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Aula sobre demências.

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    Temas da Aula

    Introduo 2

    Causas de Demncia 4

    Epidemiologia 7

    Diagnstico 8

    Doena de Alzheimer 11

    Epidemiologia 11

    Etiologia 11

    Patologia 12

    Clnica 14

    Diagnstico 16

    Teraputica 17

    Demncia com Corpos de Lewy 18

    Teraputica 18

    Demncia Frontotemporal 20

    Teraputica 21

    Doena de Creutzfelt-Jakob (DKJ) 22

    Demncia Vascular 24

    Aspectos clnicos 25

    teraputica 26

    Manifestaes Comportamentais/Psicolgicas 27

    Teraputica Sistematizao 29

    Defeito Cognitivo Ligeiro 30

    Mini Mental State Examination (MMSE) 31

    Bibliografia

    Anotada correspondente de 2006/2007, Miguel Oliveira e Olga Alves

    Ferro J., Pimentel J. Neurologia, Princpios, Diagnstico e Tratamento. Lidel

    Aminff, MJ; Greenberg, DA; Simon, RD; Clinical Neurology; Lange

    Anotadas do 4 Ano 2007/08 Data: 7 de Janeiro de 2008

    Disciplina: Neurologia Prof.: Alexandre de Mendona

    Tema do Seminrio: Demncias

    Autor: Samuel Almeida

    Equipa Revisora: Carlos Vila Nova e Pedro Freitas

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    Introduo

    A demncia um sindroma que pode ter mltiplas causas e que se caracteriza

    pela presena de alteraes nas funes cognitivas, afectando o contedo da

    conscincia, mas no o seu nvel.

    O DSM-IV classifica a demncia entre as Perturbaes cognitivas, como:

    Declnio cognitivo em relao ao estado anterior, comprovado pelo exame

    clnico e testes neuropsicolgicos, que revelam afeco da memria e de

    outras duas, ou mais, funes cognitivas (linguagem, percepo, praxias,

    funes executivas1). Este declnio deve ser suficientemente grave para

    interferir com o desempenho social e profissional e no pode ser atribuvel a um

    estado de delirium.

    J o CID-10 coloca esta patologia entre as Perturbaes mentais orgnicas,

    incluindo as sintomticas, referindo novamente o declnio em relao a um nvel de

    funcionamento prvio mais elevado e descrevendo a doena como:

    Defeito na memria e de crtica, de capacidade executiva e do

    processamento geral de informao, que deve estar presente h, pelo menos,

    seis meses e que interfere com as actividades do dia-a-dia (embora possa

    permitir uma vida independente quando este defeito ainda no muito

    acentuado).

    Com estas duas classificaes, fica claro que nesta patologia h uma afeco

    global das funes cognitivas (memria, orientao, ateno, linguagem, percepo,

    praxias, funes executivas), que deve corresponder a um declnio em relao a um

    nvel prvio de funcionamento e ser suficientemente grave para interferir com o

    desempenho social e profissional e no pode ser atribuvel a um estado de delirium.

    Este quadro pode acompanhar-se de alteraes psicolgicas (pensamentos

    delirantes, alucinaes, insnias, depresso, ansiedade, agitao psicomotora), das

    quais se destacam os comportamentos culturalmente inapropriados (agresso fsica,

    vocabulrio inapropriado, hipersexualidade e falta de inibio sexual, entre outros).

    1 Funes executivas funes de deciso/iniciativa, planeamento, abstraco, estratgia e anlise

    de novas situaes, mudana de tarefa e inbio da resposta; so realizadas pelo lobo frontal.

  • Demncias

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    As perturbaes cognitivas podem ser isoladas (amnsia, afasia, agnosia,

    apraxia) ou globais. Dentro deste ltimo grupo, esto as doenas que atingem, em

    conjunto, todas as funes cognitivas. aqui que se encontra a demncia, assim

    como o atraso mental e o estado confusional.

    Embora a incidncia da demncia aumente com a idade, esta patologia no

    um problema exclusivo dos idosos (alguns tipo de demncia podem surgir em

    qualquer faixa etria, como as secundrias a encefalites, traumatismos cranianos ou

    intoxicaes), nem uma doena que acontea invariavelmente com a idade. Assim,

    fcil perceber que a importncia da distino entre demncia de algumas

    alteraes de memria e de outras funes cognitivas, normais com a idade2.

    Tal como diversas

    demncias, o envelhecimento

    normal leva a um aumento do

    volume dos ventrculos (fig.1)

    cerebrais e dos sulcos corticais

    (fig.2), visvel na TC e na RM.

    Assim, as imagens ajudam a

    fazer o diagnstico, na presena

    de outros sintomas de patologia

    demensial, mas no so

    patognomnicas desta situao.

    A demncia pode evoluir de diversas maneiras:

    Progressiva,

    Flutuante,

    Estvel,

    Reversvel (em algumas demncias secundrias, muito raro).

    Estes padres evolutivos, em conjunto com outros sintomas que acompanham

    a demncia, podem ser importantes para determinar o tipo de demncia e a forma

    mais apropriada de lidar com ela.

    2 Referido mais frente no dfice cognitivo ligeiro.

    Fig.1 TC de um caso com atrofia cerebral revelando aumento do volume dos ventrculos cerebrais.

    Fig.2 TC de um caso com atrofia cerebral revelando aumento da profundidade dos sulcos cerebrais.

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    Causas de Demncia

    Uma larga variedade de doenas pode dar origem a demncia (um sindroma

    com caractersticas gerais comuns a todas as formas). Consoante a patologia

    especfica que origina o sindroma demencial, haver caractersticas prprias que

    permitem a sua distino.

    Mediante as suas causas, as demncias podem ser divididas em dois grupos:

    as demncias de causa desconhecida, tambm denominadas por primrias ou

    degenerativas; e demncias de causa conhecida ou secundrias.

    Algumas caractersticas que ajudam distino entre as demncias

    degenerativas e as de causa conhecida esto listadas na tabela 1.

    Tabela 1

    Demncia degenerativa Demncia secundria

    Incio insidioso e progresso lenta

    Aparenta bom estado geral (condio estvel)

    Sem histria recente de doena mdica, neurolgica ou psiquitrica

    Exame objectivo sem alteraes

    Exame neurolgico bsico sem alteraes

    Testes neuropsicolgicos anormais

    Doente com problemas de memria e alterao da personalidade h pelo menos seis meses

    Doente trazido consulta por um parente

    Incio e curso rpido

    Aparncia pouco saudvel

    Sintomas acompanhantes incomuns na demncia (ou pelo menos nas fases precoces da doena)

    Histria recente de doena mdica, neurolgica (incluindo traumatismo craniano) ou psiquitrica

    Exame neurolgico com alteraes

    Vrias patologias mdicas conhecidas

    Polimedicado

    Alcoolismo

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    Exemplos para cada grupo esto sistematizados na tabela 2.

