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CÂMARA DOS DEPUTADOS DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES TEXTO COM REDAÇÃO FINAL COMISSÃO DE RELAÇÃO EXTERIORES E DE DEFESA NACIONAL EVENTO: Audiência Pública N°: 1137/03 DATA: 13/08/03 INÍCIO: 16h25min TÉRMINO: 18h34min DURAÇÃO: 02h07min TEMPO DE GRAVAÇÃO: 02h08min PÁGINAS: 54 QUARTOS: 26 REVISÃO: Eliana, Irma, Luciene Fleury, Patrícia Maciel SUPERVISÃO: Cláudia Luiza, Débora CONCATENAÇÃO: Cláudia Luiza DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO CARLOS LESSA - Presidente do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social — BNDES. SUMÁRIO: Esclarecimentos sobre a concessão de empréstimos a países da América do Sul, sobre questões relativas à EMBRAER e outros assuntos relevantes. OBSERVAÇÕES Há oradores não identificados. Há intervenções simultâneas ininteligíveis. Há expressão ininteligível. Há intervenções inaudíveis.

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Page 1: DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO … · máquinas, equipamentos, etc. Basicamente decisivo nesse jogo é o pacote financeiro que vai associado ao fornecimento. Existem

CÂMARA DOS DEPUTADOS

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO

NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES

TEXTO COM REDAÇÃO FINAL

COMISSÃO DE RELAÇÃO EXTERIORES E DE DEFESA NACIONALEVENTO: Audiência Pública N°: 1137/03 DATA: 13/08/03INÍCIO: 16h25min TÉRMINO: 18h34min DURAÇÃO: 02h07minTEMPO DE GRAVAÇÃO: 02h08min PÁGINAS: 54 QUARTOS: 26REVISÃO: Eliana, Irma, Luciene Fleury, Patrícia MacielSUPERVISÃO: Cláudia Luiza, DéboraCONCATENAÇÃO: Cláudia Luiza

DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO

CARLOS LESSA - Presidente do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social —BNDES.

SUMÁRIO: Esclarecimentos sobre a concessão de empréstimos a países da América do Sul,sobre questões relativas à EMBRAER e outros assuntos relevantes.

OBSERVAÇÕES

Há oradores não identificados.Há intervenções simultâneas ininteligíveis.Há expressão ininteligível.Há intervenções inaudíveis.

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CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Relação Exteriores e de Defesa NacionalNúmero: 1137/03 Data: 13/08/03

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A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Declaro abertos os

trabalhos da presente reunião de audiência pública da Comissão de Relações

Exteriores e de Defesa Nacional, com a presença do Dr. Carlos Lessa, Presidente

do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social — BNDES, para

esclarecer sobre a concessão de empréstimos para países da América do Sul,

discutir questões relativas à EMBRAER e tratar de outros assuntos relevantes.

A presente audiência pública atende a requerimento de autoria do Deputado

Alberto Goldman.

Informo ao Sr. Carlos Lessa que para seus esclarecimentos S.Sa. terá tempo

suficiente, que poderá ser prorrogado. Posteriormente, passarei a palavra aos

Deputados.

Com a palavra o Presidente do BNDES, Sr. Carlos Lessa.

O SR. CARLOS LESSA - Boa-tarde, Sra. Deputada e membros da Comissão.

O BNDES agradece a oportunidade de mais este contato com o Poder Legislativo. A

posição do BNDES na minha diretoria é responder perguntas toda vez que forem

solicitadas em audiência, porque entendemos que deva haver entre o Poder

Executivo e o Poder Legislativo um jogo interativo e de absoluta transparência.

Não sei exatamente por que ponto V.Exas. querem que eu comece. Diria que

o BNDES vem se convertendo lentamente em banco de financiamento à exportação.

Assumiu também essa dimensão na medida em que o País, tendo sido

industrializado, teve de buscar competitividade no mercado internacional de

máquinas, equipamentos, etc. Basicamente decisivo nesse jogo é o pacote

financeiro que vai associado ao fornecimento.

Existem variadas modalidades para o financiamento. O BNDES opera com 3

modalidades. Uma delas á a pré-embarque, equivalente a um tipo de operação de

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capital de giro em que a empresa assume compromisso com determinado

desempenho exportador que se verifica após empréstimo. Outra modalidade são as

clássicas operações de um banco de financiamento de exportação, em que você

financia ao vendedor ou ao comprador de uma determinada mercadoria.

Vínhamos fazendo isso para complementar a política geral do BNDES de

fortalecer a indústria mecânica brasileira. Estou me referindo à mecânica para

caracterizar melhor. Porém, as vicissitudes que o Brasil atravessou principalmente

nos anos 90 fizeram crescer a atuação do BNDES como banco de apoio às

exportações brasileiras. Se não me engano, em 2002, 42% das operações do

BNDES foram ligadas ao financiamento de exportação. Nessa trajetória estão os

financiamentos à EMBRAER.

Na verdade, como sabem V.Exas., a EMBRAER é uma importantíssima

empresa exportadora brasileira. Se não me engano, é a segunda no ranking das

empresas exportadoras do Brasil, abaixo da PETROBRAS, que é a primeira. A

EMBRAER orgulha os brasileiros porque podemos competir em produtos de

tecnologia avançada, no caso aviões a jato. No mundo hoje só existem 4 fábricas de

aviões a jato comerciais — militares há mais —, que são a Boeing, a Airbus, a

Bombardier e a EMBRAER.

A EMBRAER recebeu do BNDES ao longo desses anos intenso apoio, e seu

crescimento está diretamente associado a esse apoio. Reciprocamente, o BNDES

passou a ter excessiva exposição aos negócios aéreos. Hoje, temos uma vez e meia

o patrimônio líquido do banco associado a nossa carteira aérea. A carteira aérea não

é um débito da EMBRAER, mas de todas as empresas que adquiriram aviões

brasileiros.

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O problema é que o mercado internacional exige que sejam financiados por

14 anos. Então, cada avião em média custa cerca de 30 milhões de dólares, não é

isso? Um pouco menos...

(Não identificado) - Um pouco menos, cerca de 20 milhões de dólares.

O SR. CARLOS LESSA - E a EMBRAER, para poder funcionar normalmente,

precisa exportar cerca de 160 jatos por ano. Então, a EMBRAER é uma empresa

que precisa de financiamento da ordem de 3 a 3,5 bilhões de dólares. Só que isso é

um plus a cada ano, porque a trajetória se prolonga até o 7º ou 8º ano, quando

começaria a haver um certo nivelamento, porque a recuperação de crédito estaria

mais ou menos servindo para alavancar novos financiamentos. Neste momento a

EMBRAER ainda é uma tomadora líquida de recursos muito expressiva. E, por todas

as regras bancárias, é excessiva a exposição do BNDES a esse único negócio. Por

isso mesmo, em nossos entendimentos com a EMBRAER, temos procurado que a

empresa busque uma diversificação de fontes de financiamentos.

Ela já tem algum financiamento expressivo sendo dado pela General Electric;

há no horizonte um aumento provável dos financiamentos da General Electric.

Temos insistido muito com essa empresa, que tem 12 fábricas no Brasil, para que

venha a ter a décima terceira, montando pelo menos as turbinas de jatos no Brasil, o

que aumentaria muito o valor agregado brasileiro em cada avião vendido ao exterior.

Hoje é de mais ou menos 50% o valor agregado. Mas se a turbina for feita no Brasil,

passa a ser da ordem de mais de 60%, porque durante muito tempo teríamos que

importar componentes para a própria turbina.

A propósito, a relação entre a EMBRAER e o BNDES é muito parecida com a

relação entre marido e mulher casados há muito tempo: um depende do outro.

Eventualmente podem ter rusgas, mas estão essencialmente ligados. Fiz essa

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comparação para dizer que nas relações entre BNDES e EMBRAER não existe

qualquer perspetiva de sombra. Queremos que a EMBRAER continue sendo uma

das empresas privilegiadas nas nossas carteiras, porém pretendemos que seja

relativamente reduzido o peso que representa sua posição no tocante às operações

futuras de financiamentos de exportações do banco. Os entendimentos estão

evoluindo, como ocorre usualmente com os velhos casais.

Com esses esclarecimentos, quero virar a página e passar a tratar das

relações entre Brasil e América do Sul. As relações do BNDES com a América do

Sul são também antigas. O BNDES é o principal banco que financia exportações

brasileiras de máquinas e equipamentos para os países da América do Sul. Ainda há

pouco dias, estávamos liberando financiamento de mais de 30 milhões de dólares de

máquinas e equipamentos agrícolas para a Colômbia. Na reunião da diretoria

ocorrida segunda-feira, aprovamos financiamento para a República Dominicana de

exportações de serviços e materiais para sinalização. Isso faz parte da nossa rotina.

Também estamos financiando ônibus da Marcopolo para diferentes lugares, bem

como ônibus da Busscar e motocicletas. Trata-se de espectro bastante diversificado.

A maioria das exportações são para a América Latina, mas também estamos

financiando turbinas da represa das Três Gargantas, que será a maior hidrelétrica do

mundo e está sendo construída no Rio Amarelo, na China. Enfim, não diria que isso

é rotina no banco, porque é evidente que cada operação dessas tem sua

importância, sua complexidade, mas é uma atividade, vamos dizer, natural de um

banco que desempenha o papel de financiador de exportações. Até brincamos

dizendo que o BNDES é uma espécie de Eximbank, “EximBNDES”. Isso é um pouco

de pretensão, mas um pouco de pretensão e de água benta não fazem mal a

ninguém.

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No que diz respeito à América do Sul, existe determinação de natureza

geopolítica por parte da administração geral do País no sentido de fortalecer a

integração com os países da América do Sul.

O BNDES, ao receber essa instrução, busca operacionalizar conversas,

decisões e entendimentos entre a diplomacia brasileira e a dos países vizinhos,

ratificados muitas vezes por declarações de intenção conjuntas dos Presidentes da

República dos respectivos países. No plano dessas declarações, há intenção do

Governo brasileiro de aprofundar as relações com os países da América do Sul em

geral, mas particularmente com a Argentina, a Venezuela e a Bolívia, que

representam entendimentos de maior expressão e mais avançados.

Passo a esclarecer cada um dos casos. O caso da Bolívia é relativamente

fácil de esclarecer. O Brasil tem um contrato com a Bolívia que, pessoalmente,

considero muito malfeito. Nesse contrato, take or pay, em dólar, o Brasil assumiu o

compromisso de adquirir gás da Bolívia — sendo o Brasil o único mercado para esse

gás. Ou seja, o País se comprometeu a comprar uma quantidade definida de gás,

usando ou não esse gás, para pagar em dólares. Ocorre que o Governo boliviano,

nos royalties que recebe por esse contrato, tem uma fonte de financiamento

fundamental. Esse contrato dificulta muito a tarifação de energia no Brasil, porque

além de a energia de Itaipu ser dolarizada também o gás ficou agora dolarizado.

Esses vetores restringem a tarifação de energia no Brasil, a qual seria interessante

reduzir. Porém, só será possível reduzir se gerarmos outras perspectivas negociais

com a Bolívia.

Com tudo isso, a Bolívia passa a ser parceiro extremamente importante do

Brasil na busca de repactuação dos contratos relativos ao gás. Para fazer essa

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repactuação, obviamente temos de consultar todos os parceiros envolvidos, desde

os dos campos de gás até os do gasoduto e os operadores de usinas termoelétricas.

Então, tratamos de questões complexas que fazem com que as relações

Brasil/Bolívia evoluam em direção muito decisiva e também fazem com que o

Governo brasileiro tenha a preocupação de construir uma pauta que permita uma

diplomacia comercial mais adequada ao País.

