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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE NÚCLEO DE TECNOLOGIA EDUCACIONAL PARA A SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E SAÚDE DÉBORA SILVA TEIXEIRA RESIDÊNCIA MÉDICA EM MEDICINA DE FAMÍLIA E COMUNIDADE NO RIO DE JANEIRO: O LUGAR DO CUIDADO NA ESTRUTURA CURRICULAR. RIO DE JANEIRO 2009

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

NÚCLEO DE TECNOLOGIA EDUCACIONAL PARA A SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E SAÚDE

DÉBORA SILVA TEIXEIRA

RESIDÊNCIA MÉDICA EM MEDICINA DE FAMÍLIA E COMUNIDADE NO RIO DE JANEIRO: O LUGAR DO CUIDADO NA ESTRUTURA

CURRICULAR.

RIO DE JANEIRO 2009

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Universidade Federal do Rio de Janeiro

Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde

Débora Silva Teixeira

Residência Médica em Medicina de Família e Comunidade no Rio de Janeiro: o lugar do cuidado na estrutura curricular.

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial a obtenção do título de Mestre em Educação em Ciências e Saúde.

Orientadora Profª. Drª. Victoria Maria Brant Ribeiro

Rio de Janeiro 2009

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Teixeira, Débora Silva

Residência Médica em Medicina de Família e Comunidade no Rio de Janeiro: o lugar do cuidado na estrutura curricular/ Débora Teixeira.

– Rio de Janeiro: UFRJ / NUTES, 2009. ix, 136 f. : il. ; 31 cm. Orientadora: Victoria Maria Brant Ribeiro

Dissertação (mestrado) – UFRJ/NUTES, Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Saúde, 2009.

Referências bibliográficas: f. 68-71 1. Medicina de Família e Comunidade. 2. Currículo. 3. Educação em

Saúde - legislação. 4. Educação médica - tendências. 5. Universidade Federal do Rio de Janeiro. 6. Currículo e Ensino -Tese. I. Ribeiro, Victoria Brant. II.Universidade Federal do Rio de Janeiro, NUTES, Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Saúde. III Título.

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Débora Silva Teixeira

Residência Médica em Medicina de Família e Comunidade no Rio de Janeiro: o lugar do cuidado na estrutura curricular.

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial a obtenção do título de Mestre em Educação em Ciências e Saúde.

Rio de Janeiro, 27 de abril de 2009

Aprovada por:

________________________________________________________ Profa. Victoria Maria Brant Ribeiro, Doutora em Educação – UFRJ

__________________________________________________________ Prof. Ricardo Donato Rodrigues, Doutor em Saúde Coletiva – IMS-UERJ __________________________________________________________ Prof. Luiz Augusto Coimbra de Rezende Filho, Doutor em Comunicação – UFRJ

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Dedicatória Ao meu querido Luciano, amigo, companheiro, amor mais que fundamental, que

todo dia me ensina como cuidar com leveza e esperança.

Ao Mistério da vida, que me trouxe para esse caminho de aprendizado, crescimento

e descoberta.

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Agradecimentos

O período de construção deste trabalho foi marcado por diversos acontecimentos na

minha vida pessoal. Passei pelo que os médicos de família gostam de denominar

“crise vital”. Foram várias. Mudei de casa, de estado civil, de emprego algumas

vezes. Viajei, fui a congressos. Li e escrevi. Conheci pessoas. Mudei de idéia. Nesse

período iniciei um processo de autoconhecimento, tão delicioso quanto dolorido.

Todos esses acontecimentos fazem parte de mim, e deste trabalho. Essa foi a

primeira vez que exercitei verdadeiramente a autoria. Em muitos momentos foi um

processo difícil, em que duvidei de minha capacidade e credibilidade. Tenho muitas

pessoas a agradecer. À minha família, pela torcida carinhosa e paciência nos

momentos de ausência. Aos meus alunos e pacientes, fontes de constante desafio e

aprendizado. Aos meus colegas de trabalho nos mais diferentes espaços e amigos

queridos, profissionais de saúde engajados em defesa da vida, do sonho e da

beleza. Aos meus colegas da turma do mestrado NUTES/2007 pela ótima

companhia, pela motivação e crescimento em parceria. À equipe do LCE pela

acolhida cheia de cuidado genuíno. Aos professores da banca avaliadora, por

aceitarem examinar o meu trabalho. E, finalmente, à professora Victoria Brant,

mulher incrível com quem tive o prazer de aprender de tudo um pouco, e que

generosamente me orientou neste processo.

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EPÍGRAFE

“nosce te ipsum et cura te ipsum” Conhece a ti mesmo Cura a ti mesmo

Hipócrates

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RESUMO

Residência Médica em Medicina de Família e Comunidade no Rio de Janeiro: o lugar do cuidado na estrutura curricular.

Estudo que busca construir um panorama da residência médica em Medicina de

Família e Comunidade no Rio de Janeiro, com base na análise de documentos,

classificados em duas categorias – os regulamentares (as leis propriamente ditas), e

os programas oficiais das instituições formadoras no estado do Rio de Janeiro.

Busca-se nestes documentos o lugar do cuidado em saúde - com uma definição

fundamentada na integralidade. As resoluções da CNRM marcam momentos

significativos na história da residência médica em MFC, além de reforçarem a

percepção da residência médica como modelo consolidado de formação na área

médica. Os programas, ainda que tenham como base a resolução 02/2006 da

CNRM, divergem bastante em forma, apresentação e conteúdo. Percebe-se que não

há uma preocupação com a estrutura curricular na elaboração da maioria dos

programas analisados. Pode-se concluir que o lugar que o cuidado integral em

saúde ocupa no modelo de formação é permeado por diversos tensionamentos, e a

garantia de espaços de cuidado para os residentes é uma das possíveis

contribuições do estudo.

Palavras-Chave: RESIDÊNCIA MÉDICA, EDUCAÇÃO MÉDICA, MEDICINA DE

FAMÍLIA E COMUNIDADE, CURRÍCULO.

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ABSTRACT

Family Practice Medical Residency in Rio de Janeiro state: the search for the concept of care in the curricular structure. This study intent to build a panoramic view of Family Medicine Medical Residency in

the state of Rio de Janeiro based on the analysis of documents in two main

categories- the normative documents related to the legislation about medical

residency and the institutions official programs in Rio de Janeiro. We search for the

place of the concept of care in these documents. The CNRM resolutions established

important moments in the history of the family medicine medical residency as a

specialization model in medical education. The programs, mostly based on the

resolution 02/2006, have many forms, presentation and contents. We can notice that

there is no concern about the curricular structure in the majority of the documents

studied. We can conclude that the place of the concept of care in this educational

model is full of tensions and the reflection about the caring opportunities for the

residents is one of the contributions of this study.

Keywords: MEDICAL RESIDENCY, MEDICAL EDUCATION, FAMILY PRACTICE,

CURRICULUM.

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ABREVIATURAS E SIGLAS

RM - Residência Médica

MFC – Medicina de Família e Comunidade

MGC - Medicina Geral e Comunitária

AMB – Associação Médica Brasileira

SBMFC – Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade

ESF – Estratégia Saúde da Família

PSF – Programa Saúde da Família

SUS – Sistema Único de Saúde

APS- Atenção Primária a Saúde

UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro

NUTES - Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde

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SUMÁRIO

Introdução 11

1. A residência médica 16

1.1 Campo de trabalho 16

1.2 Estrutura curricular e o modelo de formação 18

2. A Medicina de Família e Comunidade como disciplina médica 22

2.1 O habitat dos médicos de família e comunidade: Atenção Primária

à Saúde

27

2.2 O cuidado em saúde: um fundamento teórico para a MFC: 33

3. A residência em MFC 38

3.1 Estrutura e funcionamento da MFC 42

3.2 A visão da Sociedade da Especialidade a respeito da Residência 48

3.3 Os modelos pedagógicos de formação para a MFC no Rio de Janeiro

52

3.3.1 Análise do Programa da Instituição 01 52

3.3.2 Análise do Programa da Instituição 02 54

3.3.3 Análise do Programa da Instituição 03 56

3.3.4 Análise do Programa da Instituição 04 58

Considerações finais 61

Bibliografia 66

Anexos – Documentação analisada 73

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INTRODUÇÃO

Ser médico transforma quem somos de diversas maneiras.

Recebemos na graduação uma enorme dose de responsabilidade e uma

quantidade imensa de conhecimento técnico privilegiado, que vêm carregadas de

status social e de possibilidades, posicionamentos perante a vida. Passamos a

conhecer aspectos da vida, da morte e do adoecimento que poucos jovens têm a

oportunidade de experimentar. Apesar disso, as vivências acumuladas no curso de

graduação muitas vezes não se traduzem em segurança pessoal, amadurecimento,

nem possibilidade no mercado de exercer a especialidade médica desejada. Muitos

médicos, então, escolhem a residência médica para alcançar essas habilidades

específicas e ganhar a credibilidade desejada no mercado de trabalho.

Esta fase representa um importante espaço de mudança e crescimento

pessoal e profissional, que transforma a prática, a identidade profissional e o modo

de ser do médico.

O modelo de formação profissional desenvolvido na residência é muito

específico da área da saúde, fortemente ligado ao mundo do trabalho, e por isso

mesmo permeável a todas as mudanças que ocorrem na sociedade.

Apesar das diversas conformações que apresenta, nas diferentes

especialidades e serviços, a residência médica é reconhecida como um espaço

privilegiado de aprendizado e possui ainda um forte status na qualificação

profissional, sendo um dos poucos consensos entre formadores, gestores e

entidades médicas. Anualmente milhares de médicos concorrem por vagas, em

concursos tão disputados que resultaram em um mercado paralelo de cursos

preparatórios.

Neste cenário, a medicina de família e comunidade tem tido uma expansão

singular de seus programas de residência, com investimento prioritário do Estado,

com a expectativa de que esses profissionais consolidem o investimento feito na

Estratégia Saúde da Família nos últimos 15 anos. Esse processo, apesar de não

estar livre das disputas e tensões características do campo das políticas de recursos

humanos e formação profissional na área da saúde, tem resultado em mudanças

significativas nas residências em medicina de família e comunidade. A ação

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heterogênea das gestões locais, a relação entre estados, municípios e instituições

de ensino, dá o tom e o ritmo das mudanças desse cenário em cada região do país.

Muitos programas novos surgiram nos últimos quatro anos, e os mais antigos

reconfiguraram seu modo de trabalho, seja aumentando número de vagas, seja

constituindo programas multiprofissionais. A urgência na capacitação de

profissionais nessa área - opção que o país fez para constituir a Atenção Primária na

consolidação do Sistema Único de Saúde - vem provocando mudanças também no

papel dos gestores e das instituições de ensino.

Ainda não é possível vislumbrar o impacto dessas mudanças no perfil dos

profissionais formados, e na qualidade da atenção à população. Nesse contexto,

cabe conhecer o modelo com o qual se estruturam os programas de residência, a

fim de se identificar os rumos que vêm tomando, e oferecer subsídio para programas

que venham a se criar.

Uma das motivações iniciais para o desenvolvimento deste trabalho foi a

minha experiência em cursar a Residência Médica (RM) em Medicina de Família e

Comunidade (MFC) logo após a graduação, que transformou significativamente tanto

minha prática clínica quanto assistencial, além de construir um caminho possível

para a docência. A participação em debates sobre o processo de ensino

aprendizagem na residência médica e o desenvolvimento de atividades de

preceptoria com internos e residentes despertaram em mim o desejo de

compreender e analisar as diferentes formas de organização curricular desse tipo de

residência, nas instituições que a oferecem.

Uma abordagem qualitativa, traduzida pela análise documental, foi o caminho

metodológico escolhido, levando-se em consideração suas possíveis contribuições

para o cenário da pesquisa em RM no Brasil neste momento. Desse modo, pude

iniciar uma cartografia da Residência Médica em MFC no Rio de Janeiro, ao buscar

a memória coletiva de sua construção e do seu desenvolvimento.

A avaliação do modelo de formação desta Residência Médica se dá, então,

por meio da análise de documentos, em três categorias principais – documentos

regulamentares (as leis propriamente ditas), documento elaborado pela sociedade

da especialidade e os programas oficiais das instituições formadoras no estado do

Rio de Janeiro.

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Os documentos selecionados no conjunto de resoluções, decretos e leis

tiveram como critério a referência aos processos de formação do residente nesta

especialidade.

Com o objetivo de fundamentar essa análise e conhecer os autores que

refletiram a respeito do tema, como procedimento metodológico, foi feito um

levantamento bibliográfico na área de educação em saúde, triangulando as

temáticas de residência médica, estrutura curricular e medicina de família e

comunidade. Usando estas temáticas como descritores, na base de dados BIREME,

mais especificamente nos bancos LILACS, Medline e Scielo, nenhum trabalho foi

encontrado. Foram usadas, também, as ferramentas de busca Google e Google

Scolar, a fim de identificar publicações não indexadas que discutissem essas

temáticas, obtendo-se o mesmo resultado. Nessas mesmas fontes de dados, foram

ampliados os descritores para: "Internato e Residência" e "Médicos de Família"

(1308); "Internato e Residência" e "Médicos de Família" e currículo (255); "Internato e

Residência" e "Assistência Integral à Saúde" (2); "Internato e Residência" e

"Currículo" e "Tecnologia Educacional" (3); "Internato e Residência" e "Tecnologia"

(0), resultando em um conjunto de 1568 trabalhos captados na referida base de

periódicos.

Essa breve revisão possibilitou uma reflexão inicial a respeito do campo de

pesquisa, os recortes sobre o objeto mais utilizados e as principais metodologias

aplicadas. Esse passo foi importante para a elaboração e escolha dos processos de

investigação e metodologia aplicada no processo da pesquisa que se seguiu.

Por fim, os programas de residência médica em atividade no Rio de Janeiro

foram analisados no que se refere à sua estrutura curricular, ao que se acrescentou

o documento elaborado pela Sociedade Brasileira de MFC, sociedade civil que

congrega especialistas da área, sobre parâmetros para o desenvolvimento de

programas de residência médica, compondo o conjunto do material analisado.

Para a análise desse material foi escolhida a categoria cuidado, com uma

visão fundamentada na integralidade, por estar na base do trabalho em saúde, na

medida em que possibilita a reflexão e o diálogo entre os profissionais, por ser um

conceito polissêmico e que, portanto, todos conhecem, identificam e definem com

base em suas concepções de mundo, valores e conhecimentos. Funciona como

“pano de fundo” para a elaboração e o aprofundamento de outras questões de

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saúde, tais como a racionalidade médica, o perfil profissional e o próprio conceito de

saúde, na perspectiva ampliada.

Em razão da escolha do método de análise documental, cabe, antes de mais

nada, situar a concepção de documento que norteia o trabalho.

Os documentos são fonte rica e estruturada de informação na linguagem

escrita, construída e selecionada ao longo do tempo por grupos ou classes sociais.

Eles representam, mais do que um testemunho neutro de um período, a marca das

escolhas desse mesmo tempo. Traduzem a maneira como certas informações ficam

na memória coletiva de uma sociedade, conforme Le Goff (2006, p467).

Para Le Goff(2006, p468), a análise dos documentos deve acontecer para

além de uma série linear e cronológica, no conjunto de monumentos de seu tempo

histórico – sua relação com a vida e com o poder. O pesquisador deve ampliar seu

olhar para a cultura material, para a paisagem, para o sistema econômico da época

em questão.

Neste percurso pela história construída por e para os documentos, o que seria

então a memória coletiva? Para além de uma função neuro-fisiológica individual, a

memória coletiva encontra-se nos comportamentos, na mentalidade de uma época -

o que os grupos fazem de seu passado (NORA,1978 apud LE GOFF, 2006,p469).

Para a reconstrução e análise crítica desse passado habitado pelos

documentos históricos, permanece a necessidade de visitar “os lugares da memória

coletiva” (LE GOFF, 2006, p468). A memória coletiva, mais do que demarcar a

passagem do tempo e as mudanças ocorridas, é elemento fundamental na

constituição das identidades dos grupos, relação essa tão intensa quanto a

sobrevivência dos mesmos.

Como seria de se esperar, essa reflexão não se atém ao objeto de análise,

pois discorre também sobre as próprias escolhas do pesquisador. Neste sentido, o

primeiro passo numa análise documental é situar as escolhas do pesquisador, suas

intenções e predileções. Toda pesquisa é também desenvolvida em um certo tempo

histórico, como parte de um grupo com identidade própria. Essa reflexão possibilita

que o pesquisador vá alem dos fatos literais contidos nos documentos e avance a

sua análise com bases mais sólidas.

Então, antes de chegar aos documentos selecionados, há de se esclarecer

quais são as perguntas que serão feitas aos documentos. Neste trabalho, as

principais indagações são relacionadas ao modelo de formação da residência

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médica presente tanto nos documentos oficiais quanto nos programas institucionais.

O modelo de formação é avaliado, então, sob o aspecto da sua estrutura curricular e

no conceito de cuidado em saúde presente.

Observando o cenário da Residência Médica do Brasil na década de 70,

observamos o grande impacto da legislação reguladora, tanto na questão de

legitimidade social deste espaço de formação quanto na mobilização social da

classe médica para que esse passo fosse dado. A formação de um espaço plural de

negociação – a Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM) - em uma época

anterior à constituição do SUS, num país iniciando um processo de democratização,

reflete a importância desse marco regulador para o desenvolvimento da Residência

Médica.

A CNRM passou, então, a deliberar e normatizar o funcionamento dos

programas, requisitos mínimos e estrutura. Como órgão com representações de

grupos tão distintos, como o Conselho Federal de Medicina e o Ministério da

Educação, nos documentos construídos espera-se encontrar o resultado dessas

negociações e o consenso possível entre as entidades.

As instituições de ensino que desenvolvem programas de residência médica

contam com parâmetros desta documentação oficial para a organização de seus

programas, mas também utilizam as sociedades de especialidade como órgão

regulador paralelo. Neste sentido, a Sociedade Brasileira de Medicina de Família

(SBMFC) constitui uma entidade que normatiza critérios técnicos e científicos para o

desenvolvimento qualificado dos programas. Ainda que não exerça papel regulador

direto, participa ativamente dos processos de visitas e credenciamento dos

programas (Brasil, 2006,p12). Os documentos elaborados pela SBMFC, em especial

o construído em 2005 com o objetivo de listar parâmetros de qualidade para os

programas, serão objeto de análise pelos motivos citados anteriormente.

Além disso, visitamos os documentos elaborados em cada residência médica

ativa no estado do Rio de Janeiro que possuísse o programa de Medicina de Família

e Comunidade e fosse reconhecida pela CNRM. Os programas de residência médica

são documentos elaborados pelas instituições de ensino, com o objetivo de

apresentar sua proposta de funcionamento e grade curricular. Costumam variar

bastante, dependendo da instituição. As informações contidas devem ser referentes

às atividades práticas dos residentes, corpo docente e avaliação. Alguns programas

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elaboram contratos de convivência, que, em alguns casos, não constam nos

programas oficiais.

Estes documentos fornecem diferentes perspectivas da estruturação dos

programas de residência em MFC no estado do Rio de Janeiro. Indicam a maneira

de comunicação oficial das instituições para com os residentes e para com o público

em geral.

Nosso percurso é, então, construído com base na situação geral das

residências, dos parâmetros reguladores, para conhecer então parte do universo das

instituições formadoras por meio dos documentos construídos.

O cuidado em saúde tem recebido grande atenção nos meios acadêmicos

como um conceito estruturante do trabalho em saúde e, como já foi previamente

apresentado, ocupa um significativo espaço na elaboração da identidade profissional

do médico de família.

Neste sentido, identificar o cuidado em saúde e como ele se manifesta nestes

documentos é parte essencial do processo de análise. A maneira como o cuidado

pode se manifestar - como conceito teórico, como objetivo de aprendizagem, como

valor instituído nas habilidades e atitudes esperadas do residente - é apenas um

possível analisador dos documentos. As ausências também devem ser notadas, e

nos auxiliam na construção desse panorama.

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1. A residência médica

1.1 Campo de trabalho

A Residência em Medicina (RM) constitui modalidade do ensino de pós-

graduação destinada a médicos, sob a forma de curso de especialização,

funcionando em instituições de saúde, universitárias ou não, sob a orientação de

profissionais médicos de “elevada qualificação ética e profissional”. (BRASIL,

1977,p1). Ao final do período de treinamento, o médico egresso recebe um título de

especialista na área de atuação, reconhecido pelo Conselho Federal de Medicina.

No mundo, a Residência Médica surgiu em 1889, no Departamento de

Cirurgia da Universidade John’s Hopkins, nos Estados Unidos da América. O

cirurgião Willian Halsted organizou um programa de treinamento em que internos

passaram a ser chamados de residentes e tinham atividades e atribuições que se

modificavam ao longo do tempo, com níveis de autonomia e responsabilidade

progressivos (Martins, 2005,p17). Nessa mesma época, começaram a surgir outros

programas de Residência Médica que, basicamente, diferenciavam médicos com

foco na prática clínica daqueles que eram cirurgiões.

No Brasil, o primeiro programa de residência médica foi implantado no

Hospital das Clinicas da FMUSP em 1944_45, na especialidade de ortopedia. A

partir daí, diversos serviços universitários em hospitais de ensino organizaram

programas de residência médica que não apresentavam uniformidade na carga

horária, atribuições e remuneração dos residentes. Essa situação durou até 1977,

quando a RM foi regulamentada pela Lei 80.28, criando-se a Comissão Nacional de

Residência Médica, órgão ligado ao MEC com o objetivo de credenciar e definir as

normas gerais dos programas, graças ao movimento de médicos residentes que,

num momento de redemocratização política do país, realizaram a primeira greve de

médicos no Brasil, reivindicando regulamentação das regras da residência

médica.(Carro et al, 2004, p224)

A ligação da Residência Médica ao Estado pressupõe uma conexão direta da

formação médica ao SUS, na medida em esse sistema é o mantenedor das

instituições que oferecem os programas de RM. No entanto, essa aproximação é

recente e as discussões a respeito da formação de especialistas no Brasil ainda não

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estão maduras – a relação entre SUS e sociedades de especialidades é tensa, e o

papel paralelo das sociedades de especialidades, que fornecem títulos de

especialista pela Associação Médica Brasileira, cria uma situação de duplicidade no

mercado de trabalho.

O trabalho médico, nos últimos 20 anos, vem sofrendo uma progressiva

precarização, com queda da remuneração e do status social. O médico passou de

profissional liberal a assalariado, com vínculos trabalhistas precários. (Conselho

Federal de Medicina, 2005, p176) A proliferação de escolas de medicina contribuiu

para o expressivo aumento de profissionais concentrados nos grandes centros

urbanos.

O investimento em especialização seria uma forma de melhorar a

remuneração e conseguir condições diferenciadas de trabalho, além de maior status

profissional. Nesse sentido, a discrepância entre número de vagas de residência

disponíveis e médicos recém formados cria um “gargalo” na formação dos médicos

que nenhuma entidade médica ou governamental conseguiu resolver.

Esse aspecto particular da residência médica sobre o mercado de trabalho

resulta em intensas disputas entre as entidades médicas, que buscam maior

autonomia e reforço do papel das sociedades de especialidade, e as entidades

governamentais que desejam implementar suas políticas de recursos humanos e de

formação, que nem sempre estão em concordância. No meio dessa disputa, a

Comissão Nacional de Residência Médica permanece como palco de negociações e

deliberações destes grupos.

As vagas para os programas de residência, até o momento, são

disponibilizadas pelos serviços de acordo com suas necessidades, sem uma

conexão com as necessidades da população assistida pelo SUS. Uma pesquisa do

Ministério da Saúde em Parceria com a Organização Pan Americana de Saúde em

2004 constatou que “embora a maioria dos programas de RM no Brasil seja

financiada pelo setor publico, não existe racionalidade epidemiológica na distribuição

deste tipo de formação especializada”. (CARRO ET AL,2004,p234) Uma política de

recursos humanos para o SUS que envolva um planejamento e distribuição regional

do número de vagas ainda não ocorre, porém esse debate está na pauta de

discussão das entidades médicas e gestores do SUS, além do movimento estudantil.

Apesar desse cenário de disputas, no entanto, parece existir um consenso

geral entre gestores, educadores e profissionais que a residência médica seja um

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espaço de formação diferenciado, em que os profissionais recém formados têm a

oportunidade de exercitar sua prática clínica sob supervisão de profissionais mais

experientes, com níveis diferenciados e progressivos de autonomia. Outras

profissões da saúde recentemente têm aplicado este modelo para sua formação

pós-graduada, reconhecendo sua efetividade.