    Tabela 2 Classificao das demncias segundo as causas

    Primrias Secundrias

    Doena de Alzheimer

    Demncia com corpos de Lewy

    Degenerescncia lobar frontotemporal

    Doena de Parkinson

    Doena de Huntington

    Paralisia supranuclear progressiva

    Degenerescncia corticobasal

    Doenas vasculares cerebrais (demncia vascular)

    Traumatismos cranianos

    Tumores cerebrais

    Hidrocefalias de presso normal

    Infeces (SIDA, neurossfilis, meningites e outras infeces do SNC)

    Doenas desmielinizantes

    Alteraes metablicas adquiridas

    Doenas carenciais

    Intoxicaes

    Doenas psiquitricas (depresso)

    As causas reversveis de demncia, muito raras, so:

    Hidrocefalias de presso normal3,

    Algumas massas intracranianas,

    Deficincia de vitamina B12,

    Hipotiroidismo,

    Neurossfilis.

    No entanto, porm, estas causas devem ser sempre tidas em conta, uma vez

    que so os nicos tipos de demncia em que a interveno mdica pode no s

    interferir com a progresso da doena mas mesmo revert-la. Nestes casos, quanto

    mais tempo se demorar a chegar ao diagnstico, maiores sero os danos causados

    e maior a probabilidade de haver leso permanente. O diagnstico em casos de

    SIDA tambm importante, pois permite no s instituir teraputica anti-retroviral

    (pode abrandar ou mesmo reverter a demncia), como tambm a adopo de

    precaues contra a transmisso (caso a pessoa desconhea que est infectada).

    3 No foi dada muita importncia a esta doena, por ser uma entidade misteriosa de causa

    desconhecida. Nesta doena, a demncia acompanha-se de alteraes da marcha e incontinncia.

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    muito discutido se o alcoolismo origina demncia directamente ou em

    resultado de traumatismos e da deficincia nutricional.

    tambm controverso o papel das intoxicaes por drogas, dado que estas

    originam, muito mais frequentemente, estados confusionais do que demncia.

    Relativamente depresso, para alm da sua associao com estados

    demenciais (em que ambas as patologias coexistem), muitas vezes, a depresso

    pode ser confundida com demncia, visto que ambas partilham uma srie de

    caractersticas:

    Lentificao mental;

    Apatia;

    Self-neglect;

    Irritabilidade;

    Dificuldades de memria;

    Dificuldades de concentrao;

    Alteraes do comportamento;

    Alteraes da personalidade.

    A depresso tratvel, ao contrrio da maioria das demncias. Os sintomas

    depressivos que surjam no contexto de uma demncia tambm podem ser tratados

    directamente, como se constatar mais frente.

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    Epidemiologia

    Como j foi referido, a incidncia das diversas demncias aumenta com a

    idade, pelo que o aumento da esperana mdia de vida e o envelhecimento da

    populao, que se tm verificado nos ltimos anos, tm contribudo para um nmero

    crescente de casos e uma prevalncia crescente.

    A doena de Alzheimer a causa mais frequente de demncia, sendo

    seguida pela da demncia com corpos de Lewy, demncia frontotemporal e a

    demncia vascular (as trs tm uma importncia semelhante e podem considerar-

    se todas num segundo lugar).

    As demncias por outras causas so bastante mais raras.

    H alguns anos, um estudo da epidemiologia europeia apresentava os

    seguintes valores:

    Total Doena de Alzheimer 882 000 1 701 000 2 583 000

    Outras demncias 1 260 000 2 430 000 3 690 000

    No entanto, estima-se que, hoje em dia, os valores totais da doena de

    Alzheimer na Europa j ultrapassem os cinco milhes.

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    Diagnstico

    A abordagem ao doente com demncia sistematizada por Gauthier nos

    seguintes passos:

    1. Histria clnica geral

    Em primeiro lugar, para registar o nvel de declnio do doente e a durao do

    problema. Depois, pode ser usado para determinar a causa da demncia, sobretudo

    nas demncias secundrias. Estas no surgem isoladamente, mas acompanhadas

    de um conjunto com os outros sinais tpicos da doena de base.

    importante despistar hipertenso arterial, hiperlipidmia, diabetes e

    valvulopatias, que so factores de risco para fenmenos tromboemblicos cerebrais,

    responsveis por demncia vascular. Tambm importante pesquisar co-

    morbilidades (podem originar sintomatologia que altere o diagnstico)

    2. Histria neurolgica

    Questionar sobre: AVC, cirurgia s cartidas, trauma, cirurgia intracraniana,

    hematomas subdurais, infeces do SNC (encefalite, meningite, VIH,..), epilepsia e

    hidrocefalia. importante inquirir sobre quaisquer sintomas neurolgicos, tais como

    queixas motoras ou sensitivas, alteraes da marcha, entre outros. Defeitos motores

    no incio do quadro clnico apontam para uma demncia do tipo subcortical ou

    doena estrutural, em vez de demncia degenerativa do tipo cortical.

    3. Histria toxicolgica, nutricional e medicamentosa

    4. Histria comportamental e psiquitrica

    5. Histria familiar

    A histria familiar muito importante quando a demncia surge no contexto de

    doena de Huntington ou Doena de Wilson. Nestes casos, haver, em princpio,

    histria destas doenas na famlia. Tambm outros tipos de demncia podem ter

    histria familiar, como por exemplo, a doena de Alzheimer.

    6. Exame objectivo

    Engloba os exames fsico (pode revelar sinais de etiologia sistmica),

    neurolgico e neuropsicolgico.

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    Perante um doente em que se suspeita de demncia, necessrio responder a

    duas questes:

    1. O doente est, realmente, demente?

    2. Qual a causa ou natureza da demncia

    Para responder primeira questo, recorre-se entrevista do doente e

    familiares e avaliao do estado mental (utilizando testes neuropsicolgicos e

    avaliando as actividades do dia-a-dia com escalas prprias).

    Este passo importante, pois necessrio distinguir a demncia (alterao do

    contedo da conscincia que origina perturbaes globais das funes cognitiva) de:

    Alteraes no nvel da conscincia4 (estados confusionais, por

    exemplo),

    Perturbaes focais,

    Situaes menos graves, como o dfice cognitivo ligeiro.

    Para responder segunda questo, necessrio recorrer a:

    Histria,

    Exame mdico,

    Exames complementares de diagnstico (no s concedem pistas

    sobre a etiologia em questo, quando esta no evidente, como

    permitem despistar co-morbilidades).

    4 Alteraes no nvel da conscincia originam: sonolncia, falta de ateno, alteraes da memria

    imediata, desorientao no tempo e no espao. Estes sinais s aparecem nas demncias muito mais tarde.

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    Os exames complementares recomendados so os seguintes:

    Anlises ao sangue5: Hemograma; Velocidade de sedimentao; Glicose;

    Creatinina; Ionograma; Clcio; Transaminases; Colesterol; Triglicridos;

    Protenas totais e Electroforese; Funo tiroideia; Vitamina B12; cido

    flico; Serologia para sfilis e HIV.