No caso da Argentina, o comércio Brasil/Argentina teve contração espantosa

na segunda metade dos anos 90, derivada de uma porção de dificuldades que

assaltaram aquele país e que estiveram também ligadas ao Brasil. A verdade é que

houve uma brutal atrofia desse comércio, e não preciso falar a V.Exas. a respeito de

todas as dificuldades que a Argentina ainda atravessa. Houve decisão do Governo

brasileiro de intensificar o comércio, apoiando as exportações brasileiras para a

Argentina, o que seria uma atividade clássica do Eximbank, comparada à promessa

do Brasil de apoiar exportações brasileiras para a Bolívia ou Venezuela. Há uma

novidade que singulariza: no caso da Bolívia, abriu-se a janela para o apoio

brasileiro às exportações argentinas para o Brasil.

(Não identificado) - Argentinas ou bolivianas?

O SR. CARLOS LESSA - Argentinas. Bolivianas não, nem venezuelanas, só

argentinas. Na verdade, a idéia é que existisse apoio da ordem de até 500 milhões

de dólares em cada uma das direções.

Até o momento, infelizmente, nenhum dos acordos básicos foi firmado.

Algumas empresas brasileiras já manifestam firmes interesses de exportar para

esses países e outras, de forma mais modesta, de importar da Argentina. Mas há,

digamos, expectativa empresarial crescente em torno dessas operações que ainda

não foram formalizadas, estão em negociação. Trata-se sempre de negociações

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complexas, porque envolvem, além do objetivo da própria operação, questões

complicadas ligadas a garantias bancárias e questões lato sensu de diplomacia

comercial, que não cabem nessas linhas de financiamento, mas que interferem.

Então, esse é um movimento no qual o BNDES está empenhado, e o sinal mais forte

é voltado para a integração sul-americana.

A integração pretendida passa sem dúvida pelo fortalecimento das correntes

comerciais, onde se incluem as operações Eximbank, mas não apenas essas

operações. Se o Brasil importa trigo da Argentina ou se exporta algodão para a

Colômbia, podemos dizer que essas são exportações de commodities que não

entram na operação de financiamento típico de Eximbank, mas dentro das linhas

normais de comércio. Não se trata de operações a que o BNDES esteja ligado. As

operações a que o BNDES está ligado são basicamente voltadas, ou vocacionadas,

a projetos de investimentos que, decompostos, implicam busca de fornecimentos ao

Brasil.

Por exemplo: na Venezuela, o Brasil financia uma ponte no Rio Orenoco, cujo

contrato foi feito por empresa brasileira, a mesma que faz o metrô de Caracas. Neste

caso, a especificação de material a ser usado na obra favorece exportações

brasileiras.

Estou dando exemplo de operação equivalente às que fazemos na República

Dominicana ou às exportações que o Brasil vem financiando para o México.

Pertence ao universo que eu chamaria de Eximbank: turbinas elétricas, máquinas

agrícolas, material rodante, etc.

Infra-Estrutura. No ano 2000, se não me engano, os Presidentes

convencionaram acordo voltado a estudar a infra-estrutura de integração da América

do Sul. E aí se construiu, também se não me engano, a hipótese de 10 eixos

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básicos de integração. Os projetos de infra-estrutura dos países seriam formulados

tendo em vista o desenho de uma América do Sul integrada.

O sonho da integração sul-americana é recorrente na retórica sul-americana.

Basta olhar para a América do Norte para constatar que desde o início do século XIX

as ligações costa a costa estavam garantidas. E grande parte da prosperidade norte-

americana se deve exatamente a esse fato.

A América do Sul, em função da Cordilheira dos Andes, obstáculo de

engenharia respeitável, e da fragmentação ocorrida em diversos Estados nacionais,

está extremamente atrasada no que se refere a esse processo, que eleva as

sinergias sul-americanas.

O tema da infra-estrutura da América Latina visita o debate sul-americano há

mais de 40 anos. Porém, no ano 2000, houve um up grade relevante. Passamos a

discutir coisas tão prosaicas quanto bitolas de ferrovias. Apenas para exemplificar:

os países da América do Sul têm bitolas de ferrovias diferentes, o que torna muito

difícil a ligação entre ferrovias, que às vezes estão ligadas, mas com bitolas

diferentes.

Outro assunto que se discute diz respeito as nossas redes aéreas. Neste

caso, ressalte-se que é mais fácil ir de uma capital sul-americana a outra via Miami

do que diretamente.

Nos últimos 2 anos, as questões ligadas à integração receberam poderosa

impulsão dos governos sul-americanos e obtiveram monitoramento técnico muito

competente, o que amadureceu uma série de projetos. Surgiu a idéia de que o

nosso BNDES se aproximasse da Corporação Andina de Fomento, que vem a ser

um BNDES de menor porte, mas que tem no sistema financeiro internacional um

ranking superior. Trata-se de um banco de grande prestígio no cenário internacional.

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Como o Brasil é acionista minoritário da CAF, com apenas 2,5% do seu capital,

houve a decisão do Governo de ampliar, até 2004 ou 2005, sua participação em

10%. A partir dessa participação é que o CAF amplificará a possibilidade de financiar

projetos no Brasil.

Reciprocamente, os dois bancos resolveram apoiar a integração sul-

americana. Na semana passada, no Rio de Janeiro, nos dias 6, 7 e 8, foi realizada

uma reunião na qual compareceram representantes de quase todos os países.

Aproximadamente 500 pessoas participaram desse encontro. Compareceram

empresários brasileiros e sul-americanos, cerca de 100 representantes de países

sul-americanos, dentre Ministros de Estado, chanceleres, embaixadores e técnicos,

além de representantes do Banco Mundial, do BIC, do JBIC, etc. Até a Guiana

Francesa, que não é considerada um país, mas um departamento ultramar da

França, enviou representante. Durante 3 dias foram discutidos 22 projetos, já que

cada país ficou com o direito de apresentar 2 projetos que considera relevantes para

a integração sul-americana e de seu interesse. Denominamos esse seminário de

Prospecção de Projetos de Atuação Conjunta CAF/BNDES.

Não é nada fácil bancos operarem co-financiamento, porque cada banco tem

ritual e regras próprias. Os ajustamentos se dão de maneira lenta. O compromisso

político entre os 2 principais bancos de desenvolvimento que existem no continente

é no sentido de priorizar um elenco de projetos, sobre os quais cada banco vai

operar a sua própria análise e verificar sua conveniência ou inconveniência. Porém,

a princípio, estamos ávidos para examiná-los, pois têm efeito extremamente positivo.

Alguns dos projetos de infra-estrutura apresentados são privados, e o BNDES

está extremamente interessado em explorar suas possibilidades. Nosso próprio

estatuto nos impede de financiar projetos em terceiros países executados por

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empresas de quartos países. Em resumo, o BNDES nunca financiará a construção

de um projeto de infra-estrutura em um país cujo vencedor da licitação seja uma

empresa de outro país. Significaria, rigorosamente, virarmos um banco mundial. E

não é propósito do BNDES ser banco mundial. O que o BNDES quer é ajudar a

fortalecer a integração sul-americana, porque existem sinergias absolutamente

notáveis entre as nossas fronteiras e as dos países-irmãos. Se não me engano, o

Brasil tem fronteira com 10 países. Somos um dos países que têm mais fronteiras.

Com alguns desses vizinhos temos projetos óbvios de fecundação recíproca.

O Estado de Mato Grosso do Sul, por exemplo, está vitalmente interessado

no aperfeiçoamento de 2 rodovias: uma no Paraguai, outra na Bolívia. Elas dão uma

alavancagem espetacular à região e, por extensão, ao resto do Brasil, ao mesmo

tempo que abrem caminho para encurtar a ligação entre Brasil e Arica, um dos

portos do Pacífico em cuja ligação sistêmica se interessa muito nosso País. Há

inúmeros outros exemplos. Na Região Norte, o Estado de Roraima está agora ligado

a Caracas por uma rodovia de boa classe. Abriu-se uma janela para o Caribe. A

outra janela sai da mesma cidade, Boa Vista, em direção à Guiana, via Lethen, por

uma estrada de facilíssima execução.

Srs. Parlamentares, pode parecer um sonho o que vou dizer — qualquer

dirigente de Banco de Desenvolvimento tem de pensar sempre no futuro —, mas o

Estado de Roraima tem uma fantástica potencialidade para a soja. Os experimentos

em Roraima estão dando de 30% a 33% mais soja do que no Brasil central. A porta

do Caribe é extremamente conveniente para a exportação dessa soja. Há todo um

jogo de relações a ser considerado. É do conhecimento de todos que o suprimento

de energia elétrica para a Região Norte já vem de usinas venezuelanas. Essas

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relações virtuosas apontam para um futuro continente cada vez mais interarticulado,

o que potencializa o desenvolvimento brasileiro e o de outros países.

Tenho uma reprovação ao meu próprio banco: não conseguimos imprimir a

velocidade necessária a esse processo. E não é possível fazê-lo, porque todas

essas questões passam por articulações que não são estritamente bancárias. Há

momentos em que há ajustes de natureza relacional entre os países, e outros em

que acontecem dificuldades que derivam de administrações não-harmonizadas. No

MERCOSUL, a harmonização é muito mais avançada, mas com os outros países da

América do Sul ainda é incipiente.

Sra. Presidenta, não sei se cumpri a pauta, mas creio que já abordei alguns

aspectos.

Mais detalhes sobre a natureza das operações do BNDES no comércio

exterior podem ser fornecidos por uma assessora da nossa instituição. E a respeito

das operações com a EMBRAER, poderá fornecer os detalhes outra assessora,

chefe do departamento que cuida da carteira relativa à EMBRAER.

A EMBRAER é tão importante para nós que temos um departamento voltado

apenas para acompanhá-la. Recentemente, criamos um departamento para cuidar

da integração sul-americana.

Era isso que tinha a apresentar.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Muito obrigada, Dr. Carlos

Lessa, Presidente do BNDES.

Concederei agora a palavra ao autor do requerimento, Deputado Alberto

Goldman. Em seguida, aos demais Deputados que se inscreveram.

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - Sra. Presidenta, senhores

membros da Comissão, Prof. Carlos Lessa, o que me chamou a atenção e deu

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origem ao requerimento foi uma série de notícias de jornais sobre o financiamento à

exportação uruguaia — os jornais evidentemente tem sua credibilidade limitada — e

outros financiamentos, já referidos por V.Sa., sobre os contratos feitos com vários

países, especialmente Argentina, Venezuela e Bolívia. As notícias também falam

sobre as razões pelas quais em cada país está se dando isso.

Parece que a decisão é de ordem política, que escapou do próprio BNDES.

Disse o Dr. Carlos Lessa explicitamente que foi uma determinação geopolítica. Isso

significa que, pelo acompanhamento que temos do que está acontecendo no País

hoje, o Presidente da República adotou a decisão de ampliar seu campo de ação

internacional como o maior país da América Latina — maior mesmo, pois nem o

México se aproxima do Brasil nesse sentido, apesar de os índices de exportação

daquele país serem fantásticos em função do NAFTA e do PIB; aliás, eu não sabia

que o PIB era 3 vezes maior, até fiquei com vergonha.

De qualquer forma, foi decisão do Presidente da República ou de alguém.

Houve o conceito de que o País poderia se tornar o grande líder da América Latina.

Nada mal, especialmente se for possível. Mas foi uma decisão geopolítica a

ampliação, buscando esses países e esses financiamentos para exportação e

importação e para o gerenciamento de obras locais, ainda que sejam com empresas

brasileiras e não estrangeiras, evidentemente com as suas limitações. Foi uma

decisão geopolítica, repito.

A princípio, não há nada contra uma decisão geopolítica, pois isso faz parte

evidentemente da política de qualquer governo. Mas o que já se percebe claramente

é uma certa dificuldade em implementá-la. O Dr. Carlos Lessa disse isso aqui.

Concretamente, depois dessa decisão geopolítica, ainda não houve nada a se

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apresentar. Não se falou: “Fizemos isso e aquilo com a Argentina, ou com a Bolívia,

ou com a Venezuela, ou com quem quer que fosse”.