FEUERWERKER (1998,p61) ao discutir o papel da residência médica na

formação profissional do médico indica o lugar que ocupa a RM na formação

médica: “É exatamente por dar continuidade a esse processo de formação iniciado no internato, por combinar a aquisição de conhecimentos especializados mediante um treinamento prático em serviço, que a Residência Médica adquire relevância na educação dos médicos. A diversidade de experiências práticas que a Residência propicia (em relação a casos, cenários, exames, condutas, procedimentos), associada a uma atividade teórica de sistematização e a níveis crescentes de autonomia (sem estar abandonado à própria sorte) parece compor um estágio eficaz (e insubstituível no momento) do treinamento profissional do médico”.

1.2 Estrutura curricular e o modelo de formação

A residência médica se configura como um espaço importante de

transformação de um estudante de medicina em um profissional habilitado a exercer

atividades assistenciais de forma especializada. O foco da residência é o trabalho

médico e o processo de ensino aprendizagem se dá no ambiente de trabalho.

O Residente, então, se constitui como uma figura de transição, com níveis

variados de autonomia e controle sobre seu trabalho e status, que se modificam em

cada cenário de atuação. Esses limites são dinâmicos e demandam grande

flexibilidade do residente, uma vez que o próprio conceito de autonomia profissional

é permeado de ambivalência (BOTTI e REGO, 2008, p235).

Nesse contexto, a relação profissional tem papel de destaque. Existem várias

denominações para os profissionais mais experientes que supervisionam e orientam

o trabalho dos residentes – tutor, supervisor, preceptor, mentor. (BOTTI e REGO,

2008,p235) Sem demarcar as diferenças que os constituem, é importante sinalizar o

que representam em comum: o suporte necessário para que o jovem profissional

faça a integração entre escola e trabalho, desenvolvendo habilidades para lidar com

a realidade cotidiana (BOTTI e REGO, 2008, p235).

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Essa integração se faz necessária uma vez que o trabalho médico na sua

face assistencial envolve uma constante tensão entre o saber cientifico, estruturado

e racional, para o estudo das doenças, e as questões subjetivas, morais e éticas dos

sujeitos que compartilham o ato de cuidar e ser cuidado.

O bom profissional é reconhecido como aquele que consegue superar as

inconsistências desse modelo e ser tecnicamente eficiente, moral e afetivamente

adequado. O trabalho médico ainda coloca no talento pessoal a capacidade de ser

bem sucedido. A qualidade do cuidado diretamente ligada à qualidade da figura

pessoal desse agente (SCHRAIBER,1993,141).

Essas questões estão presentes de forma declarada ou não na formação do

médico residente, e a maneira como as instituições de ensino se organizam frente a

isso estrutura o modelo de formação da Residência Médica. Conhecer esses

modelos é umas das etapas necessárias para a reflexão a respeito deste processo.

Dentre as possibilidades, escolhemos a estrutura curricular para iniciar essa

aproximação.

Define-se currículo com base em uma compreensão sobre o processo de

ensino aprendizagem. Neste caso, o processo de ensino aprendizagem no campo

da educação profissional especializada, mais especificamente na Residência Médica

em Medicina de Família e Comunidade.

A residência médica é um tipo de formação em pós-graduação diferente das

demais, uma vez que as atividades práticas estruturam o processo de aprendizado,

e o médico residente tem um espaço de atuação profissional com autonomia

variável, fazendo parte da equipe de saúde, sendo parte do processo de trabalho.

Isso faz com que a visão sobre a RM fique, em muitos momentos, fragmentada,

dicotomizada entre as questões do trabalho e as questões de ensino e da

aprendizagem. Como um não existe sem o outro - são condições indispensáveis

para um programa de RM - essa fragmentação parece artificial.

FEUERWERKER (1998,p61) ao mencionar trabalho de ELIAS (1987) a

respeito dessa divisão questiona a tendência de valorizar-se um aspecto em

detrimento do outro: “Não existe contradição entre trabalho e aprendizado, nem subordinação de um processo ao outro. Um se faz dentro do outro, de maneira indissociável.(...) A Residência Médica estaria na interface (que é concreta e real) entre as políticas de educação médica e as políticas de saúde.”

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Faz-se necessário, então, apresentar uma definição de currículo que seja

compatível com um entendimento coerente desse processo.

Qual seria então a finalidade de um currículo no processo de estruturação e

manutenção de um programa de residência médica? Em geral compreende-se

currículo como sinônimo de programa ou grade curricular, o que revela um grande

equívoco.

As concepções atuais evoluíram de uma “forma” para um plano de ação, que

envolve esferas filosóficas, políticas e afetivas do processo de ensino aprendizagem.

FONTES (2008,p2) ao comentar sobre a questão do planejamento curricular,

menciona essas implicações: “A primeira tarefa não é seleccionar ou organizar experiências de aprendizagem, mas definir a finalidade da educação. Antes da definição de um currículo as sociedades devem interrogar-se sobre as intenções e funções sociais das escolas e quais os saberes relevantes em cada cultura que se deseja que os seus cidadãos possuam. A principal função de um currículo é, assim, a de materializar estas intenções(...)”

Pode-se dizer então que a primeira função de um currículo, antes de anunciar

os conteúdos priorizados por uma instituição, é de explicitar os posicionamentos que

dada instituição de ensino adota em relação ao processo de ensino aprendizagem,

aos resultados esperados com este processo e quais serão os responsáveis pela

execução dessas tarefas.

Ao elaborar um programa de Residência Médica, a instituição tem que

inicialmente preencher critérios mínimos estabelecidos pela Comissão Nacional de

Residência Médica. A documentação oficial funciona como um norte, porém não

estabelece que caminhos serão trilhados. Esses caminhos são apontados pelo

currículo.

O processo de ensino aprendizagem na Residência Médica envolve uma

quantidade dominante de atividades práticas e experiências, resquícios da prática

médica artesanal, em que o aprendizado se dava no contato direto e contínuo com o

médico mais experiente, o mestre, tutor que apoiava o trabalho do estudante e o

treinava para ser seu sucessor.

Apesar das mudanças paradigmáticas no conceito de saúde-doença, e do

crescente uso da tecnologia armada na prática médica, este aspecto do aprendizado

prático parece um consenso entre profissionais.

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O aprendizado prático e ao mesmo tempo sistematizado, flexível, porém

estruturado, vivo e planejado, que ocorre no período da Residência Médica, não é

compatível com uma definição tradicional de currículo. Demanda uma estrutura que

não seja prescritiva, mas que, ao contrário, esteja aberta aos acontecimentos

imprevisíveis da experiência viva.

Um currículo que dê conta dessas características não é simples de ser

construído. Demanda uma grande vontade, disponibilidade e criatividade de quem o

planeja e o concebe.

Nesse sentido, investigar a estrutura curricular de um programa de residência

pode nos auxiliar a conhecer as concepções de educação compartilhadas nas

instituições e o tipo de profissional que se espera formar.

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2. A Medicina de Família e Comunidade como disciplina médica

A avaliação inicial do panorama de pesquisa na área de residência médica

evidencia uma predominância de trabalhos cujo enfoque é o conteúdo conceitual dos

programas e disciplinas em detrimento dos processos de ensino aprendizagem e

estrutura curricular.

Na literatura indexada existe grande predomínio de trabalhos de origens

norte-americana e inglesa. A Espanha e a Argentina aparecem também como

produtores de trabalhos. No Brasil, não encontramos trabalhos que discutissem

especificamente a temática da estrutura curricular, ainda que existam enfoques mais

amplos que envolvem questões curriculares a outros aspectos da Residência

Médica.

A impressão que fica é que a maioria dos pesquisadores envolvidos com a

temática da residência médica preocupa-se em investigar conteúdos e experiências,

e negligencia o processo de ensino-aprendizagem.

Neste sentido, para entender o processo de formação de um médico de

família por meio da residência médica, é necessário conhecer a disciplina da

medicina de família e comunidade, como se estrutura em especialidade médica no

Brasil, quais os conhecimentos, habilidades e atitudes esperados do médico de

família, para a construção de suas competências. Observar a epistemologia deste

campo de conhecimento é uma etapa fundamental desse processo.

A medicina familiar constituiu-se como disciplina médica a partir da

necessidade identificada pelos médicos ou clínicos gerais de retomar uma

sistematização do conhecimento acumulado de forma empírica e vivencial como

resposta à crescente especialização dos médicos no início do século XX. Este

período foi marcado pela proliferação de especialidades médicas em todo o mundo,

pelo desenvolvimento da indústria de equipamentos, de medicamentos e de apoio

diagnóstico, com conseqüente impacto nos currículos de graduação. Nesse

momento, os médicos clínicos sofriam de uma desvalorização progressiva e perdiam

espaço nas universidades e no mercado de trabalho.

A nomenclatura para designar essa disciplina varia no mundo, mas apresenta

algumas características em comum nos diversos países que a desenvolvem. É

conhecida como medicina comunitária, medicina geral e familiar, medicina geral,

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medicina familiar. Todos os países cujos sistemas de saúde utilizam profissionais

médicos, em equipe multiprofissional ou não, para a provisão de cuidados primários

(como Cuba, Inglaterra, Espanha e Canadá) possuem programas de residência

médica em medicina de família, com duração que varia de 02 a 04 anos.

A medicina de família e comunidade, previamente conhecida no Brasil como

medicina geral e comunitária, é uma especialidade médica voltada para a provisão

de cuidados primários de saúde no nível individual, familiar e comunitário, em uma

população adstrita, sem restrição de cuidado por faixa etária ou órgão ou sistema

afetado (Anderson et al,2005,p62).

O desenvolvimento da medicina de família varia entre os países, pela

conformação dos sistemas de saúde e atribuições de equipes. No entanto, existem

algumas características primordiais compartilhadas que fundamentam essa prática

(WONCA,2002,p3) – primeiro contato do usuário com o sistema de saúde, acesso

sem restrição de faixa etária, sexo ou problema de saúde, gestão dos recursos

locais, coordenação do cuidado pela interface com outros provedores de cuidados

de saúde, abordagem dos problemas em consonância com o perfil epidemiológico

local, responsabilização pela comunidade e abordagem centrada na pessoa, de

forma integrada/global, além de trabalhar a promoção da saúde e prevenção de

doenças.

No Brasil, a MFC existe como especialidade reconhecida desde 1986 (com o

nome de Medicina Geral e Comunitária, modificado para Medicina de Família e

Comunidade em 2001) (Anderson et al,2005,p63). Porém, antes mesmo do

reconhecimento da especialidade pela AMB alguns serviços já possuíam programas

de formação em modalidade de Residência Médica em diferentes estados do Brasil,

mais notadamente Pernambuco, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro.

No nível de graduação, a disciplina MFC foi desenvolvida a partir da

sistematização da prática dos médicos generalistas que apontavam uma

necessidade de construir uma identidade profissional e sistematizar seus conteúdos,

desde a graduação, para validar e otimizar o ensino. No Brasil, apesar da visibilidade

crescente com as mudanças curriculares recentes, ainda apresenta expressão

incipiente, na maior parte das vezes inserida em conteúdos de outras disciplinas.

(Fajardo,Teixeira & Brant, 2008,s/p)

Atender os problemas de saúde mais comuns da população, promover a

saúde e prevenir doenças. As atribuições de um médico de família inicialmente não

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parecem trazer uma prática diferente de qualquer atendimento ambulatorial. No

entanto, a prática baseada na continuidade de cuidados centrados nas pessoas, o

foco do trabalho desenvolvido na MFC é estruturado em relacionamentos.

Se, então, todos os médicos se relacionam com seus pacientes, qual seria a

especificidade da relação dos médicos de família? A ausência de critérios de

exclusão – sem limites de idade, sexo, religião e problemas de saúde é uma

possibilidade. Essa disponibilidade constante diferencia o trabalho do médico de

família. Mesmo quando o tratamento da doença já não faz parte da sua competência

técnica, o médico de família deve estar disponível para dar suporte, coordenar o

cuidado.

A “coordenação do cuidado” seria, então, a capacidade do médico de família

estabelecer um relacionamento assertivo com outros serviços de saúde, médicos

especialistas focais, mesmo quando a doença que acomete a pessoa extrapola sua

capacidade resolutiva.

Claramente, esse tipo de compromisso não é fácil nem simples de ser

alcançado, e pressupõe um grande investimento pessoal e profissional, uma

responsabilização pelo trabalho, que muitas vezes não é reconhecido como uma das

(senão a maior) questão envolvida na prática dos médicos de família. A capacidade

de manter um relacionamento de confiança e empatia com indivíduos, suas famílias

e com a comunidade instrumentaliza os médicos de família, permite que aprofundem

seus conhecimentos biomédicos, e, sobretudo os relacionais, criando condições,

inclusive, para a sua autonomia frente ao modelo da sua formação.

Outros autores também mencionam o poder terapêutico do relacionamento

estável e continuado de um médico de família com a sua população. Na percepção

de Balint (1988, p38), psiquiatra e psicanalista que trabalhou, com médicos

generalistas, na capacitação em saúde mental e reflexão a respeito da relação

médico paciente, “a droga mais freqüentemente utilizada na clínica geral é o próprio

médico”. O cuidado surge, aqui, como uma característica intrínseca a esse modo de

trabalho.

Ampliar, pois, o olhar no encontro terapêutico, levando em consideração o

indivíduo como um todo, promove uma quebra da racionalidade biomédica, centrada

no diagnóstico. O médico se coloca disponível para se relacionar com a pessoa que

procura cuidado, mesmo que ela não possua nem vá possuir um diagnóstico. No

entanto, os médicos e pacientes esperam um “resultado” desse encontro - a cura

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passa a ter outros sentidos, mais subjetivos. Para lidar com isso, fez-se necessário

construir novas ferramentas de trabalho, em uma abordagem terapêutica

diferenciada. “Os médicos que praticam atenção primária devem tolerar a ambigüidade por que muitos problemas nunca alcançam o estágio de um diagnóstico (...). Eles devem sentir-se confortáveis em estabelecer e manter um relacionamento com os pacientes e em lidar com problemas para os quais não há nenhuma aberração biológica demonstrável”. (STARFIELD, 2002,135)

O método clínico centrado no paciente, ou abordagem centrada na pessoa,

seria, então, a resposta elaborada pelos médicos de família. O método consiste em

seis passos que envolvem o planejamento de uma consulta individual. Foi

desenvolvido exatamente com o objetivo de sistematizar esse conhecimento e

legitimar esse modo de trabalho, além de facilitar a comunicação entre profissionais,

uma tentativa de aproximar os conhecimentos biomédicos necessários para a prática

médica, aos conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias para uma

abordagem biopsicossocial, centrada na pessoa (Stewart,2003,p40).

As diferenças são muitas, e passam por diversos aspectos. Alguns deles

merecem ser destacados. O método clínico biomédico, centrado na doença e na

capacidade diagnóstica, utiliza a ciência e o discurso científico para orientar a sua

prática e dar credibilidade aos seus posicionamentos. (Silva Júnior,1998,p46) Desta

forma, utiliza os conhecimentos de forma abstrata, sem levar em consideração os

aspectos da experiência individual do adoecimento, como observado por

McWhinney(1997,p 24) ao comparar o trabalho de neurologistas e médicos de

família.

O médico de família trabalha com um nível de abstração muito variável, uma

vez que encontra pessoas nos mais diferentes níveis socioeconômicos, de saúde e

adoecimento. Por outro lado, sua realidade cotidiana envolve uma necessidade de

aproximação muito grande da experiência viva do paciente, o que implica um nível

reduzido de abstração.

Essas variabilidade e flexibilidade, próprias do trabalho em APS e, por

conseqüência em MFC, criam nos médicos uma tensão constante entre dois pólos

de raciocínio e procedimento. Neste ponto, McWhinney(1997,p66) oferece o

pensamento sistêmico como solução para este aparente impasse de racionalidades

(Tudela,Lobo e Ramos,2007,p216) Defende o holismo como forma de devolver uma

coerência teórica ao trabalho deste médico, que aparentemente ao se aproximar das

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pessoas e da sua subjetividade, das suas histórias de vida, afasta-se da

cientificidade da sua profissão e com isso reduz sua credibilidade e status. O

cuidado se insere, então, nessa prática diferenciada do médico de família como

conceito estruturante, que possibilita agregar valores, conhecimentos e habilidades

técnicas.

No caso do médico de família, as questões levantadas por

Schraiber(1993,p142), referentes à construção do trabalho médico se reforçam. O

fato de o médico que atua na Atenção Primária à Saúde dispor de pouco arsenal

tecnológico industrialmente produzido reforça a idéia que o sucesso da APS

depende do seu sucesso profissional pessoal. A sua dedicação, a sua competência,

a sua capacidade de relação e integração com a equipe ditam o êxito do trabalho em

APS.

De uma certa forma, o sistema de saúde na atenção primária é baseado nos

profissionais que o compõem. A característica pessoal e artesanal desse processo

resulta em uma personalização do sucesso e do fracasso. Esse modo de fazer

diferenciado aparece diversas vezes como o marco que delimita a competência do

médico de família. Citando WAGNER ET al (1999,p21) “A MFC se compõe muito

mais do que o médico de família faz, e como faz, do que o tipo de conhecimento

duro que concentra.”

Essas são tensões e questões da vida profissional de um médico de família

que não têm resposta ou solução. Fazem parte de uma realidade viva, que demanda

dos profissionais uma grande quantidade de flexibilidade, criatividade e coragem. O

cuidado em saúde aparece aqui, então, como uma categoria norteadora deste

trabalho, que traduz de várias maneiras as questões levantadas pela prática do

médico de família.

2.1 O habitat dos médicos de família e comunidade: Atenção Primária à Saúde É impossível discutir o médico de família sem discutir a atenção primária à

saúde no Brasil e no mundo. Diferente de outras disciplinas e especialidades

médicas que se definem e diferenciam pelas restrições de sua prática (só atendem

crianças, ou idosos, ou gestantes, ou cardiopatas) e especificidade de sua

intervenção (realiza exames complementares, cirurgias, procedimentos), o médico

de família tem uma relação intrínseca com o lugar que ocupa no sistema. É

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importante entender que isso não significa que todo médico inserido na atenção

primária à saúde seja um médico de família – como já mencionamos anteriormente;

existem inúmeras habilidades, conhecimentos e atitudes relacionadas ao fazer

específico dessa especialidade. No entanto, sem um espaço específico no sistema,

que permita o desenvolvimento de cuidados primários, esse profissional perde

grande parte de seu poder resolutivo e expressão social. O Brasil, neste aspecto,

exemplifica claramente essa situação, nos anos que antecederam a criação do

Programa de Saúde da Família.

Sem espaço no sistema único de saúde - que estruturava a atenção primária

a saúde em programas verticais - a especialidade era desconhecida da população

em geral. Poucos profissionais investiam na carreira e um número pouco expressivo

mantinha prática privada ou acadêmica. Isso desestimulava o ingresso de novos

médicos criando um circulo vicioso.

Neste sentido, é essencial definir com clareza o que é a atenção primária à

saúde numa perspectiva mais geral e posteriormente situar a APS no Brasil.

A atenção primária à saúde se inseriu de diversas formas nos sistemas de

saúde do mundo, sendo inicialmente estruturada com foco na vigilância em saúde e

controle de epidemias. (STARFIELD, 2002, p30). Ao longo do tempo, as dificuldades

enfrentadas pelos sistemas de saúde se acirraram e foi preciso repensar a forma de

produzir e cuidar da saúde, inclusive os cuidados primários, uma vez que a forma de

produção destes cuidados não contemplava as necessidades de saúde da

população.

Neste sentido, a conferência de Alma Ata de 1978 relaciona a discussão da

efetividade, equidade e da sustentabilidade dos sistemas de saúde ao modo como

esses sistemas se estruturam e a partir daí identifica na atenção primária à saúde o

caminho para a resolução desses problemas.

As décadas de 70 e 80 do séc. XX representaram a evolução da tecnociência

médica, o aumento da especialização e criação de novas frentes de trabalho na

saúde – crescimento da indústria farmacêutica, de equipamentos e procedimentos.

As especialidades médicas proliferavam e outras ocupações na área da saúde

ganhavam vulto. As pesquisas e a produção científica da área cresciam velozmente.

No entanto, essas modificações e avanços não foram traduzidas em melhorias das

condições de vida da maioria da população mundial, além de apresentarem custos

elevados.

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A OMS e outras entidades internacionais reforçaram seu discurso a favor do

investimento na atenção primária à saúde. Em 1986, na Conferência de Ottawa, o

foco da discussão ultrapassa os setores da sociedade tradicionalmente relacionados

à saúde para trazer o conceito de intersetorialidade e da promoção da saúde.

Desloca o foco das doenças – prevenção e risco – para a saúde, e na pessoa como

recurso de saúde, defendendo que investir nas pessoas é investir na saúde. Propõe,

então, uma abordagem sócio-ecológica da saúde. A discussão ambiental toma força

dentro da discussão da promoção da saúde.

Neste momento, o profissional de saúde que atua na APS tem um papel que

extrapola atividades assistenciais e gerenciais para atuar como um mediador entre

atores sociais e instituições da sociedade, uma vez reconhecidas as limitações das

instituições de saúde para enfrentar os desafios de cuidar da saúde das populações.

Traz ainda uma mudança no conceito de saúde: de bem estar para um

processo, um “recurso para a vida”. “A saúde deve ser vista como um recurso para a

vida, e não como objetivo de viver.” (OTTAWA, 1986,s/p)

Nesse contexto multifacetado, não é surpresa que a formação dos

profissionais seja objeto de reflexão, ainda que superficial. “A reorientação dos

serviços de saúde também requer um esforço maior de pesquisa em saúde, assim

como de mudanças na educação e no ensino dos profissionais da área da saúde.”

(OTTAWA, 1986)

Em 1992, Barbara Starfield apresenta estudo inédito que mostra evidências

do impacto positivo da APS em sistemas de saúde de países industrializados,

reforçando a necessidade de investimento e organização dos sistemas de saúde

com base na atenção primária. O gráfico a seguir, de um estudo posterior de 2002,

exemplifica brevemente as conclusões estabelecidas na pesquisa anterior, que além

dos custos com atenção à saúde incluiu também avaliação para diversos indicadores

de saúde, tais como mortalidade infantil, taxa de mortalidade ajustada por idade e

anos de vida perdidos, entre outros.

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Figura reproduzida de Starfield, 2002, p35. ATENÇÃO PRIMÁRIA: equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços e tecnologia. Brasília: UNESCO Brasil, Ministério da Saúde.

O gráfico apresentado demonstra a comparação entre doze nações

industrializadas, relacionando a força de orientação de seus sistemas de saúde para

a Atenção Primária e a relação com os gastos per capita com atenção á saúde. Essa

classificação utiliza onze características, sendo cinco relacionadas ao sistema e seis

relacionadas às unidades de saúde.

Cada país recebeu uma pontuação de 0, 1 ou 2, dependendo da presença e

força das características. Os países foram, então, classificados por sua pontuação

média para as onze características.

A figura mostra as classificações para a força da atenção primária em um eixo

e a classificação para gastos de atenção à saúde totais, per capita, no outro eixo,

sendo conferido grau 1 para o país com o mais baixo custo total. O gráfico

demonstra com clareza que os países com atenção primária mais forte lidam melhor

com custos. (STARFIELD, 2002, p36).

Ressalto que não considero correto avaliar a qualidade e eficácia de um

sistema de saúde apenas baseado nos gastos realizados. No entanto, o custo dos

serviços de atenção à saúde tem pesado cada vez mais nos orçamentos, tanto de

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países industrializados quanto de países em desenvolvimento. Neste cenário, a

possibilidade de um modelo de atenção constituir uma relação de custo efetividade

melhor é de suma importância e tem trazido visibilidade para a Atenção Primária,

muitas vezes em detrimento de seus valores ideológicos. Pelas características contra-hegemônicas do trabalho e da organização de um

sistema de saúde centrado na APS, é comum encontrar uma gama de equívocos e

interpretações parciais sobre esse nível de atenção. Nesse sentido, é importante

apresentar a caracterização feita por STARFIELD(2002,p26) da APS, também pelo

que não é: “A atenção primária não é um conjunto de tarefas ou atividades clínicas exclusivas; virtualmente, todos os tipos de atividades clínicas (...) são características de todos os níveis de atenção. Em vez disso, a atenção primária é uma abordagem que forma a base e determina o trabalho de todos os outros níveis dos sistemas de saúde. A atenção primária aborda os problemas mais comuns na comunidade, oferecendo serviços de prevenção, cura e reabilitação para maximizar a saúde e o bem-estar. (...) Ela integra a atenção quando há mais de um problema de saúde e lida com o contexto no qual a doença existe e influencia a resposta das pessoas a seus problemas de saúde. É a atenção que organiza e racionaliza o uso de todos os recursos, tanto básicos como especializados, direcionados para a promoção, manutenção e melhora da saúde.”