    Anlises da urina: Urina tipo II.

    TC e RM

    Avaliao neuropsicolgica

    MMSE (Mini Mental State Examination6) o mais usado na clnica

    devido sua rapidez e fiabilidade dos resultados, os quais so

    ponderados consoante a literacia (evitando alguns falsos positivos);

    um bom teste de rastreio, quando se suspeita de demncia.

    Avaliao neuropsicolgica formal mais longo, s se costuma

    fazer por questes mdico-legais ou quando difcil fazer o

    diagnstico diferencial entre os vrios tipos demncias ou entre

    demncia e depresso.

    De relembrar que a demncia primria sempre uma hiptese de diagnstico

    de ltima linha, quando mais nada pode explicar a perda de capacidade cognitiva.

    No se pode fazer este diagnstico quando h apenas:

    Alteraes da conscincia,

    Delirium,

    Afasia severa,

    Alterao sensoriomotora grave (no permite a realizao do exame

    neuropsicolgico),

    Doena mdica com efeitos sistmicos.

    5 Embora estes valores possam estar alterados sem que haja qualquer relao com a demncia, em

    5,1% dos casos de dfice cognitivo ligeiro e 11,2% das demncias, h uma contribuio destes factores para a demncia, sendo possvel melhorar o quadro clnico com a correco dos mesmos. 6 Representado no final da aula.

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    Doena de Alzheimer

    A Doena de Alzheimer (DA) uma demncia primria que afecta, em regra,

    pessoas com mais de 50 anos.

    EPIDEMIOLOGIA

    A doena de Alzheimer afecta elementos de ambos os sexos na mesma

    proporo.

    A incidncia da doena aumenta com a idade (entre 1% e 7% por cada ano), a

    partir dos 50 anos (muito rara antes disso), e estima-se que, entre a faixa etria dos

    65 anos aos 85 anos, a prevalncia da doena passe de 3% para quase 50%.

    Assim, com o envelhecimento da populao, pensa-se que a incidncia da doena

    em Portugal passe dos 50 000 doentes registados em 1991 para 70 000 em 2010.

    ETIOLOGIA

    Na maioria dos casos, desconhece-se a causa da doena de Alzheimer. No

    entanto, uma base gentica pode ser identificada em 5% dos casos. Esta base a

    responsvel pelos raros casos familiares da doena.

    A Doena de Alzheimer familiar marcada por um incio precoce (antes dos

    60 anos) e foi associada a mutaes em trs genes (existem casos de Alzheimer

    familiar que no esto associados a estes genes, mas desconhece-se a causa):

    Presenilina 1 (PS1, presente no cromossoma 12), cuja mutao d origem

    a uma forma da doena que ainda mais precoce que as outras formas

    familiares (35-55 anos);

    Presenilina 2 (PS2, presente no cromossoma 1);

    Protena percursora do -amilide (APP, presente no cromossoma 21).

    Nos casos familiares associados a estas mutaes, a transmisso da doena

    sempre autossmica dominante.

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    Existem ainda factores genticos que modificam a susceptibilidade em relao

    a esta doena sem a causarem directamente; so apenas factores de risco. Dentro

    deste grupo, destaca-se o gentipo de ApoE, em que o alelo 4 (que d origem

    protena ApoE4) est associado a um maior risco de vir a sofrer da doena, que

    aumenta com a homozigotia desta variante. Alguns estudos apontam ainda para

    uma influncia por parte da 2-macroglobulina ou da low density lipoprotein-related

    protein-1, nesta patologia. Importa ainda referir que o colesterol, o stress celular e

    o ambiente hormonal tambm parecem ter alguma influncia sobre a doena.

    PATOLOGIA

    A nvel macroscpico, visvel uma atrofia cortical e subcortical, que se

    traduz por uma acentuao dos sulcos corticais, um aumento do espao

    subaracnoideu e uma dilatao dos ventrculos cerebrais.

    A atrofia mais marcada no lobo temporal; isto porque, na doena de

    Alzheimer, todas as estruturas prximas do hipocampo e estruturas relacionadas

    so atingidas mais precocemente e em maior grau.

    A nvel microscpico, detectam-se alteraes semelhantes s do

    envelhecimento normal, embora presentes em maior quantidade:

    Perda e atrofia celular,

    Placas senis,

    Novelos neurofibrilhares,

    Angiopatia amilide,

    Degenerescncia granulovacuolar,

    Corpos de Hiraro,

    Lipofuscina.

    As placas senis e os novelos neurofiblilhares so, de todas estas alteraes, as

    que tm merecido maior ateno.

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    As placas senis (fig.3) so estruturas

    grosseiramente esfricas, insolveis, que se encontram

    no espao extracelular e so constitudos por um ncleo

    de substncia amilide (cujo principal constituinte o

    pptido -amilide7), revestido por uma camada de

    terminaes nervosas degeneradas. Nestas placas,

    possvel distinguir, em muito menor quantidade, outras

    protenas como presenilina 1 e 2, apolipoprotena E, 2-

    macroglobulina, 1-antiquimotripsina e ubiquitina.

    Os novelos neurofibrilhares (fig.4) so

    depsitos intracelulares, constitudos por

    entranados de filamentos intraneuronais, de que se

    destaca como importante constituinte a protena tau.

    As placas e os novelos acumulam-se

    primariamente nos crtex entorrnico e depois no

    hipocampo (razo pela qual o efeito inicial ocorre ao

    nvel da memria).

    Com o tempo, comeam a acumular-se nas reas corticais de associao e s

    tardiamente nas reas corticais primrias. A doena segue este mesmo percurso,

    razo pela qual o exame neurolgico mostra, at muito tarde na doena, apenas o

    defeito cognitivo.

    Os corpos dos neurnios afectados pela

    degenerescncia localizam-se nos ncleos da base do

    crebro, sobretudo o ncleo de Meynert (fig.5), sendo a

    partir destes ncleos que se projectam os axnios que

    vo libertar neurotransmissores, nomeadamente

    acetilcolina8, em diversas regies do neocrtex e no

    hipocampo estruturas cujo funcionamento afectado

    pela doena, devido perda desta inervao colinrgica.

    7 Pptido -amiloide fragmento da APP, produzido por clivagem desta pela -secretase; em

    situaes normais, a APP (que existe em quase todos os tecidos do organismo sem causar qualquer problema) seria clivada pela -secretase e o produto resultante seria, depois de outras reaces, secretado e retirado do SNC sem se acumular e sem causar qualquer dano. O producto da -secretase, pelo contrio, acumula-se e origina os j referidos depsitos. 8 Para diferentes demncias, so afectadas diferentes vias nervosas. No caso da doena de

    Alzheimer, as vias mais afectadas so as colinrgicas

    Fig.3 Placas amilides

    Fig.4 Novelo neurofibrilhar

    Fig.5 Ncleo de Meynert

  • Demncias

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    CLNICA

    A doena de Alzheimer tem um incio insidioso, uma progresso lenta com

    agravamento progressivo. No entanto, podem existir alguns perodos estacionrios

    ou mesmo perodos de remisso muito breves.

