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CÂMARA DOS DEPUTADOS DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES TEXTO COM REDAÇÃO FINAL CPI - TRÁFICO DE ÓRGÃOS HUMANOS EVENTO: Audiência Pública N°: 1057/04 DATA: 24/08/04 INÍCIO: 14h53min TÉRMINO: 18h43min DURAÇÃO: 3h50min TEMPO DE GRAVAÇÃO: 3h49min PÁGINAS: 129 QUARTOS: 46 DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO RITA MARIA PEREIRA - Técnica em Enfermagem. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Enfermeira. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Delegado. SUMÁRIO: Tomada de depoimento. OBSERVAÇÕES Há palavras ou expressões ininteligíveis. Há intervenção inaudível. Há intervenientes não identificados.

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CÂMARA DOS DEPUTADOS

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO

NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES

TEXTO COM REDAÇÃO FINAL

CPI - TRÁFICO DE ÓRGÃOS HUMANOSEVENTO: Audiência Pública N°: 1057/04 DATA: 24/08/04INÍCIO: 14h53min TÉRMINO: 18h43min DURAÇÃO: 3h50minTEMPO DE GRAVAÇÃO: 3h49min PÁGINAS: 129 QUARTOS: 46

DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃORITA MARIA PEREIRA - Técnica em Enfermagem.BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Enfermeira.ROBERTO MARTINS DE BARROS - Delegado.

SUMÁRIO: Tomada de depoimento.

OBSERVAÇÕESHá palavras ou expressões ininteligíveis.Há intervenção inaudível.Há intervenientes não identificados.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

1

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Declaro abertos os

trabalhos da 28ª Reunião Ordinária da Comissão Parlamentar de Inquérito destinada

a investigar a atuação de organizações atuantes no tráfico de órgãos humanos, a

CPI de Tráfico de Órgãos.

Comunico a V.Exas. o recebimento do ofício da Sra. Deputada Perpétua

Almeida, solicitando fosse justificada a sua ausência à reunião do dia 11 de agosto

do corrente ano por ter participado da comitiva do Presidente da República em

missão oficial ao Estado do Acre.

Esta reunião foi convocada para a realização de audiência pública com a

presença das Sras. Rita Maria Pereira e Belmira Ângela Bittencourt, ex-enfermeiras

do Hospital Regional do Vale, em Taubaté, e do Sr. Roberto Martins de Barros,

delegado em Taubaté, e ainda para a deliberação de requerimentos.

Antes de convidar a Sra. Rita Maria Pereira, primeira depoente, a tomar

assento à mesa, solicito à Secretaria desta Comissão que conduza os demais

depoentes para outra sala, nos termos do art. 210 do Código de Processo Penal.

“Art. 210 - As testemunhas serão inquiridas cada

uma de per si, de modo que umas não saibam nem

ouçam os depoimentos das outras, devendo o juiz

adverti-las das penas cominadas ao falso testemunho”.

Neste momento, quero convidar a Sra. Rita Maria Pereira a tomar assento

aqui na mesa conosco.

Antes de passar a palavra à depoente, peço a atenção dos Srs.

Parlamentares para as normas estabelecidas no Regimento Interno da Casa: o

tempo concedido aos depoentes será de até 20 minutos, prorrogáveis a juízo da

Comissão, não podendo nesse período ser aparteado, e os Deputados interessados

em interpelá-lo deverão inscrever-se previamente junto à Mesa. Portanto, solicito ao

Secretário da Mesa que passe a lista para os Deputados presentes.

Por se tratar de oitiva de testemunho, solicito à Sra. Rita Maria Pereira que

preste juramento, conforme o art. 203 do Código de Processo Penal.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Faço, sob a palavra de honra, a promessa

de dizer a verdade do que souber e me for perguntado.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Em conformidade com o

art. 210 do Código de Processo Penal, advirto à depoente das penas culminadas ao

crime de falso testemunho, assim descritas no Código Penal:

“Art. 342 - Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar

a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou

intérprete em processo judicial, ou administrativo,

inquérito policial, ou em juízo arbitral”.

Vamos passar a palavra neste momento à Sra. Rita Maria Pereira, para que

ela possa fazer sua explanação. A Sra. Rita Maria Pereira é enfermeira no Hospital

de Taubaté e, em recente depoimento prestado à TV Bandeirantes, nós entendemos

a necessidade da sua convocação para estar aqui perante a CPI. A Comissão

Parlamentar de Inquérito da Câmara Federal foi criada para investigar as diversas

denúncias que existem em algumas regiões do Brasil sobre tráfico de órgãos

humanos e irregularidades no sistema de transplantes.

já estamos acompanhando o caso de Taubaté, já estiveram conosco aqui o

Dr. Kalume, um dos médicos acusados, esteve conosco também o Dr. Marcelo

Negrini, depondo nesta Comissão, e nós vamos ouvir neste momento a Sra. Rita. A

Sra. Rita vai ter o tempo necessário para falar o que souber sobre o caso de

Taubaté, no tempo em que a senhora trabalhou, peço que nos diga qual o período

em que a senhora trabalhou, quantos anos trabalhou. Não sei se é possível saber

tudo isso, mas, se for possível, nós vamos tentar obter essas informações, para que

possamos, durante o processo da Comissão Parlamentar de Inquérito, estar

formando um juízo, através do Relator, de todos aqueles procedimentos e das

irregularidades pelas quais são acusados os 4 médicos ali da cidade de Taubaté.

Vamos passar a palavra para a senhora pelo tempo de 20 minutos, prorrogáveis por

mais 20, mas vai ficar a critério da senhora o tempo a ser usado. Logo após a

senhora fazer uso da palavra, nós vamos fazer algumas perguntas, são

procedimentos normais da CPI, para que a senhora possa responder e esclarecer e

tirar algumas dúvidas dos Deputados presentes a esta Comissão.

Eu quero, neste momento, passar a palavra então à Sra. Rita.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - (Risos.) Nem sei como começar. É que já

faz tanto tempo, né? O Dr. Kalume tinha escrito um livro, e eu trabalhava na UTI, né.

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Nós estávamos conversando sobre o livro, eu peguei e falei para ele: “Nossa, eu

participei desse negócio” — eu falei para ele. Ele falou: “Como assim?” Eu falei: “Eu

vi o que aconteceu, eu tive numa das cirurgias”. Eu falei para ele, né? Aí ele falou:

“Mas como assim?” Aí ele falou: “Por que você não denunciou?” Eu falei: “Não, eu

tenho medo”. Claro que eu ia me calar, não é, eu tenho medo. Aí ele pegou e acho

que ele falou para o Dr. Marcelo Negrini, e eu fui chamada para depor com o Dr.

Marcelo Negrini. Aí tudo bem, né? Mas eu vou direto no que aconteceu mesmo,

sabe, que eu me lembro o que aconteceu. Eu estava trabalhando à noite e falaram

que ia chegar um traumatismo. Quando se fala em traumatismo, a gente pensa

traumatismo de crânio, traumatismo craniano. Ia chegar à noite, eu sou técnica de

enfermagem. Ficamos esperando, eu e uma outra amiga, que trabalhava à noite

também comigo. E chega, é aquela correria, a gente montou sala, tudo, entrou o

residente para ajudar a montar a sala, tudo, e o rapaz se debatia muito, vivo mesmo,

sabe? Se debatia muito mesmo. Colocamos na mesa, entraram os médicos, a gente

ajuda a amarrar, aquela rotina de centro cirúrgico mesmo, eles se escovaram,

entraram, tudo. E... ai, meu Deus, daí... é duro ter que lembrar as coisas. Aí

começou a cirurgia, mas eu achei estranho, porque se é um traumatismo craniano é

cirurgia de crânio, não é? Mas daí entraram... urologista. O Dr. Rui Sacramento, o

Dr. Pedro Henrique e o residente, né? Mas foi tão rápido, porque abriram o

abdômen, foi muito rápido, foi muito rápido mesmo, e... Não, antes de começar, a

doutora Lenita, ela... primeiro começou uma briga onde os médicos se vestem, no

lavabo. A Dra. Lenita disse que não ia anestesiar. Uma discussão feia mesmo, sabe,

e o paciente ali se debatendo na mesa, sabe, e aquela discussão do lado de fora.

Daí eu e a outra, a gente não sabia o que fazia, porque uma discussão e os médicos

não começam nada, né? Aí, por fim, vieram. A doutora falou assim: “Só vou fazer o

“cheirinho”...” Era um pouquinho só de Halotano, não é, sei lá o que ela colocou lá,

mas foi muito rápido, ela nem fez e já saiu, ela não ficou. Ela falou: “Eu não vou

participar disso”. Eu e essa amiga, que estava na cirurgia, circulando a sala,

achamos estranho, falamos: “O que é isso? Eu vou participar disto?” Nós achamos

estranho, à noite. Ela foi embora e nós ficamos ali tomando conta do paciente, né?

Cortaram o abdômen do paciente, tiraram os rins. Aí quando tirou o rim, um dos

médicos pegou e pediu que pegasse a caixa. Um já saiu, o Dr. Rui Sacramento saiu

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e ainda ficaram suturando, né? O doutor... ah, o residente ficou suturando, né? O Dr.

Pedro Henrique pegou mandou a Gorete pegar umas caixas que estavam no

vestiário. Ela foi rapidinho lá pegar no vestiário e eu fiquei. Enquanto isso, o Dr.

Fernando, que era o residente, foi suturando. Terminou a sutura, o paciente estava

praticamente sentando na mesa, porque ele levantava mesmo, porque fica assim,

né, na tala, com duas talas presas no braço e ele queria levantar da mesa mesmo.

Morto não faz isso, certo?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Depois da cirurgia?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, estava a cirurgia, ele terminou a

sutura, mas o paciente ele levantava mesmo de tanta força que ele fazia. Eu de um

lado, a Gorete, ele levantando. Mas só que a Gorete saiu para pegar a caixa que o

Dr. Pedro Henrique havia mandado ela buscar, né? Enquanto ela foi, ele ficou ali,

parado em frente à sala, muito nervoso, e eu segurando o paciente sozinha ali, né,

aí a Gorete vindo correndo, porque o corredor é muito grande no centro cirúrgico lá.

Ele terminou a sutura e o Dr. Fernando falou para ele: “Aí, olha, ele não pára”. Aí,

Deus, o Dr. Pedro Henrique pegou e falou assim: “É tão simples”. Pegou assim e fez

um corte assim, furou o paciente estava assim... parou, aí ele falou assim e... a outra

amiga foi e fez o relatório mais ou menos, mas ela não viu, né. Eu falei: nossa, mas

o paciente está parando, foi caindo a pressão, foi caindo tudo, né, rapidinho, parou.

Ele falou assim: “Está morto, vai, rapidinho, manda para UTI que eles arrumam o

corpo lá, rapidinho, rapidinho, anda, anda, vai, rapidinho, rapidinho, rapidinho”. Ele é

muito grosso, sabe? Aí eu falei: “Gorete, olha ele fez isso, Gorete”, e falava para ela.

Ele colocou só um... mandou fazer um curativo aqui. A Gorete, ela não acreditou,

né? eu falei: “Olha lá, Gorete, fez, eu vi”, né? Ela ainda falou: “Fica quieta, porque dá

medo, ele pode matar você”. “É verdade, né?” Daí o que a gente fez? Tiramos o

paciente da mesa, colocamos o prontuário embaixo do colchão da maca, levamos

para UTI e a UTI não queria aceitar, porque a UTI vai aceitar defunto? Não queria

aceitar, avisamos a supervisora. Aí eu sei que tivemos que colocar para fora e

depois disso eu nunca mais comentei isso com ninguém, senti muito medo e ainda

sinto. Ah, isso aí não foi o pior (risos), esqueci meu Deus. Aí foi depois que eu dei

entrevista na Record.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Agora?

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A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É, está fazendo uns 2 meses, né. Dei

entrevista na Record, o rapaz veio, ficou insistindo tanto que eu falei: que leve a

breca! Peguei e acabei falando, sabe? Aí passaram duas semanas e o Dr. Rui

Sacramento foi lá na minha casa. Ele falou para mim assim: “Por que você citou o

meu nome?” Mas eu não citei, o que eu citei mais foi o do Dr. Pedro Henrique, de eu

ter visto, isso que eu fiquei mas traumatizada, né, de ver isso, né. Daí ele falou

assim: “Eu vou trazer um papel para você assinar, que até meu advogado que vai

dar para você assinar esse papel e você assina para mim e pronto”. Eu falei assim:

“Mas por que eu tenho que assinar esse papel?” Ele falou: “Alegando que eu não

estava lá”. Eu falei assim: “Mas eu não posso fazer isso, o meu Deus não permite”

— eu ainda falei assim. Ele pegou e falou assim: “Não...” mas era para mim assinar,

né? E eu contei para ele, eu falei: “Não, eu não sei porque vocês estão querendo

que eu assine”. Ele falou assim: “Se você não assinar, você vai ser incluída porque

você também é culpada, você estava na cirurgia”. Eu falei: “Como que eu sou

culpada de uma coisa se eu não sou médica, eu sou somente circulante de sala” —

eu falei para ele. Ele falou: “Não adianta”. Aí passou, ele foi embora, porque meu

filho chegou e meu filho tem quase 2 metros de altura, acho que ele ficou com medo,

ele pegou e foi e saiu. Ligou duas vezes em casa, só que quando ele ligou eu falei

para ele que tinha ligado para o Dr. Marcelo Negrini — só que eu não tinha ligado,

porque eu não tinha conseguido ligar para ele. Aí ele não ligou mais também. Ai só

isso que eu consigo lembrar, porque eu estou com a cabeça assim... não consigo

lembrar.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Eu vou fazer algumas

perguntas para senhora, para ver se a senhora se lembra de alguns fatos, eu sei

que é muito tempo, mas esse agora foi recente, após a entrevista que a senhora

deu, não sei se posso corrigir, mas foi na Band, se não me engano, que a senhora

deu...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Foi na Band.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A senhora falou Record.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, mas foi na Record que eu dei

primeiro...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Na Record e na Band.

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A SRA. RITA MARIA PEREIRA - A Record e a Band, depois a Band foi a

última.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A senhora lembra o

período que a senhora trabalhou no hospital, de quando até quando? Quantos anos

a senhora trabalhou no hospital, a senhora lembra?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ah! Foram muitos anos, porque eu

trabalhava lá e trabalhava na escola, eu trabalhava nos 2, né, e eu saí de lá, fiquei

na escola, depois eu voltei de novo, tanto é que agora eu estou me aposentando,

totalmente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A senhora ainda trabalha

no hospital então?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Estou registrada, quer dizer, eu estou

trabalhando.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então ainda tem os

dados, no hospital tem os dados...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Tem, tem tudo.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A senhora conheceu o Dr.

Pedro Henrique Torrecillas, esse que a senhora citou, o Rui Noronha, o que a

senhora disse que após o procedimento de retirada saiu da sala...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Saiu.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Certo? A senhora

conheceu o Dr. Antonio Aurélio de Carvalho?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Conheço.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Conheceu? Dr. Mariano

Fiore Júnior?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Conheço

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Todos os 4 trabalhavam lá

nesse hospital?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Trabalhavam.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Eles estavam sempre

juntos, a senhora era acostumada e ver eles juntos?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ah, sempre a gente via sim, eles juntos.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - No hospital. Pelo convívio

que a senhora teve com eles durante esse tempo, qual o sentimento da senhora em

relação a eles? O comportamento deles era normal, o comportamento ético deles

como médico? A senhora chegou a desconfiar da atitude deles, a forma de eles

falarem, de tratarem o paciente? Nesse procedimento de transplante, como era o

comportamento deles como médico no hospital?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ah, eu nunca vi nada assim sabe, até eu

fiquei muito assustada, né, quando eu vi isso acontecer, porque eu nunca tinha visto.

Aparentemente conversando com a gente, nunca fizeram assim, eu vi nada de

errado, mas isso que eu vi, eu vi, estou falando e eu não estou mentindo, eu vi.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A senhora se lembra o

nome desse paciente?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Lembro.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A senhora pode citar?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É José Faria Carneiro.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O nome do paciente.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu gravei esse nome.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - José Faria Carneiro. A

senhora presenciou mais algum caso ou foi só esse que a senhora presenciou

dessa forma no hospital?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Que eu me lembre foi só esse, porque foi

de dia. À noite teve uma colega também que presenciou, mas infelizmente ela já

faleceu.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A colega já faleceu, ela

também já havia...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ela também via também, ela falava

também, comentava.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E as outras enfermeiras

do hospital também conversavam sobre isso?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Conversavam, todos comentavam.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - É?

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A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É. O comentário era geral, e a gente tinha

medo de... a gente não tinha medo assim de denunciar, a gente passava para a

nossa supervisora e a supervisora passava para a chefe geral do hospital.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Quem era a supervisora?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - De dentro do hospital era a Belmira.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Belmira.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - E aí a chefe-geral, eu não me lembro se era

a dona... eu não me lembro quem era, se era o Édio, eu não me lembro quem era.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A senhora falou que

nessa noite em que a senhora estava, que aconteceu esse fato, tinha uma

companheira da senhora, chamada Gorete. É isso?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Gorete.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Gorete de quê? O nome

dela?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não lembro o nome dela não. Parece que

era Maria Gorete, porque a gente chamava de Gorete?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Ela trabalha no hospital

até hoje, a Maria Gorete?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Lá no hospital ela não está mais, porque ela

não tinha um curso de auxiliar de enfermagem. Até ela estava fazendo, que eu me

lembro, sabe?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Mas ela mora em Taubaté

ainda?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Acho que mora, sim.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A senhora tem contato

com ela ainda? Não?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não tenho.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Não, né?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não tenho.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Mas ela que

acompanhava a senhora naquele momento?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ela me acompanhava.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O que se comentava no

hospital. Os médicos faziam isso porque... Esse rim que o Dr. Rui Sacramento, após

o transplante, essa caixa que foi buscar era para quê? Para colocar o rim dentro?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Para colocar o rim. Uma caixa até muito

especial mesmo, bem fechada, sabe? Eu estranhei que, se eles falam que é uma

nefrectomia, a gente tem que buscar gelo, e a posição na mesa de cirurgia é

diferente, não de barriga para cima, a posição é de lado, a gente amarra. Tem um

jeito assim especial para a gente colocar na mesa. Mas esse não. Esse foi barriga

para cima, na cara dura mesmo para cortar.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E eles... Depois que o Rui

Sacramento saía com o órgão, vocês não sabiam, não se comentava no hospital

para onde iam esses órgãos, não?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ah, não sei porque a gente ficava dentro do

centro cirúrgico, então, a gente não tinha contato. Aliás, eu acho que eles achavam

que a gente era invisível dentro da sala. Como se diz: ignorante não sabe nada, não

dá para ver nada, certo, então, não vi.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, eles não

comentavam assim no hospital, por exemplo: ah, esse órgão foi tirado para atender

um paciente que está esperando um rim.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - De jeito nenhum. Não falavam nada. Até

muito grosso, se achava uma pinça com um tortinho qualquer (ininteligível) no chão

e ainda xingava a gente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E a senhora tinha

conhecimento se era realizado transplante lá dentro do próprio hospital? Tirava de

uma pessoa para transplantar no outro?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, não. Isso não.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Não?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não. Nunca vi acontecer isso lá.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E as enfermeiras,

ninguém comentava isso?

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A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não também. Não porque é tudo amiga,

qualquer coisinha que acontecia um comentava com o outro assim. Nunca ouvi falar

lá dentro.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Quem era o diretor do

hospital na época? A senhora se lembra ou não?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Hum, deixe-me lembrar. Eu não sei se era o

seu Camilo.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Não tem certeza?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não tenho certeza. Não tenho certeza.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E sabe como é que o Dr.

Roosevelt Kalume ficou sabendo disso tudo? Não?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ah, isso não sei.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Não sabe, né?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não sei.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Deputado Pastor Pedro

Ribeiro.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Rita, boa tarde.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Boa tarde.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - O que o Dr. Kalume era na

época dessa cirurgia lá no hospital?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ele era diretor, segundo fiquei sabendo, ele

era diretor da Escola de Medicina.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Diretor da Escola de

Medicina. A senhora falou que essa intervenção cirúrgica foi à noite?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Foi à noite.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Foi à noite?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - No período em que eu estava trabalhando.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Final de semana ou dia da

semana? Lembra?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Hum, eu não consigo lembrar. Não consigo.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Não, né?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não consigo.

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O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - A senhora escreveu um

quadro impressionante. Quer dizer, depois que eles abriram o abdômen, que

retiraram o rim, os rins, o paciente praticamente se levantava depois de aberto.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ele se debatia muito na mesa. Ah, é, e eu

falei: “Nossa, ele está se mexendo muito”. Daí, eles falaram que era devido a efeito

de medicações, sendo que nós não tínhamos feito medicação.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Em nenhum momento ele

falou, balbuciou alguma palavra, alguma coisa?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - O paciente?

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Sim.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, ele se debatia só muito.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Ele se debatia. Deixa eu ver

aqui. A senhora sabe o sobrenome da Dra. Anita.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É Bassi, Anita, ah, eu não lembro o nome

dela inteiro. Anita Bassi... Ah, eu não me lembro.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Bassi?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - B, a, 2 s, i.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Dois s, i. A senhora acha

que ela ainda é médica lá?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Lá, não.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Lá não?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Ela é anestesista?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Anestesista.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Ela não aplicou anestesia?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ela se recusou totalmente. Ela se recusou.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - O que se chama de

cheirinho? O que é isso?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Cheirinho é um tipo de anestesia. Como eu

vou explicar? (Risos.) Vapor, vaporização que eles põem em um frasco, né?

Principalmente é usado mais em criança, que faz a inalação daquele negócio,

daquele medicamento e a pessoa dorme.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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O SR. PASTOR PEDRO RIBEIRO - O que a senhora está afirmando aqui é

tão grave, é tão grave que a gente fica perplexo. Acho que todo mundo parou para

ouvir o que a senhora disse.

Para que haja um transplante, uma retirada de um órgão de alguém é preciso

que aquele traumatizado tenha descido até à condição de morte encefálica. Quer

dizer, alguém que está em um quadro irreversível, não precisa de anestesista, ou

seja, como ele está já no último estágio para morte, falta parar só o coração, então,

não tem que fazer a anestesia. Ele é operado, retirado os órgãos , fechado, entregue

o corpo para os familiares. Neste caso, ele se debatia de tal forma que a senhora

ouviu discussão entre anestesista e os médicos fora da sala.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ouvia.

O SR. PASTOR PEDRO RIBEIRO - O paciente entrou ainda se debatendo,

eles abriram, a senhora disse, o abdômen?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Abriram o abdômen.

O SR. PASTOR PEDRO RIBEIRO - Dá para fazer cirurgia de rim pelo

abdômen?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Dá, porque abre...

O SR. PASTOR PEDRO RIBEIRO - Na frente?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Dá.

O SR. PASTOR PEDRO RIBEIRO - Muito bem. Eu não conheço.

Então, abriram, retiraram os órgãos, começaram a suturar e mesmo sendo

suturado ele ainda se debatia terrivelmente. Então, esse homem foi morto,

deliberadamente, pelos médicos. Mesmo se debatendo, se debatendo, ele não

parava.

Eu vi, pela fita, a senhora dizer que deu um corte assim. Hoje, a senhora diz

que ele furou.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não. Foi um furo. Não foi um corte. Foi um

furo que eles fizeram. Eu ainda fiquei: meu Deus, será que eu estou errada? Eu

fiquei fazendo um desenho para ver se... Mas se cortar a artéria do coração, morre!

O SR. PASTOR PEDRO RIBEIRO - É lógico!

Então, foi introduzido um furo?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Um furo.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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O SR. PASTOR PEDRO RIBEIRO - E logo em seguida ele emudeceu.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Parou.

O SR. PASTOR PEDRO RIBEIRO - Parou, aquietou-se.

Isso era um bisturi? Sim. Interessante.

A senhora lembra o instrumento cortante?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Bisturi.

O SR. PASTOR PEDRO RIBEIRO - Era um bisturi? Um bisturi.

Sr. Presidente, certamente, os companheiros querem fazer alguma pergunta.

Agradeço.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Com a palavra o

Deputado Geraldo Resende.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Também confesso que fico

pasmo com o depoimento da D. Rita.

D. Rita, a senhora é enfermeira?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Sou técnica de enfermagem.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Técnica de enfermagem.

Sr. Presidente, sem qualquer tipo de demérito, gostaria que mudassem a

tabuleta.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu estava fazendo faculdade de

enfermagem. Mas devido...

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Sem qualquer demérito.

A senhora disse que trabalhou por 2 períodos no hospital.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Isso.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - É um hospital universitário?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não. Eu trabalhava no HOSIC e também

trabalhava no Hospital Escola. Às vezes, eu fazia Hospital Escola.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Essa cirurgia que a senhora se

reporta, quando disse que a equipe médica matou, literalmente, o paciente, ela

aconteceu no Hospital Universitário?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - HOSIC.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - No HOSIC.

Para trabalhar no Hospital HOSIC, era concurso?

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A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Era seleção?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Seleção. Faz um testinho, prova. As

enfermeiras selecionam para trabalhar.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Nessa época dessa cirurgia, a

senhora era técnica de enfermagem...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Técnica de enfermagem.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - ...ou era uma atendente de

enfermagem?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não. Técnica de enfermagem e trabalhava

no centro cirúrgico como circulante. Tanto é que demorou depois um tempo, eles me

tiraram do centro cirúrgico por causa de eu ser técnica de enfermagem, porque a

experiência é maior para trabalhar para fora.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - A chefia do centro cirúrgico

geralmente é uma enfermeira?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - É uma enfermeira formada, com

curso superior.

Quem era a chefe da senhora nessa época?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - A Belmira.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - D. Belmira, que também vai...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ela vai depor já, já.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - ...vai vir depor aqui. Está bom.

Essa cirurgia foi em que horário? Porque eu não entendi. Uma hora a senhora

falou que foi à noite...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Foi à noite.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - ...e teve outra...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu não me lembro bem o horário. Eu não

sei se foi das 8 horas até às 10 horas. Eu não me lembro muito bem o horário.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Porque uma hora a senhora

disse que foi de dia e outra hora disse que foi à noite.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, mas teve de dia também.

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O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Que a senhora participou?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, eu não trabalhava de dia, mas teve...

