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RuaHenriqueSchaumann,270,CerqueiraCésar—SãoPaulo—SPCEP05413-909–PABX:(11)36133000–SACJUR:08000557688–De2ªa6ª,das8:30às19:30

E-mailsaraivajur@editorasaraiva.com.brAcessewww.saraivajur.com.br

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AMAZONAS/RONDÔNIA/RORAIMA/ACRERuaCostaAzevedo,56–Centro–Fone:(92)3633-4227–Fax:(92)3633-4782–Manaus

BAHIA/SERGIPERuaAgripinoDórea,23–Brotas–Fone:(71)3381-5854/3381-5895–Fax:(71)3381-0959–Salvador

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CEARÁ/PIAUÍ/MARANHÃOAv.FilomenoGomes,670–Jacarecanga–Fone:(85)3238-2323/3238-1384–Fax:(85)3238-1331–

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TravessaApinagés,186–BatistaCampos–Fone:(91)3222-9034/3224-9038–Fax:(91)3241-0499–

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RIOGRANDEDOSULAv.A.J.Renner,231–Farrapos–Fone/Fax:(51)3371-4001/3371-1467/3371-1567–PortoAlegre

SÃOPAULOAv.Antártica,92–BarraFunda–Fone:PABX(11)3616-3666–SãoPaulo

ISBN978-85-02-16907-4

Cabette,EduardoLuizSantosDireitopenal:parteespecialI/EduardoCabette.–SãoPaulo:Saraiva,2012.–(Coleçãosaberesdodireito;6)1.Direitopenal2.Direitopenal–BrasilI.Título.II.Série.12-01432CDU-343(81)

Índiceparacatálogosistemático:1.Brasil:Direitopenal343(81)

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DiretoreditorialLuizRobertoCuriaDiretordeproduçãoeditorialLígiaAlves

EditorRobertoNavarroAssistenteeditorialThiagoFraga

ProdutoraeditorialClarissaBoraschiMariaPreparaçãodeoriginais,arte,diagramaçãoerevisãoKnow-howEditorial

ServiçoseditoriaisKelliPriscilaPinto/ViniciusAsevedoVieiraCapaAeroComunicação

ProduçãográficaMarliRampimProduçãoeletrônicaRoComunicação

Datadefechamentodaedição:17-2-2012

Dúvidas?Acessewww.saraivajur.com.br

NenhumapartedestapublicaçãopoderáserreproduzidaporqualquermeioouformasemapréviaautorizaçãodaEditoraSaraiva.

AviolaçãodosdireitosautoraisécrimeestabelecidonaLein.9.610/98epunidopeloartigo184doCódigoPenal.

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EDUARDOLUIZSANTOSCABETTE

Delegado de Polícia. Mestre em Direito Social. Pós-graduado em Direito Penal eCriminologia.Professor de Direito Penal, Processo Penal, Criminologia e Legislação Penal eProcessualPenalEspecialnagraduaçãoenapós-graduaçãodoCentroUniversitárioSalesianodeSãoPaulo–Unisal.

Conheça o autor deste livro: http://atualidadesdodireito.com.br/conteudonet/?ISBN=16906-7

COORDENADORES

ALICEBIANCHINI

DoutoraemDireitoPenalpelaPUCSP.MestreemDireitopelaUFSC.PresidentedoInstitutoPanamericanodePolíticaCriminal–IPAN.DiretoradoInstitutoLivroeNet.

LUIZFLÁVIOGOMES

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Juristaecientistacriminal.FundadordaRededeEnsinoLFG.Diretor-presidentedoInstitutodePesquisaeCulturaLuizFlávioGomes.DiretordoInstitutoLivroeNet.FoiPromotordeJustiça(1980a1983),JuizdeDireito(1983a1998)eAdvogado(1999a2001).

ConheçaaLivroeNet:http://atualidadesdodireito.com.br/?video=livroenet-15-03-2012

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Apresentação

Ofuturochegou.AEditoraSaraivaeaLivroeNet,emparceriapioneira,somaramforçaspara

lançarumprojetoinovador:aColeçãoSaberesdoDireito,umanovamaneirade aprender ou revisar as principais disciplinas do curso. São mais de 60volumes, elaborados pelos principais especialistas de cada área com base emmetodologiadiferenciada.Conteúdoconsistente,produzidoapartirdavivênciada sala de aula e baseado na melhor doutrina. Texto 100% em dia com arealidadelegislativaejurisprudencial.

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A união da tradição Saraiva com o novo conceito de livro vivo, traçocaracterísticodaLivroeNet, representaummarcodivisórionahistóriaeditorialdonossopaís.

O conteúdo impresso que está em suasmãos foimuito bem elaborado e écompleto em si. Porém, como organismo vivo, o Direito está em constantemudança. Novos julgados, súmulas, leis, tratados internacionais, revogações,interpretações, lacunas modificam seguidamente nossos conceitos eentendimentos (a título de informação, somente entre outubro de 1988 enovembrode2011forameditadas4.353.665normasjurídicasnoBrasil–fonte:IBPT).

Você,leitor,temàsuadisposiçãoduasdiferentesplataformasdeinformação:uma impressa, de responsabilidade da Editora Saraiva (livro), e outradisponibilizadanainternet,queficaráporcontadaLivroeNet(oquechamamosde )1.

No 1vocêpoderáassistiravídeoseparticipardeatividadescomosimulados e enquetes. Fóruns de discussão e leituras complementaressugeridas pelos autores dos livros, bem como comentários às novas leis e àjurisprudência dos tribunais superiores, ajudarão a enriquecer o seu repertório,mantendo-osintonizadocomadinâmicadonossomeio.

Você poderá ter acesso ao 1 do seu livro mediante assinatura.Todasasinformaçõesestãodisponíveisemwww.livroenet.com.br.

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AgradecemosàEditoraSaraiva,naspessoasdeLuizRobertoCuria,RobertoNavarroeLígiaAlves,pelaconfiançadepositadaemnossaColeçãoepeloapoiodecisivoduranteasetapasdeediçãodoslivros.

Asmudançasmaisimportantesqueatravessamasociedadesãorepresentadaspor realizações, não por ideais. O livro que você tem nas mãos retrata umamudançadeparadigma.Você,caroleitor,passaaserintegrantedessarevoluçãoeditorial,queconstituiverdadeirainovaçãodisruptiva.

AliceBianchini|LuizFlávioGomesCoordenadoresdaColeçãoSaberesdoDireito

DiretoresdaLivroeNet

SaibamaissobreaLivroeNethttp://atualidadesdodireito.com.br/?video=livroenet-15-03-2012

1O deveseradquiridoseparadamente.Paramaisinformações,acessewww.livroenet.com.br.

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Sumário

PARTEIDosCrimesContraaPessoa(arts.121a154,CP)

Homicídio(art.121,CP)Induzimento,InstigaçãoouAuxílioaoSuicídio(art.122,CP)Infanticídio(art.123,CP)Aborto(arts.124a128,CP)LesõesCorporais(art.129,CP)PerigodeContágioVenéreo(art.130,cp)PerigodeContágiodeMoléstiaGrave(art.131,cp)PerigoparaaVidaouSaúdedeOutrem(art.132,cp)AbandonodeIncapaz(art.133,CP)ExposiçãoouAbandonodeRecém-nascido(art.134,cp)OmissãodeSocorro(art.135,CP)Maus-tratos(art.136,cp)Rixa(art.137,CP)CrimesContraaHonra(arts.138a145,CP)ConstrangimentoIlegal(art.146,cp)Ameaça(art.147,CP)SequestroouCárcerePrivado(art.148,CP)ReduçãoàCondiçãoAnálogaàdeEscravo(art.149,CP)ViolaçãodeDomicílio(art.150,CP)ViolaçãodeCorrespondência(arts.151e152,CP)DivulgaçãodeSegredo(art.153,CP)ViolaçãodeSegredoProfissional(art.154,CP)

PARTEIIDosCrimesContraoPatrimônio(arts.155a183,CP)

Furto(art.155,CP)FurtodeCoisaComum(art.156,cp)roubo(art.157,CP)Extorsão(art.158,CP)ExtorsãoMedianteSequestro(art.159,CP)ExtorsãoIndireta(art.160,CP)AlteraçãodeLimites,UsurpaçãodeÁguaseEsbulhoPossessório(art.161,CP)SupressãoouAlteraçãodeMarcaemAnimais(art.162,CP)Dano(art.163,CP)IntroduçãoouAbandonodeAnimaisemPropriedadeAlheia(art.164,CP)ApropriaçãoIndébita(art.168,CP)ApropriaçãoIndébitaPrevidenciária(art.168-A,CP)ApropriaçãodeCoisaHavidaporErro,CasoFortuitoouForçadaNatureza;ApropriaçãodeTesouroeApropriaçãodeCoisaAchada(art.169eparágrafoúnico,IeII,CP)Estelionato(art.171,CP)

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DuplicataSimulada(art.172,CP)AbusodeIncapazes(art.173,CP)InduzimentoàEspeculação(art.174,CP)FraudenoComércio(art.175,CP)OutrasFraudes(art.176,CP)FraudeseAbusosnaFundaçãoouAdministraçãodeSociedadesporAções(art.177,CP)EmissãoIrregulardeConhecimentodeDepósitoouWarrant(art.178,CP)FraudeàExecução(art.179,CP)Receptação(art.180,CP)DisposiçõesGeraisdosCrimesContraoPatrimônio(arts.181a183,CP)

PARTEIIIDosCrimesContraaPropriedadeImaterial(arts.184a196,CP)

ViolaçãodeDireitoAutoral(art.184,CP)UsurpaçãodeNomeouPseudônimoAlheio(art.185,CP)Dos Crimes Contra o Privilégio de Invenção (arts. 187 a 191, CP); dos Crimes Contra asMarcasdeIndústriaeComércio(arts.192a195,CP)edosCrimesdeConcorrênciaDesleal(art.196,CP)

PARTEIVDosCrimesContraaOrganizaçãodoTrabalho(arts.197a207)

AtentadoContraaLiberdadedoTrabalho(art.197,CP)AtentadoContraaLiberdadedeContratodeTrabalhoeBoicotagemViolenta(art.198,CP)AtentadoContraaLiberdadedeAssociação(art.199,CP)ParalisaçãodoTrabalho,SeguidadeViolênciaouPerturbaçãodaOrdem(art.200,CP)ParalisaçãodeTrabalhodeInteresseColetivo(art.201,CP)InvasãodeEstabelecimentoIndustrial,ComercialouAgrícola.Sabotagem(art.202,CP)FrustraçãodeDireitoAsseguradoporLeiTrabalhista(art.203,CP)FrustraçãodeLeisobreaNacionalizaçãodoTrabalho(art.204,CP)ExercíciodeAtividadecomInfraçãodeDecisãoAdministrativa(art.205,CP)AliciamentoparaoFimdeEmigração(art.206,CP)AliciamentodeTrabalhadoresdeumLocalparaoutrodoTerritórioNacional(art.207,CP)

PARTEVDosCrimesContraoSentimentoReligiosoeContraoRespeitoaosMortos(arts.208a212,CP)

UltrajeaCultoeImpedimentoouPerturbaçãodeAtoaEleRelativo(art.208,CP)ImpedimentoouPerturbaçãodeCerimôniaFunerária(art.209,CP)ViolaçãodeSepultura(art.210,CP)Destruição,SubtraçãoouOcultaçãodeCadáver(art.211,CP)VilipêndioaCadáver(art.212,CP)

Referências

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PARTEIDosCrimesContraaPessoa(arts.121a154,

CP)

Homicídio(art.121,CP)

Induzimento,InstigaçãoouAuxílioaoSuicídio(art.122,CP)

Infanticídio(art.123,CP)

Aborto(arts.124a128,CP)

LesõesCorporais(art.129,CP)

PerigodeContágioVenéreo(art.130,CP)

PerigodeContágiodeMoléstiaGrave(art.131,CP)

PerigoparaaVidaouSaúdedeOutrem(art.132,CP)

AbandonodeIncapaz(art.133,CP)

ExposiçãoouAbandonodeRecém-nascido(art.134,CP)

OmissãodeSocorro(art.135,CP)

Maus-tratos(art.136,CP)

Rixa(art.137,CP)

CrimesContraaHonra(arts.138a145,CP)

ConstrangimentoIlegal(art.146,CP)

Ameaça(art.147,CP)

SequestroouCárcerePrivado(art.148,CP)

ReduçãoàCondiçãoAnálogaàdeEscravo(art.149,CP)

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ViolaçãodeDomicílio(art.150,CP)

ViolaçãodeCorrespondência(arts.151e152,CP)

DivulgaçãodeSegredo(art.153,CP)

ViolaçãodeSegredoProfissional(art.154,CP)

Homicídio(art.121,CP)Bemjurídicotutelado

Trata-sedavidahumana.

SujeitoativoQualquer pessoa pode ser sujeito ativo de homicídio, tratando-se de crime

comum.

SujeitopassivoTambém pode ser sujeito passivo do homicídio qualquer pessoa. Somente

não será sujeito passivo desse crime a pessoa que seja induzida, instigada ouauxiliada a destruir a própria vida. Para tanto existe tipo penal específicoprevistonoart.122,CP.Note-se,porém,quehácasosemqueemboraalguémdestruaaprópriavida,enganadaouconduzidaporoutrem,ocorreráocrimedehomicídio.Vejamosalgunsexemplos:a)Umalienadomentalquenãotemqualquernoçãodasconsequênciasdeseus

atoseéinduzidoasaltardeumprédioporoutrapessoa.b) Caso de coação absoluta em que a vítima é forçada amatar-se oumesmo

levada a erro, por exemplo, enganada quanto ao desmuniciamento de umaarma ou à natureza de uma substância a ser ingerida (ex.: veneno porremédio).Observe-seaindaqueexistetipopenalespecialparaocasodamãequemata

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oprópriofilhorecém-nascidosobainfluênciadoestadopuerperal(art.123,CP–Infanticídio).

Qualquerpessoapodeservítimadehomicídio,conformeacimamencionado,inclusive não importando o grau de vitalidade. Tanto o ser humano saudávelcomo o moribundo podem ser vítimas de homicídio. No atual estágio doordenamento jurídico brasileiro a chamada “eutanásia” configura crime dehomicídio.Omáximoquepodeocorreremcasosquetaiséoreconhecimentodeuma redução de pena devido à configuração do chamado “homicídioprivilegiado”(art.121,§1º,CP).

Outro ponto importante é a determinação domomento a partir do qual sepode falar em uma pessoa apta a ser vítima do crime de homicídio. Essadeterminaçãoserárelevanteparaadiferenciaçãoentreoscrimesdehomicídioeaborto.

Adoutrinaea jurisprudência têmindicadoo iníciodaexistênciadapessoahumanaapartirdo“iníciodoparto”.Apartirdoiníciodoparto,havendovidahumana,podeocorrerocrimedehomicídio,nãosendonecessárioqueessavidaseja viável. Por exemplo: pode ser vítima de homicídio uma criança comhidrocefalia com prognóstico de sobrevida muito reduzido ou mesmo nulo.Tambémnãoháóbiceàconfiguraçãodocrimedehomicídioseacondutaletalatingeum“ser teratológico”(deformado,quenão temformahumana),emboranascido de mulher. Tratando-se do sujeito passivo do crime, é importantelembrarquenocasodohomicídioo consentimentodavítimaé absolutamenteirrelevante,poisobemjurídicovidaéindisponível.

Uma distinção deve ser feita ao final: se a vítima for o Presidente daRepública,oPresidentedoSenado,PresidentedaCâmaradosDeputadosoudoSupremo Tribunal Federal, tendo motivação política, o crime é contra aSegurançaNacionalenãoumhomicídiocomumprevistonoart.121,CP(Lein.7.170/83 – Lei de Segurança Nacional – art. 29 – pena: reclusão de 15 a 30anos).

TiposubjetivoOhomicídioéprevistonasformasdolosaeculposa.Nocasodohomicídio

dolosoadoutrina temdenominadoavontadedoagentedeanimusnecandi ouanimusoccidendi(vontadedematar).

ConsumaçãoetentativaAconsumaçãodocrimedehomicídiosedácomamortedavítima.Trata-se

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decrimeinstantâneodeefeitospermanentes.AprovadohomicídioéproduzidapormeiodoLaudoNecroscópico.Aprova

pericial é imprescindível por tratar-se de infração penal que deixa vestígios(crime material) (art. 158, CPP). Ela somente poderá ser suprida pelatestemunhalnostermosdoart.167,CPP,emcasosextremos.

O homicídio (crime material e plurissubsistente) admite tentativa. Muitasvezes a tentativa de homicídio pode confundir-se com o crime de lesõescorporais,poisemambososcasoshaveráao finaldacondutado infratorumavítimalesionadaeviva.Oqueirádiferenciaroscasosdetentativadehomicídioede lesãocorporal seráoelementosubjetivo,ouseja,odoloouavontadedoagente. Se essa vontade for dirigida a matar a vítima (animus necandi ouoccidendi), haverá tentativa de homicídio; se for dirigida somente a lesionar(animus laedendi ou nocendi), haverá apenas lesão corporal (art. 129, CP).Note-se aindaque, seno caso concretohouverdificuldadepara a apuraçãodavontade do agente, a decisão deverá ser a mais favorável ao réu, ou seja, oreconhecimento de lesões corporais, devido ao Princípio do “Favor Rei” (indubioproreo).

Homicídioprivilegiado(art.121,§1º,CP)Ohomicídioprivilegiadoéumacausadediminuiçãodepena.Sãoprevistos

casos em que a reprovabilidade da conduta éminorada. O art. 121, § 1º, CP,descrevetrêsmotivaçõesdohomicídioquemerecemareduçãolegaldapena:a)cometer o homicídio por relevante valor moral; b) cometer o homicídio porrelevantevalorsocial;c)cometerohomicídiosobdomíniodeviolentaemoção,logoemseguidaainjustaprovocaçãodavítima.

O relevante valor moral e o relevante valor social são semelhantes, masapresentamdiferença importante: enquanto o relevante valormoral se refere ainteresses particulares, o relevante valor social é atinente a interesse coletivo.Porexemplo:a)relevantevalormoral:opaiquemataoestupradordasuafilha;b) relevante valor social: o indivíduo que mata o traidor da pátria ou umcriminosotemidonumacomunidade.

Observe-sequehá conflito aparentedenormas entreodispostono art. 65,III,a,CP(atenuantegenérica)eodispostonoart.121,§1º,CP.Deveprevaleceroprivilégiodoart.121,§1º,CP,devidoaoPrincípiodaEspecialidade.Ouseja,numcasoconcretoemqueocorrarelevantevalormoralousocialnohomicídio,aplica-seoprivilégioeafasta-seaatenuantegenérica.

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A violenta emoção de que trata o dispositivo sob comento exige certosrequisitos,asaber:a)quesejarealmenteavassaladoradopsiquismo,demodoalevarapessoaaumagirimpensado.Nãosefala,porém,comonoCódigoPenalanterior (1890), de “perturbação dos sentidos ou da inteligência”, que sedenominou de “privação dos sentidos”; b) injusta provocação – a vítima deveagir de modo a com sua conduta dar causa à ação violenta do homicida.Obviamenteaprovocaçãodeveser“injusta”,nãocabendoprivilégioseoagentefica irado como exercício de umdireito da vítima.Note-se que a lei fala em“injusta provocação”. Se o que motiva a morte da vítima é a defesa a uma“agressão”,ocorrelegítimadefesa(art.23,II,c/c25,CP).

No caso da violenta emoção não ocorre, como nas situações de relevantevalormoralousocial,umconflitoaparentedenormascomaatenuantegenéricasemelhanteprevistanoart.65,III,c,CP.Emboraalitambémsefaleemviolentaemoção,trata-sedecasosdistintosquetêmaplicaçãodiversa:emprimeirolugar,noart.65,III,c,menciona-se“influência”enão“domínio”deviolentaemoção,vislumbrando-se, portanto, uma gradação das situações que as distingueplenamente. Ademais, existe a provocação injusta da vítima na atenuantegenérica,masnãoháo requisito temporal (“logo em seguida”).Outro aspectorelevantedizrespeitoàinterpretaçãoquedeveserdadaaorequisitotemporal,ouseja,àexpressão“logoemseguida”,aqualimpõequeareaçãosejapróximanotempoemrelaçãoàprovocação.Nãoexisteumcritériorígido,sendonecessário,porém,quea reaçãosedêenquantodurara irritaçãodoautor.Obviamente, sepassadasmuitashorasdofatoouoautorpassaraoutrasocupaçõesparadepoisvir a cometer o crime, ocorrem fortes indicações ao não reconhecimento doprivilégio.Caberásempreaojuizavaliarcadacasocomassuaspeculiaridades.É preciso não esquecer, contudo, que o que importa no tempo é a ciência doagentesobreofatoprovocador.Podeocorrerqueofatosedistancielongamentenotempo,masoagentetenhatomadociênciadeleagoraeficadosobdomíniodeviolentaemoção.

Pode ocorrer ainda que o agente julgue por erro justificável a presença dealgumprivilégio, sendoquenestecasopoderáser reconhecidoobenefícioporconfigurar-se“errodetipo”,nostermosdoart.20,CP.

Finalmente,questionamentorelevanterefere-seàcompatibilidadeounãodosprivilégios com as qualificadoras no crime de homicídio. Em suma, pode umhomicídioser,concomitantemente,aomesmotempo,privilegiadoequalificado?

A doutrina dominante aponta a seguinte solução: serão compatíveis osprivilégios comasqualificadorasobjetivas (dizem respeito àmaneira como se

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mata alguém – art. 121, § 2º, III e IV, CP), mas não com as qualificadorassubjetivas(dizemrespeitoàrazãooumotivoparamataralguém–art.121,§2º,I, II e V, CP), pois estas são opostas às circunstâncias privilegiadas (nestesentido: Mirabete, Damásio E. de Jesus, Aníbal Bruno, João Mestieri, CelsoDelmantoetc.).MagalhãesNoronha,porseuturno,afirmaseremabsolutamenteincompatíveis as qualificadoras com os privilégios, inclusive pela posição doparágrafoquetratadohomicídioprivilegiadoantesdoquetratadoqualificado.

Aconsequênciado reconhecimentodoprivilégionohomicídioé a reduçãodepenadeumsextoaumterço.Comooart.121,§1º, in fine,dizqueo juiz“pode reduzir a pena”, discute-se na doutrina se esta redução é um “direitopúblico subjetivo do réu”, estando o juiz obrigado a aplicá-la uma vezreconhecidooprivilégio,ousetrata-sedeuma“faculdade”dojulgador.

Amaioria dos autoresmanifesta-se pela faculdade da redução (v.g. NelsonHungria, João Mestieri, Mirabete, Magalhães Noronha, Frederico Marques,Heleno Fragoso etc.). Outros se manifestam pela obrigatoriedade da redução,aduzindo que a faculdade se refere apenas à determinação do quantum daredução(deumsextoaumterço)(v.g.DamásioE.deJesuseCelsoDelmanto).Ajurisprudênciaatual,porém,vemtendendoareconheceraobrigatoriedadedaredução quando reconhecido o privilégio, concluindo tratar-se de “direitopúblicosubjetivodoréu”.Naverdade,reconhecidooprivilégio,nãoteráojuizcomo fundamentar a não redução da pena, sendo-lhe vedado agir por merocapricho (art. 93, IX, CF). A conformação atual do Estado de Direito nãocomportaaconcessãodepoderesincondicionaisanenhumaautoridadeestatal.

HomicídioqualificadoCrimehediondo

Ohomicídioqualificado,tratadonoart.121,§2º,IaV,CP,apresentacasosem que o legislador considera a conduta do agente mais reprovável, seja poraspectos objetivos, seja por aspectos subjetivos, determinando comoconsequênciaumconsiderávelaumentodepena(de12a30anosdereclusão).Alémdisso,conformeart.1º,I,daLein.8.072/90,alteradapelaLein.8.930/94,o homicídio qualificado e aquele praticado em atividade típica de grupo deextermínio são considerados “Crime Hediondo”, com todas as consequênciasdessaclassificação(videart.2ºeparágrafosdaLein.8.072/90).

Éimportantesalientarqueohomicídiosimples,ohomicídioprivilegiadoeohomicídio culposo não são considerados crimes hediondos. Pode-se aindaquestionar se o homicídio privilegiado/qualificado seria classificável como

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hediondo. Têm apontado a doutrina e a jurisprudência no sentido de que nãoexiste a possibilidade do reconhecimento dessa espécie de homicídio comohediondo,principalmentetendoemvistaoPrincípiodaLegalidade,jáqueaLeidosCrimesHediondosaelenãofazreferência.

EstudodosincisosI – Mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivotorpe

Os itens “paga e promessa de recompensa” sãomuito semelhantes, apenasdiferindonosentidodequenoprimeirooagenterecebeacompensaçãoparaocrimeenosegundobastaquehajaa“promessa”eoautorajamovidoporela,nãohavendonecessidadedequeapromessasejacumprida.Tambémnoscasosdepagaoupromessa,nãoéimperiosaafixaçãodevaloresnemqueapagasejarealizadaintegralmente.

Ambos os casos são denominados na doutrina como “HomicídioMercenário”. Existe divergência, porém, no que se refere à natureza darecompensa, havendo autores que defendem a tese de haver de ser estapatrimonial(v.g.Mirabete,NelsonHungria,HelenoFragoso,FredericoMarques,Magalhães Noronha, Aníbal Bruno e Celso Delmanto) e outros que afirmampoder constituir-se em qualquer vantagem, ainda que não economicamenteapreciável, como, por exemplo, uma promessa de casamento, favores sexuais,promoção profissional etc. (v.g.DamásioE. de Jesus, JoãoMestieri eCosta eSilva).

Apredominâncianadoutrina,conformesevê,énosentidodanecessidadedesignificadopatrimonialparaapagaoupromessaderecompensa.Issoparecesercorreto, uma vez que o legislador constou nesse inciso, na verdade, duasespécies do gênero “motivo torpe”, pretendendo destacá-las com vistas àreprovaçãodaquelequeagecontraavidaemtrocadevantagemmonetária.Osexemplosdosdoutrinadoresquedefendemapossibilidadedeenquadramentodeoutras vantagens não patrimoniais como pagas ou promessa de recompensapodem ter cabimento tranquilamente como homicídio qualificado na figuraprevistado“outromotivo torpe” (ex.: indivíduoquemataem trocade favoressexuaisdamulherdavítima).

Por fim, saliente-se que, nos casos de “Homicídio Mercenário”, tanto omandantecomooexecutorrespondempelaqualificadoraemestudo,nostermosdoart.30,CP,aoqueadoutrinatemdenominadocrimenintersicarios(“Crimeentreassassinos”)(veremcontrárioFernandoCapez).

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Quantoà figurado“outromotivo torpe”,deve-se inicialmenteconceituaroqueseja“torpe”.Nodicionárioencontra-sea seguintedesignação:“desonesto,repugnante, infame, nojento, ignóbil, manchado”. Assim sendo, este seráqualquermotivocapazdegeraro repúdiodaspessoas,abrangendo inclusiveohomicídiomercenáriocomoumadesuasespécies,conformejámencionado.II–Pormotivofútil

Fútil é aquilo que é frívolo, insignificante, vão, leviano. Característica é adesproporção entre omotivo e a reação extrema de praticar o homicídio. Sãoexemplos: discussão acerca de futebol, rompimento de namoro,desentendimentosbanais,discussõesnotrânsitoetc.

Indaga-se na doutrina se a futilidade domotivo deve ser analisada por umcritérioobjetivoousubjetivo,ouseja,deve-seavaliarafutilidadedeacordocomumsentimentogeralou tendoemvistaa impressãopessoaldoautordocrimeacercadarelevânciadaquelamotivaçãoespecífica?

A resposta tem indicadoque a futilidade domotivo deve ser analisada porcritériosobjetivos,enãodeacordocomopontodevistadoréu.Outrarealmentenão poderia ser a solução, pois caso contrário o dispositivo tornar-se-ia letramorta. Ora, se o agente chegou a matar alguém devido àquele motivo emdiscussão, certamente, para ele, esse não seria jamais considerado ummotivofútil.

Outra indagaçãoexistenterefere-seàequivalênciaounãodomotivofútilàausênciademotivo.Existemdecisõesjurisprudenciaisnosentidodeequipararaausênciademotivoaomotivo fútil, soboargumentodequea faltademotivoconfigurariaoextremodafutilidade.Noentanto,nadoutrinaenajurisprudência,existem posicionamentos contrários, indicando que a ausência de motivo nãopodeserequiparadaamotivofútil,devidoaoPrincípiodaLegalidade.Sealeifala em “motivo”, não havendo este, a qualificadora não subsiste (v.g. nadoutrina Damásio E. de Jesus e Celso Delmanto). Tem predominado oentendimentonajurisprudênciadequeaausênciademotivoafastaaincidênciadesta qualificadora. Entende-se que esse posicionamento é mesmo o maisacertado,sejaporquestãodelegalidade,sejatambémdevidoaofatodequesesabeque,naverdade,nenhumacondutahumanaédespidadefim.Dessemodo,oqueocorre,naverdade,équenãoseesclarecenoprocessoomotivodocrime,masesterealmenteexiste.Emexistindo,pode,aomenosemtese,estar ligado,por exemplo, a um privilégio ou ao menos constituir um motivo que nãoqualifiqueocrime.Nessepassoéprecisolevaremconta,alémdoPrincípioda

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Legalidade já mencionado, o chamado Princípio do “Favor Rei”, na suamodalidadedo in dubio pro reo. Havendo então dúvida, não se pode impor aqualificadoraaoréu.III–Comempregodeveneno, fogo,explosivo,asfixia, torturaououtromeioinsidiosooucruel,oudequepossaresultarperigocomum

São todos casos em que o meio empregado pelo agente merece umareprovação especial do legislador, seja pela crueldade ou maneira insidiosa(traiçoeira,dissimulada),sejapelofatodepoderresultarperigoaoutraspessoasquepoderãoseratingidasporviaoblíqua.Analisemoscadacaso:a)Veneno–oprimeiropassonestetópicoéconceituaroqueseriaveneno.Souza

Lima conceitua veneno como “toda substância estranha à categoria dosagentesvulnerantesepatogênicosque, introduzidaouaplicadadequalquermodonocorpohumanoemcertaquantidade, relativamentegrande,produzmais ou menos rapidamente, acidentes graves na economia, que podemterminar pela morte, ou deixar defeitos permanentes e irremediáveis”(GOMES,1994,p.592).

