democracia mercado e racionalidade um estudo … · max weber, 1919 . vii resumo a literatura...

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Universidade de Brasília Departamento de Economia DEMOCRACIA, MERCADO E RACIONALIDADE: UM ESTUDO SOBRE O ELEITOR NO BRASIL José Jorge Gabriel Júnior Brasília Janeiro de 2009

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Universidade de Brasília Departamento de Economia

DEMOCRACIA, MERCADO E RACIONALIDADE: UM ESTUDO SOBRE O

ELEITOR NO BRASIL

José Jorge Gabriel Júnior

Brasília Janeiro de 2009

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José Jorge Gabriel Júnior

DEMOCRACIA, MERCADO E RACIONALIDADE: UM ESTUDO SOBRE O

ELEITOR NO BRASIL

Dissertação apresentada ao Departamento de Economia da Universidade de Brasília – UnB como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Economia. Orientador: Prof. Dr. Bernardo Pinheiro

Machado Mueller

Brasília Janeiro de 2009

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“Democracia, Mercado e Racionalidade: Um Estudo sobre o Eleitor no Brasil”

JOSÉ JORGE GABRIEL JÚNIOR

Dissertação apresentada ao Departamento de Economia da Universidade de Brasília – UnB como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Economia.

Avaliação BANCA EXAMINADORA Prof. Dr. Bernardo Pinheiro Machado Mueller Orientador Prof. Dr. Paulo Cesar Coutinho Membro Interno Prof. Dr. Lucio Remuzat Rennó Junior Membro Externo

Brasília - DF, janeiro de 2009.

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Aos meus pais.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por sempre me guiar pelos caminhos certos e me prover com muito mais do que eu preciso. Agradeço ao meu pai, à minha mãe e à minha irmã por sempre estarem ao meu lado, me apoiarem nas horas mais difíceis e serem o meu porto seguro, sem o qual eu não teria chegado aqui. Agradeço ao CNPQ pela ajuda financeira que tornou possível a continuação dos meus estudos universitários. Agradeço ao meu Orientador Bernardo Mueller por toda dedicação, paciência e bom humor com que me atendeu ao longo da elaboração deste trabalho. Tenho nele um modelo de profissional a ser emulado. Agradeço aos professores Lucio Rennó, Maria Conceição e Paulo Coutinho pelas diversas críticas e sugestões construtivas apresentadas na defesa do projeto e na defesa da dissertação. Agradeço ao amigo Paulo Augusto Rego pela ajuda com os dados da PNAD e à amiga Cibele Bittencourt pela ajuda com a revisão do texto dos manuscritos. Quaisquer erros que permaneçam são de minha inteira responsabilidade. Em especial, agradeço ao grande amigo Luís Felipe B.O. pela ajuda não somente com a elaboração deste trabalho, mas com todo apoio e incentivo dado ao longo de todo o curso. São amigos como ele que dão sentido a frase de Epicuro: “A alma nobre se ocupa da sabedoria e dos amigos: destas, a primeira é um bem mortal, a outra imortal”.

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“A solução para todos os problemas da democracia é mais democracia”

Al Smith, 1928

“A democracia deve ser praticada apenas onde convém”

Max Weber, 1919

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RESUMO

A literatura econômica enfatiza que a eficiência da democracia como sistema de

governança está estritamente ligada ao comportamento do eleitor. Entretanto, nem a ciência

política nem a ciência econômica chegaram a um consenso a respeito de quais informações

são necessárias para que o eleitor tome decisões ótimas. Também não há consenso de qual é

a capacidade dos eleitores em processar essas informações corretamente. O presente

trabalho visa contribuir para essa literatura ao estudar se os eleitores cometem erros

sistemáticos de avaliação dos políticos. Utiliza-se a metodologia sugerida por Wolfers

(2002) para verificar se os eleitores filtram adequadamente choques exógenos ao controle

dos governadores estaduais ao avaliarem esses políticos. Os resultados encontrados para as

eleições estaduais brasileiras entre 1990 e 2006 são semelhantes aos que Wolfers encontra

para os Estados Unidos. O eleitor perfaz uma filtragem simples, avaliando relativamente

seus Estados em relação aos demais. Contudo, não é capaz de elaborar filtragens mais

sofisticadas, incorrendo recorrentemente em erros de avaliação.

Palavras-chave: Democracia, Racionalidade, Voto Retrospectivo.

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ABSTRACT

The economic literature emphasizes that the efficiency of democracy as a system of

governance is closely linked to the behavior of voters. However, neither political science

nor economic science reached a consensus about what information is necessary for the

voter to make optimal decisions. Likewise, there is no consensus about the voters' ability to

process information correctly. This work aims to contribute to this literature examining

whether voters make systematic attribution errors. The methodology used is suggested by

Wolfers (2002): it measures the extent to which voters irrationally reward state governors

for socioeconomic fluctuations that are plausibly unrelated to gubernatorial actions. The

results for the Brazilian state elections between 1990 and 2006 are similar to those found by

Wolfers for the United States. Voters make rule-of-thumb performance filtering, evaluating

their state’s economic performance relative to the national economy. However, more

sophisticated tests reveal that voters are consistently fooled.

Keywords: Democracy, Rationality, Retrospective voting.

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SUMÁRIO

Introdução .................................................................................................................... 1

1. Democracia, Mercado e Racionalidade ................................................................... 3

1.1 O Eleitor Racionalmente Ignorante .................................................................. 7

1.2 O Eleitor Racionalmente Irracional ................................................................ 11

1.2.1 Erros Sistemáticos a respeito da Economia ................................................. 13

1.2.2 O Modelo de Consumo de Irracionalidade .................................................. 21

1.3 Estudos sobre o Eleitor no Brasil ................................................................... 24

2. Teste de Racionalidade .......................................................................................... 28

2.1 O Teste de Wolfers ......................................................................................... 29

2.2 Teste de Racionalidade do Eleitor: A filtragem do Desempenho Relativo .... 30

2.3 O Teste de Racionalidade do Eleitor por Variáveis Instrumentais ................. 33

2.4 Instrumentos e Resultados .............................................................................. 35

3. O Eleitor Brasileiro ................................................................................................ 41

3.1 Considerações sobre o Contexto Brasileiro .................................................... 41

3.2 O Modelo e os Dados ..................................................................................... 44

3.3 Resultados ....................................................................................................... 46

3.3.1 Relação entre as Variáveis Socioeconômicas e o Voto ............................... 46

3.3.2 Primeiro Teste: Filtragem do Desempenho Relativo .................................. 48

3.3.3 Segundo Teste: Variáveis Instrumentais ..................................................... 59

Conclusão .................................................................................................................. 67

Bibliografia ................................................................................................................ 71

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LISTA DE FIGURAS

Gráfico 1.1 – Erros Sistemáticos versus Erros Aleatórios ......................................... 13

Gráfico 1.2 – Viés Antimercado 1 ............................................................................. 15

Gráfico 1.3 – Viés Antimercado 2 ............................................................................. 16

Gráfico 1.4 – Viés Anti-estrangeiro .......................................................................... 18

Gráfico 1.5 – Viés Gerador de Emprego ................................................................... 19

Gráfico 1.6 – Demanda por Irracionalidade .............................................................. 23

Gráfico 3.1 – Instrumentos ........................................................................................ 60

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LISTA DE TABELAS

Tabela 2.1 – .............................................................................................................. 30

Tabela 2.2 – .............................................................................................................. 32

Tabela 2.3 – .............................................................................................................. 32

Tabela 2.4 – .............................................................................................................. 36

Tabela 2.5 – ............................................................................................................... 38

Tabela 3.1 – ............................................................................................................... 43

Tabela 3.2 – ............................................................................................................... 47

Tabela 3.3 – ............................................................................................................... 49

Tabela 3.4 – ............................................................................................................... 51

Tabela 3.5 – ............................................................................................................... 54

Tabela 3.6 – ............................................................................................................... 55

Tabela 3.7 – ............................................................................................................... 56

Tabela 3.8 – ............................................................................................................... 57

Tabela 3.9 – ............................................................................................................... 58

Tabela 3.10 – ............................................................................................................. 61

Tabela 3.11 – ............................................................................................................. 63

Tabela 3.12 – ............................................................................................................. 64

Tabela 3.13 – ............................................................................................................. 65

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Introdução 

  Ao longo da história do pensamento ocidental sempre coexistiram duas visões em

relação à democracia. Por um lado, a citação de Al Smith, contida na epígrafe deste

trabalho, resume bem aqueles que consideram a democracia um bastião contra o abuso do

poder político: “a solução para todos os problemas da democracia é mais democracia”.

De acordo com essa visão, delegar aos cidadãos o máximo de decisões políticas geraria o

máximo de bem-estar social, prevenindo que a maioria fosse explorada por uma minoria.

Por outro lado, a citação de Max Weber resume aqueles que possuem uma desconfiança

com os resultados do sistema democrático: “a democracia deve ser praticada apenas onde

convém”. Segundo essa visão, o mecanismo de voto e de representação, no qual a maioria

supostamente escolhe qual decisão deve ser tomada, não gera necessariamente os

melhores resultados para a coletividade e, por isso, deve-se restringir apenas aos assuntos

que digam respeito e sejam do interesse de todos.

Subjacente a cada uma dessas visões está implícita uma hipótese a respeito dos

cidadãos comuns. Aqueles que acreditam na eficiência da democracia pressupõem que o

cidadão típico é apto para entender e decidir acerca dos assuntos aos quais a atividade

governamental se dedica. Já aqueles que desconfiam dos resultados da democracia

pressupõem que os cidadãos falham em suas decisões, seja porque não compreendem a

matéria em questão, seja porque são enganados por uma minoria. O “governo do povo,

pelo povo e para o povo” poderia gerar resultados ruins e até nefastos caso delegue-se aos

cidadãos comuns a decisão sobre assuntos que estão além de suas capacidades. Dessa

forma, esclarecer qual a capacidade e o padrão de comportamento do eleitor torna-se

crucial para elaborar uma teoria a respeito da democracia.

Analogamente, estudar o comportamento do eleitor também é crucial para a

economia. Como argumenta Downs (1957 [1999]):

“No mundo todo, os governos dominam a cena econômica. Seus gastos determinam se prevalece o

pleno emprego; seus impostos influenciam incontáveis decisões; suas políticas controlam o

comércio internacional; e suas regulamentações domésticas se estendem a quase todo ato

econômico. Contudo, o papel do governo [partidos, eleitores, instituições] no mundo da teoria

econômica não é de modo algum proporcional à sua predominância”.

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Apesar da crescente literatura econômica a respeito da atividade governamental,

são poucos os estudos que analisam empiricamente o comportamento do eleitor. Isso não

impede, porém, que os economistas sigam elaborando análises de como o governo

funciona, assumindo hipóteses fortes a respeito dos eleitores, em especial o grau de

informações que eles possuem e sua capacidade em processá-las.

Praticamente todas as teorias econômicas modernas sobre política começam

assumindo que o cidadão comum, ao menos na média, compreende os mecanismos da

economia e vota de acordo com essa compreensão correta. Em outras palavras, o eleitor

comum é racional no sentido moderno das expectativas racionais: ele não comete erros

sistemáticos. Persson e Tabellini (2000), por exemplo, apresentam pesquisas recentes da

economia política positiva, tais como modelos de competição eleitoral, modelos

intertemporais de accountability, ciclos eleitorais e elaboração de agenda, em que todas

utilizam como hipótese básica a racionalidade do eleitor. Como os autores advogam em

favor desta hipótese, “É difícil [...] sustentar que os mesmos indivíduos que agem

racionalmente e analisam prospectivamente como agentes econômicos tornam-se tolos

quando votam” (p.429, tradução livre).

Não obstante os economistas se esquivarem a respeito da comprovação dessas

hipóteses, os cientistas políticos têm estudado pesquisas de opinião pública há algumas

décadas e verificado certos padrões de comportamento dos eleitores. Essa literatura,

entretanto, continua desconhecida pela maior parte dos economistas, pois, como ocorre

entre outras disciplinas, o diálogo entre a economia e a ciência política sempre foi

pequeno, a despeito de ter se intensificado nos últimos anos. Esse diálogo, contudo, deu-

se basicamente em uma única direção, com a ciência política importando algumas

técnicas econômicas, como a aplicação do modelo de agente racional para analisar

fenômenos políticos. (Lohmann, 2008)

Este trabalho tem como objetivo contribuir com evidências empíricas sobre a

existência ou não de erros sistemáticos cometidos pelos eleitores. Para tanto, elabora-se

um teste nos moldes do implementado por Wolfers (2002) para os Estados Unidos. Este

teste, derivado do modelo principal-agente, verifica se os eleitores cometem erros

sistemáticos de avaliação dos políticos quando votam retrospectivamente. O Brasil

mostra-se particularmente interessante para esse estudo dadas suas características pouco

exploradas na literatura, tais como ser uma democracia nova, ter uma população pouco

escolarizada e um sistema federativo complexo.

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De fato, a capacidade de processar informações por parte dos eleitores pode estar

no cerne das queixas destes mesmos eleitores sobre o governo. Como explica Besley

(2005), existem duas características que determinam os trabalhos realizados pelo

governo: os homens que são eleitos para conduzir o governo e a estrutura institucional

que restringe seus trabalhos. A seleção política, portanto, é fundamental para o resultado

final da atividade governamental, sendo que a seleção de políticos incompetentes e

corruptos pode dever-se à inaptidão dos próprios eleitores em avaliar os políticos por sua

competência e honestidade.

Assim, espera-se contribuir para o debate em torno do comportamento do eleitor,

debate este que, segundo Caplan (2007), é marcado por um duplo discurso. Por um lado,

a posição dominante dos economistas acadêmicos em suas pesquisas é a de que o cidadão

comum compreende corretamente o funcionamento da economia. Por outro lado, quando

entram no papel de professores, curiosamente assumem que seus alunos possuem crenças

viesadas e tentam instruí-los contra os erros que predominam nas discussões sobre

economia. Como argumenta Donald McCloskey, “[os] economistas possuem duas

atitudes a respeito de seus discursos: a oficial e a não oficial” (Apud Caplan, 2007, p.11).

O presente trabalho estrutura-se em três partes. O primeiro capítulo elabora uma

revisão da literatura a respeito do comportamento do eleitor, tentado aproximar os

campos da ciência política e da economia. Inicialmente contextualiza-se a importância do

eleitor dentro do debate maior “Democracia versus Mercado”, para então se discutir o

problema do eleitor racionalmente ignorante e suas conseqüências para a eficiência da

democracia. Em seguida, apresenta-se a argumentação de Caplan (2007) sobre a

irracionalidade do eleitor e seu modelo de irracionalidade racional. Por fim, revisa-se a

literatura brasileira a respeito do comportamento eleitoral.

O segundo capítulo apresenta o teste de racionalidade elaborado por Wolfers

(2002). Apresentam-se a metodologia utilizada, os resultados encontrados e discute-se a

validade do teste. Já o terceiro capítulo apresenta a adaptação deste teste para o Brasil.

São tecidas algumas considerações sobre o contexto brasileiro, o qual difere em diversos

aspectos do contexto norte-americano para, em seguida, descrever o modelo e as

adaptações realizadas no teste, juntamente com a descrição dos dados utilizados. Os

resultados são apresentados na última seção deste capítulo. Por fim, têm-se as conclusões,

resumindo o trabalho os seus achados, suas implicações e sugerindo estudos futuros.

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Capítulo 1 – Democracia, Mercado e Racionalidade 

Uma das grandes questões da economia política refere-se aos méritos relativos da

democracia versus o mercado. Em teoria, a democracia é uma forma de governo cuja

dinâmica previne políticas socialmente prejudiciais e o uso do poder em benefício pessoal

por parte dos governantes. Se compararmos historicamente essa forma de governo às

ditaduras, tenderemos a concordar com essa afirmativa. Entretanto, desde o trabalho

pioneiro de Downs (1957 [1999]), a introdução do paradigma da escolha racional na

análise da democracia e o tratamento dessa forma de governo como um “mercado

político” têm chamado a atenção para suas eventuais falhas e resultados ineficientes.

(Lohmann, 2008)

Downs elabora uma análise positiva da dinâmica da democracia utilizando a

perspectiva e o instrumental próprios da microeconomia. Para que um mercado seja efi-

ciente, a análise econômica enfatiza que devem coexistir basicamente três características:

(i) os participantes devem ser racionais e informados; (ii) deve haver competição por

parte dos mesmos; e (iii) os direitos de propriedade devem ser bem definidos e facilmente

transferíveis (custos de transação baixos). Assim, a análise downsiana avalia a eficiência

do processo político-eleitoral presente nos sistemas democráticos analogamente à

avaliação dos mercados.

Como Caplan (2005a) argumenta, no debate “Democracia versus Mercado” há

quatro posições logicamente defensáveis. A primeira é “Mercados funcionam,

Democracia falha”, posição sustentada por Milton Friedman e a escola de Chicago na

década de 1970. Em segundo tem-se “Mercado falha, Democracia funciona”, posição

sustentada por sociais-democratas como John Kenneth Galbraith. Em terceiro “Mercado

falha, Democracia falha”, proposta por teóricos totalitários como Lenin. E em quarto

“Mercado funciona, Democracia Funciona”. Essa última posição é sustentada por

Wittman (1989) e Wittman (1995 [1999]), o qual argumenta que todos os requisitos (i),

(ii) e (iii) tratados acima são atendidos pelo mercado político democrático.

Esta última posição diferencia-se dos teóricos da escola clássica de Public Choice

e de grande parte dos economistas no seguinte sentido: assim como estes teóricos

enxergam que as falhas de mercado existem, mas não são significativas a ponto de

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comprometer a eficiência do mercado como um todo, o mesmo se daria com a

democracia. Segundo Wittman, “apesar de alguns autores terem feito considerações

positivas a respeito do mercado político [democrático], essas considerações são pontuais

em trabalhos consistentemente críticos” (1989, p.1395, tradução livre). A originalidade

do seu estudo se encontra na hipótese de que o arcabouço institucional democrático como

um todo seria autocorrigível e produziria resultados eficientes (um ótimo de Pareto):

“quase todos os argumentos alegando que os mercados econômicos são eficientes

aplicam-se igualmente bem aos mercados políticos democráticos, e, inversamente, os

modelos econômicos do fracasso do mercado político não são válidos mais dos que os

argumentos análogos para o fracasso do mercado econômico” (1995 [1999], p.12).

Por exemplo, críticas a respeito da persistência de políticas contrárias àquelas que

seriam adotadas caso o eleitor fosse bem informado só podem ser concebidas dentro de

um sistema político não-competitivo. Quando se analisa o mercado econômico, percebe-

se a disciplina que a concorrência impõe às firmas. Wittman argumenta que essa mesma

disciplina é imposta no sistema democrático. A competição entre políticos pelos votos

exerce os mesmos efeitos benéficos para os eleitores que a competição entre as firmas

exerce para os consumidores. Ao competirem, os políticos ganham grandes vantagens

apontando desvios de conduta e políticas impopulares dos oponentes. Isso ocorre não

somente entre partidos, mas dentro dos próprios partidos por meio da reputação.

A reputação é especialmente importante para os políticos dentro do desenho

institucional da democracia. Ao cumprirem suas promessas de campanha e se mostrarem

competentes e honestos, os políticos aumentam suas chances de reeleição. Ademais,

assim como nos mercados a marca da firma pode ser parte do valor do seu capital, a

reputação dos membros de um partido também pode ser “capitalizada”, revelando-se

valiosa na hora de atrair votos. O problema do último período de mandato, por sua vez,

não afeta a reputação dentro do sistema democrático porque é possível transferir para

outros agentes a reputação adquirida, como, por exemplo, a transferência para herdeiros

ou para o partido. Dessa forma, um partido político funciona analogamente como uma

franquia no mercado econômico, sendo que existem grandes incentivos para o partido

monitorar seus candidatos e puni-los em caso de desvios de conduta. Ademais, existem

ganhos pessoais para o candidato, no sentido de que aqueles que se mostraram mais

confiáveis no passado são provavelmente recompensados pelo partido ao serem, por

exemplo, nomeados para comitês influentes.