Isso significa que há certa capacitação ou disponibilidade do banco, que não

está sendo utilizada por causa do andamento, porque evidentemente esse

financiamento não depende apenas do BNDES. Ele depende de uma série de

contatos e relações. O processo todo é muito mais complexo.

Isso me remete exatamente à primeira parte da exposição do Dr. Carlos

Lessa. Deve haver — segundo mais uma notícia de jornal — um volume de recursos

no BNDES. E, pelo andar da carruagem, parece que se chegará ao fim do ano com

dinheiro em caixa, por uma série de razões, algumas das quais estão claras nessa

decisão geopolítica, em função desses países. Outras, provavelmente, em função de

situações reais do País. O País tem um quadro econômico de estagnação muito

grande. Certamente a demanda das empresas deve ser bem menor do que foi

historicamente nos últimos anos, e essa demanda, portanto, não existe ou é bem

menor. E mesmo não havendo demanda, o banco tem seus cuidados, tem que ter

sua segurança. A informação é que sobrarão recursos no final do ano no orçamento

do BNDES.

Aí vem a questão da EMBRAER. Pelo contrário, a EMBRAER é um grande

projeto vitorioso. Se há privatização que teve seus resultados positivos, a EMBRAER

é um exemplo que não se discute. Nunca ouvi nenhum discurso aqui, nem dos mais

radicais petistas antiprivatizações, contra a privatização da EMBRAER. Fizeram na

época da privatização, depois nunca mais. Não se ouviu mais, é claro.

A EMBRAER é um projeto de sucesso do ponto de vista econômico e também

tecnológico. Do ponto de vista econômico, ela promove o aumento da renda

nacional, o aumento da renda líquida de recursos — se não me engano, 1,5 bilhão

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de dólares — e gera empregos de forma expressiva. Acho que se fala em 150 mil

empregos em toda a cadeia.

É um sucesso do ponto tecnológico e do ponto de vista da engenharia.

(Não identificado) - Cento e cinqüenta mil, Deputado, é uma loucura.

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - Alguns exageros prováveis.

(Não identificado) - Isso é uma loucura. Eu garanto.

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - Alguns exageros prováveis.

Todas as informações que tenho aqui são...

(Não identificado) - Se forem 15 mil a gente já pode soltar foguete, mas,

enfim, não é esse o problema.

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - Mas é uma cadeia bastante

extensa. Devem até levar em conta o que aquilo produz de compra no

supermercado.

(Não identificado) - Ah, sim.

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - A cadeia toda.

(Não identificado) - Onze mil.

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - Onze mil empregos diretos.

Então, a cadeia é bem mais do que 15 mil, sem dúvida. Enfim, é um volume, de

qualquer jeito, importante.

(Não identificado) - Claro.

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - Do ponto de vista tecnológico e

do avanço da engenharia nacional nessa área é inconteste, dada sua capacidade de

oferecer ao mundo produtos de alta tecnologia e sua capacidade gerencial também.

É muito importante mostrar isso. É a própria imagem do Brasil no exterior.

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Não deve haver muitos produtos do Brasil no exterior. Uns querem vender o

carnaval como produto. Isso não é produto coisa nenhuma. É apenas uma

demonstração histórica. Mas no caso específico, os aviões da indústria aeronáutica

são fundamentais para a imagem do Brasil.

Existe um quadro de competição internacional. O Prof. Lessa nos mostrou

apenas 4 empresas: a Bombardier, do Canadá; a Airbus, da França; a Boeing, dos

Estados Unidos; e a EMBRAER. E todas elas, pelas informações que temos, têm

financiamentos nos seus países. A Bombardier é um caso que conhecemos muito

bem. Chegamos a ir à Organização Mundial do Comércio por causa disso. E não há

como essas empresas competirem em um mercado que hoje ainda é muito

competitivo sem financiamentos a longo prazo.

Reconhecemos, pelos dados trazidos pelo Prof. Lessa, o volume de recursos

que o BNDES despendeu — a chamada exposição do portifólio do BNDES em

relação à empresa. Portanto, existem riscos. O risco sempre existe. Não há nenhum

órgão público de financiamento que não tenha riscos. O Banco do Brasil é um dos

que costuma emprestar e não recebe. Depois se faz a rolagem da dívida.

Mas no caso específico do BNDES, parece-me que todos os empréstimos

feitos na área da indústria aeronáutica não são característicos de inadimplência. Ao

contrário, são empréstimos que vêm sendo...

O SR. CARLOS LESSA - Por favor, Deputado, bata na madeira, porque se

houver uma crise na aviação norte-americana o BNDES converte-se na Hertz

internacional de avião. É tão grande a frota dada hoje em garantia ao BNDES que

ela nos sufoca.

Posso aduzir uma informação?

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - Claro.

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O SR. CARLOS LESSA - O banco, quando financia um avião, o faz para uma

sociedade de propósito específico, que arrenda esse avião a um operador. Essas

sociedades de propósito específico têm conosco um contrato cruzado pelo qual a

EMBRAER assume uma dupla responsabilidade, que é a seguinte: se elas pararem

de nos pagar, a EMBRAER tem que pagar o que chamamos de primeiras perdas.

Num segundo momento, a EMBRAER é obrigada a vender esse avião a um outro

comprador, antes de um novo avião.

No momento, por conta da crise da aviação brasileira, estamos recuperando

22 aviões da EMBRAER.

(Não identificado) - Brasileiros?

O SR. CARLOS LESSA - Brasileiros, mas que tinham sido, por razões fiscais

— eu não saberia esclarecer —, operados pelas subsidiárias da VARIG, a Nordeste

e a RioSul, e as 2 o fizeram como se tivessem importado do exterior esses aviões.

(Intervenções simultâneas ininteligíveis.)

O SR. CARLOS LESSA - Não, tem Brasília e tem EMBRAER. Tem 145, tem

os 2 tipos de aviões, o grandão e o menor.

Vamos procuram encontrar uma colocação para esses aviões rapidamente.

Se não encontrarmos uma colocação, teremos que obrigar a EMBRAER a entregar

esses aviões antes de entregar filas de novos aviões, o que, do ponto de vista da

EMBRAER, é algo muito ruim, porque prejudica o fluxo de vendas que ela tem.

Ainda bem — deixem-me novamente bater na mesa — que a aviação regional

escapou das emanações do 11 de setembro; ela não foi afetada por isso, como foi a

aviação internacional. V.Exa. sabe que houve uma contração imensa de passageiros

nos vôos internacionais. Agora começa a haver uma leve recuperação, mas a

aviação nacional escapou disso. Como os aviões da EMBRAER são tipicamente de

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aviação regional, houve uma manutenção da taxa de utilização desses aviões.

Porém, como as aviações regionais estavam ligadas às empresas de bandeira

internacional, houve certa contaminação. Isso aconteceu com a American Eagle.

Para mim, isso é um pesadelo, porque se acontecer uma coisa com uma dessas

companhias ficamos numa situação realmente muito complicada.

Estou tentando dar certas informações para dizer o seguinte: o apoio do

BNDES à EMBRAER é de tal importância que faço minha a preocupação com esses

22 aviões da RioSul e da Nordeste. Vamos tentar encontrar uma solução que não

pressione a EMBRAER, porque contratualmente posso pedir as primeiras perdas e

pedir o ressarcimento na fila de vendas, mas, fazendo isso, prejudico a política de

vendas da companhia.

A idéia do casamento indissolúvel, Deputado, é rigorosamente esta: o destino

do BNDES está ligado à EMBRAER, e a EMBRAER está ligada ao BNDES. Mas o

BNDES não pode ser o banco da EMBRAER, tem que ser o banco geral do Brasil.

Uma vez e meia de exposição do patrimônio líquido do banco é muita exposição. É

só isso.

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - A preocupação é evidentemente

válida, mas também é conseqüência de uma realidade brasileira em que uma

empresa conseguiu dar um passo, enquanto a grande maioria das empresas

brasileiras não sai do discurso.

O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - Sra. Presidenta Zulaiê Cobra, peço

a palavra pela ordem.

Quero sugerir ao Dr. Carlos Lessa, ao Deputado Alberto Goldman e a V.Exa.

que, tendo em vista que a sessão está em andamento e estamos entre votações —

e gostaria muito de participar dos debates e sei que outros colegas também —,

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fizéssemos como de praxe: a intervenção do proponente seguida da resposta do

convidado; depois, falamos e ele responde. Essa é minha sugestão.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Deputado Paulo Delgado,

faria isso normalmente, mas o Presidente do BNDES é um homem ótimo. Nunca vi

nesta Comissão um expositor com uma capacidade tão grande falar. Ele quer

explicar. Ele até nem deixa o Deputado terminar e já está explicando. Então, vamos

tentar acatar sua sugestão, se for possível, porque quem manda aqui é ele, não sou

eu. Ele veio até aqui na condição de convidado, Deputado Paulo Delgado, e é um

homem extremamente ocupado. Conseguimos uma pauta para hoje às 16h num

horário horrível para todos os Deputados.

O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - Esta sessão não poderia estar

acontecendo, Sra. Presidenta. V.Exa. sabe disso.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Eu sei, mas está

acontecendo e vai continuar a acontecer. Portanto, nosso expositor vai falar, sim. E

se ele quiser interromper, vai interromper.

Com a palavra novamente ao Deputado Alberto Goldman. E V.Exa., com sua

personalidade, seu caráter, sua capacidade, seu jeito brilhante de que tanto gosto,

por favor ouça um pouco só o Deputado e depois fale. (Risos.)

O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - Então, peço ao Deputado Alberto

Goldman que me deixe falar depois.

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - Já estava encerrando.

Quero cumprimentar o Prof. Carlos Lessa, porque isso mostra seu

envolvimento emocional com a questão, não é apenas algo formal. Ele não é apenas

formal, ele está emocionalmente envolvido e interessado. Isso é muito bom. Tomara

todos fossem assim. Vamos deixar o funcionamento formalmente como deve.

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Não tenho muita coisa mais a dizer. Tivemos o exemplo de grandes

financiamentos no setor elétrico, e sabemos que os resultados não foram positivos.

Por outro lado, tivemos alguns episódios muito graves há 2 ou 3 anos, como a

montagem do modelo, o apagão e a diminuição da venda do produto que é energia

elétrica, o que ocasionou problemas internacionais também. Algumas dessas

empresas tiveram não só problemas dentro do Brasil, mas internacionalmente.

De qualquer forma, estamos numa situação em que temos um tomador de

recursos até hoje absolutamente correto, com uma capacidade demonstrada em

todos os sentidos. Acho correto evidentemente que um presidente de um banco

tome todo cuidado com a forma pela qual busca preservar e assegurar seu banco,

mas corremos também, do nosso lado, o perigo de perdermos essa corrida. Na

medida em que perdermos o passo, não alcançaremos mais. Na disputa com a

Bombardier e com as outras empresas, se perder o passo...

O SR. CARLOS LESSA - Quero dizer uma coisa muito importante. O êxito da

EMBRAER é simétrico ao êxito da Bombardier no caso canadense. A Bombardier

cria para o Governo canadense problemas equivalentes aos que temos hoje. Uma

coisa muito interessante para o futuro seria a EMBRAER e a Bombardier voarem

juntas. Aliás, isso já começou, porque há uma grande concorrência de 300 aviões da

US Airways em que metade vai ser EMBRAER metade vai ser Bombardier.

Vamos dizer que haja uma crescente harmonia entre as políticas empresariais

canadense e brasileira. A questão é tão importante para nós e para o Canadá que

há uma evolução nesse sentido.

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - De qualquer forma, temos esse

contrato com o JetBlues, se não me engano. Há uma necessidade de financiamento.

O meu receio é que percamos o passo e não alcancemos mais, caiamos fora do

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mercado internacional. É um risco, mas o banco tem que assumir e buscar todas as

garantias possíveis. O que precisamos é resolver o problema exatamente juntando

essa questão. O BNDES tem recursos numa economia que está estagnada e não

consegue sequer aproveitar bem esses recursos e, do outro lado, tem uma demanda

de recursos.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Agora, o senhor pode

responder à vontade.

