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DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA
ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE
VERSÃO NÃO CONFIDENCIAL
Considerando que a Entidade Reguladora da Saúde nos termos do n.º 1 do artigo 4.º dos
Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto exerce
funções de regulação, de supervisão e de promoção e defesa da concorrência respeitantes
às atividades económicas na área da saúde nos setores privado, público, cooperativo e
social;
Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde conferidas pelo artigo 5.º
dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto;
Considerando os objetivos da atividade reguladora da Entidade Reguladora da Saúde
estabelecidos no artigo 10.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º
126/2014, de 22 de agosto;
Considerando os poderes de supervisão da Entidade Reguladora da Saúde estabelecidos
no artigo 19.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de
agosto;
Visto o processo registado sob o n.º ERS/35/2014;
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I. DO PROCESSO
I.1. Origem do processo
1. A ERS tomou conhecimento do teor da reclamação, inicialmente tratada em sede do
processo de reclamação n.º REC/2846/2014, subscrita por F., relativa à utente M., sua
filha, e referente ao Hospital Santa Maria, estabelecimento prestador de cuidados de
saúde registado no SRER da ERS sob o n.º 113141, integrado na entidade prestadora
de cuidados de saúde Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E., inscrita no SRER da
ERS sob o n.º 18707.
2. Após análise da referida reclamação, foi aberto o processo de avaliação n,º
AV/226/2014, sendo que o Conselho de Administração da ERS, por despacho de 18 de
junho de 2014, determinou a abertura do processo de inquérito em curso, com o
propósito, em geral, de averiguar se o estabelecimento visado cumpriu as normas e
procedimentos em vigor no que respeita ao acesso a cuidados de saúde
transfronteiriços.
I.2. Da reclamação e das respostas dos prestadores
3. De acordo com o teor da exposição identificada, a reclamante alega que foi negado,
com fundamentação inválida, o acesso a cuidados de saúde transfronteiriços à sua
filha, a utente M.
4. Concretamente, resulta da reclamação, efetuada em 10 de abril de 2014, que, tendo
dirigido requerimentos de documento portátil S2, para o efeito de aceder a cuidados de
saúde transfronteiriços, os mesmos foram indeferidos com base em fundamentos
inválidos.
5. Do teor da reclamação resultava, assim, a possibilidade de o prestador ter adotado um
comportamento consubstanciador de um desrespeito pela legislação vigente em
matéria de acesso a cuidados de saúde transfronteiriços.
6. Sem prejuízo da análise desta questão, outras se suscitaram no decorrer das
diligências efetuadas, pelo que merecerão igualmente a devida análise no presente
processo.
I.3 Diligências
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7. No âmbito da investigação desenvolvida pela ERS, realizaram-se, entre outras, as
diligências consubstanciadas em:
(i) Pesquisa e consulta no SRER da ERS do prestador de cuidados de saúde
Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E. (doravante, CHLN), registado no SRER
da ERS sob o n.º 18707, detentor do estabelecimento prestador de cuidados de
saúde Hospital de Santa Maria (doravante HSM), registado sob o n.º 113141.
(ii) Pedidos de informação dirigidos ao CHLN em 27 de junho de 2015, em 20 de
agosto de 2014 e em 18 de junho de 2015, e respetivas respostas;
II. DOS FACTOS
II.1. Factos relativos à reclamação inicial
8. Em 21 de abril de 2014, foi rececionada pela Entidade Reguladora da Saúde
(doravante, abreviadamente ERS) a reclamação subscrita por F., em representação da
utente menor, sua filha e utente M., porquanto ter-lhe-á sido “(…) negado relatório
clínico do diretor do serviço de cirurgia plástica do Hospital de Santa Maria para
anexarmos ao documento portátil S2, com fundamentação inadmissível (…)”.
9. Em concreto, a reclamante descreve a situação vivenciada pela utente menor e pelos
seus progenitores no decurso dos últimos 13 anos, alegando que, não obstante aquela
mesma utente ter sido sujeita a distintas intervenções cirúrgicas e recebido
acompanhamento médico pelo SNS, certo é que, fora de Portugal, a terapêutica
seguida é alegadamente mais atualizada e com efeitos mais adequados à sua situação
clínica.
10. Na realidade, segundo a reclamante, o profissional de saúde do Hospital de Santa
Maria terá recusado “(…) enviar o caso para o estrangeiro, alegando que cá se faz
(…)”.
11. Ademais, refere a mesma reclamante que “(…) há muito que sentimos a
descoordenação total entre as 8 especialidades que tratam a nossa filha, em 3
hospitais diferentes (CHTViseu onde vivemos, HPCoimbra e HSM) (…)”; e,
12. Certo é que, ainda de acordo com a mesma reclamação, o Serviço de Cirurgia Plástica
do Hospital de Santa Maria “(…) alude que não pode elaborar um relatório porque «a
paciente deixou de vir à nossa consulta»”.
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13. A reclamante refere que “A última vez que ela [a utente, sua filha] foi vista nesse
serviço [Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital de Santa Maria] foi em 2008,
seguiram-se 7 adiamentos (!), estando a próxima consulta prevista para outubro de
2014! Decidimos entretanto recorrer ao estrangeiro, a um centro multidisciplinar que
nos indicasse um caminho a seguir”.
14. Acrescenta a reclamante que “Pedimos em outubro de 2013, por escrito e
posteriormente por telefone, transferência do processo de neurocirurgia do HSM para o
HPCoimbra e não há qualquer encaminhamento”.
II.2. Factos relativos ao pedido de informação ao CHLN em 27 de junho de 2015
15. Em 27 de junho de 2014, a ERS dirigiu um pedido de informações ao CHLN-HSM que,
no que se afigura relevante para os presentes autos, se reproduz:
“[…]
(i) Pronunciem-se, de forma completa e fundamentada, sobre o teor da predita
reclamação, designada mas não limitadamente, sobre o facto de «[…] a
técnica utilizada em Paris não se praticar em Portugal […]» e sobre a
alegada «[…] descoordenação total entre as 8 especialidades que tratam a
nossa filha, em 3 hospitais diferentes […];
(ii) Indicação dos motivos que terão determinado os sucessivos adiamentos
das consultas de especialidade;
(iii) Esclarecimento sobre o estádio do pedido de transferência do processo
clínico que terá sido apresentado a V. Exas, em nome da utente menor, com
referência, cronológica e documental, dos eventuais desenvolvimentos
entretanto ocorridos;
(iv) Enumeração de todas as (eventuais) estruturas – humanas ou institucionais
– existentes no Hospital de Santa Maria, e que se dediquem à prestação de
informação aos utentes e/ou seus representantes, sobre o seu quadro
clínico e demais aspetos sobre a possibilidade de apoio financeiro à
assistência médica de grande especialização no estrangeiro, em situação
semelhante à reclamada;
[…]”.
16. Subsequentemente, veio o CHLN-HSM referir, em 4 de agosto de 2014,
concretamente, o seguinte:
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“[…]
A reclamação dos pais da doente M. prende-se no essencial com o facto de não lhes
ter sido proporcionado suporte financeiro para as deslocações ao estrangeiro (…),
onde lhes foi proposta uma intervenção mais precoce e mais extensa sobre o terço
médio da face (LeFort III com bipartição e distracção óssea aos 14 anos), sendo que
neste CHLN o plano (…). Os motivos para a posição tomada, que se mantém no caso
da M., são clínicos (…). A opção pela não realização de bipartição facial (que seria
igualmente possível mesmo aos 16 anos) (…). Da reclamação efectuada resulta que, a
opção pelo tratamento no estrangeiro foi tomada pelos pais por uma questão de
preferência pelo método e timing propostos em Paris, apesar de estarem conscientes
da existência de uma alternativa em Lisboa.
Os adiamentos das consultas da especialidade de Cirurgia Plástica deveram-se à
marcada redução dos recursos humanos do Serviço de Cirurgia Plástica e
Reconstrutiva Maxilo Facial nestes últimos anos.
O Sector de Assistência Médica ao Estrangeiro no CHLN, funciona integrado na
Unidade de Gestão Clínica, de modo a fazer cumprir o estipulado no Decreto-Lei n.º
177/92 de 13 de Agosto que regulamenta a possibilidade dos doentes pertencentes ao
SNS se deslocarem ao estrangeiro para tratamento médico por falta de condições
técnicas e profissionais em território nacional. O processo inicia-se com o
preenchimento de um formulário da Direcção Geral de Saúde no qual, por parte do
médico assistente, é fundamentado do ponto de vista clínico a necessidade de
tratamento no estrangeiro, posteriormente ratificada pelo Director de serviço que
encaminha o pedido para a Direcção Clínica, com vista à necessária aprovação. Após
a autorização o processo é encaminhado para avaliação pela DGS, entidade que dá o
parecer final e também para o Sector de Assistência Médica ao Estrangeiro.
Neste serviço é efectuada toda a tramitação administrativa necessária, em especial o
contacto com o utente no sentido de serem prestadas todas as informações
necessárias a instrução do processo, assim como todo o expediente logístico (contacto
com o hospital de referência, organização de viagens, alojamento, pedido de termo de
responsabilidade ou caução, etc).
Para efeitos de adiantamento de verba com vista a custear despesas com alimentação
e transportes, no entanto, no enquadramento legal que o prevê pressupõe também
uma avaliação prévia pelo Serviço Social do CHLN e carece de autorização do
Conselho de Administração. O referido montante é baseado num valor fixo por
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alimentação e o restante é, na maioria das vezes, calculado com base em deslocações
anteriores.
(…) podemos referir que entre a execução do pedido, a sua autorização pela Direcção
Clínica do CHLN e a autorização do DGS, decorre tendencialmente um prazo no
máximo de 10 dias.
(…) quanto à questão global relativa à assistência a M., referir que não se verificou no
caso concreto qualquer recusa de cuidados médicos. No entanto, entendeu a equipa
que o momento referenciado pelos pais, não era adequado proceder à intervenção que
por razões clínicas entenderam deferir para a altura em que ocorresse a conclusão do
crescimento facial. Não se tratou de negar assistência ou a emissão de um relatório
médico, mas sim no entender dos médicos que assistiram a doente, não se verificavam
os critérios clínicos, pelas razões já expostas que permitissem justificar a abertura de
um processo de assistência médica no estrangeiro, tendo em consideração os critérios
que presidem ao mesmo. A equipa deste CHLN (…) está preparada para todas as
técnicas referidas na exposição dos pais da doente, e continua à disposição para
qualquer intervenção ou acto que venham a ser necessários”.
17. Posteriormente, por ofício de 20 de agosto de 2014, foi o prestador novamente instado
a pronunciar-se no sentido de completar a informação transcrita no ponto anterior, em
especial, sobre o estádio do pedido de transferência do processo clínico apresentado
pelo reclamante, tendo o mesmo, por resposta datada de 4 de setembro de 2014,
aduzido o CHLN o seguinte:
“[…]
Os pais da menor solicitaram em 22.10.2013 junto do Setor dos Relatórios Clínicos
deste centro hospitalar, «que o processo de Neurocirurgia relativo à nossa filha M,
seja transferido para o Hospital Pediátrico de Coimbra, por proximidade de
residência (vivemos em Viseu).» (…) pedido esse que, inicialmente, foi tratado por
aquele sector como um pedido de acesso a dados clínicos (formulado ao abrigo da
Lei de Acesso a Documentos Administrativos) e encaminhado para o Serviço de
Neurocirurgia.
Refira-se, porém, que a eventual transferência da doente para outro hospital não
pressupunha nem obrigava a transferência do respectivo processo clínico o qual,
em cumprimento das regras legais em vigor sobre a matéria (designadamente do
«regulamento Arquivístico para os Hospitais» aprovado em anexo á Portaria nº
247/2000, de 8 de maio) deveria permanecer arquivado no CHLN.
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Por outro lado, tal como referem os pais da doente na sua reclamação, esta já era
seguida no Hospital Pediátrico de Coimbra, pelo que não se justificava qualquer tipo
de encaminhamento por parte do CHLN, onde a doente entretanto deixou de
comparecer.
A este propósito, reitera-se que não se tratou aqui de negar a assistência clínica
necessária ou emissão de relatório clínico, mas sim de, no entender dos médicos
que assistiram a doente, não se verificarem os critérios clínicos que justificavam a
abertura de processo de assistência médica no estrangeiro, uma vez que a equipa
do CHLN está preparada para todas as técnicas referidas na exposição dos pais da
doente”.
18. Considerando a necessidade de obtenção de esclarecimentos adicionais, por forma ao
apuramento cabal dos factos, a ERS dirigiu um pedido de elementos adicional ao
CHLN-HSM, em 18 de junho de 2015, nos seguintes termos:
“[…]
1. Informação sobre se, em alguma fase do tratamento da utente M. no Hospital
Santa Maria (HSM), foram os pais informados sobre a possibilidade de pedir
uma segunda opinião médica sobre a conveniência e/ou necessidade de o
tratamento (nomeadamente, as intervenções cirúrgicas) ser realizado, total ou
parcialmente, no estrangeiro;
2. Cópia integral da “Resposta a «Requerimento de Documento Portátil S2»”
elaborada, em 09-05-2013, pelo Dr. J., em resposta ao “Requerimento de
documento portátil S2” apresentado pelos pais da utente em 02-05-2013 junto
do HSM, uma vez que, da cópia na posse da ERS, não consta uma folha ou
página, correspondente ao trecho desenvolvido do ponto 4. e anterior ao ponto
5.;
3. Cópia do Certificado de Inscrição na Lista de Inscritos para Cirurgia de M., para
a cirurgia na qual a mesma foi inscrita no SIGIC em 27-03-2013 (conforme
“Resposta a «Requerimento de Documento Portátil S2»”, de 09-05-2013), e de
outra documentação eventualmente emitida pelo prestador ao abrigo da
mencionada inscrição no SIGIC;
4. Confirmação das datas dos sucessivos adiamentos da consulta de
especialidade de Cirurgia Plástica no HSM, conforme indicadas pelos pais da
utente e melhor descritas infra, acompanhada da cópia das cartas remetidas
aos mesmos informando desses mesmos adiamentos:
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a) Consulta de 29-06-2010 (11h15) foi adiada para 19-10-2010
(10h55);
b) Consulta de 19-10-2010 foi adiada para 18-10-2011 (10.30h);
c) Consulta de 18-10-2011 foi adiada para 27-12-2011 (9h30);
d) Consulta de 27-12-2011 foi adiada para 31-12-2012 (10h10);
e) Consulta de 31-12-2012 foi adiada para 29-05-2012 (10h10);
f) Consulta de 29-05-2012 foi adiada para 26-11-2012 (8h40).
5. Informação sobre se as referidas consultas da especialidade de Cirurgia
Plástica no HSM, alegadamente adiadas por 7 (sete) ocasiões, correspondiam
a consultas preparatórias de cirurgia ou a consultas de
acompanhamento/seguimento;
6. Confirmação da remarcação da consulta de especialidade de Cirurgia Plástica
no HSM de 26-11-2012 para 27-10-2014 (depois antecipada para 23-10-2014),
conforme indicado pelos pais da utente, e cópia da carta remetida aos pais da
utente informando da data da remarcação;
7. Informação sobre o motivo para a Direção do Serviço de Cirurgia Plástica ter
indicado, por carta remetida aos pais da utente em 10-04-2014, em resposta ao
“Requerimento de documento portátil S2” apresentado pelos mesmos em 17-
03-2014, que “a paciente deixou de vir à nossa consulta”;
8. Informação sobre data da última consulta realizada com a utente no HSM;
9. Informação sobre se, relativamente à tramitação dos dois requerimentos de
documento portátil S2 apresentados pelos pais da utente (em 02-05-2013 e em
17-03-2014), se verificou, em algum momento, o
reencaminhamento/envolvimento por parte da Administração Regional de
Saúde competente e/ou da Direção-Geral da Saúde e, em caso afirmativo,
cópia de toda a documentação respetiva;
10. Informação sobre o modo, o fundamento e a data em que a utente M., até
então acompanhada no Hospital Pediátrico de Coimbra, passou a sê-lo no
HSM (conforme descrito pelo Dr. J. em “Resposta a «Requerimento de
Documento Portátil S2»”, de 09-05-2013), acompanhada de cópia de toda a
documentação relevante;
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11. Informação sobre se, em algum momento, o HSM respondeu, por qualquer
forma, ao requerimento de transferência de processo clínico apresentado pelos
pais da utente em 22-10-2013 junto desse hospital, acompanhada de cópia da
documentação respetiva;
12. Independente da informação prestada no ponto anterior, informação sobre o
modo e a data em que os pais obtiveram efetivamente acesso/cópia do
processo clínico da utente, acompanhada de cópia da documentação respetiva;
13. Informação sobre os protocolos e demais procedimentos internos então em
vigor especificamente no que se refere ao tratamento de pedidos de
autorização prévia apresentados ao abrigo da Lei n.º 177/92, de 13 de Agosto,
aplicável à data dos factos;
14. Informação sobre os protocolos e demais procedimentos internos atualmente
em vigor especificamente no que se refere ao tratamento de pedidos de
autorização prévia apresentados ao abrigo da da Lei n.º 52/2014, de 25 de
agosto;
15. Informação sobre os meios existentes, no HSM, de disponibilização de
informação aos utentes acerca da possibilidade de acederem à prestação de
cuidados de saúde no estrangeiro, quer à data da apresentação dos
requerimentos de documento portátil S2 pelos pais da utente, quer à data de
hoje, acompanhada de cópia de toda a documentação relevante.