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - A senhora trabalhava à noite?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - À noite.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Entrava que hora?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Entrava às 6 e saía às 6 da manhã, 12

horas.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Doze horas.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Doze por 36.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Doze, certo. Esse geralmente é o

padrão, 12 por 36.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É, 12 por 36.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Eu queria perguntar para a

senhora o seguinte: nesse hospital Dr. Kalume trabalhou? Trabalhava nesse

hospital?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Trabalhava.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Ele tinha alguma interferência

nesse hospital? Tinha algum cargo de confiança nesse hospital? Era diretor?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Aí eu já não sei. Daí eu já não sei. Isso daí

eu não...

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - A senhora não tinha contato com

o Dr. Roosevelt Kalume?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, porque a gente fica preso no centro

cirúrgico. Funcionário fica só ali naquele lugar.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - A senhora falou o nome do

paciente que ficou gravado, a senhora disse que ficou bem...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É, ficou gravado por causa de ter

acontecido isso.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Como é o nome do paciente

mesmo?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É José Faria Cordeiro.

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O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - José Farias Cordeiro. Tinha mais

ou menos quantos anos o Sr. José?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ah, ele aparentava... Ele já era senhor.

Aparentava, assim, uns 35 a 40 anos.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Certo.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu me lembro assim, sabe, magrinho...

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - E a senhora diz que após a... foi

uma incisão abdominal?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Abdominal.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Da onde a onde, mais ou

menos?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Aqui, ó. Foi até em baixo.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Eu queria perguntar para a

senhora o seguinte: retiraram os dois rins?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Hum, hum.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Os dois rins. E, após a retirada, a

senhora disse que o paciente ficou debatendo.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Mas foi muito rápido! E o paciente não

parava de se debater.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Sangrava?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Sangrava.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Sangrava pela incisão ou

sangrava...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Pela incisão.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Pela incisão? Hum. E aí a

senhora disse que, para ultimar a vida, já que o paciente mostrava sinais de vida —

que, se ele estava debatendo, ele estava vivo...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu também acho que estava.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - A senhora disse que foi feita uma

incisão. Aonde que foi feita essa incisão?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Olha, aqui assim, ó.

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O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Que tamanho da incisão, mais ou

menos?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não foi incisão, eles fizeram um furo.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Um furo? Que tamanho, mais ou

menos?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Foi um furo, com bisturi. Com o bisturi.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Com o bisturi?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É. Fizeram, e depois, como estava...

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Geralmente... Então, um

centímetro?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, menor que isso.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Menor?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Menor. Ele fez e depois ele pegou e falou:

“Faz o curativo aí”.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Aqui, nesta região?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Isso.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Corte com bisturi?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não foi um corte, foi um furo.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Um furo.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - O bisturi, quando a gente faz qualquer

coisinha com ele, ele faz, depois puxa, porque a pele da gente, ela é elástica, né, ela

volta.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Sei. Mas nessa região?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Isso. Aqui, ó. Desse lado.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Ou foi lateralmente?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - No meio?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Isso.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - A senhora professa qual religião?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu sou evangélica da Assembléia de Deus

Missões.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Assembléia de Deus Missões?

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A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Isso.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - A igreja da senhora, a senhora

sabe qual é a conduta que ela tem acerca de transplante, o que é que falam os

pastores, se defendem ou não defendem transplantes? O que é que eles falam? Só

para eu poder entender um pouco da...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Bom, depois que aconteceu isso que eu vi,

eu não dôo meu órgão para ninguém.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Os pastores da igreja da senhora

defendem transplante de órgãos?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - E falei isso para o meu pastor. Agora, se ele

defende eu não sei, porque eu acho que eu nunca perguntei para ele, né?

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Eles nunca discutem?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Deputado Geraldo, permite

um aparte?

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Eu só estou perguntando só para

eu saber se...

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Eu estou só pedindo um

aparte, se concede. Se não... Concede?

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Está bom, concedo.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - É que eu sou pastor da

Assembléia de Deus.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Missões?

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Missões, é. E não há entre

nós, assim, uma conduta fixa ou bíblica ou social acerca disso. Então, o fato é que

não é um assunto que seja objeto de deliberação. E todos... Por exemplo, eu, como

homem público, defendo — e sou aqui um daqueles que motiva a que tenhamos e

que permaneçamos com o projeto, o sistema de doação de órgãos. Então não há,

dentro da nossa convenção, que é nacional, essa... É livre. Todo mundo... Não há

nenhuma designação sobre isso.

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O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Certo, até agradeço. V.Exa. me

dá até essa explicação, mas eu gostaria... Porque às vezes têm determinados

dogmas em algumas igrejas que são seguidas pelo conjunto dos seus devotos.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É, o testemunho de Jeová não doa sangue,

também não recebe sangue e não quer nem saber.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - É, já vi muitos casos, inclusive de

morte, que as pessoas, por preceito religioso, na medida em que eles se negam a

ter doação.

O que a senhora relata é bastante grave, não é D. Rita? E a senhora

presenciou só esse caso?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Só esse caso.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - A senhora nunca teve mais

nenhuma... nunca circulou, porque circulante geralmente pega o material... ou a

senhora participou de outros eventos como esse, tão dantesco? Porque o quadro é

realmente muito... o quadro que a senhora nos reporta é um quadro muito, assim,

tenebroso, para não dizer palavra mais...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Feia, né?

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - É. A senhora não circulou em

nenhuma outra cirurgia desse porte?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Só foi essa cirurgia?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É, só essa, que foi muito marcante.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - A senhora não lembra se tinha

dentro do material? Porque, geralmente, o circulante às vezes tem que anotar — não

tem que anotar? — o material que usa na cirurgia e, geralmente, no prontuário que

fica ao lado do anestesista, chapas e mais chapas, exames e mais exames. A

senhora não lembra se tinha Raio X do lado, que pudesse...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, sempre vem no prontuário as coisas

que vêm da enfermaria, mas aí é a anotação da enfermaria. A gente só anota ali o

principal que aconteceu. E, nesse, nem tempo de poder marcar isso... eu não pude

marcar.

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O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Tinha quantos circulantes? A

senhora disse que tinha a senhora, mais uma colega?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Mais a outra.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Como é o nome da colega que a

senhora falou?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Gorete.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Gorete. Além da circulante, devia

ter mais gente na cirurgia, porque é uma cirurgia...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, mas à noite, à noite é assim. Às vezes

são três que trabalham à noite ou duas ou, às vezes, uma só.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Não tem muito volume de cirurgia

à noite. A cirurgia geralmente é de manhã.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Isso, não tem as cirurgias eletivas. Então,

uma suposição; fica uma na central, uma no centro cirúrgico e outra no centro

obstétrico. Então, se entrar tudo de uma vez... Aconteceu um acidente — que nem

esse, aconteceu um acidente —, entrou esse da cirurgia. Daí... E entram dois partos,

uma cesária. A gente teve que virar cinco. E, no caso, esse morreu. Aí a gente

entrega, porque tem que tirar cadáver de dentro do centro cirúrgico. Não pode ficar,

porque contamina o centro cirúrgico. A gente tem que tirar mais rápido para fora do

centro cirúrgico e atender os que estão vivos.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - E geralmente à noite tem um

número menor de circulante...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É verdade.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - ... ou de funcionário.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Isso, tem menos funcionário.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Tinha instrumentador nessa

cirurgia?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Tinha o residente.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - O residente funcionava como

instrumentador?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Como instrumentador.

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O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Esse residente geralmente é do

primeiro, do segundo... A senhora não lembra de que ano ele era?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ah, não. Aí eu já não lembro.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Porque geralmente tem o R1, R2,

R3...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É. Então, daí eu já não lembro.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Quem foi o médico que operou

esse paciente, que a senhora disse?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Dr. Rui Sacramento e Dr. Pedro Henrique.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Rui Sacramento e Dr. Pedro

Henrique eram os dois médicos.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Os dois médicos.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Mais o residente...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Dr. Fernando.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - ...mais a senhora? Mais a...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - A Gorete, que estava ajudando, né?

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Que estava ajudando. Mais o

anestesista, que a senhora disse que...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Que não ficou na sala.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - ...que fez o cheirinho...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - E foi embora.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - E se retirou. Ninguém ficou

controlando ali, só ficou...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Para cuidar do paciente ali, que

estava vivo, como a senhora disse, não ficou ninguém mais?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Certo. Depois da retirada desses

órgãos, geralmente eles colocaram numa caixa bem preparada, que ele mandou

buscar, como a senhora disse, no vestiário.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - No vestiário.

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O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Essa caixa tinha algum nome,

tinha alguma identificação?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não. Não.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Era isopor?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É um isopor, mas é diferente, né? Uma

caixa...

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - A senhora lembra se viu gelo

dentro da caixa?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Era uma caixa diferente, não estava com

gelo. Era diferente, que colocou... que tem lá dentro um lugar certo para os rins. E

ele fechou e já saiu.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Depois que — a senhora disse —

, que foram retirados os rins, que colocou nessa caixa, o doutor já saiu e não voltou

mais para a cirurgia. E o Dr. Pedro, também não voltou mais, não? Só ficou o

residente operando sozinho?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Só.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - E quem operou junto com ele?

Quem fez o...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não...

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Quem fechou junto? Ou ele

fechou sozinho?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não. O Dr. Rui com o Dr. Pedro Henrique

operaram, com o auxílio do residente. O residente instrumentando. Depois que eles

operaram, quando já tirou os rins, o Dr. Rui já saiu. Ele não ficou na sala.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Ficou o Dr. Pedro...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - O Dr. Pedro ficou, pediu para a Gorete

pegar na sala, lá no vestiário, porque ele não trouxe para a sala, as caixas. Tanto é

que a gente não sabia nem o que é que eles estavam fazendo. Aí, o Dr. Pedro que

colocou dentro, e foi lavar a mão. Colocou dentro das caixas, fechou e foi lavar as

mãos. Quando termina a cirurgia, eles arrancam as roupas e vão lavar as mãos. Só

que, na hora em que ele ia saindo, o Dr. Fernando, que estava suturando...

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Era o residente?

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A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Era o residente. Ele pegou e chamou,

porque o homem não parava. Realmente, eu não estava agüentando mais segurar

ele.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - E esse Dr. Fernando, a senhora

lembra o sobrenome dele?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ah! Não lembro.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Da Dra. Lenita a senhora

lembrou, que foi Dra. Lenita Bassi.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É Bassi, mas ela tem mais outro, mas só

que eu não lembro o nome.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Bassi.

Sr. Presidente, eu fico satisfeito com o depoimento. Eu acho que, diante do

relato da D. Rita Maria Pereira, o importante é a gente poder fazer — eu acho que já

deve haver o entendimento de toda a CPI — é convocar a Dra. Lenita Bassi para

fazer o depoimento aqui. E seria fácil encontrá-la — a não ser que veio a falecer

nesse interregno de tempo —, já que o Conselho Regional de Medicina de São

Paulo deve ter o registro. E não é um nome muito comum, Lenita Bassi. O outro

sobrenome, logicamente, a gente... E também verificar, já que a D. Rita não se

lembra do sobrenome do Dr. Fernando... Logicamente, ele deve ter terminado a

residência e poderemos, inclusive... porque o residente geralmente estuda na

mesma escola, e lá tem a Escola de Medicina de Taubaté, não?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Tem.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - E esse residente era estudante

de Taubaté ou a senhora não se lembra?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Era estudante. Ele até ficava, assim, muito

assustado, como nós ficamos. Ele estava do mesmo jeito.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Então deve ter na turma, se era

residente, R1 ou R2, durante os 6 anos de faculdade, deve ter lá alguns Fernandos,

e nós podemos inclusive trazê-lo, junto com a D. Lenita. E acho importante, até para

a gente poder elucidar melhor esse caso, que nós possamos fazer uma sessão de

acareação, porque é muito grave o que D. Rita nos traz aqui hoje. Não sei como é

que a gente pode trabalhar isso aí, mas fazer uma acareação com toda a equipe,

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junto com as atendentes, para que a gente possa de fato verificar o grau da

denúncia que D. Rita faz aqui hoje.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Eu só queria perguntar ao

nobre Deputado Geraldo Resende se V.Exa. vai querer fazer os requerimentos ou

vai querer que a Mesa faça.

O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - Pode ser.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Só neste caso. Se V.Exa.

fizer o requerimento, como Deputado pode fazer, a gente aprova e coloca na Ordem

do Dia.

Com a palavra o Deputado Geraldo Thadeu.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Sr. Presidente, Sr. Relator, Srs.

Deputados, Sras. Deputadas, D. Rita, antes de fazer algumas perguntas à D. Rita,

eu só gostaria de...

Presidente, este caso, Presidente... Existe laudo de morte cerebral nesse

caso específico, durante os depoimentos anteriores?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - No caso do cidadão citado

aqui?

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - É.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Nós estamos verificando.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - É? Então, eu até acho que nem

vou fazer tanta, tanto... o Presidente, o Sr. Relator e o Deputado Geraldo Resende já

fizeram aqui. Porque é um caso tão chocante, realmente é uma acusação tão séria

que...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Deputado Geraldo

Thadeu, este senhor citado pela Sra. Rita, José Faria Carneiro, é justamente um dos

que constam no laudo que não estava morto, através da chapa de arteriografia,

pelos quais os médicos estão respondendo ao crime de aceleração de morte por

retirada de órgãos. Está comprovado nas notas taquigráficas o depoimento prestado

na semana passada.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Quer dizer que existe o...

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A chapa de arteriografia

não comprova a morte dele. Realmente, ele não estava morto. E é por este caso,

também que os médicos estão sendo acusados. É um dos nomes.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Então, na morte encefálica, às

vezes são feitas várias radiografias. Não tem dúvida?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Não tem dúvida.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não seria, por exemplo, uma

primeira radiografia?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Foi conclusão do

delegado, conclusão do promotor e conclusão do Sr. Luís Alcides Manreza, que foi,

na época, o perito designado pelo Conselho Federal de Medicina para fazer a

perícia nas chapas de arteriografia. Conclusão dele, conclusão do delegado e

conclusão dos promotores.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Eu gostaria de pedir cópia desse

processo, de todo o material dele, para dar uma olhada nele depois, só para me

inteirar melhor desse caso, especificamente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A cópia do processo,

Deputado Geraldo Thadeu, nós também já solicitamos, por diversas vezes, à Justiça

de Taubaté e ao Ministério da Justiça. É um inquérito com mais de 9 mil folhas. Até

hoje não foi enviada a cópia, na íntegra, do processo, mas apenas um resumo do

relatório apresentado pelo Promotor Marcelo Negrini e algumas peças do inquérito,

que constam no inquérito, que foram entregues à Comissão avulsamente.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Então, eu gostaria... se no

processo, então, se não foi enviado — a Comissão já pediu —, pelo menos, se

existe, o laudo de morte cerebral. Eu gostaria de ver as radiografias que foram

apresentadas, as arteriografias que foram apresentadas, todas que foram

apresentadas, para que a gente tomasse conhecimento. Só para ter conhecimento.

Como as perguntas já foram feitas, com muito cuidado, à D. Rita, eu não

tenho nenhuma pergunta a fazer.

Obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Só a título de informação

também ao Deputado Geraldo Resende, a Anestesista Lenita Bassi realmente

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consta como médica anestesista no Estado de São Paulo. Já foi identificada. O

nome é este mesmo: Lenita Bassi. Nós vamos apenas identificar o local de trabalho,

fazer contato com ela, para a convocação da CPI.

Com a palavra a Deputada Perpétua, o Deputado Pastor Frankembergen.

Não sei qual dos dois mora mais longe, se o de Roraima ou se do Acre.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Roraima é mais distante.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - O Acre é o começo do Brasil.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Não, o começo do Brasil

é Roraima. (Risos.) Tanto é que mudou a geografia. Agora, é do Caboraí ao Chuí.

Sr. Presidente, eu gostaria de fazer algumas perguntas, e serei bem rápido.

A senhora lembra quando foi que aconteceu este caso, o ano?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Hum...

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Faz muito tempo?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Hum... Faz! Eu lembro que foi em

dezembro. Agora, falar o ano...

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Foi no mês de

dezembro?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu não lembro. Eu não lembro.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Está bem. A senhora, na

época, quando houve a denúncia e que o caso foi levado à polícia, a senhora

chegou a prestar declarações, alguma informação à polícia?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não. No começo, não. Só depois que eu

conversei com o Dr. Kalume, sem querer, porque ele tinha feito um livro e, daí — e

eu trabalhava na UTI, eu já tinha saído do centro cirúrgico. Conversando, nós

comentamos sobre isso. Daí, ele falou: “Meu Deus!”.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - A senhora tomou

conhecimento das denúncias através do livro?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Do livro. Que ele estava fazendo um livro,

né, e daí nós conversamos. Daí, eu falei para ele que eu sabia de algumas coisas.

Daí, né...

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Certo. A senhora chegou

a ser intimada alguma vez pela polícia?

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A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Fui intimada pelo Dr. Marcelo Negrini.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - E a senhora prestou as

informações à polícia?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Prestei.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - E agora, ultimamente, a

senhora deu uma nova declaração, e essa declaração foi feita para a mídia, foi para

a televisão?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu tentei fugir, mas não deu.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Está certo. Então, uma

outra pergunta. O paciente, que no caso aqui é o Sr. José Farias Carneiro, ele

estava internado no hospital para algum tratamento? O que foi que aconteceu com

ele? Ele foi lá para ser submetido a alguma cirurgia ou foi especificamente para fazer

o transplante? A senhora lembra?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Olha, o que é passado para gente é assim:

o paciente vem do setor para o centro cirúrgico. Como eu trabalhava à noite, sempre

vem emergência. À noite nunca entra cirurgia eletiva, cirurgia marcada. À noite só

entra emergência. Então, disseram que era um traumatismo, traumatismo craniano.

Então, eu pensei: vai entrar uma cirurgia de crânio, acidentado. Agora não sei o que

aconteceu com ele. Eu não sei. Eu sei que ele entrou com prontuário, só isso que eu

me lembro.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Entrou naquela mesma

noite em que a senhora estava de plantão?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Na mesma noite em que eu estava de

plantão. Acidente, traumatismo craniano. Não sei se ele foi assaltado, levou pancada

na cabeça, eu não lembro.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Em que momento a

senhora tomou conhecimento de que estaria sendo realizada uma cirurgia para a

captação de um rim ou dos rins?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Quando eles tiraram os rins, porque ele...

Eu notei que não era de crânio porque não mexeram na cabeça. Os médicos não

eram neurologistas, os que entraram. Quando a gente vê um médico diferente, a

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gente não fala nada, a gente fica quieto, porque eles são médicos, não é? Cortou o

abdômen, tirou os rins, eu não falo nada. Eles...

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - No momento em que

eles cortaram o abdômen, a senhora disse que o paciente começou a se mover, com

a tentativa de levantar-se...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É. A Gorete ainda falou: “Nossa, ele está

sentindo dor”. “Não, não está sentindo dor. São estímulos de medicamentos que ele

já tomou.”

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Quem falou isso?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Dr. Rui, Dr. Pedro Henrique. “Efeito de

medicação.”

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Foi a Gorete que

perguntou e eles responderam isso dizendo que era...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Responde isso.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - A resposta daqueles

movimentos ali eram reação do medicamento que havia sido tomado.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É. Tanto que, se eu perguntasse, qualquer

um: “Ele não pára. “Não, efeito de medicação.” Eles falam isso, não adianta.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Como é o nome da

anestesista?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Lenita.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Lenita. Ela participou de

toda a cirurgia?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, a Dra. Lenita discutiu com ele e foi

embora.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Foi ela, então, que disse

que não participaria...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É ela falou. Ela falou assim: “Eu vou colocar

um cheirinho para não dizer que eu não coloquei nada”. E foi embora.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Esse ato de colocar o

cheirinho significa colocar...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Uma inalação somente para ele...

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O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Uma inalação para que o

paciente fique anestesiado.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Anestesiado. Só que foi muito pouco, não

anestesiou nada não. Ele não dormiu não.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Deve ser Lofedrina. É

Lofedrina?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Alloferine? Não, não foi Alloferine. Deve ser

Halothane, ou Fluothane, Etrane. Esses são os inalatórios.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Tudo bem. A senhora

disse que trabalhava como circulante na sala?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É. Quem fica na sala é circulante de sala.

Pode ser auxiliar, pode ser técnico, como pode ser uma enfermeira também de nível

superior.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Qual é o trabalho de um

circulante de sala? Circular? Ficar circulando? Tem que ter um objetivo.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - A circulante de sala, ela ajuda o médico. Ela

dá os materiais esterilizados. Ela ajuda a vestir o médico.

(Intervenção inaudível.)

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Isso, ela faz tudo. Isso mesmo.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Dentro da função, claro.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Isso.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Eu quero somente...

(Não identificado) - Assessor.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - É assessor, está certo.

Eu gostaria somente de concluir aqui, voltando à questão do furo. Pelo que dá

a entender aqui, o ato de um médico enfiar o bisturi, ou seja, na altura do peito do

paciente e, a partir daquele momento, segundo o relato, foi que ele...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Sossegou.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - ...sossegou. A senhora

lembra ou a senhora chegou a ver ele perfurar?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Claro que eu vi.

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O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Está certo. A senhora

pode mais ou menos dizer que profundidade?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ah...

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Não, não, calma lá.

Estou fazendo aqui... pelo seguinte: que tamanho é o bisturi?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É deste tamanho a lâmina.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Exatamente, isso que

estou querendo saber. A lâmina, mas ela tem um... não é só a laminazinha, ela tem

uma extensão.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, tem o cabo do bisturi. A lâmina é

encaixada no cabo.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Exatamente. Eu estou

querendo aqui apenas chegar à conclusão de que, por exemplo, se o bisturi tem 2

centímetros, a quantidade que penetrou no corpo do paciente. Eu só estou... Se a

senhora tem mais ou menos uma idéia?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Não tem. Não deu para

ver. Mas a senhora lembra que penetrou e, a partir daquele momento, foi que ele

sossegou.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Foi muito rápido, porque ele não vai fazer

devagarzinho uma coisa dessas, não é?

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Então, está certo. Muito

obrigado.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Deputado...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Pois não, Deputado

Geraldo Thadeu.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Parece que, inicialmente, ela disse

que foi uma pequena incisão.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não...

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora falou agora há pouco,

que eu estava aqui.

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(Não identificado) - Eu entendi, no início, que ela falou a incisão, mais ou

menos assim o tamanho do furo.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - O diâmetro.

(Não identificado) - É o diâmetro, exatamente.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não é a profundidade. Ela não

falou em profundidade. Que tamanho é o bisturi?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - A lâmina?

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - É, que tamanho que a senhora

mostrou para mim.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Quase que eu desenho aí.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não, não, pode mostrar aí.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - A lâmina de bisturi, ela é deste tamanho,

só que ela tem uma ala assim que encaixa no cabo.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora está parecendo

pescador.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Mas é isso mesmo que eles fazem.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Eu sou cirurgião, não é esse

tamanho não, é metade disso aí.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, mas tem a Lâmina 15, tem a Lâmina

24, tem a Lâmina 23, tem a Lâmina 15, tem a Lâmina 12, tem vários tipos de lâmina.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Deputado Geraldo

Thadeu, eu queria... a depoente está aqui na condição de testemunha, mas a

citação que o senhor fez com a testemunha, de que ela está parecendo pescador,

eu acho que é ofensiva. Eu acho que daria oportunidade ao o senhor de rever a

palavra que o senhor também falou em relação a ela.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Sr. Presidente, quando o senhor

chamou a Associação, o Conselho de Medicina de corporativista, eu achei que o

senhor foi ofensivo, e o senhor não se retratou.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E chamo de novo.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Então, eu falo de novo também

que parece um comentário de pescador também.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Presidente, pela ordem.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, o senhor confirma?

O.k.

Com a palavra a Deputada Perpétua Almeida.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Eu tinha até pedido pela ordem

porque eu acho que esta discussão aqui, ela não ajuda e nem cabe a nós ficar aqui

teimando com uma enfermeira, que também não é médica, e nem nós somos, eu

não sou, sobre detalhes que só entende quem é da profissão, da função, quem é

médico.

Infelizmente, D. Rita, eu cheguei já no final do seu depoimento, mas eu só

queria ver com a Presidência da CPI, Deputado Neucimar: nós temos na CPI alguma

informação em que pé está esse processo na Justiça? Isso vai poder ajudar nas

perguntas que vou fazer?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Esse processo, Deputada

Perpétua Almeida, na época, o delegado demorou 11 anos para concluir o inquérito.

Nós chamamos o delegado para estar conosco; vai estar depondo na CPI.

Pela demora na conclusão do inquérito, não foi possível avançar nas

investigações sobre comércio, porque o crime prescreveu. Como foi denunciado

crime doloso, prescrevia com 20 anos. O Promotor Marcelo Negrini, ao chegar na

cidade de Taubaté, ele foi reavaliar o caso novamente e ofereceu novamente a

denúncia contra os médicos. Caso contrário, o crime estaria prescrevendo, mesmo

doloso, agora em 2007. E o crime já se arrasta há... Na época, foi pedido julgamento

por crime doloso dos acusados. Houve recurso, pelo advogado de defesa dos

acusados, ao Tribunal de Justiça de São Paulo. O processo ficou quase 7 anos

parado no Tribunal de Justiça de São Paulo. No final do ano passado foi votado. Os

médicos perderam por 2 a 1. Como foi 2 a 1, houve outro recurso ao Tribunal de

Justiça de São Paulo e, agora, 5 Desembargadores vão estar julgando novamente o

caso.

Só para lembrar também que o advogado dos acusados é o atual Ministro

Márcio Thomaz Bastos.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Certo. D. Rita, a senhora disse

que trabalhava à noite na época. Isso?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Trabalhava à noite.

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A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E que, normalmente, vão lá

para a cirurgia os casos de emergência.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Só emergência.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Só emergência. Então, quando

chegou aquele paciente que a senhora já tinha as informações prévias de que se

tratava de um traumatismo craniano, a senhora estava aguardando, então, um

paciente que estivesse realmente com traumatismo craniano.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - E ele estava com traumatismo craniano.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Ele estava com traumatismo

craniano. E qual era a situação dele? Como ele se encontrava naquele momento? A

senhora lembra?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ah, ele estava com a cabeça enfaixada,

né?

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Desacordado? Nada? Nenhum

sinal?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, ele estava agitado, agitado, e

continuou agitado até o fim.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Certo. Só para a gente poder

relembrar aqui. É que, nesse processo de apuração, os detalhes são importantes.