Indaga-se quanto à utilização de uma substância em geral inócua, a qual paradeterminada pessoa, por sua condição específica, pode ser letal, como porexemplooaçúcarparaodiabético.Configurar-se-ianocasoaqualificadoradoempregodeveneno?

A doutrina divide-se, existindo respeitáveis autores (v.g. Nelson Hungria eMagalhãesNoronha)queapontamaequiparaçãonestescasoscomoveneno.Noentanto,amelhoropçãoestáemconsiderarqueatipicidadeexigeousodevenenopropriamentedito,umavezqueestaéapalavrautilizadapelalei(PrincípiodaLegalidade).Casocontrário,estar-se-iaadmitindoumaanalogiainmalampartem.Nadaimpede,porém,quenessescasossejareconhecidaaqualificadorasoboaspectode“outromeioinsidioso”.

AníbalBrunotrazàcolaçãooexemplodopódevidro,concluindonãosetratarpropriamente de veneno, mas de agente vulnerante que produz lesões poraçãomecânica(instrumentocortante).Nãoobstante,acondutadeministrarpó de vidro na comida para a vítima pode configurar a qualificadora do“outromeioinsidioso”(BRUNO,1966,p.79).

Sem dúvida o venefício é um meio insidioso, sendo tal característicaimprescindível para a configuração da qualificadora em estudo, ou seja, ovenenodeveserministradosemaciênciadavítima,aqualéenganadapeloagente.Seporacasoovenenoéministradocomoconhecimentodavítima,

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por exemplo, obrigando-a a ingerir mediante violência, a doutrina àunanimidade afirma a descaracterização da qualificadora do emprego deveneno.Haverianestecasotambémumcrimequalificado,maspeloempregode“meiocruel”,enãoovenefício.

b)Fogo–ousodefogoqualificaohomicídio,poispodeconfigurarmeiocrueleaté mesmo perigo comum quando gera possibilidade de incêndio. Não sedeveconfundir,porém,ousodefogonohomicídiocomousode“armadefogo”. O emprego de arma de fogo não qualifica o homicídio. Também éimportante lembrar que para a qualificadora em estudo é necessário que ofogo seja ateado à vítima ainda viva. Se ateado à vítima já morta, podeconfiguraroutrocrime(vilipêndiodecadáverouocultaçãodecadáver–arts.211 e 212, CP). A verificação sobre se o fogo foi ateado antes ou postmortem se faz por meio da perícia médico-legal de acordo comcaracterísticasdelesõesemvivoseemmortos.

c)Explosivo–segundoMagalhãesNoronha,“explosivoéasubstânciaqueatuacom detonação e estrondo; é a matéria capaz de causar rebentação”(NORONHA,1990,p.23).Oempregodeexplosivocertamentecaracterizasituação que causa perigo comum, sendo este o cerne da previsão daqualificadora. Também o explosivo deve ser usado contra a vítima aindaviva. Se for usado em cadáver pode configurar destruição ou ocultação oumesmovilipêndio,dependendodoelementosubjetivodoautor(verarts.211e212,CP),sejaemconcursocomohomicídioouautonomamente.

Tratando-se dos casos de emprego de fogo e/ou explosivo, apresenta-se aquestãoquantoaoeventualconcursoformalcomoscrimesdeperigocomumprevistos nos arts. 250 e seguintes doCódigoPenal.Damásio entende quehaveria concurso, mas seu posicionamento é diverso da maioria dosdoutrinadores que ensinam, com razão, que os crimes de perigo sãosubsidiários,somenteprevalecendoseinexistenteoutrainfraçãomaisgrave.Assim sendo, o agente somente responderia pelo homicídio qualificado,inclusiveparaevitarpossívelbisinidem,poisseriaapenadopelohomicídioqualificadoe responderiaaindaporoutrocrimeemconcurso,considerandoummesmofato.

Acaso o agente com sua conduta efetivamente atinja outras pessoas alémdaquela(s)visada(s),dependendodocasoconcreto,poderáresponderatítulodedoloeventualporoutrostantoshomicídiosqualificadosouporhomicídiosculposos,tudovariandoconformeoelementosubjetivodoautor.

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d)Asfixia–aasfixiaéconsideradaummeiocruel,sendoexemplosdessaespéciedeconduta:d.1–Esganadura–constriçãodopescoçocomasmãos.d.2 – Enforcamento – constrição do pescoço por um laço acionado peloprópriopesodocorpodavítima.d.3 – Estrangulamento – constrição do pescoço por um laço acionado porforçamuscular.d.4–Sufocação–tamponamentodasviasaéreas.d.5–Soterramento–submersãoemmeiosólido.d.6–Afogamento–submersãoemmeiolíquido.d.7 – Confinamento – colocação da pessoa em local abafado, onde nãocirculaoar.

e) Tortura – caracteriza-se pela inflição de um meio que causa sofrimentodesnecessárioàvítimadohomicídio.Revelaosadismodoautordocrimeeconfigura-secomoummeiocrueldematar.

Adoutrina temapontadoquea torturapode ser tanto física (ex.:queimaduras,choques etc.) como moral (ex.: criação de clima de terror ou angústia navítima).

Nestetópicoéprecisoatentarparaoconflitodenormasentreoart.121,§2º,III(tortura)(homicídioqualificadopelatortura),eocrimedetorturaqualificadapelamorte,previstonoart.1º,§3º,daLein.9.455/97.O evento morte na tortura pode ocorrer de formas diversas, apresentando

soluçõestambémdiferentes.Senãovejamos:Caso1O indivíduoquermatar equerque amorte sedêpormeiode tortura.

Configura-seoart.121,§2º,III,CPeéafastadaaLein.9.455/97.Nestecasoatorturanãoeraofim,masapenasomeioparaaobtençãodamortedavítima.

Caso2O indivíduoquerpraticar a tortura edurante esta resulta amorte, semque houvesse planejado tal resultado mais gravoso. Trata-se de figurapreterdolosa,sendoquenestecasorespondepeloart.1º,§3º,infine,daLein.9.455/97.

Caso 3 O indivíduo quer praticar a tortura. Inicia sua conduta e durante estasente a vontade dematar a vítima, deferindo-lhe ao final dos atos cruéistiros que a matam. Neste caso há concurso material de dois crimes:homicídio qualificado (eventualmotivo torpe ou recurso que dificulte ou

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torneimpossíveladefesadavítima–art.121,§2º,IeIV,CP)ecrimedetorturasimples(art.1ºdaLein.9.455/97).

IV – À traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outrorecursoquedificulteoutorneimpossíveladefesadoofendido

Trata-se demeios para a prática do homicídio que revelam a covardia doautor,oqualseutilizadeexpedientesquepossibilitamapráticadocrimecommaior segurança, por intermédio da boa-fé ou desprevenção da vítima.Analisemoscasoacaso:a)Àtraição–acaracterísticaseráaexistênciadeumarelaçãodeconfiançaentre

vítimaeautor,aqualseráquebradapelosegundo.Sãoexemplosdoutrináriose jurisprudenciais: marido que mata a mulher durante relação sexual; tiropelascostas; indivíduoqueatraioamigoparalocalondeexisteumpoçoe,pedindoqueolheoqueháalidentro,oempurra.

b)Emboscada–configura-secomatocaia,ondeoagentepermaneceescondidoàesperadavítima.

c) Dissimulação – significa “encobrimento dos próprios desígnios, disfarce,refolho, fingimento”.Damásioafirmaqueadissimulaçãopodesermaterialoumoral (JESUS, 2005, p. 69-70). Exemplo da primeira seria o fato de oagente disfarçar-se paramatar a vítima; quanto à segunda seria o caso dofingimentodeamizadeoucarinhopelavítimaparamatá-la.

d) A fórmula genérica – “qualquer outro recurso que dificulte ou torneimpossível a defesa do ofendido”. São exemplos: armadilhas ocultas; oataque de surpresa sempre que se verifique que ele comprometeu apossibilidade de defesa da vítima. Note-se, porém, que a superioridade dearmas por si só não constitui a qualificadora, bem como não a constitui adiferença física entre autor e vítima.Ademais, a impossibilidade de defesadevederivardomeiodeexecuçãodohomicídio,enãodecondiçõespessoaisda vítima. Nestes casos eventualmente poderá configurar-se causa deaumentodepenaouagravantegenérica (v.g.matarum idosoouenfermo–art.61,II,h,CP;matarumacriança–art.121,§4º,infine,CP).

V–Paraasseguraraexecução,aocultação,aimpunidadeouvantagemdeoutrocrime

Ocorre sempre em conexão do homicídio com outro crime, havendo umaligaçãodemotivaçãoentreeles.Sãoprevistastrêsfiguras:a)Asseguraraexecuçãodeoutrocrime–ocorrequandooagente,parapraticar

ocrimequetememmente,vemamataralguémquelheeraobstáculo.Ex.:o

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sequestrador que mata os seguranças da vítima de extorsão mediantesequestroparapoderconsumarseuintento.

b)Ocultaçãoouimpunidadedeoutrocrime–naocultaçãosetemporobjetoocrime, o fato criminoso. O crime não é conhecido e o agente procuraesconder sua ocorrência. Já na impunidade, a ocorrência do crime éconhecida,pretendendooagenteesconderapenasaautoria.

c)Assegurar a vantagem de outro crime – a vantagem será o proveito a serobtidopeloagentecomocrime.Neste tópicoadoutrinaentendepoder seralgumavantagempatrimonialoudequalqueroutranatureza.Deve-setercuidadonestetópicocomocasodoautorquemataalguémpara

roubar,porqueseconfiguraentãoocrimede“latrocínio”(art.157,§3º,infine,CP),enãoohomicídioqualificado.

Mesmoquandoextintaapunibilidadedooutrocrimeporqualquermotivo,persiste a qualificadora. Observe-se ainda que para a configuração daqualificadora não se exige decisão final (trânsito em julgado) ou mesmocondenação com relação ao outro crime. Também não é necessário paraconfiguraraqualificadorasobcomentoqueoagenteconsigaocultar,asseguraravantagem,impunidadeouexecuçãodooutrocrime,bastandoacomprovaçãodesua intenção. Assim também não é necessário que o outro crime venha a sercometidopelomesmoagente,podendosê-loporterceiro(ex.:osujeitoquemataalguémparaevitarquereconheçaumamigoseucomoautordeumfurto).

Questãoa serpostanestepontoéaquelaqueversa sobreocasodoagenteque pratica o homicídio para, por exemplo, assegurar a prática de uma“contravençãopenal”.Haveriaaqualificadoraemapreço?Arespostaénegativa,poisanormasobcomentomenciona“crime”,enão“contravenção” (PrincípiodaLegalidade).Nãoobstante,ohomicídiocontinuaqualificadonos termosdoart.121,§2º,I(motivotorpe).

Outroquestionamentopostopeladoutrinadizrespeitoaofatodequeooutrocrimesejaimpossívelouputativo.

Damásioapresentaduassoluções,conformeocaso(JESUS,2005,p.71):Crimeimpossível:indivíduoqueévistoapunhalandoummortoemataa

testemunha.Segundooautor,responderiapelaqualificadoradoart.121,§2º,V,CP,porreferir-seàmesmamotivaçãosubjetivadohomicídio. Crime putativo: o indivíduo que pratica incesto e pensa tratar-se de

figura criminosa, matando a testemunha que o flagrou. O autor diz quenestecaso,tratando-seoprimeirosupostocrimedefatonaverdadeatípico,

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deveria responder por homicídio qualificado, mas por motivo torpe (art.121,§2º,I,CP).

Narealidadeamelhorsoluçãoparaambososcasosseriaaqualificadoradomotivo torpe (art. 121, § 2º, I, CP), pois em nenhum deles configura-seperfeitamenteo“outrocrime”dequetrataoincisoV.

Podeaconteceraindaqueumautoresteja,porexemplo,furtandoumacasae,constatando que o dono da casa é seu inimigo capital, resolve matá-lo porvingança.Nãoseráocasodelatrocínio(art.157,§3º,CP),poisqueamortenãoémeio para a subtração. Existe concursomaterial entre furto (art. 155,CP) ehomicídiopossivelmentequalificadopelomotivo torpe (vingança–art.121,§2º,I,CP).TambémnãoéocasodoincisoVdoart.121,§2º,CP,porqueamortenãotevepormóvelaexecução,ocultação,impunidadeougarantiadavantagemde outro crime, no caso, o furto,mas sim a vingança pura e simples contra avítima.Esseéocasoidentificadonadoutrinacomo“conexãoocasional”.

Algumasobservaçõesimportantessobreohomicídiodoloso

AquestãodapremeditaçãoA premeditação não é prevista como circunstância qualificadora no

homicídio,podendoapenasserlevadaemcontanadeterminaçãodoquantumdapenapelojuiz,nostermosdoart.59,CP.

O legislador pátrio optou bem neste aspecto, pois nem sempre apremeditação(opensarantes)configuraummotivoparamaiorreprovabilidadeda conduta. Na verdade, o legislador brasileiro foi sábio ao elencarcasuisticamente os casos de premeditação reprovável, sem torná-lagenericamenteumaqualificadora(v.g.emboscada,àtraição,venefício,conexãodohomicídiocomoutroscrimesetc.).

ParricídioNo Direito Antigo era tido como crime capital a ser punido com rigor

exemplar. Hoje, o homicídio do próprio pai, da própria mãe, entre irmãos,parentes em geral ou cônjuges, pode configurar no máximo uma agravantegenérica(verart.61,II,CP),enãohomicídioqualificadoporessemotivo.

GenocídioSe o crime é perpetrado com a intenção de destruir no todo ou em parte

gruponacional,étnico,racialoureligioso,ocorreocrimedegenocídioprevisto

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noart.1ºdaLein.2.889/56.Ocrimedegenocídiotambéméconsideradocrimehediondo (Lei n. 8.072/90).Adiferençabásica é queno crimedegenocídio aaçãoévoltadaparaumacoletividade,enãoparaumindivíduosomente,aindaqueoatingidosejaapenasumindivíduo.Note-seaindaqueascondutasdocrimede genocídio não se resumem a matar, mas abrangem uma série de outrasatuações criminosas (v.g. esterilização, retiradas forçadas de pessoas de umgrupo,lesõesincapacitantes,submissãoacondiçõesprecáriasdeexistênciaetc.).

OcorrênciadeduasoumaisqualificadorasSuponha-se que num caso concreto o indivíduo incida em duas ou mais

qualificadoras.Porexemplo,mataporummotivofútilecomempregodefogo(art. 121, § 2º, II e III, CP). Apenas uma das qualificadoras basta para aaplicaçãodapenamajorada(reclusão,de12a30anos).Havendomaisdeumaqualificadora,entraránocálculodapenaentreasbalizasmínimaemáximapelojulgadornostermosdoart.59,CP(circunstânciajudicial).Háposiçãonosentidodequeumadasqualificadorasseriaaplicadacomoagravantegenérica,masessanãoéamelhorsolução.Tenha-seemconsideraçãoqueajurisprudênciadoSTJtem assim semanifestado a respeito do tema (RHC7176/MS, 6ª T., rel.Min.FernandoGonçalves,j.19-3-1998,DJU6-4-1998,p.163).

VítimamulhergrávidaDuassituaçõesdevemserabordadas:

a)O agente sabe que a mulher está grávida – responde por homicídio emconcursocomaborto(art.121c/c125,CP).Existediscussãojurisprudencialapenassobretratar-sedeconcursoformalpróprioouimpróprio(art.70,CP).

b) O agente não sabe que a mulher está grávida – responde apenas pelohomicídio, pois o aborto está forade sua consciência. Inclusive afasta-se aagravantegenéricadoart.61,II,h,CP.

HomicídiocontramenoreseidososO art. 263 doECA (Lei n. 8.069/90) acrescentou ao § 4º do art. 121 uma

causadeaumentodepenadaordemdeumterçoquandoohomicídioépraticadocontra pessoa menor de 14 anos. Posteriormente o Estatuto do Idoso (Lei n.10.741/2003)incluiunessaespecialproteçãoosidosos(maioresde60anos).

Emalgunscasospodeocorrerconflitoaparentedenormasentreacausadeaumentodepenaprevistano§4ºdoart.121eaagravantegenéricadoscrimescometidoscontra“criança”ou“maiorde60anos”,nostermosdoart.61,II,h.A

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questão não tem sido objeto de maior desenvolvimento na doutrina ejurisprudência,masdeveprevaleceracausadeaumentodepena,tendoemvistaoPrincípiodaEspecialidade.

HomicídioculposoOCódigoPenalprevêemseuart.121,§3º,ohomicídioculposo,ou seja,

aquele em que amorte causada pelo agente advém de conduta informada porimprudência, negligência ou imperícia. A pena prevista é consideravelmentereduzida(detenção,de1a3anos).

ComoadventodoCódigodeTrânsitoBrasileiro(Lein.9.503/97),quandoohomicídio culposo se dá estando o infrator na direção de veículo automotor,configura-senãomaisinfraçãoaoart.121,§3º,CP,masaoart.302,CTB,cujapenaéconsideravelmentemaior(detenção,de2a4anos).Tenha-seemmente,porém,que,seohomicídiofordoloso,mesmoquesejarealizadoutilizandoumveículo automotor (ex.: indivíduo que atropela e mata dolosamente alguém),continuamvalendoasdisposiçõesdoCódigoPenal(art.121).

Portanto, hoje, em se tratando de homicídio culposo é preciso fazer adistinçãoentreocrimedoCódigoPenaleodoCódigodeTrânsito.Estanãoédificultosa,bastandosaberqueaaplicaçãodoCódigodeTrânsitoresume-seaoscasosdeacidentesocorridosnotrânsitoviárionosquaisoautordocrimeestejanadireçãodeveículoautomotor.OCódigoPenalteráumaaplicaçãoresidualatodososdemaiscasos.

Tanto o Código Penal (art. 121, § 4º, parte inicial) como o Código deTrânsito(art.302,parágrafoúnico)preveemcausasdeaumentodepenaparaosrespectivoshomicídiosculposos.Éprecisoestaratentoparaquecadagrupodecausas de aumento de pena tem sua aplicação delimitada ao diploma legalaplicável ao caso, ou seja, as causas de aumento de pena previstas no CPsomentesãoaplicáveisaoscasosdeseuart.121,§3º,enquantoqueascausasdeaumento previstas noCTB somente são aplicáveis aos casos de tipificação doart.302,CTB.

NoCódigoPenalascausasdeaumentodepenaprevistasparaohomicídioculpososãoasseguintes:a)Inobservânciaderegratécnicadeprofissão,arteouofício.Um exemplo seria aquele domédico que não esteriliza os seus instrumentos,

realizandocirurgiaqueresultaeminfecçãogeneralizadaemortedopaciente.Àprimeiravistapodeparecerqueestafiguraseriaomesmoqueaimperíciaem

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geral como configuradora da culpa. No entanto, diferencia-se no seguintedetalhe:enquantonaimperíciaoagenteignoraaregratécnicaeporissoageerroneamente,nocasodoart.121,§4º,CP,oagente temconhecimentodaregra, mas, mesmo assim, não a observa. Frise-se, porém, entendimentodivergentedeGuilhermedeSouzaNucci,paraquemessadiferenciaçãoseriaproblemáticaedeveriaserabolidaacausadeaumentodepena,poisemboraprevistanoCódigoPenal,naverdadenão teriaaplicaçãoprática, tendoemvista ser inviável sua distinção da modalidade de culpa consistente naimperícia(NUCCI,2003,p.151).

b) Deixar de prestar imediato socorro à vítima ou não procurar diminuir asconsequênciasdeseusatos.

Nestecasodeve-selembrarqueoagentenãoresponderáemconcursopelocrimedeomissãodesocorro(art.135,CP),porqueissoconstituiriabisinidem.

Seavítimaforsocorridaporterceiros,tivermorteinstantânea,sofrerferimentoslevesquenãodemandemsocorroimediatoouoautordocrimeculposonãopuder por motivo alheio à sua vontade prestar socorro (v.g. risco de suaintegridade física por populares; impossibilidade física da prestação dosocorroetc.),nãoseconfigurandoabandonopeloagente,estenãoincidenafigura.Tambémseafastaafiguraquandooautordocrimeculposonãoprestadiretamenteosocorro,masacionaquemdedireito (v.g.polícia,bombeiros,ambulânciaetc.).

c)Fugirparaevitaraprisãoemflagrante.Visaodispositivodesestimularafugadoagentequepodedificultaraposterior

apuraçãodaautoria.No art. 302, parágrafo único, CTB, aplicável aos homicídios culposos na

direçãodeveículoautomotor,existemcincofigurasprevendoaumentodepenaentreumterçoeametade:a)NãopossuirpermissãoparadirigirouCarteiradeHabilitação.b)Praticarocrimenafaixadepedestresounacalçada.c)Deixardeprestarsocorro,quandopossívelfazê-losemriscopessoal,àvítima

doacidente.Acasooindivíduocometahomicídioculposonotrânsitoenãosocorraavítima,

responderápelocrimedehomicídioculposo(art.302,CTB)comoaumentode pena,mas não responderá pelo crime autônomo de omissão de socorrotambémprevistoespecificamenteparaoscasosdecrimesdetrânsitonoart.304,CTB.IgualmenteaoqueocorrenoCP,estariaconfiguradoobisinidem.

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Não obstante a redação do parágrafo único do art. 304, CTB, as mesmaslimitaçõesparaaplicaçãodoaumentodepenaporomissãodesocorro,vistasquando se tratou do homicídio culposo do Código Penal, têm plenaaplicabilidade.Adicçãodoparágrafoúnicodoart.304,CTB,constitui-seemverdadeira aberração jurídica, dificilmente aplicável na prática, tendo emvista infração a princípios básicos doDireito PenalModerno, tais como oDireitoPenaldoDano,Tuteladebensjurídicos,lesividadedascondutasetc.

d) No exercício de profissão ou atividade, estiver conduzindo veículo detransportedepassageiros.

PerdãojudicialO § 5º do art. 121, CP, prevê hipóteses de perdão judicial. Para tanto, as

consequências do crime têm que atingir realmente de forma muito grave opróprioagenteparapossibilitaroperdãoenãoaplicaçãodepena.Ocorrerá talcasosemprequeapenapareçadiminutaemfacedapuniçãoqueoprópriofato,comsuasconsequências,impôsaosujeito.Sãoexemplos:perderoprópriofilho,agentequeficaparalíticoetc.

UmaindagaçãosurgiucomoadventodoCTB,qualseja,operdãojudicialdoart.121,§5º,CP,podeseraplicadoemcasosdeinfraçãoaoart.302,CTB?

A doutrina inicialmente manifestou-se dividida sobre o tema, havendoposicionamentospróecontra.Oscontráriosargumentavamqueoart.300,CTB,que previa o perdão judicial, foi vetado e que o art. 291, CTB, mandaaplicarem-se subsidiariamente somente as normas gerais (Parte Geral) doCódigo Penal. Estando o Perdão Judicial tratado na Parte Especial doCódigoPenal,seriainaplicável.Porseuturno,aquelesquedefendiamapossibilidadedeaplicação firmavam-se nas razões do veto do art. 300,CTB, que efetivamentefazem menção ao Perdão Judicial do Código Penal e dizem que este seriaaplicável,somentenãomantendooart.300,CTB,paraevitarredundâncialegaledevidoàopçãopelaredaçãomais técnicaeabrangentedoart.121,§5º,CP.Quantoàquestãodasnormasgeraisditasnoart.291,CTB,entende-sequenãosão estritamente as da Parte Geral do Código Penal, mas todas as normas deaplicação geral, independentemente de sua topografia no diploma legal emdestaque.Ora,oCódigoPenal temnormasdecarátergeral tantoemsuaParteGeral como em sua Parte Especial (por exemplo o conceito de funcionáriopúblico).OPerdãoJudicialprevistonoart.121,§5º,CP,seriaoutroexemplodenorma geral alojada na Parte Especial do Código Penal Brasileiro. Enfim, apolêmica sobreo tema foi-se assentando comopassar do tempo e atualmente

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predominafrancamenteoentendimentodequeéplenamentecabívelaaplicaçãodoPerdãoJudicialprevistonoCódigoPenalaoscrimesdetrânsito.

AçãopenalecompetênciaA ação penal no crime de homicídio (doloso ou culposo) é pública

incondicionada. Quanto à competência para instrução e julgamento, varia deacordocomoelementosubjetivo.ParaohomicídiodolosoacompetênciaédoTribunal do Júri (art. 5º, XXXVIII, d, CF). Para o homicídio culposo, acompetênciaédojuízocomummonocrático.

Induzimento,InstigaçãoouAuxílioaoSuicídio(art.122,CP)Suicídio

Oatosuicidanãoéprevistocomocrimeporrazõesdepolíticacriminal,deformaqueapessoaquetentasuicidar-senãocometeinfraçãopenal.Otipopenaldescrito no art. 122,CP, visa a punição daquele terceiro que induz, instiga ouauxiliaoutremaosuicídio,numquadroemqueosuicidafiguranaqualidadedevítima.

Observe-se, porém, que, embora seja impune aquele que tentamatar-se, avida continua sendo bem indisponível, tanto que a lei não considera ilegal acoaçãopraticadaparaimpedirosuicídio(verart.146,§3º,II,CP).

ObjetividadejurídicaObemjurídicotuteladoéavidahumana.

SujeitoativoQualquerpessoa,tratando-sedecrimecomum.

SujeitopassivoQualquer pessoa que tenha capacidade de resistência à prática do suicídio.

Comojávisto,seessacapacidadeénulaouinexistente,nãoocorreocrimedoart.122,CP,massimhomicídio.

Paraaconfiguraçãodocrimedoart.122,CP,énecessário,porém,quea(s)vítima(s)seja(m)determinada(s).Vejamosexemplos:a)Um indivíduoconvenceumaoumaispessoasdeterminadasa suicidarem-se

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porqueofimdomundoestápróximo–configura-seocrimedoart.122,CP.b)Omesmoindivíduoescreveumlivrosobreoassuntoparavendaemgeral–

fatoatípico.

TipoobjetivoO tipo penal prevê três condutas (crime de ação múltipla, de conteúdo

variadooutipomistoalternativo),asaber:induzir,instigareprestarauxílio.Asduas primeiras (induzimento e instigação) são chamadas de “participação ouconcursomoral”, enquanto o auxílio é chamado de “participação ou concursofísicooumaterial”.

As condutas do induzimento e da instigação diferem. No induzimento oagente cria a ideia do suicídio que não existia na vítima. Já na instigação oagente apenas incentiva uma ideia anterior de matar-se, oriunda da própriavítima. Em ambos os casos a atuação do agente émeramente psicológica, deconvencimento.Agora,noauxílio,existeumaparticipaçãomaterialdoautor.Porexemplo, fornecendo uma arma, fornecendo veneno, ministrando instruçõessobremeiosdesuicidar-se,montandoumaparatoparao suicídio, iludindoumvigiaqueimpediriaosuicídioparaqueavítimapossadarcabodaprópriavida,dificultandoosocorroimediatodosuicidaetc.Nãoobstante,éimportantenotarque essa intervenção física do agente não pode extrapolar o mero auxílio eacabaradentrandoematosdeexecuçãodamorte,senãoocorreráhomicídio.Porexemplo,oindivíduochutaacadeiraparaqueavítimasejaenforcada.

Adoutrinaeajurisprudênciavêmconsiderandoqueossimplesmaus-tratosinfligidosàvítimanãoconfiguramotipopenalemdiscussão,anãoseremcasosextremos,comprovadoodolodoagente.

Apráticadocrimeporomissãotemsidoobjetodepolêmica:Em primeiro lugar, tratando-se de suposto crime omissivo impróprio ou

comissivo por omissão, há que analisar a relevância dessa omissão, ou seja,somenteseconfigurariaeventualfiguratípicanoscasosemqueoagentetivesseo“deverjurídico”deatuarparaimpedirosuicídio,nosestritostermosdoart.13,§2º,a,bec,CP.

Aquestãosedividedoutrinariamentecommaisdestaquequandosetratadaquestãodapossibilidadedo“auxílio”poromissão:

SãodaopiniãodapossibilidadeNelsonHungria,AníbalBruno,MagalhãesNoronha eMirabete. Em sentido contrário posicionam-se FredericoMarques,DamásioE. de Jesus,Bento deFaria,HelenoFragoso eEuclidesCustódio da

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Silveira.A orientação que melhor se afigura no caso é aquela que admite a

possibilidadeinclusivedapráticado“auxílio”poromissão.Veja-seelucidativoexemplodeAltavilla:

Em um hospital é internado um doente que sofre atrozmente e manifestapropósitos suicidas. O enfermeiro, violando a norma do regulamento quemandarecolherasarmasdetodapessoainternada,deixa-lheorevólver,paraqueele (odoente)possa realizar seudesígnio.Essaomissãonãoconfigurainduzimentoouinstigação,masauxílioaosuicídio(apudMIRABETE,2011,p.85).

NecessidadederesultadoOcrimedoart.122,CP,sóocorresehouverumdosresultadospreconizados

(morte ou lesão corporal de natureza grave), sendo as penas previstasrespectivamentedereclusãode2a6anosede1a3anos.Portanto,nãoexistetentativa, ou ocorre um dos resultados ou o fato é atípico. Ressalve-seentendimento diferenciado de Cezar Roberto Bitencourt, para quem haveria atentativadocrimedoart. 122,CP,quando resultassem lesõesgraves, aqualoautor denomina de “tentativa qualificada”. Por outro lado, mesmo esse autorafirmaquenãohaveriapossibilidadedoreconhecimentodatentativabrancaoumesmo da figura da tentativa quando a vítima sofresse lesões corporais leves(BITENCOURT,2008,p.108-112).

Existediscussãodoutrináriaquantoànaturezajurídicadessesresultados:Hádoutrinadoresqueafirmamqueosresultadosexigidosseriam“condição

objetivadepunibilidade”(v.g.NelsonHungria,Manzini,Soler,Carrara)eoutrosque dizem serem os resultados “elemento do tipo” (Magalhães Noronha,Mirabete, Frederico Marques, Damásio E. de Jesus, Costa e Silva, HelenoFragoso,EuclidesCustódiodaSilveira,Piromallo,Pannain,Altavilla,Gimenesde Ásua, Maggiore e Alimena). Predomina, como visto, o entendimento queconsideraosresultados(morteoulesãograve)como“elementosdotipo”.