[…]”.
19. Em resposta ao solicitado pela ERS, o prestador remeteu a informação prestada pela
Direção do Serviço de Cirurgia Plástica, pela Direção do Serviço de Neurocirurgia e
pela Direção do Serviço de Gestão Hospitalar.
20. Na informação da Direção do Serviço de Cirurgia Plástica, é referido que:
“[…]
Ponto 1: Não me recordo se informei proactivamente os pais sobre a possibilidade
de pedir uma segunda opinião médica, embora eles o tenham feito por iniciativa
própria, facto que considero ser seu total direito e ao qual nunca me oporia.
Ponto 4,5,6: Os adiamentos sucessivos das consultas da Especialidade de Cirurgia
Plástica deveram-se à marcada redução dos recursos humanos do SCPRME nos
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últimos anos, incluindo o carácter descontínuo da minha relação contratual com o
HSM na altura a que se referem os factos.
Ponto 7: Não tenho conhecimento do motivo pelo qual essa informação
[comunicação da Direção do Serviço de Cirurgia Plástica aos pais da utente, em 10-
04-2014, de que «a paciente deixou de vir à nossa consulta»] foi prestada nos
termos referidos.
Ponto 10: Não me recordo dos trâmites envolvidos na transferência do
acompanhamento da M. dos HUC para o HSM, mas presumo que tal se tenha
ficado a dever à preferência dos progenitores e à disponibilidade demonstrada pela
equipa do HSM.
[…]”.
21. Por sua vez, na informação da Direção do Serviço de Neurocirurgia, datada de 11 de
agosto de 2015, era referido o seguinte:
“[…]
1) Não recordo se informei especificamente os pais da utente M. sobre a
possibilidade de pedir uma segunda opinião médica fora de Portugal, do ponto de
vista neurocirúrgico. De qualquer modo:
i) Nos anos iniciais de seguimento no HSM, desde 2005 até 2013, a evolução
clínica, foi favorável; (…).
ii) (…).
(…)
(…) a questão de pedido de uma segunda opinião fora de Portugal nunca se
colocou de forma concreta no caso da utente M. porque os seus pais sempre
evidenciaram grande autonomia nesse sentido, solicitando por sua iniciativa
opiniões a centros fora de Portugal (…), de que depois informavam os médicos que
a seguiram em Portugal; (…).
3) Junto enviamos cópia de inscrição na Lista de inscritos para Cirurgia, realizada
em 27/03/2013, e também cópia do cancelamento dessa inscrição em 23/04/2013,
efectuada após a mãe da criança me ter informado que tinham optado pelo
tratamento em França.
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10) Não recordo o fundamento porque a utente M. passou a ser seguida no Hospital
de Santa Maria. A primeira observação em Consulta de Neurocirurgia Pediátrica foi
realizada em 7/6/2005 (…). Não recordo se já tinha sido observada antes por
Cirurgia Plástica (embora a primeira consulta de Cirurgia Plástico só tenha sido
realizada a 21/06/2005), se teve referenciação específica de algum médica para a
nossa consulta, ou se este seguimento partiu da iniciativa (pedido) dos pais.
[…]”.
22. Finalmente, na informação da Direção do Serviço de Gestão Hospitalar, datada de 10
de agosto de 2015, foram referidos os seguintes elementos:
“[…]
9) A Unidade de Gestão Clínica, e mais especificamente o seu Setor de Assistência
Médica no Estrangeiro, não foi envolvido no processo aqui referido de requerimento
de Documento Portátil S2.
(…)
12) O pedido de cópia do processo clínico de Neurocirurgia Pediátrica de M. foi
formalizado por requerimento datado de 25.9.2014. A cópia da documentação foi
remetida via CTT em 30.09.2014. O processo clínico de Oftalmologia foi solicitado
em 10.09.204 e remetido em 16.09.2014 (…).
(…)
14) O Setor de Assistência Médica no Estrangeiro do Centro Hospitalar Lisboa
Norte, que integra a Unidade de Gestão Clínica do Serviço de Gestão Hospitalar,
dá apoio a todos os Serviços do CHLN. Mais especificamente em relação à Lei nº
52/2014 de 25 de Agosto, há a referir a Portaria 191/2014 de 25 de Setembro, onde
são definidos os cuidados de saúde sujeitos a autorização prévia. Acrescente-se
ainda a informação disponibilizada em formação específica para o efeito por parte
da ACSS (Formação ACSS: Diretiva nº 2011/24/EU – Cuidados de Saúde
Transfronteiriços (…).
15) (…) a informação [transmitida aos utentes acerca da possibilidade de aceder à
prestação de cuidados de saúde no estrangeiro] é dada de modo personalizado e
pro funcionário especializado da Unidade de Gestão Clínica, mais especificamente
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do Setor de Assistência Médica no Estrangeiro, sendo o utente encaminhado pelos
diversos serviços clínicos.
Em relação ao Documento Portátil S2 remete-se Orientação da DGS n.º 003/2010.
[…]”.
III. DO DIREITO
III.1. Das atribuições e competências da ERS
23. De acordo com o n.º 1 do artigo 4.º e o n.º 1 do artigo 5.º, ambos dos Estatutos da ERS
aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, 22 de agosto, a ERS tem por missão a
regulação, supervisão, e a promoção e defesa da concorrência, respeitantes às
atividades económicas na área da saúde dos setores privados, público, cooperativo e
social, e, em concreto, da atividade dos estabelecimentos prestadores de cuidados de
saúde.
24. Sendo que estão sujeitos à regulação da ERS, nos termos do n.º 2 do artigo 4.º dos
mesmos Estatutos, todos os estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde, do
sector público, privado, cooperativo e social, independentemente da sua natureza
jurídica;
25. Consequentemente, o Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E. é uma entidade
prestadora de cuidados de saúde, registada no SRER da ERS sob o n.º 18707,
detentor do estabelecimento prestador de cuidados de saúde Hospital de Santa Maria,
registado sob o n.º 113141.
26. As atribuições da ERS, de acordo como disposto nas alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo
5.º dos Estatutos da ERS, compreendem a supervisão da atividade e funcionamento
dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde, no que respeita à garantia
dos direitos relativos ao acesso aos cuidados de saúde, à prestação de cuidados de
saúde de qualidade, bem como dos demais direitos dos utentes, e ainda, à legalidade e
transparência das relações económicas entre os diversos operadores, entidades
financiadoras e utentes.
27. Ademais, constituem objetivos da ERS, nos termos do disposto nas alíneas b), c) e e)
do artigo 10.º do mencionado diploma, assegurar o cumprimento dos critérios de
acesso aos cuidados de saúde, garantir os direitos e interesses legítimos dos utentes e
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zelar pela legalidade e transparência das relações económicas entre todos os agentes
do sistema.
28. Competindo-lhe, na execução dos preditos objetivos, e conforme resulta dos artigos
12.º e 15.º dos Estatutos, assegurar o direito de acesso universal e equitativo ao
serviço público de saúde, zelar pelo respeito da liberdade de escolha nos
estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde, incluindo o direito à informação, e
também analisar as relações económicas nos vários segmentos da economia da
saúde, tendo em vista o fomento da transparência, da eficiência e da equidade do
sector, bem como a defesa do interesse público e dos interesses dos utentes.
Para tanto, a ERS pode assegurar tais incumbências mediante o exercício dos seus
poderes de supervisão, zelando pela aplicação das leis e regulamentos e demais
normas aplicáveis às atividades sujeitas à sua regulação, no âmbito das suas
atribuições, e emitindo ordens e instruções, bem como recomendações ou
advertências individuais, sempre que tal seja necessário, sobre quaisquer matérias
relacionadas com os objetivos da sua atividade reguladora, incluindo a imposição de
medidas de conduta e a adoção das providências necessárias à reparação dos direitos
e interesses legítimos dos utentes – cfr. alíneas a) e b) do artigo 19.º dos Estatutos da
ERS.
III.2. Do enquadramento legal da prestação de cuidados
III.2.1. O direito à saúde como direito constitucionalmente reconhecido, a natureza e
a organização do SNS
29. O acesso aos cuidados de saúde implica a consequente obrigação de os prestadores
de cuidados de saúde assegurarem aos utentes os serviços que se dirijam à
prevenção, à promoção, ao restabelecimento ou à manutenção da sua saúde, bem
como ao diagnóstico, ao tratamento/terapêutica e à sua reabilitação, e que visem
atingir e garantir uma situação de ausência de doença e/ou um estado de bem-estar
físico e mental.
30. Nessa medida, o direito de acesso dos utentes aos cuidados de saúde impõe-se,
designadamente, a todos os estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde que
estejam integrados no SNS, os quais deverão garanti-lo em respeito pelos princípios da
generalidade, da universalidade e da gratuitidade tendencial constitucionalmente
considerados na concretização do direito à proteção da saúde.
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31. A característica da universalidade assenta na atribuição a “todos” do direito à proteção
da saúde e, por isso, deve ser assegurado a todos os cidadãos o direito de acesso aos
serviços de saúde integrados no SNS “[…] independentemente da sua condição
económica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação”.
32. Pelo que, em suma, esta característica pressupõe que todos os cidadãos1, sem
exceção, estejam cobertos pelas políticas de promoção e proteção da saúde e possam
aceder aos serviços prestadores de cuidados de saúde.
33. Intimamente ligada à universalidade do SNS está a característica da generalidade, que
se prende com a determinação do tipo de cuidados de saúde que devem ser
abrangidos pelo SNS, impondo-se que este garanta, com maior ou menor grau, uma
prestação integrada de cuidados globais de saúde aos seus beneficiários.
34. O princípio da generalidade aponta para o direito dos cidadãos a obter todo o tipo de
cuidados de saúde, pelo que o Estado, com o intuito de assegurar a realização do
direito à proteção da saúde, deverá “garantir uma racional e eficiente cobertura de todo
o país em recursos humanos e unidades de saúde” – cfr. alínea b) do n.º 3 do artigo
64º da CRP.
35. Ademais, a Lei de Bases da Saúde veio consagrar, na sua Base II, como uma das
diretrizes da política de saúde, que “é objetivo fundamental obter a igualdade dos
cidadãos no acesso aos cuidados de saúde, seja qual for a sua condição económica e
onde quer que vivam, bem como garantir a equidade na distribuição de recursos e na
utilização de serviços”;
36. Para tanto, e nos termos da al. d) da mesma Base, “os serviços de saúde estruturam-
se e funcionam de acordo com o interesse dos utentes e articulam-se entre si e ainda
com os serviços de segurança e bem-estar social”, sendo que, e de acordo com a al.
e), “a gestão de recursos disponíveis deve ser conduzida por forma a obter deles o
maior proveito socialmente útil e a evitar desperdício e a utilização indevida dos
serviços”.
37. Sendo reconhecido ao cidadão a “liberdade de escolha no acesso à rede nacional de
prestação de cuidados de saúde, com as limitações decorrentes dos recursos
existentes e da organização dos serviços.” – cfr. n.º 5 da Base V2;
1 É também com base neste princípio que é concedido a todos os cidadãos portugueses o direito de
recorrer ao SNS, sejam eles residentes em Portugal ou no estrangeiro, mas também aos “[...] cidadãos nacionais de Estados membros das Comunidades Europeias, nos termos das normas comunitárias aplicáveis”; aos “[...] cidadãos estrangeiros residentes em Portugal”; e aos “[...] cidadãos apátridas residentes em Portugal”- cfr. Base XXV da Lei de Bases da Saúde publicada
pela Lei n.º 48/90, de 24 de agosto.
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38. Bem como o direito de “ser tratado pelos meios adequados, humanamente e com
prontidão, correção, privacidade e respeito” – cfr. al. c) da Base XIV –, para o que deve
“observar as regras de organização e funcionamento dos serviços e estabelecimentos”
e utilizar “os serviços de acordo com as regras estabelecidas” – cfr. al. b) e d) do n.º 2
da Base XIV, todas da LBS.
39. Como resulta expressamente do art. 4.º, 1, da Lei n.º 15/2014, de 21 de março3,
referente à adequação da prestação dos cuidados de saúde, “O utente dos serviços de
saúde tem direito a receber, com prontidão ou num período tempo considerado
clinicamente aceitável, consoante os casos, os cuidados de saúde de que necessita”.
40. A este respeito encontra-se reconhecido na LBS, mais concretamente na sua alínea c)
da Base XIV, o direito dos utentes a serem “(…) tratados pelos meios adequados,
humanamente e com prontidão, correcção técnica, privacidade e respeito”.
41. Quanto ao direito do utente ser tratado com prontidão, o mesmo encontra-se
diretamente relacionado com o respeito pelo tempo do paciente4, segundo o qual deve
ser garantido o direito do utente a receber o tratamento necessário dentro de um rápido
e predeterminado período de tempo, em todas as fases do tratamento.
42. Aliás, o Comité Económico e Social Europeu (CESE), no seu Parecer sobre “Os
direitos do paciente”, refere que o “reconhecimento do tempo dedicado à consulta, à
escuta da pessoa e à explicação do diagnóstico e do tratamento, tanto no quadro da
medicina praticada fora como dentro dos hospitais, faz parte do respeito das pessoas
[sendo que esse] investimento em tempo permite reforçar a aliança terapêutica e
ganhar tempo para outros fins [até porque] prestar cuidados também é dedicar tempo”.
43. Ademais, prescreve ainda o mesmo diploma legal que o sistema de saúde assenta nos
cuidados de saúde primários que devem situar-se junto das comunidades – cfr. n.º 1 da
Base XIII –, “devendo ser promovida a intensa circulação entre os vários níveis de
cuidados de saúde, reservando a intervenção dos mais diferenciados para as situações
deles carecidas […]” – cfr. n.º 2 da Base XIII.
2 O utente tem direito de escolha dos serviços e prestadores de cuidados de saúde, na medida dos
recursos existentes, sendo certo que o direito à proteção da saúde deve ser exercido com
consideração pelas regras de organização dos serviços de saúde – cfr. artigo 2.º da Lei n.º 15/2014,
de 21 de março.
3 Lei consolidando a legislação em matéria de direitos e deveres do utente dos serviços de saúde.
4 Vd. o ponto 7. da “Carta Europeia dos Direitos dos Utentes”.
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44. Desta forma, veio o legislador assumir a existência de um sistema de saúde
estratificado no qual os serviços e unidades de saúde se devem estruturar, funcionar e
articular entre si em favor dos interesses dos utentes, os quais, em condições de
igualdade, devem aceder aos cuidados de saúde;
45. Sendo que, naturalmente, os cuidados primários devem localizar-se mais perto das
comunidades e os diferenciados abrangerem uma maior população que a eles recorre
por força de estados de saúde mais específicos.
46. Por sua vez, o Estatuto do SNS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de janeiro,
em desenvolvimento das bases gerais contidas no regime jurídico da saúde, define o
SNS como sendo “um conjunto organizado e hierarquizado de instituições e de
serviços oficiais prestadores de cuidados de saúde, funcionando sob a
superintendência ou tutela do Ministro da Saúde” – cfr. artigo 1.º do referido Estatuto.