Estava a senhora e mais uma outra enfermeira, correto? E vocês estavam

preparadas para auxiliar numa cirurgia de traumatismo craniano.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Auxiliar, não, para circular.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Sim, certo.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Auxiliar é outra coisa.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - É a forma que... vai auxiliar de

alguma forma.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Isso.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Que não são exatamente as

auxiliares de enfermagem que estariam lá.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Isso.

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A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - No ato da aplicação da

anestesia, como é que aconteceu o processo? Eu queria entender melhor. Como é

que foi a discussão?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, ela não aplicou a anestesia.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Ela estaria lá para aplicar.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Só que ela se recusou.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Tá. Então, até esse se recusar,

eu quero entender esse passo. Ela foi para lá para aplicar uma anestesia. O que

aconteceu? O que ela percebeu na hora? O que ela falou? A senhora lembra?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não dava para ouvir a discussão e o

paciente na mesa. A gente não pode largar um paciente na mesa.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Certo.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Porque não tem jeito. Você tem que cuidar

do paciente. Os médicos não ligam. Enquanto uma está amarrando, a outra está

olhando o paciente para ele não cair da mesa. É sempre assim. É rotina. É normal.

Sempre uma fica com o paciente e a outra olha.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Sim.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - E eles começaram a discutir e ela gritava

muito alto: “Eu não vou auxiliar vocês nisso!”

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Na verdade, ela foi para lá para

fazer a anestesia.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ela percebeu o que era que ia acontecer,

só que nós, na sala, não sabíamos o que ia acontecer, tanto é que ela falou: “Eu só

vou fazer um cheirinho”. Um cheirinho é um tipo, assim, de anestesia muito leve, é

uma coisa nada, é uma coisa nada, praticamente.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Certo. E, na hora, então, ela foi

embora?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ela foi embora.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Alguém veio e fez a anestesia,

não?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, não fez. Porque, quando dá esse

cheirinho, o paciente amolece.

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A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Mesmo assim... Certo. Embora

a senhora disse que acha que a dosagem não foi correta...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Foi bem pouquinho, mesmo.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - ...não foi a quantidade

necessária porque ele não estava anestesiado.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Por isso que eu tenho certeza de que

estava vivo, que estava sentindo dor.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Ele reclamava ou...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, ele se debatia. Acho que não tinha

força, né?

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Certo. E quando a senhora viu

que não se tratava de uma cirurgia na cabeça, e a senhora começou a perceber que

se tratava, depois que a senhora percebeu que era retirada de rins, qual foi a reação

da senhora e da outra sua colega no momento?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ficamos quietas. O que a gente vai falar?

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Não fizeram nenhum

comentário com o médico?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - De jeito nenhum! O homem é um cavalo.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Certo. E depois? Ele saiu,

ficaram só vocês?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ficamos nós para levar o corpo.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E, depois, vocês conversaram

sobre o que tinha acontecido ali, a senhora e ela?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Claro, daí...

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - A senhora lembra o que vocês

haviam conversado?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - A gente não comenta, assim, entre nós. A

gente liga para a supervisora...

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Assim, e vocês duas? Porque,

depois, saem e vocês ficam cuidando do processo, limpando...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, o comentário da gente é avisar a

supervisora que aconteceu isso.

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A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E, aí, vocês avisaram?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Porque não dá nem tempo de conversar,

porque, enquanto está entrando um paciente, já estava entrando um parto.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Certo.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - E, no parto, no caso, a gente tem de ajudar

a pegar o neném, ajudar o médico... Então, fica aquela correria. À noite é assim.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E os rins foram colocados...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Dentro de uma caixa, tipo assim... Sabe,

tipo assim, térmica.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Certo. E a senhora lembra

quem levou de lá da sala?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Quem tirou da sala é o Dr. Pedro Henrique.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E, aí, a senhora não soube

mais nada o que aconteceu?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não. Não.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E, a partir dali, quem ficou

acompanhando o paciente?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu e a Gorete. E, aí, a gente tira o corpo da

sala, pede ajuda uma para a outra, né?

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - O corpo, ele já estava morto,

então?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ué, depois que furou, morreu.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Em seguida, a senhora lembra

desse...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Lembro, claro que eu lembro! A UTI não

queria aceitar. Porque eu vou passar um defunto para a UTI?

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Certo. D. Rita, qual foi a

sensação que a senhora teve naquele momento? O que se passou pela sua

cabeça? Qual foi o sentimento que a senhora teve ali? A senhora consegue

descrever? Lembra?

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A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu perdi a confiança. Eu achava os

médicos tão legais e, infelizmente, eu perdi a confiança. Eram pessoas em que a

gente confiava e vê-los assassinar...

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E a reação da sua amiga, a

senhora lembra qual foi, depois?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - A mesma que a minha.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E quando vocês colocaram o

problema para a supervisora do hospital, a senhora lembra qual foi a reação dela?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Elas não falam. Por causa da ética, elas já

vão e já resolvem o problema.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E o que a senhora esperava a

partir dali?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Nada, porque a cabeça da gente é treinada

assim: você está trabalhando, assim que sai um paciente, já entra outro, e assim vai

a noite inteira.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Mas, na sua cabeça, no seu

raciocínio, o sentimento que a senhora tinha era um sentimento de que achava que

aquilo estava errado, deveria ter conserto, ter punição, ter uma apuração daquilo.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu acho que deveria, sim, ter punição, mas

se a justiça dos homens não consegue, vamos ver se justiça divina vai... Eu sei que

a justiça divina resolve.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Certo. D. Rita, a senhora, se a

CPI pedir uma acareação com a senhora, o médico e a outra sua colega, a senhora

topa a acareação?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - O que é isso, a acareação?

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - É estarem todos ao mesmo

tempo no depoimento. A senhora confirmando isso, ele afirmando, desmentindo ou

dizendo a versão dele.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Para mim, tanto faz.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Está certo. Estou satisfeita.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu só tenho um problema: e se eu receber

ameaça novamente?

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A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Aí nós precisamos saber e a

Justiça também; se tivermos que pedir proteção para a senhora, vamos fazer isso.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - À minha família.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Veja bem, D. Rita, a senhora

está aqui, prestando um depoimento à CPI, que tem a obrigação de apurar,

esclarecer os fatos e, na conclusão dos trabalhos da CPI, se for o caso, pedir

punição para os responsáveis que tenham cometido ilícitos. E senhora, como uma

testemunha importante, a senhora precisa ser preservada também. A senhora

precisa ter a sua tranqüilidade. E se a senhora se sentir, a partir deste depoimento

de hoje e outros que a senhora vier a dar nesta CPI, incomodada de alguma forma,

intimidada, a senhora precisa avisar urgentemente a gente. Nós vamos dar

conhecimento à Justiça e a senhora vai ter a proteção necessária. Está certo? Muito

obrigada, Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Com a palavra o

Deputado Dimas Ramalho.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Sr. Presidente, Deputado Neucimar

Fraga; Sr. Relator, Deputado Pastor Ribeiro, primeiro, quero cumprimentar pela

forma como estão fazendo esta CPI ganhar a repercussão que está ganhando no

Brasil. Infelizmente não faço parte desta CPI, até por conta de eu fazer parte de

outra que está tendo muitos problemas, que é a CPI do BANESTADO. Infelizmente

hoje não está havendo sessão por motivos que todos sabem. Mas, dada a gravidade

das denúncias desta CPI e o fato de eu ser Deputado pelo Estado de São Paulo e

ter acompanhado, pela imprensa, mais ou menos, o que ocorreu, pediria permissão

ao Presidente, ao Relator, às Sras. Deputadas, aos Srs. Deputados, para fazer umas

perguntas à depoente, que demonstra ser uma pessoa de bem, uma pessoa que se

emociona com o fato ocorrido há muitos anos, não é D. Rita?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Há muitos anos.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Dez anos, mais ou menos?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Quantos anos?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Acho que quase vinte.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Dezoito anos?

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A SRA. RITA MARIA PEREIRA - É isso mesmo.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - De qualquer forma, a questão da

impunidade que a senhora coloca, esta CPI está existindo exatamente para cobrar

providências e mostrar que nós, Deputados da CPI, não vamos julgar ninguém, mas

vamos apontar quem errou, para que as autoridades possam tomar as providências.

Então, objetivamente, pergunto o seguinte: a senhora notou algum ferimento

no paciente, na cabeça?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Notei, sim. Saía sangue. A cabeça dele

estava enfaixada e estava umedecida com sangue a faixa, a atadura que estava na

cabeça dele.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Do fato propriamente dito, a senhora

já explicou bastante aqui que foram retirados os rins e, posteriormente, o médico

veio e teria enfiado o bisturi. Isso, de certa forma, motivou a denúncia pelo promotor

como homicídio doloso evidentemente. A minha pergunta é a seguinte: depois desse

fato com é que isso ganhou foro de publicidade, como é que a população ficou

sabendo sobre isso? A família do paciente?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Isso aí eu não sei.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Teve alguma repercussão imediata

logo depois? A imprensa noticiou isso? Quanto tempo demorou, desse fato, para

que a população tomasse conhecimento?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu acho, eu não sei, eu dei o depoimento

para o Dr. Marcelo Negrini, aí passou um certo tempo e eu não queria falar mais

sobre o assunto — já dei o depoimento, espero; se chamar, muito bem; não

chamar... Aí esse rapaz da Record, que eu falei, ele foi em casa. Nossa, mas ele

ficou insistindo, insistindo, insistindo, aí ele falou o nome do Dr. Marcelo Negrini. Eu

peguei, resolvi fazer a entrevista com ele, só que eu não quis que aparecesse meu

rosto. Dei a entrevista para ele, falei tudo, mas eu não queria mostrar, não, porque

eu estava com medo.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Mas a pergunta que faço para a

senhora é a seguinte: logo depois que aconteceu esse fato da morte do paciente...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Se teve comentário depois?

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Teve comentário na cidade?

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Ninguém falou nada?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Se teve, eu não fiquei sabendo que teve, a

gente fica presa.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Mas ali no hospital, claro que houve

comentários.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não teve.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Estava a senhora, e a Sra. Belmira

também estava presente.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ah, não, mas a Belmira, como chefe, não

comenta as coisas.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Sei, mas de qualquer maneira, como

o fato era um fato inusitado, de um médico que, em tese, em vez de salvar, pega o

bisturi e enfia no peito do paciente, se duas pessoas sabem, se a anestesista sabia,

se o médico sabia, evidente que isso correu no hospital. Aqui na Câmara, que é

grande, se o fato acontece, mais ou menos todo mundo fica sabendo. O hospital

comentou essa questão, no momento? Nunca ninguém comentou?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não sei.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - E a senhora não comentou com

ninguém mais?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Também não.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Guardou a decepção só para si.

Uma pergunta só: na entrevista que a senhora deu, a senhora disse o

seguinte: que os médicos cortavam a artéria renal e não religavam.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ah, não, isso aí eu não sei.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - A senhora não falou isso?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, eu não.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Só para informação: foi

outro depoente que disse e que está convocado e vai depor depois dela.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Só mais uma questão para a

senhora. O Dr. Roosevelt, qual o papel dele nisso tudo aí?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ele que fez a denúncia.

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O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - A senhora sabe por que ele fez a

denúncia?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Isso eu já não sei. Ele era diretor, não é?

Não sei.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Está bom. Obrigado.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - D. Rita, eu queria fazer uma

pergunta ainda à senhora. Só para ficar registrado aqui, que está sendo tudo

gravado. O seu depoimento com o Dr. Marcelo Negrini foi exatamente essa versão,

foi essa mesma história que ficou registrada lá?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu acho que foi.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Eu queria só também

perguntar, para ficar registrado: quem fez, quem introduziu o bisturi no peito?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - O Dr. Pedro Henrique.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - O Dr. Pedro Henrique.

Obrigado, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Agradecemos a presença

da Sra. Rita aqui conosco.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Só mais uma perguntinha.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Pois não, Deputado

Geraldo Thadeu.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora falou que o Dr. Kalume

escreveu um livro. Que livro era, D. Rita?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Ele escreveu um livro acho que foi sobre

tráfico de órgãos.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Tráfico de órgãos?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu acho que era. Ele estava comentando

sobre um livro que ele estava fazendo e é sobre isso.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Aí depois que a senhora

conversou com ele que a senhora...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu nem cheguei a pegar o livro dele. Até

ficou para eu pegar o livro para o Dr. Roberto, que ele está querendo o livro, que

roubaram o livro dele.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora conhece o livro? A

senhora leu o livro?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não li.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Ele mostrou o livro?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Eu sei, porque ele comentou que ele estava

fazendo o livro. Daí eu falei para ele que eu sabia.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas aí ele comentou algum caso

que estava no livro com a senhora?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - O livro, que eu estou sabendo, estava

falando sobre órgãos. Daí eu falei: “Nossa, eu vi uma cirurgia dessa”. Foi assim que

começou tudo.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Foi desse jeito que começou?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Foi.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Uma coisa que precisamos ter na

vida, às vezes é humildade. Quando eu falei para a senhora achei que a senhora

exagerou realmente o tamanho da lâmina do bisturi.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não. Mas tem lâmina grande mesmo.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não falei como pescador de...

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, mas eu nem me ofendi, eu

simplesmente até concordei.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - ...de ofender a senhora não.

Agora, o Presidente é meio às vezes fica um tanto chateado, mas não foi nesse

sentido. Acho que a gente... Mas achei realmente, até mandei buscar uma lâmina de

bisturi, que vou mostrar para o Presidente o tamanho que é.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Mas tem a lâmina 24, ela é grande mesmo,

ela é usada mais para cesária.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Agora eu vejo o seguinte: ou a

história da senhora é real e é gravíssima, é uma questão de execução. Isso tem que

ficar muito claro, agente tem que apurar a verdade realmente, ou ela é real e é

gravíssima, ou ela é fantástica.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Mas é real. Infelizmente, ela é real.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Um ou outro, porque para pegar

um bisturi enfiar no peito da pessoa e acertar o ponto xis numa tacada, ainda mais

no externo, que é um osso duro, que tem uma proteção aqui, eu acho que... Porque

o coração ou qualquer órgão, às vezes está mais à direita, mais à esquerda, mais ao

centro.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Não, mas se você acertar no coração, se

acertar numa artéria a pessoa vai embora.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mesmo na artéria, uma pessoa

para fazer um furo desse e acertar exatamente na artéria como a senhora disse, deu

um furo e puxou e o cara...

(Não identificado) - Só o médico.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Especialista.

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Especializado em anatomia.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Pode ser, por isso que estou

falando, ou é uma história real e gravíssima, ou é fantástica, um ou outro. Então, nós

temos que partir... A senhora desculpe, não estou falando aqui que a senhora está

prestando um depoimento falso nada, mas ou ele é real e é gravíssimo, ou ele é

fantástico. E acho que aí tem que ser apurado realmente para saber... Agora, a

senhora está consciente das declarações da senhora, da responsabilidade que a

senhora tem para fazer, não é?

A SRA. RITA MARIA PEREIRA - Claro.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Está bem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Sra. Rita, queremos

agradecer a presença da senhora, o depoimento prestado, a sinceridade da

senhora, a simplicidade durante o depoimento prestado, e agradecer a grande

colaboração dada para a CPI do Tráfico de Órgãos, para que possamos, na

conclusão do relatório, termos realmente instrumentos contundentes, eficazes e

precisos na apresentação do mesmo a esta Comissão. Muito obrigado.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Sr. Presidente, pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Pois não.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Ela tem os contatos da CPI se

precisar entrar em contato com a gente? Ela tem?

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Nós vamos pedir a

Secretaria da Mesa que possa ter essa conversa com a depoente. Agradecendo,

Deus abençoe a senhora, está encerrado este depoimento. Convidamos a Sra.

Belmira Angela Bittencourt a tomar assento nesta mesa e prestar juramento a esta

Comissão.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Sr. Presidente, gostaria de sugerir

à Mesa que este caso fosse extremamente cuidadoso de ser apurado rigorosamente

mas com a presença de todo o material, de todo o processo, de cópia dele,

completa, e que aqui fosse inclusive trazido o delegado, os médicos...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O delegado já está aí, vai

prestar depoimento.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - ...não, mas os médicos todos para

que se resolvesse ...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - ...os médicos já vieram

também...

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - ...mas que fosse feito uma

acareação disso aí.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga ) - V.Exa. pode fazer o

requerimento, que nós vamos colocá-lo em votação.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A Mesa não poderia?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga ) - Não. A iniciativa cabe a

qualquer Parlamentar. Como V.Exa. está propondo, eu sugiro... Como muitas vezes

o Parlamentar faz alguma sugestão e a Mesa apresenta o requerimento e alguns

Parlamentares sentem-se enciumados porque a Mesa apresentou um requerimento

que ele que tinha pensado. Então, se V.Exa. não quiser eu posso fazer, peço

permissão para fazer.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Tudo bem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Dando continuidade aos

depoimentos desta tarde, queremos convidar a Sra. Belmira Ângela Bittencourt a

prestar juramento a esta Comissão.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Faço, sob a palavra de honra,

a promessa de dizer a verdade do que souber e me for perguntado.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Queríamos informar à

depoente, em conformidade com o art. 210 do Código de Processo Penal, das

penas culminadas ao crime de falso testemunho, assim descrito no Código:

“Art. 342. fazer afirmação falsa, ou negar, ou calar

a verdade, como testemunha, perito, tradutor ou intérprete

em processo judicial, policial ou administrativo, ou em

juízo arbitral”.

A Sra. Belmira, foi citada aqui no caso, através de um depoimento prestado

em rede de televisão, um depoimento que a Comissão achou muito importante e nós

a convidamos, essa Comissão foi criada para apurar irregularidades no sistema de

transplante sobre o tráfico de órgãos no País, e o caso de Taubaté, chegou ao

conhecimento desta Comissão, existem algumas dúvidas que a Comissão precisa

tirar durante os depoimentos. Como a senhora era a enfermeira, na época, desse

caso, se não me engano, enfermeira-chefe, achamos por bem convidá-la para vir à

CPI prestar depoimento e colaborar com a Comissão em tudo que souber, não se

negando e falando a verdade de tudo que souber, porque desta forma a senhora

estará prestando um grande trabalho para esta Comissão e para a sociedade

brasileira, principalmente a sociedade paulista e o povo da cidade de Taubaté.

Vamos conceder à senhora, neste momento, o tempo de até 20 minutos, para falar

sobre os acontecimentos de Taubaté, na época em que a senhora trabalhava no

hospital, como enfermeira; o que aconteceu no hospital sobre estes fatos que estão

sendo relacionados, de que forma acontecia, quem eram os médicos envolvidos, e

como esse assunto se tornou público e chegou ao conhecimento depois das

autoridades, ou do médico Kalume, que foi um dos percursores desse assunto na

cidade de Taubaté. A senhora tem 20 minutos, que poderemos prorrogar por mais

20 minutos, se achar necessário. Assim que a senhora encerrar sua participação nos

relatos, os Deputados farão algumas perguntas para tirar dúvidas. A senhora pode

ficar bastante tranqüila e falar para a Comissão, tudo que sabe sobre o caso de

Taubaté. Com a palavra a Sra. Belmira.

A SR. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Quando iniciou esses casos em

Taubaté, ali no Hospital Santa Isabel de Clínicas, eu era enfermeira-chefe do centro

cirúrgico; foi em 1986. Os casos normalmente aconteciam no final de semana,

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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feriado e à noite. Então, normalmente, como enfermeira-chefe, eu não estava

exatamente dentro da sala de cirurgia por causa do horário que eram realizadas as

cirurgias. Apenas uma ou duas, me parece, que foram feitas durante o dia, uma

inclusive eu estava na sala de cirurgia. Outra coisa também que algumas

coincidências, que era sempre o plantão do Dr. Carlos Eduardo Pinto Mouassab,

que era o médico da UTI, sempre ele estava de plantão na UTI quando vinham os

pacientes para o centro cirúrgico. Eu não sabia também nada a respeito do caso que

aconteceria depois da cirurgia. Para mim, era uma cirurgia a mais. Então, a minha

função como enfermeira ali seria: providenciar material e pessoal, para que

realizasse a cirurgia. Agora, houve um caso... Um dos caso que me lembro, foi o

caso que eu fiquei na sala, que foi um caso que aconteceu durante o dia, o paciente

chama-se Hélder. O Hélder estava na sala de cirurgia... Porque como

enfermeira-chefe, eu quis acompanhar de perto a cirurgia para ver o que ia precisar,

como estava quase que rotina já os casos, então eu tinha que saber o que ia

precisar, diferente das demais cirurgias, que eu já estava acostumada. Então, no

caso do Hélder, eu lembro que a pressão dele estava muito baixa, estava 8 por 6,

então o Dr. Rui Sacramento, que é um dos médicos que estava em sala,

responsável pela cirurgia, mandou colocar quatro ampolas de Revivan, que é um

medicamento que ajuda a suspender a pressão arterial. E eu perguntando para ele

porque estava colocando essa medicação, ele disse que até a retirada do rim,

tinham que estar normais todas as funções do organismo, então aí a necessidade

desse Revivan, que eu mesma, apesar de ser enfermeira-chefe estava na sala no

momento, fiz essa função. E eu era... Deixe-me ver o que mais tinha... Tinha a

medicação e, depois que era retirado o rim, tinha dois isopores. Colocava o rim no

isopor escrito “rim direito” e “rim esquerdo”, e usava-se muito gelo. Tanto é que eu

tinha dificuldade de conseguir gelo que usava para esses rins que eram colocados

nesses isopores. E esse Hélder também é um paciente que veio a óbito logo, foi um

óbito rápido, não sei precisar exatamente a hora, mas foi um óbito rápido. Mas

houve casos que as funcionárias me contavam que, como os casos eram à noite, no

outro dia as funcionárias me contavam o que tinha acontecido. Então, elas falavam

que às vezes tinham alguns casos que demorava o paciente a falecer, a ir a óbito.

Então, elas não sabiam o que fazer com o paciente, porque a UTI não aceitava mais

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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o paciente, a UTI sabia que o paciente também ia a óbito, como todos os casos iam

a óbito, então não aceitavam. O paciente ficava no corredor se debatendo ou muitas

vezes esperando a hora de parar, não é, que nós chamamos a hora do óbito. Depois

também, conversando com o Dr. Rui Sacramento, eu perguntei para ele qual era a

diferença dessa cirurgia e da cirurgia normal. Porque existe a cirurgia de

nefrectomia, que o paciente sobrevive. O paciente está com um problema nos dois

rins; ele retira os dois rins e consegue sobreviver, fazendo hemodiálise depois. Ainda

existe. Nós tínhamos esse tipo de cirurgia. Então eu perguntei para o Dr. Rui

Sacramento qual que era a diferença dessa cirurgia dele, porque nós vimos,

notamos, observamos que tinha alguma coisa diferente nessas cirurgias, alguns

procedimentos diferentes. Então, ele comentou para nós... comentou comigo,

comigo, palavras do Dr. Rui Sacramento. Ele falou assim que nas cirurgias normais

a artéria renal ela é suturada, costurada e, nessa cirurgia, ele deixava a artéria

aberta, a artéria babando, sangrando. Então, a gente... Supõe-se, deduz-se que

provavelmente e o paciente ia a óbito por uma hemorragia interna, porque a artéria

renal ficava aberta, sangrando. Eu creio que são esses os fatos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Com a palavra a

Deputada Perpétua Almeida.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - D. Belmira, boa tarde.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Boa tarde.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Ouvimos agora há pouco o

depoimento da D. Rita, por sinal um depoimento bastante...

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Chocante.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - ...emocionante para a gente.

Mesmo depois de tantos anos ela consegue lembrar detalhes, e o sentimento é o

mesmo, que eu imagino, que deve ter tido naquela noite do que aconteceu. A

senhora, por exemplo, está citando um caso específico que a senhora acompanhou.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Sei.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Antes desse caso, do caso

Hélder, a senhora teria ficado sabendo de outros casos meio estranhos, como a

senhora falou, que não eram normais a forma como as cirurgias eram feitas?

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Ficamos sabendo, mas eram

casos que para nós eram assim um caso novo que estava começando a ter uma

nova... um novo tipo de cirurgia, como fosse uma cirurgia nova que estava

começando a ter a partir daquela data e que nós tínhamos que nos adaptar àquele

modelo de cirurgia. Para nós, era como uma cirurgia nova. Só isso.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Mas eram cirurgias novas e um

modelo que depois o paciente sempre vinha a falecer?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Sempre vinha a falecer. Isso aí

nós constatamos depois.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Ah, sim.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Porque eu soube da notícia...

Inclusive eu, sendo funcionaria do centro cirúrgico, eu vim a saber da notícia, eu

estava de férias em Caraguá e vi pela televisão pelo Jornal Nacional. Aí que eu vi e

falei: Nossa, é o meu hospital! Sou eu, não é o meu caso, é o caso que estou lá no

hospital. Então, daí que eu fiquei sabendo, entendeu, porque para nós até então era

só uma cirurgia normal.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E depois desse caso do Hélder,

a senhora ficou sabendo de outros casos?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Teve outros casos, teve outros

casos. Não sei precisar o nome, mas teve outros casos.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Assim 4, 5, 10?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Uns 7 a 8 mais ou menos, 7 a

8 casos.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Certo. E D. Belmira, me diga

uma coisa. Quando a senhora estava nesse caso específico do Hélder, na sala de

cirurgia, a senhora lembra? Ele chegou para fazer cirurgia de quê?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Nefrectomia. Chama

nefrectomia. Seria a retirada do rim.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Por quê?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não tem o porquê, só tem o

nome da cirurgia só tem... só tem o nome da cirurgia.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Ele estava... Qual era o

problema de saúde dele mesmo? A senhora lembra?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu não lembro, o problema de

saúde eu não lembro, só lembro que... Porque assim: como enfermeira-chefe, eu

chegava e não ficava o tempo todo dentro da sala. Então, eu chegava, muitas vezes

o paciente já estava preparado. Agora, só sei que o caso dele é um caso de suicídio.

Ele tentou suicídio, porque o Dr. Roberto, o delegado, me contou. Mas eu não tenho

outras informações.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Tá. E a senhora lembra qual

era o estado dele? Ele estava quase morto? Como é que era? A senhora lembra?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Ele estava em coma, mas no

prontuário dele não tinha nada que dizia que ele estava em morte cerebral. Não

tinha nada acusando morte cerebral.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - A senhora lembra quem aplicou

anestesia nele?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Dr. Cláudio Shiohama deu a

anestesia. Ele deu a anestesia. Só que nós temos um... lá tinha, ainda tem, um

plantão que os anestesistas, às vezes, eles fazem a anestesia, mas ele coloca o

nome da anestesia no nome de outro que tá de plantão. Então, por isso que no

prontuário do Hélder, por exemplo, não consta o nome do Dr. Cláudio Shiohama.