É importante ressaltar a diferença entre essas figuras. Enquanto as“condiçõesobjetivasdepunibilidade”nãointegramodoloeestãoforadocrimecomodescriçãotípica(ex.:art.1º,CP,eart.7º,§2º,CP),os“elementosdotipo”constituemsuadescriçãoedevemestar abrangidospelodolodoagente, comoocorre comaqueleque, por exemplo, instiga alguémao suicídio, pretendendo,logicamente,amorteou,nomínimo,lesõesgraves.

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TiposubjetivoOelementosubjetivoéodolo,consistentenavontadeconscientedeinduzir,

instigar ou auxiliar a vítima ao suicídio.Alguns doutrinadores falam em doloespecífico, considerando este a finalidade de obter a morte da vítima (v.g.Magalhães Noronha e Manzini). Outros consideram o dolo genérico porquesempreestápresentenoatodeinduçãoaosuicídioodesejodamortedavítima(MirabeteeDamásio).Osegundoentendimentopareceseromaisconsentâneocom o bom-senso, pois é mesmo impensável que alguém instigue outrem aosuicídiosemaintençãoinerenteaessacondutadequeavítimamorra.

Não existe modalidade culposa. Se, culposamente, se participa de umsuicídio, pode haver responsabilização por homicídio culposo,mas jamais porinfraçãoaoart.122,CP.Noentanto,háautores(v.g.JoãoMestierieMirabete)que consideram impossível a responsabilização por homicídio culposo, sendosimplesmentefatoatípico.

Maisumavezdeveráseranalisadocasoacasopeloseguintecritério:a)Sehouve realmenteeliminaçãovoluntáriadavidapelapessoa,possibilitada

pela conduta culposa, trata-se de fato atípico, pois inexiste participaçãoculposa em suicídio. Por exemplo, se o pai negligente deixa a arma aoalcance do filho, sendo este filho de idade mais avançada (v.g. 20 anos),tendo plena consciência de seus atos. Se pega a arma e se mata, trata-serealmentedefatoatípico.

b)Seacondutaculposa inicial levaaumacontecimentoacidentalquecausaamorte, tem-se um caso de homicídio culposo. Por exemplo, o mesmo paidesidiosoquedeixaumaarmaaoalcancedofilhomenor,oqualédepoucaidade (v.g. 3 anos) e, acidentalmente, se fere e morre. Não houvepropriamenteumsuicídioparaquesepudessefalarem“participaçãoculposaatípica”.Houvemesmoumhomicídioculposoinformadopelanegligência.

AumentodepenaNoscasosdoart. 122,parágrafoúnico, I e II,CP, apenaéduplicada.São

dois casos: a)motivo egoístico; b) vítimamenor ou que tem “diminuída” porqualquercausasuacapacidadederesistência.

Nomotivoegoísticoháarevelaçãododesprezodoagentepelavidaalheia,sobrepondointeressespessoais.Sãoexemplos:desejodereceberherança,desejoderecebersegurodevida,eliminaçãoderivalemcasoamoroso,competiçãoemnegócios,vingança,ódio,maldadeetc.Note-sequeomotivoegoístico,parasua

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caracterização,nãopressupõesomenteinteressesmateriais.No segundo caso, o que vai ser aferido é a capacidade “psíquica” de

resistênciadavítimaaoconvencimentodapráticadosuicídio.Arigor,quandoaleifalaem“menor”significariamosmenoresde18anos(art.27,CP).Existem,porém,posiçõesdoutrinárias (v.g.DamásioE. de Jesus eMagalhãesNoronha)afirmando que seriam os menores entre 14 e 18 anos, pois que, numainterpretaçãosistemáticadoCódigoPenal,osqueestivessemabaixodos14anosnãoapresentariamnenhumacapacidadederesistênciaainfluênciasexternas,demodoqueseriamentãovítimasdehomicídio.Atualmentevemdespontandoumterceiro entendimento, especialmente na jurisprudência, apontando para anecessidade de verificação no caso concreto, independentemente da idade davítima, se esta tinha plena resistência ou não, sendo amenoridade apenas umindicativo não conclusivo. Entretanto, tem predominado ainda neste caso oposicionamento que interpreta a palavra “menor” ora enfocada como sendoaquelesentre14e18anos.

Afora os menores, o inciso II do dispositivo ora enfocado abre fórmulagenérica para abarcar outras pessoas, embora maiores, que tenham suacapacidade de resistência psíquica diminuída. Estariam abarcados então osalienados, débeis mentais, embriagados, drogados, enfermos etc., os quaistenhamdiminuída sua capacidadede resistência.Não se pode esquecer que setaispessoasnãotêmqualquercapacidadederesistênciaaoinvésdesofreremdesomenteumadiminuiçãodessacapacidade,ocorrerácrimedehomicídio,enãodesimplesinstigaçãoaosuicídio.

AçãopenalecompetênciaO crime previsto no art. 122, CP, é de ação penal pública incondicionada,

sendoacompetênciaparaoseuprocessoejulgamentodoTribunaldoJúriportratar-sedecrimedolosocontraavida.

Infanticídio(art.123,CP)Conceito

Magalhães Noronha conceitua o crime sob comento de forma singela: amorte do nascente ou do neonato, pela própriamãe, sob influência do estadopuerperal(NORONHA,1990,p.40).

Critériosparaaconceituaçãolegaldoinfanticídio

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Existemtrêscritériosquesãoutilizadospelaslegislaçõesparaaconceituaçãolegaldoinfanticídio,demodoadistingui-lodeumhomicídiocomum.Sãoeles:a)CritérioPsicológico–descreveoinfanticídiotendoemvistaahonra,ouseja,

apráticadocrimesedáparaofimespecíficode“ocultardesonraprópria”.EraomodelodoCódigoPenalde1890.

b)CritérioFisiopsicológico–nestecasonãoélevadaemconsideraçãoahonoriscausa,mas sim a influência do estado puerperal. Este é o critério adotadopeloCódigoPenalemvigor.

c)CritérioMisto–levam-seemcontaomotivodehonraeoestadopuerperal.Há necessidade do concurso desses dois requisitos para que ocorrainfanticídio e não homicídio; a falta de qualquer um deles desnatura oinfanticídio.EstecritériofoioadotadopeloAnteprojetodeCódigoPenaldeNelsonHungriaem1963.

ObjetividadejurídicaTratando-sedecrimecontraavida,éavidadoneonatoounascente.

ConceitodeestadopuerperalO estado puerperal é um conjunto de fatores biológicos, físicos e

psicológicos que influenciam a parturiente, podendo causar-lhe alteraçõespsíquicas. No entanto, sua constatação e mesmo sua definição médica éconturbada.

SujeitoativoeconcursodeagentesOinfanticídioécrimepróprio,sópodendoserpraticadopelamãedavítima.

Questão relevante é aquela a respeito da tipificação adequada da condutadaquele que colabora na prática de um infanticídio. Deveria esse terceiroresponderporhomicídioouporinfanticídioemconcursodeagentes?

Sobre o tema existe controvérsia doutrinária, podendo-se referir trêsposições:a) Com base no disposto no art. 30, CP, afirmam alguns que responde o

colaborador por infanticídio porque as condições pessoais no caso (mãe eestadopuerperal)sãocomunicáveis.Nestalinhaencontram-se,porexemplo,MagalhãesNoronha,Mirabete,DamásioE.deJesus,CelsoDelmanto,PauloJosé da Costa Júnior, Roberto Lyra, Basileu Garcia, Romeu de AlmeidaSalles Júnior, Alberto Silva Franco etc. Esta também é a conclusão daConferência de Desembargadores do Rio de Janeiro de 1943. Na doutrina

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estrangeira, encontram-se afiliados a esse pensamento Carrara, Soler,Maggiore e Manzini, dentre outros. Como se vê, este é o entendimentopredominantesobreatemáticaabordada.

b)Outrosconsideramque,emboraelementaresdocrime,ascondiçõespessoaisdoinfanticídioseriam“personalíssimas”,afastando,porisso,aincidênciadaregradoart.30,CP,devendoocoautoroupartíciperesponderporhomicídio.Neste sentido manifestaram-se, por exemplo, Galdino Siqueira, AníbalBruno, Costa e Silva, João Mestieri, Heleno Fragoso e Nelson Hungria.Destaque-se, porém, com relação ao últimomencionado que veio a alterarseu entendimento nas últimas edições de sua obra, admitindo que ainterpretação pela configuração de homicídio para o colaborador nãoencontra sustentação no ordenamento jurídico penal brasileiro em face daclaradisposiçãodoart.30,CP.

c)Posiçãomista:paraalgunsautoresasituaçãoseriavariável;sehouvessecoau-toria o terceiro deveria responder por homicídio; se houvesse meraparticipação,deveriaresponderporinfanticídio.Nestesentidomanifestam-seBentodeFaria,EuclidesCustódiodaSilveiraeFredericoMarques.

SujeitopassivoÉonascenteouneonato.Valemaqui asobservações feitas com relaçãoao

homicídio. O que importa é que nasça com vida (não interessa se é viável,saudável,normal,anormal,monstruosoetc.).

TipoobjetivoA conduta típica é “matar” e pode ser realizada por qualquermeio idôneo

(CrimedeFormaLivre).Podeserpraticadoporaçãoouomissão.Sendoosujeitopassivonatimortotratar-se-ádecrimeimpossívelnosestritos

termosdoart.17,CP.Sãoelementosdocrime:

a)aprópriamãemataofilho;b)influênciadoestadopuerperal;c)elementotemporal:duranteopartooulogoapós.

Com relação a esse elemento temporal há certa controvérsia sobre o prazodurante o qual se configura infanticídio e não homicídio. O Código Penal de1890estabeleciaumprazomáximode7diasapósopartoparaseconsideraramãe sob influência do estadopuerperal.Os autores divergem; alguns apontam

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esseprazododireitoantecedente;outrosassinalam8dias.Naverdade,comoaleinãofixaprazo,ficaráaoprudentearbítriodojuizaanálisedocasoconcreto.

TiposubjetivoO elemento subjetivo do infanticídio é o dolo, não havendo previsão de

formaculposa.Atualmenteodoloexigidoparaaconfiguraçãodotipopenaléodologenérico.Inobstanteafaltadeprevisãolegal,podeocorrerqueamãe,sobinfluênciadoestadopuerperal,provoqueamortedoprópriofilhorecém-nascidoporcondutaculposa.Nestecaso,anteainexistênciadeprevisãodotipoculposo,comoseriasolucionadaaquestão?

Sobreotemaadoutrinasedivide:Amaioriadosestudiososdizquesepoderesponsabilizaramãenesses

casos por homicídio culposo, porque embora sob influência do estadopuerperal, ela não deixa de ter responsabilidade penal. Neste sentido:Mirabete,MagalhãesNoronha,JoãoMestieri,AnibalBruno.Outros autores, emminoria, afirmamque se trata de fato atípico, não

respondendo a genitora por crime algum. Neste sentido: Damásio E. deJesusePauloJosédaCostaJúnior.

ConsumaçãoetentativaConsuma-se o crime com a morte do nascente ou neonato. É possível a

tentativa.

Algumasquestõescomplementaresa)Distinçãoentreo infanticídioeoaborto–diferemporqueoabortosópode

ocorrer antes do início do parto. Após este marco, ocorre homicídio ouinfanticídio,conformeocaso.

b)Distinçãoentre infanticídioeexposiçãoouabandonoderecém-nascidonoscasosemqueocorramortedavítima.

Seamãesimplesmenteexpõeouabandonarecém-nascido,paraocultardesonraprópria,estejaelaounãosoboefeitodoestadopuerperal,nãoresultandoamortenemsendoestaporelaalmejada,cometeapenasocrimedeExposiçãoouAbandonodeRecém-nascido(art.134,CP).Ocorrequealgumasvezesorecém-nascido abandonado morre ou sofre lesões graves. Se a mãe nãopretendia tais resultados e somente queria abandonar o filho para ocultardesonra própria, o crime é omesmo,mas desta feita qualificado (vide art.134,§§1ºe2º,CP).

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Noentanto,podehavercasosemqueaexposiçãoouabandonosejammeiosparaamorte,configurando-seinfanticídioouhomicídio.Vejamostrêsexemplos:

1ºcasoAmãeabandonaorecém-nascidosobefeitoounãodoestadopuerperal,paraocultardesonraprópria,elhesobrevémamorte.Trata-sedeinfraçãoaoart.134,§2º,CP(figurapreterdolosa).

2º caso A mãe, sob o efeito do estado puerperal, abandona o filho em localdeserto,objetivandoqueelemorradefrioefome.Amorteadvémdedoloeentãoocrimeédeinfanticídio.

3ºcasoAmãe, não sofrendo efeito do estado puerperal, abandona o filho emlocalermoparaquemorradefrioefome.Comamortedacriança,retiradoorequisitodoestadopuerperal,ter-se-áumcrimedehomicídio.

c) Agravantes genéricas – as agravantes genéricas previstas no art. 61, II, e(crime cometido contra descendente) e h (crime cometido contra criança),nãosãoaplicáveisaoinfanticídio,poisjáfazempartedadescriçãotípicadocrime(art.61,caput,CP).

d)Qual a solução se amãe, sob a influência do estado puerperal,mata outracriança,supondotratar-sedoprópriofilho?

Nestecasodeveresponderporinfanticídio,tendoemvistaoerrosobreapessoa(art.20,§3º,CP).

Outra questão interessante é o exemplo de Impallomeni mencionado porNoronha:

Ocorrendo um aborto espontâneo e sendo o feto inviável expulso mortoapóssuaexpulsão,ocorrecrime?A resposta é negativa. Não se trata de aborto porque o abortamento foiespontâneoeporqueofetofoimortoforadoútero.Poroutroladotambémnãoéinfanticídioporqueo“fetoabortado”nãoésujeitopassivodocrimedoart.123,CP(NORONHA,1990,p.47).

Observe-sequeoexemplodoautoritalianorefere-sea“abortoespontâneo”,não a “parto prematuro” ou “parto acelerado”. Nesses casos pode haverhomicídioouinfanticídio,conformeasituaçãoconcretaaseranalisada.

PenaeaçãopenalA pena prevista é de detenção de 2 a 6 anos. A ação penal é pública

incondicionada e de competência do Tribunal do Júri (Crime doloso contra avida–art.5º,XXXVIII,d,CF).

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Aborto(arts.124a128,CP)Conceito

Etimologicamente a palavra “aborto” deriva de ab + ortus, que tem osignificadode“privaçãodonascimento”.Algunsautoresdestacamqueapalavra“aborto”nãoseriaamaiscorretaparadesignaracondutadepraticaradestruiçãodo produto da concepção, preferindo a palavra “abortamento”, pois que o“aborto”serefeririasomenteaoprodutodainterrupçãodagravidez(MESTIERI,1970,p.166-167).

Dentre os diversos conceitos do crime de aborto encontráveis na doutrina,prefere-se aquele esposado por Paulo José da Costa Júnior, que afirma ser oaborto “a interrupção voluntária da gravidez, com a morte do produto daconcepção”(COSTAJÚNIOR,2010,p.265).Oautor,aoreferir-seao“produtodaconcepção”deformagenérica(ovo,embriãooufeto)eaofrisaranecessáriavoluntariedadedaconduta,emprestaaotermoumsentidomaisexatonoquedizrespeito à conceituação jurídico-criminal. Certos autores reduzem o objeto daação a umdos produtos da concepção (v.g. JoãoMestieri, que fazmenção ao“ovo”).Outrosolvidamo fatodequeo crimede aborto somente se configuraporaçãodolosa,voluntária,dirigidaparaofimespecíficodoabortamento(v.g.Mirabete,Damásio,AníbalBruno).

Observe-sequeoabortopodeserdevariadasespécies:a)Aborto espontâneo ou natural – quando ocorre por problemas de saúde da

gestante.b)Abortoacidental–quandoocorredevidoaalgumacidente,porexemplo,uma

quedadagestante,forteabaloemocionaletc.c)Abortoprovocado–quandooabortoéprovocadopelaprópriagestanteoupor

terceirointencionalmente.ChamandoaatençãoparaoconceitoexpostoporPauloJosédaCostaJúnior,

é interessante notar que o Aborto Espontâneo ou Natural não tem relevânciajurídico-criminal, de modo que seu interesse se restringe ao campo médico.Quanto ao Aborto Acidental, não tem qualquer relevância no que tange àcaracterização do crime de aborto. Eventualmente pode apresentar alguminteressenasearacriminalparaconfiguraçãodocrimedelesãocorporalculposa.Somente o Aborto Provocado (voluntário, intencionalmente perpetrado)apresentarelevânciaquantoaocrimedeaborto.

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ObjetividadejurídicaOcrimedeabortoapresentaduplaobjetividadejurídica.Emprimeiroplano

protegeavida intrauterinaeemsegundoplanoa integridadefísicaeavidadagestante.

SujeitoativoConsiderandoaexistênciadetrêsfigurascriminosasdeaborto(arts.124,125

e126,CP),deve-seteremcontaqueosujeitoativovariarádeacordocomotipopenalenfocado.Nocasoespecíficodoart.124,CP,trata-sedecrimepróprioquesópodeserpraticadopelagestante.Quantoaoscrimesprevistosnosarts.125e126,CP,qualquerpessoapodecometê-los,poisquesetratadecrimescomuns.

SujeitopassivoAdoutrinadivergequantoàqualidadedosujeitopassivodocrimedeaborto.

Alguns defendem a tese de que o produto da concepção não pode ser sujeitopassivodecrime,masmeroobjeto,demodoqueapenasoEstadoe,nocasodoabortoprovocadoporterceiro,agestante,seriamvítimas(v.g.MirabeteePauloJosé daCosta Júnior). Emoutra banda encontram-se aqueles que, emposiçãopredominante,afirmamqueoprodutodaconcepçãoésujeitopassivo,sendoquenoabortoprovocadoporterceirohaveriaduplasubjetividadepassiva:oprodutoda concepção e a gestante (v.g. Celso Delmanto, Romeu de Almeida SallesJúnior,DamásioEvangelistadeJesusetc.).

TiposubjetivoOcrimedeabortoédoloso,nãohavendoprevisãodefiguraculposa.Acasoa

mulher,culposamente,provoqueabortoemsimesma,ofatoserásimplesmenteatípico,pois,conformejáafirmado,inexisteabortoculposo.Agora,seterceiro,culposamente, causa aborto numa gestante, pode haver responsabilização pelocrime de lesões corporais culposas (art. 129, § 6º, CP). Acaso um terceiro,agindo culposamente, ocasionar o aborto numa gestante e dele resultar suamorte,responderátambémcriminalmente,masporcrimedehomicídioculposo(art.121,§3º,CP).

Questão tormentosa é aquela que aventa a possibilidade de tentativa desuicídioporpartedeumagestante.Poderiaelaresponderportentativadeabortoou,seaborta,porcrimedeabortoconsumado?Aorientaçãodadoutrinatemsidono sentido de que não é punível como tentativa de aborto o ato da mulhergrávida que tenta suicidar-se, isso por razões de política criminal semelhantes

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àquelas por que não se prevê um tipo penal para a tentativa de suicídio(MIRABETE,2011,p.96;COSTAJÚNIOR,1999,p.266).

Acaso a vontade do agente dirija-se não à eliminação do produto daconcepção, mas sim à antecipação do parto, não existirá crime de aborto porausênciadoelementosubjetivo.

TipoobjetivoOobjetomaterialdocrimedeabortoéoprodutodaconcepção(ovo,embrião

oufeto).Tem-se discutido bastante quanto ao marco inicial da vida intrauterina

tutelável pelo crime de aborto. Na doutrina há diversas indicações, entre asquais:fecundação(NelsonHungria);constituiçãodoovo(DamásioE.deJesus)eimplantaçãodoovonoúteromaternoounidação(HelenoFragoso).Aterceiracolocação parece ser a mais coerente e tem predominado no entendimentodoutrinárioejurisprudencial.

Outroaspectorelevanteéachamadagravidezextrauterinaoumolar,tambémconhecidacomogravidez“ectópica”,ouseja,aquelagravidezdesenvolvidaemlocaisestranhosaoútero.Nessescasosnãose tratadecrimedeaborto,poisainterrupçãodessesprocessosé terapêutica,nãosetratandodegravideznormal,mas de anomalias com perigo para a saúde da mulher e sem qualquerpossibilidadededesenvolvimento.

O aborto é crime de forma livre, de modo que qualquer ato idôneo àprovocaçãodoabortopodeserutilizado(meiosfísicos,químicos,psicológicos,orgânicos etc.). Se por acaso o meio empregado não for idôneo, como, porexemplo, um chá sem efeito abortivo ou rezas, despachos etc., tratar-se-á decrime impossível (art. 17,CP).Também semelhante caso de crime impossívelseráaqueleemquesejamefetuadasmanobrasabortivasemumamulherquenaverdadenãoestágrávida,havendoenganoousendoocasodachamadagravidezimaginária,gravidezfantasmaoupseudociese.Outrocasosimilarseráaqueleemquesejamrealizadasmanobrasabortivasemmulherefetivamentegrávida,masnaqualofetojáestavaanteriormentemorto.

Umexemplocuriosoquetemsidoventiladonadoutrinaéoseguinte:Um indivíduo inicia manobras abortivas em mulher grávida. O feto é

expulso, mas ainda vivo. Então o indivíduo o recolhe e esmaga. Neste casoocorreuumcrimedeabortoconsumado.Amortedofetopodedar-sedentrooufora do útero, o que importa é que a ação visava a eliminação da vida

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intrauterina.O aborto pode ainda ser perpetrado por omissão. Por exemplo, se a

enfermeiraouomédicoseomitemdeevitaroaborto,tendoodeverjurídicodeagirem.

Lembre-se,porém,queosimplesanúnciodemeioabortivonãoconfiguraapráticadeabortooutentativadeaborto,massimacontravençãopenalprevistanoart.20,LCP.

ConsumaçãoetentativaConsuma-seoabortocomainterrupçãodagravidezeamortedofeto,sendo

desnecessáriaaexistênciadeexpulsão.Atentativaépossível,ensejandoalgunsquestionamentos:

Quandoumamulhertentaoaborto,masofetonascevivoeviávelevemaperecerposteriormenteemconsequênciadasmanobrasabortivas,oabortotrans-muda-se de tentado para consumado, pois que a morte foi consequência dasmanobrasabortivas,nãohavendoquebradonexocausal.Noentanto,seofetovemanascervivoeviável,mesmocomasmanobrasabortivas,eperecedepois,não em consequência destas, mas por causa independente, restará apenas atentativadeaborto,jáquenestecasoonexocausalfoidesfeito.Finalmentecabemencionarocasoemqueofeto,mesmocomasmanobrasabortivas,nascevivoeviáveledepoisdehaverdefinitivamentesobrevividovemasermorto.Nestasituaçãoocorreráocrimedehomicídioouinfanticídio,conformeocaso.

Autoabortoouabortoconsentido(art.124,CP)Oart.124,CP,podeserdivididoemduaspartes.Aprimeirapartedescreveo

chamado “Autoaborto” (“provocar aborto em si mesma”). Trata-se de crimepróprio,sópodendoserpraticadopelagestante.Asegundapartedoart.124,CP,refere-seaochamado“AbortoConsentido”,emqueagestanteéincriminadapor“consentirqueoutremlhoprovoque”.Tambémsetratadecrimepróprio,quesótemcomosujeitoativoamulhergrávida.Nestecaso,agestanteéapenadanoart.124, CP, segunda parte, pelo consentimento, e aquele que provoca o aborto(terceiro) responde nos termos do art. 126, CP, com pena mais grave, porprovocarabortocomoconsentimentodagestante.

Emborasendocrimepróprio,podeocorreroconcursodeagentesnoart.124,CP,desdequenamodalidadede“participação”.Porexemplo,seumindivíduoparticipadoaborto,prestandoauxílioquenãointegraacondutatípicadapráticadoaborto,v.g. induzindoagestanteaoautoaborto, fornecendo-lhematerial,ou

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induzindo-a a concordar que terceiro lhe provoque o aborto. Em todos estescasostalpessoaresponderáemconcursodeagentesnoart.124,CP.Noentanto,sepratica atosde “provocação”doaborto (ex.: auxilianasmanobras,ministrasubstânciasabortivasetc.),respondepeloart.126,CP.

Seria de se questionar a hipótese em que havendo apenas participação deterceiro(ex.: induzindoavítimaaoautoaborto),cominfração,portanto,aoart.124,CP,emconcurso,comoficariaocasoderesultaremlesõesgravesoumortedagestante?Aperguntaadquireimportânciaemfacedodispostonoart.127,CP,que prevê aumentos de pena consideráveis quando tais resultados acontecem.Ocorre que nesta situação o art. 127, CP, seria inaplicável porque constaexpressamente de sua redação que só pode ser aplicado aos casos de abortoprovocadoporterceiro(arts.125e126,CP).Algunsautoressugeremsomentearesponsabilização pelo art. 124, CP, enquanto outros ainda aduzem apossibilidade de responsabilização em concurso formal pelos crimes dehomicídio culposo ou lesão corporal culposa. A nosso ver o primeiroentendimento parece ser o mais escorreito, pois que a responsabilização porcrimeculpososeriapraticamente insustentável, configurando responsabilizaçãocriminalpor condutadeoutrem.Nocasoagestanteque se submeteapráticasabortivasseautocolocaemrisco,nãopodendoopartícipeserresponsabilizadoporissoatítulodehomicídiooulesãocorporalculposa.

Diferenteseráocasoemqueumpartícipeconvençaagestanteapermitirqueoutremlheprovoqueoaborto.Seduranteaspráticasabortivasamulhervemamorrer ou sofrer lesões graves, haverá campo para aplicação das causas deaumentodepenaprevistasnoart.127,CP,poisqueoautordoaborto,incidentenoart.126,CP,estásujeitoaestas.Comrelaçãoaomeropartícipe,asituaçãoseráamesmaacimamencionada.

Outrahipóteseaventadanadoutrinaéadequenoautoabortopodeagestanteagirporautoriamediata,utilizando-sedeuminimputávelouinduzindoalguémaerro.ÉexemplodeAníbalBrunoagestantequesimulaumabortoespontâneo,levandoomédicoaprovocarumabortorealdeboa-fé,quandojulgavaeliminarosrestosdosupostoabortoduranteprocedimentodecuretagem(BRUNO,1966,p.165-166).

Abortoprovocadoporterceiro(arts.125e126,CP)Oabortoprovocadopor terceiro englobaos casosdos arts. 125 e126,CP,

apenas diferindo os tipos penais pela ausência ou não do consentimento dagestante. Este consentimento tem de ser válido e espontâneo. O próprio

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parágrafoúnicodoart.126,CP,desconsideraoconsentimento,aplicandooart.125,CP,nosseguintescasos:gestantemenorde14anos;gestantealienadaoudébilmental; e consentimento viciado por fraude, violência ou grave ameaça.Ademais o consentimento deve ser ininterrupto, permanecendo do começo aofim da conduta. Se durante o ato a gestante muda de ideia e se opõe,prosseguindooagentemesmoassim,incidenoart.125,CP.Nãoobstante,seoagente supõe erradamente que existe o consentimento, responde pelo art. 126,CP, e não pelo art. 125, CP, tendo em vista operar-se no caso erro de tipo,conformeprevistonoart.20,CP.

Abortomajorado(art.127,CP)Oart.127,CP,contémaschamadas“formasmajoradaspeloresultado”.Os

resultadosqueaumentamapenanocrimedeabortosãoalesãograve(aumentodeum terço)ouamorte (penaduplicada)dagestante.Esses resultadosdevemdecorrer de culpa, e não de dolo do agente, pois os crimes de aborto comaumento de pena pelas lesões graves oumorte da gestante são preterdolosos.Dessaformaoagentedevepretenderapenasprovocaroaborto,sendofatoqueamorteoulesãogravenãosãoporeledesejadas,decorrendodecondutaculposa.

Podeocorrerqueoagentenãoconsigaprovocaroabortopretendido,masagestante sofra lesõesgravesoumorra.Asoluçãopreconizadapelamaiorpartedos autores tem sido a responsabilização por “tentativa de aborto qualificado”(por todos MIRABETE, 2011, p. 98). No entanto, difere desse entendimentoFernandoCapez, o qual afirma que seria o caso de reconhecimento do abortoqualificadoconsumado,devendo-sedarmaiorconsideraçãoaobemjurídicovidaou integridade física da gestante.Ademais, o reconhecimento da “tentativa deaborto qualificado” corresponderia a permitir a ocorrência de tentativa de umcrimepreterdoloso,oquenãoseriaadmissível(CAPEZ,2010,p.122).

Quanto às lesões leves que sejam sofridas como meio normal para aconsecução do aborto, serão elas absorvidas. Segundo Magalhães Noronha eMirabete, mesmo as lesões graves podem excepcionalmente ser absorvidas,desde que comprovado que elas foram necessárias (meio) para a prática doaborto,sendo“normais”nessetipodeintervenção,como,porexemplo,aslesõesnoútero(NORONHA,1990,p.58;MIRABETE,2011,p.98).

Finalmente,éimportanteressaltarqueosaumentosdepenaprevistosnoart.127,CP,somentesãoaplicadosaoscasosdeabortoprovocadoporterceiro(arts.125e126,CP),jamaisaoscasosprevistosnoart.124,CP(AutoabortoeAbortoConsentido).

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Abortolegal(art.128,IeII,CP)O Código Penal Brasileiro, ao criminalizar o aborto, não o fez de forma

absoluta, prevendo em seu art. 128 casos em que ele é legalmente permitido.Esses abortos legais, no entanto, somente podem ser praticados por médico.Note-se,porém,que,emboraadicçãolegalaparentetratardecausasdeexclusãode punibilidade, na verdade são causas de exclusão de ilicitude, ou seja, noscasos de abortos legais, não há mesmo crime, a conduta é lícita e nãoantijurídica.

