei Matos - uA Tribuna

Por outro lado num exerciacutecio imaginaacuterio um professor eacute convidado a pensar num seu aluno negro ou preto como frequumlentemente dizemos Imediatamente sem qualquer duacutevida pensa

10 Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

logo no Sebastiatildeo Segundo o professor o Sebastiatildeo eacute negro porque tem traccedilos negroacuteides acentuados eacute escuro tem cabelo ruim nariz chato E negro porque tambeacutem descende de escravos embora ele professor natildeo tenha disso a imediata percepccedilatildeo Por outro lado aleacutem da cor da pele e de seus traccedilos Sebastiatildeo eacute pobre e carrega consigo a imagem de pobre e tudo que vem com ela (Adaptado de Santos 1989)

J-

Quem satildeo os sujeitos envolvidos nestas duas pequenas histoacuterias Satildeo os considerados outros ou seja os diferentes porque iacutendio

e negro diferentes do modelo socialmente instituiacutedo por um paiacutes que se r pensa branco de origem europeacuteia embora como bem mostra Tarsila natildeo seja essa a nossa realidade Eacute verdade que reconhecemos a presenccedila do iacutendio e do africano em nossa formaccedilatildeo mas quando contamos a nossa histoacuteria ficam eles esmaecidos ou ausentes dada a magnitude do branco

Com isso tais histoacuterias nos dizem muitas coisas primeiro nos lembram aqueles que satildeo vistos como diferentes dizem de um contexto escolar e de educaccedilatildeo dizem tambeacutem de aspectos proacuteprios desse contexto ou seja o processo educativo e a relaccedilatildeo professor-aluno

No entanto o que eacute dito natildeo se reduz apenas a esses fatos Tais histoacuterias nos revelam aspectos mais complexos que nos envolvem Assim falam de como se daacute o processo de formaccedilatildeo de imagens no contexto social e histoacuterico em que vivemos o iacutendio como selvagem ou preguiccediloso o negro como indolente e bom de samba a mulata como sensual a crianccedila como pureza etc Falam de como essas imagens criadas

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez2000 11

12

transitam por nossa mente e por nossas vidas e nesta medida acarreshytam consequumlecircncias sobre o que eacute vivido por noacutes

Portanto a fala de Marcos Terena faz sentido eacute necessaacuterio recuperar e ensinar agraves crianccedilas o respeito muacutetuo entre diferentes tanto como eacute preciso fazer ver ao professor as introjeccedilotildees da sociedade em sua percepccedilatildeo

de mundo e com isso resgatar a histoacuteria de Sebastiatildeo As duas histoacuterias nos conduzem a reverter o pensamento escrutinaacute-lo em seus elementos para entatildeo compreender os muitos significados em jogo

A partir de Tarsila de Marcos e Sebastiatildeo compreendemos ainda a pluralidade social cultural e eacutetnica que envolve a realidade brasileira e a escola Mais que tudo suas histoacutellas revelam a questatildeo do outro como diferente

O que eacute ser diferente Para Brandatildeo (1986) o diferente e a diferenccedila satildeo partes da

descobelta de um sentimento que armado pelos siacutembolos da cultura nos diz que nem tudo eacute o que eu sou e nem todos satildeo como eu sou Mais que as diferenccedilas o que estaacute em jogo eacute a imensa diversidade que nos informa eacute o que nos constitui como sujeitos de uma relaccedilatildeo de alteridade

A alteridade revela-se no fato de que o que eu sou e o outro eacute natildeo se faz de modo linear e uacutenico poreacutem constitui um jogo de imagens muacuteltiplo e diverso Saber o que eu sou e o que o outro eacute depende de quem eu sou do que acredito que sou com quem vivo e por quecirc Depende tambeacutem das consideraccedilotildees que o outro tem sobre isso a respeito de si mesmo pois eacute

nesse processo que cada um se faz pessoa e sujeito membro de um grupo de uma cultura e sociedade Depende tambeacutem do lugar a partir do

qual noacutes nos olhamos Trata-se de processos decorrentes de contextos culturais que nos formam e informam deles resultando nossa compreensatildeo de mundo e nossas praacuteticas frente ao igual e ao diferente

Um poema ensinado nas escolas americanas entre o final do seacuteculo passado e o iniacutecio deste seacuteculo pode nos ajudar nessa discussatildeo I Diz o poema

Indiozinho Sioux ou Crow pequeno esquimoacute

pequeno turco ou japonecircs Vocecircs natildeo queriam ser eu2

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28 judez 2000

A qualidade do poema eacute a de indicar que nem todos satildeo iguais shynem todos satildeo como eu sou comem como eu vestem como eu andam como eu ando e falam como eu falo A escola ensinava entatildeo que havia diferenccedilas no mundo dos homens e que nem tudo era igual

No entanto o mesmo verso revela tambeacutem alguns pontos fundamentais da criacutetica antropoloacutegica sobre as formas de compreensatildeo de si e do outro que constituem a identidade social e cultural de um povo de um grupo de uma cultura ou sociedade

Em primeiro lugar em qualquer parte do mundo os povos indiacutegenas satildeo sioux crow kamayuraacute xokleng guarani avaacute ou outros mas natildeo satildeo iacutendios categoria inventada pelos brancos para desrespeitando as especificidades de cada grupo colocaacute-los a todos no mesmo saco - Indiozinhos sioux ou crow - isto eacute tanto faz satildeo iacutendios para os brancos Desconsidera-se aiacute o que satildeo de fato e o que pensam sobre si mesmos como resultado de uma histoacuteria singular de grupo que tem suas proacuteprias marcas e portam significaos sentidos e visatildeo de mundo uacutenicos Desconsidera-se aquilo que os fazem serem quem satildeo Chamaacute-los de iacutendios indistintamente eacute negar-lhes o que de mais interior os habita e dizem deles por aquilo que satildeo kamayuraacutes kadiweu ticuna etc Ou como os esquimoacutes - nome tambeacutem forjado pelo branco dominador - que reagem dizendo natildeo somos esquimoacutes somos Inuits que quer dizer homens verdadeiros Certamente os turcos natildeo satildeo simplesmente turcos e tampouco se pode afirmar que exista um uacutenico modo de se ser japonecircs Como entatildeo explicar o verso fmal Vocecircs natildeo queriam ser eu

O que estaacute em jogo eacute a diferenccedila do outro e sua identidade que exige que se abdique daquilo que se eacute para assumir a identidade do eu como modelo a ser imitado O eu nesse caso eacute o branco ocidental cristatildeo medida de todas as coisas e como tal superior A histoacuteria dos homens eacute feita num jogo de imagens expressas num espelho de muitos acircngulos em que a diversidade se mostra em seus muitos significados e permanentemente nos desafia pois tem por base o fato de que a relaccedilatildeo entre o eu e o outro eacute sempre conflitiva e marcada por instacircncias diferenciadas de poder Um poder de duplo semblante (cf Clastres 1982) isto eacute um poder e uma submissatildeo que impedem a eclosatildeo de relaccedilotildees de liberdade entre iguais Tem sido assim entre os considerados

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28juldez2000 13

14

diferentes - loucos iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Eacute assim que o diferente precisa ser feito um igual como diz Brandatildeo (1986) para melhor ser dominado A questatildeo da identidade do eu portanto passa pelo mundo onde estou pertenccedilo e vivo mas soacute eacute objeto de meu pensar enquanto uma questatildeo um problema quando me defronto com o outro diferente de mim e aiacute me pergunto quem sou

A identidade e a alteridade revelam portanto que o outro natildeo eacute inexistente e estrangeiro distante de noacutes e daquilo que constitui nosso mundo O que a alteridade diz eacute que o outro existe e estaacute no nosso mundo como noacutes estamos no dele Eacute esse encontro que nos desafia e exige nossa definiccedilatildeo O eu e o outro enquanto noacutes eacute parte de um contexto relacional marcado antes de mais nada por relaccedilotildees de hierarquia e poder Como entatildeo fazer do outro um mesmo transitar pelo seu mundo e ele no nosso sem confronto sem conflitos sem fazer dele um igual para melhor submetecirc-lo Como conviver com as diferenccedilas e estabelecer relaccedilotildees solidaacuterias e de equumlidade entre sujeitos diferentes Estes satildeo os desafios permanentes da educaccedilatildeo e da escola

Diversidade educaccedilatildeo eescola

A diversidade nos espelha como parte das relaccedilotildees de poder e nos envolve em todas as dimensotildees da vida vivida no nosso cotidiano e ateacute mesmo ali onde sequer suspeitamos de sua existecircncia Com isso vale perceber que

Nos planos econocircmico social poliacutetico e das relaccedilotildees pessoais

diferenccedila tem significado em nosso paiacutes quase sempre de

desigualdade ou mais exatamente as diferenccedilas eacutetnicas culturais

fenotiacutepicas serviram de marcas entre desiguais sociais No plano da

cultura poreacutem a aplicaccedilatildeo dessa equumlivalecircncia (diferenccedila=desigualdade)

confunde os partidaacuterios da democracia levando-os a postular o fim

das diferenccedilas como garantia de igualdade Eis o que pensaria um

democrata bem intencionado nossos alunos seratildeo iguais a noacutes quando

natildeo forem diferentes (Santos 1989 p26) (grifo nosso)

Revista MediaccedilotildeesLondrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

A questatildeo eacute seraacute esse o caminho Ser diferente eacute ser desigual E tornar todos iguais negando suas diferenccedilas natildeo seria um ato autoritaacuterio negador do outro e como tal um ato de poder

Tonuccl

~OtildeOtildemiddot C ~

)11 ((((

Oacute lwAacutevivO ~

111 Ccedil0 Arn-1 fPNNi~

~a~Saacute~ i ItalnI4t

$I Aavaliaco

o que este cartum nos diz Que mesmo no micro contexto da relaccedilatildeo de poder entre

professor-aluno o problema natildeo estaacute na diferenccedila mas na des-igualdade como diz Vargas (1989 pAO) citando Dumont que supotildee uma igualdade de fundo aquela que reflete a minha imagem no espelho seja essa imagem a do professor ou ainda daqueles que detecircm o poder O eu eacute assim aquele que soacute aceita os que considera igualou mais proacuteximo de sua proacutepria imagem Portanto natildeo eacute a diferenccedila que pertence ao donuacutenio da desigualdade ( ) mas ao contraacuterio eacute porque pensamos pelo donuacutenio da semelhanccedila e da identidade que hierarquizamos o diferente e o tratamos como desigual

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28 juldez 2000 15

16

Neste sentido como diz Stolcke (1993 p28) compreendemos que igualdade e diferenccedila natildeo satildeo categorias absolutas - dependem das relaccedilotildees em jogo para definir o igua1 e o diferente e assim num processo de poder e dominaccedilatildeo gerar a marginalizaccedilatildeo e a exclusatildeo

Aqui a questatildeo da escola se coloca por inteiro em sua complexidade e se defronta com seu maior problema o fracasso diante da diversidade que nos constitui Nesta medida entra em debate o que se entende por cultura e como ela eacute pensada e compreendida no interior de projetos educativos e na praacutetica cotidiana

Antes de mais nada a cultura no interior de uma realidade humana eacute sempre dinacircmica natildeo eacute fechada ou cristalizada como um patrimocircnio de raiacutezes fixas e permanentes A cultura possui fronteiras moacuteveis e em constante expansatildeo Tampouco eacute conjugada no singular posto que eacute plural marcada por intensas trocas e muitas contradiccedilotildees nas relaccedilotildees entre grupos culturais di versos e mesmo no interior de um mesmo grupo Por esse motivo natildeo eacute possiacutevel reduzir nem os grupos nem os indiviacuteduos agrave sua cultura como diz Augeacute (1998 pl15) Do mesmo modo natildeo se pode afirmar existir uma essecircncia proacutepria desta ou daquela cultura jaacute que satildeo as sociedades que decretam a cultura e natildeo satildeo as culturas que formam as sociedades (Cunha 1998 p88)

O desafio da escola e dos projetos educativos que orientam nossa praacutetica estaacute no fato de que para compreender a cultura de um grupo ou de um indiviacuteduo que dela faz parte eacute necessaacuterio olhar a sociedaccedille onde o grupo ou o indiviacuteduo estatildeo e vivem Eacute aqui que as diferenccedilas ganham sentido e expressatildeo como realidade e definem o papel da alteridade nas relaccedilotildees sociais entre os homens

Primeiramente fazemos parte de uma sociedade de classes em que as relaccedilotildees sociais entre sujeitos satildeo relaccedilotildees de hierarquia e poder que se sustentam em classificaccedilotildees dadas a priori e naturalizadas como proacuteprias deste ou daquele grupo - Sebastiatildeo eacute negro porque tem nariz chato e cabelo ruim os iacutendios satildeo selvagens ou preguiccedilosos O pedido de Marcos Terena aos professores se justifica pois a escola tem sido o veiacuteculo de projeccedilatildeo de padrotildees e modelos que impedem o verdadeiro conhecimento privilegiando um conhecimento dado e assimilado pela ordem institucional nem sempre percebido pelos agentes sociais que conduzem o processo educativo Eacute assim que muitas vezes a dificuldade

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28juldez 2000

de aprender eacute explicada pelo fato de se ser paraibano nordestino favelado vesgo canhoto filho de prostituta (Santos 1989 p73)

Educar eacute entatildeo um desafio posto que se processa no interior de um embate entre interesses dominaccedilatildeo exploraccedilatildeo revelando a existecircncia do poder e seu exerciacutecio sobre os indiviacuteduos grupos ou

sociedades tidos como diferentes Educar tem sido o meio pelo qual o

diferente deve ser transformado em igual para que se possa submeter dominar e explorar em nome de um modelo cultural que se acredita natural universal e humano (Gusmatildeo op cit 43)

No campo de forccedila que envolve as relaccedilotildees da escola frente aos diferentes e frente agrave diferenccedila cultural proacutepria da sociedade brasileira J oel Rufino dos Santos afirma existir uma imensa ingenuidade Para ele eacute ingecircnuo pensar em salvar o ensino a partir de uma falsa noccedilatildeo de igualdade que desconsidera e faz taacutebula rasa das diferenccedilas

Exemplar eacute a reaccedilatildeo de professores e dirigentes de escola quando indagados sobre as diferenccedilas do alunado Eacute frequumlente se ouvir que naquela escola todos satildeo iguais e que aos olhos do educador natildeo haacute

diferenccedila No entanto todos sabemos que essa igualdade natildeo eacute real Os

alunos que ali estatildeo tecircm as mais diferentes origens satildeo portadores de

diferentes histoacuterias de vida as quais informam seu modo de ser e suas possibilidades de aprender Por que entatildeo os dizemos iguais Porque todos satildeo vistos a partir do lugar que ocupam no interior da escola Ali eles satildeo alunos categoria geral e abstrata que tal como a categoria iacutendio coloca a todos no mesmo saco e nega as diferenccedilas que os tomam cada um sujeitos soacutecio-culturais Diante da pergunta de quem satildeo os jovens e o que vatildeo buscar na escola Dayrell (1996 p139) afirma que

Para grande parte dos professores perguntas como estas natildeo fazem muito sentido pois a resposta eacute oacutebvia satildeo alunos E eacute essa categoria que vai informar seu olhar e as relaccedilotildees que manteacutem com os jovens a compreensatildeo de suas atitudes e expectativas Assim independente do

sexo idade da origem social das expectativas vivenciadas todos satildeo

considerados igualmente alunos procuram a escola com as mesmas expectativas e necessidades ( ) A homogeneizaccedilatildeo dos sujeitos como alunos corresponde agrave homogeneizaccedilatildeo da instituiccedilatildeo escolar compreendida como universal

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000 17

18

Por outro lado diz Ioel Rufino dos Santos eacute ingenuidade tambeacutem pensar em salvar o ensino pura e simplesmente pelo reconhecimento das diferenccedilas culturais Fazecirc-lo eacute reificar a cultura como se as diferenccedilas pudessem ser contidas e explicadas por si mesmas por uma essecircncia proacutepria que afirma que cada um eacute um que se eacute assim por causa da cultura

oprocesso educativo entre oensinar e o aprender

Nem a igualdade absoluta nem a diferenccedila relativa satildeo efetivamente adequadas para compreender e solucionar o problema da diversidade social e cultural Nisto reside o paradoxo e o desafio de nossas praacuteticas e propostas educativas Nelas o que estaacute em jogo mais que as diferenccedilas e a imensa diversidade que nos informa eacute a alteridade - espaccedilo permanente de enfrentamento tensatildeo e complementariedade Nestaacute medida a escola mais que um espaccedilo de socializaccedilatildeo toma-se um espaccedilo de sociabilidades ou seja um espaccedilo de encontros e desencontros de buscas e de perdas de descobertas e de encobrimentos de vida e de negaccedilatildeo da vida A escola por essa perspectiva eacute antes de mais nada um espaccedilo soacutecio-cultural

Analisar a escola como espaccedilo soacutecio-cultural significa compreendecirc-la na

oacutetica da cultura sob um olhar mais denso que leva em conta a dimensatildeo

do dinamismo do fazer cotidiano levado a efeito por homens e mulheres

trabalhadores e trabalhadoras negros e brancos adultos e adolescentes

enfim alunos e professores seres humanos concretos sujeitos sociais e

histoacutericos presentes na histoacuteria atores da histoacuteria Falar da escola como

espaccedilo soacutecio-cultural implica em resgatar o papel dos sujeitos na trama

social que a constitui enquanto instituiccedilatildeo [ ] A escola como espaccedilo

soacutecio-cultural eacute entendida portanto como um espaccedilo social proacuteprio

ordenado em dupla dimensatildeo Institucionalmente por um conjunto de

normas e de regras que buscam unificar e delimitar a accedilatildeo de seus

sujeitos Cotidianamente por uma complexa trama de relaccedilotildees sociais

entre sujeitos envolvidos que incluem alianccedilas e conflitos imposiccedilotildees

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5n2 p9middot28 juldez 2000

de normas e estrateacutegias individuais ou coletivas de transgressatildeo e de acordos Um processo de apropriaccedilatildeo constante dos espaccedilos das normas das praacuteticas e dos saberes que datildeo forma agrave vida escolar Fruto da accedilatildeo reciacuteproca entre o sujeito e a instituiccedilatildeo esse processo como tal eacute heterogecircneo(Dayrell op cit p 136-137)

A heterogeneidade poreacutem encontra-se institucionalmente negada como negada estaacute a condiccedilatildeo soacutecio-cultural dos alunos na

medida que a escola pratica o ensino e nega a aprendizagem Isto eacute a escola organiza os processos de compreensatildeo da realidade como universal e uacutenica tomando por base um saber formal e abstrato distanciado do aluno de sua vida e experiecircncia O saber que se ensina eacute entatildeo redutor de culturas que informam as realidades vividas dos sujeitos e desloca suas vidas das problemaacuteticas imediatas que as envolve acreditando que o aluno eacute uma taacutebula rasa sobre a qual deve-se inscrever o conhecimento tido como real e legiacutetimo Assim a escola representa um saber positivista perante um saber cultural (lturra 1990 p55)

Eacute aqui que a pluralidade cultural de grupos eacutetnicos sociais ou culturais necessita ser pensada como mateacuteria-prima da aprendizagem poreacutem nunca como conteuacutedo de dias especiais datas comemorativas ou momentos determinados em sala de aula Fazer isso eacute congelar a cultura reificaacute-Ia transformaacute-Ia em recurso de folclorizaccedilatildeo e como tal acentuar as diferenccedilas Nesse processo rompe-se a possibilidade de comunicaccedilatildeo e de aprendizagem para reforccedilar os mecanismos discriminatoacuterios e a desigualdade instaurando a impossibilidade da troca e dos processos de equumlidade entre sujeitos diferentes Eacute preciso

I compreender que o ensino eacute repetir criando uma subordinaccedilatildeo a r aprendizagem eacute descobrir criando uma relaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo (lturra 1990 p 31)

Para Santos (1989) a questatildeo estaacute no fato de haver um mecanismo que separa a educaccedilatildeo do ensino e nisto reside a esquizofrenia da escola brasileira Diz ele

Educaccedilatildeo seria tudo o que se transmite de qualquer maneira formal ou informalmente todo o tempo aos menos experientes sem objetivos

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28juldez 2000 19

especiacuteficos Ensino seria uma particularizaccedilatildeo da educaccedilatildeo atraveacutes de

determinada maneira (isto eacute utilizando a escola) formal ou

informalmente num tempo exclusivo com o objetivo especiacutefico de treinar

uma competecircncia particular Pois bem eacute evidente que natildeo se pode colocar

as pessoas que educam rio lugar das que ensinam Estamos condenados a

lamentar essa contradiccedilatildeo para sempre (op cit p 28)

Os que ensinam preocupam-se em utilizando a escola e sua organizaccedilatildeo num dado tempo treinar seus alunos para competecircncias especiacuteficas somar dividir contar ler escrever Imaginam ser esse o caminho legitimo de tomando seus alunos como iguais instaurar um processo democraacutetico jaacute que todos aprendem as mesmas coisas tecircm acesso as mesmas informaccedilotildees ainda que possam ser portadores de outras informaccedilotildees aiacute natildeo consideradas Para esse professor a diversidade do social tatildeo difiacutecil de ser tratada fonte de tantos desencontros seria finalmente erradicada e as trajetoacuterias diferenciadas de seus alunos resultariam de competecircncias individuais que independe dele proacuteprio enquanto professor Aleacutem de um engano tal postura eacute um equiacutevoco e resulta em uma praacutetica autoritaacuteria constituindo um olhar que natildeo vecirc o outro que aiacute estaacute pois o vecirc de cima e distante

~ I

TONUCCI (1973) A crianccedila aquela que eacute sempre vista de cima

20 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

o desafio que permanece eacute entatildeo compreender a educaccedilatildeo enquanto processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca permanente entre diferentes Como fazecirc-lo se como dizem Moyseacutes e Collares (apud Quinteiro 2000 p 31) eacute comum no discurso 1shydos professores o argumento de que as crianccedilas natildeo aprendem porque satildeo pobres sujas desnutridas imaturas negras nordestinas natildeo aprendem porque seus pais satildeo analfabetos alcooacutelatras e as matildees trabalham fora

Para Sarmento amp Pinto (1997 p 26) eacute preciso que o adulto natildeo projete o seu olhar sobre as crianccedilas colhendo junto delas apenas aquilo que eacute reflexo conjunto dos seus proacuteprios preconceitos e representaccedilotildees

Neste sentido agrave guisa de reflexatildeo alguns exemplos de como o aluno da Rede Puacuteblica de Ensino do Rio de Janeiro eacute visto por alguns de seus professores satildeo significativos De acordo com Quinteiro (2000) dizem eles

bull esse garoto eacute uma praga mesmo eacute uma dessas criaturas que Deus produziu num dia que estava puto Soacute podia ser da turma da farrulia Adams

bull natildeo prestam para nada satildeo faltosos graccedilas a Deus fazem revezamento Aquelas alunas satildeo uns estrupiacutecios morreram e se esqueceram de deitar

bull turma antipaacutetica nunca estatildeo dispostos a nada [ ] Eles natildeo existem para mim As vezes eu me pergunto se morri desencamei e vim parar no inferno dessa turma

bull o aluno eacute um ser mutante Acho-os feios assustadores natildeo conseguem entender nada

bull tem um menino na minha sala que vive rindo e eu pergunto para ele que caboclo vocecirc estaacute recebendo E ele continua

rindo parece um orangotango

~ A pergunta eacute qual o preparo desses professores para estabelecer um processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca

I Como no cotidiano superar a discriminaccedilatildeo e a exclusatildeo social presentes no contexto social e intensamente reproduzido na escola

r Revista Mediaccedilatildees Londrina v5 n2 p9middot28 judez2000 21

22

Do aprender aaprender aprendizagem ediferenccedila

o caraacuteter ideoloacutegico das representaccedilotildees sobre a crianccedila alunos do ensino fundamental tanto quanto uma concepccedilatildeo idiacutelica e idealista da crianccedila segundo Quinteiro (2000) influencia e caracteriza a praacutetica pedagoacutegica Para a autora isto exige romper com a cultura oficial mudar mentalidade em direccedilatildeo agrave uma consciecircncia de classe para que a professoraprofessor possa compreender-se enquanto ser social que supere o senso comum e concomitantemente altere tanto as suas relaccedilotildees de trabalho quanto as condiccedilotildees objetivas da praacutetica educativa (op cit p 91) Mas para isso eacute preciso saber ouvir e se dispor a ouvir o que seu aluno tem a dizer a respeito de si mesmo e do outro que com ele

partilha a vida partilha o dia-a-dia incluindo O proacuteprio professor Poreacutem

isso natildeo eacute nada simples daiacute a surpresa do aluno das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista ao descobrir que seu professor o ouve Diz ele

Minha professora eacute diferente ela me escuta natildeo me ignora trata todo

mundo igual natildeo trata melhor do que o outro (In Quinteiro 2000)

Na tentativa de ouvir as vozes do outro as falas que se seguem satildeo falas de crianccedilas e jovens que chegam a escola puacuteblica portando marcas sociais inscritas no corpo postura linguagem percepccedilatildeo de mundo e de realidade e que de acordo com elas resignificam o mundo escolar atraveacutes dessas relaccedilotildees trazendo assim para dentro dos muros da instituiccedilatildeo aquilo que constantemente lhes eacute negado suas histoacuterias sua cultura e seus mundos (Dayrell 1996 p138)

o que dizem e como pensam os alunos das escolas puacuteblicas do Rio de Janeiro Quinteiro (2000) ressalta

bull de longe a escola parece um presiacutedio bull (gostaria) de jogar uma bomba e explodir tudo bull completava todos os tempos vagos com diversas coisas ateacute

lazer para os alunos porque a gente natildeo tem isso na escola bull pintava a escola ajeitava as janelas e fazia uma quadra de esportes

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 2: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

Durante muito tempo na minha vida eu comecei a ter vergonha de mim

mesmo de minha origem das minhas tradiccedilotildees do meu povo ateacute mesmo de meus pais Mas depois eu aprendi que sem eles eu nunca seria nada

eu nunca seria um branco vamos dizer assim um branco no sentido de

pessoa da cidade porque eu nasci iacutendio Tereno e tambeacutem morrerei um

Terena Entatildeo com esses princiacutepios eu procurei trabalhar a minha

fonnaccedilatildeo de coacutedigo indiacutegena Ao mesmo tempo eu procurei mostrar

pra sociedade envolvente que de fato por exemplo de natildeo estar com

orelha furada de natildeo estar usando o beiccedilo de pau de natildeo estar usando

cabelo comprido natildeo significava que eu tinha deixado de ser iacutendio mas

sim que as caracteriacutesticas de meu povo eram um princiacutepio proacuteprio de meu povo e que natildeo me identifica na minha pessoa aquela generalizaccedilatildeo que eacute ser iacutendio uma coisa que na verdade natildeo existe Entatildeo eu peccedilo que

os educadores eles contribuam com a formaccedilatildeo do respeito muacutetuo

desde as crianccedilas As crianccedilas brasileiras elas tecircm uma sede muito

grande de conhecer o iacutendio mas muitas vezes os professores erram ao

afirmar que os iacutendios satildeo selvagens ou satildeo preguiccedilosos criando um

preconceito estabelecido no proacuteprio aprendizado do professor na

formaccedilatildeo do professor(Terena 1996)

Dinei Matos - uA Tribuna

Por outro lado num exerciacutecio imaginaacuterio um professor eacute convidado a pensar num seu aluno negro ou preto como frequumlentemente dizemos Imediatamente sem qualquer duacutevida pensa

10 Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

logo no Sebastiatildeo Segundo o professor o Sebastiatildeo eacute negro porque tem traccedilos negroacuteides acentuados eacute escuro tem cabelo ruim nariz chato E negro porque tambeacutem descende de escravos embora ele professor natildeo tenha disso a imediata percepccedilatildeo Por outro lado aleacutem da cor da pele e de seus traccedilos Sebastiatildeo eacute pobre e carrega consigo a imagem de pobre e tudo que vem com ela (Adaptado de Santos 1989)

J-

Quem satildeo os sujeitos envolvidos nestas duas pequenas histoacuterias Satildeo os considerados outros ou seja os diferentes porque iacutendio

e negro diferentes do modelo socialmente instituiacutedo por um paiacutes que se r pensa branco de origem europeacuteia embora como bem mostra Tarsila natildeo seja essa a nossa realidade Eacute verdade que reconhecemos a presenccedila do iacutendio e do africano em nossa formaccedilatildeo mas quando contamos a nossa histoacuteria ficam eles esmaecidos ou ausentes dada a magnitude do branco

Com isso tais histoacuterias nos dizem muitas coisas primeiro nos lembram aqueles que satildeo vistos como diferentes dizem de um contexto escolar e de educaccedilatildeo dizem tambeacutem de aspectos proacuteprios desse contexto ou seja o processo educativo e a relaccedilatildeo professor-aluno