47. Assim, nos termos do artigo 2.º do Estatuto do SNS, este “tem como objectivo a
efectivação, por parte do Estado, da responsabilidade que lhe cabe na protecção da
saúde individual e colectiva”, através de cada uma das instituições que o integra e que
desempenha um papel de elevada relevância na prossecução de tal imposição,
devendo garantir o direito de acesso universal e igual a todos os cidadãos aos
cuidados por si prestados;
48. Deve ter-se igualmente presente que o SNS, enquanto conjunto organizado e
hierarquizado de instituições e de serviços oficiais prestadores de cuidados de saúde,
se organiza em regiões de saúde – cfr. n.º 1 do artigo 3.º do Estatuto do SNS;
49. Como, aliás, igualmente se estatui na Base XXIV da Lei de Bases da Saúde, que
estabelece que o SNS se caracteriza por ter organização regionalizada e gestão
descentralizada e participada – cfr. alínea e) da referida Base;
50. O que surge, aliás, enquanto concretização do princípio, estabelecido no n.º 4 do artigo
64.º da CRP, de que o serviço nacional de saúde tem gestão descentralizada e
participada.
51. Ou seja, desde a conformação inicial e fundamental do SNS que claramente se
assumiu que a sua organização deveria, sem prejuízo da superintendência ou tutela do
Ministro da Saúde, assentar na estruturação que melhor serviria a identificação dos
cuidados de saúde necessários e a garantia do acesso aos utentes onde quer que
vivam.
52. Competindo, ademais, a cada uma das ARS um papel fundamental na estruturação e
organização da resposta do SNS nas áreas sob sua influência, sendo aliás
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responsáveis “[…] pela saúde das populações da respetiva área geográfica,
coordenam a prestação de cuidados de saúde de todos os níveis e adequam os
recursos disponíveis às necessidades, segundo a política superiormente definida e de
acordo com as normas e diretivas emitidas pelo Ministério da Saúde.” – cfr. n.º 1 da
Base XXVII da Lei de Bases da Saúde.
53. Visa-se, portanto, um SNS que “preste integradamente cuidados globais ou garanta a
sua prestação” (al. b) e d) da Base XXIV da referida Lei), e que possibilite ao utente o
acesso, conforme já anotado, com carácter “de equidade e de forma integrada, [a]
todos os cuidados globais, com o objetivo de minimizar os efeitos das desigualdades
económicas, geográficas e quaisquer outras no acesso aos cuidados”. – cfr. al. b) e d)
da Base XXIV.
54. E é assim que as ARS desempenham um papel fundamental na estruturação e
organização da resposta do SNS nas áreas sob sua influência e, in extremis, nas
Redes de Referenciação Hospitalar (de ora em diante, e indistintamente, RRH).
55. Efetivamente, a organização do sistema de saúde baseia-se na divisão do território
nacional em regiões de saúde que “são dotadas de meios de ação bastante para
satisfazer autonomamente as necessidade correntes de saúde dos seus habitantes,
podendo, quando necessário, ser estabelecidos acordos inter-regionais para a
utilização de determinados recursos” – cfr. n.º 1 e 2 da Base XVIII.
56. Consequentemente, o SNS detém uma organização de carácter regional, sendo
administrado por cada uma das ARS, competentes por cada uma das regiões
administrativamente organizadas, devendo assim analisar-se em que medida as RRH
atualmente existentes são enquadráveis com esta organização do SNS e, claro está,
que consequências daí resultam.
57. Note-se, ademais, que, a propósito da implementação e cumprimento das redes de
referenciação5, também aos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde
5 A ERS teve já a oportunidade de publicar um Parecer no seu portal da internet, em 14 de abril de
2010. Sem necessidade de considerar exaustivamente o predito Parecer e o seu conteúdo para o qual se remete na íntegra, importa aqui realçar as conclusões ali avançadas:
(i) a estrutura, os parâmetros de funcionamento e as imposições adjacentes a cada uma das RRH, tal como arquitetadas, consubstanciam regras que, necessariamente, se manifestam no direito de acesso do utente aos cuidados de saúde como consagrado na Constituição e na lei; e
(ii) tanto assim é, que o seu não funcionamento ou deficiente funcionamento impacta negativamente com o direito de acesso do utente aos cuidados de saúde, na medida em que resultam num efetivo não acesso (ou num acesso tardio ou inadequado) aos cuidados de saúde necessários;
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compete proporcionar os cuidados de saúde necessários, mediante uma gestão que
deve obedecer, designadamente a um princípio de comparticipação orçamental do
Estado estabelecida em planos financeiros que devem ser anuais ou plurianuais e
baseados em programas propostos pelas ARS - cfr. alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo
16.º do Estatuto do SNS;
58. E ainda, a uma gestão por força da qual os membros dos órgãos de administração são
responsáveis pelo cumprimento da lei e pela realização dos objetivos e metas
constantes dos planos e programas aprovados - cfr. alínea c) do referido n.º 1 do artigo
16.º do Estatuto do SNS.
59. Ou seja, compete a esta organização hierarquizada, com identificação concreta de
responsabilidades, garantir que os cuidados de saúde necessários são prestados nas
melhores condições, seja de acesso, de qualidade ou de segurança.
60. A atual organização do SNS assenta, pois, numa identificação clara e inequívoca da
cadeia (vertical) de atribuições, competências e responsabilidades, para que o SNS
seja, não somente de iure mas também de facto, um conjunto de instituições e de
serviços oficiais prestadores de cuidados de saúde organizado e hierarquizado.
61. Ou seja, do atual quadro legal aplicável e conformador do SNS resulta que (também)
cada instituição conhece, sem dúvida ou incerteza, o que concretamente a si compete
– e por tanto de si é esperado – para contribuir para a garantia constitucional da
prestação de cuidados de saúde nas melhores condições de acesso, qualidade e
segurança.
(iii) compete ao SNS, aliás como imposto pela Lei de Bases da Saúde, garantir de forma integrada, com vista a atenuar, mormente, os efeitos das desigualdades económicas e geográficas no acesso aos referidos cuidados;
(iv) podendo de tanto resultar uma rejeição de acesso aos cuidados de saúde pelo SNS quer seja por não possuir os recursos suficientes à prestação de cuidados necessários;
(v) seja por, possuindo-os, não se encontrar devidamente articulado de forma a permitir a referenciação do utente.
Nessa medida, foi possível concluir que as regras de referenciação constituem regras de acesso, devendo, por isso, ser garantidas pela ERS, porquanto concorrem para o respeito e cumprimento dos critérios de acesso aos cuidados de saúde, nos termos da Constituição e da lei e para a garantia dos direitos e interesses legítimos dos utentes.
Não obstante as conclusões atingidas, foi ali proposto, em prol da defesa da transparência, da eficiência e da equidade do sector, bem como a defesa do interesse público e dos interesses dos utentes, e da organização e do desempenho dos serviços de saúde do SNS, a adoção de regras claras, precisas e objetivas quanto à referenciação hospitalar. E, nesse seguimento, foi recomendado a todas as ARS, no sentido de definirem, publicitarem e ordenarem para cumprimento por parte dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde envolvidos, as RRH que se apresentem como necessárias nas suas áreas de influência.
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62. Ora, atento todo o supra referido, importará, no decurso da análise dos presentes
autos, perceber se o SNS logrou, ou não, garantir, o direito à saúde da utente, aqui
consideradas a legislação vigente em matéria de prestação de cuidados de saúde no
estrangeiro/transfronteiriços.
III.2.2. A assistência médica prestada em estabelecimento de saúde sito no
estrangeiro ao utente do SNS
63. A LBS é praticamente omissa na previsão e enquadramento da possibilidade de
recurso a serviços de saúde no estrangeiro, limitando-se o n.º 2 da Base XXXV a
estabelecer que “Só em circunstâncias excepcionais em que seja impossível garantir
em Portugal o tratamento nas condições exigíveis de segurança e em que seja
possível fazê-lo no estrangeiro, o Serviço Nacional de Saúde suporta as respectivas
despesas”.
64. Não obstante, certo é que tal disposição possui o efeito essencial de abrir a
possibilidade de assunção de responsabilidade financeira pelo SNS quanto à prestação
de cuidados de saúde que sejam prestados no estrangeiro; e
65. Assim, concede um direito (condicionado) aos utentes de beneficiarem da cobertura
financeira do SNS quando seja impossível garantir, em Portugal, o tratamento, nas
condições exigíveis de segurança e em tempo útil.
66. Em concretização de tal prerrogativa, veio o Decreto-Lei n.º 177/92, de 13 de agosto,
assumir que, atento “[…] o esforço financeiro [tendente] à modernização das unidades
hospitalares e a atualização médica e científica dos profissionais da saúde”, a
assistência médica ocorrida no estrangeiro deve revestir uma natureza absolutamente
excecional.
67. Tendo o referido diploma entrado em vigor, de modo pleno, no dia 1 de janeiro de
1993.
68. O Decreto-Lei n.º 177/92 impunha uma responsabilidade acrescida do Médico
Assistente, que devia acompanhar o utente e elaborar um relatório devidamente
fundamentado, bem como do Director Clínico do prestador hospitalar onde o utente era
assistido.
69. E era ainda reconhecida pelo legislador a necessária articulação entre o processo
decisório do profissional médico e o processo administrativo, de forma a que uma
qualquer autorização só poderia ser concedida mediante a emissão prévia de um
relatório médico com as informações constantes do artigo 3.º do mesmo diploma legal.
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70. Mais determinava o diploma em análise que era da responsabilidade da então Direção-
Geral dos Hospitais (hoje, Direção-Geral da Saúde) a coordenação de todos os
processos de deslocação dos utentes a prestador estrangeiro;
71. Competindo igualmente à Direção-Geral da Saúde o poder de decisão quanto aos
pedidos de assistência médica que lhe fossem submetidos pelos interessados.
72. Assim, e concretizando, conforme resulta do seu artigo 1.º, o Decreto-Lei n.º 177/92
vinha regulamentar “[…] A assistência médica de grande especialização no estrangeiro
que, por falta de meios técnicos ou humanos, não possa ser prestada no País […]”;
73. Estando abrangidos por tal regime “[…] os beneficiários do Serviço Nacional de
Saúde”, com exclusão de todas as propostas de “[…] deslocação ao estrangeiro que
provenham de instituições privadas.” – cfr. n.º 2 e 3 do artigo 1.º do predito diploma.
74. Ademais, o artigo 5.º elencava as situações de natureza urgente, de entre as quais
figurava a possibilidade de o utente, que previamente recorreu a prestador no
estrangeiro, apresentar depois ao então Diretor-Geral dos Hospitais (hoje, ao Diretor-
Geral de Saúde) o respetivo processo clínico, desde que instruído com o relatório
médico nos termos já referidos supra e com fundamentação da escolha pelo prestador
a que recorreu.
75. Neste conspecto, era, então, da competência do então Diretor-Geral dos Hospitais
(atual Diretor-Geral da Saúde) a decisão dos processos de assistência médica no
estrangeiro que lhe sejam submetidos pelos interessados (atentas as condições
essenciais à atribuição dos benefícios tal como supra enunciadas) – cfr. n.º 1 do artigo
4.º do Decreto-Lei n.º 177/92;
76. Fixando ainda o diploma que deveria dar-se conhecimento aos interessados, pela
forma mais expedita e nos termos do Código do Procedimento Administrativo (CPA),
da decisão e das diligências efetuadas – cfr. n.º 3 do artigo 4.º, do Decreto-Lei n.º
177/92;
77. Mais especificando que toda a decisão deveria ser proferida e comunicada aos
interessados no prazo de 15 dias úteis contados da data do registo de entrada do
pedido de assistência junto da então Direcção-Geral dos Hospitais (hoje, Direcção-
Geral da Saúde) – cfr. n.º 4 do artigo 4.º, do Decreto-Lei n.º 177/92;
78. Por outro lado, que da decisão desfavorável cabia recurso para o Ministro da Saúde,
que decidirá no prazo de 30 dias – cfr. n.º 5 do artigo 4.º, do Decreto-Lei n.º 177/92;
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79. Assim, competia à atual Direcção-Geral da Saúde a análise e decisão sobre o pedido
de apoio financeiro para assistência médica no estrangeiro, aqui considerado o pedido
pré e pós recurso a prestador estrangeiro, ou seja,
80. O pedido de apoio para adiantamento e para reembolso das despesas, a suportar ou já
suportadas, por força da assistência médica de que beneficiarão ou beneficiaram os
utentes, respetivamente, no estrangeiro.
81. A acrescer ao diploma publicado no ano de 1992 devem ser aqui igualmente
consideradas as orientações concretizadas em Circulares emitidas pela Direcção-Geral
da Saúde a respeito da assistência médica a obter fora de território nacional; e que,
82. Nessa medida, foram servindo, de forma mais clara e atualizada, para informar dos
procedimentos que, administrativamente, deveriam ser seguidos pelas instituições
hospitalares de origem, com vista à apresentação e fundamentação de um pedido de
tal natureza.
83. Com efeito, foram publicadas, a este respeito, a Circular Normativa 08DSPCS, de 25
de junho de 2002, a Circular informativa 16/DQS/DMD, de 22 de abril de 2010, e a
Orientação 003/2010, de 29 de setembro de 2010.
84. Mediante tais documentos, uniformizaram-se os critérios determinados no Decreto-Lei
n.º 177/92, no que concretamente respeita às informações essenciais à análise dos
processos que visam a autorização do Diretor-Geral de Saúde para assistência médica
e que devem constar do “Requerimento de Documento Portátil S2”.
85. Foi nesta sequência que surgiu o regime aprovado pela Diretiva n.º 2011/24/UE, do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2011, e, depois, a Diretiva de
Execução n.º 2012/52/UE da Comissão, de 20 de dezembro.
86. Aquela primeira, dirigida precisamente ao exercício dos direitos dos doentes em
matéria de cuidados de saúde transfronteiriços, veio estabelecer regras para facilitar o
acesso a cuidados de saúde transfronteiriços seguros e de elevada qualidade na
União, para assegurar a mobilidade dos doentes de acordo com os princípios
estabelecidos pelo TJUE e para promover a cooperação em matéria de cuidados de
saúde entre os E-M, sempre no pleno respeito das competências nacionais em matéria
de organização e prestação de cuidados de saúde – cfr. n.º 1 do artigo 1.º da Diretiva
n.º 2011/24/UE.
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87. Mas certo é que também ali se previa, sob algumas condicionantes, a possibilidade de
os E-M determinarem um procedimento de autorização prévia6.
88. Com efeito, conforme ali se referia, aquela autorização não poderia ser recusada se,
por um lado, o doente tiver direito aos cuidados de saúde em questão no E-M e se
6 A propósito da exigência de uma condição prévia concretizada na autorização da Direcção-Geral
da Saúde, diga-se que foi esta condição objeto de discussão junto do Tribunal de Justiça da União
Europeia no âmbito de ação intentada pela Comissão Europeia contra a República Portuguesa, por
alegado incumprimento derivado de uma restrição injustificada à livre prestação de serviços. Com
efeito, foi ali discutido em que medida ou em que situações pode um cidadão da UE deslocar-se
programadamente a um outro EM para aí receber cuidados de saúde ao abrigo da cobertura
financeira (pública ou equivalente) de que seja beneficiário no seu EM de origem.
O direito comunitário prevê, em situações de prestação programada de cuidados de saúde em
outros EM, o condicionamento da assunção da responsabilidade financeira pela entidade
financiadora (pública ou equivalente) de que o utente seja beneficiário no seu EM de origem à
obtenção de uma autorização prévia de autorização por parte da “instituição competente”. Mas
igualmente limita as situações em que uma tal autorização pode ser recusada, sendo claro que
tanto não poderá ocorrer quando “o tratamento em questão figure entre as prestações previstas pela
legislação do Estado-Membro onde o interessado reside e onde esse tratamento não possa ser
prestado dentro de um prazo clinicamente seguro, tendo em conta o seu estado de saúde atual e a
evolução provável da doença”.
Já quanto à possibilidade de na legislação nacional do EM de origem, como visto, no ordenamento
português o regime está determinado pelo Decreto-Lei n.º 177/92, de 13 de agosto, no âmbito do
SNS e no âmbito da ADSE, esta última enquanto representativa do maior subsistema público.
