departamento de química faculdade de ciências da ... · da mesma escola, também no ano lectivo...

182
Departamento de Química Faculdade de Ciências da Universidade do Porto SIMULAÇÕES ON-LINE PARA O ENSINO E APRENDIZAGEM DE QUÍMICA Manuel Eduardo Fernandes Salgueiro Janeiro de 2003

Upload: duongbao

Post on 07-Nov-2018

212 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • Departamento de Qumica Faculdade de Cincias da Universidade do Porto

    SIMULAES ON-LINE PARA O ENSINO E APRENDIZAGEM DE QUMICA

    Manuel Eduardo Fernandes Salgueiro

    Janeiro de 2003

  • Departamento de Qumica

    Faculdade de Cincias da Universidade do Porto

    SIMULAES ON-LINE PARA O ENSINO

    E APRENDIZAGEM DE QUMICA

    Tese orientada por:

    Professor Doutor Joo Carlos de Matos Paiva Universidade do Porto

    Professor Doutor Jorge Marques Gonalves Universidade do Porto [*-S I I I ! I IJHiVf RSIDAOl DO m

  • Agradecimentos

    Correndo sempre o risco de cometer a injustia (de que antecipadamente me penitencio) de

    me esquecer de todas as pessoas que, de alguma forma, directa ou indirectamente, me

    apoiaram e contriburam para a realizao deste trabalho, gostaria de expressar os meus

    sinceros agradecimentos:

    Ao Professor Doutor Joo Carlos de Matos Paiva, orientador desta tese, por todo o apoio

    prestado desde o seu primeiro momento, desde a escolha do tema, pela sua disponibilidade e

    pelo estmulo transmitido, pelos seus comentrios e sugestes, pela leitura e reviso do texto.

    Ao Professor Doutor Jorge Marques Gonalves, co-orientador, pela sua disponibilidade,

    pelos seus comentrios e sugestes pertinentes, pela sua leitura e reviso do texto.

    Ao Professor Doutor Duarte Costa Pereira, pela sua preciosa ajuda no que se refere ao

    tratamento estatstico dos estudos realizados.

    Professora Doutora Maria Gabriela Ribeiro, por me ter permitido a consulta da sua

    bibliografia, em especial pela consulta actualizada do Journal of Chemical Education.

    Ao Eng Ildio Martins, pela sua disponibilidade, pelos seus conhecimentos e pela sua arte

    na programao das simulaes.

    A todos os alunos que participaram neste trabalho, sem os quais tal no seria possvel.

    Maria Jos e Rita, pela pacincia e compreenso infinitas durante todo este trabalho.

    II

  • Lista de abreviaturas

    ADN: cido desoxirribonuclico

    e. g.\ exempli gratia (por exemplo)

    GHz: Giga (IO9) hertz

    GR: Ganho residual

    GRC: Ganho residual corrigido

    GRCM: Ganho residual corrigido mdio

    IAC: Instruo assistida por computador

    IUPAC: International Union of Pure and Applied Chemistry

    MBL: Microcomputer Based Laboratory (laboratrio computadorizado)

    PC: Personal Computer (computador pessoal)

    PDA: Personal Digital Assistant (computador de bolso)

    PVC: poli (cloreto de vinilo)

    PTN: Condies normais de presso e de temperatura (P 1 atm; / = 0o C)

    SI: Sistema Internacional de unidades

    TIC: Tecnologias de informao e comunicao

    vs: versus

    III

  • Resumo

    Este estudo teve como objectivos principais produzir, implementar e avaliar o impacto de

    simulaes computacionais on-line no ensino e aprendizagem de conceitos de Qumica.

    Foram desenvolvidas vrias simulaes apoiadas por pequenos filmes vdeo on-line, que

    so descritas neste trabalho.

    Ao nvel do 9o ano de escolaridade, foi desenvolvido e avaliado um conjunto de simulaes

    relativo polaridade / no polaridade de algumas molculas. Os sujeitos do estudo foram 37

    alunos de duas turmas do 9o ano da Escola Secundria de Alij e decorreu durante o ano

    lectivo 2001/2002. Os contedos foram leccionados, nas duas turmas, de forma tradicional,

    tendo-se acrescentado um conjunto de simulaes em computador numa das turmas (grupo

    experimental). O impacto foi avaliado atravs de um conjunto de questes includas em teste

    sumativo.

    No 12 ano de escolaridade, investigou-se o impacto de uma simulao acerca da ligao

    dipolo instantneo - dipolo induzido. Para este estudo, foram realizadas entrevistas a alunos

    da mesma escola, tambm no ano lectivo 2001/2002. Neste caso, os alunos foram

    entrevistados aps ensino dos contedos, no sentido de detectar dificuldades relativamente

    aos mesmos. Aps visualizao da simulao, os mesmos alunos foram novamente

    entrevistados no sentido de avaliar em que medida a simulao se revelou ou no eficaz na

    resoluo das dificuldades anteriormente apresentadas.

    Em ambos os casos os resultados revelaram a utilidade das simulaes, no sentido de

    promover uma melhor visualizao e compreenso dos fenmenos envolvidos, podendo ser

    uma hiptese para um ensino mais atraente e para despertar o gosto pelo estudo da Qumica.

    Sugerem-se, finalmente, hipteses de desenvolvimento futuro.

    IV

  • Abstract

    The study which follows had as main goals to produce, implement and evaluate the impact

    of on-line computational simulations in Chemistry teaching and learning.

    Several simulations were developed and supported by small on-line video films, which are

    described in this work.

    In the 9th grade, it was developed a set of simulations related to the polarity I non-polarity

    of some molecules. The subjects of the study were 37 students of two classes from Alij

    Secondary School during the school year of 2001/2002. The contents were taught, in both

    classes, in a traditional way, having been added a set of simulations with a computer in one of

    the classes (the experimental group). The impact was evaluated through a set of questions

    included in a summative test.

    In the 12th grade, it was researched the impact of a simulation about the instant dipole -

    - induced dipole intermolecular bonds. For this study, interviews were done to students of the

    same school, also on the school year of 2001/2002. The students were interviewed after the

    teaching of the contents, in order to detect difficulties about them. After the visualization of

    the simulation, the same students were interviewed again in order to evaluate if the simulation

    revealed to be efficient or not in the resolution of the previous difficulties.

    In both cases the results revealed the utility of simulations in the sense of promoting a

    better visualization and understanding of the involved phenomena, being an hypothesis for a

    more attractive teaching and also to increase the taste for the study of Chemistry.

    Finally, hypotheses of future development are suggested.

    V

  • ndice

    ndice

    Agradecimentos U

    Lista de abreviaturas III

    Resumo IV

    Abstract V

    ndice de figuras X

    ndice de grficos XIII

    ndice de tabelas XIV

    1- Introduo 1

    1.1. Computadores por todo o lado 2

    1.2. Estrutura da dissertao 3

    2- As TIC no ensino das cincias 5

    2.1. Breve retrospectiva 6

    2.2. Os computadores e a Qumica 6

    2.2.1. Simulaes em computador no ensino e aprendizagem da Qumica 7

    2.2.2. Reviso de alguns estudos sobre simulaes computacionais em Qumica 10

    2.3. Simulaes on-line 14

    2.3.1. Vantagens das simulaes on-line 16

    2.3.2. Constrangimentos das simulaes on-line 16

    3- Foras intermoleculares 18

    3.1. Definio 19

    3.2. Dipolo elctrico 19

    3.2.1. Interaces entre dipolos 20

    3.2.2. Molculas polares e molculas apoiares 21

    3.2.3. Momentos de dipolo induzidos 22

    3.3. Tipos de foras intermoleculares 22

    3.3.1. Ligao dipolo instantneo - dipolo induzido 23

    VI

  • ndice

    3.3.2. Ligao dipolo permanente - dipolo permanente 25

    3.3.3. Ligao dipolo permanente - dipolo induzido 26

    3.3.4. Ligao io - dipolo 27

    3.3.5. Ligao de hidrognio 28

    3.3.6. Ligao tnica 30

    3.4. Importncia das foras intermoleculares 31

    3.4.1. Estados fsicos 31

    3.4.2. Mudanas de estado fsico 32

    3.4.2.1. Mudanas de estado fsico e foras de disperso 33

    3.4.2.2. Mudanas de estado fsico e ligaes de hidrognio 35

    3.5. Repulses e interaces globais 36

    4- Caso I: Ensino da polaridade molecular no 9o ano 38

    4.1. Contexto 39

    4.1.1. Contexto cientfico - pedaggico 39

    4.1.1.1. Electrizao por contacto 42

    4.1.1.2. Electrizao por influncia 42

    4.1.1.3. Electrizao por frico 43

    4.1.1.4 Teste experimental de polaridade molecular 45

    4.1.2. Ponto da situao na Web 48

    4.2. Simulao on-line desenvolvida 48

    4.2.1. Descrio da simulao 48

    4.2.2. Disponibilizao na Web 52

    4.2.3. Roteiro de explorao 54

    4.3. Metodologia 54

    4.3.1. Tipo de estudo 54

    4.3.2. Caracterizao da amostra 55

    4.3.3. Limitaes do estudo 58

    VII

  • ndice

    4.3.4. Hiptese em estudo 59

    4.3.5. Procedimento 59

    4.4. Anlise dos resultados 61

    5- Caso II: Ensino da ligao dipolo instantneo - dipolo induzido no 12 ano 67

    5.1. Contexto 68

    5.1.1. Contexto cientfico - pedaggico 68

    5.1.2. Ponto da situao na Web 69

    5.2. Simulao on-line desenvolvida 70

    5.2.1. Descrio da simulao 70

    5.2.2. Disponibilizao na Web 72

    5.3. Metodologia 73

    5.3.1. Tipo de estudo 73

    5.3.2. Caracterizao da amostra 74

    5.3.3. Limitaes do estudo 74

    5.3.4. Procedimento 75

    5.4. Anlise dos resultados 76

    6- Concluses 81

    Bibliografia 87

    Glossrio 94

    Anexos 100

    Anexo I- Endereos de sites recomendados para o ensino e aprendizagem de

    Qumica 101

    Anexo II- Roteiro de explorao (9o ano) 104

    Anexo III- Dados de natureza quantitativa (pr-teste) 114

    Anexo IV- Teste sumativo (ps-teste) 116

    Anexo V- Resultados do teste sumativo (ps-teste) 120

    Anexo VI- Valores calculados para os ganhos de aprendizagem 123

    VIII

  • Indice

    Anexo VII- Entrevista(12 ano)-parteI 125

    Anexo VIII- Entrevista (12 ano) - parte II 127

    Anexo IX- Transcrio das entrevistas (12 ano) 129

    Anexo X- Endereos de simulaes sobre ligaes intermoleculares 165

    IX

  • ndice de figuras

    ndice de figuras

    Figura 1.1- Organizao da dissertao 4

    Figura 2.1- Imagem de entrada do programa Le Chat II 9

    Figura 2.2- Imagem de simulao da separao das bases citosina e gaunina no ADN 9

    Figura 2.3- Imagem de simulao do acerto de equaes qumicas 10

    Figura 2.4- Imagem de simulao on-line da experincia de Rutherford 15

    Figura 2.5- Imagem principal de simulao on-line que permite misturar as cores primrias da luz 15

    Figura 2.6- Imagem de simulao on-line da relao entre presso e temperatura, a volume constante, para um gs ideal 16