O SR. CARLOS LESSA - Só quero primeiramente, Deputado, chamar sua a

atenção para o seguinte. Como brasileiro, de longa data acompanho a trajetória da

EMBRAER, porque sou de uma geração que viu o Governo brasileiro construir uma

base tecnológica e educacional em São José dos Campos, que posteriormente

evoluiu para um conjunto de empresas de onde sai esse resultado, que é

rigorosamente o resultado da criatividade dos brasileiros e do apoio do Governo

brasileiro.

A história da EMBRAER tem a assinatura do BNDES o tempo todo. Até o

protótipo do seu maior produto, que é o 145, foi bancado pelo BNDES. Então,

quando usei a imagem do velho casamento, foi para dizer que é um casamento

testado. Pode ter um ou outro chega-pra-lá ou chega-pra-cá, mas vamos continuar

juntos, não tenha essa preocupação.

Talvez V.Exa. esteja sendo um pouco injusto com outras empresas

brasileiras. Vou citar algumas: a Marcopolo é uma glória para o País. Hoje a

Marcopolo opera em 32 países no mundo, montando ônibus. Aliás, é uma

especialidade brasileira, porque não é só a Marcopolo que faz isso. Há pelo menos 2

outras empresas no País que têm desempenho brilhante. Uma delas é a Buscar

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Ônibus S.A, de Joinville. E temos de escorá-las também nas suas operações de

exportação e de robustecimento.

Para o senhor ter idéia, a EMBRAER está com uma planta na China,

montando aviões lá. A Marcopolo também está com uma empresa na China,

montando ônibus Marcopolo.

Para mim foi uma surpresa o fato de que o Brasil exportou 900 mil

motocicletas no ano passado. É uma loucura esse número. São motocicletas

brasileiras que começam a ocupar um espaço que no passado eram ocupados pelas

motocicletas produzidas no Japão.

E agora vou lhe passar mais um outro dado para o senhor ficar satisfeito: o

Modernfrota, que considero o maior êxito do Governo Fernando Henrique Cardoso

— embora eu tenha sido um crítico do Governo, o Modernfrota é um sucesso

inquestionável —, tem um subproduto muito curioso: a indústria de máquinas e

equipamentos agrícolas. A partir da demanda firme do Modernfrota, ganhou-se tal

densidade que hoje somos exportadores bem-sucedidos de máquinas e

equipamentos agrícolas.

Estou financiando pesadamente embarcações off-shore. São embarcações de

alta especialização que atendem campos e plataformas de petróleo. Neste ano já

aprovamos 12 embarcações desse tipo. Cada uma delas é um pouco mais cara que

um avião a jato: 30 milhões de dólares. E com essas embarcações dominaremos o

mercado mundial de off-shore, porque a PETROBRAS não é líder apenas em

matéria de petróleo em águas profundas — e cada vez o mundo investe mais nisso.

Ao mesmo tempo, se fizermos os últimos navios off-shore, faremos os melhores do

mundo. São indústrias do learning by doing, que sempre ganham enorme

capacidade de competição tendo feito a penúltima unidade.

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Estou começando a construir, por indução: em tudo que se refere à

montagem mecânica o Brasil é muito bom, porque nossa mão-de-obra é excelente e

barata em relação à mão-de-obra com o mesmo treinamento em outras sociedades.

Então, se conseguirmos ajustar, vamos começar a ser importantes exportadores de

aviões a jato, máquinas agrícolas, embarcações especializadas, eventualmente até

de plataformas, mais à frente, talvez, porque no momento está difícil.

Tudo isso passará por estruturas de financiamento robustecidas. O senhor

sabe que o maior problema é que o Brasil não tem crédito. A verdade é essa. A

relação crédito/PIB no Brasil não chega a 28% do PIB. Para os senhor ter idéia de

como esse valor é pequeno, no Chile é de 60% a 70%; nos Estados Unidos, 110%.

É um milagre as empresas se moverem no Brasil com crédito tão rarefeito. Aí o

BNDES fica numa evidência enorme, porque acaba sendo a única fonte de

financiamento a longo prazo.

Mas digo aos senhores o seguinte: não temos ainda uma previsão segura do

que irá acontecer este ano com nossos recursos. Apesar disso, já estamos

aprovando operações de 1 bilhão de dólares com a EMBRAER e já estamos pré-

pactuados para outro bilhão de dólares no próximo ano, o que faz da EMBRAER o

nosso maior cliente — e continua sendo o maior cliente. O problema é ela não

passar de 1 bilhão para 2 bilhões, porque, de repente, eu bato no meu limite. Aliás,

para a própria EMBRAER é preferível que o BNDES seja seu parceiro mesmo que

financie parcela menor do conjunto das suas necessidades — mas que seja firme

nessa participação.

Quero tranqüilizá-lo, dizendo quase de maneira jocosa e coloquial o seguinte:

o matrimônio é sólido, até porque tem bens comuns, e já tem muitos anos de

convivência, é um casamentão.

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O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - É que eles estão querendo beijar

e o senhor não está querendo.

O SR. CARLOS LESSA - Mas aí é a tal história: o senhor precisa observar

mais os velhos casamento.

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - É momentâneo. Eu entendo.

O SR. CARLOS LESSA - Desculpem-me ter gasto tanto tempo, mas apenas

queria dizer que a questão geopolítica é muito importante, porque o Brasil não

pretende ser líder, mas ter um espaço em que nos harmonizemos com os outros

vizinhos. Todos os partos desse tipo de projeto são de elefante: são sempre muito

trabalhosos.

Há pouco menos de 2 semanas tivemos a alegria de liberar o financiamento

para 4 petroleiros. O senhor sabe quanto tempo levou essa operação para ser

aprovada? Dois anos e meio.

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - Imaginem a operação que foi o

financiamento do gás da Bolívia. Fiz uma tese sobre esse assunto quando era

estudante de Engenharia na Escola Politécnica.

O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - Sra. Presidenta Zulaiê Cobra, assim

não é possível. A sessão está acontecendo, ela foi suspensa por 10 minutos.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - (Ininteligível.)

O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - Sra. Presidenta, estou falando em

termos regimentais. A única coisa que nos protege é o Regimento, porque somos

todos iguais e igualmente prestigiados.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Não sei por que o senhor,

Deputado Paulo Delgado, está tão preocupado.

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O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - É que a sessão está correndo e eu

não posso deixar de votar.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Mas vamos ficar até às 19h.

Já foi combinado. Precisamos aproveitar, já que o expositor é muito bom.

O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - Mas, Deputada, eu gostaria que

V.Exa. seguisse o Regimento da Comissão.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Hoje, o Regimento quebrou.

A presença do Presidente do BNDES...

O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - Ah, então V.Exa. deveria ter falado

que não tem Regimento.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - V.Exa. não está gostando?

O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - Estou gostando.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - V.Exa. vai ser chamado

logo em seguida.

V.Sa. já terminou a resposta? Satisfeito, Deputado Alberto Goldman? Posso

continuar?

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - Pois não.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Com a palavra o Deputado

João Almeida.

O SR. DEPUTADO JOÃO ALMEIDA - Sra. Presidenta, companheiros, Sr.

Presidente do BNDES, Carlos Lessa, é uma alegria revê-lo aqui. Lembro-me muito

das nossas tertúlias baianas.

Sra. Presidenta, nós nos movimentamos nesta Casa também nos baseando

nas notícias dos jornais. Eu vim porque li nos jornais — e o Deputado Alberto

Goldman fez o convite através da Comissão — notícias no sentido de que

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estávamos construindo um ambiente para o novo Bolívar na integração sul-

americana. E os projetos ali colocados eram desafiadores, inclusive o da floresta

amazônica, que já conhecemos. Como diriam os portugueses, literalmente comer

uma estrada. Mas agora vejo que é diferente disso.

Primeiro, diz V.Exa. que esse é um programa já definido em 2000, dos 10

eixos de integração. E V.Exa. citou 2 exemplos que nos parecem bastante

razoáveis, factíveis, que se podem perseguir. Então, desfaz-se toda aquela auréola

mística de que poderia ser pago com o Erário e não com recursos privados para

alguma promoção pessoal, ou o que fosse. Não é isso. É um programa que tem

densidade, responsabilidade e antecedentes e que resulta desse amadurecimento.

Fiquei também impressionado — e agora V.Exa. já me tirou essa dúvida —

em relação à Modernfrota, programa interessantíssimo. Represento uma área

agrícola da Bahia que está experimentando um desenvolvimento extraordinário.

O SR. CARLOS LESSA - Região de Barreiras.

O SR. DEPUTADO JOÃO ALMEIDA - É. E fiquei preocupado com

declarações de importantes membros do Governo de que esse programa será

suspenso, já que não tem sentido. O Presidente disse que pelo BNDES não passa

essa idéia. Isso já está bem esclarecido.

Eu fiquei preocupado porque entre aqueles projetos anunciados apareciam

megaprojetos de transposição de águas, de integração de bacias. E na própria

apresentação deles já vinha um questionamento de pessoas que outrora

participaram desse projeto mostrando sua inviabilidade, ou sua inoportunidade

diante de todos os problemas que temos de enfrentar. E o Presidente citou soluções

mais viáveis agora.

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Solicito a V.Sa., Presidente, que se esses aviões sobrarem, mande-os de

volta à Bahia. Dois deles serviriam para a integração da Bahia. A Nordeste Linhas

Aéreas foi integrada pela VARIG. Carecemos disso lá, está nos fazendo muita falta.

Muito obrigado.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Se V.Sa. quiser responder,

pode fazê-lo.

O SR. CARLOS LESSA - A preocupação com a integração territorial

brasileira é legítima, porque houve grande redução de aeroportos interligados. Se

não me engano, hoje são 112 aeroportos que estão com freqüências regulares, e já

houve tempo em que eram 180 aeroportos. É necessário fazer renascer a aviação

regional.

Aproveito a intervenção de V.Exa. para dizer o seguinte: agora que

acompanho de perto o que está acontecendo com determinados projetos e

programas, muitas vezes vejo na mídia uma informação de natureza especulativa,

coletada sem verificação das fontes e que, muitas vezes, é inteiramente fantasiosa.

Vou citar um exemplo: se eu considerasse o que disseram na mídia — tenho

um fantástico serviço de leitura diária — que vou fazer com a VARIG e com a TAM,

eu estaria correndo, porque já disseram que eu vou botar 400 milhões, 600 milhões

de dólares e até 1 bilhão e 200 milhões de dólares. Não entrou sequer um pleito

nesse sentido dentro do BNDES.

Então, consigo compreender perfeitamente que o leitor interessado em

determinados temas fique preocupado com certas emanações ou derivações. Por

isso, todas as vezes que o Congresso Nacional chamar o BNDES, ele tem de vir

para esclarecer determinados fatos. Podemos até apresentar o contraditório, mas é

extremamente importante que haja a máxima precisão quanto à informação. Isso é

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uma obrigação do dirigente de um órgão público para com os representantes do

povo brasileiro nas Casas do Congresso.

Os recursos do BNDES têm distintas procedências. Os recursos do Fundo de

Amparo ao Trabalhador — FAT têm vinculações extremamente reguladas por

legislação. Nunca poderíamos utilizar recursos do FAT para, por exemplo, apoiar

exportações argentinas para o Brasil, mesmo que fosse de alto interesse de

importadores brasileiros e que correspondesse ao interesse geopolítico brasileiro de

restaurar as relações havidas com o MERCOSUL. Porém, o BNDES capta recursos

em fontes internacionais, sobre os quais temos muito mais flexibilidade.

Quero, então, tranqüilizá-los, dizendo que pretendemos fazer parte dessas

operações com recursos de outras moedas disponíveis, mas que não se prestam

para determinadas operações e podem se prestar para outras. É uma tecnicidade,

mas eu queria que ficasse clara.