São apenas dois os casos de abortos legais previstos pela legislaçãobrasileira:1ºcasoAbortonecessárioouterapêutico–ocorrequandooabortoéoúnico

meiodesalvaravidadagestante,assemelhando-seaumcasodeestadodenecessidade. Nesses casos nem mesmo é preciso o consentimento dagestante,preponderandoatuteladavidadamulheremconflitocomavidado produto da concepção. Trata-se de uma situação-limite em que olegisladorviu-seobrigadoaoptarentredoisbensjurídicoscujasrespectivaspreservações implicariam a destruição do outro. Assim sendo, optoucorretamentepelavidadamulher.

Podeacontecerqueumabortonecessáriosejapraticadoporumapessoaquenãoseja médica, uma enfermeira ou qualquer pessoa em uma situação deemergência em que não era possível recorrer a um médico. Nesse caso,embora o art. 128, CP, restrinja sua aplicação aos médicos, também nãohaverácrime.Noentanto,talnãosedariaporinfluênciadoart.128,I,CP,senãopeloart.24,CP,configurando-seestadodenecessidade.

Nãoestandoavidadagestanteemperigo,massomentesuasaúde,omédiconãoestará autorizado a praticar o aborto terapêutico, pois que o dispositivosomentemencionaoaborto legalnoscasosemqueelesejaoúnicomeiopara“salvaravidadagestante”.

Inexistindocrime,aquelequeauxiliaomédiconapráticadoabortonecessáriotambémnãopodeserresponsabilizadopelocrimedeaborto.

2ºcasoAborto sentimental, humanitário ou ético – trata-se do aborto legalquandoagravidezresultadeestupro.Adoutrina temjustificadoestecasode aborto legal porque a mulher não pode ser obrigada, sob pena deviolação de sua dignidade humana e saúde psíquica, a levar adiantegravidezresultantedecoitoviolento.

Paraapráticadoabortosentimentalnãohánecessidadedeordemjudicialprévia

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nem que haja Inquérito Policial ou processo em andamento ou decidido,bastandoqueomédico tenhaelementos sériosparacrernaveracidadedaocorrênciadoestupro.Seomédicopraticaoabortocrendonaocorrênciadeestupro que na verdade não ocorreu, fica isento por erro de tipo (art. 20,CP).

A lei menciona somente a gravidez resultante de “estupro” (art. 213, CP).Entretanto, vinha reconhecendo a jurisprudência analogia em bonampartem para permitir o aborto legal em casos de gravidez resultante de“atentadoviolentoaopudor”(antigoart.214,CP).Noentanto,estaúnicaexceçãoreconhecidaagoradeixadeterimportância,vezquecomoadventodaLein.12.015/2009passaramtantoosatosdeconjunçãocarnalcomodeoutros atos libidinosos diversos a constituírem o crime de estupro,revogando-se o art. 214,CP, e todas as condutas sendo agrupadas no art.213,CP, sob onomen juris unificado de “estupro”.Nos demais casos decrimescontraaliberdadesexualemqueresultegravidez,nãosepermiteapráticadoabortosentimental.Jánoscasosde“estuprodevulnerável”(art.217-A,CP), outrora casosde estupro comviolênciapresumida (revogadoart.224,CP),pode-seaplicarnormalmenteaexcludente,umavezquealeinãofazdistinçãoentreviolênciarealoupresumida.

Noscasosdeabortosentimental,diferentementedoqueacontececomoabortonecessário, acaso uma pessoa que não seja médica o provoque, haveráresponsabilização criminal por aborto, não sendo possível aplicar aexcludente do art. 128, II, CP e muito menos o estado de necessidadeprevistonoart.24,CP.

Para os casos de aborto ético, há absoluta necessidade do consentimento dagestanteou, quando incapaz, de seu representante legal.Seomédico agesemesseconsentimentonecessário,cometeocrime.

OutrasmodalidadesdeabortomencionadasnadoutrinaOsdois casosvistos no itemanterior sãoosúnicos previstos na legislação

brasileiracomolegaisatéomomento.Adoutrinaarrolaoutroscasosdeabortos,dando-lhes nomenclaturas específicas, mas deve-se frisar que nenhum deles éexpressamente previsto na lei penal como caso de aborto legal. Vejamos osprincipais:

a)AbortoeugênicooueugenésicoSeria aquele aborto praticado devido à previsão de anomalias graves que

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acometeriam a criança. Tem-se discutido o fato desse tipo de aborto não serconsiderado legal em casos extremos como hidrocefalia, anencefalia,deformação ou malformações muito graves etc. Casos estes em que onascimento,emtese,somentetrariasofrimentosàcriançaeaospais.

Assim,tendoemconsideraçãoestafacetahumanitáriadoabortoeugênico,háimportantes juristasemsuadefesaedecisões judiciais autorizando suaprática,sendooidealsuaprevisãoelimitaçãocuidadosanotextodoCódigoPenal.Nãoobstante, na atualidade, inexiste sua previsão como aborto legal na legislaçãobrasileira.

A maior discussão acerca do aborto eugênico no momento versa sobre aquestãoda anencefalia, tendo emvista inclusive a alegaçãode inexistência debemjurídicoasertuteladonestescasos,considerandoadeterminaçãodamortetendocomomarcoacessaçãodaatividadecerebral.Alémdisso,advoga-sesuaequiparaçãocomoscasosdeabortosentimental(art.128,II,CP),considerandoanecessidadedetuteladadignidadedapessoahumana,afetadapelosofrimentoimpostoaospaisdurantetodaagestaçãodeumacriançaabsolutamenteinviável(amatériaéobjetodediscussãonoSTF).

b)AbortoeconômicoousocialTrata-sedecasosemqueagestantepraticaoabortodevidoacondiçõesde

pobrezaoupenúria,nãosendotambémadmitidopelalegislaçãoerespondendoaautora pelo crime. Pode, eventualmente, aplicar-se neste caso a atenuanteinominadaprevistanoart.66,CP.

c)Aborto“honoriscausa”Seria aquele praticado para “ocultar desonra própria”, mas também não é

previstoemnossoCódigoPenal.Tambémeventualmentepoderiaseraplicadoodispostonoart.66,CP.

d)AbortoestéticoRefere-seàpráticadoabortopelamulher,visandotãosomenteapreservação

daintegridadeestéticadeseucorpo,abelezafísicaquepoderiaserafetadapelagravidez.Efetivamentetrata-sedeabortocriminoso,sequersedevendofalaremeventualatenuante,aindaqueinominada.

CompetênciaeaçãopenalOcrimedeabortoéjulgadopeloTribunaldoJúri(CF,art.5º,XXXVIII),ea

açãopenalépúblicaincondicionada.

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LesõesCorporais(art.129,CP)Conceito

Mirabeteconceituaocrimedelesãocorporaldaseguinteforma:

Odelitodelesãocorporalpodeserconceituadocomoaofensaàintegridadecorporalouàsaúde,ouseja,odanoocasionadoànormalidadefuncionaldocorpo humano, quer do ponto de vista anatômico, quer do ponto de vistafisiológicooumental(MIRABETE,2011,p.103).

A relevância desse conceito de lesão corporal está no fato de que se deveatentar para que ela não se reduza apenas à lesão física, materialmenteconstatável, mas abrange também o dano ao normal funcionamento doorganismo(fisiológico)etambémaodanopsíquico(mental).

ObjetividadejurídicaObemjurídicotuteladopelocrimedelesõescorporaiséaintegridadefísica

epsíquicadoserhumano.

SujeitoativoTrata-sedecrimecomum,podendo serpraticadoporqualquerpessoa.Não

obstante, é importante notar que a lesão corporal criminosa é somente aquelaocasionadaemoutrem.A“autolesão”nãoconstituicrimepelasmesmasrazõesdepolíticacriminalpelasquaisnãosepunea tentativadesuicídio.Entretanto,hácasosemqueautolesõesconstituemcrimes:Ex.1O indivíduocortaumdedodaprópriamão,simulandoumacidentepara

receberindenizaçãodeseguro.Caracteriza-seocrimedoart.171,§2º,V,CP(Fraudepararecebimentodeindenizaçãoouvalordeseguro).

Ex.2Indivíduoqueseautomutilaparaesquivar-sedoserviçomilitar(art.184doCódigoPenalMilitar).

Podemocorreraindacasosemqueumapessoaseautolesiona,sugestionadapor outra que a usa como um verdadeiro instrumento. Por exemplo, se umindivíduo(insano,embriagado,menorsemcompreensãoetc.)seautolesionaporinfluência de outro, este que influenciou aquele que não tinha discernimentorespondepelocrimedelesõescorporais.

SujeitopassivoQualquerpessoa.

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TipoobjetivoO verbo núcleo é “ofender”. Tal ofensa pode ser perpetrada por qualquer

meioidôneo,poisquesetratadecrimedeformalivre.OCódigoPenal de 1890previa a necessidade de ocorrência de dor para a

caracterizaçãodocrimedelesõescorporais.Hojenãoexistetalexigêncianotipopenal, de modo que basta que haja a lesão corporal, independente demanifestação de dor. Note-se, porém, que se houver dor e não houver lesãoprovocada por uma agressão, não se configurará o crime de lesões corporais,massimacontravençãopenaldeviasdefato(art.21,LCP).

Ocortedecabelo,barbaouunhascomausênciadoconsentimentodavítimatem provocado dissidência doutrinária. Alguns autores (v.g. Aníbal Bruno eHelenoFragoso)defendemtratar-sedecrimedelesõescorporais.Noentanto,aposiçãopredominanteemaisacertadaseriaaquelaquereconhecenestescasosaocorrênciadeinjúriareal(art.140,§2º,CP),contravençãodeviasdefato(art.21,LCP)oucrimedeconstrangimentoilegal(art.146,CP).

Nocasodeagressãoaumamesmapessoafrequentementeocorremdiversaslesõescorporais.Nestescasosnãohaverávárioscrimesdelesõescorporais,masapenasum,ouseja,apluralidadedelesõesnummesmocontextoecontraumamesma vítima não ocasiona pluralidade de crimes.Mas, se há pluralidade devítimas (ex.: indivíduo que agride e lesiona as vítimas A, B e C), ocorre,obviamente, pluralidade de crimes. O mesmo se pode dizer se uma mesmapessoa é agredida várias vezes, sofrendo lesões diversas em ocasiões distintas(ex.:oautoragrideavítimahojeedepoisnovamenteaagridenooutrodiaounomesmodia,masemoutrocontexto).

Comojávisto,nãosomenteorompimentodetecidoscorpóreosconfiguraocrimedelesõescorporais;odanoàsaúdeemgeraltambémélesãocorporal.Sãoexemplos:transmissãovoluntáriadequalquermoléstia;provocaçãodedistúrbiosfisiológicos como vômitos, desmaios, insônia etc.; dano mental como choquenervoso,convulsões,insanidademental,neuroses,psicosesetc.

Nãosomenteaprovocaçãodeumalesãocorporalemumindivíduoíntegroconfigurao crime,mas tambémo agravamentodeuma lesão já existente.Porexemplo:umindivíduoquequebraobraçodavítimaquejáestavaanteriormentelesionadoporumaluxação.

Sendoumcrimede forma livre, as lesões corporais podemser perpetradaspor violência física (socos, chutes, golpes, pauladas, facadas etc.); violênciamoral(sustos,ameaças,pressõespsicológicasetc.).Tambémpodeserpraticada

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por omissão (ex.: mãe que deixa de alimentar o filho, causando lesão à suasaúde).Finalmente,éaindapossívelapráticadocrimedelesõescorporaispor“açãoindireta”,ouseja,utilizaçãodearmadilhasouanimaisferozes.

TiposubjetivoAslesõescorporaisexistemnaformadolosaouculposa.Naslesõesdolosas

ocorre a vontade de produzir dano ao corpo ou à saúde de outrem (animuslaedendiouanimusnocendi).

Em alguns casos, embora presentes o elemento subjetivo e a condutaobjetiva,ocrimedelesõescorporaisnãoseconfigura.Sãoexemplos:a)Lesõesnos esportes– se as lesões fazemparte do contato físico normal da

prática esportiva (ex.: futebol, basquete, boxe etc.), são atípicas, pois sãoconsideradas socialmente adequadas (Teoria da Adequação Social – HansWelzel), configurando um risco permitido na vida social (Teoria daImputaçãoObjetiva–ClausRoxin).Éclaroque,seaslesõesextrapolampordemais as regras existentes para a prática esportiva, configura-senormalmenteocrime.Porexemplo,umabrigaentrejogadoresdefutebolemcampo.

b) Intervenções cirúrgicas – também neste caso não há crime, embora sejamcausadaslesõesnopaciente.Algunsautoresjustificamporhaver“exercícioregular de direito”; outros afirmam que não há crime devido aoconsentimento da vítima. Dessas duas posições parece mais aceitável aprimeira,poisqueoconsentimentodavítima,alémdeserirrelevantenestescasos (a integridade física é bem jurídico indisponível), nem sempre estápresente no caso concreto, pois, às vezes,mesmo sem o consentimento davítima a cirurgia pode ser realizada para salvar sua vida (ex.: vítimadesacordada). Outras motivações podem ainda ser aduzidas justificando anão incriminação: emprimeiro lugaromédicoque atuanumacirurgianãotem o dolo necessário para a configuração do crime de lesões corporais(animuslaedendiouanimusnocendi).Dir-se-áqueelecortaapeledavítimavoluntariamenteeissoéinduvidoso,masnaverdadesuaintençãoaoatuaréexatamente oposta ao dolo de lesão corporal; ele não atua visando causardano ao paciente, mas sim tendo emmira a cura, a melhora da saúde dodoente(animuscurandi).Issodescaracterizaafigurasupostamentecriminosapor ausência do elemento subjetivo, tornando o fato atípico. Também asTeorias da Adequação Social (conduta socialmente adequada) e daImputação Objetiva (Risco Permitido) têm ampla aplicação no caso. A

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medicina é uma atividade não somente socialmente adequada e admitida,mas também indispensável para a sociedade, demodo que não somente épermitida, mas até incentivada (atipicidade conglobante). Ademais, naprópria Teoria da Imputação Objetiva, são isentas as condutas que sãodirigidas à diminuição de um risco ou a evitar um dano maior ao bemjurídico,oquecertamenteocorrenoscasosdeintervençõescirúrgicas.

ConsumaçãoetentativaO crime de lesões corporais se consuma com a efetiva lesão à integridade

físicaoupsíquicadavítima.Atentativaépossível.

Lesõescorporaisleves(art.129,caput,CP)Acaracterizaçãodaslesõeslevesédadaporexclusão,ouseja,senãoforo

casode lesõesgraves,gravíssimasouseguidasdemorte, terãoocorrido lesõescorporaisleves(art.129,caput,CP).

A açãopenal nos casos de lesões corporais leves é pública condicionada arepresentaçãonos termosdo art. 88daLei n. 9.099/95.Tambémoprocesso ejulgamentocabemaosJuizadosEspeciaisCriminaisnostermosdoart.61daLein.9.099/95,porqueapenamáximanãoultrapassadoisanos.

Lesõescorporaisgraves(art.129,§1º,IaIV,CP)Noscasosdelesõesgravesapenaémaior(reclusão,de1a5anos),demodo

queinclusivenãosetratadeinfraçãopenaldemenorpotencialofensivoeaaçãopenal é pública incondicionada.Os resultadosmais graves das lesões levam àmaiorresponsabilidadedaconduta.Taisresultadospodemadvirdeformadolosaoupreterdolosa,dependendodocaso.Analisemoscadaumdeles:I–Incapacidadeparaocupaçõeshabituaispormaisde30dias

Esta figura pode ocorrer de forma dolosa ou preterdolosa. A incapacidadeparaocupaçõeshabituaisnãoseconfundecoma incapacidadeparao trabalho.Essas atividades habituais podem referir-se a atividades não econômicas,podendo ser atingidas pessoas que sequer fazem parte da populaçãoeconomicamenteativa(ex.:crianças,débeismentais,idososetc.).

Oprazode 30dias a ser ultrapassadopara a caracterizaçãoda lesãogravenão se refere ao tempo de recuperação da lesão, mas sim à incapacitação davítima,ouseja,nãoconfiguralesãograveofatodequedeterminadalesãonãosecure num prazo superior a 30 dias, desde que o ofendido continue realizandosuasatividadeshabituais.

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A incapacitação deve ser objetiva, a vítima não deve poder praticar suasatividades habituais pormais de 30 dias devido a um impedimento real e nãomeramentesubjetivo.Porexemplo,nãosecaracterizaalesãogravequandoumapessoa deixa de sair à rua por mais de 30 dias por simples sentimento devergonhaouhumilhaçãodevidoàagressãosofrida.

Nestes casos de lesões graves normalmente amaterialidade é comprovadapor um exame inicial e outro complementar nos termos do art. 168, CPP.Especificamentenocasodelesõesgravesporincapacidadepormaisde30dias,oexamedeveserrealizadologodepoisdo30ºdiaparaumacorretaaferição.Nafaltadolaudocomplementarocrimeédesclassificadoparalesõesleves.

São recorrentes na doutrina duas indagações, apresentando-se respostashomogêneas:a)Considerandoqueaatividadehabitualqueavítimafique impossibilitadade

realizarsejailegal,subsisteocrimedelesõesgraves?Porexemplo,jogodobicho,exercícioilegaldamedicina,tráficodedrogasetc.

Seésomenteaatividadeilegalqueficaprejudicadaenãooutras,nãosubsisteocrimedelesõesgraves,operando-seadesclassificaçãoparalesõesleves.Se,entretanto,outrasatividadesnormaisficamprejudicadas,ocrimesubsistenaformagrave.

b)Eseaatividadeélegal,masimoral?Ex.:prostituição.Cabe o reconhecimento das lesões corporais graves. A atividade não é ilícita,

emboraimoral.Note-sequecomrelaçãoaestetópicoháposiçãoisoladadeFredericoMarques,dizendoqueseaatividadeprejudicadaéimoral,nãoháaplicaçãodaslesõesgraves,poisoDireitonãopoderiadefenderatosimorais(apudMIRABETE,2011,p.110).

II–PerigodevidaAprimeiraobservaçãoimportantenestecasoéqueessamodalidadedelesão

gravesópodeseradmitidadeformapreterdolosa.Obviamente,naformadolosahaveria,emverdade,tentativadehomicídio.

Operigoexigidodeveserconcreto.InclusiveoLaudodoIMLnestescasosdeve ser bem fundamentadopeloperito, nãobastando apenasdizer quehouveperigodevida,masapontaremqueconsistiuesseperigo.III–Debilidadepermanentedemembro,sentidooufunção

Esta figura pode ser praticada tanto na forma dolosa como preterdolosa.Serãolesõesquecausamuma“reduçãodacapacidadefuncional”.

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Podematingir:a)membros–braçosepernas;b)sentidos–visão,audição,olfato, paladar e tato; c) função – atividades que são desenvolvidas por umconjunto de órgãos (exs.: respiratória, circulatória, digestiva, locomotora,reprodutora,mastigatóriaetc.).

Sãoexemplosdelesõesdessaespécie:perdadeórgãoduplo(ex.:umolho);perdadeumdedooupartedeumdedo;enrijecimentodamãooudosdedos(obs.Seamãoéamputada,a lesãoégravíssima–art.129,§2º, III, inutilizaçãodemembro);perdadentária(atacaafunçãomastigatóriae/oudigestiva).

Nestescasosnão importaqueadebilidadepossa seratenuadapormeiodousodepróteses.IV–Aceleraçãodeparto

Tambémpossívelnasformasdolosaoupreterdolosa.Ocorrequandoalesãolevaàantecipaçãodoparto.Nestecasoocorreumpartoprematuroeonascidosobrevive;seocorreraborto,hálesãogravíssima(art.129,§2º,V,CP).

Acaso o sujeito ativo desconheça a gravidez da vítima, não pode serresponsabilizadopelalesãograve,poisseexigeaomenoscondutaculposaparapossibilitarsuaresponsabilização(art.19,CP).

Senumcasoconcretoocorreraaceleraçãodoparto,sendoqueinicialmenteacriança sobrevive, mas depois vem amorrer, a situação não se altera. Houvelesãograveporaceleraçãodoparto,poisqueaconteceuumpartoprematuro,enãoumaborto.Adefiniçãoquanto à ocorrência departo prematuroou abortoficabasicamenteadstritaàprovapericialmédico-legal.

Lesõescorporaisgravíssimas(art.129,§2º,IaV,CP)Anomenclatura “lesões corporais gravíssimas” não é prevista peloCódigo

Penal,massimpeladoutrina.Osincisosdoart.129,§2º,descrevemresultadosainda mais danosos à vítima do que aqueles previstos no § 1º. Assim areprimendapenaléaindamaior(reclusãode2a8anos),tambémnãosetratandode infrações penais demenor potencial ofensivo e sendo a ação penal públicaincondicionada.Vejamoscasoacaso:I–Incapacidadepermanenteparaotrabalho

Oelementosubjetivodesteincisopodeserodoloouopreterdolo.Nestecasoa lei não se refere à incapacidade para ocupações habituais, mas sim àincapacidadeparao trabalho,aqual tambémnãopodeser transitória,massim“permanente”.

É interessante notar que, segundo a doutrina, a incapacidade deve ser para

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qualquer trabalho, enão especificamentepara a atividade exercidapelavítima(v.g.CelsoDelmanto,DamásioE.deJesus,AníbalBrunoetc.).

Tratando o inciso da incapacidade permanente para o trabalho, verifica-seque se tem emmira a atividade de caráter econômico, excluindo-se, portanto,segundoadoutrina,comovítimas,acriançaeoancião,quenãopodemdedicar-seaotrabalho.

Outro tema de relevo diz respeito ao requisito da permanência da lesãomencionado no tipo penal. O legislador estaria se referindo efetivamente àpermanênciaoupretenderiacomessapalavrareferir-seàperpetuidade?

Magalhães Noronha apresenta uma passagem bastante esclarecedora sobreessaquestão:

Falaodispositivoempermanênciadaincapacidade.Vimosquenãosignificaperpetuidade. Os escritores argentinos, Soler, Molinário e Gómez,comentandooCódigodesuapátria,queprevêamesmaagravante,entendemqueaincapacidadedeveserparatodaavida.BentodeFariatambémassimpensa,citando,aliás,velhojulgadodoSupremoTribunalFederal.Emsentidocontráriopronuncia-seHungriae,anossovercomrazão.Bastaoprognósticoda impossibilidade de trabalhar por tempo que não se possa avaliar, ounoutras palavras, por período que não se pode fixar o limite (NORONHA,1990,p.71).

II–EnfermidadeincurávelTambém possível nas formas dolosa ou preterdolosa. Enfermidade é

sinônimodemoléstiaoudoençanaleipenal,dizendo-seincurávelaqueladoençaque, de acordo como atual estágio de desenvolvimento damedicina, não temcuraintegral,aindaquesejatratávelecontrolável.III–Perdaouinutilizaçãodemembro,sentidooufunção

Possível a prática nas formas dolosa ou preterdolosa. Na perda ocorre amutilação (causada por violência) ou amputação (causada por cirurgia). Nainutilização,omembroouórgão, emborapermaneça ligadoaocorpo,não temmaiscapacidadefuncional,ouseja,derealizaraatividadenormalaqueéafeto.Porexemplo,amãoquenãoémaiscapazdeapreenderetc.

Aperdadeumdedodamãoéapenasdebilidadepermanente,enãoperdademembro(lesãocorporalgrave,enãogravíssima).Jáaamputaçãooumutilaçãodeumbraçoconfiguraperdademembro,assimcomoaamputaçãooumutilaçãodetodaamãoconfigurainutilizaçãodemembro.

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Lesãoquecauseimpotênciagenerandi (reprodutiva)oucoeundi (demantercoito)paraambosos sexoségravíssimaporperdada função reprodutorae/ousexual.

Magalhães Noronha e Mirabete (NORONHA, 1990, p. 71; MIRABETE,2011,p.113)citamoexemplodequealesãovenhaaatingirohímencomsuaperda.Obviamente,nãosetratadelesãograveougravíssima,poisqueestenãoédotadodequalquerfunçãoorgânica.Noentanto,alesãoqueacarreteaperdado clitóris na mulher pode configurar lesão corporal de natureza grave pordebilidadedafunçãosexual.

Jáaablaçãodeórgãossexuaisemtransexualécontroversanajurisprudência,havendo decisões no sentido da não configuração e em contrário. Entretanto,tratando-se de casos excepcionais e em face da anuência da suposta vítima,certamente o caminho do bom-senso leva a aceitar tais cirurgias como nãocriminosas(RT545/355eJTacrim/SP61/256).IV–Deformidadepermanente

Adeformidadepermanentepode serpraticadapeloagentede formadolosaou preterdolosa. Deformidade será considerada toda lesão que acarrete umprejuízo estético à vítima. Essa deformidade, para configurar o tipo emdiscussão,devesatisfazercertosrequisitos:

Deve ser permanente e visível, no entanto pode ser em qualquer parte docorpo, não somente no rosto. A deformidade deve causar uma impressãodesagradável ou vexatória para a vítima. Voltando à questão da permanência,deve-se teremmentequenãobastaqueodanoestéticosejavisíveledecertovulto; há absoluta necessidade de que o dano estético seja “permanente”, nãosendopossívelsuarecuperaçãonaturaloupormeiodaartemédicaordinária.

Nãoimportaqueavítimapossadisfarçaradeformidadecomartifícioscomoperucas, cremes, maquiagens, roupas com gola alta ou manga comprida etc.Tambémnãoimportaqueadeformidadepossaserreparadaporcirurgiaplástica,nãoestandoavítimaobrigadaasubmeter-seaessetipodeintervenção.Quantoaisso, porém, uma observação deve ser feita: a doutrina e a jurisprudência têmreconhecidoquenocasodadeformidadeavítimanãoestáobrigadaasubmeter-seacirurgiaplástica,demodoqueamerapossibilidadede reparaçãododanoestéticonãodesconfiguraaqualificadora.Entretanto,seavítimaefetivamentesesubmete a cirurgia plástica, revertendo o dano estético, as lesões seriamdesclassificadas para leves (neste sentido: Mirabete, Damásio E. de Jesus,AníbalBrunoetc.).

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Algumas vezes essa lesão estética pode apresentar-se juntamente comumalesãofuncional.Porexemplo,sedevidoàlesãooindivíduopassaasermancodeumapernaouficacomproblemanacolunavertebral,apresentando-secorcundaoutorto,ouaindase,devidoaumaqueimaduraemumolho,ficacegodaquelavista e com uma terrível cicatriz. A questão é a seguinte: em casos que taisdeveriaprevaleceradebilidadepermanenteprevistanoincisoIIIdo§1º(lesãograve)ousecaracterizariaalesãogravíssimado§2º,incisoIV?

Havendo dano estético, prevaleceria a lesão gravíssima de deformidadepermanentequeabsorveameralesãograve.

Noronhaobservaquenadeformidadedevemserlevadosemcontaaspectossociais,etáriosesexuais,aduzindoqueadeformidadedeumgilvaznafacedeumadonzelanãosepodecompararaumacicatriznopeitodeumestivadoroumesmo no rosto de um ancião jámarcado pelas rugas (NORONHA, 1990, p.72).

A deformidade permanente é estabelecida por meio de exame pericialmédico-legal,noqualseverificaráseelanãoéreparávelnaturalmenteoupelaaplicação ordinária da arte médica ou curativa. A jurisprudência tem semanifestado no sentido da necessidade de haver ilustração por meio defotografiasnoslaudosqueversemsobredeformidadepermanente,possibilitandoaojulgador(noprimeiroesegundograus)aaferiçãopessoaldodanoestético.V–Aborto

Trata-se do denominado “Aborto Preterintencional”. O agente quer apenascausarlesõescorporais,masfazcomqueavítimaaborte.Certamentenestecasoocrimesópodesercometidopormeiodepreterdolo.Acasooagentepretendalesionaramulherecausar-lhetambémoaborto,deveráresponderpelocrimedeabortoemconcursocomlesõescorporais.

Quando o autor não sabe da gravidez não pode ser responsabilizado peloabortoe,portanto,afasta-sealesãogravíssimaporessemotivo(art.19,CP).

Sendoumcrimepreterdoloso,nãocabetentativadessaformaqualificada.Seo agente queria provocar o aborto e não consegue, responde por esse crime(aborto)nasuaformatentada,masjamaisporestaslesõescorporaisgravíssimas.

Lesãocorporalseguidademorte(art.129,§3º,CP)Aslesõescorporaisseguidasdemortetêmrecebidodadoutrinaoepítetode

“Homicídio Preterdoloso” ou “Homicídio Preterintencional”. Para suaconfiguração, o agente deve pretender somente lesionar a vítima, mas o

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resultadomorteocorre independentementedesuavontade.Seosujeito lesionaalguémparamatar,responderáporhomicídioconsumadooutentado,conformeocaso.

São exemplos de lesão corporal seguida de morte na jurisprudência:empurrão com queda da vítima e traumatismo crânio-encefálico; soco com omesmo resultado; pauladas na cabeça; facadas na perna que seccionam artériaetc.

Ocrimedelesõescorporaisseguidasdemortenãoexistenaformatentada,poisquetalfatoconfigurariatentativadehomicídio.

Lesãocorporalprivilegiada(art.129,§4º,CP)Valem aqui os comentários já expostos com relação ao homicídio

privilegiado,sendoaredaçãodosdispositivosidêntica.

Casosdesubstituiçãodepena(art.129,§5º,CP)Somenteemcasosdelesõesleveso juizpodesubstituirapenadedetenção

pormultaemdoiscasos:sealesãoéprivilegiada(art.129,§4º)ouseaslesõessãorecíprocas.

Paraaconfiguraçãodelesõesrecíprocasénecessárioqueseestejadiantededoisagressoresqueatuamdemaneirainjustificada.Acasoumdoscontendoresseja absolvidopor legítimadefesa, o outro não fará jus à substituição, pois aslesõesprovocadaspeloprimeiroforamlegais.Paraaaplicaçãodoart.129,§5º,II,CP,seránecessárioqueambososenvolvidossejamcondenados.

Aindanocasode lesões recíprocas, seduranteoprocessonãoseconseguedeterminar quem deu início às agressões ou se foram concomitantes, odispositivonãopodeseraplicado.EssasituaçãoexigeoempregodoPrincípiodo “Favor Rei”, devendo ambos os contendores ser absolvidos, pois que umdelespodeteratuadoemlegítimadefesa,demodoqueindubioproreo.