Consta o nome do Dr. Gil, por causa do esquema de plantão entre eles. Eles

colocam outro nome, entendeu?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Aí troca de escala.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É, troca de escala.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - D. Belmira, então ele estava na

mesa de cirurgia para tirar rins?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Certo.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Até aí, a senhora sabia que

seriam tirados os rins dele, sabia?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Sabia.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E a senhora sabia exatamente

por que, para que, para quem?

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não. Não sabia nada, nada,

nada. Não sabia.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Mas passava pela sua cabeça

que estava sendo feita uma cirurgia e que o paciente morreria em seguida? Ou na

sua cabeça o paciente ficaria bom, porque aquela cirurgia seria para ajudá-lo?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - A gente não questionava. E o

movimento no centro cirúrgico também é muito grande. Doze salas de cirurgia para

tomar conta, mais uma sala de recuperação, mais parto. É muita coisa.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Vamos tentar lembrar aqui,

porque eu sei que faz muito tempo. Pode ser que a senhora não esteja lembrada. A

senhora lembra que o caso dele era envenenamento, não é isso?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É suicídio.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Suicídio. Ele tinha se suicidado.

A senhora lembra? Foi envenenamento, foi o quê?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não lembro por que foi. Não

lembro, porque o Dr. Roberto...

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Então ele tentou se suicidar.

Então, aquele paciente que estava em cima da mesa, a senhora lembra que ele

estava ali, estava num estado de coma, pelo que a senhora lembra, porque ele

tentou o suicídio. Mas iam tirar os rins dele por quê?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Ah, não sei. A gente não

questionava. Não questionava conduta médica. A gente não questiona.

Simplesmente a gente obedecia as ordens, que ali no momento da cirurgia a gente

provia pessoal e material. Somente...

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Mas na hora não dá nem uma

vontade... “Que negócio é esse? O cara tá com um problema, vamos fazer outro?”

Nem dá essa vontade de fazer isso?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não. Não, porque inclusive no

começo eram poucos casos. Não passou pela nossa cabeça que era realmente

tráfico de órgãos. Não pensava de jeito nenhum.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Ou que o médico tivesse

errando, tivesse enganado ali?

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não pensava.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E depois? A senhora lembra

qual foi? O médico saiu da sala, deixou o paciente, levou os rins? Como é que foi? A

senhora lembra os detalhes?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Só lembro disso. Só lembro

que o médico saía, ele tirava os rins, ele levava o rim. Depois que colocava no isopor

ele ia, e o paciente ficava conosco.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Quem costurava o paciente?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Oi?

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Quem costurava o paciente?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eles mesmos terminavam.

Eles terminavam de costurar, de fazer a sutura, deixavam o paciente prontinho e

saíam com o rim. E deixavam o paciente conosco.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E a senhora lembra mais ou

menos quanto tempo ele ainda ficou vivo?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu não lembro. A morte do

Hélder, por exemplo, eu não lembro. Eu sei que foi rápido.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - D. Belmira, a senhora lembra

qual foi a sua atitude depois? Começou a conversar com as suas colegas dali? Ou

depois... fez o quê?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Lá, primeiramente, na época a

gente tinha medo de perder o emprego. Então, a gente não se falava muito. A gente

tinha medo, porque envolvia toda uma instituição, parte administrativa...

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Mas a senhora sentia, no seu

coração, ali, na sua mente, a senhora sentia que tinha alguma coisa errada ali?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - A gente começou a ver que

tinha alguma coisa errada. As funcionárias falavam para mim que tinham medo, que

o paciente começava a mexer, o que é que fazia. E a gente não sabia como fazer,

mesmo porque para onde iria o paciente? Ele não tinha destino certo. Ele não era da

UTI, porque a UTI não queria. Eu não sabia o que fazia. Então, era um problema.

Estava começando a ter... também tive problema para...

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E a senhora acompanhou a

morte dele em seguida?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, não.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Nem tem noção, por exemplo,

depois se a família chegou, o que disseram?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Também não, porque o centro

cirúrgico é uma área totalmente fechada e isolada. Então, a gente não tem esse tipo

de contato. Nem com familiar não tem.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Certo. E a senhora lembra, D.

Belmira... depois, a senhora nem tentou registrar no hospital, em algum setor,

alguma ocorrência de que podia estar havendo uma cirurgia errada ali?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Então, foi falha nossa. A gente

poderia realmente ter feito anotações...

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Um procedimento...

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Procedimentos. Nós não

fizemos, mas foi por pura ignorância mesmo do fato. Estamos tão acostumadas com

a rotina de 30, 35 cirurgias no período da manhã até às 1, 2 horas da tarde, então a

gente nem... Escrevi só o essencial.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E esse caso estranho e os

demais, sempre eram com o Dr. Rui Sacramento?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Sempre o Dr. Rui Sacramento.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Esse caso que a senhora

assistiu com o Dr. Rui Sacramento, que a senhora me disse que antes já tinha

escutado comentários, esse poderia já ser o terceiro caso, o quarto caso, o quinto

caso?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Ah, mais, porque pela data,

que ele foi, em novembro, e os outros casos começaram em setembro, mais ou

menos, em 86, então deveria ser já um...

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Todos com ele.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Com ele.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Mas então, D. Belmira, então

se antes a senhora já tinha escutado falar esses comentários acerca dessas

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cirurgias meio estranhas, a senhora estava acabando de assistir a uma que também

era estranha, não retomou a memória de que tinha alguma coisa errada e precisava

tomar providências?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, a gente não, não deu

para tomar, na hora, no momento que estava acontecendo, não, a gente não

pensava.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Tá, e depois? Quando é que a

senhora ouvir falar nessa história de novo?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Quando eu conversei com o

Dr. Kalume.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Quem era o Dr. Kalume?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - O Dr. Kalume é médico

denunciante. É o denunciante.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - A senhora é que contou para

ele a história ou ele já sabia?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Ele sabia também, ele

percebeu, ele soube não foi através de mim.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Aí vocês foram conversar,

como é que a senhora procurou?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Nós conversamos, ele fez um

livro, ele fez um livro sobre...

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Não, antes do livro, deixa só eu

tentar entender. Antes do livro, ele trabalhava no hospital com a senhora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Ele trabalhava no hospital

também, no mesmo...

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - A senhora o procurou para

conversar ou ele lhe procurou para discutir esses assuntos?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu conversei, eu comentei

com ele a respeito do caso da artéria, que o Dr .Sacramento me contou, contei para

ele, mas ele ficou sabendo ali dentro do hospital. Não sei por que fontes, através de

mim não foi, mas ele ficou sabendo ali no hospital e ali dentro do próprio centro

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cirúrgico, que ele trabalhava ali, ele estava vendo. Porque ele, como médico, ele

tinha muito mais condições de avaliar a conduta médica do que eu. Entendeu?

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Sim.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu posso olhar, eu posso estar

vendo uma artéria, mas eu posso exatamente não saber que artéria é aquela, e ele

sabe.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Claro, claro, claro. E depois dali

a senhora lembra se na cidade de Taubaté ou no Estado de São Paulo a imprensa

abordou esses assuntos, esses comentários saíram para fora do hospital?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, não saíram. Não sei

como foi abafado, mas não saiu.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Então eles só se tornaram

públicos a partir do livro?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Foi a partir do livro. A partir do

livro, não tinha antes, não tinha caso, não soube nem tive contato com família,

família nenhuma me procurou.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Certo. A senhora lembra

quantos anos depois é que abriu outro processo, que a senhora foi ouvida na

Polícia?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Um ano, foi um ano.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Um ano depois.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Um ano depois que teve o

processo, só que naquela época eu não falei tudo que eu estou falando hoje,

primeiro porque eu temia perder o emprego. Hoje eu não trabalho lá, sou evangélica,

tenho compromisso com a verdade, e a gente realmente quer falar o que a gente

sabe.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Está certo, D. Belmira. E nesse

caso do Hélder a D. Rita estava junto, a senhora lembra?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, não estava. Era a Dulce,

era outra funcionária.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E se a gente pedir aqui uma

acareação, que a senhora possa retomar esse depoimento junto com o Dr.

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Sacramento ou outro médico que estivesse na hora, a senhora teria coragem de

fazer essa acareação, esse depoimento conjunto?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Faria.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - A senhora faria.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Faria, faria porque foi assim

que aconteceu, foi assim que ele falou, tenho certeza.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Está certo. Muito obrigada, D.

Belmira.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Deputado Geraldo

Thadeu.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - D. Belmira, a senhora era

enfermeira-chefe?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Exatamente, enfermeira-chefe.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E esses casos nesse hospital

foram à noite, durante o dia, a senhora sabe?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Aconteciam geralmente à

noite, final de semana, feriado. Teve dois casos, se não me engano teve dois casos

de dia, do Hélder, por exemplo, foi ao meio-dia, então por isso que eu participei,

então os outros é mais fim de semana e feriado.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Agora, a senhora disse que a

participação da senhora era muito profissional, a senhora nunca se interessava para

saber que caso que era, quem que era, o que aconteceu. A senhora conversava

com os médicos?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não era que eu não me

interessava, é que a minha função, era muita coisa para fazer, muita coisa, então

para mim era uma cirurgia a mais, um caso a mais que já tinha isso, tinha acabado a

cirurgia e eu tinha que realmente ver o quê que eu ia fazer. E com os problemas que

poderiam surgir dali, através dali, mas até então...

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Qual que era a equipe da

senhora? A senhora trabalhava, a senhora e quem mais?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Tinha uns 10 ou 12

funcionários.

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O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas e em cada cirurgia?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Em cada cirurgia vai um

funcionário, nós chamamos de circulante, ela fica circulando na sala, atendendo o

médico, obedecendo o médico.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora é enfermeira-chefe.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu sou enfermeira-chefe,

então eu não entrava nas salas, a menos para saber como é que estava, se estava

acontecendo alguma coisa, se teve algum problema, se está precisando de alguma

coisa.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Sei.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Só assim que eu ia, senão eu

não entrava na sala.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Foi a senhora que aplicou aquele

medicamento para o paciente subir a pressão, para controlar a pressão?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Nesse caso apliquei. É, nesse

caso eu apliquei. Como eu estava dentro da sala, então o médico pediu, por ordem

médica, então eu fiz. Eu fiz a medicação nele.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora não ficava na sala?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu não estava, eu cheguei na

sala para...

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Geralmente a senhora não

acompanhava a cirurgia.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Geralmente eu não

acompanhava, mas nesse dia eu quis acompanhar para eu ver o que realmente

precisava nesse tipo de cirurgia, para ver o quê que eu iria fazer, qual a conduta que

eu iria tomar posteriormente.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E aí a senhora, como é que a

senhora viu as artérias todas abertas?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu não vi, ele me falou, eu fui

conversar com ele depois, com o Dr. Rui, depois eu conversei com ele. Expliquei

para ele qual que era a diferença, perguntei para ele: “Doutor, qual que é a diferença

entre as cirurgias normais, dentro da nefrectomia, e essas cirurgias que o senhor

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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faz? Qual a diferença?” — perguntei para ele. Aí ele explicou: “As outras a gente

sutura a artéria renal e a minha eu não suturo, eu deixo babando, eu deixo aberta a

artéria renal” — ele falou.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Deixa aberta.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Deixa aberta.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas aí, o que a senhora notou de

diferente, que a senhora achou que estava errado?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Então, isso. A artéria, por

exemplo, como eu tinha comentado anteriormente, se ele suturasse a artéria, com a

artéria suturada o paciente ele vive, ele pode fazer uma hemodiálise depois, que

hemodiálise é uma máquina que ela filtra as impurezas do sangue, ela funciona

como um rim.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Sei muito bem, agora...

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Então, no caso do paciente

com a artéria suturada ele sobreviveria.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas esse paciente que foi retirado

os órgãos dele, não era paciente com morte cerebral?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não tinha nada no prontuário

que comprovasse morte cerebral, nenhum exame, não tinha nenhum exame.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora não comentou isso com

ele?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, na época nós não

comentamos, não comentamos porque eu não sabia que era tráfico, não sabia que

era tráfico de órgãos.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas a senhora acha que é?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Agora eu acho que é.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Por que a senhora acha que é?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Pelas evidências, pelas

evidências dos casos, o paciente ir a óbito e não preocuparem com o paciente,

preocuparem só com os rins, o rim tinha que estar em bom funcionamento, o

condicionamento do rim, como é que era para o rim ser transportado. Então, ele

estava mais preocupado com o transplante, com os rins, do que com o paciente.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas na sala de cirurgia, o médico

que vai retirar um órgão, ele está preocupado em retirar o órgão.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É, mas isso hoje, eu tenho

visão hoje. Hoje, depois das coisas que eu tenho sabido, que eu tenho conversado,

que a gente tem visto, pelas notícias, então, eu tenho acompanhado.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Por que a senhora ficou quieta,

não falou?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Então, na época eu tinha

medo de perder o emprego, muito medo de perder o emprego.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E quantas cirurgias a senhora fez,

participou?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Lá no centro cirúrgico

ocorreram, foram umas 7 ou 8, mais ou menos.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E a senhora nunca falou nada e

continuava trabalhando.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Continuava trabalhando.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - De medo?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - De medo.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Alguém ameaçou a senhora de

perder o emprego?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, não, mas a gente tinha

medo de falar contra o hospital, contra os médicos, nós tínhamos medo de falar. E é

muito difícil, nós, como enfermeiros, você querer provar, comprovar alguma coisa

contra o médico. É muito difícil.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E como é que a senhora criou

coragem para falar?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Porque agora eu sou

evangélica, não temo nada, vou falar a verdade e eu sei que Deus está comigo,

porque o que eu vi, o que eu sei, eu vou falar. Eu não temo nada.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Quanto tempo depois a senhora

prestou depoimento?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Um ano.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Um ano?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Um ano.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Foi para o doutor...

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Dr. Roberto, Dr. Roberto

Barros.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - O delegado?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - O delegado. Então, mas na

época o meu depoimento não valeu porque eu me contradisse toda, porque eu

estava muito nervosa e preocupada em perder o emprego. Então eu não falei,

muitas coisas que eu estou falando hoje, eu não falei em 87, sabe?

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas o quê que a senhora falou lá

e o quê que a senhora está falando hoje?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Hoje, sobre as artérias, que é

um dado muito importante do paciente, sabe, de deixar a artéria babando. Isso é um

dado muito importante, eu não tinha falado isso da outra vez, com medo, para não

envolver o médico também. Então, hoje eu já estou falando porque eu não tenho

compromisso, não tenho vínculo, não estou trabalhando, não tenho vínculo, não

tenho problema nenhum.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E o Dr. Kalume, foi ele que

procurou a senhora ou a senhora que procurou ele para falar disso?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu encontrei ele casualmente

lá no centro cirúrgico e eu falei para ele, eu o procurei para contar para ele, para

contar para ele inclusive das artérias. Aí ele falou assim: “Ah, é um dado que eu vou

falar com o meu advogado” — na época, mas depois não deu em nada.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Ele já tinha feito o livro ou o livro

foi depois?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Tinha feito o livro.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Já tinha feito?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Tinha feito o livro.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E constavam esses casos que a

senhora participou?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu não li o livro, não li o livro.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não li. Eu sei que eu estou

citada.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora está citada no livro?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Estou citada no livro com o

nome de Elvira, estou citada no livro, eu sei que eu estou citada no livro.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas a senhora falou que o livro foi

depois, foi antes que a senhora conversou com ele?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu creio que nessa época o

livro já estava pronto. Eu creio que já estava pronto.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora foi citada no livro. Como

que a senhora foi citada? O que fala no livro? O que fala da senhora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Então, o Dr. Kalume, eu não

sei o que fala, o que fala eu não sei.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora não sabe, mas sabe

que foi citada?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu sei que fui citada, porque

alguém leu e já me falou no nome, que eu fui citada como Elvira e tal, que eu sou

enfermeira-chefe, mas sou citada sim.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E o livro foi feito antes da senhora

falar com o Dr. Kalume?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu creio que sim, eu creio que

sim, mas ele sabia que eu trabalhava lá, né, então eu creio que só foi por isso que

ele colocou. Eu não sei, isso aí eu não sei. Só ele que pode responder.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Tá bom. A senhora, esses casos

que a senhora acompanhou nenhum a senhora teve curiosidade para saber se tinha

morte cerebral, se tinha exames, conversou com o médico? A senhora nunca

conversava com o médico?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, porque nós não

fazíamos, pensa bem, nós não tínhamos, não era comum, nós nunca tivemos casos,

nunca teve, porque se fosse uma coisa legalizada, era para ter uma reunião: Olha, a

partir de agora nós vamos ter, então, é necessário que tenha tal documento, é

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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necessário que o prontuário do paciente venha com esse exame, documentando

que está com morte cerebral. Nós íamos ser comunicados. Nós não fomos

comunicados. Foi chegando a cirurgia assim: vai ter só uma nefrectomia. Pronto. Vai

ter uma nefrectomia. O paciente vinha, era uma situação de urgência, era noite, era

fora de hora, vinha como cirurgia sim.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora, como

enfermeira-chefe, a senhora nunca perguntou para eles?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas, escuta, não fez a

nefrectomia? Agora, como é que vai ficar? O paciente vai para a hemodiálise? O que

vai acontecer? A senhora nunca perguntou?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, nunca perguntei.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Nunca teve curiosidade de

perguntar para o médico?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Ou não teve coragem de perguntar

para o médico?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, não perguntei porque eu

também não me encontrava com eles, né? Como era à noite, como é que eu ia

encontrar?

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas a senhora trabalhava com

eles?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Então, mas não era sempre

que eu via.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora participava lá, a

senhora participou da cirurgia.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu participei de uma cirurgia,

de uma cirurgia.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E não perguntou nada?

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não perguntei. Perguntei só

do caso...

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Era mais um que entrava e saia lá

para senhora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Para mim era, era uma

nefrectomia.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora sabe que a senhora,

achando que estava errada, a senhora não falava nada, a senhora estava de

acordo?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Mas eu não sei se o senhor

me ouviu eu falar que eu falei que eu acho errado agora. Depois que eu ouvi todo o

comentário, foi tudo analisado, daí que eu vi. Mas na época não, na época não,

tanto é que eu continuava ali, senão eu nem ia participar disso. Eu não ia participar,

não ia estar ali, eu ia fazer alguma coisa, eu ia fazer uma reunião com os

funcionários, tinha que fazer alguma coisa. Eu não sabia que isso estava errado, o

que estava sendo, o que estava acontecendo. Eu não sabia. Era mais uma vítima do

caso ali também. Agora eles era uma equipe, entre eles, eles sabiam. Eu não sabia

nada. Para quem, os familiares, nada, se falava com os familiares, se não falava, se

tinha autorização, se não tinha. Não sabia nada. Para mim só vinha assim: olha, vem

aviso de cirurgia, quando vai ter a cirurgia, nefrectomia. Pronto.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Só isso?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Só isso. Vai ter nefrectomia,

urgência, o paciente (ininteligível), qual o setor que o paciente está? Ele está na UTI.

Então, vem o paciente.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora não conversava com o

médico?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Nem com parente nem com

ninguém?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Uma cidade assim igual Taubaté,

uma cidade menor, que é do interior, que as pessoas se interessam saber, que, às

vezes, aí a pessoa chega quem que era, o que aconteceu?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, você não conversa.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora nunca...

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não conversa.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não conversa. O paciente

entrou, fica só o paciente, põe para dentro, preparar, ver os materiais, o que precisa

e prepara, só isso. Não conversa. Eu nem conheço nenhum parente, nenhum deles.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Como é que era o Dr. Kalume?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - O Dr. Kalume é muito correto.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Correto?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Muito correto, eficiente, bom

médico.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E ele era o diretor lá do hospital?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Na época, ele era o Diretor da

Faculdade de Medicina.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Ele era cirurgião?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Cirurgião.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora trabalhava com ele?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Também. Ele era da parte de

tórax, ele era especialista da parte de tórax.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora conversava muito com

ele?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Conversava um pouco

profissionalmente.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Profissionalmente?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Profissionalmente.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Discutia casos com ele?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Alguns.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Por que que a senhora não

discutia com os outros médicos?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Porque depende da empatia

que você tem com o médico ou não. Agora o Dr. Kalume eu tinha mais empatia com

ele, de conversar.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora era mais amiga do Dr.

Kalume?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Mais amiga do Dr. Kalume.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E com os outros não?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Com os outros não, eu não

tinha essa liberdade de conversar.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Nenhum deles?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não. Esses outros da equipe

não. Dr. Pedro, Dr. Torrecillas, não; Dr. Mariano nem o Dr. Aurélio.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Muito bem. Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Com a palavra o

Deputado Dimas Ramalho, PPS de São Paulo.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Sr. Presidente, eu queria só

perguntar para depoente que o que ela está falando é de muita gravidade, ela sabe

o que ela está falando, que é de muita gravidade. A senhora falou em tráfico de

órgãos, a senhora está dizendo que houve tráfico de órgãos. O Deputado não

perguntou para senhora se havia tráfico, a senhora falou: Não, tem tráfico de órgãos.

O que que é tráfico de órgãos para a senhora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - O que eu tenho visto dizer,

tenho visto pelos jornais, eu estou falando pelos jornais que eu vi.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Sim, mas eu sei. Mas o que a

senhora entende como tráfico de órgãos? Só para gente conceituar um pouco isso.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É que retirava-se um rim e

manda-se para um particular, um terceiro que você não sabe quem é ou por que

meios que ele está sendo levado.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Está certo, perfeito. Outra questão

para a senhora é o seguinte: Taubaté não é um Município tão grande. É um

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Município grande, importante de São Paulo, mas não é um Município muito grande.

Ou seja, um fato desse tipo ganha repercussão. E é inevitável que no hospital, se

mais uma pessoa fica sabendo, nunca a senhora conversou com outra enfermeira

sobre esse fato? Se estaria acontecendo coisas estranhas no hospital? Houve essa

conversa com outra enfermeira ou não? Alguém procurou a senhora para perguntar:

Olha, estou achando que está havendo muita cirurgia de rins aqui. Alguém procurou

a senhora nesse sentido?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Então, quando começava a

falar, a gente já não falava mais que a gente estava vendo que estava a perigo. Eu

quando comecei a falar com o Dr. Kalume, quando eu contei das artérias, ele falou:

Vou falar com meu advogado. Eu falei: nossa, isso aí é sério. Aí que eu caí em mim

e vi que realmente isso aí eu estava falando coisa séria.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Mas fora a senhora, mais alguém do

corpo clínico, mais uma enfermeira ou um paramédico, alguém comentou esse fato

com a senhora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Ninguém comentou isso?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, não comentava.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - A senhora falou que houve 7

cirurgias, que a senhora conhece 7 cirurgias?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Sete a 8.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Então, 7 a 8. E ninguém comentou

isso?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - o corpo clínico que fazia a cirurgia,

quem servia de instrumentadora, circulante, eram sempre as mesmas pessoas ou

não? Ou mudava?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eram sempre as mesmas

pessoas.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Então, havia quase que uma

conivência em relação a isso? Um pacto de silêncio seria? Com medo?

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É, mas tem, no centro

cirúrgico corre esse medo. Inclusive quando tem caso sério lá nós até somos

obrigados a transcrever o prontuário, passar a limpo o prontuário. Tirar, então,

dependendo daquilo que você anota, você é obrigado a refazer o prontuário. Não foi

nesses casos, que esses casos eu olhei, eu vi que estava até incompleto.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Como é que a senhora ficou

sabendo que eram 7 ou 8 casos?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Então, revendo agora, revendo

agora.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Revendo há quanto tempo?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Ah, essa semana que eu revi.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Ah, só essa semana você ficou

sabendo que foram 7 ou 8 casos?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Então, quer dizer, durante todo esse

tempo a senhora não sabia quantos casos eram?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Ah, a senhora tem noção de quantos

casos eram ou não?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não tinha idéia de quantos

eram não.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - E como é que a senhora pesquisou

para saber que são 7 ou 8 casos?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Agora foi através do Dr.

Roberto.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Qual, o que escreveu o livro?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - O Dr. Roberto disse que vai

testemunhar agora.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Ah, do delegado?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Delegado.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Quer dizer que a senhora, antes de

vir aqui, conversou com ele para saber quantos casos eram?

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu fui me inteirar dos casos

para saber dos casos que tinham.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - E quando a senhora foi se inteirar, a

senhora se situou na época, a senhora se lembrou dos casos ou não?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Então, daí eu me lembrei do

Hélder, que eu realmente...

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - E os outros 7 casos, a senhora se

lembrou ou não?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, daí eu fiquei sabendo

assim muito por alto.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - E quem falou para a senhora por

alto?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, eu me lembrei de ler, de

olhar no prontuário, de rever, mas nós não escrevemos muita coisa. A enfermagem

nessa parte ela é falha, ela não tem muita escrita.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Não, eu sei. Eu só estou entendendo

o seguinte: eu sei que a senhora está aqui como apenas testemunha para colaborar,

mas nós queremos entender. Durante todo esse tempo, a senhora nunca imaginou

que tinham 7 ou 8 casos?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Nunca imaginou?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - A senhora achava que tinha um

caso só?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não. Um caso não, eu sabia

que tinha mais, sabia que tinha mais pelos casos que vinham, sabia que tinha mais.

Mas não sabia quantos.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Mas a senhora não sabia quantos?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não sabia.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - E a semana passada a senhora

procurou o delegado e ele falou para a senhora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É, agora.

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O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - E como ele falou para a senhora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Porque nós fomos nos inteirar,

ele tem as cópias dos prontuários. Então, nós fomos olhar para verificar...

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - E a senhora chegou a conversar

com outra enfermeira nesse período para saber: Olha, aquele tempo atrás nós

ficamos quietas. Chegou a tratar desse assunto? Porque vir aqui é um

acontecimento que não é normal na vida das pessoas. A senhora chegou a

conversar com outras pessoas?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Então, conversei só com a

Rita, que é depoente, que falou: “Nossa, como é que depois de tanto tempo você

teve a coragem de falar?” Falei para ela que era o mesmo assunto, o mesmo caso

dela.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - E durante todo esse tempo, mudou

alguma coisa na sua vida? A senhora nunca ficou: olha, fui testemunha de um caso

que acho que foi irregular, não falei nada para ninguém...