Refira-se porém, que este mesmo diploma foi já objeto de análise no âmbito do TJUE, em sede de
apreciação de ação por incumprimento intentada pela Comissão Europeia contra a República
Portuguesa, por alegado incumprimento derivado de uma restrição injustificada à livre prestação de
serviços, pois que ali não se encontra prevista, a possibilidade do reembolso de despesas médicas
não hospitalares efetuadas noutro Estado-Membro, a não ser nas circunstâncias previstas no
Regulamento (CEE) n.° 1408/71, ou por subordinar a possibilidade de reembolso de despesas
médicas não hospitalares à concessão de uma autorização prévia – cfr. as conclusões da
Advogada-Geral do TJUE, de 14 de abril de 2011, no processo C-255/09, Comissão Europeia c.
República Portuguesa.
Este diploma (Decreto-Lei n.º 177/1992) esteve até outubro de 2011 sob análise do TJUE.
Atualmente, e conforme melhor resulta do teor do respetivo Acórdão, foi considerado pelo TJUE
que, “[a]o não prever, excepto nas circunstâncias previstas pelo Regulamento (CEE) n.º 1408/71 do
Conselho, de 14 de Junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos
trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que
se deslocam no interior da Comunidade […] a possibilidade de reembolso das despesas com
cuidados médicos não hospitalares, efectuadas noutro Estado-Membro, que não implicam o recurso
a equipamentos materiais pesados e dispendiosos, taxativamente enumerados na legislação
nacional, ou, nos casos em que o Decreto-Lei n.º 177/92, de 13 de Agosto de 1992, que fixa os
requisitos do reembolso das despesas médicas efectuadas no estrangeiro, reconhece a
possibilidade de reembolso das despesas com os referidos cuidados, ao subordinar o seu
reembolso à concessão de uma autorização prévia, a República Portuguesa não cumpriu as
obrigações que lhe incumbem por força do artigo 49.º CE.”– cfr. Acórdão do TJUE C-255-09
(Comissão vs Portugal), de 27 de outubro de 2011, disponível em em http://eur-lex.europa.eu.
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esses mesmos cuidados de saúde não puderem ser prestados no seu território num
prazo útil fundamentado do ponto de vista médico (com base numa avaliação objetiva
da sua situação clínica, da história e evolução provável da sua doença, do grau de dor
por ele suportado e/ou da natureza da sua incapacidade no momento em que for
apresentado ou renovado o pedido de autorização).
89. Pelo que, para o exercício do direito ali previsto, importaria sempre que o sistema de
saúde do E-M, no caso o SNS, não pudesse responder à necessidade clínica da
concreta utente.
90. Certo é que foi precisamente este o entendimento mais tarde transposto pela Lei n.º
52/2014, de 25 de agosto, para o nosso ordenamento jurídico, quando fez depender o
pedido de autorização prévia de um requerimento a “[…] apresentar através do portal
do utente, junto da unidade hospitalar da área de residência do beneficiário […],
assumindo sempre, além disso, o requerente como beneficiário, ou seja, utente do
SNS ou do SRS (cfr. artigo 12.º e 13.º em conjugação com o artigo 3.º).
91. Com efeito, a Lei n.º 52/2014 estabelece um sistema duplo relativamente ao direito ao
reembolso das despesas diretamente relacionadas com os cuidados de saúde
transfronteiriços prestados noutro Estado membro.
92. De um lado, prevê despesas sujeitas à autorização prévia acima referida (artigo 11.º da
Lei n.º 52/2014) e, do outro, despesas não sujeitas a autorização prévia mas apenas a
avaliação prévia (n.º 4 do artigo 8.º da Lei n.º 52/2014).
93. Quanto às despesas sujeitas a autorização prévia, estão em causa cuidados de saúde
transfronteiriços cirúrgicos que exijam o internamento durante pelo menos uma noite,
assim como o reembolso dos cuidados de saúde transfronteiriços que exijam recursos
a infraestruturas ou equipamentos médicos altamente onerosos e de elevada
especialização (n.º 1 do artigo 11.º da Lei n.º 52/2014).
94. E, ainda, os cuidados de saúde transfronteiriços que envolvam tratamentos que
apresentem um risco especial para o doente ou para a população ou o reembolso dos
cuidados de saúde transfronteiriços que sejam prestados por um prestador de cuidados
de saúde que, por decisão casuística da entidade competente para apreciação do
pedido de autorização prévia, possa suscitar preocupações sérias e específicas quanto
à qualidade ou à segurança dos cuidados (n.º 2 do artigo 11.º da Lei n.º 52/2014).
95. O pedido depende de requerimento a apresentar através do portal do utente, junto da
unidade hospitalar da área de residência do beneficiário ou da unidade competente de
cada região autónoma (n.º 1 do artigo 13.º da Lei n.º 52/2014), dele devendo constar,
entre outros elementos, o Estado membro de tratamento e a respetiva unidade
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prestadora, assim como informação clínica com a indicação da necessidade de
realização da prestação dos cuidados de saúde (n.º 2 do artigo 13.º da Lei n.º
52/2014).
96. A informação clínica constante do requerimento do pedido de autorização prévia fica
sujeita a uma avaliação clínica hospitalar da necessidade de diagnóstico ou de
tratamento e de adequação cirúrgica, a realizar no prazo de 20 dias úteis a contar da
data da formulação do pedido de autorização prévia, tendo em consideração situações
comprovadas de maior urgência clínica (n.º 1 do artigo 13.º da Lei n.º 52/2014).
97. Desta informação clínica avaliação clínica referida no número anterior devendo constar
a proposta de deferimento ou indeferimento do pedido de autorização prévia (n.º 2 do
artigo 13.º da Lei n.º 52/2014).
98. Posto isto, o requerimento do pedido e o respetivo relatório da avaliação clínica são
remetidos pela unidade hospitalar que emitiu o relatório à ACSS, I. P., ou aos serviços
competentes das regiões autónomas, para apreciação (n.º 1 do artigo 14.º da Lei n.º
52/2014), que emitem resposta ao pedido de autorização prévia no prazo de 15 dias
úteis a contar da receção do relatório da avaliação clínica (n.º 2 do artigo 14.º da Lei n.º
52/2014).
99. Há lugar a indeferimento do pedido de autorização prévia nos casos previstos no n.º 3
do artigo 14.º7, e, em caso de dúvida, a ACSS, I. P., ou os serviços competentes das
regiões autónomas podem solicitar o parecer da DGS, que deve ser emitido no prazo
de cinco dias úteis (n.º 4 do artigo 14.º da Lei n.º 52/2014).
100. Sendo que a Portaria n.º 191/2014, de 25 de Setembro, veio definir, justamente, e
conforme previsto no n.º 3 do seu artigo 11.º, os cuidados de saúde sujeitos a
autorização prévia nos termos do n.º 1 do artigo 11.º da Lei n.º 52/20148.
7 Que são os seguintes: se a avaliação clínica indicar, com grau de certeza razoável, que o doente é
exposto a um risco de segurança que não possa ser considerado aceitável, tendo em conta o
benefício potencial para o doente dos cuidados de saúde transfronteiriços pretendidos; b) Se existir
um grau de certeza razoável para se concluir que a população é exposta a um risco de segurança
considerável em resultado dos cuidados de saúde transfronteiriços pretendidos; c) Se os cuidados
de saúde em causa forem ministrados por um prestador de cuidados de saúde que suscite
preocupações sérias e específicas quanto ao respeito pelas normas e orientações em matéria de
qualidade dos cuidados de saúde e de segurança dos doentes; d) Se os cuidados de saúde em
causa puderem ser prestados em Portugal num prazo útil fundamentado do ponto de vista clínico,
tendo em conta o estado de saúde e a evolução provável da doença do doente.
8 Que são os seguintes: a) Diagnóstico e tratamento de patologias para as quais existam centros de
referência reconhecidos oficialmente pelo Ministério da Saúde; b) Internamento hospitalar, por
cirurgia; c) Internamento hospitalar que resulte em GDH com peso relativo igual ou superior a 2.0 de
acordo com a tabela de preços do Serviço Nacional de Saúde; d) Internamento em Unidades de
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101. À data dos factos (anos de 2013 e 2014), e ainda que o regime da Lei n.º 52/2014
não estivesse em vigor (pois tal só veio a acontecer em 1 de setembro de 2014),
102. Certo é que, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 177/92, a liberdade dos doentes em
recorrer aos cuidados transfronteiriços era assumida como uma garantia nas situações
em que houvesse efetiva incapacidade de resposta do sistema nacional do E-M9.
III.2.3. Do direito à informação do utente
103. A relação que se estabelece entre prestadores de cuidados de saúde e os seus
utentes deve pautar-se pela verdade, completude e transparência em todos os aspetos
da mesma.
104. Sendo que tais caraterísticas devem revelar-se em todos os momentos da relação,
incluindo nos momentos que antecedem a própria prestação de cuidados de saúde.
105. Nesse sentido, o direito à informação – e o concomitante dever de informar – surge
aqui com especial relevância e é dotado de uma importância estrutural e estruturante
da própria relação.
106. Na verdade, o direito do utente à informação não se limita ao que prevê a alínea e)
do n.º 1 da Base XIV da Lei n.º 48/90, de 24 de agosto, normativo atualmente reforçado
pelo disposto no artigo 7º da Lei n.º 15/2014, de 21 de março, para efeitos de
cuidados intensivos ; e) Tratamento em Unidades especializadas de queimados; f) Internamento em
serviços, departamentos ou Hospitais de Psiquiatria e Saúde Mental, em psiquiatria forense; g)
Cirurgia de ambulatório que requeira a colocação de dispositivo médico previsto na codificação
publicada pelo Infarmed, I. P., excetuando -se as situações de suturas cirúrgicas; h) Cirurgia de
ambulatório que resulte em GDH com peso relativo igual ou superior a 2.0 de acordo com a tabela
de preços do Serviço Nacional de Saúde; i) Procedimentos no âmbito da Cirurgia plástica e
reconstrutiva; j) Tratamentos farmacológicos ou com agentes ou produtos biológicos cujo encargo
mensal seja superior a 1.500 euros; k) Tratamento oncológico; l) Tratamentos com
imunossupressores; m) Radiocirurgia; n) Transplantação e terapia celular; o) Diálise renal; p)
Litotrícia renal; q) Tratamento de incapacidade que necessite para a sua correção de cadeira de
rodas motorizada, próteses de membro superior ou inferior com exceção de prótese parcial de mão
ou pé, aparelho auditivo ou bitutores; r) Análises genéticas, incluindo farmacogenética e
farmacogenómica; s) Procriação Medicamente Assistida; t) PET|Tomografia por Emissão de
Positrões, Câmara gama, Tomografia Computorizada, Câmara gama — TC| Câmara gama com
Tomografia Computorizada, PET — TC|Tomografia por Emissão de Positrões com Tomografia
Computorizada, PET — RM|Tomografia por Emissão de Positrões com Ressonância Magnética,
SPECT|Tomografia Computadorizada por Emissão de Fotões Simples; u) Ressonância magnética;
v) Câmara hiperbárica.
9 Remete-se novamente para a Diretiva n.º 2011/24/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de
9 de março de 2011.
26 Mod.016_01
consentimento informado e esclarecimento quanto a alternativas de tratamento e
evolução do estado clínico.
107. Trata-se, antes, de um princípio que deve modelar todo o quadro de relações atuais
e potenciais entre utentes e prestadores de cuidados de saúde.
108. A informação não pode, por isso, deixar de ser completa, verdadeira e inteligível.
109. Só assim se logrando obter a referida transparência na relação entre prestadores de
cuidados de saúde e utentes.
110. Por outro lado, a prestação de informação errónea ao utente, a falta de informação
ou a omissão de um dever de informar são suficientes para distorcer o exercício da
própria liberdade de escolha dos utentes.
111. Para além de poderem conduzir – ou mesmo criarem - situações de lesões de
direitos e interesses financeiros dos utentes.
III.2.4. Das regras do SIGIC
112. Conforme descrito na Portaria n.º 45/2008, de 15 de janeiro10, que aprovou o
Regulamento do Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC), é
este último um sistema de regulação da atividade relativa “[…] a utentes propostos
para cirurgia e a utentes operados, assente em princípios de equidade no acesso ao
tratamento cirúrgico, transparência dos processos de gestão e responsabilização dos
utentes e dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e dos estabelecimentos
de saúde que contratam e convencionam com aquele a prestação de cuidados de
saúde aos seus beneficiários.”; e
113. São elegíveis para efeitos de inscrição na lista de inscritos para cirurgia (LIC) “[…]
todos os utentes dos hospitais do SNS e os utentes beneficiários deste Serviço
referenciados para os estabelecimentos de saúde do sector privado e do sector social,
ao abrigo dos contratos e convenções celebrados.”.
114. Sendo que toda a programação cirúrgica é registada no SIGLIC e deve obedecer
aos critérios:
(i) da prioridade clínica estabelecida pelo médico especialista, em função da
doença e problemas associados, patologia de base, gravidade, impacto na
esperança de vida, na autonomia e na qualidade de vida do utente, velocidade de
progressão da doença e tempo de exposição à doença; bem como
10
Recentemente alterada por via da publicação da Portaria n.º 179/2014, de 11 de setembro.
27 Mod.016_01
(ii) da antiguidade na LIC, sendo, em caso de igual prioridade clínica, selecionado
em primeiro lugar o utente que se encontra inscrito na lista há mais tempo – cfr. §
73. do Regulamento.
115. Cumprindo a este propósito ressaltar que, cronologicamente, a inscrição dos utentes
em LIC é precedida da consulta da especialidade e da consequente elaboração de um
plano de cuidados, ou seja da elaboração de uma proposta de abordagem de um ou
mais problemas de saúde do utente, onde se inscrevem e caracterizam os eventos
necessários à sua resolução, ordenados de forma cronológica, não havendo limitação
ao registo na proposta quanto ao número de diagnósticos descritos ou procedimentos a
realizar, cfr. § 3.2.1.1. e 3.2.1.2.1 do Manual de Gestão de Inscritos para Cirurgia
(MGIC).
116. Igualmente prévia à inscrição do utente em LIC, uma vez concluído o preenchimento
da proposta de cirurgia, é a recolha do consentimento informado do utente, garantindo
que o mesmo atesta a concordância com a proposta e respetiva inscrição em LIC.
117. Ademais, aos utentes é reconhecido, nomeadamente, o direito de obter um
certificado comprovativo da sua inscrição e de obter informação a todo o tempo junto
da Unidade Hospitalar de Gestão de Inscritos para Cirurgia (UHGIC) do seu hospital e
a seu pedido, sobre os dados que lhe respeitem registados na LIC, como seja o nível
de prioridade que lhe foi atribuído e o seu posicionamento relativo na prioridade
atribuída – cfr. § 44. do Regulamento.
118. Assim, a UHGIC é o principal elo de ligação do utente com o hospital, e todos os
contactos com aquele e outros factos são registados no SI, competindo-lhe a
informação aos utentes ou seus representantes, sobre o estado da inscrição, o teor dos
deveres e direitos e qualquer outra sobre as diferentes fases do processo. – cfr. §
3.3.3. e § 3.3.5. do MGIC que remetem para o Volume II – Área da gestão.
119. Refira-se, ainda, que as UHGIC ficam integradas nos hospitais, competindo-lhes:
a) Zelar pelo cumprimento das normas aplicáveis à LIC e respetivo
Regulamento;
g) Prever e identificar os casos dos utentes que deverão ser transferidos para
outra unidade prestadora de cuidados de saúde […] – cfr. § 54.º e 56.º do
Regulamento.
120. As URGIC ficam integradas nas Administrações Regionais de Saúde, competindo-
lhes:
28 Mod.016_01
a) Monitorizar, avaliar e controlar a evolução de inscritos para cirurgia nas
unidades hospitalares, designadamente os tempos de espera;
j) Autorizar a emissão de vales cirurgia para a realização de procedimentos
cirúrgicos propostos pelo HD, quando sejam complementares de
procedimentos cirúrgicos realizados anteriormente, apos auscultação do
HO;
m) Decidir nas situações em que se verifiquem conflitos entre HO e HD;
n) Verificar se a facturação emitida pelas entidades convencionadas
corresponde à actividade realizada no âmbito dos vales cirurgia […] – cfr. §
50.º e § 52.º do Regulamento.
121. Ainda, a UCGIC fica integrada na ACSS, competindo-lhe:
j) Selecionar os utentes a transferir e garantir o cumprimento e monitorização
dos protocolos de transferência definidos por parte dos restantes
intervenientes;
l) Emitir e enviar vales cirurgia;
m) Autorizar o […] HD a elaborar propostas cirúrgicas e a realizar os
procedimentos que lhes correspondam – cfr. § 47.º e 49.º do Regulamento.