No entanto o que eacute dito natildeo se reduz apenas a esses fatos Tais histoacuterias nos revelam aspectos mais complexos que nos envolvem Assim falam de como se daacute o processo de formaccedilatildeo de imagens no contexto social e histoacuterico em que vivemos o iacutendio como selvagem ou preguiccediloso o negro como indolente e bom de samba a mulata como sensual a crianccedila como pureza etc Falam de como essas imagens criadas

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez2000 11

12

transitam por nossa mente e por nossas vidas e nesta medida acarreshytam consequumlecircncias sobre o que eacute vivido por noacutes

Portanto a fala de Marcos Terena faz sentido eacute necessaacuterio recuperar e ensinar agraves crianccedilas o respeito muacutetuo entre diferentes tanto como eacute preciso fazer ver ao professor as introjeccedilotildees da sociedade em sua percepccedilatildeo

de mundo e com isso resgatar a histoacuteria de Sebastiatildeo As duas histoacuterias nos conduzem a reverter o pensamento escrutinaacute-lo em seus elementos para entatildeo compreender os muitos significados em jogo

A partir de Tarsila de Marcos e Sebastiatildeo compreendemos ainda a pluralidade social cultural e eacutetnica que envolve a realidade brasileira e a escola Mais que tudo suas histoacutellas revelam a questatildeo do outro como diferente

O que eacute ser diferente Para Brandatildeo (1986) o diferente e a diferenccedila satildeo partes da

descobelta de um sentimento que armado pelos siacutembolos da cultura nos diz que nem tudo eacute o que eu sou e nem todos satildeo como eu sou Mais que as diferenccedilas o que estaacute em jogo eacute a imensa diversidade que nos informa eacute o que nos constitui como sujeitos de uma relaccedilatildeo de alteridade

A alteridade revela-se no fato de que o que eu sou e o outro eacute natildeo se faz de modo linear e uacutenico poreacutem constitui um jogo de imagens muacuteltiplo e diverso Saber o que eu sou e o que o outro eacute depende de quem eu sou do que acredito que sou com quem vivo e por quecirc Depende tambeacutem das consideraccedilotildees que o outro tem sobre isso a respeito de si mesmo pois eacute

nesse processo que cada um se faz pessoa e sujeito membro de um grupo de uma cultura e sociedade Depende tambeacutem do lugar a partir do

qual noacutes nos olhamos Trata-se de processos decorrentes de contextos culturais que nos formam e informam deles resultando nossa compreensatildeo de mundo e nossas praacuteticas frente ao igual e ao diferente

Um poema ensinado nas escolas americanas entre o final do seacuteculo passado e o iniacutecio deste seacuteculo pode nos ajudar nessa discussatildeo I Diz o poema

Indiozinho Sioux ou Crow pequeno esquimoacute

pequeno turco ou japonecircs Vocecircs natildeo queriam ser eu2

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28 judez 2000

A qualidade do poema eacute a de indicar que nem todos satildeo iguais shynem todos satildeo como eu sou comem como eu vestem como eu andam como eu ando e falam como eu falo A escola ensinava entatildeo que havia diferenccedilas no mundo dos homens e que nem tudo era igual

No entanto o mesmo verso revela tambeacutem alguns pontos fundamentais da criacutetica antropoloacutegica sobre as formas de compreensatildeo de si e do outro que constituem a identidade social e cultural de um povo de um grupo de uma cultura ou sociedade

Em primeiro lugar em qualquer parte do mundo os povos indiacutegenas satildeo sioux crow kamayuraacute xokleng guarani avaacute ou outros mas natildeo satildeo iacutendios categoria inventada pelos brancos para desrespeitando as especificidades de cada grupo colocaacute-los a todos no mesmo saco - Indiozinhos sioux ou crow - isto eacute tanto faz satildeo iacutendios para os brancos Desconsidera-se aiacute o que satildeo de fato e o que pensam sobre si mesmos como resultado de uma histoacuteria singular de grupo que tem suas proacuteprias marcas e portam significaos sentidos e visatildeo de mundo uacutenicos Desconsidera-se aquilo que os fazem serem quem satildeo Chamaacute-los de iacutendios indistintamente eacute negar-lhes o que de mais interior os habita e dizem deles por aquilo que satildeo kamayuraacutes kadiweu ticuna etc Ou como os esquimoacutes - nome tambeacutem forjado pelo branco dominador - que reagem dizendo natildeo somos esquimoacutes somos Inuits que quer dizer homens verdadeiros Certamente os turcos natildeo satildeo simplesmente turcos e tampouco se pode afirmar que exista um uacutenico modo de se ser japonecircs Como entatildeo explicar o verso fmal Vocecircs natildeo queriam ser eu

O que estaacute em jogo eacute a diferenccedila do outro e sua identidade que exige que se abdique daquilo que se eacute para assumir a identidade do eu como modelo a ser imitado O eu nesse caso eacute o branco ocidental cristatildeo medida de todas as coisas e como tal superior A histoacuteria dos homens eacute feita num jogo de imagens expressas num espelho de muitos acircngulos em que a diversidade se mostra em seus muitos significados e permanentemente nos desafia pois tem por base o fato de que a relaccedilatildeo entre o eu e o outro eacute sempre conflitiva e marcada por instacircncias diferenciadas de poder Um poder de duplo semblante (cf Clastres 1982) isto eacute um poder e uma submissatildeo que impedem a eclosatildeo de relaccedilotildees de liberdade entre iguais Tem sido assim entre os considerados

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28juldez2000 13

14

diferentes - loucos iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Eacute assim que o diferente precisa ser feito um igual como diz Brandatildeo (1986) para melhor ser dominado A questatildeo da identidade do eu portanto passa pelo mundo onde estou pertenccedilo e vivo mas soacute eacute objeto de meu pensar enquanto uma questatildeo um problema quando me defronto com o outro diferente de mim e aiacute me pergunto quem sou

A identidade e a alteridade revelam portanto que o outro natildeo eacute inexistente e estrangeiro distante de noacutes e daquilo que constitui nosso mundo O que a alteridade diz eacute que o outro existe e estaacute no nosso mundo como noacutes estamos no dele Eacute esse encontro que nos desafia e exige nossa definiccedilatildeo O eu e o outro enquanto noacutes eacute parte de um contexto relacional marcado antes de mais nada por relaccedilotildees de hierarquia e poder Como entatildeo fazer do outro um mesmo transitar pelo seu mundo e ele no nosso sem confronto sem conflitos sem fazer dele um igual para melhor submetecirc-lo Como conviver com as diferenccedilas e estabelecer relaccedilotildees solidaacuterias e de equumlidade entre sujeitos diferentes Estes satildeo os desafios permanentes da educaccedilatildeo e da escola

Diversidade educaccedilatildeo eescola

A diversidade nos espelha como parte das relaccedilotildees de poder e nos envolve em todas as dimensotildees da vida vivida no nosso cotidiano e ateacute mesmo ali onde sequer suspeitamos de sua existecircncia Com isso vale perceber que

Nos planos econocircmico social poliacutetico e das relaccedilotildees pessoais

diferenccedila tem significado em nosso paiacutes quase sempre de

desigualdade ou mais exatamente as diferenccedilas eacutetnicas culturais

fenotiacutepicas serviram de marcas entre desiguais sociais No plano da

cultura poreacutem a aplicaccedilatildeo dessa equumlivalecircncia (diferenccedila=desigualdade)

confunde os partidaacuterios da democracia levando-os a postular o fim

das diferenccedilas como garantia de igualdade Eis o que pensaria um

democrata bem intencionado nossos alunos seratildeo iguais a noacutes quando

natildeo forem diferentes (Santos 1989 p26) (grifo nosso)

Revista MediaccedilotildeesLondrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

A questatildeo eacute seraacute esse o caminho Ser diferente eacute ser desigual E tornar todos iguais negando suas diferenccedilas natildeo seria um ato autoritaacuterio negador do outro e como tal um ato de poder

Tonuccl

~OtildeOtildemiddot C ~

)11 ((((

Oacute lwAacutevivO ~

111 Ccedil0 Arn-1 fPNNi~

~a~Saacute~ i ItalnI4t

$I Aavaliaco

o que este cartum nos diz Que mesmo no micro contexto da relaccedilatildeo de poder entre

professor-aluno o problema natildeo estaacute na diferenccedila mas na des-igualdade como diz Vargas (1989 pAO) citando Dumont que supotildee uma igualdade de fundo aquela que reflete a minha imagem no espelho seja essa imagem a do professor ou ainda daqueles que detecircm o poder O eu eacute assim aquele que soacute aceita os que considera igualou mais proacuteximo de sua proacutepria imagem Portanto natildeo eacute a diferenccedila que pertence ao donuacutenio da desigualdade ( ) mas ao contraacuterio eacute porque pensamos pelo donuacutenio da semelhanccedila e da identidade que hierarquizamos o diferente e o tratamos como desigual

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28 juldez 2000 15

16

Neste sentido como diz Stolcke (1993 p28) compreendemos que igualdade e diferenccedila natildeo satildeo categorias absolutas - dependem das relaccedilotildees em jogo para definir o igua1 e o diferente e assim num processo de poder e dominaccedilatildeo gerar a marginalizaccedilatildeo e a exclusatildeo

Aqui a questatildeo da escola se coloca por inteiro em sua complexidade e se defronta com seu maior problema o fracasso diante da diversidade que nos constitui Nesta medida entra em debate o que se entende por cultura e como ela eacute pensada e compreendida no interior de projetos educativos e na praacutetica cotidiana

Antes de mais nada a cultura no interior de uma realidade humana eacute sempre dinacircmica natildeo eacute fechada ou cristalizada como um patrimocircnio de raiacutezes fixas e permanentes A cultura possui fronteiras moacuteveis e em constante expansatildeo Tampouco eacute conjugada no singular posto que eacute plural marcada por intensas trocas e muitas contradiccedilotildees nas relaccedilotildees entre grupos culturais di versos e mesmo no interior de um mesmo grupo Por esse motivo natildeo eacute possiacutevel reduzir nem os grupos nem os indiviacuteduos agrave sua cultura como diz Augeacute (1998 pl15) Do mesmo modo natildeo se pode afirmar existir uma essecircncia proacutepria desta ou daquela cultura jaacute que satildeo as sociedades que decretam a cultura e natildeo satildeo as culturas que formam as sociedades (Cunha 1998 p88)

O desafio da escola e dos projetos educativos que orientam nossa praacutetica estaacute no fato de que para compreender a cultura de um grupo ou de um indiviacuteduo que dela faz parte eacute necessaacuterio olhar a sociedaccedille onde o grupo ou o indiviacuteduo estatildeo e vivem Eacute aqui que as diferenccedilas ganham sentido e expressatildeo como realidade e definem o papel da alteridade nas relaccedilotildees sociais entre os homens

Primeiramente fazemos parte de uma sociedade de classes em que as relaccedilotildees sociais entre sujeitos satildeo relaccedilotildees de hierarquia e poder que se sustentam em classificaccedilotildees dadas a priori e naturalizadas como proacuteprias deste ou daquele grupo - Sebastiatildeo eacute negro porque tem nariz chato e cabelo ruim os iacutendios satildeo selvagens ou preguiccedilosos O pedido de Marcos Terena aos professores se justifica pois a escola tem sido o veiacuteculo de projeccedilatildeo de padrotildees e modelos que impedem o verdadeiro conhecimento privilegiando um conhecimento dado e assimilado pela ordem institucional nem sempre percebido pelos agentes sociais que conduzem o processo educativo Eacute assim que muitas vezes a dificuldade

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28juldez 2000

de aprender eacute explicada pelo fato de se ser paraibano nordestino favelado vesgo canhoto filho de prostituta (Santos 1989 p73)

Educar eacute entatildeo um desafio posto que se processa no interior de um embate entre interesses dominaccedilatildeo exploraccedilatildeo revelando a existecircncia do poder e seu exerciacutecio sobre os indiviacuteduos grupos ou

sociedades tidos como diferentes Educar tem sido o meio pelo qual o

diferente deve ser transformado em igual para que se possa submeter dominar e explorar em nome de um modelo cultural que se acredita natural universal e humano (Gusmatildeo op cit 43)

No campo de forccedila que envolve as relaccedilotildees da escola frente aos diferentes e frente agrave diferenccedila cultural proacutepria da sociedade brasileira J oel Rufino dos Santos afirma existir uma imensa ingenuidade Para ele eacute ingecircnuo pensar em salvar o ensino a partir de uma falsa noccedilatildeo de igualdade que desconsidera e faz taacutebula rasa das diferenccedilas

Exemplar eacute a reaccedilatildeo de professores e dirigentes de escola quando indagados sobre as diferenccedilas do alunado Eacute frequumlente se ouvir que naquela escola todos satildeo iguais e que aos olhos do educador natildeo haacute

diferenccedila No entanto todos sabemos que essa igualdade natildeo eacute real Os

alunos que ali estatildeo tecircm as mais diferentes origens satildeo portadores de

diferentes histoacuterias de vida as quais informam seu modo de ser e suas possibilidades de aprender Por que entatildeo os dizemos iguais Porque todos satildeo vistos a partir do lugar que ocupam no interior da escola Ali eles satildeo alunos categoria geral e abstrata que tal como a categoria iacutendio coloca a todos no mesmo saco e nega as diferenccedilas que os tomam cada um sujeitos soacutecio-culturais Diante da pergunta de quem satildeo os jovens e o que vatildeo buscar na escola Dayrell (1996 p139) afirma que

Para grande parte dos professores perguntas como estas natildeo fazem muito sentido pois a resposta eacute oacutebvia satildeo alunos E eacute essa categoria que vai informar seu olhar e as relaccedilotildees que manteacutem com os jovens a compreensatildeo de suas atitudes e expectativas Assim independente do

sexo idade da origem social das expectativas vivenciadas todos satildeo

considerados igualmente alunos procuram a escola com as mesmas expectativas e necessidades ( ) A homogeneizaccedilatildeo dos sujeitos como alunos corresponde agrave homogeneizaccedilatildeo da instituiccedilatildeo escolar compreendida como universal

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000 17

18

Por outro lado diz Ioel Rufino dos Santos eacute ingenuidade tambeacutem pensar em salvar o ensino pura e simplesmente pelo reconhecimento das diferenccedilas culturais Fazecirc-lo eacute reificar a cultura como se as diferenccedilas pudessem ser contidas e explicadas por si mesmas por uma essecircncia proacutepria que afirma que cada um eacute um que se eacute assim por causa da cultura

oprocesso educativo entre oensinar e o aprender

Nem a igualdade absoluta nem a diferenccedila relativa satildeo efetivamente adequadas para compreender e solucionar o problema da diversidade social e cultural Nisto reside o paradoxo e o desafio de nossas praacuteticas e propostas educativas Nelas o que estaacute em jogo mais que as diferenccedilas e a imensa diversidade que nos informa eacute a alteridade - espaccedilo permanente de enfrentamento tensatildeo e complementariedade Nestaacute medida a escola mais que um espaccedilo de socializaccedilatildeo toma-se um espaccedilo de sociabilidades ou seja um espaccedilo de encontros e desencontros de buscas e de perdas de descobertas e de encobrimentos de vida e de negaccedilatildeo da vida A escola por essa perspectiva eacute antes de mais nada um espaccedilo soacutecio-cultural

Analisar a escola como espaccedilo soacutecio-cultural significa compreendecirc-la na

oacutetica da cultura sob um olhar mais denso que leva em conta a dimensatildeo

do dinamismo do fazer cotidiano levado a efeito por homens e mulheres

trabalhadores e trabalhadoras negros e brancos adultos e adolescentes

enfim alunos e professores seres humanos concretos sujeitos sociais e

histoacutericos presentes na histoacuteria atores da histoacuteria Falar da escola como

espaccedilo soacutecio-cultural implica em resgatar o papel dos sujeitos na trama

social que a constitui enquanto instituiccedilatildeo [ ] A escola como espaccedilo

soacutecio-cultural eacute entendida portanto como um espaccedilo social proacuteprio

ordenado em dupla dimensatildeo Institucionalmente por um conjunto de

normas e de regras que buscam unificar e delimitar a accedilatildeo de seus

sujeitos Cotidianamente por uma complexa trama de relaccedilotildees sociais

entre sujeitos envolvidos que incluem alianccedilas e conflitos imposiccedilotildees

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5n2 p9middot28 juldez 2000

de normas e estrateacutegias individuais ou coletivas de transgressatildeo e de acordos Um processo de apropriaccedilatildeo constante dos espaccedilos das normas das praacuteticas e dos saberes que datildeo forma agrave vida escolar Fruto da accedilatildeo reciacuteproca entre o sujeito e a instituiccedilatildeo esse processo como tal eacute heterogecircneo(Dayrell op cit p 136-137)

A heterogeneidade poreacutem encontra-se institucionalmente negada como negada estaacute a condiccedilatildeo soacutecio-cultural dos alunos na

medida que a escola pratica o ensino e nega a aprendizagem Isto eacute a escola organiza os processos de compreensatildeo da realidade como universal e uacutenica tomando por base um saber formal e abstrato distanciado do aluno de sua vida e experiecircncia O saber que se ensina eacute entatildeo redutor de culturas que informam as realidades vividas dos sujeitos e desloca suas vidas das problemaacuteticas imediatas que as envolve acreditando que o aluno eacute uma taacutebula rasa sobre a qual deve-se inscrever o conhecimento tido como real e legiacutetimo Assim a escola representa um saber positivista perante um saber cultural (lturra 1990 p55)

Eacute aqui que a pluralidade cultural de grupos eacutetnicos sociais ou culturais necessita ser pensada como mateacuteria-prima da aprendizagem poreacutem nunca como conteuacutedo de dias especiais datas comemorativas ou momentos determinados em sala de aula Fazer isso eacute congelar a cultura reificaacute-Ia transformaacute-Ia em recurso de folclorizaccedilatildeo e como tal acentuar as diferenccedilas Nesse processo rompe-se a possibilidade de comunicaccedilatildeo e de aprendizagem para reforccedilar os mecanismos discriminatoacuterios e a desigualdade instaurando a impossibilidade da troca e dos processos de equumlidade entre sujeitos diferentes Eacute preciso

I compreender que o ensino eacute repetir criando uma subordinaccedilatildeo a r aprendizagem eacute descobrir criando uma relaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo (lturra 1990 p 31)

Para Santos (1989) a questatildeo estaacute no fato de haver um mecanismo que separa a educaccedilatildeo do ensino e nisto reside a esquizofrenia da escola brasileira Diz ele

Educaccedilatildeo seria tudo o que se transmite de qualquer maneira formal ou informalmente todo o tempo aos menos experientes sem objetivos

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28juldez 2000 19

especiacuteficos Ensino seria uma particularizaccedilatildeo da educaccedilatildeo atraveacutes de

determinada maneira (isto eacute utilizando a escola) formal ou

informalmente num tempo exclusivo com o objetivo especiacutefico de treinar

uma competecircncia particular Pois bem eacute evidente que natildeo se pode colocar

as pessoas que educam rio lugar das que ensinam Estamos condenados a

lamentar essa contradiccedilatildeo para sempre (op cit p 28)

Os que ensinam preocupam-se em utilizando a escola e sua organizaccedilatildeo num dado tempo treinar seus alunos para competecircncias especiacuteficas somar dividir contar ler escrever Imaginam ser esse o caminho legitimo de tomando seus alunos como iguais instaurar um processo democraacutetico jaacute que todos aprendem as mesmas coisas tecircm acesso as mesmas informaccedilotildees ainda que possam ser portadores de outras informaccedilotildees aiacute natildeo consideradas Para esse professor a diversidade do social tatildeo difiacutecil de ser tratada fonte de tantos desencontros seria finalmente erradicada e as trajetoacuterias diferenciadas de seus alunos resultariam de competecircncias individuais que independe dele proacuteprio enquanto professor Aleacutem de um engano tal postura eacute um equiacutevoco e resulta em uma praacutetica autoritaacuteria constituindo um olhar que natildeo vecirc o outro que aiacute estaacute pois o vecirc de cima e distante

~ I

TONUCCI (1973) A crianccedila aquela que eacute sempre vista de cima

20 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

o desafio que permanece eacute entatildeo compreender a educaccedilatildeo enquanto processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca permanente entre diferentes Como fazecirc-lo se como dizem Moyseacutes e Collares (apud Quinteiro 2000 p 31) eacute comum no discurso 1shydos professores o argumento de que as crianccedilas natildeo aprendem porque satildeo pobres sujas desnutridas imaturas negras nordestinas natildeo aprendem porque seus pais satildeo analfabetos alcooacutelatras e as matildees trabalham fora

Para Sarmento amp Pinto (1997 p 26) eacute preciso que o adulto natildeo projete o seu olhar sobre as crianccedilas colhendo junto delas apenas aquilo que eacute reflexo conjunto dos seus proacuteprios preconceitos e representaccedilotildees

Neste sentido agrave guisa de reflexatildeo alguns exemplos de como o aluno da Rede Puacuteblica de Ensino do Rio de Janeiro eacute visto por alguns de seus professores satildeo significativos De acordo com Quinteiro (2000) dizem eles

bull esse garoto eacute uma praga mesmo eacute uma dessas criaturas que Deus produziu num dia que estava puto Soacute podia ser da turma da farrulia Adams

bull natildeo prestam para nada satildeo faltosos graccedilas a Deus fazem revezamento Aquelas alunas satildeo uns estrupiacutecios morreram e se esqueceram de deitar

bull turma antipaacutetica nunca estatildeo dispostos a nada [ ] Eles natildeo existem para mim As vezes eu me pergunto se morri desencamei e vim parar no inferno dessa turma

bull o aluno eacute um ser mutante Acho-os feios assustadores natildeo conseguem entender nada

bull tem um menino na minha sala que vive rindo e eu pergunto para ele que caboclo vocecirc estaacute recebendo E ele continua

rindo parece um orangotango

~ A pergunta eacute qual o preparo desses professores para estabelecer um processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca

I Como no cotidiano superar a discriminaccedilatildeo e a exclusatildeo social presentes no contexto social e intensamente reproduzido na escola

r Revista Mediaccedilatildees Londrina v5 n2 p9middot28 judez2000 21

22

Do aprender aaprender aprendizagem ediferenccedila

o caraacuteter ideoloacutegico das representaccedilotildees sobre a crianccedila alunos do ensino fundamental tanto quanto uma concepccedilatildeo idiacutelica e idealista da crianccedila segundo Quinteiro (2000) influencia e caracteriza a praacutetica pedagoacutegica Para a autora isto exige romper com a cultura oficial mudar mentalidade em direccedilatildeo agrave uma consciecircncia de classe para que a professoraprofessor possa compreender-se enquanto ser social que supere o senso comum e concomitantemente altere tanto as suas relaccedilotildees de trabalho quanto as condiccedilotildees objetivas da praacutetica educativa (op cit p 91) Mas para isso eacute preciso saber ouvir e se dispor a ouvir o que seu aluno tem a dizer a respeito de si mesmo e do outro que com ele

partilha a vida partilha o dia-a-dia incluindo O proacuteprio professor Poreacutem

isso natildeo eacute nada simples daiacute a surpresa do aluno das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista ao descobrir que seu professor o ouve Diz ele

Minha professora eacute diferente ela me escuta natildeo me ignora trata todo

mundo igual natildeo trata melhor do que o outro (In Quinteiro 2000)

Na tentativa de ouvir as vozes do outro as falas que se seguem satildeo falas de crianccedilas e jovens que chegam a escola puacuteblica portando marcas sociais inscritas no corpo postura linguagem percepccedilatildeo de mundo e de realidade e que de acordo com elas resignificam o mundo escolar atraveacutes dessas relaccedilotildees trazendo assim para dentro dos muros da instituiccedilatildeo aquilo que constantemente lhes eacute negado suas histoacuterias sua cultura e seus mundos (Dayrell 1996 p138)

o que dizem e como pensam os alunos das escolas puacuteblicas do Rio de Janeiro Quinteiro (2000) ressalta

bull de longe a escola parece um presiacutedio bull (gostaria) de jogar uma bomba e explodir tudo bull completava todos os tempos vagos com diversas coisas ateacute

lazer para os alunos porque a gente natildeo tem isso na escola bull pintava a escola ajeitava as janelas e fazia uma quadra de esportes

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 3: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

logo no Sebastiatildeo Segundo o professor o Sebastiatildeo eacute negro porque tem traccedilos negroacuteides acentuados eacute escuro tem cabelo ruim nariz chato E negro porque tambeacutem descende de escravos embora ele professor natildeo tenha disso a imediata percepccedilatildeo Por outro lado aleacutem da cor da pele e de seus traccedilos Sebastiatildeo eacute pobre e carrega consigo a imagem de pobre e tudo que vem com ela (Adaptado de Santos 1989)

J-

Quem satildeo os sujeitos envolvidos nestas duas pequenas histoacuterias Satildeo os considerados outros ou seja os diferentes porque iacutendio

e negro diferentes do modelo socialmente instituiacutedo por um paiacutes que se r pensa branco de origem europeacuteia embora como bem mostra Tarsila natildeo seja essa a nossa realidade Eacute verdade que reconhecemos a presenccedila do iacutendio e do africano em nossa formaccedilatildeo mas quando contamos a nossa histoacuteria ficam eles esmaecidos ou ausentes dada a magnitude do branco

Com isso tais histoacuterias nos dizem muitas coisas primeiro nos lembram aqueles que satildeo vistos como diferentes dizem de um contexto escolar e de educaccedilatildeo dizem tambeacutem de aspectos proacuteprios desse contexto ou seja o processo educativo e a relaccedilatildeo professor-aluno

No entanto o que eacute dito natildeo se reduz apenas a esses fatos Tais histoacuterias nos revelam aspectos mais complexos que nos envolvem Assim falam de como se daacute o processo de formaccedilatildeo de imagens no contexto social e histoacuterico em que vivemos o iacutendio como selvagem ou preguiccediloso o negro como indolente e bom de samba a mulata como sensual a crianccedila como pureza etc Falam de como essas imagens criadas

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez2000 11

12

transitam por nossa mente e por nossas vidas e nesta medida acarreshytam consequumlecircncias sobre o que eacute vivido por noacutes

Portanto a fala de Marcos Terena faz sentido eacute necessaacuterio recuperar e ensinar agraves crianccedilas o respeito muacutetuo entre diferentes tanto como eacute preciso fazer ver ao professor as introjeccedilotildees da sociedade em sua percepccedilatildeo

de mundo e com isso resgatar a histoacuteria de Sebastiatildeo As duas histoacuterias nos conduzem a reverter o pensamento escrutinaacute-lo em seus elementos para entatildeo compreender os muitos significados em jogo

A partir de Tarsila de Marcos e Sebastiatildeo compreendemos ainda a pluralidade social cultural e eacutetnica que envolve a realidade brasileira e a escola Mais que tudo suas histoacutellas revelam a questatildeo do outro como diferente

O que eacute ser diferente Para Brandatildeo (1986) o diferente e a diferenccedila satildeo partes da

descobelta de um sentimento que armado pelos siacutembolos da cultura nos diz que nem tudo eacute o que eu sou e nem todos satildeo como eu sou Mais que as diferenccedilas o que estaacute em jogo eacute a imensa diversidade que nos informa eacute o que nos constitui como sujeitos de uma relaccedilatildeo de alteridade

A alteridade revela-se no fato de que o que eu sou e o outro eacute natildeo se faz de modo linear e uacutenico poreacutem constitui um jogo de imagens muacuteltiplo e diverso Saber o que eu sou e o que o outro eacute depende de quem eu sou do que acredito que sou com quem vivo e por quecirc Depende tambeacutem das consideraccedilotildees que o outro tem sobre isso a respeito de si mesmo pois eacute

nesse processo que cada um se faz pessoa e sujeito membro de um grupo de uma cultura e sociedade Depende tambeacutem do lugar a partir do

qual noacutes nos olhamos Trata-se de processos decorrentes de contextos culturais que nos formam e informam deles resultando nossa compreensatildeo de mundo e nossas praacuteticas frente ao igual e ao diferente

Um poema ensinado nas escolas americanas entre o final do seacuteculo passado e o iniacutecio deste seacuteculo pode nos ajudar nessa discussatildeo I Diz o poema

Indiozinho Sioux ou Crow pequeno esquimoacute

pequeno turco ou japonecircs Vocecircs natildeo queriam ser eu2

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28 judez 2000

A qualidade do poema eacute a de indicar que nem todos satildeo iguais shynem todos satildeo como eu sou comem como eu vestem como eu andam como eu ando e falam como eu falo A escola ensinava entatildeo que havia diferenccedilas no mundo dos homens e que nem tudo era igual

No entanto o mesmo verso revela tambeacutem alguns pontos fundamentais da criacutetica antropoloacutegica sobre as formas de compreensatildeo de si e do outro que constituem a identidade social e cultural de um povo de um grupo de uma cultura ou sociedade