Outra coisa que eu quero dizer ao senhor é o seguinte: não sei de onde o

senhor colheu a idéia de o Modernfrota ser...

(Intervenção inaudível.)

O SR. CARLOS LESSA - Pois é. Eu não consigo compreender isso pelo

seguinte: o BNDES é o agente do Modernfrota há muitos anos, desde seu

nascedouro. É um programa extremamente bem-sucedido, a produção de grãos

cresceu 33% em 2 anos e meio, o que é algo espetacular.

Depois dos anos 90, quase não cresceu. Mato Grosso está virando a terra da

promissão. Na região de Barreiras, na Bahia, há prosperidade espetacular, até

mesmo em um pedaço do Piauí e do Maranhão a soja tem desenvolvimento

extremamente importante. Estamos interessadíssimos em ver surgir nessa região

empresas que prensem óleo.

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A infra-estrutura dessa região do Maranhão e do Piauí vai ter de ser

fortalecida agora, porque não é possível ficar transportando soja por centenas de

quilômetros por estradas vicinais, pois assim arrebentam-se as estradas, o caminhão

e desaparece a vantagem do produtor de soja.

Enfim, é uma coisa maravilhosa o que está acontecendo, e as máquinas

agrícolas foram fundamentais nessa hora.

Para o senhor ter idéia — eu não sabia, mas vou passar a informação —, há

uma máquina de colheitadeira que reduz as perdas a 1%. O horizonte de perdas,

antes, era de 11%. Então, o simples fato de trocar a máquina eleva em 10% a

produção de grãos sem se plantar um pé novo. Reduz-se a comida dos passarinhos,

mas se dá um salto espetacular à frente.

Desde o primeiro momento, no ano passado, houve uma interrupção do

Modernfrota, porque foi esgotada a linha. Mas como o BNDES, por intermédio do

FINAME, financia máquinas agrícolas, no primeiro semestre do ano seguimos os

financiamentos usando linhas FINAME. E agora retomamos o refinanciamento com

o novo Modernfrota aprovado. A taxa de juros subiu um pouco, mas continua com

características confortáveis.

Há um problema: a liberação dos recursos tem de estar associada à safra

agrícola. No cronograma aprovado, estamos voltando a discutir isso, porque é

preciso antecipar.

Sabem qual é o problema? Todos os outros fabricantes de máquinas e

equipamentos do Brasil agora querem o Modernfrota, porque a taxa de juros é

prefixada e há uma prestação definida. Então, é óbvio que, para um caminheiro e

para um comprador de embarcação de pesca, isso é o ideal. Todos querem isso. É

tão bom que agora querem também para armazéns, etc. A massa de recursos tem

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também suas limitações, e o banco só pode fazer isso se o Tesouro bancar a

equalização. E o Tesouro fica com limitações. Enfim, é um sucesso. Fique tranqüilo.

Transposição de águas. Em parte, sou culpado por essa discussão. Não há

nenhum projeto amadurecido de transposição nem há uma definição inequívoca de

que ela será feita, mas acredito que nada vale a pena se a alma não for pequena e

que os primeiros passos começam com discussões.

O Nordeste semi-árido tem a maior concentração de pobreza do Brasil, mas

tem solos que, para uma agricultura irrigada, pode ter desempenho absolutamente

espetacular, porém a água precisa ser transposta. O problema é que o Rio São

Francisco precisa, por sua vez, receber água adicional, e os estudos preliminares de

engenharia da transposição de águas do Rio São Francisco para a da Bacia já foram

feitos. No entanto, não foram feitos estudos sobre o impacto no meio ambiente

quando da transposição do Tocantins para o São Francisco.

Esse é, então, um sonho para daqui a 10 anos. Mas a discussão deve ir se

perfilando desde agora. Afinal de contas, José Bonifácio de Andrada e Silva já

localizava a Capital no interior do Brasil. Floriano fez da transposição da Capital do

Brasil o art. 4 da primeira Constituição Republicana, e só em 1960 foi construída

Brasília.

O que quero dizer com isso é o seguinte: a idéia da transposição é de mil

oitocentos e setenta e poucos, de um engenheiro do qual não me lembro o nome

agora.

(Não identificado) - Henrique Alfred, de Juiz de Fora.

O SR. CARLOS LESSA - Isso. O senhor se lembrou. Eu não me lembrava.

Muito obrigado. Eu e você gostamos muito de Juiz de Fora. Em tempo: sou cidadão

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honorário de Juiz de Fora, sabiam? Eu só tenho um problema com aquela cidade:

eu queria anexá-la ao Estado do Rio de Janeiro.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - O senhor parou quando

falava de Euclides da Cunha.

O SR. CARLOS LESSA - Euclides da Cunha fez um relatório inteiro propondo

a transposição. E aquela idéia de o sertão virar mar aparece já nesse relatório. É um

dos sonhos brasileiros. Agora, concordem: quando o Grand Canyon apenas cortava

um deserto, ninguém imaginava que a represa Grand Colee ia dar origem ao Vale

Imperial, cuja agricultura é da mais alta sofisticação no mundo em terras de deserto.

E se utiliza de águas do Grand Canyon.

Na condição de brasileiro, gosto de sonhar que este País é imenso, que

vamos fazer coisas de espantar. Não gosto de pensar o Brasil com taxas medíocres

de crescimento. Sou daquela geração que acredita que o Brasil tem futuro e que é o

País do futuro. Então, quero pensar que no Nordeste semi-árido vai surgir uma

agricultura hipersofisticada.

O SR. DEPUTADO JOÃO ALMEIDA - V.Exa. fala de um modo que eu, como

nordestino, seria execrado.

O SR. CARLOS LESSA - Por quê?

O SR. DEPUTADO JOÃO ALMEIDA - Acompanho todas essas coisas de

longo tempo e sou favorável a todos esses sonhos. Porém conheço soluções mais

viáveis e de curto prazo para o abastecimento de água para uso humano e animal

no Nordeste.

O SR. CARLOS LESSA - Eu sei disso.

O SR. DEPUTADO JOÃO ALMEIDA - Há a discussão sobre o transporte de

água pelo Rio do Sonho, Rio Preto.

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O SR. CARLOS LESSA - Mas o projeto de engenharia do Rio Sonho nunca

foi estudado, infelizmente. Não se tem nem sequer foto aérea confiável. Ainda está

muito verde. O que não está verde é a outra idéia que o senhor levantou: a

perfuração de poços em cima dos aqüíferos profundos do Nordeste. Alguns são

espetaculares. No Piauí, há um magnífico. Só que são poços muito caros.

Houve, no passado, uma experiência no Brasil de uma empresa de

perfuração, que, infelizmente, não... Estou preocupado com uma porção de coisas.

A Bahia tem uma faixa muito grande que precisa ser irrigada também. Vamos ter de

trabalhar isso com estratégias múltiplas. O que posso dizer? Faz parte dos meus

defeitos gostar de sonhar. Estou dizendo isso com toda honestidade possível. Eu é

que estou forçando um pouco a discussão em torno disso.

Algumas pessoas discordam de mim, mas gosto disso, porque, quando uma

discussão gera controvérsia, constrói-se melhor a argumentação. É uma tertúlia

tecnológica para avançarmos.

(Intervenção inaudível.)

O SR. CARLOS LESSA - O Paulo é amigo meu de Juiz de Fora. Ele é meu

amigo de longa data. Não pode ficar zangado.

O SR. DEPUTADO JOÃO ALMEIDA - Se ele não ficar zangado comigo, direi

mais uma coisa aqui. (Risos.)

O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - Deputado João Almeida; sou da

bancada do Governo. Está havendo votação, não posso perdê-la. Só posso sair no

cartaz 2 vezes: uma votando com o Governo e outra não votando com o Governo.

O SR. DEPUTADO JOÃO ALMEIDA - Sra. Presidenta, é só para dizer 2

coisas.

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O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - Aqui predomina o Governo anterior.

Estão prolongando a reunião para não votarmos. É brincadeira, retiro. (Risos.)

(Não identificado) - Vai ficar provado que a agenda deste Governo é a

agenda que nós esquecemos na gaveta.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Quanto mais discutimos

outras coisas, não discutimos o que é importante. Continue.

O SR. DEPUTADO JOÃO ALMEIDA - Gostaria de dizer ao Presidente que

reserve um momento na sua agenda. Tenho uma idéia sobre o aproveitamento

desses aqüíferos nordestinos. Trabalhei 5 anos perfurando poços.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Vamos marcar uma

audiência.

(Não identificado) - Não parece, mas ele é geólogo.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Tem a palavra o Sr.

Deputado Paulo Delgado.

O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - Sra. Presidenta, Deputada Zulaiê

Cobra, Dr. Carlos Lessa, colegas, gostaria que V.Exas. relevassem a minha

preocupação regimental, que é rigorosamente pelo fato de que a sessão está em

andamento. Agora ela foi suspensa. Deus, na sua sabedoria, aumentou a dúvida do

Plenário e me tranqüilizou um pouco.

Sr. Presidente Carlos Lessa, cumprimento-o pela maneira ampla, informada e

circunstanciada com que enfrenta todos os temas. Cumprimento também o colega

Alberto Goldman, autor do requerimento, pela importância desta audiência.

Em relação à questão da América Latina, tema principal desta audiência, tive

a felicidade de acompanhar tanto o Presidente Fernando Henrique Cardoso quanto

o Presidente Lula em reuniões do Grupo do Rio. Nessa reunião multilateral de

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Presidentes latino-americanos há mais de 10 anos fala-se da integração física da

América Latina. A idéia de política de integração por eixos estruturantes é a única

forma que temos de conseguir realizar um dos sonhos de Bolívar, a comunidade

Latino Americana de Nações, a idéia da estrada que sai do Acre e que poderá

chegar até o Equador. São várias possibilidades.

Fico muito feliz ao ver o Presidente do BNDES e gostaria de saber da

possibilidade de ampliar a aliança do BNDES que saiu, na última reunião em Cusco,

do Grupo do Rio, e de se criar um banco latino- americano com capital latino-

americano, onde se pudesse ampliar esse financiamento para programas

estruturantes.

Nós, da Comissão, a pedido da Sra. Presidenta Zulaiê Cobra, aprovamos há

menos de uma semana a abolição de visto para o México, permitindo que o livre

trânsito nas fronteiras compense o bloqueio da fronteira norte do México, a fronteira

americana, e amplie não só o turismo, mas também o comércio e negócios.

Então, há um sentimento de integração que, quando traduzido

monetariamente, traduzido por financiamento, é muito positivo. Sei das ações do

nosso Governo na América Latina para resolver problemas de empresas brasileiras,

tanto no Uruguai quanto em outros países, de modo a evitar que haja qualquer tipo

de rompimento de soluções de investimento, trabalhistas, políticas, de preservação

ecológica. Há uma realidade latino-americana, e nosso Governo lhe vem dando

tratamento exemplar. Ela não foi criada por nosso Governo, mas é a continuidade da

política externa brasileira e vem sendo afirmada de maneira extremamente positiva

por ele. E não se trata apenas de exigência do Grupo do Rio, mas também do

Tratado de Assunção e do Tratado de Ouro Preto, que criaram a idéia da

comunidade sul-americana, do MERCOSUL, que se está ampliando para os Andes.

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Então, minha questão quanto ao primeiro tema seria relativa à possibilidade

de criação de um banco latino-americano, pedido feito, à época, ao Presidente Lula,

que, como o Presidente do maior País do Grupo do Rio, foi o mais abordado por

todos os Presidentes sobre tal possibilidade, da qual a CAF, o BNDES e outros

organismos, inclusive o próprio BID, talvez pudessem participar.

Minha segunda questão diz respeito à EMBRAER. Aproveitando a imagem

matrimonial empregada por V.Exa, afirmo que acompanhamos com muito interesse

tal matrimônio, a ponto de nos metermos na vida do casal.