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Pode-se argumentar que a competição dentro do mercado político é insuficiente

devido à formação de conluios por parte dos políticos e barreiras à entrada, tais como

custos elevados de campanha. Entretanto, Wittman analisa que o capital de risco dos que

esperam lucrar com uma política mais popular sustentará um novo entrante, e que “a

habilidade de manter esse cartel com tantas pessoas, com tantos possíveis entrantes, não é

factível para um estudante de organização industrial” (1995 [1999], p.45). Wittman ainda

cita Morris Fiorina, que descreve como barreiras à entrada os recursos burocráticos

disponíveis aos políticos já em exercício, e que com o passar do tempo aumentaram suas

taxas de reeleição. Entretanto, essa lógica seria questionável, existindo evidências

estatísticas contra essa hipótese. A razão do porquê a probabilidade do político que já foi

eleito ser reeleito é maior do que a de um novato ser eleito pela primeira vez é a mesma

do porquê um presidente de uma corporação tende a manter sua posição no dia seguinte:

eles são os melhores e, portanto, têm maiores chances de manterem-se em seus cargos.

(Wittman, 1995)

O desenho ótimo dos contratos também reduz o grau de desvio que as políticas

podem assumir. Por exemplo, ao serem recompensados acima dos salários de mercado, os

políticos possuem incentivos para se reelegerem, o que é corroborado pelo fato deles se

engajarem em campanhas eleitorais muito caras. Além disso, a inexistência da

aposentadoria compulsória reduz a severidade do problema de último período de

mandato.

Já em relação aos custos de transação, o sistema de representatividade reduz

enormemente os custos de negociação. O pequeno número de membros na Câmara e no

Senado cria condições para que ocorram trocas de interesses que gerem ganhos para as

partes sem que custos de ineficiência sejam repassados para terceiros, já que estes

poderiam entrar nas negociações. Ademais, o desenho institucional do sistema de maioria

reduz os custos de negociação ao evitar o chamado “monopólio da intransigência”: ao

não exigir a unanimidade, nem uma supermaioria (por exemplo, dois terços dos votos) na

elaboração de leis complementares, o sistema de maioria simples previne abusos de uma

minoria que exigiria grandes ganhos para modificar o status quo. Além disso, o sistema

partidário também reduz os custos de transação, com a existência de líderes dos partidos

que podem forçar políticas de compromisso, e o sistema de comitês especializados, onde

a participação dos mais interessados na política em questão evita a participação de

interessados periféricos, além dos benefícios em termos de produtividade que se ganha

com a especialização dos parlamentares.

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Como analisado acima, o desenho de contratos ótimos, a monitoração da

reputação e a competição reduzem, mas não eliminam a possibilidade de oportunismo. A

análise do comportamento político por meio do modelo principal-agente, em que as

autoridades eleitas são consideradas como agentes e os eleitores como principais, mostra

o potencial de oportunismo que existe no sistema democrático. Porém, argumenta

Wittman, se não houver alternativa melhor de controle, dados os altos custos de controle

público ou privado de formas alternativas, provavelmente não é possível encontrar uma

estrutura Pareto superior, e o problema do principal-agente não é mais grave na política

do que na economia.

1.1 O Eleitor Racionalmente Ignorante A análise de Wittman é bastante convincente no que diz respeito aos pontos (ii) e

(iii). Dificilmente se pode argumentar contra a existência de competição nas campanhas

eleitorais, e certamente o sistema democrático é uma forma bastante eficiente de realizar

decisões de grupo que envolvam 190 milhões de pessoas, como é o caso do Brasil.

Contudo, umas das críticas mais freqüentemente levantadas contra a democracia é o

problema resultante da insuficiência de informação que os eleitores possuem.

De acordo com Downs (1957), os eleitores, em geral, possuem duas motivações

básicas para adquirir informação política: ajudá-los a decidir como votar e ajudá-los a

formar opiniões com as quais possam influenciar a agenda de políticas governamentais. A

partir dessas motivações, a aplicação do postulado de racionalidade ao comportamento do

eleitor leva inevitavelmente à conclusão de que os eleitores não se informam a respeito

dos candidatos e das políticas adotadas. Uma análise custo-benefício explica o porquê. Os

custos de obter informação a respeito dos candidatos, de obter informação sobre as

políticas públicas, assim como suas influências sobre o bem-estar geral são sempre

positivos. Arcar com tais custos em todas as áreas de políticas públicas é inviável. Ao

contrário, só há benefícios em investir em informação nas áreas de sua especialização,

onde a intervenção compensa em termos de utilidade. Como são poucas as políticas que

recaem diretamente sobre o eleitor e como é infinitesimal o papel que um voto individual

tem sobre o resultado da eleição, o comportamento racional é ser desinformado quanto à

maior parte das decisões políticas, exceto quando as informações são gratuitas e

acidentais. Como explica Downs: “É irracional ser politicamente bem informado porque

os baixos retornos das informações simplesmente não justificam o custo em tempo e

outros recursos para adquiri-las” (1957 [1999], p.277).

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Diversos trabalhos têm estudado o grau de informação dos eleitores. Por exemplo,

Silva e Silva Costa (2006) analisam as eleições municipais de 1997 em Portugal com o

objetivo de verificar o grau de informação econômica que os eleitores detêm. De acordo

com os autores, os resultados encontrados parecem corresponder à hipótese de eleitores

racionalmente ignorantes. A competência dos candidatos não possui muita influência na

decisão do voto, enquanto características como a simpatia e o carisma mostram-se fatores

determinantes. Ademais, os resultados também sugerem que a decisão do voto é tomada

com menos informações nas localidades onde os custos em obtê-las são maiores. Os

resultados são, portanto, condizentes com a análise custo-benefício proposta pelo modelo

de ignorância seletiva.

Peltzman (1990), por sua vez, tem sérias dúvidas quanto à tese do eleitor

racionalmente ignorante. Ao analisar as eleições para presidente, governador e senador

nos Estados Unidos, entre 1950 e 1988, ele argumenta que o mercado político é um

eficiente agregador de informação e que os eleitores utilizam eficientemente toda a

informação disponível. Eles distinguem fatores como mudanças na renda permanente das

mudanças transitórias, inflação esperada da não esperada, além de não descartar as

informações prévias ao ano eleitoral.

Esses resultados são semelhantes aos encontrados por Duch e Randy (2005). Em

seu estudo, os autores analisam quão bem a percepção do eleitorado sobre alguns

agregados econômicos corresponde à realidade. Introduzindo inovações à literatura

empírica existente como, por exemplo, a percepção sobre agregados econômicos

específicos, ao invés de índices gerais de percepção da economia, além do uso de dados

cross-countries, que analisam diversos países europeus simultaneamente, Duch e Randy

concluem que: (i) no longo prazo (estimado em seis meses) as percepções do passado e

do presente, assim como a expectativas futuras, correspondem bem ao desempenho

passado, presente e futuro da economia real; (ii) no curto prazo as expectativas a respeito

dos preços e do desemprego são geralmente incorretas; e (iii) percepções negativas sobre

flutuações econômicas apresentam-se mais precisas do que percepções positivas. Apesar

destes desvios, os autores argumentam que os eleitores compreendem bem a economia.

Dessa forma, como seria possível, questiona Peltzman (1990), que os participantes desse

mercado político sejam mal informados?

Outras evidências, entretanto, mostram que as decisões que os eleitores tomam

são fracamente baseadas em informações. Blinder e Krueger (2004) tentam determinar

quais são os fatores mais importantes na formação da opinião dos cidadãos. Por meio de

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uma pesquisa realizada nos Estados Unidos com cerca de mil pessoas, os autores

concluem que a ideologia do indivíduo é o fator mais importante, enquanto o interesse

próprio é o menos importante. O conhecimento factual sobre a economia habita um ponto

intermediário entre estes dois fatores. Os autores também analisam como as pessoas se

informam sobre a economia, descobrindo que a fonte de informação mais utilizada é a

televisão, seguida pelos jornais locais. Ademais, as opiniões são afetadas por

conhecimentos específicos sobre a matéria em questão, ao invés de conhecimentos gerais.

Este fato torna-se preocupante, já que, como Blinder e Krueger argumentam, a televisão

mostra-se uma boa fonte em termos de quantidade, mas não de qualidade.

Estes resultados estão de acordo com os que Gilens (2001) encontra ao analisar

quais são os tipos de informação que influenciam significativamente a opinião dos

cidadãos. De acordo com este autor, informações específicas sobre uma determinada

política são mais importantes para a formação de preferências do que conhecimentos

gerais sobre política. Além disso, informações específicas possuem efeitos maiores sobre

as preferências daqueles indivíduos que possuem maior conhecimento geral. Ao invés de

diluir o efeito de novas informações, conhecimentos políticos gerais aparentemente

facilitam a incorporação dessas informações nos julgamentos que os eleitores fazem. Para

os eleitores mais ignorantes politicamente, contudo, informações específicas não

apresentam grande impacto. Segundo Gilens, estudos anteriores, que negavam esse efeito

das informações específicas, eram limitados pelo fato de não considerar que muitos

indivíduos, os quais se mostravam bem informados em termos de conhecimentos

políticos gerais, eram mal informados em termos de conhecimentos específicos,

conhecimentos estes que poderiam alterar suas preferências.

Os efeitos dessa “ignorância racional”, por sua vez, são analisados por Bartels

(1996). Por meio de uma simulação de um eleitorado “completamente informado”, o

autor observa a relação entre informação e comportamento eleitoral. Ao comparar o

padrão de voto entre esse eleitorado hipotético e o eleitorado real para seis eleições

americanas, Bartels verifica que “a ignorância política tem conseqüências políticas

sistemáticas e significantes” (p. 220, tradução livre), tanto para o nível individual quanto

para o nível agregado. Por exemplo, há um claro viés a favor do partido Democrata, já

que, caso o eleitorado fosse “completamente informado”, candidatos republicanos iriam,

em média, ganhar 5% a mais de votos, enquanto os democratas iriam ganhar apenas 2%.

A informação repercutiria, portanto, sobre as decisões de voto.

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Sendo o eleitor, em geral, ignorante e existindo evidências de que a informação

influi na decisão do voto, grande parte da literatura econômica procurou estudar quais são

as conseqüências destes fatos para a eficiência da democracia. Por exemplo, em um

influente artigo, Becker (1983) apresenta uma teoria da competição entre grupos de

pressão assumindo que “as preferências [dos eleitores] podem ser manipuladas e criadas

por meio de informações e desinformações fornecidas pelos grupos de interesse” (p.392,

tradução livre). A partir desta hipótese, chega-se a conclusão de que os grupos de pressão

influenciam os governos para obter impostos, subsídios, regulações e cotas a seu favor.

Outro exemplo de resultado amplamente estudado a partir da ignorância dos

eleitores é a ocorrência de ciclos econômicos políticos. Uma vez que os eleitores

interpretam um bom desempenho econômico como evidência de um governo competente,

os políticos possuem incentivos para estimular “artificialmente” a economia por meio dos

gastos públicos em períodos pré-eleitorais, de forma a enganar os eleitores e obter votos.

Dada a falta de informação do eleitorado, os efeitos inflacionários dessa expansão podem

ser corrigidos no mandato seguinte, sem conseqüências nas urnas. (Alesina et al., 1997)

Wittman (1995) contra-argumenta a tese do eleitor racionalmente ignorante

mostrando que tanto o custo de obter informações é sobrevalorizado, quanto o grau de

informação detida pelos eleitores é subestimado. Por um lado, os argumentos de que os

custos de obtenção de informação são muito elevados, implicitamente sugerem que todos

os custos recaem basicamente sobre os eleitores. Entretanto, é benéfico ao candidato

investir na informação do eleitorado a seu respeito. Como a exploração de um novo nicho

de mercado é altamente lucrativa para um empresário, também o é para os

empreendedores políticos explorar demandas políticas não atendidas, o que impõe a

necessidade de se investir em informação para o eleitorado.

Outros aspectos que, de acordo com Wittman (1995), a literatura da ciência

política aponta como redutores do custo de obtenção de informações são: os nomes dos

partidos e suas reputações, assim como seu alinhamento ideológico servem como sinais

de suas políticas e posições; a existência de diversos atores políticos que coletam

informações gratuitamente para os eleitores, tais como jornais, grupos de interesse, além

dos próprios políticos; e a competição no mercado político, que ajudaria a manter uma

fidedignidade das informações que lhes é repassada. Já os benefícios advindos de se

informar são recorrentemente subvalorizados. As políticas públicas têm efeitos

econômicos e, portanto, é vital que se adquira conhecimento acerca delas para que se

tome melhores decisões no consumo e no investimento, mesmo na ausência de eleições.

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Por outro lado, a quantidade de informações requerida para que se escolha uma

decisão ótima não é tão elevada como se supõe. Há o que na literatura da ciência política

se conhece como “atalhos cognitivos”: “dicas” informais ou subliminares que

permitiriam ao eleitor articular melhor seus conhecimentos políticos e avaliar seus

candidatos. Por exemplo, não é necessário que o eleitor saiba qual a exata posição de um

político num contínuo esquerda-direita. Para que a escolha seja correta, é necessário

apenas que ele saiba onde se localizam relativamente os candidatos (mais a direita, mais a

esquerda). Outro exemplo é o endosso de grupos de interesse acerca de cada candidato, o

que é suficiente para que o eleitor encontre as organizações com preferências similares.

Dessa forma, argumenta Wittman, a eficácia política não exige eleitores perfeitamente

informados (o que seria insensato afirmar a existência), “[assim] como os mercados

econômicos eficientes não exigem que os acionistas conheçam todos os trâmites internos

das firmas onde possuem ações, nem exigem que os dirigentes monitorem seus agentes

com perfeição” (1995, p.32).

De fato, a ignorância do eleitor é relativizada pelo chamado “milagre da

agregação”. Como explicam Fehr e Tyran (2005), assumindo que os eleitores não

cometem erros sistemáticos, isto é, esses erros são independentes e aleatórios, pela lei dos

grandes números seus erros tenderão a se cancelar resultando em uma média zero. Assim,

os eleitores ignorantes acabam por anular seus erros, e quem realmente acaba decidindo

as eleições são eleitores bem informados. Essa concepção está de acordo com a moderna

teoria das expectativas racionais e é assumida pela maioria dos modelos econômicos, os

quais definem que o cidadão mediano compreende o funcionamento da economia e vota

de acordo.

1.2 O Eleitor Racionalmente Irracional

O fato de o eleitor ser desinformado tem o efeito de desviar, por meio de grupos

de interesse, as políticas governamentais das reais preferências da sociedade. A

ignorância do eleitor em relação aos representantes permite que estes persigam agendas

pessoais à parte dos interesses sociais ou se vendam aos doadores de campanha. Essa é a

explicação clássica pela qual os economistas têm apontado a adoção e a manutenção de

políticas socialmente prejudiciais, tais como o protecionismo econômico excessivo em

quase todos os países, subsídios para setores pouco competitivos da economia, etc.

Contudo, Caplan (2007) sugere outra explicação para que essas políticas

sobrevivam. Sua idéia central é que os eleitores não são apenas ignorantes, eles são, em

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uma palavra, irracionais – e a adoção de políticas ineficientes se deve exatamente porque

os candidatos atendem aos desejos do eleitorado. Na explicação downsiana, a ignorância

é seletiva. Se um voto não muda o resultado final, não há incentivo para que o eleitor se

informe. Caplan estende esse insight: se o voto não muda o resultado final, não há

incentivo para que o eleitor vote racionalmente, ao invés de emocional ou

ideologicamente.

Há o problema de como se distinguir ignorância de irracionalidade. De acordo

com Caplan (2001b), os economistas em geral são hostis à associação de erros cometidos

pelos eleitores com irracionalidade. A hipótese de que esses erros sejam devidos à falta

de informação é sempre advogada em favor da racionalidade. Entretanto, a teoria

econômica moderna possui uma definição simples e consensual do que é racional e do

que não é: a teoria das expectativas racionais, que associa racionalidade à ausência de

erros sistemáticos: “A intuição é que a mera ignorância produz apenas erros aleatórios. Se você superestima o nível de tráfico em uma manhã e subestima-o na manhã seguinte, ninguém lhe qualificaria com a pecha de irracional. [...] Em contraste, se você subestima a severidade do tráfico todos os dias, ‘Como eu poderia saber?’ é uma desculpa fraca. Não havia muita informação para prever perfeitamente; mas é extremamente difícil explicar por que as previsões falharam consistentemente e do mesmo modo”. (2007, p.98, tradução livre)

O chamado “milagre da agregação” exige que os erros dos eleitores não sejam

sistemáticos, caso contrário uma política socialmente prejudicial pode ser preferida em

lugar de outra benéfica. Por exemplo, se a maioria dos eleitores baseia suas preferências

de política econômica em modelos errados, os candidatos eleitos serão aqueles cuja

plataforma política atenda a tais preferências e que levam a resultados ineficientes.

Tomemos o caso do grau de protecionismo econômico preferido pela sociedade: se os

erros dos eleitores a respeito dos efeitos do protecionismo são aleatórios, pessoas que

preferem os efeitos do livre comércio votam a favor do protecionismo. Mas é igualmente

provável que pessoas que preferem os efeitos do protecionismo votem a favor do livre

comércio. Assim, o milagre da agregação funciona e o grau de protecionismo é

socialmente ótimo.

Por sua vez, quando os erros são sistemáticos e, por exemplo, as pessoas

subestimam os benefícios do comércio internacional, grande parte dos que votam pelo

protecionismo preferiria os efeitos do livre comércio, mas não há a mesma contrapartida

dos que prefeririam os efeitos do protecionismo e votam ao contrário. Dessa forma, o

grau de protecionismo escolhido será superior ao que seria socialmente ótimo. O gráfico

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1.1 abaixo exemplifica essa diferença entre a agregação dos votos quando os erros são

aleatórios e quando os erros são sistemáticos.

Gráfico 1.1 – Erros Sistemáticos versus Erros Aleatórios

De fato, segundo Caplan (2007), existem evidências de que os erros da maioria da

população sejam sistemáticos em questões de grande relevância sobre políticas

econômicas, dentre as quais ele identifica quatro: um viés antimercado, um viés anti-

estrangeiro, um viés de percepção de prosperidade e um viés de pessimismo. A próxima

subseção trata mais detalhadamente de cada um deles.

1.2.1 Erros sistemáticos a respeito da economia

Viés Antimercado

Alston et al. (1992) verifica, em uma pesquisa conduzida para os Estados Unidos,

que a maioria dos economistas concordava em diversos assuntos: controles sobre os

lucros eram prejudiciais à economia; mecanismos de mercado, como cotas negociáveis,

eram formas melhores de controlar a poluição ao invés de se impor tetos para poluir; o

poder de monopólio não foi a causa do aumento do petróleo durante a crise do Kuwait,

entre outros. Depreende-se, portanto, que apesar das inúmeras críticas que partem dos

próprios economistas, os benefícios do mecanismo de mercado não são subestimados.

Esses benefícios, entretanto, não são tão fáceis de serem percebidos.

Fonte: Caplan (2007)

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Caplan denomina “viés antimercado” a tendência das pessoas em subestimarem os

benefícios econômicos do mecanismo de mercado. O público, em geral, tem severas

dúvidas a respeito da existência de algum benefício social que venha de empresários que

buscam maximizar seus lucros. O foco na motivação, ao invés da disciplina imposta pela

competição, leva as pessoas a ver como socialmente prejudicial tal comportamento. E,

mais importante, o viés antimercado não é uma aberração específica, em um determinado

momento da história ou de um determinado país; é um padrão enraizado no pensamento

humano que tem frustrado economistas há vários séculos. (Caplan, 2007)

Há diversas formas de manifestação deste viés. Uma das mais comuns é igualar

pagamentos com transferências. No jargão econômico, uma transferência é um

“movimento” de renda entre duas pessoas sem nenhuma contrapartida por parte de quem

a recebe. Por exemplo, uma doação é uma forma de transferência. Assim, o que importa é

a empatia que se tem com o receptor. O público, em geral, tende a ver lucros como uma

transferência, um presente aos empresários, ignorando as propriedades de incentivos: a

busca pelo lucro incentiva a redução de custos, a alocação de recursos escassos para as

atividades econômicas mais valoradas, a pesquisa de novos produtos, etc. Mas, a menos

que se tenha empatia para com os empresários, a política correta parece ser a de limitar os

lucros e taxá-los fortemente.