Em primeiro lugar em qualquer parte do mundo os povos indiacutegenas satildeo sioux crow kamayuraacute xokleng guarani avaacute ou outros mas natildeo satildeo iacutendios categoria inventada pelos brancos para desrespeitando as especificidades de cada grupo colocaacute-los a todos no mesmo saco - Indiozinhos sioux ou crow - isto eacute tanto faz satildeo iacutendios para os brancos Desconsidera-se aiacute o que satildeo de fato e o que pensam sobre si mesmos como resultado de uma histoacuteria singular de grupo que tem suas proacuteprias marcas e portam significaos sentidos e visatildeo de mundo uacutenicos Desconsidera-se aquilo que os fazem serem quem satildeo Chamaacute-los de iacutendios indistintamente eacute negar-lhes o que de mais interior os habita e dizem deles por aquilo que satildeo kamayuraacutes kadiweu ticuna etc Ou como os esquimoacutes - nome tambeacutem forjado pelo branco dominador - que reagem dizendo natildeo somos esquimoacutes somos Inuits que quer dizer homens verdadeiros Certamente os turcos natildeo satildeo simplesmente turcos e tampouco se pode afirmar que exista um uacutenico modo de se ser japonecircs Como entatildeo explicar o verso fmal Vocecircs natildeo queriam ser eu

O que estaacute em jogo eacute a diferenccedila do outro e sua identidade que exige que se abdique daquilo que se eacute para assumir a identidade do eu como modelo a ser imitado O eu nesse caso eacute o branco ocidental cristatildeo medida de todas as coisas e como tal superior A histoacuteria dos homens eacute feita num jogo de imagens expressas num espelho de muitos acircngulos em que a diversidade se mostra em seus muitos significados e permanentemente nos desafia pois tem por base o fato de que a relaccedilatildeo entre o eu e o outro eacute sempre conflitiva e marcada por instacircncias diferenciadas de poder Um poder de duplo semblante (cf Clastres 1982) isto eacute um poder e uma submissatildeo que impedem a eclosatildeo de relaccedilotildees de liberdade entre iguais Tem sido assim entre os considerados

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28juldez2000 13

14

diferentes - loucos iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Eacute assim que o diferente precisa ser feito um igual como diz Brandatildeo (1986) para melhor ser dominado A questatildeo da identidade do eu portanto passa pelo mundo onde estou pertenccedilo e vivo mas soacute eacute objeto de meu pensar enquanto uma questatildeo um problema quando me defronto com o outro diferente de mim e aiacute me pergunto quem sou

A identidade e a alteridade revelam portanto que o outro natildeo eacute inexistente e estrangeiro distante de noacutes e daquilo que constitui nosso mundo O que a alteridade diz eacute que o outro existe e estaacute no nosso mundo como noacutes estamos no dele Eacute esse encontro que nos desafia e exige nossa definiccedilatildeo O eu e o outro enquanto noacutes eacute parte de um contexto relacional marcado antes de mais nada por relaccedilotildees de hierarquia e poder Como entatildeo fazer do outro um mesmo transitar pelo seu mundo e ele no nosso sem confronto sem conflitos sem fazer dele um igual para melhor submetecirc-lo Como conviver com as diferenccedilas e estabelecer relaccedilotildees solidaacuterias e de equumlidade entre sujeitos diferentes Estes satildeo os desafios permanentes da educaccedilatildeo e da escola

Diversidade educaccedilatildeo eescola

A diversidade nos espelha como parte das relaccedilotildees de poder e nos envolve em todas as dimensotildees da vida vivida no nosso cotidiano e ateacute mesmo ali onde sequer suspeitamos de sua existecircncia Com isso vale perceber que

Nos planos econocircmico social poliacutetico e das relaccedilotildees pessoais

diferenccedila tem significado em nosso paiacutes quase sempre de

desigualdade ou mais exatamente as diferenccedilas eacutetnicas culturais

fenotiacutepicas serviram de marcas entre desiguais sociais No plano da

cultura poreacutem a aplicaccedilatildeo dessa equumlivalecircncia (diferenccedila=desigualdade)

confunde os partidaacuterios da democracia levando-os a postular o fim

das diferenccedilas como garantia de igualdade Eis o que pensaria um

democrata bem intencionado nossos alunos seratildeo iguais a noacutes quando

natildeo forem diferentes (Santos 1989 p26) (grifo nosso)

Revista MediaccedilotildeesLondrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

A questatildeo eacute seraacute esse o caminho Ser diferente eacute ser desigual E tornar todos iguais negando suas diferenccedilas natildeo seria um ato autoritaacuterio negador do outro e como tal um ato de poder

Tonuccl

~OtildeOtildemiddot C ~

)11 ((((

Oacute lwAacutevivO ~

111 Ccedil0 Arn-1 fPNNi~

~a~Saacute~ i ItalnI4t

$I Aavaliaco

o que este cartum nos diz Que mesmo no micro contexto da relaccedilatildeo de poder entre

professor-aluno o problema natildeo estaacute na diferenccedila mas na des-igualdade como diz Vargas (1989 pAO) citando Dumont que supotildee uma igualdade de fundo aquela que reflete a minha imagem no espelho seja essa imagem a do professor ou ainda daqueles que detecircm o poder O eu eacute assim aquele que soacute aceita os que considera igualou mais proacuteximo de sua proacutepria imagem Portanto natildeo eacute a diferenccedila que pertence ao donuacutenio da desigualdade ( ) mas ao contraacuterio eacute porque pensamos pelo donuacutenio da semelhanccedila e da identidade que hierarquizamos o diferente e o tratamos como desigual

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28 juldez 2000 15

16

Neste sentido como diz Stolcke (1993 p28) compreendemos que igualdade e diferenccedila natildeo satildeo categorias absolutas - dependem das relaccedilotildees em jogo para definir o igua1 e o diferente e assim num processo de poder e dominaccedilatildeo gerar a marginalizaccedilatildeo e a exclusatildeo

Aqui a questatildeo da escola se coloca por inteiro em sua complexidade e se defronta com seu maior problema o fracasso diante da diversidade que nos constitui Nesta medida entra em debate o que se entende por cultura e como ela eacute pensada e compreendida no interior de projetos educativos e na praacutetica cotidiana

Antes de mais nada a cultura no interior de uma realidade humana eacute sempre dinacircmica natildeo eacute fechada ou cristalizada como um patrimocircnio de raiacutezes fixas e permanentes A cultura possui fronteiras moacuteveis e em constante expansatildeo Tampouco eacute conjugada no singular posto que eacute plural marcada por intensas trocas e muitas contradiccedilotildees nas relaccedilotildees entre grupos culturais di versos e mesmo no interior de um mesmo grupo Por esse motivo natildeo eacute possiacutevel reduzir nem os grupos nem os indiviacuteduos agrave sua cultura como diz Augeacute (1998 pl15) Do mesmo modo natildeo se pode afirmar existir uma essecircncia proacutepria desta ou daquela cultura jaacute que satildeo as sociedades que decretam a cultura e natildeo satildeo as culturas que formam as sociedades (Cunha 1998 p88)

O desafio da escola e dos projetos educativos que orientam nossa praacutetica estaacute no fato de que para compreender a cultura de um grupo ou de um indiviacuteduo que dela faz parte eacute necessaacuterio olhar a sociedaccedille onde o grupo ou o indiviacuteduo estatildeo e vivem Eacute aqui que as diferenccedilas ganham sentido e expressatildeo como realidade e definem o papel da alteridade nas relaccedilotildees sociais entre os homens

Primeiramente fazemos parte de uma sociedade de classes em que as relaccedilotildees sociais entre sujeitos satildeo relaccedilotildees de hierarquia e poder que se sustentam em classificaccedilotildees dadas a priori e naturalizadas como proacuteprias deste ou daquele grupo - Sebastiatildeo eacute negro porque tem nariz chato e cabelo ruim os iacutendios satildeo selvagens ou preguiccedilosos O pedido de Marcos Terena aos professores se justifica pois a escola tem sido o veiacuteculo de projeccedilatildeo de padrotildees e modelos que impedem o verdadeiro conhecimento privilegiando um conhecimento dado e assimilado pela ordem institucional nem sempre percebido pelos agentes sociais que conduzem o processo educativo Eacute assim que muitas vezes a dificuldade

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28juldez 2000

de aprender eacute explicada pelo fato de se ser paraibano nordestino favelado vesgo canhoto filho de prostituta (Santos 1989 p73)

Educar eacute entatildeo um desafio posto que se processa no interior de um embate entre interesses dominaccedilatildeo exploraccedilatildeo revelando a existecircncia do poder e seu exerciacutecio sobre os indiviacuteduos grupos ou

sociedades tidos como diferentes Educar tem sido o meio pelo qual o

diferente deve ser transformado em igual para que se possa submeter dominar e explorar em nome de um modelo cultural que se acredita natural universal e humano (Gusmatildeo op cit 43)

No campo de forccedila que envolve as relaccedilotildees da escola frente aos diferentes e frente agrave diferenccedila cultural proacutepria da sociedade brasileira J oel Rufino dos Santos afirma existir uma imensa ingenuidade Para ele eacute ingecircnuo pensar em salvar o ensino a partir de uma falsa noccedilatildeo de igualdade que desconsidera e faz taacutebula rasa das diferenccedilas

Exemplar eacute a reaccedilatildeo de professores e dirigentes de escola quando indagados sobre as diferenccedilas do alunado Eacute frequumlente se ouvir que naquela escola todos satildeo iguais e que aos olhos do educador natildeo haacute

diferenccedila No entanto todos sabemos que essa igualdade natildeo eacute real Os

alunos que ali estatildeo tecircm as mais diferentes origens satildeo portadores de

diferentes histoacuterias de vida as quais informam seu modo de ser e suas possibilidades de aprender Por que entatildeo os dizemos iguais Porque todos satildeo vistos a partir do lugar que ocupam no interior da escola Ali eles satildeo alunos categoria geral e abstrata que tal como a categoria iacutendio coloca a todos no mesmo saco e nega as diferenccedilas que os tomam cada um sujeitos soacutecio-culturais Diante da pergunta de quem satildeo os jovens e o que vatildeo buscar na escola Dayrell (1996 p139) afirma que

Para grande parte dos professores perguntas como estas natildeo fazem muito sentido pois a resposta eacute oacutebvia satildeo alunos E eacute essa categoria que vai informar seu olhar e as relaccedilotildees que manteacutem com os jovens a compreensatildeo de suas atitudes e expectativas Assim independente do

sexo idade da origem social das expectativas vivenciadas todos satildeo

considerados igualmente alunos procuram a escola com as mesmas expectativas e necessidades ( ) A homogeneizaccedilatildeo dos sujeitos como alunos corresponde agrave homogeneizaccedilatildeo da instituiccedilatildeo escolar compreendida como universal

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000 17

18

Por outro lado diz Ioel Rufino dos Santos eacute ingenuidade tambeacutem pensar em salvar o ensino pura e simplesmente pelo reconhecimento das diferenccedilas culturais Fazecirc-lo eacute reificar a cultura como se as diferenccedilas pudessem ser contidas e explicadas por si mesmas por uma essecircncia proacutepria que afirma que cada um eacute um que se eacute assim por causa da cultura

oprocesso educativo entre oensinar e o aprender

Nem a igualdade absoluta nem a diferenccedila relativa satildeo efetivamente adequadas para compreender e solucionar o problema da diversidade social e cultural Nisto reside o paradoxo e o desafio de nossas praacuteticas e propostas educativas Nelas o que estaacute em jogo mais que as diferenccedilas e a imensa diversidade que nos informa eacute a alteridade - espaccedilo permanente de enfrentamento tensatildeo e complementariedade Nestaacute medida a escola mais que um espaccedilo de socializaccedilatildeo toma-se um espaccedilo de sociabilidades ou seja um espaccedilo de encontros e desencontros de buscas e de perdas de descobertas e de encobrimentos de vida e de negaccedilatildeo da vida A escola por essa perspectiva eacute antes de mais nada um espaccedilo soacutecio-cultural

Analisar a escola como espaccedilo soacutecio-cultural significa compreendecirc-la na

oacutetica da cultura sob um olhar mais denso que leva em conta a dimensatildeo

do dinamismo do fazer cotidiano levado a efeito por homens e mulheres

trabalhadores e trabalhadoras negros e brancos adultos e adolescentes

enfim alunos e professores seres humanos concretos sujeitos sociais e

histoacutericos presentes na histoacuteria atores da histoacuteria Falar da escola como

espaccedilo soacutecio-cultural implica em resgatar o papel dos sujeitos na trama

social que a constitui enquanto instituiccedilatildeo [ ] A escola como espaccedilo

soacutecio-cultural eacute entendida portanto como um espaccedilo social proacuteprio

ordenado em dupla dimensatildeo Institucionalmente por um conjunto de

normas e de regras que buscam unificar e delimitar a accedilatildeo de seus

sujeitos Cotidianamente por uma complexa trama de relaccedilotildees sociais

entre sujeitos envolvidos que incluem alianccedilas e conflitos imposiccedilotildees

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5n2 p9middot28 juldez 2000

de normas e estrateacutegias individuais ou coletivas de transgressatildeo e de acordos Um processo de apropriaccedilatildeo constante dos espaccedilos das normas das praacuteticas e dos saberes que datildeo forma agrave vida escolar Fruto da accedilatildeo reciacuteproca entre o sujeito e a instituiccedilatildeo esse processo como tal eacute heterogecircneo(Dayrell op cit p 136-137)

A heterogeneidade poreacutem encontra-se institucionalmente negada como negada estaacute a condiccedilatildeo soacutecio-cultural dos alunos na

medida que a escola pratica o ensino e nega a aprendizagem Isto eacute a escola organiza os processos de compreensatildeo da realidade como universal e uacutenica tomando por base um saber formal e abstrato distanciado do aluno de sua vida e experiecircncia O saber que se ensina eacute entatildeo redutor de culturas que informam as realidades vividas dos sujeitos e desloca suas vidas das problemaacuteticas imediatas que as envolve acreditando que o aluno eacute uma taacutebula rasa sobre a qual deve-se inscrever o conhecimento tido como real e legiacutetimo Assim a escola representa um saber positivista perante um saber cultural (lturra 1990 p55)

Eacute aqui que a pluralidade cultural de grupos eacutetnicos sociais ou culturais necessita ser pensada como mateacuteria-prima da aprendizagem poreacutem nunca como conteuacutedo de dias especiais datas comemorativas ou momentos determinados em sala de aula Fazer isso eacute congelar a cultura reificaacute-Ia transformaacute-Ia em recurso de folclorizaccedilatildeo e como tal acentuar as diferenccedilas Nesse processo rompe-se a possibilidade de comunicaccedilatildeo e de aprendizagem para reforccedilar os mecanismos discriminatoacuterios e a desigualdade instaurando a impossibilidade da troca e dos processos de equumlidade entre sujeitos diferentes Eacute preciso

I compreender que o ensino eacute repetir criando uma subordinaccedilatildeo a r aprendizagem eacute descobrir criando uma relaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo (lturra 1990 p 31)

Para Santos (1989) a questatildeo estaacute no fato de haver um mecanismo que separa a educaccedilatildeo do ensino e nisto reside a esquizofrenia da escola brasileira Diz ele

Educaccedilatildeo seria tudo o que se transmite de qualquer maneira formal ou informalmente todo o tempo aos menos experientes sem objetivos

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28juldez 2000 19

especiacuteficos Ensino seria uma particularizaccedilatildeo da educaccedilatildeo atraveacutes de

determinada maneira (isto eacute utilizando a escola) formal ou

informalmente num tempo exclusivo com o objetivo especiacutefico de treinar

uma competecircncia particular Pois bem eacute evidente que natildeo se pode colocar

as pessoas que educam rio lugar das que ensinam Estamos condenados a

lamentar essa contradiccedilatildeo para sempre (op cit p 28)

Os que ensinam preocupam-se em utilizando a escola e sua organizaccedilatildeo num dado tempo treinar seus alunos para competecircncias especiacuteficas somar dividir contar ler escrever Imaginam ser esse o caminho legitimo de tomando seus alunos como iguais instaurar um processo democraacutetico jaacute que todos aprendem as mesmas coisas tecircm acesso as mesmas informaccedilotildees ainda que possam ser portadores de outras informaccedilotildees aiacute natildeo consideradas Para esse professor a diversidade do social tatildeo difiacutecil de ser tratada fonte de tantos desencontros seria finalmente erradicada e as trajetoacuterias diferenciadas de seus alunos resultariam de competecircncias individuais que independe dele proacuteprio enquanto professor Aleacutem de um engano tal postura eacute um equiacutevoco e resulta em uma praacutetica autoritaacuteria constituindo um olhar que natildeo vecirc o outro que aiacute estaacute pois o vecirc de cima e distante

~ I

TONUCCI (1973) A crianccedila aquela que eacute sempre vista de cima

20 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

o desafio que permanece eacute entatildeo compreender a educaccedilatildeo enquanto processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca permanente entre diferentes Como fazecirc-lo se como dizem Moyseacutes e Collares (apud Quinteiro 2000 p 31) eacute comum no discurso 1shydos professores o argumento de que as crianccedilas natildeo aprendem porque satildeo pobres sujas desnutridas imaturas negras nordestinas natildeo aprendem porque seus pais satildeo analfabetos alcooacutelatras e as matildees trabalham fora

Para Sarmento amp Pinto (1997 p 26) eacute preciso que o adulto natildeo projete o seu olhar sobre as crianccedilas colhendo junto delas apenas aquilo que eacute reflexo conjunto dos seus proacuteprios preconceitos e representaccedilotildees

Neste sentido agrave guisa de reflexatildeo alguns exemplos de como o aluno da Rede Puacuteblica de Ensino do Rio de Janeiro eacute visto por alguns de seus professores satildeo significativos De acordo com Quinteiro (2000) dizem eles

bull esse garoto eacute uma praga mesmo eacute uma dessas criaturas que Deus produziu num dia que estava puto Soacute podia ser da turma da farrulia Adams

bull natildeo prestam para nada satildeo faltosos graccedilas a Deus fazem revezamento Aquelas alunas satildeo uns estrupiacutecios morreram e se esqueceram de deitar

bull turma antipaacutetica nunca estatildeo dispostos a nada [ ] Eles natildeo existem para mim As vezes eu me pergunto se morri desencamei e vim parar no inferno dessa turma

bull o aluno eacute um ser mutante Acho-os feios assustadores natildeo conseguem entender nada

bull tem um menino na minha sala que vive rindo e eu pergunto para ele que caboclo vocecirc estaacute recebendo E ele continua

rindo parece um orangotango

~ A pergunta eacute qual o preparo desses professores para estabelecer um processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca

I Como no cotidiano superar a discriminaccedilatildeo e a exclusatildeo social presentes no contexto social e intensamente reproduzido na escola

r Revista Mediaccedilatildees Londrina v5 n2 p9middot28 judez2000 21

22

Do aprender aaprender aprendizagem ediferenccedila

o caraacuteter ideoloacutegico das representaccedilotildees sobre a crianccedila alunos do ensino fundamental tanto quanto uma concepccedilatildeo idiacutelica e idealista da crianccedila segundo Quinteiro (2000) influencia e caracteriza a praacutetica pedagoacutegica Para a autora isto exige romper com a cultura oficial mudar mentalidade em direccedilatildeo agrave uma consciecircncia de classe para que a professoraprofessor possa compreender-se enquanto ser social que supere o senso comum e concomitantemente altere tanto as suas relaccedilotildees de trabalho quanto as condiccedilotildees objetivas da praacutetica educativa (op cit p 91) Mas para isso eacute preciso saber ouvir e se dispor a ouvir o que seu aluno tem a dizer a respeito de si mesmo e do outro que com ele

partilha a vida partilha o dia-a-dia incluindo O proacuteprio professor Poreacutem

isso natildeo eacute nada simples daiacute a surpresa do aluno das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista ao descobrir que seu professor o ouve Diz ele

Minha professora eacute diferente ela me escuta natildeo me ignora trata todo

mundo igual natildeo trata melhor do que o outro (In Quinteiro 2000)

Na tentativa de ouvir as vozes do outro as falas que se seguem satildeo falas de crianccedilas e jovens que chegam a escola puacuteblica portando marcas sociais inscritas no corpo postura linguagem percepccedilatildeo de mundo e de realidade e que de acordo com elas resignificam o mundo escolar atraveacutes dessas relaccedilotildees trazendo assim para dentro dos muros da instituiccedilatildeo aquilo que constantemente lhes eacute negado suas histoacuterias sua cultura e seus mundos (Dayrell 1996 p138)

o que dizem e como pensam os alunos das escolas puacuteblicas do Rio de Janeiro Quinteiro (2000) ressalta

bull de longe a escola parece um presiacutedio bull (gostaria) de jogar uma bomba e explodir tudo bull completava todos os tempos vagos com diversas coisas ateacute

lazer para os alunos porque a gente natildeo tem isso na escola bull pintava a escola ajeitava as janelas e fazia uma quadra de esportes

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 4: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

12

transitam por nossa mente e por nossas vidas e nesta medida acarreshytam consequumlecircncias sobre o que eacute vivido por noacutes

Portanto a fala de Marcos Terena faz sentido eacute necessaacuterio recuperar e ensinar agraves crianccedilas o respeito muacutetuo entre diferentes tanto como eacute preciso fazer ver ao professor as introjeccedilotildees da sociedade em sua percepccedilatildeo

de mundo e com isso resgatar a histoacuteria de Sebastiatildeo As duas histoacuterias nos conduzem a reverter o pensamento escrutinaacute-lo em seus elementos para entatildeo compreender os muitos significados em jogo

A partir de Tarsila de Marcos e Sebastiatildeo compreendemos ainda a pluralidade social cultural e eacutetnica que envolve a realidade brasileira e a escola Mais que tudo suas histoacutellas revelam a questatildeo do outro como diferente

O que eacute ser diferente Para Brandatildeo (1986) o diferente e a diferenccedila satildeo partes da

descobelta de um sentimento que armado pelos siacutembolos da cultura nos diz que nem tudo eacute o que eu sou e nem todos satildeo como eu sou Mais que as diferenccedilas o que estaacute em jogo eacute a imensa diversidade que nos informa eacute o que nos constitui como sujeitos de uma relaccedilatildeo de alteridade

A alteridade revela-se no fato de que o que eu sou e o outro eacute natildeo se faz de modo linear e uacutenico poreacutem constitui um jogo de imagens muacuteltiplo e diverso Saber o que eu sou e o que o outro eacute depende de quem eu sou do que acredito que sou com quem vivo e por quecirc Depende tambeacutem das consideraccedilotildees que o outro tem sobre isso a respeito de si mesmo pois eacute

nesse processo que cada um se faz pessoa e sujeito membro de um grupo de uma cultura e sociedade Depende tambeacutem do lugar a partir do

qual noacutes nos olhamos Trata-se de processos decorrentes de contextos culturais que nos formam e informam deles resultando nossa compreensatildeo de mundo e nossas praacuteticas frente ao igual e ao diferente

Um poema ensinado nas escolas americanas entre o final do seacuteculo passado e o iniacutecio deste seacuteculo pode nos ajudar nessa discussatildeo I Diz o poema

Indiozinho Sioux ou Crow pequeno esquimoacute

pequeno turco ou japonecircs Vocecircs natildeo queriam ser eu2

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28 judez 2000

A qualidade do poema eacute a de indicar que nem todos satildeo iguais shynem todos satildeo como eu sou comem como eu vestem como eu andam como eu ando e falam como eu falo A escola ensinava entatildeo que havia diferenccedilas no mundo dos homens e que nem tudo era igual

No entanto o mesmo verso revela tambeacutem alguns pontos fundamentais da criacutetica antropoloacutegica sobre as formas de compreensatildeo de si e do outro que constituem a identidade social e cultural de um povo de um grupo de uma cultura ou sociedade

Em primeiro lugar em qualquer parte do mundo os povos indiacutegenas satildeo sioux crow kamayuraacute xokleng guarani avaacute ou outros mas natildeo satildeo iacutendios categoria inventada pelos brancos para desrespeitando as especificidades de cada grupo colocaacute-los a todos no mesmo saco - Indiozinhos sioux ou crow - isto eacute tanto faz satildeo iacutendios para os brancos Desconsidera-se aiacute o que satildeo de fato e o que pensam sobre si mesmos como resultado de uma histoacuteria singular de grupo que tem suas proacuteprias marcas e portam significaos sentidos e visatildeo de mundo uacutenicos Desconsidera-se aquilo que os fazem serem quem satildeo Chamaacute-los de iacutendios indistintamente eacute negar-lhes o que de mais interior os habita e dizem deles por aquilo que satildeo kamayuraacutes kadiweu ticuna etc Ou como os esquimoacutes - nome tambeacutem forjado pelo branco dominador - que reagem dizendo natildeo somos esquimoacutes somos Inuits que quer dizer homens verdadeiros Certamente os turcos natildeo satildeo simplesmente turcos e tampouco se pode afirmar que exista um uacutenico modo de se ser japonecircs Como entatildeo explicar o verso fmal Vocecircs natildeo queriam ser eu

O que estaacute em jogo eacute a diferenccedila do outro e sua identidade que exige que se abdique daquilo que se eacute para assumir a identidade do eu como modelo a ser imitado O eu nesse caso eacute o branco ocidental cristatildeo medida de todas as coisas e como tal superior A histoacuteria dos homens eacute feita num jogo de imagens expressas num espelho de muitos acircngulos em que a diversidade se mostra em seus muitos significados e permanentemente nos desafia pois tem por base o fato de que a relaccedilatildeo entre o eu e o outro eacute sempre conflitiva e marcada por instacircncias diferenciadas de poder Um poder de duplo semblante (cf Clastres 1982) isto eacute um poder e uma submissatildeo que impedem a eclosatildeo de relaccedilotildees de liberdade entre iguais Tem sido assim entre os considerados

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28juldez2000 13

14

diferentes - loucos iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Eacute assim que o diferente precisa ser feito um igual como diz Brandatildeo (1986) para melhor ser dominado A questatildeo da identidade do eu portanto passa pelo mundo onde estou pertenccedilo e vivo mas soacute eacute objeto de meu pensar enquanto uma questatildeo um problema quando me defronto com o outro diferente de mim e aiacute me pergunto quem sou

A identidade e a alteridade revelam portanto que o outro natildeo eacute inexistente e estrangeiro distante de noacutes e daquilo que constitui nosso mundo O que a alteridade diz eacute que o outro existe e estaacute no nosso mundo como noacutes estamos no dele Eacute esse encontro que nos desafia e exige nossa definiccedilatildeo O eu e o outro enquanto noacutes eacute parte de um contexto relacional marcado antes de mais nada por relaccedilotildees de hierarquia e poder Como entatildeo fazer do outro um mesmo transitar pelo seu mundo e ele no nosso sem confronto sem conflitos sem fazer dele um igual para melhor submetecirc-lo Como conviver com as diferenccedilas e estabelecer relaccedilotildees solidaacuterias e de equumlidade entre sujeitos diferentes Estes satildeo os desafios permanentes da educaccedilatildeo e da escola

Diversidade educaccedilatildeo eescola

A diversidade nos espelha como parte das relaccedilotildees de poder e nos envolve em todas as dimensotildees da vida vivida no nosso cotidiano e ateacute mesmo ali onde sequer suspeitamos de sua existecircncia Com isso vale perceber que

Nos planos econocircmico social poliacutetico e das relaccedilotildees pessoais

diferenccedila tem significado em nosso paiacutes quase sempre de

desigualdade ou mais exatamente as diferenccedilas eacutetnicas culturais

fenotiacutepicas serviram de marcas entre desiguais sociais No plano da

cultura poreacutem a aplicaccedilatildeo dessa equumlivalecircncia (diferenccedila=desigualdade)

confunde os partidaacuterios da democracia levando-os a postular o fim

das diferenccedilas como garantia de igualdade Eis o que pensaria um

democrata bem intencionado nossos alunos seratildeo iguais a noacutes quando

natildeo forem diferentes (Santos 1989 p26) (grifo nosso)

Revista MediaccedilotildeesLondrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

A questatildeo eacute seraacute esse o caminho Ser diferente eacute ser desigual E tornar todos iguais negando suas diferenccedilas natildeo seria um ato autoritaacuterio negador do outro e como tal um ato de poder

Tonuccl

~OtildeOtildemiddot C ~

)11 ((((

Oacute lwAacutevivO ~

111 Ccedil0 Arn-1 fPNNi~

~a~Saacute~ i ItalnI4t

$I Aavaliaco

o que este cartum nos diz Que mesmo no micro contexto da relaccedilatildeo de poder entre

professor-aluno o problema natildeo estaacute na diferenccedila mas na des-igualdade como diz Vargas (1989 pAO) citando Dumont que supotildee uma igualdade de fundo aquela que reflete a minha imagem no espelho seja essa imagem a do professor ou ainda daqueles que detecircm o poder O eu eacute assim aquele que soacute aceita os que considera igualou mais proacuteximo de sua proacutepria imagem Portanto natildeo eacute a diferenccedila que pertence ao donuacutenio da desigualdade ( ) mas ao contraacuterio eacute porque pensamos pelo donuacutenio da semelhanccedila e da identidade que hierarquizamos o diferente e o tratamos como desigual