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Você fica... não só desses

casos, mas com vários casos que você fica sabendo.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Sim, mas esse caso específico que

a senhora disse que, em tese, é tráfico de órgãos. A senhora ficou questionando

essa questão?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Você fica questionando, mas

você se sente impotente perto de tudo isso que está acontecendo. Você não sabe o

que fazer, o que provar, o que falar, porque é enfermagem, é contra médico. Então,

se eu fosse uma médica, eu vendo a cirurgia, eu falaria o que estava fazendo. Mas

eu como enfermeira fica difícil. Eu sou impotente.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Eu sei. Aquela outra circulante

chegou a falar com a senhora: “Olha, estou vendo coisa estranha aí”.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Também não comentou.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Nunca ninguém levou reclamação

para a senhora? A senhora é enfermeira-chefe?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - O que eles comentavam era

que os pacientes se debatiam e eles não sabiam o que fazer. Um estava até com

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medo porque o paciente parecia que estava morrendo e de repente ele se debatia.

Então, essas coisas que eles levavam para mim. E como era tudo novo, eu também

não sabia o que fazer ainda.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Deputado, me dê um aparte?

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Claro.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - D. Belmira, a senhora trabalhou

no mesmo hospital da D. Rita?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Mesmo hospital, fui chefe dela.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Tá. Teve um caso que ela

assistiu, que foi um rapaz que estava com traumatismo craniano. Ela me disse que,

como achou estranho, depois confirmou, contou o acontecido para a

enfermeira-chefe. A senhora se lembra disso? Teria sido a senhora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Lembro desse caso. Ele se

debateu.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Qual foi a procedência do caso

que a senhora deu? Registraram como algo incomum no hospital? Fizeram alguma

comissão para investigar?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não foi feito nada.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Quando ela lhe contou, qual foi

a sua reação?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Foi estranho só, porque como

a cirurgia era nova, fiquei pensando se eles teriam feito alguma coisa. Ficamos

questionando o que mais eles fizeram: Por que o paciente fez? Será que foi da

anestesia? Será que foi reação à alguma coisa? Ficamos questionando, porque

também não sabíamos.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Qual era o conceito dessa equipe

médica que, em tese, tirava rins para outros meios? O conceito era bom na cidade?

No hospital, era bom? O pessoal respeitava essa equipe ou havia reservas?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Olha, o Dr. Rui Sacramento

até que é respeitado, sim.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Depois desse fato, o que mudou nos

procedimentos? Houve mais cuidado? Quanto tempo a senhora ficou lá no hospital?

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - No centro cirúrgico fiquei 2

anos. Estava o primeiro ano lá e ainda fiquei mais um ano, no centro cirúrgico.

Depois, fui chefe geral de enfermagem.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - E daí a senhora saiu, se aposentou?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, saí para outro setor. Em

vez de ser só do centro cirúrgico...

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Agora, a senhora não trabalha mais

lá?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não trabalho em lugar algum,

agora.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - A senhora se aposentou?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Também não, não me

aposentei.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - A senhora não trabalha mais por que

não quer trabalhar mais?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não trabalho. O meu marido

trabalha em outra área agora.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Tudo bem. Isso daí levou a senhora

a precisar fazer algum tratamento, algum apoio psicológico?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Cheguei à conclusão de que a

enfermagem é difícil, porque é uma área que você luta e se você quiser mudar

alguma coisa sozinha não consegue. Eu, como enfermeira, e com essa qualidade

que tenho de falar o que penso, falar o que vejo, tenho muita dificuldade de arranjar

emprego. Creio também que seja por que digo a verdade.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Só para terminar, Sr. Presidente.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Peço mais um aparte.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Pois não.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - D. Belmira, como o caso é

muito antigo, precisamos puxar um pouco na memória de vocês para que se

lembrem. A senhora me disse que o sentimento que tinha era de que precisava

largar a profissão porque via que não iria conseguir resolver nada sozinha, pelo fato

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do seu comportamento de dizer tudo o que pensava e o que via. Na época, com

quem a senhora comentou o que a senhora pensava e o que senhora via?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Na época eu não comentei,

porque não sabia o que estava acontecendo. Não comentei.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - A senhora só tinha dúvidas,

mas não tinha certeza.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Só tinha dúvida, mas não tinha

certeza. Não sou médica para saber o que estava acontecendo ali.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - A senhora lembra daquela

equipe de médicos e de pessoas que trabalhavam no hospital que também tinham

dúvidas como a senhora, além da D. Rita, que a gente podia chamar para ouvir?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É difícil.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Se a senhora voltar a lembrar,

a senhora avisa para gente?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Aviso.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Está certo.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Para terminar, Sr. Presidente,

pergunto o seguinte: depois desse fato, a senhora precisou de algum apoio

psicológico para superar todas essas questões ou não?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não precisei, porque para nós

não sei o que pensávamos o que era.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Está bom. E segundo, o seguinte: a

senhora está fazendo uma afirmação que é grave e a senhora está, em tese ou

involuntariamente, assumindo uma responsabilidade que a coloca em uma situação,

inclusive, de uma eventual penalidade. A senhora tem consciência disso?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Sobre o quê?

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Não, a senhora está dizendo que

presenciou coisas que a senhora achava irregulares.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Ah, certo.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Que em tese houve tráfico de rins,

que houve alguma intervenção que não era correta. E se a senhora como

enfermeira-chefe presenciou e não falou, a senhora acaba sendo...

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu não falei porque eu não

sabia que era.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - Não, tudo bem.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Vim saber depois.

O SR. DEPUTADO DIMAS RAMALHO - É isso, Presidente, obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Com a palavra o Relator,

Pastor Pedro Ribeiro.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - D. Belmira, boa tarde.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Boa tarde.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - A senhora lembra a razão

da internação do Hélder?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Suicídio, tentou suicídio.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - A alegativa é de que ele

havia tentado suicídio.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Suicídio.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Mas ele chegou respirando?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Isso eu não sei, porque ele

chegou na UTI. Para nós ele já veio direto da UTI.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Mas lá na sala de cirurgia,

qual era o quadro dele?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Ah, ele chegou aparentemente

em coma.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Aí a senhora foi instada

pelo médico a aplicar 4 ampolas de Revivan.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Isso.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - A senhora aplicou?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Apliquei.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Sob a alegativa de que os

órgãos internos tinham que ficar vivos ativos.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Isso.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Mas, aparentemente,

clinicamente o quadro não demonstrava vida, não demonstrava que ele estivesse...

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Demonstrava que ele estava

em coma.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Ele estava em coma. E o

anestesista foi Carlos Eduardo Pinto?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, Carlos Eduardo Pinto é

plantonista da UTI.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - É plantonista da UTI?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É plantonista da UTI.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Esse estava lá também?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Ele que estava na UTI e que

liberava os pacientes. Quando era plantão dele na UTI, ele liberava os pacientes

para cirurgia.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Certo, quem fez, foi Cláudio

Shiohama?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Shiohama. Esse é anestesista.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - A senhora acha que no

registro ficou o nome Gil.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Ficou Gil, Dr. Gil.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Então, o Hélder chegou,

aparentemente em coma, foi aplicado o Revivan, e o médico disse que ia fazer uma

nefrectomia. Fez a nefrectomia, após isso ele não fechou a arterial renal, aí ficou

sangrando?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu acho que não fechou, ele

não falou exatamente desse caso. Quando ele me falou, foi geral, foi genérico. Ele

me falou, nos nossos casos nós não fechamos a artéria. Ele falou, então, supõe-se.

Do Hélder eu não sei exatamente, ele não falou: “Olha, foi desse caso”.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - A senhora lembra do

quadro do Hélder depois da operação, depois da nefrectomia?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não lembro, porque eu saí da

sala. Como era chefe, eu não ficava o tempo todo lá. Eu saí da sala, eu fiquei só

esse tempo, foi o que eu vi e o que eu fiz.

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O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - No caso do Hélder, qual o

fato que lhe faz crer que tenha havido alguma irregularidade?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Do Hélder?

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Sim. Que foi esse caso que

a senhora acompanhou, que esteve junto. Porque ele chegou em coma. Então, a

comunicação de que haveria uma nefrectomia. Então, os médicos chegaram e a

senhora, veio o anestesista.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Certo.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Me diga uma coisa, a

pessoa quando está em coma, mesmo estando em coma, ela recebe anestesia?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não precisaria, normalmente

não precisaria.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Não precisaria. Alguém

morto recebe anestesia? Não. E a senhora tem certeza de que o Cláudio Shiohama

aplicou a anestesia?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Fez. Ele aplicou alloferine, que

é um relaxante muscular.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Como é o nome?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Alloferine.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Aloperine?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Alloferine, com efe.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Alloferine, com efe. É

injetável?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É injetável.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Injetável. Então, o Cláudio

Shiohama aplicou Alloferine.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Certo.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Após essa aplicação, então,

o paciente foi aberto, retirado os rins direito e esquerdo, cada um na sua caixa e a

senhora saiu e não viu mais o que aconteceu?

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não vi mais. O que foi de

diferente foi que ele foi a óbito logo. Logo ele já foi a óbito. Agora, ele não sei se é o

caso das artérias, só sei que ele foi a óbito logo.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Sei. A senhora soube que

ele tinha ido a óbito quando?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não me lembro.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Foi logo após sair? Por que

a senhora acha que foi logo?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Porque eu sei que o caso dele

foi logo. Porque a gente sabia os casos demoravam, às vezes a gente comentava

tudo. Mas o dele foi logo.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Como enfermeira-chefe a

senhora leu o prontuário dele? Leu depois ou no período?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Li o prontuário dele.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Não viu presença dos

exames clínicos e os exames, como é que chama, que faz para constatar a morte

encefálica?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não me recordo, não me

recordo se tem ou se não tem.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Arteriografia.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não me recordo.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Então não recorda. Quando

foi que a senhora conversou com o Dr. Rui Sacramento, que deu essa explicação

que os pacientes dele, como se fosse alguma coisa nova, ele costumava não fechar

a artéria renal, deixava aberta?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Então, foi depois da cirurgia do

Hélder.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Aí um dia a senhora...

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Foi depois, mas não logo em

seguida, que ele pudesse dizer que é daquela cirurgia. Eu lembro que foi, como ele

estava sempre no centro cirúrgico, ele fazia outros tipos de cirurgia também, ele é

urologista, então, eu lembro que eu comentei com ele.

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O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Aí pediu explicação porque

uns fechavam e outros não.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Qual que era a diferença da

cirurgia dele e de outras cirurgias também chamada nefrectomia. Aí que ele explicou

a diferença.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Certo. Mas a senhora

observou que sempre essa metodologia de deixar a arteira aberta culminava em

morte.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Sempre morte. Nos casos,

sempre morte.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - A senhora sofreu, depois

que prestou depoimentos ao Dr. Roberto?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Dr. Roberto.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - E depois na Rede

Bandeirantes, a senhora recebeu alguma afronta, alguma perseguição, alguma

ameaça?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, não sofri nenhuma.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Até agora não houve.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - No primeiro caso porque o

meu depoimento foi contraditório, então não valeu, então não teve grandes coisas. E

no segundo e agora na minha declaração, também não teve. Ninguém me procurou,

a não ser jornal. É normal, jornal, televisão.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Mas ninguém lhe procurou

para dizer: “Olhe, pare com isso porque...”

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Nada. Satisfeito, Sr.

Presidente. Ah, desculpe. Em que posição o paciente Hélder foi posto na mesa?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Isso também é uma das

diferenças. Porque nas cirurgias normais o paciente, se fosse tirar o rim direito e o

rim esquerdo, ele ficava em posição lateral. Colocava um esparadrapo largo, um

esparadrapo grande para fixar, para ficar nessa posição lateral. E quando era para

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retirar outros órgãos ficava em posição dorsal, de costas, deitado de costas, barriga

para cima.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Sei, e foi assim que o

Hélder foi operado?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - O Hélder foi operado assim.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Com a palavra o

Deputado Geraldo Thadeu.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Da. Belmira, caro Relator, eu

tenho uma informação de que no paciente que é retirado... Na nefrectomia com

morte cerebral, não é necessária a ligação das artérias após a retirada do órgão.

Não é necessária. Então, essa a informação científica.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Qual a informação,

Deputado Geraldo Thadeu?

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Que após a retirada do rim, por

exemplo, as artérias não são ligadas quando existe morte cerebral.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E quando não existe?

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Aí eu não... Estou só falando.

Pode ser verificado se é real ou não é.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Mas o questionamento aí

também é de morte cerebral, se havia morte cerebral ou não. Aí também está a

questão.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas aí a senhora... Como a

senhora disse que a senhora só chegava, o paciente entrava e a senhora preparava

tudo, não ficava na sala, não acompanhava, a senhora não discutia com o médico,

não tinha informação nenhuma...

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Mas no prontuário eu vi. No

prontuário não tinha nenhum exame que constatasse. Isso eu sei.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas o exame que constata morte

cerebral nem sempre está lá junto com a mesa de cirurgia.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Mas geralmente acompanha,

na cirurgia acompanha todos os exames. Todos os exames que o paciente fez antes

da cirurgia, depois da cirurgia, sempre acompanham esses exames.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E a senhora acompanhava tudo

isso?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Alguns casos que dava eu

acompanhava.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Alguns, por que não acompanhava

todos?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Porque não dava tempo, era

muito serviço, muita coisa para eu fazer.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas a senhora não era a

enfermeira-chefe?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Enfermeira-chefe, mas não

dava tempo para todos. Doze salas de cirurgias, mais parto, mais... É muita coisa.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E a senhora só foi certificar que

eram sete casos, seis casos agora, uma semana atrás?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É. Porque, como não deu em

nada, você fica até pensando o que é certo, o que é errado. Você começa a

questionar de novo o que é certo o que é errado. Você não valeu nada, não serviu

nada. Falar? Falar o quê? Falar para quem? Falar onde? Você começa a questionar

depois desse tempo. Agora, como ressurgiu o caso, então, vamos rever, vamos ver

o que que é. Eu também agora estou diferente, os anos se passaram, então, agora

realmente estou falando tudo. Então é isso que aconteceu.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Então, naquela época a senhora

não falava porque tinha medo e passou o medo, agora não tem mais medo.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu não falava, eu tinha medo.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas a senhora nunca foi

ameaçada?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Nunca fui. Mas eu tinha medo

de perder o emprego. Eu ia falar do meu hospital, entendeu?

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - É só um aparte, D. Belmira, eu

quero tirar essa dúvida. A senhora antes não falava porque a senhora não tinha

certeza, a senhora tinha dúvida ou por que a senhora tinha medo?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu não tinha certeza, mas se

soubesse alguma coisa, como foi o caso do dia do depoimento, eu não depus, eu

não falei, porque aí eu tive medo. Do que eu sabia, eu tive medo, eu não falei. As

duas coisas.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora não tinha certeza.

Agora a senhora tem certeza?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Agora eu tenho certeza, pelas

evidências.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Por que a senhora...Que

evidências? Quais evidências?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Evidências, jornais falando,

comentando, a gente vai indo mais a fundo, olhando prontuário, porque eu nunca

mais vi prontuário, nunca mais conversei, nunca mais falei.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora vê o prontuário depois?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Agora, eu vi o prontuário.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Quando que a senhora viu esse

prontuário?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - A semana passada.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Quem mostrou para a senhora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Dr. Roberto.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Quem?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Dr. Roberto.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - O delegado? A senhora foi depor

novamente?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Fui conversar com ele, porque

eu vim junto com ele de Taubaté. A primeira vez que eu venho e venho de avião

também, a primeira vez. Então, a gente veio com ele. Então, precisava ter contato

com ele.

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O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Então, mas a senhora viu esse

prontuário foi semana passada...

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - A semana passada.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Ou agora na viagem com ele?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Essa semana agora. Não

lembro o dia que eu fui lá conversar com ele.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Aí que a senhora viu o prontuário?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É que eu vi o prontuário, mas

o prontuário é muito incompleto. O prontuário não dá muitos dados. É isso que eu

falei: a enfermagem, ela peca por escrever pouco. Se a gente escrevesse mais,

talvez teria mais dados, mais coisas, mas a gente escreve pouco. Então, não dá

muitos dados.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora sabia para onde esses

órgãos iam?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não sabia. A partir dali não

sabia. Nunca soube.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não tinha mais notícia nenhuma?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não. Não tinha mais notícia

nunca. Isso eles não comentavam com a gente.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Quem não comentava?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Dr. Rui, Dr. Pedro. Eles não

conversavam assim. Eles não contavam para a gente isso.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não, mas pelo que eu sinto, a

senhora não conversava nada com eles.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, muito pouco.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora entrava quieta, saia

calada.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Muito pouco.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - É?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Muito bem.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Porque eu tinha funcionária,

né, que fazia o serviço. Eu arrumava funcionário, pessoal e o material. Então, essa

era a minha função realmente. Então, eu fazia isso aí para ele. Ele estava servindo,

a funcionária servia o que ele pedia. Ela estava ali, servia ele na sala. Então, estava

tudo certo.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Sr. Presidente, está aqui. Pediu

para ver. Realmente, a depoente anterior tinha razão. A lâmina maior é mais ou

menos a que ela mesma apresentou e a lâmina menor é nessa... justiça seja feita. A

gente tem de fazer justiça. A gente não pode querer acusar ninguém sem ter prova

concreta. Tem de fazer justiça. Agora, com respeito a... Eu acho a senhora muito

cheia de dúvida.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Como, por exemplo?

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora não tinha coragem

nenhuma, agora a senhora virou tão corajosa. O que aconteceu com a senhora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Então, agora eu sou

evangélica. É diferente. Eu mudei. Sou outra pessoa. Estou mais velha, mais

madura, não trabalho. Não tenho vínculo com o hospital, não tenho vínculo com os

médicos, apesar de a cidade ser pequena, porque eu morria de medo de não ter

emprego, 3 hospitais. Os médicos trabalham aqui, trabalham ali. E agora, não. Não

tenho, não tenho vínculo com eles. Não preciso deles. Não estou lá. Não trabalho.

Não tenho...

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - A senhora não gostava dos

médicos?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Gostava. Quando trabalhava,

gostava. Sempre gostei. Trabalhava direitinho. Ele fazia a função dele. Eu fazia a

minha função, tanto é que eu fui promovida depois. Depois, eu fui chefe de

enfermagem. Fui chefe do hospital inteiro.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Quem promoveu a senhora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - O próprio hospital me

promoveu.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas quem que era o seu chefe

que te promoveu?

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - O provedor.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Quem era o provedor?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - O provedor... esqueci o nome

dele agora.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Dr. Kalume?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não. Dr. Kalume era médico.

É médico como os outros, né?

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Sei.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - O provedor não é médico.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Por que o repórter da tevê

procurou a senhora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Ah... porque que ele procurou

também não sei, como ele me achou. Eu não sei. Essa turma acha a gente, né?

Acha o telefone. Meu telefone, inclusive, mudou. Eu achei estranho até. Meu

telefone mudou, eles me acharam. Não sei quem contou.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Quem indicou a senhora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É, não sei. Não sei quem

indicou.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Está bom.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Ele falou que ele leu o livro

também. Pode ser pelo livro.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - É que o seu nome estava

colocado.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Estava no livro

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Sei, sei.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Estava no livro. Ele disse que

leu o livro.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Está bom. Muito obrigado.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - De nada.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Sr. Presidente, pela ordem. Só

uma informação. V.Exa. tem a informação de quanto tempo depois desses ocorridos

saiu o livro?

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Olha, o livro... nós

sabemos que qualquer escritor não pode escrever um livro rápido. A primeira edição,

se não me engano, saiu em 92 ou 93, alguma coisa assim. Acho que uns 4, 5 anos

depois que começaram a acontecer os fatos.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - E o primeiro processo foi

encerrado antes do livro sair, não é isso?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Não tenho informação

assim precisa, porque o livro...

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Não tem informação? Não,

porque, depois, foi reaberto o inquérito, sim...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O inquérito foi concluído

11 anos depois.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Sim.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, deve ter sido

concluído em 88. Em noventa e...

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Mesmo depois do livro?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - É isso, 97, se não me

engano, alguma coisa assim.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - O inquérito ficou na mão desse

delegado que vai depor daqui a pouco.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Vai depor daqui a pouco.

O Deputado Pastor Frankembergen vai fazer uso da palavra. Só quero

informar que nós temos mais um depoente, e nós precisamos encerrar no máximo

os trabalhos aqui até às 18h30. As informações prestadas pela Belmira foram

bastante importantes. Vou passar a palavra para o Deputado Pastor Frankembergen

fazer uso da palavra por alguns minutos, e, depois, vamos chamar o delegado para

ouvir, que é importante também ouvi-lo.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Sr. Presidente, nobres

colegas, eu gostaria de fazer algumas perguntas, e vou ser bem rápido.

É comum os médicos deixarem de fazer as anotações necessárias nos

prontuários?

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É comum. Tanto os médicos

quanto a enfermagem também não fazem as anotações que devem. É comum, os

prontuários não são completos.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - A senhora chegou a

comentar que os médicos... A única preocupação dos médicos era mais em retirar

os rins.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Certo.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Eles entravam lá

somente para retirar os rins.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É verdade.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Esses pacientes que

foram atendidos por esses médicos, eles eram atendidos diretamente por eles ao

entrarem no hospital, ou havia um médico que os acompanhavam anteriormente, e,

depois, eram passados para os médicos que realizavam a captação dos órgãos?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Diretamente por eles, a equipe

do Dr. Rui Sacramento. Rui e Dr. Pedro.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Então, por exemplo, no

caso da pessoa que entrou por tentativa de suicídio...

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Sei.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Quem atendeu o

paciente em primeiro lugar? Foi diretamente esses médicos que já receberam, e

atenderam, e já levaram lá para a sala de cirurgia para realizar?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Porque é assim: o paciente

chega pela porta, quem recebe é a enfermagem, a enfermagem leva até a sala. O

anestesista vem primeiro, faz a anestesia, aí, o cirurgião entre na sala. É assim que

se procede. Foi o caso do Hélder.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - No caso do Hélder, no

mesmo dia que ele deu entrada no pronto-socorro, lá no hospital, nesse mesmo dia

foi realizada a cirurgia?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Ah, isso eu não me recordo.

Não me recordo.

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O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - A senhora não sabe. No

prontuário consta a data em que ele entrou e a data em que foi feita a cirurgia?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Consta, mas eu não me

recordo.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - A senhora não lembra se

foi 2 dias depois, 1 dia depois?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não lembro, não.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Está bem.

Quando foi que a senhora prestou depoimento para o Dr. Roberto, na

delegacia?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Foi 1 ano depois. Foi em 87.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Em 87?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Foi em 87. Então, eu ainda

trabalhava lá. Na época, eu trabalhava no hospital, no centro cirúrgico ainda.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - A senhora trabalhou

durante quanto tempo depois de passado esse caso?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Esse caso? Ah, ainda trabalhei

uns 8 anos ainda.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Oito anos?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Oito anos.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - A senhora é aposentada

agora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não sou aposentada, mas

também não trabalho na enfermagem. Estou sem trabalhar.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Está bem. Eu creio que...

Somente uma pergunta aqui. As enfermeiras, no seu caso aí, vocês não

acompanhavam os transplantes normalmente? Se vocês tinham conhecimento de

que aqueles transplantes que estavam sendo feitos..., ou seja, que a captação dos

órgãos ali estava sendo realizada, se era legal ou não? Vocês acompanhavam?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Isso que eu falei, a gente não

acompanhava tanto porque os casos eram isolados. Era um caso no fim de semana,

era um caso no feriado, era um caso no fim de semana, era um caso no mês, no

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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outro... A gente não acompanhava de perto nesse sentido, porque os casos não

eram repetidos todo dia. E cada um era uma funcionária. A maioria das vezes, era

uma funcionária, a não ser a noite, que era a mesma funcionária, geralmente,

porque à noite são menos funcionários.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Está o.k.

Obrigado, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Nós vamos apenas fazer

algumas perguntas para a Sra. Belmira, para encerrarmos esse depoimento.

A senhora trabalhou quantos anos no hospital lá de Taubaté?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Creio que uns 15 anos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Quinze anos no Hospital

de Taubaté. Conheceu o Dr. Pedro Henrique?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Conheci.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Conheceu o Dr. Mariano

Fiore?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Conheci.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O Dr. Antônio Aurélio

Monteiro de Carvalho?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Conheci.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O Dr. Rui Sacramento?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Conheci também.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Os pacientes, quando

eram levados à sala de cirurgia, eles já vinham com o laudo de que estavam com

morte encefálica?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu não vi no prontuário.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A senhora sabe quem

eram os médicos que faziam o laudo de morte encefálica lá no hospital, na época?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não sei.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A senhora sabe quais os

médicos que faziam atestado de óbito dos pacientes, quem eram os médicos

legistas na época?

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Atestado de óbito era o próprio

médico. Agora, o legista era o Dr. Mariano.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Mariano e mais quem?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Eu só sei do Dr. Mariano.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Em todos esses casos o

Dr. Mariano foi o legista?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não sei. Quem vai saber mais

é o Dr. Roberto, que vai dar essa informação.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A senhora se lembra, na

época, quando surgiram as primeiras denúncias, se o Dr. Roosevelt Kalume foi

ameaçado de demissão da faculdade, da direção da escola?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Da vida do Dr. Kalume, assim,

eu não sei, porque eu não segui de perto. Não sei. Não quis me envolver no caso.

Não conversei mais sobre o assunto. Não conversei com ele.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Não lembra. A senhora,

como enfermeira-chefe, trabalhava normalmente durante o dia?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - O dia.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - À noite, a senhora nunca

trabalhou?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Nunca trabalhei.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - As enfermeiras que

trabalhavam à noite, algumas vezes, procuraram a senhora para relatar alguns

desses casos.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É, a gente ficava sabendo de

alguns casos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Inclusive a Maria Rita

contou um caso que ela presenciou para a senhora?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Contou.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, além da Maria Rita,

que depôs aqui hoje, outras enfermeiras também que trabalhavam em outros

plantões diferentes da senhora, algumas vezes, procuraram a senhora para informar

sobre esses procedimentos durante a operação de retirada de órgãos?

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não o funcionário diretamente.