Aqui não há oposição à política brasileira em relação à EMBRAER. Pelo

contrário. V.Exa. fala muito em diminuir a exposição futura. O futuro, no Brasil, é

sempre tratado com temor. Não consigo entender essa idéia de futuro como um

lugar a se temer — futuro é lugar de descanso, de tranqüilidade. Temos de começar

a trabalhar com o futuro de maneira tão racional no presente que essa realidade se

afirme. E V.Exa. está diante de um desafio. É bom que não haja aqui oposição a

essa política — os Deputados Antonio Carlos Pannunzio, Francisco Dornelles e

Alberto Goldman, entre outros, são grandes defensores dessa política.

A EMBRAER está muito além da curva de aprendizado na produção de

aeronaves econômicas. O grande problema hoje são aeronaves mais econômicas,

pois já alcançamos o nível tecnológico e temos padrão internacional de excelência.

O problema é que, com a quebra da Dornier, ocorrida no ano passado, abriu-se o

mercado de aviação regional para mais de mil aeronaves nos próximos 10 ou 15

anos em apenas algumas regiões do mundo: estou falando dos mercados indiano e

chinês. O Brasil deve sinalizar de maneira clara, desde já, que a EMBRAER não é

só a parceira prioritária do banco. O banco não pode ter receio de dizer que a

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EMBRAER é sua principal parceira. Pelo contrário, isso tem de ser tido, em Nova

York, pelo Banco.

Isso é como os negócios do café: não adianta dizer em Itajubá, no sul de

Minas ou entre os grandes plantadores. Tem de dizer na Bolsa de Café em Chicago,

nos Estados Unidos. Assim me disseram os plantadores de café.

São necessárias decisões de Governo na área, porque, se as posições da

EMBRAER oscilarem para baixo e para cima, isso terá implicações na Bolsa, por ser

empresa de perfil internacional. E isso é o melhor da globalização para o Brasil,

além de ter um sentido histórico e afetivo extremamente forte, sólido, que é o fato de

ser o País de Santos Dumont. Aqui nasceu o avião, aqui nasce uma aeronave

competitiva. Não temos condições de vacilar quanto a isso, porque, no momento, a

imprensa internacional vem informando regularmente que a Sukoy...

As empresas aeronáuticas russas, embora de grande vocação militar, têm

grande experiência aeronáutica pelas características da Rússia, semelhantes às do

Brasil, um país continental, etc. Há sucateamento, há parques industriais

subaproveitados, mas a Rússia se está aliando à Boeing e a consórcios europeus

para a produção de aviões regionais, tornando imediatamente cativo um mercado de

800 aviões. Não tenho dúvidas de que a Rússia fará isso, se o consórcio se

viabilizar.

Se, com a saída da Dornier do mercado, o Brasil, por meio do BNDES,

sinalizar agora que oferece o crédito, que assegura o aporte de que a EMBRAER

precisa no momento para dar o salto de exportação, confirmando as compras de

carteira que já tem e pelas quais tem de responder este ano, estou certo de que a

Boeing, que não rasga dinheiro, terá dúvidas quanto a se associar à Sukoy, já que

entraríamos antes no mercado asiático. E um projeto desses não leva menos de 3

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ou 4 anos. Se a associação entre Boeing e Sukoy se fizer este ano, o mercado de

2007 já não terá apenas 2 companhias competitivas de aviões regionais —

Bombardier e EMBRAER —, mas passará a ter uma terceira, forte: Boeing-Sukoy.

O lado do mundo que George Orwell chamava de Eurásia se constitui em um

mercado que, portanto, poderia ser ocupado de maneira preventiva pela ousadia do

BNDES. Creio que todos os outros casamentos da EMBRAER compreenderão que

a noiva predileta está necessitando de aporte maior para seu dote.

Presidente do BNDES, Carlos Lessa, entendo que esse mercado de 800

aeronaves nos próximos 5 anos — ou de mais de 2 mil aeronaves, porque, segundo

projeções existentes, esse mercado se esgota até 2022 — justifica que esta

Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional, intimamente ligada à

soberania nacional, se necessário for, aprove aumento de capital ou crie fórmula que

permita ao Governo brasileiro fazê-lo; afinal, estão em jogo o mercado internacional

e a principal imagem do Brasil no momento.

Portanto, não tenho dúvidas de que, na verdade, temos grandes expectativas

quanto ao trabalho de V.Sa. na direção do BNDES. Esta é a terceira ou quarta vez

que participo de reuniões de diferentes Comissões nesta Casa em que esse assunto

é tratado com V.Sa. e nunca o ouvi vacilar na defesa dessa parceria prioritária.

Então, a pergunta que faço é sobre a possibilidade de acordo entre Boeing-

Sukoy, ao qual temos de nos antecipar e o qual temos de desestimular. O Governo

brasileiro pode desestimular esse acordo ao sinalizar que as compras da EMBRAER

estão garantidas e que a empresa não perderá posição nos seus balanços — o que

pode ocorrer se houver dúvidas.

V.Sa. sabe que confiança é um cristal, e, nesse mercado, se o produto é de

leasing, vamos dizer assim, o produto principal sempre pertence ao país que o

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financiou: não há risco de perda, porque o tomador, na verdade, não leva o produto

que tiver sofrido algum tipo de acidente de percurso. E V.Sa. sabe mais do que

todos nós aqui que, embora o mercado regional seja crescente, seu horizonte vai até

2025.

Concordo com V.Sa. que a General Electric — GE poderia investir um pouco

mais na área, como V.Sa. vem insistindo muito.

Essas são as perguntas que faço.

Obrigado.

O SR. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - O nobre Deputado Paulo

Delgado foi brilhante em sua intervenção. Também aqui, e não só em plenário, a

discussão é muito importante.

Com a palavra o Sr. Presidente do BNDES.

O SR. CARLOS LESSA - Nobre Deputado Paulo Delgado, estejam V.Exa. e

todos os Parlamentares absolutamente certos de que nós, do BNDES, não nos

desligamos da preocupação maior de fortalecer a economia e as empresas

brasileiras e de que sabemos da imensa importância de o Brasil conquistar saldos

favoráveis no comércio exterior, preferencialmente com produtos de alta tecnologia.

Então, vou falar um pouco sobre a maneira como estamos pensando a

operação com a EMBRAER. Estamos pensando em 2 diretivas, que não se chocam

com o apoio que o BNDES dá à EMBRAER, mas viabilizam que esse apoio torne-se

mais sólido e consistente.

Em primeiro lugar, estamos interessadíssimos em aumentar o índice de

nacionalização das aeronaves, que é hoje da ordem de 50%. Esperamos elevar

esse índice de nacionalização para algo próximo a 65%, o que será factível com a

questão das turbinas: a Rolls-Royce já se está instalando no Brasil e sinaliza seu

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eventual interesse em vir a fabricar turbinas no País, o que é um elemento muito

importante na atração da General Electric para esse movimento.

Por outro lado, é preciso compreender o seguinte: a General Electric tem

muito interesse em conseguir a fidelidade da EMBRAER às suas turbinas, tanto que

ela financia, em parte, e, com muita freqüência, evolui agora para financiar aviões

completos, usando as lessons da própria GE e a grande financiadora de aviões da

General Electric.

Então, queremos maior comprometimento da General Electric com a

EMBRAER e queremos maior coeficiente de nacionalização das aeronaves. E a

razão é muito simples: a EMBRAER é uma empresa do tamanho do Brasil que, em

alguns momentos, torna-se ainda maior. Precisamos, portanto, adotar uma

estratégia desse tipo para evitar que chegue o problema a um ponto a partir do qual

não tenhamos como seguir em frente.

Quero, entretanto, deixar claro que nada será feito de modo a quebrar a

confiança, porque um produto desse tipo não é só, como disse V.Exa., um produto

de leasing, mas também um produto cuja manutenção das linhas de suprimento, de

reposição e de eventual recondicionamento é fundamental. É como se dá nas

fábricas de automóveis: quando se deixa de produzir determinada linha, o automóvel

de segunda mão sofre um rápido slow down . Com a aviação, isso é extremamente

importante, visto que, como é um bem financiado com longo período de

amortização, é muito importante que o comprador tenha a segurança de que o

fornecedor estará 5, 6, 8, 10 anos depois, pronto para aperfeiçoar e recondicionar

aquela aeronave, porque essa é a maneira pela qual ele tem segurança de que está

operando um patrimônio que não perde valor.

O BNDES é muito avarento em matéria de pessoal.

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(Não identificado) - V.Sa. falou em duas diretivas para a EMBRAER:

aumentar o índice de nacionalização e...

O SR. CARLOS LESSA - E conseguir outros parceiros que financiem aviões.

Confesso que o parceiro de meus sonhos é a General Electric. Na medida do

possível, o tempo todo procuro conversar com o Presidente da GE, que, por sinal, é

um brasileiro muito dinâmico e muito orgulhoso de dirigir um complexo de 12

fábricas. A General Electric tem grande presença no Brasil: são 12 empresas com

30 fábricas, algo impressionante.

Então, acho que a parceria com a General Electric vai ser muito boa. Mas

acho também que o Presidente da EMBRAER anda muito ansioso. Assim como

consigo compreender que ocupa a cadeira de Presidente da EMBRAER, S.Sa.

precisa entender que ocupo a cadeira de Presidente do BNDES, que é uma cadeira

elétrica: se não tomar cuidado, levo um choque. Deve também compreender S.Sa.

que paira sobre minha cabeça uma porção de outras coisas, não só aviões da

EMBRAER, mas também da VARIG e da TAM. E cito apenas os problemas de que

posso falar de público, que todos já conhecem; há ainda aqueles dos quais não

posso falar, por sigilo bancário.

O que quero dizer é que a EMBRAER ocupa espaço muito importante nas

nossas preocupações. Pelo menos um de nossos diretores já foi 3 ou 4 vezes ao

exterior apenas para discutir questões ligadas à empresa. Estamos muito

concentrados sobre o assunto. Mais 1 ano e poderei substituir o Presidente da

EMBRAER, se ele quiser me dar o emprego: acho que oferece salário maior e

menos dores de cabeça do que o meu.

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O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - V.Sa. pode impedir que a Boeing

invista na Rússia, se disser que vai confirmar toda a carteira da EMBRAER. E, para

tanto, V.Sa. tem o integral apoio desta Comissão.

O SR. CARLOS LESSA - Não há como fazer isso. Há sérios problemas

institucionais aos quais vou fazer referência.

Existe um desafio ligado ao Acordo de Basiléia, que estabelece limites para a

alavancagem de bancos, e já estamos perigosamente próximos dos limites. Além

disso, há também limites em nosso sistema de seguro de crédito de exportação.

Temos de renegociar isso, e é muito importante que a IBE se robusteça, porque isso

dá maior conforto a um banco como o nosso. Temos de estar todo o tempo de olho

nas regras da Organização Mundial do Comércio para evitar que se criem

vulnerabilidades.

Talvez o Tesouro queira nos ajudar um pouco com equalização. Sei que a

capitalização do BNDES virá, inexoravelmente.

O SR. DEPUTADO ANTONIO CARLOS PANNUNZIO - Sr. Presidente do

BNDES, permita-me interrompê-lo para dizer o que quer esta Comissão, que V.Sa.

tanto conseguiu empolgar.

Se o banco encontra dificuldades, e esta Comissão ou a Câmara dos

Deputados puder ajudá-lo de alguma forma, V.Sa. pode ter certeza de que o

faremos. Aqui não se trata de Oposição ou de Situação, a questão é o Brasil. Hoje, o

BNDES significa Brasil, a EMBRAER significa Brasil e talvez seja a maior marca

brasileira no exterior. As vendas que realizou recentemente e que já está produzindo

— ela gera 11 mil empregos diretos e não sei quantos milhares de indiretos —

significam aporte ou mobilização do seu capital de giro, da ordem de 1,5 bilhão de

dólares.