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28 juldez 2000 15

16

Neste sentido como diz Stolcke (1993 p28) compreendemos que igualdade e diferenccedila natildeo satildeo categorias absolutas - dependem das relaccedilotildees em jogo para definir o igua1 e o diferente e assim num processo de poder e dominaccedilatildeo gerar a marginalizaccedilatildeo e a exclusatildeo

Aqui a questatildeo da escola se coloca por inteiro em sua complexidade e se defronta com seu maior problema o fracasso diante da diversidade que nos constitui Nesta medida entra em debate o que se entende por cultura e como ela eacute pensada e compreendida no interior de projetos educativos e na praacutetica cotidiana

Antes de mais nada a cultura no interior de uma realidade humana eacute sempre dinacircmica natildeo eacute fechada ou cristalizada como um patrimocircnio de raiacutezes fixas e permanentes A cultura possui fronteiras moacuteveis e em constante expansatildeo Tampouco eacute conjugada no singular posto que eacute plural marcada por intensas trocas e muitas contradiccedilotildees nas relaccedilotildees entre grupos culturais di versos e mesmo no interior de um mesmo grupo Por esse motivo natildeo eacute possiacutevel reduzir nem os grupos nem os indiviacuteduos agrave sua cultura como diz Augeacute (1998 pl15) Do mesmo modo natildeo se pode afirmar existir uma essecircncia proacutepria desta ou daquela cultura jaacute que satildeo as sociedades que decretam a cultura e natildeo satildeo as culturas que formam as sociedades (Cunha 1998 p88)

O desafio da escola e dos projetos educativos que orientam nossa praacutetica estaacute no fato de que para compreender a cultura de um grupo ou de um indiviacuteduo que dela faz parte eacute necessaacuterio olhar a sociedaccedille onde o grupo ou o indiviacuteduo estatildeo e vivem Eacute aqui que as diferenccedilas ganham sentido e expressatildeo como realidade e definem o papel da alteridade nas relaccedilotildees sociais entre os homens

Primeiramente fazemos parte de uma sociedade de classes em que as relaccedilotildees sociais entre sujeitos satildeo relaccedilotildees de hierarquia e poder que se sustentam em classificaccedilotildees dadas a priori e naturalizadas como proacuteprias deste ou daquele grupo - Sebastiatildeo eacute negro porque tem nariz chato e cabelo ruim os iacutendios satildeo selvagens ou preguiccedilosos O pedido de Marcos Terena aos professores se justifica pois a escola tem sido o veiacuteculo de projeccedilatildeo de padrotildees e modelos que impedem o verdadeiro conhecimento privilegiando um conhecimento dado e assimilado pela ordem institucional nem sempre percebido pelos agentes sociais que conduzem o processo educativo Eacute assim que muitas vezes a dificuldade

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28juldez 2000

de aprender eacute explicada pelo fato de se ser paraibano nordestino favelado vesgo canhoto filho de prostituta (Santos 1989 p73)

Educar eacute entatildeo um desafio posto que se processa no interior de um embate entre interesses dominaccedilatildeo exploraccedilatildeo revelando a existecircncia do poder e seu exerciacutecio sobre os indiviacuteduos grupos ou

sociedades tidos como diferentes Educar tem sido o meio pelo qual o

diferente deve ser transformado em igual para que se possa submeter dominar e explorar em nome de um modelo cultural que se acredita natural universal e humano (Gusmatildeo op cit 43)

No campo de forccedila que envolve as relaccedilotildees da escola frente aos diferentes e frente agrave diferenccedila cultural proacutepria da sociedade brasileira J oel Rufino dos Santos afirma existir uma imensa ingenuidade Para ele eacute ingecircnuo pensar em salvar o ensino a partir de uma falsa noccedilatildeo de igualdade que desconsidera e faz taacutebula rasa das diferenccedilas

Exemplar eacute a reaccedilatildeo de professores e dirigentes de escola quando indagados sobre as diferenccedilas do alunado Eacute frequumlente se ouvir que naquela escola todos satildeo iguais e que aos olhos do educador natildeo haacute

diferenccedila No entanto todos sabemos que essa igualdade natildeo eacute real Os

alunos que ali estatildeo tecircm as mais diferentes origens satildeo portadores de

diferentes histoacuterias de vida as quais informam seu modo de ser e suas possibilidades de aprender Por que entatildeo os dizemos iguais Porque todos satildeo vistos a partir do lugar que ocupam no interior da escola Ali eles satildeo alunos categoria geral e abstrata que tal como a categoria iacutendio coloca a todos no mesmo saco e nega as diferenccedilas que os tomam cada um sujeitos soacutecio-culturais Diante da pergunta de quem satildeo os jovens e o que vatildeo buscar na escola Dayrell (1996 p139) afirma que

Para grande parte dos professores perguntas como estas natildeo fazem muito sentido pois a resposta eacute oacutebvia satildeo alunos E eacute essa categoria que vai informar seu olhar e as relaccedilotildees que manteacutem com os jovens a compreensatildeo de suas atitudes e expectativas Assim independente do

sexo idade da origem social das expectativas vivenciadas todos satildeo

considerados igualmente alunos procuram a escola com as mesmas expectativas e necessidades ( ) A homogeneizaccedilatildeo dos sujeitos como alunos corresponde agrave homogeneizaccedilatildeo da instituiccedilatildeo escolar compreendida como universal

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000 17

18

Por outro lado diz Ioel Rufino dos Santos eacute ingenuidade tambeacutem pensar em salvar o ensino pura e simplesmente pelo reconhecimento das diferenccedilas culturais Fazecirc-lo eacute reificar a cultura como se as diferenccedilas pudessem ser contidas e explicadas por si mesmas por uma essecircncia proacutepria que afirma que cada um eacute um que se eacute assim por causa da cultura

oprocesso educativo entre oensinar e o aprender

Nem a igualdade absoluta nem a diferenccedila relativa satildeo efetivamente adequadas para compreender e solucionar o problema da diversidade social e cultural Nisto reside o paradoxo e o desafio de nossas praacuteticas e propostas educativas Nelas o que estaacute em jogo mais que as diferenccedilas e a imensa diversidade que nos informa eacute a alteridade - espaccedilo permanente de enfrentamento tensatildeo e complementariedade Nestaacute medida a escola mais que um espaccedilo de socializaccedilatildeo toma-se um espaccedilo de sociabilidades ou seja um espaccedilo de encontros e desencontros de buscas e de perdas de descobertas e de encobrimentos de vida e de negaccedilatildeo da vida A escola por essa perspectiva eacute antes de mais nada um espaccedilo soacutecio-cultural

Analisar a escola como espaccedilo soacutecio-cultural significa compreendecirc-la na

oacutetica da cultura sob um olhar mais denso que leva em conta a dimensatildeo

do dinamismo do fazer cotidiano levado a efeito por homens e mulheres

trabalhadores e trabalhadoras negros e brancos adultos e adolescentes

enfim alunos e professores seres humanos concretos sujeitos sociais e

histoacutericos presentes na histoacuteria atores da histoacuteria Falar da escola como

espaccedilo soacutecio-cultural implica em resgatar o papel dos sujeitos na trama

social que a constitui enquanto instituiccedilatildeo [ ] A escola como espaccedilo

soacutecio-cultural eacute entendida portanto como um espaccedilo social proacuteprio

ordenado em dupla dimensatildeo Institucionalmente por um conjunto de

normas e de regras que buscam unificar e delimitar a accedilatildeo de seus

sujeitos Cotidianamente por uma complexa trama de relaccedilotildees sociais

entre sujeitos envolvidos que incluem alianccedilas e conflitos imposiccedilotildees

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5n2 p9middot28 juldez 2000

de normas e estrateacutegias individuais ou coletivas de transgressatildeo e de acordos Um processo de apropriaccedilatildeo constante dos espaccedilos das normas das praacuteticas e dos saberes que datildeo forma agrave vida escolar Fruto da accedilatildeo reciacuteproca entre o sujeito e a instituiccedilatildeo esse processo como tal eacute heterogecircneo(Dayrell op cit p 136-137)

A heterogeneidade poreacutem encontra-se institucionalmente negada como negada estaacute a condiccedilatildeo soacutecio-cultural dos alunos na

medida que a escola pratica o ensino e nega a aprendizagem Isto eacute a escola organiza os processos de compreensatildeo da realidade como universal e uacutenica tomando por base um saber formal e abstrato distanciado do aluno de sua vida e experiecircncia O saber que se ensina eacute entatildeo redutor de culturas que informam as realidades vividas dos sujeitos e desloca suas vidas das problemaacuteticas imediatas que as envolve acreditando que o aluno eacute uma taacutebula rasa sobre a qual deve-se inscrever o conhecimento tido como real e legiacutetimo Assim a escola representa um saber positivista perante um saber cultural (lturra 1990 p55)

Eacute aqui que a pluralidade cultural de grupos eacutetnicos sociais ou culturais necessita ser pensada como mateacuteria-prima da aprendizagem poreacutem nunca como conteuacutedo de dias especiais datas comemorativas ou momentos determinados em sala de aula Fazer isso eacute congelar a cultura reificaacute-Ia transformaacute-Ia em recurso de folclorizaccedilatildeo e como tal acentuar as diferenccedilas Nesse processo rompe-se a possibilidade de comunicaccedilatildeo e de aprendizagem para reforccedilar os mecanismos discriminatoacuterios e a desigualdade instaurando a impossibilidade da troca e dos processos de equumlidade entre sujeitos diferentes Eacute preciso

I compreender que o ensino eacute repetir criando uma subordinaccedilatildeo a r aprendizagem eacute descobrir criando uma relaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo (lturra 1990 p 31)

Para Santos (1989) a questatildeo estaacute no fato de haver um mecanismo que separa a educaccedilatildeo do ensino e nisto reside a esquizofrenia da escola brasileira Diz ele

Educaccedilatildeo seria tudo o que se transmite de qualquer maneira formal ou informalmente todo o tempo aos menos experientes sem objetivos

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28juldez 2000 19

especiacuteficos Ensino seria uma particularizaccedilatildeo da educaccedilatildeo atraveacutes de

determinada maneira (isto eacute utilizando a escola) formal ou

informalmente num tempo exclusivo com o objetivo especiacutefico de treinar

uma competecircncia particular Pois bem eacute evidente que natildeo se pode colocar

as pessoas que educam rio lugar das que ensinam Estamos condenados a

lamentar essa contradiccedilatildeo para sempre (op cit p 28)

Os que ensinam preocupam-se em utilizando a escola e sua organizaccedilatildeo num dado tempo treinar seus alunos para competecircncias especiacuteficas somar dividir contar ler escrever Imaginam ser esse o caminho legitimo de tomando seus alunos como iguais instaurar um processo democraacutetico jaacute que todos aprendem as mesmas coisas tecircm acesso as mesmas informaccedilotildees ainda que possam ser portadores de outras informaccedilotildees aiacute natildeo consideradas Para esse professor a diversidade do social tatildeo difiacutecil de ser tratada fonte de tantos desencontros seria finalmente erradicada e as trajetoacuterias diferenciadas de seus alunos resultariam de competecircncias individuais que independe dele proacuteprio enquanto professor Aleacutem de um engano tal postura eacute um equiacutevoco e resulta em uma praacutetica autoritaacuteria constituindo um olhar que natildeo vecirc o outro que aiacute estaacute pois o vecirc de cima e distante

~ I

TONUCCI (1973) A crianccedila aquela que eacute sempre vista de cima

20 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

o desafio que permanece eacute entatildeo compreender a educaccedilatildeo enquanto processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca permanente entre diferentes Como fazecirc-lo se como dizem Moyseacutes e Collares (apud Quinteiro 2000 p 31) eacute comum no discurso 1shydos professores o argumento de que as crianccedilas natildeo aprendem porque satildeo pobres sujas desnutridas imaturas negras nordestinas natildeo aprendem porque seus pais satildeo analfabetos alcooacutelatras e as matildees trabalham fora

Para Sarmento amp Pinto (1997 p 26) eacute preciso que o adulto natildeo projete o seu olhar sobre as crianccedilas colhendo junto delas apenas aquilo que eacute reflexo conjunto dos seus proacuteprios preconceitos e representaccedilotildees

Neste sentido agrave guisa de reflexatildeo alguns exemplos de como o aluno da Rede Puacuteblica de Ensino do Rio de Janeiro eacute visto por alguns de seus professores satildeo significativos De acordo com Quinteiro (2000) dizem eles

bull esse garoto eacute uma praga mesmo eacute uma dessas criaturas que Deus produziu num dia que estava puto Soacute podia ser da turma da farrulia Adams

bull natildeo prestam para nada satildeo faltosos graccedilas a Deus fazem revezamento Aquelas alunas satildeo uns estrupiacutecios morreram e se esqueceram de deitar

bull turma antipaacutetica nunca estatildeo dispostos a nada [ ] Eles natildeo existem para mim As vezes eu me pergunto se morri desencamei e vim parar no inferno dessa turma

bull o aluno eacute um ser mutante Acho-os feios assustadores natildeo conseguem entender nada

bull tem um menino na minha sala que vive rindo e eu pergunto para ele que caboclo vocecirc estaacute recebendo E ele continua

rindo parece um orangotango

~ A pergunta eacute qual o preparo desses professores para estabelecer um processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca

I Como no cotidiano superar a discriminaccedilatildeo e a exclusatildeo social presentes no contexto social e intensamente reproduzido na escola

r Revista Mediaccedilatildees Londrina v5 n2 p9middot28 judez2000 21

22

Do aprender aaprender aprendizagem ediferenccedila

o caraacuteter ideoloacutegico das representaccedilotildees sobre a crianccedila alunos do ensino fundamental tanto quanto uma concepccedilatildeo idiacutelica e idealista da crianccedila segundo Quinteiro (2000) influencia e caracteriza a praacutetica pedagoacutegica Para a autora isto exige romper com a cultura oficial mudar mentalidade em direccedilatildeo agrave uma consciecircncia de classe para que a professoraprofessor possa compreender-se enquanto ser social que supere o senso comum e concomitantemente altere tanto as suas relaccedilotildees de trabalho quanto as condiccedilotildees objetivas da praacutetica educativa (op cit p 91) Mas para isso eacute preciso saber ouvir e se dispor a ouvir o que seu aluno tem a dizer a respeito de si mesmo e do outro que com ele

partilha a vida partilha o dia-a-dia incluindo O proacuteprio professor Poreacutem

isso natildeo eacute nada simples daiacute a surpresa do aluno das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista ao descobrir que seu professor o ouve Diz ele

Minha professora eacute diferente ela me escuta natildeo me ignora trata todo

mundo igual natildeo trata melhor do que o outro (In Quinteiro 2000)

Na tentativa de ouvir as vozes do outro as falas que se seguem satildeo falas de crianccedilas e jovens que chegam a escola puacuteblica portando marcas sociais inscritas no corpo postura linguagem percepccedilatildeo de mundo e de realidade e que de acordo com elas resignificam o mundo escolar atraveacutes dessas relaccedilotildees trazendo assim para dentro dos muros da instituiccedilatildeo aquilo que constantemente lhes eacute negado suas histoacuterias sua cultura e seus mundos (Dayrell 1996 p138)

o que dizem e como pensam os alunos das escolas puacuteblicas do Rio de Janeiro Quinteiro (2000) ressalta

bull de longe a escola parece um presiacutedio bull (gostaria) de jogar uma bomba e explodir tudo bull completava todos os tempos vagos com diversas coisas ateacute

lazer para os alunos porque a gente natildeo tem isso na escola bull pintava a escola ajeitava as janelas e fazia uma quadra de esportes

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 5: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

A qualidade do poema eacute a de indicar que nem todos satildeo iguais shynem todos satildeo como eu sou comem como eu vestem como eu andam como eu ando e falam como eu falo A escola ensinava entatildeo que havia diferenccedilas no mundo dos homens e que nem tudo era igual

No entanto o mesmo verso revela tambeacutem alguns pontos fundamentais da criacutetica antropoloacutegica sobre as formas de compreensatildeo de si e do outro que constituem a identidade social e cultural de um povo de um grupo de uma cultura ou sociedade

Em primeiro lugar em qualquer parte do mundo os povos indiacutegenas satildeo sioux crow kamayuraacute xokleng guarani avaacute ou outros mas natildeo satildeo iacutendios categoria inventada pelos brancos para desrespeitando as especificidades de cada grupo colocaacute-los a todos no mesmo saco - Indiozinhos sioux ou crow - isto eacute tanto faz satildeo iacutendios para os brancos Desconsidera-se aiacute o que satildeo de fato e o que pensam sobre si mesmos como resultado de uma histoacuteria singular de grupo que tem suas proacuteprias marcas e portam significaos sentidos e visatildeo de mundo uacutenicos Desconsidera-se aquilo que os fazem serem quem satildeo Chamaacute-los de iacutendios indistintamente eacute negar-lhes o que de mais interior os habita e dizem deles por aquilo que satildeo kamayuraacutes kadiweu ticuna etc Ou como os esquimoacutes - nome tambeacutem forjado pelo branco dominador - que reagem dizendo natildeo somos esquimoacutes somos Inuits que quer dizer homens verdadeiros Certamente os turcos natildeo satildeo simplesmente turcos e tampouco se pode afirmar que exista um uacutenico modo de se ser japonecircs Como entatildeo explicar o verso fmal Vocecircs natildeo queriam ser eu

O que estaacute em jogo eacute a diferenccedila do outro e sua identidade que exige que se abdique daquilo que se eacute para assumir a identidade do eu como modelo a ser imitado O eu nesse caso eacute o branco ocidental cristatildeo medida de todas as coisas e como tal superior A histoacuteria dos homens eacute feita num jogo de imagens expressas num espelho de muitos acircngulos em que a diversidade se mostra em seus muitos significados e permanentemente nos desafia pois tem por base o fato de que a relaccedilatildeo entre o eu e o outro eacute sempre conflitiva e marcada por instacircncias diferenciadas de poder Um poder de duplo semblante (cf Clastres 1982) isto eacute um poder e uma submissatildeo que impedem a eclosatildeo de relaccedilotildees de liberdade entre iguais Tem sido assim entre os considerados

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28juldez2000 13

14

diferentes - loucos iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Eacute assim que o diferente precisa ser feito um igual como diz Brandatildeo (1986) para melhor ser dominado A questatildeo da identidade do eu portanto passa pelo mundo onde estou pertenccedilo e vivo mas soacute eacute objeto de meu pensar enquanto uma questatildeo um problema quando me defronto com o outro diferente de mim e aiacute me pergunto quem sou

A identidade e a alteridade revelam portanto que o outro natildeo eacute inexistente e estrangeiro distante de noacutes e daquilo que constitui nosso mundo O que a alteridade diz eacute que o outro existe e estaacute no nosso mundo como noacutes estamos no dele Eacute esse encontro que nos desafia e exige nossa definiccedilatildeo O eu e o outro enquanto noacutes eacute parte de um contexto relacional marcado antes de mais nada por relaccedilotildees de hierarquia e poder Como entatildeo fazer do outro um mesmo transitar pelo seu mundo e ele no nosso sem confronto sem conflitos sem fazer dele um igual para melhor submetecirc-lo Como conviver com as diferenccedilas e estabelecer relaccedilotildees solidaacuterias e de equumlidade entre sujeitos diferentes Estes satildeo os desafios permanentes da educaccedilatildeo e da escola

Diversidade educaccedilatildeo eescola

A diversidade nos espelha como parte das relaccedilotildees de poder e nos envolve em todas as dimensotildees da vida vivida no nosso cotidiano e ateacute mesmo ali onde sequer suspeitamos de sua existecircncia Com isso vale perceber que

Nos planos econocircmico social poliacutetico e das relaccedilotildees pessoais

diferenccedila tem significado em nosso paiacutes quase sempre de

desigualdade ou mais exatamente as diferenccedilas eacutetnicas culturais

fenotiacutepicas serviram de marcas entre desiguais sociais No plano da

cultura poreacutem a aplicaccedilatildeo dessa equumlivalecircncia (diferenccedila=desigualdade)

confunde os partidaacuterios da democracia levando-os a postular o fim

das diferenccedilas como garantia de igualdade Eis o que pensaria um

democrata bem intencionado nossos alunos seratildeo iguais a noacutes quando

natildeo forem diferentes (Santos 1989 p26) (grifo nosso)

Revista MediaccedilotildeesLondrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

A questatildeo eacute seraacute esse o caminho Ser diferente eacute ser desigual E tornar todos iguais negando suas diferenccedilas natildeo seria um ato autoritaacuterio negador do outro e como tal um ato de poder

Tonuccl

~OtildeOtildemiddot C ~

)11 ((((

Oacute lwAacutevivO ~

111 Ccedil0 Arn-1 fPNNi~

~a~Saacute~ i ItalnI4t

$I Aavaliaco

o que este cartum nos diz Que mesmo no micro contexto da relaccedilatildeo de poder entre

professor-aluno o problema natildeo estaacute na diferenccedila mas na des-igualdade como diz Vargas (1989 pAO) citando Dumont que supotildee uma igualdade de fundo aquela que reflete a minha imagem no espelho seja essa imagem a do professor ou ainda daqueles que detecircm o poder O eu eacute assim aquele que soacute aceita os que considera igualou mais proacuteximo de sua proacutepria imagem Portanto natildeo eacute a diferenccedila que pertence ao donuacutenio da desigualdade ( ) mas ao contraacuterio eacute porque pensamos pelo donuacutenio da semelhanccedila e da identidade que hierarquizamos o diferente e o tratamos como desigual

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28 juldez 2000 15

16

Neste sentido como diz Stolcke (1993 p28) compreendemos que igualdade e diferenccedila natildeo satildeo categorias absolutas - dependem das relaccedilotildees em jogo para definir o igua1 e o diferente e assim num processo de poder e dominaccedilatildeo gerar a marginalizaccedilatildeo e a exclusatildeo

Aqui a questatildeo da escola se coloca por inteiro em sua complexidade e se defronta com seu maior problema o fracasso diante da diversidade que nos constitui Nesta medida entra em debate o que se entende por cultura e como ela eacute pensada e compreendida no interior de projetos educativos e na praacutetica cotidiana

Antes de mais nada a cultura no interior de uma realidade humana eacute sempre dinacircmica natildeo eacute fechada ou cristalizada como um patrimocircnio de raiacutezes fixas e permanentes A cultura possui fronteiras moacuteveis e em constante expansatildeo Tampouco eacute conjugada no singular posto que eacute plural marcada por intensas trocas e muitas contradiccedilotildees nas relaccedilotildees entre grupos culturais di versos e mesmo no interior de um mesmo grupo Por esse motivo natildeo eacute possiacutevel reduzir nem os grupos nem os indiviacuteduos agrave sua cultura como diz Augeacute (1998 pl15) Do mesmo modo natildeo se pode afirmar existir uma essecircncia proacutepria desta ou daquela cultura jaacute que satildeo as sociedades que decretam a cultura e natildeo satildeo as culturas que formam as sociedades (Cunha 1998 p88)

O desafio da escola e dos projetos educativos que orientam nossa praacutetica estaacute no fato de que para compreender a cultura de um grupo ou de um indiviacuteduo que dela faz parte eacute necessaacuterio olhar a sociedaccedille onde o grupo ou o indiviacuteduo estatildeo e vivem Eacute aqui que as diferenccedilas ganham sentido e expressatildeo como realidade e definem o papel da alteridade nas relaccedilotildees sociais entre os homens

Primeiramente fazemos parte de uma sociedade de classes em que as relaccedilotildees sociais entre sujeitos satildeo relaccedilotildees de hierarquia e poder que se sustentam em classificaccedilotildees dadas a priori e naturalizadas como proacuteprias deste ou daquele grupo - Sebastiatildeo eacute negro porque tem nariz chato e cabelo ruim os iacutendios satildeo selvagens ou preguiccedilosos O pedido de Marcos Terena aos professores se justifica pois a escola tem sido o veiacuteculo de projeccedilatildeo de padrotildees e modelos que impedem o verdadeiro conhecimento privilegiando um conhecimento dado e assimilado pela ordem institucional nem sempre percebido pelos agentes sociais que conduzem o processo educativo Eacute assim que muitas vezes a dificuldade

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28juldez 2000

de aprender eacute explicada pelo fato de se ser paraibano nordestino favelado vesgo canhoto filho de prostituta (Santos 1989 p73)

Educar eacute entatildeo um desafio posto que se processa no interior de um embate entre interesses dominaccedilatildeo exploraccedilatildeo revelando a existecircncia do poder e seu exerciacutecio sobre os indiviacuteduos grupos ou

sociedades tidos como diferentes Educar tem sido o meio pelo qual o

diferente deve ser transformado em igual para que se possa submeter dominar e explorar em nome de um modelo cultural que se acredita natural universal e humano (Gusmatildeo op cit 43)

No campo de forccedila que envolve as relaccedilotildees da escola frente aos diferentes e frente agrave diferenccedila cultural proacutepria da sociedade brasileira J oel Rufino dos Santos afirma existir uma imensa ingenuidade Para ele eacute ingecircnuo pensar em salvar o ensino a partir de uma falsa noccedilatildeo de igualdade que desconsidera e faz taacutebula rasa das diferenccedilas

Exemplar eacute a reaccedilatildeo de professores e dirigentes de escola quando indagados sobre as diferenccedilas do alunado Eacute frequumlente se ouvir que naquela escola todos satildeo iguais e que aos olhos do educador natildeo haacute

diferenccedila No entanto todos sabemos que essa igualdade natildeo eacute real Os

alunos que ali estatildeo tecircm as mais diferentes origens satildeo portadores de

diferentes histoacuterias de vida as quais informam seu modo de ser e suas possibilidades de aprender Por que entatildeo os dizemos iguais Porque todos satildeo vistos a partir do lugar que ocupam no interior da escola Ali eles satildeo alunos categoria geral e abstrata que tal como a categoria iacutendio coloca a todos no mesmo saco e nega as diferenccedilas que os tomam cada um sujeitos soacutecio-culturais Diante da pergunta de quem satildeo os jovens e o que vatildeo buscar na escola Dayrell (1996 p139) afirma que

Para grande parte dos professores perguntas como estas natildeo fazem muito sentido pois a resposta eacute oacutebvia satildeo alunos E eacute essa categoria que vai informar seu olhar e as relaccedilotildees que manteacutem com os jovens a compreensatildeo de suas atitudes e expectativas Assim independente do

sexo idade da origem social das expectativas vivenciadas todos satildeo

considerados igualmente alunos procuram a escola com as mesmas expectativas e necessidades ( ) A homogeneizaccedilatildeo dos sujeitos como alunos corresponde agrave homogeneizaccedilatildeo da instituiccedilatildeo escolar compreendida como universal

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000 17

18

Por outro lado diz Ioel Rufino dos Santos eacute ingenuidade tambeacutem pensar em salvar o ensino pura e simplesmente pelo reconhecimento das diferenccedilas culturais Fazecirc-lo eacute reificar a cultura como se as diferenccedilas pudessem ser contidas e explicadas por si mesmas por uma essecircncia proacutepria que afirma que cada um eacute um que se eacute assim por causa da cultura

oprocesso educativo entre oensinar e o aprender

Nem a igualdade absoluta nem a diferenccedila relativa satildeo efetivamente adequadas para compreender e solucionar o problema da diversidade social e cultural Nisto reside o paradoxo e o desafio de nossas praacuteticas e propostas educativas Nelas o que estaacute em jogo mais que as diferenccedilas e a imensa diversidade que nos informa eacute a alteridade - espaccedilo permanente de enfrentamento tensatildeo e complementariedade Nestaacute medida a escola mais que um espaccedilo de socializaccedilatildeo toma-se um espaccedilo de sociabilidades ou seja um espaccedilo de encontros e desencontros de buscas e de perdas de descobertas e de encobrimentos de vida e de negaccedilatildeo da vida A escola por essa perspectiva eacute antes de mais nada um espaccedilo soacutecio-cultural

Analisar a escola como espaccedilo soacutecio-cultural significa compreendecirc-la na

oacutetica da cultura sob um olhar mais denso que leva em conta a dimensatildeo

do dinamismo do fazer cotidiano levado a efeito por homens e mulheres

trabalhadores e trabalhadoras negros e brancos adultos e adolescentes

enfim alunos e professores seres humanos concretos sujeitos sociais e

histoacutericos presentes na histoacuteria atores da histoacuteria Falar da escola como

espaccedilo soacutecio-cultural implica em resgatar o papel dos sujeitos na trama

social que a constitui enquanto instituiccedilatildeo [ ] A escola como espaccedilo

soacutecio-cultural eacute entendida portanto como um espaccedilo social proacuteprio

ordenado em dupla dimensatildeo Institucionalmente por um conjunto de

normas e de regras que buscam unificar e delimitar a accedilatildeo de seus

sujeitos Cotidianamente por uma complexa trama de relaccedilotildees sociais

entre sujeitos envolvidos que incluem alianccedilas e conflitos imposiccedilotildees

