depressÃo: o atual foco das especulações · a primeira a apontar as diferenças na melancolia...
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
INSTITUTO DE FÍSICA DE SÃO CARLOS
LICENCIATURA EM CIENCIAS EXATAS
Victor José de Oliveira – Nº USP: 8911310
DEPRESSÃO:
O atual foco das especulações
São Carlos
Agosto de 2015
VICTOR JOSÉ DE OLIVEIRA
DEPRESSÃO:
Culminância de uma especulação
Monografia apresentada ao curso de
Licenciatura em Ciências Exatas, na
disciplina SLC 0631 – Psicologia da
Educação II, Instituto de Física de São
Carlos – USP, como parte do critério de
avaliação do curso e divulgação científica
para o instituto.
Docente: Prof.º Dr. José Fernando
Fontanari
São Carlos
Agosto de 2015
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .............................................................................................................................. 4
2. COMO O MUNDO CIENTÍFICO IDENTIFICOU HISTORICAMENTE A DEPRESSÃO ... 5
2.1. Metodologia ......................................................................................................................... 5
2.2. Antiguidade (500 a.C. – 100 d.C.) ................................................................................... 5
2.3. Idade Média (450 – 1400 d.C.) .......................................................................................... 6
2.4. Idade Moderna (séculos XV a XIX) ................................................................................. 9
2.5. Idade Contemporânea (século XX até os dias atuais) ............................................ 10
3. EFEITOS REAIS DOS ANTIDEPRESSIVOS ........................................................................ 13
4. CONCLUSÕES ........................................................................................................................... 15
5. REFERÊNCIAS .......................................................................................................................... 16
1. INTRODUÇÃO
Grande parte da população mundial, e principalmente ocidental, acredita
que a depressão é “o mal do século vinte e um”. Todavia, apesar de levantamentos
estatísticos que confirmam sua grande ocorrência na última década, principalmente
em países desenvolvidos, ela não é um problema recente que permeia o cotidiano
dos cidadãos. Ao fazer uma análise histórica do caráter psíquico humano e as
problemáticas envolvidas, percebe-se que havia outros termos que definiam o
mesmo problema psicológico, e atualmente essa relação é possível de ser feita
devido aos critérios científicos utilizados para seu diagnóstico.
Tendo uma noção histórica da depressão, percebe-se que ela,
inicialmente, não era reconhecida como um malefício propriamente dito contra o
psicológico humano e tendo também relação com fatores externos ao indivíduo, mas
sim como um problema interior, relacionado a crenças e superstições.
Posteriormente, com a permissão de olhares críticos sobre os fenômenos
relacionados simultaneamente ao intelecto e ao físico do ser humano, e graças
também, e principalmente, ao desenvolvimento do racionalismo e da investigação de
caráter científico, a psicologia, a psiquiatria e a medicina puderam se desenvolver e
se unir para desvendar o que havia por trás dessa questão complexa.
Nos dias de hoje, é comum delegar a total responsabilidade do
diagnóstico da depressão, bem como seu tratamento, às questões problemáticas
que a medicina e a farmácia dos bioquímicos sugerem. Com exceção dos casos
graves da “doença da alma” e que requerem um tratamento clínico intenso, vêm se
notando nas últimas décadas o uso intensivo de antidepressivos cujos efeitos podem
não ter o efeito esperado. Além disso, muitos medicamentos podem apenas causar
uma melhoria imediata, não tratando do problema de modo completo, com a
tendência de saná-lo. Tendo em vista tais situações, nota-se que a depressão torna-
se um negócio lucrativo às indústrias farmacêuticas, fomentando a dúvida sobre
quem benefícios adquiridos pela ciência ao longo desses séculos sobre o estudo da
doença visam beneficiar.
2. COMO O MUNDO CIENTÍFICO IDENTIFICOU HISTORICAMENTE A
DEPRESSÃO
2.1. Metodologia
Estudos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro possibilitaram a realização de
um levantamento histórico sobre os contextos científico e filosófico da depressão,
com base nas ideias de importantes filósofos, teólogos, matemáticos e médicos,
tendo como base registros de culturas predominantemente ocidentais.
2.2. Antiguidade (500 a.C. – 100 d.C.)
Nesse período, importantes filósofos gregos já identificavam as doenças
da mente como fruto de disfunções corporais. Para eles, a depressão seria
consequência do excesso de bile negra, que seria uma substancia fria e seca,
responsável pelos por todos os sues sintomas, porém nunca encontrada até hoje.