    Figura 3.1- Ligaes intramoleculares vs ligaes intermoleculares em molculas de

    HC1 19

    Figura 3.2- Representao de um dipolo elctrico 20

    Figura 3.3- Esquema dos dipolos elctricos em H2O e HC1 20

    Figura 3.4- Representao de dipolos elctricos em H2O e em HC1. 20

    Figura 3.5- Interpretao da polaridade de O3 21

    Figura 3.6- Momento de dipolo no nulo em H2O. Representao simplificada de H2O

    como molcula polar 22

    Figura 3.7- Interpretao do momento de dipolo nulo em CO2 22

    Figura 3.8- Representao da ligao dipolo instantneo - dipolo induzido 24

    Figura 3.9- Representao de interaces entre molculas de HC1 25

    Figura 3.10- Representao da orientao de dois dipolos permanentes 25

    Figura 3.11- Representao da orientao de dois dipolos permanentes 25

    Figura 3.12- Orientao paralela de dois dipolos permanentes 26

    Figura 3.13- Representao da interaco dipolo permanente - dipolo induzido 26

  • ndice de figuras

    Figura 3.14- Representao de interaces io - dipolo em NaCl / H2O 27

    Figura 3.15- Representao de interaco io-dipolo 28

    Figura 3.16- Representao de ligaes de hidrognio em H2O e em H2O / NH3 29

    Figura 3.17-Frmula de estrutura e representao de ligaes intramoleculares de

    hidrognio no cido mlico 29

    Figura 3.18- Representao de ligaes de hidrognio na molcula de ADN 30

    Figura 3.19- Representao de ligaes de hidrognio numa protena 30

    Figura 3.20- Interaco tnica 30

    Figura 3.21- Frmula de estrutura do glicerol 32

    Figura 3.22- Interpretao dos pontos de ebulio de pentano e de tetrametilmetano 35

    Figura 3.23- Representao genrica de curva de energia potencial para uma molcula 36

    Figura 3.24- Relao entre os parmetros e e r0 da curva de energia potencial de

    Lennard- Jones 37

    Figura 4.1- Electroscpio; representao simplificada 41

    Figura 4.2- Representao da electrizao de um electroscpio por contacto 42

    Figura 4.3- Electrizao por influncia 42

    Figura 4.4- Representao da electrizao de um objecto de plstico por um pano de l 44

    Figura 4.5- Representao da electrizao de um objecto de vidro por um pano de seda 44 Figura 4.6- Esquema de montagem para provar experimentalmente que quando um

    objecto friccionado, o excesso de electres com que um objecto fica igual deficincia com que fica o outro 44

    Figura 4.7- Esquema de montagem para testar a polaridade molecular 45

    Figura 4.8- Imagem de vdeo do esquema de montagem para testar a polaridade da acetona 45

    Figura 4.9- Interpretao do comportamento de H2O perante um objecto electrizado 46

    XI

  • ndice de figuras

    Figura 4.10- Interpretao do comportamento de CCU perante um objecto electrizado 47

    Figura 4.11- Imagem de entrada da simulao "Interaces" 49

    Figura 4.12-Janela mostrando substncias a escolher para testar a polaridade das

    respectivas molculas 50

    Figura 4.13- Janela mostrando materiais a escolher para electrizar 50

    Figura 4.14- Imagem do teste de polaridade com acetona 51 Figura 4.15-Visualizao macroscpica e interpretao microscpica do comporta-

    mento de um fio de gua perante um objecto de plstico electrizado 51

    Figura 4.16- Imagens de simulao da electrizao de uma barra de plstico e sua

    aproximao a um fio de gua 52

    Figura 4.17- Imagem de entrada no "Molecularium" na Internet 52

    Figura 4.18- Imagem de entrada de "Ligaes intermoleculares" na Internet 53

    Figura 4.19- Imagem de entrada da simulao "Interaces" na Internet 53

    Figura 5.1- Imagem esttica final da simulao "Dipolo", na sua primeira verso 71

    Figura 5.2- Imagem esttica final da simulao "Dipolo", na sua segunda verso 71 Figura 5.3- Imagem da simulao "Dipolo" evidenciando a utilizao do comando

    "AVANAR" para a visualizao do movimento de cargas elctricas durante a formao dos dipolos induzidos 72

    Figura 5.4- Imagem esttica final da simulao "Dipolo", na sua terceira verso 73

    Figura 5.5- Imagem final da simulao "Dipolo" (3a verso) na Internet 73

    XII

  • ndice de grficos

    ndice de grficos

    Grfico 3.1- Relao entre pontos de ebulio e pontos de fuso de algumas molculas com o seu tamanho e nmero de electres 33

    Grfico 3.2- Efeito das ligaes de hidrognio sobre o ponto de ebulio de algumas molculas 35

    Grfico 4.1- Comparao dos resultados (mdia dos testes) do grupo de controlo e do grupo experimental antes de ensino diferenciado 56

    Grfico 4.2- Comparao dos resultados (mdias em percentagem), por questo, do grupo experimental e do grupo de controlo aps ensino diferencial 62

    Grfico 4.3- Representao dos resultados do ps-teste em funo do pr-teste 63

    Grfico 4.4- Comparao dos ganhos residuais corrigidos (GRC) individuais no grupo de controlo e no grupo experimental 64

    Grfico 4.5- Comparao entre o nmero de alunos a responder correctamente s questes relativas polaridade de H2O 66

    XIII

  • ndice de tabelas

    ndice de tabelas

    Tabela 2.1- Resumo de alguns estudos envolvendo simulaes computacionais em

    Qumica 13

    Tabela 3.1- Constantes dielctricas de alguns lquidos puros, a 25 C 28

    Tabela 3.2- Resumo das caractersticas essenciais das diversas foras intermoleculares e da ligao tnica 32

    Tabela 3.3- Relao entre foras de disperso, pontos de ebulio e estado fsico

    nalguns alcanos 34

    Tabela 3.4- Comparao entre pontos de ebulio de dois alcanos ismeros 34

    Tabela 3.5- Parmetros de Lennard-Jones de algumas molculas 37

    Tabela 4.1- Srie triboelctrica 43

    Tabela 4.2- Parmetros estatsticos dos grupos de controlo e experimental antes de ensino diferencial 57

    Tabela 4.3- Parmetros estatsticos dos grupos de controlo e experimental relativamente mdia dos testes antes de ensino diferencial 57

    Tabela 4.4- Resultados do grupo de controlo vs grupo experimental nas questes de polaridade molecular aps ensino diferencial 61

    Tabela 4.5- Parmetros estatsticos dos grupos de controlo e experimental aps ensino diferencial 62

    Tabela 4.6- Comparao dos parmetros estatsticos relativos aos GRCM no grupo controlo e no grupo experimental 64

    XIV

  • Captulo 1

    Introduo

  • 1- Introduo

    1- Introduo

    1.1. Computadores por todo o lado

    Os computadores vieram revolucionar a forma como toda uma srie de actividades so

    desenvolvidas, bem como a prpria vida do Homem. O seu impacto na humanidade

    comparvel ao da criao da agricultura e ao da revoluo industrial (Toffler, 2000). Hoje em

    dia so ferramentas de trabalho indispensveis e quase omnipresentes. A sua utilizao

    quase inumervel: desde a simples utilizao como fonte de diverso (jogos, filmes, etc) ou

    para processamento de texto, at sua utilizao em investigao cientfica (clculos que na

    sua ausncia poderiam levar anos a realizar, modelao, estudos dinmicos de novas

    substncias a introduzir como medicamentos, etc) ou ainda como forma de automatizar e at

    substituir o Homem em muitas tarefas (Gates, 1999). A lista seria interminvel, podendo

    afirmar-se que quase no se pode viver sem os computadores, pelo menos no actual estilo de

    vida da sociedade ocidental (Negroponte, 1995).

    frequente apontar-se o desemprego como um dos males trazidos pelos computadores,

    pela substituio que fizeram da mo de obra humana em muitas actividades. Convm,

    entretanto, no esquecer que a indstria de computadores e reas relacionadas gerou uma srie

    de postos de trabalho e de emprego anteriormente inexistentes: software, fabrico dos

    microprocessadores, montagem de computadores, nas telecomunicaes, empregos

    relacionados com a Internet, so apenas alguns exemplos. Feito o balano entre prs e

    contras, muito provavelmente os ganhos sero maiores que as perdas.

    O ensino, embora sofra de alguma "inrcia" e as mudanas no se faam velocidade

    desejvel (Papert, 1994), no excepo influncia do uso de computadores. A sua utilidade

    no contexto educativo parece inegvel (Suppes, 1992), apesar de alguma desiluso

    relativamente a um uso mais macio atribuda, sobretudo, resistncia dos professores (Miller

    e Olsen, 1994), que, por por falta de contacto e experimentao dos computadores e das

    tecnologias da informao e comunicao (TIC) em sentido lato, no reconhecem as suas

    potencialidades e as afastam da sua prtica (Paiva, 2002).

    Sendo a Qumica uma cincia do infinitamente pequeno, a compreenso adequada de

    muitos dos seus fenmenos implica necessariamente a sua visualizao mental. As

    simulaes em computador tm-se revelado, neste sentido, uma ferramenta pedaggica de

    valor acrescentado. Sendo a Internet o espao ideal para a disseminao da informao, a

    utilizao e explorao de simulaes on-line para se aprender e ensinar Qumica bastante

    oportuna.

    2

  • 1 - Introduo

    1.2. Estrutura da dissertao

    O trabalho que a seguir se apresenta teve como objectivos principais produzir e avaliar o

    impacto da utilizao de simulaes computacionais no ensino e aprendizagem de contedos

    de Qumica, tendo decorrido numa dupla vertente:

    1- Simulao da polaridade / no polaridade molecular, ao nvel do 9o ano de escolaridade.

    2- Simulao da ligao dipolo instantneo - dipolo induzido, ao nvel do 12 ano de

    escolaridade.

    O processo comeou com a seleco dos contedos especficos, tendo-se feito o

    levantamento de dificuldades relacionadas com o ensino e aprendizagem dos mesmos. Este

    levantamento foi realizado com base em bibliografia e tendo igualmente em linha de conta

    uma experincia prpria enquanto professor. De modo a superar os problemas detectados

    anteriormente, colocaram-se as seguintes hipteses:

    1- Ser que o ensino da polaridade e no polaridade molecular auxiliada por simulaes em

    computador se revela eficaz no processo de ensino / aprendizagem destes conceitos, ao

    nvel do 9o ano de escolaridade?

    2- Quais os benefcios, para os alunos do 12 ano, de uma simulao da ligao

    intermolecular dipolo instantneo - dipolo induzido?

    Verificou-se, ento, o que existia na Web sobre o assunto e, no se tendo encontrado nada

    especfico com valor acrescentado, partiu-se para a construo de simulaes em computador

    com o objectivo de visualizar e compreender os fenmenos envolvidos em cada caso. A

    disponibilizao na rede foi o passo seguinte.

    As simulaes foram utilizadas e exploradas durante as aulas, tendo-se avaliado o seu

    efeito em termos dos resultados obtidos atravs da avaliao. Dos resultados extraram-se

    concluses e apontam-se sugestes para estudos futuros.

    O diagrama seguinte (figura 1.1) resume as principais fases do trabalho.

    No endereo www.educa.fc.up.pt/investiga/teses/salgueiro possvel a consulta desta

    tese on-line. Est igualmente disponvel em CD-ROM no final desta dissertao.

    3

    http://www.educa.fc.up.pt/investiga/teses/salgueiro
  • 1 - Introduo

    Contedos a leccionar

    Polaridade / no polaridade

    molecular (9o ano)

    Ligao dipolo instantneo - dipolo induzido (12 ano)

    Levantamento de dificuldades

    Hiptese

    Ensino com simulaes ser eficaz para uma melhor compreenso da polaridade molecular?

    Em que medida a simulao consegue ajudar a superar as dificuldades?