    Uma vez que progride sem marcos ntidos, o nmero de fases em que pode ser

    dividida varia segundo os autores.

    Numa fase inicial, comea por uma perda de memria, de agravamento

    progressivo (primeiro sentida s pelo prprio e depois pelos que esto volta,

    nomeadamente a famlia), que pode dar origem a ansiedade e depresso. medida

    que as falhas de memria se vo agravando, os doentes comeam a cometer erros

    cada vez mais bvios. Surge uma desorientao espao-temporal e comeam a

    perder-se com facilidade.

    Paralelamente, pode ocorrer uma perda de expressividade facial e do discurso

    (onde tambm ocorre perda de temas). No entanto, as prticas sociais so, muitas

    vezes, mantidas at muito tarde (este tipo de comportamentos e frases, como o

    cumprimentar, por exemplo, fazem parte dos gestos automticos, sendo mantidos

    pelo cerebelo).

    Numa fase mais tardia, comeam a ocorrer alteraes da personalidade,

    prosopagnosia (deixam de reconhecer familiares e amigos), perda de

    reconhecimento do ambiente que os rodeia, anognosia (perdem a capacidade de se

    aperceber do seu declnio cognitivo, negando quaisquer problemas).

    Surge afasia (quer com alteraes no dbito do discurso, que se torna pobre,

    podendo chegar a perseverante e a ecollico, quer pelo aparecimento de parafasias

    ou anomia) e acalculia.

    O nvel de dependncia vai aumentando medida que o doente deixa de se

    conseguir vestir e comer (perde a noo da forma como se deve comportar e pode

    mesmo deixar de saber como comer) e perde o controlo dos esfncteres (que se

    torna mais frequente, chegando a constante).

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    Surgem alteraes do comportamento, podendo ficar calmos e dceis,

    tornarem-se muito irrequietos (uma hiperactividade sem finalidade e que pode

    obrigar a conteno fsica) ou at agressivos. Para alm da agressividade, podem

    surgir outros comportamentos socialmente condenveis (as capacidades sociais,

    que at aqui estavam preservadas, desaparecem), como a desinibio sexual ou o

    discurso ofensivo.

    Eventualmente, podem aparecer perturbaes psiquitricas, como a psicose,

    que se manifesta por alucinaes e delrio (muitas vezes paranico), que podem

    complicar a agressividade.

    O sono torna-se agitado, devido a episdios confusionais.

    O exame neurolgico (normal at fases tardias da doena, uma vez que as

    alteraes cognitivas, o principal sintoma destes doentes, no so pesquisadas no

    exame neurolgico de rotina) pode j mostrar o aparecimento de reflexos primitivos

    e manifestaes motoras (com passos pequenos, lentos e inseguros, base de apoio

    ampla, postura flectida, dificuldade em iniciar a marcha e bradicinsia).

    Muito raramente, podem ocorrer episdios epilpticos.

    Tardiamente (com o envolvimento de quase todas as reas corticais), podem

    aparecer mioclonias, espasticidade, sinal de Babinski e hemiparsia.

    Numa ltima fase, podem permanecer sentados e imveis, e, mais tarde,

    confinados cama (membros superiores e inferiores em flexo) e com necessidade

    de uma sonda nasogstrica, gastrostomia ou soros para serem alimentados.

    A morte surge em mdia sete anos (entre cinco e dez anos) aps o incio dos

    sintomas, muitas vezes por uma infeco respiratria ou outra intercorrncia.

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    DIAGNSTICO

    Existem algumas dificuldades no diagnstico da doena de Alzheimer, devido

    continuidade entre o envelhecimento normal e a doena.

    Realiza-se a partir de um quadro demencial com evoluo superior a seis

    meses (num doente com mais de 50 anos), que se inicia com um defeito de memria

    e vai progredindo e aumentando o defeito cognitivo (sem outras alteraes no

    exame neurolgico).

    A atrofia cerebral pode ser vista nos exames de imagem como a TC (fig.6) e a

    RM.

    O PET pode mostrar uma diminuio do consumo de glicose (sobretudo

    temporo-occipital) e o PETscan uma reduo do fluxo sanguneo. O PET e o

    PETscan so pouco utilizados na rotina clnica.

    As alteraes nos exames de imagem podem surgir noutras demncias e at

    no envelhecimento normal, pelo que o mais importante no diagnstico a clnica.

    No entanto, difcil distinguir a doena de Alzheimer de alteraes da memria

    pura ou, mais tarde, com o aparecimento de outros sintomas, de muitas das outras

    demncias, sobretudo as primrias.

    Assim, um diagnstico definitivo s pode vir de um exame

    anatomopatolgico, para o qual s se pode obter um fragmento do encfalo por

    bipsia (no feito por razes ticas) ou na autpsia.

    Fig.6 TC normal (esq.) e TC de um doente com DA, onde so visveis os aumentos dos sulcos corticais

  • Demncias

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    TERAPUTICA

    Toda a teraputica na doena de Alzheimer sintomtica, no existindo

    frmacos que alterem a progresso da doena.

    Resultando a demncia na doena de Alzheimer da deficincia de inervao

    colinrgica devido a leses no ncleo de Meynert, muitas das estratgias

    teraputicas esto relacionadas com a facilitao da transmisso colinrgica das

    clulas ainda viveis. Neste sentido, so usados inibidores da acetilcolinesterase,

    aumentando o tempo de vida da acetilcolina na fenda sinptica, com vista a

    melhorar o quadro clnico. Dentro destes inibidores, a tacrina deixou de poder ser

    usada devido sua hepatotoxicidade, mas, o donepezil, a rivastigmina e a

    galantamina no tm esse risco e podem ser usados, tendo apenas efeitos

    secundrios colinrgicos.

    Os inibidores da acetilcolinesterase so usados, quer na doena de Alzheimer

    ligeira e moderada, quer na fase grave da doena. No entanto, a melhoria no quadro

    (medida pelos testes neuropsicolgicos, por escalas globais de avaliao da

    demncia e por escalas de actividades da vida diria) modesta

    (cerca de apenas 5%).

    Outro medicamento utilizado, mas, s nas fases graves da doena e tambm

    com um efeito modesto, a mementina, um antagonista dos receptores de

    glutamato de subtipo NMDA.

    A teraputica farmacolgica pode ser complementada, sobretudo nas fases

    iniciais da doena, com teraputica psicolgica, para reabilitao das funes

    cognitivas afectadas.

    ainda necessrio relembrar que os doentes dementes tm um risco

    aumentado de quedas e fracturas, desnutrio, desidratao, incontinncia urinria

    e fecal, infeces urinrias e obstipao, pelo que devem ser medicados para o seu

    problema especfico. A fase final no leito pode ainda acarretar outros problemas

    devido imobilizao.

