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DEFINIÇÃO DAS CONDIÇÕES DE CONTORNO E CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO TERMO-ENERGÉTICO DE HIS RESUMO O presente trabalho tem por objetivo definir as condições de contorno e os critérios de avaliação de desempenho termo-energético de uma habitação de interesse social (HIS), de forma a proceder uma análise dos valores recomendados pela NBR 15220 parte 3 e considerados como limites de transmitância térmica, atraso térmico e fator de calor solar, tanto para fechamentos verticais quanto horizontais, para as zonas bioclimáticas 1, 2 e 3. Para isso será definida uma tipologia para a HIS que se enquadre na realidade nacional atual. A mesma será modelada, com a utilização de um programa de simulação termo-energética de edificações, o DesignBuilder. A análise dos resultados nos dará condições de propor novas prescrições normativas com relação a estes valores, para as diferentes zonas bioclimáticas estudadas. O desempenho térmico da edificação será avaliado através do percentual de horas de conforto, com base na carta bioclimática de Givoni adaptada para países de clima quente em desenvolvimento, e a análise de desempenho energético através de graus-hora de refrigeração e aquecimento. Esta análise será feita tanto para a edificação como um todo quanto para os dormitórios, durante o período noturno, acordando com o RTQ-R (INMETRO, 2010). Liader S. Oliveira (1), Antônio Cesar S. B. da Silva (2), Eduardo Grala da Cunha(2) e Mônica M. Pinto (3) 1 Mestrando, Universidade Federal de Pelotas Pelotas, RS, 96010-020, Brasil 2 Prof. Dr., Universidade Federal de Pelotas Pelotas, RS, 96010-020, Brasil 3 Bolsista Acadêmica, Universidade Federal de Pelotas Pelotas, RS, 96010-020, Brasil [email protected] , [email protected] , [email protected] , [email protected]

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Page 1: Definição de condições do entorno e critérios de avaliação de

DEFINIÇÃO DAS CONDIÇÕES DE CONTORNO E

CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO

TERMO-ENERGÉTICO DE HIS

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo definir as condições de contorno e os

critérios de avaliação de desempenho termo-energético de uma habitação de

interesse social (HIS), de forma a proceder uma análise dos valores

recomendados pela NBR 15220 – parte 3 e considerados como limites de

transmitância térmica, atraso térmico e fator de calor solar, tanto para

fechamentos verticais quanto horizontais, para as zonas bioclimáticas 1, 2 e 3.

Para isso será definida uma tipologia para a HIS que se enquadre na realidade

nacional atual. A mesma será modelada, com a utilização de um programa de

simulação termo-energética de edificações, o DesignBuilder. A análise dos

resultados nos dará condições de propor novas prescrições normativas com

relação a estes valores, para as diferentes zonas bioclimáticas estudadas. O

desempenho térmico da edificação será avaliado através do percentual de

horas de conforto, com base na carta bioclimática de Givoni adaptada para

países de clima quente em desenvolvimento, e a análise de desempenho

energético através de graus-hora de refrigeração e aquecimento. Esta análise

será feita tanto para a edificação como um todo quanto para os dormitórios,

durante o período noturno, acordando com o RTQ-R (INMETRO, 2010).

Liader S. Oliveira (1), Antônio Cesar S. B. da Silva (2), Eduardo Grala da Cunha(2) e Mônica M. Pinto (3) 1Mestrando, Universidade Federal de Pelotas

Pelotas, RS, 96010-020, Brasil 2Prof. Dr., Universidade Federal de Pelotas

Pelotas, RS, 96010-020, Brasil 3 Bolsista Acadêmica, Universidade Federal de Pelotas

Pelotas, RS, 96010-020, Brasil

[email protected], [email protected], [email protected], [email protected]

Page 2: Definição de condições do entorno e critérios de avaliação de

Palavras-chave: condições de contorno, desempenho termo-energético,

habitação de interesse social.