Caplan (2007) apresenta evidências deste tipo de erro por meio de uma pesquisa

de opinião conduzida para os Estados Unidos em 1996, a qual compara as opiniões entre

três categorias de pessoas: economistas com PhD, que representam os especialistas nas

matérias tratadas pela pesquisa; o chamado “público iluminado”, constituído daqueles

que possuem um conhecimento correto maior de fatos econômicos, mantidas as demais

características constantes; e o público geral. As opiniões entre estas categorias são

notavelmente divergentes, como pode-se observar no gráfico 1.2 abaixo. Nele, pergunta-

se ao indivíduo se os lucros muito grandes das empresas constitui um dos motivos do

porquê a economia não vai tão bem quanto poderia. Para os economistas e o público

iluminado, lucros grandes não constituem nenhuma preocupação. Já para o público geral

esse é um fato preocupante.

Outra forma que o viés antimercado toma é o preconceito popular contra os juros.

A usura foi literalmente um pecado no pensamento cristão antigo, e permanece até os dias

de hoje no imaginário popular a figura do credor rico e a do devedor pobre. Entretanto,

assim como o lucro, o juro não é um presente; os juros são a compensação que o

emprestador obtém por adiar seu consumo, e não haveria empréstimos se não houvesse

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tal compensação. Mesmo tendo isso em vista, não faltam tentativas de restringi-los, como

a fixação de um teto para os juros nominais na própria Constituição Federal brasileira em

no máximo 12%.

Gráfico 1.2 – Viés Antimercado 1

Uma terceira forma proeminente que esse viés pode tomar são as teorias de

monopólio na fixação de preços. Economistas obviamente reconhecem que os

monopólios existem e podem ser socialmente prejudiciais, cobrando preços muito acima

de seus custos, restringindo a participação de outras firmas no mercado e adotando

tecnologias ineficientes. Entretanto, esse tipo de empresa é a exceção e não a regra nas

modernas economias capitalistas. Ademais, as pesquisas econômicas modernas mostram

que algumas poucas firmas competindo bastam para que o preço de equilíbrio seja

aproximadamente o preço de um mercado perfeitamente competitivo. Isso, porém, não

impede que o público em geral ignore a idéia do mecanismo regulador da competição (de

que tanto a demanda quanto a oferta controlam os preços) e atribua unicamente aos

empresários a fixação destes. Por exemplo, na concepção popular, os salários são

demarcados exclusivamente pelos empresários, os quais se valem de seu poder de

monopólio para mantê-los baixos. O mesmo se daria com os preços dos bens e serviços

em geral, demarcados ao gosto do dono da firma.

Como o gráfico 1.3 abaixo demonstra, há um claro viés de percepção em relação à

fixação de preços. Enquanto os economistas e o público iluminado crêem que o preço da

gasolina é decorrente da interação normal entre oferta e demanda, o público geral acredita

Fonte: Caplan (2007)

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que o aumento deste preço é decorrente da vontade dos empresários. Dessa forma, é fácil

entender o porquê de recorrentes propostas de políticas de regulação de preços e salários.

Gráfico 1.3 – Viés Antimercado 2

Depreende-se, portanto, que a idéia advogada por Adam Smith da mão invisível é

totalmente contra-intuitiva para a maior parte das pessoas. Como Lora e Oliveira (2004)

demonstram ao analisar as eleições entre 1985 e 2002 para 17 países da America Latina,

o eleitorado não se preocupa somente com o resultado econômico, mas com as políticas

em si, mostrando-se muito adverso a políticas pró-mercado, especialmente quando os

partidos não possuem uma ideologia condizente com esse tipo de orientação econômica.

Viés Anti-Estrangeiro

  Caplan denomina “viés anti-estrangeiro” a tendência de se subestimar os

benefícios econômicos advindos do comércio com outros países. A idéia comum é que o

próprio fato de que outra nação queira realizar trocas com seu país é razão suficiente para

receber as propostas de comércio com suspeita. Por esse raciocínio, um país somente

comercializaria livremente seus produtos se obtivesse alguma vantagem em relação ao

outro país. Portanto, restringir o comércio internacional seria a alternativa mais sensata.

Há um equívoco nesse pensamento que é recorrentemente explicitado pelos

economistas. Trata-se de considerar o comércio internacional como um jogo de soma

zero, em que a única maneira de um país ter uma balança comercial favorável é que outro

tenha uma balança desfavorável. Entretanto, assim como o indivíduo ganha ao se

Fonte: Caplan (2007)

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especializar e realizar trocas, um país também ganha em termos de produção total caso

comercialize com outros países. E, como mostra a Lei das Vantagens Comparativas, esse

ganho se dá mesmo que o país seja menos eficiente em tudo o que produza.

De fato, o comércio internacional pode ser visto como uma tecnologia que

aumenta a produção de um país, como exemplifica Steven Landsburg:

“Há duas tecnologias para a produção de automóveis nos Estados Unidos. Uma é manufaturá-los em Detroit, a outra é plantá-los em Iowa. Todo mundo sabe a respeito da primeira tecnologia; deixe-me dizer a você sobre a segunda. Em primeiro lugar, você deve plantar algumas sementes, que são os insumos principais na construção dos automóveis. Então espere alguns meses até que o trigo apareça. Depois você colhe este trigo, embarca-o em navios e os manda em direção ao ocidente do Oceano Pacífico. Após alguns poucos meses os mesmos navios reaparecem cheios de Toyotas”. (Apud Caplan, 2007, p.38, tradução livre)

   A raiz desse tipo de viés deve-se, segundo Caplan, a alguma desconfiança

injustificada para com estrangeiros. Caso contrário, por que as pessoas somente focam

em supostas desvantagens comerciais com outros países, enquanto essa mesma

preocupação não aparece no comércio com outras regiões, outras cidades ou outras

famílias? Não há nenhuma desconfiança quanto ao benefício advindo do comércio entre

essas esferas sociais e geográficas, mas quando se trata do comércio entre países, todo

cuidado é pouco.

Um exemplo da manipulação desse tipo de viés em uma campanha política pode

ser verificado nas eleições para presidente em 2006 no Brasil, quando o candidato

Geraldo Alckmin do PSDB classificou a política externa do governo e o comércio com a

China como “exterminadora de empregos”.1 Ao afirmar, por exemplo, que a indústria

têxtil foi invadida por produtos chineses, o candidato desconsiderou o saldo positivo de

mais de 40 bilhões de dólares com esse país.

Retornando à questão do porquê a economia não vai tão bem quanto poderia,

perguntou-se se o fato das empresas americanas estarem investindo em outros países

constituía um problema severo. Como pode-se observar pelo gráfico 1.4, novamente as

opiniões entre os especialistas e o público em geral difere consideravelmente.

                                                            1 http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u81686.shtml, último acesso 28/12/2008

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Gráfico 1.4 – Viés Anti-estrangeiro

  Assim como no viés antimercado, o viés anti-estrangeiro não é endossado pelos

economistas: segundo Alston et al. (1992), quase 93% dos economistas concordavam que

tarifas e cotas de importação são prejudiciais ao bem-estar social. E mesmo um

economista como o prêmio Nobel Paul Krugman, cuja pesquisa se baseou nas

peculiaridades do mercado internacional, afirma que “o conflito entre nações que tantos

intelectuais imaginam prevalecer é pura ilusão; mas é uma ilusão que pode destruir a

realidade dos ganhos mútuos do comércio [internacional]” (Apud Caplan, 2007, p.39,

tradução livre).

Viés gerador de emprego

O “viés gerador de emprego”, de acordo com Caplan, é a tendência em subestimar

os benefícios econômicos advindos da conservação de trabalho. O público acredita que é

melhor utilizar mais trabalhadores do que menos, e vêem negativamente as atividades e

as tecnologias que conservam trabalho. Os economistas, ao contrário, enxergam nessas

atividades a essência do crescimento econômico: a produção de mais com menos

recursos.

Ninguém nega que quanto maior a produtividade de um trabalhador, melhor esse

trabalhador é para a sociedade como um todo. Entretanto, as pessoas tendem a associar

que uma sociedade prospera quando o desemprego diminui, não quando a produção

aumenta. Isso porque, para o indivíduo, é preciso somente que ele tenha um trabalho para

Fonte: Caplan (2007)

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prosperar. Já a sociedade prospera somente quando o indivíduo faz um trabalho, ou seja,

se ele cria bens e serviços que são valorizados por outras pessoas. Ademais, a tendência

natural é associar progresso a esforço: quanto maior o esforço, maior o resultado. Assim,

progresso estaria relacionado ao maior esforço. Já aos olhos dos economistas, progresso

se equaciona numa relação inversa: quanto menor o esforço para um maior resultado,

maior o progresso alcançado. (Caplan 2007)

Essa diferença se daria pelas diferentes percepções do que seria considerado

progresso: como a produção e o consumo estão dissociados em uma economia capitalista,

algumas pessoas se beneficiam com o aumento de produtividade e outras são

temporariamente prejudicadas. Por exemplo, para a maioria das pessoas o advento do

computador foi uma revolução na produtividade em seus trabalhos. Entretanto, para

outras, que perderam seus empregos em um primeiro momento, esse progresso

tecnológico foi temporariamente prejudicial. Temporariamente porque o indivíduo que

perde seu emprego em decorrência de um aumento de produtividade terá incentivos para

procurar outro emprego em outra atividade que o requeira. A economia capitalista se

recria, alocando os trabalhadores onde eles são mais necessários. Entretanto, a percepção

geral é a de que o progresso ocorre com o uso de mais trabalhadores.

Por exemplo, na pesquisa de opinião estudada, Caplan (2007) verifica que o

público geral associa a redução de trabalhadores pelas firmas a um dos problemas mais

graves que a economia enfrentava. Novamente, essa opinião é bem diversa da

apresentada pelos economistas e o público iluminado.

Gráfico 1.5 – Viés Gerador de Emprego

Fonte: Caplan (2007)

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Não é à toa, portanto, que toda política governamental é alardeada como criadora

de empregos, e não como forma de aumentar a produção de bens de consumo. Estatísticas

de criação de postos de trabalho têm retornos políticos muito maiores do que as de

aumento da produção. E também não é à toa que tecnologias poupadoras de mão-de-obra

são vistas com maus olhos pela sociedade.

Viés de pessimismo

É uma constante antropológica o fato de que pessoas mais velhas acham que,

quando mais novas, a sociedade em que viviam era melhor em diversas questões sociais.

Ao idealizarem as condições de um passado remoto, elas colocam as condições presentes

numa perspectiva negativa. Como explica David Hume, economista e filósofo inglês do

século XVII: “O temperamento de maldizer o presente e admirar o passado está

fortemente enraizado na natureza humana, influenciando até pessoas dotadas de

julgamentos lúcidos e extenso conhecimento” (Apud Caplan, 2007, p.46, tradução livre).

De acordo com Caplan, essa crença também se estende à economia. Ele denomina “viés

de pessimismo” a tendência em se superestimar a severidade dos problemas econômicos

e subestimar o desempenho econômico do presente. O público, em geral, tende a crer que

as condições econômicas não são tão boas como elas realmente são, ou crêem que uma

crise representa um colapso da economia.

Assim, de acordo com Caplan, em diversas ocasiões os economistas necessitam

relembrar os ganhos que a humanidade tem conseguido nos últimos anos (ganhos estes

que são considerados como inatos pela maior parte das pessoas), de forma a colocar em

perspectiva os problemas pelos quais passa a economia. Um recente artigo do economista

Delfim Neto exemplifica muito bem esse fato:

“Há pelo menos dois fatos empiricamente verificáveis que não podem (ou não deveriam) ser

esquecidos neste momento de crise: 1°)as vantagens insuperáveis [do capitalismo]. [...] Permitindo

aos homens apropriarem-se dos benefícios de sua liberdade de iniciativa e criatividade na ciência e

na tecnologia, ele, nos últimos 250 anos (depois de dez séculos de estagnação), permitiu que a

população mundial se multiplicasse por seis, acompanhada de um enorme aumento de seu bem-estar

material, cujo indicador definitivo foi a duplicação de sua expectativa ao nascer (de 30 para 60 anos)

e 2°) que nestes 250 anos todas as organizações alternativas inventadas por cérebros peregrinos

revelaram-se tragicamente ineficientes do ponto de vista econômico e supressoras da liberdade

individual sem a qual o homem não realiza o seu potencial. [...] Nos últimos 250 anos, o crescimento

do PIB per capita se fez em torno de uma tendência exponencial com 46 ciclos irregulares, o último

dos quais estamos vivendo. É por isso que, muito mais do que tentar ‘refundar o capitalismo’ em

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resposta à crise, é melhor continuar a aperfeiçoá-lo para que a próxima crise tenha menos virulência

que a atual...”. (Folha de São Paulo, 5 de novembro de 2008, p.A2)

Apesar de reconhecer que o papel desse viés é menor do que o dos outros, Caplan

(2007) argumenta que entre economistas e o público geral há uma diferença significativa

de perspectiva da economia. Enquanto os debates entre os primeiros giram em torno do

quanto a economia crescerá, os segundos giram em torno de assuntos como estagnação

versus declínio.

1.2.2 O Modelo de consumo de Irracionalidade

Se as evidências de erros sistemáticos estão corretas, como é possível então

conciliar um consumidor racional e um eleitor irracional? De acordo com Caplan (2001b,

2001c e 2007), por meio da introdução do conceito de preferências de crenças. Downs

(1957) notou que alguns eleitores votavam com propósitos diversos, não somente tendo

em vista escolher o candidato que melhor representasse suas preferências. O próprio ato

de votar, por exemplo, poderia servir ao eleitor como uma forma de expressar suas

preferências políticas. Um comportamento desse tipo seria necessariamente irracional

apenas em um modelo que explorasse estritamente a relação entre as preferências do

eleitor e os resultados eleitorais gerados pela sua participação.

Dentro da análise econômica, o eleitor possui unicamente uma motivação

instrumental, ou seja, são motivados pelo “fazer”, pelas conseqüências que suas ações

terão no resultado da eleição. Schuessler (2000), entretanto, elabora uma teoria do voto

expressivo com uma diferença fundamental: o foco da motivação do eleitor passa do

“fazer”, da motivação puramente instrumental, para o “ser”, para uma motivação onde a

participação eleitoral é uma forma de expressar suas preferências políticas e, ao fazê-lo,

moldar e/ou reafirmar sua própria identidade política. Uma ação motivada pelo desejo de

expressão é, antes de tudo, uma forma de identificação e de vinculação. É uma forma de

identificação porque é expressando sua preferência por um candidato de esquerda que o

indivíduo se torna de esquerda. É uma forma de vinculação porque é votando em um

candidato de esquerda que o indivíduo se vincula a uma comunidade de esquerda. Como

argumenta Schuessler:

“Um indivíduo motivado instrumentalmente desempenha uma ação X somente para criar um resultado Y, e o valor da ação X é determinado pela sua capacidade (esperada) de efetivamente obter o resultado Y. [...] Em contraste, um indivíduo motivado expressivamente desempenha uma ação X não para gerar um resultado Y, mas para ser um X-performer. [...] O valor de X depende do valor do que significa ser um X-performer para ele”. (2000, pág. 91, tradução livre)

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Pode-se dizer, portanto, que os retornos do voto são antes “existenciais” do que

instrumentais. E também que os retornos são antes privados do que públicos, ao contrário

do voto econômico instrumental.

A argumentação de Schuessler resolve o chamado paradoxo da participação do

modelo downsiano: dada a probabilidade muito pequena de que seu voto influencie o

resultado da eleição, o comportamento racional do eleitor seria não participar da eleição,

já que esta participação envolve custos. Contudo, eles participam.

Caplan (2001b, 2001c e 2007) utiliza a idéia de Schuessler, de um modelo de

escolha de voto desligado de considerações puramente instrumentais, para introduzir o

conceito de preferências de crenças e explicar o apoio popular a políticas

contraproducentes. O exemplo mais contundente desse tipo de preferência está na

religião. A visão de mundo desta crença proporciona uma utilidade positiva aos seus

seguidores, independente do grau de informação que se possui a respeito desta crença e o

grau de sua coerência lógica. O mesmo se daria em outras esferas: assim como a fé

religiosa tem um valor muito grande para os crentes, as crenças políticas e econômicas

também teriam valor para os eleitores. Como argumenta Caplan:

“A ideologia política/econômica é a religião da modernidade. Como os que aderem à religião tradicional, muitas pessoas encontram conforto em suas crenças políticas e afastam com grande hostilidade qualquer questionamento de suas visões. [...] Para muitas pessoas, por exemplo, praguejar contra o comércio internacional é uma fonte de conforto e orgulho. Elas podem não proclamar sua visão protecionista todos os dias, e podem inclusive reconhecer o efeito benéfico do comércio em algumas circunstâncias especiais. Mas eles resistem – e se ofendem – com aqueles que tentam mudar suas opiniões explicando [a Lei das] vantagens comparativas. Cientistas naturais sabem há muito tempo que a maioria das pessoas desacredita em suas descobertas porque contradizem a religião. Cientistas sociais precisam aprender que a maioria desacredita em algumas de suas descobertas porque estas contradizem uma quase-religião.” (2007, p.16, tradução livre)

Tecnicamente, então, introduz-se na função utilidade dos eleitores downsianos

uma segunda variável: além da utilidade esperada da renda pessoal advinda de seu voto,

inclui-se a utilidade de sua crença política (ou visão de mundo político-econômica).

Assim, pode-se pensar na irracionalidade como um bem econômico, cujo nível ótimo de

consumo depende de duas forças: preferências e preços. As preferências, como já visto,

são preferências sobre crenças político-sociais que podem ser condizentes ou não com a

realidade. As pessoas obtêm utilidade dessas crenças. Já o preço da irracionalidade é o

custo material de manter um comportamento sistematicamente errado.

De posse das preferências e dos preços das crenças, podemos estabelecer um

modelo de “consumo” de irracionalidade, o qual Caplan denomina de modelo de

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irracionalidade racional, numa alusiva analogia ao modelo de ignorância racional. Dado

que os agentes se preocupam com sua riqueza material e com suas crenças, quanto menor

o custo material de ser irracional mais se “consumirá” irracionalidade. Ou seja, esta

relação implica em uma “demanda por irracionalidade”, exemplificada no gráfico 1.6

abaixo. O gráfico à direita mostra a hipótese do agente totalmente racional adotada pelos

economistas no modelo de expectativas racionais, em que o agente não deseja ser

irracional a nenhum preço.

Gráfico 1.6 – Demanda por Irracionalidade

Na realidade, não se pressupõe que as pessoas consumam irracionalidade, ou seja,

que elas comecem com uma percepção clara da verdade e jogam-na fora para consumir

irracionalidade. Ao contrário, pressupõe-se que o indivíduo apegado emocionalmente a

uma determinada crença não possui incentivos para examiná-la até que apareçam custos

materiais em sustentar tal crença. É a partir desses custos que ele toma uma decisão

ótima.

Porém, é preciso diferenciar o custo material na vida privada e na vida pública. Se

um consumidor é irracional em relação às decisões que toma, e erra sistematicamente em

suas previsões, isso possivelmente o levará à falência. O custo de seus erros é privado, ou

seja, somente ele sofre as conseqüências. Já quando esse mesmo consumidor é a favor de

uma política ineficiente, e vota a favor dela, toda a população arca com os custos,

diminuindo o custo individual do seu erro de avaliação. Em outras palavras, os custos são

socializados. Assim, a chave para entender as diferenças entre a racionalidade do

consumidor e a racionalidade do eleitor é ter em mente que a opinião pública de um

Fonte: Caplan (2007)

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eleitor é um bem público, enquanto a opinião de um consumidor é um bem privado.