  • Demncias

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    Demncia com Corpos de Lewy

    Os corpos de Lewy so incluses intracitoplasmticas arredondadas e

    eosinfilas que, neste tipo de demncia, se distribuem pelo crtex cerebral, podendo

    tambm ser encontradas no tronco cerebral9. A -sinuclena o principal

    constituinte destas estruturas, tendo sido tambm j descrita a presena da protena

    tau (existente tambm na doena de Alzheimer e na demncia frontotemporal).

    Esta demncia uma patologia heterognea, caracterizada clinicamente por:

    declnio cognitivo (sem alteraes da memria nas fases mais iniciais)

    flutuante (h alturas em que o doente parece estar bem, outras no),

    alucinaes visuais bem definidas,

    sinais de um sindroma parkinsnico10 (sobretudo rigidez e bradicinsia).

    Os critrios de diagnstico para a demncia com corpos de Lewy esto

    especificados na tabela 3.

    TERAPUTICA

    Os inibidores da acetilcolinesterase podem ser usados para minorar as

    alteraes cognitivas da doena.

    As manifestaes comportamentais/psicolgicas melhoram com o uso de

    neurolpticos. No entanto, estes frmacos agravam as manifestaes

    extrapiramidais e podem ainda originar manifestaes autonmicas e mesmo levar a

    coma e morte, em alguns casos. Devido ao grande perigo que os neurolpticos

    representam para estes doentes, a doena deve ser diagnosticada precocemente,

    de modo a que estes possam ser evitados ou, pelo menos, usados com muito

    cuidado e num ambiente controlado. Por outro lado, os frmacos usados para tratar

    as manifestaes extrapiramidais, como a Levodopa, agravam as manifestaes

    psiquitricas, como as alucinaes.

    9 Nos doentes com doena de Parkinson, existem corpos de Lewy na substncia nigra.

    10 A demncia com corpos de Lewy um dos diagnsticos diferenciais da doena de Parkinson.

    Todos os tipos de demncia podem apresentar sintomas de parkinsonismo se o doente estiver a ser tratado com neurolpticos (ou nas fases muito avanadas da doena). Neste tipo de demncia, os sintomas parkinsnicos aparecem muito precocemente, antes do tratamento com neurolpticos ou quaisquer outros frmacos que os possam causar.

  • Demncias

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    Tabela 3 Critrio de Diagnstico da Demncia com corpos de Lewy

    1. A caracterstica central requerida para o diagnstico de demncia com corpos de

    Lewy (DLB) o declnio cognitivo progressivo suficiente para interferir com as

    funes sociais e ocupacionais. Uma perturbao de memria proeminente ou

    persistente pode no ocorrer necessariamente nas fases precoces, mas

    habitualmente evidente com a progresso da doena. Defeitos nos testes de

    ateno e capacidades fronto-subcorticais e funes visuo-espaciais podem ser

    particularmente marcados.

    2. Duas das seguintes caractersticas diagnsticas so essenciais para o diagnstico

    de DLB provvel, e uma essencial para o diagnstico de DLB possvel:

    a) Flutuao na cognio, com variaes marcadas na ateno e vigilidade;

    b) Alucinaes visuais recorrentes tipicamente ntidas e pormenorizadas;

    c) Parkinsonismo espontneo.

    3. Caractersticas que apoiam o diagnstico:

    a) Quedas repetidas;

    b) Sncope;

    c) Perda de conscincia transitria;

    d) Sensibilidade aos neurolpticos;

    e) Delrios sistematizados;

    f) Alucinaes em outras modalidades sensoriais.

    4. O diagnstico de demncia com corpos de Lewy menos provvel em presena de:

    a) Acidente vascular cerebral, revelado por sinais neurolgicos focais ou estudo

    de imagem cerebral;

    b) Evidncia, no exame fsico ou exames auxiliares, de qualquer doena geral ou

    de qualquer perturbao cerebral susceptvel de explicar o quadro clnico.

  • Demncias

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    Demncia Frontotemporal

    A demncia frontotemporal aparece mais frequentemente durante a sexta

    dcada de vida e corresponde a um conjunto de entidades (demncia

    frontotemporal; afasia no-fluente progressiva e demncia semntica) que tm em

    comum a atrofia do crtex frontal e temporal e a alterao precoce da

    personalidade, do comportamento e da linguagem.

    O humor e as funes executivas podem tambm estar alteradas e a hiperfagia

    frequente. O defeito de memria no notrio no incio.

    A alterao da personalidade e comportamento podem dar origem a apatia e

    desinteresse ou a desinibio, jocosidade inapropriada e agitao11. muito comum

    a perda de preocupao com os outros e com os seus sentimentos.

    Antes da atrofia ser detectvel na TC, pode haver um perodo em que j

    existam sintomas, podendo as alteraes no lobo frontal s ser identificadas com

    PETscan.

    Para alm da atrofia, as pores anteriores dos lobos frontais e temporais,

    assim como, alguns ncleos da base do crebro, sofrem tambm alteraes

    histolgicas:

    Perda de neurnios;

    Perda de sinapses;

    Gliose12, sobretudo nas trs primeiras camadas do crebro;

    Neurnios inchados;

    Incluses neuronais, entre as quais, os corpos de Pick.

    Contrariamente doena de Alzheimer, o restante crtex (regies temporais

    posteriores, parietais e occipitais) est relativamente poupado.

    Os critrios de diagnstico da demncia frontotemporal aparecem na tabela 4.

    11

    Podem ficar quietos e apticos ou apresentar comportamentos estranhos, tais como: compras excessivas, alteraes dos hbitos alimentares, roubar doces aos netos, contar anedotas a estranhos, alcoolismo e abuso de outras substncias, nudismo e perda fcil do controlo emocional (bater com o carro em algum que buzinou, por exemplo). 12

    Gliose hipertrofia e hiperplasia dos astrcitos.

  • Demncias

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    Tabela 4 Critrios de Diagnstico da Demncia Frontotemporal

    1. Instala-se a partir dos 50 anos, e tem como caractersticas fundamentais:

    a) Incio insidioso e evoluo progressiva;

    b) Declnio precoce do comportamento social e interpessoal;

    c) Declnio precoce da conduta pessoal;

    d) Embotamento emocional precoce, com perda de ressonncia afectiva;

    e) Prejuzo precoce do conhecimento de si.

    2. Existem outras caractersticas que suportam o diagnstico:

    a) Alterao do comportamento:

    declnio da higiene pessoal e apresentao,

    rigidez e inflexibilidade mental,

    distractibilidade e impersistncia ,

    hiperoralidade e modificao na dieta,

    comportamento perseverativo e estereotipado,

    comportamento da utilizao (necessidade de mexer nas coisas);

    b) Discurso e linguagem:

    diminuio do dbito do discurso com perda de espontaneidade e economia,

    estereotipia, ecollia, perseverao, mutismo;

    c) Sinais objectivos:

    reflexos primitivos,

    incontinncia,

    acinsia, rigidez, tremor,

    presso arterial baixa ou lbil;

    d) Exames auxiliares

    Avaliao neuropsicolgica revela um defeito significativo em testes dependentes dos lobos frontais (na ausncia de amnsia grave, afasia e alterao perceptivo-espacial),

    EEG convencional normal na presena de demncia evidente,

    Estudos de imagem (estrutural e/ou funcional): alterao predominantemente frontal e/ou temporal anterior.