Esta definição auxilia na compreensão da complexidade das necessidades de

saúde das populações no nível primário. A partir daí, é possível perceber que essas

necessidades não podem ser atendidas sem um sistema de saúde que priorize a

APS como foco estruturante do trabalho em saúde.

Os estudiosos da APS defendem e demonstram a relação direta entre a APS

e maior equidade nos sistemas de saúde, contribuindo para a melhoria das

condições de vida da população. A saúde como um caminho para um mundo

melhor, mais justo e coerente - essas parecem ser as idéias que os organismos

internacionais buscam na luta pela valorização da APS.

No Brasil, até o início do século XX, a atenção primária acontecia por meio de

campanhas higienistas relacionadas à vigilância epidemiológica. Posteriormente,

mas antes ainda da criação do Sistema Único de Saúde, o foco se deslocou para

atendimentos centrados nos programas verticais do Ministério da Saúde, que tinham

como principal objetivo trabalhar a vigilância em saúde. Eram focados em doenças

de importância epidemiológica (Tuberculose, Hanseníase, Desnutrição, entre

outras), centrados em atendimento clínicos de médicos e enfermeiros, estruturados

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em atendimentos individuais e campanhas de “saúde pública” para a população em

geral – como as imunizações e distribuição de medicamentos em massa. Não há,

nesse momento, uma mudança do foco – o paradigma do trabalho em saúde

permanece nas doenças – em tratá-las e preveni-las por meio do controle dos

“fatores de risco” (Campos et al, 2006,p.797). Ainda que presente como parte

integrante do sistema de saúde, esse modelo de atenção primária focada na

prevenção/vigilância em saúde desconsiderava inúmeros aspectos das

necessidades básicas de saúde da população, além de possuir uma capacidade

resolutiva limitada. Podemos considerar que não havia, nesse momento, uma

estrutura de organização para atender a essas necessidades.

O movimento da Reforma Sanitária traz consigo a possibilidade de mudança

estrutural, organizacional e ideológica do cuidado em saúde. A criação do Sistema

Único de Saúde estrutura uma rede regionalizada e hierarquizada de acordo com as

seguintes diretrizes, expressas no Art. 198: I - descentralização, com direção única

em cada esfera de governo; II - atendimento integral, com prioridade para as

atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; III - participação da

comunidade. (BRASIL, 1988)

Neste movimento de construção do SUS, a VIII Conferência Nacional de

Saúde, em 1986, sinaliza essas mudanças, ao trazer um conceito de saúde que

inclui aspectos biopsicossociais às políticas de saúde. Esta visão abrangente da

saúde possibilita e traz embasamento para ações individuais e coletivas que

priorizem o cuidado em saúde. Esse novo conceito contribuiu para o reordenamento

do setor saúde no Brasil, como menciona Coelho (2007,p48). Em seu sentido mais abrangente, a saúde é a resultante das condições alimentação, habitação, educação, renda, meio-ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde. É, assim, antes de tudo, o resultado das formas de organização social da produção, as quais podem gerar grandes desigualdades nos níveis de vida. (VIII CNS, 1986, p.2)

A partir daí, algumas iniciativas locais priorizando cuidados primários em

saúde surgiram nas décadas de 80 e 90 do século passado (como o programa de

agentes comunitários no Ceará), porém apenas com a implantação do Programa

Saúde da Família (PSF) em 1994 verificamos um movimento nacional que prioriza a

Atenção Primária a Saúde no Brasil. Essa mudança se traduz pelas modificações na

remuneração do trabalho em saúde, no financiamento diferenciado ao trabalho das

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equipes de PSF e na articulação política para responsabilizar os municípios pela

gestão local destes recursos. Observamos nesse momento a entrada de novos

atores – agentes comunitários de saúde – nas equipes de saúde e o estímulo à

participação das comunidades junto às equipes de saúde da família.

O PSF (posteriormente denominado de Estratégia Saúde da Família, a fim de

reforçar o objetivo de reestruturação do sistema) traz uma nova concepção de

trabalho para a APS, como sinalizado em sua diretriz conceitual. Esta concepção supera a antiga proposição de caráter exclusivamente centrado na doença, desenvolvendo-se por meio de práticas gerenciais e sanitárias, democráticas e participativas, sob a forma de trabalho em equipes, dirigidas às populações de territórios delimitados, pelos quais assumem responsabilidade.(BRASIL,MS,2004,s/p)

O investimento federal estimula a adesão dos municípios e a abertura de um

novo mercado de trabalho, com remuneração diferenciada e possibilidades de

atuação também inéditas no Brasil, conquista a adesão de muitos médicos e outros

profissionais. Em 15 anos de existência, observa-se a criação e implantação de

25000 mil equipes em todo Brasil, implantação e desenvolvimento sem precedentes

no mundo.

O PSF traz consigo a possibilidade de concretização de inúmeras bandeiras

do Movimento Sanitário, tais como a horizontalização das ações de saúde, com

vistas ao aumento da equidade, a regionalização possibilitando maior adequação às

necessidade locais, a participação popular no planejamento e na resolução coletiva

dos problemas de saúde, a formação de equipe multiprofissional para o cuidado da

população, a intersetorialidade, entre outros. O cuidado integral em saúde, na APS,

passa a ter um território repleto de possibilidades, ainda que enfrente inúmeras

dificuldades, tais como a falta de valorização e reconhecimento das atividades

primárias, gestão incoerente aos princípios da APS, falta de continuidade das

políticas e das equipes de saúde, entre tantas outras.

Assim, o espaço estabelecido pelo PSF propõe mudanças paradigmáticas do

trabalho médico, ainda que não explicitadas claramente. Apesar de pregar a

substituição da “rede básica tradicional”, (BRASIL,MS 2004) o MS não propõe uma

substituição dos profissionais que permanecem nestes espaços. Há de se concluir

que esta transição não é simples nem tranquila.

As questões referentes aos recursos humanos necessários para a

implementação efetiva, resolutiva e de qualidade na ESF estão no centro das

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discussões dos gestores, acadêmicos e trabalhadores de saúde do Brasil. A ESF

abre um campo de trabalho novo e promissor para profissões cada vez mais

precarizadas e uma possibilidade de cenário de ensino aprendizagem compatível

com as Diretrizes Curriculares Nacionais (MEC, 2001) dos cursos da saúde.

Neste sentido, os gestores do SUS têm aplicado diversas estratégias para

capacitar seus profissionais, inclusive trazendo novas abordagens aos processos de

ensino e de aprendizagem em saúde – a educação permanente como o exemplo

mais palpável, e a educação popular. No quesito de educação formal, o MS tem

investido nos últimos anos em financiamento de residências médicas em MFC e

multiprofissionais em Saúde da Família, além de incentivar inovações curriculares

nos cursos da área da saúde, como o PROMED e o PRÓ-Saúde.

2.2 O cuidado em saúde: um fundamento teórico para a MFC

Neste percurso a respeito da constituição do médico de família como

profissional de saúde, é possível observar o posicionamento contra-hegemônico

presente tanto na prática quanto na proposta de formação destes profissionais. A

medicina de família estaria, segundo Bonet (2004, p39), em uma situação

intermediária, entre a biomedicina e as denominadas “medicinas românticas” ou

alternativas, uma vez que se conforma como uma especialidade da biomedicina,

mas que se propõe a “olhar além” do diagnóstico anátomo-funcional. Desta forma, a

expressão do cuidado em saúde na prática do MFC é uma questão que merece

reflexão. Aparece, então, como um conceito que possibilita aos profissionais e

teóricos discutirem, criarem uma linguagem comum e aprofundarem as reflexões

teóricas sobre esse novo fazer em saúde.

Segundo Valle (2008, p303), um conceito teria a função de unificar um

número indefinido de objetos ou fenômenos em um conjunto, tornando-os inteligíveis

(...). Os conceitos atuam, assim, de forma a absorver a multiplicidade que

experimentamos empiricamente e organizá-la. Dessa maneira, os conceitos

fornecem um ‘recorte’ a que se submete a realidade.

Neste sentido, o conceito de cuidado pode traduzir fenômenos, atitudes e

percepções da experiência prática para o campo racional, possibilitando debates e

reflexões por estar na base do trabalho em saúde. É um conceito polissêmico, que

todos conhecem, identificam e definem a partir de suas concepções de mundo,

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valores e conhecimentos. Funciona como “pano de fundo” para a elaboração e

aprofundamento de outras questões de saúde – a racionalidade médica, o perfil

profissional e o próprio conceito de saúde seriam algumas.

Por tudo isso, não é prudente acreditar que exista apenas uma definição de

cuidado compartilhada por todos os profissionais de saúde; coloca-se, então, a

necessidade de apresentar algumas possíveis leituras. Algumas concepções

traduzem o cuidado em saúde como sinônimo de tratamento e prescrição,

unicamente relacionado à dimensão prática – um procedimento com o objetivo de

curar o corpo doente. Sabendo, no entanto, que todo ato prático revela uma leitura

da realidade, alguns autores apresentam outras dimensões, incluindo “uma

compreensão filosófica e uma atitude prática” (Ayres, 2003, p74, Boff 2004,p101,

Merhy, 2002, p116). Neste sentido, BOFF (2004,p101)resume, de forma exemplar,

os atributos que constituem o conceito de cuidado. Em suas palavras, “representa

uma atitude de ocupação, de preocupação, de responsabilização e de envolvimento

afetivo com o outro.”

É importante mencionar, ainda, que faz parte desse processo o

desenvolvimento e o refinamento de algumas qualidades humanas, tais como a

compaixão, a solidariedade e a alteridade. Entende-se, então, o cuidado como

“expressão ontológica” do ser humano, isto é, como parte inerente da sua natureza e

conformação, como forma de estar e ser no mundo.

Desta forma, autores - entre eles PIRES (2005, p.1033) - propõem que o

desafio do cuidado em saúde seja transcender a relação de ajuda e poder. A autora

traz a discussão do cuidado como forma de conhecer e construir cotidianos.

Descreve o aspecto da politicidade do cuidado, como possibilidade de emancipação

pelo conhecimento que pode proporcionar, mas que também pode ser instrumento

de coerção, dominação e opressão. A proposta da autora é “conhecer para cuidar

melhor, cuidar para confrontar, cuidar para emancipar”.

Neste sentido, as tensões vividas no cotidiano das relações de trabalho e

aprendizado no campo da saúde influenciam a forma de expressão deste cuidado.

Dependerá, portanto, das crenças, dos valores, de atitudes e posicionamentos

individuais e de suas interações nas relações constituídas nos espaços de encontro.

Fica claro, então, que considerar o cuidado - com uma definição

fundamentada na integralidade - como base do trabalho em saúde, implica

modificações da abordagem individual do profissional; porém, essa escolha não

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aparece apenas na prática assistencial direta. Tem influência também na gestão dos

processos de trabalho, do planejamento em saúde e na formação dos profissionais.

Essas dimensões devem ser lembradas quando se percebe que o cuidado de

indivíduos não pode ser dissociado do cuidado das famílias e comunidades.

(Ayres,2004,p81) Encontramos essa preocupação no debate a respeito do conceito

de saúde e na pauta de debate das atribuições das equipes de saúde; porém, o

instrumental para o cuidado coletivo ainda é pouco desenvolvido pelos profissionais

de saúde.

A dimensão cuidadora do trabalho médico vem sendo historicamente

desvalorizada (Merhy,2002, p116) na constituição dos conhecimentos e ferramentas

da racionalidade médica biologicista, procedimento centrada. O processo de

formação profissional, ainda centrado nesta racionalidade apesar das recentes

mudanças trazidas pelas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), traduz esses

valores para o estudante em formação.

A formação do profissional de saúde, e do médico em especial, tem profundo

impacto na constituição de sua personalidade e conseqüentemente na sua forma de

entender e de lidar com as relações terapêuticas. Durante o curso de graduação, os

estudantes lidam com um sistema de valores que envolvem uma pedagogia oculta

(VASCONCELOS e colaboradores, 2006, grifo meu) – um processo de aprendizado

de posturas e comportamentos que não são passados em uma disciplina formal,

mas incutidos nos processos de trabalho, de avaliação e das relações entre

estudantes e professores. Esse processo estimula a competitividade e o

individualismo, a dedicação acadêmica e racional em detrimento de espaços

vivenciais e afetivos e uma avaliação punitiva e classificatória. A racionalidade

centrada no diagnóstico é cultivada e exercitada como forma correta de pensar e

agir (Bonet, 2004: 106). Esse processo de aprendizagem reflete diretamente na

atuação destes estudantes, quando colocados em situações vivas de cuidado.

VASCONCELOS (2006,p 268) exemplifica esta situação ao relatar sua experiência

em um projeto de saúde comunitária com estudantes de final de curso de diversas

áreas da saúde. “(...) Vão se tornando pessoas com olhar focado e frio, como se tivessem uma viseira, destas que os burros que puxam carroças nas cidades usam para não se espantarem com os carros. Em seus cursos ganham um martelo, ou seja, um instrumento de trabalho terapêutico, e passam a só procurar pregos na realidade. O instrumental de ação técnica adquirido passa a limitar e orientar seus olhares para a realidade.”

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Como mencionado anteriormente, a percepção de que o processo de ensino

aprendizagem na graduação em medicina necessita de mudanças já é

compartilhada por grande parte dos educadores, profissionais e estudantes,

culminando inclusive com um amplo movimento de discussão e reestruturação que

se encontra em curso nas instituições de ensino pelo Brasil. Não é possível saber

qual será o impacto nos profissionais formados nos próximos anos, mas espera-se

uma mudança no perfil do egresso.

A residência em medicina de família e comunidade teria, nesse momento, a

função de resgatar e desenvolver a capacidade cuidadora destes médicos,

compatibilizando suas competências clínicas a um amadurecimento pessoal que

resulte em maior autoconhecimento, resultando em um médico com abordagem

integral e integradora. Espera-se que seja um momento de descoberta e

ressignificação do conhecimento acumulado ao longo da graduação, construindo

uma nova racionalidade.

Sem a essência do cuidado na utilização das ferramentas, o trabalho em MFC

não alcança seus objetivos. A simples aplicação do conhecimento desenvolvido na

disciplina médica da MFC, ainda que possua uma racionalidade contra-hegemônica,

não dá conta da complexidade e refinamento do encontro terapêutico. Neste sentido,

Ayres sintetiza essa necessidade no ato de cuidar, que vai ao encontro do discurso

da medicina de família e comunidade. (...) para cuidar há que se sustentar, ao longo do tempo, uma certa relação entre a matéria e o espírito, o corpo e a mente, moldados a partir de uma forma de vida que quer se opor à dissolução, que quer garantir e fazer valer sua presença no mundo. (AYRES,2003,p75)

Neste caminho, percebemos que o cuidado em saúde pode abarcar vários

entendimentos, que convergem na oposição à dissolução, à redução e a rigidez,

movimento este muito próximo ao entendimento que se tem da integralidade em

saúde, como paradigma que sustenta esse novo fazer. A integralidade tem se

configurado em nossos tempos, segundo Mattos (2001) in Coelho (2007, p52), pela

“negação ao reducionismo”. Recorrendo a Santos (2000), também em Coelho (2007,

p52) o autor entende que há um movimento de insatisfação nas relações

interpessoais que reduzem o outro a um objeto, razão pela qual defende a

integralidade como uma forma de garantir a reciprocidade no encontro.

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Neste caminho, o encontro terapêutico se complexifica, o olhar sobre as

necessidades de saúde se expande, trazendo, então, a necessidade de se trabalhar

também com disponibilidade ampliada, com a visão integral do sujeito que procura

atendimento.

A indagação que se coloca ao observarmos o modelo de formação na

Residência Médica é a seguinte: o cuidado está presente como uma categoria de

estudo e nos objetivos de aprendizagem? Podemos observar na forma como o

processo de formação profissional destes médicos é construído o cuidado com

categoria norteadora? Podemos encontrar nos documentos construídos nas

residências médicas a preocupação de expressar um cuidado comprometido com a

emancipação e autonomia dos sujeitos?

3. A residência em MFC

Em 1976, foi criada no Brasil, pela Secretaria Estadual de Saúde do Rio

Grande do Sul, em sua Unidade Sanitária denominada São José do Murialdo, a

primeira Residência em Medicina Geral e Comunitária (MGC). Dois anos depois, a

Residência do Murialdo se torna multiprofissional. (MS,2006,p17). No mesmo ano

tivemos a formação de mais dois programas de residência em MGC- no Rio de

Janeiro sob organização da Universidade Estadual do Rio de Janeiro e em Vitória de

Santo Antão, Pernambuco, sob organização da Universidade Federal de

Pernambuco. (Anderson e Rodrigues, 2008,p30).

A residência médica em MFC, sucessora dos programas de residência em

Medicina Geral e Comunitária, é regulamentada pela resolução da CNRM Nº. 02

/2006, de 17 de maio de 2006. É um programa de acesso direto e possui dois anos

de duração obrigatória e um terceiro ano opcional com foco em administração em

saúde, que atualmente é oferecido por apenas uma instituição no Brasil. (CNRM,

s/d).

Um estudo do Ministério da Saúde demonstra que até meados da década de

90 estes programas permaneceram limitados, tanto em vagas quanto em procura

pelos recém formados, uma vez que o mercado de trabalho era bastante restrito,

não havia visibilidade do trabalho em medicina de família na graduação nem espaço

nos meios acadêmicos. Além disso, o sistema de saúde estruturado em uma

atenção hospitalocêntrica e dividida em especialidades focais desvalorizava o

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trabalho em APS. (Carro,2004, p235) O próprio Estado, representado naquele

período pelo INAMPS, reduziu drasticamente o financiamento dos programas,

resultando em um desmonte da maioria deles. (Falk, 2005,p38)

Com a expansão do Programa Saúde da Família, a residência médica e a

especialidade começam a ganhar maior visibilidade. As modificações curriculares

nos cursos de graduação iniciadas no final dos anos 90 do século XX e início do

século XXI, diversificaram os cenários de ensino aprendizagem e também

contribuíram para o despertar do interesse de novos médicos pela medicina

comunitária.

No entanto, a abertura de novos postos de trabalho em APS não significou no

reconhecimento do médico de família como o profissional adequado para este fim.

Além de outras especialidades médicas pleitearem seu espaço neste novo mercado,

a própria necessidade de um profissional especializado para atuar na APS é motivo

de debate (Campos e Belizário, 2001, p132). Poucos estudos internacionais se

debruçaram sobre esse assunto, mas como mostra a revisão realizada por Harzheim

e colaboradores (2008,p38), alguns trabalhos mostram que médicos que passaram

por dois anos de residência utilizam mais uma abordagem psicossocial e a educação

em saúde, além de realizarem menos encaminhamentos para outros níveis de

atenção, quando comparados com médicos sem especialização na área.

Apesar da discussão sobre o profissional de APS permanecer, em 2004 o

governo federal por meio do MS começou a investir no aumento do número de

vagas dos programas existentes e na criação de novos programas, financiando

bolsas e fazendo parcerias com prefeituras municipais para que os médicos

residentes tivessem o mesmo piso salarial dos médicos atuantes no PSF, que

significou em um aumento salarial de até 100% em alguns programas. (MS,2005,

Prefeitura Municipal de Sobral,2008)

Atualmente a medicina de família e comunidade conta com 78 programas

credenciados em todo o país, que apresentam diferentes perfis de ocupação e

atividade. Em levantamento realizado por CASTRO em 2006 com doze programas

ativos, utilizando dados da CNRM, podemos observar a seguinte taxa de ocupação:

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Tabela reproduzida de Castro, 2007p47.

Como podemos observar, a ocupação das vagas dos programas de

residência médica em MFC varia consideravelmente, dependendo do programa

avaliado. Uma investigação mais aprofundada, levando em consideração as

características regionais do sistema de saúde e perfil dos programas, de forma

prospectiva, poderia auxiliar na compreensão do que se passa.

A residência médica em medicina de família e comunidade vem sofrendo

mudanças significativas e abrindo espaço para experimentações no âmbito da

formação profissional. A urgente necessidade imposta pelo Ministério da Saúde de

formação em massa de um grande número de médicos para atuar no programa de

saúde da família trouxe consigo a possibilidade de respostas mais criativas para as

instituições. Observa-se a entrada de novas instituições no papel formador - o

potencial da rede municipal começa a ser reconhecido e legitimado. A utilização de

recursos de educação à distância e a criação de residências multiprofissionais são

também iniciativas que começaram a se estruturar em programas de medicina

comunitária.

Em paralelo ao processo de criação e crescimento dos programas de

Residência Médica, observa-se no Brasil uma preocupação crescente com o grande

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número de médicos que atuam na APS sem qualificação específica e a imensa

discrepância entre equipes da ESF e vagas de RM. Falk (2005,p129), ao mencionar

estudo que investigou o perfil dos médicos e enfermeiros atuantes no PSF na

década de 90 do século XX, declara que apenas 14,1% dos médicos haviam

cursado residência médica e 39,5% algum tipo de especialização, em áreas diversas

da medicina de família e comunidade.

O objetivo desta estratégia seria o de “converter” os médicos que atuam na

APS, em especial na ESF, sem formação específica na área, em especialistas.

Visando regulamentar esse mercado em expansão, diversas entidades reunidas em

2008 durante a III Cumbre Iberoamericana de Medicina Familiar estipularam uma

meta de 10 anos para que o título de especialização seja indispensável para atuação

na APS, tal como em outros campos da medicina. (HARZHEIM et al 2008,p36)

Os desafios levantados por esse tipo de iniciativa se relacionam na escassez

de preceptores com formação em medicina de família e comunidade, uma vez que

até o presente momento o Brasil conta com apenas 992 médicos especialistas em

MFC – dados da SBMFC até dezembro de 2007- e um número similar de médicos

com residência em MFC, a falta de um processo de avaliação e vistoria efetivos dos

programas e a continuidade das parcerias com os gestores municipais.

Essas características distinguem a residência em MFC dos demais

programas, cuja formação está prioritariamente focada nos hospitais e cujas políticas

de planejamento e gestão concentram-se nas instituições formadoras (Carro et al,

2004, p226). A interação da medicina de família e comunidade com as demais

especialidades médicas ainda é tímida, porém espera-se que nos próximos anos

esse debate possa permear a discussão da residência médica como modelo de

formação de maneira mais ampla.

A residência em MFC pode ser entendida como mais um campo de interface

dos médicos de família com o mercado de trabalho, gestão e formação profissional.

Pela natureza destas características, é um espaço rico para o desenvolvimento de

soluções solidárias e criativas para os problemas de assistência à saúde das

comunidades, além de palco de disputas e tensões. Por tudo isso, merece ser

observada mais profundamente, com a expectativa de assim colaborarmos para a

construção de um sistema de saúde e uma APS mais coerentes.

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3.1 Estrutura e funcionamento da MFC

O funcionamento dos programas de residência médica é regulamentado por

um conjunto de decretos oficiais. Os documentos denominados oficiais são aqueles

que têm autoridade de lei, produzidos por órgãos do Estado com o objetivo de

regulamentar a existência e funcionamento da residência médica como curso de

pós-graduação.

No entanto, o caminho de reconstrução da trajetória da residência médica no

Brasil começa algumas décadas antes do Decreto 80.281 de 1977, que

regulamentou a RM como modelo para a formação de especialistas.

O período que antecedeu à criação da legislação relativa à RM, no início da

década de 50 do século XX, caracterizou-se pela ausência de remuneração e

informalidade nos vínculos entre o médico residente e a instituição, em uma relação

marcada pelas concepções românticas e ideológicas da formação médica. Nesse

momento, o mercado era composto predominantemente por médicos que não

haviam cursado a RM, sem que houvesse então uma pressão por parte do mercado

de trabalho para este tipo de especialização. As décadas seguintes caracterizam-se

por profundas mudanças no perfil do médico, marcadas pela especialização e

crescimento do complexo tecnológico industrial na área da saúde. O mercado de

trabalho vai se modificando, e no final da década de 70 do século XX, existe uma

forte pressão - traduzida aqui em melhores salários, status e oportunidades de

ascensão profissional - para a realização de RM pelos médicos recém-formados.

(Martins 2005,p29).

Neste período, o número de programas aumentou significativamente, e com

isso os problemas e discrepâncias na formação foram se aprofundando, culminando

com a mobilização nacional dos residentes, que levou à primeira greve nacional dos

médicos no Brasil. Esse momento é profundamente marcante no movimento médico

brasileiro, uma vez que em decorrência deste processo de mobilização houve a

criação da Comissão Nacional de Residência Médica e significativa mudança no

panorama geral dos programas.