Tal substancia corporal fazia parte dos fluidos responsáveis pela teoria dos quatro
humores, que visava explicar a correlação entre saúde e doença. Esse modelo de
pensamento foi importante na historia, foi consistiu na substituição da mitologia pela
biologia e na adoção de um modelo para a observação clínica.
Já no século V a.C., Hipócrates já utilizava o termo melancolia para
designar a depressão, “uma afecção sem febre, na qual o espírito triste permanece
sem razão fixado em uma mesma ideia, constantemente abatido” [...]. Ele afirmava
que a bile negra em excesso ocasionava estados de tristeza e cansaço,
ocasionando a falta de apetite e até o desejo de morte. O excesso da bile negra
estaria associado a padrões inadequados de alimentação, e a situações rotineiras
de vida errôneas, como trabalho estressante e sedentarismo. Sendo assim, os
possíveis tratamentos eram: mudanças na dieta, ginástica, hidroterapia e
medicamentos orais, ervas catárticas, eméticas e purgantes destinadas a eliminar o
excesso da bile negra. Também seria essencial diálogo intenso e a necessidade de
não deixar o doente sozinho.
Cícero, Aristóteles e latão contribuíram fortemente para a questão do
entendimento do psicológico humano e as doenças relacionadas. Em uma de suas
obras, Aristóteles afirma que os indivíduos com melancolia possuem mais espírito
em relação aos que não a tem.
Imagem 1: Problemata, obra de Aristóteles.
Fonte:
http://www.europeana.eu/portal/record/04202/BibliographicResource_200006825048
9.html?query=refusing&qt=false.
Em sua obre Problemata, ele completa a ideia de Hipócrates, afirmando
que drásticas alterações nos padrões da bile negra causariam o estágio mais
agravado da melancolia. Leves alterações nas quantidades do fluido, somados a
pouca inspiração e ao brilhantismo ou satisfação baixa da realização, culminariam a
doença em seu estado leve ou intermediário.
As contribuições de caráter filosófico provindas do racionalismo grego
para a explicação das doenças da alma perduraram até o inicio da idade das trevas
(450 a 1400 d.C.),uma vez que, antes desse marco histórico, as formas de tratar os
males da mente na Europa já haviam aderido ao pensamento da antiguidade.
2.3. Idade Média (450 – 1400 d.C.)
Nesse período, houve a ascensão do Cristianismo e do estado cristão, que
modificaram bruscamente a ótica sobre os problemas psicológicos e todas as
doenças fisiológicas. A medicina racional deu lugar ao misticismo, ao sobrenatural e
às superstições. Com os paradigmas da doutrina católica ditados sobre as diversas
populações europeias, os tratamentos psicofarmacológicos desenvolvidos graças ao
avanço científico-filosófico greco-romano foram sendo cada vez menos usados, pois
os transtornos mentais passam a englobar a demonologia da época.
Inicialmente, o monge Ionnes Cassianus introduz a doença com o termo
acídia, que diz respeito a um estado de descuido do espírito. Esse é o significado da
palavra de origem grega, que se refere à apatia do indivíduo, a preguiça, a
indolência e a negligência. Acídia é então o termo medieval para melancolia. Santo
Agostinho afirmava que o que separava o homem dos demais animais é a razão, por
isso, a perda da razão ocasionada pela melancolia “seria um desfavor a Deus, a
punição para a alma pecadora”. São Gregório Magno (540 – 604) a inclui como um
dos sete pecados capitais a condena totalmente, mas São Tomás de Aquino se
mostra mais benevolente com o indivíduo diagnosticado, afirmando que, ao se
dedicar a sua cura, estaríamos contribuindo para seu renascimento espiritual e
moral, fazendo com que houvesse reconciliação com Deus. Isso contribuiria para
que a penitência em relação a esse estado espiritual se atenuasse.
Todavia, em 1233, com o início da Santa Inquisição da Igreja Católica, a
prática benevolente de São Tomaz foi abolida, e com isso tanto os portadores da
doença quanto estudiosos que buscavam um entendimento e um tratamento
alternativo para a melancolia eram condenados à fogueira. Com isso, intelectuais
que se dedicavam aos estudos dos mecanismos e diagnósticos da depressão
medieval encontraram refúgio no mundo árabe, onde as principais obras greco-
romanas foram traduzidas e continuaram sendo aprimoradas. Nesse contexto,
destaca-se o pensador Avicena (980 - 1037), que, em suas explicações a respeito
da melancolia, se baseia nas teorias greco-romanas, retratando o desequilíbrio das
quantidades da bile negra e fazendo alusão à teoria humoral. Para ele, o fluido seria
ocasionado por superaquecimento e sedimentação, e com base nessa hipótese, lista
os principais tipos de sintomas que vão desde desconfortos físicos até desequilíbrios
mentais, como medos irracionais, prejuízo no julgamento, falsas crenças e
percepções distorcidas da realidade. Todos os seus estudos sobre medicina e
psicologia encontram-se em sua obra O cânone da medicina.