ABSTRACT

The present work aims to define the boundary conditions and the criteria for

evaluation of the thermal and energy performance of a social housing (HIS), in

order to proceed an analysis from the recommended and considered values as

limits by the NBR 15220-Part 3 for thermal transmittance, thermal lag factor and

solar heat for both vertical and horizontal partitions, in bioclimatic zones1, 2 and

3. To reach this aim, will be defined a HIS design that is representative of the

national reality current. It will be modeled with the use of DesignBuilder energy

building simulation program. The results will give us conditions to propose new

normative prescriptions with respect to these values, including the possibility of

getting correlations among intervals of these variables for different bioclimatic

zones studied. The thermal performance of the building will be evaluated

through the percentage of comfort hours, based on the Givoni´s bioclimatic

chart adapted to hot climate in development countries. The analysis of energy

performance will be evaluated through of cooling and heating degree-hours.

This analysis will be made as for the whole building as for the bedrooms during

the nocturnal period, agreeing with the RTQ-R (INMETRO, 2010).

Keywords: boundary conditions, thermal-energetic performance, social

housing.

1. INTRODUÇÃO

Segundo dados do Programa Nacional de Amostra por Domicílios (PNAD) de

2008, para zerarmos o déficit habitacional nacional precisaríamos construir

quase 5,6 milhões de moradias e, somente na região sul do país, cerca de 590

mil moradias. Os elevados recursos financeiros que estão sendo

disponibilizados para a redução deste déficit, porém, não garantem a qualidade

das moradias. Historicamente as políticas habitacionais adotadas para

Page 3: Definição de condições do entorno e critérios de avaliação de

enfrentar este déficit estimularam a busca por novos sistemas construtivos, a

utilização de materiais de baixa qualidade e a redução do espaço da moradia,

entre outros problemas, procurando adaptar-se aos valores limites de

financiamentos disponibilizados (Santos, 1995).

A preocupação crescente com o nível de conforto dos usuários e,

principalmente, com o consumo desnecessário de energia de edificações mal

projetadas ou construídas com materiais não adequados conduziu a uma

recente normatização sobre o tema. A Associação Brasileira de Normas

Técnicas (ABNT) aprovou, nos últimos anos, duas normas: a NBR 15220 -

Desempenho Térmico de Edificações – em 2005 e a NBR 15575 –

Desempenho de Edifícios Habitacionais de até Cinco Pavimentos – em 2008.

A NBR 15220, em sua parte 3, define recomendações quanto ao

desempenho térmico de habitações unifamiliares de interesse social, indicando

as diretrizes construtivas e as estratégias bioclimáticas mais adequadas para

diversas zonas bioclimáticas. Muitas das prescrições contidas na norma,

principalmente em relação às características físicas dos fechamentos

(transmitância térmica, atraso térmico e fator de calor solar), têm sido

contestadas em trabalhos de pesquisadores da área. Cabe salientar que hoje

as ferramentas computacionais de simulação são muito mais confiáveis e

completas do que no final da década de 90, quando a norma foi elaborada.

Matos (2007) observou, através de um processo de simulação computacional

em habitações com o uso de ventilação natural, que a limitação do atraso

térmico previsto na norma não se justificaria, em função de que todas as

paredes com transmitância dentro dos limites estabelecidos apresentam

semelhança nos resultados de graus-hora para a zona bioclimática 3. Pereira

(2009), que estudou a importância do envelope no desempenho térmico em

uma habitação ocupada e ventilada naturalmente em Florianópolis, zona

bioclimática 3, chegou à conclusão que, mais do que a transmitância térmica, a

capacidade térmica dos fechamentos tem uma correlação positiva com o

conforto térmico no interior das edificações. A própria NBR 15575, posterior à

NBR 15220, utiliza a capacidade térmica e não o atraso térmico como limitador,

Page 4: Definição de condições do entorno e critérios de avaliação de

mesmo critério do Regulamento Técnico da Qualidade para o Nível de

Eficiência Energética de Edificações Residenciais, o RTQ-R (INMETRO, 2010).