Lesãocorporalculposa(art.129,§6º,CP)Trata-sedoscasosemquealesãocorporalécausadaporcondutainformada

por imprudência,negligênciaou imperícia.Nestescasosnãohádistinçãoentrelesõesleves,gravesougravíssimas,sendofatoquesempreatipificaçãorecairáno§6ºdoart.129,CP,semcorrespondênciacomos§§1ºou2º.Malgradoisso,haverádistinçãonadosimetriadapenanosmoldesdoart.59,CP,considerandoasconsequênciasdocrime.Assimsendo,cabeobservarquemesmonoscasosdelesões corporais culposas será importante apurar a gravidade das lesões,

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encaminhandoavítimaaexamecomplementar,senecessário.Aaçãopenalnoscasosdelesõescorporaisculposasépúblicacondicionadaa

representaçãonostermosdoart.88daLein.9.099/95.ComoadventodoCTBpassaramaexistirnoordenamentojurídicopenalbrasileirodoiscrimesdelesõescorporaisculposas,talqualocorrecomohomicídioculposo:aprevisãodoart.129,§6º,CP,abrangendotodososcasosdeformaresidual;eaprevisãodoart.303,CTB,comaplicaçãoexclusivaparaosacidentesdetrânsitoviárioemqueoautordocrimeestejanadireçãodeveículoautomotor.Emsuaformasimples,odispositivodoCTBtambéméinfraçãodemenorpotencialofensivo(art.61daLein.9.099/95)eaaçãopenalépúblicacondicionadaàrepresentação(art.88daLein.9.099/95c/cart.291,caput,CTB).

Operdão judicial, já estudadonos casos de homicídio culposo, é aplicáveltambém às lesões corporais culposas de acordo com o art. 129, § 8º, CP, queremete ao § 5º do art. 121, CP.Neste tema remetemo-nos aos comentários jádespendidos sobre o homicídio culposo, inclusive quanto à sua aplicabilidadeaoscasosdelesõesculposasnotrânsito.

Tambémsãoextensíveisàs lesõescorporaisculposasascausasdeaumentodepena,conformedispõeo§7ºdoart.129,CP,remetendoaoart.121,§4º,CP,inclusivesendodolosaalesão,nocasodesuapráticacontrapessoamenorde14anosemaiorde60anos.JánoscasosdelesõescorporaisculposasdoCTB(art.303,CTB),tambémascausasdeaumentodepenasãotratadasnaquelediplomadeformaespecífica(verparágrafosúnicosdosarts.303e302,CTB).

ViolênciadomésticaUmanovamodalidadedecrimequalificadodelesãocorporaléprevistano§

9ºdoart.129,CP.Trata-sedocasoemquealesãocorporal(leve)sejapraticadaemsituaçãodeviolênciadoméstica.Note-sequeessaqualificadoraseráaplicadasomentenoscasosde lesões leves,poisseas lesõesforemgraves,gravíssimasouseguidasdemortehaverátipificaçãoespecíficanos§§1º,2ºou3º,dopróprioart.129,CP.

Aqualificadoraenfocadaexigeespecialcondiçãodosujeitoativoedosujeitopassivo (crime bipróprio), consistente em certa relação parental ou afetiva, jáque deve ser praticada “contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge oucompanheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda,prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou dehospitalidade”.

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Apenaprevistaédedetenção,de3mesesa3anos,estabelecidaconformealteração promovida pela Lei n. 11.340/2006 (art. 44). Portanto, essa infraçãopenaldeixoudeserconsideradademenorpotencialofensivo.Emboraareferidaalteração tenha sido promovida pela chamada “Lei Maria da Penha” (Lei n.11.340/2006),quetratadaviolênciadomésticaefamiliarcontraamulher,deve-seatentarparaofatodequeoart.129,§9º,CP,podetercomosujeitopassivotantohomenscomomulheres.Aúnicadiferença seráadeque, acasoavítimasejamulher,poderãoseraplicadososinstitutoseonovosistemaprotetivodaLein.11.340/2006.

Além disso, quando a vítima da violência doméstica formulher discute-sesobre a natureza da açãopenal nas lesões leves. Isso porque, embora aLei n.9.099/95,emseuart.88,estabeleçaaaçãopenalcomopúblicacondicionada,aLein.11.340/2006determinaemseuart.41avedaçãodaaplicaçãodaLein.9.099/95 para os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher.Surgemduascorrentesdoutrináriasacercadotema:unsdefendematesedequeoart.88daLein.9.099/95continuapodendoseraplicado,mesmoaoscasosdeviolênciadomésticacontraamulher;outrosafirmamque,comavedaçãolegalacima mencionada, a ação passou a ser pública condicionada. O tema écontroverso,eoSTJjádecidiu,emvotaçãonãounânimeeapertada(3a2),emsededeHabeasCorpus(HC96.992/DF–rel.Min.JaneSilva,12-8-2008),queaaçãoseriapúblicaincondicionada.

Também o STF julgou procedentes aADI 4.424 da Procuradoria-Geral daRepública e a ADC 19 para declarar a constitucionalidade da Lei Maria daPenha e estabelecer que a ação penal nas lesões leves em casos de violênciadomésticaefamiliarcontraamulherépúblicaincondicionada.

Porseuturno,o§10doart.129,CP,prevêumanovacausadeaumentodepena, para os casos de lesões graves, gravíssimas e seguidas de morte, casoocorramascircunstânciaselencadasno§9º.Oaumentoprevistoédaordemdeumterço.Então,seocorrerviolênciadomésticaeaslesõesforemleves,ocrimeseráqualificadonostermosdo§9º.Jásehouverviolênciadomésticaeaslesõesforemgraves,gravíssimasouseguidasdemorte,incidiráumacausadeaumentodepenasobreospreceitossecundáriosdos§§1º,2ºe3ºdoart.129,CP.

Finalmente, o § 11prevêuma causade aumentodepenapara os casosdeviolência doméstica com lesões leves (§ 9º), também da ordem de um terço,quando “o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência”. Essacausadeaumentonão incidenoscasosdos§§1º,2ºe3º,massomenteparaapenado§9º.

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PerigodeContágioVenéreo(art.130,CP)Conceito

Pode-seconceituarocrimecomooatodeexporoutrem,por intermédiodeatos libidinosos (conjunção carnal ou outros atos libidinosos), ao perigo decontágio de doença venérea, sabendo ou devendo saber o agente que estácontaminado.

ObjetividadejurídicaObemjurídicotuteladoéasaúdedoserhumano.

SujeitoativoPodeserqualquerpessoa,homemoumulher, tratando-sedecrimecomum.

Também pode responder pelo crime o cônjuge, desde que exponha o(a)companheiro(a) ao perigo de contágio. Nestes casos haverá ainda a agravantegenéricaprevistanoart.61,II,e,CP.Aspessoasquesededicamàprostituiçãotambém podem ser sujeitos ativos desse crime. É claro que o agente deveráefetivamente estar contaminado quando praticar o ato capaz de ocasionar operigodecontágio.Casocontrário,tratar-se-ádecrimeimpossível(art.17,CP).

SujeitopassivoQualquerpessoapodesersujeitopassivodocrimedeperigodecontágiode

moléstiavenérea,inclusiveaquelasdedicadasàprostituição.

TipoobjetivoOart.130,CP,descreveumcrimedeformavinculada,poisqueoperigode

transmissão da doença venérea deve dar-se por meio de “relações sexuais”,abrangendo a conjunção carnal ou quaisquer outros atos libidinosos. Acaso ocontágio se dê por outras formas que não o contato sexual, descaracterizadoestará o crime em estudo, podendo, dependendo do caso, configurarem-seinfrações aos arts. 131ou132,CP.É inviável o cometimentodessedelitoporomissão.

AtransmissãodaAIDSnãoconfigurainfraçãoaoart.130,CP,poisquetalmoléstianãoéumaespéciededoençavenérea.Ademais,sendoaAIDSdoençaletal, omelhor enquadramento encontra-se na tentativa de homicídio (art. 121c/c14,II,CP).

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LembraMonteiro deBarros a possibilidade de contágio venéreo nutriz, ouseja, aquele que ocorre durante a amamentação, seja por parte da ama ou dacriança.Comoaleinãoprevêtipoespecíficoparaessasituaçãoeoart.130,CP,édeformavinculada,exigindoqueocontágioseprocessepormeiode“relaçõessexuais”, a tipificaçãopoderá recairnoart. 129,CP,ou art. 131,CP (havendodolo de dano), ou art. 132,CP (havendo dolo de perigo) (BARROS, 1997, p.115).

Discute-senadoutrinaacercadanaturezadaexpressão“moléstiavenérea”.Paraalgunsoart.130,CP,seriauma“normapenalembranco”(v.g.MagalhãesNoronha, Ney Moura Teles, Cezar Roberto Bitencourt, José HenriquePierangeli),demodoqueaexpressãosobreditadeveriasercomplementadaporRegulamento do Departamento Nacional de Saúde Pública (Decreto n.16.300/1923).Poressedecreto seriamdoençasvenéreasa sífilis, ablenorragia(“blenorreia”ou“gonorreia”)eocancromole.Outrosafirmamnãosetratardecaso de norma penal em branco. Na realidade seria a expressão enfocada umelementonormativodotipo,devendoseusignificadoeabrangênciaseraferidoem cada caso concreto pelo juiz, com o auxílio da perícia médico-legal, quedeveria indicar quando se trata de uma doença venérea ou não (v.g. FlávioAugustoMonteirodeBarros,FernandoCapez,DamásioE.deJesuseAdilsonMehmeri).Omelhorentendimentoérealmenteestesegundo,poisquepossibilitauma “interpretação progressiva” da normapenal que está diretamente ligada aum conceito médico dinâmico que pode constantemente alterar-se com aevoluçãodamedicina.Deoutraformaaleitornar-se-iapordemaisinflexível,esua adaptação à evolução da sociedade no seu aspecto científico (médico,especificamente)seriamuitolenta.

ConsumaçãoetentativaAconsumaçãosedácomaefetivaexposiçãodavítimaaperigodecontágio

dedoençavenéreapormeiodeatolibidinoso.Nãoénecessáriaacontaminação,bastandoameraexposiçãoaperigodecontágio,demodoqueacontaminaçãoserá considerada exaurimento do crime. Isso não impedirá que em caso decontaminaçãoessaconsequênciadocrimesejalevadaemconsideraçãopelojuiznomomentodefixaçãodapena-base,nostermosdoart.59,CP.

Atentativaépossível,poissetratadecrimeplurissubsistente.Érecorrentenadoutrina o exemplo do sujeito contaminado com blenorragia que tentamanterrelação sexual com uma garota, mas é surpreendido e impedido pelo pai davítima. No entanto, no caso da modalidade culposa também prevista no tipo

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penal,quandomencionaamodalidadedeperigoemqueoagente“devesaber”estarcontaminado,nãoéviávelafiguratentada.Issoporqueinexistetentativadecrimeculposo.

Questão intrincada é aquela de solucionar o conflito de normas quandoocorre efetivamente o contágio.Amelhor solução é apresentada porMirabete(MIRABETE,2011,p.125):

Quando o agente não pretendia transmitir a moléstia, mesmo com acontaminação,deveprevalecernoconflitoaparentedenormasoart.130,CP,desde que as lesões sejam culposas ou, mesmo em caso de dolo natransmissão,sendolevesaslesões,poisnestescasosotipopenaldoart.130e seu § 1º, CP, tem pena mais elevada. Agora, quando o agente agetransmitindo dolosamente a doença e resultam lesões corporais graves ougravíssimas,devemprevalecerosdispositivosdoart.129,§§1ºe2º,CP,emface do princípio da subsidiariedade, já que as lesões graves e gravíssimastêm pena bemmais elevada. Em caso de suceder amorte da vítima, se atransmissão foi simplesmente culposa, deverá o agente responder porHomicídio Culposo (art. 121, § 3º, CP). Se, por acaso, a transmissão foidolosa, havendo dolo de dano, deverá o agente responder por lesõescorporaisseguidasdemorte(art.129,§3º,CP).

Sendoo sujeitopassivopessoa imuneou já contaminada, inexisteo crime,configurando-setentativainidônea(art.17,CP).

TiposubjetivoO tipo penal em estudo descreve trêsmodalidades de conduta, sendo duas

delasnocaputeumanoseu§1º,asquaisdiferemquantoaoelementosubjetivodotipo.Vejamoscadaumadelas:a)Aexposiçãodealguém,pormeioderelaçõessexuais,acontágiodedoença

venéreaquandooagentesabequeestácontaminado(art.130,caput,CP).b)Aexposiçãodealguém,pormeioderelaçõessexuais,acontágiodedoença

venéreaquandooagentedevesaberqueestácontaminado(art.130,caput,CP).

c) A intenção deliberada de manter relações sexuais com alguém, sabendo-secontaminado,coma intençãodeprovocara transmissãodadoençavenérea(art.130,§1º,CP).Quandooautordocrimesabedacontaminaçãohádolodireto.Nestecasoé

precisoqueoagentetenhacertezasobresuacontaminação,oquenãooimpede

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demanterarelaçãosexual,ocasionandodolosamenteoperigodecontágio.Quantoà figuraque fazmençãoà situaçãoemqueoagentedevesaber de

seu contágio há discussão na doutrina. Para alguns (v.g.Magalhães Noronha,Mirabete,NelsonHungria,HelenoFragoso,BentodeFaria,FredericoMarques,EuclidesCustódiodaSilveira,DamásioE.deJesuseFlávioAugustoMonteirodeBarros) trata-se de conduta informadapelaculpa. Para outros (v.g. Costa eSilva)aexpressãodevesaberseriaindicativadedoloeventual.Temprevalecidooprimeiroentendimento,comacríticadequeolegisladoracabouequiparandoas condutas dolosa e culposa, pois que se o agente agir comdolo eventual ouculpaseráigualmentepunidocombasenocaputdoart.130,CP.

No § 1º o agente tem o dolo direto de transmitir amoléstia. Ele não quersimplesmente causar o perigo, mas ostenta dolo de dano, razão pela qual areprimendapenalémaissevera (reclusãode1a4anos).Note-seque,emboracapitulada dentre os crimes de perigo, essa figura é conformadora do dolo dedano. O crime é formal, bastando a conduta com a intenção de ocasionar ocontágio. Operando-se efetivamente o contágio, haverá mero exaurimento docrime (como se verá abaixo, as lesões leves serão absorvidas, e as graves,gravíssimasouamorteconfigurarãotipopenalespecífico).ComobemobservaMonteirodeBarros,“opreceitoemanálisenãopassadeumatentativadelesãocorporal que o legislador erigiu à categoria de crime autônomo” (BARROS,1997,p.119).

Mirabeteapresentacaso interessantedeerrode tipopossíveldeocorreremcasosdeperigodecontágiodemoléstiavenérea:seoagentequeexpõeoutremaoperigodecontágionãotemrazõesplausíveisparadesconfiardesuaprópriacontaminação, como no caso do homem casado e fiel que acabou sendocontaminadopelaprópriaesposapromíscua,decujacondutanãotinhaciência.Tal homem não poderá ser responsabilizado, a não ser no caso em que ossintomasdamoléstiasejamevidentes(art.20,CP)(MIRABETE,2011,p.124).Outro exemplo de erro de tipo que exclui o crime é aquele do agente que sesupunha curado da doença venérea por afirmação médica e mantém relaçõessexuais(BARROS,1997,p.120).

AçãopenalO§2ºdoart.130,CP,estabeleceexpressamentequeaaçãopenalépública

condicionadaarepresentaçãodoofendido.Frise-seque,emboraavítimahavendoconsentidonapráticasexualcienteda

contaminação do agente, isso não a impedirá de exercer seu direito de

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representação,poisqueasaúdeébemjurídicoindisponível.

PerigodeContágiodeMoléstiaGrave(art.131,CP)Conceito

Trata-sedacondutadepraticaratocapazdeocasionarocontágiodeoutremcommoléstiagravedequeseestácontaminado.

ObjetividadejurídicaProtegeotipopenalasaúdedaspessoas.

SujeitoativoOsujeitoativopodeserqualquerpessoa,desdequeestejacontaminadacom

algumamoléstiagrave.Dessaforma,seoagentecrêestarcontaminadoquandonaverdadenãoestá,configurar-se-ácrimeimpossível(art.17,CP).Omesmosepodedizerseavítimajáestácontaminadaouéimuneàquelaenfermidade.

SujeitopassivoQualquerpessoa.

TipoobjetivoA conduta delituosa é descrita como a prática de ato capaz de produzir o

contágio de doença grave e transmissível. São elementares do crime: a) que oagenteestejacontaminadocomdoençagraveecontagiosa;b)apráticadeatoshábeisaproduziroperigodecontágio.

Como diz a lei, a moléstia há que ser grave. Dessa forma são afastadasenfermidades de pequena monta como uma simples gripe, um resfriado etc.Somenteaperíciamédico-legalpoderáprecisarcomsegurançaquandose tratademoléstia graveounão.Certamente trata-se de elemento normativodo tipo,devendo ser a expressãomoléstia grave analisada pelo julgador de posse dosinformesmédicosdisponíveis.Nãosãoobviamenteabrangidaspelotipodoençasdesumagravidadequenãosãotransmissíveis,como,porexemplo,ocâncer,odiabetesetc.Nessescasos,comosepoderiafalarem“perigodecontágio”?

Como já visto, no caso das moléstias venéreas, que são doenças degravidade, não se configurao tipopenal emapreço,mas simcrimeespecífico

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previstonoart.130,CP.Somenteseconfiguraráoart.131,CP,mesmoemcasodedoençasvenéreas,seestasforemtransmitidaspormeioquenãosejarelaçãosexual.

EmboraaAIDSsejaindubitavelmenteumamoléstiagrave,quandooagentepretendecontaminaralguémnãoincidenoart.131,CP,masdeveresponderportentativadehomicídioouhomicídioconsumadoquandoavítimavemamorrer.

Diversamentedoart.130,CP,otipopenaloraemestudoécrimedeformalivre,admitindoosmaisvariadosmeiosexecutórios.Somentenãoservirãoparaconfiguraçãoosmeiosquesejamabsolutamenteinidôneos(art.17,CP).Ocrimepodeaindaserpraticadoporomissãoquando,porexemplo,amãecontaminadanadafazparaevitarqueofilhoseaproxime,tendocontatofísicoconsigocomofimdeprovocarocontágio.

TiposubjetivoOelemento subjetivodo tipoéodolo.Odoloé específico,poisnãobasta

queoagentequeirapraticarumatocapazdeproduzirocontágio,maséprecisoque ele queira praticar tal ato com o fim de provocar o contágio. Não existefigura culposa.No entanto, emcasode transmissão culposa, de acordo comoresultado,poderáconfigurar-selesãocorporalculposaouhomicídioculposo.

Entende-sequequandooagenteatuacomdoloeventual,ouseja,praticaoato não querendo o contágio, mas assumindo o risco de provocá-lo, não secaracterizaestecrime,paraoqualseriaexigidoodolodireto.Subsidiariamenteaplicar-se-ia ao caso o crime de lesão corporal (art. 129, CP), possível de serperpetradopormeiodedoloeventual(BARROS,1997,p.127).

ConsumaçãoetentativaTrata-se de crime formal. Assim sua consumação independe do efetivo

contágio, bastando a prática de ato idôneo a ocasionar o perigo.Aqui exsurgeoutra característica do tipo penal em comento. Ele é um crime de perigo,inobstante para sua configuração exija um dolo direto de dano. Trocando emmiúdos, o agente deve pretender provocar a transmissão damoléstia grave deque é portador. No entanto, essa efetiva transmissão não é exigida para aconsumaçãodocrimequeéformaledeperigo.Bindingdenominaessaespéciededelitode“crimesderesultadocortado”,nosquais“oagentepraticaacondutapara alcançar um fim específico, mas cuja ocorrência não é exigida para aconsumação” (apud BARROS, 1997, p. 124). Eventual contágio configurarámero exaurimento do crime, o qual somente poderá ser levado em conta pelo

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juizparaadosimetriadapena-base,nostermosdoart.59,CP.Note-se que Mirabete afirma que, mesmo ocorrendo lesões graves ou

gravíssimas, prevalecerá o delito enfocado (art. 131, CP), pois que é normaespecialemrelaçãoaelas.Afinalfazpartedesuadescriçãotípicaagravidadedaenfermidadetransmitida.Apenasnocasodemorteprevaleceráocrimedelesãocorporal seguida de morte (art. 129, § 3º, CP) ou homicídio (art. 121, CP)quandooautoragiuvisandomataravítima(MIRABETE,2011,p.127).

No entanto, esse entendimento não é o que prevalece doutrinariamente. Amaioriadosautoresaponta,nocasodelesõesgraves,aresponsabilizaçãopeloscrimesprevistosnoart.129,§§1ºe2º,CP.QuantoaocasodemortenãodivergeMirabete da doutrina dominante. Razão assiste à corrente doutrináriapredominante, eis que os crimes de perigo são subsidiários, somenteprevalecendoemfacedecrimesdemenorgravidade.Atentativaéadmissível.

AçãopenalAaçãopenalépúblicaincondicionada.

PerigoparaaVidaouSaúdedeOutrem(art.132,CP)Conceito

Ocrimedeperigoparaavidaousaúdedeoutrempodeserconceituadocomoa exposição da vida ou da saúde de outra pessoa a perigo direto ou iminente.Apresenta caráter subsidiário expresso quando em seu preceito secundário olegisladorfazconstarqueotipopenalemestudosomenteéaplicado“seofatonãoconstituicrimemaisgrave”.

ObjetividadejurídicaTutelam-secomodispositivosobcomentoavidaeasaúdedaspessoas.

SujeitoativoTrata-sedecrimecomumquepodesercometidoporqualquerpessoa.

SujeitopassivoTambém pode ser vítima desse crime qualquer pessoa. Há, porém,

necessidadedequea(s)vítima(s)seja(m)determinada(s).Seacriaçãoderisco

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abrangepessoasindeterminadas,configurar-se-áalgumcrimedeperigocomumprevistonoart.250eseguintesdoCP.

TipoobjetivoAcondutaincriminadaconsisteemcriarporqualquermodoumasituaçãode

risco para a vida ou a saúde de outrem. O crime estudado é considerado deperigoconcreto,devendorestarcomprovadoofatodequeavidaouasaúdedealguémdeterminadofoiarriscadapelaatuaçãodoagente.Operigocriadodeveser também iminente, de modo que seu risco possa concretizar-se em efetivalesãologoemseguida.Dessaformaoperigoremotonãoserveparaconfigurarotipopenal.

Éclaroqueos riscoscriadosparaavidaou saúdedevemser contráriosàsnormas culturais e sociais. Há atividades que são arriscadas,mas que contamcomaautorização legal para sua realização, bem como,muitas vezes, são atémesmoincentivadas.Nessescasos,emboraseja inerenteàquelaatividadelícitacertorisco,nãohaverácrimeemsuaexecução.Sãoexemplos:otrânsitoviárioobedecendo às normas; a prática médica; atividades industriais arriscadas; apráticadaaviaçãoetc.Logicamentetodasessasatividades,paranãoconstituíremo crime, devem ser realizadas dentro das balizas normativas que asregulamentam,deformaanãoextrapolarograuderiscopermitidosocialmente.

Estecrimeadmite tambémacondutaomissiva,desdequeoagente tenhaodeverjurídicodeimpediroresultadonostermosdoart.13,§2º,CP.

A jurisprudência tem dissentido quanto à solução para os casos em que secria perigo contra várias pessoas determinadas. Há decisões afirmando apluralidade de crimes em concurso formal, mas há também posicionamentosalegando a ocorrência de crime único. Tratando-se de crime que exige adeterminaçãodavítimaeperigoconcreto,parecemais corretooentendimentode configuração de pluralidade de crimes em concurso formal ou mesmo oreconhecimento da continuidade delitiva (neste sentido: Flávio AugustoMonteiro de Barros e Cezar Roberto Bitencourt. Em sentido contrário: JulioFabbriniMirabete).

TiposubjetivoOelementosubjetivoéodolo.Essedolodeveserdeperigo,ouseja,oagente

deve pretender criar perigo ao bem jurídico (vida ou saúde). Acaso o autorpretenda atingir efetivamente os referidos bens jurídicos, apresentando entãodolo de dano, o crime será outro: tentativa de homicídio ou de lesão corporal

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respectivamente.O crime emdestaque é de subsidiariedade expressa, como jávisto.Épossívelapráticadacondutacomdoloeventual.

Não há previsão de forma culposa. Se o agente, por meio de condutainformadapelaculpa,ocasionaperigoparaavidaouasaúdedeoutrem,poderáconfigurar-se alguma contravenção penal (v.g. arts. 31 e 36, LCP). Agora, sedessacondutaarriscadaculposaderivarumeventolesivo,oautorresponderáporlesão corporal culposa ou homicídio culposo de acordo com o resultadoocorrido.Note-sequesomenteresponderáporlesãocorporalculposasetratar-sede infração do Código de Trânsito Brasileiro (art. 303, CTB) ou de lesãocorporalculposaqualificadadoCódigoPenal(art.129,§7º,CP),quetêmpenamaiselevadaqueoart.132,CP.NocasodelesõescorporaisculposassimplesdoCP(art.129,§6º,CP),prevaleceráocrimedeperigo(art.132,CP),vezquetempenamaiselevadaesuasubsidiariedadesomenteatuaquandoemconfrontocomcrimemaisgrave.Tambémnocasodeoagenteatuarcomdolodeperigo,masacabar ocorrendo um resultado lesivo, deverá responder pelos crimes dehomicídio culposo ou lesão corporal culposa de acordo como acima exposto,pois certamente caracterizar-se-á a imprudência em seu agir (PIERANGELI,2005, p. 158; BITENCOURT, 2009, p. 251-252; NORONHA, 1990, p. 85;COSTAJUNIOR,2010,p.278).

ConsumaçãoetentativaO crime se consuma com a prática do ato constitutivo do perigo e com a

ocorrência concreta de risco para a saúde ou a vida de alguém.A tentativa épossível,tratando-sedecrimeplurissubsistente.

AumentodepenaALein.9.777/98acrescentouemumparágrafoúnicoumacausaespecialde

aumento de pena variável de um sexto a um terço no crime do art. 132, CP,quando “a exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo decorre dotransporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimentos dequalquernatureza,emdesacordocomasnormaslegais”.

Aprincipalmotivaçãodolegisladorcertamentefoiotransporte irregulardetrabalhadoresruraiscomumenteconhecidoscomo“boias-frias”,emborapossamtipificaracondutaoutrassituaçõessimilares.Quandoaleimencionaotransporte“emdesacordocomasnormaslegais”,introduzumelementonormativodotipo,de maneira que seu complemento deverá ser buscado na legislação queregulamentaotransportecoletivoouindividualdepessoas,qualseja,oCódigo

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deTrânsitoBrasileiro.Anote-sequenãobastaráparaaconfiguraçãododelitoamera infração às normas administrativas sobreditas, fazendo-se necessáriocomprovar o perigo concreto ocasionado para a integridade ou a vida daspessoastransportadas.

Érelevantedestacarofatodequeotransporteirregulardeveser“depessoasparaprestaçãodeserviçosemestabelecimentosdequalquernatureza”.Portanto,seotransportenãoéparaessefimespecífico,descaracteriza-seotipoagravado.Eventualmente, o transporte irregular com outros fins (por exemplo, lazer,carona etc.), desde que ocasione perigo concreto para o transportado, poderátipificarocrimesimples(art.132,caput).Nãohavendoaconfirmaçãodeperigoconcreto,constituirámerainfraçãoadministrativadetrânsito.

AçãopenalAaçãopenalépúblicaincondicionada.

AbandonodeIncapaz(art.133,CP)Conceito

Ocrimedeabandonode incapazconsistenacondutadeabandonaralguémincapaz de enfrentar os perigos resultantes do abandono, que esteja sob ocuidado,guarda,vigilânciaouautoridadedoautordodelito.

ObjetividadejurídicaSãoprotegidaspelotipopenalavidaeasaúdedaspessoasmaisdébeis,as

quaisnecessitamdoscuidadosdeterceiros.

SujeitoativoTrata-sedecrimepróprio,poisquesópodesercometidoporaquelequetem

o dever de cuidar da vítima. Sem isso, o crime cometido pode transmudar-separaomissãodesocorro(art.135,CP).

SujeitopassivoSãoexigidasduasqualidadesdosujeitopassivo:

a)Quesejaincapazdeenfrentarascondiçõesdoabandono.b)Quetenhacomosujeitoativoumarelaçãodeassistênciaoudependência.

O recém-nascidopode ser sujeitopassivodestecrime,eoquediferenciaa

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conduta do art. 134, CP (Abandono de Recém-nascido), é o dolo específicoprevistonaqueletipopenalde“ocultardesonraprópria”.

TipoobjetivoO verbo do tipo penal é “abandonar”, tendo o significado de deixar ao

desamparo,semassistência, largado.Acondutapodeserintegradaporaçãoouomissão. O crime é de perigo concreto, de maneira que é necessária acomprovação de efetiva ocorrência de perigo para a vítima em virtude doabandono.

Hádebate doutrinário acerca da necessidadeounãode quehaja separaçãofísicaentreossujeitosativoepassivoparaaconfiguraçãodoabandono.Algunsautores defendem a tese de que o distanciamento é imprescindível para aconfiguraçãodocrimeemtestilha(v.g.Mirabete,NelsonHungria,DamásioE.de Jesus, Cezar Roberto Bitencourt, Paulo José da Costa Júnior, Romeu deAlmeida Salles Júnior e Frederico Marques). Outros alegam que não hánecessidade absoluta desse distanciamento para que ocorra o abandono (v.g.Flávio Augusto Monteiro de Barros, Heleno Fragoso e José HenriquePierangeli),bastandoqueoautordeixedeprestarassistênciaaoincapaz,emborapermaneçaemsuaproximidade.Emnossoentendimento,amelhororientaçãoéaquepugnapelanecessidadedoafastamentofísicoparaaconfiguraçãododelitoprevisto no art. 133, CP. Argumenta-se destacando que o tipo incrimina acondutadeabandonarapessoaincapaz,enãoaatitudedeabandonarodeverdeprestaçãodeassistência.Ademais,acrescenta-seque,nocasodeabandonodosdeveresdeprestaçãodeassistênciasemocorrespondenteafastamentofísico,nãohaveriaumvácuodetutelaemtodososcasos,poisquetaiscondutaspoderiamser tipificadas como abandono material (art. 244, CP) ou mesmo omissão desocorro (art. 135, CP). Não obstante, a tendência da doutrina mais moderna,inclusive estrangeira, tem sido o acolhimento majoritário da tese dadesnecessidadedeafastamentofísico,bastandoaocorrênciadoefetivoabandonodoscuidadosnecessáriosparacomavítima,ocasionando-lheperigoconcreto.