Mas vinha através de terceiros. Então, o negócio vinha diferente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Mas vinha até a senhora

como enfermeira-chefe.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Vinha até a mim.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A senhora, alguma vez,

procurou a direção do hospital para comunicar esses fatos ou não?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não procurei, porque eu não

achava... estava começando a achar diferente, mas achava que o problema era

meu.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A cirurgia era uma cirurgia

nova no hospital?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É, para mim era uma cirurgia

nova no hospital e uma cirurgia nova para mim. Então, eu pensava que para mim

que era nova. Então, eu não comuniquei com ninguém.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O.k. A senhora recebeu

algum comunicado do hospital, na época, como enfermeira-chefe, que estavam se

realizando alguns novos procedimentos cirúrgicos no hospital?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não recebi.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Não recebeu?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não recebi.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E quando o hospital ficou

sabendo, a senhora sabia se existia alguma portaria do hospital autorizando esses

médicos a fazer transplante no hospital?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Também não.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Se existia essa portaria?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Também não sei da portaria,

porque não chegou nada para mim.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Nunca chegou para a

senhora? Quando o hospital queria fazer alguma comunicação para a

enfermeira-chefe, no caso, ou alguma decisão, alguma mudança de escala, algum

procedimento novo no hospital, eles mandavam sempre uma circular informando?

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A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Informando. Mandavam.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Nesse caso, eles não

mandaram?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não mandaram.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Não mandaram?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não mandaram.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E quando o diretor do

hospital ficou sabendo desse caso — o diretor do hospital, não o diretor da

faculdade, nós temos que diferenciar —, o Dr. Kalume era diretor da faculdade?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Da faculdade.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O hospital é um hospital

universitário, e ele ficava subordinado à faculdade?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Certo.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Foi por isso que o

Kalume, quando ficou sabendo dos casos, ele procurou o auxílio do Conselho

Regional de Medicina, porque como o hospital era um hospital subordinado à escola

de Medicina, ele se sentia co-responsável pelos atos que pudessem estar sendo

praticados irregularmente no Hospital Universitário, é isso?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Certo, é isso.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Qual o conceito do Dr.

Kalume na cidade? Ele é um médico respeitado na cidade?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - É um médico respeitável.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Fora essa denúncia que

ele fez, a senhora conhece outra denúncia que ele tenha feito contra algum médico

na cidade?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não sei.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Ele responde a algum

processo na cidade, fora esse caso, por alguma irregularidade, por algum

procedimento médico que não tenha dado certo, a senhora conhece?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, não sei da vida do Dr.

Kalume.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Nem que houve coisas

erradas com ele durante esse período na cidade?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não sei.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Não sabe? Depois de

esse fato ter chegado ao público, através de informações de jornal, de revista, de

televisão e das fofocas circulantes dentro dos corredores do hospital, vocês não

imaginaram, assim, por exemplo: para onde que eles levavam esses órgãos? Os

órgãos que eles retiravam, eles transplantavam em alguns pacientes do hospital?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não sabíamos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Não sabia? Nunca ficou

sabendo?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não, nunca ficamos sabendo.

Só sabia até a retirada.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Só sabia que retirava.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Só que retiravam.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Sabia que eram levados

para São Paulo?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Não sabia.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Ficou sabendo depois?

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT - Depois. Fiquei sabendo pela

televisão.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Tudo bem. Nós

agradecemos o depoimento da senhora.

Temos certeza de que a senhora contribuiu muito para com esta Comissão.

Agradecemos a senhora por ter, durante o seu depoimento, falado realmente aquilo

que expressa a verdade, conforme o juramento prestado pela senhora. E se a

Comissão entender a necessidade de chamá-la novamente, nós vamos convocá-la.

Caso contrário, ficamos até o momento satisfeitos com os esclarecimentos

prestados pela senhora a esta Comissão.

Está encerrado este depoimento.

Deus abençoe a senhora.

A SRA. BELMIRA ÂNGELA BITTENCOURT- Obrigada.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Dando continuidade aos

trabalhos, convido o Sr. Roberto de Barros a tomar assento à mesa.

Enquanto o delegado toma assento, informo aos Srs. Parlamentares que foi

distribuída cópia da ata da 27ª reunião. Assim sendo, indago se há necessidade de

sua leitura.

(Não Identificado) - Solicito a dispensa da leitura da ata, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Dispensada a leitura,

coloco a ata em discussão.

Não havendo quem queira discuti-la, coloco em votação.

Os Srs. Deputados que a aprovam permaneçam como se encontram.

(Pausa.)

Aprovada a ata.

Estamos votando a ata agora, no meio do depoimento, porque alcançamos o

quorum para a votação apenas neste momento.

Estamos aguardando a chegada do delegado. (Pausa.)

Informo também ao Plenário que, conforme o art. 35 do Regimento Interno,

esta Comissão Parlamentar de Inquérito teria o prazo de 120 dias, prorrogável por

até a metade, caso julgado necessário, mediante deliberação do Plenário para a

conclusão dos seus trabalhos.

O Sr. Presidente da Casa, Deputado João Paulo Cunha, sensível ao apelo

deste colegiado, deferiu, ad referendum do Plenário, a prorrogação dos trabalhos

deste órgão técnico pelo prazo de 30 dias, passando o termo de nosso fundamento

a ser o próximo dia 14 de setembro.

No entanto, em que pese o fato de qualquer Parlamentar da Casa poderia

solicitar prorrogação, cabendo decisão ao Plenário da Câmara dos Deputados, esta

Presidência, no interesse da melhor realização dos trabalhos da CPI, informa ao

Plenário que está sendo encaminhado ofício à Presidência, solicitando prorrogação

da CPI, para que fosse o ato democrático, como é de costume deste órgão técnico,

submete à apreciação dos Srs. Parlamentares o pedido de prorrogação do prazo de

funcionamento da CPI por mais 30 dias, a contar do término efetivo dos trabalhos.

Em votação.

Os Deputados que aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)

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Aprovado.

Convido o Delegado Dr. Roberto para tomar assento à mesa.

O Dr. Roberto, na condição de convidado desta Comissão, está dispensado

de prestar juramento, conforme o art. 342.

O Delegado Roberto Martins de Barros foi o delegado que apurou o inquérito

no caso de Taubaté durante muitos anos E esta Comissão, Delegado Roberto

Martins, acha necessário ouvir o delegado do caso para que pudéssemos tirar

algumas dúvidas sobre os procedimentos dos fatos apurados em Taubaté e algum

esclarecimento que o senhor ache necessário prestar a esta Comissão sobre os

fatos que ainda não vieram à tona e que na época não foram relatados até pela

omissão e dificuldade de tomar depoimentos, dado a gravidade e a complexidade do

caso. Hoje as coisas parece que estão mais claras para muitas pessoas, de repente

até o delegado tem outra visão do inquérito.

Queríamos que o senhor relatasse para esta Comissão, no prazo de 20

minutos, sobre o que o senhor apurou durante esse tempo, qual sua visão do caso

hoje, e logo em seguida, poderemos tirar algumas dúvidas fazendo algumas

perguntas ao Delegado Roberto Martins de Barros, delegado da Polícia Civil da

cidade de Taubaté.

Com a palavra o Delegado Roberto Martins de Barros.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Exmo. Sr. Neucimar Fraga,

digníssimo Presidente desta Comissão Parlamentar de Inquérito, Exmo. Sr.

Deputado Federal Pastor Pedro Ribeiro, digníssimo Relator desta Comissão, na

pessoa de quem saúdo todos os demais Deputados aqui presentes. De início queria

destacar porque demorei tanto tempo para conseguir concluir esse inquérito policial.

Tenho a certeza de que esta é uma questão que até então não ficou muito bem

definida. Quando fui designado para presidir esse inquérito, eu era delegado titular

do 1º Distrito Policial de Taubaté e naquela ocasião tinha 1.200 inquéritos policiais

sobre a minha presidência, não só este inquérito. E também era responsável pelo

setor de investigação gerais, dava assistência a uma cadeia pública com

superlotação, aquela situação de rebeliões, etc. Então, realmente estava

assoberbado. No decorrer do tempo, recebemos mais funcionários, mais colegas.

Essa é uma das causas. E também porque sempre um aficionado pela Medicina

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Legal, fiz pós-graduação em Medicina Legal, já tinha presidido alguns inquéritos ao

envolver problemas de erro médico. Por isso fui designado para esse inquérito. De

início, devido à complexidade do inquérito, logicamente fui apanhado de surpresa

pelo noticiário, tive de instaurar esse inquérito de ofício, quer dizer, antes da

gravidade do noticiário. Então, logo em seguida, procedemos à oitiva do Dr.

Roosevelt Kalume e iniciamos a nossa investigação. Tive uma série, digamos assim,

de percalços e obstáculos, dificuldade em conseguir os laudos, dificuldade em

conseguir o que foi apurado no CREMESP, Conselho Federal de Medicina. Isso aí

foi um embaraço, foi um marasmo no inquérito. E ouvi as pessoas, precatórias

expedidas, um número elevado de pessoas foram ouvidas, tudo isso demandou,

além das minhas atividades, não era só a este inquérito que tinha de me dedicar.

Tinha sob minha responsabilidade uma cidade que, ao final do ano, tínhamos mais

de 4 mil ocorrências. E esses 1.200 inquéritos ficavam permanentes, vamos dizer

assim, acabava um bom número e continuava presidindo 1.200 inquéritos, depois

veio mais colegas e houve uma divisão de serviços. Queria de imediato fazer um

desagravo, porque o Dr. Rui Noronha Sacramento, nesta Casa de Leis — aliás,

cumpro o dever cívico e constitucional, estou satisfeito de falar na Casa do povo, ter

a oportunidade de expressar minha opinião —, ele disse que o Dr. Kalume, parece

que ele consegue manipular o delegado, os juízes, os promotores, até também os

Desembargadores do Tribunal de Justiça. Só tive contato com o Dr. Kalume 3 vezes,

se não me engano, quando eu o ouvi no inquérito, uma outra vez quando ele me

procurou para saber da tramitação do inquérito, outra vez, talvez, por telefone, não

tenho nenhum contato pessoal algum com o Dr. Kalume. De início, quem estava

como juiz da Comarca de Taubaté era o Dr. Dimas Rubens Fonseca, um juiz jovem

e íntegro. Quem começou a acompanhar esse caso foi o Dr. José Bernardo Gil,

promotor designado pelo Procurador-Geral do Ministério Público do Estado de São

Paulo, ele acompanhou todas as audiências. Ao final de um longo tempo, ele

manifestou ao procurador que eu tinha condições de continuar na presidência do

inquérito, sem haver necessidade de acompanhamento do Ministério Público. Seria

feito esse acompanhamento por ocasião dos prazos solicitados. Assim, foi

sucedendo os fatos, o Dr. José Bernardo Gil se aposentou, assumiu o novo promotor

da Comarca, um jovem promotor Dr. Paulo de Palma, também um promotor íntegro,

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acompanhou todas as nossas atividades. E finalmente o Dr. Luiz Marcelo Negrini.

Também participaram, digamos assim, como juízes desse caso o Dr. James Alberto

Siano e depois o Dr. Luís Felipe Nogueira e finalmente o Dr. Flávio, que foi o juiz que

aceitou a denúncia e depois também pronunciou os acusados. Então, o senhor está

vendo que foram várias as pessoas que tiveram participação, são pessoas dignas,

todos nós somos operadores do Direito, não somos manipulados por quem quer que

seja. Qual é a função do delegado de Polícia como operador de Direito na

presidência do inquérito policial? Imparcialidade. Imparcialidade, principalmente

preservar a imagem das pessoas que estão sendo investigadas. Nesse inquérito,

como quis o Dr. Rui falar, e outros quiseram também aqui tecer esses comentários,

tive a cautela de me basear exclusivamente em perícia técnica realizada pelo

Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo e também pelo Instituto

Médico Legal. Tinha vários médicos, eu estava apurando seu envolvimento ou não.

Ao concluir inquérito, depois de uma longa caminhada, achei por bem — esse é um

detalhe que quero destacar — não indiciar nenhum médico. Por quê? Porque eu

poderia cometer injustiça, devido à complexidade do fato. Como o Ministério Público

é o dono da ação penal, cabe a ele, realmente, avaliar todas as provas e fazer uma

denúncia segura. Acho extremamente grave você denunciar uma pessoa, que tem

seu status social, tem sua família, e ao final essa pessoa, vamos dizer assim, sofrer

todo o desgaste e ser excluído da ação penal, como aconteceu com o médico que

foi excluído da ação penal nesse caso. Eu simplesmente relatei todos os fatos. O

meu relatório está aqui, são mais de 252 páginas. Mostrei todas as provas, todas as

contradições e submeti ao crivo do dono da ação penal. Outro detalhe: não indiciei,

como o Dr. Mariano Fiore Júnior, aqui depondo nesta Comissão, de uma forma

irônica, disse que eu indiciei. Aliás, acho que ele mistura a nossa atividade

profissional, porque sou um profissional, sou um operador de Direito, com o

relacionamento pessoal. Não indiciei. Eu já não estava mais no Primeiro DP, já tinha

sido transferido para o Segundo DP, já tinha concluído esse inquérito quando, em

decorrência da denúncia oferecida pelo Ministério Público e recebida pelo juiz, ele

requisitou — requisição legal — que o delegado procedesse ao indiciamento dos

denunciados. Naquela ocasião, eu já não era mais delegado do Primeiro DP.

Portanto, eu não podia indiciar os acusados. Quem fez o indiciamento foi o delegado

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do Primeiro Distrito, que lá se encontrava, que apenas cumpriu uma requisição legal,

nada mais do que isso. Ele não apreciou o mérito, ele só cumpriu essa requisição

legal. Foi isso o que aconteceu. São mitos que a gente tem que, vamos dizer assim,

espancar de vez. Outro detalhe: eu ouvi a D. Belmira, que era técnica de

enfermagem na ocasião, e ela nada me relatou sobre os fatos denunciados à

imprensa, se não me engano à TV Record. Tive conhecimento através da TV

Record. O repórter me indagou, falei: “Estou sabendo disso agora, é um caso grave,

é uma crueldade que poderia até caracterizar homicídio qualificado, não homicídio

simples”. Então, fiquei sabendo através do repórter. O Dr. Rui citou meu nome várias

vezes: “Como o delegado não sabia disso? Olha, ele ouviu certa D. Belmira”. Lógico,

ela não falou nada para mim. Certo? Então, eu não sabia do acontecido. A Rita, por

exemplo... Acho que estou fazendo confusão. Foi a Rita que ouvi. Foi a Rita que

ouvi, certo. A Rita que era chefe. A Rita que ouvi, realmente. Ela relatou e, depois,

fiquei sabendo, com receio de perder o emprego, medo, pressão, ela não me falou

as verdades. Mas no caso que a ouvi, ela se referia a Éldon MacDowell Nogueira

Faria, era um caso em que a perícia não foi conclusiva. Então, não trouxe tanto

prejuízo. Agora, a D. Belmira, que deu essa entrevista, por último, essa realmente eu

não ouvi, porque não encontrei o nome dela nos prontuários, não vi nenhuma

atividade dela, ninguém fez referência a ela. Nós, de início, de comum acordo com o

Dr. Gil, montamos uma estratégia. Vimos a complexidade e a gravidade desse caso

e tivemos que montar uma estratégia. Desde o início, diante da notitia criminis

trazida pelo Dr. Kalume, tipifiquei o caso como homicídio doloso a apurar, porque a

notícia que ele me trouxe era de um homicídio doloso a apurar, um caso sério e

grave. Desde o início, dia 1º de abril de 1987, desde o início. Todas as capas de

inquérito estão com esse tipo de autuação, desde o início. Montando uma estratégia

com o Ministério Público, chegamos à conclusão de que os demais delitos,

logicamente, iriam prescrever. A gente não ia chegar a conseguir encerrar o

inquérito. Eram delitos com penas menores, não haveria condições, uma lei antiga,

uma lei realmente que não foi regulamentada, uma lei extremamente deficiente.

Então seria impossível a gente, realmente, concluir esse inquérito, evitando uma

eventual prescrição. Centramos no homicídio doloso, o que foi difícil, mas, através

dos nossos quesitos formulados pelo Instituto Médico Legal e também diante do

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processo que eles responderam no CREMESP, os peritos foram contundentes nos 4

casos que motivaram a denúncia contra os acusados nesse processo de Taubaté.

Temos que realmente espancar esses mitos. Outro detalhe a respeito, vamos dizer

assim, do programa de transplante: foi um verdadeiro arremedo de programa de

transplante, não existiu. É só consultar os autos, as provas estão nos autos. Isso foi

feito de uma forma verbal, acordo entre alguns médicos. Há depoimento do Dr. Emil

Sabbaga, que diz que não tem nenhum relacionamento, temos médicos que também

falam que não têm nenhum relacionamento. Há caso de médico que é assistente

dos denunciados no CREMESP, que ele mesmo fala que, depois que vem a

imprensa, nos casos de Taubaté, é que se colocou na UTI o roteiro de como se

comprova uma morte encefálica. Começa por aí. Outro detalhe: o assistente técnico

deles, que é o Dr. Roland Abraham, neurologista, ele mesmo, em março de 1987,

consta dos autos, fez uma avaliação dos casos e manifestou para a direção do

hospital que não tinha nenhuma condição de prosseguir esse tipo de exérese de

rins, essas nefrectomias bilaterais para transplante. Não havia condições. Ele

analisou os prontuários, que estavam insuficientes, não havia condições de

determinação, de fato, da morte encefálica. Ele manifestou. A Dra. Gisele, que na

época era responsável pelo SAME, preocupada com essa situação, ficou com esses

prontuários no cofre. Ela foi procurada pelo Dr. Pedro Henrique Torrecillas, que

pediu uma cópia de um prontuário. Ela chegou a fornecer cópia desse prontuário.

Ela perguntou por que os prontuários estavam desfalcados. “Não, os outros dados,

os prontuários se encontram conosco.” O detalhe é o seguinte: prontuário médico,

toda intercorrência, toda evolução clínica, tudo o que acontecer com o paciente tem

que ser lançado no prontuário médico. A gente, avaliando os prontuários médicos, a

prescrição médica, a evolução clínica, conseguiu muitos dados através do registro

de enfermagem, porque é extremamente deficiente, letra ilegível, tinha que chamar o

médico para ele poder traduzir o que ele escreveu, muitas vezes ele não sabia. O

próprio desembargador, ao apreciar o recurso, em sentido restrito, o procurador

também se manifestou. Eles falaram que, “para azar do denunciante”, que seria o

Dr. Kalume, “eles tinham feito anotações de próprio punho dos exames, dessa

constatação de morte encefálica”. Quando ouvidos no CREMESP, eles nada mais

repetiram, o que constava nesse prontuário médico, que eles diziam que estava

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desfalcado. Isso está constando, tanto a manifestação dos desembargadores como

dos integrantes do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo. Está

constando isso daí. A gente tem que acabar com essas inverdades. Está tudo nos

autos, é só pesquisar. É contundente a prova pericial do CREMESP, é contundente

a prova pericial do Instituto Médico Legal. Eu, como delegado de polícia, sou

imparcial, não sou juiz, não estou aqui para julgar, mas estou... É aquele caso, me

considero como se estivesse sob juramento. Não estou aqui para falar o que não

existe. O que não existe nos autos não existe no mundo. Tudo o que estou falando

aqui é só com prova nos autos. Essa é uma verdade, está aqui. Tentei uma síntese

apertada, vamos dizer assim. De início, é só dar esse nosso desabafo. Garanto aos

Srs. Deputados aqui presentes que o Dr. Kalume não manipulou delegado,

promotor, juiz nem desembargador. O nosso interesse era que esse caso fosse

concluído o mais rápido possível. Aliás, esperamos o julgamento do Tribunal de

Justiça o mais rápido possível também, para cessar de uma vez por todas, no

interesse da Nação, a solução disso aí. Um detalhe que também queria falar é o

seguinte. Tentei, durante todo esse tempo, determinar a comercialização dos

órgãos. Eu não consegui. O motivo é simples: quem recebe um rim transplantado

jamais ia falar que comprou esse rim. Tudo gracioso, tudo gracioso, todo mundo

bonzinho. “Não, vim de Taubaté. Tudo bem. Foram transplantados os pacientes aqui

no Osvaldo Cruz.” Todo mundo é bonzinho. Fica difícil realmente... Aliás, graças a

Deus, nós estamos num Estado de Direito e temos que respeitar aquilo que as

pessoas falam. E eu tenho que me curvar também. Não posso obrigar a pessoa a

falar aquilo que ela não quer falar. Eu tenho que aceitar. Gracioso é gracioso. Tudo

bem. Não consegui nesse inquérito. Nós fizemos perícia contábil — não tenho aqui,

mas está no inquérito a perícia contábil —, foi quebrado o sigilo bancário —

disseram que não, mas quebrei —, também o Imposto de Renda, etc. Não

conseguimos determinar a vinculação de algum pagamento relacionado com a

nefrectomia. O que houve realmente foi o pagamento, na época, de 2.500 cruzados

por cada ato cirúrgico que o Dr. Mariano realizou. Aliás, há a avaliação deles nessa

morte encefálica, o Dr. Antônio Aurélio de Carvalho e os demais médicos na

nefrectomia bilateral, que também realizaram, através da FUT, que é a Fundação

Universitária de Taubaté. Depois esse fato foi contestado pelo Dr. Ciro João Bertoldi.

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Inclusive gerou, se não me engano, inquérito na Polícia Federal, que eu não sei o

resultado, que é esfera federal, ele é que poderia dar mais detalhes. Outro detalhe

também a que eu queria chamar a atenção: o transplante realizado, em Taubaté, no

paciente Jorge César com 1 rim , se não me engano, de Mauro Wilton Marinho,

consta dos autos. Realmente foi um fracasso. O hospital não tinha suporte técnico,

vários médicos, professores de Medicina assim se manifestaram. Não tinha. Foi

realmente um arremedo de transplante, esse programa de transplante, esse

transplante que foi feito lá. Tanto é que o paciente veio a morrer. Há um exame

necroscópico aqui. Há laudo criticando essa situação. Tentei ser breve.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O.k. Agradecemos a

palavra ao delegado. Vou começar fazendo algumas perguntas, só para a gente

deixar bem claro. O senhor, no início, disse que tomou conhecimento dos fatos

através dos jornais.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Exato. Agi ex-officio.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A primeira informação

sobre as irregularidades do sistema de transplantes de Taubaté veio através da

imprensa.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Através da imprensa.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, o senhor não foi

procurado pelo Dr. Roosevelt Kalume para fazer uma denúncia?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não fui procurado por ele. Tomei

conhecimento através da imprensa, no dia 1º de abril de 1987, e instaurei inquérito.

Se eu não me engano, ouvi o Dr. Kalume, se não me engano, foi no dia 3 abril. Fui

surpreendido por toda a imprensa quase que do País, aquela pressão. Quando ele

apareceu na delegacia, acompanhado com advogado, quando procedi à sua oitiva.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O.k. Então, deixamos bem

claro para os Parlamentares da Comissão que o Dr. Kalume, em momento algum, foi

à delegacia denunciar esses casos. O senhor ficou sabendo através da imprensa...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Da imprensa.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - ...e aí o convocou para

prestar depoimento.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Exatamente.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Segundo, em depoimento

prestado ao delegado, quais foram as evidências apresentadas pelo Dr. Kalume das

denúncias veiculadas através da imprensa?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Ele narrou todo o acontecido. Eu

achei interessante que ele manteve a mesma postura, como ele manteve nesta

Comissão Parlamentar de Inquérito. Após a sua oitiva, eu falei: “Doutor, o senhor é

muito corajoso como médico fazer uma denúncia extremamente grave, porque eu

vou ter de apurar tudo isso o que o senhor falou”. Ele falou assim: “Eu não sou

corajoso. Eu estou com medo, eu sou um medroso, eu sou um covarde”. Assim que

ele se manifestou para mim.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Por que o senhor disse a

ele que ele era corajoso em fazer uma denúncia contra o médico?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Porque o nosso País... eu não

sei... no meu entender, na magnitude do caso que eu apurei, foi a primeira vez que

eu vi um médico fazer uma denúncia tão grave, desse quilate. Realmente se deduz,

vamos dizer assim, que as conseqüências para ele em sua profissão — eu não sei,

que não acompanhei, que não tenho contato com ele — não devem ter sido tão

cômodas.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Sim. Em depoimento

prestado nesta Comissão, os médicos acusados disseram que as informações

prestadas por Kalume ao CREMESP... Faltavam peças dos prontuários e que o

Kalume havia sumido com essas peças.

O senhor disse agora a nós que o Dr. Pedro Henrique solicitou à Dra. Gisele

peças desse prontuário. Quem é que ficou com as peças do prontuário: o Kalume ou

o Pedro Henrique?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - O que aconteceu foi o seguinte:

o Dr. Pedro Henrique pediu peças à Dra. Gisele, que era do SAME, do Serviço de

Assistência Médica...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Do SAME.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - ...do HOSIC, na ocasião; hoje,

Hospital Regional. Queria fazer uso. E ela falou: “Estão faltando algumas peças”. “É,

não se preocupa, não, que nós temos essas peças.” Depois, o Dr. Kalume procurou

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a Dra. Gisele, talvez no mês de janeiro ou fevereiro de 87, solicitando também

cópias dos prontuários, para ele poder prestar informações ao CREMESP. E ela

também cedeu.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, o Dr. Kalume se

dirigiu formalmente à Dra. Gisele, que era responsável pelo arquivo das peças do

prontuário, para que ele pudesse usar essas peças no processo em sua defesa no

CREMESP?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Correto.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E o Dr. Pedro Henrique,

antes do Dr. Kalume, já havia também solicitado à Dra. Gisele peças desse

prontuário.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Correto.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Com que objetivo? O

senhor sabe?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - O senhor está perguntando o Dr.

Pedro...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Pedro Henrique.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - O Dr. Pedro Henrique disse que

precisava de um prontuário de um paciente — agora não me recordo de qual

paciente —, e ela cedeu. Não foram todos os prontuários.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E um desses pacientes é

um desses que foi constatado que não houve a morte encefálica?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Olha, eu acredito que não. Eu

não sei, acho que deve ter sido o caso do Hélder. Eu teria que consultar os autos

aqui, são tantas folhas, mas eu acho que não.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, os documentos

que chegaram ao CREMESP faltando peças não foi porque o Dr. Kalume também

solicitou cópia. Quem solicitou cópia, a Dra. Gisele tinha as originais, correto?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Tinha as originais, que foram

encaminhadas para o CREMESP.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então o CREMESP tinha

todas as peças.