2. OBJETIVOS

O presente trabalho tem por objetivo discutir a geometria e as condições de

contorno (densidade de carga de equipamentos e iluminação, padrão de

ocupação, setpoints de ventilação natural, arquivo climático, etc.) da habitação

de interesse social (HIS) que será objeto do processo de simulação

computacional, bem como definir os critérios de análise de desempenho termo-

energético que servirão de base para a revisão das recomendações da NBR

15220-3 em relação às características físicas dos fechamentos (transmitância

térmica, atraso térmico e fator de calor solar). Além disso objetiva também

apresentar o estudo-piloto que confirma a hipótese da necessidade de revisão

da NBR 15220-3.

3. METODOLOGIA

A metodologia deste trabalho é dividida em três etapas:

3.1. Caracterização da HIS a ser analisada.

3.2. Definição dos critérios de análise de desempenho termo-energético da

edificação.

3.3. Estudo-piloto.

3.1. CARACTERIZAÇÃO DA HIS

Definição da tipologia da edificação

Já foram realizados estudos utilizando um modelo de habitação para famílias

de renda de até 3 salários mínimos, resultado da tese de doutorado de Sérgio

Tavares, “Metodologia para análise do ciclo de vida energético de edificações

residenciais brasileiras” (2006, UFSC). É uma edificação de 2 dormitórios, sala,

cozinha e banheiro, de 63m², que representa uma média obtida através dos

Page 5: Definição de condições do entorno e critérios de avaliação de

dados do PNAD de 2005. Porém, verificando as especificações mínimas que

constam no site do Ministério das Cidades para o programa Minha Casa Minha

Vida “2” e os planos de obras dos municípios de Curitiba, Pelotas e

Florianópolis, zonas bioclimáticas 1, 2 e 3, respectivamente, aliado aos valores

de financiamento garantidos pelos programas habitacionais, deve-se adotar

para estudo uma habitação que represente a tendência atual da construção

civil no país. Segundo reportagem veiculada no Jornal Diário Popular (Pelotas),

em 04 de outubro de 2011, estavam sendo construídas no município cerca de

1300 HIS, sendo que a área total das mesmas está compreendida entre 35 e

42m².

Com base nisto modelou-se uma habitação que atende a todas as

especificações. Ela possui dois dormitórios, sala e cozinha conjugadas e

banheiro, totalizando 40,8m², conforme figura 1- Planta baixa da edificação.

Figura 1. Planta baixa da edificação

Definição das condições de contorno da edificação

Os programas de simulação termoenergética de edificações possibilitam

quantificar, através da inserção de um arquivo climático que reproduz as

condições do clima de determinada região, a influência das variáveis

Page 6: Definição de condições do entorno e critérios de avaliação de

arquitetônicas no desempenho térmico e energético das edificações. São

ferramentas valiosas para o projetista, mas exigem um conhecimento

aprofundado a respeito das diversas variáveis envolvidas no balanço térmico

de uma edificação (Batista et al, 2005). Isto é fundamental para assegurar que

os dados de saída das simulações sejam analisados de forma correta, e sua

aplicação na busca de edificações térmica e energeticamente eficientes possa

garantir a satisfação dos usuários. As condições de contorno definidas para a

edificação estão descritas a seguir.

Programa de simulação:

O DesignBuider, software que será utilizado neste trabalho, dispõe de

recursos amigáveis para modelagem da geometria e para a inserção de dados

de entrada dos sistemas construtivos e rotinas de ocupação e utilização da

edificação. Utiliza os algoritmos do EnergyPlus, que apresenta funções mais

elaboradas para simulação do balanço térmico, além de maior precisão na

simulação para ambientes não condicionados (Venâncio, 2007).

Arquivos Climáticos:

Conforme o RTQ-R (INMETRO, 2010) o arquivo climático a ser utilizado para

o processo de simulação computacional deve, no mínimo, fornecer valores

horários para todos os parâmetros relevantes requeridos pelo programa de

simulação, como temperatura e umidade do ar, direção e velocidade do vento,

radiação solar, etc. Devem ser utilizados arquivos climáticos disponibilizados

pelo Departamento de Energia dos Estados Unidos ou no site do

PROCEL/ELETROBRÁS, como TRY ou TMY e, além disso, os dados devem

ser representativos da zona bioclimática onde o projeto está inserido. Para o

presente trabalho os arquivos climáticos utilizados serão:

Zona Bioclimática 1: arquivo TRY da cidade de Curitiba/PR;

Zona Bioclimática 2: arquivo TMY da cidade de Santa Maria/RS.