    Ponto de situao na Web

    Construo de simulaes

    Colocao na Web

    Metodologia de investigao

    Entrevista

    (12 ano)

    Figura 1.1- Organizao da dissertao.

    4

  • Captulo 2

    As TIC no ensino das cincias

  • 2 As TIC no ensino das cincias

    2 As TIC no ensino das cincias

    2.1. Breve retrospectiva

    A utilizao das TIC no ensino das cincias est inevitavelmente ligada ao

    desenvolvimento dos computadores pessoais (PCs), nos finais da dcada de 70 do sculo XX.

    Este desenvolvimento est, por sua vez, intimamente relacionado com o dos

    microprocessadores, cujo desempenho tem sido assinalvel (http://tek.sapo.pt/comp;

    http://www.pcmag.com) e, ainda, por preos acessveis que tm permitido a sua massificao.

    De facto, desde o famoso ENIAC (Electronic Numerical Integrator and Calculator), criado

    em 1946, com 30 toneladas, cerca de 18 000 vlvulas e capaz de efectuar 500 multiplicaes e

    5000 adies por segundo (http://www.nunoportugal.com/microlusa/histcomp/comp.htm), at

    aos mais recentes computadores de secretria e portteis que operam acima dos 3 GHz, os

    tablet PC e computadores de bolso (PDAs, Personal Digital Assistants), os progressos so

    assinalveis (http://www.pcmag.com).

    Assim, no sculo XX, o perodo que vai da dcada de 60 at finais da dcada de 70

    referido pela literatura como a era do uso de meios analgicos (filmes e vdeos) no ensino. A

    utilizao de meios digitais deuse na dcada de 80 (Brown, 1999). Foi durante esta dcada

    que apareceram as simulaes em computador e foi tambm nesta altura que apareceu o CD

    ROM, em 1985. Na dcada de 90 assistiuse ao continuado desenvolvimento dos

    computadores, descida do seu custo e a tendncias inovadoras, como a realidade virtual e a

    inteligncia artificial.

    2.2. Os computadores e a Qumica

    A Qumica no escapa "fatalidade" do uso dos computadores e das TIC. de referir, a

    ttulo de exemplo:

    Tratamento de dados / estatstica atravs de folhas de clculo que poupam tempo ao

    utilizador.

    Clculos que seriam infinitamente demorados, como o caso da resoluo de

    equaes relativas mecnica quntica.

    Aquisio de dados atravs de interfaces que permitem a aquisio e tratamento, em

    tempo real, de dados atravs de sensores. So disto exemplos a possibilidade da

    realizao de uma titulao de cidobase e a construo simultnea da respectiva

    curva de titulao, com utilizao de sensores de pH; a verificao da lei de Boyle

    Mariotte atravs de sensores de presso; a verificao da relao entre presso e

    6

    http://tek.sapo.pt/comphttp://www.pcmag.comhttp://www.nunoportugal.com/microlusa/histcomp/comp.htmhttp://www.pcmag.com
  • 2 As TIC no ensino das cincias

    temperatura (a volume constante) para um gs atravs da utilizao simultnea de

    sensores de presso e de temperatura.

    Explorao de software didctico especfico para ensino I aprendizagem de Qumica.

    o caso, por exemplo, de programas para ensino de equilbrio qumico ou para o

    ensino da constituio da matria.

    Modelao da interaco de novos frmacos e medicamentos investigados no

    tratamento de doenas, como seja a descoberta de novos agentes no combate ao cancro

    (http://members.ud.com/projects/cancer/index.htm).

    Simulaes em computador quer em termos de investigao (interaco de uma

    enzima com o substrato, por exemplo), quer para o ensino / aprendizagem de Qumica

    (experincia de Rutherford, por exemplo).

    Automatizao de diversas tcnicas: cromatografia, interpretao de espectros,

    quantificao de analitos, etc.

    De facto, a relao entre computadores e a Qumica (ou pode ser) muito estreita, tendo

    justificado a atribuio de um Prmio Nobel, em 1998, a Walter Kohn e John Pople, pelos

    seus estudos que possibilitaram o uso de equaes complexas da mecnica quntica para o

    estudo de molculas e processos moleculares com o auxlio dos computadores

    (http://www.nobel.se/chemistry/laureates/1998/index.html).

    2.2.1. Simulaes em computador no ensino e aprendizagem da Qumica

    Nos ltimos anos, no mbito das TIC, as simulaes computacionais tm registado um

    desenvolvimento assinalvel e uma aplicao crescente em termos do ensino e aprendizagem.

    As simulaes em computador consistem basicamente em programas ou ambientes gerados

    em computador que contm um modelo subjacente e onde o objectivo que o

    utilizador / aprendiz infira o modelo, que interaja, que interiorize e consubstancie

    aprendizagens. Pretendese, desta forma, que o aprendiz participe de uma forma activa na

    descoberta do conhecimento numa perspectiva construtivista (Joolingen, 1999). No ensino, as

    simulaes em computador representam experincias da realidade que:

    Ou so difceis de visualizar sem o recurso ao computador. o caso, por exemplo, da

    manipulao de variveis (temperatura, concentrao, presso) sobre o estado de

    equilbrio qumico (Paiva, 2000) ou a propagao de ondas mostrando fenmenos de

    interferncia (Cox, 1992).

    7

    http://members.ud.com/projects/cancer/index.htmhttp://www.nobel.se/chemistry/laureates/1998/index.html
  • 2 As TIC no ensino das cincias

    Ou so perigosas, caras ou muito morosas (Cox, 1992).

    As simulaes so ainda indicadas quando est em causa a segurana. E o caso da

    simulao da produo de cido sulfrico (Cox, 1992).

    Do ponto de vista pedaggico, as simulaes apresentam algumas vantagens que podero

    ser enumeradas (Russell et ai, 1997):

    Possibilidade de visualizar fenmenos qumicos quer escala macroscpica quer

    microscpica, fazendo a ligao entre este dois "mundos".

    Facilidade de reproduo a maior ou menor velocidade.

    Possibilidade de um semnmero de repeties do mesmo fenmeno.

    Eliminao dos custos das experincias laboratoriais, acrescendo ainda a possibilidade

    de um laboratrio sempre limpo e de um nmero infinito de repeties.

    Interactividade, permitindo ao utilizador uma participao activa e a possibilidade de

    seleccionar o que pretende experimentar.

    Possibilidade de se interagir sem receio de errar (tantas vezes os alunos se inibem, nas

    aulas, de participar com receio de errar) ou at de danificar material (em actividades

    experimentais, por exemplo).

    Deve, contudo, chamarse a ateno para o facto de as simulaes serem uma alternativa

    realidade, no a realidade (Brown, 1999). Pretendese, deste modo, alertar para o facto de

    que uma simulao no deve substituir o trabalho experimental e de laboratrio que esses,

    sim, traduzem a realidade. As simulaes imitam e so uma espcie de zoom dos fenmenos

    escala microscpica e, em determinadas situaes, podero ser a nica forma de se poderem

    ver e entender esses fenmenos (e.g., a simulao de uma reaco qumica).

    Como exemplos de simulaes computacionais em assuntos de Qumica, podero citar

    se, sobre equilbrio qumico, o Great Chemical Bead Game (Cullen, Jr, 1989) ou o Le Chat II

    (Paiva, 2000 figura 2.1), o 4M.CHEM (Russell et ai, 1997) sobre cidobase e equilbrio

    qumico, o Chemland (download a partir de http://soulcatcher.chem.umass.edu/cgi

    bin/pickPage.cgi?downloads.html) sobre cromatografia lquida (figura 2.2) ou, para acerto de

    equaes qumicas, The Equation Balancer (download a partir de

    http://ourworld.compuserve.com/homepages/RayLec/atoms.htm) includa no programa

    Atoms, Symbols and equations v 2.4.(figura 2.3).

    8

    http://soulcatcher.chem.umass.edu/cgibin/pickPage.cgi?downloads.htmlhttp://soulcatcher.chem.umass.edu/cgibin/pickPage.cgi?downloads.htmlhttp://ourworld.compuserve.com/homepages/RayLec/atoms.htm
  • 2- As TIC no ensino das cincias

    Figura 2.1- Imagem de entrada do programa Le Chat IL

    O Section 8 File Sim Speed Instructions Compound Categories Mobile Phase Column Type Row Rate Detection

    Chromatography Simulations of Published Results

    Nucleic Ac id Components

    O Adenine and Adenosine

    O ATP and Guanine

    Cytosine and Guanosine

    ConcvMracioii

    Y

    26,8 mu

    Ekite

    K(Cytosine) = 1.84

    K(Guanine) = 2.56

    a = 1.39

    M^

    Figura 2.2- Imagem (do programa Chemland) de simulao relativa separao, por cromatografia lquida, das bases citosina e gaunina.

  • 2 As TIC no ensino das cincias

    The Equation Balancer Click on reactant and product formulas until you have a balanced equation

    - for a real chemical reaction. Then click OK. \JJ

    Reactant 1

    2

    I I

    Na +

    2Na +

    Reactant 2

    NaOH i Mfl

    2

    I I

    "ci | | o2 |

    2

    I I

    CH4 I CuO

    2

    I I

    H?A H20 I

    2

    I I

    Chlorine

    CaCOgII Na

    2

    I I CI 2

    2

    I I

    M

    2

    I I

    2

    I I

    Combustion |

    CI. : I NaCI I

    CI ,

    mm

    2NaCI

    Possible products

    LJ NaOH 11 co2 11 C'C2 | [~HCT

    CuSoJI H 20 | | caS0 4 | | Mgcij,

    MflO |1 H2 | [ C u C I 2 | | N 2 S a

    CaO 11 Na2Q 11 NaCI | |M f l so 4

    Exit

    Figura 2.3 Imagem de The Equation Balancer, simulao do acerto de equaes qumicas, includa no programa Atoms, Symbols and Equations v 2.4.

    2.2.2. Reviso de alguns estudos sobre simulaes computacionais em Qumica

    Friedler, Nachmias e Linn (1990) investigaram, nos Estados Unidos da Amrica, o

    impacto dum MBL (microcomputer based laboratory) relativamente observao e

    previso relativamente a problemas envolvendo os conceitos de calor e de temperatura. O

    objectivo principal era conceber um mdulo capaz de fomentar o raciocnio e posteriormente

    avalilo.

    No estudo estiveram envolvidos 110 alunos de 8o ano de escolaridade, distribudos da

    seguinte forma: em 2 turmas enfatizouse a capacidade de observao e noutras 2 turmas a

    capacidade de previso. Para o MBL, dispunham de um computador por 2 alunos, sensores de

    temperatura e software prprio, sendo esta instruo aplicada durante um semestre (29 aulas).

    Algumas das questes a que os autores que pretendiam obter resposta eram:

    1 Como que os alunos adquirem as capacidades de observao e de previso a partir de

    um currculo MBL?

    2 As exigncias do grupo de observao so diferentes das do grupo de previso?

    3 A aprendizagem das capacidades de observao e de previso ajudam os alunos noutras

    capacidades de raciocnio (planeamento, controlo de variveis, etc)?

    A avaliao da instruo constou genericamente dos seguintes instrumentos:

    Teste final "de descoberta".

    10

  • 2 As TIC no ensino das cincias

    Teste de raciocnio cientfico.

    Teste de conhecimento sobre a matria.

    Observao na sala de aula.

    Entrevistas.

    Os resultados mostraram que o grupo de alunos envolvidos na observao aprenderam a

    fazer observaes mais pormenorizadas, descrevendo os passos iniciais, alteraes durante a

    experincia e interpretao de resultados. O grupo de alunos envolvido na previso era capaz

    de fazer previses em mais pormenor e de justificlas com base nas suas experincias

    anteriores.