TiposubjetivoO elemento subjetivo é o dolo (dolo genérico). Não existe modalidade

culposa.

ConsumaçãoetentativaO crime se consuma com o abandono e a criação do risco para a vítima.

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Ensina Damásio que é irrelevante se o agente pratica o abandono e depois“reassumeodeverdeassistência”,desdequecomsuacondutaanteriorjátenhasubmetido a vítima a perigo concreto, pois neste caso já foi atingida aconsumaçãododelito(JESUS,2005,p.166;PIERANGELI,2005,p.163).Noentanto,nãohaveráocrimeseoagentedeixaavítima,masaficaobservandoeguardandodelongeatéquealguémarecolha,issoporquenestasituaçãonãoteráhavidocriaçãodeperigoconcreto.

Discute-searespeitodanaturezadessecrime,indagandoseseriapermanenteouinstantâneodeefeitospermanentes.Tendoemvistaqueaconsumaçãosedánumúnicoato(abandonoemsituaçãodeperigoconcreto)eoperigoseprotrainotempo,masindependedavontadedoagente,trata-se,segundoentendimentomajoritário,decrimeinstantâneodeefeitospermanentes.

Tratando-se de conduta comissiva é viável a figura tentada, segundo amaioriadadoutrina(v.g.Mirabete,PauloJosédaCostaJúnior,FernandoCapez).Emposiçãofrancamenteminoritáriaexisteaindaquemdefendaatesedequeatentativaseriapossível,inclusivenaformaomissiva(TELES,2004,p.273).

QualificadorasOcrimesequalifica,nostermosdoart.133,§§1ºe2º,CP,quandoocorrem

osresultadoslesãograveoumorte.Taisresultadosmaisgravososresultantesdoabandononãopodemadvirdedolodiretooueventualdoagente,demodoqueconfiguramsomentecondutaspreterdolosas.

CausasdeaumentodepenaO § 3º do art. 133, CP, prevê os casos de aumento de pena no crime de

abandono de incapaz. Esses aumentos serão aplicados tanto para os casos deabandonodeincapazsimplescomoqualificado.

Oscasossãoosseguintes:a)seoabandonoocorreremlugarermo;b)seoagenteéascendenteoudescendente,cônjuge,irmão,tutoroucuradordavítima;c)seavítimaémaiorde60anos.

Note-se que, nos casos expostos nas letras b e c, ficarão afastadas,respectivamente,asagravantesgenéricasprevistasnoart.61,II,eeh,CP.Suaaplicaçãoconfigurariabisinidem.

Comrelaçãoaoidoso(maiorde60anos),deve-serecordartambémdanormaespecialprevistanoart.98doEstatutodoIdoso(Lein.10.741/2003),desdequeoabandonosedêemhospitais,casasdesaúde,entidadesdelongapermanência

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ou congêneres, ou quando o autor não satisfizer “suas necessidades básicas,quandoobrigadoporleioumandado”.

AçãopenalPúblicaincondicionada.

ExposiçãoouAbandonodeRecém-nascido(art.134,CP)Conceito

Consistenaexposiçãoouabandonoderecém-nascido,comofimespecíficodeocultardesonraprópria.

Narealidade,oabandonoderecém-nascidonadamaisédoqueumaespécie“privilegiada e autônoma” em relação ao crime de abandono de incapaz(MIRABETE,2011,p.134).Suadistinçãoemrelaçãoaesteésomenteofatodequeosujeitopassivosomentepodeserumincapazespecial,qualseja,orecém-nascido, e ainda a necessidade de que haja um dolo específico de “ocultardesonraprópria”.Dessaforma,emsendoumrecém-nascidoabandonadoparaofim especial de ocultação de desonra própria, haverá incidência do crimeprevistonoart.134,CP.Nocasodeumrecém-nascidoabandonadoporoutrosmotivosquenão aocultaçãodedesonra, haveráo crimedo art. 133,CP,bemcomo nos casos de abandonos de outras espécies de incapazes, seja por quemotivofor(v.g.doentes,idososetc.).

ObjetividadejurídicaAobjetividadejurídicaéasegurançadorecém-nascido.

SujeitoativoTrata-se de crime próprio, pois que somente pode ser praticado pelos pais

(mãe ou pai) do recém-nascido que pretendam ocultar desonra própria, como,por exemplo, uma gravidez extramatrimonial ou incestuosa. Há entendimentominoritárionosentidodequesomenteamãepoderiacometerocrime,ficandoafastada a possibilidade também de o pai praticá-lo igualmente (SILVEIRA,1973,p.183).

Note-se,porém,queadesonradeveser“própria”,demaneiraqueaquelequeabandona recém-nascido para ocultar desonra de terceiro, sem a atuação

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conjunta deste, comete o crime de abandono de incapaz (art. 133, CP). Nãoobstante,havendoconcursodeagentesentreapessoadesonradaeum terceirocomofimdeocultardesonradaprimeira,haveránormalmenteaincidênciadoart.134,CP,emconcursodeagentes,nostermosdoart.29,CP.

SujeitopassivoOsujeitopassivodestecrimeéorecém-nascido.OCódigoPenalBrasileiro

nãodefiniuoqueseja“recém-nascido”,demodoquesurgiramcontrovérsiasnadoutrina, sendo que prevalece o entendimento que elege a queda do cordãoumbilicalcomomarco.

TipoobjetivoOsverbossão“expor”e“abandonar”.Ocrimeédeperigoconcreto.

TiposubjetivoOcrimeédoloso, consistindonavontadedeexporouabandonaro recém-

nascido (dolo de perigo). Neste caso há também exigência de um doloespecífico,qualseja,odesejodeocultardesonraprópria.Devidoaissosetementendido na doutrina e na jurisprudência que ameretriz ou amulher de vidasabidamente licenciosa não pode ser sujeito ativo desse crime privilegiado,devendoser-lheaplicadoo tipopenalprevistonoart.133,CP.Issoporqueemtaiscircunstânciasnãohaveráhonraalgumaaserpreservada.

Observe-se que a honra preservada no caso deste delito é exclusivamenteaquela de natureza sexual.Dessa forma nada impede que um homemou umamulherpossaincidirnestecrimeaoabandonarofilhoparaocultardesonra(porexemplo, um filho adulterino), sendo eles conhecidos como pessoas que nãopagam suas dívidas. Agora, se a finalidade do abandono é outra que não aocultação de desonra própria (por exemplo, dificuldades econômicas, criançadefeituosaoudébilmentaletc.),ocrimeseráodeabandonodeincapaz(art.133,CP).

ConsumaçãoetentativaOcrimeconsuma-secomoabandonodavítimaesuaexposiçãoasituaçãode

perigoconcreto.Épossívelatentativa.

FormasqualificadasO crime se qualifica nos termos do art. 134, §§ 1º e 2º, com o advento

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preterdolosodosresultadoslesãocorporaldenaturezagraveoumorte.

AçãopenalPúblicaincondicionada.

OmissãodeSocorro(art.135,CP)Conceito

Consiste o crime de omissão de socorro na conduta de deixar de prestarassistênciaàcriançaabandonadaouextraviada,ouàpessoa inválidaouferida,aodesamparoouemgraveeiminenteperigo,desdequeissosejapossívelsemriscopessoal;ounãosolicitar,nessassituações,osocorrodaautoridadepública.

ObjetividadejurídicaTutelam-seavidaea integridadefísicadaspessoas,pormeiodaatençãoà

segurançaindividual.

SujeitoativoQualquerpessoa(crimecomum).

SujeitopassivoO tipo penal elenca algumas pessoas que podem ser vítimas do crime de

omissãodesocorro:a)criançaabandonadaouextraviada;b)pessoainválida;c)pessoaferida;d)pessoaaodesamparoouemgraveeiminenteperigo.

TipoobjetivoTrata-sedeumcrimeomissivopróprioouomissivopuro.Aprimeiraforma

decometimentodocrimeédeixardeprestarassistênciaaoofendido.Esse dever de prestar assistência obviamente limita-se de acordo com a

capacidadedoagente,nãosendopossívelexigirdaspessoasalgoalémdesuascapacidades.Essacapacidadedecadaagenteatuardeveseranalisadadeacordocom o caso concreto. Também será afastado o crime quando o agente, paraprestarosocorro,tenhadearriscarsuaintegridadefísicaoumesmosuavida.

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Outroaspectorelevantedizrespeitoànãoconfiguraçãodocrimedeomissãodesocorroquandoesteésupridoporterceiros.Quandováriaspessoasomitemosocorro, todas elas respondem pelo crime.No entanto, se uma dessas pessoaspresentesprestao socorro, todasasoutras ficamdesobrigadas.Deve-se teremmente,porém,quequandoalguémomiteosocorroedepois,porumafelicidadeda vítima, um terceiro acaba prestando-lhe auxílio, isso não afasta aresponsabilidadedoomitente.

TiposubjetivoOelementosubjetivoéodolo,inexistindomodalidadeculposa.

ConsumaçãoetentativaOcrimeseconsumanomomentodainaçãodosujeito.Emregraocrimeé

instantâneo, mas pode eventualmente ser permanente, dependendo do casoconcreto.Porexemplo,quandoalguémdeixadeassistiraumdoentequeseachaemumquartosobaresponsabilidadedoagentediaapósdia.

Tratando-se de crime omissivo próprio, não existe a possibilidade detentativa.

CausasdeaumentodepenaA lei prevê no parágrafo único do art. 135,CP, dois aumentos de pena.A

pena é acrescida da metade se da omissão resultar lesão corporal grave e étriplicada se resultar morte. Os resultados mais gravosos (morte ou lesõesgraves) devem ser preterdolosos, pois se houver o dolo direto ou eventualcaracterizar-se-ãooutroscrimescomohomicídiooulesõescorporaisgraves.

AlgunscasosespeciaisOCódigodeTrânsitoBrasileiro(Lein.9.503/97)trouxeaomundojurídico

umanovamodalidadeespecialdeomissãodesocorroemseuart.304.Apartirdeentão,emcasosdemotoristaenvolvidoemacidentedetrânsitoprevaleceráoPrincípiodaEspecialidade.

Se o sujeito passivo da conduta for idoso (maior de 60 anos), havendoomissão de socorro, tipificado estará o art. 97 do Estatuto do Idoso (Lei n.10.741/2003),poisnoconflitoaparentedenormasprevalecerátaldispositivoporforçadoPrincípiodaEspecialidade.

Açãopenal

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Públicaincondicionada.

Maus-tratos(art.136,CP)Conceito

Consisteocrimenaexposiçãoaperigodavidaoudasaúdedealguémqueesteja sob a autoridade, guarda ou vigilância do agente, com a finalidade deeducação,ensino,tratamentooucustódia,sejamedianteaprivaçãoalimentaroude cuidados indispensáveis, seja submetendo a vítima a trabalho excessivo ouinadequado,sejaporabusodosmeiosdecorreçãooudisciplina.

ObjetividadejurídicaTutelam-seaincolumidadeeavidadapessoa.

SujeitoativoTrata-se de crime próprio, vez que somente aquele que tem uma anterior

relação jurídica com a vítima, a qual implique em autoridade, guarda ouvigilância,podecometê-lo.

SujeitopassivoTambémsópodesersujeitopassivodessecrimeaquelapessoaqueestejasob

aautoridade,guardaouvigilânciadeoutrem.Nãoénecessárioqueavítimasejamenorde18anosparapoderhaverocrimedemaus-tratos,bastandoqueestejasobaautoridade,guardaouvigilânciadoautordoilícito.Aliás,comoadventodoECA (Lei n. 8.069/90), poderá haver o crime especial do art. 232 daquelediplomaacasoavítimasejacriançaouadolescente,conformelecionaMonteirodeBarros(BARROS,1997,p.157).FernandoCapezchegaaafirmarquedeveráprevalecerotipopenaldescritonoart.232,ECA,quandoavítimaforcriançaouadolescente, por aplicação do “Princípio da Especialidade” (CAPEZ, 2010, p.215).Cabeaqui, segundonossoentendimento,uma ressalva: realmentehaverácasosemqueprevaleceráoart.232doECAemsetratandodevítimacriançaouadolescente.Noentanto,deve-seobservarqueocrimedemaus-tratosprevistono Código Penal (art. 136) é, na verdade, norma especial em relação aodispositivodoEstatutodaCriançaedoAdolescente.Tratando-seoart.136,CP,de crime de forma vinculada que descreve pormenorizadamente as condutas aseremencetadaspeloagenteparacolocaremriscoaintegridadefísicaouavidada vítima por meio dos maus-tratos, ainda que esta seja uma criança ou

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adolescente,deveráprevaleceroart.136,CP,semprequerestarconfiguradaumacondutaespecificamentealidescrita.Noscasosdesubmissãodavítimacriançaouadolescenteamerovexameououtrosconstrangimentosquenãoencontremabrigonodispostonoart.136,CP,aísimseráocasodeaplicaçãodoart.232doECA,crimedeformalivre,quedestaformaassumeumacaracterísticaresidual.Tanto isso corresponde à realidade que, caso contrário, restaria sem utilidadealgumaaprevisãodeaumentodepenaparaoscasosdemaus-tratosquandoavítima forpessoamenorde14anos,conformeconstado§3ºdoart.136,CP,justamenteacrescentadopelopróprioECA(Lein.8.069/90).

Quantoaoidoso,háprevisãoespecialtambémnoEstatutodoIdoso–art.99daLein.10.741/2003.

TipoobjetivoAcondutaconsistenoabusodosmeiosdecorreçãoedisciplinapeloagente,

deformaaexporaperigoavidaouasaúdedavítima.Trata-sedecrimedeaçãomúltipla,conteúdovariadooutipomistoalternativo.

Pode-se afirmar que o tipo penal em estudo constitui um crime de formavinculada, pois a colocação em risco da saúde ou da vida da vítima deveconformar-seàscondutasespecificadasnadescriçãotípica.

TiposubjetivoO elemento subjetivo é o dolo, não havendo previsão de figura culposa.

Necessário para a configuração do delito o chamado animus corrigendi veldisciplinandi,ouseja,ainfliçãodosmaus-tratosdevedar-secomoobjetivode“educação,ensino,tratamentooucustódia”.

Cabe lembrar que no caso de custódia, tratando-se de pessoa presa ousubmetidaamedidadesegurança,osmaus-tratosconfiguramcrimeespecialdetortura (art. 1º, § 1º, da Lei n. 9.455/97). Essa mesma legislação prevê umamodalidadede torturamuitoassemelhadaaosmaus-tratos,abrangendopessoasqueestejamsobaguarda,poderouautoridadedeoutrem.Nestecasoainfliçãodemaus-tratos,mediante emprego de violência ou grave ameaça, provocando“intensosofrimentofísicooumental”comomodalidade“decastigooumedidadecaráterpreventivo”,configurarátambémcrimeespecialdetorturaprevistonoart.1º,II,daLein.9.455/97.Naverdadeadiferençaentreoscrimesdemaus-tratos(art.136,CP)etortura(art.1º,II,daLein.9.455/97)éapenasdegrau,ouseja,osmaus-tratosficarãoreservadosparacondutasmenosintensas,eocrimedetorturaseráaplicadoaoscasosmaisgravosos.

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ConsumaçãoetentativaOcrimeseconsumacomaefetivacriaçãodoperigoparaavidaouasaúde

davítima.Nãohánecessidadededanoefetivoataisbensjurídicos.Atentativaépossívelnascondutascomissivas.

FormasqualificadasSegundo disposto no art. 136, §§ 1º e 2º, CP, o crime de maus-tratos se

qualificaquandoocorreremosresultadoslesõescorporaisgravesoumorte.Taisresultadosdevemadvirdecondutapreterdolosa.

AçãopenalPúblicaincondicionada.

Rixa(art.137,CP)Conceito

Arixaéumabrigatumultuosaenvolvendotrêsoumaispessoasnobojodaqualháviasde fatoeviolências recíprocasde tal formaquenãosejapossíveldeterminaraautoriadasagressõeselesõesocorridas.

ObjetividadejurídicaTutelam-sea incolumidadedapessoaeaordempúblicaporvia indireta.É

importante salientar que o crime de rixa tem certo caráter subsidiário, isso nosentido de evitar a impunidade em casos nos quais fique difícil determinar aautoriadaslesõesemmeioaumaconfusão,evitandocomodispositivoatotalimpunidade.

SujeitoativoesujeitopassivoTrata-se de crime plurissubjetivo ou de concurso necessário, só se

caracterizando quando há participação de pelo menos três pessoas. Para aconfiguração do número mínimo de participantes são computados inclusiveeventuais inimputáveis (menores, loucos etc.). Não importa que não seidentifiquem todos os participantes, bastando a comprovação da ocorrência darixa.Nãoentramporémnacontagemaspessoasqueintervêmnabrigasomenteparasepararosdemaisenvolvidos.

Os sujeitospassivosnesse crime se confundemcomos ativos.Ospróprios

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“rixentos” são vítimas, atémesmo aqueles lesionados durante o entrevero sãoautoresdocrime,oqualconsisteem“participarderixa”.

TipoobjetivoA conduta é “participar da rixa”, praticando violência física contra as

pessoas.Nãoimportaseoindivíduochegadepoisdeiniciadaarixaousaiantesdoseutérmino;bastaaparticipação.

Aqueleque ingressanarixaparasepararoscontendoresnãorespondepelocrime.Mas, se o indivíduo ingressa numa rixa para separar os contendores eacabaseenvolvendonasagressões,respondenormalmentepeloilícito.

“Participar da rixa” implica em ação física, mas não necessariamente emcontatofísicoentreaspessoas.Pode-separticiparatirandopedras,pauseoutrosobjetosde longe.Tambémpodeocorrerquealguématueapenasexternamente,gritando e incentivando a violência. Neste caso tal pessoa será “partícipe” docrimede rixa.HelenoFragosoapontapara este fato, fazendoadistinçãoentre“participar da rixa” (autor do crime de rixa) e “participar do crime de rixa”(partícipedocrimede rixa) (FRAGOSO,1977,p.191).Emambososcasosaresponsabilizaçãocriminaléamesma,qualseja,infraçãoaoart.137,CP.

Existeumadistinçãodoutrináriaentrearixaeximproviso(aquelaquesurgesubitamente,semplanejamento)ea rixaexproposito (aquelaqueéproposital,preparada).Emambososcasosconfigura-seocrimenormalmente.

TiposubjetivoÉochamadoanimusrixandi,somentehavendoafiguradolosanosentidode

quererparticipardarixa.Nãoexistefiguraculposa.

ConsumaçãoetentativaArixaseconsumainstantaneamentecomoingressodoscontendores.Nãoé

possívelatentativa.

LegítimadefesanarixaSeráqueépossívelocorrerlegítimadefesanarixa?Ensinaadoutrinanãoserpossívela legítimadefesaentreos“corrixantes”,

ouseja,aquelesqueparticipamdarixanapráticaesofrimentodeagressões.Elesnãopodembeneficiar-sedaexcludentedeantijuridicidadedalegítimadefesa.

Podem, no entanto, agir em legítima defesa própria ou de terceiro aquelesque ingressam na rixa para separar os contendores e desde que ajam nesse

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sentido do início ao fim, nunca entrando simplesmente na troca de agressões.Poderãoaindaagiremlegítimadefesaterceirosquenãoparticipamdarixa,massãoatingidosporacaso.Porexemplo,umapessoaquepassapelaruaeécolhidainvoluntariamente pelo tumulto ou a pessoa que tem sua casa invadida pelorixentos.

RixaqualificadaSãodoiscasosquequalificamocrimederixa:aocorrênciaemseubojode

lesõescorporaisgravesoumorte.Não importa indagar neste caso sobre a autoria das lesões graves ou da

morte.Todosaquelesqueparticipamdarixarespondempelocrimequalificado,comodiz a lei: “pelo fato da participaçãona rixa”. Se identificadoo autor dalesãocorporalgraveoumorte,respondeeleemconcursomaterialpeloscrimesderixaqualificadaelesõesgravesouhomicídio.

No que tange à vítima da lesão grave, ela também responde pela rixaqualificada,desdequetenhasidotambémparticipantedarixa,issoporque,comodito anteriormente, os sujeitos ativos e passivos confundem-se neste delito.Logicamente,seavítimanãoparticipoudarixa–porexemplo,apenaspassavapelolocalefoiatingida–,nãorespondepornada,éapenasvítima.

Comrelaçãoàsqualificadorasdocrimederixacostumaadoutrinaapresentardois questionamentos, tendo em vista o momento do ingresso e saída doparticipantedarixaeosresultadosmaisgravosos:a)Seumindivíduoparticipadeumarixaeemdadomomentovaiembora,sendo

queapóssuasaídaocorrelesãograveoumortedealguém,elerespondepelaqualificadora?

Arespostaépositiva,poissuaparticipaçãotevealgumacontribuição,aindaqueindireta,noresultado.

b)Enocasodoindivíduoqueingressanumarixaapósocorridososresultadoslesãograveoumorte,nãohavendooutrosapartirdeseuingresso?

Nestecasoelerespondeporrixasimples,vezquenãohánexocausalentreasuaatuaçãoetaiseventosgravosos.Nocasodasqualificadorasnãoimportaseocorreapenasumamorteoulesão

grave ou várias. Há apenas uma rixa qualificada, devendo-se analisar essascircunstânciasnadosimetriadapenanostermosdoart.59,CP.

Ainda que amorte ou lesão grave tenha resultado de atuação em legítimadefesa,porexemplo,dealguémqueapenaspassavapelolocalefoicolhidopelo

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entrevero ou de alguém que somente separava os contendores, a rixa équalificada.

Essamorteoulesãogravepodeserdequalquerpessoa,sejaelaumrixoso,assistente,estranhooumesmoalguémquetentasepararoscontendores.

AçãopenalA ação penal é pública incondicionada, e o processo regula-se pela Lei n.

9.099/95, tendo em vista que a pena máxima, seja da rixa simples, seja daqualificada,nãoultrapassa2anos.

CrimesContraaHonra(arts.138a145,CP)Algunsconceitosbásicos

OCódigoPenal prevê trêsmodalidades de crimes contra a honra, a saber:calúnia (art. 138), difamação (art. 139) e injúria (art. 140).Uma das questõesmais importantes é saber diferenciar cada um desses crimes. Assim sendo,vejamososconceitos:a)calúniaéafalsaimputaçãodefatocriminosoaoutrem;b)difamaçãoéaimputaçãoaalguémdefatoofensivoàsuareputação;c)injúriaéaofensaàdignidadeoudecorodeoutrem.

Verifica-se que nos dois primeiros (calúnia e difamação) atribui-se sempreumfatoofensivodahonraaumapessoa.Adiferençaéquenacalúniaofatoécriminosoenadifamaçãoele é apenasdesonroso, imoral etc.Por seu turno, ainjúria constitui não a atribuição de um fato (criminoso ou não),mas omeroxingamento,rotulação,palavreadoofensivo.

É importante salientar que existem previsões dosmesmos crimes contra ahonraemdiplomaslegaisespecíficostaiscomooCódigoPenalMilitar,CódigoEleitoral eCódigoBrasileiro deTelecomunicações, alémdaLei deSegurançaNacional.Oconflitoaparentedenormassolucionar-se-ápormeiodoPrincípiodaEspecialidade.

Outro ponto importante é que eventualmente a falsa atribuição de fatoscriminosospodeensejaralgumcrimecontraaadministraçãodajustiça(arts.339ou340,CP).Sea atribuiçãodocrimedáensejoà instauraçãode investigaçãopolicial ou processo judicial contra alguém, ocorre o crime de denunciaçãocaluniosa,queédeaçãopenalpúblicaecujapenaébemmaiorqueadacalúnia(videart. 339,CP). Emhavendo apenas a comunicação falsa de um crime oucontravenção, sem atribuição a uma pessoa qualquer, há o crime de

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“Comunicaçãofalsadecrimeoucontravenção”(art.340,CP).Note-seaindaquenacalúniaofatoatribuídofalsamentetemdeserprevisto

comocrime.Seéatribuídafalsamenteapráticadeumacontravenção,hácrimededifamação,enãodecalúnia.Emais,sedaatribuiçãofalsadapráticadeumacontravençãodecorreainstauraçãodeinvestigaçãoouprocessocontraavítima,há o crime de denunciação caluniosa, pois que prevista expressamente talhipótesenoart.339,§2º,CP.

ALein.9.459/97acrescentouum§3ºaoart.140,CP.Apartirdeentão,seainjúriaconsistenautilizaçãodeelementosreferentesaraça,cor,etnia, religiãoou origem, a tipificação é diferenciada, inclusive com pena bem mais grave(reclusão de 1 a 3 anos e multa). Mais tarde o Estatuto do Idoso (Lei n.10.741/2003)aindaacrescentouaessemesmoparágrafoaproteçãoespecialaosidososeportadoresdedeficiência.

Sobreessetemaéimportanteteremvistaqueocrimedeinjúriareferentearaça, cor, etnia, religião, origem, condição de pessoa idosa ou portadora dedeficiência é apenas um crime de injúria qualificada. Trata-se de umamodalidade especial de crime contra a honra, e não de crime de racismo. OscrimesderacismosãoprevistosnaLein.7.716/89.

Honra–algumasclassificaçõesimportantesa)Honra dignidade – diz respeito a atributos morais, de honestidade e bons

costumes.Porexemplo,ofende-seahonradignidadeaochamarumapessoadedesonesta,estelionatáriaetc.

b)Honradecoro–dizrespeitoadotesouqualidadesdohomemedamulher.Porexemplo, ofende-se a honra decoro ao chamar uma pessoa de feia, burra,ignoranteetc.

c) Honra subjetiva – traduz a estima de si mesmo, o amor-próprio, oautorrespeito.

d)Honraobjetiva–éaconsideraçãoparacomosujeitonomeiosocial,ojuízoquefazemdelenacomunidade.

e)Honracomum–aquelaqueserefereatodososhomens.f)Honra especial ou profissional – que se refere a determinados grupos ou

categorias de pessoas. Por exemplo, chamar um militar de covarde, ummédicodeaçougueiro,umadvogadodecoveirodecausasetc.

Objetividadejurídica

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Oscrimescontraahonratutelamaincolumidademoraldoserhumano,suahonra.

A doutrina costuma distinguir dentre as três modalidades aquelas queatingem a honra subjetiva ou objetiva. Assim vejamos: a) calúnia – honraobjetiva;b)difamação–honraobjetiva;c)injúria–honrasubjetiva.

SujeitoativoTrata-sedecrimescomunsquepodemserpraticadosporqualquerpessoa.

SujeitopassivoTrataremosseparadamentedecadacrime,conformesegue:

NacalúniaSujeito passivo é todo ser humano capaz de cometer crimes. A doutrina

predominante afirma a impossibilidade da prática de calúnia contra pessoajurídica,devezqueestanãopodesersujeitoativodecrimes.Hoje,entretanto,temosumelementocomplicadordesdequesurgiuumaexceçãocomoadventodaLein.9.605/98(Leidoscrimesambientais),naqualéprevistaapossibilidadede responsabilização penal da pessoa jurídica (art. 3º da Lei n. 9.605/98).Noentanto, a pessoa jurídica continuanãopodendo ser vítimade crimes contra ahonra, ainda que se lhe atribuam falsamente crimes ambientais, os quais podecometer.Issoporqueoscrimescontraahonrasãoespéciesde“crimescontraapessoa”(pessoahumana).Nestescasossomenteosdirigentesdapessoajurídicaafetada poderão ser vítimas.Anote-se que há entendimento de que as pessoasjurídicas poderiam ser vítimas de crimes contra a honra. Adalberto CamargoAranha, por exemplo, defende esta tese em monografia sobre o tema. Nãoobstante,emseutextoafastaapossibilidadedapráticadecalúniacontrapessoajurídica.Oautor,porém,embasasuaconclusãotãosomentenaassertivadequeaspessoasjurídicasnãopodemsersujeitosativosdecrimes,oquepoderiaserexcepcionadopeloart.3ºdaLein.9.605/98(ARANHA,2000,p.34-35).

Diverge ainda a doutrina, mas a conclusão mais coerente é de que osinimputáveistambémpodemservítimasdecalúnia,mesmoporquealeifalaem“imputarfatodefinidocomocrime”,enãosimplesmente“crime”.

Tambémnãoimportaseosujeitopassivoéumcriminoso,desdequeaquelaimputaçãoespecíficasejafalsa.

Acalúniacontraosmortosépunívelnostermosexpressosdoart.138,§2º,CP.Obviamenteomortonãoéosujeitopassivo,massimsuafamíliainteressada

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napreservaçãodesuamemória.

NadifamaçãoTambémpodesersujeitopassivoqualquerserhumano,mesmomenoresou

doentes mentais. A pessoa jurídica também não pode ser sujeito passivo,conformenosso entendimento, umavezque se tratade crimecontra apessoa.Porém a questão da pessoa jurídica é controvertida, havendo decisõesjurisprudenciaisemsentidopositivo.

Nãoéprevistaadifamaçãocontraosmortos,sendo,portanto,figuraatípica.Eventualmenteseosfamiliaresdomortoforemofendidosreflexamenteemsuahonrapoderáconfigurar-secrimededifamação.

NainjúriaQualquerpessoapodesersujeitopassivo.Apessoajurídica,segundonosso

entendimento,tambémnãopodeservítimadeinjúriapelosmesmosmotivosjáexpostos.

ConsumaçãoetentativaNostrêscrimessomenteépossívela tentativapelaformaescrita.Quantoà

consumaçãoestadifere:a)nacalúniaedifamaçãosóháconsumaçãoseofatochega ao conhecimento de terceiros; b) na injúria há consumação quando oprópriosujeitopassivotomaconhecimentodaofensa.