(Caplan 2001c)

A irracionalidade política é como a poluição do ar. Em ambos os casos, os

benefícios privados de se auto-restringir são quase zero. Se o indivíduo se torna um

eleitor racional, as políticas que são adotadas basicamente não mudam, da mesma forma

que o ar que respira não melhora caso deixe de dirigir. Mas, em ambos os casos, o

resultado final é ineficiente para a sociedade.

Se os argumentos de Caplan estão corretos, os mecanismos supostamente

eficientes de controle político, tais como a competição e o monitoramento dos candidatos,

corroboram com a ineficiência da democracia. Isso porque, devido a esses mecanismos, a

atitude predominante seria a demagogia, ou seja, o uso de preconceitos e reivindicações

populares erradas para a obtenção de votos. Com pouco espaço para manobras políticas

impopulares, mas mais eficientes, os candidatos possuem poucos incentivos para se

desviarem das demandas da população.

1.3 Estudos sobre o eleitor no Brasil

A literatura brasileira sobre o comportamento eleitoral tem se baseado mais em

analises descritivas, no âmbito de eleições individuais, do que em analises quantitativas,

que agreguem diversos pleitos (Castro, 1997). Contudo, dada a natureza do presente

trabalho, optou-se por revisar esta literatura quantitativa.

O contexto brasileiro é muito diverso do contexto norte-americano, o qual a maior

parte dos estudos analisados baseia-se. Por exemplo, a democracia brasileira possui um

histórico de diversos interregnos marcados por ditaduras, ao contrário da democracia nos

Estados Unidos, a qual existe há mais de 200 anos ininterruptos. Entretanto, de acordo

com Rennó e Spanakos (2006), o recente período de redemocratização é extremamente

favorável a análise da relação entre variáveis econômico-financeiras e o voto. Por um

lado, as eleições presidenciais de 1994, 1998 e 2002 foram marcadas por disputas entre

candidatos a favor de políticas pró-mercado (abertura comercial, privatizações, ajustes

fiscais) e candidatos com discursos desfavoráveis a tais políticas. Por outro lado, a mídia

tem dado destaque crescente aos indicadores financeiros nacionais e internacionais: temas

como o risco-país e a taxa de câmbio passaram a ser tratados diariamente pelos meios de

comunicação. Ademais, o Brasil passou por profundas transformações econômicas,

debelando uma hiperinflação, mas não conseguindo retomar o crescimento sustentado da

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economia. Esse contexto, portanto, mostra-se desafiador ao voto retrospectivo, já que ele

é padrão normal de decisão eleitoral em regimes democráticos estáveis.

Rennó e Spanakos (2006) analisam a relação causal existente entre indicadores

financeiros e as intenções de voto, além da relação destas últimas com variáveis

econômicas tradicionais. Por meio de um banco de dados de intenções de voto para os

dois principais candidatos a presidente, entre 1994 e 2002, os autores concluem que o

padrão de voto retrospectivo predominou nestas eleições. O candidato da oposição se

beneficia com um desempenho econômico fraco, ou seja, as intenções de voto nele

aumentam, enquanto os candidatos do governo se beneficiam com bons resultados da

economia. Já a relação entre indicadores financeiros e intenções de voto apresenta uma

mão dupla. Intenções no então presidente Fernando Henrique influenciam diversos

indicadores econômicos, afetando diretamente a economia. Já intenções no candidato da

oposição alteram somente os indicadores financeiros, não afetando variáveis reais, como

desemprego e inflação. Ou seja, bons resultados da economia influenciam os votos, assim

como as intenções de voto influenciam a economia.

Tendo em vista, portanto, que o eleitor brasileiro também vota retrospectivamente,

é preciso verificar até que ponto eles são informados. Contudo, outra distinção do

contexto brasileiro é a alta desigualdade socioeconômica que caracteriza todo o país. De

acordo com Rennó (2007), as diversas desigualdades existentes tendem a se acumular e

se reforçar, o que, por sua vez, pode afetar a distribuição de informações políticas na

sociedade. Por exemplo, desigualdades econômicas podem comprometer a distribuição de

informações e de voz políticas, sendo que esta distribuição desigual pode reforçar a

desigualdade econômica, criando um círculo vicioso.

Utilizando uma pesquisa realizada em 2002 para duas cidades de médio porte,

Juiz de Fora, em Minas Gerais, e Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, em três períodos

distintos no ano (antes e durante a campanha eleitoral), Rennó (2007) avalia a existência

de vieses na participação política e na distribuição de informação. Os resultados mostram

que o comportamento dos eleitores mais informados difere em relação aos menos

informados no que tange a participação política e ao tipo de voto. Os resultados também

mostram vieses na distribuição de informações políticas. Existe um hiato de gênero que

favorece os homens: estes possuem um nível de informação mais alto do que o das

mulheres em ambas as cidades no início e ao longo da campanha. Já o hiato de raça só é

significativo na cidade de Juiz de Fora, o que indica que os negros possuem mais

dificuldades de obter informações políticas em um ambiente mais complexo. Por sua vez,

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o hiato entre ricos e pobres existente em Caxias do Sul, mas não em Juiz de Fora, indica

que esse hiato ocorre mais em ambientes onde as divisões de classe são mais profundas.

Assim, a principal conclusão do estudo é que as desigualdades socioeconômicas no Brasil

se traduzem em desigualdades de informação política. Homens, brancos e ricos são os

que mais possuem informação política.

Apesar desses vieses na distribuição de informação, os eleitores brasileiros fazem

um bom uso delas quando facilmente disponíveis. Ferraz e Finan (2008) demonstram esse

fato ao apresentarem evidências de que um aumento da informação disponível aumenta o

accountability por parte dos eleitores. Utilizando os dados de um programa de

anticorrupção iniciado em 2003 no Brasil, os autores derivam um modelo de experimento

natural que os permite investigar quais são os efeitos informativos de auditorias fiscais

em dois aspectos: os efeitos do tipo de informação revelada pela fiscalização e os efeitos

da presença de mídia local na divulgação das auditorias.

Nesse programa anticorrupção, a Controladoria Geral da União selecionava

governos municipais aleatoriamente para serem auditados em seus usos de verbas

transferidas pelo governo federal, sendo que os resultados encontrados pelos auditores

eram tornados públicos para a mídia em geral. Ao comparar os resultados das eleições

nos municípios que foram auditados antes das eleições (o chamado grupo de tratamento)

com os que foram auditados depois (o chamado grupo de controle), Ferraz e Finan

mostram que ser auditado antes das eleições municipais e possuir evidências de

corrupção têm um efeito muito grande nas chances de reeleição. Entre os prefeitos com

nenhuma irregularidade de corrupção, 53% se reelegeram. Esse número caiu 20% nos

municípios onde foram encontradas três dessas irregularidades. Um ponto interessante a

ser notado é que quando não foi reportada nenhuma irregularidade de corrupção, o

candidato à reeleição se beneficiou com a auditoria, aumentando sua chance de reeleição.

Isso mostra que os eleitores, nas palavras dos autores, cometem erros sistemáticos de

avaliação dos políticos, pois superestimam sistematicamente o nível de corrupção dos

candidatos, recompensando-os quando se apresentam honestos.

Assim, dadas as evidências para o Brasil de que a informação exerce influência

sobre a decisão do voto, e sendo o país marcado por desigualdades informacionais

significativas entre a população, torna-se necessário verificar se as ineficiências

apontadas pela teoria econômica realmente ocorrem. Por exemplo, Avarte et al. (2007)

estuda os Political Business Cycles no Brasil para o período de redemocratização.

Segundo os autores, o Brasil é um ótimo país para se estudar os efeitos da política fiscal

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sobre as chances de reeleição dos governadores. Déficits freqüentes e excessivos em

grande parte dos estados constituíram o padrão na década de 1980 até meados dos anos

90. O ambiente de alta inflação contribuía para que os governos estaduais permanecessem

em constante déficit em suas contas, “balanceando” seus orçamentos por meio de

indexações de impostos e atrasos com suas despesas. Contudo, a introdução da “Lei de

Responsabilidade Fiscal” em 2000 restringiu a discricionariedade de todas as esferas de

poder na condução de seus orçamentos, o que pode ter impactado nos ciclos políticos.

A análise dos dados mostra a existência destes ciclos. Os anos eleitorais de 1990,

1994 e 1998 apresentam déficits que são, em média, 1,5 a 3% maiores do que em anos

não eleitorais. Após as restrições da Lei de Responsabilidade Fiscal e das privatizações

dos bancos estaduais, a política fiscal passou a produzir superávits em todos os anos.

Ademais, resultados econométricos indicam que os eleitores recompensam os políticos

que produzem melhores resultados fiscais, ou seja, os eleitores são fiscalmente

conservadores. Apesar disso, o arcabouço institucional parece ter sido o redutor dos

incentivos em se incorrer em déficits fiscais, já que os eleitores mostraram-se incapazes

de antecipar os custos de ajustes futuros na maior parte do período analisado.

Resultados semelhantes são encontrados por Sakurai e Menezes-Filho (2008) ao

analisarem a relação entre a probabilidade de reeleição dos prefeitos e os gastos públicos

em seus municípios. Estimações utilizando um painel com dados de 2000 municípios

entre 1988 e 2000 mostram que, em termos gerais, aumentos nos gastos públicos

realizados pelos prefeitos aumentam suas chances de reeleição. Ademais, aumentos nos

gastos com capital nos três anos anteriores à eleição e desvios de gastos correntes no ano

eleitoral beneficiam os prefeitos. Estes resultados, portanto, sugerem que os eleitores

brasileiros são sistematicamente enganados por manipulações fiscais nos anos eleitorais.

Seriam estes resultados evidências de que o eleitor é racionalmente ignorante, ou

os enganos sistemáticos evidenciam uma irracionalidade nos moldes da que Caplan

sugere? Dillon Soares (2000) contra-argumenta a tese do eleitor irracional ao analisar

uma pesquisa conduzida para o Distrito Federal, em 1997. Os resultados mostram que os

eleitores decidem seu voto em função da avaliação de um extenso conjunto de políticas

públicas. Entretanto, o autor não verifica até que ponto essa avaliação mostra-se correta, e

o caráter pouco usual da situação socioeconômica do Estado do Distrito Federal não

permite extrapolar essas conclusões para todo o Brasil. Assim, pode-se notar que as

evidências empíricas sobre o comportamento eleitoral brasileiro ainda são poucas,

especialmente no que concerne à racionalidade do eleitor.

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Capítulo 2 – Teste de Racionalidade 

Apesar da literatura teórica e empírica da economia política positiva assumir

implícita ou explicitamente a racionalidade do eleitor, não existem muitas evidências

empíricas sobre quão bem os eleitores processam informações econômicas quando

realizam escolhas sobre políticas. Também não há consenso a respeito de como se deve

testar a racionalidade dos eleitores (ver, por exemplo, Wittman (2005a, 2005b), Caplan

(2005a, 2005b), Peltzman (1990) e Wolfers (2002)).

Este trabalho visa contribuir com essa literatura testando quão boa é a capacidade

de processar informações do eleitor no Brasil, país este cujas características (ser uma

democracia recente, ter um baixo índice de escolaridade, etc.) são pouco exploradas pela

maioria dos trabalhos, dado que se concentram basicamente em países desenvolvidos.

Wittman (2005a) chama a atenção para o fato de que a metodologia dos testes de

racionalidade aplicados aos eleitores não corresponde a mesma metodologia aplicada aos

consumidores, o que seria um erro. Uma das formas de testar a capacidade de processar

informações dos agentes no mercado econômico é por meio do modelo principal-agente.

Por exemplo, Bertrand & Mullainathan (2001) testam quão bem o conselho diretor de

uma empresa filtra efeitos exógenos (condições agregadas do mercado) no desempenho

dos CEOs, recompensando-os financeiramente. A existência de erros sistemáticos na

avaliação de desempenho sugeriria então um processamento de informações não-racional.

Similar a este teste, Wolfers (2002) deriva um teste de racionalidade para o eleitor

baseado no problema principal-agente existente entre os eleitores e seus candidatos

eleitos.

Os eleitores se preocupam em eleger líderes competentes, mas não conseguem

observar diretamente o esforço e a habilidade dos políticos. Pela teoria do principal-

agente, esses eleitores devem, portanto, basear seus votos em variáveis observáveis,

incluindo o desempenho econômico de sua região ou país. Assim, um eleitor racional –

no sentido de processar eficientemente as informações que possui e não cometer erros

sistemáticos de avaliação – deve recompensar resultados econômicos bons, os quais

reflitam as ações do político em questão (o chamado voto retrospectivo), mas também

deve conseguir “filtrar” em sua avaliação eventos econômicos que não estejam sob o

controle desse político. Caso essa “filtragem” seja imperfeita, isso evidenciaria

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irracionalidade, já que o eleitor incorre em erros sistemáticos de avaliação por não

processar eficientemente a informação disponível, aumentando a probabilidade de que

um político incompetente (mas que tenha sorte) seja reeleito. Ou, ao contrário, não

reeleger um político competente que tenha tido azar de assumir seu cargo em um

momento ruim da economia. Uma irracionalidade desse tipo diminui o poder de incentivo

que os eleitores detêm, já que enfraquece a relação entre as ações de um político e suas

conseqüências eleitorais, diminuindo o chamado accountability político.

Essa caracterização de racionalidade do eleitor não leva em conta os custos e

benefícios de se informar e processar eficientemente essa informação. Entretanto, ao

equacionar a racionalidade com o uso eficiente de toda a informação disponível para

avaliar a competência administrativa dos políticos, permite implementar um teste direto

de racionalidade, sem a necessidade de especificar nenhuma forma restrita de modelo. Ao

final deste capítulo, contudo, algumas considerações são feitas a respeito da validade

deste teste.

2.1 O Teste de Wolfers

Como já dito, Wolfers (2002) deriva um teste do problema principal-agente

existente entre os eleitores e os candidatos. Os eleitores são os principais e os

governadores estaduais dos Estados Unidos são os agentes em questão.

Contudo, antes de testar a racionalidade, faz-se necessário examinar se os eleitores

realmente avaliam os governadores pelo desempenho econômico dos estados. Ao analisar

as eleições estaduais dos 50 estados dos EUA para o período entre 1947 e 1997, o autor

restringe a amostra somente para as eleições que se aproximam de uma disputa entre dois

partidos (classificados como republicanos e democratas), o que lhe dá uma amostra de

636 eleições. Wolfers então regressa a diferença percentual de votos obtida pelos partidos

candidatos a reeleição entre duas eleições consecutivas em relação a vários indicadores

econômicos:

(1) ∆Parte dos votos recebidos s,t = c + β ∆Desempenho econômico do Estado s,t + ε s,t

Em que s denota o estado e t o ano. A variação nas variáveis independentes se refere à

diferença entre os dois anos anteriores às eleições. A primeira variável de desempenho

econômico testada é a renda pessoal per capita real, utilizada pela maior parte da

literatura, apesar de ser preferível, segundo o autor, o uso do PIB estadual agregado,

contudo somente disponível a partir de 1977. Essa variável se mostra uma má

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prognosticadora dos resultados eleitorais, como se pode perceber pela análise da tabela

2.1 abaixo. Porém, de acordo com Wolfers, esse resultado provavelmente se deve a

significantes erros de mensuração e dificuldades em deflacionar essa variável.

Tabela 2.1

A segunda variável de desempenho econômico é a taxa de emprego. Os resultados

são robustos e significantes estatisticamente, o que corrobora para a hipótese de que a

primeira variável apresenta problemas de mensuração. Por último, utilizou-se o preço das

casas, já que representam uma proxy da valoração futura do mercado a respeito das

características locais, tais como a oportunidade de empregos, a criminalidade local, o

provimento de bens públicos, etc. Essa variável também apresenta resultados robustos e

significantes da relação entre desempenho econômico e a chance de reeleição do partido.

Assim, pode-se afirmar que o desempenho econômico afeta os resultados das

eleições estaduais para governador e que grande parte dos estudos que negam essa

correlação deve-se à escolha de indicadores pouco precisos.

2.2 Teste da Racionalidade do Eleitor: A filtragem do desempenho relativo

Adaptando para o contexto político os testes empreendidos para os CEOs, Wolfers

regressa a variação dos votos obtidos pelos partidos que disputavam a reeleição em

relação às variações da economia nacional e da economia estadual relativamente à

mudança na economia nacional. De acordo com o autor, “a idéia central é a de que as

variações nacionais não provêem informações sobre a competência dos governadores,

enquanto os desvios da economia dos estados em relação ao resto do país refletem essa

competência e esforço” (2002, p.7, tradução livre). Assim:

Renda pessoal per capita Taxa de emprego Preço real das casasCoeficiente

Erro padrão robusto

R² ajustado

Amostra

Fonte: Wolfers (2002)***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.

0.19**

0.08

0.025

n = 185 (1982-1997)n = 636 (1947-1997) n = 636 (1947-1997)

Variável dependente: Variação dos votos recebidos pelo partido em exercício (OLS)Efeitos das condições econômicas estaduais sobre os votos do partido em exercício para governador

0.06

0.07

-0.001

0.027***

0.1

0.011

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(2) ∆Parte dos votos recebidos s,t = c + α(∆Desempenho econômico do Estado s,t –

∆Desempenho econômico Nacional t )+ β ∆Desempenho econômico Nacional t + ε s,t

O Coeficiente α é caracterizado como a recompensa do esforço e competência do

governador, enquanto o coeficiente β mede a recompensa da “sorte”. O modelo de eleitor

racional implica que essa recompensa pela sorte não deve existir, ou seja, a racionalidade

implica em β = 0. Entretanto, a crescente literatura da economia comportamental sugere

que, devido a fatores do ambiente social e de segundo plano que atrapalham a avaliação

de competência, o coeficiente β pode ser positivo. Dessa forma, os testes para CEO

também testam a hipótese nula de que os principais não distinguem a sorte da

competência, ou seja, β = α.

O primeiro teste, em que a estimação é realizada por mínimos quadrados

ordinários, utiliza como variável dependente a variação na porcentagem dos votos

recebidos pelo partido entre as duas eleições. O segundo teste utiliza o governador

individual, ao invés do partido, estimando a regressão pelo método Probit, sendo que a

variável assume o valor 1 quando o governador é reeleito, e zero, quanto não é.

Os resultados são apresentados nas tabelas 2.2 e 2.3 abaixo. Eles mostram que os

eleitores possuem um bom desempenho em filtrar as informações disponíveis. Cinco

coeficientes das seis regressões estimadas (três variáveis de desempenho econômico e

duas variáveis dependentes, partidos e governadores individuais) mostram que o

desempenho econômico relativo dos estados é um importante fator nas eleições do chefe

do executivo local. Novamente, somente os dados referentes à renda pessoal per capita

levaram a resultados inconclusivos.

Em relação à hipótese de que os eleitores são enganados pelo desempenho da

economia nacional, em apenas uma regressão a hipótese nula (β = 0) pode ser rejeitada,

ou seja, os eleitores filtram esses falsos sinais. Analogamente, a hipótese nula de uma

filtragem pouco eficaz (β = α) é rejeitada para a variável desemprego, enquanto os testes

que utilizam o preço das casas e a renda pessoal possuem pequeno poder estatístico.

Assim, as evidências sugerem que o desempenho econômico estadual influencia as

eleições e os eleitores apresentam uma boa capacidade de avaliá-lo relativamente à

economia nacional.