    Os dois grupos obtiveram resultados semelhantes em testes de conhecimentos e em

    mestria de outras capacidades de raciocnio cientfico.

    Hameed, Hackling e Garnett (1993), na Austrlia, utilizaram uma "instruo assistida por

    computador" (IAC) para "desafiar" dificuldades previamente identificadas sobre equilbrio

    qumico. A IAC utilizou simulaes para criar conflito cognitivo nos alunos e para promover

    concepes cientficas.

    O estudo envolveu 30 alunos do 12 ano nas Maldivas, sendo as CAs obtidas por

    entrevista, teste de escolha mltipla, tendo escolhido, para o efeito, o seguinte equilbrio,

    desconhecido dos alunos:

    2NO(g)+ Cl 2 (g )^2NOCl(g )

    Aps instruo normal, sobre equilbrio qumico e teste de papel e lpis, os alunos

    tiveram 2 aulas com IAC, de 90 minutos cada, sendo posteriormente realizado novo teste.

    Notouse, aps a IAC, de um modo geral, um efeito positivo (que variou entre 19% e

    95% para diferentes dificuldades), que os autores referem como podendo ser imputveis

    IAC. Estes resultados foram, alm disso, duradouros.

    Referem, ainda, que os computadores tm claramente duas vantagens que os tornam

    particularmente teis para a mudana conceptual:

    1 A possibilidade de instruo individualizada.

    2 A possibilidade de simular muitos problemas cientficos com eficcia {e.g., o

    comportamento molecular pode ser observado).

    11

  • 2- As TIC no ensino das cincias

    Clavel e Duarte (1997) investigaram, em Portugal, a razo de os alunos terem a ideia

    (errada) de que a matria descontnua e esttica. Para isso, utilizaram um software

    hipermedia com simulao cujas caractersticas essenciais eram:

    1 - As partculas em constante movimento.

    2- Os espaos entre as partculas vazios.

    O estudo envolveu 57 alunos de 8o ano, sendo 28 a turma de controlo e 29 a turma

    experimental, durante 3 meses.

    A avaliao mostrou que os alunos da turma experimental demonstraram:

    1- Maior aplicao da ideia de espaos vazios (nomeadamente para os estados lquido e

    gasoso).

    2- Maior referncia existncia de movimentos intrnsecos das molculas.

    3- Facilidade acrescida na aplicao de ideias submicroscpicas na explicao dos

    fenmenos apresentados.

    Sanger, Phelps e Fienhold (2000), nos Estados Unidos da Amrica, utilizaram uma

    animao no computador para melhor compreenso do colapso / esmagamento de uma lata

    contendo gua em ebulio ao ser invertida sobre gua fria ou quando fechada (rolhada) e

    arrefecida.

    O estudo envolveu 70 alunos do Io ano de um curso superior de Qumica, que

    apresentaram diversas ideias erradas e/ou dificuldades:

    1- No interpretao do fenmeno a nvel molecular, aplicando cegamente as leis dos gases.

    2- As molculas so capazes de mudar de forma e de tamanho.

    3- A energia uma forma de matria ao nvel macroscpico.

    4- No reconhecimento do vapor de gua na lata.

    Aps aplicao da animao, verifcou-se que os alunos eram capazes de explicar o

    fenmeno correctamente, mencionando a condensao do vapor de gua (fazendo a presso

    dentro da lata diminuir), o que leva ao seu colapso por diferena de presso relativamente ao

    exterior.

    Na tabela 2.1 esto sintetizadas as caractersticas essenciais dos estudos referidos. Estes

    estudos so s uma amostra da vasta investigao que existe neste domnio, mas que no so,

    12

  • 2- As TIC no ensino das cincias

    contudo, muito abundantes na temtica das ligaes intermoleculares, nomeadamente no que

    se refere a simulaes computacionais.

    Contedos Dificuldades Questo central Amostra e

    metodologia Resultados aps

    aplicao Autores

    Calor e tem-peratura

    Aspectos no previstos no estudo.

    Avaliar o im-pacto de um MBL na apren-dizagem dos conceitos de calor e de temperatura.

    110 alunos de turmas de 8o ano.

    MBL para um par de alunos.

    Melhorias ao nvel da observao e da previso, assim co-mo na capacidade de resoluo de problemas.

    Friedler, Nach-mias e Linn, 1990.

    Equilbrio qu-mico

    Foram detecta-das 16 dificul-dades.

    Em que medida as dificuldades que os alunos apresentavam sobre equi-lbrio qumico foram alteradas por uma IAC base-ada num modelo de um-dana concep-tual.

    30 alunos de 12 ano com entre-vista e teste de escolha mltipla para detectar dificuldades.

    Simulao para criar o conflito cognitivo com respectivo feed-back.

    Efeitos positivos que variaram de 19% a 95%.

    Os melhores resul-tados foram nos casos onde, alm do conflito cogni-tivo, se utilizaram grficos.

    Hameed, Hack-ling e Garnett, 1993.

    Estrutura da matria

    Concepo de matria cont-nua e esttica.

    Os alunos con-cebem a mat-ria como cont-nua e esttica, referindo que esta concepo muito basea-da na teoria cintica mole-cular.

    57 alunos de 8o ano.

    Software hiper-media com simu-lao.

    Aplicao da ideia de espaos inter-moleculares.

    Referncia exis-tncia de movi-mentos molecula-res.

    Maior facilidade na aplicao de ideias submicroscpicas na explicao dos fenmenos apre-sentados.

    C lavei e Duarte, 1997.

    Teoria cintica molecular; leis dos gases

    Molculas ca-pazes de mudar de forma e tamanho.

    A energia uma forma de matria ao n-vel macrosc-pico.

    A razo pela qual colapsa uma lata aberta aquecida con-tendo vapor de gua quando rolhada e arre-fecida ou quan-do se inverte sobre gua fria.

    70 alunos (1 ano, 2 semestre dum curso supe-rior de Qumica).

    Simulao em computador.

    Melhor explicao do fenmeno base-ado na diminuio da presso entre a lata e o exterior, que a faz colapsar.

    Sanger, Phelps e Fienhold, 2000.

    Tabela 2.1- Resumo de alguns estudos envolvendo simulaes computacionais em Qumica.

    13

  • 2 As TIC no ensino das cincias

    2.3. Simulaes on-line

    O desenvolvimento das TIC e da sociedade da informao trouxe consigo as redes de

    computadores (e de sistemas de comunicao em geral) que, desta forma, passam a debitar

    cada vez maiores quantidades de informao.

    Neste contexto, a Internet desempenha um papel primordial no processo educativo. No

    , pois, de admirar, que escolas e universidades a utilizem para divulgar os seus cursos, para

    desenvolverem materiais de apoio ao ensino (testes, vdeos, apontamentos, etc) e, at, para

    angariar novos alunos. No anexo I indicamse alguns endereos (com descrio sumria) na

    Web, dedicados ao ensino e aprendizagem de Qumica.

    Relativamente ao processo de ensino / aprendizagem, podero ser enumerados alguns

    benefcios trazidos pela Web:

    O acesso informao praticamente ilimitado: tanto se pode visitar um museu

    virtual em Nova Iorque, como obter informao mais actualizada sobre os efeitos

    ambientais relativos camada do ozono.

    A variedade de recursos enorme: grficos, imagem, texto, som, vdeo, etc.

    A possibilidade de pesquisa e descoberta, que contribui no s para alargar o leque de

    conhecimentos do aluno, como igualmente para aumentar a sua autoestima.

    As possibilidades de comunicao via correio electrnico {email) e chat ("conversar"

    electronicamente com outros usando o teclado do computador).

    A igualdade de oportunidades para todos.

    A participao na sociedade da informao.

    Uma maior credibilidade do professor perante os alunos, na medida em que estes

    podem estudar matrias anteriormente leccionadas, de modo tradicional.

    Na Web existe praticamente informao sobre tudo o que se pretenda, em qualquer local e

    a qualquer hora. O papel do professor essencial no sentido de "filtrar" muita dessa

    informao que pode estar "distorcida" ou at cientificamente incorrecta, sendo, cada vez

    mais, um orientador que ajude os seus alunos a saber procurar e a seleccionar a melhor

    informao.

    Para o ensino e aprendizagem de Qumica, existem variadssimos sites com simulaes

    interactivas e em tempo real. A ttulo de exemplo, apresentamse alguns endereos:

    14

  • 2 As TIC no ensino das cincias

    http://www.howstufworksxorr^framed.htm?parent=atom.htm&url=http://micro.magn

    et.fsu.edu/electromag/java/rutherford/, simulao da experincia de Rutherford (figura

    2.4).

    http://www.phy.ntnu.edu.tw/java/image/rgbColor.html, que permite misturar as cores

    primrias da luz (figura 2.5).

    http://jersey.uoregon.edu/vlab/Piston/index.htmlg, simulao do comportamento de

    um gs ideal (figura 2.6).

    Figura 2.5 Imagem principal de simulao on-line que permite misturar as cores primrias da luz.

    15

    http://www.howstufworksxorr%5eframed.htm?parent=atom.htm&url=http://micro.magnhttp://et.fsu.edu/electromag/java/rutherford/http://www.phy.ntnu.edu.tw/java/image/rgbColor.htmlhttp://jersey.uoregon.edu/vlab/Piston/index.htmlg
  • 2 As TIC no ensino das cincias

    Welcome to the Pressure Chamber

    Figura 2.6 Imagem de simulao on-line da relao entre presso e temperatura, a volume constante, para um gs ideal.

    2.3.1. Vantagens das simulaes on-line

    As simulaes on-line apresentam algumas das caractersticas j mencionadas para as

    simulaes e para as TIC em sentido lato: interactividade, eliminao dos custos das

    experincias com laboratrio sempre limpo e arrumado, possibilidade de repetio sempre

    que se quiser e sem receio de errar, visualizao de fenmenos a nvel microscpico a maiores

    ou menores velocidades, etc. Acrescentese, ainda, a vantagem das simulaes na Web serem

    tipicamente de livre acesso, dado que no implica, por parte do utilizador, qualquer

    pagamento (alm do custo da utilizao da rede) para delas poder usufruir. Finalmente, h a

    referir que no ocupam espao no disco duro do computador do utilizador, no precisam de

    ser instaladas nem de se fazer o seu download, dado que esto on-line.

    2.3.2. Constrangimentos das simulaes on-line

    Apesar de todas as virtudes das simulaes on-line, alguma frustrao e desencanto no

    que diz respeito ao seu uso em contexto pedaggico tm sido apontados por diversos autores

    (Miller e Olson, 1994; Donovan e Nakhleh, 2001; Paiva, 2002):

    Uma certa "fobia" dos professores por estes materiais devido a prticas e rotinas

    enraizadas h muito, o que dificulta a sua implementao.

    Pouca conscincia e desconhecimento at das suas potencialidades.

    A inexistncia da igualdade que se reclama; a implementao das TIC no , de modo

    algum, uniforme, havendo populaes mais favorecidas do que outras. Muitos alunos

    h que no tm sequer computador, o que poder dificultar a sua relao com os

    mesmos.

    16

  • 2 As TIC no ensino das cincias

    Experincia insuficiente com as TIC, quer em termos de formao inicial dos

    professores, quer em termos de formao contnua.

    Stress dos professores na sua actividade diria.

    Convm sempre ter em mente que as simulaes so uma aproximao realidade, no

    so a realidade propriamente dita, devendo esta ideia estar sempre presente quando se

    utilizam simulaes {on-line ou no), de modo a no criar ideias erradas nos alunos que

    aprendem manipulando essas mesmas simulaes.