Imagem 2: O cânone da medicina, obra de Avicena.
Fonte: http://www.artehistoria.com/v2/obras/26299.htm.
Outro grande contribuinte nesse período foi o médico Isaaq Imran, com sua obra
Melancholia. Nesse livro, Imran realiza uma observação detalhada sobre seus
pacientes que possuem a doença e constrói uma lista oficial de todos os seus
sintomas, que são: “mutismo, a imobilidade, distúrbios do sono, agitação, desânimo,
choro e risco de suicídio”.
A primeira a apontar as diferenças na melancolia entre os homens e as
mulheres, com bases em seus estudos sobre causas e curas, foi a freira alemã
Hildegard von Bingen (1098 – 1179). Em seus manuscritos, ela contextualiza as
funções que são sucedidas à mulher na sociedade feudal, as quais eram
completamente diferentes das dos homens. Por isso, az razões para a doença entre
os dois sexos eram tão diferentes, quanto à origem. A irmã postulava que seus
princípios fisiológicos também se diferenciam, uma vez em que as manifestações
entre os dois sexos eram distintas.
Imagem 3: Irmã Hildegard von Bingen.
Fonte: http://semeadorestrelas.blogspot.com/2015/08/hildegarde-de-bingen-o-fogo-
do-espirito.html.
Apesar de sua conclusão, ela não se aprofundava quanto aos
mecanismos físiológicos, pois afirmava que a ciência já os explicaria. Para a
estudiosa, a melancolia provém do inconsciente pessoal, da história do pessoal do
indivíduo. O seu caráter psicossomático provém da não aceitação em relação a uma
situação da vida. A única cura seria o encontro psico-espiritual do paciente.
2.4. Idade Moderna (séculos XV a XIX)
Os estudos da depressão na idade moderna tiveram, inicialmente,
influência do iluminismo, movimento marcado pelo antropocentrismo, naturalismo e
racionalismo. Foram retomados os ideais científico-filosóficos greco-romanos, como
os de Aristóteles, Platão e Sócrates.
No século XVI, nota-se grande divergência entre os pensadores europeus
em relação à doença, ainda que retomassem ideias da antiguidade. Na Itália, o
filósofo Marsilio Ficino foi quem mais discutiu a respeito, afirmando que a ansiedade
era a manifestação do anseio humano pelo grande e o eterno e que todo gênio é um
melancólico. Já os ingleses diziam que seria o fruto das relações com anjos maus,
mas que o indivíduo nesta situação não seria culpado. Até metade do século XVII,
nota-se a predominância da teoria dos quatro humores e suas qualidades provindas
do um desequilíbrio de “uma substancia fria e seca de temperamento”.
Já no início do século XVIII, com o advento do Iluminismo, que
proporcionou uma ciência comprovada com métodos empíricos e não apenas
dedutivos, intelectuais como o médico Hernan Boerhaave promoveram a
substituição da teoria dos humores por um modelo de funcionamento mecânico e
hidráulico que proporcionou muitos avanços na medicina. Com base nisso, o médico
William Cullen passa a correlacionar integralmente as doenças psíquicas com o
sistema nervoso. Ele firma que a melancolia resulta de um desequilíbrio em
diferentes partes do cérebro, que resulta no comprometimento das faculdades
cognitivas como o julgamento e a articulação de ideias. A melancolia seria, então,
uma ansiedade parcia, causada por um grau de torpor na atividade do sistema
nervoso que afeta a sensação e a volição.
O filósofo e metafísico Emmanuel Kant também contribuiu para a
investigação da depressão na Idade Moderna, classificando os transtornos mentais
em três entidades: a melancolia, a mania e a ansiedade.
No século XIX, o termo melancolia perde importância para ciência,
surgindo então, de forma bem edificada, os estudos da depressão, algo que,
inicialmente, não apresentava muita semelhança. Nesse período, ocorrem inúmeras
transformações na psiquiatria, que passa a ter uma visão integral de relação entre o
físico e o psíquico, embasando-se assim a psicossomática. O professor de medicina
psíquica Christian August Leipzing, utilizou desta base científica para descrever a
melancolia como uma paralisia da disposição do indivíduo, acompanhada da
depressão.