Chegamos, então, ao Decreto 80.281. O objetivo da análise deste documento

é compreender a concepção de currículo e de ensino aprendizagem na residência

médica neste período e os possíveis impactos da legislação sobre a estruturação

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dos programas. Além disso, buscamos a presença do cuidado em saúde no

documento, e as possíveis concepções que podem estar associadas a este conceito.

O documento, em seis artigos, delimita várias questões estruturantes, que

serão discutidas a seguir. A legislação demarca de forma clara a questão da

especialização na residência médica, o que inicia uma divisão no processo de

especialização profissional – residência médica e cursos de especialização lato

sensu. A partir desse momento apenas os programas credenciados pela CNRM

podem ser denominados como “residência médica”. Isso centraliza no Ministério da

Educação e Cultura o poder de credenciamento dos programas.

O primeiro artigo do Decreto situa a RM na categoria de ensino de pós-

graduação, uniprofissional, indicando que o aprendizado se dará com o contato com

médicos de “elevada qualificação ética e profissional” (grifo meu), sem, com isso,

delimitar a qualificação acadêmica e a forma de orientação pedagógica. Sinaliza,

desta forma, a compreensão de que o processo de ensino-aprendizagem na

residência se dará essencialmente pelo contato do médico aprendiz com um

profissional mais experiente no cotidiano do serviço. A ausência de um

direcionamento pedagógico explicitado pode nos fazer entender que a aprendizagem

se dará apenas pela convivência e observação das habilidades e competências do

médico tutor, sem que um plano de ensino estruturado seja uma exigência formal.

O texto não apresenta a possibilidade, hoje real e amplamente discutida, do

aprendizado com profissionais de outras áreas da saúde e da intersetorialidade (a

troca de conhecimento com outros setores da sociedade, não se limitando à área da

saúde). Essa diferença demarca as modificações ocorridas ao longo do tempo na

compreensão da educação médica e do trabalho em saúde de forma mais ampla.

O Decreto divide os programas em cinco grandes áreas - Clínica Médica,

Cirurgia Geral, Pediatria, Obstetrícia e Ginecologia, Medicina Preventiva e Social –

porém, desde a elaboração deste decreto, o número de especialidades médica e

sub-especialidades proliferou consideravelmente, tendo atualmente cinqüenta

especialidades médicas reconhecidas pelo CFM, sem contar com as sub-

especialidades (denominadas pela AMB áreas de atuação). Esse panorama sinaliza

o caminho tomado pela medicina nos últimos 30 anos, com o aprofundamento do

conhecimento técnico especializado traduzido em especialidades médicas.

O primeiro artigo delimita a duração mínima do programa em horas,

procedimento padrão na regulamentação de cursos de pós-graduação. Não há,

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nesse momento, ainda uma diferença estabelecida entre as especialidades

(atualmente um programa pode durar de dois a seis anos) nem um consenso que

estabeleça a duração dos programas. Essas particularidades modificaram-se ao

longo do tempo e provavelmente continuarão mudando, uma vez que pressupõe um

consenso sobre o tempo ideal para a formação de um especialista em diferentes

áreas. Apesar disso, o terceiro parágrafo menciona o estabelecimento de uma carga

horária mínima de atividades teóricas com participação ativa do residente. A

distribuição da carga horária total varia entre os serviços e especialidades, sendo

regulamentada posteriormente em sessenta horas semanais (Brasil,1981), por conta

de protestos constantes por parte dos médicos e mudanças na legislação

internacional. (Martins, 2005,p32)

O segundo artigo do decreto cria e delimita as funções da Comissão Nacional

de Residência Médica (CNRM), órgão que avalia, credencia e vistoria os programas

de residência médica no Brasil. A criação da comissão traduz de diversas maneiras

as forças de tensionamento que evolvem a RM, e os interesses muitas vezes

díspares. Ao longo do tempo, a composição da comissão modificou-se, não

contando mais com representantes das forças armadas, porém mantendo sempre

essa pluralidade de entidades governamentais, representantes dos médicos

residentes e entidades médicas. A certificação profissional fica, então, sob tutela da

CNRM e, desse modo, na dependência de negociação das entidades que participam

desse processo, nem sempre de forma equilibrada. A criação da CNRM demarca

uma forma de regulação e interlocução das entidades médicas e Estado, e da

interface de diferentes esferas governamentais na formação de recursos humanos

na área da saúde.

Além da composição e estrutura hierárquica da Comissão, o decreto

menciona as atribuições referentes à vistoria e à avaliação dos programas,

considerando as necessidades de saúde locais, interessante observação em um

momento político marcado pela da ausência de um sistema de saúde articulado.

As Universidades têm papel destacado no desenvolvimento dos programas,

uma vez que a legislação determina a vinculação dos programas a uma instituição

de ensino superior, ainda que o papel das escolas não fique claro. Em um momento

anterior à criação do SUS, sem um sistema de saúde estruturado no país, a

possibilidade de um serviço assistencial elaborar um programa sem a tutela de uma

universidade era impensável.

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Como é previsível em uma legislação que regulamenta genericamente um

modelo de pós-graduação, o decreto não delimita com clareza como se dará a

residência médica de maneira prática. Funciona como norte, principalmente

legitimando a CNRM como espaço para as negociações entre entidades. Reforça o

predomínio das atividades práticas no aprendizado, mas não explicita um modelo

pedagógico a ser seguido. Neste caminho, é interessante observar a ausência do

cuidado em saúde como um conceito explícito na elaboração do documento, na

preocupação de critérios mínimos de qualidade e funcionamento.

Em seguida passamos à análise da resolução que trata das especificidades

da medicina de família e comunidade. Contextualizando o documento, a

especialização em medicina só pode acontecer após a conclusão do curso de

graduação, sendo que algumas especialidades necessitam de uma especialização

prévia para que possam ser alcançadas. Por conta disso, a resolução 02/2006

começa por determinar nominalmente quais especialidades têm o acesso direto e

quais necessitam deste percurso. Essa configuração muda constantemente, tanto

pela proliferação de novas especialidades quanto pelas alterações e subdivisões em

especialidades previamente existentes. No caso da medicina de família e

comunidade, sendo esta uma área considerada básica, mantém-se o acesso direto,

ou seja, médicos recém saídos da graduação podem se candidatar a um dos

programas credenciados.

Neste contexto, a resolução de 02/2006 é a mais recentemente utilizada para

a regulação dos programas, sendo precedida por outros documentos com

semelhante finalidade e, provavelmente, será futuramente substituída por uma

versão mais atualizada. É, portanto, um documento que tem um caráter bastante

atual e, de certa forma, traduz a transitoriedade dos conhecimentos, habilidades e

atitudes que regulamentam a especialização médica. Auxilia, então, a conhecer

melhor o tempo presente, o que foi priorizado e esquecido.

O documento busca listar e definir para os programas as características

esperadas no egresso da residência em MFC, além de mencionar como as

atividades de formação devem ocorrer para que essas competências sejam

alcançadas.

Inicia demarcando o objetivo da residência em MFC “formar um especialista

cuja característica básica é atuar, prioritariamente, em Atenção Primária à Saúde, a

partir de uma abordagem biopsicossocial”. Este trecho do documento sinaliza, de

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forma clara, que a formação de um médico de família necessita o aprendizado de

uma nova abordagem do processo saúde-adoecimento. Ao longo do texto,

encontram-se pistas de como esta abordagem diferenciada pode se estruturar.

As competências esperadas para o especialista formado mencionam a

abordagem centrada na pessoa, e trazem como foco desta abordagem a relação

médico-paciente, o cuidado em saúde e a continuidade. Podemos identificar o

cuidado em saúde como uma das habilidades que estruturam a prática desse

especialista, inserida na abordagem e na relação profissional-indivíduo-família-

comunidade.

A forma como esse médico irá adquirir essas competências fica subentendida

nas atividades de treinamento que se espera desenvolver durante a residência.

Existe uma preocupação de delimitar os cenários de aprendizado do residente e a

resolução menciona uma distribuição de carga horária, de forma a garantir que o

residente experimente diferentes serviços e níveis de atenção. Como parte deste

processo de aprendizagem, o médico em formação deve experimentar cenários de

atuação nos diferentes níveis de assistência (primária, secundária e terciária), além

de atividades gerenciais e de pesquisa.

A CNRM lista quatro esferas principais de atuação do residente em medicina

de família: assistência à população no nível individual, no nível familiar e coletivo,

atividades de administração e planejamento e sinaliza a necessidade do

desenvolvimento de ações relacionadas ao ensino e à pesquisa em MFC. Podemos

observar que as atividades elencadas para a residência em MFC pressupõem o

desenvolvimento de habilidades em que se identifica o cuidado nos níveis individual,

coletivo e na gestão dos processos de trabalho e na interface das políticas de saúde,

além de espaço na pesquisa da área.

Nas atividades com foco no atendimento individual percebe-se a preocupação

de incluir a promoção e proteção à saúde, incutidas nas atividades assistenciais.

Nesta questão, a resolução menciona os atributos já reconhecidos do trabalho em

medicina de família e comunidade – prestar assistência aos problemas de saúde

mais freqüentes da população em todas as fases da vida, identificar e encaminhar

problemas que fogem a esfera da APS para outros níveis de atenção, identificar os

ciclos vitais de desenvolvimento individual.

Na abordagem familiar e comunitária a resolução foca na identificação das

crises familiares e no diagnóstico comunitário, e propõe algumas linhas de cuidado

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que possibilitam o exercício de uma assistência mais integradora, tais como os

trabalhos grupais, a educação em saúde, e o trabalho multi/inter disciplinar. A

promoção e a proteção à saúde também estão presentes, com foco no papel

comunitário na resolução das questões de saúde.

Na esfera da gestão, temos na avaliação dos processos e metas de

qualidade, associada a ações intersetoriais, as principais atividades a serem

desenvolvidas.

O desenvolvimento de pesquisa e de atividades de educação em saúde para

a equipe são itens que também aparecem na resolução, sem, no entanto, discriminar

de que forma essas pesquisas seriam incluídas no cotidiano do trabalho dos

residentes e com que suporte. É interessante observar a última habilidade

mencionada na resolução, que diz respeito ao desenvolvimento profissional

continuado do residente- “Promover o auto-aprendizado e a atualização de

conhecimentos na área da medicina geral, familiar e comunitária”- e que pode ser

entendida como um estímulo à educação permanente no espaço da RM.

Não há menção específica às atividades teóricas, sobre métodos didáticos ou

ao conteúdo que poderia/deveria ser abordado nesta atividade, ainda que seja

obrigatória, por determinação da própria CNRM.

A resolução aponta diversos caminhos a serem percorridos pelo residente no

desenvolvimento de habilidades necessárias para a prática qualificada em MFC. O

cuidado integral em saúde permeia todo o documento, sendo possível vislumbrar

uma prática voltada para uma abordagem centrada na pessoa e orientada para a

comunidade. No entanto, a falta de um direcionamento do processo de ensino-

aprendizagem, pode dar margem a uma residência caracterizada por uma infinidade

de tarefas, sem, no entanto, problematizar esses espaços de aprendizagem.

O estímulo à pesquisa, é, a nosso ver, uma proposta ousada e que pode

contribuir para o desenvolvimento da APS no Brasil. Entretanto, a revisão realizada

para esta pesquisa demonstra que, apesar de presente no documento oficial, a

pesquisa na e sobre a residência médica em MFC ainda é incipiente no nosso país,

provavelmente pela falta de suporte para esta prática no cenário de atuação dos

médicos residentes e o despreparo da maioria dos preceptores para tarefas dessa

natureza.

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3.2 – A visão da Sociedade de Especialidade a respeito da Residência. Já mencionamos anteriormente que a residência médica como modelo para

formação de especialistas é plural e se estabelece como um terreno de negociações,

em que as sociedades de especialistas compõem um papel importante, ainda que

muitas vezes polêmico. Na medicina de família, a Sociedade Brasileira de Medicina

de Família e Comunidade (SBMFC) ocupa esse espaço junto aos órgãos

responsáveis, como a AMB, CNRM e MS, e tem participado ativamente dos

processos de negociação, vistoria e implementação dos programas no Brasil. Nesse

sentido, é pertinente contextualizar o desenvolvimento da entidade no cenário da

APS no Brasil, a fim de termos um olhar mais apurado em relação ao documento

analisado.

A história da entidade se mistura à história da medicina de família e

comunidade no Brasil. A fundação da Sociedade de Medicina Geral e Comunitária

(SBMCG), no ano de 1981, coincide com a formalização dos primeiros programas de

RM em Medicina Geral e Comunitária pela CNRM. Da mesma forma, em 1986,

ocorre o 1° Congresso Brasileiro de Medicina Geral Comunitária em Sete Lagoas,

MG, ano em que o Conselho Federal de Medicina (CFM) reconhece a Medicina

Geral Comunitária como Especialidade Médica, e a Sociedade Brasileira de

Medicina Geral Comunitária como sua representante (FALK, 2004,p06). Esses

acontecimentos não são apenas uma coincidência cronológica e, ao longo do tempo,

podemos então observar a concentração de esforços do reduzido número de

especialistas na área para demarcar seu espaço de interlocução com as entidades

médicas e com o Estado.

Em diversos momentos nessa trajetória, provavelmente em decorrência das

condições pouco favoráveis do mercado de trabalho/pesquisa/ensino da MFC no

Brasil, houve esvaziamento da entidade, sendo inclusive desativada por alguns

anos. A criação do PSF e o conseqüente fortalecimento da APS no Brasil na década

de 90 do século XX trazem nova tônica para a especialidade, e, em 2001, a entidade

é reativada, já com o nome de Sociedade Brasileira de Medicina de Família e

Comunidade, sendo filiada a WONCA e AMB no ano seguinte.

Neste contexto, em 2005, foi elaborado um documento pela SBMFC com o

intuito de nortear a implantação e a organização dos novos programas de residência

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em MFC, detalhando cenários, atividades e infra-estrutura considerados adequados

para a situação atual.

Este documento, ainda que não tenha valor legislativo, reflete o acúmulo de

discussão dos especialistas em MFC e o posicionamento da entidade perante esse

processo de formação. Considerando esse aspecto, acreditamos ser pertinente

buscar o olhar da entidade a respeito do cuidado em saúde, como se insere neste

modelo de formação proposto.

Inicialmente, observamos no texto uma preocupação com a proliferação dos

programas sem uma avaliação particularizada, em um momento político de

expansão acelerada da Estratégia Saúde da Família, como podemos observar no

trecho a seguir: “A realidade particular de implantação de PRMs em situações em que o poder público encontra limitações para expandir a ESF torna necessário um acompanhamento mais detido. E sugere uma particularização de normas complementares e transicionais, até que o desenvolvimento cuidadoso dos programas atinja sua maturidade”.

Como esperado, o documento traz, logo no início, a compreensão da entidade

a respeito do trabalho na medicina de família, e demarca a concepção de cuidado

que se espera do médico de família: “abrangente, continuado e contextualizado da

saúde das pessoas, preferencialmente no âmbito de equipe multidisciplinar”. A partir

daí, é razoável esperar que as tarefas elencadas traduzam essa compreensão e

expectativa.

Partindo, então, da percepção que a abrangência das atividades

desempenhadas pelos médicos de família faz com que em muitas instituições o

número de cenários de aprendizagem e preceptores seja bastante extenso, o

documento sinaliza para a necessidade de integração destas tarefas, ao mencionar

que “O MFC não é adequadamente formado com uma fusão antipedagógica das

chamadas áreas básicas, como pediatria, gineco-obstetrícia, medicina interna,

cirurgia e psiquiatria”. Claramente, demarca a inadequação de expor o médico em

formação a uma infinidade de cenários, o que sugere uma advertência para que a

composição curricular não se torne a soma das áreas básicas como se essa fosse a

estratégia para formar um generalista.

O número reduzido de médicos especialistas em medicina de família e

comunidade formados até hoje também é motivo de reflexão, aqui relacionada à

disparidade entre vagas de residência e preceptores habilitados. Apesar de

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reconhecer que esse é um dos impasses na capacitação em massa de novos

especialistas, ainda assim o documento traz um posicionamento a favor de

preceptores especializados em MFC. Posteriormente, no fechamento do documento,

encontramos uma proposta para o enfrentamento dessa questão, que será debatida

posteriormente.

A fim de nortear a distribuição de carga horária, são elencadas algumas

categorias, que dizem respeito à tarefa a ser desempenhada. Os espaços de

aprendizagem seriam então: o consultório de MFC (com foco na consulta individual),

a atenção domiciliar (relacionada às consultas e internações domiciliares), os grupos

terapêuticos, os espaços administrativo-gerenciais (relacionados à organização e

planejamento do processo de trabalho), espaços que o documento nomeia como

“outras atividades coletivas” (entendidas aqui como espaços de representação social

da comunidade e ações de intersetorialidade), as atividades teóricas e as atividades

nos níveis secundário e terciário da atenção.

As três primeiras categorias representariam então a chamada “Clínica da

Medicina de Família e Comunidade” e, segundo o documento, deveriam ocupar mais

da metade da carga horária do programa de residência durante os dois anos de

formação. Se considerarmos a clínica, neste contexto, como forma de elaboração do

cuidado no processo de trabalho, existe então uma preocupação em priorizar esse

momento do aprendizado dos residentes, como núcleo do trabalho em MFC.

Em paralelo, traz-se um conjunto de competências a serem desenvolvidas,

com uma correspondência aproximada aos cenários citados anteriormente, sendo

estas competências clínicas nas áreas da saúde da mulher/do homem/do adulto/do

idoso/da criança e do adolescente; competências clínicas da atenção secundária;

competências clínicas na atenção terciária e emergência; abordagem sistêmica da

família; abordagem comunitária.

O documento apresenta, então, uma extensa lista de atividades assistenciais,

com objetivos, atitudes, habilidades, conhecimentos, teorias e situações de

treinamento em serviços nos diversos níveis de atuação do MFC, que não cabe aqui

pormenorizar. Fica claro o objetivo de dissecar cada uma dessas etapas, a fim de

garantir uma experiência padronizada nas diferentes instituições mantenedoras de

programas de RM. Isso fica mais evidente com a elaboração de listas da estrutura

física que devem estar presentes em cada serviço. Apesar do volume de

informações com vários parâmetros que podem ser utilizados na avaliação de

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desempenho dos residentes, é notável a ausência de um espaço de deliberação

sobre o processo avaliativo. A avaliação não é significada como espaço de

formação.

Por fim, há uma reflexão sobre a preceptoria na residência em MFC, em que

o documento expõe a posição da SBMFC a respeito da necessidade dos

preceptores serem especialistas em MFC, por meio de residência ou titulação pela

própria sociedade. Neste sentido, vê-se um claro movimento de estabelecer a

titulação como parâmetro de qualidade técnica para as atividades de preceptoria.

A entidade propõe, então, uma iniciativa para formar e atualizar os

preceptores, em modalidade de oficinas de capacitação para posterior multiplicação.

Esta proposta foi apoiada pelo Ministério da Saúde, e até a conclusão deste

trabalho, várias oficinas haviam sido realizadas no Brasil, ainda que o número exato

de preceptores capacitados e seu impacto nas residências ainda não estejam

disponíveis.

Percorrendo o documento podemos, então, conhecer um pouco mais a visão

da sociedade de especialidade a respeito da formação em MFC e a necessidade de

demarcar seu espaço como entidade na elaboração das propostas dos programas,

sendo a titulação dos profissionais médicos que atuam na ESF uma das estratégias

priorizadas. O cuidado em saúde está presente na conceituação básica do trabalho

em MFC e permeia as atividades e competências desejadas no residente.

3.3 Os modelos pedagógicos de formação para a MFC no Rio de Janeiro

Os programas das instituições analisados a seguir, acontecem no estado do

Rio de Janeiro, e encontram-se ativos no momento do desenvolvimento desta

pesquisa. Atualmente o Rio de Janeiro conta com cinco programas ativos,

credenciados CNRM, e nesta pesquisa foi possível analisar quatro destes

documentos, uma vez que não conseguimos acessar uma das instituições.

Optamos por não identificar as instituições, uma vez que o objetivo deste

trabalho não é fazer uma avaliação das instituições que desenvolvem os programas

e sim dar uma visão do cenário da RM no estado do RJ.

Os documentos analisados a seguir, ainda que tenham como base a

resolução 02/2006 da CNRM, divergem bastante em forma, apresentação e

conteúdo. A fim de possibilitar uma reflexão a respeito da residência médica em

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MFC no estado do RJ, buscamos nos documentos informações que pudessem

elucidar alguns aspectos de sua estrutura curricular, sendo esses: os cenários de

aprendizagem, as atividades teóricas, a forma de avaliação, a relação com a rede

SUS, o espaço para produção científica e reflexão sobre o processo de trabalho,

além de um posicionamento pedagógico claro, quando presente.

3.3.1 Análise do Programa da Instituição 01

A análise do programa, seguindo a concepção de documento destacada neste

trabalho, não pode desconsiderar as características da Instituição que o oferece.

Neste sentido, sabemos que o programa é credenciado junto a CNRM, é oferecido

por uma instituição de ensino superior de medicina em associação com a

administração municipal da cidade onde está localizado. Anualmente, são oferecidas

duas vagas para ingresso no primeiro ano. Não há vagas para um terceiro ano

opcional.

Inicialmente, buscamos conhecer a estrutura curricular e posteriormente

tentamos conhecer as maneiras como o cuidado se apresenta no programa.

Observando, então, como o texto do programa se constrói, encontramos a ementa

do curso, em que constam as principais temáticas trabalhadas ao longo da RM. Os

temas predominantes relacionam-se ao Programa de Saúde da Família e sua

relação com o restante do sistema único de saúde, com destaque especial para os

aspectos de financiamento e sistema de informação.

Podemos observar que o cuidado em saúde não aparece como conceito

norteador, nem temática de estudo nesta etapa do documento. Além disso,

percebemos também a ausência de menção, nesta etapa, de tópicos específicos a

respeito de abordagem clínica ou conceituação de saúde.

A estrutura do programa reflete um currículo norteado por competências,

sendo então necessário definir o conceito de competência utilizado. Neste trabalho

foi utilizada uma definição dialógica de competência, mais compatível com um

processo de ensino aprendizagem significativo. Desta forma, a busca das

competências anunciadas neste programa sugere um conjunto de conhecimentos

especializados e saberes tácitos, habilidades e atitudes desenvolvidas na trajetória

de vida dos sujeitos, tal como definido por RIBEIRO (2003). Com base nestas

competências, o próximo passo envolve a avaliação dos objetivos de aprendizagem

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e os conteúdos a fim de verificar se dão conta das competências almejadas e se

existem instrumentos de avaliação validados que possam verificar se os objetivos

foram alcançados.

Neste sentido, o programa da instituição 1 apresenta um conjunto de objetivos

de aprendizagem que explicitam os conhecimentos e habilidades a serem

desenvolvidos no decurso da residência médica. Podemos dividir esses atributos em

1. Habilidades no processo de trabalho 2. Habilidades clínicas 3 Habilidades de

planejamento e gestão. As habilidades clínicas focam na capacidade de

acompanhamento de uma pessoa no processo de adoecimento e levantam a

necessidade de um olhar levando em consideração aspectos psicossociais e

genéticos, um “pensar integrado”. Nas habilidades relacionadas ao processo de

trabalho observamos uma necessidade de “desenvolver características humanísticas

no trabalho em equipe”. Apesar do cuidado não estar anunciado nestas habilidades,

elas falam a favor de uma preocupação para além do corpo e da doença.

Para além dos objetivos de aprendizagem, este programa lista uma série de

competências a serem desenvolvidas e alcançadas pelos residentes de primeiro e

segundo ano, caracterizando o aspecto progressivo do processo de ensino-

aprendizagem na residência médica. A ênfase aqui está na característica reflexiva

destas competências, marcadas por características como “problematizar”, “discutir” e

“reconhecer nexos”, muito relacionados aos objetivos de aprendizagem citados

anteriormente. Neste processo, espera-se do residente de segundo ano a

capacidade de assumir uma equipe de PSF. Deste modo, a análise crítica do modelo

de APS no Brasil - estabelecer parcerias intersetoriais, refletir a respeito da

educação permanente e da formação profissional - são atributos esperados deste

médico.

O cuidado em saúde aparece neste programa traduzido pelas habilidades e

atitudes esperadas no desenvolvimento dos médicos residentes, assim como nas

suas atividades assistenciais. O processo de ensino aprendizagem não fica claro,

porém nota-se uma estruturação do processo desde as competências a serem

atingidas, sem, no entanto, situar de que maneira o aprendizado será avaliado.

Neste sentido, o cuidado, ou a maneira de expressar esse cuidado, não aparece

como algo a ser aferido ou avaliado, muito mais presente nas entrelinhas dos

objetivos de trabalho.