    Frisase, pois, que as simulaes para o ensino e aprendizagem de Qumica so, em si

    prprias e de um modo geral, um bem. A sua eficcia pedaggica, contudo, depende muito

    dos contextos e dos protagonistas.

    Feitas as contas, o balano global , porm, claramente positivo. E se j o hoje, muito

    mais ser amanh quando a massifcao da largura de banda deixar de ser uma miragem,

    nomeadamente com a ADSL (Assymetric Digital Subscriber Line), alargamento de banda via

    linha telefnica. Esta foi a razo de se ter optado por construir mdulos on-line (ver adiante

    4.2. e 5.2.).

    17

  • Captulo 3

    Foras intermoleculares

  • 3- Foras intermoleculares

    3- Foras intermoleculares

    3.1. Definio

    As foras que se estabelecem entre molculas so designadas foras intermoleculares.

    Tal como as foras intramoleculares (mais conhecidas por covalentes, entre tomos dentro de

    uma molcula), so de natureza electrosttica (repulses entre electres, repulses entre

    ncleos e atraces entre ncleos e electres). A figura seguinte ilustra a diferena entre

    foras intermoleculares e intramoleculares.

    Ligaes _ intermoleculares

    H-Cl

    Ligaes intramoleculares

    Figura 3.1- Ligaes intramoleculares vs ligaes intermoleculares em molculas de HC1.

    No entanto, as ligaes intramoleculares so, de um modo geral, mais fortes que as

    ligaes intermoleculares. Por exemplo, para se conseguir separar, a 100 C, uma mole de

    molculas de gua lquida, fenmeno representado pela equao

    H20(1) - H20(g)

    necessria uma energia de 41 kJ. Entretanto, a separao de uma mole de molculas de

    vapor de gua nos seus elementos, representada por

    H20(g) > 2H(g) + 0(g )

    exige a energia de 930 kJ (Gil, 2001).

    3.2. Dipolo elctrico

    Qualquer que seja o tipo de ligao intermolecular, est sempre presente o conceito de

    dipolo elctrico (Gil, 2001), que poder ser permanente, caso de molculas polares (e.g., HC1)

    ou que tenha que ser formado (instantneo), como o caso de molculas apoiares (02, N2,

    CH4, etc).

    19

  • 3- Foras intermoleculares

    Um dipolo elctrico pode ser definido como um conjunto de -*

    cargas elctricas pontuais, qA e q&, os plos, separadas entre si a * ^

    uma distncia r (Atkins, 1998). Uma medida quantitativa da Q (+)

    polaridade de um dipolo dada pelo momento de dipolo (ou r

    momento dipolar), //, representado por um vector com sentido da umd^iol^ri.Cntaa

    carga negativa para a carga positiva (figura 3.2) e de intensidade

    H = qy.r (3.1)

    Embora no sistema internacional de unidades (SI) as unidades de ju sejam C m (coulomb

    metro), vulgar, no entanto, exprimi-las em D (debye), sendo 1 D = 3,33564 x 10" C m. C

    a unidade SI para carga elctrica.

    Numa molcula, a existncia de um dipolo elctrico resultante das diferentes

    electronegatividades dos tomos que participam na ligao qumica: os electres da ligao

    so mais fortemente atrados pelo tomo mais electronegativo. Deste modo, os electres esto

    mais deslocados na direco de um dos tomos, gerando junto deste uma zona com excesso

    de electres (um plo 8") e, junto do outro, uma zona com deficincia de electres (um plo

    +). Dipolos elctricos existem, por exemplo, em molculas como H2O ou em HC1, como a

    seguir se representa (figura 3.3).

    S" 6" 0

    / \ H H + -5+ 5+ H Cl

    Figura 3.3- Esquema dos dipolos elctricos em H20 e HC1. Por simplificao, no esto representados os pares de electres no ligantes.

    Podem representar-se os dipolos de outra forma tendo em conta a nuvem electrnica das

    molculas (figura 3.4).

    Ch & &

  • 3- Foras intermoleculares

    independentemente por Joseph Priestley e Charles Coulomb (Oxtoby e Hachtrieb, 1990),

    dada por (Atkins, 1998; Chang, 2000):

    F = & < 3 - 2 )

    Nesta equao, b = 8,845 x IO"12 C2 J"1 m"1 a permitividade no vazio.

    Noutro meio (ar ou um lquido, e.g.), ser dada por (Atkins, 2000)

    F = ^ \ (3. 3) 471 er

    onde e a permitividade do meio, definida como e = % SQ, sendo % a permitividade relativa

    (ou constante dielctrica) do meio. Por sua vez, a energia potencial elctrica, V, do sistema dada por (Chang, 2000):

    v=A_qjL (3.4) 4%e0r

    3.2.2. Molculas polares e molculas apoiares

    Relacionado com a existncia de dipolos elctricos numa molcula est o facto de haver

    molculas polares e molculas apoiares. Se o momento de dipolo resultante, //res, da molcula

    for nulo, esta ser apolar; se for no nulo, ser polar.

    Molculas diatmicas heteronucleares so polares, havendo uma relao estreita entre ju e

    a diferena de electronegatividades, x, dos seus tomos (Atkins, 1998) dada por /u I D A%.

    Por exemplo, HC1 e Hl apresentam valores ju ID 1,08 e 0,42, respectivamente.

    Molculas homonucleares podem ser apoiares (e.g., para H2, / / / D = 0) e podem ser

    polares, apesar de no haver diferena de electronegatividade entre os seus tomos. -

    Um exemplo a molcula de ozono, O3, que polar devido ^

    sua geometria (angular) e devido ao facto de a densidade o

    electrnica ser menor no seu tomo central (figura 3.5). Nesta ' ^ O O

    molcula, (///D) = 0,53. " 5" Figura 3.5- Interpretao da polaridade de 03 . In Atkins, 1998.

    Molculas poliatmicas polares tm um momento de dipolo "global", resultante, /yres, no

    nulo: a combinao dos vrios momentos de dipolo da molcula diferente de zero (figura

    3.6- a). Desta forma, a molcula pode ser reduzida a um dipolo (figura 3.6- b).

    21

  • 3 Foras intermoleculares

    - S" 8" - MK. O V ^ B

    + H H

    /

  • 3- Foras intermoleculares

    1- Dipolo instantneo - dipolo induzido.

    2- Dipolo permanente - dipolo permanente.

    3- Dipolo permanente - dipolo induzido.

    4- Io - dipolo.

    5- Ligao de hidrognio.

    A intensidade destas ligaes , de um modo geral, decrescente no sentido ligaes io -

    - dipolo, ligaes de hidrognio, dipolo permanente - dipolo permanente, dipolo permanente -

    - dipolo induzido, dipolo instantneo - dipolo induzido. No entanto, esta intensidade depende

    de vrios factores como sejam a constante dielctrica do meio, a distncia de separao entre

    as molculas, a carga de ies envolvidos, os momentos de dipolo e a polarizabilidade

    molecular (Chang, 2000). Pode dar-se, por exemplo, o caso de uma ligao entre molculas

    apoiares (dipolo instantneo - dipolo induzido) ser mais forte que uma ligao entre

    molculas polares (dipolo permanente - dipolo permanente), como se descreve em 3.3.1. E o

    caso do iodo, que slido temperatura ambiente e que remete para algum cuidado quando se

    diz "as ligaes nesta molcula so fracas", sendo ligaes dipolo instantneo - dipolo

    induzido. Como se discutir adiante (3.4.1.), o estado fsico de uma subtncia depende da

    intensidade das suas ligaes intermoleculares.

    Os trs primeiros grupos so designados, no seu conjunto, por foras de Van der Waals.

    Estes cinco tipos de ligaes sero caracterizadas sucintamente. Ser igualmente caracterizada

    a ligao tnica (apesar de esta no ser uma ligao intermolecular) para comparao

    (equaes e energias de ligao) com as ligaes intermoleculares.

    3.3.1. Ligao dipolo instantneo - dipolo induzido

    As ligaes dipolo instantneo - dipolo induzido ocorrem em molculas apoiares, quer

    monoatmicas (He, Ne, Ar, e.g.), quer poliatmicas (CCU, CH4, N2, H2, e.g.). Como os

    electres nas molculas esto constantemente em movimento, num determinado instante

    podem acumular-se numa dada zona da molcula: forma-se um dipolo instantneo, que pode,

    noutro instante, ter orientao diferente. Esse dipolo, vai criar, em molculas mais prximas, a

    formao de outros dipolos, designados dipolos induzidos: a zona do dipolo instantneo com

    excesso de electres vai repelir electres de molculas vizinhas; a parte com deficincia de

    electres vai atrair electres de molculas vizinhas (Russo e Silver, 2000). Este processo

    prossegue entre as molculas envolvidas. Entre as zonas de carga elctrica contrria surgem

    23

  • 3- Foras intermoleculares

    foras responsveis pela ligao entre as molculas. Estas foras so geralmente designadas

    porforas de disperso de London. Na figura 3.8 representa-se globalmente o fenmeno.

    l i

    32=) c-tf) c-t:-tf) :& (-:::]

    > S> +S) +v--(r+^

    Figura 3.8- Representao esquemtica da ligao dipolo instantneo - dipolo induzido.

    a. Molculas apoiares (A, B e C).

    b. Polarizao instantnea de A.

    c. O dipolo instantneo em A vai induzir dipolos em B e em C. d. Entre zonas de sinal contrrio surgem interaces responsveis pela ligao

    A KzJi^ A vsC_3

  • 3 Foras intermoleculares

    Nesta expresso

    IA e TB so as primeiras energias de ionizao de A e B,

    respectivamente.

    OTA e 0 as polarizabilidades de A e B, respectivamente.

    r a distncia entre A e B.

    A equao anterior mostra a dependncia da energia potencial relativamente a r6: a

    energia potencial sofre uma reduo drstica quando a distncia entre as molculas aumenta.

    3.3.2. Ligao dipolo permanente dipolo permanente

    Este tipo de ligao ocorre entre molculas polares, ou seja, com momento de dipolo (//)

    no nulo. So igualmente designadas por ligaes dipolo dipolo e ocorrem, por exemplo, em

    H2S, HC1 e CH3COCH3. A interaco ocorre entre os plos de sinal contrrio nas molculas

    (figura 3.9).

    + 8" + 5" + " H Cl H C l HCl

    ClH S" +

    Figura 3.9 Representao de interaces () entre molculas de HC1.

    A energia potencial da interaco entre dipolos depende da sua orientao relativa

    (Atkins, 1998).

    Considerando dois dipolos, A e B, distncia r com a . B orientao da figura 3.10, a expresso da energia potencial dada ~_j) ~S^

    por (Chang, 2000) * *>

    ~ Figura 3.10 Representao da y _ _ "A "B /3 g\ orientao de dois dipolos

    4 71 S r3 permanentes.

    onde JUAQ JUB so os momentos de dipolo de A e B, respectivamente, 5, a permitividade no

    vazio e r a distncia entre os dipolos.

    Com uma orientao semelhante da figura 3.11, a energia / ^ . / ^

    potencial dada por (Chang, 2000) \ / r ~\+J

    Figura 3.11 Representao y __ A*A f*B (3.10) ^ orientao de dois

    4 7 r e n r 3 dipolos permanentes.

    25

  • 3- Foras intermoleculares

    Para um sistema de dipolos dispostos paralelamente (figura

    3.12), a energia potencial dada por (Atkins, 1998)

    v= yMA//B(l-3cos2e) 4 7t e r 3 Figura 3.12- Orientao

    paralela de dois dipolos permanentes.

    sendo 0 o ngulo definido nas condies da figura.