Na mesma época, o francês Philippe Pinel (1745 – 1826) revolucionou a
abordagem da doença mental, com sua obra Trate Médico Philosophique sur
L’aliénation Menta ou la Manie, definindo a melancolia como uma forma parcial da
insanidade, caracterizada por um número limitado de delírios. Ele identificou uma
série de configurações nervosas próprias de certos indivíduos, relacionadas a
experiências de vida, que estariam ligadas a predisposições físicas e psicológicas.
Por isso, defendia que a psiquiatria deveria ser baseada em observações rígidas e
livre ideologias, de modo a investigar diferentes manifestações clínicas.
Outro importante nome que merece ser citado é o do cientista Benjamin
Rush, que se esforçou para colocar as doenças mentais no mesmo paradigma das
outras especialidades médicas. Ele descreve a melancolia como uma ansiedade
parcial, e estaria mais associada com a presença de falsas crenças e delírios do que
com sentimentos e emoções como medo ou tristeza. Até o final do século XIX,
inúmeros cientistas já definiam a melancolia como o início da demência crônica e a
depressão como um estagio mais brando dessa doença.
2.5. Idade Contemporanea (século XX até os dias atuais)
O início desse período ficou marcado pelos pela dualidade entre a
psicanálise de Sigmund Freud, fundamentada em princípios psicológicos, e a
psiquiatria de Ernil Kraepelin, embasada na neurobiologia. Nessa fase, a psiquiatria
já havia já havia sido cientificamente muito contribuída, graças ao avanço da
psicopatologia, da farmacologia, da anatomia patológica, da neurologia e da
genética.
Freud, em 1917, escreveu o livro Luto e melancolia. Nesta obra, ele
retrata a melancolia (ou a depressão) como uma forma de luto do indivíduo, que
surge de uma sensação de perda do libido. Ele considera que na melancolia, o ego
se torna pobre e vazio. Já Kraepelin impulsionou o aperfeiçoamento da análise
psiquiátrica no início do século, supondo que toda doença mental se erigia sobre
uma base bioquímica interna. Separou a depressão em três categorias, da mais
suava à mais grave, havendo uma relação entre elas, e segundo sua teoria, a
hereditariedade seria responsável por 80% dos casos da doença. Em outras
palavras, influenciou em sua classificação como sendo parte do curso da psicose
maníaco-depressiva, eu seria um estágio de loucura. Até então, a doença não era
vista como uma entidade separável das outras.
Percebe-se que, neste contexto, a análise da depressão fica restrita ao
campo científico, uma vez que fortalecida pelo desenvolvimento da bioquímica, da
psicanálise, da Teoria da Evolução e da Teoria Quântica. Com o favorecimento de
tais áreas da ciência, surgem, nos anos 50, os primeiros antidepressivos. Descobre-
se que seus princípios ativos estão relacionados a mecanismos de
neurotransmissores cerebrais, responsáveis pelas emoções, e esse avanço ocorre
devido à intensa influencia da psiquiatria científica, bem como suas classificações
para a síndrome depressiva, tanto utilizadas no Manual diagnóstico estatístico de
transtornos mentais e na Classificação internacional das doenças. Já a psicanálise
contribuiu para o desenvolvimento de psicoterapias a as representações da
depressão ocorridas na literatura.
Adolf Meyer, psiquiatra suíço, criticou o posicionamento de Kraepelin,
afirmando que havia muitos quadros de depressão que não se encaixavam nos
cursos da psicose maníaco-depressiva. Ele contrariou o uso da palavra melancolia,
adotando definitivamente e termo depressão.
Apesar da forte tendência da psiquiatria bioquímica, a teoria psicanalítica
de Freud foi a mais recorrida para a solução da depressão até a década de 1970,
devido às sistematizações de suas abordagens clínicas para o tratamento da
neurose, que também se aplicavam à depressão.
Na década de 1960, abordagens cognitivas e comportamentais passam a
despertar o interesse de cientistas a respeito de entendimento do comportamento
depressivo. O psicólogo norte-americano criou a terapia cognitivo-comportamental
(TCC), que sustenta a origem da depressão à disfunções, e não a problemas
inconscientes, como era defendido por Freud. Inúmeros ensaios clínicos comprovam
a eficácia da TCC no tratamento da depressão leve e moderada.