III.2.5. Do acesso à informação contida no processo clínico
122. Relativamente ao acesso à informação contida no processo clínico, e do que resulta
do direito à proteção da saúde tal como consagrado na Constituição da República
Portuguesa, os cidadãos, enquanto utentes do SNS, têm o direito de acesso à
informação ou dados de saúde registados no seu processo clínico.
123. Ademais, tal direito aparece consagrado no ordenamento jurídico nacional em
diplomas legais, como sejam a Lei de Bases de Saúde (Lei n.º 48/90, de 24 de agosto),
a Lei de Proteção de Dados Pessoais (Lei n.º 67/98, de 26 de outubro – LPDP), e a Lei
sobre a Informação Genética Pessoal e Informação de Saúde (Lei n.º 12/2005, de 26
de janeiro) e a Lei de Acesso aos Documentos Administrativos (Lei n.º 46/2007, de 24
de agosto - LADA);
124. Neste quadro legal, incumbe aos estabelecimentos prestadores de cuidados de
saúde o dever de criar, manter, atualizar e conservar em arquivo ficheiros adequados
relativos aos processos clínicos dos seus doentes.
29 Mod.016_01
125. Refira-se, ademais, que, embora o processo clínico seja propriedade do doente, são
os estabelecimentos de saúde os depositários da informação e, portanto, aqueles que
têm os processo clínicos dos utentes à sua guarda –cfr. n.º 1 do artigo 3.º da Lei n.º
12/2005.
126. Assim, de acordo com a definição da Lei n.º 12/2005, de 26 de janeiro, o processo
clínico é propriedade exclusiva do próprio utente, uma vez que contém informação
sobre o próprio, a qual, ademais, se integra no conceito de intimidade da vida privada.
127. Cabendo, então, ao profissional médico que tenha assistido o utente, ou a outro
profissional de saúde sob a supervisão daquele, o dever de proceder à referida
documentação ou registo da informação médica (e que pode incluir dados sobre
consultas, tratamentos, exames ou diagnósticos a que os utentes foram sujeitos).
128. Importa, assim, determinar o que se deve entender por dados de saúde, informação
de saúde e processo clínico.
129. O conceito de dados de saúde deve-se integrar naquele conceito mais amplo
relativo aos dados pessoais que são definidos pela Lei n.º 67/98 (LPDP) como “[…]
qualquer informação, de qualquer natureza e independentemente do respectivo
suporte, incluindo som e imagem, relativa a uma pessoa singular identificada ou
identificável («titular dos dados»)”, sendo pessoa identificável aquela “[…] que possa
ser identificada directa ou indirectamente, designadamente por referência a um número
de identificação ou a um ou mais elementos específicos da sua identidade física,
fisiológica, psíquica, económica, cultural ou social” (artigo 3º al. a) da LPDP).
130. De acordo com esta definição, podem ser considerados dados pessoais, entre
muitos outros, o nome, a morada, o número da segurança social, o número de
contribuinte, o número do bilhete de identidade, a sua história clínica, entre outros.
131. Por seu lado, a Lei n.º 12/2005, de 26 de janeiro, optou por utilizar o conceito de
informação de saúde “[…] como todo o tipo de informação directa e indirectamente
ligada à saúde, presente ou futura, de uma pessoa, quer se encontre com vida ou
tenha falecido, e a sua história clínica e familiar.” (artigo 2.º).
132. De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 3.º do referido diploma legal, a
informação de saúde inclui “[…] os dados clínicos registados, resultados de análises, e
outros exames subsidiários, intervenções e diagnósticos.”.
133. Já o artigo 5.º da Lei n.º 12/2005, de 26 de janeiro, para além de referir que a
informação médica “[…] é a informação de saúde destinada a ser utilizada em
prestações de cuidados ou tratamentos de saúde”, estabelece o conceito de processo
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clínico como “qualquer registo, informatizado ou não, que contenha informação de
saúde sobre doentes ou seus familiares” e que deve conter toda a informação médica
disponível que diga respeito à pessoa .
134. Assim, o processo clínico relativo a um determinado utente/doente deve conter
informação suficiente sobre a sua identificação, bem como sobre todos os factos
relacionados com a sua saúde, incluindo a sua situação atual, evolução futura e
história clínica e familiar, e ainda com os factos relacionados com os cuidados de
saúde que lhe tenham sido prestados e que lhe venham a ser prestados no
estabelecimento de saúde em que o processo clínico se encontra depositado;
135. E que permita, em caso de transferência do utente, seja por sua vontade ou em
resultado das regras internas da organização do SNS, para uma outra unidade
hospitalar, a continuidade de prestação dos cuidados de saúde, em respeito dos
princípios supra referidos;
136. Ou seja, a prestação dos cuidados de saúde adequados à sua situação, em tempo
útil, onde quer que os utentes vivam e ainda atendendo à sua condição económica.
137. E note-se que, entre os elementos que integram o processo clínico, encontram-se a
memória de anamnese (entrevista prévia ao paciente), o registo da admissão (e o
estado de saúde do doente nesse momento), o diagnóstico e os tratamentos utilizados
(incluindo os resultados dos exames e das análises), os fármacos, produtos e outros
materiais utilizados (e respetiva dosagem, lote, marca e outros elementos relevantes),
a evolução do seu estado de saúde, informação prestada ao doente sobre o seu
estado de saúde, eventuais correspondências entre profissionais (ou mesmo a
mudança de profissionais que se encontrem a cuidar dos doentes), a transferência dos
utentes de serviços, o prognóstico, o registo de alta dos doentes, e ainda os custos e a
faturação subjacente a todos os actos incluídos na prestação de cuidados de saúde.
138. Sendo que o utente, enquanto titular da informação, “[…] tem o direito de, querendo,
tomar conhecimento de todo o processo clínico que lhe diga respeito, salvo
circunstâncias excepcionais devidamente justificadas e em que seja inequivocamente
demonstrado que isso lhe possa ser prejudicial, ou de o fazer comunicar a quem seja
por sindicado.” (n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 12/2005, de 26 de janeiro).
139. Ainda que, de acordo com o n.º 3 do artigo 3.º da referida Lei, se considere a
necessidade de o “[…] acesso à informação de saúde por parte do titular, ou de
terceiros com o seu consentimento, [ser] feito através de médico, com habilitação
própria, escolhido pelo titular da informação”.
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140. No que se refere ao acesso aos dados de saúde contidos em processo clínico,
importa acrescentar que, no caso de o estabelecimento prestador de cuidados de
saúde pertencer ao sector público, como sucede com o CHLN, é-lhe aplicável não o
disposto na referida Lei n.º 12/2005, de 26 de janeiro, mas sim o disposto na Lei n.º
46/2007, de 24 de agosto.
141. Nos termos do disposto em tal diploma legal, “Todos, sem necessidade de enunciar
qualquer interesse, têm direito de acesso aos documentos administrativos, o qual
compreende os direitos de consulta, de reprodução e de informação sobre a sua
existência e conteúdo.”;
142. Sendo que “A comunicação de dados de saúde é feita por intermédio de médico se
o requerente o solicitar” – cfr. artigos 5.º e 7.º da Lei n.º 46/2007, de 24 de agosto;
143. Ou seja, o titular do processo clínico pode aceder diretamente ao mesmo, sem
necessidade de ser invocado qualquer interesse.
144. Decorre do aludido supra que se afigura inquestionável o direito de acesso à
informação contida no processo clínico.
145. Bem como o direito do utente a que seja garantida a sua transferência para o
prestador a que venha a recorrer, o que, a não ser efetivado, pode consubstanciar
igualmente uma limitação no seu direito de acesso aos cuidados de saúde.
III.3. Análise da situação concreta
146. Conforme acima se expôs, atenta a denúncia apresentada pelo utente, as questões
que importa analisar no âmbito dos presentes autos são as seguintes:
(i) Cumprimento, em matéria de acesso a assistência médica ou cuidados de
saúde no estrangeiro ou transfronteiriços, de todos os procedimentos
impostos pela legislação em vigor quer à data dos factos, quer no momento
atual;
(ii) Garantia e efetivação, no caso e em geral, do direito à informação da utente
e dos pais em toda a sua extensão e amplitude, nomeadamente, no que se
refere à existência de meios adequados e suficientes, no HSM, de
publicitação e divulgação junto dos utentes do modo como aceder à
prestação de cuidados no estrangeiro, à data dos factos e actualmente, nos
termos da lei em vigor;
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(iii) Saber se o adiamento sucessivo de consultas à utente colocou em causa,
no caso concreto, a garantia do direito da utente a receber, com prontidão
ou num período tempo considerado clinicamente aceitável, os cuidados de
saúde de que necessitava, através de meios adequados, humanamente e
com prontidão, correção técnica, privacidade e respeito.
(iv) Saber se a estimativa temporal prevista pelo médico para a realização da
cirurgia respeitou as regras do SIGIC e dos TMRG aplicáveis à data dos
factos;
(v) Garantia do direito da utente de acesso ao seu processo clínico e de
aceitação e efetivação da transferência do mesmo para outra unidade
hospitalar, de acordo com a sua solicitação.
147. Neste contexto, a análise da situação concreta será efectuada tendo em
consideração cada uma destas questões.
III.3.1 Do cumprimento do iter procedimental previsto no Decreto-Lei n.º 177/92, de
13 de agosto
148. Relativamente ao cumprimento de todos os procedimentos em matéria de acesso
assistência médica ou cuidados de saúde no estrangeiro ou transfronteiriços, importa
fixar, em primeiro lugar, a lei aplicável à data dos factos.
149. No caso, estão em causa dois requerimentos de assistência médica no estrangeiro
dirigidos ao HSM: o primeiro, em 2 de maio de 2013 (…); e o segundo, em 17 de março
de 2014 (..).
150. Tendo sido os dois requerimentos apresentados em 2 de maio de 2013 e 17 de
março de 2014, respetivamente, a lei aplicável à data dos factos é o Decreto-Lei n.º
177/92, de 13 de Agosto, posto que a Lei n.º 52/2014 foi publicada em Diário da
República em 25 de Agosto só entrou em vigor no dia 1 de Setembro de 2014.
151. Termos em que é à luz do Decreto-Lei 177/92 que se deverá aferir do cumprimento
ou incumprimento, pelo HSM, dos procedimentos e requisitos legais aí vertidos em
relação ao caso concreto da utente M.
152. Sem prejuízo de se levar em linha de conta, como já supra aludido, as circulares e
orientações da DGS (nomeadamente, a Orientação n.º 003/2010, de 29 de setembro
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de 2010, da DGS, a qual é, alias, expressamente citada pelo CHLN em resposta à
ERS);
153. Bem como, ainda que mais a latere, a Directiva 2011/24/UE, de 9 de Março de
2011, a qual, pese embora ainda não transposta à data dos factos, constituía, já então,
um parâmetro de atuação para as entidades públicas, como é o caso do CHLN.
154. Para o pagamento das despesas afectas à assistência médica no estrangeiro, o
artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 177/92 estabelecia como requisitos:
“a) A existência de um relatório médico hospitalar favorável, a elaborar
circunstanciadamente pelo médico que tenha acompanhado a assistência ao
doente, confirmado pelo respectivo director de serviço;
b) A confirmação de tal relatório por parte do director clínico da unidade hospitalar
onde o doente foi assistido;
c) A decisão favorável do director-geral dos Hospital [actual Direcção-Geral da
Saúde], mediante parecer da assessoria técnica”.
155. É com base nestes requisitos que o atual Diretor-Geral da Saúde exercia a
competência, que a lei lhe atribuía, de decisão dos processos de assistência médica no
estrangeiro (artigo 4.º, Decreto-Lei n.º 177/92).
156. Segundo a Orientação da DGS n.º 003/2010:
“[…]
O requerimento de emissão do Documento Portátil S2 pode ser solicitado por
iniciativa do utente do Serviço Nacional de Saúde, deve ser formalizado através de
impresso (…).
(…) O impresso para requerer o Documento Portátil S2 pode ser solicitado pelo
utente do Serviço Nacional de Saúde no serviço de atendimento ao público das
unidades prestadoras de cuidados de saúde (…).
(…) O pedido de emissão do Documento Portátil S2 deve ser requerido pelo utente
no hospital integrado onde ande a ser observado, em investigação clínica ou em
tratamento, que, depois de devidamente instruído, deve ser reencaminhado para a
respectiva Administração Regional de Saúde.
(…) O pedido do Documento Portátil S2, para além de ser instruído com os
elementos essenciais de identificação do utente do Serviço Nacional de Saúde,
deve ser instruído com relatório clínico emitido pelo médico hospitalar responsável
pela consulta de atendimento do utente, validado pelo Director Clínico (…).
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[…]”
157. Em 2 de maio de 2013, os pais da utente dirigiram requerimento ao HSM com
assunto “Requerimento de documento portátil S2” (…).
158. Pese embora a designação do assunto, o que, em rigor, os pais solicitavam era o
relatório médico favorável a que fazem alusão o artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 177/92 e a
Orientação da DGS n.º 003/2010, a anexar ao referido requerimento de Documento
Portátil S2.
159. De facto, como consta da própria minuta do Documento Portátil S2:
“[…]
“NB: Por cada requerimento de Documento portátil S2 ou Formulário E112, deverá
o utente do Serviço Nacional de Saúde apresentar relatório médico emitido pelo
médico assistente, com expressa indicação do diagnóstico da doença (confirmado
ou provável), comprovando a impossibilidade da realização do tratamento em
Portugal, num prazo clinicamente seguro. O relatório clínico deve ser junto ao
presente pedido de emissão do Documento Portátil S2 (…)”.
160. Nos termos da al. a) do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 177/92, tal relatório deve ser
elaborado “pelo médico que tenha acompanhado a assistência ao doente” e
“confirmado pelo respectivo director de serviço”.
161. E, ainda, confirmado novamente, de acordo com a alínea b) do artigo 2.º do
Decreto-Lei n.º 177/92, pelo “diretor clínico da unidade hospitalar onde o doente foi
assistido”.
162. Cabendo a decisão final sempre ao Diretor-Geral da Saúde, de harmonia com o
disposto no n.º1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 177/92.
163. A resposta, de sentido negativo/desfavorável, ao pedido de elaboração de relatório
médico foi elaborada, em 9 de maio de 2013, pelo médico que assistiu a utente, Dr. J.
164. Sendo expressamente confirmada pelo Diretor do Serviço de Neurocirurgia, Prof.
Doutor JL., em 13 de maio de 2013.
165. Vindo, ainda, a ser igualmente confirmada pela Diretora Clínica, Dr.ª MM., em 17 de
maio de 2013.
166. Sendo, porém, a resposta final enviada aos pais da utente somente no dia 17 de
junho de 2013.
167. Injustificadamente, entre 17 de maio de 2013 (data da confirmação do relatório pela
Diretora Clínica) e 17 de junho de 2013 (data do envio da resposta aos pais da utente),
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decorreu um mês sem que os pais da utente tivessem sido informados do sentido da
decisão.
168. O que vai contra os critérios da eficiência, economicidade e celeridade que
enformam o princípio da boa administração (art. 5.º, CPA) e da colaboração com os
particulares (art. 13.º, CPA).
169. Indo contra, mais a mais, o prazo geral de resposta de Administração de 10 dias
úteis, na ausência de norma especial.
170. Em face do exposto, desde já se mostra violado o prazo legal de resposta ao
requerimento da utente por parte do HSM.
171. Não fazendo parte do conjunto de competências inscrito no Estatutos da ERS a
avaliação clínica dos cuidados de saúde prestados aos utentes, nomeadamente, e para
o que aqui interessa, a avaliação dos fundamentos clínicos para a decisão
(desfavorável) sobre os requerimentos apresentado pelos pais da utente,
172. Urge, no entanto, analisar do cumprimento dos trâmites e formalidades exigidos, à
data dos factos, pelo Decreto-Lei n.º 177/92.
173. Ora, do disposto no n.º1 do artigo 4.º, do Decreto-Lei n.º 177/92 resultava que “É da
competência do director-geral dos Hospitais [atual Diretor-Geral da Saúde] a decisão
dos processos de assistência médica no estrangeiro que lhe sejam submetidos pelos
interessados, atentos os requisitos previstos no art. 2.º”.