Zona Bioclimática 3: arquivo TRY da cidade de Florianópolis/SC.

Page 7: Definição de condições do entorno e critérios de avaliação de

Padrões de ocupação e utilização:

Quanto aos padrões de uso e ocupação dos ambientes, bem como uso e

densidade de potência da iluminação e cargas internas de equipamentos foram

utilizados os padrões descritos no Regulamento Técnico da Qualidade para o

Nível de Eficiência Energética de Edificações Residenciais (RTQ-R, 2010), que

também serviu de base para definição da taxa metabólica das atividades

desempenhadas em cada ambiente.

Definição da temperatura do solo:

Em relação à temperatura do piso deverá ser utilizado o programa SLAB,

vinculado ao EnergyPlus, para calcular a temperatura média do solo para cada

mês do ano, com base nos valores médios de temperaturas internas e externas

da edificação para o clima escolhido, levando em conta sua geometria,

elementos construtivos e padrões de uso e ocupação. Em função do número

total de simulações, para as três zonas bioclimáticas, ser próximo a 1.000, é

inviável definirmos a temperatura, por este método, para cada caso, pois

duplicaríamos o número de simulações a serem realizadas. Propõe-se então

um estudo inicial para verificar as temperaturas do solo para fechamentos com

alta e baixa transmitância, além do caso-base, procurando-se utilizar, a partir

da análise dos resultados obtidos, um valor de temperaturas do solo para cada

zona bioclimática, definida através da utilização do programa SLAB para o

caso-base.

Fechamentos:

O programa de simulação considera todos os componentes formados por

camadas transversais ao fluxo de calor, não permitindo o cálculo de

resistências térmicas em paralelo. Desta forma foi utilizado o trabalho de

Ordenes et al (2003) que desenvolveu um modelo de construção de um

componente equivalente para ser inserido no programa. As características dos

fechamentos, tanto do caso-base quanto das alternativas de simulação estão

definidas a seguir.

Page 8: Definição de condições do entorno e critérios de avaliação de

Caso-base:

Para a caracterização dos materiais e elementos construtivos, que comporão

os fechamentos da edificação para o caso-base, foram definidas as

propriedades térmicas de paredes externas e cobertura, com base nos limites

estabelecidos pela ABNT NBR 15220 parte 3, em função do zoneamento

bioclimático, conforme tabela 1 – transmitância térmica, atraso térmico e fator

de calor solar admissíveis para cada tipo de fechamento. Para as zonas 1 e 2

as paredes devem ser leves e a cobertura leve e isolada. Para a zona 3 as

paredes devem ser leves e refletoras e a cobertura deve ter as mesmas

propriedades das zonas já referenciadas.

Tabela 1 - Transmitância térmica, atraso térmico e fator de calor solar admissíveis para cada tipo de

vedação

Fonte: Adaptado de NBR 15220 – parte 3, anexo C, tabela C.2, 2005.

Configurações para simulação:

Para a definição das alternativas a serem analisadas a partir do processo de

simulação computacional, de forma a atender aos objetivos do trabalho, serão

fixados valores de transmitância térmica que abranjam os valores de

transmitância das paredes e coberturas listadas na NBR 15220-3 (de 1,0W/m²K

a 5,0W/m²K) e, a partir daí, serão testados fechamentos com atrasos térmicos

de 1 a 11 horas, que também estão contidos na norma.

Em relação ao fator de calor solar, todas as configurações serão testadas

para as absortâncias de 20, 50 e 70%. Estes valores foram definidos de forma

a utilizar as cores claras, médias e escuras, tomando por base os valores

iniciais da tabela de Lamberts et al (2004).

Page 9: Definição de condições do entorno e critérios de avaliação de

As configurações a serem simuladas estão indicadas na figura 2 –

configurações de simulação.

Figura 2. Configurações de simulação

Orientação solar:

Em relação à orientação solar a edificação, por possuir aberturas apenas em

duas orientações, o que viabiliza inclusive a sua construção em fita, será

simulada sobre os eixos norte-sul e leste-oeste.