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Não sei se alguma outra empresa brasileira chegou a movimentar capital

próprio nessa proporção, num negócio dessa magnitude.

O SR. CARLOS LESSA - Para que V.Exa. tenha uma idéia, o montante que a

aviação comercial — leia-se EMBRAER — e todas as empresas movimentam,

através da EMBRAER, é de 5 bilhões e 681 milhões de dólares. São quase 6 bilhões

de dólares. No ano que vem, vamos chegar perto de 7 bilhões de dólares. Esse

assunto é muito sério.

Sabe o que registro deste encontro, fora encontrar velhos amigos como o

Deputado Francisco Dornelles? Nós fomos professores na mesma ocasião. Está

presente também o Deputado Paulo Delgado, cidadão daquela cidade tresmalhada

do Rio de Janeiro que é Juiz de Fora. Essa cidade deveria ser nossa.

O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - Seria a Avenida Brasil 3000.

O SR. CARLOS LESSA - É, isso aí. É carioca do brejo, não é? Está aqui

também o Dr. Neiva, que conheço há muito tempo.

Então, fora a satisfação de encontrar velhos amigos, outra coisa me deu

muita satisfação: saber que o BNDES poderá pedir o apoio de V.Exas. em ajustes

institucionais inexoravelmente necessários.

Quero felicitar o Deputado Paulo Delgado por ter dito que temos de pensar no

futuro sem medo. Gosto dessa idéia.

(Não identificado) - Para mostrar, de fato, que a esperança venceu o medo.

O SR. CARLOS LESSA - O meu primeiro ato como brasileiro de calça longa,

ou seja, como adulto, foi na campanha O Petróleo é Nosso, quando se argumentava

que o Brasil jamais poderia ter uma empresa de petróleo. Por quê? Porque não tinha

petróleo, não tinha dinheiro, não tinha mercado de capitais. Eu vi a PETROBRAS

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nascer e a vi fazer uma série de prodígios, inclusive se tornar líder mundial em

exploração em águas profundas.

Na qualidade de Reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, tive a

satisfação de ver 3 alunos nossos ganharem prêmio de off-shore em concurso

internacional, porque também temos tecnologia de ponta da melhor qualidade no

segmento petróleo. Vi isso acontecer com estes olhos. Vi Juscelino Kubitschek

começar a construir Brasília. Até duvidei, como carioca, que fosse possível construir

a grande cidade que vejo hoje, com 3 milhões de habitantes, além de mais de 30

cidades com 100 mil habitantes ou mais na Amazônia Meridional. A Setentrional

ainda está um pouco vazia. São exatamente essas 30 cidades que me demonstram

o efeito fantástico do sonho de uma pessoa que não tem medo.

Este Brasil é uma nova Roma. Apropriei-me da expressão de Darci Ribeiro,

um sonhador emérito, que dizia que esta era a Nova Roma não pelo que tinha de

imperial, mas por seus espaços abertos. É uma característica muito interessante do

Brasil. Estamos abertos a tudo e misturamos tudo.

Por isso, de certa maneira a globalização, que é um recurso expositivo e

idealizado, é experiência e prática nossa. Somos a única sociedade do mundo que

come sashimi com arroz e feijão. Nenhum povo do mundo faz isso. A grande força

da nossa cultura é saber fazer essas misturas.

E isso não é jogo de palavras. Basta ir à praça de alimentação de um

shopping center, ou melhor, de um centro comercial — e só pão de queijo resiste no

idioma de Camões; todo o resto se transformou — para ver as pessoas cometendo

atos canibais ao misturar as comidas mais espantosas no mesmo prato. É uma

espécie de oração cotidiana de brasilidade.

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Estou convencido de que somos o País do futuro. O meu medo é o presente.

Tenho uma confiança enorme no futuro. O meu pesadelo é o presente, que não me

deixa dormir em paz.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Sr. Carlos Lessa, vou

conceder a palavra rapidamente a outros oradores inscritos, Deputados Serafim

Venzon, Francisco Dornelles e Colombo. Peço a V.Sa. que seja breve. Prometi a

seu assessor que V.Sa. ficaria hoje somente até as 18h30min.

Portanto, rapidamente, concedo a palavra aos três Deputados.

O SR. DEPUTADO SERAFIM VENZON - Dr. Carlos Lessa, ao cumprimentá-

lo, quero cumprimentar todos os membros presentes nesta reunião. V.Sa é

fantástico pelo entusiasmo e pela forma como expõe seus conhecimentos. Isso nos

empolga a todos.

Observando todo o seu entusiasmo e o tamanho dos investimentos que o

Brasil e o BNDES fazem, observando também a necessidade de apoio que temos,

pergunto, primeiramente, qual é o limite, hoje, que o banco tem para apoiar

investimentos internos? Nós fazemos e exportamos aviões; é bom que se exportem.

Certamente, havendo maior apoio, poderemos fazer mais aviões. Se fazemos tantos

aviões, por que voamos em aviões importados, leasing da Boeing, por exemplo, ou

outra fábrica de aviões?

Quero chamar a atenção de V.Sa. para a integração com a América Latina.

No mês de julho, num fim de semana, fui a Santiago do Chile. Antes, aqui no Brasil,

procurei em diversas livrarias um livro de informações turísticas e dicas práticas, tipo

Quatro Rodas ou outros existentes sobre o México, os Estados Unidos e os países

da Europa. Parece-me que é o jornal Folha de S.Paulo imprime esse tipo de livro.

Não consegui encontrar nenhum exemplar sobre a América Latina, salvo do México.

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Na volta, tentei comprar nas livrarias do Aeroporto de Santiago algum livro

com informações sobre o Brasil, como se viesse passear aqui, mas também não

encontrei nada.

Às vezes, pensamos em grandes investimentos, que obviamente são

necessários, mas investimentos menores deveriam vir na frente, a exemplo da

integração cultural entre os países, o que não é feito. Talvez essa não seja a alçada

do BNDES, mas digo isso porque V.Sa, que tem visão extraordinária, sabe que

muitas vezes deixamos passar pequenas mas importantes oportunidades.

Sr. Presidente, sei que há vários tipos financiamentos. O melhor

financiamento que o BNDES pode fazer é nas empresas, e a melhor empresa é a

Prefeitura, que nunca vai quebrar. Ela tranca, através do FPM, o retorno que tem.

Entretanto, Sr. Presidente, existem Prefeituras que pegam dinheiro do BNDES para

fazer teatro ou Rua 24 horas, e questiono isso. Mesmo que o administrador local

considere aquela iniciativa de extraordinária importância para a cidade, existem

muitas outras coisas às quais o BNDES precisa dar preferência. No entanto, a

aceitação passa a ser co-responsabilidade.

Vou cortar a pergunta, porque a Sra. Presidenta me pede para encerrar.

Cumprimento o Deputado Neiva Moreira e saúdo V.Sa., Sr. Carlos Lessa, pelo

entusiasmo que transmite ao Brasil. Vejo o BNDES como extraordinário instrumento

de desenvolvimento.

O SR. CARLOS LESSA - Muito obrigado.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Com a palavra o Deputado

Francisco Dornelles.

O SR. DEPUTADO FRANCISCO DORNELLES - Prof. Carlos Lessa, meus

cumprimentos. V.Sa. explicou muito bem as dificuldades do BNDES em relação à

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EMBRAER, decorrentes do Acordo de Basiléia. Mas o que gostaríamos de saber é

se V.Sa., com a sua capacidade de liderança e o profundo conhecimento das

atividades empresariais, não poderia se tornar o grande coordenador dessas

operações, mesmo no caso de se recorrer à garantia do Tesouro, e se poderia tocar

no ponto da capitalização do BNDES.

O SR. CARLOS LESSA - Claro. V.Exa. gostaria de maiores informações?

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Com a palavra o Deputado

Luiz Carlos Hauly, de forma curta e rápida.

O SR. DEPUTADO LUIZ CARLOS HAULY - Sra. Presidenta, Sras. e Srs.

Parlamentares, Sr. Presidente do BNDES, primeiro gostaria de dizer da alegria em

tê-lo na Casa. Fui criado politicamente com a leitura dos textos do Prof. Carlos

Lessa, da Fundação Pedroso Horta, nos muitos cursos de que participei e aos quais

assisti nos bons tempos do MDB.

Tenho 31 anos de vida pública e há 12 anos e meio estou nesta Casa.

Acompanho a trajetória de V.Sa. de longe. Sei que veio da Academia e que deixou a

Reitoria da Universidade Federal para trabalhar no BNDES. É uma alegria para nós,

porque sabemos do compromisso de V.Sa. com as causas nacionais, o que não

ocorre, infelizmente, com outras pessoas que ocupam diversos cargos de

importância, até porque não sabemos bem a origem de algumas delas. Também sei

da responsabilidade e da prudência de V.Sa. no trato dos financiamentos

internacionais e que o BNDES tem sido rigoroso, ao longo da sua história, com a

garantia do crédito. Creio que a mesma rigorosidade é aplicada às concessões de

empréstimos lá fora, porque aqui dentro elas são extremamente rigorosas.

Acompanhei inúmeros processos no BNDES e, quando não é possível conceder o

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empréstimo, os técnicos colocam as propostas num envelope e mandam tudo de

volta, até o cartão credencial.

A expectativa realmente se refere à pulverização, porque existem os aspectos

internacional e nacional. Hoje, creio que o Brasil exporta bem, que vai aumentar

cada vez mais as exportações, mas terá de tomar precauções internas. Estou muito

preocupado com isso, porque as mudanças elaboradas até agora não vão melhorar

o mercado interno nem as condições das empresas, e a inadimplência vai continuar

grande. Ajudei a fazer o primeiro e o segundo REFIS, porque as empresas estão

absolutamente em grande dificuldade. Ajudamos a criar, há 6 anos, o SIMPLES,

uma espécie de reforma tributária para 3 milhões de empresas, embora não seja

suficiente. A estrutura está errada e vai levar a inadimplência cada vez maior e ao

caos na economia brasileira. Esse fato não é de hoje, remonta há 15 anos e é fruto

do erro na condução da base tributária. Essa questão afeta de morte a economia

brasileira e, por conseqüência, as empresas clientes do BNDES.

Era esta a ponderação que eu gostaria de fazer. Corri do plenário até aqui

para ouvir toda a explanação de V.Sa. e fazer esta consideração final a respeito do

momento brasileiro. Não adianta apenas reduzir a taxa de juros, porque ela vai fazer

uma pequena bolha. É preciso mexer na base estrutural tributária. Faço esta

consideração, em particular a V.Sa., nesta audiência pública, baseado em dados e

números sobre o que ocorre no desenvolvimento brasileiro, porque diz respeito a

todos nós, não importa o partido. Sou do PSDB, mas todos somos brasileiros e

queremos o melhor para o nosso País.

(Intervenção inaudível.)

O SR. DEPUTADO LUIZ CARLOS HAULY - Bem colocado. Obrigado.

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A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Com a palavra o Deputado

Colombo, do PT do Paraná. Colombo mesmo, uma fortaleza.

O SR. DEPUTADO COLOMBO - Sra. Presidenta, eu gostaria de justificar o

meu atraso. Estava em reunião da CPI da SERASA.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Não precisa se justificar,

Deputado.

O SR. DEPUTADO COLOMBO - Tenho que me justificar para que o nosso

convidado não se sinta desprestigiado por mim.

O requerimento fala sobre o financiamento do BNDES à exportação. Chamo a

atenção para o seguinte: sou um médio conhecedor do FUNPLATA e vejo o

movimento de alguns setores do Planejamento que trabalham com a CAF, porque

ela tem disposição jurídica estrutural diferente: capta dinheiro fora e é aberta.

O SR. CARLOS LESSA - É um banco, não é?

O SR. DEPUTADO COLOMBO - É um banco. E o Fundo, embora tenha um

dos mais altos padrões de segurança em investimento do mundo, está fechado.