174. Por sua vez, a Orientação n.º 003/2010, de 29-09-2010, da DGS, previa o seguinte:
“[…]
O pedido de emissão do Documento Portátil S2 deve ser requerido pela utente no
hospital (…), que, depois de devidamente instruído, deve ser reencaminhado para a
respectiva Administração Regional de Saúde.
(…) Compete à Administração Regional de Saúde certificar na rede hospitalar d
Serviço Nacional de Saúde da sua área de abrangência, se existe capacidade
instalada para prestar os cuidados de saúde requeridos pelo utente. Caso não exista
capacidade de resposta, o pedido de emissão do Documento Portáril S2 deve ser
remetido para apreciação e decisão da Direcção-Geral da Saúde.
(…) Compete ao hospital que recepcionou o pedido de emissão do Documento
Portátil S2 comunicar ao utente a emissão favorável ou não do referido documento
decidida pela Direcção-Geral da Saúde.
36 Mod.016_01
[…]”.
175. No caso concreto, não se verificou, porém, o reencaminhamento, pelo HSM, do
pedido de emissão do Documento Portátil S2 para a ARS competente.
176. E também em nenhum momento o Diretor-Geral da Saúde exerceu a sua
competência decisória, tal qual a mesma lhe era outorgada pelo artigo 4.º do Decreto-
Lei n.º 177/92.
177. Ora, como decorre do Decreto-Lei n.º 177/92 e da Orientação DGS n.º 003/2010, o
reencaminhamento do pedido de emissão do Documento portátil S2 para a ARS e a
ulterior decisão do mesmo pelo Diretor-Geral da Saúde deveriam ter ocorrido, mesmo
que, em momento prévio, o relatório clínico tivesse sido de sentido desfavorável.
178. Resulta, assim, que o procedimento permaneceu sempre dentro da esfera exclusiva
do CHLN-HSM, não tendo sido cumpridos os trâmites procedimentais previstos na lei e
seguidos na prática administrativa (conforme Orientação DGS n.º 003/2010).
179. De facto, o prestador, em nenhum momento ou por qualquer meio, remeteu a
decisão e/ou respetivos elementos documentais instrutórios para a Direcção-Geral da
Saúde, com vista a permitir a esta última a emissão de uma decisão definitiva in casu.
180. Não permitindo, assim, aos interessados, caso assim o entendessem, o exercício do
direito à impugnação administrativa e/ou judicial nos termos do Decreto-Lei n.º 177/92,
do CPA e do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA)
181. Assim, e em resumo, decorre dos autos que, não obstante a existência de um
relatório médico não favorável à assistência médica no estrangeiro,
182. Certo é que tal relatório médico nunca foi comunicado à Direcção-Geral da Saúde, à
qual competia a decisão final, nos termos do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º
177/92, de 13 de Agosto; sem que, por isso,
183. Aos interessados fosse permitido que se pronunciassem previamente, em sede de
audiência prévia, tal como consignado nos artigos 121.º e ss., todos do CPA.
184. Nem que pudessem exercer, formal e devidamente, o direito de impugnação
administrativa e/ou judicial da sobredita decisão.
185. O CHLN, ao atuar como atuou, cerceou ao utente o seu direito a uma decisão
definitiva em sede do procedimento administrativo emitida pela entidade competente,
tal como definido pelo Decreto-Lei n.º 177/92, de 13 de Agosto;
186. Com efeito, e sem que aqui se cuide do entendimento clínico assumido pelos
profissionais de saúde quanto à situação clínica da utente, esta teria sempre direito a
37 Mod.016_01
uma decisão administrativa proferida nos termos da legislação em vigor, ou seja, pelo
Director-Geral da Saúde.
187. Decisão a qual, ainda que concordante (ou não) com o relatório médico hospitalar,
deveria, ela própria, ser fundamentada.
188. Assim como deveria ser passível, ela mesma, de impugnação administrativa para o
Ministro da Saúde nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 4.ºdo Decreto-Lei n.º
177/92 ou de impugnação judicial nos termos gerais.
189. Termos em que a conduta do CHLN reduziu, outrossim, as garantias impugnatórias
(graciosas e judiciais) da utente.
190. Concluiu-se, pois, que o CHLN avocou a si próprio, indevidamente e sem arrimo na
lei, uma atribuição que não lhe pertencia mas que era da exclusiva competência da
Direcão-Geral da Saúde.
191. Em 15 de julho de 2013, a mãe da utente dirigiu novo requerimento, com assunto
“Recurso da decisão acerca do requerimento de documento portátil S2”, e nos termos
do qual solicitou “(…) a revisão do processo que iniciámos aquando o pedido do
documento portátil S2, em 2 de maio de 2013 (…)”,
192. Por carta de 2 de agosto de 2013, foi o recurso indeferido, com a transcrição, pela
Directora do HSM, Dr.ª M.C.P., da informação recebida da Direcção do Serviço de
Neurocirurgia, segundo a qual “Não vejo qualquer motivo para rever a nossa posição
nesta matéria. O pagamento dos cuidados prestados noutra Instituição abria um
precedente que levanta as maiores reservas éticas por clara violação do princípio da
equidade”.
193. Se, como descrito anteriormente, o direito a uma decisão definitiva da entidade
competente (Direção-Geral da Saúde) e o direito à impugnação administrativa e/ou
judicial da mesma já haviam sido cerceadas à utente,
194. Nem por ocasião deste Recurso da decisão acerca do requerimento de documento
portátil S2” apresentado pela reclamante o CHLN logrou dar cumprimento aos trâmites
procedimentais previstos na lei.
195. De facto, uma vez mais, o CHLN não reencaminhou o processo à Direção-Geral da
Saúde (tão-pouco ao Ministério da Saúde, entidade legalmente competente, segundo
n.º 5 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 177/92, para conhecer do recurso das decisões do
Diretor-Geral da Saúde), antes mantendo o mesmo sob a sua exclusiva órbita.
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196. Impedindo, assim, através de uma conduta opaca e bloqueadora, que a reclamante
pudesse beneficiar das normais vias impugnatórias de qualquer decisão
administrativas.
197. Por outro lado, e novamente, foi desrespeitado o prazo legal de resposta de 10 dias
(úteis) pelo HSM.
198. Em 17 de março de 2014, os pais da utente dirigiram novo “Requerimento de
documento portátil S2” ao Director do Serviço de Cirurgia Plástica e Reconstrutiva do
HSM, solicitando relatório médico favorável para a prestação de cuidados de saúde no
estrangeiro (…).
199. Por carta de 10-04-2014, a Directora de Serviços, Dr.ª M.C.P., e ”Em resposta ao
pedido apresentado (…) no passado dia 17 de Março (…)”, transcreveu a informação
recebida da Direcção do Serviço de Cirurgia Plástica, com base na qual o pedido é
rejeitado.
200. Concretamente, resulta dessa informação o seguinte:
“[…]
Não sou indiferente à gravidade da situação, nomeadamente até em termos
económicos, pelo que tendo sido explicado detalhadamente aos pais a
possibilidade segura de aquela ser tratada em Portugal, apenas posso referir ter
sido uma opção dos pais.
Após ter contactado o cirurgião plástico Prof. J.P.G. responsável pela área de
Craneofacial e após análise direi que por razões óbvias não podemos assumir a
responsabilidade dos pais, não havendo lugar a relatório já que a paciente deixou
de vir à nossa consulta.
[...]”.
201. Neste segundo requerimento apresentado pela utente, verificou-se, uma vez mais,
ainda que tacitamente, a emissão de relatório médico desfavorável.
202. O primeiro a aspeto a salientar é, uma vez mais, o facto de a resposta do HSM ao
requerimento da reclamante desrespeitar o prazo legal de 10 dias (úteis).
203. Forçoso sendo de concluir, portanto, pela prática consistente e reiterada do HSM de
violação do prazo legal de resposta nas três respostas aos três requerimentos
apresentados pela reclamante.
204. Por outro lado, note-se que, na resposta a este segundo requerimento, as
formalidades exigidas pelas alíneas a) e b) do art. 4.º do Decreto-Lei n.º 177/92 – e que
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foram corretamente seguidas (pelo menos estas) no âmbito do primeiro requerimento
apresentado – não foram cumpridas.
205. De facto, em vez de ter sido emitido relatório por médico que acompanha a utente,
acompanhado das confirmações do mesmo pelo diretor de serviço e pelo diretor
clínico, foi apenas enviada aos pais da utente uma resposta de conteúdo vago e
genérico e desprovida de fundamentação clínica (sem prejuízo da mesma não ser
objeto de apreciação da ERS).
206. Acresce que, na referida resposta emitida pela Direção do Serviço de Cirurgia
Plástica, não consta sequer menção ou assinatura da pessoa que a elaborou.
207. Assim, constata-se que não foram, neste caso, cumpridos os trâmites das alíneas a)
e b) do art. 2.º do Decreto-Lei n.º 177/92, porquanto não foi elaborado um relatório
médico pelo médico que acompanha a utente, nem foi o mesmo confirmado pelo
diretor de serviço e pelo diretor clínico.
208. Tendo-se o prestador limitado a transcrever a informação (um parágrafo, três
linhas), vaga e genérica, recebida da Direção do Serviço de Cirurgia Plástica, sem
qualquer relatório clínico ou outro documento anexo.
209. Mais importante, porém, é que novamente se verifica que, também em sede deste
segundo requerimento apresentado, o CHLN chamou a si competências de que não
era titular, mantendo o processo na sua órbita e sobre ele emitindo uma decisão
definitiva.
210. Em vez de o remeter, como a lei impunha, à Direção-Geral da Saúde, esta sim, a
entidade legalmente competente para decidir.
211. O que significa que, por uma segunda vez, a utente viu cerceado o seu direito a uma
decisão administrativa proferida pela entidade legalmente competente, bem como o
seu direito às vias impugnatórias que legal e constitucionalmente lhe assistem.
III.3.2. Garantia e efetivação, in casu, do direito à informação
212. Importa aferir, neste passo, se, à data dos factos e à data de hoje, os meios de
publicitação relativamente aos cuidados de saúde no estrangeiro a que os utentes
podem receber se revelavam/revelam adequados e suficientes.
213. Recorde-se que, instado pela ERS a prestar informação sobre os protocolos e
demais procedimentos internos então em vigor especificamente no que se refere ao
tratamento de pedidos de autorização prévia apresentados ao abrigo da Lei n.º 177/92,
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o prestador remeteu em 12 de agosto de 2015, para o Regulamento interno da
Assistência Médica no Estrangeiro, que juntou em anexo.
214. A este propósito, a primeira observação que cumpre fazer é a de que o referido
Regulamento data de 5 de Abril de 2000.
215. Significa isto duas coisas:
216. Por um lado, que o citado Regulamento não sofreu qualquer alteração por ocasião
da aprovação da Diretiva 2011/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 9 de
Março de 2011, relativa ao exercício dos direitos dos doentes em matéria de cuidados
de saúde transfronteiriços;
217. Por outro, e mais grave, que nenhuma alteração foi igualmente introduzida com a
entrada em vigor da Lei n.º 52/2014 e da Portaria n.º 191/2014, de 25 de Setembro, as
quais impuseram todo um novo quadro normativo no que respeita ao acesso a
cuidados de saúde transfronteiriços.
218. Quanto ao mencionado na alínea a), se é certo que as Diretivas europeias não são
diretamente aplicáveis na ordem jurídica interna e carecem de transposição pelo
legislador nacional, certo é também, todavia, que, sendo do conhecimento do prestador
a aprovação da referida Diretiva em 9 de Março de 2011,
219. Poderia e deveria o mesmo ter atualizado e adequado, ao menos em parte, os seus
procedimentos à normação vertida na Diretiva 2011/24/UE.
220. Todavia, não só o prestador assim não diligenciou,
221. Como, mais gravosamente, não o fez igualmente até à presente data, e isto já
depois da entrada em vigor da Lei n.º 52/2014, em 1 de setembro de 2014, e da
Portaria n.º 191/2014, de 25 de Setembro.
222. Concluindo, e de acordo com a informação e documentação junta pelo prestador, à
data de hoje (2015), o predito Regulamento da Assistência Médica no Estrangeiro, que
data de 5 de Abril de 2000, continua a vigorar, não tendo sido revogado/alterado/revisto
em função da entrada em vigor da Lei n.º 52/2014.
223. O que, necessariamente, deveria ter sido – e deve ser – feito pelo CHLN-HSM.
224. Por outro lado, relativamente aos meios existentes, no HSM, de disponibilização de
informação aos utentes acerca da possibilidade de acederem à prestação de cuidados
de saúde no estrangeiro, quer à data dos factos, quer à data de hoje, o prestador
informou o seguinte:
“[…]
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O Setor de Assistência Médica no Estrangeiro do Centro Hospitalar Lisboa Norte,
que integra a Unidade de Gestão Clínica do Serviço de Gestão Hospitalar, dá apoio
a todos os Serviços do CHLN.
(…) Acrescente-se ainda a informação disponibilizada em formação específica para
o efeito por parte da ACSS (Formação ACSS: Diretiva nº 2011/24/EU – Cuidados de
Saúde Transfronteiriços).
(…) a informação [aos utentes] é dado de modo personalizado e por funcionário
especializado da Unidade de Gestão Clínica, mais especificamente do Setor de
Assistência Médica no Estrangeiro, sendo o utente encaminhado pelos diversos
serviços clínicos.
[…]”.
225. Consultado o sítio do CHLN, verifica-se que o Setor de Assistência Médica no
Estrangeiro possui contactos, instalações e horários próprios.
226. No entanto, justifica-se que, de modo a assegurar que os utentes tenham pleno
acesso e conhecimento da existência de tal Setor e de tal possibilidade de recorrer a
cuidados de saúde no estrangeiro nos termos da Lei n.º 52/2014, haja uma maior
divulgação e publicitação nas próprias instalações do hospital, nomeadamente, através
de cartazes e outros meios informativos (em papel ou em suporte audiovisual).
227. Desse modo se assegurando aos utentes a prestação de informação adequada e
suficiente quanto os procedimentos inerentes ao regime do acesso a cuidados de
saúde transfronteiriços.
228. Por outro lado, subsistem dúvidas quanto ao grau de conhecimento atualizado dos
funcionários relativamente ao novo quadro normativo imposto pela Lei n.º 52/2014 e,
consequentemente, quanto ao grau de atualização da informação prestada aos
utentes.
III.3.3. Do adiamento das consultas de especialidade de Cirurgia Plástica no HSM
229. Questão diferente prende-se com o alegado adiamento consecutivo de consultas da
especialidade.
230. Sucede que, entre os anos de 2010 e 2014, foram registados 7 (sete) adiamentos
sucessivos de consulta à utente, na especialidade de Cirurgia Plástica.
231. Mais concretamente, e segundo os pais da utente, os adiamentos processaram-se,
cronologicamente, nos seguintes termos:
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i) A consulta de 29-06-2010 (11h15) foi adiada para 19-10-2010 (10h55);
ii) A consulta de 19-10-2010 foi adiada para 18-10-2011 (10.30h);
iii) A consulta de 18-10-2011 foi adiada para 27-12-2011 (9h30);
iv) A consulta de 27-12-2011 foi adiada para 31-01-2012 (10h10);
v) consulta de 31-01-2012 foi adiada para 29-05-2012 (10h10);
vi) consulta de 29-05-2012 foi adiada para 26-11-2012 (8h40).
232. Instada a confirmar os referidos adiamentos pela ERS, o prestador, por ofício de 12
de agosto de 2015, reconheceu os mesmos, apenas mencionando uma divergência
quanto à consulta de 19 de outubro de 2010, que indica ter sido efetivamente realizada,
ao passo que a Mãe da utente alega ter sido remarcada para dia 18 de outubro de
2011.
233. Sobre os motivos para tais adiamentos, o prestador informou, em 6 de agosto de
2014, que “Os adiamentos das consultas da especialidade de Cirurgia Plástica
deveram-se à marcada redução dos recursos humanos do Serviço de Cirurgia Plástica
e Reconstrutiva Maxilo Facial nestes últimos anos”.
234. Por sua vez, o médico Dr. J., reiterando expressamente a falta de recursos humanos
acima mencionada, aduziu, como motivo para os sucessivos adiamentos, o “carácter
descontínuo da [sua] relação contratual com o HSM na altura a que se referem os
factos”.