PropalaçãooudivulgaçãoNocasodacalúnia,olegislador,noart.138,§1º,CP,punecomasmesmas

penas quem propala ou divulga. Na difamação e injúria não há dispositivosimilar, sendopossível,porém,queaquelequedivulga,nocasodadifamação,possaincidirnapráticadenovadifamação.

Exceçãodaverdade(exceptioveritatis)A exceção da verdade é um meio de defesa para as pessoas a quem seja

imputada a prática de um crime contra a honra. Por meio dela procurar-se-ádemonstrarqueaquiloquefoiditocomrelaçãoàsupostavítimadecrimecontraahonranadamaisédoqueaverdade.Noentanto,aexceçãodaverdadenãoélivrementeadmitida,variandoseuslimitesdeacordocomcadatipopenal:a) Na calúnia – é admissível em regra, apenas excepcionando-se os casos

elencadosnoart.138,§3º,CP.

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b) Na difamação – em regra não cabe a exceção da verdade. Cabeexcepcionalmentenocasodoart.139,parágrafoúnico,CP,“seoofendidoéfuncionáriopúblicoeaofensaérelativaaoexercíciodesuasfunções”,poisnessecasoaadministraçãoteminteressedefiscalização.Observe-sequenocasodoPresidentedaRepúblicanuncacabeexceçãodaverdade,nemmesmonadifamação.

c)Nainjúria–nuncacabeaexceçãodaverdade.

AlgumasdisposiçõesespecíficasdainjúriaProvocaçãoouretorsão

Oart.140,§1º,CP,prevêduashipótesesdeperdão judicial: I–quandooofendidoprovocoudiretamenteainjúria;II–retorsãoimediataqueconsistaemoutrainjúria.

InjúriarealPrevista no art. 140, § 2º, CP. São exemplos: bofetada, corte ou puxão de

barba,rasgarasroupasdapessoa,atirarexcrementoousujeiras,atirarovosetc.Nesses casos a injúria consiste em uma agressão física de caráter ofensivo àhonra da pessoa. Com relação a eventuais lesões corporais (art. 129, CP) háconcurso material e com relação às vias de fato (art. 21, LCP) são elasabsorvidas.

DisposiçõescomunsdoscrimescontraahonraCausasdeaumentodepena(art.141,I,II,IIIeIV,parágrafoúnico,CP)

As penas dos crimes contra a honra sofrem um aumento da ordem de umterçonosseguintescasos:a)Art.141,I,CP–crimepraticadocontraoPresidentedaRepúblicaouchefede

governoestrangeiro.NocasodoPresidentedaRepúblicaéprecisoatentarquepodehavercrimeda

LeideSegurançaNacional (art.26),massomentequandoocrimecontraahonratemfimdeabalaraSegurançaNacional,sendoaplicávelodispositivonosdemaiscasosqueconfiguramcrimecomum.

b)Art.141,II,CP–contrafuncionáriopúblicoemrazãodasfunções.Nestecasooaumentose justifica, tendo emvista quenãohá apenaso atingimentodahonra da pessoa individualmente, mas também a honorabilidade e

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respeitabilidade da Administração Pública. Tenha-se sempre em vista quenão basta para configurar o aumento o fato de ser o ofendido funcionáriopúblico,necessitandoqueaofensasedêemrazãodasfunções.

c)Art.141,III,CP–napresençadeváriaspessoas,oupormeioquefaciliteadivulgação da calúnia, da difamação ou da injúria. Neste inciso, paraconfigurarváriaspessoasdevehaverumaquantidadeconsiderável,comonocasodeumaplateiaemumespetáculo,numapalestra,numasaladeaulaetc.Aindanesseinciso,omeioquefaciliteadivulgaçãopodeser,porexemplo:impressos, alto-falantes, fotos, filmes, cartazes etc.Antes da declaração deinconstitucionalidade da Lei de Imprensa pelo STF, não podia o meio serjornal,revista,rádioouTV,poisnessescasoshaveriaconfiguraçãodeCrimede Imprensa.Atualmente, com a referidamanifestação doSTF, a causa deaumento de pena pode ser normalmente aplicada nesses casos. Deve-seapenas atentar, nos casos do rádio e TV, para as tipificações especiais doCódigoBrasileirodeTelecomunicações.

d)Art.141,IV,CP–contrapessoamaiorde60anosouportadoradedeficiência,excetonocasodeinjúria.EsteincisofoiacrescentadopeloEstatutodoIdoso(Lei n. 10.741/2003), tendo por escopo ensejar uma maior proteção aosidosos e aos portadores de deficiência, bem como repudiar com maioreloquência atitudes preconceituosas. Note-se que é excetuado o caso dainjúria,paraaqualtalaumentodepenaéinaplicável.Issosedeveaofatodeque omesmo diploma legal acimamencionado também acrescentou comofiguras de injúria qualificada pelo preconceito o fato de a ofensa serrelacionada com as condições de pessoa idosa (maior de 60 anos) ouportadora de deficiência. Nesses casos o agente já responderá pelo crimequalificado, com pena consideravelmente mais gravosa nos termos do art.140, § 3º, CP, de modo que a aplicação do aumento de pena previsto noincisoemestudoconfigurariabisinidem.

e)Art.141,parágrafoúnico,CP–aspenassãoaplicadasemdobroseoagenteatuamovidoporinteressepecuniário(pagaoupromessaderecompensa).

Exclusãodecrime(art.142,I,IIeIII,CP)Oart.142,CP, emseus três incisos, alinhaoscasosemquea injúriaoua

difamação não são puníveis. Por óbvio, à calúnia não se aplicam os citadosdispositivos.a)Art.142,I,CP–aofensairrogadaemjuízo,nadiscussãodacausa,pelaparte

ouporseuprocurador.Aspartesaodigladiarememjuízodevemcontarcom

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ummínimodeliberdadeparamanifestaçãodeseuspontosdevista,aindaquesejam em certa medida ofensivos em relação aos demais envolvidos noprocesso. Por exemplo, um advogado deve ter liberdade para externar osmotivosqueolevamaaduzirasuspeiçãodojuizparadeterminadoprocesso,sobpenadesercerceadooexercíciodesuaprofissão(art.133,CF).Emboraa lei fale somente da discussão da causa em juízo, pensamos que por umainterpretação extensiva do dispositivo deve abranger toda atuação doadvogado, inclusive em processos administrativos, inquéritos policiais etc.Destaque-se,porém,queestaexcludentedepunibilidadenãoéilimitada,demodoquepodehaverabusosquedevemseranalisadoscombom-sensoemcadacasoconcreto.

b) Art. 142, II, CP – a opinião desfavorável da crítica literária, artística oucientífica, salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar. Acríticadeverealmenteserlivre,poiscasocontrárionãoteriarazãodeexistir.Elaé salutar epropiciaodesenvolvimentoe aprimoramentodasatividadesquetemporobjeto.Malgradoisso,tambémaquiháqueconsiderarquepodehaverabusosaimpediremaaplicaçãodanormaexcludente,configurando-senormalmente o crime. Neste caso específico a lei é inclusive expressa arespeito,aoressalvarahipótesedeser“inequívocaaintençãodeinjuriaroudifamar”.

c)Art.142, III,CP–oconceitodesfavorávelemitidopor funcionáriopúblico,emapreciaçãoouinformaçãoqueprestenocumprimentododeverdeofício.Também neste caso há que se reservar alguma liberdade ao funcionárioencarregadodeemitir apreciaçõesou informaçõesnocumprimentode seusdeveres,sobpenadetornarsuafunçãodesprovidadeutilidade.Finalmentevale ressaltarqueoparágrafoúnicodoart. 142,CP, estabelece

quenoscasosdosincisosIeIIIrespondepelainjúriaoupeladifamaçãoquemlhedápublicidade.Éclaroqueadivulgaçãovoluntáriaedescabidadoconteúdodeumadiscussãojudicialoudeumadeliberaçãofuncionalnãopodeencontrarabrigonasexcludentes.Noentanto,deve-seatentarparaofatodequeaatuaçãodo sujeito, para configurar crimes contra ahonra, deve serdolosa, demaneiraquepretendacomadivulgaçãoatingirahonradaspessoasimplicadas,ouseja,atuasemjustacausa.IssoporquenãosepodeolvidaroPrincípiodaPublicidade,queorientaosprocessosjudiciaiseadministrativosemgeral.Odispositivonãomenciona o caso do inciso II porque a crítica (literária, artística ou científica)abrigaemsuapróprianaturezaadivulgação,demodoquenãopodeserapenadoaquelequedivulgataismanifestaçõesnoexercícionaturaldessaatividade.

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Retratação(art.143,CP)Retratar-sesignificadesdizer-se,declararqueerrou,retiraroquedisse,sendo

causa de extinção de punibilidade nos termos do art. 107, VI, CP. Porém, aretrataçãonãoéaplicávela todoequalquercasodecrimecontraahonra.Emprimeirolugarelasóseaplicaaoscasosdeaçãopenalprivada,jáqueoart.143mencionaapalavra“querelado”.Aretrataçãotambémsóseaplicaàcalúniaeàdifamação. Não tem cabimento na injúria, uma vez que esta atinge a honrasubjetiva primordialmente, demaneira que a retratação não teria o condão dereparar o mal ocasionado. Nos casos de calúnia e difamação que têm comoobjeto a honra objetiva, a retratação pode ocasionar um efeito reparador dareputaçãodavítimanoseiosocial.

Havendo coautores, a retratação de um deles não aproveita aos outros.Ademais,eladevesercabal,completa,nãoservindoaparcialoucondicional.Aretrataçãonãodependedeaceitaçãodoofendido.

Pedidodeexplicações(art.144,CP)O pedido de explicações é cabível quando há dúvida sobre a intenção de

ofender ou a quem se queria ofender. Trata-se de medida preparatória efacultativa na qual o juiz só decide sobre a satisfatoriedade ou não dasexplicações,masnãohácondenaçãooupré-julgamento.

Poderão ocorrer duas situações: a) se o juiz considera as explicaçõessatisfatórias,aaçãopenalnãopodeserintentadaporfaltadejustacausa;b)seojuizconsideraasexplicações insatisfatóriasouelasnãosãoapresentadas,cabeaoofendidointentaraaçãopenalrespectiva.

É importante ressaltar que o juiz não profere decisão no pedido deexplicações. Ele será objeto de análise somente posteriormente no processo-crime,nomomentodasentença.

Açãopenal(art.145eparágrafoúnico,CP)Emregraaaçãopenalnoscrimescontraahonraéprivada.AtualmenteaLei

n. 9.099/95 pode ser aplicada aos crimes contra a honra (art. 61 da Lei n.9.099/95).Excetuam-seacalúniacomaumentodepena(art.138c/c141,CP)ea injúria por preconceito (art. 140, § 3º, CP), vez que nestes casos a penamáximaultrapassa2anos.Adifamação,ainjúriaemesmoainjúriareal,aindaque com aumento de pena, configuram infrações penais de menor potencialofensivo, pois mesmo com o eventual acréscimo não ultrapassam o patamarmáximode2anos.Tambémacalúniasimplestempenamáximade2anos,não

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fugindodoconceitodeinfraçãodemenorpotencialofensivo.Sãoexceçõesemqueaaçãopenalépública:

a) Pública incondicionada, nos casos de injúria real com lesões corporais (art.145,CP). Para isso deve sofrer a vítima lesões corporais, ainda que leves,poissehouverapenasviasdefatoocrimecontinuasendonormalmentedeaçãopenalprivada.

A doutrina tem revisto a interpretação desse dispositivo do Código Penal,considerandoamodificaçãodessasituaçãocomoadventodaLein.9.099/95,que estabeleceu que o crime de lesões corporais leves seria de ação penalpúblicacondicionadaarepresentação(art.88daLein.9.099/95).Tratando-se então de injúria real com lesões leves, a ação penal deveria tornar-sepública sim, mas condicionada a representação do ofendido. Somentecontinuariamsendodeaçãopenalpúblicaincondicionadaoscasosdeinjúriarealcomlesõescorporaisdenaturezagraveougravíssima.

b)Públicacondicionadab.1–A requisiçãodoMinistroda Justiçanos casosdoart. 141, I,CP.Sãoos

casos em que a vítima é o Presidente da República ou chefe de governoestrangeiro. O condicionamento da ação penal deve-se a razões de ordempolíticaquepodemorientaraoportunidadeouconveniênciadaaçãopenal.Observe-se que no caso do Presidente da República, se tratar-se de crimecontraaSegurançaNacional,aaçãopenalserápúblicaincondicionada.

b.2–Arepresentaçãodoofendidonocasodoart.141,II,CP.Esteéocasoemqueavítimaéfuncionáriopúblicoeaofensarefere-seaoexercíciodesuasfunções.SobreotemaháaSúmula714doSTF,queestabeleceoseguinte:

Éconcorrentealegitimidadedoofendido,mediantequeixa,edoMinistérioPúblico, condicionada a representação do ofendido, para a ação penal porcrime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suasfunções.

Assimsendoháduasorientações: a legal,queestabelecea açãopenalpúblicacondicionada para tais casos, e a construção pretoriana, que permite aalternativa entre a ação penal pública condicionada e a ação penal privadaintentadadiretamentepelopróprioofendidopormeiodeseuadvogado.

Observe-sequenocasodofuncionáriopúblico,paraqueaaçãopenalpossaserpúblicacondicionada,aofensadeveserirrogadaemrazãodasfunções,casocontrárioseránormalmenteprivada.

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b.3 – A representação do ofendido nos casos de injúria qualificada pelopreconceito,deacordocomoart.140,§3º,CP.ALein.12.033,de29desetembro de 2009, acrescentou uma parte final no parágrafo único do art.145,CP,estabelecendoquedoravanteaaçãopenalsejapúblicacondicionadaàrepresentaçãonessescasos.

Observaçõesimportantes1)Autocalúnianãoécrime,anãosernocasodeconfigurarautoacusaçãofalsa

(art.341,CP).2) Atribuir a alguém a prática de Contravenção Penal não infamante – por

exemplo, dirigir embarcação em águas públicas sem habilitação –, nãocaracterizadifamaçãoporquenãoatingeahonra.

3)Nadifamaçãonãointeressaseofatoéverdadeirooufalso,poispretende-seevitarqueumsearvoreemcensordooutro.

4) Injúria contra funcionário público no exercício ou em razão das funçõesconfiguradesacato(art.331,CP).

5) Injúria contra morto, dependendo do caso (ex.: cuspir ou esbofetear odefunto),podeconfigurarvilipêndioacadáver(art.212,CP).

6)OEstatutodo Idoso (Lein.10.741/2003)previu emseuart. 105a condutacriminosa de “exibir ou veicular, por qualquer meio de comunicação,informações ou imagens depreciativas ou injuriosas à pessoa do idoso”.Apenaprevistaédedetençãode1a3anosemulta.Essetipopenalparecenãotutelarahonraindividual,massimaquelaqueserefereaoidosoconsideradocomo categoria ou grupo social. Assim sendo, distingue-se dos demaiscrimes contra a honra previstos no Código Penal e legislações especiaisporque abrange condutas que depreciemou atinjam a honra da “pessoa doidoso”consideradacomocategoriaabstrata,enãopessoa(s)determinada(s).Quando um idoso em específico seja atingido diretamente pela ofensa,configurar-se-ácrimecontraahonracomaumentodepenanostermosdoart.141, IV,CP;140,§3º,CP(idoso)ou infraçãoprevistaemoutrosdiplomasespecíficos (v.g. Código Penal Militar, Código Brasileiro deTelecomunicaçõesetc.).

ConstrangimentoIlegal(art.146,CP)Conceito

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Consistenoatodeconstrangeralguém,pormeiodeviolênciaougraveamea-ça,oureduzindoporqualquermeioacapacidadedereação,adeixardefazeroquealeiautoriza,ouafazeroqueelanãodetermina.

ObjetividadejurídicaTutela-sealiberdadeindividual.

SujeitoativoQualquer pessoa pode cometer o crime de constrangimento ilegal, pois se

trata de crime comum. No caso do funcionário público que abusa de suaautoridade, deve-se atentar para o disposto na Lei n. 4.808/65, bem como,eventualmente, para possível incidência de crime de tortura previsto naLei n.9.455/97.

SujeitopassivoVítima deste crime poderá ser qualquer pessoa com poder de

autodeterminação. Note-se que essa capacidade de autodeterminação não seconfundecomacapacidade jurídica.Bastaráparaquealguémpossaservítimade constrangimento ilegal que a pessoa tenha capacidade de querer,independentementedesuacapacidadecivil,porexemplo.Somentenãopoderãoser sujeitos passivos os doentes mentais sem qualquer capacidade dediscernimento, o embriagado total, criança de pouca idade etc. Nestes casosdesaparece o bem jurídico tutelado pelo tipo penal, qual seja, a liberdadeindividual.

TipoobjetivoOverbodo tipo é “constranger”, ou seja, obrigar, coagir, forçar a vítima a

fazeroudeixardefazeralgoquealeinãodetermina.A pretensão do agente deve ser ilegítima e ele deve ter consciência disso.

Acaso sua pretensão seja legítima ou,mesmo que ilegítima, tenha o agente oentendimento de que age de maneira a satisfazer uma pretensão legítima,configuradoestaráocrimedeexercícioarbitráriodasprópriasrazões(art.345,CP).

Os meios executórios do crime em discussão são a violência (violênciafísica), a grave ameaça (violência moral) ou a redução da capacidade deresistênciadavítima(violênciaimprópria).

Discute-se na doutrina sobre a caracterização ou não do crime quando o

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agenteobrigaavítimaanãoperpetraratosconsideradosimorais.Háautoresquedefendematesedeque,emsendoosatosobstadosimorais,

não deve haver punição criminal (v.g. Bento de Faria, no Brasil; Florian eMaggiore,naItália).Noentanto,prevaleceoentendimentodequeocorre,sim,ocrimequandoalguéméconstrangidoanãopraticarsimplesmenteumatoimoral,como, por exemplo, a prostituição (v.g. Manzini, Mirabete, Flávio AugustoMonteirodeBarros,DamásioE.deJesus,LuizRegisPrado,FernandoCapez,Cezar Roberto Bitencourt, Nelson Hungria, Magalhães Noronha). OentendimentocontrárionãofazadevidadiferenciaçãoentreasesferasdoDireitoPenal e da Moral, o que pode ser muito perigoso, resultando em terríveisarbitrariedades.

Agora, tratando-sedo impedimentodapráticadeaçãoouomissão ilegaisenãomeramenteimorais,dúvidanãorestaquantoànãoconfiguraçãododelitodeconstrangimentoilegal.Équenestecasonãoháquesefalaremum“direitodedelinquir”.

TiposubjetivoOelementosubjetivodotipoéodolo,sendoindispensáveltambém,comojá

expostoacima,aconsciênciadailegitimidadedapretensão.Nãoexisteafiguraculposa.

ConsumaçãoetentativaTrata-sedecrimematerial,oqualexigeparasuaconsumaçãoqueavítimase

submetaàvontadedoagente,fazendooudeixandodefazeralgoemvirtudedoconstrangimento.Épossívelatentativa.

CausasdeaumentodepenaNoart.146,§1º,CPsãoprevistosdoiscasosdeaumentodepena:a)quando

ocrimeécometidopormaisdetrêspessoas;b)quandoháempregodearmas.Falando a lei em crime cometido por mais de três pessoas, entrarão no

cômputopara totalizaromínimodequatropessoas inclusive inimputáveisqueatuem com o autor do ilícito. Assim também não importará se não foremidentificadostodososparticipantesdocrime,mas,havendosidocomprovadaaparticipação de mais de quatro pessoas, a causa de aumento de pena estaráperfeitaemrelaçãoaosidentificados.

Há dissidência na doutrina quanto a entrarem no cômputo somente oscoautoresoutambémosmerospartícipes.Algunsautoresafirmamquesomente

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devem ser computados os coautores, sendo que aqueles que somente atuamincentivandoouauxiliandoexternamenteacondutanãoservemparaconfiguraronúmeromínimoexigidopelacausadeaumentodepena.Issoporque,emboraalei fale em “reunião” de mais de três pessoas, exige que tal se dê “para aexecução do crime”, de maneira que a mera participação, por exemplo, noplanejamento,nãoserviriaparaaentradanonúmeromínimodepessoasexigidopela lei. Neste sentido manifestam-se Flávio Augusto Monteiro de Barros,Mirabete,CezarRobertoBitencourt,PauloJosédaCostaJúnioreJoséHenriquePierangeli. Há, porém, quem entenda que os partícipes também entram nacontagem,vezqueotipopenalfalana“reunião”demaisdetrêspessoas,enãonaefetivaexecuçãodocrimepormaisdetrêspessoas.Dessaforma,havendoogruposereunidoparaapráticadocrime,aindaquealgunssomenteparticipemdo planejamento e não da execução direta, estes também deverão entrar nacontagempara a configuraçãoda causa de aumento emestudo.Neste sentido:Fernando Capez. Embora fique claro que o entendimento predominante nadoutrina é o de que há necessidade da efetiva execução do crime para que sepossacomputarnonúmerodeagentes,afiliamo-nosaosegundoentendimento.Justifica-se:otipopenal,comsuaredaçãodúbia,ensejaambasasinterpretaçõesacimaexpostas.Realmentefala-seemreuniãoparaaexecuçãodocrime.Dessaforma,viáveléoentendimentodequeexijaaleiaefetivaexecuçãoparaquesepossa computar no número mínimo. Da mesma forma não é desprezível ainterpretaçãodequeamerareuniãoparaofimdeexecutarocrimejábasta.Emnosso entendimento, o que deve solucionar a questão é a razão de ser daqualificadora. Ela existe visando a repressão mais rigorosa, tendo em vista omaiorpoderdecoerçãoeeficiêncianaaçãodaquelesqueagememgrupo.Essemaior poder pode derivar não somente da força bruta, mas também de ummelhorplanejamentoda açãocriminosa,deumamelhor alocaçãodemeiosdeexecução etc. Assim sendo, o alijamento do partícipe que pode muitas vezesatuardeformabastantedecisiva, incrementandoopotencial lesivodaconduta,nãonospareceamelhorsolução,emborasejaaquelaquepredomina.

Utilizando-seanormadapalavra“armas”(plural),issonãosignificaquehajanecessidadedoempregodemaisdeumaarma.Opluraléutilizadonesteaspectoapenasparaindicarogênero.

A arma simulada ou de brinquedo não serve para configurar a causa deaumento de pena em questão. Embora o tema seja controvertido, devendo seranalisado com mais vagar no estudo do crime de roubo, parece que ocancelamentodaSúmula174,STJ,quepreviaaconfiguraçãodaqualificadora

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similarparaocrimederoubocomempregodearmadebrinquedoousimulacro,somente pode conduzir à conclusão supramencionada numa interpretaçãocontrariosensu.Noentantoquaisquerarmas(própriasouimpróprias,brancasoudefogo)servirãoparaaconfiguraçãodoaumentodepena.

Quando a lei diz que “as penas aplicam-se cumulativamente e em dobro”,significa que o juiz deverá aplicar a pena de detenção e a pena demulta, aopasso que o tipo penal simples apresenta-se em seu preceito secundário sobformaalternativaenãocumulativa.

DistinçãoeconcursodecrimesOcrime de constrangimento ilegal é subsidiário, de forma que quando em

conflitocomoutrosilícitosdemaiorgravidadenãoprevalece.Porexemplo,nocaso do constrangimento de mulher à prática de conjunção carnal, haverá ocrime de estupro, e não o constrangimento ilegal. Também em se tratando deconstrangimentomediante violência ou grave ameaça, que causem sofrimentofísicooumental,comofimdeobterconfissão,informação,declaraçãodavítimaou de terceira pessoa ou ainda devido a preconceito racial ou religioso,configurar-se-áocrimede tortura,enãoodeconstrangimento ilegal.Oroldeexemplospoderiaprosseguirdeformabastanteampla.Noentanto,éimportantesomentesalientarquenoscasosemquehouverumcrimeespecíficoedemaiorgravidadeparaoconstrangimentoperpetrado,emfacedasubsidiariedade,ficaráafastadoocrimedeconstrangimentoilegal.

Somentehaveráexceçãoaesseregramentonocasodaslesõescorporaisemvista do disposto no § 2º do art. 146, CP, que determina expressamente aaplicação da regra do concurso material, estabelecendo: “além das penascominadas, aplicam-se as correspondentes à violência”.Note-se, porém, que aameaçaficaráabsorvida,bemcomoasviasdefato.

ExclusãodecrimeO§3ºdoart.146,CP,estabelecequenãoconstituiconstrangimentoilegal:a)

a intervençãomédicaoucirúrgica,semoconsentimentodopacienteoudeseurepresentante legal, se justificada por iminente perigo de vida; b) a coaçãoexercidaparaimpedirsuicídio.

AçãopenalAaçãopenalépúblicaincondicionada.

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Ameaça(art.147,CP)Conceito

Aameaçaéapromessadeummalinjustoegravefeitaaalguém,deformaaatingir sua liberdade psíquica. O tipo penal prevê a ameaça feita por palavra,escritoougesto,ouqualqueroutromeiosimbólico,decausarmalinjustoegraveaalguém.

ObjetividadejurídicaProtege-sealiberdadepsíquicadapessoa.

SujeitoativoQualquerpessoapodesersujeitoativo,poistrata-sedecrimecomum.

SujeitopassivoTambémqualquerpessoapoderásersujeitopassivodeameaça.

TipoobjetivoOverbodotipoé“ameaçar”.Nocaso,ameaçaralguémdeummalinjustoe

grave.Questãocontroversanadoutrinaéaquelaqueversa sobreanecessidadede

queomalprenunciadonaameaçaseja futuro.Algunsautoresentendemqueocrime somente se configura quando o mal ameaçado é futuro. Se o mal forpresente ou iminente (“ameaça em ato”), descaracterizado estaria o crime deameaça.Nestesentido:CelsoDelmanto.Noentanto,háquementendaqueomalpode ser futuro ou mesmo presente ou iminente, já que o tipo penal não faznenhumadistinçãoourestrição.Nestesentido:NeyMouraTeles,DamásioE.deJesus,FlávioAugustoMonteirodeBarros,Manzini,Piromallo,NelsonHungria,dentreoutros.

Parece-nos mais correto o segundo entendimento, o qual inclusivepredomina.Apenasdeve-seteremcontaodevidocuidadocomaacepçãoquesepretendaimprimiràpalavra“presente”.Note-sequeacasoummal,porexemplo,de agressão física, seja ameaçado contra alguém em meio a uma discussão,sendo que neste mesmo momento a dita agressão se concretize, ocasionandolesõesnavítima,ficaráafastadoocrimedeameaça,oqualseráabsorvidopelaslesões corporais. É claro que qualquer ameaça é sempre de ummal “futuro”,senão não seria uma ameaça, e sim um ato concreto. Quando se fala em

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caracterizaçãodocrimedeameaça,referindo-seaameaçaspresentes,pretende-sereferirasituaçõesemqueoautordocrimeprometeagirnaquelemomentooumuito próximo no tempo. Nestes casos não há por que afastar o crime deameaça. Inclusive se o mal for muito remoto, aí sim é que estarádescaracterizadooilícitosobcomento.

TiposubjetivoOcrimedeameaçasomenteexistena formadolosa.Temhavidodiscussão

doutrinária e jurisprudencial quanto à ameaça dever ser proferida com ânimocalmo, refletido, e não em meio a um acesso de raiva ou cólera. A mesmadiscussão existe com referência ao embriagado que ameaça outrem.Mirabeteapresentadiversasdecisõespretorianasemambosossentidos,orareconhecendoa descaracterização do crime por exigência do ânimo calmo e refletido, oraapontandoparaaconfiguraçãodoilícito,tendoemvistaque,nostermosdoart.28,IeII,CP,nemaemoção,nemaembriaguezexcluemaimputabilidadepenal(MIRABETE,2011,p.186;BARROS,1997,p.238).

Emnosso entendimento, razão assiste àqueles que defendema tese de quenem a emoção nem a embriaguez, necessariamente, devem descaracterizar ocrimedeameaça.Nãoháqualquermotivoparaquenãoseleveemconsideraçãoa ameaça proferida por alguém que esteja emocionalmente abalado. Aliás,muitasvezesesseenvolvimentoemocionaléquerevelaaseriedadedaameaçaecausa temoràvítima.Tambémoembriagadopodeproferirameaçasquesejamverossímeis e que possam incutir perturbação ao sujeito passivo, atingindo obem jurídico tutelado. Apenas deve haver o cuidado de pautar-se pelo bom-senso,percebendo-seoscasosemqueaameaçaproferidanessassituaçõesnãopassadeumabravataouinconsequênciadeumébrio.

ConsumaçãoetentativaTrata-se de crime formal que se consuma no momento em que o sujeito

passivotomaconhecimentodaameaça.Odelitoseconsumaindependentementedaefetivaintimidaçãodavítima.Sendocrimeformal,atentativaemregranãoépossível,anãosernaformaescrita.

AçãopenalAaçãopenalépúblicacondicionadaarepresentação,conformedispõeoart.

147, parágrafo único, CP. O crime de ameaça é infração de menor potencialofensivo,aplicando-se-lheoprocedimentoprevistonaLein.9.099/95.

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SequestroouCárcerePrivado(art.148,CP)Conceito

Consisteafiguracriminosanumaespéciedeconstrangimentoilegalemquese tolhe a liberdade de locomoção da vítima, mediante sequestro ou cárcereprivado.

Neste ponto impende destacar que a doutrina tem apontado umadiferenciaçãoentreasfigurasdosequestroedocárcereprivado.Emboraalgunsautores cheguem a equiparar ambas as figuras, a distinção tem sido feita combasenograudeprivaçãodaliberdadeimpostoàvítima.Noscasosdesequestroaprivaçãoseriamaismoderada,demaneiraqueoofendidoteriacertaliberdadedelocomoção,emboraesteja tolhido.Umexemploseriaumapessoarefémemuma ilha deserta e sem meios de chegar ao continente. Já nas situaçõesconfiguradorasdecárcereprivado,acoerçãosobrealiberdadedelocomoçãodavítimaseriapraticamenteabsoluta,como,porexemplo,nacondutademanteravítimaconfinadaemumquarto,presaemumacela,numburacoetc.