Ventilação natural:

A edificação será analisada utilizando o padrão de uso da ventilação natural

com controle automático por temperatura. Nesta opção as janelas somente

serão abertas se, concomitantemente, a temperatura do ar no interior da

edificação estiver acima da temperatura de setpoint de ventilação e também for

maior que a temperatura do ar no exterior. Além disso, o horário de

funcionamento deve estar habilitando para utilização da ventilação natural.

Como a edificação possui venezianas nas aberturas, proporcionando controle

de entrada de radiação solar e segurança, as janelas estão habilitadas para

abertura nas 24 horas do dia. A temperatura de setpoint foi definida em 25ºC,

com base em trabalho de Martins et al (2009).

Page 10: Definição de condições do entorno e critérios de avaliação de

O padrão de utilização das venezianas procura atender aos critérios de

segurança, ao mantê-las fechadas durante a noite, e às recomendações da

NBR 15220 – 3, que indicam para a zona bioclimática 1, durante o período frio,

e para as zonas 2 e 3, durante o período de inverno, que as janelas permitam a

entrada de radiação solar na edificação.

3.2. DEFINIÇÃO DOS CRITÉRIOS DE ANÁLISE DE DESEMPENHO

TERMO-ENERGÉTICO DA EDIFICAÇÃO

Os resultados obtidos serão analisados de duas formas. A primeira é através

de uma análise comparativa dos desempenhos de cada modelo com base na

porcentagem de horas de conforto, considerando a zona de conforto adaptada

de Givoni (1992). Para isso foi utilizado o programa computacional Analysis

Bio, inserindo os valores horários de temperatura e umidade relativa do ar

obtida em cada modelo simulado, para o ano inteiro. Os resultados serão

analisados para toda a edificação, nas 24 horas do dia, e para os dormitórios,

no período noturno, das 21 às 8 horas, quando a ocupação destes ambientes é

de 100%, de acordo com metodologia adotada no RTQ-R (INMETRO, 2010).

A segunda forma de análise é através do número de graus-hora, nos mesmos

padrões da análise anterior. Está análise será utilizada como um indicador

energético que possibilite a quantificação da energia requerida para que as

temperaturas da zona de conforto sejam reestabelecidas nos ambientes

analisados, indicando a eficiência energética das alternativas simuladas.

As temperaturas-base para aquecimento e resfriamento serão de 18 e 29ºC,

isto é, as temperaturas da zona de conforto de Givoni para países em

desenvolvimento, que deram sustentação para a elaboração da NBR 15220 -

parte 3.

3.3. ESTUDO-PILOTO

As dúvidas levantadas a partir dos trabalhos de Matos (2007) e Pereira

(2009), bem como a mudança de parâmetros de análise constantes nas

normas e regulamentos mais recentes, como a NBR 15575 (2008) e o RTQ-R

(2010), suscitaram a realização de um estudo-piloto para, inicialmente,

Page 11: Definição de condições do entorno e critérios de avaliação de

confirmar a hipótese de que as recomendações da NBR 15220, em sua parte

3, quanto às características do envelope da edificação, não expressam

totalmente a realidade.

Este estudo se baseou na mesma metodologia que será utilizada no trabalho,

tanto em relação às configurações da edificação, quanto em relação à

geometria e padrões de uso e utilização de equipamentos, uso da ventilação

natural, com rotinas para abertura e fechamento de vidros e venezianas. Em

relação às características construtivas, utilizando os limites estabelecidos pela

NBR 15220-3 para configurar os materiais dos fechamentos da edificação,

chamada de caso-base. Com relação à orientação solar da edificação a mesma

foi simulada com as aberturas orientadas para norte-sul e leste-oeste,

conforme figura 3 – orientação dos modelos.

(a) (b)

Figura 3 – Orientação dos modelos: (a)leste-oeste (b)norte-sul

A partir daí, através do processo de simulação computacional,

estabeleceram-se os índices de conforto térmico para os limites da norma, com

a utilização do programa Analysis-Bio (LabEEE, UFSC, 2010).