235. Relativamente à consulta de 26 de novembro de 2012, foi efetuado, pela mãe da
utente, um pedido de remarcação da mesma, por indisponibilidade da própria.
236. Tendo a remarcação sido feita, pelo HSM, para 27 de outubro de 2014, entretanto
antecipada em 4 dias, para 23 de outubro de 2014.
237. Note-se que, neste caso em concreto, está em causa um adiamento de quase 2
(dois) anos.
238. Em termos globais, verifica-se, que, entre o agendamento da primeira consulta (29-
06-2010) de Cirurgia Plástica e o agendamento da última (consulta de 23-10-2014),
decorreram mais de 4 (quatro) anos, sendo que, durante esse período, apenas um dos
adiamentos (adiamento de 26 de outubro de 2011) se deveu a impossibilidade da
utente.
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239. Com a agravante, reitere-se, de, tendo sido solicitada, pela utente, a remarcação da
consulta de 26 de novembro de 2012, esta ter sido remarcada para quase 2 (dois) anos
depois, em 27 de outubro de 2014.
240. Ora, não é razoável nem admissível que a carência de recursos humanos (ainda
menos o caráter mais ou menos contínuo de um profissional médico em concreto, o Dr.
J.), ainda que significativa, se possa traduzir num adiamento sucessivo de consultas de
Cirurgia Plástica à utente durante um período de mais de 4 anos.
241. Até porque, se essa carência era real e foi efetivamente detetada, deveria ter sido,
ao menos em algum momento durante esses 4 anos, resolvida ou atenuada
devidamente.
242. O que, tudo indica, não sucedeu.
243. Embora, nos termos da lei, os TMRG apenas sejam aplicáveis às consultas de
primeira consulta de especialidade, e não às consultas de
acompanhamento/seguimento, o certo é que, mesmo quanto a estas últimas, o
agendamento deve, em qualquer caso, ser efectuado em tempo razoável e adequado,
desde logo em função da concreta situação clínica da utente.
244. De facto, e como resulta expressamente do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 15/2014, de
21 de março11, referente à adequação da prestação dos cuidados de saúde, “O utente
dos serviços de saúde tem direito a receber, com prontidão ou num período tempo
considerado clinicamente aceitável, consoante os casos, os cuidados de saúde de que
necessita”.
245. A este respeito encontra-se reconhecido na LBS, mais concretamente na sua alínea
c) da Base XIV, o direito dos utentes a serem “(…) tratados pelos meios adequados,
humanamente e com prontidão, correcção técnica, privacidade e respeito”.
246. Quanto ao direito do utente ser tratado com prontidão, o mesmo encontra-se
directamente relacionado com o respeito pelo tempo do paciente12, segundo o qual
deve ser garantido o direito do utente a receber o tratamento necessário dentro de um
rápido e predeterminado período de tempo, em todas as fases do tratamento.
247. Aliás, o Comité Económico e Social Europeu (CESE), no seu Parecer sobre “Os
direitos do paciente”, refere que o “reconhecimento do tempo dedicado à consulta, à
escuta da pessoa e à explicação do diagnóstico e do tratamento, tanto no quadro da
11
Lei consolidando a legislação em matéria de direitos e deveres do utente dos serviços de saúde.
12 Vd. o ponto 7. da “Carta Europeia dos Direitos dos Utentes”.
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medicina praticada fora como dentro dos hospitais, faz parte do respeito das pessoas
[sendo que esse] investimento em tempo permite reforçar a aliança terapêutica e
ganhar tempo para outros fins [até porque] prestar cuidados também é dedicar tempo”.
248. Atento o hiato, de mais de 4 (quarto anos), entre o agendamento da consulta de 29
de junho de 2010 e agendamento da última (consulta de 23-10-2014), resulta não ter
sido respeitada a necessidade, exigida pelo legislador, de adequação da prestação dos
cuidados de saúde em tempo razoável e adequado.
249. Por outro lado, mesmo após o pedido de remarcação da consulta de 26 de
novembro de 2012, feito pela utente por sua própria indisponibilidade, não se afigura
igualmente razoável nem adequado que a remarcação tenha sido feita para quase 2
(dois) anos depois, desde logo tendo em conta, novamente, a concreta situação clínica
da utente.
250. Também daqui resultando não ter sido respeitada a adequação da prestação dos
cuidados de saúde em tempo razoável e adequado, contra aquilo que impõe a
legislação em vigor.
251. Em suma, não só se encontrava na disponibilidade do HSM prover por uma
prestação integrada de cuidados de saúde de forma atempada.
252. Como também lhe cabia, atenta a sua qualidade de hospital integrado na Rede
Nacional de Prestação de Cuidados de Saúde, informar a utente e dotá-la do
conhecimento necessário quanto às alternativas existentes, no quadro do SNS, para
acompanhamento e correto encaminhamento da sua situação clínica.
253. Não tendo sido, por isso, acautelados os legítimos interesses da utente, uma vez
que não foi prestada a assistência em tempo razoável e adequado.
III.3.4. Da inscrição da utente na Lista de Inscritos para Cirurgia
254. Já quanto à inscrição da utente em LIC, refira-se que a utente foi inscrita na Lista de
Inscritos para Cirurgia no âmbito do SIGIC em 27 de março de 2013, tendo a mesma
sido cancelada em 23 de abril de 2013, em virtude de os pais da utente terem optado
pelo tratamento em França.
255. Conforme resposta, em 9 de Maio de 2013, do Chefe de Serviço de Neurocirurgia,
Dr. J. (em resposta ao “Requerimento de documento portátil S2” apresentado em 2 de
maio de 2013):
“[…]
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(…) tendo a criança sido inscrita na lista de espera para cirurgias (SIGIC) no dia 27-
3-2013 (…). Não foi possível na altura especificar uma data concreta para a cirurgia,
porque, como foi explicado à mãe, as nossas marcações são contingentes a
múltiplos fatores, nomeadamente a urgência dos casos com que diariamente somos
confrontados, mas foi dito que a sua realização seria certamente possível no prazo
de um a dois meses, bastante antes da data que foi, depois, programada em França
(19-6-2013). Penso que esse prazo poderia ter sido cumprido, não fora a alteração
da decisão dos pais [em prosseguir com o tratamento em França].
[…]”.
256. Talqualmente resulta da cópia da Proposta Cirúrgica em causa, a cirurgia possuía
Prioridade Normal.
257. Como tal, e de acordo com o Anexo n.º I da Portaria n.º 1529/2008, de 26 de
dezembro, aplicável à data dos factos13, o Tempo Máximo de Resposta Garantido
(TMRG) para a cirurgia era de 270 dias (9 meses).
258. Termos em que a estimativa do médico de um ou dois meses para a realização da
cirurgia estava “dentro” do prazo máximo definido pela lei, nenhuma irregularidade
havendo, portanto, a registar neste capítulo.
259. Por conseguinte, não se pode afirmar que a opção dos pais da utente pelo
tratamento em França se deveu à demora excessiva – por exemplo, por se encontrar
em “lista de espera” – da realização da cirurgia em hospital português.
III.3.5. Do acesso ao processo clínico
260. Por último, quanto ao acesso ao processo clínico e sua transferência para outra
unidade hospitalar, recorde-se que, em 22 de outubro de 2013, os pais da utente
dirigiram um requerimento ao CHLN-HSM, com assunto “Pedido de transferência de
processo clínico”, do qual constava o seguinte:
“Vimos por este meio solicitar que o processo clínico da consulta de Neurocirurgia
relativo à nossa filha M. (DN 6/9/2000) seja transferido para o Hospital Pediátrico de
Coimbra, por motivo de proximidade de residência (vivemos em Viseu).
Aproveitamos para agradecer todo o empenho e dedicação que a equipa liderada
pelo Exmo Sr Dr M. teve ao longo destes anos para com a nossa filha.
13
Entretanto revogada pela Portaria n.º 87/2015, de 23 de março.
46 Mod.016_01
[…].
261. Em 16 de abril de 2014, em requerimento dirigido ao Diretor de Serviço de Cirurgia
Plástica do CHLN-HSM, e entre outros aspetos, os pais da utente voltam a pedir “(…)
encarecidamente a sua [do Diretor de Serviço] ajuda para transferência urgente do
processo da nossa filha do HSM para o HPCoimbra, por motivos financeiros e de
proximidade de residência”.
262. Em e-mail dirigido à ERS em 10 de setembro de 2014, os pais da utente referem,
entre outros aspetos, o seguinte:
“[…]
(…) aguardamos a transferência de neurocirurgia deste outubro de 2013 (…).
[…]”.
263. Verifica-se, portanto, que, tendo os pais da utente feito o primeiro pedido de
transferência de processo clínico de neurocirurgia em 22 de outubro de 2013, à data de
10 de setembro de 2014 (quase um ano depois), ainda não tinha sido prestada
qualquer resposta.
264. E, mais gravosamente, das informações prestadas pelo prestador decorre
igualmente que nenhuma resposta ou diligência foi adotado pelo mesmo no sentido de
dar seguimento ao solicitado pelos pais da utente.
265. O que o CHLN-HSM vem alegar, a este propósito, numa primeira fase, em 4 de
setembro de 2014, é o seguinte:
“[…]
Os pais da menor solicitaram em 22.10.2013 junto do Setor dos Relatórios Clínicos
deste centro hospitalar, «que o processo de Neurocirurgia relativo à nossa filha M.,
seja transferido para o Hospital Pediátrico de Coimbra, por proximidade de
residência (vivemos em Viseu).» (…) pedido esse que, inicialmente, foi tratado por
aquele sector como um pedido de acesso a dados clínicos (formulado ao abrigo da
Lei de Acesso a Documentos Administrativos) e encaminhado para o Serviço de
Neurocirurgia.
Refira-se, porém, que a eventual transferência da doente para outro hospital não
pressupunha nem obrigava a transferência do respectivo processo clínico o qual, em
cumprimento das regras legais em vigor sobre a matéria (designadamente do
«regulamento Arquivístico para os Hospitais» aprovado em anexo à Portaria nº
247/2000, de 8 de maio) deveria permanecer arquivado no CHLN.
47 Mod.016_01
Por outro lado, tal como referem os pais da doente na sua reclamação, esta já era
seguida no Hospital Pediátrico de Coimbra, pelo que não se justificava qualquer tipo
de encaminhamento por parte do CHLN, onde a doente entretanto deixou de
comparecer.
[…]”.
266. Posteriormente, e inquirido diretamente sobre esta questão pela ERS, veio o
prestador, em 10 de agosto de 2015, pronunciar-se nos seguintes termos (juntando
documentos comprovativos):
“[…]
Nos Registos do Setor de Relatórios Clínicos consta uma saída de informação
relativa a este pedido em 10.9.2014. Não existe cópia da informação disponibilizada
neste Setor.
O pedido de cópia do processo clínico de Neurocirurgia Pediátrica de M. foi
formalizado por requerimento datado de 25.9.2014. A cópia da documentação foi
remetida via CTT em 30.09.2014. O processo clínico de Oftalmologia foi solicitado
em 10.09.2014 e remetido em 16.09.2014.
[…]”.
267. A este respeito, importa recordar que, do quadro legal supra exposto nesta matéria,
decorre que impende sobre os estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde o
dever de criar, manter, atualizar, e conservar em arquivo ficheiros adequados relativos
aos processos clínicos dos seus utentes.
268. Cabendo, designadamente, ao profissional médico que tenha assistido o utente, ou
a outro profissional de saúde sob a supervisão daquele, o dever de proceder à referida
documentação ou registo da informação médica (e que pode incluir dados sobre
consultas, tratamentos, exames ou diagnósticos a que os utentes foram sujeitos).
269. Assim, e sendo “(…) a informação de saúde destinada a ser utilizada em prestações
de cuidados ou tratamentos de saúde”;
270. O processo clínico relativo a um determinado utente/doente deve conter informação
suficiente sobre a sua identificação, bem como sobre todos os factos relacionados com
a sua saúde, incluindo a sua situação atual, evolução futura e história clínica e familiar,
e ainda com os factos relacionados com os cuidados de saúde que lhe tenham sido
prestados e que lhe venham a ser prestados no estabelecimento de saúde em que o
processo clínico se encontra depositado.
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271. E que permita, em caso de transferência do utente, seja por sua vontade, ou em
resultado das regras internas da organização do SNS, para uma outra unidade
hospitalar, quer a veracidade e completude do seu processo clínico, quer a
continuidade de prestação dos cuidados de saúde, em respeito dos princípios supra
referidos.
272. Ou seja, a prestação dos cuidados de saúde adequados à sua situação, em tempo
útil, onde quer que os utentes vivam e ainda atendendo à sua condição económica.
273. Conforme o relatado pela reclamante e averiguado em sede de instrução, o HSM
não respondeu ao pedido de transferência do processo clínico, nem diligenciou, por
alguma forma, nesse sentido.
274. Nem sequer informando a reclamante do seu entendimento, i.e., da alegada
impossibilidade da transferência do processo e da consequente necessidade de obter
cópia do processo.
275. Situação que, como descrito supra, se manteve até ao momento em que, por sua
iniciativa, a utente se viu forçada a solicitar, em 26 de setembro de 2014, e em
formulário escrito próprio do HSM, a “Cópia do Processo Clínico”, ainda assim fazendo
menção, no campo “Outros”, de que se tratava de um pedido de “Transferência do
processo clínico relativo à consulta de Neurocirurgia para outro hospital”.
276. Por outro lado, atente-se, ainda, no seguinte.
277. A Lei de Acesso aos Documentos Administrativos (LADA)14 regula “O acesso a
documentos nominativos, nomeadamente quando incluam dados de saúde, efectuado
pelo titular da informação, por terceiro autorizado pelo titular ou por quem demonstre
um interesse directo, pessoal e legítimo”.
278. Sendo que “O acesso aos documentos deve ser solicitado por escrito através de
requerimento do qual constem os elementos essenciais à sua identificação, bem como
o nome, morada e assinatura do requerente” (n.º 1 do artigo 13.º da LADA).
279. No caso de o pedido não se encontrar suficientemente preciso/exato, a entidade
requerida deve, no prazo de cinco dias, indicar ao requerente essa deficiência e
convidá-lo a supri-la em prazo fixado para o efeito (n.º 4 do artigo 13.º da LADA)
280. Acrescendo que os órgãos e entidades devem prestar, através dos seus
funcionários, assistência ao público na identificação dos documentos pretendidos,
14
Lei n.º 46/2007, de 24 de agosto.
49 Mod.016_01
designadamente informando sobre a forma de organização e utilização dos seus
arquivos e registos (n.º 5 do artigo 13.º da LADA).
281. Como se depreende da letra e do espírito das normas citadas, o que se pretende,
aqui, é, ao abrigo dos critérios da eficiência, economicidade e celeridade que
enformam o princípio da boa administração (artigo 5.º do CPA) e da colaboração com
os particulares (artigo 13.º do CPA), que a Administração agilize e acelere os
procedimentos, evitando a sua estagnação e a inércia.
282. Pelo contrário, dos autos decorre que não só o CHLN não respondeu (negativa ou
positivamente) ao requerimento dos pais da utente de 22 de outubro de 2013, como
não prestou qualquer esclarecimento sobre o modo de obter devidamente a pretendida
transferência ou, caso o CHLN entendesse existir apenas o direito à cópia do processo,
pelo menos o modo de obtenção dessa cópia.
283. Dos factos vertentes e da informação recolhida junto do prestador e dos pais da
utente resulta, assim, que não houve da parte do CHLN-HSM qualquer comportamento
proactivo no sentido de esclarecer os pais da utente sobre o modo de como obter, com
brevidade, a transferência ou, na pior das hipóteses, a cópia do processo.
284. Vale por dizer que, sensivelmente entre 22 de outubro de 2013 (data do primeiro
requerimento os pais da utente solicitando a transferência do processo clínico) e 25 de
setembro de 2014 (data da formalização do requerimento para obtenção de cópia do
processo), decorreu quase um ano,
285. Sem que, durante esse período, o CHLN-HSM tenha diligenciado ou esclarecido a
utente no sentido de esta poder obter, definitivamente e com brevidade, a cópia do
processo pretendida.
286. Resultando, a final, na circunstância de a sobredita cópia só ter sido enviada no dia
30 de setembro de 2014 para os pais da utente.