    Em sistemas macroscpicos, onde todas as orientaes dos dipolos so possveis, a

    energia potencial (mdia) dada por (Atkins, 1998; Chang, 2000)

    V=-- M'M\ ft (3.12) 3 ( 4 T I 0 ) V kT

    Nesta equao, k = 1,381 *10~23 J K"1 a constante de Boltzmann e T a temperatura

    absoluta. Na mesma evidencia-se a dependncia da energia potencial relativamente a r : tal

    como na equao 3.8, h uma reduo drstica da energia potencial quando a distncia entre

    as molculas aumenta. H, igualmente, a destacar a dependncia relativamente ao inverso de

    T, dado que, a temperaturas superiores, a energia cintica mdia das molculas maior,

    tornando-se desfavorvel orientao dos dipolos para interaco atractiva (Chang, 2000).

    3.3.3. Ligao dipolo permanente - dipolo induzido

    Esta ligao pode ser definida como a ligao entre uma molcula polar (e.g., H2O) e

    uma molcula apolar (e.g., O2).

    A aproximao de uma molcula polar (um dipolo A B

    elctrico permanente) provoca uma distoro da nuvem (t~~z) ^ (^) a

    electrnica na molcula apolar, induzindo nesta ltima um _ . . . b

    dipolo. O dipolo induzido pode, ento, interagir com o dipolo permanente, estabelecendo-se interaco entre eles Fifa 3.13-a. Uma molcula polar (A)

    r r induz um dipolo numa molcula apolar f-fipiira "> 1 -J\ (B). b. Entre estes surge interaco * ' responsvel pela ligao ().

    assim que se explica, por exemplo, a, embora pequena, solubilidade do oxignio (O2)

    em gua, essencial para a vida de muitos organismos nesse meio (peixes, por exemplo). Estas

    interaces so geralmente fracas, o que explica a no miscibilidade e/ou a pequena

    solubilidade de substncias apoiares em solventes polares.

    A energia potencial para um sistema dipolo permanente - dipolo induzido separados

    distncia r dada por (Atkins, 1998; Chang, 2000)

    26

  • 3- Foras intermoleculares

    V = ^ (3.13) 47te0 r6

    onde a a polarizabilidade da molcula apolar e ju o momento de dipolo da molcula polar.

    Um io pode, de forma semelhante, induzir um dipolo numa molcula apolar. o caso,

    por exemplo, de Na+- CH. Neste caso, a energia potencial dada por (Chang, 2000)

    1 aq 2 V=-- * . (3.14) 2 471 e0 r

    sendo a a polarizabilidade da molcula, q a carga do io, o a permitividade no vazio e r a

    distncia entre o io e a molcula.

    3.3.4. Ligao io - dipolo

    Este tipo de ligao refere-se interaco entre ies e molculas polares (dipolos

    permanentes), permitindo a dissoluo de compostos inicos em solventes polares. Um

    exemplo a dissoluo de NaCl em H2O, representada pela equao

    NaCl(s) H 2 > Na+(aq) + Cl" (aq)

    Tanto os caties (Na+) como os anies (Cl") ligam-se s molculas de gua (solvatao)

    por foras io - dipolo, sendo a interaco (de natureza electrosttica) estabelecida entre o io

    e o plo de carga elctrica contrria do dipolo (figura 3.14).

    s- / H / H N a + - O + 8"O 5 + - d *

    "-H ^ H

    Figura 3.14- Representao de interaces io - dipolo em NaCl / H20.

    Estas interaces so tanto mais fortes quanto menor for o tamanho do io (para ies com

    a mesma carga) e quanto maior for a carga, para ies de tamanho semelhante (Chang, 2000;

    Gil, 2001).

    A ligao tnica particularmente forte (ver, na tabela 3.3, os valores de energia de

    ligao), pelo que estas interaces devem ser vencidas para que, por exemplo, NaCl se

    dissolva em gua. a elevada constante dielctrica da gua (tabela 3.1) que reduz as foras de

    atraco entre os ies, Na+ e Cl", permitindo que estes se separem em soluo (Chang, 2000).

    27

  • 3- Foras intermoleculares

    Lquido Constante dielctrica

    H2S04 101 H20 78,5 C3H803 (glicerol) 42,5 CH3OH 32,6 C2H5OH 24,3 CH 4,6 C2H5OC2H5 4,3 CH3COCH3 2,7 cs2 2,6

    Tabela 3.1- Constantes dielctricas de alguns lquidos puros, a 25 C. In Chang, 2000.

    Em termos de energia potencial, para um arranjo em que o io e (7y - -

    o dipolo estejam no mesmo eixo distncia r (figura 3.15), a energia '** ~

    potencial dada por (Chang, 2000)

    q/i

    Figura 3.15- Representao de interaco io-dipolo.

    v=-4ne0 r

    (3.15)

    onde q a carga do io e // o momento de dipolo da molcula polar.

    3.3.5. Ligao de hidrognio

    A ligao (ou ponte) de hidrognio pode ser considerada um caso particular da ligao

    dipolo - dipolo, ocorrendo em molculas com uma constituio do tipo A - H B, onde A e

    B so muito electronegativos e B tem um par de electres no ligantes (Chang, 2000). O

    hidrognio faz de ligao ou ponte entre dois tomos muito electronegativos pertencentes a

    duas molculas.

    Este tipo de ligao nico na medida em que o hidrognio possui apenas um electro.

    Quando este participa numa ligao intramolecular com um tomo muito electronegativo, o

    ncleo de hidrognio fica parcialmente desprotegido. Desta forma, H+ pode interagir com

    outro tomo fortemente electronegativo de outra molcula (Chang, 2000). Na figura 3.16

    representam-se ligaes de hidrognio em H20 e em H20 / NH3.

    28

  • 3- Foras intermoleculares

    0 / \

    H H

    / \ / \ i H . .H H

    0 / \

    H H

    II \

    .HN / y 0

    / \ H H

    Figura 3.16- Representao de ligaes de hidrognio (...) em a. H20;b. H20/NH3 .

    Em geral, esta ligao est limitada participao de tomos de N, O e F, mas Cl pode

    igualmente participar em ligaes de hidrognio se pertencer a um composto tnico (Atkins,

    1998). de referir igualmente que podem ocorrer, numa molcula, ligaes intramoleculares

    de hidrognio (Chang, 2000). o caso do cido mlico, onde a ligao se estabelece entre

    grupos - COOH e grupos - COO" (figura 3.17).

    o W . H\ /- cq

    H \ ^ C O O H C

    % X > C HT ^ C O H COOH //

    O

    Figura 3.17- a. Frmula de estrutura do cido mlico. b. Representao de ligaes intramoleculares de hidrognio no cido mlico.

    Se houver ligaes de hidrognio entre molculas, esta predominante relativamente s

    outras ligaes intermoleculares, dado ser mais intensa que qualquer uma delas. Comparando

    a energia de ligao mdia destas ligaes com as restantes (tabela 3.2), possvel verificar-se

    que , em mdia, cerca de dez vezes mais forte que a ligao dipolo permanente - dipolo

    induzido ou trs vezes mais forte que a ligao dipolo - dipolo. (Dado que na ligao io -

    - dipolo participam ies e no apenas molculas, esta no pode ser considerada uma ligao

    intermolecular tpica.)

    a ligao de hidrognio que explica que a gua seja lquida nas condies normais de

    presso e de temperatura, sendo igualmente responsvel pelo seu elevado ponto de ebulio,

    como ser abordado em 3.4.2.2.

    Ocorrem igualmente ligaes de hidrognio em molculas maiores, como lcoois, cidos

    carboxlicos, em misturas de cidos carboxlicos com gua, de etanol com gua, entre os pares

    29

  • 3- Foras intermoleculares

    de bases adenina - timina e citosina - guanina na molcula de cido desoxirribonucleico, ADN

    (figura 3.18), e nas protenas (figura 3.19).

    Adenina H Timina

    N NH O Pn3

    - N ' ^ C N H is] CH. ' M Acar , % M

    / N /)N\. / ' ' Acar

    O y Grupo fosfato \

    Grupo fosfato H

    / Citosina O HN Guanina

    _ ^ N \ \ = N A - I \ I \ ^Acar

    /AUC" {/ H _ V O \ \ II \ . / Grupo fosfato

    Grupo fosfato ^ H Q N /

    H

    Figura 3.18- Representao de ligaes de hidrognio entre pares adenina - timina e entre pares citosina - guanina na molcula de cido desoxirribonucleico (ADN).

    HN C = 0 \ /

    C = 0 H N < >

    NH 0 = C / \

    0 = C N H > <

    H - N / C = 0 / C = 0 HN

    \

    Figura 3.19- Representao de ligaes de hidrognio entre cadeias polipep-tdicas numa protena.

    3.3.6. Ligao inica

    A ligao inica corresponde ligao entre ies, por exemplo entre Na+ e Cl" em NaCl.

    igualmente devida a foras de natureza electrosttica (atraco entre cargas elctricas de

    sinal contrrio, repulso entre cargas do mesmo sinal).

    Para um arranjo de dois ies separados, no vazio, distncia r, entre CL)""C+)

    si (figura 3.20), a energia potencial do sistema dada por '"***'

    n n Figura 3.20- Interaco V = - H+q- ( 3 . 1 6 ) inica(-) .

    471 e 0 r

    30

  • 3- Foras iritermoleculares

    onde q+ e q. so as cargas dos ies respectivos, r a distncia entre eles e &) a permitividade no

    vazio.

    Para o caso da interaco entre Na+ e Cl", a energia potencial devida s foras de atraco

    dada por (Chang, 2000)

    F a _ g N a + g q - (3.17) 471 e0 r

    sendo gNa+ e qCy as cargas de Na+ e Cl", respectivamente.

    Tendo em conta as interaces relativas s repulses interelectrnicas e internucleares, a

    energia potencial deste par dada por (Chang)

    Na* Cl-4ne0re

    i-ll (3.18)

    onde Fo se refere energia necessria para romper a ligao mais estvel distncia ree n

    um nmero entre 8 e 12.

    A tabela 3.2 resume as caractersticas dos vrios tipos de foras, nela se incluindo

    igualmente a ligao inica (no sendo esta ltima uma ligao intermolecular).

    3.4. Importncia das foras intermoleculares

    O estado fsico de uma substncia depende essencialmente do balano entre a intensidade

    das foras intermoleculares (que tende a orden-las) e os incessantes movimentos das

    molculas (que tendem a criar desordem). Dependendo do balano entre estes dois factores,

    assim a substncia se apresenta no estado slido, lquido ou gasoso. A intensidade dos

    movimentos, por sua vez, depende da temperatura, que determina igualmente o estado fsico.

    De uma forma geral, a intensidade das foras intermoleculares influencia o estado fsico da

    substncia e os seus pontos de fuso e de ebulio (Gil, 2001).

    3.4.1. Estados fsicos

    Substncias muito semelhantes do ponto de vista de constituio qumica podem, devido

    natureza e intensidade das foras intermoleculares, existir, nas mesmas condies, em

    estados fsicos diferentes. o caso de H2S, que um gs, e de H2O, que um lquido. Na

    primeira, as foras intermoleculares predominantes so dipolo - dipolo, enquanto na segunda

    so ligaes de hidrognio, mais fortes que as primeiras (em H2O existem ligaes de

    hidrognio devido grande electronegatividade do oxignio, O).