Com as consequências negativas sobre os de um grande número de
soldados sobreviventes da Segunda Guerra Mundial, que eram dominados pela
doença, aumentaram os estudos sobre os substratos utilizados para a fabricação de
antidepressivos. Descobriu-se, em 1955, o efeito antidepressivo da molécula de
imipramina, conhecido também como antidepressivo tricíclico (ADT). Depois disso,
outros ADTs foram desenvolvidos, e o princípio farmacológico mais importante
dessa classe de medicamentos seria a inibição da receptação da noroadrenalina
(NA), pois estudos mais detalhados permitiram concluir que a ausência dessa
substancia culminaria da depressão. Essa teoria ficou conhecida como hipótese
norodrenérgica.
Com base nos estudos de outro substrato, a aproniazida, descobriu-se,
posteriormente, que ela estaria associada à inibição da enzima monoaminoxidase,
que tem a função de degradar neurotransmissores. Com isso haveria o aumento da
serotonina no cérebro, o que acarreta do bom humor do paciente. Surge então, uma
nova classe de antidepressivos, os inibidores MAO (IMAO), que logo foram
substituídos pelos ADTs. A imipramina e a apriniazida marcaram uma nova era para
a psiquiatria e justamente por isso os anos 50 ficaram marcados como a “década de
ouro”.
Em 1969 e 1970, os farmacologistas russos Izyaslav P. Lapin e Gregory
F. Oxenkrug postularam a hipótese serotonérgica da depressão, em oposição à
norodrenérgica. Tal hipótese justificaria a doença como a falta da serotonina entre
as fendas sinápticas. Como já descrito os ADTs e os IMAO haviam sido descobertos
de forma acidental. Com a formulação de Lapin e Gregory, em 1974, um grupo de
pesquisadores patrocinados pela indústria farmacêutica descobriu uma molécula
altamente seletiva a potente na inibição da captação da serotonina, a SSRI, que
apresenta maior tolerabilidade me relação aos outros dois antidepressivos.
Rapidamente, essa substancia passou a ser a mais prescrita do mundo.
Na década de 80, muitos avanços na neurociência possibilitaram a
avaliação cerebral em termos estruturais, funcionais e moleculares, representando-
se um cérebro in vivo. Com isso, cientistas puderam aumentaram as investigações
das síndromes psico-patológicas. Houve, então uma maior aproximação da
psiquiatria com a neurobiologia, o que a elevou ao mesmo patamar das outras
especialidades médicas. A depressão, então, começa a ser uma doença descrita
com óticas tão importantes como as das doenças propriamente ditas fisiológicas.
3. EFEITOS REAIS DOS ANTIDEPRESSIVOS
Uma publicação feita New England Journal of Medicine por uma equipe
coordenada pelo psicólogo Eick H. Turner, da Health and Science University de
Oregon, Em Potland, abordou uma avaliação a respeito de todos os antidepressivos
autorizados entre 1987 e 2004 nos Estados Unidos, sendo a maioria deles SSRIs.
Foram analisados estudos de avaliações a respeito de sua eficácia e, segundo um
levantamento realizado, de 74 estudos, 13 mil participantes, exatamente 37 –
metade deles – foram classificados pelo Food And Drugs Administration (FDS) como
positivos. Ou seja, um em cada dois testes comprovara a eficácia dos remédios,
sendo que esses antidepressivos tinham sido aprovados em 94% dos casos.
Em 2008, o psicólogo Irving Kirsch, da universidade britânica de Hull
avaliou documentos de autorização de quatro novos medicamentos. Constatou que
eles tinham efeito apenas sobre pacientes com estado de depressão grave. Esses
remédios, sendo um deles a paroxetina, costumam mitigar os sintomas das
depressões mais leves, uma vez em que as formas mais amenas da melancolia
costumam regredir naturalmente após certo tempo, e a probabilidade disso
acontecer aumente conforme o estado depressivo é mais leve. Sendo assim, faz
pouquíssima diferença se o paciente recebeu o medicamento ou placebo. Somente
em pessoas com o caso mais sério a diferença entre o medicamento e o placebo é
tão grande a ponto de adquirir importância segundo os critérios do Instituto Britânico
de Medicamentos, conforme o gráfico abaixo:
Imagem 4: Gráfico da pesquisa de Irving Kirsch sobre os efeitos da paroxetina.
Fonte: Revista Mente cérebro – Edição novembro de 2011.