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O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Exatamente. Tanto é que eu

recebi só cópia.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Porque, em depoimento

prestado aqui na CPI, os médicos disseram que o Dr. Kalume havia sumido algumas

peças desse prontuário, propositadamente, e que ele apresentou... que no

CREMESP foram apresentadas algumas peças, e, quando a Polícia prendeu os

prontuários no hospital, as peças eram diferentes porque eram numeradas essas

peças. É verdade isso?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Veja bem, nós tivemos uma

apreensão judicial, e essa apreensão foi encaminhada para mim. Depois, eu procedi

a outras apreensões que estavam faltando de prontuários lá realmente, no Hospital

Santa Isabel de Clínicas.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E estavam onde essas

peças?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Essas peças se encontravam no

SAME, realmente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - No SAME. Então não

estavam com o Dr. Kalume.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não, não estavam com o Dr.

Kalume. Eu apreendi. E lá têm autos de apreensão.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E essa decisão judicial de

apreensão dessas peças foi solicitada por quem?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Olha, também foi uma surpresa

para mim, porque compareceu o diretor do cartório do fórum, cumprindo um

mandado judicial, o Dr. Wilson Cabral, então juiz, hoje aposentado. Não sei quem

fez a petição. Ele cumpriu esse mandado encaminhando para a delegacia de polícia.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, todas...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Eu não sei se foi petição do

advogado do Dr. Kalume, não sei se foi, não me recordo agora, mas foi uma decisão

judicial.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, os documentos

que foram solicitados de apreensão foram encontrados no SAME.

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O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - No SAME.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Se houve sumiço de

alguma peça, foi de responsabilidade do SAME.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Exatamente, a Dra. Gisele, em

seu depoimento, estava preocupada com essa situação desse programa de

transplante. Ela procurou realmente deixar esses prontuários no cofre, por questão

de segurança, e depois ela só fez a entrega desses prontuários ao diretor clínico do

HOSIC.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O.k. Nas chapas de

arteriografias, que eram os exames exigidos para comprovação da morte encefálica,

algumas delas apresentavam sinais claros de que não havia comprovação da morte,

de que havia fluxo. O senhor disse que essas chapas foram periciadas.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Foram periciadas.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Essas chapas eram

originais?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Chapas originais, inclusive —

vou falar aqui —, eu coloquei uma marca, que eu tinha receio dessas arteriografias,

dessas angiografias bilaterais fossem, vamos dizer assim, maquiadas. Em todas

elas eu coloquei a minha letra “r”. Quando eu mandei para a perícia, para eu saber,

quando tivesse recebendo de volta, que era uma prova, se se tratava daquela que

eu havia mandado. Uma cautela que eu tive.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então agora fica

esclarecido para a Comissão, porque, em depoimento prestado aqui na CPI, os

médicos acusados alegaram que as chapas que foram enviadas para o CREMESP

eram chapas normais e as que foram apreendidas posteriormente e apresentadas

no processo estavam enumeradas.

E eles não entendiam como algumas chegaram no CREMESP de uma

forma... E eles disseram aqui que foi o Kalume que havia marcado essa chapa.

Então, foi o senhor quem marcou?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Olha, é só pegar uma dessas aí

e ver que está a letra “r”. Eles procuraram, eu sei que depois de 17 anos. Deve ter

essa letra “r”. Se aparecer uma letra “r”, é de meu próprio punho, eu botei a letra “r”.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Porque, em depoimento a

esta Comissão, os médicos alegaram que o Kalume havia enumerado essas chapas.

E elas não estavam iguais às originais.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Eu não enumerei. Eu sei que a

minha letra “r”... Para saber... Eu estava preocupado de que, quando voltasse, fosse

uma outra.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O senhor, ao tomar

conhecimento dessas chapas, de posse dessas chapas de arteriografia, o senhor

pediu auxílio ao Conselho Regional de Medicina?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não, nós encaminhamos ao

Instituto Médico Legal.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - De onde?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - De São Paulo.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Para perícia?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Para perícia.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Quem periciou?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Foram peritos da área de

neurocirurgia.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E qual a conclusão deles?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - A conclusão, nos 4 casos

denunciados aqui, é de que eles realmente se encontravam vivos, ou seja, eles não

se encontravam em morte encefálica — bem entendido. Não, não se encontravam

em morte encefálica, alguns deles... ou seja, morte cerebral. A diferença de morte

cerebral para morte encefálica todos nós já sabemos, porque isso aí já ficou

espancado. Até houve a mudança da legislação. Porque antes a lei determinava a

prova incontestável da morte. Mas que prova é essa? Não há como se fazer

confusão entre morte cerebral e morte encefálica. Então, nesse caso, eles não se

encontravam em morte encefálica; portanto, se encontravam vivos e, portanto, não

poderiam ter seus rins retirados — essa exérese de rins, essa nefrectomia bilateral

para transplante. Além disso, de acordo com a lei que estava em vigor na época, a

maioria deles, aliás, todos, com exceção do Erani Gobo, que tinha um aneurisma

cerebral, todos eram vítimas de crime. É interessante que nós temos o caso do

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Antônio Carlos do Amaral. Tem uma anotação no prontuário dele de que ele havia

sido vítima de crime, ou seja, ele foi descartado de ser submetido a uma

nefrectomia, apesar de ter sido feito todo o procedimento, de haver autorização dos

parentes, etc. Nesse não foi feito. É interessante que nesse não foi feito; por que nos

demais foi feito, se também eram vítimas de crime? Aliás, se o senhor me permite,

uma das situações interessantes e que causa impacto é: “Como estou sendo

acusado de homicídio se já tem pessoas condenadas pela prática de latrocínio,

etc.?” O que vai Não podemos misturar; está previsto na nossa legislação

processual penal, no nosso Direito Penal. O que vai acontecer? Revisão criminal.

Vai ter uma revisão criminal para esses que estão presos, dependendo do resultado

desse processo-crime — se eles foram condenados pela prática de homicídio, os

acusados de latrocínio... Um dos delitos não vai ser o caso, porque foi absolvido.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Está prevista também a

tentativa de homicídio. O cara pode ter tentado matar, ele não morreu, foi levado

para o hospital; lá, foi cometido o crime. Realmente, ali houve homicídio. Então, você

pode ter um acusado por tentativa de homicídio e outro acusado por homicídio.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Deputado, é tanta coisa. Outro

mito que eu queria quebrar aqui e que achei interessante é o seguinte: é que se lê

parcialmente aquilo que se interessa para se defender. Aliás, é o direito de defesa;

nós vivemos em um Estado Democrático, que assegura a ampla defesa. Eu acho

que o acusado tem que se defender realmente, tem que usar seus artifícios. Sobre o

processo administrativo disciplinar, em relação ao Dr. Mariano Fiore Júnior, ele disse

que os 3 colegas que foram designados o absolveram. Mentira. Mentira. Os colegas

estavam em uma situação crítica, ou seja, não tinham o julgamento desse processo

na 1ª Vara, ele estava tramitando, tinha só a denúncia. Devido à complexidade da

matéria, eles mesmos querendo preservar o acusado e o princípio da inocência, se

socorreram de um expediente administrativo que nós temos, que é o sobrestamento

do processo administrativo, para se evitar a duplicidade de decisões. Vamos dizer

que eles absolvessem e, na Justiça, ele fosse condenado, ou que eles

condenassem e, na Justiça, ele fosse absolvido, imaginem o dano que eles iriam

causar para o Dr. Mariano Fiore Júnior, para a vida pessoal dele. Então, eles

solicitaram o sobrestamento; o pedido dessa comissão foi submetido à assessoria

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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jurídica do gabinete do Secretário de Segurança Pública, o qual acolheu esse

parecer e determinou o sobrestamento do processo até a conclusão final do

processo-crime em Taubaté, o que foi publicado no Diário Oficial do Estado. Eu não

repreendi meus colegas porque sempre respeitei neles a livre convicção. Sou

legalista, respeito a Constituição e não quero ferir a consciência de ninguém.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, o senhor confirma

que as chapas de arteriografias que foram apreendidas... Quando o senhor

apreendeu essas chapas, elas estavam onde?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Elas se encontravam no SAME.

Certos funcionários as trouxeram. Nós fizemos o auto de apreensão no próprio

hospital.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, elas não estavam

na casa do Kalume?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não. Inclusive, no caso de

Pindamonhangaba, eu fui à Santa Casa de Pindamonhangaba, e lá procedi à

apreensão do prontuário. Que é o caso de Pindamonhangaba também.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E os médicos legistas que

foram convocados para fazer a perícia confirmaram que as chapas de arteriografia

tinham elementos que deixavam bem claro que não havia a morte encefálica dos

pacientes.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Esses 4 casos — Alex de Lima,

José Faria Carneiro e José Miguel da Silva são os 4 casos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Quais eram os médicos

legistas que faziam...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Dr. Mariano Fiore Júnior e

Antônio Aurélio de Carvalho eram os 2 que davam o diagnóstico de morte

encefálica, que deveria constar do prontuário médico, e não de folhas apartadas.

Tudo o que ocorre com o paciente deve constar do prontuário, a evolução clínica, a

prescrição, as observações da enfermagem — ali está a vida do paciente. Não tem

que estar separado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E esses mesmos médicos

que faziam a necropsia eram os médicos que faziam o laudo da morte encefálica?

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O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Correto. Faziam o laudo e depois

examinavam o cadáver. Eu tive um caso, que consta dos autos... O Dr. Maurício,

médico legista, ao proceder o exame necroscópico, se deparou com um cadáver

sem os 2 rins. O que está acontecendo? O que houve? Qual a causa mortis? Ele

falou: “Não, mas isso aí é normal.” Eu perguntei: Normal, como? Estão mandando

um cadáver sem os 2 rins. Que eu saiba, ele é vítima de crime. Por que ele está sem

os 2 rins? É melhor você entrar em contato com o diretor clínico do hospital e

perguntar, porque há um programa de transplante. Ele não sabia desse programa de

transplante, o Dr. Maurício.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O senhor teve

informações de para onde iam esses órgãos retirados no hospital de Taubaté?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Depois de muito tempo e muita

luta, conseguimos determinar que eles foram encaminhados para o Hospital

Oswaldo Cruz, em São Paulo.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O Hospital Oswaldo Cruz

é público, em São Paulo?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - O Oswaldo Cruz não é público.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - É particular?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - É particular. E foi realizado pela

equipe do Dr. Emil Sabbaga, alguns médicos. O valor desses transplantes foi em

torno de 100 a 120 mil cruzados, na época.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, esses órgãos eram

levados para o Hospital Oswaldo Cruz, em São Paulo, entregues à equipe de Emil

Sabbaga, e eles cobravam pelo transplante, na época, cerca de 100 a 120 mil

cruzados.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - O Dr. Emil Sabbaga alegou que

não participou disso. Os médicos integravam a equipe dele. Ele, em seu

depoimento, falou que não tinha participação nenhuma. Quando ele falou, por

exemplo, sobre o roteiro do transplante de rins realizado em Taubaté, ele só aprovou

o que estava escrito. Outra situação: o INAMPS fez uma vistoria no Hospital

Universitário de Taubaté e só autorizou a hemodiálise; em hipótese alguma, o

transplante de órgãos em um hospital-escola, e foi feito assim mesmo.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, o transplante era

feito sem um credenciamento, sem...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não houve credenciamento.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - A direção do hospital foi

ouvida sobre o assunto?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - A direção do hospital não foi

ouvida. Vários médicos que eram diretores ficaram indignados. O Hospital

Universitário não tinha suporte para fazer o transplante renal.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, esses médicos

realizavam os transplantes sem o consentimento da direção do hospital?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Foi só um caso no Hospital

Universitário, um único caso.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Mas sem o consentimento

da direção do hospital.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Nesse caso, vários médicos que

ouvimos não sabiam. E no HOSIC se fazia a nefrectomia bilateral, só teve um caso.

O Dr. José Miguel Carter Neto, que era o então diretor clínico, autorizou a

nefrectomia no Mauro Wilton Marinho. Esse caso, ele autorizou e solicitou que, além

da angiografia bilateral, fosse feito um eletroencefalograma no paciente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Quem transportava esses

órgãos para o Hospital Oswaldo Cruz?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Olha, até para eu tentar...

Depois, fiquei sabendo que a Polícia Militar tem um expediente nos autos, que ela

falou que não levou até o final. Acabaram assumindo que chegaram a levar esses

órgãos em isopor, caixa acondicionada — a Polícia Militar, no início.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, eles deviam ter

algum contato, alguma autorização do hospital para levar esses órgãos para...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Exato. O primeiro caso, se não

me engano, foi via rodoviária, ônibus, se não me engano, da Pássaro Marrom, se

não me engano.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga)- O senhor sabe quem era o

comandante da Polícia Militar na época, lá em Taubaté?

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O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Na época, eu tenho ofício que

era do..., depois de longo tempo, na época, não me lembro, mas o Capitão

Marcondes, não sei se ele havia assumido. Não sei se ele...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Ele ainda está na região?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Está na ativa.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Está na ativa?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - É, ele chegou a ser Comandante

lá da...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E ele foi ouvido?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Olha, depois, vamos dizer

assim, que chegou ao nosso conhecimento, depois de longo tempo, desse

transporte desses órgãos, para os autos, o que estava interessando de mais grave

realmente seria o homicídio doloso, que é um bem inestimável do ser humano, é o

bem maior do ser humano e nós nos concentramos realmente naquilo que era de

maior gravidade, porque esses outros detalhes, aí, não teria como alcançar, vamos

dizer assim, qualquer tipo de aplicação de pena.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Delegado...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Pois não.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Depois de tanto tempo, e,

claro, que o senhor concluiu o inquérito, vasculhando ali, examinando, depois do

senhor, outros participaram. O senhor foi substituído, em algum momento, no

inquérito ou o senhor apurou todo o inquérito?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não, em hipótese alguma houve

substituição.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, o senhor

acompanhou o inquérito do início ao fim?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Desde o início até o final... Aliás,

houve apostas, certo, houve apostas na cidade de que esse inquérito não ia dar em

nada. Fui chamado de bobo, chamado de idiota, “você está perdendo seu tempo;

isso não vai dar em nada, etc.” Eu falei: “Eu estou cumprindo minha obrigação, vou

terminar e encaminhar à Justiça e ela é que vai decidir”.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Havia indício de

envolvimento de outras pessoas que poderiam ser ouvidas, mas que não existiam,

assim, provas contundentes para que elas fossem incluídas no processo?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Outras pessoas, não. Porque eu

queria ouvir todas as pessoas que se relacionavam com o caso. Todos os médicos

de Taubaté que se relacionavam com esse caso daí, tanto do Hospital Universitário

como o do HOSIC foram ouvidos, os mais diretos que estavam relacionados,

intensivistas, professores de medicina, na época.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O senhor ouviu outras

enfermeiras, além da Rita?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Ouvi. Ouvi.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - E qual o relatório?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Nós chegamos à conclusão do

seguinte, junto com o Ministério Público: todas as enfermeiras estavam com medo,

receio de perder o emprego e elas não estavam trazendo nada de digno para os

autos. Elas se limitavam apenas a dar aquela resposta meramente técnica: “não sei”,

“não vi”, “eu saí”, “estava circulando”, “não prestei atenção”. A gente via que elas

estavam atemorizadas.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Havia, assim, burburinhos,

na época, de que esses médicos recebiam do Sabbaga uma recompensa por esses

procedimentos realizados no Hospital?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Olha, comentários. Como não

vivo de comentários, eu só tenho de me basear no que está nos autos, o próprio Dr.

Emil Sabbaga fala que nunca recebeu nada, não tem participação de nada.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Mas recebia os órgãos.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Os órgãos eram encaminhados

lá para o Hospital Oswaldo Cruz e, lá, foram realizados os transplantes. E, em

termos de dinheiro que eu posso falar de concreto, seriam esses 2.500 cruzados, na

época, para cada participação de diagnóstico de morte encefálica e mais a

nefrectomia bilateral, exérese dos rins para transplante.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Só para encerrar a minha

parte. O senhor tomou conhecimento posterior de que um desses médicos

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indiciados no inquérito, o Dr. Antônio Aurélio Monteiro de Carvalho, foi preso agora,

em 2001, na cidade de Franco da Rocha, retirando órgão de paciente novamente e

vendendo órgãos para as faculdades?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Tomei conhecimento e, inclusive,

ele já foi demitido a bem do serviço público do Estado de São Paulo como médico

legista. Ele foi demitido já. Isso já foi publicado no Diário Oficial.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Em depoimento prestado

à CPI, ele foi demitido do Estado, mas ele tem um emprego ainda na Prefeitura de

Guarulhos. Ele continua exercendo a Medicina. O senhor tem conhecimento também

disso?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não. Disso eu não tenho

conhecimento.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Ele foi demitido do

Estado, mas como ele tinha dois empregos, ele continua exercendo a Medicina na

cidade de Guarulhos.

Agradeço. É a minha participação. Quero dizer que estou satisfeito com...

Deputada Perpétua Almeida.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Sr. Presidente, queria

cumprimentar o Dr. Roberto. Só fiquei com algumas dúvidas rápidas, Dr. Roberto.

Não me lembro bem do nome da enfermeira, aliás, da anestesista que se recusou a

fazer a anestesia no dia que a D. Rita estava de plantão. O senhor já ouviu a D.

Lenita nesse processo?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - A Dra. Lenita foi ouvida, não sei

se é o caso concreto, e normalmente eles alegavam que apenas davam suporte

para os colegas, alegavam que confiavam nos colegas no diagnóstico de morte

encefálica e estava só ali apenas para dar um apoio e que não estava agindo como

anestesista. Mas consta do prontuário médico ela como anestesista em vários

casos, como outros anestesistas também.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - A D. Rita falou no depoimento

dela que assistiu a uma discussão dessa anestesista com os médicos, dizendo que

não ia fazer aquele tipo de coisa que eles estavam querendo. Portanto, naquele dia,

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Tráfico de Orgãos HumanosCPI - Tráfico de Orgãos HumanosNúmero: 1057/04 Data: 24/08/04

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naquela noite, ela não fez a anestesia. Ela colocou um remédio, que eles chamam

de cheirinho, exatamente para adormecer um pouco o paciente.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Alloferine, no caso, curare?

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Sim.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Alloferine é uma substância...

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Ela não contou nada disso

acerca...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Essa medicação foi usada e

consta na nota de débito também. Quando a gente faz a investigação numa situação

dessa, a gente vê todo o prontuário médico, principalmente a nota de débito, que vai

dar um indício para a gente. Então, o curare realmente foi usado. É uma substância

que nós sabemos que é sedativa. A alegação dos médicos é que seria para, vamos

dizer assim, a perfusão do órgão que seria transplantado, um relaxamento. Não

seria realmente uma anestesia. Paciente que é um doador de órgãos, como

aconteceu em Taubaté, após ser realizada a nefrectomia, ele retornava à UTI. Eu

nunca vi defunto, morto, de cujus, retornar à UTI. Para quê?

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Então, deixe eu só emendar a

pergunta. Eu quero insistir na primeira ainda. Se, no depoimento dela, ela fez algum

comentário sobre o porquê que ela não aceitou fazer a anestesia.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - No caso de José Maria

Carneiro.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Sim.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - José Maria Carneiro?

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - O senhor lembra?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Eu não me lembro. O

depoimento dela deve estar aqui. São 252 folhas. É tanta gente que eu ouvi.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - O depoimento dela são 252

folhas?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não, 252 folhas é o meu

relatório. O que aconteceu foi o seguinte: todos os médicos anestesistas constavam

no prontuário como anestesistas, não sei por que, e depois vêm alegar que não

faziam anestesia. Mas está lá o anestesista acompanhando e tal, o horário etc.

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A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - No decorrer dessa apuração, o

senhor chegou a uma conclusão por que nesses casos, quando as enfermeiras nos

colocaram aqui, nesses casos específicos de suspeita de tráfico de órgãos, por que

o Dr. Cláudio não recebia os pacientes? É como se ele já soubesse que os

pacientes viriam a morrer. Nesse processo de apuração, o senhor conseguiu pegar

essas informações, checar com ele e com as pessoas?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Teve médico que falou que o

paciente foi encaminhado para a UTI. Logicamente que a UTI não ia receber um

paciente que está saindo do centro cirúrgico, se já é cadáver. Encaminhar cadáver

para a UTI? Eu nunca vi. O preparo do corpo tem que ser feito fora da UTI, no

necrotério. Se é cadáver, é necrotério. É isso que aconteceu. O Dr. Alfredo Leonardo

ficou sabendo de um caso. Esse realmente falou e assinou que o paciente, depois

de ser submetido à nefrectomia bilateral, teria sido encaminhado para UTI. Ele não

sabe se foi recebido pela UTI. Só tem um caso, o de Erani Gobo. A filha de Erani

Gobo estava próxima do centro cirúrgico, sabia que o pai dela estava sendo

submetido a uma nefrectomia bilateral para transplante de órgão. Ela sair o pai dela

em direção à UTI. Ela fala isso e é filha de um paciente. Então, isso me causou

espanto. Um defunto sair para a UTI é esquisito.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Só mais uma pergunta, doutor:

nesses casos todos que foi comprovada a retirada de órgãos, as famílias colocaram

nos depoimentos... O senhor deve ter ouvido as famílias das vítimas?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Ouvi, ouvi.

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - O que elas têm colocado? Elas

tinham conhecimento do fato? Ficaram sabendo depois? Ficaram surpresas?

Alguma delas tinha autorização para retirada de órgãos?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Tratava-se de pessoas simples,

facilmente manipuladas. Só tinha o caso do Éldon MacDowell Nogueira Faria, que o

pai era mais esclarecido. Esse aí várias vezes me procurou. Ele tinha dúvidas se

realmente tinha sido constatada ou não a morte encefálica do filho dele. Depois que

veio o laudo pericial, eu falei para ele ficar tranqüilo, pois naquele caso realmente

tinha sido constatada a morte cerebral do filho. Ele ficou mais sossegado. Era um

projeto, um arremedo... Tinha até parapsicóloga. Eu nunca vi isso na minha vida,

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mas eu ouvi a parapsicóloga: “Eu só prestava um apoio moral à família”. Assistente

social, tudo bem; psicóloga, tudo bem. Não tenho nada contra parapsicóloga, mas

achei estranho, num programa de transplante de órgão, parapsicólogo. Foi difícil

localizar essa senhora, mas consegui ouvi-la, Maria Dulce Boldrim. Consegui ouvi-la,

mas foi um arremedo. A grande verdade é que foi um arremedo. Não há lançamento.

O resumo do ato cirúrgico não se lança. Está lá aquele caso. Foram desfalcados os

prontuários? E o resumo? Lançaram alguma coisa no resumo? Está em branco. O

detalhe que é importante é que está no CREMESP. Os próprios Desembargadores

atentaram para esse detalhe, que os médicos denunciados, assim afirmaram os

dois, Dr. Mariano e Dr. Antonio Aurélio de Carvalho, que, para a felicidade dos

denunciados e o azar do denunciante, eles anotaram os dados que tinham

conseguido nos exames realizados. Quando eles se manifestam sobre esses dados,

eles repetem o que consta do prontuário que falam que está desfalcado. Esse é o

detalhe. Está constando isso daqui. Até os Desembargadores e o CREMESP citam

essa passagem também. É estranho. Inclusive, o Dr. Antonio Aurélio de Carvalho,

quando foi ouvido, fez comentário de um paciente, o Valdemar. Depois ele se

lembrou: “Estou falando do Valdemar. Não tem nada a ver com o caso esse

Valdemar. O paciente que eu vi é outro”. É confuso. Realmente, eles caem em

contradição. O Dr. Mariano, por exemplo, fez uma punção lombar num paciente. Ele

acha até que não fez. São contraditórios. O nosso Procurador de Justiça, nas suas

alegações junto aos Desembargadores e no recurso em sentido estrito, falou que os

acusados estão apenas procurando fazer cortina de fumaça e repetindo questões de

mérito que já foram rejeitadas em juízo várias vezes. Apenas querem dilatar o prazo,

ou seja, quanto mais demorar, melhor. No meu entender, não estamos sendo

manipulados. É interesse da defesa que, quanto mais demorar, é ideal. Prescrição

nesse caso vai ocorrer. Tenho certeza disso. É um crime gravíssimo, é homicídio, é

um bem inestimável que o ser humano tem. Tanto é que o nosso legislador de 1940,

ao elaborar o Código Penal, determinou, nesse instituto da prescrição, que

prescreve o crime de homicídio em 20 anos. Então, vejam bem, no momento em que

houve a pronúncia, já interrompeu o prazo da prescrição e começou a contar 20

anos. Então, é humanamente possível eles conseguirem a prescrição nesse caso

desse crime. Vejam bem, não estou fazendo prejulgamento. Estou me baseando só

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em provas que constam dos autos. Eles terão direito à ampla defesa. Se forem ao

Tribunal do Júri, serão julgados pelos seus pares. Se forem absolvidos, vamos

acatar essa decisão. Eu sou técnico. Se os colegas deles chegaram no CREMESP a

essa conclusão, se os colegas deles do Instituto Médico Legal chegaram a essa

conclusão de que não há dúvida... É aquele caso, trabalhamos com provas materiais

ou provas subjetivas, testemunhas etc. Essa é uma prova material que até então... É

interessante que no CREMESP há o princípio do contraditório. Os assistentes

técnicos contradizem a perícia que está sendo realizada. Agora, o próprio assistente

técnico deles concordou com a perícia realizada pelo IML, a não ser no caso do Alex

de Lima, e lá no CREMESP ele também concordou. O assistente técnico em

neurologia é o Dr. Roland Abraham. Isso aí é mais uma evidência da validade do

exame pericial.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Deputada?

A SRA. DEPUTADA PERPÉTUA ALMEIDA - Estou satisfeita.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Concedemos a palavra ao

Deputado Pastor Frankembergen.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Sr. Relator, Delegado

Roberto Martins, gostaria de fazer algumas perguntas, embora o tempo esteja

bastante adiantado e está tendo votação nominal. Quantos acusados foram ouvidos

no inquérito policial. Quantas pessoas acusadas?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - O número de médicos... Eu falei

que tive aquela cautela. Não vou nominar, por uma questão de ética.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Não, as que foram

ouvidas como acusados. Quantos?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Dezesseis médicos.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Dezesseis foram ouvidos

como acusados?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Como envolvidos. Por isso que

tive aquela cautela ao final do inquérito policial. Como se tratava de 16 médicos,

conversando com o promotor do caso, ele que é o dono da ação penal: “Não vamos

cometer injustiça”. Ainda falei para ele: “Não vamos criar aquele caso da cantina

Bodega, escola de base. Você que é dono da ação penal, avalie realmente quem

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que você tenha mais certeza, as provas mais contundentes, e faça a sua denúncia.