    31

  • 3- Foras intermoleculares

    Fora intermolecular

    Representao esquemtica

    Expresso da energia potencial

    Exemplos Energia de ligao(1)/ kJ mol"1

    Dipolo instantneo -- dipolo induzido o-o 4 r6 Ne Ne CH4 CH4 4,0-40 Dipolo - dipolo o-o y 2 V\li\ 1 3 ( 4 J I e 0 ) V kT HCl HCl S02 so2 0,50-15 Dipolo - dipolo

    induzido -o v a^ HCl C6H6 H20 0 2 0,40-4,0 Dipolo - dipolo induzido -o 6 471 e0 r HCl C6H6 H20 0 2

    0,40-4,0

    Io - dipolo C>-43>

    v w Na+ H20 Cl H20

    5,0 - 60 Io - dipolo C>-43>

    2

    471 0 r

    Na+ H20

    Cl H20 5,0 - 60

    Ligao de hidrognio A H - B

    No h expresso H 2 0 - H 2 0

    HF - H F 4 ,0-40

    Ligao inica

    r

    V-- q+q 4ne0 r

    Na+ Cl"

    Cu2+ SO^ 40 - 400

    (1) Energia de rede no caso da ligao inica. Os valores reais das energias de ligao dependem da distncia de separao, da carga, momento de dipolo, polarizabilidade e da constante dielctrica do meio. Tabela 3.2- Resumo das caractersticas essenciais das diversas foras intermoleculares e da ligao inica. Adaptado de Chang, 2000.

    De forma semelhante, nas mesmas condies de temperatura e presso, h um slido,

    Br2 lquido, enquanto CI2 e F2 so gases (note-se que estas molculas so todas de

    halogneos). A explicao reside no facto de as ligaes intermoleculares (nestes casos,

    dipolo instantneo - dipolo induzido, ou foras de disperso) serem mais intensas no sentido

    F2, Cl2, Br2 e I2.

    Lquidos onde as ligaes intermoleculares sejam CH2-OH

    particularmente fortes so pouco volteis e podem mesmo QH _ Q H

    apresentar-se viscosos. o caso, por exemplo, da glicerina (ou ^ _ Q U

    glicerol) que, devido sua composio (figura 3.21), pode formar Figura 3.21- Frmula de

    vrias ligaes de hidrognio intermoleculares. estrutura do glicerol.

    3.4.2. Mudanas de estado fsico

    A mudana de estado fsico para uma substncia depende da intensidade das suas foras

    intermoleculares. Deste modo, os pontos de fuso e os pontos de ebulio de uma substncia

    32

  • 3- Foras intermoleculares

    sero tanto mais elevados quanto maior a intensidade das foras intermoleculares. Por

    exemplo, presso normal, a gua, H20, entra em ebulio a cerca de 100 C, enquanto o ter

    dietlico, C2H5OC2H5, entra em ebulio a cerca de 36 C.

    3.4.2.1. Mudana de estado fsico e foras de disperso

    Como j foi referido, a intensidade das foras de disperso proporcional ao nmero de

    electres e ao tamanho das molculas e diminui (no caso de ismeros) com o aumento de

    ramificao da cadeia.

    por isso que, por exemplo, o ponto de ebulio de I2 superior ao de Br2, ao de CI2 e de

    F2, todas molculas de halogneos. O mesmo se passa com o aumento nos pontos de fuso

    (grfico 3.1).

    400

    300

    200

    100

    Grfico 3.1- Relao entre pontos de ebulio e pontos de fuso de algumas molculas com o seu tamanho e nmero de electres. In Gil, 2001.

    Da figura anterior, concluses semelhantes se podem tirar quanto aos pontos de fuso e

    de ebulio no caso dos gases raros: o tamanho das molculas e o nmero de electres est a

    aumentar ao longo do perodo, tornando as molculas mate polarizveis.

    Na tabela seguinte mostram-se alguns pontos de ebulio e estados fsicos de alguns

    alcanos de cadeia linear, evidenciando-se a relao entre estes e o aumento da cadeia

    carbonada (e do nmero de electres).

    33

  • 3- Foras intermoleculares

    Nome do alcano

    Frmula molecular

    Ponto de ebulio / C

    Estado fsico (PTN)

    Metano CH4 -162 Gs Etano C2H6 -89 Gs

    Propano C3H8 -42 Gs Butano C4H10 -0,5 Gs Pentano C5H12 36 Lquido Hexano C H H 69 Lquido Octano C8H18 126 Lquido Icosano C20H42 344 Slido

    Tabela 3.3- Relao entre foras de disperso, pontos de ebulio e estado fsico nalguns alcanos. In Gil, 2001.

    A forma da molcula pode igualmente influenciar a intensidade das foras de disperso.

    Assim, por exemplo, o pentano (alcano linear) e o tetrametilmetano (alcano de cadeia

    ramificada) tm pontos de ebulio diferentes: 36 C para o primeiro e 10 C para o segundo

    (Gil, 2001). A explicao reside no facto de o primeiro ter uma nuvem molecular mais

    polarizvel que o segundo, como se pode concluir a partir das respectivas frmulas de

    estrutura. Na tabela 3.4 apresentam-se algumas propriedades caractersticas destes ismeros.

    Frmula molecular C5H12 C5H12

    Frmula de estrutura CH3-CH2-CH2-CH2-CH3

    H j

    Nome IUPAC Pentano Tetrametilmetano

    Ponto de ebulio / C 36 10

    Tabela 3.4- Comparao entres pontos de ebulio de dois alcanos ismeros. In Gil, 2001.

    As formas diferentes das molculas vo fazer com que as interaces sejam diferentes

    nos dois casos: mais intensas no caso do ismero de cadeia linear e mais fracas no caso do

    ismero de cadeia ramificada (figura 3.22).

    34

  • 3- Foras intermoleculares

    B

    Figura 3.22- Interpretao dos pontos de ebulio de pentano (A) e de tetrametilmetano (B). Em A, os dipolos instantneos tendem a interagir com maior intensidade que em B, devido ao facto de a forma da nuvem electrnica permitir uma maior superfcie de contacto. Adaptado de Atkins e Jones, 2000.

    3.4.2.2. Mudana de estado fsico e ligaes de hidrognio

    O aumento da intensidade das foras de disperso e, consequentemente, o aumento do

    ponto de ebulio com o nmero de electres em molculas semelhantes ocorre igualmente

    nas sries

    HC1, HBr, Hl H2S, H2Se, H2Te PH3, AsH3, SbH3

    como se pode constatar pelo grfico seguinte.

    o 100 H 2 0

    Grupo 16 \

    3 x>

  • 3- Foras intermoleculares

    3.5. Repulses e interaces globais

    Alm de foras responsveis pela atraco e consequente aproximao das molculas

    (entre ncleos e electres), h foras repulsivas que tendem a afast-las. Caso isto no

    acontecesse, as molculas fundir-se-iam (Chang, 2000). Esta hipottica fuso evitada por

    foras entre electres e por foras entre os ncleos que tendem a afastar as molculas. A

    impossibilidade de fuso mais no do que consequncia do princpio da excluso de Pauli

    que impede que dois electres tenham o mesmo nmero quntico de spin e, por isso, no

    podem estar ao mesmo tempo no mesmo local. As molculas vo, deste modo, distar umas

    das outras, tendo em conta um compromisso entre foras de atraco e foras de repulso.

    Analisando curvas de energia potencial, verifica-se que, medida que as molculas se

    aproximam, as repulses interelectrnicas e internucleares aumentam significativamente

    (figura 3.23).

    Repulso

    Curva de energia potencial

    Distncia / r

    Atraco

    Figura 3.23- Representao genrica de uma curva de energia potencial para uma molcula. In Atkins, 1998.

    Para sistemas no inicos, a energia potencial dada por

    6 12 r r

    (3.19)

    Nesta equao, A e B so constantes para as molculas envolvidas, Air representa o

    termo relacionado com as foras de atraco e B I rn o termo relacionado com as foras de

    repulso.

    A equao anterior normalmente expressa na forma de uma equao conhecida por

    potencial de Lennard-Jones:

    36

  • 3- Foras intermoleculares

    V = 4e ( V

    \ r )

    , v V A J

    (3.20)

    Nesta equao, ro e e representam a distncia para a qual V = 0 e a profundidade do poo

    na curva de energia potencial, respectivamente (figura 3.24). O mnimo do poo, re, ocorre 1/6 para re = 2 r0.

    1/r (Atraco)

    Figura 3.24- Relao entre os parmetros e r0 da curva de energia potencial de Lennard-Jones. Adaptado de Atkins, 1998.

    O valor de ro d uma ideia de quanto dois tomos separados se podem aproximar. E

    frequente ser expresso como o raio de Van der Waals, que corresponde a metade desta

    distncia.

    Na tabela 3.5 apresentam-se alguns valores para os parmetros de Lennard-Jones para

    algumas molculas.

    Molcula (e/k)/K rn/pm Ar 111,8 362,3 Xe 214,0 426,0 F2 104,3 357,1 N2 91,85 391,9

    CH 377,5 617,4 CCU 378,9 624,1

    Tabela 3.5- Parmetros de Lennard-Jones de algumas molculas. In Atkins, 1998.

    37

  • Captulo 4

    Caso I: Ensino da polaridade molecular no 9o ano

  • 4- Caso I: Ensino da polaridade molecular no 9o ano

    4- Caso I: Ensino da polaridade molecular no 9o ano

    4.1. Contexto

    4.1.1. Contexto cientfico - pedaggico

    As simulaes que foram desenvolvidas esto relacionadas com contedos a leccionar na

    componente de Qumica na disciplina Cincias Fsico-Qumicas 9o ano de escolaridade,

    estando integrados na unidade temtica "Como a matria em mais pormenor" (Programa de

    Cincias Fsico-Qumicas, 1994).

    Tradicionalmente, a Qumica considerada uma disciplina difcil, com um insucesso

    geralmente elevado (Carter e Brickhouse, 1989; Martins et ai, 2002). As dificuldades podem

    ser atribudas a vrios factores, desde o grau de abstraco envolvido em muitos conceitos at

    dificuldades inerentes a uma linguagem prpria (Ayas e Demirbas, 1997). Nakhleh (1992)

    refere que a razo principal a no compreenso de conceitos fundamentais nos quais

    assentam outros mais avanados. Sem a compreenso de conceitos elementares no possvel

    a compreenso de conceitos mais complexos, dependentes dos primeiros.

    Devido sua natureza dinmica, a visualizao e a compreenso de fenmenos qumicos

    a nvel microscpico so particularmente difceis (Nurrenbern e Pickering, 1987; Smith e

    Metz, 1996; Sanger, 2000; Sanger, Phelps e Fienhold, 2000). Alguns destes fenmenos esto

    bastante estudados como sejam, por exemplo, o equilbrio qumico (Hameed, Hackling e

    Garnett 1993; Tyson, Treagust e Bucat, 1999), oxidao-reduo (Ogude e Bradley, 1996;

    Sanger e Greenbowe, 1997), o conceito de reaco qumica (Barker, 1999; Ahtee e Varjola,

    1998) ou calor vs temperatura (Caldeira e Martins, 1990; Harrison, Grayson e Treagust,

    1999). Muitos destes fenmenos so, pela sua natureza, dinmicos, no sendo, em geral, fcil

    visualiz-los com representaes estticas (livros, manuais, quadro preto, etc), por melhores

    que estas possam ser.