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5n2 p9middot28 juldez 2000

de normas e estrateacutegias individuais ou coletivas de transgressatildeo e de acordos Um processo de apropriaccedilatildeo constante dos espaccedilos das normas das praacuteticas e dos saberes que datildeo forma agrave vida escolar Fruto da accedilatildeo reciacuteproca entre o sujeito e a instituiccedilatildeo esse processo como tal eacute heterogecircneo(Dayrell op cit p 136-137)

A heterogeneidade poreacutem encontra-se institucionalmente negada como negada estaacute a condiccedilatildeo soacutecio-cultural dos alunos na

medida que a escola pratica o ensino e nega a aprendizagem Isto eacute a escola organiza os processos de compreensatildeo da realidade como universal e uacutenica tomando por base um saber formal e abstrato distanciado do aluno de sua vida e experiecircncia O saber que se ensina eacute entatildeo redutor de culturas que informam as realidades vividas dos sujeitos e desloca suas vidas das problemaacuteticas imediatas que as envolve acreditando que o aluno eacute uma taacutebula rasa sobre a qual deve-se inscrever o conhecimento tido como real e legiacutetimo Assim a escola representa um saber positivista perante um saber cultural (lturra 1990 p55)

Eacute aqui que a pluralidade cultural de grupos eacutetnicos sociais ou culturais necessita ser pensada como mateacuteria-prima da aprendizagem poreacutem nunca como conteuacutedo de dias especiais datas comemorativas ou momentos determinados em sala de aula Fazer isso eacute congelar a cultura reificaacute-Ia transformaacute-Ia em recurso de folclorizaccedilatildeo e como tal acentuar as diferenccedilas Nesse processo rompe-se a possibilidade de comunicaccedilatildeo e de aprendizagem para reforccedilar os mecanismos discriminatoacuterios e a desigualdade instaurando a impossibilidade da troca e dos processos de equumlidade entre sujeitos diferentes Eacute preciso

I compreender que o ensino eacute repetir criando uma subordinaccedilatildeo a r aprendizagem eacute descobrir criando uma relaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo (lturra 1990 p 31)

Para Santos (1989) a questatildeo estaacute no fato de haver um mecanismo que separa a educaccedilatildeo do ensino e nisto reside a esquizofrenia da escola brasileira Diz ele

Educaccedilatildeo seria tudo o que se transmite de qualquer maneira formal ou informalmente todo o tempo aos menos experientes sem objetivos

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28juldez 2000 19

especiacuteficos Ensino seria uma particularizaccedilatildeo da educaccedilatildeo atraveacutes de

determinada maneira (isto eacute utilizando a escola) formal ou

informalmente num tempo exclusivo com o objetivo especiacutefico de treinar

uma competecircncia particular Pois bem eacute evidente que natildeo se pode colocar

as pessoas que educam rio lugar das que ensinam Estamos condenados a

lamentar essa contradiccedilatildeo para sempre (op cit p 28)

Os que ensinam preocupam-se em utilizando a escola e sua organizaccedilatildeo num dado tempo treinar seus alunos para competecircncias especiacuteficas somar dividir contar ler escrever Imaginam ser esse o caminho legitimo de tomando seus alunos como iguais instaurar um processo democraacutetico jaacute que todos aprendem as mesmas coisas tecircm acesso as mesmas informaccedilotildees ainda que possam ser portadores de outras informaccedilotildees aiacute natildeo consideradas Para esse professor a diversidade do social tatildeo difiacutecil de ser tratada fonte de tantos desencontros seria finalmente erradicada e as trajetoacuterias diferenciadas de seus alunos resultariam de competecircncias individuais que independe dele proacuteprio enquanto professor Aleacutem de um engano tal postura eacute um equiacutevoco e resulta em uma praacutetica autoritaacuteria constituindo um olhar que natildeo vecirc o outro que aiacute estaacute pois o vecirc de cima e distante

~ I

TONUCCI (1973) A crianccedila aquela que eacute sempre vista de cima

20 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

o desafio que permanece eacute entatildeo compreender a educaccedilatildeo enquanto processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca permanente entre diferentes Como fazecirc-lo se como dizem Moyseacutes e Collares (apud Quinteiro 2000 p 31) eacute comum no discurso 1shydos professores o argumento de que as crianccedilas natildeo aprendem porque satildeo pobres sujas desnutridas imaturas negras nordestinas natildeo aprendem porque seus pais satildeo analfabetos alcooacutelatras e as matildees trabalham fora

Para Sarmento amp Pinto (1997 p 26) eacute preciso que o adulto natildeo projete o seu olhar sobre as crianccedilas colhendo junto delas apenas aquilo que eacute reflexo conjunto dos seus proacuteprios preconceitos e representaccedilotildees

Neste sentido agrave guisa de reflexatildeo alguns exemplos de como o aluno da Rede Puacuteblica de Ensino do Rio de Janeiro eacute visto por alguns de seus professores satildeo significativos De acordo com Quinteiro (2000) dizem eles

bull esse garoto eacute uma praga mesmo eacute uma dessas criaturas que Deus produziu num dia que estava puto Soacute podia ser da turma da farrulia Adams

bull natildeo prestam para nada satildeo faltosos graccedilas a Deus fazem revezamento Aquelas alunas satildeo uns estrupiacutecios morreram e se esqueceram de deitar

bull turma antipaacutetica nunca estatildeo dispostos a nada [ ] Eles natildeo existem para mim As vezes eu me pergunto se morri desencamei e vim parar no inferno dessa turma

bull o aluno eacute um ser mutante Acho-os feios assustadores natildeo conseguem entender nada

bull tem um menino na minha sala que vive rindo e eu pergunto para ele que caboclo vocecirc estaacute recebendo E ele continua

rindo parece um orangotango

~ A pergunta eacute qual o preparo desses professores para estabelecer um processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca

I Como no cotidiano superar a discriminaccedilatildeo e a exclusatildeo social presentes no contexto social e intensamente reproduzido na escola

r Revista Mediaccedilatildees Londrina v5 n2 p9middot28 judez2000 21

22

Do aprender aaprender aprendizagem ediferenccedila

o caraacuteter ideoloacutegico das representaccedilotildees sobre a crianccedila alunos do ensino fundamental tanto quanto uma concepccedilatildeo idiacutelica e idealista da crianccedila segundo Quinteiro (2000) influencia e caracteriza a praacutetica pedagoacutegica Para a autora isto exige romper com a cultura oficial mudar mentalidade em direccedilatildeo agrave uma consciecircncia de classe para que a professoraprofessor possa compreender-se enquanto ser social que supere o senso comum e concomitantemente altere tanto as suas relaccedilotildees de trabalho quanto as condiccedilotildees objetivas da praacutetica educativa (op cit p 91) Mas para isso eacute preciso saber ouvir e se dispor a ouvir o que seu aluno tem a dizer a respeito de si mesmo e do outro que com ele

partilha a vida partilha o dia-a-dia incluindo O proacuteprio professor Poreacutem

isso natildeo eacute nada simples daiacute a surpresa do aluno das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista ao descobrir que seu professor o ouve Diz ele

Minha professora eacute diferente ela me escuta natildeo me ignora trata todo

mundo igual natildeo trata melhor do que o outro (In Quinteiro 2000)

Na tentativa de ouvir as vozes do outro as falas que se seguem satildeo falas de crianccedilas e jovens que chegam a escola puacuteblica portando marcas sociais inscritas no corpo postura linguagem percepccedilatildeo de mundo e de realidade e que de acordo com elas resignificam o mundo escolar atraveacutes dessas relaccedilotildees trazendo assim para dentro dos muros da instituiccedilatildeo aquilo que constantemente lhes eacute negado suas histoacuterias sua cultura e seus mundos (Dayrell 1996 p138)

o que dizem e como pensam os alunos das escolas puacuteblicas do Rio de Janeiro Quinteiro (2000) ressalta

bull de longe a escola parece um presiacutedio bull (gostaria) de jogar uma bomba e explodir tudo bull completava todos os tempos vagos com diversas coisas ateacute

lazer para os alunos porque a gente natildeo tem isso na escola bull pintava a escola ajeitava as janelas e fazia uma quadra de esportes

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 6: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

14

diferentes - loucos iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Eacute assim que o diferente precisa ser feito um igual como diz Brandatildeo (1986) para melhor ser dominado A questatildeo da identidade do eu portanto passa pelo mundo onde estou pertenccedilo e vivo mas soacute eacute objeto de meu pensar enquanto uma questatildeo um problema quando me defronto com o outro diferente de mim e aiacute me pergunto quem sou

A identidade e a alteridade revelam portanto que o outro natildeo eacute inexistente e estrangeiro distante de noacutes e daquilo que constitui nosso mundo O que a alteridade diz eacute que o outro existe e estaacute no nosso mundo como noacutes estamos no dele Eacute esse encontro que nos desafia e exige nossa definiccedilatildeo O eu e o outro enquanto noacutes eacute parte de um contexto relacional marcado antes de mais nada por relaccedilotildees de hierarquia e poder Como entatildeo fazer do outro um mesmo transitar pelo seu mundo e ele no nosso sem confronto sem conflitos sem fazer dele um igual para melhor submetecirc-lo Como conviver com as diferenccedilas e estabelecer relaccedilotildees solidaacuterias e de equumlidade entre sujeitos diferentes Estes satildeo os desafios permanentes da educaccedilatildeo e da escola

Diversidade educaccedilatildeo eescola

A diversidade nos espelha como parte das relaccedilotildees de poder e nos envolve em todas as dimensotildees da vida vivida no nosso cotidiano e ateacute mesmo ali onde sequer suspeitamos de sua existecircncia Com isso vale perceber que

Nos planos econocircmico social poliacutetico e das relaccedilotildees pessoais

diferenccedila tem significado em nosso paiacutes quase sempre de

desigualdade ou mais exatamente as diferenccedilas eacutetnicas culturais

fenotiacutepicas serviram de marcas entre desiguais sociais No plano da

cultura poreacutem a aplicaccedilatildeo dessa equumlivalecircncia (diferenccedila=desigualdade)

confunde os partidaacuterios da democracia levando-os a postular o fim

das diferenccedilas como garantia de igualdade Eis o que pensaria um

democrata bem intencionado nossos alunos seratildeo iguais a noacutes quando

natildeo forem diferentes (Santos 1989 p26) (grifo nosso)

Revista MediaccedilotildeesLondrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

A questatildeo eacute seraacute esse o caminho Ser diferente eacute ser desigual E tornar todos iguais negando suas diferenccedilas natildeo seria um ato autoritaacuterio negador do outro e como tal um ato de poder

Tonuccl

~OtildeOtildemiddot C ~

)11 ((((

Oacute lwAacutevivO ~

111 Ccedil0 Arn-1 fPNNi~

~a~Saacute~ i ItalnI4t

$I Aavaliaco

o que este cartum nos diz Que mesmo no micro contexto da relaccedilatildeo de poder entre

professor-aluno o problema natildeo estaacute na diferenccedila mas na des-igualdade como diz Vargas (1989 pAO) citando Dumont que supotildee uma igualdade de fundo aquela que reflete a minha imagem no espelho seja essa imagem a do professor ou ainda daqueles que detecircm o poder O eu eacute assim aquele que soacute aceita os que considera igualou mais proacuteximo de sua proacutepria imagem Portanto natildeo eacute a diferenccedila que pertence ao donuacutenio da desigualdade ( ) mas ao contraacuterio eacute porque pensamos pelo donuacutenio da semelhanccedila e da identidade que hierarquizamos o diferente e o tratamos como desigual

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28 juldez 2000 15

16

Neste sentido como diz Stolcke (1993 p28) compreendemos que igualdade e diferenccedila natildeo satildeo categorias absolutas - dependem das relaccedilotildees em jogo para definir o igua1 e o diferente e assim num processo de poder e dominaccedilatildeo gerar a marginalizaccedilatildeo e a exclusatildeo

Aqui a questatildeo da escola se coloca por inteiro em sua complexidade e se defronta com seu maior problema o fracasso diante da diversidade que nos constitui Nesta medida entra em debate o que se entende por cultura e como ela eacute pensada e compreendida no interior de projetos educativos e na praacutetica cotidiana

Antes de mais nada a cultura no interior de uma realidade humana eacute sempre dinacircmica natildeo eacute fechada ou cristalizada como um patrimocircnio de raiacutezes fixas e permanentes A cultura possui fronteiras moacuteveis e em constante expansatildeo Tampouco eacute conjugada no singular posto que eacute plural marcada por intensas trocas e muitas contradiccedilotildees nas relaccedilotildees entre grupos culturais di versos e mesmo no interior de um mesmo grupo Por esse motivo natildeo eacute possiacutevel reduzir nem os grupos nem os indiviacuteduos agrave sua cultura como diz Augeacute (1998 pl15) Do mesmo modo natildeo se pode afirmar existir uma essecircncia proacutepria desta ou daquela cultura jaacute que satildeo as sociedades que decretam a cultura e natildeo satildeo as culturas que formam as sociedades (Cunha 1998 p88)

O desafio da escola e dos projetos educativos que orientam nossa praacutetica estaacute no fato de que para compreender a cultura de um grupo ou de um indiviacuteduo que dela faz parte eacute necessaacuterio olhar a sociedaccedille onde o grupo ou o indiviacuteduo estatildeo e vivem Eacute aqui que as diferenccedilas ganham sentido e expressatildeo como realidade e definem o papel da alteridade nas relaccedilotildees sociais entre os homens

Primeiramente fazemos parte de uma sociedade de classes em que as relaccedilotildees sociais entre sujeitos satildeo relaccedilotildees de hierarquia e poder que se sustentam em classificaccedilotildees dadas a priori e naturalizadas como proacuteprias deste ou daquele grupo - Sebastiatildeo eacute negro porque tem nariz chato e cabelo ruim os iacutendios satildeo selvagens ou preguiccedilosos O pedido de Marcos Terena aos professores se justifica pois a escola tem sido o veiacuteculo de projeccedilatildeo de padrotildees e modelos que impedem o verdadeiro conhecimento privilegiando um conhecimento dado e assimilado pela ordem institucional nem sempre percebido pelos agentes sociais que conduzem o processo educativo Eacute assim que muitas vezes a dificuldade

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28juldez 2000

de aprender eacute explicada pelo fato de se ser paraibano nordestino favelado vesgo canhoto filho de prostituta (Santos 1989 p73)

Educar eacute entatildeo um desafio posto que se processa no interior de um embate entre interesses dominaccedilatildeo exploraccedilatildeo revelando a existecircncia do poder e seu exerciacutecio sobre os indiviacuteduos grupos ou

sociedades tidos como diferentes Educar tem sido o meio pelo qual o

diferente deve ser transformado em igual para que se possa submeter dominar e explorar em nome de um modelo cultural que se acredita natural universal e humano (Gusmatildeo op cit 43)

No campo de forccedila que envolve as relaccedilotildees da escola frente aos diferentes e frente agrave diferenccedila cultural proacutepria da sociedade brasileira J oel Rufino dos Santos afirma existir uma imensa ingenuidade Para ele eacute ingecircnuo pensar em salvar o ensino a partir de uma falsa noccedilatildeo de igualdade que desconsidera e faz taacutebula rasa das diferenccedilas

Exemplar eacute a reaccedilatildeo de professores e dirigentes de escola quando indagados sobre as diferenccedilas do alunado Eacute frequumlente se ouvir que naquela escola todos satildeo iguais e que aos olhos do educador natildeo haacute

diferenccedila No entanto todos sabemos que essa igualdade natildeo eacute real Os

alunos que ali estatildeo tecircm as mais diferentes origens satildeo portadores de

diferentes histoacuterias de vida as quais informam seu modo de ser e suas possibilidades de aprender Por que entatildeo os dizemos iguais Porque todos satildeo vistos a partir do lugar que ocupam no interior da escola Ali eles satildeo alunos categoria geral e abstrata que tal como a categoria iacutendio coloca a todos no mesmo saco e nega as diferenccedilas que os tomam cada um sujeitos soacutecio-culturais Diante da pergunta de quem satildeo os jovens e o que vatildeo buscar na escola Dayrell (1996 p139) afirma que

Para grande parte dos professores perguntas como estas natildeo fazem muito sentido pois a resposta eacute oacutebvia satildeo alunos E eacute essa categoria que vai informar seu olhar e as relaccedilotildees que manteacutem com os jovens a compreensatildeo de suas atitudes e expectativas Assim independente do

sexo idade da origem social das expectativas vivenciadas todos satildeo

considerados igualmente alunos procuram a escola com as mesmas expectativas e necessidades ( ) A homogeneizaccedilatildeo dos sujeitos como alunos corresponde agrave homogeneizaccedilatildeo da instituiccedilatildeo escolar compreendida como universal

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000 17

18

Por outro lado diz Ioel Rufino dos Santos eacute ingenuidade tambeacutem pensar em salvar o ensino pura e simplesmente pelo reconhecimento das diferenccedilas culturais Fazecirc-lo eacute reificar a cultura como se as diferenccedilas pudessem ser contidas e explicadas por si mesmas por uma essecircncia proacutepria que afirma que cada um eacute um que se eacute assim por causa da cultura

oprocesso educativo entre oensinar e o aprender

Nem a igualdade absoluta nem a diferenccedila relativa satildeo efetivamente adequadas para compreender e solucionar o problema da diversidade social e cultural Nisto reside o paradoxo e o desafio de nossas praacuteticas e propostas educativas Nelas o que estaacute em jogo mais que as diferenccedilas e a imensa diversidade que nos informa eacute a alteridade - espaccedilo permanente de enfrentamento tensatildeo e complementariedade Nestaacute medida a escola mais que um espaccedilo de socializaccedilatildeo toma-se um espaccedilo de sociabilidades ou seja um espaccedilo de encontros e desencontros de buscas e de perdas de descobertas e de encobrimentos de vida e de negaccedilatildeo da vida A escola por essa perspectiva eacute antes de mais nada um espaccedilo soacutecio-cultural

Analisar a escola como espaccedilo soacutecio-cultural significa compreendecirc-la na

oacutetica da cultura sob um olhar mais denso que leva em conta a dimensatildeo

do dinamismo do fazer cotidiano levado a efeito por homens e mulheres

trabalhadores e trabalhadoras negros e brancos adultos e adolescentes

enfim alunos e professores seres humanos concretos sujeitos sociais e

histoacutericos presentes na histoacuteria atores da histoacuteria Falar da escola como

espaccedilo soacutecio-cultural implica em resgatar o papel dos sujeitos na trama

social que a constitui enquanto instituiccedilatildeo [ ] A escola como espaccedilo

soacutecio-cultural eacute entendida portanto como um espaccedilo social proacuteprio

ordenado em dupla dimensatildeo Institucionalmente por um conjunto de

normas e de regras que buscam unificar e delimitar a accedilatildeo de seus

sujeitos Cotidianamente por uma complexa trama de relaccedilotildees sociais

entre sujeitos envolvidos que incluem alianccedilas e conflitos imposiccedilotildees

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5n2 p9middot28 juldez 2000

de normas e estrateacutegias individuais ou coletivas de transgressatildeo e de acordos Um processo de apropriaccedilatildeo constante dos espaccedilos das normas das praacuteticas e dos saberes que datildeo forma agrave vida escolar Fruto da accedilatildeo reciacuteproca entre o sujeito e a instituiccedilatildeo esse processo como tal eacute heterogecircneo(Dayrell op cit p 136-137)

A heterogeneidade poreacutem encontra-se institucionalmente negada como negada estaacute a condiccedilatildeo soacutecio-cultural dos alunos na

medida que a escola pratica o ensino e nega a aprendizagem Isto eacute a escola organiza os processos de compreensatildeo da realidade como universal e uacutenica tomando por base um saber formal e abstrato distanciado do aluno de sua vida e experiecircncia O saber que se ensina eacute entatildeo redutor de culturas que informam as realidades vividas dos sujeitos e desloca suas vidas das problemaacuteticas imediatas que as envolve acreditando que o aluno eacute uma taacutebula rasa sobre a qual deve-se inscrever o conhecimento tido como real e legiacutetimo Assim a escola representa um saber positivista perante um saber cultural (lturra 1990 p55)

Eacute aqui que a pluralidade cultural de grupos eacutetnicos sociais ou culturais necessita ser pensada como mateacuteria-prima da aprendizagem poreacutem nunca como conteuacutedo de dias especiais datas comemorativas ou momentos determinados em sala de aula Fazer isso eacute congelar a cultura reificaacute-Ia transformaacute-Ia em recurso de folclorizaccedilatildeo e como tal acentuar as diferenccedilas Nesse processo rompe-se a possibilidade de comunicaccedilatildeo e de aprendizagem para reforccedilar os mecanismos discriminatoacuterios e a desigualdade instaurando a impossibilidade da troca e dos processos de equumlidade entre sujeitos diferentes Eacute preciso

I compreender que o ensino eacute repetir criando uma subordinaccedilatildeo a r aprendizagem eacute descobrir criando uma relaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo (lturra 1990 p 31)

Para Santos (1989) a questatildeo estaacute no fato de haver um mecanismo que separa a educaccedilatildeo do ensino e nisto reside a esquizofrenia da escola brasileira Diz ele

Educaccedilatildeo seria tudo o que se transmite de qualquer maneira formal ou informalmente todo o tempo aos menos experientes sem objetivos

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28juldez 2000 19

especiacuteficos Ensino seria uma particularizaccedilatildeo da educaccedilatildeo atraveacutes de

determinada maneira (isto eacute utilizando a escola) formal ou

informalmente num tempo exclusivo com o objetivo especiacutefico de treinar

uma competecircncia particular Pois bem eacute evidente que natildeo se pode colocar

as pessoas que educam rio lugar das que ensinam Estamos condenados a

lamentar essa contradiccedilatildeo para sempre (op cit p 28)

Os que ensinam preocupam-se em utilizando a escola e sua organizaccedilatildeo num dado tempo treinar seus alunos para competecircncias especiacuteficas somar dividir contar ler escrever Imaginam ser esse o caminho legitimo de tomando seus alunos como iguais instaurar um processo democraacutetico jaacute que todos aprendem as mesmas coisas tecircm acesso as mesmas informaccedilotildees ainda que possam ser portadores de outras informaccedilotildees aiacute natildeo consideradas Para esse professor a diversidade do social tatildeo difiacutecil de ser tratada fonte de tantos desencontros seria finalmente erradicada e as trajetoacuterias diferenciadas de seus alunos resultariam de competecircncias individuais que independe dele proacuteprio enquanto professor Aleacutem de um engano tal postura eacute um equiacutevoco e resulta em uma praacutetica autoritaacuteria constituindo um olhar que natildeo vecirc o outro que aiacute estaacute pois o vecirc de cima e distante

~ I

TONUCCI (1973) A crianccedila aquela que eacute sempre vista de cima

20 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

o desafio que permanece eacute entatildeo compreender a educaccedilatildeo enquanto processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca permanente entre diferentes Como fazecirc-lo se como dizem Moyseacutes e Collares (apud Quinteiro 2000 p 31) eacute comum no discurso 1shydos professores o argumento de que as crianccedilas natildeo aprendem porque satildeo pobres sujas desnutridas imaturas negras nordestinas natildeo aprendem porque seus pais satildeo analfabetos alcooacutelatras e as matildees trabalham fora

Para Sarmento amp Pinto (1997 p 26) eacute preciso que o adulto natildeo projete o seu olhar sobre as crianccedilas colhendo junto delas apenas aquilo que eacute reflexo conjunto dos seus proacuteprios preconceitos e representaccedilotildees

Neste sentido agrave guisa de reflexatildeo alguns exemplos de como o aluno da Rede Puacuteblica de Ensino do Rio de Janeiro eacute visto por alguns de seus professores satildeo significativos De acordo com Quinteiro (2000) dizem eles

bull esse garoto eacute uma praga mesmo eacute uma dessas criaturas que Deus produziu num dia que estava puto Soacute podia ser da turma da farrulia Adams

bull natildeo prestam para nada satildeo faltosos graccedilas a Deus fazem revezamento Aquelas alunas satildeo uns estrupiacutecios morreram e se esqueceram de deitar

bull turma antipaacutetica nunca estatildeo dispostos a nada [ ] Eles natildeo existem para mim As vezes eu me pergunto se morri desencamei e vim parar no inferno dessa turma

bull o aluno eacute um ser mutante Acho-os feios assustadores natildeo conseguem entender nada

bull tem um menino na minha sala que vive rindo e eu pergunto para ele que caboclo vocecirc estaacute recebendo E ele continua

rindo parece um orangotango

~ A pergunta eacute qual o preparo desses professores para estabelecer um processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca

I Como no cotidiano superar a discriminaccedilatildeo e a exclusatildeo social presentes no contexto social e intensamente reproduzido na escola

r Revista Mediaccedilatildees Londrina v5 n2 p9middot28 judez2000 21

22

Do aprender aaprender aprendizagem ediferenccedila

o caraacuteter ideoloacutegico das representaccedilotildees sobre a crianccedila alunos do ensino fundamental tanto quanto uma concepccedilatildeo idiacutelica e idealista da crianccedila segundo Quinteiro (2000) influencia e caracteriza a praacutetica pedagoacutegica Para a autora isto exige romper com a cultura oficial mudar mentalidade em direccedilatildeo agrave uma consciecircncia de classe para que a professoraprofessor possa compreender-se enquanto ser social que supere o senso comum e concomitantemente altere tanto as suas relaccedilotildees de trabalho quanto as condiccedilotildees objetivas da praacutetica educativa (op cit p 91) Mas para isso eacute preciso saber ouvir e se dispor a ouvir o que seu aluno tem a dizer a respeito de si mesmo e do outro que com ele

partilha a vida partilha o dia-a-dia incluindo O proacuteprio professor Poreacutem

isso natildeo eacute nada simples daiacute a surpresa do aluno das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista ao descobrir que seu professor o ouve Diz ele

Minha professora eacute diferente ela me escuta natildeo me ignora trata todo

mundo igual natildeo trata melhor do que o outro (In Quinteiro 2000)

Na tentativa de ouvir as vozes do outro as falas que se seguem satildeo falas de crianccedilas e jovens que chegam a escola puacuteblica portando marcas sociais inscritas no corpo postura linguagem percepccedilatildeo de mundo e de realidade e que de acordo com elas resignificam o mundo escolar atraveacutes dessas relaccedilotildees trazendo assim para dentro dos muros da instituiccedilatildeo aquilo que constantemente lhes eacute negado suas histoacuterias sua cultura e seus mundos (Dayrell 1996 p138)

o que dizem e como pensam os alunos das escolas puacuteblicas do Rio de Janeiro Quinteiro (2000) ressalta

bull de longe a escola parece um presiacutedio bull (gostaria) de jogar uma bomba e explodir tudo bull completava todos os tempos vagos com diversas coisas ateacute

lazer para os alunos porque a gente natildeo tem isso na escola bull pintava a escola ajeitava as janelas e fazia uma quadra de esportes

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 7: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

A questatildeo eacute seraacute esse o caminho Ser diferente eacute ser desigual E tornar todos iguais negando suas diferenccedilas natildeo seria um ato autoritaacuterio negador do outro e como tal um ato de poder

Tonuccl

~OtildeOtildemiddot C ~

)11 ((((

Oacute lwAacutevivO ~

111 Ccedil0 Arn-1 fPNNi~

~a~Saacute~ i ItalnI4t

$I Aavaliaco

o que este cartum nos diz Que mesmo no micro contexto da relaccedilatildeo de poder entre

professor-aluno o problema natildeo estaacute na diferenccedila mas na des-igualdade como diz Vargas (1989 pAO) citando Dumont que supotildee uma igualdade de fundo aquela que reflete a minha imagem no espelho seja essa imagem a do professor ou ainda daqueles que detecircm o poder O eu eacute assim aquele que soacute aceita os que considera igualou mais proacuteximo de sua proacutepria imagem Portanto natildeo eacute a diferenccedila que pertence ao donuacutenio da desigualdade ( ) mas ao contraacuterio eacute porque pensamos pelo donuacutenio da semelhanccedila e da identidade que hierarquizamos o diferente e o tratamos como desigual

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28 juldez 2000 15

16

Neste sentido como diz Stolcke (1993 p28) compreendemos que igualdade e diferenccedila natildeo satildeo categorias absolutas - dependem das relaccedilotildees em jogo para definir o igua1 e o diferente e assim num processo de poder e dominaccedilatildeo gerar a marginalizaccedilatildeo e a exclusatildeo

Aqui a questatildeo da escola se coloca por inteiro em sua complexidade e se defronta com seu maior problema o fracasso diante da diversidade que nos constitui Nesta medida entra em debate o que se entende por cultura e como ela eacute pensada e compreendida no interior de projetos educativos e na praacutetica cotidiana