Foi realizado nos Estado Unidos um estudo que alarma ainda mais o
quadro, o STAR*D (Sequenced Treatment Alternatives to Relieve Depression). Nele,
o Instituto Nacional de Saúdem Mental analisou pessoas com depressão que
também tinham diabetes ou doenças cardiovasculares. Sabendo que havia cerca de
4 mil participantes, 78% deles teriam sido excluídos pelos procedimentos de
tratamento padrão. Aqueles que normalmente seriam excluídos apresentavam um
risco maior de suicídio, em geral estavam desempregados e recebiam baixos
salários, o que indica que sofriam de depressões renitentes. 39% dessa parcela
responderam ao tratamento e para os outros o índice de sucesso foi de 51%. Sendo
assim, os benéficos não podem ser transferidos para a maioria dos pacientes.
Para alarmar ainda mais a situação, foi constatado que um ano após o
tratamento, apenas um quarto dos pacientes ainda estava melhor do que no
começo. Nessa parcela, já está incluído um possível efeito placebo, pois no STAR*D
não houve pacientes apenas aparentemente tratados cujas reações os
pesquisadores poderiam ter excluído dos resultados farmacológicos.
Conclui-se então que “antidepressivos não têm garantias de sucesso tão
fortes quanto as pessoas pensavam antigamente”, como afirma o farmacologista
Gerard Glaeske. Os efeitos colaterais causados pelos medicamentos e os resultados
modestos levam ao questionamento se realmente, foram desenvolvidos tratamentos
ideais para a depressão. Precisa-se entender o que ocorre no cérebro das pessoas
e quis os efeitos dos diferentes fármacos. Ainda que seções de acompanhamento
psicoterápico sejam efetivas, as mesmas têm resultados apenas em estados
brandos da depressão. As combinações dos remédios aprovados para o uso só têm
seu real efeito quando a depressão está em um estágio avançado.
4. CONCLUSÕES
Ao se analisar o processo histórico de como a sociedade interpretava a
depressão, percebe-se que ao longo de um acervo riquíssimo, o seu conceito e sua
investigação mudaram de uma forma extrema. Inicialmente, não eram utilizados
métodos científicos para entender suas causas, fazer seu diagnóstico de forma
precisa e aperfeiçoar seu tratamento. Com os progressos científicos e os
consequentes avanços tecnológicos, foram possíveis muitos estudos que
conciliassem o comportamento fisiológico humano e o entendimento do seu
psicológico, e isso possibilitou a criação de fármacos que, a priori, seriam efetivos no
tratamento. Porém estudos já revelaram e ainda e ainda nos mostra que ainda há
muito para se conhecer do funcionamento do cérebro humano e o efeito desses
medicamentos. Percebe-se que o consumo destes, por mais que existam essas
grandes lacunas, é altíssimo, o que é vantajoso para as indústrias farmacêuticas,
que são privilegiadas que ando omitir os resultados não vantajosos de suas
pesquisas. Para ter acesso a estes, um indivíduo precisa acessar à informações
institucionais, como as da Food And Drugs Administration (FDS), pois a mídia
apenas divulga as aspectos vantajosos das pesquisas realizadas.
5. REFERÊNCIAS
[1] – FERREIRA, SILVANA A. T. A EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE DEPRESSÃO
NO SÉCULO XX:UMA ANÁLISE DA CLASSIFICAÇÃO DA DEPRESSÃO NAS
DIFERENTES EDIÇÕES DO MANUAL DIAGNÓSTICO E ESTATÍSTICO DA
ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE PSIQUIATRIA (DSMs) E POSSÍVEIS
REPERCUSSÕES DESTAS MUDANÇAS NA VISÃO DE MUNDO MODERNA. Rio
de Janeiro, 2011.
[2] – SOUZA, THAÍS RABANEA DE; LACERDA, ACIOLY RUIZ TAVAREZ DE.
Depressão ao longo da história. Quevedo & silva (org.). 2010.
[3] – GONÇALVES, CÍNTIA ADRIANA VIEIRA; MACHADO, ANA LÚCIA. Depressão,
o mal do século: de que século? Revista Enfermagem. Rio de Janeiro, 2007.
[4] – PAULUS, JOCHEN. Antidepressivos: são mesmo eficazes? Revista mente
cérebro. P. 26-33. Novembro de 2011.
[5] – BUENO, J. ROMILDO. A era dos antidepressivos. Revisão sobre a escolha de
um antidepressivo na prática clínica. Revista Debates em psiquiatria. P. 6 – 12.
Janeiro/Fevereiro de 2011.