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55

Não há uma descrição detalhada das atividades cotidianas dos residentes;

portanto, a tradução dos objetivos de aprendizagem em experiência concreta

depende da organização do processo de trabalho da instituição, a qual não é

explicitada em documentos.

3.3.2 Análise do Programa da Instituição 02

O segundo programa analisado é desenvolvido por uma instituição de ensino

superior em parceria com a secretaria municipal de saúde, e oferece anualmente

duas vagas de residência médica em MFC, sendo credenciado junto a CNRM.

O programa organiza-se como uma lista de tarefas e atividades, divididas por

cenários e cronologia do curso. No entanto, faltam informações relacionadas aos

objetivos de aprendizagem, avaliação do processo de ensino aprendizagem e corpo

docente esperadas em uma estrutura curricular.

O objetivo enunciado no programa, de “desenvolver habilidades necessárias

ao exercício da medicina de família de forma integral, sintonizada com as políticas

de saúde vigentes e pautada nos princípios do SUS”, é compatível com as diretrizes

da CNRM, porém é um tanto vago na elucidação do processo de ensino

aprendizagem.

No entanto, ao observarmos as atividades listadas, podemos de forma indireta

nos aproximar destes objetivos e do que se espera do médico egresso. Inicialmente

observamos uma divisão da carga horária semanal, em que os residentes passam

metade de sua semana nas unidades básicas de saúde (UBS) do município e a

outra metade em atividades teóricas e em ambulatórios de especialidades ou em

enfermarias dessas mesmas especialidades básicas (Ginecologia, Pediatria, Clínica

Médica, Cirurgia Geral), e em um plantão de emergência. Além das tarefas

assistenciais, os residentes passam seis meses no setor de saúde coletiva

desenvolvendo ações de gerenciamento do sistema local.

Cada cenário de atuação vem acompanhado de uma lista de atividades a

serem desenvolvidas e o foco que essa residência assume nestes espaços de

aprendizagem. Nas enfermarias, ambulatórios e plantões espera-se do residente a

familiarização com as rotinas e procedimentos, mencionando-se a relação médico-

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paciente-família, o que pode ser interpretado como preocupação com o cuidado.

Apesar de não haver uma reflexão, no programa, a respeito de como essa relação

se dará, o fato de estar mencionada como uma das habilidades a serem

aprimoradas denota uma atenção especial a este aspecto do trabalho na MFC, ainda

que fora do cenário habitual de atuação do médico de família.

Nas UBSs, pode-se perceber que as habilidades e conhecimentos da

medicina de família ficam mais explícitos, com especial atenção ao chamado

“diagnóstico ampliado”. Apesar de não aparecer no documento uma definição mais

precisa deste termo, é razoável supor que se espera do residente o

desenvolvimento, neste cenário, de uma capacidade clínica para além do

conhecimento biomédico, ampliando-o para o conhecimento das narrativas de vida e

outras habilidades, que dão corpo à MFC. Um diagnóstico ampliado pressupõe uma

terapêutica ampliada. No caso da residência em MFC, a integralidade do cuidado é

parte estruturante desta etapa da abordagem clínica, permeando todo o processo de

trabalho. Vislumbrar a necessidade de ampliar a abordagem para além das doenças

permite o desenvolvimento destas habilidades.

Identifica-se, então, neste programa que não há menção explícita ao cuidado

em saúde, como um tema de discussão ou como habilidade a ser desenvolvida.

Mais uma vez, percebemos que a tônica do cuidado está, de alguma maneira,

implícita no fazer do dia a dia, tanto nas atividades assistenciais quanto na rotina da

atenção primária. Enfim, a falta de uma estrutura curricular clara torna difícil

visualizar o perfil do egresso.

3.3.3 Análise do Programa da Instituição 03 O terceiro programa analisado também é desenvolvido por uma instituição de

ensino superior, que utiliza a rede municipal para realizar parte de suas atividades

assistenciais, sendo o restante das atividades didáticas desenvolvido nas unidades-

escola da própria instituição. O programa disponibiliza anualmente duas vagas para

ingresso no primeiro ano. Não há vagas para o terceiro ano de residência.

O documento é bem estruturado, apresentando uma lista específica de

objetivos a serem alcançados, o conteúdo programático a ser estudado/vivenciado

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neste período, as habilidades e atitudes que devem ser trabalhadas e a metodologia

empregada, além do modo de avaliação do desempenho do residente. Nestes

aspectos, o documento se assemelha muito ao que se espera de uma estrutura de

currículo em um curso de pós-graduação.

Outros itens que compõem esse programa são a grade de atividades dos

residentes ao longo do tempo e os locais onde as atividades ocorrem, com a

distribuição de carga horária correspondente. Neste quesito, observamos que os

residentes percorrem um grande número de cenários, uma característica que se

apresenta nos demais programas analisados e que merece reflexão, uma vez que a

continuidade do processo de ensino aprendizagem destes residentes, em cenários

tão diversos, deve ser embasado por uma equipe de preceptores bem afinada; do

contrário, corre-se o risco de fragmentar a experiência.

Voltando aos objetivos elencados no programa, percebe-se a presença das

questões básicas do trabalho na medicina de família, tais como o diagnóstico e

tratamento dos problemas de saúde mais prevalentes, e a preocupação com o

cuidado integral à saúde manifesta-se na ênfase no desenvolvimento da relação

médico-paciente-equipe, no diagnóstico comunitário e no trabalho em equipe

multiprofissional. Aspectos relacionados à educação em saúde e promoção à saúde,

trabalho com grupos e vigilância epidemiológica complementam o quadro de

objetivos, e produzem espaços de possibilidades para o desenvolvimento do cuidado

em saúde.

Para alcançar os objetivos mencionados, o programa cita uma lista de

conhecimentos, habilidades e atitudes a serem desenvolvidas e aprimoradas durante

a residência. É interessante perceber que os conhecimentos são separados em

conhecimentos gerais da medicina de família e conhecimentos específicos de outras

especialidades, traduzindo, a nosso ver, uma compreensão de que o cuidado nas

diferentes faixas etárias (crianças, adultos, idosos) e nos sistemas fica sob a

responsabilidade de outras especialidades que não a MFC, o que de certa forma

causa estranhamento, uma vez que o campo de conhecimento da MFC inclui todos

os itens mencionados. Uma vez que este aspecto da formação não é elucidado no

documento, a maneira como essa divisão do conhecimento influencia o processo de

ensino aprendizagem só poderia ser conhecida com uma investigação de campo.

Nas habilidades e atitudes esperadas destes residentes, podemos identificar o

cuidado em saúde, quando entendido como um procedimento, presente em vários

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itens, relacionados ao aprendizado de técnicas de entrevista e de intervenção. O

cuidado, considerando a integralidade como norte, aparece na preocupação com a

promoção a saúde, na educação e no trabalho multi-interdisciplinar.

Um ambiente de trabalho e de aprendizado que possibilite o desenvolvimento

de uma atitude cuidadora, necessita de um direcionamento pedagógico que permita

o diálogo e a reflexão. No caso do programa em questão, o documento define uma

metodologia que “privilegiará o enfoque do ciclo de vida” em um trabalho

multidisciplinar, “segundo as premissas da atenção primária à saúde.” A natureza

desta abordagem, ainda que não fique totalmente clara, nos permite intuir que este

processo estimula a reflexão e auxilia na produção de sentido para o residente.

As atividades teóricas, denominadas aqui de educação continuada, incluem

temáticas da saúde coletiva e temas clínicos, ministrados pelos docentes da

instituição nos locais de atendimento e incluem seminários, apresentação de casos,

clube de revista e aulas.

Por fim, a avaliação dos residentes é realizada em três etapas, sendo a

primeira referente aos conhecimentos acumulados no período e tendo como

instrumento de avaliação provas e trabalhos teóricos, a segunda relacionada às

habilidades e atitudes, neste caso avaliadas pelos preceptores no dia a dia do

trabalho, utilizando parâmetros como “interesse e iniciativa profissional,

responsabilidade e assiduidade, relações humanas com a equipe e com os

pacientes” e, finalmente, a produção de uma monografia “sobre tema relevante da

especialidade”. Os critérios de avaliação utilizados pelo programa demonstram a

preocupação com o desenvolvimento de conhecimentos, habilidades e atitudes no

médico residente que são compatíveis com uma atitude cuidadora, ainda que essa

intenção não fique explícita no texto corrente. Por outro lado, esses mesmos critérios

permitem afirmar que o modelo de formação toma por base as competências1,

traduzidas pelas habilidades e atitudes a serem avaliadas no desempenho laboral do

1 Andrew Gonczi define pessoa competente como sendo aquela que possui os atributos (conhecimento, valores, habilidades e atitudes) necessários para o desempenho do trabalho e enfatiza que a educação baseada em competências deve ser holística no sentido de que reúna múltiplos fatores para o desempenho laboral exitoso abrangendo aspectos relacionados à generalidade e especificidade de tarefas, pois alguns trabalhos em certos contextos requerem combinações próprias de atributos e, em outros contextos, trabalhos similares requerem combinações mais complexas. Com base nesta análise o autor destaca o caráter dinâmico que deve ter a formação baseada em competências evidenciando sua concepção evolutiva que permite a análise crítica e melhoria constante de suas formas de implementação por meio de um método integrado que combine atributos, tarefas e contexto (Gonczi, 1998:162/3).

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residente, previstas em cada estágio supervisionado que realizar ao longo de seu

treinamento em serviço.

3.3.4 Análise do Programa da Instituição 04

O documento analisado, neste caso, difere dos demais por ter sido

disponibilizado em duas versões, uma lista de atividades com a grade curricular da

residência e um documento mais detalhado, apresentando atividades, cenários e

corpo docente do programa, no formato utilizado para a solicitação de

credenciamento junto à CNRM. Esses documentos, apesar de conterem as

informações necessárias para a análise deste trabalho, não são um programa de

residência propriamente dito.

Feita essa observação, podemos analisar o documento começando então

pelas informações contidas no formulário da CNRM. Temos uma lista de atividades,

divididas de acordo com a etapa da residência- primeiro, segundo ou terceiro ano-,

em diferentes cenários de atuação – enfermarias e serviços de emergência,

ambulatórios, atividades comunitárias- envolvendo assistência individual e familiar,

visitas domiciliares, atividades de grupo e de educação em saúde no ambiente

escolar. Neste sentido, este programa não difere muito das residências

anteriormente analisadas e tem um direcionamento coerente com a resolução da

CNRM.

A “prática integral da saúde”, a realização de interconsultas com equipe

multidisciplinar, a prática com grupos com portadores de doenças crônicas, a

educação em saúde no ambiente escolar, sinalizam o desejo por parte da instituição

do treinamento do residente em uma abordagem ampliada dos problemas de saúde,

com a possibilidade de desenvolvimento de um cuidado para além dos

procedimentos e intervenções pontuais.

As atividades teóricas traduzem com mais clareza essas intenções, quando

apresentam temáticas voltadas à racionalidade médica, a abordagem familiar, saúde

mental e políticas de saúde relacionadas à APS no Brasil.

Neste programa a elaboração de monografia ou artigo científico também é

requerida aos residentes, sendo que o método científico aparece como tema de

discussão, ainda que não se vislumbre na grade horária destes residentes tempo

para esta atividade.

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O processo avaliativo é mencionado, considerando-se atividades teóricas,

práticas e o artigo científico de conclusão, porém os critérios e os instrumentos de

avaliação não são explicitados. Com isso, temos pouca clareza dos objetivos de

aprendizagem e o perfil do médico egresso fica mais distante da nossa análise.

A grade de atividades deste programa demonstra uma atenção ao

desenvolvimento de habilidades e atitudes cuidadoras no médico residente, ao

colocá-lo em cenários e atividades que contribuem para a ampliação do seu olhar e

da sua terapêutica. Neste sentido, a presença de uma atividade semanal voltada

para a reflexão da relação médico paciente é um campo potente de desenvolvimento

destas características/qualidades humanas.

A falta de um documento organizado e estruturado como um programa de

residência não nos permite avaliar a orientação pedagógica e o delineamento

curricular da instituição, ainda que possamos identificar, mais uma vez, a presença

do cuidado em saúde nas atividades assistenciais propostas e nos conteúdos

discutidos.

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Considerações finais

“O que se pretende com o diálogo, em qualquer hipótese (seja em torno de um conhecimento científico e técnico, seja de um conhecimento “experiencial”), é a problematização do próprio

conhecimento em sua indiscutível relação com a realidade concreta na qual se gera e sobre a qual incide, para melhor

compreendê-la, explicá-la, transformá-la”. Freire (1977, p52)

A citação acima nos ajuda a retornar ao nosso ponto de partida e dar um

contorno à trajetória estabelecida nesta pesquisa. O percurso feito nesse trabalho,

ainda que represente um pequeno passo no reconhecimento da situação em que a

residência de Medicina de Família e Comunidade se encontra, nesse momento, no

estado do RJ, dá substrato a algumas reflexões. A análise dos documentos, como

recorte selecionado, possibilita conhecer uma das fases iniciais do processo de

elaboração dos programas, a maneira de organização das ideias e valores, que

esperamos dêem base para o processo de ensino-aprendizagem. Desta forma,

possibilita que o diálogo entre os diferentes atores que constituem a residência

médica fique mais transparente, claro e frutífero. Podemos, assim, começar a

compreender o lugar do cuidado nas residências em MFC.

O olhar investigativo, curioso, sobre estes documentos, traduz uma intenção

de valorizar a memória que carregam, o conhecimento que organizam e os

posicionamentos teóricos, políticos e ideológicos que traduzem. Desta forma,

observamos nos documentos algumas direções em comum que valem serem

mencionadas, bem como algumas ausências dignas de nota.

Os documentos normativos, considerando aqui as resoluções da CNRM,

marcam momentos significativos na história da residência médica em MFC, além de

reforçarem a percepção da residência médica como modelo consolidado de

formação na área médica. É interessante notar, ao mesmo tempo, que apesar desta

trajetória, o modelo de formação da RM é permeável a mudanças conceituais, uma

vez que se abriu, por exemplo, para possibilidades de interlocução com outras áreas

da saúde - como podemos observar com os programas de residência

multiprofissional, a interface com a equipe e com a comunidade (MS,2006). Temos

também algumas iniciativas inovadoras, como a interface da residência médica com

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a pesquisa em saúde, que apesar das possibilidades interessantes, ainda não

resultou em um volume de trabalhos que consolide o campo da pesquisa

relacionada com a residência médica no Brasil.

Da ausência do cuidado na resolução criadora da RM até a abordagem

biopsicossocial da residência em MFC observamos uma mudança, ainda que lenta e

discreta, na mentalidade - e por que não dizer?- da racionalidade envolvida no

processo de formação. Considerando que a medicina de família é apenas uma das

mais de cinqüenta especialidades médicas, não podemos inferir uma modificação no

processo de formação de outras especialistas, porém a semente do cuidado integral

em saúde aparece neste espaço.

Todos os programas, assim como o documento elaborado pela SBMFC,

mostram um movimento, consonante com a resolução 02/2006, de ampliar a

formação do médico de família e comunidade para além da consulta ambulatorial,

como demonstrado nas temáticas de promoção, prevenção, proteção à saúde

presentes nos textos.

A interação comunitária, ainda que receba várias denominações, também está

presente e demonstra a valorização da atuação do MFC para além do binômio

indivíduo-família. Ainda assim, a participação dos médicos nos espaços de gestão

local do SUS, do planejamento das políticas e negociação participativa com a

comunidade, além das ações de intersetorialidade aparecem timidamente nos

documentos, de forma pouco elaborada nos programas. A politicidade do cuidado,

entendido aqui como a elaboração de sua potência transformadora de espaços de

ajuda em espaços de cidadania e emancipação, não ocupa o espaço que talvez

mereça nos programas estudados.

Percebe-se que não há uma preocupação com a estrutura curricular na

elaboração da maioria dos programas analisados, o que pode dar margem a

algumas considerações – as RM não são vistas pelas instituições de ensino como

programas de pós-graduação, e, por conta disso, não há uma reflexão declarada a

respeito do processo de ensino-aprendizagem. Isso pode ser percebido na falta de

descrição dos processos de avaliação, na pouca clareza dos objetivos de

aprendizagem e na ausência de um projeto político pedagógico delineado.

Essa questão é bastante delicada, uma vez que a disseminação dos

programas de residência em medicina de família e comunidade tem, como um de

seus objetivos, suprir as deficiências de uma massa de médicos não especializados

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para atuar na atenção primaria à saúde. Nesse sentido, a falta de uma reflexão

sobre os processos pedagógicos que perpassam essa formação pode trazer

conseqüências importantes para a validação desse processo. Ou seja, sem uma

reflexão profunda sobre a maneira de ensinar novas habilidades e atitudes a esses

médicos, conseguiremos as transformações desejadas/almejadas? Ainda que estes

processos de reflexão estejam acontecendo no interior das instituições, o acesso

não é compartilhado pela comunidade científica, o que pode futuramente fragilizar

este modelo de formação.

Neste contexto, o lugar que o cuidado integral em saúde ocupa no modelo de

formação, e ainda mais importante, na realidade cotidiana do residente em MFC, é

permeado por constante tensionamento, uma vez que observamos movimentos que

facilitam e fomentam o desenvolvimento do cuidado, porém percebemos a existência

de outras condições que facilitam o enfraquecimento/fragmentação do cuidado.

A multiplicidade de cenários de formação no contexto da medicina de família

pode facilitar a flexibilidade e as soluções criativas na formação, uma vez que um

número maior de pessoas interage com o residente. Por outro lado, manter uma

linha de cuidado contínua sem fragmentação demanda um esforço maior e um

processo de responsabilização por parte dos preceptores, atitudes essas que

demandam uma conscientização sobre o ensino-aprendizagem na residência

médica.

Nesta procura pelo lugar do cuidado na formação do médico de família e

comunidade, a ausência de espaços de cuidado e reflexão para os residentes nas

propostas, indica uma desvalorização - ou não reconhecimento - destes espaços no

processo de ensino-aprendizagem. Existe cuidado para com os residentes? Eles são

cuidados de alguma forma nestes espaços de aprendizado? Essas indagações não

encontram resposta pela análise dos documentos, e vale nesse momento refletir

sobre a real importância do cuidado na residência em MFC.

Por que valorizar esse cuidado? Na abordagem clínica centrada na doença,

partimos o nosso olhar perante a pessoa adoecida, fragmentando a experiência de

adoecimento em fatos biológicos. Nesse momento, fragmentada também está a

figura do médico, que se coloca nesse encontro terapêutico apenas como um ser

racional, sem afetos, crenças e valores pessoais. Quando o médico se permite

cuidar integralmente de uma pessoa, em uma interação terapêutica genuína, ele

consegue resgatar não só o paciente, mas também ele próprio. O cuidado “devolve”

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ao médico a sua integridade, ao permitir que o encontro com o outro não seja

apenas prescritivo, desigual e objetivante (McWhinney,1997,p25).

Neste sentido, é importante considerar que o ensino do cuidado, como valor,

qualidade, característica humana, não é simples. Envolve uma experiência que

perpassa a subjetividade do profissional e que, acredito, necessita do envolvimento

do residente em um processo de cuidado, que deve estimular o processo de

autoconhecimento preconizado por McWhinney (1997, p21). Este processo envolve

transformar os conhecimentos adquiridos, as técnicas experimentadas, as

habilidades desenvolvidas em uma capacidade de coordenação destes atributos que

muitos denominam sabedoria. A sabedoria estaria no espaço de desenvolvimento de

uma personalidade equilibrada, que consegue estar totalmente presente, consciente

e atento ao encontro com o outro.

Neste contexto, a face humana do processo de ensino aprendizagem passa a

ser fundamental. Stewart (2003, p165), menciona o valor do relacionamento

estabelecido entre professor-aluno durante o processo de aprendizado do método

clínico centrado na pessoa. Uma relação de respeito, empatia e cuidado estimula e

traz para a consciência do estudante o modelo de relação esperado para com as

pessoas assistidas por ele. Na residência médica, em que além de aprendiz o

residente também faz parte do processo de trabalho, esses modelos se tornam

ainda mais preciosos para vencer as dificuldades de relacionamento em equipe e

trabalho colaborativo.

Os espaços de cuidado e reflexão na residência podem ter várias

conformações (Martins, 2005, p149), sendo que a única característica imprescindível

é fazer parte da rotina, da estrutura e do processo de trabalho do residente. Desta

forma, é garantido ao médico em formação espaço para o seu crescimento subjetivo,

para o desenvolvimento de sua autoconfiança e autoconhecimento. O estilo que

cada programa deseja ou pode promover vai depender de suas condições

estruturais e delineamento pedagógico, no entanto, é imprescindível que esta

reflexão tome corpo e ocupe algum tempo na formação do residente.

Fica claro, no processo desta pesquisa, que as ausências percebidas podem

denotar uma falta concreta no processo de ensino aprendizagem, ou apenas uma

não documentação da atividade. De qualquer forma, a contribuição deste trabalho

fica na expectativa de que os programas de residência médica tragam no futuro,

maiores informações que contribuam para a reflexão e aprendizado coletivos.

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Além disso, estas reflexões podem servir de partida para estudos com

delineamentos e escolhas metodológicas complementares, que auxiliem no

amadurecimento do campo de pesquisa da residência médica em MFC no Brasil,

com novos olhares e contribuições.

Espero, enfim, ter cumprido o objetivo de trazer novas informações e

reflexões à produção em pesquisa sobre a residência em MFC. O desenvolvimento

desta pesquisa foi um importante marco no meu desenvolvimento profissional, um

grande exercício da autoria, da criatividade e de coragem. Foi possível alcançar

certo distanciamento crítico a respeito do trabalho realizado pelo meu coletivo, e

encontrar uma nova comunidade com a qual posso me comunicar. Esse processo

ampliou meu olhar a respeito do cuidado e seu papel na constituição dos

profissionais de saúde. A citação a seguir, de uma autora africana, traduz minhas

expectativas a respeito do diálogo com a comunidade científica e com os

profissionais da MFC e APS. “A comunidade é o espírito, a luz-guia da tribo; é onde as pessoas se reúnem para realizar um objetivo específico, para ajudar os outros a

realizarem seu propósito e para cuidar uma das outras. O objetivo da comunidade é assegurar que cada membro seja ouvido e consiga

contribuir com os dons que trouxe ao mundo, da forma apropriada. Sem essa doação, a comunidade morre. E sem a comunidade, o

indivíduo fica sem um espaço para contribuir. A comunidade é uma base na qual as pessoas vão compartilhar seus dons e recebem as

dádivas dos outros.” (S. Some, 2003, p19)

Neste sentido, espero que o processo de ensino-aprendizagem na medicina

de família e comunidade, com suas características tão particulares em relação ao

restante do quadro de especialidades médicas, possa contribuir para a criação de

mais espaços de reflexão e interlocução com a comunidade, a fim auxiliar nas

transformações na educação médica de forma mais abrangente. E que esse debate

possa, de alguma forma, contribuir para melhorar a atenção à saúde das pessoas,

desejo maior que todos compartilhamos.