Antes de mais nada a cultura no interior de uma realidade humana eacute sempre dinacircmica natildeo eacute fechada ou cristalizada como um patrimocircnio de raiacutezes fixas e permanentes A cultura possui fronteiras moacuteveis e em constante expansatildeo Tampouco eacute conjugada no singular posto que eacute plural marcada por intensas trocas e muitas contradiccedilotildees nas relaccedilotildees entre grupos culturais di versos e mesmo no interior de um mesmo grupo Por esse motivo natildeo eacute possiacutevel reduzir nem os grupos nem os indiviacuteduos agrave sua cultura como diz Augeacute (1998 pl15) Do mesmo modo natildeo se pode afirmar existir uma essecircncia proacutepria desta ou daquela cultura jaacute que satildeo as sociedades que decretam a cultura e natildeo satildeo as culturas que formam as sociedades (Cunha 1998 p88)

O desafio da escola e dos projetos educativos que orientam nossa praacutetica estaacute no fato de que para compreender a cultura de um grupo ou de um indiviacuteduo que dela faz parte eacute necessaacuterio olhar a sociedaccedille onde o grupo ou o indiviacuteduo estatildeo e vivem Eacute aqui que as diferenccedilas ganham sentido e expressatildeo como realidade e definem o papel da alteridade nas relaccedilotildees sociais entre os homens

Primeiramente fazemos parte de uma sociedade de classes em que as relaccedilotildees sociais entre sujeitos satildeo relaccedilotildees de hierarquia e poder que se sustentam em classificaccedilotildees dadas a priori e naturalizadas como proacuteprias deste ou daquele grupo - Sebastiatildeo eacute negro porque tem nariz chato e cabelo ruim os iacutendios satildeo selvagens ou preguiccedilosos O pedido de Marcos Terena aos professores se justifica pois a escola tem sido o veiacuteculo de projeccedilatildeo de padrotildees e modelos que impedem o verdadeiro conhecimento privilegiando um conhecimento dado e assimilado pela ordem institucional nem sempre percebido pelos agentes sociais que conduzem o processo educativo Eacute assim que muitas vezes a dificuldade

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28juldez 2000

de aprender eacute explicada pelo fato de se ser paraibano nordestino favelado vesgo canhoto filho de prostituta (Santos 1989 p73)

Educar eacute entatildeo um desafio posto que se processa no interior de um embate entre interesses dominaccedilatildeo exploraccedilatildeo revelando a existecircncia do poder e seu exerciacutecio sobre os indiviacuteduos grupos ou

sociedades tidos como diferentes Educar tem sido o meio pelo qual o

diferente deve ser transformado em igual para que se possa submeter dominar e explorar em nome de um modelo cultural que se acredita natural universal e humano (Gusmatildeo op cit 43)

No campo de forccedila que envolve as relaccedilotildees da escola frente aos diferentes e frente agrave diferenccedila cultural proacutepria da sociedade brasileira J oel Rufino dos Santos afirma existir uma imensa ingenuidade Para ele eacute ingecircnuo pensar em salvar o ensino a partir de uma falsa noccedilatildeo de igualdade que desconsidera e faz taacutebula rasa das diferenccedilas

Exemplar eacute a reaccedilatildeo de professores e dirigentes de escola quando indagados sobre as diferenccedilas do alunado Eacute frequumlente se ouvir que naquela escola todos satildeo iguais e que aos olhos do educador natildeo haacute

diferenccedila No entanto todos sabemos que essa igualdade natildeo eacute real Os

alunos que ali estatildeo tecircm as mais diferentes origens satildeo portadores de

diferentes histoacuterias de vida as quais informam seu modo de ser e suas possibilidades de aprender Por que entatildeo os dizemos iguais Porque todos satildeo vistos a partir do lugar que ocupam no interior da escola Ali eles satildeo alunos categoria geral e abstrata que tal como a categoria iacutendio coloca a todos no mesmo saco e nega as diferenccedilas que os tomam cada um sujeitos soacutecio-culturais Diante da pergunta de quem satildeo os jovens e o que vatildeo buscar na escola Dayrell (1996 p139) afirma que

Para grande parte dos professores perguntas como estas natildeo fazem muito sentido pois a resposta eacute oacutebvia satildeo alunos E eacute essa categoria que vai informar seu olhar e as relaccedilotildees que manteacutem com os jovens a compreensatildeo de suas atitudes e expectativas Assim independente do

sexo idade da origem social das expectativas vivenciadas todos satildeo

considerados igualmente alunos procuram a escola com as mesmas expectativas e necessidades ( ) A homogeneizaccedilatildeo dos sujeitos como alunos corresponde agrave homogeneizaccedilatildeo da instituiccedilatildeo escolar compreendida como universal

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000 17

18

Por outro lado diz Ioel Rufino dos Santos eacute ingenuidade tambeacutem pensar em salvar o ensino pura e simplesmente pelo reconhecimento das diferenccedilas culturais Fazecirc-lo eacute reificar a cultura como se as diferenccedilas pudessem ser contidas e explicadas por si mesmas por uma essecircncia proacutepria que afirma que cada um eacute um que se eacute assim por causa da cultura

oprocesso educativo entre oensinar e o aprender

Nem a igualdade absoluta nem a diferenccedila relativa satildeo efetivamente adequadas para compreender e solucionar o problema da diversidade social e cultural Nisto reside o paradoxo e o desafio de nossas praacuteticas e propostas educativas Nelas o que estaacute em jogo mais que as diferenccedilas e a imensa diversidade que nos informa eacute a alteridade - espaccedilo permanente de enfrentamento tensatildeo e complementariedade Nestaacute medida a escola mais que um espaccedilo de socializaccedilatildeo toma-se um espaccedilo de sociabilidades ou seja um espaccedilo de encontros e desencontros de buscas e de perdas de descobertas e de encobrimentos de vida e de negaccedilatildeo da vida A escola por essa perspectiva eacute antes de mais nada um espaccedilo soacutecio-cultural

Analisar a escola como espaccedilo soacutecio-cultural significa compreendecirc-la na

oacutetica da cultura sob um olhar mais denso que leva em conta a dimensatildeo

do dinamismo do fazer cotidiano levado a efeito por homens e mulheres

trabalhadores e trabalhadoras negros e brancos adultos e adolescentes

enfim alunos e professores seres humanos concretos sujeitos sociais e

histoacutericos presentes na histoacuteria atores da histoacuteria Falar da escola como

espaccedilo soacutecio-cultural implica em resgatar o papel dos sujeitos na trama

social que a constitui enquanto instituiccedilatildeo [ ] A escola como espaccedilo

soacutecio-cultural eacute entendida portanto como um espaccedilo social proacuteprio

ordenado em dupla dimensatildeo Institucionalmente por um conjunto de

normas e de regras que buscam unificar e delimitar a accedilatildeo de seus

sujeitos Cotidianamente por uma complexa trama de relaccedilotildees sociais

entre sujeitos envolvidos que incluem alianccedilas e conflitos imposiccedilotildees

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5n2 p9middot28 juldez 2000

de normas e estrateacutegias individuais ou coletivas de transgressatildeo e de acordos Um processo de apropriaccedilatildeo constante dos espaccedilos das normas das praacuteticas e dos saberes que datildeo forma agrave vida escolar Fruto da accedilatildeo reciacuteproca entre o sujeito e a instituiccedilatildeo esse processo como tal eacute heterogecircneo(Dayrell op cit p 136-137)

A heterogeneidade poreacutem encontra-se institucionalmente negada como negada estaacute a condiccedilatildeo soacutecio-cultural dos alunos na

medida que a escola pratica o ensino e nega a aprendizagem Isto eacute a escola organiza os processos de compreensatildeo da realidade como universal e uacutenica tomando por base um saber formal e abstrato distanciado do aluno de sua vida e experiecircncia O saber que se ensina eacute entatildeo redutor de culturas que informam as realidades vividas dos sujeitos e desloca suas vidas das problemaacuteticas imediatas que as envolve acreditando que o aluno eacute uma taacutebula rasa sobre a qual deve-se inscrever o conhecimento tido como real e legiacutetimo Assim a escola representa um saber positivista perante um saber cultural (lturra 1990 p55)

Eacute aqui que a pluralidade cultural de grupos eacutetnicos sociais ou culturais necessita ser pensada como mateacuteria-prima da aprendizagem poreacutem nunca como conteuacutedo de dias especiais datas comemorativas ou momentos determinados em sala de aula Fazer isso eacute congelar a cultura reificaacute-Ia transformaacute-Ia em recurso de folclorizaccedilatildeo e como tal acentuar as diferenccedilas Nesse processo rompe-se a possibilidade de comunicaccedilatildeo e de aprendizagem para reforccedilar os mecanismos discriminatoacuterios e a desigualdade instaurando a impossibilidade da troca e dos processos de equumlidade entre sujeitos diferentes Eacute preciso

I compreender que o ensino eacute repetir criando uma subordinaccedilatildeo a r aprendizagem eacute descobrir criando uma relaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo (lturra 1990 p 31)

Para Santos (1989) a questatildeo estaacute no fato de haver um mecanismo que separa a educaccedilatildeo do ensino e nisto reside a esquizofrenia da escola brasileira Diz ele

Educaccedilatildeo seria tudo o que se transmite de qualquer maneira formal ou informalmente todo o tempo aos menos experientes sem objetivos

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28juldez 2000 19

especiacuteficos Ensino seria uma particularizaccedilatildeo da educaccedilatildeo atraveacutes de

determinada maneira (isto eacute utilizando a escola) formal ou

informalmente num tempo exclusivo com o objetivo especiacutefico de treinar

uma competecircncia particular Pois bem eacute evidente que natildeo se pode colocar

as pessoas que educam rio lugar das que ensinam Estamos condenados a

lamentar essa contradiccedilatildeo para sempre (op cit p 28)

Os que ensinam preocupam-se em utilizando a escola e sua organizaccedilatildeo num dado tempo treinar seus alunos para competecircncias especiacuteficas somar dividir contar ler escrever Imaginam ser esse o caminho legitimo de tomando seus alunos como iguais instaurar um processo democraacutetico jaacute que todos aprendem as mesmas coisas tecircm acesso as mesmas informaccedilotildees ainda que possam ser portadores de outras informaccedilotildees aiacute natildeo consideradas Para esse professor a diversidade do social tatildeo difiacutecil de ser tratada fonte de tantos desencontros seria finalmente erradicada e as trajetoacuterias diferenciadas de seus alunos resultariam de competecircncias individuais que independe dele proacuteprio enquanto professor Aleacutem de um engano tal postura eacute um equiacutevoco e resulta em uma praacutetica autoritaacuteria constituindo um olhar que natildeo vecirc o outro que aiacute estaacute pois o vecirc de cima e distante

~ I

TONUCCI (1973) A crianccedila aquela que eacute sempre vista de cima

20 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

o desafio que permanece eacute entatildeo compreender a educaccedilatildeo enquanto processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca permanente entre diferentes Como fazecirc-lo se como dizem Moyseacutes e Collares (apud Quinteiro 2000 p 31) eacute comum no discurso 1shydos professores o argumento de que as crianccedilas natildeo aprendem porque satildeo pobres sujas desnutridas imaturas negras nordestinas natildeo aprendem porque seus pais satildeo analfabetos alcooacutelatras e as matildees trabalham fora

Para Sarmento amp Pinto (1997 p 26) eacute preciso que o adulto natildeo projete o seu olhar sobre as crianccedilas colhendo junto delas apenas aquilo que eacute reflexo conjunto dos seus proacuteprios preconceitos e representaccedilotildees

Neste sentido agrave guisa de reflexatildeo alguns exemplos de como o aluno da Rede Puacuteblica de Ensino do Rio de Janeiro eacute visto por alguns de seus professores satildeo significativos De acordo com Quinteiro (2000) dizem eles

bull esse garoto eacute uma praga mesmo eacute uma dessas criaturas que Deus produziu num dia que estava puto Soacute podia ser da turma da farrulia Adams

bull natildeo prestam para nada satildeo faltosos graccedilas a Deus fazem revezamento Aquelas alunas satildeo uns estrupiacutecios morreram e se esqueceram de deitar

bull turma antipaacutetica nunca estatildeo dispostos a nada [ ] Eles natildeo existem para mim As vezes eu me pergunto se morri desencamei e vim parar no inferno dessa turma

bull o aluno eacute um ser mutante Acho-os feios assustadores natildeo conseguem entender nada

bull tem um menino na minha sala que vive rindo e eu pergunto para ele que caboclo vocecirc estaacute recebendo E ele continua

rindo parece um orangotango

~ A pergunta eacute qual o preparo desses professores para estabelecer um processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca

I Como no cotidiano superar a discriminaccedilatildeo e a exclusatildeo social presentes no contexto social e intensamente reproduzido na escola

r Revista Mediaccedilatildees Londrina v5 n2 p9middot28 judez2000 21

22

Do aprender aaprender aprendizagem ediferenccedila

o caraacuteter ideoloacutegico das representaccedilotildees sobre a crianccedila alunos do ensino fundamental tanto quanto uma concepccedilatildeo idiacutelica e idealista da crianccedila segundo Quinteiro (2000) influencia e caracteriza a praacutetica pedagoacutegica Para a autora isto exige romper com a cultura oficial mudar mentalidade em direccedilatildeo agrave uma consciecircncia de classe para que a professoraprofessor possa compreender-se enquanto ser social que supere o senso comum e concomitantemente altere tanto as suas relaccedilotildees de trabalho quanto as condiccedilotildees objetivas da praacutetica educativa (op cit p 91) Mas para isso eacute preciso saber ouvir e se dispor a ouvir o que seu aluno tem a dizer a respeito de si mesmo e do outro que com ele

partilha a vida partilha o dia-a-dia incluindo O proacuteprio professor Poreacutem

isso natildeo eacute nada simples daiacute a surpresa do aluno das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista ao descobrir que seu professor o ouve Diz ele

Minha professora eacute diferente ela me escuta natildeo me ignora trata todo

mundo igual natildeo trata melhor do que o outro (In Quinteiro 2000)

Na tentativa de ouvir as vozes do outro as falas que se seguem satildeo falas de crianccedilas e jovens que chegam a escola puacuteblica portando marcas sociais inscritas no corpo postura linguagem percepccedilatildeo de mundo e de realidade e que de acordo com elas resignificam o mundo escolar atraveacutes dessas relaccedilotildees trazendo assim para dentro dos muros da instituiccedilatildeo aquilo que constantemente lhes eacute negado suas histoacuterias sua cultura e seus mundos (Dayrell 1996 p138)

o que dizem e como pensam os alunos das escolas puacuteblicas do Rio de Janeiro Quinteiro (2000) ressalta

bull de longe a escola parece um presiacutedio bull (gostaria) de jogar uma bomba e explodir tudo bull completava todos os tempos vagos com diversas coisas ateacute

lazer para os alunos porque a gente natildeo tem isso na escola bull pintava a escola ajeitava as janelas e fazia uma quadra de esportes

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 8: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

16

Neste sentido como diz Stolcke (1993 p28) compreendemos que igualdade e diferenccedila natildeo satildeo categorias absolutas - dependem das relaccedilotildees em jogo para definir o igua1 e o diferente e assim num processo de poder e dominaccedilatildeo gerar a marginalizaccedilatildeo e a exclusatildeo

Aqui a questatildeo da escola se coloca por inteiro em sua complexidade e se defronta com seu maior problema o fracasso diante da diversidade que nos constitui Nesta medida entra em debate o que se entende por cultura e como ela eacute pensada e compreendida no interior de projetos educativos e na praacutetica cotidiana

Antes de mais nada a cultura no interior de uma realidade humana eacute sempre dinacircmica natildeo eacute fechada ou cristalizada como um patrimocircnio de raiacutezes fixas e permanentes A cultura possui fronteiras moacuteveis e em constante expansatildeo Tampouco eacute conjugada no singular posto que eacute plural marcada por intensas trocas e muitas contradiccedilotildees nas relaccedilotildees entre grupos culturais di versos e mesmo no interior de um mesmo grupo Por esse motivo natildeo eacute possiacutevel reduzir nem os grupos nem os indiviacuteduos agrave sua cultura como diz Augeacute (1998 pl15) Do mesmo modo natildeo se pode afirmar existir uma essecircncia proacutepria desta ou daquela cultura jaacute que satildeo as sociedades que decretam a cultura e natildeo satildeo as culturas que formam as sociedades (Cunha 1998 p88)

O desafio da escola e dos projetos educativos que orientam nossa praacutetica estaacute no fato de que para compreender a cultura de um grupo ou de um indiviacuteduo que dela faz parte eacute necessaacuterio olhar a sociedaccedille onde o grupo ou o indiviacuteduo estatildeo e vivem Eacute aqui que as diferenccedilas ganham sentido e expressatildeo como realidade e definem o papel da alteridade nas relaccedilotildees sociais entre os homens

Primeiramente fazemos parte de uma sociedade de classes em que as relaccedilotildees sociais entre sujeitos satildeo relaccedilotildees de hierarquia e poder que se sustentam em classificaccedilotildees dadas a priori e naturalizadas como proacuteprias deste ou daquele grupo - Sebastiatildeo eacute negro porque tem nariz chato e cabelo ruim os iacutendios satildeo selvagens ou preguiccedilosos O pedido de Marcos Terena aos professores se justifica pois a escola tem sido o veiacuteculo de projeccedilatildeo de padrotildees e modelos que impedem o verdadeiro conhecimento privilegiando um conhecimento dado e assimilado pela ordem institucional nem sempre percebido pelos agentes sociais que conduzem o processo educativo Eacute assim que muitas vezes a dificuldade

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28juldez 2000

de aprender eacute explicada pelo fato de se ser paraibano nordestino favelado vesgo canhoto filho de prostituta (Santos 1989 p73)

Educar eacute entatildeo um desafio posto que se processa no interior de um embate entre interesses dominaccedilatildeo exploraccedilatildeo revelando a existecircncia do poder e seu exerciacutecio sobre os indiviacuteduos grupos ou

sociedades tidos como diferentes Educar tem sido o meio pelo qual o

diferente deve ser transformado em igual para que se possa submeter dominar e explorar em nome de um modelo cultural que se acredita natural universal e humano (Gusmatildeo op cit 43)

No campo de forccedila que envolve as relaccedilotildees da escola frente aos diferentes e frente agrave diferenccedila cultural proacutepria da sociedade brasileira J oel Rufino dos Santos afirma existir uma imensa ingenuidade Para ele eacute ingecircnuo pensar em salvar o ensino a partir de uma falsa noccedilatildeo de igualdade que desconsidera e faz taacutebula rasa das diferenccedilas

Exemplar eacute a reaccedilatildeo de professores e dirigentes de escola quando indagados sobre as diferenccedilas do alunado Eacute frequumlente se ouvir que naquela escola todos satildeo iguais e que aos olhos do educador natildeo haacute

diferenccedila No entanto todos sabemos que essa igualdade natildeo eacute real Os

alunos que ali estatildeo tecircm as mais diferentes origens satildeo portadores de

diferentes histoacuterias de vida as quais informam seu modo de ser e suas possibilidades de aprender Por que entatildeo os dizemos iguais Porque todos satildeo vistos a partir do lugar que ocupam no interior da escola Ali eles satildeo alunos categoria geral e abstrata que tal como a categoria iacutendio coloca a todos no mesmo saco e nega as diferenccedilas que os tomam cada um sujeitos soacutecio-culturais Diante da pergunta de quem satildeo os jovens e o que vatildeo buscar na escola Dayrell (1996 p139) afirma que

Para grande parte dos professores perguntas como estas natildeo fazem muito sentido pois a resposta eacute oacutebvia satildeo alunos E eacute essa categoria que vai informar seu olhar e as relaccedilotildees que manteacutem com os jovens a compreensatildeo de suas atitudes e expectativas Assim independente do

sexo idade da origem social das expectativas vivenciadas todos satildeo

considerados igualmente alunos procuram a escola com as mesmas expectativas e necessidades ( ) A homogeneizaccedilatildeo dos sujeitos como alunos corresponde agrave homogeneizaccedilatildeo da instituiccedilatildeo escolar compreendida como universal

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000 17

18

Por outro lado diz Ioel Rufino dos Santos eacute ingenuidade tambeacutem pensar em salvar o ensino pura e simplesmente pelo reconhecimento das diferenccedilas culturais Fazecirc-lo eacute reificar a cultura como se as diferenccedilas pudessem ser contidas e explicadas por si mesmas por uma essecircncia proacutepria que afirma que cada um eacute um que se eacute assim por causa da cultura

oprocesso educativo entre oensinar e o aprender

Nem a igualdade absoluta nem a diferenccedila relativa satildeo efetivamente adequadas para compreender e solucionar o problema da diversidade social e cultural Nisto reside o paradoxo e o desafio de nossas praacuteticas e propostas educativas Nelas o que estaacute em jogo mais que as diferenccedilas e a imensa diversidade que nos informa eacute a alteridade - espaccedilo permanente de enfrentamento tensatildeo e complementariedade Nestaacute medida a escola mais que um espaccedilo de socializaccedilatildeo toma-se um espaccedilo de sociabilidades ou seja um espaccedilo de encontros e desencontros de buscas e de perdas de descobertas e de encobrimentos de vida e de negaccedilatildeo da vida A escola por essa perspectiva eacute antes de mais nada um espaccedilo soacutecio-cultural

Analisar a escola como espaccedilo soacutecio-cultural significa compreendecirc-la na

oacutetica da cultura sob um olhar mais denso que leva em conta a dimensatildeo

do dinamismo do fazer cotidiano levado a efeito por homens e mulheres

trabalhadores e trabalhadoras negros e brancos adultos e adolescentes

enfim alunos e professores seres humanos concretos sujeitos sociais e

histoacutericos presentes na histoacuteria atores da histoacuteria Falar da escola como

espaccedilo soacutecio-cultural implica em resgatar o papel dos sujeitos na trama

social que a constitui enquanto instituiccedilatildeo [ ] A escola como espaccedilo

soacutecio-cultural eacute entendida portanto como um espaccedilo social proacuteprio

ordenado em dupla dimensatildeo Institucionalmente por um conjunto de

normas e de regras que buscam unificar e delimitar a accedilatildeo de seus

sujeitos Cotidianamente por uma complexa trama de relaccedilotildees sociais

entre sujeitos envolvidos que incluem alianccedilas e conflitos imposiccedilotildees

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5n2 p9middot28 juldez 2000

de normas e estrateacutegias individuais ou coletivas de transgressatildeo e de acordos Um processo de apropriaccedilatildeo constante dos espaccedilos das normas das praacuteticas e dos saberes que datildeo forma agrave vida escolar Fruto da accedilatildeo reciacuteproca entre o sujeito e a instituiccedilatildeo esse processo como tal eacute heterogecircneo(Dayrell op cit p 136-137)

A heterogeneidade poreacutem encontra-se institucionalmente negada como negada estaacute a condiccedilatildeo soacutecio-cultural dos alunos na

medida que a escola pratica o ensino e nega a aprendizagem Isto eacute a escola organiza os processos de compreensatildeo da realidade como universal e uacutenica tomando por base um saber formal e abstrato distanciado do aluno de sua vida e experiecircncia O saber que se ensina eacute entatildeo redutor de culturas que informam as realidades vividas dos sujeitos e desloca suas vidas das problemaacuteticas imediatas que as envolve acreditando que o aluno eacute uma taacutebula rasa sobre a qual deve-se inscrever o conhecimento tido como real e legiacutetimo Assim a escola representa um saber positivista perante um saber cultural (lturra 1990 p55)

Eacute aqui que a pluralidade cultural de grupos eacutetnicos sociais ou culturais necessita ser pensada como mateacuteria-prima da aprendizagem poreacutem nunca como conteuacutedo de dias especiais datas comemorativas ou momentos determinados em sala de aula Fazer isso eacute congelar a cultura reificaacute-Ia transformaacute-Ia em recurso de folclorizaccedilatildeo e como tal acentuar as diferenccedilas Nesse processo rompe-se a possibilidade de comunicaccedilatildeo e de aprendizagem para reforccedilar os mecanismos discriminatoacuterios e a desigualdade instaurando a impossibilidade da troca e dos processos de equumlidade entre sujeitos diferentes Eacute preciso

I compreender que o ensino eacute repetir criando uma subordinaccedilatildeo a r aprendizagem eacute descobrir criando uma relaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo (lturra 1990 p 31)

Para Santos (1989) a questatildeo estaacute no fato de haver um mecanismo que separa a educaccedilatildeo do ensino e nisto reside a esquizofrenia da escola brasileira Diz ele

Educaccedilatildeo seria tudo o que se transmite de qualquer maneira formal ou informalmente todo o tempo aos menos experientes sem objetivos

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28juldez 2000 19

especiacuteficos Ensino seria uma particularizaccedilatildeo da educaccedilatildeo atraveacutes de

determinada maneira (isto eacute utilizando a escola) formal ou

informalmente num tempo exclusivo com o objetivo especiacutefico de treinar

uma competecircncia particular Pois bem eacute evidente que natildeo se pode colocar

as pessoas que educam rio lugar das que ensinam Estamos condenados a

lamentar essa contradiccedilatildeo para sempre (op cit p 28)

Os que ensinam preocupam-se em utilizando a escola e sua organizaccedilatildeo num dado tempo treinar seus alunos para competecircncias especiacuteficas somar dividir contar ler escrever Imaginam ser esse o caminho legitimo de tomando seus alunos como iguais instaurar um processo democraacutetico jaacute que todos aprendem as mesmas coisas tecircm acesso as mesmas informaccedilotildees ainda que possam ser portadores de outras informaccedilotildees aiacute natildeo consideradas Para esse professor a diversidade do social tatildeo difiacutecil de ser tratada fonte de tantos desencontros seria finalmente erradicada e as trajetoacuterias diferenciadas de seus alunos resultariam de competecircncias individuais que independe dele proacuteprio enquanto professor Aleacutem de um engano tal postura eacute um equiacutevoco e resulta em uma praacutetica autoritaacuteria constituindo um olhar que natildeo vecirc o outro que aiacute estaacute pois o vecirc de cima e distante

~ I

TONUCCI (1973) A crianccedila aquela que eacute sempre vista de cima

20 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

o desafio que permanece eacute entatildeo compreender a educaccedilatildeo enquanto processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca permanente entre diferentes Como fazecirc-lo se como dizem Moyseacutes e Collares (apud Quinteiro 2000 p 31) eacute comum no discurso 1shydos professores o argumento de que as crianccedilas natildeo aprendem porque satildeo pobres sujas desnutridas imaturas negras nordestinas natildeo aprendem porque seus pais satildeo analfabetos alcooacutelatras e as matildees trabalham fora

Para Sarmento amp Pinto (1997 p 26) eacute preciso que o adulto natildeo projete o seu olhar sobre as crianccedilas colhendo junto delas apenas aquilo que eacute reflexo conjunto dos seus proacuteprios preconceitos e representaccedilotildees

Neste sentido agrave guisa de reflexatildeo alguns exemplos de como o aluno da Rede Puacuteblica de Ensino do Rio de Janeiro eacute visto por alguns de seus professores satildeo significativos De acordo com Quinteiro (2000) dizem eles

bull esse garoto eacute uma praga mesmo eacute uma dessas criaturas que Deus produziu num dia que estava puto Soacute podia ser da turma da farrulia Adams

bull natildeo prestam para nada satildeo faltosos graccedilas a Deus fazem revezamento Aquelas alunas satildeo uns estrupiacutecios morreram e se esqueceram de deitar

bull turma antipaacutetica nunca estatildeo dispostos a nada [ ] Eles natildeo existem para mim As vezes eu me pergunto se morri desencamei e vim parar no inferno dessa turma

bull o aluno eacute um ser mutante Acho-os feios assustadores natildeo conseguem entender nada

bull tem um menino na minha sala que vive rindo e eu pergunto para ele que caboclo vocecirc estaacute recebendo E ele continua

rindo parece um orangotango

~ A pergunta eacute qual o preparo desses professores para estabelecer um processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca

I Como no cotidiano superar a discriminaccedilatildeo e a exclusatildeo social presentes no contexto social e intensamente reproduzido na escola

r Revista Mediaccedilatildees Londrina v5 n2 p9middot28 judez2000 21

22

Do aprender aaprender aprendizagem ediferenccedila

o caraacuteter ideoloacutegico das representaccedilotildees sobre a crianccedila alunos do ensino fundamental tanto quanto uma concepccedilatildeo idiacutelica e idealista da crianccedila segundo Quinteiro (2000) influencia e caracteriza a praacutetica pedagoacutegica Para a autora isto exige romper com a cultura oficial mudar mentalidade em direccedilatildeo agrave uma consciecircncia de classe para que a professoraprofessor possa compreender-se enquanto ser social que supere o senso comum e concomitantemente altere tanto as suas relaccedilotildees de trabalho quanto as condiccedilotildees objetivas da praacutetica educativa (op cit p 91) Mas para isso eacute preciso saber ouvir e se dispor a ouvir o que seu aluno tem a dizer a respeito de si mesmo e do outro que com ele

partilha a vida partilha o dia-a-dia incluindo O proacuteprio professor Poreacutem

isso natildeo eacute nada simples daiacute a surpresa do aluno das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista ao descobrir que seu professor o ouve Diz ele