Indago a V.Sa. se não poderíamos dar um segundo e pequeno passo, seguro,

tranqüilo, com pouco dinheiro e muito pouco risco: reestruturarmos o FUNPLATA e o

transformarmos num banco, sem impedir a possibilidade de uni-lo à CAF — aí, sim,

um grande banco, bem mais oxigenado —, e permitirmos que o BNDES seja um dos

primeiros aportadores de recursos do FUNPLATA reestruturado.

O SR. CARLOS LESSA - Uma bela questão. Vou até começar pelo Deputado

Colombo, dando precedência ao navegador.

V.Exa. lembrou muito oportunamente a existência do FUNPLATA. Na

verdade, em todo o continente sul-americano existe o nosso BNDES, um banco de

desenvolvimento sólido, a CAF, um banco de desenvolvimento de muito bom perfil,

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e o FUNPLATA, um banco de fomento muito tolhido. No entanto, todos nós —

quando digo todos nós refiro-me à Direção do BNDES e à da CAF — estamos

interessadíssimos em fortalecer o FUNPLATA, mas para isso é preciso haver

decisão política dos governantes dos outros países.

A idéia de V.Exa. de caminhar para uma relação mais sistêmica e orgânica

entre os 3 bancos é excelente. Vou aproveitar para fazer uma referência, porque me

esqueci dela. Deixei de falar de um instrumento fundamental para o fortalecimento

das exportações brasileiras para o continente sul-americano, das exportações dos

outros países sul-americanos para o Brasil, para a aceleração da integração através

do Convênio de Crédito Recíproco. O grande mecanismo do CCR permite reduzir

inibições quanto às transferências em dólar. Na verdade, é uma câmara de

compensação em que os bancos centrais pactuam liquidar suas operações

recíprocas e só zerar saldos eventuais de 4 em 4 meses, com alguma regra pela

qual será possível aperfeiçoar o processo, gerando financiamento se houver

desequilíbrio sistêmico durante mais do que 1, 2, 3 ou 4 quadrimestres. É uma

pactuação.

Qual é a vantagem do CCR? Ele retira das operações o risco cambial e

internaliza-o nos bancos centrais, deixando para os demais bancos o risco creditício

normal. Isso desinibe os bancos para alavancar a exportação. Sou amigo de

Henrique Iglesias há muito tempo, trabalhamos juntos, como professores, no século

passado. Outro dia ele me telefonou oferecendo muito dinheiro, mas era dólar. E

disse a ele: “Olha, Iglesias, tomo todo o dinheiro que você tiver em moedas sul-

americanas”. Ele riu às gargalhadas, porque, em última instância, para incentivar e

consolidar os investimentos, temos de caminhar em direção a um sistema de

pagamento sul-americano eficiente. Já existe o Convênio de Crédito Recíproco, ao

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qual o Banco Central do Brasil aderiu, que tem como banco líder de compensação o

Banco Central do Peru, mas os nossos limites e o prazo em que operamos são

muito pequenos. Só fazemos operações de até 200 mil dólares e em 360 dias.

Trata-se de instrumento ainda muito acanhado para alavancar o investimento,

porque os Bancos Centrais não gostam do CCR, falando em bom português. A

razão é esta: eles não gostam da idéia de assumir o risco cambial. Na verdade, o

euro, originalmente, foi um Convênio de Crédito Recíproco com 1 milhão de

pagamentos.

Quer dizer, só conseguiremos destravar o comércio quando se retirarem os

temores nas trocas, e o temor das variações cambiais é muito palpável. Então, o

mérito desse mecanismo é retirar esse temor, ou melhor, deixar só os presidentes

de Bancos Centrais com dor de cabeça. É ofício deles lidar com câmbio, mas eles

gostam mais de lidar com taxas de juros.

Vou responder aos Srs. Deputados. O Deputado Serafim Venzon me

perguntou até quanto, em investimentos, o BNDES pode financiar. A minha resposta

é a seguinte: formal, neste ano, 34 bilhões; para o próximo ano, propomos 47

bilhões. Propomos ampliação significativa. Porém, o banco é sempre um

personagem que depende do mutuário, ou seja, preciso ter demandas consistentes

que absorvam essa totalidade de recursos.

O Deputado Alberto Goldman chamava a atenção para o fato de que, num

cenário de relativa estagnação, as demandas tornam-se pequenas. Isso é

absolutamente verdadeiro. Quer dizer, quando o BNDES propõe para o próximo ano

47 bilhões, aposta que no ano que vem o País vai ter crescimento muito mais

substancial, e muitos setores, que hoje estão tímidos, apresentarão seus projetos ao

exame do BNDES.

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Apresento um horizonte formal. Informalmente, quero dizer que o BNDES tem

grande poder de alavancagem que não foi muito explorado. As operações ligadas ao

mercado de capitais admitem fundos derivativos, a constituição de diversas fórmulas

pelas quais é possível dar liquidez a imobilizações e, com isso, amplificar o volume

de operações. Quase diria a V.Exa. que, se o Brasil voltar a crescer, o BNDES terá

capacidade de responder a essas demandas.

Deputado, V.Exa. fez outra pergunta que achei muito interessante: por que os

nossos aviões não são todos da EMBRAER? Não sou especialista no tema, mas

diria que obviamente os aviões brasileiros que voam no espaço internacional são de

longo curso, não podendo ser de aviação regional. Agora, suspeito que muitos dos

nossos modelos são pequenos para as rotas brasileiras de maior intensidade, e as

nossas companhias disputam essas rotas de grande intensidade, tipo Rio—São

Paulo, Rio—Brasília, São Paulo—Brasília etc. Em função disso, optaram por certos

modelos maiores, e é por esta razão que acho que a EMBRAER pensa em chegar a

um protótipo para 170...

(Não identificado) - Chama 170, mas tem 110 lugares.

O SR. CARLOS LESSA - É isso mesmo. Misturei. É o de 110 lugares. Já é

um tamanho muito bom, só que para desenvolver esse protótipo gasta-se uma

quantidade brutal de recursos. E isso não é biscoito.

(Não identificado) - Ele já está voando.

O SR. CARLOS LESSA - Não, o outro avião, a outra série. Como é a outra

série? (Risos.)

(Não identificada) - A família 170, 190.

O SR. CARLOS LESSA - Cento e noventa!

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(Não identificada) - Cento e noventa é o que tem 118 lugares. O que já está

voando é o 170, que tem 98 lugares.

O SR. CARLOS LESSA - Desculpem. O que está voando tem 98 lugares. O

modelo que vai à frente tem 118 lugares. O problema é que cada salto desses

parece fácil de fazer, mas para a engenharia é difícil.

É muito interessante a sua pergunta. Eu até diria que, se começarmos a

reestruturar a aviação brasileira, é nosso interesse aumentar muito a presença dos

aviões da EMBRAER no Brasil ou na América do Sul. Aliás, a Guiana já nos pediu

financiamento para avião EMBRAER.

V.Exa. tem toda a razão. Fui para o exílio em Santiago e, quando lá cheguei,

a minha maior surpresa foi constatar que, embora tão próximos, os países da

América do Sul sabiam tão pouco uns dos outros. De modo geral, diria que nós, sul-

americanos, olhamos para o oceano, e as densidades das nossas relações são

pequenas. Isso se reflete em correntes de turismo ainda muito pequenas e também

num movimento de guias de turismo relativamente modesto. É algo para o qual

todos os brasileiros que apostam na idéia da integração deveriam estar atentos.

Aliás, quero dizer aos Srs. Parlamentares que o Parlamento Latino-Americano

tem que ganhar outra dimensão. Por exemplo: gostaria muito de pensar a aviação

comercial na América do Sul com o aumento das freqüências entre as Capitais. Mas

sei que essa solução é difícil porque há muito poucos vôos.

(Intervenção inaudível.)

O SR. CARLOS LESSA - Não posso dizer isso porque sou presidente de um

banco, mas como viajante gostaria muito da idéia.

O SR. DEPUTADO PAULO DELGADO - É mais fácil ir a Paris do que a

Manhuaçu.

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O SR. CARLOS LESSA - É verdade, eu sei. No entanto, o Deputado Serafim

Venzon levantou uma questão que não está exatamente no âmbito desta audiência,

mas é muito importante: as Prefeituras.

Dou toda a força a V.Exa. O Congresso aprovou a Lei de Responsabilidade

Fiscal, que reputo ser um avanço nas relações entre as pessoas públicas. Agora,

existem 2 mil Municípios brasileiros adimplentes e que podem contratar

financiamento. Nós, do BNDES, adoraríamos financiar uma massa muito grande

desses Municípios, porque gerariam emprego de maneira irradiada por todo o País.

E, mesmo investindo dinheiro na construção de teatro, que pode não ser a última

das prioridades, gera emprego para a construção civil e encomendas que ativam a

vida brasileira.

Agora, só posso financiar uma quantidade minúscula de Municípios, porque

estão contingenciados pelo acordo brasileiro com o FMI. Há um limite fixado

anualmente, e o contingenciamento é a grande barreira. Pelo BNDES, estou pronto

para financiar número maior de Municípios.

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - Mas financiar produção e não

consumo.

O SR. CARLOS LESSA - Não, consumo não. Para financiar obras,

investimentos e não custeio. O BNDES não financia custeio, em hipótese alguma,

ele só financia capital de giro quando associado a projeto de investimento.

O SR. DEPUTADO ALBERTO GOLDMAN - Tem que financiar indústrias que

reproduzam. Não é um bem final.

O SR. CARLOS LESSA - Deputado Alberto Goldman, se V.Exa. me

perguntasse qual seria minha visão macrodinâmica, eu responderia: em primeiro

lugar, infra-estrutura; em segundo, infra-estrutura; e em terceiro, infra-estrutura. O

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que puxa um país são os investimentos em infra-estrutura públicos, privados,

parcerias públicas e privadas. A grande locomotiva é essa. Agora, a construção civil,

obras urbanas e outras são importantíssimas geradoras de emprego.

Concordo com quem mencionou nesta reunião que a simples redução da taxa

de juros não reativa a economia, cria apenas pequena bolha. É muito importante

enfrentar a situação de depressão no emprego. Eu, carioca que sou, fico muito

nervoso ao saber que 131 mil candidatos disputavam uma vaga de gari. E quem

estava em Santo André soube que 27 mil candidatos também concorreram a uma

vaga para coveiro.

O Deputado Francisco Dornelles me fez uma pergunta e vou respondê-la.

Capitalização é uma das minhas preocupações permanentes, porém, há dificuldades

técnicas para se abrir o caminho. Posso destravar o Acordo de Basiléia, se converter

o exigível do Tesouro num “não” exigível. Isso é muito fácil, é mudança contábil, mas

bate no acordo do Fundo. Então, há problemas técnicos a serem superados. Temos

que capitalizar o BNDES, até porque há 10 anos isso não é feito.

Por último, Deputado Luiz Carlos Hauly, quero dizer que concordo

inteiramente com V.Exa. O sistema tributário brasileiro tem problemas muito sérios

que precisam ser ajustados. Por outro lado, quero dizer que fui fiscalista junto com o

Deputado Dornelles, na juventude, e com o Sr. Gerson Augusto da Silva, e tenho

medo de mexer radicalmente nos sistemas. Então, existe um trade-off entre

aperfeiçoar e não desarrumar muito, até montar uma nova máquina. Enfim, V.Exas.

sabem melhor disso do que eu.

Muito obrigado.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Sr. Presidente do BNDES,

Carlos Lessa, estamos terminando a reunião. Infelizmente, o Presidente Lula o

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convocou, mas esperamos contar com a presença de V.Sa. numa próxima

oportunidade. Hoje, tiramos todas as dúvidas. (Palmas.) V.Sa. merece o nosso

aplauso. É um homem não só inteligente, mas também dinâmico, absolutamente

compreensível e que muito orgulha o Governo Federal.

Está encerrada a reunião.

Muito obrigada.