287. O que, afigurando-se um período de tempo manifestamente dilatado e inadequado
para o tipo de pedido simples que é a transferência (ou, ainda mais simples, a cópia)
do processo,
288. É obviamente causador de incómodo e desconforto para a utente, que, passando a
ser seguida em consulta de outro Hospital, não tem acesso ao seu processo, tão-pouco
os profissionais médicos que a acompanham.
289. O que, por sua vez, pode ter impacto na situação clínica de qualquer utente,
precisamente pelo facto de os profissionais médicos que o acompanham no presente,
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por não terem acesso ao seu processo clínico, não estarem no pleno conhecimento de
todos os dados e implicações do mesmo.
290. Tudo somado, o comportamento do prestador mostrou-se violador dos direitos e
interesses legítimos dos utentes e de influenciar negativamente a garantia do direito de
acesso dos utentes aos cuidados de saúde.
291. Com efeito, a recusa da transferência do processo clínico da utente para outra
instituição de saúde consubstancia um constrangimento no acesso da mesma à
prestação dos cuidados de saúde de que necessita em outra unidade hospitalar, in
casu, o Hospital Pediátrico de Coimbra.
292. Nesse sentido, atentas as atribuições e competências da ERS, revela-se oportuna e
necessária uma intervenção regulatória da ERS, no sentido de assegurar a adequação
do comportamento futuro do CHLN à necessidade de garantir em permanência o
respeito pelo direito dos utentes de acesso à informação contida no seu processo
clínico.
293. E que implicará que o prestador implemente os procedimentos que se revelem
necessários a garantir, de forma permanente e em qualquer situação:
(i) a resposta em tempo útil aos pedidos dos utentes de acesso à informação
clínica; e
(ii) a transferência imediata do processo clínico dos utentes para outras
unidades de saúde, sempre que tal lhe seja solicitado ou quando se tenha
verificado uma referenciação ou transferência do utente .
294. Assume especial gravidade o facto de o CHLN-HSM ser reincidente nesta matéria,
uma vez que foi já alvo de uma Instrução, no âmbito do Processo de Inquérito n.º
ERS/74/12, com o sentido e conteúdo seguintes:
“[…]
d) O Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE deve elaborar e implementar os
procedimentos que se revelem necessários a garantir, de forma permanente e em
qualquer situação, a resposta em tempo útil aos pedidos dos utentes de acesso à
informação contida no seu processo clínico;
e) O Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE deve, nomeadamente para efeito de
cumprimento da alínea anterior, garantir uma melhor articulação entre o Serviço de
Gestão Hospitalar e os serviços de ação médica;
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f) O Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE deve elaborar e implementar os
procedimentos que se revelem necessários a garantir, de forma permanente e em
qualquer situação, a transferência imediata do processo clínico dos utentes para
outras unidades de saúde, sempre que tal lhe seja solicitado, ou quando se tenha
verificado uma referenciação ou transferência do utente.
[…]”.
295. Importando recordar que a referida instrução foi emitida ao CHLN-HSM, por
deliberação do então Conselho Diretivo da ERS de 21 de agosto de 2013, e que da
mesma constava a menção de que “A instrução ora emitida constitui decisão da ERS,
sendo que a alínea b) do n.º 1 do artigo 51.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de
Maio, configura como contraordenação punível in casu com coima de € 1000,00 a € 44
891,81, “[….] o desrespeito de norma ou de decisão da ERS que, no exercício dos
seus poderes, determinem qualquer obrigação ou proibição”;
296. E, ainda, que foi dado uma prazo de 120 dias contados da referida deliberação para
o CHLN-HSM garantir os procedimentos necessários ao cumprimento da referida
instrução.
297. Nessa sequência, o CHLN-HSM, através de comunicação recebida pela ERS, no dia
15 de janeiro de 2014, veio informar dos procedimentos por si adotados para
cumprimento da instrução emitida.
298. Concretamente veio o prestador remeter
(i) Cópia da informação interna divulgada a todos os profissionais de saúde,
alertando-os sobre a necessidade de registo eletrónico da informação
clínica dos utentes – cfr. referido no ponto 1 do ofício INF.68/13GJ, de
30.09.2013;
(ii) Cópia do Regulamento do Arquivo Clínico Central – cfr. referido no ponto 2
do ofício INF.68/13GJ, de 30.09.2013.
(iii) O Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E. veio ainda informar que o Módulo
de Gestão Hospitalar para Relatórios Clínicos se encontra já em fase
experimental de desenvolvimento.
299. Pelo exposto, e considerando que os factos constantes dos presentes autos são
contemporâneos quer da data da emissão de deliberação pela ERS, quer da data da
comunicação das medidas adotadas pelo prestador, importa neste momento reiterar a
instrução então emitida ao CHLN-HSM quanto ao acesso e transferência do processo
clínico.
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IV. AUDIÊNCIA DOS INTERESSADOS
300. A presente deliberação foi precedida de audiência escrita dos interessados, nos
termos e para os efeitos do disposto no artigo 122.º do Código do Procedimento
Administrativo, aplicável ex vi artigo 24.º dos Estatutos da ERS, tendo, para o efeito,
sido chamados a pronunciar-se, relativamente ao projeto de deliberação da ERS, a
reclamante e o prestador envolvidos.
301. Decorrido o prazo concedido para a referida pronúncia, a ERS rececionou a
pronúncia unicamente da reclamante, com data de 26 de outubro de 2015 (referência:
EXP/45584/15), não tendo, porém, recebido qualquer pronúncia por parte do
prestador.
IV.1 Da pronúncia da reclamante
302. Em sede de audiência de interessados, veio a reclamante pronunciar-se nos
seguintes termos:
“[…]
1) Relativamente ao ponto 21, lii), não houve esclarecimento do Hospital de Santa
Maria(…) . (…). Que outros Pais optariam por outra solução?
Ainda não compreendemos por que razão tivemos de nos endividar e pagar
cirurgia/internamento/alojamento/alimentação/viagens de dezenas de milhares de
euros, quando no nosso país a técnica cirúrgica de um centro altamente
especializado é desconhecida e, por conseguinte, não é realizada. (…). Quando
um paciente "descobre" um centro apropriado para se tratar no estrangeiro, tem
de aceitar por razões económicas o tratamento proposto no nosso país, ainda que
não seja o melhor e o mais indicado para o caso?
Em suma, não sentimos que tivéssemos alternativa em Portugal, alegada pelo
neurocirurgião, pois a cirurgia não era a mesma.
2) (…). (…) Portanto, não sentimos que tivéssemos alternativa em Portugal.
3) Relativamente à transferência do processo do HSM para o Hospital Pediátrico
de Coimbra, o prestador refere no ponto 17 (pág. 8) que "não se justificava
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qualquer tipo de encaminhamento por parte do CHLN", pois a nossa filha já era
seguida em Coimbra. No entanto, não é seguida em Coimbra em neurocirurgia,
mas sim noutras especialidades.
4) Esclarecemos que, já no ponto 167, o pai da Maria Rita recebeu em Portugal,
via correio, a informação desfavorável para aceder ao documento portátil S2
relativo à cirurgia de junho de 2013, apenas (…) em Paris (19/06/2013). Ou seja,
para além de estarmos a lidar com o desgaste inerente a esta delicada cirurgia no
estrangeiro, estávamos a lidar em simultâneo com a total falta de dinheiro e
aflição que aquela resposta implicava. Não contávamos, de facto, com um parecer
desfavorável.
5) No ponto 255, não corresponde à verdade que fosse dito pelo médico que o
prazo previsto para a cirurgia proposta em março de 2013 no HSM fosse possível
"de um a dois meses". Na verdade, (…) a Mãe questionou o neurocirurgião sobre
o prazo aproximado, até para perceber a gravidade e urgência do caso, sendo
verdade que o mesmo justificou que não conseguiria atribuir um prazo. A Mãe
inquiriu-o novamente nos seguintes termos: " - Mas será daqui a uma semana, um
mês, um ano?", tendo sido a resposta, não um ou dois meses, mas "- Mãe, é este
ano." (estávamos em finais de março de 2013). Obviamente que não conseguimos
provar estes discursos orais, apenas justificamos o nosso entender de que aquela
previsão foi determinante para aceitarmos a cirurgia de Paris marcada pouco
depois (para 19/06/2013), numa consulta a que fomos para obtermos uma
"segunda opinião". A nossa opção não se deveu à demora excessiva como consta
no ponto 255, mas sim ao total desconhecimento do timing aproximado em
Portugal. Levámos para Paris apenas a certeza de que ocorreria até dezembro de
2013, estando em lista de espera. Entre a consulta em Lisboa e a ida à primeira
consulta em Paris, cerca de duas semanas, (…), pelo que não hesitámos em
confiar na resposta possivelmente mais célere de Paris. Quem agiria de outra
forma?
6) Quanto ao ponto 288, lamento informar que ainda não foi possível a nossa filha
ser seguida em neurocirurgia no Hospital Pediátrico de Coimbra (!). Estamos
desde março de 2013 sem consulta de seguimento de neurocirurgia em
Portugal…Temos já o processo de neurocirurgia do HSM connosco graças às
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diligências da ERS, mas ainda não conseguimos consulta em Coimbra. (…)
Obviamente que respeitamos todas as consultas marcadas para a nossa filha e
ligámos a pedir adiamento mais do que justificado da referida consulta. Sem
qualquer remarcação, em agosto de 2015 o Pai dirigiu-se pessoalmente aos
serviços da neurocirurgia para voltar a pedir consulta, tendo sido informado que
não remarcaram porque o computador acusava "falta" à consulta de maio, mas
que não nos preocupássemos, pois iríamos receber carta de remarcação dentro
de 15 dias. Até hoje. A nossa tentativa de pedir consulta de neurocirurgia através
do nosso médico de família, em outubro de 2014, também não surtiu qualquer
efeito até hoje.
[…]” – cfr. pronúncia da reclamante de 26 de outubro de 2015.
IV.3 Análise dos fundamentos da pronúncia da reclamante
303. Cumpre analisar os elementos invocados na pronúncia da reclamante, aferindo da
suscetibilidade dos mesmos infirmarem ou alterarem a deliberação projetada.
304. As declarações prestadas na pronúncia da reclamante foram consideradas e
ponderadas pela ERS.
305. Verificando-se, em síntese, que a reclamante não contestou o quadro factual e
jurídico apresentado pela ERS no seu projeto de deliberação, antes apontando e
corrigindo alegadas imprecisões referentes, não ao referido projeto de deliberação,
mas às respostas do prestador no âmbito das diligências realizadas pela ERS.
306. E, sendo assim, a pronúncia da reclamante em nada altera o conteúdo do projeto de
deliberação elaborado, razão pela qual a deliberação deve manter in totum o sentido
do projeto tal como emitido e regularmente notificado.
307. Ainda assim, importa sublinhar, no que respeita aos pontos 1) e 2) da pronúncia da
reclamante, que o conteúdo dos mesmos versa matéria eminentemente clínica,
contestando a reclamante, nomeadamente, os juízos e entendimentos clínicos dos
profissionais médicos envolvidos.
308. Ora, a avaliação clínica dos cuidados médicos prestados não se inscreve no
catálogo competencial previsto nos Estatutos da ERS, razão pela qual não cabe a
esta entidade pronunciar-se ou emitir juízos a esse respeito.
309. Quanto ao alegado pela reclamante no ponto 5), sem prejuízo do aduzido em sede
do projeto de deliberação, importa notar que, tendo a utente sido inscrita na Lista de
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Inscritos para Cirurgia (LIC), no âmbito do SIGIC, em 27 de março de 2013, e
possuindo a cirurgia Prioridade Normal;
310. O Tempo Máximo de Resposta Garantido (TMRG) para a cirurgia era, de acordo
com o Anexo n.º I da Portaria n.º 1529/2008, de 26 de dezembro, aplicável à data dos
factos15, de 270 dias (9 meses).
311. Ou seja, o TMRG estender-se-ia até, aproximadamente, ao dia 27 de dezembro de
2013.
312. Razão pela qual, ainda que a previsão do médico tivesse sido, como alega a
reclamante e ao contrário do alegado pelo prestador, a de que a cirurgia seria realizada
até ao final do ano de 2013,
313. Essa previsão sempre acabaria por estar sensivelmente “dentro” do TMRG
legalmente aplicável, porquanto este apenas terminaria no dia 27 de dezembro de
2013.
V. DECISÃO
314. Tudo visto e ponderado, o Conselho de Administração da ERS delibera, nos termos
e para os efeitos do preceituado nas alíneas a) e b) do artigo 19.º e alínea a) do artigo
24.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto,
emitir uma instrução ao Centro Hospitalar de Lisboa Norte, E.P.E. – Hospital de Santa
Maria, nos seguintes termos:
a) O Centro Hospitalar de Lisboa Norte, E.P.E. – Hospital de Santa Maria deve
proceder à atualização, completa e total, dos seus procedimentos internos no
que respeita aos cuidados de saúde transfronteiriços, em conformidade e no
respeito pela Lei n.º 52/2014, de 25 de agosto e pela Portaria n.º 191/2014,
de 25 de Setembro;
b) O Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E. – Hospital de Santa Maria deve
garantir, em permanência, através da emissão e divulgação de ordens e
orientações claras e precisas, que os procedimentos adotados e a adotar
para cumprimento da instrução sejam corretamente seguidos e respeitados
por todos os profissionais de saúde, incluindo a realização de ações de
formação;
15
Entretanto revogada pela Portaria n.º 87/2015, de 23 de março.
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c) O Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E. – Hospital de Santa Maria deve
proceder, de imediato, à revisão e atualização do seu Regulamento Interno
nesta matéria, em conformidade e no respeito pela Lei n.º 52/2014, de 25 de
agosto e pela Portaria n.º 191/2014, de 25 de Setembro;
d) O Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E. – Hospital de Santa Maria deve
publicitar e divulgar, através da afixação de cartazes ou outros suportes
informativos, a existência do Setor de Assistência Médica no Estrangeiro,
onde os utentes se poderão informar em matéria de acesso a cuidados de
saúde transfronteiriços;
e) O Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E. – Hospital de Santa Maria deve
garantir o efetivo acompanhamento dos utentes e acompanhar a evolução da
sua condição clínica, devendo, para o efeito, assegurar que as consultas são
realizadas em tempo adequado, útil e clinicamente aceitável, não podendo as
mesmas ser adiadas por períodos de tempo sucessivos e manifestamente
exagerados no tempo, por forma a não prejudicar o percurso para o
restabelecimento do seu estado de saúde, com prontidão e correção técnica;
f) O Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E. – Hospital de Santa Maria deve
garantir, em permanência, o direito dos utentes dos serviços de saúde de
acesso ao seu processo clínico, de acordo com as regras e orientações a
cada momento aplicáveis, designadamente, de acordo com a legislação em
vigor;
g) O Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E. – Hospital de Santa Maria deve
elaborar e implementar os procedimentos que se revelem necessários a
garantir, de forma permanente e em qualquer situação, a resposta em tempo
útil aos pedidos dos utentes de acesso à informação contida no seu processo
clínico;
h) O Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E. – Hospital de Santa Maria deve
elaborar e implementar os procedimentos que se revelem necessários a
garantir, de forma permanente e em qualquer situação, a transferência
imediata do processo clínico dos utentes para outras unidades de saúde,
sempre que tal lhe seja solicitado ou quando se tenha verificado uma
referenciação ou transferência do utente;
i) O Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E. – Hospital de Santa Maria deve dar
cumprimento imediato à instrução emitida, bem como dar conhecimento à
ERS, no prazo máximo de 30 dias após a notificação da deliberação final, das
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medias e/ou procedimentos por si adotados para cumprimento do
determinado nos pontos anteriores.
315. As instruções ora emitidas constituem decisão da ERS, sendo que a alínea b) do n.º
1 do artigo 61.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22
de agosto, configura como contraordenação punível, in casu com coima de 1000,00
EUR a 44 891,81 EUR, “[….] o desrespeito de norma ou de decisão da ERS que, no
exercício dos seus poderes regulamentares, de supervisão ou sancionatórios,
determinem qualquer obrigação ou proibição, previstos nos artigos 14º, 16º, 17º, 19º,
20º, 22º e 23º”.
316. A presente deliberação será dada a conhecer à Administração Central do Sistema
de Saúde, I.P..
317. A versão não confidencial da presente deliberação será publicitada no sítio oficial
da Entidade Reguladora da Saúde na Internet.
O conselho de Administração.
Porto, 27 de novembro de 2015.