    TERAPUTICA

    No existe teraputica com eficcia demonstrada para as alteraes na

    personalidade, embora j tenha sido sugerido o uso de inibidores selectivos da

    recaptao de serotonina. Nas alteraes comportamentais e psicolgicas, so

    usados frmacos prprios (referidos mais frente).

  • Demncias

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    Doena de Creutzfelt-Jakob (DKJ)

    Prio o termo usado para definir pequenas partculas proteicas com

    capacidade infecciosa. O seu principal constituinte uma protena amiloidognica, a

    PrP (prion protein), que possui duas isoformas:

    PrPC, que existe no ser humano normal (na membrana celular de diversas

    clulas, sobretudo nos neurnios) e sensvel proteinase K;

    PrPSc, que se localiza nos lisosomas e resistente proteinase K.

    Para que a doena ocorra, necessrio que a PrPSc aparea no organismo

    (por uma alterao na estrutura tridimensional da PrPC ou de forma adquirida) e se

    replique, aumentando a sua quantidade. Pensa-se que esta replicao se d devido

    induo da alterao na PrPC j existente.

    A PrP est ligada a algumas doenas humanas:

    Doena de Creutzfelt-Jakob (DKJ);

    Kuru;

    Doena de Gerstmann-Strusler-Scheinker;

    Insnia familiar fatal.

    Nestas doenas ocorrem trs alteraes neuropatolgicas:

    Degenerescncia esponjosa;

    Gliose astrocitria;

    Perda neuronal (mas, sem infiltrado inflamatrio ou necrose).

    Tambm so identificveis, por imunohistoqumica, depsitos de PrPSc.

    A doena de Creutzfelt-Jakob a mais frequente das doenas prinicas,

    embora seja bastante rara (a forma idioptica tem uma incidncia de

    1 para 1 milho). uma doena, invariavelmente, fatal e aparece nas variantes:

    idioptica, adquirida e gentica/familiar/hereditria.

  • Demncias

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    A forma espordica a mais frequente e tem uma incidncia mxima entre a

    stima e a oitava dcadas de vida. Caracteriza-se por uma demncia rapidamente

    progressiva (induzindo logo o diagnstico para esta doena), de instalao

    subaguda, que leva morte em seis meses. Verifica-se um envolvimento focal

    varivel do crtex cerebral, gnglios da base, cerebelo, tronco cerebral e medula

    espinhal.

    Tambm podem ocorrer outros sintomas acompanhantes, que variam de caso

    para caso (tabela 5), sendo os mais frequentes a disfuno piramidal e/ou

    extrapiramidal (rigidez; bradicinsia; tremor; distonia; coreia) e as mioclonias.

    Tabela 5 Critrios de diagnstico da forma espordica de DKJ

    I. Demncia rapidamente progressiva

    II. Sintomas: A. Mioclonias B. Perturbaes visuais e/ou cerebelosas C. Disfuno piramidal e/ou extrapiramidal D. Mutismo acintico

    III. Exames complementares: A. EEG tpico B. Protena 14.3.3

    Diagnstico:

    Definitivo: Confirmao neuropatolgica

    Provvel: I + pelo menos dois de II + IIIA ou

    Possvel + IIIB

    Possvel: I + pelo menos dois de II + durao < 2 anos

    Relativamente a exames complementares, o EEG tpico mostra uma

    actividade generalizada, peridica, trifsica (a actividade fsica do EEG tpica

    desta doena), em que estas ondas trifsicas ocorrem uma vez em cada segundo.

    Estas alteraes no EEG esto ausentes na nova variante.

    A protena 14.3.3 positiva no LCR, numa grande percentagem dos casos,

    embora, sendo um marcador de destruio neuronal, seja pouco especfica,

    podendo estar elevada em encefalites por herpes simplex ou enfarte cerebral.

    A forma adquirida est ligada transmisso entre humanos (atravs de

    transplantes de crnea, implantes de dura-mter, elctrodos profundos ou por

    preparados de hormona de crescimento a partir da glndula pituitria de cadveres

    infectados) ou transmisso da encefalopatia espongiforme bovina (BSE), a nova

    variante da DKJ (pensa-se que pela ingesto de rgos e tecidos infectados).

    A forma familiar muito rara e pensa-se que se deva a mutaes que

    induzem a transformao de PrPC em PrPSc. O seu diagnstico requer a deteco da

    forma mutante da PrP no DNA dos linfcitos.

  • Demncias

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    Demncia Vascular

    A demncia vascular o tipo mais comum de demncia secundria.

    determinada por acidentes vasculares cerebrais (AVC), isqumicos ou

    hemorrgicos. Pode resultar de doenas de pequenos vasos, vrios enfartes

    grandes, enfartes nicos estrategicamente localizados, hipxia/efeito hemodinmico

    e hemorragia cerebral.

    A doena de pequenos vasos a causa mais frequente de demncia

    vascular. Os pequenos enfartes so denominados lacunas e resultam,

    normalmente, de lipohialinose (designao de um processo arterioesclertico nestas

    artrias e que tem como factores de risco a hipertenso arterial e/ou a diabetes).

    Tambm podem ser consequncia de vasculite, que se estende s artrias de

    pequeno calibre.

    Os enfartes podem ser isqumicos ou

    hemorrgicos. Uma vez que os enfartes nicos

    estrategicamente localizados requerem uma

    localizao to precisa e pouco comum para um

    enfarte (a circunvoluo angular; o territrio da

    artria cerebral posterior; o territrio da artria

    cerebral anterior; os dois tlamos pticos), esta

    uma causa pouco frequente de demncia vascular.

    A hemorragia pode dar origem, por exemplo,

    a um hematoma subdural crnico. Esta patologia

    mais frequente em doentes entre os 50 e os 70

    anos, muitas vezes, aps um pequeno trauma

    (pode estar separado do incio dos sintomas por

    meses) e tem como factores de risco o alcoolismo,

    a atrofia cerebral, a epilepsia, o uso de

    anticoagulao, shunts ventriculares e a

    hemodilise de longa durao.

    Estes hematomas so muitas vezes bilaterais (logo, sempre importante que

    se pesquisem bilateralmente). O sintoma inicial uma cefaleia muito intensa, qual

    se podem seguir confuso, demncia, hemiparsia, vmitos, entres outros.

    Fig.7 RM de um caso de demncia vascular causado por pequenos enfartes. As lacumas esto presentes quer nas zonas adjacentes aos ventrculos cerebrais (setas) quer nos ncleos da base (pontas de seta).

  • Demncias

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    ASPECTOS CLNICOS

    A demncia vascular manifesta-se por um quadro demencial em que o defeito

    cognitivo no segue, ao contrrio do das demncias primrias, um percurso

    previsvel. Isto ocorre porque o defeito varia de doente para doente, de acordo com

    as caractersticas (localizao, dimenso, modo como sucede) dos acidentes

    vasculares.