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ANEXOS – DOCUMENTAÇÃO ANALISADA. ANEXO 1.1 Decreto Nº 80.281 (de 05 de setembro de 1977) Regulamenta a residência Médica, cria a Comissão Nacional de Residência Médica e dá outra providências. O Presidente da República, usando das atribuições que lhe confere o art. 81, item III, da Constituição, decreta: Art. 1º A Residência em Medicina constitui modalidade do ensino de pós-graduação destinada a médico, sob a forma de curso de especialização, caracterizada por treinamento em regime de dedicação exclusiva, funcionando em instituições de saúde, universitárias ou não, sob a orientação de profissionais médicos de elevada qualificação ética e profissional. 1º Os Programas de Residência Médica serão desenvolvidos, preferencialmente, em uma das seguintes áreas: Clínica Médica; Cirurgia Geral; Pediatria; Obstetrícia e Ginecologia; Medicina Preventiva e Social. 2º Os programas de Residência terão a duração mínima de um ano, correspondendo ao mínimo de 1800 horas de atividade. 3º Além do treinamento em serviço, os Programas de Residência Médica Compreenderão um mínimo de quatro horas semanais de atividades sob a forma de sessões de atualização, seminários, correlações clínico - patológicas ou outras, sempre com a participação ativa dos alunos. Art. 2º Fica criada no âmbito do Departamento de Assuntos Universitários do Ministério da Educação e Cultura a Comissão Nacional de residência Médica, com as seguintes atribuições: a) Credenciar os programas de Residência, cujos certificados terão validade

nacional; b) Definir, observado o disposto neste Decreto e ouvido o Conselho Federal de

Educação, as normas gerais que deverão observar os Programas de Residência em Medicinas;

c) Estabelecer os requisitos mínimos necessários que devem atender as instituições onde serão realizados os programas de Residência, assim como os critérios e a sistemática de credenciamento dos programas;

d) Assessorar as instituições para o estabelecimento de programas de Residência;

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e) Avaliar periodicamente os programas, tendo em vista o desempenho dos mesmo em relação ás necessidades de treinamento e assistência à saúde em âmbito nacional ou regional;

f) Sugerir modificações ou suspender o credenciamento dos programas que não estiverem de acordo com as normas e determinações emanadas da Comissão;

1º A Comissão Nacional de Residência Médica será composta de dez membros, designados pelo Ministro da Educação e Cultura, assim constituída: a) O Diretor Geral do Departamento de Assuntos Universitários do Ministério da

Educação e Cultura, que é o membro nato da Comissão e seu Presidente: b) Um representante da Comissão de Ensino Médico do Ministério da Educação e

Cultura; c) Um representante do Ministério da Saúde; d) Um representante do Ministério da Previdência e assistência Social ; e) Um representante do Estado Maior das Forças Armadas; f) Um representante do Conselho Federal de Medicina; g) Um representante da Associação Brasileira de Escola Médicas (ABEM) h) Um representante da Associação Médica Brasileira; i) Um representante da Federação Nacional dos Médicos; j) Um representante da Associação Nacional de Médicos Residentes. 2º Sempre que necessário, a Comissão Nacional de Residência Médica poderá convidar representantes de outras entidades e órgão governamentais, para exame de assuntos específicos. 3º A Comissão Nacional de Residência Médica terá um Secretário Executivo, substituto eventual do Presidente, designado pelo Ministro da Educação e Cultura. 4º O Departamento de Assuntos Universitários do Ministério da Educação e Cultura proverá o suporte administrativo e técnico necessário aos trabalhos da Comissão. Art. 3º Para que a instituição de saúde não vinculada ao sistema de ensino seja credenciada a oferecer Programa de Residência, será indispensável o estabelecimento de convênio específico entre este e Escola Médica ou Universidade, visando mútua colaboração no desenvolvimento de programas de treinamento médico.

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Art. 4º Os programas de Residência serão credenciados por um prazo de cinco anos, ao final do qual o credenciamento será renovado a critério da Comissão Nacional de Residência Médica. Art. 5º Aos médicos que completarem o programa de Residência em Medicina, com aproveitamento suficiente, será conferido o certificado de Residência Médica, de acordo com as normas baixadas pela Comissão Nacional de Residência Médica. Parágrafo único. Os certificados de Residência em Medicina, expedidos até janeiro de 1979, poderão ser convalidados de acordo com normas a serem estabelecidas pela Comissão Nacional de Residência Médica. Art. 6º Este Decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

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ANEXO 1.2 (O documento abaixo foi editado; apenas a parte que se refere ao programa de medicina de família e comunidade foi mantida). RESOLUÇÃO CNRM Nº 02 /2006, de 17 de maio de 2006 Dispõe sobre requisitos mínimos dos Programas de Residência Médica e dá outras providências. O Presidente da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM), no uso de suas atribuições que lhe conferem o Decreto nº 80.281, de 05 de Setembro de 1977, e a Lei nº 6.932, de 07 de julho de 1981, resolve: Art. 1º. Os Programas de Residência Médica credenciáveis pela Comissão Nacional de Residência Médica poderão ser de acesso direto ou com pré-requisito. I – ACESSO DIRETO Acupuntura ... Medicina de Família e Comunidade

29 – MEDICINA DE FAMÍLIA E COMUNIDADE - R1 e R2 O Programa de Residência Médica (PRM) na área de Medicina de Família e Comunidade tem como objetivo formar um especialista cuja característica básica é atuar, prioritariamente, em Atenção Primária à Saúde, a partir de uma abordagem biopsicossocial do processo saúde adoecimento, integrando ações de promoção, proteção, recuperação e de educação em saúde no nível individual e coletivo. Esse especialista deverá ser capaz de: priorizar a prática médica centrada na pessoa, na relação médico-paciente, no cuidado em saúde e na continuidade da atenção; atender, com elevado grau de qualidade, sendo resolutivo em cerca de 85% dos problemas de saúde relativos a diferentes grupos etários; desenvolver, planejar, executar e avaliar programas integrais de saúde, para dar respostas adequadas às necessidades de saúde da população sob sua responsabilidade, tendo por base metodologias apropriadas de investigação, com ênfase na utilização do método epidemiológico; estimular a participação e a autonomia dos indivíduos, das famílias e da comunidade; desenvolver novas tecnologias em atenção primária à saúde; desenvolver habilidades docentes e a capacidade de auto aprendizagem; desenvolver a capacidade de crítica da atividade médica, considerando-a em seus aspectos científicos, éticos e sociais. As atividades de treinamento em serviço devem ser programadas por meio dos seguintes meios e formas: –atividades na comunidade: domicílios, escolas, locais de trabalho e lazer – um mínimo de 10% da carga horária total; –atividades em unidades de cuidados primários de saúde: postos de saúde em áreas rurais e/ou urbanas; centros de saúde ou unidades mistas de saúde e unidades básicas situadas em centros de referência – um mínimo de 50% da carga horária total; – atividades em unidades de cuidados secundários e terciários: hospitais gerais, de especialidades ou especializados – um mínimo de 10% da carga horária total.

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As atividades a que se referem os itens acima incluem os cuidados médico individuais, familiares e comunitários. As atividades de prática integral à saúde incluem habilidades para: 1. Em nível individual: a)Implementar ações de promoção e proteção à saúde da criança, da mulher, do adolescente, do adulto, do trabalhador e do idoso; b)Identificar as fases evolutivas e assistir aos transtornos adaptativos da infância, da adolescência, da idade adulta e da velhice; c)Prestar assistência à gestação normal, identificando os diferentes tipos de risco; d)Assistir ao parto e ao puerpério normais; e)Diagnosticar e tratar as afecções mais freqüentes do ciclo gravídico-puerperal; f)Proporcionar cuidados ao recém-nascido normal e realizar puericultura; g)Diagnosticar e tratar as afecções mais freqüentes na infância, na adolescência, na idade adulta e na velhice; h)Reconhecer e proporcionar os primeiros cuidados às afecções graves e urgentes; i)Examinar e constatar anormalidades em exames complementares e de apoio ao diagnóstico relacionado com a complexidade de sua atividade clínica; j)Diagnosticar e tratar distúrbios psicológicos mais comuns, encaminhando para assistência psicológica ou psiquiátrica os pacientes que dela necessitarem; k)Diagnosticar patologia cirúrgica freqüente e encaminhar à sua resolução; l)Executar cirurgia ambulatorial de pequeno porte; m)Encaminhar, para serviços adequados, pacientes que necessitarem de procedimentos diagnósticos e/ou terapêuticos especializados; n)Orientar o pré e pós-operatórios das intervenções mais simples; o)Diagnosticar e tratar os problemas mais freqüentes de saúde do trabalhador, encaminhando para a assistência especializada sempre que se fizer necessário. 2. Em nível familiar e coletivo: a)Conhecer o ciclo vital, a estrutura e a dinâmica familiar; b)Reconhecer e assistir, quando necessário, às crises familiares, evolutivas e não evolutivas; c)Reconhecer e assistir às disfunções familiares, encaminhando corretamente para assistência psicológica ou psiquiátrica as famílias que dela necessitarem; d)Conhecer e utilizar as técnicas de dinâmica de grupo; e)Conhecer e promover ações de educação em saúde, bem como participar de ações em parceria com a comunidade, buscando desenvolvimento simultâneo e mútuo; f)Identificar os problemas e necessidades de saúde da comunidade, particularizando grupos mais vulneráveis, e implementar ações de promoção, proteção e recuperação da saúde de caráter coletivo e no âmbito da atenção primária; g)Desenvolver ações de caráter multiprofissional e interdisciplinar; h)Realizar cadastro familiar e estabelecer o perfil de saúde de grupos familiares. As atividades de administração e planejamento incluem habilidades para: a)Chefiar ou apoiar à chefia da unidade em questão de gerência; b)Realizar programação quantificada das atividades da unidade e criação de parâmetros para medir o atingimento de metas propostas;

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c)Montar e operar sistema de informação para acompanhamento da prestação de atividades finais e de produtividade, visando à avaliação da unidade quanto a eficácia, a eficiência e a efetividade; d)Orientar a organização e o funcionamento de arquivo médico da unidade; e)Montar, orientar e avaliar sistema de referência e contra-referência dentro e fora da unidade, visando promover a complementaridade da atenção médica sanitária; f)Atuar intersetorialmente, acionando secretarias municipais, entidades, instituições e outras organizações, sempre que se fizer necessário. As atividades na área do ensino e pesquisa incluem habilidades para: a)Promover estudos de incidência e prevalência de morbi-mortalidade e de indicadores de saúde na população sob sua responsabilidade; b)Participar da realização de investigações operacionais como estudos de demanda e estudos de setores específicos da unidade, visando à melhoria no funcionamento e a adequação às necessidades de saúde da população a que serve; c)Desenvolver e implementar novas tecnologias na assistência e atenção no âmbito da medicina geral, de família e da comunidade, baseadas no paradigma biopsicossocial; d)Participar da implementação, controle e avaliação do programa de imunização da unidade, de acordo com a norma vigente na Instituição e de acordo com o Programa Nacional de Imunizações; e)Participar das atividades de vigilância epidemiológica na área de referência da unidade, acionando o sistema de vigilância epidemiológica sempre que necessário; desenvolver e participar da orientação e implementação de atividades de treinamento de pessoal de vários níveis e de educação continuada para a equipe de saúde; f)Promover o auto-aprendizado e a atualização de conhecimentos na área da medicina geral, familiar e comunitária.

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ANEXO 1.3 Projeto de Expansão da Residência em Medicina de Família e Comunidade 2005- SBMFC Programas de Residência Médica em Medicina de Família e Comunidade - MFC I - Introdução

A Medicina de Família e Comunidade é a especialidade médica da integralidade. O cenário privilegiado de seu exercício é o da Atenção Primária à Saúde. Dedica-se ao cuidado abrangente, continuado e contextualizado da saúde das pessoas, preferencialmente no âmbito de equipe multidisciplinar. Seu foco de atuação são as pessoas de todas as idades e gêneros, no cenário biopsicossocial da família e da comunidade em que vivem. O médico de família e comunidade deve estar habilitado a cuidar com resolutividade e coordenar o cuidado da grande maioria dos problemas de saúde mais freqüentes na população a ele referenciada, dos complexos até os mais simples.

Como especialidade médica presente internacionalmente, já nasceu comprometida com a noção de uma ampla reforma dos cuidados de saúde com vista à sua conquista para todos. Em nosso país, desde seu reconhecimento em 1981, trabalha pela excelência clínica e pela reforma sanitária. Insere-se no esforço da sociedade para a construção de um Sistema de Saúde público, democrático, universal e cuja rede de serviços propicie a todos fácil acesso, cuidados abrangentes ao longo de toda a vida e coordenação de seu trânsito pelos diferentes serviços de que oportunamente necessite.

A reforma do setor saúde teve um grande impulso quando o Estado Nacional definiu–se por estabelecer a Atenção Primária como base de estruturação do SUS através da Estratégia da Saúde da Família. Entretanto, nos primórdios da Reforma Sanitária, como um dos paradoxos da Saúde brasileira, realizou-se um desmonte da maioria dos Programas de Residência de Medicina de Família e Comunidade (então denominada medicina geral comunitária). O médico especialista do cenário da Atenção Primária, desde então, passou a ser formado em escala ainda mais reduzida do que antes. Sua carência passaria a ser evidente com a expansão da Saúde da Família. Médicos especialistas focais de órgãos, sistemas, gêneros e faixas etárias assumiram tarefas do cuidado integral para o qual não foram preparados. Isto ocasiona importante carga de sofrimento para os próprios médicos, para as equipes e a população.

Parceiros nos esforços de qualificação e expansão dessa Estratégia, a SBMFC e o Governo Federal vêm debatendo e avaliando a melhor maneira de oferecer simultaneamente especialização médica, integração da equipe de saúde e expansão de acesso.

Como parte das medidas que podem propiciar tal avanço conjunto, o Programa de Bolsas do MS, aprovado no Congresso Nacional, permite iniciar a reversão do paradoxo antes aludido. Multiplicam-se os PRMs em MFC, primeiramente nas áreas onde há limitantes para o desenvolvimento da ESF. Complementa-se o valor de suas bolsas, de modo a aproximá-las dos vencimentos

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do médico no PSF. Remuneram-se os preceptores. Esse conjunto cria uma incidência poderosa contra elementos infra-estruturais que limitam a expansão da APS e a procura pela especialidade. Restam todos os elementos pertinentes à qualidade da formação oferecida, sua avaliação e gargalos em relação à melhoria contínua.

O MFC não é adequadamente formado com uma fusão antipedagógica das chamadas áreas básicas, como pediatria, gineco-obstetrícia, medicina interna, cirurgia e psiquiatria. Quando cuida de crianças, mulheres, adultos e pessoas que sofrem psiquicamente, o MFC o faz sempre a partir da integralidade das necessidades de saúde da pessoa inserida em um contexto familiar e comunitário particular. Atua a partir de um corpo de conhecimentos específicos e mediante técnicas próprias a esta abordagem.

A formação do MFC deve ocorrer com preceptores especialistas em MFC, mais experientes e pedagogicamente habilitados para o ensino-aprendizado com adultos jovens, como reza o art. 16 da resolução 04 de 23 de dezembro de 2004

1.

É nesse sentido que a SBMFC constituiu um projeto para contribuir com esse avanço. O faz com sua especificidade de sociedade científica e sua co-responsabilidade institucional quanto à Residência Médica, definida no âmbito da CNRM pela Resolução 01 de 2004, em seu artigo 21

2. A realidade particular de

implantação de PRMs em situações em que o poder público encontra limitações para expandir a ESF torna necessário um acompanhamento mais detido. E sugere uma particularização de normas complementares e transicionais, até que o desenvolvimento cuidadoso dos programas atinja sua maturidade.

1 “A supervisão permanente do treinamento do Médico Residente deverá ser

realizada por docentes, por médicos portadores de Certificado de residência Médica da área ou especialidade em causa, ou título superior ou possuidores de qualificação equivalente, a critério da Comissão Nacional de residência Médica.”

2 “§ 1°Na determinação de normas complementares para cada especialidade,

a CNRM ouvirá as Sociedades Médicas pertinentes...”

Sendo assim, a Diretoria da SBMFC apresenta, logo abaixo, os elementos necessários ao processo de estruturação e de distribuição dos tempos de atividades nos PRMs e as competências a serem constituídas. Do mesmo modo, elenca elementos da infra-estrutura e de fluxo assistencial necessários para propiciar o ambiente de treinamento em serviço para o especialista em formação. Na seqüência, propõe um conjunto de iniciativas para iniciar a superação da defasagem atual entre necessidade e oferta de preceptores especialistas da área.

II - Organização e desenvolvimento dos programas de residência médica em MFC

Distribuição de carga horária de acordo com as atividades práticas e teóricas a serem desenvolvidas

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De acordo com as normas da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM) os programas de residência se desenvolvem ao longo de, no mínimo dois anos, com carga horária semanal de 60 h.

Considerando que o ano tem 52 semanas, e o residente tem direito a um período de 4 (quatro) semanas de férias / ano, a carga horária total do treinamento em serviço é de 2.880h / ano (60h X 48 semanas) ou de 5.760 h /dois anos.

Para facilitar o cálculo dos tempos a serem atribuídos às atividades, deve ser considerado a carga horária anual total e distribuí-las através do período, na forma de atividades contínuas e/ou concentradas em períodos, de acordo com o tipo de atividade e sua pertinência.

Para facilitar a distribuição da carga horária, o percentual atinente a cada atividade deve ser planejado em percentuais, divisíveis ou múltiplos de 5 (1, 25%, 2,5%, 5 %, 10%, ...), considerando a carga horária anual total anual (2.880h). Uma vez calculada, pode-se distribuir por semana, mês, semestre ou ano, de acordo com o mais adequado em termos de treinamento.

Assim, por exemplo, uma atividade que requeira 40% da carga horária de 2880h, ocupará 1.152h/ano a serem distribuídas em 48 semanas, que podem corresponder a 24h/semana (6 turnos de 4 horas), 96 h/mês ou 576 h/semestre.

Em relação aos PRMFC, a distribuição da carga horária das atividades práticas e teóricas deve ser organizada de acordo com o quadro abaixo: Em relação aos PRMFC, a distribuição da carga horária das atividades práticas e teóricas deve ser organizada de acordo com o quadro abaixo: ATIVIDADE

Distribuição % mínima das 2880h/anuais em 48 semanas

Distribuição % mínima das 2880h/anuais em 48 semanas

totais

• Consultório de MFC: corresponde aos espaços de consulta ambulatorial individual ou familiar nas áreas de atuação da clínica da APS e da MFC;

• Atenção domiciliar: corresponde às consultas e internações domiciliares;

• Grupos terapêuticos: correspondem às atividades de organização e realização de grupos de pacientes/pessoas, que contemplem à participação do residente e que tenham por objetivo a informação / educação em saúde / incremento da autonomia / suporte terapêutico, relacionados à temáticas específicas e/ou questões mais prevalentes no âmbito dos problemas de saúde de crianças / adolescentes / mulheres / homens / adultos e idosos.

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• Administrativo-gerenciais: correspondem às atividades de organização dos prontuários médicos e outros registros / banco de dados das famílias/ comunidade que propiciem a organização e o planejamento das ações de saúde; reuniões da equipe envolvida com o cuidado em saúde.

• Outras atividades coletivas: correspondem às visitas domiciliares não clínicas, cadastramento de famílias; contato com associações de moradores, participação em reuniões comunitárias, dos Conselhos de Saúde e outras instâncias de representação social da comunidade; ações de intersetorialidade.

• Teóricas: correspondem ao desenvolvimento de atividades teóricas, na forma de estudos dirigidos; cursos, discussões de casos e temas clínicos; seminários de integração teórico-prática; produção científica, trabalho de final de curso; jornadas, seminários e congressos na área de interesse da MFC;

• Nos níveis secundário e terciário da atenção: correspondem ao treinamento em serviço nas áreas da atenção secundária e terciária à saúde, aí incluídos o acompanhamento de pacientes sob regime de internação hospitalar e o atendimento de situações de emergência no âmbito da prática médica. A carga horária destinada a tais atividades, como o treinamento hospitalar, pode ser concentrada em períodos mensais, semestrais ou anuais durante o desenvolvimento da residência.

III - Competências a serem constituídas durante o PRM/MFC, Cenários de treinamento e Atividades teórico / práticas

Descrevem-se nos quadros a seguir, os objetivos gerais, os conhecimentos, habilidades, atitudes, bem como requisitos para o treinamento em serviço e desenvolvimento das atividades teórico-práticas. Para efeitos didáticos, os quadros foram sistematizados em áreas, a saber:

• Competências Clínicas na Atenção Primária nas áreas da Saúde da mulher / do homem / do adulto / do idoso / da criança e do adolescente;

• Competências Clínicas da Atenção Secundária;

• Competências Clínicas na Atenção Terciária e Emergência;

• Abordagem Sistêmica da Família;

• Abordagem Comunitária.

A abordagem de cada área deverá ser desenvolvida baseada nas melhores

evidências disponíveis, fundamentando processos decisórios articularizados e contextualizados.

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V. – Cenários de Prática e Infra-estrutura necessária ao desenvolvimento de Programas de Residência em Medicina de Família e Comunidade Para o desenvolvimento de um Programa de Residência Médica, faz-se necessário a constituição de uma estrutura mínima, que assegure o processo de ensino-aprendizagem do residente, incluídos o treinamento em serviço e o desenvolvimento das atividades teóricas. As variações quanto ao espaço físico e demais recursos diferem de um programa de residência para outro, em função da especificidade de cada especialidade médica e de cada local. Em relação à Residência de Medicina de Família e Comunidade, considera-se a necessidade da seguinte estrutura: a) Unidade de Saúde para treinamento em serviço da Clínica da MFC:

Local onde serão desenvolvidas atividades no nível da Atenção Primária à Saúde, em especial as consultas médicas. Tais locais podem ser específicos, configurando-se Unidades de Medicina / Saúde da Família ou podem estar inseridos em outras unidades de cuidados primários, secundários ou terciários de saúde, como: Postos ou Centros de Saúde; Policlínicas; Unidades Ambulatoriais de Hospitais). Devem estar preparadas para o atendimento de crianças, adolescentes, adultos e idosos. Espaços necessários - elementos da infra-estrutura física: • Sala de espera; • Recepção; • Espaço para arquivamento das fichas, prontuários e outros registros de

organização e planejamento do trabalho; • Consultório (s) (mínimo de 7,5 mt2/consultório); • Sanitários • Sala para desenvolvimento de atividades de grupo e atividades teóricas (que comporte de 12 a 20 pessoas – 9 a 20 mt

2 )

Elementos da infra-estrutura físico-funcional: - mesas, cadeiras, mesa ginecológica, balança de adulto, balança para nenês foco de luz, biombo, escada para maca; estante(s); arquivos mesa para computador;

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- computador e impressora, telefone; conexão internet; - esfingmomanômetro, estetoscópio, termômetro, fita métrica, sonar, estetoscópio de pinard, otoscópio, oftalmoscópio, laringoscópio, maleta, sonar doppler obstétrico, microscópio (este último, desejável); - tubo orotraqueal, ambu, microscópio, bandeja para pequenos procedimentos em cirurgia, bandeja para cateterismo vesical, material para exame ginecológico (espéculos, pinça longa, lâmina, espátula, escova), lanterna, foco pescoço de ganso, oxigênio, nebulizador, aspirador, oxímetro de pulso, aparelho para eletrocardiografia (este ultimo, desejável), manguitos para esfingmomanômetro conforme faixa etária e para paciente obeso, ventilador/aquecedor, cortinas. - Disponibilidade de livros para consulta clínica:

- DUNCAN, SCHMIDT, GIULIANI Medicina Ambulatorial Ed. Artes Médicas, 4

a edição,1996.; - SOARES, J.L.F.; PASQUALOTTO, A.C.; LEITE, V.R.S. Métodos

Diagnósticos Consulta Rápida Porto Alegre: ArtMed Editora, 2002.

b) Unidades de Referência / Contra- Referência

Na sua formação, o médico de família deverá ser capaz de cumprir o programa mínimo estruturado para a especialidade, incluindo a preceptoria e as competências no nível dos cuidados secundários e terciários de saúde, e, também, dispor de referência e contra-referência de pacientes quando necessário. Os principais serviços para atender estas necessidades incluem:

• Pediatria; • Ginecologia / Obstetrícia; • Medicina Interna; • Pequenas Cirurgias; • Saúde Mental; • Unidades de emergência • Unidades Hospitalares (pediatria, clínica médica, cirurgia geral e

ginecologia/obstetrícia)

c) Acesso a Métodos de Investigação Diagnóstica No desenvolvimento de sua prática, o Médico de Família e Comunidade necessita desenvolver senso crítico, conhecer e aplicar a investigação diagnóstica, não só para sua formação, mas também para atingir o grau de resolutividade inerente à prática de excelência da especialidade, que corresponde a no mínimo 85% dos problemas de saúde de uma determinada população, tal como é apresentado em estratégias de nível nacional e internacional. Para tanto, o acesso aos meios diagnósticos é condição essencial. Entre os principais, estão: - Métodos de imagem: radiologia, ultra-sonografia; cintilografia; - Endoscopia digestiva e intestinal; - Métodos gráficos: eletrocardiografia e ergometria de esforço; - Patologia clínica: hemograma completo, pesquisa de leucócitos atípicos, monoteste, contagem de reticulócitos, ferro sérico, transferrina, ferritina, TIBIC, velocidade de hemossedimentação, lipidograma, coagulograma, dosagem/titulação de sódio,

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potássio, cálcio, ácido úrico, fator reumatóide, FAN, Proteína C Reativa, ASLO, uréia, creatinina, glicemia, hemoglobina glicosilada, hormônio tireoestimulante, T4 livre, amilase, CK, CKMB, transaminase oxalacética, transaminase pirúvica, fosfatase alcalina, proteínas totais e frações, tipagem sangüínea, fator Rh, sorologias (HIV, hepatite B, hepatite C, EBV, CMV, toxoplasmose, Doença de Chagas), VDRL, FTA-ABS, teste de coombs, clearance de creatinina, proteinúria, EAS, urinocultura + TSA, PSA total, parasitológico de fezes, sangue oculto nas fezes, TSA.

d) Infra-estrutura docente

A função de preceptoria requer, igualmente, estrutura para seu desenvolvimento. Uma estrutura para capacitação permanente do residente e preceptoria, contato com outros programas de residência e comunicação imediata com a rede de saúde, apresenta-se como estratégica. Considerando este ponto de vista, são recursos necessários: - Acesso à comunicação imediata (linha telefônica) - Material educativo (quadro branco; pilots; papel; canetas; retroprojetor; recursos de mídia (se possível)); - Acesso à Internet - Biblioteca.