    Por outro lado, frequente os alunos resolverem facilmente problemas com base em

    frmulas e algoritmos memorizados sem a compreenso dos fenmenos ao nvel

    atmico / molecular (Nurrenbern e Pickering, 1987; Sawrey, 1990; Nakhleh, 1993; Nakhleh e

    Mitchell, 1993; Smith e Metz, 1996). Alunos h que memorizam esquemas de resoluo de

    problemas, algoritmos e definies sem compreenderem verdadeiramente, na essncia, muitos

    conceitos. Muitos alunos inclusive passam pelo sistema educativo com sucesso continuado

    durante anos a Qumica, sabendo resolver problemas sem a compreenso dos conceitos que

    lhes esto subjacentes (Nicoll, 2001). Nurrenbern e Pickering (1987) referem alunos que

    39

  • 4 Caso I: Ensino da polaridade molecular no 9o ano

    resolvem problemas envolvendo clculos estequiomtricos e reagente limitante numa equao

    sem terem noo das alteraes que ocorrem durante a reaco qumica, apresentando

    dificuldades quando solicitados a escrever uma equao qumica a partir de representaes

    simblicas de molculas. Yarroch (1985), num estudo levado a cabo com alunos

    universitrios, detectou dificuldades na escrita correcta dos produtos de reaco dada por

    N2 + 3 H2 > 2 NH3 quando lhes era proposta uma representao simblica das molculas.

    No entanto, os mesmos alunos acertavam correctamente equaes qumicas. Segundo Turner

    (1990), as dificuldades de muitos alunos em cursos de Qumica podem ser atribudas ao facto

    de "nunca terem aprendido a visualizar sistemas qumicos" (pp 955). Williamson e Abraham

    (1995) referem que "a falta da compreenso de conceitos qumicos pode estar relacionada

    com a incapacidade dos alunos em construrem modelos mentais completos que permitam

    visualizarem ao nvel microscpico" (pp 521). sabido que a no compreenso de contedos

    poder levar desmotivao de um aluno, e que um aluno motivado tende a empenharse

    mais profundamente naquilo que est a realizar (Carvalho, 1999).

    A polaridade molecular um assunto cuja compreenso remete igualmente para o

    domnio do "mundo microscpico". Recordese (ver 3.2.2.) que uma molcula considerada

    polar se tiver um momento de dipolo resultante no nulo; caso contrrio, apolar. Por sua

    vez, o momento de dipolo depende da geometria da molcula e da existncia ou no de

    ligaes polares. Estas ltimas, por sua vez, dependem da diferena de electronegatividade

    entre os tomos da ligao.

    Entre as dificuldades e/ou ideias erradas identificadas na literatura relativas ao tema

    incluemse:

    A polaridade depende apenas da geometria molecular, no interessando se as

    molculas tm ou no ligaes polares e a posio relativas destas (Furi e Catalayud,

    1996).

    A polaridade depende apenas da diferena de electronegatividades entre os tomos

    envolvidos nas ligaes (Peterson e Treagust, 1989; Furi e Catalayud, 1996; Birk e

    Kurtz, 1999).

    Uma molcula polar apenas porque tem ligaes polares (Birk e Kurtz, 1999).

    A polaridade determina a geometria da molcula (Peterson e Treagust, 1989; Nicoll,

    2001).

    A polaridade no est associada electronegatividade (Nicoll, 2001).

    40

  • 4 Caso I: Ensino da polaridade molecular no 9 ano

    A presena de electres no ligantes determina a polaridade de uma molcula

    (Peterson, Treagust e Garnett, 1989).

    Destes estudos h a destacar a pouca importncia dada geometria molecular na

    determinao da polaridade das molculas, ignorandose, praticamente, o seu efeito.

    A polaridade de uma substncia molecular pode ser avaliada aproximando desta um

    objecto electrizado. A electrizao do objecto pode ocorrer de diversas formas (Aido et ai,

    1983), nomeadamente por:

    Contacto.

    Influncia.

    Frico.

    A deteco de carga elctrica pode ser feita com auxlio de um electroscpio, aparelho

    que contm, genericamente, duas folhas de ouro ligadas a um condutor isolado que termina

    num boto esfrico (figura 4.1).

    Figura 4.1 a. Electrospio. b. Representao simplificada.

    No havendo carga elctrica em excesso, as folhas do electroscpio mantmse juntas e a

    prumo. Quando a esfera for tocada por um objecto com excesso de carga negativa (uma rgua

    de plstico friccionada por um pano de l, por exemplo), parte dos electres do objecto

    passam para a esfera do electroscpio e destas para as folhas, que, ento, se afastam (repelem

    se) em virtude de ficarem electrizadas com carga de sinal igual. Se a esfera for tocada por um

    objecto com excesso de carga positiva (uma barra de vidro friccionada com um pano de seda,

    por exemplo), passam electres da esfera para o vidro e, por causa disso, das folhas para a

    esfera. Desta forma, as folhas ficam com excesso de carga positiva e, por isso, repelemse,

    afastandose (Tipler, 1995).

    41

  • 4 Caso I: Ensino da polaridade molecular no 9o ano

    4.1.1.1. Electrizao por contacto

    Um objecto pode ser electrizado por aco de outro + + carregado electricamente por contacto directo. E o que + + + + + + + +

    + + +

    + + +

    7\

    acontece, por exemplo, quando, no boto de um

    electroscpio, se toca com um objecto com carga elctrica

    (figura 4.2): as folhas do electroscpio afastamse

    indicando, assim, que tambm este foi electrizado (Aido et Figura 4 2. Representavo da electriza. ; 1 o c n ?a de um electroscpio por contacto. In

    ai, ^). Aido e/a/, 1983.

    4.1.1.2. Electrizao por influncia

    Quando um objecto electrizado se aproxima de um condutor neutro isolado, pode haver a

    electrizao do ltimo sem haver transferncia de electres entre eles. O objecto electrizado, o

    indutor, vai provocar no condutor, o induzido, uma polarizao devido ao movimento de

    cargas (electres), ficando a parte do induzido mais prxima do indutor com carga elctrica de

    sinal contrrio e de valor absoluto igual do indutor (Aido et ai, 1983). Este processo

    designado por induo electrosttica (figura 4.3 a e b).

    importante, contudo, referir que aps esta nova distribuio da carga elctrica no

    induzido, no h a sua electrizao dado que continua a haver igual nmero de cargas

    positivas e negativas.

    Retirando o indutor, as cargas, no induzido, voltam situao em que se encontravam

    antes da presena do primeiro. , no entanto, possvel electrizar o induzido. Mantendo o

    indutor prximo, ligase o induzido terra, escoandose a carga elctrica de igual sinal da do

    indutor ficando o induzido com carga de sinal contrrio do indutor (figura 4.3 c e d).

    Figura 4.3 Electrizao por influncia

    a. Aproximao de um objecto electrizado, B, o indutor, a um objecto electricamente neutro, A, o induzido.

    b. Induo electrosttica, em A, por aco de B.

    c. Ligao de A terra: "="

    A fica com carga elctrica de sinal contrrio da de B.

    d. Corte da ligao terra. A mantm carga elctrica de sinal contrrio da de B.

    e. Afastandose B, a carga elctrica em A distribuise uniformemente.

    Adaptado de Aido et ai, 1983.

    A B

    l+t +. -+-++--+-I I " - " - - - - - l a +. -+-++--+-I

    r----- V+V+l I - - - - - . - . | b

    H V+V+l I " - " - - - " - 1 c V+V+l

    1 V+V+l I - - " - " - " - 1 d

    l+ + + + + + + +1 e

    42

  • 4- Caso I: Ensino da polaridade molecular no 9o ano

    Cortando, ento, a ligao terra e retirando-se o indutor, o induzido vai manter a carga

    que, entretanto, se distribui uniformemente (Aido et ai, 1983; Tipler, 1995). Este processo de

    electrizao designado por electrizao por influncia.

    4.1.1.3. Electrizao por frico

    Em geral, quando dois objectos so postos em contacto, pode ocorrer entre eles

    transferncia de electres, havendo materiais com mais tendncia a ganhar electres e outros

    com tendncia a perd-los. Segundo a sua maior ou menor tendncia a perder electres, os

    diferentes materiais costumam ser ordenados em sries triboelctricas (Aido et ai, 1983;

    Villate, 1999). Na tabela seguinte apresenta-se uma srie triboelctrica.

    Amianto Pele de coelho

    L Chumbo

    Seda Alumnio

    Papel Algodo Madeira mbar

    Nquel, Cobre Borracha

    Estanho, Prata Acetato

    Esferovite PVC

    Tabela 4.1- Srie triboelctrica. In Villate 1999.

    Nestas sries, os materiais do topo da lista so os que maior tendncia tm para perder

    electres. Utilizando estes materiais para friccionar objectos, pode-se conseguir electriz-los.

    Assim, por frico de um objecto de plstico (uma rgua, por exemplo) com um pano de

    l, parte dos electres do pano passam para o plstico, ficando este com excesso de electres e

    o pano com deficincia (figura 4.4).

    43

  • 4- Caso I: Ensino da polaridade molecular no 9o ano

    Plstico

    Figura 4.4- Friccionando um objecto de plstico com um pano de l (a), passam electres do pano para o plstico (b). Pode ver-se a simulao dinmica do fenmeno em httpy/www.molecularium.net/pt/ligintermol/interaccoes/index.html.

    Caso se friccionasse um objecto de vidro com um pano de seda, haveria passagem de

    electres do vidro para o pano (figura 4.5).

    Vidro

    Seda

    Figura 4.5- Friccionando um objecto de vidro com um pano de seda (a), passam electres do vidro para a seda (b). Pode ver-se a simulao dinmica do fenmeno em http://www.molecularium.net/pt/ligintermol/interaccoes/index.html.

    Pode provar-se experimentalmente que, quando um objecto friccionado com um dado

    material, o excesso de electres com que o primeiro fica igual deficincia com que fica o

    segundo (Aido et ai, 1983). A figura seguinte resume este processo.

    g>'

    Figura 4.6- Friccionando uma barra, B, de poli(etileno) com um pano de l, L, enrolado no interior de um vaso metlico, V, colocado sobre o prato de um electroscpio, E, as folhas deste afastam-se aps se retirar a barra, sinal de que o pano ficou electrizado. Introdu-zindo novamente a barra no pano de l, as folhas caem, mostrando que o excesso de electres da barra igual deficincia de electres do pano. In Aido et ai, 1983.

    44

    http://www.molecularium.net/pt/ligintermol/interaccoes/index.htmlhttp://www.molecularium.net/pt/ligintermol/interaccoes/index.html
  • 4- Caso I: Ensino da polaridade molecular no 9o ano

    4.1.1.4. Teste experimental de polaridade molecular

    Para se confirmar a polaridade de diversas molculas, recorreu-se ao teste que consiste

    em aproximar um corpo electrizado a um fio dos diversos lquidos das molculas contidos em

    buretas. Neste caso, foi utilizada uma rgua de plstico que foi previamente friccionada com

    um pano de l. Na figura 4.7 indica-se o esquema de montagem.

    Figura 4.7- Esquema de montagem para testar a polaridade de diversas molculas.

    Na figura 4.8 mostra-se uma imagem de um dos vdeos, correspondente ao teste de

    polaridade com acetona.

    Figura 4.8- Imagem retirada de vdeo do esquema de montagem para testar a polaridade da acetona.

    Molculas polares (por exemplo, a gua) so atradas (sofrem um desvio) em direco ao

    objecto electrizado, enquanto molculas apoiares (por exemplo, benzeno) em geral no so.

    45

  • 4- Caso I: Ensino da polaridade molecular no 9o ano

    Podem s-lo, no entanto, com utilizao de um campo magntico de intensidade adequada

    (Vermulapalli e Kukolich, 1996). Como as molculas so apoiares, podem adquirir um

    momento de dipolo induzido por aco, por exemplo, de uma diferena de potencial. No caso

    concreto do benzeno, para que esta molcula possa apresentar um desvio semelhante ao da

    gua, a diferena de potencial dever ser 3,5 vezes maior que a utilizada para a gu