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Tabela 2.2

Tabela 2.3

Entretanto, existe a possibilidade de que fatores externos estejam guiando os

resultados encontrados. Por exemplo, segundo o autor, as eleições estaduais podem servir

para “sinalizar ao governo nacional” alguma insatisfação com a economia, caso o

governador e o presidente pertençam ao mesmo partido, o que sugere a inclusão de uma

variável para o partido do presidente em exercício. Ademais, variáveis de controle, como

efeitos fixos para os anos interagidos com o partido, que capturem mudanças em relação

à preferência pelo partido, e de efeitos fixos para estados, que capturem mudanças

próprias do estado, também devem ser incluídas. Os resultados mostram que essas

Preço real das casas

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional) 0.42*** 0.22*** 0.08

β = Efeitos da sorte (∆Nacional) 0.14 0.09 0.01

R² ajustado 0.013 0.022 -0.001

Teste α = β F(1, 633) = 2.84* F(1, 182) = 0.73 F(1, 633) = 0.33

Amostra n = 636 (1947-97) n = 185 (1982-97) n = 636 (1947-97)

Fonte: Wolfers (2002)

Taxa de emprego Renda pessoal per capitaPrimeiro Teste de Racionalidade - Filtragem do Desempenho Relativo (Variável Dependente = Variação dos Votos do partido)

***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.

Preço real das casas

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional) 3.0*** 1.2** 1.4**

β = Efeitos da sorte (∆Nacional) 1.6* 0.8 1.6

R² ajustado 0.026 0.059 0.016

Teste α = β χ²(1) = 1.16* χ²(1) = 0.18 χ²(1) = 0.02

Amostra n = 356 (1950-88) n = 69 (1982-88) n = 356 (1950-88)

Fonte: Wolfers (2002)

Taxa de emprego Renda pessoal per capita

***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.

Primeiro Teste de Racionalidade - Filtragem do Desempenho Relativo (Variável Dependente = Governador Reeleito) - Probit

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variáveis de controle são muito significativas estatisticamente, mas as estimações em

relação à competência do eleitor permanecem robustas.

Por fim, Wolfers analisa somente os dados para os períodos de variação moderada

das variáveis de desempenho econômico, já que fora desses períodos a avaliação dos

eleitores pode ser dificultada por questões como aversão ao risco de eleger novos

governadores (em períodos de depressão econômica nacional) ou assimetria de

informação (em períodos de grande crescimento). Os resultados continuam robustos após

a retirada destes períodos. Portanto, os resultados são consistentes com o modelo de

eleitor racional, pois sugerem que o eleitor não é enganado por melhoras na economia

estadual que não se devem à competência e ao esforço do governador.

2.3 O Teste da Racionalidade do Eleitor por Variáveis Instrumentais

O teste acima, entretanto, somente evidencia uma capacidade mais simples de

filtragem por parte dos eleitores. Um teste mais complexo deveria estender a análise para

um conjunto de outros choques exógenos relacionados com a economia estadual além da

mera correlação desta com a economia nacional. Para isolar tais choques, Wolfers utiliza

o método de variáveis instrumentais, o qual facilita a comparação direta entre os retornos

por “sorte” e os retornos por competência: em um primeiro estágio, divide-se o

desempenho econômico estadual em um componente que claramente não reflete a

competência do governador, por estar fora do controle deste, e outro que, possivelmente,

reflete em parte essa competência. Em um segundo estágio, estima-se a correlação entre

cada um desses componentes e a probabilidade de reeleição.

Pode-se comparar esse método com o teste anterior da seguinte forma: o teste

utilizado de avaliação relativa tratava a variável de desempenho econômico nacional

como uma possível fonte exógena do desempenho estadual. Especificamente, ela serviu

como um instrumento de “sorte” do governador. Já a variação residual dos estados

(∆Desempenho econômico do Estado s,t – ∆Desempenho econômico Nacional t )

funcionou como uma proxy imperfeita para estimar a competência do governador.

Portanto, supôs-se implicitamente que na regressão do primeiro estágio o coeficiente foi

1, ao invés de se estimá-lo. Esses dois “instrumentos” foram então utilizados para medir o

papel da sorte e da competência nas decisões eleitorais. Dessa forma, pretende-se

estender essa abordagem para testar efeitos de outras fontes de “sorte” e verificar se os

eleitores cometem erros sistemáticos na avaliação dos políticos.

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Como já dito, a variação residual dos estados funcionou como uma proxy

imperfeita para estimar a competência dos governadores. Ao invés de supor como 1 o

coeficiente da regressão no primeiro estágio, pode-se estimá-lo isolando uma fonte

conhecida fora da alçada de competência do governador:

(3) Us,t Estado – Nacional = βXs,t + ξ s,t

Em que Us,t Estado – Nacional é a variação do desempenho econômico estadual em relação ao

nacional (Wolfers utiliza a variação do emprego estadual menos a variação do emprego

nacional) e Xs,t refere-se à fonte de crescimento da economia estadual fora do controle dos

governadores. O resíduo remanescente ξ s,t é denominado Us,t Inexplicável, que pode, em

parte, refletir a competência do governador. Defini-se esse resíduo da seguinte forma:

(4) Us,t Inexplicável ≡ Us,t

Estadual − Ut Nacional – β^Xs,t = γ Gs,t + vs,t

Em que a variável Gs,t é denominada “competência do governador” e a variação residual

vs,t é denominada “sorte não-observada”. Ou seja, o desempenho econômico estadual

pode refletir tanto a competência do governador Gs,t, quanto outras fontes que não sejam

relacionadas com a economia nacional e nem com o choque exógeno Xs,t. Cabe aqui

salientar dois pontos. Primeiro, a diferença entre a “sorte observada” Xs,t e a “sorte não-

observada” vs,t refere-se à observação pelo econometrista, não sobre a observação pelos

eleitores, já que não se sabe até que ponto vs,t é desconhecido por estes. Segundo, Gs,t e vs,t

são calculadas apenas indiretamente, por meio de ξ s,t. Assim, na regressão de segundo

estágio, o teste de racionalidade é expandido da seguinte forma:

(5) ∆ dos votos recebidos s,t = λ Ut Nacional +δ Ûs,t Estado – Nacional + α Us,t Inexplicável + ε s,t

O coeficiente λ reflete o impacto da economia nacional na chance de reeleição dos

governadores, indicando a capacidade mais simples de filtragem pelos eleitores, os quais

comparam o desempenho da economia estadual em relação à economia nacional. Um

λ > 0 evidencia que os eleitores cometem erros sistemáticos em suas avaliações. Por sua

vez, δ reflete uma capacidade “mais sofisticada” dessa filtragem, já que mede a variação

da economia estadual devida a fonte Xs,t, fora do controle do governador. Caso esse

coeficiente também seja positivo, os eleitores também cometem erros sistemáticos de

avaliação. Já a interpretação do coeficiente α é mais sutil. Devido à variável Us,t Inexplicável

refletir tanto as ações governamentais Gs,t como a “sorte não-observada” vs,t, esse

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coeficiente pode ser interpretado como uma média ponderada dos retornos da

competência do governador e de sua sorte não-observada.

Sabe-se que essa hipótese sobre α é bastante forte, mas de acordo com Wolfers a

dubiedade desse coeficiente não compromete a estimação da competência sobre as

chances de reeleição por três motivos. Primeiramente, se a “sorte não-observada” vs,t não

é observada pelos eleitores, então eles não conseguem distinguir o que é competência e o

que é sorte em Us,t Inexplicável e, por conseguinte, recompensam ambos com o mesmo peso.

Assim, α representa bem os retornos do governador em conduzir competentemente a

economia de seu estado. Em segundo lugar, se vs,t é observada por eleitores racionais, eles

irão descontar totalmente essa sorte em sua avaliação e, portanto, α irá refletir uma

estimativa atenuada dos retornos de competência. Por último, se vs,t é observada pelos

eleitores, mas eles não a distinguem da competência, também não distinguem a “sorte

observada” Xs,t, e o coeficiente α irá refletir uma média ponderada dos retornos por sorte

e por competência. Contudo, caso o instrumento utilizado na regressão de primeiro

estágio (equação 3) seja fraco, o componente de sorte na estimação de Us,t Inexplicável será

exacerbado.

Resumindo, se um instrumento isola apropriadamente uma fonte exógena de

variação no desempenho econômico que reflita apenas a sorte dos governadores,

Us,t Inexplicável refletirá uma boa estimativa da competência governamental e λ e δ

representarão capacidades distintas de avaliação dos eleitores.

2.4 Instrumentos e Resultados

O primeiro instrumento utilizado foi o preço do petróleo, de modo a verificar se as

flutuações econômicas dos estados causadas por choques desse insumo são devidamente

filtradas pelos eleitores nas eleições para governador. Esse é um bom instrumento por

dois motivos: i) é improvável que o preço do petróleo seja afetado pela competência do

governador e; ii) porque ele proporciona uma expansão econômica nos estados

produtores de petróleo e uma diminuição naqueles dependentes desse insumo. Assim, na

regressão de primeiro estágio, o logaritmo do preço real do petróleo interage com uma

dummy para cada estado e empregam-se 50 variáveis de efeitos fixos para captar as

particularidades de cada estado:

(6) Us,t Estado – Nacional = ∑   + βs (Estados * ∆Pt – 1Petróleo) + ξ s,t

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Em que µs e Estados são dummies para os estados e ∆Pt – 1Petróleo é a variação percentual

do logaritmo do preço real do petróleo entre os dois anos anteriores a eleição. A variável

dependente utilizada foi a taxa de emprego. Por sua vez, ξ s,t é a proxy que será utilizada

na estimativa dos retornos eleitorais da competência do governador.

Tabela 2.4

Os resultados obtidos por essa regressão indicam que a os estados produtores de

petróleo (Alaska, Wyoming e Texas) são os maiores beneficiados pelo aumento do preço

desse bem, como seria de se esperar, enquanto os mais prejudicados são estados como

Michigan e Indiana. Entretanto, ao analisar os efeitos dessa fonte de crescimento nos

resultados eleitorais (ver tabela 2.4 acima), verifica-se que, apesar dos eleitores não se

enganarem a respeito da influência dos ciclos econômicos nacionais no desempenho de

seus estados, as flutuações causadas pelos choques no preço do petróleo os enganam

sistematicamente. Os governadores de estados produtores de petróleo são reeleitos em

Amplitude dos coeficientes da variável interada: de -0.07 até +0.023Estados cujos efeitos foram mais positivos: AK, LA, OK, TX, WYEstados cujos efeitos foram mais negativos: IN, MI, NV, TN

Erro Padrão Bootstrap

Filtragem Simples (λ) 0.12

Flitragem Sofisticada (δ) 0.40

Retornos da Competência (α) 0.15

R² ajustado = 0.017 n = 636 (1947-97)

Fonte: Wolfers (2002)***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.

Erro Padrão Robusto

0.12

0.37

0.14

Regressão em Segundo Estágio (OLS)

Coeficiente

0.15

1.13***

0.32**

Segundo Teste de Racionalidade - Variáveis InstrumentaisTaxa de Emprego - Instrumento: Logaritmo do Preço do Petróleo t-1

Regressão em Primeiro Estágio

R² ajustado = 0.15 n = 2504 (1947-97)

Us,t Estado – Nacional = ∑     + βs (Estados * ∆Log Preço Petróleo t-1) + ξ s,t 

∆ dos votos recebidos s,t = λ Ut Nacional +δ Ûs,t Estado – Nacional + α Us,t Inexplicável + ε s,t 

Us,t Estado – Nacional = ∑   + βs (Estados * ∆Pt – 1Petróleo) + ξ s,t 

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períodos de alta dos preços, enquanto nos estados mais dependentes os governadores são

retirados de seus cargos. Já a variável que mede a “competência” apresenta um bom

poder de explicação, indicando que quanto maior essa competência maior a probabilidade

de reeleição.

O segundo instrumento utilizado foi os choques econômicos agregados. Com isso,

examinam-se as flutuações econômicas estaduais que reflitam a sensibilidade de cada

estado a esses choques. Novamente empregam-se 50 instrumentos, um para cada estado,

que interagem com a taxa de desemprego nacional, a qual reflete esses choques

econômicos agregados:

(7) Us,t Estado – Nacional = ∑     + βs (Estados * Ut Nacional) + ξ s,t

Os resultados mostram diferenças estatística e economicamente significativas

entre as sensibilidades cíclicas dos estados. Por exemplo, o estado de Michigan é

extremamente pró-cíclico, enquanto o Alaska é contra-cíclico. Ao analisar os efeitos

dessa fonte exógena de crescimento nos resultados eleitorais, apresentados na tabela 2.5

abaixo, novamente se verifica que os eleitores cometem erros sistemáticos de avaliação.

Apesar de compararem relativamente bem seus estados em relação à economia nacional e

não haver nenhuma tendência em avaliarem os governadores pelo desempenho

econômico nacional (λ não é estatisticamente significante), eles são enganados por surtos

de crescimento econômico devido a flutuações pró-cíclicas em seus estados. Ou seja,

dado que uma expansão econômica leva um estado pró-cíclico a um boom econômico

local ainda maior, os eleitores são enganados pelo maior crescimento local relativamente

à média nacional e reelegem os governadores, presumivelmente baseados em um erro de

inferência da competência destes. Do mesmo modo, os eleitores depõem os governadores

de estados pró-ciclicos em períodos de recessão nacional e de estados contra-cíclicos em

períodos de crescimento econômico, ambos por “manterem” o desempenho econômico de

seus estados abaixo da média nacional. Já a variação residual ξ s,t, utilizada como proxy

para competência, continua apresentando um bom poder de explicação.

Wolfers realiza o mesmo teste de variáveis instrumentais utilizando, no modelo

Probit, a variável dependente “Governador em exercício reeleito”. Os resultados com

ambos os instrumentos são mais fracos e apresentam algumas anomalias, como os

eleitores conseguindo realizar a filtragem sofisticada, mas não a filtragem simples, no

caso dos ciclos nacionais. Ademais, Wolfers impõe mais estrutura no instrumento de

sorte: ao invés de deixar que os efeitos variem independentemente entre os estados, é

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imposta uma restrição de que as diferentes sensibilidades refletem diferentes

composições de indústrias nos estados. Assim, ele interage, na regressão de primeiro

estágio, o logaritmo do preço do petróleo com a porcentagem dos rendimentos de cada

tipo de indústria do estado: construção, finanças, agropecuária, mineração, etc. Os

resultados são basicamente os mesmos.

Tabela 2.5

Portanto, os resultados encontrados sugerem que os eleitores diferenciam apenas

os sinais mais evidentes entre “sorte” e competência governamental. Testes que avaliam

uma capacidade de filtragem mais sofisticada mostram que eles cometem erros

sistemáticos de avaliação, reelegendo políticos sortudos, mas menos competentes.

Entretanto, Wolfers argumenta que, tendo rejeitado a racionalidade estrita, a

evidência de que os eleitores não agem como o modelo principal-agente prediz não

Amplitude dos coeficientes da variável interada: de -2.4 até +0.9Estados cujos efeitos foram mais positivos: CT, IN, KY, MI, OHEstados cujos efeitos foram mais negativos: AK, HI, ND, NM, OK, SD, WY

Erro Padrão Bootstrap

Filtragem Simples (λ) 0.12

Flitragem Sofisticada (δ) 0.34

Retornos da Competência (α) 0.14

R² ajustado = 0.012 n = 636 (1947-97)

Fonte: Wolfers (2002)

0.54* 0.30

0.40*** 0.14

***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.

Regressão em Segundo Estágio (OLS)

Coeficiente Erro Padrão Robusto

0.15 0.12

Segundo Teste de Racionalidade - Variáveis InstrumentaisTaxa de Emprego - Instrumento: Sensibilidade ao Ciclo Nacional

Regressão em Primeiro Estágio

R² ajustado = 0.12 n = 2504 (1947-97)

∆ dos votos recebidos s,t = λ Ut Nacional +δ Ûs,t Estado – Nacional + α Us,t Inexplicável + ε s,t 

Us,t Estado – Nacional = ∑   + βs (Estados * Ut Nacional) + ξ s,t Us,t Estado – Nacional = ∑ + βs (Estados * Ut Nacional) + ξ s,t

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significa que sejam necessariamente irracionais. Pode ser que ocorram desvios do

modelo, como preferências por lideranças estáveis em períodos de incerteza política

devido à aversão ao risco. Como qualquer conjunto de escolhas pode ser racionalizado

apelando-se para uma formulação particular das preferências, um contra-argumento aos

resultados encontrados depende da plausibilidade das preferências requeridas para

explicá-los. Portanto, o autor prefere classificar os eleitores como quase-racionais, ao

invés de puramente irracionais.

É preciso, contudo, levar em consideração algumas dificuldades que este teste

enfrenta. Primeiramente, Wolfers analisa comportamentos agregados para inferir sobre o

comportamento individual. Na literatura esse tipo de abordagem é conhecida como

“falácia ecológica”: pensar que as relações observadas para grupos necessariamente se

mantém para o nível individual. Esse tipo de abordagem pode apresentar dois problemas.

Por um lado, o interesse analítico pode ser em um determinado grupo, mas os dados que

se dispõem podem pertencer a outro grupo. Por exemplo, os eleitores mais sofisticados,

que votam de acordo com o modelo principal-agente, podem estar empregados, enquanto

que os dados de desemprego referem-se ao indivíduos menos capazes, eleitores que se

encontram desempregados e que não filtram os efeitos da sorte dos efeitos de

competência. Por outro lado, pode haver um viés de agregação, ou seja, o comportamento

individual não é o mesmo do comportamento agregado, inclusive podendo ser o contrário

do esperado. (Kramer, 1983)

Um segundo ponto que se deve considerar é o fato de que o teste de Wolfers

equaciona racionalidade com apenas um aspecto do comportamento eleitoral, a saber, o

voto retrospectivo. Essa abordagem reducionista, apesar de ser útil para a modelagem

econométrica, deixa de fora fatores tão ou mais importantes para a explicação do voto.

Por exemplo, a abordagem da escola de Michigan, que enfatiza as perspectivas

psicológicas e psicossociológicas para explicar o comportamento eleitoral, não é

contemplada por este teste. Como explica Borba (2005), para essa vertente teórica são as

opiniões (motivações, percepções e atitudes) em relação à esfera política que determinam

as preferências e, conseqüentemente, o voto, ao invés de considerações factuais sobre a

economia e a sociedade.

Por fim, pode-se contra-argumentar que os resultados obtidos devem-se a falta de

informação dos eleitores. Ao não saberem quem é o responsável pelos resultados

econômicos, os eleitores preferem recompensar (ou punir) todos os políticos

possivelmente envolvidos. Na falta de informação, é preferível manter o status quo.

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Tendo em vista tais considerações, acredita-se que o teste de Wolfers pode

representar mais uma capacidade que o eleitor deveria possuir para um bom

funcionamento da democracia, ou seja, pode medir mais a sofisticação do eleitor, do que

propriamente sua racionalidade. Apesar dessas ressalvas, a adaptação deste teste para o

contexto brasileiro ainda mantém-se importante e interessante, quer seja pelo aspecto de

teste de sofisticação do eleitor, quer seja pela ligação que estabelece entre economia e

política nas eleições estaduais para governador, aspecto este muito pouco estudado na

literatura nacional. Assim sendo, pode-se passar ao estudo do caso brasileiro.

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Capítulo 3 – O Eleitor Brasileiro   Tendo em mente as ressalvas feitas ao teste de racionalidade elaborado por

Wolfers no último capítulo, sua adaptação para o Brasil exige algumas considerações

sobre o contexto institucional e social brasileiro, além de considerações sobre

dificuldades estatísticas que podem comprometer as estimações. A próxima seção

examina detalhadamente tais aspectos. Em seguida, a seção 3.2 descreve os dados

utilizados nas estimações que, por sua vez, são apresentadas na seção 3.3.

3.1 Considerações sobre o contexto brasileiro

O primeiro aspecto a ser levado em conta quando se adapta para o Brasil uma

metodologia utilizada para os Estados Unidos é a diferença histórica dos sistemas de

governança política entre esses países. Enquanto os Estados Unidos já estão acostumados

ao processo democrático há mais de 200 anos ininterruptos, o Brasil ainda está entrando

em sua terceira década de democracia. Esse histórico de baixa experiência com o sufrágio

universal pode se refletir numa cultura política fraca. Como explicam Almond e Verba

(1989), “o termo cultura política refere-se às orientações especificamente políticas, às

atitudes com respeito ao sistema político, suas diversas partes e o papel dos cidadãos na

vida pública” (apud Borba, 2005, p.149). Essas atitudes a respeito do sistema e seus

procedimentos teriam uma ligação com a experiência democrática, em um processo de

aprendizagem que se sedimentaria com o tempo. Dessa forma, seria de se esperar que os

eleitores americanos estivessem mais familiarizados com o sistema democrático e

tivessem um comportamento mais condizente com este.