    Assim, o incio do defeito cognitivo pode ser:

    Sbito hipoxia ou enfarte nico;

    Progressivo na doena de pequenos vasos, em que a doena se vai

    instalando lentamente, medida que os enfartes ocorrem, mas, sem que

    o mdico ou os familiares se apercebam destes episdios individuais);

    Por episdios quando h vrios enfartes grandes.

    Os doentes com demncia vascular tm, como evidente, factores de risco

    crebro-vasculares.

    Os vrios acidentes de grandes dimenses vo apresentar, para alm do

    dfice cognitivo, mltiplos sinais e sintomas, resultantes dos diversos enfartes, como

    afasia (caso afecte o hemisfrio esquerdo), neglect (caso afecte o hemisfrio direito),

    hemiparsia, alteraes sensitivas, hemianpsia, entre outros.

    O diagnstico passa por comprovao imagiolgica dos acidentes vasculares

    cerebrais e pela excluso de outras causas de demncia. Na doena de pequenos

    vasos, podem no existir outros sinais ou sintomas para alm da demncia, logo, a

    imagiologia, que mostra leucoariose (rarefaco da substncia branca), o principal

    modo de distino em relao a uma demncia primria. Pelo contrrio, na anxia

    cerebral no h alteraes imagiolgicas relevantes e o factor determinante ser a

    clnica. Os critrios de diagnstico esto listados na tabela 6.

    Aps o diagnstico, recomendvel excluir outras causas possveis do

    acidente, particularmente em doentes jovens sem histria de HTA, como: mbolos

    cardacos; policitmia; trombocitose; vasculite cerebral ou sfilis meningovascular.

  • Demncias

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    Tabela 6 Critrios de Diagnstico para Demncia Vascular

    1. Demncia definida como declnio cognitivo a partir de um nvel mais elevado de

    funcionamento e manifestado por defeito de memria e de dois ou mais domnios cognitivos

    (orientao, ateno, linguagem, funes visuo-espaciais, funes executivas, controlo motor

    e praxias), preferencialmente estabelecida por exame clnico e documentada por avaliao

    neuropsicolgica. Os defeitos devem ser suficientemente graves para interferirem com as

    actividades da vida diria e no serem apenas devidos s limitaes fsicas do acidente

    vascular cerebral.

    Critrios de excluso: casos com alteraes da conscincia, sindroma confusional,

    psicose, afasia grave, ou defeito sensoriomotor importante que impea a avaliao

    neuropsicolgica. Excluem-se tambm doenas sistmicas ou doenas cerebrais (como a

    doena de Alzheimer) capazes de explicar os defeitos de memria e cognio.

    2. Doena crebro-vascular, definida pela presena de:

    a) Sinais focais no exame neurolgico como hemiparsia, parsia facial central, sinal

    de Babinski, defeito sensitivo, hemianpsia ou disartria consistentes com um acidente

    vascular cerebral (com ou sem histria de AVC);

    b) Evidncia de doena crebro-vascular relevante nos estudos de imagem cerebral

    (TC ou RM crnio-enceflica), incluindo mltiplos enfartes nos territrios dos grandes vasos

    cerebrais ou um enfarte nico estrategicamente localizado (circunvoluo angular, tlamo,

    telencfalo basal ou territrios das artrias cerebral posterior ou anterior), bem como

    mltiplas lacunas nos gnglios da base e na substncia branca, leses extensas de

    substncia branca periventricular, ou combinaes destas leses.

    3. Relao entre as duas condies acima:

    a) Incio de demncia at trs meses aps um acidente vascular cerebral reconhecido;

    b) Deteriorao abrupta das funes cognitivas;

    c) Progresso flutuante ou em degraus dos defeitos cognitivos.

    TERAPUTICA

    H evidncias de que o quadro beneficia do uso de frmacos

    anticolinestersicos. A esta terapia deve juntar-se a terapia usual para doentes

    que sofreram um acidente vascular cerebral (AVC).

  • Demncias

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    Manifestaes Comportamentais/Psicolgicas

    Estes sintomas so importantes pois so causadores de sofrimento quer ao

    doente quer ao cuidador, determinando, muitas vezes, a institucionalizao do

    doente. Assim, necessrio que, quando causam sofrimento ou constituem perigo

    para o doente ou o cuidador, sejam eficazmente tratados.

    Entre os sintomas psicolgicos, encontram-se os pensamentos delirantes,

    iluses, alucinaes, insnia, depresso e ansiedade.

    As manifestaes comportamentais podem englobar alteraes to

    diferentes como a irrequietude, deambulao e fuga, comportamentos culturalmente

    inapropriados (como a desinibio sexual), perguntas repetidas, falta de iniciativa,

    discurso ofensivo, gritos e agresso fsica.

    A abordagem inicial para estes problemas deve ser no farmacolgica, a

    menos que a sua gravidade exija tratamento farmacolgico imediato.

    A teraputica no farmacolgica baseia-se em trs mtodos:

    Terapia orientada para a realidade: procura manter as actividades do

    doente, sem deixar que faam coisas por ele, mesmo que este no as faa

    to bem ou demore muito mais tempo;

    Terapia das reminiscncias: procura aproveitar aquilo que o doente se

    recorda;

    Terapia da validao: procura respeitar o mundo onde os doentes vivem.

    A abordagem farmacolgica deve ter em conta as alteraes prprias do

    envelhecimento (diminuio da massa corporal, hipoalbuminmia, reduo do

    metabolismo heptico e da excreo renal), a possvel existncia de doenas

    concomitantes e a toma de mltiplos frmacos.

    As regras de preveno so inespecficas, focando os bons hbitos de vida

    geral: desporto, controlo da tenso arterial, dieta saudvel, abstinncia de lcool e

    tabaco e manter actividade mental. No fundo, o objectivo atrasar a morte neuronal.

  • Demncias

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    A depresso acompanha muitas vezes a demncia e a sua teraputica no

    farmacolgica passa por promover uma atitude mais positiva perante a vida e

    desenvolver actividade salutares. Posteriormente, pode recorrer-se ao uso de

    antidepressivos, que devem ter pouca actividade anticolinrgica e pouco potencial

    de complicaes cardacos (os tricclicos no so recomendados).

    Tambm na insnia se comea por promover uma boa higiene do sono

    (actividade fsica diria, restrio do sono diurno, horrios regulares, evitar

    substncias com efeitos estimulantes, reduo da ingesto vespertina de lquidos,

    para evitar a nictria, ambiente nocturno calmo), e, a nvel farmacolgico, devem

    ser usadas benzodiazepinas, cuja semivida deve ser escolhida de acordo com o tipo

    de insnia (inicial, intermdia ou terminal) e de forma a evitar a sonolncia diurna.

    Uma alternativa o uso de inidazopiridina, que tem a vantagem de ser um

    antidepressivo e neurolptico com grande efeito sedativo.