Em um segundo momento modificou-se as características físicas do

envelope, utilizando como fechamento vertical uma parede dupla de tijolos

furados, assentados na menor dimensão, e que não é recomendado para as

zonas bioclimáticas 1, 2 e 3 por ter uma atraso térmico de 6,5 horas, superior

ao limite da norma, que é de 4,3 horas, apesar de ter uma transmitância

térmica de 1,52 W/m²K, valor muito inferior aos limites da norma. Foram

testadas duas configurações, apenas com mudança na absortância do

Page 12: Definição de condições do entorno e critérios de avaliação de

fechamento vertical. Na configuração 1 a absortância solar foi de 0,82,

mantendo-se o fator solar em 5%, que é o limite da norma. Na configuração 2,

porém, não se alterou a cor do fechamento em relação ao caso-base. As três

configurações estudadas estão representadas na figura 4 – configurações de

simulação. Na figura 4, abaixo da parede utilizada, apresenta-se a resistência

equivalente da mesma, modelada no Design Builder através da metodologia

desenvolvida no trabalho de Ordenes et al (2003).

O estudo foi realizado para a zona bioclimática 2, onde está inserido o

município de Pelotas (RS), utilizando-se o arquivo climático .TMY da cidade de

Santa Maria (RS).

Figura 4 – configurações de simulação

Os resultados, mostrados no gráfico 1 – índices de conforto, indicam que os

índices de conforto térmico foram superiores para a edificação que utilizou a

parede dupla de tijolos furados, com maior atraso térmico e menor

transmitância. Na zona bioclimática 2, que foi analisada neste estudo-piloto e

onde está inserido o município de Pelotas, o conforto obtido no caso-base foi

de 65,4%, enquanto com a parede dupla este valor subiu para 73,6% das

horas, na configuração 1 e 69,9% na configuração 2, durante todo o ano, para

a edificação disposta com as aberturas nas orientações leste-oeste. Os valores

obtidos com as aberturas na orientação norte-sul mostrou o aumento do

percentual de conforto de 65,4% do caso-base para 73,5% na configuração 1 e

70,2% na configuração 2. Para o dormitório de casal, analisado no período

noturno (21-8hs), com aberturas para leste e norte, os valores foram diferentes,

Page 13: Definição de condições do entorno e critérios de avaliação de

porém a configuração 1 se mostrou novamente a mais vantajosa. A maior

temperatura interna no dormitório de casal, neste horário, foi no dia 24/12, às

21hs. No caso-base foi de 32,5ºC e 33ºC, para as aberturas para leste e norte,

respectivamente. Na configuração 1 estes valores subiram para 33,1 e 33,5ºC,

respectivamente, e na configuração 2, os valores foram 32,7ºC, tanto para a

orientação leste quanto para a norte. A temperatura externa máxima, neste dia,

se deu às 15hs, com 33,8ºC.

Gráfico 1 – índices de conforto (geral e dormitório do casal)

Em relação aos números de graus-hora a parede dupla de tijolos furados

também se mostrou vantajosa, tanto na edificação como um todo quanto

apenas no quarto do casal, resultados mostrados no gráfico 2 – graus-hora

(geral e dormitório do casal).

Gráfico 2 – graus-hora (geral e dormitório do casal)

4. CONCLUSÕES

Os resultados obtidos no estudo-piloto indicam que a parede dupla de tijolos

furados, mesmo não sendo indicada pela NBR 15220 em função do atraso

térmico, proporciona mais conforto, bem como reduz a quantidade de graus-

hora necessários para que a temperatura esteja dentro da zona de conforto,

tanto para a edificação como um todo quanto para o dormitório, no período

noturno (21 às 8 horas), do que o caso-base, cujas características térmicas

Page 14: Definição de condições do entorno e critérios de avaliação de

estão no limite dos valores normatizados. O maior pico de temperatura

observado nas configurações 1 e 2 durante o período noturno de verão, não foi

relevante frente ao melhor desempenho destas configurações durante o

inverno, proporcionando ao longo do ano muito melhores condições de conforto

e economia de energia. Em função disto podemos dizer que as indicações da

norma não se confirmam, e que os limites das características térmicas dos

fechamentos ali indicados devem ser revistos.

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