Assim iremos fazer justiça”.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - O.k. Houve alguma

contradição na inquirição desses envolvidos?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Por incrível que pareça, todos

esses que foram ouvidos, aliás, os denunciados, os 4 denunciados, nós demos

oportunidade — o senhor vai ver nas oitivas deles — para eles refutarem os laudos,

quesito por quesito. Eles contestaram parte por parte do laudo. Uma parte concorda,

e foram refutando etc. Falaram o que bem acharam, sem ser o princípio do

contraditório, ficaram à vontade. Aliás, na fase do inquérito policial, o relacionamento

foi excelente, foi um relacionamento de nível superior, cortês, principalmente o Dr.

Rui Noronha Sacramento — agora está com outra postura, tudo bem —, o Dr.

Mariano. Mas o Pedro Henrique Torrecillas sempre manteve esse comportamento,

como ele manteve aqui nesta Comissão Parlamentar de Inquérito. Então, teve

aquela facilidade.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Mas houve alguma

contradição entre o depoimento de um e outro na inquirição?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Houve algumas contradições.

Tivemos que fazer acareações entre o Dr. Mariano e o médico legisla. Houve alguns

casos realmente de fazer acareações.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Nessas acareações, a

conclusão chegada...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - A conclusão chegada... Houve

um acordo, uma convergência de vontade, “eu não sei bem”, aquela situação que

fica, vamos dizer assim, em cima do muro, que fica difícil de podermos dirimir quem

está falando a verdade, quem não está falando a verdade.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Qual foi a tipificação do

crime?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Desde o início, eu tipifiquei como

homicídio doloso a apurar. Eu não coloquei se era qualificado, se era simples.

Homicídio doloso a apurar, diante da notitia criminis que foi trazida pelo Dr. Kalume.

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Logicamente, se eu fizer nefrectomia bilateral em paciente vivo, lógico que é

homicídio. Isso é indiscutível.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - A notícia-crime chegou

até o senhor...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Como sendo homicídio.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - ...como sendo homicídio.

Pelo Dr. Kalume?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não, não foi pelo Dr. Kalume. Se

V.Exa. me permitir, aliás, a minha portaria exordial foi uma das mais pobres que já

fiz até hoje devido à gravidade. Olha só: “Este inquérito policial foi instaurado para

apuração de graves denúncias divulgadas no jornal Folha de S.Paulo, edição de 1º

de abril de 97, na qual consta, em sua página 1 e A-13, manchetes com os títulos

Médico Faz Denúncia de Eutanásia e Médico Denuncia Morte de Paciente para

Retirada de Órgão, fatos esses que teriam, a princípio, ocorridos no Hospital Escola

da Universidade de Taubaté. Esses foram os fatos sucintos que chegaram ao

conhecimento da polícia no calor dos acontecimentos, motivando, de imediato,

instalação deste inquérito policial.” Ex-officio, porque eu não ia esperar a evolução

disso. Eu, sabendo que estava em todas as manchetes, tinha que tomar alguma

posição. Estava ocorrendo na minha área.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Quantas pessoas foram

indiciadas até o final do inquérito, ou não foram indiciadas?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Na denúncia formulada pelo

Ministério Público, foram 5 médicos. Depois ele foi excluído na pronúncia.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Pelo Ministério Público?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Pelo Ministério Público. Ele

chegou à conclusão de que... Desde o início que esse médico foi excluído, eu

também não iria indiciá-lo, porque eu vi que realmente ele entrou na carruagem da

história sem saber o que ele estava fazendo. Ele realmente, vamos dizer assim, não

teve nenhuma participação, não agiu dolosamente. Ele foi levado sem saber o que

estava fazendo. Não havia indícios seguros, concretos, de uma efetiva participação

dele, tanto é que ele foi excluído da pronúncia.

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O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - O senhor, como

presidente do inquérito... Durante quanto tempo o senhor foi presidente do inquérito?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Eu fiquei cerca de... Comecei dia

1º de abril de 87 e terminei dia 11 de janeiro de 96, na conclusão dos autos. Nove

anos mais ou menos. Nove anos e alguns meses.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Nove anos. Certamente,

o manuseio dos autos, com cotas, o senhor teve uma boa participação nesse

inquérito?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Exato.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Na sua convicção como

presidente do inquérito, houve dolo?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Tranqüilamente. Tanto é que, na

conclusão de meu inquérito, falo em dolo eventual, ou seja, quando a gente quer o

resultado ou assume o risco de produzi-lo. Já coloquei dolo eventual. E um detalhe

importante: não só o médico que dá o diagnóstico da morte encefálica pode errar; a

equipe que vai proceder à retirada dos órgãos para transplante, se ela constatar que

o paciente está vivo, é suspenso imediatamente. Isso já aconteceu na história da

Medicina, logicamente. Então, fica uma situação... Se eu dou um diagnóstico falho, a

equipe vai fazer a cirurgia e o paciente está vivo, logicamente que é co-autoria, é

dolo eventual assumir o risco e produzir resultado. Tanto isso é verdade que o

Ministério Público acolheu essa tese, e dois desembargadores de larga experiência

do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, inquestionável, aceitaram isso aí. Há

até um detalhe interessante. Um dos desembargadores desse caso, por acaso, eu o

conheci muito depois desse caso aqui. Aí perguntaram assim, se eu era de Taubaté.

Você é de Taubaté? Eu tive um caso em Taubaté, que eu me manifestei no caso e

eu acompanhei o voto do relator. Não tive dúvida: com segurança, realmente,

acompanhei o voto do relator. Eu falei: eu fui presidente dos autos. Mas que

coincidência! Nos conhecemos assim. A segurança desse desembargador que

acompanhou o voto do relator.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Quantos casos de

vítimas foram apurados?

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O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Nós tivemos 8... Uma não foi

submetida à nefrectomia bilateral para transplante de órgãos, aquela anotação que

consta no prontuário precisa ter sido vítima de crime. Então, 7 casos. Para o senhor

ver também...

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Dos 7 casos...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Dos 7 casos, todos foram...

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Constatados...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não, não. Dos 7 casos, só

sobraram 4 que a perícia determinou que eles estavam vivos; nos noutros, não tinha

como se determinar, vamos dizer assim, não havia nada de concreto que

determinasse que eles estavam vivos. Na dúvida, para o réu. Mas eu tive problema

também com uma moça que foi atropelada, acharam que tinham retirado um rim

dela — entrou nesse caso aqui também. Tive problema com um senhor que, depois

que foi operado na HOSIC, quando foi fazer uma tomografia, uma ultrassonografia e

se constatou a ausência de um rim dele, e deu um trabalho tremendo para depois se

provar que o caso dele foi ausência; já nasceu sem um rim. Foram os complicadores

que aconteceram durante o inquérito. Teve um caso também, que não interessa

para a gente aqui, de um paciente que lá estava internado, que eu tive que também

apurar no final e não interessava para os autos. Isso é questão mais da área, vamos

dizer assim, do CREMESP, não seria da área da polícia, se o tratamento era

inadequado ou não para o paciente não interessava para a gente.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Está bem. O senhor

chegou a comentar aí sobre um valor, cerca de 100 mil cruzados...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - É, foram 100 mil cruzados; 120

mil cruzados era o valor de um transplante no Hospital Oswaldo Cruz na época.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Com relação ao sigilo

bancário dos acusados, foi constatado algum ato ilícito, alguma coisa assim, que não

houve uma constatação...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Nós temos exame pericial,

exame contábil, que consta dos autos, a incompatibilidade do movimento bancário

com a renda. Isso foi constatado. Isso normalmente pode acontecer...

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O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - De todos os acusados,

não? Só de alguns?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - De todos os acusados. Isso é

comum acontecer, no meu entender. Hoje em dia já se tem termo de declaração de

Imposto de Renda ser compatível com seu movimento... Eu não sei. Às vezes... Eu

não estou aqui para acusar ninguém; não sou contador. A perícia lá se encontra, e

essa foi a conclusão.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Não houve nenhuma

caracterização de tráfico de órgão?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Diante das circunstâncias, que

tudo é gracioso, tudo cai do céu, todo mundo é bonzinho, e quem recebeu diz que

recebeu porque não sabe de onde que era, fica difícil de a gente comprovar. Eu

tentei, realmente. Eu tentei.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Foi constatada em algum

momento uma relação entre os médicos e os médicos do Hospital Oswaldo Cruz?

Um vínculo?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não. Eles sempre alegaram que

os contatos eram via telefone, que os órgãos vinham de Taubaté, eles

transportavam os pacientes que estavam precisando etc.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - O senhor chegou a ouvir,

ou pedir alguma carta precatória para ouvir os médicos...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Pedi. Foram ouvidos, todos

foram ouvidos.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Os médicos que

realizaram o implante...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Foram ouvidos. Eles só alegam

que sabiam que esses órgãos vinham de Taubaté e eram transplantados nos

pacientes, que não tinham contato direto com as equipes, que recebiam os órgãos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Só um aparte, Deputado.

E os órgãos sempre eram enviados para a equipe do Emil Sabbaga no Oswaldo

Cruz?

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O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Oswaldo Cruz, e também

constam dos autos dois rins, se não me engano, que foram pela Escola Paulista de

Medicina.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - O.k.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Também está constando nos

autos.

O SR. DEPUTADO PASTOR FRANKEMBERGEN - Está o.k., Sr. Presidente.

Obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Com a palavra o Relator,

Deputado Geraldo Thadeu.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Dr. Roberto, o senhor, nesse

inquérito, foi o presidente o tempo todo, desde o início até o final; foi o senhor que

concluiu esse inquérito.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Exato.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Na questão, por exemplo, desses

casos, em todos eles o laudo apresentado foi de morte cerebral?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Os demais casos, ou o senhor

fala...

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não, esses casos aí.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Esses casos do...

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Eles tinham o laudo de morte

cerebral?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Se tinham o laudo?

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - É.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não, eu estou me baseando na

perícia. A perícia é que determinou que não foi constatada a morte encefálica.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas eles tinham o laudo?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Em alguns casos estava

determinado morte cerebral; em outros casos, morte encefálica... Não, dessas 4

vítimas, é taxativo; 4 vítimas não se encontravam em morte encefálica.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não se encontravam?

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O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não se encontravam em morte

encefálica.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas os médicos que atenderam,

eles realizaram, eles tinham um laudo prescrito pelo médico que atendia?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Eles alegam que fizeram.

Alegam, certo, mas não provam.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas apresentaram documento?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não, não.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Nunca foi...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Alegam. É aquele caso, veja

bem, se eu vou fazer um programa de transplante, se é essencial... Aliás, queria

deixar bem claro aqui que eu não sou contra transplante de órgãos. Eu sou favorável

a transplante de órgãos lícito, programa lícito, decente, honesto. Não sou contra.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não, não, eu...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Então, veja bem, se é um

programa de transplante, isso é sério. Não pode ser um arremedo de transplante

para o projeto; protocolo, assim, verbal, acordos... Parece corte medieval, que

ninguém está sabendo, e vai-se fazendo de qualquer jeito. Não pode acontecer um

negócio desses aí. E, logicamente, que nós sabemos que os lançamentos devem

ser efetuados nos prontuários. Um caso desse seria nos prontuários que deveria ser

lançado, constatado. Alguns casos têm lá “constatado morte cerebral”. Por que não

se lançou mais à frente “constatado a morte encefálica”? Se ele constata a morte

cerebral e lança, sem motivação, tudo bem. É fácil, chegar aqui “morte cerebral”.

Cadê certos dados clínicos, os achados clínicos para colocar por que eu cheguei à

conclusão que esse paciente está em morte cerebral; por que eu cheguei à

conclusão que esse paciente está em morte encefálica? Quais os achados clínicos?

Isso não tem...

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não, não. Eu gostaria de saber o

seguinte. Vou pegar um caso, um desses 4 que o senhor tem.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Certo.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Por exemplo, quando o senhor fez

lá a apreensão dos documentos, o prontuário, junto com os documentos que o

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senhor apreendeu, estava lá? Existia um documento escrito, assinado pelo médico,

dizendo que esse paciente está em morte cerebral ou encefálica?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Em alguns casos, nós tínhamos

esse lançamento de morte cerebral. Estava nas angiografias bilaterais celebrais que

acompanharam o prontuário e que foram submetidas à perícia.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Constatavam...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - É constatavam. Está lá: morte

cerebral. O que aconteceu foi o seguinte; a grande verdade é a seguinte...

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não, eu quero continuar.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Certo.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Então, estava constatado, por

exemplo, que o paciente tal, prontuário, laudo de morte cerebral, acompanhado da

arteriografia. Estava isso?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não. Alguns casos lançavam

morte cerebral, só isso aí, mas nada, sem motivação nenhuma.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E o laudo? A arteriografia

acompanhava?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Exato. Acompanhava. O detalhe

é o seguinte...

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Tinha data na arteriografia?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Tem, tem data, nome do

paciente e data.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E constatava a morte cerebral?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Olha, veja bem, eu fiz os

quesitos para os peritos, e os peritos chegaram à conclusão que não estava

constatada a morte encefálica, e me interessava a morte encefálica.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não, naquelas arteriografias, os

peritos constataram que não existia morte encefálica?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Exato. Para o senhor ver só o

enfrentamento meu, vamos dizer assim, o problema que eu enfrentei. A lei antiga

falava: “prova incontestável da morte”. O senhor se lembra dessa lei antiga, primeira

lei, que não foi regulamentada. Ninguém sabia o que é essa prova incontestável da

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morte. E todo mundo fala morte cerebral. Os próprios neurocirurgiões, os 2, o Dr.

Mariano e Dr. Antônio Aurélio de Carvalho, não sabiam o que era morte encefálica.

Não distinguiam morte cerebral de morte encefálica. Eles tinham dúvida. O Dr.

Antonio Costardi, outro neurocirurgião, que tem um caso em Pindamonhangaba,

também não sabia. Esse aí ainda falou que não sabia. Está assinado por ele que ele

não sabia a definição. Até que ele considerou...

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas ele deu algum laudo de morte

cerebral?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Deu.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Ele falou que não sabia?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Ele não sabia. Ele desconhecia a

lei de transplante. A maioria deles desconhecia a lei de transplante. Eles não sabiam

que retirada de órgãos de pacientes vítimas de crime, a lei vedava. Eles não sabiam.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Mas esses depoimentos estão nos

autos?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Estão nos autos. Eles se

encontram nos autos.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Essas declarações deles?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Tem. Elas se encontram nos

autos.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Agora, deixa eu perguntar uma

coisa para o senhor. Eu estou um pouco prejudicado, eu sei que o senhor tem um

compromisso, nós estamos também com votação nominal.

Há poucos dias... A gente fala que a Justiça é lenta, que o Tribunal de Justiça

demora muito, mas eu fiquei até surpreso quando vi que um Juiz de Tribunal

Superior julga, em um ano, 9.000 processos, em média 9.000 processos.

Dr. Roberto, 10 anos, 11 anos, não é muito para ficar com um inquérito?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - É uma situação interessante.

Veja bem, certo, se fosse 10 ou fosse 12 anos, não podemos inverter o ônus, vamos

dizer assim. Eu não sou o vilão da história, não estou sendo acusado de homicídio.

Esses 10 anos também não vão ser motivo para se elidir o eventual crime que eles

tenham cometido. Prescrição não haverá. Procuramos fazer o quê? Justiça. Não vou

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ser leviano, como o caso lá da escola de base, cantina moderna, de jeito nenhum.

Eu respeito o cidadão mesmo investigado. Então, aquele caso...

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Não estou levantando... Eu apenas

gostaria de... Há quantos anos o senhor está lá em Taubaté?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Eu estou desde 1986.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - 86.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Exato.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Está há uns 18 anos.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Exato.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Quantos inquéritos o senhor já

realizou como Presidente?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Olha, como eu falei para o

senhor, quando eu comecei a presidir esse inquérito, tinha 1.200 inquéritos sob a

minha presidência, porque nós não tínhamos delegados, eu era o único presidente.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Sei.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Aconteceu uma situação até

hilariante. Quando eu estava pedindo prazo em um inquérito, o outro lado já tinha

vencido. Então, é aquele caso, a gente ficava tomando providência, até que recebi

funcionários, com mais colegas conseguimos adequar a situação. O número de

ocorrência era mais de 4.000 ocorrências ao ano, o que dava mais de 450

ocorrências ao mês. Tinha o setor de investigações gerais. A cidade me cobrava

segurança. Tinha uma cadeia que era um barril de pólvora, na iminência de

rebeliões e etc. Eu tinha uma série de atividades.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Esse caso teve uma repercussão

nacional. Foi uma repercussão...

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Teve uma repercussão nacional.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - E mesmo assim, com a pressão

até da opinião pública, tudo, sinceramente, acho que 10 anos desse processo é

absurdo.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Tudo bem. Vamos nos socorrer

da lei, certo? Temos o art. 10 do Código de Processo Penal, § 3º, que determina o

seguinte: os casos complexos, de difícil elucidação, eu posso pedir prazo motivado.

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Eu fui fiscalizado pelo Ministério Público esse tempo todo e pelos magistrados, com

concessão de prazos, porque eles verificaram realmente eu que estava com casos

de difícil elucidação, casos complexos. Eu não poderia, vamos dizer assim, ser

leviano em fazer um relatório breve. Olha, eu era a pessoa mais interessada, vamos

dizer assim, em concluir esse inquérito. Até hoje esse inquérito está me

perseguindo. Sou a pessoa mais interessada em concluir. A cobrança foi muita. Só

que não poderia ser leviano. Vou agora concluir esse inquérito, fazer um relatório por

fazer um relatório? Eu vou transferir a minha responsabilidade para o Ministério

Público? Não. Tanto é que, quando eu concluí esse inquérito, não houve quota, não

houve solicitação de diligência pelo Ministério Público.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Pelo inquérito, pelo processo, o

senhor considera que em Taubaté estava sendo montado um processo de tráfico de

órgãos?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Olha, ao arrepio da lei, certo, a

lei desrespeitada. Havia outros interesses, logicamente, que não consegui provar,

mas foi ao arrepio da lei, um arremedo de programa de transplante, de protocolo. Foi

como se fosse uma corte medieval. Realmente eu cheguei depois a ler aquele o livro

do Dr. Kalume, que seria fictício ou não, mas uma verdadeira corte medieval, tudo

feito às escondidas, sem diretores, vamos dizer assim, de departamentos.

Professores de Medicina não estavam sabendo o que estava acontecendo; tudo às

escondidas; só um grupo atuando, envolvendo nomes: Emil Sabbaga. Tanto é que

naquele caso ele mesmo fala que não teve participação nenhuma, não sei o que, e

tal, tudo bem. Só se limitou a dar aprovação pelo roteiro que eles apresentaram, mas

não acompanhou nada. O INAMPS, por exemplo, certo, não autorizou o Hospital

Universitário a realizar transplantes renais.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Foi realizado algum no Hospital

Universitário?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Foi. Foi realizado um,

improvisado realmente.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Quantos?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Um transplante. Tanto é que o

paciente morreu logo em seguida. Dentro de uns 3 meses, o paciente morreu, certo,

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e foi suspenso; de imediato foi suspenso esse transplante renal no Hospital, porque

ele não tinha suporte nenhum. E lá no Hospital Santa Isabel de Clínicas, antigo

HOSIC, diante da denúncia apresentada na imprensa, também foram suspensos os

transplantes dos órgãos — os transplantes não, a retirada de órgãos para

transplante.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Foram suspensos?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Foram suspensos.

O SR. DEPUTADO GERALDO THADEU - Muito obrigado.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Pois não.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Dr. Roberto, o senhor já nos

explicou, iniciou a sua fala explicando por que o processo demorou tanto, esses

muito afazeres, e agora o senhor acaba de reiterar. Esses foram os únicos e

principais motivos desse tempo todo?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - É, disso tudo que eu falei, da

complexidade, das minhas atividades outras, porque eu tinha também que atender à

sociedade, não era só esse caso, e a minha preocupação em fazer justiça. É uma

preocupação minha, porque nenhum outro colega ia querer assumir a Presidência

desses autos. E seria também antiético da minha parte transferir a presidência desse

autos para um outro colega. Eu fiquei, vamos dizer assim, me tornei vítima de

chacota, certo? “Você é um idiota, você com esse inquérito, isso não vai dar em

nada, você é bobo, está perdendo o seu tempo, relata logo isso aí”. Falei: “Não, vou

até o final. Demore o tempo que demorar, vou até o final. Não vou ser precipitado”.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Nessa caminhada, sofreu

algum tipo de pressão interna ou externa para não concluir a investigação?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não, em hipótese alguma. Não

aceito pressão de ninguém. Na condução de uma investigação policial, não aceito.

Seja lá quem for, pode até ser chefe.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Mas às vezes ela vem sem

a gente querer.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não, não tive.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Nunca?

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O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - A única pressão que tive foi

cobrança.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Sei.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - A cobrança da sociedade.

Reconheço que a sociedade tinha que cobrar realmente. É um caso de máxima

relevância, é interesse da Nação isso daí. Aliás, no meu entender, a lei de

transplantes atual, já que os senhores estão aqui numa Comissão Parlamentar de

Inquérito, essa lei tem que ser revista. Essa lei ainda continua inadequada. Essa lei

tem uns conceitos aí um tanto quanto duvidosos. Acho que desta CPI pode nascer,

de um dos Srs. Parlamentares aqui presentes, uma nova lei de transplantes, mais

coerente, que venha realmente inibir o que aconteceu aqui em Taubaté que é o que

está acontecendo no País, na África do Sul e outros lugares aí.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Foram solicitadas

diligências protelatórias pela Justiça e pelo Ministério Público alguma vez?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Não entendi.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Se lhe foi apresentada

alguma solicitação de diligências protelatórias.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Em hipótese alguma.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Nem pela Justiça nem pelo

Ministério Público?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARRO - Não, de jeito nenhum. Não houve

nada, nada.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - A perícia contribuiu,

retardou ou cooperou bem?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Olha, a perícia demorou. Eu tive

muito problema com o CREMESP e o Conselho Federal de Medicina. Esse aí

realmente foi um obstáculo que obtivemos e, se não fosse a ação enérgica do juiz,

não teria vindo para os autos o que aconteceu no CREMESP e no Conselho Federal

de Medicina. Interessante é que nós colocamos aqui na conclusão do Conselho

Federal de Medicina que eles foram absolvidos. Foram absolvidos por uma decisão,

vamos dizer assim... os laudos estão aí. Não dá para entender a absolvição. Não

sei. Não estou aqui para querer julgar. Isso aí já é uma entidade de classe. Tenho

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que me basear apenas no laudo. E o inquérito está aqui, a gente tece nossos

comentários.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Além do CREMESP, algum

outro órgão representativo da classe médica influenciou, ou quis impressionar, ou

atrasar?

O SR. ROBERTO DE BARROS - Não. Foi para o Conselho Federal de

Medicina, que eles mantiveram, o CREMESP, a posição da condenação dos

médicos — no caso, a censura pública, infringência de alguns artigos do Código de

Deontologia Médica. Nesse recurso, o Relator se manifestou para manter aquela

decisão do CREMESP. Teve um voto vencedor, sem motivação, que os outros

acompanharam, e eles foram absolvidos.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Doutor, hoje, qual é a

posição desse processo? Eu mesmo quero saber pessoalmente, quero me situar.

Qual é próximo passo a ser dado? Esse passo dado culminaria em quê?

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Encontra-se no Tribunal de

Justiça, com recursos e embargos infringentes, que o recurso em sentido estrito foi 2

a 1. Os acusados perderam. Como foi 2 a 1, eles tiveram direito de ingressar com

embargos infringentes. Então, vão estar dependendo do voto de mais 2

desembargadores para dirimir essa questão, se eles serão realmente submetidos ao

julgamento do Tribunal do Júri. Acredito eu que, se isso acontecer, não será nem em

Taubaté, devido à repercussão. Vai ter de ser em um outro Município neutro. Lá não

vai ter condições.

O SR. DEPUTADO PASTOR PEDRO RIBEIRO - Obrigado, doutor. Sr.

Presidente, estou satisfeito.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Sr. Delegado, queremos

agradecer a participação do senhor e solicitar, em nome da Comissão Parlamentar

de Inquérito, a possibilidade de o senhor deixar conosco a cópia desse relatório do

inquérito apresentado pelo senhor.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Poderei deixar todo esse

material que fiz. Aqui tem as perícias, etc. Tem também a decisão do Tribunal, a

manifestação do Procurador de Justiça. Fiz caso por caso. Quero cooperar

realmente com a Comissão Parlamentar de Inquérito. E espero que sejam

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espancadas de uma vez por todas no País essas ações, essa era medieval, a Idade

Média, a idade negra da humanidade, a ganância por dinheiro e aquelas pessoas

que ferem o Código de Ética, os seus juramentos, que têm condutas escusas. Não

estou julgando, estou falando de uma forma genérica.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Então, nós vamos receber

da mão do senhor essas peças, que farão parte do acervo da Comissão Parlamentar

de Inquérito, para serem analisadas pelo Relator na conclusão do seu relatório.

O SR. ROBERTO MARTINS DE BARROS - Pois não.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Neucimar Fraga) - Nós tínhamos um

requerimento em pauta do Sr. Deputado Geraldo Thadeu, mas como a Ordem do

Dia se iniciou e as votações ficariam prejudicadas, vamos colocá-lo na pauta de

amanhã.

Não havendo mais quem queira fazer uso da palavra, primeiramente

queremos agradecer e encerrar esse depoimento prestado pelo Delegado,

agradecendo a sua participação e as informações prestadas, e dizer que nos damos

por satisfeitos com as informações prestadas aqui pelo Delegado.

Não havendo mais quem queira fazer uso da palavra, convoco reunião para

amanhã, dia 25 de agosto, às 13h, no plenário 7 do Anexo II desta Casa, para a

realização de audiência pública e deliberação de requerimentos, cuja pauta já foi

encaminhada aos gabinetes de V.Exas.

Agradeço a presença de todos e declaro encerrada a presente reunião.

Muito obrigado e Deus abençoe a todos.