    A agitao psicomotora deve ser pormenorizada (frequncia, durao,

    aparecimento, resposta a teraputica prvia), podendo ser o resultado de uma

    resposta adversa medicao, uma resposta a estmulos que geram desconforto ao

    doente, uma resposta mudana de cuidador ou uma deteriorao das capacidades

    sensoriais do doente e, neste caso, a teraputica farmacolgica. De uma forma

    geral, importante manter o doente num ambiente calmo e agradvel, evitar

    situaes que possam induzir alterao comportamental ao doente, encontrar um

    cuidador adequado (gentil, tranquilizador, firme, sem uma postura que possa

    perturbar o doente), tentar distrair o doente, evitar a discusso ou a conteno

    fsica. No que diz respeito ao tratamento farmacolgico, as benzodiazepinas

    (embora com risco de sonolncia diurna, quedas e deteriorao da memria) e os

    neurolpicos so os mais apropriados, sendo os neurolpticos os mais adequados

    quando h sintomas psicticos. A existncia de problemas extrapiramidais contra-

    indica estes frmacos, mas, os neurolpticos atpicos tm menos riscos nessa rea,

    sobretudo a risperidona.

    Deve ainda ser prestado apoio psicolgico/psiquitrico ao cuidador do doente,

    que, frequentemente, sofre de exausto fsica e psicolgica.

  • Demncias

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    Teraputica Sistematizao

    Os inibidores de acetilcolinesterase (sendo o donezepil, a rivastigmina e a

    galantamina os mais comuns em Portugal) so usados no tratamento de demncia

    no contexto de doena de Alzheimer, demncia com corpos de Lewy e demncia

    vascular. Os efeitos adversos destes frmacos costumam desaparecer ao fim de

    trs a cinco semanas e, normalmente, podem ser evitados, iniciando a teraputica

    com doses baixas, que se aumentam progressivamente (o mesmo deve ser feito

    aps uma paragem prolongada na sua toma).

    Os efeitos adversos dos inibidores da acetilcolinesterase incluem:

    Anorexia e perda de peso, nuseas e vmitos, dispepsia, diarreia, dor

    abdominal;

    Bradicrdia;

    Sncope;

    Contraces musculares involuntrias (devido excessiva estimulao

    dos receptores nicotnicos na juno neuromuscular) e cibras;

    Insnia (em especial, com o donepezil que deve, por isso, ser

    administrado noite) e agitao.

    Das interaces medicamentosas destes frmacos, destacam-se:

    A galantamina e o donepezil, que so metabolizados pelo citP450.

    O donepezil tem grande afinidade para as protenas, pelo que pode

    potenciar efeitos secundrios com outros frmacos muito proteinoflicos,

    tais como a varfarina, digoxina e teofilina.

    A rivastigmina hidrolisada por esterases cerebrais e a mais segura

    quanto a interaces medicamentosas.

    Para as demncias frontotemporais, no existe nenhum tratamento com

    eficcia comprovada, sendo usados antidepressivos inibidores selectivos da

    recaptao da serotonina, devido falta de outras opes.

    J foi referido o problema do balano entre os neurolpticos e os

    antiparkinsnicos na demncia com corpos de Lewy.

  • Demncias

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    Defeito Cognitivo Ligeiro

    O defeito cognitivo ligeiro designa um defeito de memria sem demncia que

    aparece com o envelhecimento.

    Este dfice deve ser detectado e seguido clinicamente para confirmar que no

    h agravamento do quadro e que no se tratava da fase inicial de uma demncia

    mal diagnosticada.

    Assim, para que o defeito cognitivo ligeiro seja diagnosticado:

    O doente deve apresentar queixas de dificuldades mnsicas (de

    preferncia corroboradas por um acompanhante);

    O defeito de memria deve ter em conta a idade e a escolaridade;

    A funo cognitiva geral deve estar preservada;

    As actividades do dia-a-dia devem estar intactas;

    No pode haver demncia.

  • Demncias

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    Mini Mental State Examination (MMSE)

    1. Orientao (1 ponto por cada resposta correcta)

    Em que ano estamos? _____

    Em que ms estamos? _____

    Em que dia do ms estamos? _____

    Em que dia da semana estamos? _____

    Em que estao do ano estamos? _____

    Nota:____

    Em que pas estamos? _____

    Em que distrito vive? _____

    Em que terra vive? _____

    Em que casa estamos? _____

    Em que andar estamos? _____

    Nota:____

    2. Reteno (contar 1 ponto por cada palavra correctamente repetida)

    "Vou dizer trs palavras; queria que as repetisse, mas s depois de eu as dizer

    todas; procure ficar a sab-las de cor".

    Pra _____

    Gato _____

    Bola _____

    Nota:____

    3. Ateno e Clculo (1 ponto por cada resposta correcta. Se der uma errada

    mas depois continuar a subtrair bem, consideram-se as seguintes como

    correctas. Parar ao fim de cinco respostas)

    "Agora peco-lhe que me diga quantos so 30 menos 3 e depois ao nmero

    encontrado volta a tirar 3 e repete assim at eu lhe dizer para parar".

    27_ 24_ 21 _ 18_ 15_

    Nota:____

  • Demncias

    Pgina 32 de 33

    4. Evocao (1 ponto por cada resposta correcta.)

    "Veja se consegue dizer as trs palavras que pedi h pouco para decorar".

    Pra ______

    Gato ______

    Bola ______

    Nota:____

    5. Linguagem (1 ponto por cada resposta correcta)

    a. "Como se chama isto? Mostrar os objectos:

    Relgio ____

    Lpis______

    Nota:____

    b. "Repita a frase que eu vou dizer: O RATO ROEU A ROLHA"

    Nota:____

    c. "Quando eu lhe der esta folha de papel, pegue nela com a mo direita,

    dobre-a ao meio e ponha sobre a mesa"; dar a folha segurando com as duas

    mos.

    Pega com a mo direita____

    Dobra ao meio ____

    Coloca onde deve____

    Nota:____

    d. "Leia o que est neste carto e faa o que l diz". Mostrar um carto com a

    frase bem legvel, "FECHE OS OLHOS"; sendo analfabeto l-se a frase.

    Fechou os olhos____

    Nota:____

    e. "Escreva uma frase inteira aqui". Deve ter sujeito e verbo e fazer sentido; os

    erros gramaticais no prejudicam a pontuao.

    Frase:

    Nota:____

  • Demncias

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    6. Habilidade Construtiva (1 ponto pela cpia correcta.)

    Deve copiar um desenho. Dois pentgonos parcialmente sobrepostos; cada um

    deve ficar com cinco lados, dois dos quais intersectados. No valorizar tremor

    ou rotao.

    Cpia:

    Nota:____

    TOTAL (Mximo 30 pontos):____

    Considera-se com defeito cognitivo:

    analfabetos 15 pontos

    1 a 11 anos de escolaridade 22

    com escolaridade superior a 11 anos 27