Outro aspecto a ser levado em conta é a diferença institucional entre o federalismo

brasileiro e o norte-americano. Por diferenças constitucionais, os estados norte-

americanos gozam de uma autonomia muito maior do que os estados brasileiros. Tal

aspecto pode se refletir na atribuição que os eleitores dão a cada governador. É possível,

por exemplo, que os eleitores brasileiros não associem o desempenho econômico de seus

estados à competência do governador, atribuindo tal desempenho exclusivamente ao

executivo federal. Portanto, é provável que variáveis que captem aspectos locais, como a

violência ou o saneamento básico, tenham mais relação com a avaliação que os eleitores

fazem do governador do que variáveis econômicas.

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Um terceiro aspecto que diferencia estes países é a escolaridade da população. No

Brasil, enquanto índice de analfabetismo ainda se mantém em 27% em certos estados,

como Alagoas e Piauí, nos Estados Unidos ¾ da população possuem ensino médio. Por

estar ligado ao grau de sofisticação do eleitor, o baixo nível de escolaridade da população

pode ter repercussões significativas nos resultados obtidos. Ademais, a concentração de

renda no Brasil é uma das mais altas do mundo, o que pode ter implicações em relação ao

acesso às informações políticas. De fato, Rennó (2007) mostra que a renda média do

bairro em que o eleitor vive é um fator decisivo no acesso a informação. Estes fatos são

agravados ainda mais devido à obrigatoriedade do voto. Enquanto nos Estados Unidos o

voto é facultativo, no Brasil o não comparecimento às urnas implica em sanções legais e

financeiras (apesar de alguns autores considerarem tais sanções baixas). Faz-se

necessário, portanto, controlar os resultados com uma variável que capte a educação, por

exemplo, a taxa de analfabetismo da população estadual, além de algum controle para a

desigualdade de renda, como o índice de Gini.

Por fim, a adaptação do teste de Wolfers para o contexto brasileiro esbarra no

problema do sistema multipartidário. Nas eleições norte-americanas, o bipartidarismo

permite uma atribuição mais clara da variável “Variação dos votos” à avaliação que o

eleitor faz do governo. Se a disputa se dá entre dois partidos, pode-se argumentar que a

variação dos votos entre duas eleições consecutivas capta bem a avaliação do

desempenho do partido em exercício por parte dos eleitores. Em um sistema

multipartidário, entretanto, essa correspondência entre variação dos votos e avaliação

seria menos clara. Devido ao maior número de partidos e à pluralidade de coligações

entre os diferentes estados, a variação dos votos se daria mais pela entrada de novos

partidos e seus candidatos do que à avaliação do governo em exercício.

Contudo, uma análise detalhada das eleições brasileiras para governador entre

1994 e 2006 afasta tal hipótese. Em primeiro lugar é preciso diferenciar as variações de

votos entre governadores, partidos e coligações. Variações na quantidade de votos

recebidos por um governador candidato à reeleição refletem muito mais uma avaliação de

seu governo do que variações de votos da coligação que ele apóia. Por exemplo, é mais

provável que a variação dos votos que o governador Jarbas Vasconcelos do PMDB de

Pernambuco obteve entre 1998 e 2002, quando se candidatou à reeleição, se deva à

avaliação de seu governo, do que a variação dos votos entre 2002 e 2006, quando apoiou

o candidato Mendonça, do PFL. Dessa forma, a variável “Variação dos votos” em 2002

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para o estado de Pernambuco provavelmente capta mais a avaliação que os eleitores

fizeram do governo que a mesma variável em 2006.

Analogamente, variações de votos de um mesmo partido também captam melhor,

em relação à coligação, a avaliação que os eleitores fazem a respeito do governo em

exercício. Por exemplo, a variação dos votos em 2002 no estado da Bahia, quando o

governador César Borges do PFL apoiou Paulo Souto, também do PFL baiano, possui,

provavelmente, mais relação com a avaliação que o eleitor fez do governo em exercício

do que a variação de votos no estado do Rio Grande do Norte, quando o PMDB do

governador Garibaldi Alves apoiou a coligação do candidato Fernando Freire, do PPB.

Assim, as variações dos votos que se referem a governadores candidatos à reeleição e

candidatos cujos partidos estejam concorrendo à reeleição captam muito melhor o

componente “avaliação do governo” do que quando o governo em exercício apóia um

candidato apenas por meio da coligação.

Uma análise das eleições brasileiras para o período mostra que em apenas 10%

das eleições analisadas a variável “Variação dos votos” representa variações referentes à

coligação, enquanto que 52,5% das eleições da amostra são governadores que corriam à

reeleição. Portanto, em 90% dos dados utilizados o que está em questão é a variação dos

votos recebidos por um governador candidato à reeleição ou seu partido. Isso permite

afirmar que a variável “Variação dos votos” capta bem o voto retrospectivo, ou seja, a

avaliação que os eleitores fazem dos governadores em exercício, e não se deve à entrada

ou saída de partidos e seus candidatos. Esse argumento é comprovado por uma análise

estatística das eleições: abaixo, tem-se a variável “Variação dos votos” em função da

diferença do número de candidatos a governador por estado entre as duas eleições. Como

depreende-se da análise dos resultados, não há relação entre estas duas variáveis, ou seja,

o aumento da concorrência nas eleições não influencia significativamente a variável

“variação dos votos”.

Tabela 3.1

Coeficiente Erro Padrão Robusto t P-valor-0.008 -0.97 0.335 F(1, 78) = 0.94

Influência do Número de Partidos sobre a variação dos votos rebebidos:

0.008F(k, n-k) R-quadrado

0.013

∆Parte dos votos recebidos s,t = c + µ (∆ do Número de Candidatos a governador s,t ) + ε s,t

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Outra característica das eleições governamentais brasileiras que permite a

adaptação do modelo OLS (cuja variável dependente é “∆ votos recebidos”) para o Brasil

é seu alto índice de eleições que se caracterizam como uma eleição bipartidária, em que

apenas dois partidos recebem mais que 20% dos votos em primeiro turno: 86% das

eleições para o período entre 1994 e 2006 possuem essa característica. Por exemplo, a

despeito das eleições estaduais de São Paulo em 2006 terem tido 14 candidatos diferentes

(o estado que mais teve candidatos nesse ano), os dois candidatos mais votados obtiveram

89,6% do total de votos válidos, o que claramente caracteriza este pleito como sendo

bipartidário. Ademais, dos 14% remanescentes, apenas em quatro eleições os candidatos

apoiados pelos governadores em exercício não ficaram entre os dois candidatos mais bem

votados: Rio Grande do Sul, em 2006, Amapá e Sergipe, em 2002, e Amapá em 1994.

Assim sendo, a despeito do sistema multipartidário, acredita-se que as variações

dos votos das eleições estaduais para governador representam bem a avaliação que o

eleitor brasileiro faz destes políticos, o que permite a adaptação do modelo OLS de

Wolfers para o Brasil.

3.2 O modelo e os dados

Feitas essas considerações, é preciso levar em conta algumas dificuldades

estatísticas. O número de eleições para o Brasil é muito inferior ao número que Wolfers

possui a disposição. As eleições para governador no Brasil sofreram uma interrupção ao

longo do período da ditadura militar e só foram retomadas em 1982. Mesmo assim,

alguns estados somente tiveram eleições para esse cargo em 1990, como é o caso de

alguns estados do Norte, como Amapá, Roraima e Rondônia. Similarmente, o estado de

Tocantins foi criado em 1988 e a primeira eleição só se realizou em 1990. Portanto as

análises dão-se a partir das eleições de 1990. Tendo sido realizadas quatro eleições desde

então, conta-se com uma base de 108 unidades.

A variável dependente “Variação dos votos” utilizada no modelo OLS foi

construída da seguinte forma: refere-se à diferença de votos obtida entre duas eleições

consecutivas pelo governador em exercício, ou partido/coligação à qual ele pertence.

Todas as diferenças referem-se à variação percentual entre as eleições de primeiro turno,

o que evita comparar eleitores que votaram pela reeleição de um candidato como segunda

opção. Por exemplo, em 1998 o governador de São Paulo Mário Covas, do PSDB, obteve

no primeiro turno da eleição 23% do total de votos válidos. Em 2002, o candidato

apoiado pelo governador foi Geraldo Alckmin, também do PSDB, que obteve 38,3% dos

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votos válidos. Ou seja, a variação dos votos obtidos pelo governador/partido/coligação

em 2002 foi de 15,3%.

Outro exemplo: em 1998, o governador do Rio Grande do Sul Olívio Dutra do PT

obteve 45,9% dos votos válidos no primeiro turno. Em 2002, o candidato apoiado por

esse governador, Tarso Genro, do também PT obteve 37,3% dos votos válidos. Assim, a

variação dos votos no Rio Grande de Sul, em 2002, foi de -8,6%.

Ademais, houve uma preocupação com as variações muito grandes de votos, já

que podem se dever a fatores que não sejam correlacionados com a avaliação do

governador em exercício. Por exemplo, a entrada de um candidato muito popular, como

na eleição estadual de Minas Gerais, em 2002, quando o candidato Aécio Neves do

PSDB concorreu ao cargo de governador, fez com que a variação dos votos entre 1998 e

2002 fosse de -37,6%. Assim, adotou-se a cautela de excluir da amostra todos os valores

da variável “Variação dos votos” maiores, em módulo, que 25%. Com isso, 28

observações foram excluídas da amostra. Destas, 18 encontram-se no pleito de 1994,

antes da possibilidade de reeleição do governador.

Já para o modelo Probit foram testadas duas formas da variável dependente. Em

primeiro lugar, utilizou-se a variável “Coligação Reeleita”: essa variável assume valor 1

caso o governador tenha sido reeleito, ou o partido ao qual ele pertence tenha sido

reeleito, ou ainda se seu partido pertence à coligação reeleita. Caso contrário, a variável

assume valor zero. Em segundo lugar, utilizou-se a variável “Governador e/ou partido

reeleito”: ela assume valor 1 caso o governador ou partido tenha sido reeleito, e zero caso

contrário. Como em apenas 7 observações a variável “Coligação Reeleita” assumiu um

valor diferente da variável “Governador e/ou partido reeleito”, todos os resultados

estimados não apresentaram nenhuma diferença significativa entre as duas variáveis.

A variação das variáveis independentes refere-se à diferença entre o ano eleitoral

e o ano anterior, assumindo que o eleitor avalia o governador pelo desempenho recente

do seu estado, como é padrão na literatura existente. Por exemplo, a variável ∆Taxa de

Homicídios refere-se à taxa de crescimento dos homicídios entre 1993 e 1994, entre 1997

e 1998, etc. A variação do PIB, por sua vez, é medida como a diferença entre o PIB do

ano eleitoral menos o PIB do ano anterior, mantendo-se a unidade em bilhões de reais.

Os dados referentes ao desemprego estadual foram calculados por meio das

Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios (PNADs) entre 1992 e 2007. Essa taxa

corresponde ao total de pessoas desocupadas, com 16 anos ou mais, divido pela

população economicamente ativa do estado. Devido a não realização destas pesquisas

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46  

para os anos de 1994 e 2000, calculou-se os dados para estes anos por meio de uma

média entre o ano anterior e o ano consecutivo, como é padrão na literatura (ver, por

exemplo, Avarte et al., 2007). Os dados eleitorais foram coletados através do banco de

dados do Professor Jairo Nicolau da IUPERJ.2 Todos os demais dados foram obtidos no

banco de dados Ipeadata3, exceto os dados de despesa com custeio (pessoal e encargos),

despensa com assistência e previdência para os anos de 2006 e 2007, obtidos no sítio

eletrônico da Secretaria do Tesouro Nacional.4

3.3 Resultados

Tendo em vista as peculiaridades do contexto brasileiro e ciente, especialmente,

do menor número de observações disponíveis para o Brasil, podemos examinar as

regressões estimadas. Cabe lembrar que todas as estimações foram realizadas pelo

método pooled cross section, de modo que as variáveis nacionais não fossem

perfeitamente correlacionadas com os efeitos fixos. A próxima subseção verifica se o

eleitor brasileiro avalia os governadores por meio de variáveis socioeconômicas, ou seja,

se há relação entre o voto e essas variáveis. Em seguida, são apresentados os resultados

para o primeiro e segundo testes de Wolfers.

3.3.1 Relação entre as variáveis socioeconômicas e o voto

A primeira análise a ser feita é verificar se uma melhora em indicadores

socioeconômicos possui relação com a quantidade de votos recebidos pelo

governador/partido/coligação. Para isso, foram testadas onze variáveis, todas a nível

estadual: a taxa de desemprego, PIB per capita, PIB a preços constantes, PIB a preços de

mercado corrente, renda média do primeiro trabalho, renda média de todos os trabalhos,

média do salário/hora, porcentagem de domicílios com água potável na rede geral,

porcentagem de domicílios com instalação de esgoto, a porcentagem de pessoas

consideradas pobres e taxa de homicídios por 100.000 habitantes. Cabe salientar que os

dados para taxa de homicídios estavam disponíveis apenas até o ano 2002 no banco de

dados Ipeadata.

Como em Wolfers (2002), a estimação dessa relação é dada pela regressão (1)

abaixo. Os resultados para cada variável são apresentados na tabela 3.2.                                                             2 http://jaironicolau.iuperj.br/, último acesso em 28/12/2008 3 http://www.ipeadata.gov.br/, último acesso em 28/12/2008 4 http://www.tesouro.fazenda.gov.br/, último acesso em 28/12/2008 

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(1) ∆ dos votos recebidos s,t = c + β ∆Desempenho socioeconômico do Estado s,t + ε s,t

Tabela 3.2

Depreende-se da análise da tabela 3.2 que apenas cinco das onze variáveis

socioeconômicas testadas possuem relação com a quantidade de votos recebidos pelo

governo em exercício. São elas: taxa de desemprego, PIB a preços constantes, domicílios

com água potável, porcentagem da população abaixo da linha da pobreza e taxa de

homicídios. Destas, todas apresentam o sinal esperado, exceto a variável “Água Potável”,

que possui sinal negativo, ao contrário do que seria de se esperar. O mesmo acontece para

a outra variável que mede saneamento e infra-estrutura: domicílios com instalação de

esgoto. Supostamente, um aumento do número de domicílios com essas características

deveria repercutir positivamente na reeleição dos governadores. Por sua vez, a variável

“Taxa de homicídios” é uma das mais significativas, o que seria de se esperar, dada a

grande importância atribuída pelo eleitor à segurança e a responsabilização dela ao

governo estadual.

Variável Coeficiente Erro Padrão P > |t| F(n, n-k) R²

Tx. de Deseprego -2.446 0.969 0.014** F(1, 78) = 6.38** 0.056

PIB per capita 0.012 0.011 0.271 F(1, 78) = 1.23 0.009

PIB preços const. 0.003 0.001 0.005*** F(1, 78) = 8.52*** 0.027

PIB mercador corrente 0.001 0.001 0.607 F(1, 78) = 0.27 0.006

Renda média 1° trabalho 0.000 0.000 0.316 F(1 , 78) = 1.02 0.013

Renda méd. todos trabalhos 0.000 0.000 0.347 F(1 , 78) = 0.90 0.011

Média salário/hora 0.015 0.010 0.143 F(1 , 78) = 2.19 0.024

Água Potável -0.922 0.371 0.015** F(1, 78) = 6.18** 0.049

Esgoto -0.109 0.157 0.489 F(1, 78) = 0.48 0.004

Pessoas Pobres -0.633 0.261 0.018** F(1 , 78) = 5.86** 0.043

Taxa de Homicídios -0.225 0.084 0.01*** F(1, 55) = 7.09*** 0.105

***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.Todas as estatísticas foram calculadas com o erro padrão robusto.

Relação entre Condições Socioeconômicas e o Voto (Variável Dependente = Variação dos Votos) - Modelo OLS

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Como no estudo de Wolfers, as variáveis de renda pessoal não apresentam

correlação com a quantidade de votos recebidos. Entretanto, a variável de PIB a preços

constantes mostra-se bastante significativa, a qual, de acordo com ele, seria preferível às

variáveis de renda pessoal por dois motivos: em primeiro lugar, os dados de renda

enfrentariam erros de mensuração significantes, os quais poderiam viesar os coeficientes

e, em segundo lugar, dificuldades em deflacioná-los maiores do que o produto interno

bruto (2002, p.5). Em seu trabalho, Wolfers só não utiliza o PIB estadual porque os dados

estão disponíveis apenas a partir de 1977.

As magnitudes dos coeficientes são diretamente interpretáveis: por exemplo, o

aumento de 1% de pessoas pobres da população do estado diminui em 0.63% a

porcentagem de votos recebidos pelo governo em exercício. Assim, as estimações

mostram que a variável “Taxa de Desemprego” é a que possui o maior impacto nas

chances de reeleição do governador/partido/coligação. Essa forte relação entre voto e

emprego está de acordo com o que Caplan (2007) denomina “viés gerador de emprego”:

as pessoas, em geral, tendem a associar a prosperidade econômica mais com o aumento

de empregos do que com o aumento da produção.

É possível, portanto, concluir que o eleitor brasileiro avalia retrospectivamente os

governos estaduais por meio de indicadores socioeconômicos. Os baixos valores da

estatística R² mostram apenas que existem muitos outros fatores que determinam o voto.

3.3.2 Primeiro Teste: filtragem do desempenho relativo

O primeiro teste de Wolfers examina a capacidade do eleitor de avaliar o

desempenho de seu estado relativamente ao resto do país. De acordo com o modelo

principal-agente, o desempenho nacional da variável em questão não deveria repercutir

sobre a avaliação que o eleitor faz do governo estadual. Já o desempenho relativo dessa

variável deveria, pois, em tese, ele reflete a competência e esforço do governador. Assim,

na estimação da equação (2) abaixo, a hipótese nula de que β é igual a zero não deveria

ser rejeitada.

(2) ∆ dos votos recebidos s,t = c + α(∆Desempenho socioeconômico do Estado s,t –

∆Desempenho socioeconômico Nacional t )+ β ∆Desempenho socioeconômico Nacionalt

+ ε s,t

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Os resultados da estimação desse modelo em Pooled OLS são apresentados na

tabela 3.3 abaixo. Esse teste foi realizado apenas para as variáveis que mostraram relação

com a quantidade de votos recebidos pelo governo.

Tabela 3.3

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

Coeficiente -2.419 -2.868 0.004 0.003

Erro Padrão 1.105 2.657 0.001 0.001

P > |t| 0.032** 0.284 0.001*** 0.001***

F(n, n-k)

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

Coeficiente -0.216 -0.961 -0.774 -16.947

Erro Padrão 0.088 1.198 0.376 12.137

P > |t| 0.018** 0.426 0.043** 0.167

F(n, n-k)

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

Coeficiente -0.577 -0.879

Erro Padrão 0.297 0.826

P > |t| 0.056* 0.290

F(n, n-k)

R²***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.Todas as estatísticas foram calculadas com o erro padrão robusto.

0.099 0.068

0.062

Primeiro Teste de Racionalidade - Filtragem do Desempenho Relativo (Variável Dependente = Variação dos Votos) - OLS

3.55**3.41**

6.34***

Taxa de Desemprego PIB preços constantes

Taxa de Homicídios Água Potável

3.34**

0.058

3.03**

0.046

Pessoas Pobres

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A tabela 3.3 mostra fortes evidências de que o eleitor brasileiro filtra corretamente

o componente “sorte” quando realiza a avaliação do governo em exercício. Exceto para a

variável “PIB a preços constantes”, todas as estimações do modelo OLS não rejeitam a

hipótese nula de que o coeficiente β é igual a zero, como pode ser observado nas

estatísticas p-valor. Portanto, variações nacionais não repercutem sobre o voto para

governador estadual.