VI - Atividades de Preceptoria, Norma transicional e Capacitação de Preceptores

Todo processo de expansão acelerada supõe, antes de tudo, uma necessidade que o justifique. Essa necessidade foi delineada na introdução deste projeto. Diante da defasagem de preceptores especializados em MFC e a possível demanda de abertura de programas, é adequado fazer uma adaptação transitória da norma vigente (CNRM), visando preservar seu objetivo sem impedir o atendimento da necessidade social de formação desse especialista em escala ampliada.

A SBMFC entende necessário que o conjunto dos médicos que assumirão a supervisão direta dos residentes iniciem formação como preceptores antes do início da operação dos novos programas. E também que, até o final do credenciamento provisório, titulem-se como especialistas, recebendo o apoio necessário para essa conquista. Já os coordenadores de Programas teriam até o primeiro recredenciamento para obterem a mesma titulação. Ainda a respeito da preceptoria, deve ser presencial, em especial no desenvolvimento das atividades de consultório, considerando-se em caráter de exceção algumas situações específicas, mas, de todo modo, não dispensam a preceptoria presencial em grande parte das atividades desenvolvidas pelo residente.

Entende-se necessário e pertinente o incentivo a outras formas de incrementar o processo ensino-aprendizagem, com acesso permanente via telefone e/ou Internet aos preceptores envolvidos com as atividades práticas e teóricas desenvolvidas pelos residentes. Em algumas circunstâncias, pode ser aceitável que um mesmo especialista compartilhe a preceptoria de residentes em Unidades muito próximas, mas não há motivo para adaptar a norma sobre proporção entre residentes e preceptores.

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Embora a formação dos preceptores da área não possa prescindir do protagonismo da Sociedade da Especialidade, entendemos que há um outro campo de apoio à expansão simultânea da ESF e dos PRMs em MFC que deve ser compartilhado presencialmente e à distância por especialistas focais de várias áreas, assim como por MFCs experientes via recursos de telemedicina. Essa supervisão será importante tanto para os médicos-residentes como para os preceptores em formação. Pediatras, internistas, tocoginecologistas, cirurgiões e psiquiatras ligados a hospitais e/ou Centros de Saúde da localidade ou da região podem ser organizados para comparecer periodicamente e supervisionar casos menos freqüentes atendidos nas Unidades.

A disponibilidade de computadores e internet permitirá também a discussão de casos e avaliações conjuntas de situações por colegas mais experientes ou com maior formação em determinadas áreas. Para isto, entendemos ser necessária a incorporação, nesta iniciativa, da abertura de qualificação para que serviços de Atenção Primária com reconhecida excelência possam se candidatar a uma seleção para prestar este tipo de apoio à distância, e recebam recursos públicos para tal.

A tudo isso deve ser acrescentada a necessidade de que, aos preceptores dos PRMs, em especial àqueles localizados em áreas menos providas de transporte, seja assegurado apoio para usufruírem de atividades educacionais reconhecidas no processo de revalidação de seu título de especialista. Aqui se incluem tanto as atividades presenciais como aquelas à distância.

Com o objetivo de colaborar com o processo de capacitação de preceptores e de qualificação da prática da preceptoria em RMFC e outros cursos de especialização na área, a SBMFC está organizando uma Oficina de Multiplicadores. Tais Multiplicadores estarão envolvidos, num segundo momento, na organização e execução de Cursos de Capacitação de Preceptores.

O público-alvo da Oficina de Multiplicadores é de médicos, que tenham cursado residência médica na especialidade e que, preferencialmente, sejam preceptores de médicos, que tenham cursado residência médica na especialidade e que, preferencialmente, sejam preceptores de programas de RMFC já existentes.

O público-alvo do Curso de Capacitação de Preceptores são médicos especialistas em MFC, ou médicos que estejam envolvidos ou venham a se envolver com a preceptoria ou a docência clínica da Atenção Primária à Saúde e a Medicina de Família e Comunidade.

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ANEXO 2.1

Programa da Instituição 01 R 1 Ementa Introdução à Saúde da Família como modalidade de atenção primária; diferentes modelos de saúde da família; Integração entre Saúde da Família e o SUS; mecanismos de financiamento e gestão da Saúde da Família; O uso dos principais sistemas de informação do SUS para o planejamento e avaliação da Saúde da Família. Programa

1. Estudar os diferentes modelos assistenciais de atenção primária e sua evolução; diferentes modelos de Saúde da Família; a estratégia da saúde da família como estruturante do SUS, atenção integral à saúde entre o PSF e os demais níveis de complexidade do SUS; Mecanismos de financiamento e gestão da Saúde da Família no SUS:

Habilitar os residentes à identificação de problemas de saúde prevalentes na comunidade e à construção de um diagnóstico em nível local, em parceria com os profissionais de saúde e as famílias, visando detectar situações de risco em âmbito individual, familiar e social;

Elementos de gestão em saúde; Gestão de serviços públicos de saúde; Acreditação de serviços básicos de saúde;

Elementos para o planejamento de Saúde da Família;

Rever os processos de promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação de doenças de importância epidemiológica nos cuidados básicos de saúde em uma perspectiva multiprofissional;

Projetar rotinas diagnósticas, de exames complementares e de tratamento para as doenças relevantes examinadas;

Propor rotina de referência e contra-referência para a rede de serviços de saúde em relação às doenças estudadas;

Capacitar o residente a pensar de forma integrada nos casos clínicos mais freqüentes da população assistida pelo Programa de Saúde da Família

Habilitar ao acompanhamento do paciente de forma contínua abrangendo a prevenção, diagnóstico, tratamento e seguimento da sua patologia;

Desenvolver os aspectos humanísticos da equipe de saúde da família no atendimento da população assistida;

Capacitar a pensar no contexto social, econômico e genético da população assistida como influências significativas do processo de saúde e doença;

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Desenvolver o sentido do limite de atuação profissional, considerando as indicações para encaminhamento (internações, exames complementares, tratamento cirúrgico, etc.) de todos os casos mais complexos de acordo com as necessidades de saúde do paciente;

Incorporar as atividades de educação de saúde (educação comunitária, prevenção de doenças, etc.) a sua prática;

Aprofundar os conceitos éticos profissionais na relação do paciente com o profissional de saúde;

Reconhecer a Importância dos protocolos na gestão clínica do PSF;

Desenvolver a análise crítica dos protocolos mais usuais;

Entender a avaliação das competências dos médicos, enfermeiros e profissionais de outras áreas no PSF;

Saber trabalhar em equipe, exercer liderança e respeitar atributos e capacidades individuais.

Competências 1. Reconhecer as características e diferenças entre os diferentes modelos

assistenciais de atenção básica; 2. Conhecer e saber aplicar a estratégia e os princípios básicos do Programa de

Saúde da Família (PSF); 3. Conhecer a realidade da rede de serviços do SUS e saber analisar sua relação

com o PSF; 4. Problematizar a intersetorialidade e integralidade das ações do SUS; 5. Problematizar o sentido da atenção básica e sua inserção no SUS; 6. Realizar o diagnóstico das necessidades de saúde do município onde exerce

sua profissão, valendo-se dos indicadores de qualidade de vida e saúde, habitualmente disponíveis.

7. Conhecer as principais etapas a serem desenvolvidas na realização de inquéritos de saúde à luz de suas potencialidades e limitações.

8. Valer-se de estudos de percepção de necessidade de saúde e de utilização de serviços de saúde por parte da comunidade adscrita para definição de prioridades.

9. Estabelecer os nexos entre as metas e ações propostas nos Programas do Ministério da Saúde e as prioridades locais de saúde.

10. Reconhecer a importância e ser capaz de estabelecer relação com instituições governamentais e da sociedade civil presentes na área de abrangência das equipes, visando à definição de prioridades, planejamento e desenvolvimento de ações de forma integrada no âmbito da saúde da família.

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11. Desenvolver capacidade de análise crítica sobre o PSF e sua relação com o SUS. Conhecer os aspectos centrais de organização e operacionalização da atenção básica e do PSF;

12. Conhecer e saber aplicar as responsabilidades, estratégias mínimas de atenção básica e a lógica do Pacto de Atenção Básica; e

13. Saber utilizar e ser capaz de interferir na ampliação e melhoria dos mecanismos de monitoramento e avaliação da atenção básica e do PSF.

R 2

Competências 1. Problematizar as políticas de saúde e educação superior na indução da

formação profissional adequada à realidade do SUS e às necessidades de saúde da população brasileira, com ênfase no PSF;

2. Discutir as premissas que orientam iniciativas inovadoras na formação de recursos humanos em saúde. Debater as experiências mais relevantes de formação profissional baseadas nas novas diretrizes curriculares. Debater a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde;

3. Responsabilizar-se por uma das equipes de saúde da família da Faculdade de Medicina no gerenciamento das ações programáticas e atendimento médico à população adstrita.

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ANEXO 2.2

Programa da Instituição 02

Proposta para o Programa de Residência Médica em Medicina de Família e Comunidade.

I. Introdução

Objetivos: desenvolver habilidades necessárias ao exercício da medicina de família de forma integral, sintonizada com as políticas de saúde vigentes e pautada nos princípios do SUS.

Carga horária semanal:

• Equipe de saúde da família – 20 horas

• Ambulatório/enfermaria de especialidades básicas (Pediatria, Clínica Médica, Obstetrícia e Ginecologia e Cirurgia Geral) – 12 horas

• Atividades de especialidade complementar (Saúde Coletiva, saúde Mental, Dermatologia e área opcional) – 4 horas

• Atividade teórica – 4 horas

• Plantão de emergência – 12 horas

• Estudo auto-dirigido e atividades de pesquisa científica -8 horas

II. Cenários de atuação

II.1) Gerenciais

Locais:

• Setor de Saúde Coletiva – 6 meses (04horas semanais)

• Unidades de Saúde da Família

Atividades a serem desenvolvidas:

• Vivenciar os sistemas de informação

• Vigilância epidemiológica

• Imunização (cadeia de frio, controle de estoque)

• Gestão local através das reuniões de equipe com os gestores e com a comunidade

II.2) Ambulatórios

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Locais:

• Especialidades básicas - Pediatria, Clínica Médica, Obstetrícia e Ginecologia, Cirurgia Geral e Ortopedia e Traumatologia: esquema de rodízio, atuando 12 horas durante 03 meses em cada área.

• Especialidades Complementares - Saúde Mental, Dermatologia e área opcional – esquema de rodízio, atuando 04 horas semanais durante 6 meses em cada setor.

Atividades a serem desenvolvidas:

• Atendimento inicial e subseqüente

• Familiarização com as rotinas

• Contato com as situações de maior prevalência

II.3) Emergência

Locais: Pediatria, Clínica Médica, Obstetrícia e Ginecologia, Cirurgia Geral e Trauma – plantões de 12 horas semanais, com duração de 06 meses em cada setor.

Atividades a serem desenvolvidas:

• Pronto atendimento

• Reanimação cardio-respiratória

• Identificação e condução do trabalho de parto

• Diagnóstico e condução inicial de emergência ginecológica

• Diagnóstico e condução inicial de emergência cirúrgica

• Atendimento às emergências pediátricas e clínicas mais prevalentes

II.4) Enfermarias

Locais: Pediatria, Clínica Médica e suas especialidades, Obstetrícia e Ginecologia, Cirurgia e Ortopedia – 12 horas por semana, com duração de 03 meses em cada setor.

Atividades a serem desenvolvidas:

• Relação com o paciente internado e sua família

• Utilização prolongada de medicamentos parenterais

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• Abordagem do paciente portador de enfermidades crônicas

• Familiarização com procedimentos clínico-cirúrgicos (Ex:passagem de sonda, realização de curativos, coleta de exames)

II.5) Unidades de Saúde da Família

Locais:

• Unidades Urbanas- mínimo de 6 meses e máximo de 01 ano numa unidade-20 horas semanais, num período de 01 ano.

• Unidades Rurais- mínimo de 6 meses e máximo de 01 ano numa unidade-20 horas semanais, num período de 01 ano.

• Atividades a serem desenvolvidas:

• Territorialização, mapeamento, cadastramento, atividades ambulatoriais, visita domiciliar, atividades de educação em saúde, promoção, proteção e prevenção.

• Diagnóstico ampliado a partir de campanhas governamentais.

• Participação em campanhas vacinais.

• Acompanhamento de alunos internos do curso de graduação em medicina e outros cursos da área da saúde, quando compatíveis as atividades com seu campo de conhecimento.

II.6) Comunidade

Atividades a serem desenvolvidas:

• Mapeamento, cadastramento e elaboração de diagnóstico

• Definição de prioridades para atuação

• Realização de atividades de educação em saúde

• Práticas de promoção e prevenção à saúde

• Estímulo ao controle social e participação popular II.7) Exemplo de Rodízio Ano I

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SEG TER QUA QUI SEX SAB DOM USF EBA USF EBA USF EMERG X

EBA USF EC USF ESP EMERG X USF- Unidade de Saúde da Família ESP- Curso de Especialização

EBA –Especialidade Básica EMERG- Plantão de Emergência

EC – Especialidade complementar

Ano II SEG TER QUA QUI SEX SAB DOM USFR PEDE USFR PEDE USFR EMERG X

PEDE USFR SCOLET USFR ESP EMERG X USFR- Unidade de Saúde da Família Rural ESP- Curso de Especialização

EMERG- Plantão de Emergência PEDE- Enfermaria de Pediatria

SCOLET – Atividades de Saúde Coletiva

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ANEXO 2.3

Programa da Instituição 03

PROGRAMA DE RESIDÊNCIA EM MEDICINA DE FAMÍLIA E DA COMUNIDADE

OBJETIVO GERAL: • Formar especialistas em Medicina de Família e Comunidade, capazes de

utilizar conhecimentos, habilidades e atitudes necessários ao desempenho da prática da Atenção Primária à Saúde e da Saúde da Família, em consonância com os princípios consagrados pelo Sistema Único de Saúde/SUS.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS: • Conceituar Atenção Primária à Saúde, Saúde Comunitária, Saúde da

Família e definir o papel do Médico de Família e Comunidade; • Prevenir, diagnosticar e tratar os problemas de saúde mais freqüentes dos

indivíduos, famílias e comunidades; • Desenvolver relação médico-paciente que promova o vínculo com a

equipe de saúde local, a responsabilidade e a continuidade da assistência e o comprometimento com os problemas de saúde dos indivíduos, famílias e comunidades;

• Utilizar adequadamente os meios diagnósticos e terapêuticos na prática clínica em Atenção Primária à Saúde e desenvolver postura crítica sobre suas indicações e limitações, levando em conta os princípios da medicina baseada em evidências e a relação custo-eficiência dos diversos procedimentos;

• desenvolver diagnósticos de situação demográfica, sócio-econômica, cultural, domiciliar e familiar das populações locais e propor ações médico-sanitárias voltadas para as necessidades identificadas;

• Atuar em equipes multiprofissionais em unidades básicas de saúde, unidades de saúde da família e comunidade, reconhecendo a estrutura e funções da rede básica de saúde e as atribuições e responsabilidades dos membros da equipe;

• abordar e estimular o trabalho com grupos sociais, famílias e comunidade com vistas à promoção da saúde;

• atuar como gerente das equipes de saúde locais, sendo capaz de propor e executar ações que aumentem a resolutividade do meio de atendimento primário e do uso adequado das referências do sistema de saúde;

• Monitorar a situação de saúde e doença dos indivíduos, famílias e comunidades, indicando as ações mais adequadas para a melhoria da saúde.

DURAÇÃO E HORÁRIO DA RESIDÊNCIA/ESPECIALIZAÇÃO: O programa prevê uma duração de 2 anos, com uma carga horária de 5760h, funcionando de segundas às sextas feiras de 8 às 17h, e plantões de 24h de treinamento em emergências e maternidade.

NÚMERO DE MÉDICOS RESIDENTES:

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Total: 12, sendo 6 RI e 6 RII

CONTEÚDOS PROGRAMÁTICOS: Conhecimentos gerais: O treinamento do residente será desenvolvido segundo os conhecimentos que se constituem os eixos da prática em Medicina de Família e Comunidade: • conceitos e princípios relacionados ao ciclo biológico da vida; • abordagem médica humanizada do indivíduo, família e comunidade, de

caráter preventivo e terapêutico, atuando individual e coletivamente; • vigilância à saúde nos seus componentes epidemiológico, ambiental e

sanitário; • determinantes do processo saúde-doença na concepção bio-psico-social; • processo multidisciplinar como instrumento de estruturação da

interdisciplinariedade; • princípios e técnicas de educação e promoção de saúde; • metodologia de investigação clínica e medicina baseada em evidências; • custo-benefício e efetividade dos exames complementares mais utilizados

na medicina geral comunitária e familiar; • gerência de unidades básicas de saúde e resolutividade das ações; • sistemas de informação; • avaliação de qualidade, de eficiência e de efetividade; • Sistema Único de Saúde, políticas de saúde e programas de saúde no

nível local. Conhecimentos específicos: O treinamento abrangerá os seguintes conteúdos de especialidades básicas afins à prática da medicina de família e comunidade: • Saúde mental: relação médico-paciente, interdisciplinariedade, grupos,

famílias, ciclo de vida, psicologia médica, representação social da doença, ansiedade, somatização, depressão, alcoolismo e tabagismo, droga-adição, tratamento ambulatorial do paciente psiquiátrico.

• Saúde da Criança: sinais vitais e avaliação do recém nato, aleitamento materno, alimentação e nutrição, crescimento e desenvolvimento, doenças infecciosas da infância, desidratação, infecções respiratórias, diarréias, anemias, parasitoses, acidentes, violência, epilepsia, alergias, saúde escolar, desenvolvimento e problemas clínicos do adolescente, contexto familiar e gestação na adolescência, saúde bucal, urgências em pediatria.

• Saúde do adulto: sobrepeso e obesidade, hipertensão arterial, doença-isquêmica coronariana e insuficiência cardíaca, dislipidemias, acidente vascular encefálico, diabetes mellitus, afecções ósteo-musculares e reumatológicas, doenças sexualmente transmissíveis/síndrome de imnunodeficiência adquirida, doença pulmonar obstrutiva crônica, alergias, pneumonias, tuberculose, hanseníase, doenças infecciosas e parasitárias, doença péptica, doenças hepáticas, da vesícula biliar, do pâncreas, colopatias, insuficiência venosa crônica, úlceras de perna, insuficiência arterial aguda, doenças da tiróide, distúrbios e infecções do trato urinário, afecções prostáticas, anemias e coagulopatias, saúde bucal, doenças ocupacionais, neoplasias, urgëncias e emergências.

• Saúde da mulher: leucorréia, dismenorréia, cistites, hemorragias, prevenção de câncer de colo uterino e mama, pré-natal, parto e puerpério,

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sexualidade, contracepção e planejamento familiar, menopausa e climatério, saúde bucal, urgências em obstetrícia.

• Saúde coletiva: epidemiologia clínica, vigilância epidemiológica, sanitária e ambiental, programação e planejamento de saúde, sistemas de informação em atenção básica, equipes mulltiprofissionais, promoção à saúde, ciência sociais em saúde, educação para a saúde, comunicação em saúde, saúde ocupacional.

• Saúde do idoso: abordagem do paciente, reabilitação de distúrbios específicos, atendimento domiciliar, drogas no idoso, distúrbios nutricionais, sexualidade, distúrbios genito-urinários, demência, doença de Parkinson, pneumonia e infecções mais comuns do idoso, câncer de próstata, maus tratos a idosos, saúde bucal.

• Dermatologia: eczemas, pediculoses, acne, erisipela, impetigo, verrugas, micoses, hanseníase e neoplasias.

• Otorrinolaringologia: otalgia, avaliação auditiva, corpo estranho, traumas, vertígens, otites, rinite, sinusites, faringites, amigdalites, estomatites e laringites.

• Oftalmologia: conjuntivites, traumatismos oculares, avaliação da acuidade visual, catarata, glaucoma, retinopatia diabética e hipertensiva.

• Pequena cirurgia: anestesia local, retirada de pontos, tratamento de feridas, drenagem de abscessos.

• Urgência e emergência: parada cárdio-pulmonar, arritmias, infarto, angina, embolia, edema agudo, acidentes vasculares encefálicos, anafilaxia, afogamento, traumatismos, cuidado de ferimentos, corpo estranho, intoxicações, envenenamentos, lesões térmicas e ambientais, afecções ortopédicas traumáticas, condições abdominais agudas, síndromes hemorrágicas, choque.

HABILIDADES E ATITUDES:

O residente deverá desenvolver as seguintes habilidades e atitudes: • Elaborar história clínica e registro médico orientado por problemas e

prontuário familiar; solicitar e interpretar exames complementares para diagnóstico de doenças prevalentes, ler e interpretar heredogramas, avaliar a necessidade de recursos materiais para exercício de sua atividade na localidade, fazer notificações compulsórias e relatórios;

• desenvolver técnicas de entrevistas, anamnese, história clínica orientada por problemas prioritários e utilizar este instrumento para o monitoramento da saúde da família e da comunidade local; avaliar o estado de saúde e executar atividades de promoção e educação para a saúde;

• efetuar consultas ambulatoriais, domiciliares (paciente terminal, idoso, portador de doença crônica incapacitante, pacientes sem possibilidades de locomoção) e de vigilância à saúde;

• realizar procedimentos cirúrgicos de pequena complexidade no ambiente ambulatorial e fazer o primeiro atendimento nos casos de urgência/emergência;

• orientar a manutenção de cânulas, catéteres, sondas, estomas em pacientes crônicos com necessidades especiais de assistência em domicílio;

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• diagnosticar, prevenir, assistir e tratar os problemas de saúde e afecções mais comuns do recém nato, da criança, do adolescente, da mulher e da gestante, do adulto e do idoso; identificar e atender as demandas em saúde mental e saúde ocupacional no nível primário;

• assistir ao paciente em situação de urgência/ emergência nas afecções mais freqüentes na criança, adolescente, mulher, adulto e idoso;

• interpretar os resultados de exames complementares mais comuns na assistência básica;

• reconhecer e indicar os procedimentos envolvidos na referência ao nível secundário e terciário;

• selecionar os indicadores para caracterização do perfil das famílias e de seu estado de saúde e doença;

• elaborar as rotinas de coleta, registro, obtenção e análise de informações disponíveis na atenção básica;

• aplicar e monitorar, segundo indicadores, as metas de cobertura e de impacto sobre a situação de saúde e doença das famílias e comunidades locais, indicadores de qualidade dos serviços de atenção primária e familiar;

• selecionar temas e problemas para análise e apresentação em sessões clínicas e científicas; desenvolver capacidade de analisar criticamente artigos científicos;

• atuar em equipe multiprofissional e desenvolver metodologias de supervisão e de educação continuada.

METODOLOGIA: A proposta didático-pedagógica privilegiará o enfoque do ciclo de vida, partindo-se dos contextos da situação social da criança, do adolescente, do adulto, da mulher, do idoso, em termos de condições sócio-econômicas, contexto familiar, graus de autonomia, fisiologia, comportamentos e qualidade de vida. A partir dos critérios identificados na prática desenvolvida nas unidades básicas e na comunidade com as famílias e pacientes, buscando-se identificar a transição do normal para o patológico, caracterizando-se os quadros clínico e epidemiológico envolvidos. Em um trabalho em equipe interdisciplinar se buscará traçar as estratégias de intervenção sobre os determinantes do processo saúde e doença, sobre os riscos, agravos e os danos. Ações de promoção e educação para a saúde, prevenção, assistência e reabilitação estarão sendo executadas usando-se da tecnologia mais apropriada segundo as premissas da atenção primária à saúde.