Minha professora eacute diferente ela me escuta natildeo me ignora trata todo

mundo igual natildeo trata melhor do que o outro (In Quinteiro 2000)

Na tentativa de ouvir as vozes do outro as falas que se seguem satildeo falas de crianccedilas e jovens que chegam a escola puacuteblica portando marcas sociais inscritas no corpo postura linguagem percepccedilatildeo de mundo e de realidade e que de acordo com elas resignificam o mundo escolar atraveacutes dessas relaccedilotildees trazendo assim para dentro dos muros da instituiccedilatildeo aquilo que constantemente lhes eacute negado suas histoacuterias sua cultura e seus mundos (Dayrell 1996 p138)

o que dizem e como pensam os alunos das escolas puacuteblicas do Rio de Janeiro Quinteiro (2000) ressalta

bull de longe a escola parece um presiacutedio bull (gostaria) de jogar uma bomba e explodir tudo bull completava todos os tempos vagos com diversas coisas ateacute

lazer para os alunos porque a gente natildeo tem isso na escola bull pintava a escola ajeitava as janelas e fazia uma quadra de esportes

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 9: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

de aprender eacute explicada pelo fato de se ser paraibano nordestino favelado vesgo canhoto filho de prostituta (Santos 1989 p73)

Educar eacute entatildeo um desafio posto que se processa no interior de um embate entre interesses dominaccedilatildeo exploraccedilatildeo revelando a existecircncia do poder e seu exerciacutecio sobre os indiviacuteduos grupos ou

sociedades tidos como diferentes Educar tem sido o meio pelo qual o

diferente deve ser transformado em igual para que se possa submeter dominar e explorar em nome de um modelo cultural que se acredita natural universal e humano (Gusmatildeo op cit 43)

No campo de forccedila que envolve as relaccedilotildees da escola frente aos diferentes e frente agrave diferenccedila cultural proacutepria da sociedade brasileira J oel Rufino dos Santos afirma existir uma imensa ingenuidade Para ele eacute ingecircnuo pensar em salvar o ensino a partir de uma falsa noccedilatildeo de igualdade que desconsidera e faz taacutebula rasa das diferenccedilas

Exemplar eacute a reaccedilatildeo de professores e dirigentes de escola quando indagados sobre as diferenccedilas do alunado Eacute frequumlente se ouvir que naquela escola todos satildeo iguais e que aos olhos do educador natildeo haacute

diferenccedila No entanto todos sabemos que essa igualdade natildeo eacute real Os

alunos que ali estatildeo tecircm as mais diferentes origens satildeo portadores de

diferentes histoacuterias de vida as quais informam seu modo de ser e suas possibilidades de aprender Por que entatildeo os dizemos iguais Porque todos satildeo vistos a partir do lugar que ocupam no interior da escola Ali eles satildeo alunos categoria geral e abstrata que tal como a categoria iacutendio coloca a todos no mesmo saco e nega as diferenccedilas que os tomam cada um sujeitos soacutecio-culturais Diante da pergunta de quem satildeo os jovens e o que vatildeo buscar na escola Dayrell (1996 p139) afirma que

Para grande parte dos professores perguntas como estas natildeo fazem muito sentido pois a resposta eacute oacutebvia satildeo alunos E eacute essa categoria que vai informar seu olhar e as relaccedilotildees que manteacutem com os jovens a compreensatildeo de suas atitudes e expectativas Assim independente do

sexo idade da origem social das expectativas vivenciadas todos satildeo

considerados igualmente alunos procuram a escola com as mesmas expectativas e necessidades ( ) A homogeneizaccedilatildeo dos sujeitos como alunos corresponde agrave homogeneizaccedilatildeo da instituiccedilatildeo escolar compreendida como universal

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000 17

18

Por outro lado diz Ioel Rufino dos Santos eacute ingenuidade tambeacutem pensar em salvar o ensino pura e simplesmente pelo reconhecimento das diferenccedilas culturais Fazecirc-lo eacute reificar a cultura como se as diferenccedilas pudessem ser contidas e explicadas por si mesmas por uma essecircncia proacutepria que afirma que cada um eacute um que se eacute assim por causa da cultura

oprocesso educativo entre oensinar e o aprender

Nem a igualdade absoluta nem a diferenccedila relativa satildeo efetivamente adequadas para compreender e solucionar o problema da diversidade social e cultural Nisto reside o paradoxo e o desafio de nossas praacuteticas e propostas educativas Nelas o que estaacute em jogo mais que as diferenccedilas e a imensa diversidade que nos informa eacute a alteridade - espaccedilo permanente de enfrentamento tensatildeo e complementariedade Nestaacute medida a escola mais que um espaccedilo de socializaccedilatildeo toma-se um espaccedilo de sociabilidades ou seja um espaccedilo de encontros e desencontros de buscas e de perdas de descobertas e de encobrimentos de vida e de negaccedilatildeo da vida A escola por essa perspectiva eacute antes de mais nada um espaccedilo soacutecio-cultural

Analisar a escola como espaccedilo soacutecio-cultural significa compreendecirc-la na

oacutetica da cultura sob um olhar mais denso que leva em conta a dimensatildeo

do dinamismo do fazer cotidiano levado a efeito por homens e mulheres

trabalhadores e trabalhadoras negros e brancos adultos e adolescentes

enfim alunos e professores seres humanos concretos sujeitos sociais e

histoacutericos presentes na histoacuteria atores da histoacuteria Falar da escola como

espaccedilo soacutecio-cultural implica em resgatar o papel dos sujeitos na trama

social que a constitui enquanto instituiccedilatildeo [ ] A escola como espaccedilo

soacutecio-cultural eacute entendida portanto como um espaccedilo social proacuteprio

ordenado em dupla dimensatildeo Institucionalmente por um conjunto de

normas e de regras que buscam unificar e delimitar a accedilatildeo de seus

sujeitos Cotidianamente por uma complexa trama de relaccedilotildees sociais

entre sujeitos envolvidos que incluem alianccedilas e conflitos imposiccedilotildees

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5n2 p9middot28 juldez 2000

de normas e estrateacutegias individuais ou coletivas de transgressatildeo e de acordos Um processo de apropriaccedilatildeo constante dos espaccedilos das normas das praacuteticas e dos saberes que datildeo forma agrave vida escolar Fruto da accedilatildeo reciacuteproca entre o sujeito e a instituiccedilatildeo esse processo como tal eacute heterogecircneo(Dayrell op cit p 136-137)

A heterogeneidade poreacutem encontra-se institucionalmente negada como negada estaacute a condiccedilatildeo soacutecio-cultural dos alunos na

medida que a escola pratica o ensino e nega a aprendizagem Isto eacute a escola organiza os processos de compreensatildeo da realidade como universal e uacutenica tomando por base um saber formal e abstrato distanciado do aluno de sua vida e experiecircncia O saber que se ensina eacute entatildeo redutor de culturas que informam as realidades vividas dos sujeitos e desloca suas vidas das problemaacuteticas imediatas que as envolve acreditando que o aluno eacute uma taacutebula rasa sobre a qual deve-se inscrever o conhecimento tido como real e legiacutetimo Assim a escola representa um saber positivista perante um saber cultural (lturra 1990 p55)

Eacute aqui que a pluralidade cultural de grupos eacutetnicos sociais ou culturais necessita ser pensada como mateacuteria-prima da aprendizagem poreacutem nunca como conteuacutedo de dias especiais datas comemorativas ou momentos determinados em sala de aula Fazer isso eacute congelar a cultura reificaacute-Ia transformaacute-Ia em recurso de folclorizaccedilatildeo e como tal acentuar as diferenccedilas Nesse processo rompe-se a possibilidade de comunicaccedilatildeo e de aprendizagem para reforccedilar os mecanismos discriminatoacuterios e a desigualdade instaurando a impossibilidade da troca e dos processos de equumlidade entre sujeitos diferentes Eacute preciso

I compreender que o ensino eacute repetir criando uma subordinaccedilatildeo a r aprendizagem eacute descobrir criando uma relaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo (lturra 1990 p 31)

Para Santos (1989) a questatildeo estaacute no fato de haver um mecanismo que separa a educaccedilatildeo do ensino e nisto reside a esquizofrenia da escola brasileira Diz ele

Educaccedilatildeo seria tudo o que se transmite de qualquer maneira formal ou informalmente todo o tempo aos menos experientes sem objetivos

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28juldez 2000 19

especiacuteficos Ensino seria uma particularizaccedilatildeo da educaccedilatildeo atraveacutes de

determinada maneira (isto eacute utilizando a escola) formal ou

informalmente num tempo exclusivo com o objetivo especiacutefico de treinar

uma competecircncia particular Pois bem eacute evidente que natildeo se pode colocar

as pessoas que educam rio lugar das que ensinam Estamos condenados a

lamentar essa contradiccedilatildeo para sempre (op cit p 28)

Os que ensinam preocupam-se em utilizando a escola e sua organizaccedilatildeo num dado tempo treinar seus alunos para competecircncias especiacuteficas somar dividir contar ler escrever Imaginam ser esse o caminho legitimo de tomando seus alunos como iguais instaurar um processo democraacutetico jaacute que todos aprendem as mesmas coisas tecircm acesso as mesmas informaccedilotildees ainda que possam ser portadores de outras informaccedilotildees aiacute natildeo consideradas Para esse professor a diversidade do social tatildeo difiacutecil de ser tratada fonte de tantos desencontros seria finalmente erradicada e as trajetoacuterias diferenciadas de seus alunos resultariam de competecircncias individuais que independe dele proacuteprio enquanto professor Aleacutem de um engano tal postura eacute um equiacutevoco e resulta em uma praacutetica autoritaacuteria constituindo um olhar que natildeo vecirc o outro que aiacute estaacute pois o vecirc de cima e distante

~ I

TONUCCI (1973) A crianccedila aquela que eacute sempre vista de cima

20 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

o desafio que permanece eacute entatildeo compreender a educaccedilatildeo enquanto processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca permanente entre diferentes Como fazecirc-lo se como dizem Moyseacutes e Collares (apud Quinteiro 2000 p 31) eacute comum no discurso 1shydos professores o argumento de que as crianccedilas natildeo aprendem porque satildeo pobres sujas desnutridas imaturas negras nordestinas natildeo aprendem porque seus pais satildeo analfabetos alcooacutelatras e as matildees trabalham fora

Para Sarmento amp Pinto (1997 p 26) eacute preciso que o adulto natildeo projete o seu olhar sobre as crianccedilas colhendo junto delas apenas aquilo que eacute reflexo conjunto dos seus proacuteprios preconceitos e representaccedilotildees

Neste sentido agrave guisa de reflexatildeo alguns exemplos de como o aluno da Rede Puacuteblica de Ensino do Rio de Janeiro eacute visto por alguns de seus professores satildeo significativos De acordo com Quinteiro (2000) dizem eles

bull esse garoto eacute uma praga mesmo eacute uma dessas criaturas que Deus produziu num dia que estava puto Soacute podia ser da turma da farrulia Adams

bull natildeo prestam para nada satildeo faltosos graccedilas a Deus fazem revezamento Aquelas alunas satildeo uns estrupiacutecios morreram e se esqueceram de deitar

bull turma antipaacutetica nunca estatildeo dispostos a nada [ ] Eles natildeo existem para mim As vezes eu me pergunto se morri desencamei e vim parar no inferno dessa turma

bull o aluno eacute um ser mutante Acho-os feios assustadores natildeo conseguem entender nada

bull tem um menino na minha sala que vive rindo e eu pergunto para ele que caboclo vocecirc estaacute recebendo E ele continua

rindo parece um orangotango

~ A pergunta eacute qual o preparo desses professores para estabelecer um processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca

I Como no cotidiano superar a discriminaccedilatildeo e a exclusatildeo social presentes no contexto social e intensamente reproduzido na escola

r Revista Mediaccedilatildees Londrina v5 n2 p9middot28 judez2000 21

22

Do aprender aaprender aprendizagem ediferenccedila

o caraacuteter ideoloacutegico das representaccedilotildees sobre a crianccedila alunos do ensino fundamental tanto quanto uma concepccedilatildeo idiacutelica e idealista da crianccedila segundo Quinteiro (2000) influencia e caracteriza a praacutetica pedagoacutegica Para a autora isto exige romper com a cultura oficial mudar mentalidade em direccedilatildeo agrave uma consciecircncia de classe para que a professoraprofessor possa compreender-se enquanto ser social que supere o senso comum e concomitantemente altere tanto as suas relaccedilotildees de trabalho quanto as condiccedilotildees objetivas da praacutetica educativa (op cit p 91) Mas para isso eacute preciso saber ouvir e se dispor a ouvir o que seu aluno tem a dizer a respeito de si mesmo e do outro que com ele

partilha a vida partilha o dia-a-dia incluindo O proacuteprio professor Poreacutem

isso natildeo eacute nada simples daiacute a surpresa do aluno das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista ao descobrir que seu professor o ouve Diz ele

Minha professora eacute diferente ela me escuta natildeo me ignora trata todo

mundo igual natildeo trata melhor do que o outro (In Quinteiro 2000)

Na tentativa de ouvir as vozes do outro as falas que se seguem satildeo falas de crianccedilas e jovens que chegam a escola puacuteblica portando marcas sociais inscritas no corpo postura linguagem percepccedilatildeo de mundo e de realidade e que de acordo com elas resignificam o mundo escolar atraveacutes dessas relaccedilotildees trazendo assim para dentro dos muros da instituiccedilatildeo aquilo que constantemente lhes eacute negado suas histoacuterias sua cultura e seus mundos (Dayrell 1996 p138)

o que dizem e como pensam os alunos das escolas puacuteblicas do Rio de Janeiro Quinteiro (2000) ressalta

bull de longe a escola parece um presiacutedio bull (gostaria) de jogar uma bomba e explodir tudo bull completava todos os tempos vagos com diversas coisas ateacute

lazer para os alunos porque a gente natildeo tem isso na escola bull pintava a escola ajeitava as janelas e fazia uma quadra de esportes

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 10: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

18

Por outro lado diz Ioel Rufino dos Santos eacute ingenuidade tambeacutem pensar em salvar o ensino pura e simplesmente pelo reconhecimento das diferenccedilas culturais Fazecirc-lo eacute reificar a cultura como se as diferenccedilas pudessem ser contidas e explicadas por si mesmas por uma essecircncia proacutepria que afirma que cada um eacute um que se eacute assim por causa da cultura

oprocesso educativo entre oensinar e o aprender

Nem a igualdade absoluta nem a diferenccedila relativa satildeo efetivamente adequadas para compreender e solucionar o problema da diversidade social e cultural Nisto reside o paradoxo e o desafio de nossas praacuteticas e propostas educativas Nelas o que estaacute em jogo mais que as diferenccedilas e a imensa diversidade que nos informa eacute a alteridade - espaccedilo permanente de enfrentamento tensatildeo e complementariedade Nestaacute medida a escola mais que um espaccedilo de socializaccedilatildeo toma-se um espaccedilo de sociabilidades ou seja um espaccedilo de encontros e desencontros de buscas e de perdas de descobertas e de encobrimentos de vida e de negaccedilatildeo da vida A escola por essa perspectiva eacute antes de mais nada um espaccedilo soacutecio-cultural

Analisar a escola como espaccedilo soacutecio-cultural significa compreendecirc-la na

oacutetica da cultura sob um olhar mais denso que leva em conta a dimensatildeo

do dinamismo do fazer cotidiano levado a efeito por homens e mulheres

trabalhadores e trabalhadoras negros e brancos adultos e adolescentes

enfim alunos e professores seres humanos concretos sujeitos sociais e

histoacutericos presentes na histoacuteria atores da histoacuteria Falar da escola como

espaccedilo soacutecio-cultural implica em resgatar o papel dos sujeitos na trama

social que a constitui enquanto instituiccedilatildeo [ ] A escola como espaccedilo

soacutecio-cultural eacute entendida portanto como um espaccedilo social proacuteprio

ordenado em dupla dimensatildeo Institucionalmente por um conjunto de

normas e de regras que buscam unificar e delimitar a accedilatildeo de seus

sujeitos Cotidianamente por uma complexa trama de relaccedilotildees sociais

entre sujeitos envolvidos que incluem alianccedilas e conflitos imposiccedilotildees

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5n2 p9middot28 juldez 2000

de normas e estrateacutegias individuais ou coletivas de transgressatildeo e de acordos Um processo de apropriaccedilatildeo constante dos espaccedilos das normas das praacuteticas e dos saberes que datildeo forma agrave vida escolar Fruto da accedilatildeo reciacuteproca entre o sujeito e a instituiccedilatildeo esse processo como tal eacute heterogecircneo(Dayrell op cit p 136-137)

A heterogeneidade poreacutem encontra-se institucionalmente negada como negada estaacute a condiccedilatildeo soacutecio-cultural dos alunos na

medida que a escola pratica o ensino e nega a aprendizagem Isto eacute a escola organiza os processos de compreensatildeo da realidade como universal e uacutenica tomando por base um saber formal e abstrato distanciado do aluno de sua vida e experiecircncia O saber que se ensina eacute entatildeo redutor de culturas que informam as realidades vividas dos sujeitos e desloca suas vidas das problemaacuteticas imediatas que as envolve acreditando que o aluno eacute uma taacutebula rasa sobre a qual deve-se inscrever o conhecimento tido como real e legiacutetimo Assim a escola representa um saber positivista perante um saber cultural (lturra 1990 p55)

Eacute aqui que a pluralidade cultural de grupos eacutetnicos sociais ou culturais necessita ser pensada como mateacuteria-prima da aprendizagem poreacutem nunca como conteuacutedo de dias especiais datas comemorativas ou momentos determinados em sala de aula Fazer isso eacute congelar a cultura reificaacute-Ia transformaacute-Ia em recurso de folclorizaccedilatildeo e como tal acentuar as diferenccedilas Nesse processo rompe-se a possibilidade de comunicaccedilatildeo e de aprendizagem para reforccedilar os mecanismos discriminatoacuterios e a desigualdade instaurando a impossibilidade da troca e dos processos de equumlidade entre sujeitos diferentes Eacute preciso

I compreender que o ensino eacute repetir criando uma subordinaccedilatildeo a r aprendizagem eacute descobrir criando uma relaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo (lturra 1990 p 31)

Para Santos (1989) a questatildeo estaacute no fato de haver um mecanismo que separa a educaccedilatildeo do ensino e nisto reside a esquizofrenia da escola brasileira Diz ele

Educaccedilatildeo seria tudo o que se transmite de qualquer maneira formal ou informalmente todo o tempo aos menos experientes sem objetivos

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28juldez 2000 19

especiacuteficos Ensino seria uma particularizaccedilatildeo da educaccedilatildeo atraveacutes de

determinada maneira (isto eacute utilizando a escola) formal ou

informalmente num tempo exclusivo com o objetivo especiacutefico de treinar

uma competecircncia particular Pois bem eacute evidente que natildeo se pode colocar

as pessoas que educam rio lugar das que ensinam Estamos condenados a

lamentar essa contradiccedilatildeo para sempre (op cit p 28)

Os que ensinam preocupam-se em utilizando a escola e sua organizaccedilatildeo num dado tempo treinar seus alunos para competecircncias especiacuteficas somar dividir contar ler escrever Imaginam ser esse o caminho legitimo de tomando seus alunos como iguais instaurar um processo democraacutetico jaacute que todos aprendem as mesmas coisas tecircm acesso as mesmas informaccedilotildees ainda que possam ser portadores de outras informaccedilotildees aiacute natildeo consideradas Para esse professor a diversidade do social tatildeo difiacutecil de ser tratada fonte de tantos desencontros seria finalmente erradicada e as trajetoacuterias diferenciadas de seus alunos resultariam de competecircncias individuais que independe dele proacuteprio enquanto professor Aleacutem de um engano tal postura eacute um equiacutevoco e resulta em uma praacutetica autoritaacuteria constituindo um olhar que natildeo vecirc o outro que aiacute estaacute pois o vecirc de cima e distante

~ I

TONUCCI (1973) A crianccedila aquela que eacute sempre vista de cima

20 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

o desafio que permanece eacute entatildeo compreender a educaccedilatildeo enquanto processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca permanente entre diferentes Como fazecirc-lo se como dizem Moyseacutes e Collares (apud Quinteiro 2000 p 31) eacute comum no discurso 1shydos professores o argumento de que as crianccedilas natildeo aprendem porque satildeo pobres sujas desnutridas imaturas negras nordestinas natildeo aprendem porque seus pais satildeo analfabetos alcooacutelatras e as matildees trabalham fora

Para Sarmento amp Pinto (1997 p 26) eacute preciso que o adulto natildeo projete o seu olhar sobre as crianccedilas colhendo junto delas apenas aquilo que eacute reflexo conjunto dos seus proacuteprios preconceitos e representaccedilotildees

Neste sentido agrave guisa de reflexatildeo alguns exemplos de como o aluno da Rede Puacuteblica de Ensino do Rio de Janeiro eacute visto por alguns de seus professores satildeo significativos De acordo com Quinteiro (2000) dizem eles

bull esse garoto eacute uma praga mesmo eacute uma dessas criaturas que Deus produziu num dia que estava puto Soacute podia ser da turma da farrulia Adams

bull natildeo prestam para nada satildeo faltosos graccedilas a Deus fazem revezamento Aquelas alunas satildeo uns estrupiacutecios morreram e se esqueceram de deitar

bull turma antipaacutetica nunca estatildeo dispostos a nada [ ] Eles natildeo existem para mim As vezes eu me pergunto se morri desencamei e vim parar no inferno dessa turma

bull o aluno eacute um ser mutante Acho-os feios assustadores natildeo conseguem entender nada

bull tem um menino na minha sala que vive rindo e eu pergunto para ele que caboclo vocecirc estaacute recebendo E ele continua

rindo parece um orangotango

~ A pergunta eacute qual o preparo desses professores para estabelecer um processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca

I Como no cotidiano superar a discriminaccedilatildeo e a exclusatildeo social presentes no contexto social e intensamente reproduzido na escola

r Revista Mediaccedilatildees Londrina v5 n2 p9middot28 judez2000 21

22

Do aprender aaprender aprendizagem ediferenccedila

o caraacuteter ideoloacutegico das representaccedilotildees sobre a crianccedila alunos do ensino fundamental tanto quanto uma concepccedilatildeo idiacutelica e idealista da crianccedila segundo Quinteiro (2000) influencia e caracteriza a praacutetica pedagoacutegica Para a autora isto exige romper com a cultura oficial mudar mentalidade em direccedilatildeo agrave uma consciecircncia de classe para que a professoraprofessor possa compreender-se enquanto ser social que supere o senso comum e concomitantemente altere tanto as suas relaccedilotildees de trabalho quanto as condiccedilotildees objetivas da praacutetica educativa (op cit p 91) Mas para isso eacute preciso saber ouvir e se dispor a ouvir o que seu aluno tem a dizer a respeito de si mesmo e do outro que com ele

partilha a vida partilha o dia-a-dia incluindo O proacuteprio professor Poreacutem

isso natildeo eacute nada simples daiacute a surpresa do aluno das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista ao descobrir que seu professor o ouve Diz ele

Minha professora eacute diferente ela me escuta natildeo me ignora trata todo

mundo igual natildeo trata melhor do que o outro (In Quinteiro 2000)

Na tentativa de ouvir as vozes do outro as falas que se seguem satildeo falas de crianccedilas e jovens que chegam a escola puacuteblica portando marcas sociais inscritas no corpo postura linguagem percepccedilatildeo de mundo e de realidade e que de acordo com elas resignificam o mundo escolar atraveacutes dessas relaccedilotildees trazendo assim para dentro dos muros da instituiccedilatildeo aquilo que constantemente lhes eacute negado suas histoacuterias sua cultura e seus mundos (Dayrell 1996 p138)

o que dizem e como pensam os alunos das escolas puacuteblicas do Rio de Janeiro Quinteiro (2000) ressalta

bull de longe a escola parece um presiacutedio bull (gostaria) de jogar uma bomba e explodir tudo bull completava todos os tempos vagos com diversas coisas ateacute

lazer para os alunos porque a gente natildeo tem isso na escola bull pintava a escola ajeitava as janelas e fazia uma quadra de esportes

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 11: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

de normas e estrateacutegias individuais ou coletivas de transgressatildeo e de acordos Um processo de apropriaccedilatildeo constante dos espaccedilos das normas das praacuteticas e dos saberes que datildeo forma agrave vida escolar Fruto da accedilatildeo reciacuteproca entre o sujeito e a instituiccedilatildeo esse processo como tal eacute heterogecircneo(Dayrell op cit p 136-137)

A heterogeneidade poreacutem encontra-se institucionalmente negada como negada estaacute a condiccedilatildeo soacutecio-cultural dos alunos na

medida que a escola pratica o ensino e nega a aprendizagem Isto eacute a escola organiza os processos de compreensatildeo da realidade como universal e uacutenica tomando por base um saber formal e abstrato distanciado do aluno de sua vida e experiecircncia O saber que se ensina eacute entatildeo redutor de culturas que informam as realidades vividas dos sujeitos e desloca suas vidas das problemaacuteticas imediatas que as envolve acreditando que o aluno eacute uma taacutebula rasa sobre a qual deve-se inscrever o conhecimento tido como real e legiacutetimo Assim a escola representa um saber positivista perante um saber cultural (lturra 1990 p55)

Eacute aqui que a pluralidade cultural de grupos eacutetnicos sociais ou culturais necessita ser pensada como mateacuteria-prima da aprendizagem poreacutem nunca como conteuacutedo de dias especiais datas comemorativas ou momentos determinados em sala de aula Fazer isso eacute congelar a cultura reificaacute-Ia transformaacute-Ia em recurso de folclorizaccedilatildeo e como tal acentuar as diferenccedilas Nesse processo rompe-se a possibilidade de comunicaccedilatildeo e de aprendizagem para reforccedilar os mecanismos discriminatoacuterios e a desigualdade instaurando a impossibilidade da troca e dos processos de equumlidade entre sujeitos diferentes Eacute preciso

I compreender que o ensino eacute repetir criando uma subordinaccedilatildeo a r aprendizagem eacute descobrir criando uma relaccedilatildeo de comunicaccedilatildeo (lturra 1990 p 31)

Para Santos (1989) a questatildeo estaacute no fato de haver um mecanismo que separa a educaccedilatildeo do ensino e nisto reside a esquizofrenia da escola brasileira Diz ele

Educaccedilatildeo seria tudo o que se transmite de qualquer maneira formal ou informalmente todo o tempo aos menos experientes sem objetivos

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9-28juldez 2000 19

especiacuteficos Ensino seria uma particularizaccedilatildeo da educaccedilatildeo atraveacutes de

determinada maneira (isto eacute utilizando a escola) formal ou

informalmente num tempo exclusivo com o objetivo especiacutefico de treinar

uma competecircncia particular Pois bem eacute evidente que natildeo se pode colocar

as pessoas que educam rio lugar das que ensinam Estamos condenados a

lamentar essa contradiccedilatildeo para sempre (op cit p 28)

Os que ensinam preocupam-se em utilizando a escola e sua organizaccedilatildeo num dado tempo treinar seus alunos para competecircncias especiacuteficas somar dividir contar ler escrever Imaginam ser esse o caminho legitimo de tomando seus alunos como iguais instaurar um processo democraacutetico jaacute que todos aprendem as mesmas coisas tecircm acesso as mesmas informaccedilotildees ainda que possam ser portadores de outras informaccedilotildees aiacute natildeo consideradas Para esse professor a diversidade do social tatildeo difiacutecil de ser tratada fonte de tantos desencontros seria finalmente erradicada e as trajetoacuterias diferenciadas de seus alunos resultariam de competecircncias individuais que independe dele proacuteprio enquanto professor Aleacutem de um engano tal postura eacute um equiacutevoco e resulta em uma praacutetica autoritaacuteria constituindo um olhar que natildeo vecirc o outro que aiacute estaacute pois o vecirc de cima e distante

~ I

TONUCCI (1973) A crianccedila aquela que eacute sempre vista de cima

20 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

o desafio que permanece eacute entatildeo compreender a educaccedilatildeo enquanto processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca permanente entre diferentes Como fazecirc-lo se como dizem Moyseacutes e Collares (apud Quinteiro 2000 p 31) eacute comum no discurso 1shydos professores o argumento de que as crianccedilas natildeo aprendem porque satildeo pobres sujas desnutridas imaturas negras nordestinas natildeo aprendem porque seus pais satildeo analfabetos alcooacutelatras e as matildees trabalham fora

Para Sarmento amp Pinto (1997 p 26) eacute preciso que o adulto natildeo projete o seu olhar sobre as crianccedilas colhendo junto delas apenas aquilo que eacute reflexo conjunto dos seus proacuteprios preconceitos e representaccedilotildees