Os efeitos da competência, por sua vez, mostram-se significativos para todas as

regressões, indicando que o eleitor avalia relativamente seu estado em relação ao resto do

país. Novamente, todos os coeficientes apresentam o sinal esperado, exceto os da variável

“Água Potável”, os quais mostram uma relação negativa com a quantidade de votos

recebidos pelo governador. Acrescenta-se ainda o fato da magnitude da variação nacional

da variável “Água Potável” sobre os votos recebidos ser muito superior às demais

magnitudes. É possível que tais anomalias se devam ao tempo que essa variável leva para

apresentar mudanças significativas, já que se está trabalhando apenas com variações entre

dois anos consecutivos. Como foi recentemente relatado, o Brasil sofre de um grave

problema de infra-estrutura de saneamento básico, e seu ritmo de expansão tem-se

mostrado aquém do que seria desejado. Se a taxa de crescimento de acesso a esgoto

tratado se mantiver na velocidade do período entre 1992 e 2006, a universalização desse

acesso somente se dará em 115 anos. A velocidade da expansão da rede de água se

encontra em uma situação melhor, mas suficiente para também ser considerada “marcha

lenta”.5

Por sua vez, a não-filtragem do “PIB a preços constantes”, em que o eleitor

recompensa o governo em exercício tanto pelo desempenho relativo quanto pelo

desempenho nacional, mostra que existem dificuldades em se atribuir o crescimento da

economia à esfera política correta. Entretanto, tal resultado não é anômalo, dada a

complexidade de fatores que interagem na condução do crescimento econômico.

A tabela 3.4 abaixo apresenta as estimações para as mesmas variáveis utilizando

como variável dependente “Governador e/ou Partido reeleito”. As estimações foram

realizadas por meio do modelo Probit, mantendo-se os dados na forma de pooled cross

section. Como se pode observar, as estimações desse modelo apresentam diversas

anomalias: em nenhuma das regressões o coeficiente α é significativo, indicando que o

eleitor não avalia seu estado relativamente. Além disso, nas variáveis “Taxa de

                                                            5 “O ano do saneamento básico”. Conjuntura Econômica, Vol. 61, n°12, dezembro de 2007.

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Homicídios” e “Pessoas Pobres” o coeficiente β é significante, indicando, contrariamente

ao que seria de se esperar, que para essas variáveis a avaliação do governo estadual se dá

por meio dos indicadores nacionais. Por fim, as variáveis “Taxa de Desemprego” e

“Pessoas Pobres” apresentam sinais contrários nos efeitos da sorte (coeficiente β) dos

efeitos da competência (coeficiente α). A variável “Água Potável” continua apresentando

sinais inversos dos que seriam esperados.

Tabela 3.4

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

Coeficiente dF/dx -3.162 4.164 0.015 0.014

Erro Padrão 4.769 9.513 0.009 0.009

P > |t| 0.507 0.662 0.099* 0.107

χ²(k)

Pseudo R²

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

Coeficiente dF/dx -0.376 -13.187 -1.940 -5.132

Erro Padrão 0.353 4.878 1.824 52.741

P > |t| 0.287 0.007*** 0.287 0.9220

χ²(k)

Pseudo R²

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

Coeficiente dF/dx -1.105 5.191

Erro Padrão 1.493 2.673

P > |t| 0.459 0.052**

χ²(k)

Pseudo R²***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.Todas as estatísticas foram calculadas com o erro padrão robusto.

0.072

Primeiro Teste de Racionalidade - (Variável Dependente = Governador e/ou Partido Reeleito) - Probit

Pessoas Pobres

3.94

0.026

Taxa de Desemprego PIB preços constantes

Taxa de Homicídios Água Potável

0.009

0.63 2.77

7.52** 1.21

0.004 0.015

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Contudo, exceto pela variável “Taxa de Homicídios”, todas as regressões são

estatisticamente insignificantes pelo teste χ², diferentemente das regressões do modelo

OLS, todas significantes a 5%. Pode ser que as anomalias encontradas sejam causadas

pela falta de poder estatístico decorrente do tamanho insuficiente da amostra para estimar

o modelo Probit. Assim, as estimações do modelo OLS apresentam-se mais confiáveis e

mais informativas.

Existe a possibilidade, entretanto, de que os resultados obtidos com o modelo

OLS estejam sendo conduzidos por outros fatores. Por exemplo, pode haver um link entre

os votos para governador e o desempenho nacional decorrente da relação entre o

presidente e o governador. Se os eleitores são muito influenciados pelo presidente em

exercício, as eleições governamentais podem refletir a relação do governador com o

executivo nacional. Dessa forma, faz-se necessário o uso de um controle que capte esse

efeito: a variável “Mesmo partido do presidente” é introduzida para este fim, assumindo

valor 1 caso o governador seja do mesmo partido e zero caso não seja. Outra variável

“Mesma coligação vencedora do candidato à presidência” também é adicionada para que

os efeitos de um forte candidato à presidência sobre os governadores que ele apóia sejam

captados. Por fim, são adicionadas variáveis interagindo o partido do presidente com

variáveis de efeitos fixos para os anos eleitorais, de forma a controlar para eventuais

mudanças de avaliação do presidente em exercício decorrentes do ano em questão.

Um segundo grupo de controle tenta captar os votos partidários por meio de

variáveis dummies para os seis partidos que mais elegeram governadores: PSDB, PT,

PMDB, PFL, PDT e PSB. A interação destes com a porcentagem da população analfabeta

tenta captar um possível “voto de cabresto” nas eleições estaduais. O voto partidário é

reconhecido na literatura com um voto mais sofisticado, normalmente associado aos

eleitores com maior escolaridade. Portanto, votos partidários de pessoas analfabetas

podem ser associados à influência de algum grupo político sobre a população mais pobre.

Um terceiro grupo de controle introduz duas variáveis que servem como proxy

para um possível populismo do governador: “gastos estaduais com custeio” (pessoal e

encargos), que capta um aumento dos gastos do governador com a contratação de

funcionários públicos e aumento de salários; e “gastos estaduais com assitência”, que

capta o aumento de gastos com programas de cunho assistencialistas. Ambas despesas

são as formas disponíveis ao governador de influenciar mais diretamente a população

local. Ademais, são adicionadas variáveis de concentração de renda (índice de Gini) e de

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educação (taxa de analfabetos) que refletem a desigualdade do estado e a capacidade de

avaliação (sofisticação) de seus eleitores.

Por fim, introduz-se uma variável dummy para captar os efeitos da Lei de

Responsabilidade Fiscal sobre as eleições estaduais, já que esta restringiu a condução da

política fiscal dos estados, afetando, de acordo com Avarte et al. (2007) as chances de

reeleição dos governadores. As tabelas 3.5 a 3.9 apresentam a introdução destes controles

para cada variável testada no modelo OLS. As tabelas começam pelas estimações da

especificação básica (equação 2) e a cada linha são adicionados os controles reportados.

A adição dos controles é cumulativa, ou seja, na última linha encontra-se a regressão com

todas as variáveis de controle.

Como depreende-se da análise das tabelas abaixo, a introdução dessas variáveis

não altera significativamente os resultados encotrados, exceto para a variável “Pessoas

Pobres”. A partir da introdução da “Taxa de Analfabetos” o coeficiente α, que mede os

retornos por competência, perde significância para essa variável. Os retornos por sorte

mostram-se significantes a 10% para a variável “Taxa de Desemprego” com a adição dos

controles que estabelecem um link entre o executivo estadual e o executivo federal. Isso

indica, provavelmente, que os governadores se beneficiam de uma redução do

desemprego nacional quando são apoiados pelo presidente da república. Contudo, esse

efeito não se mantém com a adição dos outros grupos de controle, o que permite concluir

que o eleitor não recompensa o governador por uma diminuição do desemprego nacional.

A despeito da introdução dos controles, ambos os coeficientes da variável “PIB a

preços constantes” mantêm-se fortemente significativos, indicando que o eleitor não

consegue filtrar os efeitos da sorte dos efeitos da competência para essa variável.

Assim, pode-se concluir que o voto retrospectivo é um componente relevante na

escolha do governo estadual no Brasil. Ademais, as evidências encontradas com o

modelo OLS para as variáveis “Taxa de Desemprego”, “Taxa de Homicídios” e “Água

Potável” mostram que o eleitor brasileiro se comporta de acordo com o modelo principal-

agente, sendo capaz de avaliar o desempenho relativo de seu estado em relação ao país,

além de perfazer a filtragem simples. Parafraseando Wolfers, consistentemente com o

modelo racional, os eleitores parecem não ser enganados por melhoras socioeconômicas

que se devem ao ciclo nacional.

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54  

Tabela 3.5

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

Especificação Básica -2.419 -2.8680.032** 0.284

(+ Mesmo partido do presidente) -2.415 -2.819

0.033** 0.292

(+ Mesma coligação vencedora do candidato à

presidência)-2.358 -4.632

0.032** 0.097*

(+ ∑ partidos) -2.935 -4.8680.004*** 0.071*

(+ ∑ partido do presidente *Ano) -2.939 -5.999

0.005*** 0.082*

(+ Taxa de analfabetos estadual) -2.906 -6.047

0.006*** 0.08*

(+ ∑ partido * taxa de analfabetos estadual)

-3.302 -5.713

0.003*** 0.125

(+ Despesas de Custeio +Despesa de Assistência)

-3.068 -5.669

0.007*** 0.119

(+Índice de Gini estadual) -3.072 -5.3200.006*** 0.158

(+Dummy de Lei de Responsabilidade Fiscal) -3.028 -4.332

0.009*** 0.433

***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.

A primeira linha de cada variável refere-se ao coeficiente, enquando a segunda refere-se ao p-valor utilizando o erro padrão robusto.

Taxa de DesempregoPrimeiro Teste de Racionalidade - Adição de Controles - OLS

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55  

Tabela 3.6

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

Especificação Básica 0.004 0.0030.001*** 0.001***

(+ Mesmo partido do presidente) 0.004 0.004

0.000*** 0.001***

(+ Mesma coligação vencedora do candidato à

presidência)0.004 0.004

0.001*** 0.002***

(+ ∑ partidos) 0.005 0.0040.000*** 0.000***

(+ ∑ partido do presidente *Ano) 0.004 0.004

0.000*** 0.002***

(+ Taxa de analfabetos estadual) 0.005 0.004

0.000*** 0.001***

(+ ∑ partido * taxa de analfabetos estadual)

0.005 0.004

0.000*** 0.001***

(+ Despesas de Custeio +Despesa de Assistência)

0.005 0.005

0.000*** 0.001***

(+Índice de Gini estadual) 0.006 0.0050.000*** 0.001***

(+Dummy de Lei de Responsabilidade Fiscal) 0.005 0.003

0.000*** 0.029**

***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.

A primeira linha de cada variável refere-se ao coeficiente, enquando a segunda refere-se ao p-valor utilizando o erro padrão robusto.

Primeiro Teste de Racionalidade - Adição de Controles - OLSPIB preços constantes

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56  

Tabela 3.7

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

Especificação Básica -0.216 -0.9610.018** 0.426

(+ Mesmo partido do presidente) -0.215 -0.996

0.027** 0.504

(+ Mesma coligação vencedora do candidato à

presidência)-0.197 -1.241

0.037** 0.391

(+ ∑ partidos) -0.206 -0.9600.034** 0.560

(+ ∑ partido do presidente *Ano) -0.241 -1.191

0.011** 0.449

(+ Taxa de analfabetos estadual) -0.205 -1.861

0.050** 0.300

(+ ∑ partido * taxa de analfabetos estadual)

-0.163 -2.878

0.135 0.147

(+ Despesas de Custeio +Despesa de Assistência)

-0.190 -2.919

0.073* 0.124

(+Índice de Gini estadual) -0.185 -3.2420.066* 0.075*

(+Dummy de Lei de Responsabilidade Fiscal) -0.195 -2.868

0.058* 0.135

***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.

A primeira linha de cada variável refere-se ao coeficiente, enquando a segunda refere-se ao p-valor utilizando o erro padrão robusto.

Primeiro Teste de Racionalidade - Adição de Controles - OLSTaxa de Homicídios

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57  

Tabela 3.8

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

Especificação Básica -0.774 -16.9470.043** 0.167

(+ Mesmo partido do presidente) -0.772 -16.791

0.046** 0.172

(+ Mesma coligação vencedora do candidato à

presidência)-0.780 -15.002

0.049** 0.236

(+ ∑ partidos) -0.802 -14.7410.078* 0.266

(+ ∑ partido do presidente *Ano) -0.761 -15.951

0.114 0.304

(+ Taxa de analfabetos estadual) -0.808 -14.442

0.087* 0.366

(+ ∑ partido * taxa de analfabetos estadual)

-0.822 -16.708

0.120 0.334

(+ Despesas de Custeio +Despesa de Assistência)

-0.922 -14.264

0.078* 0.410

(+Índice de Gini estadual) -0.910 -13.5430.078* 0.460

(+Dummy de Lei de Responsabilidade Fiscal) -0.945 -23.239

0.067* 0.240

***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.

Primeiro Teste de Racionalidade - Adição de Controles - OLSÁgua Potável

A primeira linha de cada variável refere-se ao coeficiente, enquando a segunda refere-se ao p-valor utilizando o erro padrão robusto.

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58  

Tabela 3.9

α = Efeitos da competência (∆Estado - ∆Nacional)

β = Efeitos da sorte (∆Nacional)

Especificação Básica -0.577 -0.8790.056* 0.290

(+ Mesmo partido do presidente) -0.600 -0.823

0.052* 0.323

(+ Mesma coligação vencedora do candidato à

presidência)-0.604 -0.803

0.043** 0.331

(+ ∑ partidos) -0.716 -0.6590.061* 0.444

(+ ∑ partido do presidente *Ano) -0.723 -0.655

0.066* 0.527

(+ Taxa de analfabetos estadual) -0.721 -0.641

0.07* 0.556

(+ ∑ partido * taxa de analfabetos estadual)

-0.568 -0.801

0.202 0.467

(+ Despesas de Custeio +Despesa de Assistência)

-0.543 -0.793

0.227 0.465

(+Índice de Gini estadual) -0.531 -0.7020.228 0.531

(+Dummy de Lei de Responsabilidade Fiscal) -0.576 -0.803

0.178 0.473

***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.

Primeiro Teste de Racionalidade - Adição de Controles - OLSPessoas Pobres

A primeira linha de cada variável refere-se ao coeficiente, enquando a segunda refere-se ao p-valor utilizando o erro padrão robusto.

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59  

3.3.3 Segundo Teste: variáveis instrumentais

O teste anterior verifica, segundo Wolfers, apenas uma capacidade simples (Rule

of thumb signal extraction) de filtrar choques exógenos na avaliação da competência do

governador. Seria preciso, portanto, verificar se o eleitor possui uma capacidade de

filtragem mais sofisticada, em que outros choques exógenos mais sutis sejam

diferenciados da competência nessa avaliação.

É possível testar essa filtragem sofisticada (Sophisticated signal extraction) por

meio do método de variáveis instrumentais, já discutido no capítulo anterior. Escolheu-se,

para tanto, as variáveis “Taxa de Homicídios” e “Taxa de Desemprego”, por

apresentarem os resultados mais significativos no primeiro teste. Por sua vez, foram

utilizados três instrumentos nas estimações da regressão de primeiro estágio (equação 3)

para a variável “Taxa de Desemprego”: a cotação internacional do preço do petróleo, o

índice de preços das commodities (exceto petróleo) calculado pelo IPEA e a taxa de

desemprego nacional.

O uso da cotação internacional do preço do petróleo, assim como Wolfers utiliza,

tenta verificar se os eleitores brasileiros conseguem filtrar melhoras econômicas em seus

estados devido a choques nesse insumo, ou se recompensam erroneamente os

governadores. O grande crescimento em anos recentes do preço do petróleo (ver gráfico

3.1) pode ter afetado a economia de determinados estados que recebem royalties da

Petrobrás. São eles: Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Paraná, Rio de

Janeiro, Rio Grande do Norte, São Paulo e Sergipe (ANP, 2006). Porém, o impacto do

aumento desse preço em cada estado não é o mesmo: o recebimento de royalties por São

Paulo, por exemplo, passou de 2 milhões em 1999 para pouco mais de 4 milhões de reais

em 2006, enquanto no Rio de Janeiro esse royalties passaram de 190 milhões para 1,65

bilhão de reais no mesmo período.

O índice de preço das commodities (exceto petróleo) também teve significativo

aumento em anos recentes. Seus efeitos sobre os estados exportadores de commodities,

tais como Mato Grosso, São Paulo, Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul, teve um

significativo impacto sobre a economia desses estados. Como os preços dessas

commodities não dependem de políticas estaduais e sim de fatores exógenos, como a

demanda internacional, esse índice torna-se um bom instrumento para se estimar a sorte e

a competência dos governadores. Compõem esse índice commodities agrícolas, minerais

e algumas matérias primas como carvão, lã, couros e madeiras serradas.

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60  

O terceiro instrumento utilizado na regressão de primeiro estágio da variável

“Taxa de Desemprego” é a taxa de desemprego nacional. As estimações com esse

instrumento permitem captar as sensibilidades dos estados a choques econômicos

agregados e verificar se, em um estado pró-cíclico, que tenha um bom desempenho

econômico devido ao crescimento da economia nacional, os eleitores recompensam o

governo em exercício a despeito dele não ter tido influência nesse resultado. Ou, ao

contrário, verificar se em um estado anticíclico, que teve um desempenho relativamente

ruim ao resto da economia, os eleitores punem o governo em exercício a despeito dele

não ter sido responsável.

Por fim, para a variável “Taxa de Homicídios” utilizou-se como instrumento o

montante de gastos definidos nas contas públicas como “despesas com segurança

nacional e defesa pública”, que engloba os gastos com policiamento, defesa civil,

informação e inteligência, além da rubrica demais subfunções. Essas despesas

influenciam a taxa de homicídios estadual na medida em que os gastos com segurança

pública nacionais repercutem no combate ao tráfico de drogas e armas, no combate ao

crime organizado, etc. É de se esperar, portanto, que a diminuição dos homicídios

decorrentes do aumento desses gastos não seja atribuída aos governos estaduais.

Gráfico 3.1 - Instrumentos

0

10

20

30

40

50

60

70

80

1988

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

Preço do Petróleo ‐ Cotação Internacional

Preço US$

80

90

100

110

120

130

140

150

1988

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

Preços das Commodities (exceto Petróleo)

Preços das Commodities  ‐ Índice (jan. 2002 = 100)

0

0.01

0.02

0.03

0.04

0.05

0.06

0.07

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

Taxa de Desemprego Nacional

Taxa de Desemprego Nacional

024681012141618

1986

1987

1988

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

Despesa Nacional com Segurança 

Despesa Nacional com Segurança (Bilhões)

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A regressão de primeiro estágio é estimada da mesma forma que em Wolfers

(2002): às dummies de efeitos fixos para cada estado são acrescentadas as interações

destas dummies com o instrumento. De posse dos resultados destas regressões, testa-se,

no segundo estágio, se o eleitor consegue distinguir o desempenho estadual que se deve

ao choque exógeno do desempenho que, supostamente, se deve ao governo estadual

(calculado por meio do resíduo da regressão de primeiro estágio). Ademais, é acrescido o

desempenho nacional da variável em questão, de forma a verificar se o eleitor continua

perfazendo a filtragem simples. As tabelas 3.10 a 3.13 apresentam os resultados para

ambos os estágios. Deve-se ter em mente que o modelo de racionalidade implica que os

coeficientes λ e δ devem ser estatisticamente insignificantes, ou seja, a hipótese nula não

deve ser rejeitada. Já α, caso represente realmente uma boa estimação da competência dos

governadores, deve ser significativo.