Dinâmicas e práticas de treinamento em serviço: • assistência clínica e acompanhamento de doentes internados • consulta individual, consulta conjunta, interconsulta com especialistas • atendimento hospitalar e de emergência; • atividades de grupo e de prevenção e educação; • visitas domiciliares de consulta, vigilância epidemiológica; planejamento

participativo local orientado por problemas; • atividades comunitárias de promoção à saúde; reuniões de equipe e

atividades de educação permanente; • discussão de casos clínicos, revisão de literatura científica; • cursos teóricos complementares;

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• avaliação periódica, monografia. Dinâmicas e práticas de treinamento específicos: A- Unidade de internação: Serviços de Clínica Médica, Cirurgia e Doenças infecciosas e Parasitárias • atividade diária de assistência clínica e acompanhamento de doentes

internados, admissão e alta de pacientes, evolução e prescrição, discussão dos casos em cada enfermaria após o término da prescrição, realização de procedimentos invasivos, quando indicados pela equipe, orientação aos internos, com relação a todos os procedimentos acima listados; (5 turnos de 4h/semana durante 12 semanas no 1o semestre)

B- Serviços de Emergência: • plantões de 24h/semana no setor de emergência do HU por um período de

24 semanas, no 1o ano; • plantões de 12h por semana na Maternidade por um período de 24

semanas, no 1o ano; • plantões de 12h por semana no serviço de emergência do HOSPITAL

PEDIÁTRICO por um período de 24 semanas, no 1o ano; • plantões de 20h por semana nas grandes emergências da rede de saúde

do Município do Rio de Janeiro, durante 48 semanas no 2o ano. C- Ambulatórios: • atendimento de primeira vez e subseqüente referência ao nível

secundário, diagnóstico, prognóstico e terapêutica, rotinas e condutas (Centro Municipal de Saúde nos Programas da Criança, do Adulto, da Mulher e do Idoso assim como no Serviço de Epidemiologia (5 turnos de 4h por semana durante 12 semanas no 1o semestre do 1o ano e 4 turnos por semana durante 24 semanas no 2o semestre do 1o ano);

• atendimento de primeira vez e subseqüente referência ao nível secundário, diagnóstico, prognóstico e terapêutica, rotinas e condutas na Unidade de Atenção Básica, nos Programas especiais de atenção básica da Criança, da Mulher e do Idoso (2 turnos de 4 h/semana durante 24 semanas no 1o ano);

• atendimento de primeira vez, diagnóstico, prognóstico e terapêutica, rotinas, condutas e subseqüente contra-referência ao nível primário nas especialidades: otorrinolaringologia, oftalmologia, geriatria, dermatologia, saúde mental, angiologia e pequena cirurgia no Hospital Universitário (2 turnos de 4h/semana no 1o semestre e 1 turno de 4h pr semana no 2o semestre).

• atendimento de primeira vez, diagnóstico, prognóstico e terapêutica, rotinas, condutas e subseqüente contra-referência ao nível primário em especialidades pediátricas, saúde do adolescente e violência doméstica no Instituto de Pediatria (4 turnos de 4h por semana durante 12 semanas no 2o semestre)

• atendimento de primeira vez, diagnóstico, prognóstico e terapêutica, rotinas, condutas e subseqüente contra-referência ao nível primário em especialidades ginecológicas, ambulatório de mama e de infertilidade do Instituto de Ginecologia (4 turnos de 4h por semana durante 12 semanas no 2o semestre);

• atendimento de primeira vez, diagnóstico, prognóstico e terapêutica, rotinas, condutas e subseqüente contra-referência ao nível primário em

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especialidades obstétricas e no ambulatório de gestação de risco (4 turnos de 4h por semana durante 12 semanas no 2o semestre);

• atendimento de primeira vez, diagnóstico, prognóstico e terapêutica, rotinas, condutas e subseqüente contra-referência ao nível primário em especialidades psiquiátricas (4 turnos de 4h por semana durante 12 semanas no 2o semestre);

• cadastramento familiar, diagnóstico de comunidade, mapeamento de risco clínico, epidemiológico, sanitário e ambiental. Sigab/Siab, planejamento local, atividades comunitárias, de educação e de promoção à saúde, relação médico/paciente/família/comunidade, visita domiciliar, referência e contra-referência, avaliação, supervisão, trabalho multidisciplinar, ação intersetorial nas Unidades Básicas de Saúde da Família da SMS/Rio de Janeiro e/ou do Município de Piraí (40 h por semana durante 48 semanas no 2o ano).

Atividades de educação continuada: C-Departamento de Medicina Preventiva/Faculdade de Medicina: Será oferecido 1 seminário de 4h/semana durante 48 semanas no 10 ano e 48 semanas no 2o ano sobre os temas abaixo, no Hospital Estadual e nas Unidades de Saúde da Família:

- investigação epidemiológica, notificação, busca ativa, quimioprofilaxia, índice endêmico, identificação de surtos.

- diagnóstico de saúde, programação de metas, atividades técnicas de educação e promoção, cobertura, impacto, resolutividade e avaliação.

As atividades de educação continuada serão realizadas com docentes da Instituição nos locais de funcionamento das equipes de PSF, envolvendo consultas supervisionadas e 1 hora para as atividades de clube de revistas, apresentação de casos e aulas teóricas. Será oferecida uma programação envolvendo todas as especialidades médicas com interface na residência, ou seja, nas áreas de clínica médica, pediatria, gineco-obstetrícia, otorrinolarongologia, oftalmologia, dermatologia, saúde coletiva, cirurgia geral, urologia, geriatria, educação para saúde, educação física, antropologia, ecologia e outras a serem definidas com os alunos, segundo demanda verificada no local.

Serviços e instalações: listagem da estrutura física da instituição.

PROGRAMAÇÃO DIDÁTICO-COMPLEMENTAR Discussão de literatura e artigos científicos, seminários, dinâmicas de grupo, supervisão de atividade em serviço, aulas expositivas e sessões clínicas. Serão desenvolvidos os seguintes temas:

- Sistema de informação - Diagnóstico de saúde - Vigilância e saúde - Educação em Saúde - Saúde Mental - Política e Programação em saúde - Epidemiologia e pesquisa clínica - Gestão de Unidades de saúde

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- Atualização em Atenção Primária à Saúde da Criança, da Mulher e do Adulto.

AVALIAÇÃO O residente será avaliado em cada um dos estágios segundo a sua capacidade de apreensão de conhecimentos ministrados e o desempenho de habilidades e atitudes previstas em cada estágio supervisionado que realizar ao longo de seu treinamento em serviço.

avaliação de conhecimentos: - prova de conhecimentos discursiva tratando de temas específicos a

cada área (peso 6) - notas de participação em seminários, apresentação em sessões e

discussões de casos (peso 2) - trabalhos escritos (peso2)

avaliação de habilidades e atitudes: - parâmetros: capacidade e desempenho técnico (peso 4), interesse

e iniciativa profissional ( peso 2), responsabilidade e assiduidade (peso2), relações humanas com a equipe e com os pacientes (peso 2)

monografia: ao final do programa o residente deverá apresentar uma monografia por escrito sobre tema relevante da especialidade, obedecendo, metodologicamente, as etapas previstas em investigações científicas. A nota final será dada mediante a avaliação do texto escrito e a apresentação oral para uma banca constituída entre o corpo docente.

nota final: - nota da avaliação de conhecimentos (peso 3) - nota da avaliação de habilidades e atitudes (peso 4) - nota da monografia ( peso 3)

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GRADE CURRICULAR PROPOSTA PARA O 1O SEMESTRE D0 1O ANO DE RESIDÊNCIA

2a feira

3a feira

4a feira

5a feira

6a feira

8 às 12h - módulo 4 enfermarias de clínica médica, pediatria e ginecologia e obstetrícia(12 semanas )

ambulatórios no CMS (12 semanas)

módulo 1

8 às 12h - módulo 4 enfermarias de clínica médica, cirurgia e doenças infecciosas e parasitárias (12 semanas )

ambulatórios no CMS(12 semanas)

módulo 1

8 às 12h - módulo 4 enfermarias de clínica médica, cirurgia e doenças infecciosas e parasitárias (12 semanas ) ambulatórios no CMS

(12 semanas) módulo 1

8 às 12h - módulo 4 enfermarias de clínica médica, cirurgia e doenças infecciosas e parasitárias (12 semanas )

ambulatórios no CMS(12 semanas)

módulo 1

8 às 12h - módulo 4 enfermarias de clínica médica, cirurgia e doenças infecciosas e parasitárias (12 semanas )

ambulatórios no CMS (12 semanas)

módulo 1

13 às 17h ambulatórios no Hospital Universitário – módulo 2

13 às 17h ambulatórios em Programas especiais de atenção básica no Hospital Escola - módulo 5

13 às 17h seminário de saúde coletiva no Hospital Escola módulo 5

13 às 17h ambulatórios no Hospital Universitário –módulo 2

livre

O residente terá que fazer um mínimo de: •2 plantões de 12h no serviço de emergência do HOSPITAL UNIVERSITÁRIO- módulo 1 •2 turnos de ambulatório no HE - módulo 5 •2 turnos de ambulatório em unidade hospitalar da INSTITUIÇÃO - módulo 2 •5 turnos matutinos de enfermaria: durante 12 semanas - módulo 4 •5 turnos em ambulatórios no CMS durante 12 semanas - módulo 1

GRADE CURRICULAR PROPOSTA PARA O 2O SEMESTRE D0 1O ANO DE RESIDÊNCIA

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2a feira

3a feira

4a feira

5a feira

6a feira

8 às 12h ambulatórios no Hospital Universitário módulo 2

8 às 12h ambulatórios em unidades hospitalares da INSTITUIÇÃO/ IPUB e HOSPITAL PEDIÁTRICO-módulos 6 e 11

8 às 12h ambulatórios em unidades hospitalares da INSTITUIÇÃO/ Hospital Escola módulo 5

8 às 12h ambulatórios nas Unidades Básicas da INSTITUIÇÃO/CMS módulo 1

8 às 12h ambulatórios nas Unidades Básicas da INSTITUIÇÃO/CMS módulo 1

livre

13 às 17h seminários de saúde coletiva no HESFA/INSTITUIÇÃO módulo 5

13 às 17h ambulatórios em unidades hospitalares Maternidade Escola e Instituto de Ginecologia módulos 8 e 9

13 às 17h ambulatórios nas Unidades Básicas da INSTITUIÇÃO/CMS módulo 1

13 às 17h ambulatórios nas Unidades Básicas da INSTITUIÇÃO/CMS módulo 1

obs: O residente terá que fazer um mínimo de: •1 plantão de 12h no serviço de emergência do HOSPITAL PEDIÁTRICO – módulo 7 •1 plantão de 12h na Maternidade Escola da INSTITUIÇÃO – módulo 10 •6 turnos de ambulatório em unidade básica da INSTITUIÇÃO - módulos 1 e 5 •3 turnos de ambulatório em unidades hospitalares da INSTITUIÇÃO - módulos 2, 6, 8, 9 e 11 • 1 turno de seminário de saúde coletiva - módulo 5

GRADE CURRICULAR PROPOSTA PARA O 1O e 2o SEMESTRES D0 2O ANO DE RESIDÊNCIA

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2a feira

3a feira

4a feira

5a feira

6a feira

8 às 12h atividades nas equipes

de PSF da SMS -RJ módulo 13

8 às 12h atividades nas equipes

de PSF da SMS -RJ módulo 13

8 às 12h atividades nas equipes

de PSF da SMS -RJ módulo 13

8 às 12h atividades nas equipes

de PSF da SMS -RJ módulo 13

8 às 12h atividades nas equipes

de PSF da SMS -RJ módulo 13

13 às 17h

atividades nas equipes de PSF da SMS -RJ

módulo 13

13 às 17h

atividades nas equipes de PSF da SMS -RJ

módulo 133

13 às 17h

atividades nas equipes de PSF da SMS -RJ

módulo 13

13 às 17h

educação continuada em serviço nos PSF

módulo 13

13 às 17h

atividades nas equipes de PSF da SMS -RJ

módulo 13

obs: O residente terá que fazer um mínimo de: •1 plantão de 24h nos serviços de emergência da SMS/RJ - módulo 128 turnos de 4h por semana de atividade nas equipes do PSF da SMS/RJ e/ou Piraí -

módulo 13

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ATIVIDADES A SEREM REALIZADAS PELOS RESIDENTES NOS SERVIÇOS

1. Serviços de emergência: • HOSPITAL PEDIÁTRICO: emergência infantil em todos os setores • HOSPITAL UNIVERSITÁRIO: sala de adultos e ortopedia • SMS/Hospital Souza Aguiar: setores de oftalmologia, otorrinolaringologia,

ortopedia e atendimento de adultos 1. Ambulatórios do Hospital Universitário: • Oftalmologia • Otorrinolaringologia • Pequena Cirurgia • Saúde mental • Geriatria • Tuberculose • Dermatologia • Alergia • Dor • Angiologia • Pé-diabético • Medicina Física e Reabilitação • Saúde ocupacional 2. Ambulatórios do Hospital Pediátrico: • Puericultura • Ambulatório da família (violência infantil) • Alergia respiratória • Dermatologia infantil 3. Ambulatórios Instituto de Psiquiatria: • psiquiatria • demências 4. Ambulatórios Maternidade: • Obstetrícia 5. Ambulatórios do Instituto de Ginecologia: • ambulatório geral 6. Ambulatórios do Hospital: • Programa do idoso • Programa de álcool e drogas • Programa de testagem anônima de AIDS • Ginecologia • Pediatria • Clínica Médica • Saúde mental 7. Ambulatório do Centro de Saúde: • Pediatria • Clínica Médica • Ginecologia/Obstetrícia • Dermatologia • Epidemiologia • Infectologia

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• Tuberculose

PROPOSTA DE TRABALHO DOS RESIDENTES EM SAÚDE DA FAMÍLIA NAS EMERGÊNCIAS DA REDE MUNICIPAL

• ATIVIDADES A SEREM REALIZADAS:

Plantões: 24h por semana Modalidades: a) 12h em horário noturno e 12 h em horário diurno de fim de semana; b) 2 plantões de 12h em horário noturno.

• SERVIÇOS DE TREINAMENTO: Grande Emergência: atendimento a homens, mulheres e crianças: 24

semanas Ortopedia: 8 semanas Oftalmologia: 8 semanas Otorrinolaringologia: 8 semanas

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ANEXO 2.4

Programa da Instituição 04

A instituição disponibilizou para este trabalho o formulário de credenciamento junto à CNRM e a escala de atividades atual dos residentes.

Programa de Treinamento em Serviço- Primeiro ano (R1) MEDICINA DE FAMÍLIA E COMUNIDADE

Carga Horária Hospital ou Outra Unidade de Saúde onde a atividade será realizada

Especificar Atividade Total %

1. Enfermarias e Serviços de Emergência

Estágio supervisionado em Enfermarias de Clínica Médica, prestando assistência médica à pacientes adultos e idosos.

Plantão geral em Clínica Médica – atendimento de emergência aos pacientes internados no HU e através de rede conveniada da SMS

288h

720h

2. Ambulatórios Medicina Integral

Atendimento supervisionado por equipe interdisciplinar e com realização de interconsultas (clínicas, psicológicas e psiquiátricas) - Primeiro Atendimento e Triagem de pacientes

do Ambulatório do HU - Ambulatório de Medicina Integral

216h 396h

Outros serviços ambulatoriais

Estágio supervisionado - Ambulatório de Pediatria/Puericultura - Ambulatório de Geriatria - Ambulatório de Ginecologia - Ambulatório de Obstetrícia

216h 108h 180h 216h

3. Comunidade Atividade de prática integral à saúde supervisionada, em nível individual, familiar e coletivo. A atividade principal tem por objetivo: - Integrar-se ao Projeto Saúde na Vila; - Programar e preparar a substituição do R2

com atividade no programa; - Criar vínculo com as pessoas e suas famílias,

moradores de Vila Isabel; - Desenvolver as atividades de prática integral

à saúde.

256h

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Metodologia da Avaliação do Aprendizado

Discriminar os Procedimentos e a Periodicidade de Aplicação

Conceito de Desempenho

Avaliação mensal de desempenho conforme regimento da Residência Médica

Avaliação presencial bimestral

Avaliação teórica – prática semestral

Avaliação trimestral de desenvolvimento da monografia / Artigo

Científico de final de curso

Programação Científica Habitual para o Corpo Clínico

Especificar os Itens com funcionamento regular vinculados ou não a Programas de Residência Cursos interativos: - Bases da Racionalidade Médica - Novos Paradigmas da Ciência Aplicados à Saúde. - Paradigma da Complexidade e a Prática da Medicina Integral. - EpiINFO – Programa informatizado para lidar com informações em saúde. - Saúde Mental para a equipe de saúde. - Discussão de casos e temas clínicos em pediatria, medicina de

adolescentes, adultos e idosos. Monografia Definição de tema e desenvolvimento de monografia de final de curso.

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Programa de Treinamento em Serviço- Segundo Ano (R2)

MEDICINA DE FAMÍLIA E COMUNIDADE

Carga Horária Hospital ou Outra Unidade de Saúde onde a atividade

será realizada Especificar Atividade

Total %

Ambulatórios Ambulatório de Vila

Isabel

Atendimento supervisionado por equipe interdisciplinar e realização de interconsultas (clínico; psicólogo e psiquiatra) no Ambulatório de Medicina Integral para população adscrita (moradores do Bairro de Vila Isabel).

180h

Outros ambulatórios Ambulatório de Pediatria Ambulatório de Medicina Integral Ambulatórios de especialidades clínicas (p.e., dermatologia, reumatologia, violência familiar) – opcional. Consulta domiciliar supervisionada em comunidade adscrita, com possibilidade de interconsulta (equipe interdisiplinar da Unati, composta por geriatra, fisioterapeuta, enfermagem e nutricionista)

180h 180h

180h

180h

4. UDA de Medicina Integral

Participação em atividades de grupo de pacientes com doenças crônico degenerativas e HIV positivos (Grupo Conviver e Com Vida)

180h

180h

5. Comunidade de Vila Isabel

Atividade de prática integral à saúde, supervisionada, em nível individual, familiar e coletivo. As atividades principais têm por objetivo: - Cadastramento Familiar e Domiciliar; - Visitas domiciliares; - Consultas domiciliares; - Diagnóstico das condições de saúde da

população adscrita; - Planejamento das ações de saúde; - Desenvolvimento de ações de saúde; - Avaliação das ações de saúde.

612h

6. Saúde Escolar Atividade de prática integral à saúde em escolas de Vila Isabel. As atividades principais têm como objetivo: - Diagnóstico das condições de saúde; - Planejamento de ações de promoção e

educação em saúde; - Desenvolvimento de ações de saúde; - Avaliação das ações de saúde.

180h

7. Serviço de Emergência Plantão geral em Clínica Médica / Obstetrícia / Pediatria- atendimento de emergência aos pacientes internados no HUPE e/ou através rede conveniada da SMS

720h

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Metodologia da Avaliação do Aprendizado

Discriminar os Procedimentos e a Periodicidade de Aplicação

Conceito de Desempenho

Avaliação mensal de desempenho conforme regimento da Residência Médica da FCM

Avaliação teórica – prática semestral

Monografia / Artigo Científico de final de curso

Programação Científica Habitual para o Corpo Clínico

Especificar os Itens com funcionamento regular vinculados ou não a Programas de Residência Cursos interativos: - Bases da Gerência e Planejamento em Saúde - Implantação e avaliação de Projetos de Atenção Primária em Saúde - O Programa de Saúde da Família no Brasil. - Metodologia para o Desenvolvimento de Trabalhos Científicos - Saúde Mental para o médico generalista - Abordagem e Intervenção Familiar para o Médico de Família - Discussão de casos e temas clínicos em pediatria, medicina de

adolescentes, adultos e idosos. Monografia Elaboração de monografia / Artigo Científico de final de curso

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Programa de Treinamento em Serviço – Terceiro ano (R3)

MEDICINA DE FAMÍLIA E COMUNIDADE / ADMINISTRAÇÃO EM SAÚDE

8. Unidade Docente- Atividade de Grupo

Gerencia supervisionada e participação em atividades de grupo (por exemplo: pacientes com doenças crônico degenerativas e HIV positivos (Grupo Conviver e Com Vida)

Total %

Atividade docente-assistencial

Supervisão supervisionada de alunos de graduação em atividades de promoção, educação em saúde, medicina de família e consulta ambulatorial.

180h

9. Comunidade de Vila Isabel

Gerenciamento, realização e acompanhamento supervisionado das atividades de: - Reuniões de equipe; - Reuniões com a comunidade; - Expansão das atividades comunitárias; - Atividades intersetoriais e interinstitucionais; Gerenciamento, realização e acompanhamento supervisionado das atividades de: - Cadastramento Familiar e Domiciliar; - Visitas Domiciliares; - Diagnóstico das condições de saúde da população e da

comunidade adscrita; - Planejamento das ações de saúde; - Desenvolvimento de ações de saúde; - Avaliação das ações de saúde

396h

10. Saúde Escolar Gerenciamento, realização e acompanhamento supervisionado das atividades de prática integral à saúde em escolas de Vila Isabel.

396 468

11. Ambulatórios Ambulatório de Vila

Isabel

Atendimento supervisionado por equipe interdisciplinar e realização de interconsultas (clínico; psicólogo e psiquiatra) no Ambulatório de Medicina Integral para população adscrita (moradores do Bairro de Vila Isabel).

180

Outros Ambulatórios Ambulatório de Pediatria – Violência Familiar – supervisionado por pediatra e psicólogo Consulta domiciliar supervisionada em comunidade adscrita, com possibilidade de interconsulta (equipe interdisciplinar da Medicina Integral e/ou da Unati, incluíndo clínico, geriatra, psiquiatra, fisioterapeuta, enfermagem e nutricionista) Ambulatórios de especialidades clínicas (p.e.: dermatologia, reumatologia, fisiatria; violência familiar) - opcional

180

12. Enfermarias e Serviço de Emergência

Plantão em Clínica Médica- atendimento de emergência aos pacientes internados no HU e através da rede conveniada da SMS.

108 180 108

13. 396

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Metodologia da Avaliação do Aprendizado

Discriminar os Procedimentos e a Periodicidade de Aplicação

Conceito de Desempenho

Avaliação mensal de desempenho conforme regimento da Residência Médica da FCM

Avaliação teórica – prática semestral

Monografia / Artigo Científico de final de curso

Programação Científica Habitual para o Corpo Clínico

Especificar os Itens com funcionamento regular vinculados ou não a Programas de Residência Atividades teórico-práticas de planejamento e administração em serviços de atendimento primário e secundário em saúde. Discussão de casos clínicos baseados nos atendimentos de Medicina de Família e Comunidade com treinamento teórico em análise de procedimentos complementares (Radiologia/exames endoscópicos/outros exames complementares) Avaliação de Projetos de Atenção Primária em Saúde Monografia Elaboração de monografia / Artigo Científico de final de curso

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ESCALA GERAL DE ATIVIDADES - RESIDENTES PRIMEIRO ANO – 2009

SEGUNDA TERÇA QUARTA QUINTA SEXTA

8:30 – 10:10h

ATIVIDADE TEORICA

MANHA

AMBULATÓRIO (todos)

SAUDE NA VILA

10:30 – 12:00h

Grupo Balint

PRE-NATAL

(todos)

AMBULATÓRIO (todos)

TARDE

SAUDE NA VILA

SAUDE DA CRIANÇA

(todos)

13:30 – 17:00h

ATIVIDADE

TEÓRICA

AMBULATÓRIO

(todos)

SAUDE DA CRIANÇA

PROJETO AMAR

OBS:

1) As atividades ambulatoriais iniciam no turno da manha e da tarde às 8:00 e às 13:00h;

2) Não são permitidas modificações na escala e/ou troca de horário sem conhecimento e anuência prévios da Coordenação do Programa de Residência.

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RESIDENTES SEGUNDO ANO – 2009 SEGUNDA TERÇA QUARTA QUINT

A SEXTA

AMBULATÓRIO (todos)

PRE-NATAL

MANHA

Escala no ComVida – 1 residente por

vez

SAUDE NA VILA

ATIVIDADE TEORICA

Atividade Física na

Vila (1 residente a cada 3 semanas

, em sistema

de rodízio)

AMBULATÓRIO (todos)

TARDE SAUDE NA VILA

AMBULATÓRIO

(todos)

ATIVIDADE

TEORICA

SAUDE DA

CRIANÇA

(todos)

SAUDE DA MULHER

(todos)

OBS: 1) As atividades ambulatoriais iniciam no turno da manha e da tarde às 8:00 e às

13:00h; 2) Não são permitidas modificações na escala e/ou troca de horário sem conhecimento

e anuência prévios da Coordenação do Programa de Residência

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RESIDENTE TERCEIRO ANO – 2009 SEGUNDA TERÇA QUARTA QUINTA SEXTA

AMBULATÓRIO MANHA

Escala no ComVida –

Alternando com R2

SAUDE NA VILA ATIVIDADE

TEORICA

SAUDE NA VILA

PRE-NATAL

TARDE SAUDE NA VILA AMBULATÓRIO ATIVIDADE

TEORICA

SAUDE DA

CRIANÇA

SAUDE DA

MULHER

1) As atividades ambulatoriais iniciam no turno da manha e da tarde às 8:00 e às

13:00h; 2) Não são permitidas modificações na escala e/ou troca de horário sem conhecimento

e anuência prévios da Coordenação do Programa de Residência