Neste sentido agrave guisa de reflexatildeo alguns exemplos de como o aluno da Rede Puacuteblica de Ensino do Rio de Janeiro eacute visto por alguns de seus professores satildeo significativos De acordo com Quinteiro (2000) dizem eles

bull esse garoto eacute uma praga mesmo eacute uma dessas criaturas que Deus produziu num dia que estava puto Soacute podia ser da turma da farrulia Adams

bull natildeo prestam para nada satildeo faltosos graccedilas a Deus fazem revezamento Aquelas alunas satildeo uns estrupiacutecios morreram e se esqueceram de deitar

bull turma antipaacutetica nunca estatildeo dispostos a nada [ ] Eles natildeo existem para mim As vezes eu me pergunto se morri desencamei e vim parar no inferno dessa turma

bull o aluno eacute um ser mutante Acho-os feios assustadores natildeo conseguem entender nada

bull tem um menino na minha sala que vive rindo e eu pergunto para ele que caboclo vocecirc estaacute recebendo E ele continua

rindo parece um orangotango

~ A pergunta eacute qual o preparo desses professores para estabelecer um processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca

I Como no cotidiano superar a discriminaccedilatildeo e a exclusatildeo social presentes no contexto social e intensamente reproduzido na escola

r Revista Mediaccedilatildees Londrina v5 n2 p9middot28 judez2000 21

22

Do aprender aaprender aprendizagem ediferenccedila

o caraacuteter ideoloacutegico das representaccedilotildees sobre a crianccedila alunos do ensino fundamental tanto quanto uma concepccedilatildeo idiacutelica e idealista da crianccedila segundo Quinteiro (2000) influencia e caracteriza a praacutetica pedagoacutegica Para a autora isto exige romper com a cultura oficial mudar mentalidade em direccedilatildeo agrave uma consciecircncia de classe para que a professoraprofessor possa compreender-se enquanto ser social que supere o senso comum e concomitantemente altere tanto as suas relaccedilotildees de trabalho quanto as condiccedilotildees objetivas da praacutetica educativa (op cit p 91) Mas para isso eacute preciso saber ouvir e se dispor a ouvir o que seu aluno tem a dizer a respeito de si mesmo e do outro que com ele

partilha a vida partilha o dia-a-dia incluindo O proacuteprio professor Poreacutem

isso natildeo eacute nada simples daiacute a surpresa do aluno das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista ao descobrir que seu professor o ouve Diz ele

Minha professora eacute diferente ela me escuta natildeo me ignora trata todo

mundo igual natildeo trata melhor do que o outro (In Quinteiro 2000)

Na tentativa de ouvir as vozes do outro as falas que se seguem satildeo falas de crianccedilas e jovens que chegam a escola puacuteblica portando marcas sociais inscritas no corpo postura linguagem percepccedilatildeo de mundo e de realidade e que de acordo com elas resignificam o mundo escolar atraveacutes dessas relaccedilotildees trazendo assim para dentro dos muros da instituiccedilatildeo aquilo que constantemente lhes eacute negado suas histoacuterias sua cultura e seus mundos (Dayrell 1996 p138)

o que dizem e como pensam os alunos das escolas puacuteblicas do Rio de Janeiro Quinteiro (2000) ressalta

bull de longe a escola parece um presiacutedio bull (gostaria) de jogar uma bomba e explodir tudo bull completava todos os tempos vagos com diversas coisas ateacute

lazer para os alunos porque a gente natildeo tem isso na escola bull pintava a escola ajeitava as janelas e fazia uma quadra de esportes

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 12: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

especiacuteficos Ensino seria uma particularizaccedilatildeo da educaccedilatildeo atraveacutes de

determinada maneira (isto eacute utilizando a escola) formal ou

informalmente num tempo exclusivo com o objetivo especiacutefico de treinar

uma competecircncia particular Pois bem eacute evidente que natildeo se pode colocar

as pessoas que educam rio lugar das que ensinam Estamos condenados a

lamentar essa contradiccedilatildeo para sempre (op cit p 28)

Os que ensinam preocupam-se em utilizando a escola e sua organizaccedilatildeo num dado tempo treinar seus alunos para competecircncias especiacuteficas somar dividir contar ler escrever Imaginam ser esse o caminho legitimo de tomando seus alunos como iguais instaurar um processo democraacutetico jaacute que todos aprendem as mesmas coisas tecircm acesso as mesmas informaccedilotildees ainda que possam ser portadores de outras informaccedilotildees aiacute natildeo consideradas Para esse professor a diversidade do social tatildeo difiacutecil de ser tratada fonte de tantos desencontros seria finalmente erradicada e as trajetoacuterias diferenciadas de seus alunos resultariam de competecircncias individuais que independe dele proacuteprio enquanto professor Aleacutem de um engano tal postura eacute um equiacutevoco e resulta em uma praacutetica autoritaacuteria constituindo um olhar que natildeo vecirc o outro que aiacute estaacute pois o vecirc de cima e distante

~ I

TONUCCI (1973) A crianccedila aquela que eacute sempre vista de cima

20 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

o desafio que permanece eacute entatildeo compreender a educaccedilatildeo enquanto processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca permanente entre diferentes Como fazecirc-lo se como dizem Moyseacutes e Collares (apud Quinteiro 2000 p 31) eacute comum no discurso 1shydos professores o argumento de que as crianccedilas natildeo aprendem porque satildeo pobres sujas desnutridas imaturas negras nordestinas natildeo aprendem porque seus pais satildeo analfabetos alcooacutelatras e as matildees trabalham fora

Para Sarmento amp Pinto (1997 p 26) eacute preciso que o adulto natildeo projete o seu olhar sobre as crianccedilas colhendo junto delas apenas aquilo que eacute reflexo conjunto dos seus proacuteprios preconceitos e representaccedilotildees

Neste sentido agrave guisa de reflexatildeo alguns exemplos de como o aluno da Rede Puacuteblica de Ensino do Rio de Janeiro eacute visto por alguns de seus professores satildeo significativos De acordo com Quinteiro (2000) dizem eles

bull esse garoto eacute uma praga mesmo eacute uma dessas criaturas que Deus produziu num dia que estava puto Soacute podia ser da turma da farrulia Adams

bull natildeo prestam para nada satildeo faltosos graccedilas a Deus fazem revezamento Aquelas alunas satildeo uns estrupiacutecios morreram e se esqueceram de deitar

bull turma antipaacutetica nunca estatildeo dispostos a nada [ ] Eles natildeo existem para mim As vezes eu me pergunto se morri desencamei e vim parar no inferno dessa turma

bull o aluno eacute um ser mutante Acho-os feios assustadores natildeo conseguem entender nada

bull tem um menino na minha sala que vive rindo e eu pergunto para ele que caboclo vocecirc estaacute recebendo E ele continua

rindo parece um orangotango

~ A pergunta eacute qual o preparo desses professores para estabelecer um processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca

I Como no cotidiano superar a discriminaccedilatildeo e a exclusatildeo social presentes no contexto social e intensamente reproduzido na escola

r Revista Mediaccedilatildees Londrina v5 n2 p9middot28 judez2000 21

22

Do aprender aaprender aprendizagem ediferenccedila

o caraacuteter ideoloacutegico das representaccedilotildees sobre a crianccedila alunos do ensino fundamental tanto quanto uma concepccedilatildeo idiacutelica e idealista da crianccedila segundo Quinteiro (2000) influencia e caracteriza a praacutetica pedagoacutegica Para a autora isto exige romper com a cultura oficial mudar mentalidade em direccedilatildeo agrave uma consciecircncia de classe para que a professoraprofessor possa compreender-se enquanto ser social que supere o senso comum e concomitantemente altere tanto as suas relaccedilotildees de trabalho quanto as condiccedilotildees objetivas da praacutetica educativa (op cit p 91) Mas para isso eacute preciso saber ouvir e se dispor a ouvir o que seu aluno tem a dizer a respeito de si mesmo e do outro que com ele

partilha a vida partilha o dia-a-dia incluindo O proacuteprio professor Poreacutem

isso natildeo eacute nada simples daiacute a surpresa do aluno das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista ao descobrir que seu professor o ouve Diz ele

Minha professora eacute diferente ela me escuta natildeo me ignora trata todo

mundo igual natildeo trata melhor do que o outro (In Quinteiro 2000)

Na tentativa de ouvir as vozes do outro as falas que se seguem satildeo falas de crianccedilas e jovens que chegam a escola puacuteblica portando marcas sociais inscritas no corpo postura linguagem percepccedilatildeo de mundo e de realidade e que de acordo com elas resignificam o mundo escolar atraveacutes dessas relaccedilotildees trazendo assim para dentro dos muros da instituiccedilatildeo aquilo que constantemente lhes eacute negado suas histoacuterias sua cultura e seus mundos (Dayrell 1996 p138)

o que dizem e como pensam os alunos das escolas puacuteblicas do Rio de Janeiro Quinteiro (2000) ressalta

bull de longe a escola parece um presiacutedio bull (gostaria) de jogar uma bomba e explodir tudo bull completava todos os tempos vagos com diversas coisas ateacute

lazer para os alunos porque a gente natildeo tem isso na escola bull pintava a escola ajeitava as janelas e fazia uma quadra de esportes

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 13: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

o desafio que permanece eacute entatildeo compreender a educaccedilatildeo enquanto processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca permanente entre diferentes Como fazecirc-lo se como dizem Moyseacutes e Collares (apud Quinteiro 2000 p 31) eacute comum no discurso 1shydos professores o argumento de que as crianccedilas natildeo aprendem porque satildeo pobres sujas desnutridas imaturas negras nordestinas natildeo aprendem porque seus pais satildeo analfabetos alcooacutelatras e as matildees trabalham fora

Para Sarmento amp Pinto (1997 p 26) eacute preciso que o adulto natildeo projete o seu olhar sobre as crianccedilas colhendo junto delas apenas aquilo que eacute reflexo conjunto dos seus proacuteprios preconceitos e representaccedilotildees

Neste sentido agrave guisa de reflexatildeo alguns exemplos de como o aluno da Rede Puacuteblica de Ensino do Rio de Janeiro eacute visto por alguns de seus professores satildeo significativos De acordo com Quinteiro (2000) dizem eles

bull esse garoto eacute uma praga mesmo eacute uma dessas criaturas que Deus produziu num dia que estava puto Soacute podia ser da turma da farrulia Adams

bull natildeo prestam para nada satildeo faltosos graccedilas a Deus fazem revezamento Aquelas alunas satildeo uns estrupiacutecios morreram e se esqueceram de deitar

bull turma antipaacutetica nunca estatildeo dispostos a nada [ ] Eles natildeo existem para mim As vezes eu me pergunto se morri desencamei e vim parar no inferno dessa turma

bull o aluno eacute um ser mutante Acho-os feios assustadores natildeo conseguem entender nada

bull tem um menino na minha sala que vive rindo e eu pergunto para ele que caboclo vocecirc estaacute recebendo E ele continua

rindo parece um orangotango

~ A pergunta eacute qual o preparo desses professores para estabelecer um processo de aprendizagem baseado na comunicaccedilatildeo e na troca

I Como no cotidiano superar a discriminaccedilatildeo e a exclusatildeo social presentes no contexto social e intensamente reproduzido na escola

r Revista Mediaccedilatildees Londrina v5 n2 p9middot28 judez2000 21

22

Do aprender aaprender aprendizagem ediferenccedila

o caraacuteter ideoloacutegico das representaccedilotildees sobre a crianccedila alunos do ensino fundamental tanto quanto uma concepccedilatildeo idiacutelica e idealista da crianccedila segundo Quinteiro (2000) influencia e caracteriza a praacutetica pedagoacutegica Para a autora isto exige romper com a cultura oficial mudar mentalidade em direccedilatildeo agrave uma consciecircncia de classe para que a professoraprofessor possa compreender-se enquanto ser social que supere o senso comum e concomitantemente altere tanto as suas relaccedilotildees de trabalho quanto as condiccedilotildees objetivas da praacutetica educativa (op cit p 91) Mas para isso eacute preciso saber ouvir e se dispor a ouvir o que seu aluno tem a dizer a respeito de si mesmo e do outro que com ele

partilha a vida partilha o dia-a-dia incluindo O proacuteprio professor Poreacutem

isso natildeo eacute nada simples daiacute a surpresa do aluno das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista ao descobrir que seu professor o ouve Diz ele

Minha professora eacute diferente ela me escuta natildeo me ignora trata todo

mundo igual natildeo trata melhor do que o outro (In Quinteiro 2000)

Na tentativa de ouvir as vozes do outro as falas que se seguem satildeo falas de crianccedilas e jovens que chegam a escola puacuteblica portando marcas sociais inscritas no corpo postura linguagem percepccedilatildeo de mundo e de realidade e que de acordo com elas resignificam o mundo escolar atraveacutes dessas relaccedilotildees trazendo assim para dentro dos muros da instituiccedilatildeo aquilo que constantemente lhes eacute negado suas histoacuterias sua cultura e seus mundos (Dayrell 1996 p138)

o que dizem e como pensam os alunos das escolas puacuteblicas do Rio de Janeiro Quinteiro (2000) ressalta

bull de longe a escola parece um presiacutedio bull (gostaria) de jogar uma bomba e explodir tudo bull completava todos os tempos vagos com diversas coisas ateacute

lazer para os alunos porque a gente natildeo tem isso na escola bull pintava a escola ajeitava as janelas e fazia uma quadra de esportes

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 14: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

22

Do aprender aaprender aprendizagem ediferenccedila

o caraacuteter ideoloacutegico das representaccedilotildees sobre a crianccedila alunos do ensino fundamental tanto quanto uma concepccedilatildeo idiacutelica e idealista da crianccedila segundo Quinteiro (2000) influencia e caracteriza a praacutetica pedagoacutegica Para a autora isto exige romper com a cultura oficial mudar mentalidade em direccedilatildeo agrave uma consciecircncia de classe para que a professoraprofessor possa compreender-se enquanto ser social que supere o senso comum e concomitantemente altere tanto as suas relaccedilotildees de trabalho quanto as condiccedilotildees objetivas da praacutetica educativa (op cit p 91) Mas para isso eacute preciso saber ouvir e se dispor a ouvir o que seu aluno tem a dizer a respeito de si mesmo e do outro que com ele

partilha a vida partilha o dia-a-dia incluindo O proacuteprio professor Poreacutem

isso natildeo eacute nada simples daiacute a surpresa do aluno das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista ao descobrir que seu professor o ouve Diz ele

Minha professora eacute diferente ela me escuta natildeo me ignora trata todo

mundo igual natildeo trata melhor do que o outro (In Quinteiro 2000)

Na tentativa de ouvir as vozes do outro as falas que se seguem satildeo falas de crianccedilas e jovens que chegam a escola puacuteblica portando marcas sociais inscritas no corpo postura linguagem percepccedilatildeo de mundo e de realidade e que de acordo com elas resignificam o mundo escolar atraveacutes dessas relaccedilotildees trazendo assim para dentro dos muros da instituiccedilatildeo aquilo que constantemente lhes eacute negado suas histoacuterias sua cultura e seus mundos (Dayrell 1996 p138)

o que dizem e como pensam os alunos das escolas puacuteblicas do Rio de Janeiro Quinteiro (2000) ressalta

bull de longe a escola parece um presiacutedio bull (gostaria) de jogar uma bomba e explodir tudo bull completava todos os tempos vagos com diversas coisas ateacute

lazer para os alunos porque a gente natildeo tem isso na escola bull pintava a escola ajeitava as janelas e fazia uma quadra de esportes

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28juldez 2000

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 15: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

bull a cor eacute deprimente eacute sinistra bull muita gente discrimina a gente que estuda em escola puacuteblica

dizem que a particular eacute melhor que daacute mais atenccedilatildeo a eles (alunos) que natildeo tem nada destruiacutedo e eles vecircem isso e falam ateacute mal da escola

Por sua vez os alunos das Classes de Aceleraccedilatildeo Paulista dizem que gostam da escola porque

bull tem jogos brincadeiras video biblioteca mapas globo cartazes

bull o aluno pode levantar e conversar bull antes (na escola comum) soacute escrevia a outra professora natildeo

ensinava bull nunca tive uma professora tatildeo legal Se eu erro ela me ensina

(Quinteiro2000)

o que se vecirc eacute que a crianccedila ou o jovem na condiccedilatildeo de aluno sabe e percebe o que o rodeia sabe tambeacutem o que quer para si e porquecirc No entanto o processo de ensino natildeo estabelece um diaacutelogo entre o conhecimento ensinado e a cultura de origem dos alunos deixando de considerar as diferenccedilas de sexo idade origem social e outras para pensaacute-los homogeneamente como se enquanto alunos aiacute estejam somente para aprender conteuacutedos para fazer provas e passar de ano (DayreIL op cit p 155) O olhar do professor vecirc aos alunos apenas como seres de cogniccedilatildeo e mesmo assim de forma equivocada sua maior ou menor capacidade de aprender conteuacutedos e comportamentos sua maior ou menor disciplina Como de resto jaacute nos mostrou o cartum de Tonucci sobre a avaliaccedilatildeo

Os problemas pedagoacutegicos postos pelas diferenccedilas apontam portanto para uma dupla face a das referecircncias culturais muacuteltiplas e a dos status soacutecio-econocircmico de crianccedilas e jovens que chegam agrave escola puacuteblica com sede de conhecer e que com ela se decepcionam tomandoshyse candidatos potenciais ao insucesso escolar

Diante dos problemas aqui levantados e de muitos outros que o cotidiano escolar nos revela haacute hoje no mundo como um todo e na

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9-28 juldez 2000 23

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 16: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

24

escola em particular uma preocupaccedilatildeo em estabelecer uma educaccedilatildeo voltada para o respeito pela diversidade O que se busca eacute a toleracircncia social e poliacutetica para uma ordem social potencialmente explosiva e violenta dentro e fora da escola

Neste contexto a escola tem e deve assumir um papel de agente transformador promovendo o conhecimento muacutetuo entre diferentes formando professores e quadros teoacutericos entre muitos outros pontos Emergem dessa perspectiva diferentes propostas educativas baseadas em princiacutepios democraacuteticos e legiacutetimos A questatildeo seraacute entatildeo como efetivaacute-Ias na praacutetica se tudo que foi dito aponta para a diversidade social e cultural de todos os envolvidos - dos professores e alunos aos quadros administrativos e dirigentes do processo educativo na escola e fora dela Como fazecirc-lo se todos e cada um atribuem uma multiplicidade de sentidos para o que eacute a escola e a significam de maneiras diversas dependendo como diz DayreIl da cultura dos projetos e dos anseios de cada um Como saber escutar a crianccedila e o jovem e receber deles a verdade daquilo que nos dizem

A diversidade social e cultural a pluralidade eacutetnica e racial satildeo hoje o desafio daqueles que natildeo querem ser apenas pessoas que ensinam mas querem tambeacutem educar Nesta busca pautam-se por princiacutepios mais amplos e consequumlentes e tentam apoiar-se nas leis que regulam e orientam o processo educativo entre elas a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educaccedilatildeo Nacional) e os PCNs (paracircmetros Curriculares Nacionais) Em que medida satildeo eles suficientes e capazes de iluminar a praacutetica pedaacutegoacutegica e instituir um processo real de aprendizagem O que fazer diante das diferenccedilas culturais eacutetnicas e de classe Basta atribuir ao professor uma autonomia frente a realidade de seus alunos Como vencer as dificuldades de um sistema educativo que se pauta em conteuacutedos escolares postos por uma cultura nacional e universal Como definir o papel dos professores e dos alunos por meio de um conhecimento geral abstrato e universal Este conhecimento tambeacutem eacute parte da formaccedilatildeo do professor e que o desafia a compreender-se a si mesmo entre o que acredita ser correto e o que experencia na relaccedilatildeo com seus alunos Como diante disso tudo pensar a questatildeo da toleracircncia e do direito de cidadania para todos

Revista Mediaccedilotildees Londrina vS n2 p9middot28 juldez 2000

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 17: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

Os problemas persistem e natildeo tecircm respostas absolutas Restashynos refletir sobre o outro e pensaacute-lo como algo que nos inquieta e nos surpreende como diz Larrosa (1998) mas eacute preciso deixar-se surpreender e querer ser surpreendido Nesta medida o aluno diante do professor natildeo eacute somente aluno eacute tambeacutem o enigma que nos desafia e desafia nosso conhecimento Ass~me-se assim que natildeo sabemos tudo que natildeo detemos todo o conhecimento disponiacutevel sobre a realidade e as coisas Por este caminho desloca-se o olhar e sua centralidade para descobrir a alteridade e compreender o que cada um tem a dizer sobre si mesmo Isto exige uma abertbra para pensar o que somos e o que natildeo somos reconhecer o mundo do outro no nosso mundo a vida do outro como parte da nossa vida e estabelecer pontes abrir portas para que o tracircnsito no espaccedilo comum seja solidaacuterio e democraacutetico Vale dizer sem transformar o outro num igual sem face mas admitir sua igualdade - de direitos de cidadaacutenia ou o que mais seja - preservando-lhe a diferenccedila

A imagem feita por uma crianccedila africana em Portugal e um poema se colocam aqui como reflexos dos desejos dos homens a respeito de uma sociedade mais justa

Trabalhos de Alunos

o mundo estaacute unido por laccedilos fortes

Patricia Sofia Caldeira Mofa 090596

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9middot28 juldez 2000 25

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 18: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

Art VI da Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos

ARTIGO VI roo~ PESSOA TE~ O OIREITO DE SER EM TODOS OS LUGARES RECOJHECIDA COO PESSOA pfRAr~r E A LEI

Tementel DeJs ouSeja mulher seJG homemSeja em Pars oil na bartdidltJSeJC cronccedilo pequeno

SeJ vttho seJltl moccedilo Espanna

COfG~oacutee bom coraJoso No Zaire ou 10 Gratilde-

Use porft de sofeno FCflforr3c ou comedido Brelunha

De ~II Mgra nu muloto Sem fi cmr t p IIU pedo$oAtilderqola ou Gllfucatu De pele brorca ou EIc9Ultte bemegttldo

Mo(OITblqUL ou Mar-deshyr= spurhe l1)or e(IQ Duorr urnOdo andrajOsoi Fortoleza cu TfGlsvocircflIo

SejQ alto ou StJO bOlXO ~ ~ Todo murdo todo O Nc Grtclo ou Tombuetu QUf s~Jltl u~ ou yjdtl~ ~ tvnpo 14 De muletalu de beIacutel9olaquo--middot ~ _ Tem dWI fC a proteccedil30 bull Que s~jlt bem ltMcrenle~ A lei eXt~te para ICddsLuondo Que SVoJH bOnl do Juizo bull Se nenhumo d I I I~-a

QIO de JaMlIO c Hocndo ATeacute que seJo ciemente T Pois $om()s todos pess~IAl-= 110 AfegClUS100 Gos te ltk fes te CJO 30~middotS(go Namp pode kover u(u$s50Nctl York lU

Cochabanba Goste de homem ou Bclm Grotlacircndlo Tulher trlandtl re nha dinhe iro no baoco

TI~lJci9-1ipo OJ JopOO Ou seja um hQmem Trobolhe rum bom

bull qlJ(llquu tmpregtl k Faccedila aquilo que puder

1

ESCRITORA ~grDA COM CEtCA DE iM ctNTENA OE U1l0S RVTH ROCliA NA~V EM SAtildeO Ato Ca-MW

I NTENAJlEN1E COM ~IAHCcedilA5 QlJRANfeuro 15 ~NOS OItO OtUEN-l Af)()RA EOVCACoML bO CCtBIO ~IO StI~

~Atildeo P~VIO DESNJOL EV JMA ~NOE HAtllUrgttleuro PAAA UOAA COM o MvNogtO l ANTIl gtEugt TlIASAlrfOS

1AAlEM UMA 1OJl-ENr ccedilAtildeO I-iVlfJNisncA E CCNSfGVE FAVJUAIUZAA altVNCcedilAS (OE -ro-vs AS 10Aors) COM SUA

P~~ CUYANDAbE

Entre desejos sonhos princiacutepios legais e poliacuteticas educativas a diversidade social e cultural desafia nossas praacuteticas e nossos valores e nos coloca diante de nosso enigma maior a diferenccedila do outro a semelhanccedila do mesmo

Notas

I Poema de Stevenson citado por Margareth Mead In Mead Margareth amp Metraux Rhoda Aspectos do presellte Rio de l aneiroF Alves 1982

2 Recupero aqui parte de uma discussatildeo apresentada em meu artigo Linguagem cultura e altelidade imagens do outro publicado no Cadernos de Pesquisa Ndeg107 julho de 1999 p 41-78

26 Revista MediaccedilotildeesLondrina vS n2 p9-28juldez2000

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 19: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

l-Referecircncias Bibliograacuteficas

AUGEacute Marc Natildeo-Lugares Introduccedilatildeo a uma antropologia da sobremodernidade LisboaBertrand Editora 1994

BRANDAtildeO Carlos Rodrigues degoutro esse desconhecido In BRANDAtildeO Carlos Rodrigues Identidade e Etnia Satildeo PauloBrasiliense 1986

CLASTRES Pierre Arqueologia da Violecircncia Satildeo PauloBrasiliense 1982

CUNHA Manuela Carneiro da Saberes locais tramas identitaacuterias e o sistema mundial na antropologia de Manuela Carneiro da Cunha Entrevista a Kiko Ferrite In SEXTA-FEIRA - antropologia artes e humanidades Satildeo Paulo 03 out 1998

DAYRELL Juarez A escola como espaccedilo soacutecio-cultural In DAYRELL Juarez (org) Muacuteltiplos olhares sobre educaccedilatildeo e cultura Belo Horizonte UFMG 1996

ITURRA Raul Fugiraacutes agrave escola para trabalhar a terra Ensaios de Antropologia Social sobre o insucesso escolar Lisboa Escher Publicaccedilotildees 1990

LARROSA Jorge degenigma da infacircncia ou o que vai do impossiacutevel ao verdadeiro In LARROSA Jorge amp LARA Nuacuteria Peres de (orgs) Imagens do Outro Petroacutepolis Vozes 1998

QUINTEIRO Jucirema Infacircncia e escola uma relaccedilatildeo marcada por preconceitos Tese de Doutorado EEUNICAMP abril de 2000 (ineacutedita)

SANTOS Eliane Quanto vale uma crianccedila negra Debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SANTOS Joel Rufino Quanto vale uma crianccedila negra Ideacuteias em debate In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

SARMENTO Manuel Jacinto amp PINTO Manuel (coord) As crianccedilas Contextos e Identidades Centro de Estudos da Crianccedila Portugal Universidade do Minho 1997

STOLCKE Verena Cultura europeacuteia uma nova retoacuterica de exclusatildeo Revista Brasileira de Ciecircncias Sociais Satildeo Paulo n 22 jun 1993

TERENA Marcos Identidade Terena em contextos pluriculturais Entrevista a Narcimaacuteria CP Luz In LUZ Narcimaacuteria cP(org) Pluralidade Cultural e Educaccedilatildeo Salvador Secretaria da Educaccedilatildeo - SECNEB 1996

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2 p9middot28 juldez 2000 27

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000

Page 20: DESAFIOS DA DIVERSIDADE NA ESCOLA da diver… · Estes são os desafios permanentes da educação e da escola. Diversidade, educação eescola . A diversidade nos espelha como parte

28

TONUCCI Francesco Com olhos de crianccedila Porto Alegre Artes Meacutedicas 1997

VARGAS Eduardo Viana Devir e Diferenccedila consideraccedilotildees micropoliticas a respeito dos modos de expressatildeo semioacutetica das crianccedilas In SANTOS Joel Rufino amp VARGAS Eduardo Viana (orgs) Literatura e Crianccedila I Encontro Local do Programa Quanto Vale uma Crianccedila Negra Rio de JaneiroISER - Instituto de Estudos da Religiatildeo 1989

Resumo

Usando imagens como suporte linguumliacutestico o texto procura alertar professores para a necessidade de recuperar e ensinar agraves crinccedilas o respeito muacutetuo entre os diferentes iacutendios negros mulheres crianccedilas deficientes e muitos outros Para tanto coloca a a1teridade como horizonte a ser alcanccedilado na educaccedilatildeo e na escola cujo desafio estaacute em compreender a relaccedilatildeo ensino-aprendizagem como processo cultural baseado na troca permanente entre diferentes

Palavras-chave educaccedilatildeo cultura diversidade escola

Abstract

Using images as a Iinguistical framework the article seeks to increase the awareness of teachers to the necessity of recovering and teaching children mutual respect among lhe different natives blacks women children mentally and physically challenged ones and many others In order to do so it establishes the alterity as the goal to be reached in education and schools whose main challenge is to understand the teaching-Iearning relation as a cultural process based on a permanent exchange among the different subjects

Key-words education culture diversity school

Neusa Maria Melldes de Gusmatildeo eacute professora da Faculdade de Educaccedilatildeo da Unicamp

Revista Mediaccedilotildees Londrina v5 n2p9-28 julJdez2000