Tabela 3.10

Amplitude dos coeficientes da variável interada: de -0.0495 até 0.0749Estados cujos efeitos foram mais positivos: AP, ES, MT, TO, PI, SPEstados cujos efeitos foram mais negativos: RN, PB, AL, MA, RR, RO

Erro Padrão Robusto P > |t|

Filtragem Simples (λ) 2.671 0.285[2.614] [0.272]

Flitragem Sofisticada (δ) 4.171 0.392[4.964] [0.470]

Retornos da Competência (α) 4.543 0.771[4.925] [0.787]

R² = 0.058 F(3, 76) = 2.23* n = 80

Os números entre colchetes [.] representam as estatísticas calculadas pelo método bootstrap

Regressão em Primeiro Estágio

R² = 0.0545 n = 405 (1993 a 2007)

Regressão em Segundo Estágio

1.330

***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.

Segundo Teste de Racionalidade - Variáveis InstrumentaisTaxa de Desemprego - Instrumento: Taxa de Crescimento do Índice de Preços das Commodities

(exceto Petróleo) t-1

Coeficiente

-2.874

-3.587

∆ dos votos recebidos s,t = λ Ut Nacional +δ Ûs,t Estado – Nacional + α Us,t Inexplicável + ε s,t 

Us,t Estado – Nacional = ∑   + βs (Estados * ∆Índice de Preço Commodities t – 1) + ξ s,t

Us,t Estado – Nacional = ∑   + βs (Estados * ∆ Índice de Preço Commodities t – 1) +ξ s,t 

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62  

A tabela 3.10 acima apresenta os resultados das estimações utilizando o

instrumento índice de preços das commodities. Pela regressão de primeiro estágio pode-

se verificar que o aumento desses preços teve repercussões positivas nas economias de

estados produtores de commodities, diminuindo a taxa de desemprego em São Paulo,

Mato Grosso e Tocantins, enquanto estados como Rio Grande do Norte, Paraíba e

Alagoas foram prejudicados. Já a regressão de segundo estágio apresenta evidências de

que o eleitor brasileiro se comporta como prediz o modelo de racionalidade. O

coeficiente λ indica que ele perfaz a filtragem simples, não sendo enganado por ciclos

nacionais favoráveis aos governadores em exercício. Por sua vez, na segunda linha o

coeficiente δ também mostra-se estatisticamente insignificante, apontando que o eleitor

passa no teste de uma filtragem mais sofisticada. Contudo, os retornos da competência

também mostram-se estatisticamente insignificantes, indicando que o resíduo utilizado

para estimá-la não é uma boa proxy. Ademais, a regressão é relativamente fraca, como

pode-se atestar pelo teste F. É possível, portanto, que os resultados encontrados devam-se

ao instrumento ser fraco: quanto mais fraco é o instrumento utilizado na primeira

regressão, de acordo com Wolfers (2002), mais viesada será a estimativa de α na

regressão de segundo estágio.

Essa desconfiança com os resultados acima é corroborada pelas demais

regressões. A tabela 3.11 apresenta os resultados para as estimações instrumentadas pelo

preço do petróleo. Estados como Sergipe, Rio de Janeiro e Ceará são os mais afetados

positivamente por um aumento nos preços dessa commodity, como seria de se esperar,

dados os royalties pagos pela Petrobrás aos municípios destes estados. Já a regressão de

segundo estágio evidencia que o eleitor comete erros sistemáticos de avaliação. Apesar de

perfazer a filtragem simples, resultado encontrado no teste da subseção anterior, ele não

consegue distinguir choques exógenos mais sutis, recompensando (punindo), nas urnas, o

governo em exercício pela diminuição (aumento) da taxa de desemprego que se deve a

um choque no preço do petróleo. A robustez do teste F para essa regressão favorece mais

esse resultado do que o encontrado anteriormente. Ademais, assim como em Wolfers, são

reportadas entre colchetes as estimações utilizando o método bootstrap, como forma de

verificar se as estatísticas heterocedasticamente consistentes (erros padrão robustos) não

são viesadas pela inclusão na mesma regressão do valor predito Ûs,t Estado – Nacional e do seu

resíduo ξ s,t. Como pode-se verificar, ambos os valores são notavelmente próximos,

mostrando que as estimações são estatisticamente robustas.

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63  

Tabela 3.11

Os retornos da competência, entretanto, permanecem sem poder explicativo, o que

pode ser causado, como já discutido, pelo fraco instrumento. De fato, esta explicação

parece ser plausível quando se compara os resultados anteriores do coeficiente α com as

estimações que utilizam o ciclo nacional como instrumento. A tabela 3.12 abaixo mostra

que, quando o instrumento é mais forte, a variação residual da regressão de primeiro

estágio apresenta-se como uma boa estimativa dos retornos por competência na avaliação

que o eleitor faz do governo estadual. O sinal positivo indica que há uma relação direta

entre competência e quantidade de votos recebidos: o eleitor recompensa positivamente o

governador por sua competência e esforço. Na regressão de primeiro estágio, um maior

Amplitude dos coeficientes da variável interada: de -0.1178 até 0.06008Estados cujos efeitos foram mais positivos: PI, MA, SE, MS, RJ, CEEstados cujos efeitos foram mais negativos: SC, AC, RR, DF, AM, AP

Erro Padrão Robusto P > |t|

Filtragem Simples (λ) 2.642 0.316[2.203] [0.226]

Flitragem Sofisticada (δ) 3.187 0.040**[3.132] [0.034]**

Retornos da Competência (α) 3.379 0.170[3.424] [0.171]

R² = 0.068 F(3, 76) = 2.95** n = 80

Os números entre colchetes [.] representam as estatísticas calculadas pelo método bootstrap

Regressão em Primeiro Estágio

R² = 0.0721 n = 405 (1993 a 2007)

Regressão em Segundo Estágio

Segundo Teste de Racionalidade - Variáveis InstrumentaisTaxa de Desemprego - Instrumento: Logaritmo do Preço do Petróleo t-1

***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.

Coeficiente

-2.670

-6.653

4.684

Us,t Estado – Nacional = ∑     + βs (Estados * ∆Log Preço Petróleo t-1) + ξ s,t 

∆ dos votos recebidos s,t = λ Ut Nacional +δ Ûs,t Estado – Nacional + α Us,t Inexplicável + ε s,t 

Us,t Estado – Nacional = ∑   + βs (Estados * ∆Pt – 1Petróleo) + ξ s,t 

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esforço e competência do governador possuem uma relação inversa com a variável

dependente “Taxa de Desemprego”, já que a diminui. Mas na regressão de segundo

estágio, o eleitor racional deve recompensar positivamente o governo pela maior

competência.

Tabela 3.12

Os resultados também mostram que, apesar do eleitor brasileiro conseguir

perfazer a filtragem simples, comparando o desempenho econômico de seus estados com

o restante do país, ele é sistematicamente enganado por choques exógenos mais sutis.

Uma expansão da economia nacional favorece os governadores dos estados pró-cíclicos,

enquanto os governadores de estados anticíclicos têm uma probabilidade maior de

perderem a disputa para a reeleição.

 

Amplitude dos coeficientes da variável interada: de -1.8925 até 1.51801Estados mais pró-cíclicos: AM, RR, RN, SP, RO, ACEstados mais anti-cíclicos: SE, TO, CE, BA, MA, AP

Erro Padrão Robusto P > |t|

Filtragem Simples (λ) 2.555 0.183[2.522] [0.174]

Flitragem Sofisticada (δ) 3.785 0.021**[3.816] [0.020]**

Retornos da Competência (α) 3.791 0.072*[4.449] [0.121]

R² = 0.097 F(3, 76) = 2.74** n = 80

Os números entre colchetes [.] representam as estatísticas calculadas pelo método bootstrap

Regressão em Segundo Estágio

-8.886

-3.431

Segundo Teste de Racionalidade - Variáveis InstrumentaisTaxa de Desemprego - Instrumento: Sensibilidade ao Ciclo Nacional

Coeficiente

***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.

Regressão em Primeiro Estágio

R² = 0.0576 n = 405 (1993 a 2007)

6.908

Us,t Estado – Nacional = ∑ + βs (Estados * Ut Nacional) + ξ s,t 

∆ dos votos recebidos s,t = λ Ut Nacional +δ Ûs,t Estado – Nacional + α Us,t Inexplicável + ε s,t 

Us,t Estado – Nacional = ∑ + βs (Estados * Ut Nacional) + ξ s,t

Page 76: DEMOCRACIA MERCADO E RACIONALIDADE UM ESTUDO … · Max Weber, 1919 . vii RESUMO A literatura econômica enfatiza que a eficiência da democracia como sistema de ... impede, porém,

65  

Por fim, a tabela 3.13 apresenta os resultados para as estimações da variável

“Taxa de Homicídios” instrumentada pela “Despesa com Segurança Nacional”. Observa-

se que os estados mais beneficiados com o aumento dos gastos nacionais com segurança

são Rio de Janeiro, São Paulo, Distrito Federal, enquanto os menos favorecidos são

Alagoas, Pará e Acre, possivelmente por serem estados cujos assassinatos cometidos têm

uma relação menor com crimes relacionados com o restante do país. Por exemplo, o

estado do Rio de Janeiro é muito beneficiado com o aumento das despesas nacionais com

segurança possivelmente porque os homicídios cometidos têm maior relação com o crime

organizado, o tráfico de armas e de drogas, etc.

Tabela 3.13

 

Amplitude dos coeficientes da variável interada: de -0.0000197 até 0.000279Estados cuja taxa de homicídios mais decaiu: SP, RR, RJ, DF, MT, APEstados cuja taxa de homicídios mais aumentou: AL, PA, PB, PI, BA, AC

Erro Padrão Robusto P > |t|

Filtragem Simples (λ) 1.183 0.253[1.258] [0.277]

Flitragem Sofisticada (δ) 0.208 0.001***[0.192] [0.000]***

Retornos da Competência (α) 0.193 0.012**[0.173] [0.004]***

R² = 0.159 F(3, 52) = 4.31*** n = 56

Os números entre colchetes [.] representam as estatísticas calculadas pelo método bootstrap***, **, * denotam significancia estatística à 1%, 5% e 10% respectivamente.

R² = 0.0754 n = 429 (1986 a 2002)

-0.702

-1.367

Regressão em Segundo Estágio

Regressão em Primeiro Estágio

0.502

Segundo Teste de Racionalidade - Variáveis InstrumentaisTaxa de Homicídio - Instrumento: Despesa Nacional com Segurança

Coeficiente

∆ dos votos recebidos s,t = λ Ht Nacional +δ Ĥs,t Estado – Nacional + α Hs,t Inexplicável + ε s,t 

Hs,t Estado – Nacional = ∑   + βs (Estados * Despesa Nacional com Segurança) + ξs,t

Hs,t Estado – Nacional = ∑     + βs (Estados * Despesa Nacional com Segurança) + ξ s,t  

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Mais uma vez verifica-se que o eleitor brasileiro consegue realizar a filtragem

simples, não recompensando o governo estadual pelo ciclo nacional, mas falha na

filtragem sofisticada. De acordo com a significância e o sinal do coeficiente δ, um

aumento na taxa de homicídios que se deva a diminuição das despesas nacionais com

segurança leva à diminuição dos votos recebidos pelo governo em exercício, apesar dele

não ter controle sobre esses gastos. Portanto, os eleitores brasileiros cometem erros

sistemáticos de avaliação em relação à violência estadual, resultado este corroborado pela

forte robustez da regressão, como se pode atentar pelo teste F e pelas estatísticas

calculadas pelo método bootstrap.

Verifica-se, além disso, que o resíduo utilizado como proxy para a estimação dos

retornos por competência mostra-se bastante significante e com o sinal esperado, o que

indica que os resultados das primeiras regressões deveram-se aos fracos instrumentos

utilizados. Cabe ainda salientar que a comparação entre os coeficientes da Filtragem

Sofisticada e dos Retornos da Competência não é particularmente informativo, já que a

estimação pelo erro tende a atenuar esses retornos.

Resumindo, as evidências acumuladas acima sugerem que os eleitores brasileiros

conseguem realizar uma filtragem mais simples quando avaliam o governo estadual, mas

não conseguem perfazer uma filtragem mais sofisticada. Destarte, é possível que eles

cometam erros sistemáticos de avaliação, reelegendo governos que tenham sorte ao invés

de serem competentes. Contudo, devido a fatores discutidos no capítulo anterior, a

evidência deste comportamento não implica que o eleitor seja irracional. Não é possível

concluir fidedignamente comportamentos individuais por meio de dados agregados, nem

tampouco estabelecer que o voto retrospectivo é o único padrão de comportamento

racional. Uma falha nesse tipo de voto não é, portanto, garantia de irracionalidade,

podendo-se classificá-la como uma falta de sofisticação do eleitor.

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67  

Conclusão  Milton Friedman, em um de seus artigos mais controversos, argumentava que uma

teoria deveria ser avaliada pela sua capacidade de predição, não pela realidade de suas

hipóteses.6 Desde então, uma longa tradição da economia tem modelado o

comportamento dos agentes políticos assumindo hipóteses de racionalidade e informação

completa que, como se sabe, são apenas formas de simplificação da realidade. Mas até

que ponto essa simplificação não envolve justamente assumir uma hipótese contrária à

realidade? Essa pergunta torna-se ainda mais relevante quando se verifica que o

paradigma do agente racional se mostrou um dos intercâmbios científicos mais fecundos

entre a ciência política e a economia.

Como pôde ser visto no primeiro capítulo, algumas hipóteses a respeito do eleitor

estão no cerne do debate entre democracia e mercado. Verificou-se que existe uma

controvérsia a respeito do grau de informação que o eleitor comum possui. Alguns

estudos, como Silva e Silva Costa (2006), apresentam evidências que o eleitor é

racionalmente desinformado como sugere o modelo downsiano. Blinder e Krueger (2004)

mostram ainda que a ideologia tem papel muito mais relevante na formação da opinião do

eleitor do que o conhecimento sobre a economia. Essas evidências são consistentes com

a idéia presente na literatura da ciência política: quando é custoso se informar, as pessoas

normalmente utilizam atalhos cognitivos para tomar decisões.

Outros estudos, entretanto, argumentam ser o eleitor suficientemente informado

para se comportar de acordo com o modelo racional. Por exemplo, Peltzman (1990)

argumenta que o mercado político agrega eficientemente a informação, sendo que seus

agentes conseguem avaliar coerentemente a economia. Ademais, como explicam Fehr e

Tyran (2005), diversas teorias enfatizam que a agregação dos votos dos eleitores

corrigiria quaisquer erros de avaliação, e a decisão final seria a mesma que um eleitor

bem informado tomaria.

Contudo, críticas mais profundas têm sido apresentadas por autores como Caplan

(2007). Esse autor critica não apenas a hipótese de agentes bem informados, mas o

próprio modelo de racionalidade do eleitor. O diagnóstico de erros sistemáticos de

avaliação em diversas matérias de política econômica seria evidência suficiente de que os                                                             6 Friedman, Milton (1953). “The Methodology of Positive Economics”. In: Essays in Positive Economics, Chicago: University of Chicago Press, pp. 3-43

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68  

eleitores não se comportam como assumem os modelos econômicos de comportamento

racional. A disparidade entre o comportamento do indivíduo quando consumidor e

quando eleitor deve-se, segundo Caplan, à disparidade dos custos associados à

irracionalidade nas esferas pública e privada. Como os custos de erros de avaliação na

esfera política são infinitamente menores do que os custos de erros cometidos na esfera

privada, não existem grandes restrições com as quais o eleitor se defronta para ter que

rever eventuais concepções erradas sobre políticas públicas. Problemas do sistema

democrático, tais como manutenção de políticas socialmente prejudiciais, que

normalmente são associados ao lado da oferta (políticos, grupos de interesse, burocracia,

mídia) são, ao contrário, devidos à própria demanda.

Tendo em vista tais críticas, procurou-se analisar empiricamente a capacidade de

processar informações do eleitor. Para tanto, procurou-se adaptar para o Brasil o teste

realizado por Wolfers (2002) baseado no modelo principal-agente: se os eleitores

(principais) são racionais, no sentido de não cometerem erros sistemáticos de avaliação,

eles não deveriam recompensar eleitoralmente os governadores (agentes) por resultados

econômicos que não se devam a sua competência e esforço. Contudo, algumas ressalvas

foram feitas ao teste em si. Ele incorre no erro da chamada falácia ecológica, em que

infere-se de variáveis agregadas suposições sobre o comportamento individual. Ademais,

equaciona-se racionalidade ao voto retrospectivo, o que não considera todas as outras

formas possíveis de votos. Portanto, preferiu-se considerar o teste como um teste sobre a

sofisticação do eleitor, o que não diminui a importância da pesquisa.

Os resultados encontrados mostram que o eleitor possui uma capacidade simples

de filtrar a sorte da competência do governador. Desempenhos de algumas variáveis

socioeconômicas que se devem ao ciclo nacional são devidamente filtradas pelos eleitores

brasileiros. Além disso, eles avaliam relativamente seus Estados em relação aos demais

como forma de atestar a competência do governo em exercício. Contudo, quando se testa

uma capacidade mais sofisticada dessa filtragem, os resultados mostram que o eleitor

engana-se sistematicamente na avaliação dos governos estaduais. Choques exógenos mais

sutis não são devidamente filtrados e o eleitor acaba recompensando eleitoralmente a

sorte de tais políticos, apesar de também recompensá-los pela competência.

Quais as implicações destes resultados para o debate inicial sobre a democracia

versus o mercado? A falta de sofisticação dos eleitores na capacidade de avaliar os

políticos pode ser nefasta para a democracia? Como argumenta Wittman (1995), se não

houver alternativa melhor de controle, e possivelmente não há dados os altos custos de

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monitoração de formas alternativas, provavelmente o problema do principal-agente não é

mais grave na democracia do que no mercado. Inicialmente essa resposta pode ser

corroborada pelos resultados encontrados por Bertrand & Mullainathan (2001), que

verificam que os CEOs das empresas (agentes) também são recompensados pela sorte

pelo conselho diretor (principais). De fato, os pagamentos por sorte dos CEOs são tão

grandes quanto os pagamentos por competência. Entretanto, argumentam os autores, os

pagamentos por sorte são mais fortes nas firmas mais fracamente administradas. Tais

firmas, possivelmente, são as mais passíveis de enfrentar problemas de falência, processo

pelo qual o governo não está suscetível. Dessa forma, portanto, o problema do principal-

agente cria um potencial de oportunismo e, conseqüentemente, uma ineficiência maior na

democracia do que no mercado.

Se esses resultados estão corretos, qual a solução para diminuir as ineficiências

causadas pela democracia? “A solução para todos os problemas da democracia é mais

democracia” não parece uma resposta satisfatória. Nem tampouco “não há alternativa

melhor dados os altos custos de controle público e privado”. De fato, ambos os

argumentos recaem no que Caplan (2007) denomina fundamentalismo democrático: o

pensamento que só há uma escolha binária a respeito das decisões políticas: ou se é a

favor do sistema democrático, ou se é a favor de regimes ditatoriais. Entretanto, esse tipo

de pensamento não considera que o governo varia tanto no seu tamanho quanto na sua

forma. Assim como os mercados, a democracia pode ser limitada, regulada ou conduzida,

e decisões sobre diversas matérias que hoje se encontram sobre a tutela do governo

podem ser delegadas à mão invisível do mercado.

Essa proposta, por sua vez, sofre a pecha de ser qualificada como um

fundamentalismo mercadológico: o pensamento que tudo deve se reverter ao mecanismo

de livre mercado, pensamento este normalmente associado aos economistas ortodoxos.

Entretanto, como argumenta Caplan, esse fundamentalismo atribuído aos economistas

não corresponde à realidade. Não há economista que endosse uma frase do tipo “a

solução para todos os problemas do mercado é mais mercado”. E, ademais, quase todas as

críticas sobre as falhas de mercado, tais como monopólio, bens públicos, externalidades,

informação assimétrica, etc. partiram da própria agenda de pesquisas dos economistas. Se

o mecanismo de mercado se mostra mais eficiente do que o mecanismo de voto e

delegação, classificar uma proposta de “mais mercado, menos democracia” como

fundamentalismo mercadológico é uma argumentação falaciosa.

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É preciso, entretanto, que antes de afirmações mais veementes a respeito do

debate “democracia versus mercado” sejam obtidas mais evidências empíricas a respeito

do comportamento eleitoral. Estudos futuros deveriam contemplar pesquisas ao nível

individual para verificar se o eleitor brasileiro realmente comete erros sistemáticos na

avaliação dos políticos. Além disso, também é preciso considerar quais são os demais

motivos que levam um eleitor a selecionar um determinado candidato além da avaliação

retrospectiva. Como Besley (2005) explica, desde os Federalist Papers de 1788, James

Madison já argumentava que a seleção política deveria ser uma das preocupações

fundamentais da Constituição para o bom funcionamento da democracia. A capacidade

do eleitor aqui testada mostra-se parte fundamental deste processo de seleção.

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