ObjetividadejurídicaObemjurídicoprotegidoéaliberdadedeirevir.Emcertascircunstânciaso

consentimentodavítimaafastaocrime,como,porexemplo,nocasodamulherque livremente consente em não sair de casa sem o marido ciumento ou doreligioso que se enclausura em um mosteiro. Mesmo nestes casos o crimesomente é afastado enquanto perdurar o consentimento, já que se em algummomentoapessoaresolvermudardeatitudeeforimpedidaocorreráodelito.

SujeitoativoTrata-se de crime comum, de forma que qualquer pessoa pode cometer,

tirante o funcionário público no exercício ou em razão das funções, o qualpraticarácrimeespecialdeabusodeautoridade(Lein.4.898/65–art.3º,a,ouaindaart.4º,a,doui).TambémoEstatutodaCriançaedoAdolescente(Lein.8.069/90) prevê um tipo especial de abuso de autoridade em seu art. 230,consistindonaapreensãoindevidadecriançaouadolescente,foradoscasosdeflagrante de ato infracional ou sem as formalidades legais.Mas o Estatuto daCriançaedoAdolescentenãoparaporaínaproteçãoconferidaàliberdadedosjovens.Emseuart.234tambémapenaaautoridadequeseomiteemdeterminaraimediataliberaçãodecriançaouadolescenteilegalmentedetido,tãologotomeconhecimentodofato.Prevêaindaoutrotipopenalnoart.235paraaqueleque

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descumpre de forma injustificada prazo estabelecido na lei em prol deadolescentesujeitoaprivaçãodaliberdade.

SujeitopassivoQualquer pessoa pode ser sujeito passivo de sequestro ou cárcere privado.

Cabe salientar que mesmo as pessoas privadas legalmente de sua liberdadepodemservítimasdocrime,desdequesejaintensificadadeformainjustificadaarestrição,como,porexemplo,nocasodeumcolegadecelaqueobrigaooutroaficar somente em um certo compartimento. Note-se que nos casos de celasfortes, celas escuras ou solitárias impostas a detentos poderá configurar-semodalidade de crime de tortura previsto no art. 1º, § 1º, da Lei n. 9.455/97.Destaque-seainda,noque se refereàLeideTortura,queo sequestro,quandoperpetrado para a finalidade de praticar crime de tortura, constitui causa deaumento de pena desse ilícito (aumento de um sexto a um terço), conformedispostonoart.1º,§4º,III,daLein.9.455/97.Dessaforma,emcasosquetais,osequestroseráabsorvidopelocrimedetortura,comaumentodepena.

Acasoo sequestrooucárcereprivado sejacometidocontraoPresidentedaRepública, do Senado, da Câmara dos Deputados ou do Supremo TribunalFederal,configurar-se-ácrimeespecialcontraaSegurançaNacional(art.28daLSN–Lein.7.170/83).

TipoobjetivoA conduta descrita no tipo penal consiste em “privar alguém de sua

liberdade,mediantesequestrooucárcereprivado”.Pode parecer à primeira vista que a conduta criminal deve implicar,

necessariamente, o transbordo da vítima de um local para outro ondepermanecerápresa.Noentanto,issonãocorrespondeàrealidade.Podeocorrerochamado“Sequestro per obsidionem”, no qual o ofendido é retido no própriolocalondeseencontra.Porexemplo,umamulherqueémantidaencarceradaemumquartodesuaprópriacasapelomarido.

É possível o cometimento do crime por omissão quando, por exemplo, seretémumapessoainternadaquedeveriareceberaltaeserliberada.

TiposubjetivoTrata-sedecrimedoloso,eavontadedoagentedeveserdirigidaàprivação

da liberdade da vítima mediante sequestro ou cárcere privado. Deve-se aindaatentar para certas distinções, pois que, se alguém sequestra outrem com a

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finalidadedeobtervantagemilícitacomopreçoouresgate,configura-seocrimedeextorsãomediantesequestro(art.159,CP).AntesdaLein.11.106/2005,seaprivaçãodaliberdadefossecomfimlibidinosocontramulherhonesta,haveriaocrimederaptoviolento(art.219,CP).Noentanto,taldiplomalegalrevogouoart.219,CP,eatualmenteofimlibidinosonosequestroconfiguraqualificadoradopróprioart.148,§1º,V,CP.

Cumpre salientar ainda que, se o sequestro se destina a fins políticosclandestinos ou subversivos, caracterizar-se-á crime contra a SegurançaNacional previsto nos arts. 20 ou 28 da Lei n. 7.170/83, dependendo daqualidadedosujeitopassivo.

O erro exclui a culpabilidade – por exemplo, se uma pessoa é presaconfundidacomumcriminosoprocurado.

ConsumaçãoetentativaO crime consuma-se com a privação da liberdade da vítima. Trata-se de

crime permanente. Há discussão acerca do tempo de privação da liberdade.Alguns defendem a tese de que mesmo um tempo exíguo de privação daliberdade já seria suficiente para caracterizar a infração (v.g. José HenriquePierangeli, Rivarola e Fernando Capez). Outros exigem que haja um lapsotemporal considerável, juridicamente relevante, para que se possa dizer quehouvelesãoaobemjurídicotutelado(v.g.FlávioAugustoMonteirodeBarros,EuclidesCustódiodaSilveira,CezarRobertoBitencourt,BentodeFariaePauloJosé da Costa Júnior). Afiliamo-nos ao segundo entendimento que tempredominadoatualmente,vezqueéimportanteteremconsideraçãoofatodequeparaquesepossafalaremcrimedevehaverumalesãoefetivaeconsiderávelaobemjurídicotuteladonanorma(PrincípiodaInsignificância).

A tentativa é plenamente possível quando, por exemplo, o agente tentacapturaravítimaqueconsegueresistirefugir.

CrimequalificadoHoje, tendo emconta as alteraçõesdaLei n. 11.106/2005, prevêoCódigo

Penalcincocircunstânciasqualificadorasno§1ºdoart.148,CP:I.Seavítimaéascendente,descendente,cônjugeoucompanheirodoagenteou

maiorde60 (sessenta)anos.Oreconhecimentodestaqualificadoraafastaaincidênciadoart.61,II,e,CP(agravantegenérica),queimplicariaembisinidem.

II. O crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou

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hospital.III. Se a privação da liberdade durar mais de 15 dias. Configura-se o que a

doutrina tem denominado de “crime a prazo”, vez que a tipificação daqualificadora se faz condicionada ao decurso de um certo lapso temporal(BARROS,1997,p.248).Observe-sequenacontagemdoprazode15diasinclui-seodiadocomeço,deacordocomanormadoart.10,CP.

IV.Seocrimeépraticadocontramenorde18anos.Aidadedavítimadeveseraferidanomomentodoarrebatamento,ouseja,seosequestropermaneceporlongoperíododetempoeavítimavemacompletar18anosnocativeiro,issoéirrelevanteparadesconfiguraraqualificadora.

V.Seocrimeépraticadoparafinslibidinosos.Note-seque,diferentementedoque ocorria com o antigo crime de rapto violento, o sujeito passivo dosequestro ou cárcere privado qualificado pelo fim libidinoso pode serqualquerpessoa,nãoimportandoosexoouacondutasocial.No seguimento o Código Penal prevê ainda mais uma qualificadora, com

pena específica no art. 148, § 2º, CP, quando resultar “à vítima, em razão demaus-tratosoudanaturezadadetenção,gravesofrimentofísicooumoral”.

ReduçãoàCondiçãoAnálogaàdeEscravo(art.149,CP)Conceito

Constitui o crime a redução de um ser humano à condição análoga à deescravo. Note-se que não se fala em “escravidão”, uma vez que esta comoinstituição já foi há bastante tempo abolida dos ordenamentos jurídicos.Portanto,menciona-se redução à “condição análoga”, ou seja, a uma situaçãosemelhante ou similar àquela a que eram submetidos os escravos, sofrendo aexploração de sua força de trabalho, sem contraprestação e em condiçõesdegradantes.

ObjetividadejurídicaTutela-se a liberdade individual, o status libertatis do ser humano. Além

dissotambéméobjetodetutelaadignidadedapessoahumana.Referindo-seabem jurídico indisponível, torna-se irrelevante o consentimento do ofendido.Essa regra somente pode excepcionar-se nos casos em que, sem qualqueriniciativadobeneficiado,umapessoa se colocaespontaneamenteemcondição

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de servidão. Por exemplo, se umamulher apaixonada resolve prestar serviçosdomésticos sem qualquer contraprestação ao homem objeto de seu carinho, oqual,porseuturno,nãoaobrigaaisso,masapenasaceitaseusfavores.

SujeitoativoO crime é comum, podendo ser perpetrado por qualquer pessoa, e não

somente pelo empregador da vítima. Tanto isso é verdade que na casuísticaencontram-se nesses casos grupos de indivíduos que atuam em conjunto paracompletaraaçãodelituosa,porexemplo,pessoasresponsáveispeloaliciamentode trabalhadores (“gatos”), pela vigilância, pela exploração do trabalho, pelocontroledasdespesasetc.

SujeitopassivoQualquerserhumano,sempossibilidadededistinçãoderaça,sexo,idadeou

qualqueroutra,podeservítimadocrimeoraenfocado.Inclusivenãoimportaemnadaograudecivilizaçãoemqueseencontraapessoa.Acasosetratedecriançaou adolescente, ou quando o crime é cometido em virtude de preconceito deraça, cor, etnia, religião ou origem, incidem as causas de aumento de penaprevistasnoart.149,§2º,IeII,CP.

TipoobjetivoA conduta consiste em “reduzir alguém à condição análoga à de escravo”.

Isso significa tratar o ser humano como uma “coisa”, desconsiderando suapersonalidade,suaindividualidadeeliberdade,tudoissocomofitodeexplorarsua capacidade de trabalho sem contraprestação. Enfim, trata-se do chamado“plágio”,ouseja,dasubmissãodeumapessoaaodomíniodeoutra.

O crime em destaque era de forma livre, já que não elencavapormenorizadamente os meios de execução. Ocorre que com a Lei n.10.803/2003foidadanovaredaçãoaoart.149,CP,demaneiraquepassaramaser enumeradas condutas específicas para a configuração criminal. Inobstanteessaimportantealteração,dandoumadescriçãomaisespecíficaeprestigiandooPrincípiodaLegalidadeestrita,entendemosqueocrimenãoseconvolouemdeformavinculada,poisquetodasascondutasalidescritaspodemserperpetradasporquaisquermeiosidôneos,como,porexemplo,aviolência,agraveameaça,afraude, o sequestro, a narcotização, o constrangimento moral daquele queconsidera suas supostasdívidasparacomoempregadorumaquestãodehonraetc.

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Passemosaanalisarcadaumadascondutasoraprevistaslegalmente:a) A primeira forma prevista é a submissão da vítima a trabalhos forçados, a

jornada exaustiva ou a condições degradantes de trabalho. Paracaracterização dessamodalidade a vítima deve ser privada da liberdade deescolheredeexecutarounãodeterminadaatividadelaborativa,detalformaque não possa se insurgir contra as determinações de terceiros.Observe-seque a jornada exaustivamencionada na lei refere-se àquela que excede oslimitesrazoáveis,incidindoemdegradaçãodacondiçãohumanadotrabalho.Éóbvioqueexistemtrabalhosquesãoexaustivosporsuapróprianatureza,masnãoconfiguramapráticacriminosaquandoexercidosporalguémdentrodos limites da legislação trabalhista.Nemmesmo a simples desobediênciadasnormastrabalhistasconfiguraráainfraçãopenal.Porexemplo,aadoçãodeuma jornadabem superior àquela legalmente estabelecida.A tipificaçãopenal dependerá da ocorrência de uma submissão do empregado que lheretirecompletamentealiberdadedeescolhaedeação.Quantoàscondiçõesdegradantes, têm sido consideradas aquelas que submetem a pessoa ahumilhações,afrontandosuadignidade.

b)Asegundamodalidadedecondutaretratapráticaaviltanteeinsidiosacontraotrabalhador costumeiramente adotada por aqueles que costumam submeterpessoas à exploração de sua força de trabalho. Refere-se à privação daliberdade de alguém em virtude de endividamento geralmente criadoartificiosamente. A vítima é atraída ao posto de trabalho com promessasmirabolantes e vantajosas.Quando inicia o trabalho passa a ser obrigada aadquirirdesdealimentosevestimentasatéinstrumentosdetrabalho,osquaisgeramumendividamento,comoempregadorouseusprepostos,detalmontaque aquilo que deveria receber como pagamento pelo trabalho não chegasequer para cobrir suas despesas. Dessa forma o empregado fica numasituaçãodesubmissãoreferenteàqueladívidaqueoatrelaaoempregadorporum laçomoral (aobrigaçãodequitar suasdespesas) e,principalmente,pormeiodecoerçãoexercidaporviolênciaegraveameaça,jáqueéimpedidodedeixaropostodeserviçosemhaverquitadointegralmentesuasdespesas.

c)Prevêaindaa leiduasmodalidadesdecondutasequiparadasno§1ºdoart.149,CP,asaber:

I–cercearousodequalquermeiodetransporteporpartedotrabalhador,comofimderetê-lonolocaldetrabalho;

II – manter vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apoderar de

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documentosouobjetospessoaisdotrabalhador,comofimderetê-lonolocaldetrabalho.

TiposubjetivoOcrimeédoloso,nãohavendoprevisãodefiguraculposa.

ConsumaçãoetentativaOcrime se consumaquando a vítima torna-se dominada pelo sujeito ativo

quecerceiasualiberdade.Trata-sedecrimepermanente,permitindoaprisãoemflagranteenquantoperdurarasituaçãodecerceamentodaliberdadedavítima.Atentativaépossível.

AlgumasdistinçõesimportantesEmalgumassituações,inexistindoareduçãodavítimaàcondiçãoanálogaà

deescravo,mas,havendoconstrangimentooumaus-tratos,podemconfigurar-seoutros crimes como, por exemplo, os maus-tratos, constrangimento ilegal,sequestrooucárcereprivado,crimedetortura,frustraçãodedireitoasseguradoporleitrabalhistaetc.

Com relação ao trabalho excessivo ou abusivo durante a execução penal,impingido ao detento, pode haver configuração do crime de Abuso deAutoridade(Lein.4.898/65–art.3º,i,ouart.4º,aeb).

O Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/2003) prevê em seu art. 99 um crimeespecífico que consiste em “expor a perigo a integridade e a saúde física oupsíquica do idoso, submetendo-o a condições desumanas ou degradantes ouprivando-odealimentosoucuidadosindispensáveis,quandoobrigadoafazê-lo,ousujeitando-oatrabalhoexcessivoouinadequado”.Deve-seobservar,porém,queoreferido tipopenal temcarátersubsidiárioemrelaçãoaoart.149,CP, jáquesuapenaébeminferior.

Anote-seaofinalquehaverácasosdeconcursomaterialouformaldedelitos,já que o preceito secundário do art. 149, CP, expressamente determina acumulaçãodapenacorrespondenteàviolênciaquandoesteforomeioescolhidopeloagenteparaperfazerasdescriçõestípicas.

ViolaçãodeDomicílio(art.150,CP)Conceito

Consiste o crime na entrada ou permanência em casa alheia ou em suas

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dependências clandestina ou astuciosamente ou contra a vontade expressa outácitadomoradoroudequemdedireito.

ObjetividadejurídicaÉ tutelada pela norma em estudo a liberdade individual, sob o aspecto da

inviolabilidade da intimidade e da vida privada. Note-se que o bem jurídicotutelado é disponível de forma que a aquiescência do morador implica ematipicidadedaconduta.

SujeitoativoTrata-sedecrimecomum.Atémesmooproprietáriodeumimóvelhabitado

porterceirospodesersujeitoativo,porexemplo,emcasodecontratodealuguel.Aexpressão“casaalheia”empregadapelotipopenalpodedarafalsaimpressãodequeoproprietárionãoincidirianocrime.Entretanto,tenha-seemmentequeareferida expressão deve ser interpretada não no sentido da relaçãomeramentematerialentreoproprietárioeobemimóvel.Aquia“casaalheia”refere-seaoabrigo, ao asilo inviolável do indivíduo, onde este exerce seu direito àintimidade. Dessa forma, mesmo o proprietário de um imóvel habitado porterceiros não tem o direito de violar a “casa alheia” no sentido de espaçoreservadodaintimidadeedavidaprivadadaspessoasquealimoram.

SujeitopassivoO sujeito passivo é o morador, ou melhor, o titular do direito de decisão

quantoàentradaoupermanênciadepessoasemsuacasa.Nestepassoécrucialperquirirqueméotitulardochamadojusprohibendi,especialmenteemcasosdemais de um morador. Para isso deve-se verificar se há uma relação desubordinação ou de igualdade entre moradores ou mesmo empregados ouservidores. Por exemplo, um porteiro somente tem autoridade para proibir oupermitiraentradadepessoasdeacordocomosditamesdospatrões.Quandoumsubordinado age clandestinamente pode inclusive incidir em participação nocrimedeviolaçãodedomicílio,talqualocorrecomaempregadadomésticaquerecebe clandestinamente o amante em seu quarto na casa dos patrões. Numafamília os pais exercem o direito de inclusão/exclusão, estando os filhossubordinadosàssuasdecisões,desdeque,obviamente,moremnacasadaqueles.Jáentremaridoemulher,porforçadenormaconstitucional(art.226,§5º,CF),vigora o regime de igualdade, devendo a decisão ser tomada em conjunto oudeliberada por aquele que está presente no momento do fato na ausência do

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outro.Entretanto,nasrelaçõesdeigualdade,havendoconflitodevontades,deveprevaleceraproibição.

Indagaçãopolêmicanadoutrinaéaquelaquedizrespeitoàsoluçãodocasodo amante que entra na casa com o consentimento da adúltera, sem aaquiescênciadomaridotraído.Cometeriaele(oamante)ocrimedeviolaçãodedomicílio? A questão ganha importância na atualidade com a revogação docrime de adultério, uma vez que na falta de configuração da violação dedomicílioacondutatorna-seatípica,somenterestandoumilícitocivil.

Algunsdefendema tesedequeoamantecometeriaocrimedeviolaçãodedomicílio, já que se poderia concluir que o marido não consentiria em suaentrada, a qual se dá de forma clandestina (v.g. EdgardMagalhãesNoronha).Outros afirmamquenãodeveprevalecer a tipificaçãodaviolaçãoao art. 150,CP, a partir do momento em que a mulher permite a entrada na ausência domarido,jáquenestasituação,havendorelaçãodeigualdade,éaelaquecabeoexercíciodojusprohibendi(v.g.DamásioE.deJesus,FlávioAugustoMonteirodeBarros,FernandoCapez,BentodeFariaeCezarRobertoBitencourt).Comosevê,estasegundacorrentevemprevalecendonadoutrinaeinclusiveoSTFjádecidiunestesentido(RTJ47/734).Afiliamo-nos tambémaesteentendimento,uma vez que, conforme já anotado supra, na ausência de um dos titularesigualitários do jus prohibendi deve prevalecer a vontade daquele que estápresentee,assimsendo,desapareceumelementonecessárioàconfiguraçãodoilícitopenalemestudo,qualseja,odissensodequemdedireitoquantoàentradaoupermanêncianolocal.

TipoobjetivoAcondutaconsisteementraroupermanecerclandestinaouastuciosamente

oucontraavontadedequemdedireitoemcasaalheiaouemsuasdependências.O verbo “entrar” designa a atuação daquele que penetra na casa sem

autorização. Sua atitude viola, desde o início, a vontade do morador. Énecessárioquehajauma introduçãocompletadocorponahabitaçãoalheia.Sealguém fica sentado nummuro ou introduz somente o pé ou a perna, haverámera tentativa ou mesmo outro ilícito penal (v.g. a contravenção penal deperturbaçãodatranquilidade–art.65,LCP).

Mencionaaleitambéma“permanência”,apontandoparasituaçãoemqueaentrada inicial teria sido permitida, mas em certo momento o morador teriadeterminado a retirada do extraneus, o qual insiste em permanecer no localcontraasuavontade.

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Osmeiosdeexecuçãopodemsermedianteoengododomorador,deformaqueelenãosaibadaentradaoupermanênciaquesedãodeformaclandestinaouastuciosa, ou então pormeio de direto enfrentamento da vontade domorador,entrandooupermanecendooautordocrimenolocalcontraavontadedequemde direito, sem qualquer preocupação em ocultar sua conduta. A afronta dodireitodeinclusão/exclusãonestescasoséexplícitaedireta.

Nãoéqualquerbemimóvelquepodeconfigurarocrimeemquestãocomsuaviolação.Paratanto,deveenquadrar-senoconceitode“casa”queconstituiumelementonormativodotipo.Oconceitoreferidodeveserbuscadonopróprio§4º do art. 150, CP, que se constitui em norma explicativa. De acordo com odispositivo, compreende-se por “casa” o seguinte: a) qualquer compartimentohabitado; b) aposento ocupado de habitação coletiva; c) compartimento nãoabertoaopúblico,ondealguémexerceprofissãoouatividade.

Tambémtemocaráterdenormaexplicativao§5ºdoart.150,CP,agoraparaexcluir do conceito de casa algumas situações específicas: a) hospedaria,estalagemou qualquer habitação coletiva, enquanto aberta, salvo os aposentosdoshóspedes;b)taverna,casasdejogoseoutrasdomesmogênero.

Finalmentecabeobservarquenãoseincluemnoconceitorestritodecasaosveículos (carros, caminhões etc.), de forma que a busca no interior destes éequiparadaàbuscapessoal,anãosernoscasosemquesirvamdemoradiaparaaspessoas(v.g.trailler).Tambémaentradaemfazendasousítiosnãoconfiguraviolação de domicílio, tirante os casos de entrada em suas sedes oumoradiasexistentesemseusterrenos.

TiposubjetivoParaconfiguraçãodocrimesoboaspectosubjetivobastaodolodeentrarou

permanecernacasasemoconsentimentodomorador,nãohavendonecessidadedenenhumoutrofimilícito,detalformaquesepodedizerquesetratadedologenérico.Ocrimenãoapresentamodalidadeculposa.

ConsumaçãoetentativaO crime de violação de domicílio é de mera conduta, bastando a simples

entradaoupermanência ilícitasno local.Namodalidadede“entrar”ocrimeéinstantâneo.Jánamodalidadede“permanecer”ocrimeépermanente.Quandooagente entra e permanece no local não comete dois crimes, mas apenas umincidindo nos dois verbos típicos, como sói acontecer com os crimes de açãomúltipla,conteúdovariadooutiposmistosalternativos.

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Hápossibilidadedetentativatantonoscasosdoverbo“entrar”comonosdoverbo“permanecer”.

Crimequalificado(art.150,§1º,CP)O § 1º do dispositivo sob comento prevê cinco qualificadoras, a saber: a)

crime cometido durante a noite; b) crime cometido em lugar ermo; c) crimecometidocomempregodeviolência;d)crimecometidocomempregodearma;e)crimecometidoporduasoumaispessoas.

No caso do crime cometido durante a noite justifica-se a exacerbação dareprimendalegalemfacedamaiorvulnerabilidadedavítimanesseshorários,oquefacilitaaatuaçãodocriminoso.Oconceitodenoiteéapuradopelocritériofísico-astronômico, caracterizando-se pelo intervalo de tempo em que não hápresença de luz solar. Neste caso não menciona a lei a expressão “repousonoturno”comoocorrenoart.155,§1º,CP.Dessaformapoucoimportaqueosmoradores estejam efetivamente repousando ou que seja o horário noturnonormalmenteutilizadoparaodescanso,bastandoquesejanoite.

O lugarermo(deserto, semvizinhançapróxima, local solitário,desabitado)também impõe uma reação penalmais rigorosa pelamesmamotivação supra,qual seja, a maior dificuldade da vítima em defender-se e obter socorro deterceiros,tornando-amaisvulnerávelaocriminosoque,porseuturno,temmaiorfacilidadeparaocometimentoimpunedainfração.

O emprego de violência enseja maior rigor punitivo, tendo em vista aconcomitantelesãoaoutrosbensjurídicoscomoaintegridadefísicaepsíquicada vítima. A doutrina dominante aponta que a violência pode ser tantoempregadacontraapessoacomocontracoisas(porexemplo,umarrombamento)(em contrário, DELMANTO, 2010, p. 323), uma vez que o legislador nãofazendodistinçãonão caberia ao intérprete fazê-lo.Tambémsequestiona seotermo “violência” abrangeria a grave ameaça, sendo a resposta predominantenegativa. A violência ali mencionada seria somente a física, de modo que aameaça somente seria levada em consideração com referência a eventualempregodearma(emcontrário,FARIA,1961,p.270).Porderradeiroanote-seque,seoagenteaoempregarviolênciaincideemoutracondutacriminosa(dano,lesãocorporaletc.),respondeemconcursomaterialdedelitos,jáqueopreceitosecundáriodo§1ºdoart.150,CP,éexplícitoquantoatalsolução.Nãoobstante,asviasdefato(art.21,LCP)sãoabsorvidas.

O crime perpetrado com emprego de arma também é qualificado,considerandoomaiorpoderdeintimidaçãoocasionado,bemcomoaelevaçãodo

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potenciallesivodoagente.Otermo“arma”deveserinterpretadoemumsentidoamplo, abrangendo tanto armas próprias como impróprias. No entanto, énecessárioqueaarmasejaefetivamenteutilizadanaação,aomenospormeiodeseuporteostensivo, intimidandoavítima.Noque tange à armadebrinquedo,com o cancelamento da Súmula 174, STJ, entende-se que não serve paraqualificarocrime.

Porderradeiroocrimesequalificapeloconcursodeduasoumaispessoas,jáque então o fato se reveste de maior gravidade, obtendo os agentes umincremento de seu potencial lesivo e de intimidação da vítima por meio daatuaçãoemgrupo.Discute-se sobreanecessidadeounãodeque todososquecolaboramparaocrimeestejampresentesnomomentodainvasão.Noentanto,tem predominado o entendimento que também entra na contagem do númeromínimoparaconfiguraçãodaqualificadoraopartícipe,porexemplo,aquelequeplaneja a violação que é executada por outrem sozinho (em contrário,HUNGRIA,1958,p.46-47).Afinal,presenteounãonomomentodainvasão,oque importa é que ele prestou ajuda na empreitada criminosa, tornando-a dealgumaformamaiseficazparaaproduçãodalesãoaobemjurídicotutelado.

Causadeaumentodepena(art.150,§2º,CP)Prevêo§2ºdoart.150,CP,umacausadeaumentodepenaquandoocrimeé

cometido por funcionário público, agindo ilegalmente ou inobservando asformalidadeslegaisouaindacomabusodepoder.

Estacausadeaumentodepenaéaplicáveltantoaocaputcomoao§1º,umavezquevemdescritaabaixodessesdispositivos.

Questão intrigante neste tópico refere-se ao conflito de normas entre o art.150,§2º,CPeoart.3º,b,daLein.4.898/65(AbusodeAutoridade).Afinalodiplomaporúltimomencionadoincriminaqualqueratentadoàinviolabilidadededomicílio, tratando-se também de conduta afeta a funcionário público noexercíciodasfunções(videart.5ºdaLein.4.898/65).

Podem-se encontrar na doutrina basicamente quatro soluções diversas: a)paraalguns,deveriaofuncionáriopúblicoresponderemconcursoformalpeloscrimesprevistosnoart.150,§2º,CPeart.3º,b,daLein.4.898/65(v.g.FlávioAugustoMonteirodeBarros);b)afirmamoutrosqueseoagenteforfuncionáriopúblicoqueagenoexercíciodasfunções,deveresponderpelocrimedeviolaçãodedomicílio simples (art.150,caput,CP) emconcurso formal comAbusodeAutoridade(art.3º,b,daLein.4.898/65)(v.g.CezarRobertoBitencourt);c)háaindaquemsustentequedeveráprevalecerotipopenaldoart.150,§2º,CP(v.g.

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AlexandredeMoraeseGianpaoloPoggioSmanio);d)finalmente,emtesequetem predominado, manifestam-se os autores pela aplicação do Princípio daEspecialidade,deformaqueseofuncionáriopúblicopuderserabrangidopeloconceito de “autoridade” deve prevalecer a aplicação do art. 3º,b, da Lei n.4.898/65.Apenasnoscasosemqueofuncionáriopúbliconãosejaconsiderado“autoridade”seriaaplicadooart.150,§2º,CP,de formaquecadadispositivoteriaseucampodeterminadodeatuação(v.g.FernandoCapez,FábioRamazziniBechara,GilbertoPassosdeFreitaseVladimirPassosdeFreitas).

Parece-nos que assiste mesmo razão ao entendimento por últimocolacionado.Emsetratandodefuncionáriopúblicodetentordecertaparceladepoder estatal, ou seja, que se possa adequar ao conceito de “autoridade” (v.g.DelegadodePolícia,PoliciaisMilitares,PoliciaisCivis, Juízes,PromotoresdeJustiça,Fiscaisetc.),deveprevaleceraaplicaçãodoart.3º,b,daLein.4.898/65.No caso de algum funcionário público que não detenha a qualidade de“autoridade”perpetraraviolaçãodedomicílio,aíentãoseráaoportunidadedeaplicaçãodoart.150,§2º,CP.Porexemplo,umagentedesaúdequeingressenacasadealguémsemautorização.

Éclaroqueessasoluçãodeixaemabertoumaquestão,qualseja:entãoqualocampodeaplicaçãodaúltimafiguraprevistanoart.150,§2º,CP,o“abusodepoder”,poisquenestescasossempreseriautilizadaaLein.4.898/65?Pensamosque a resposta mais coerente possível é que realmente nestes casos seria deaplicar somente a Lei n. 4.898/65, a qual, sendo lei posterior e especial, teriaderrogadoapartefinaldo§2ºdoart.150,CP.

Exclusãodeilicitude(art.150,§3º,CP)O§3ºdodispositivo sobcomento relacionaoscasosemqueaentradaou

permanência em casa alheia é permitida pela lei, ainda que contra ou sem oconsentimento do morador, de forma que não haverá crime. Os casos são osseguintes: I – durante o dia, com observância das formalidades legais, paraefetuarprisãoououtradiligência;II–aqualquerhoradodiaoudanoite,quandoalgumcrimeestásendoalipraticadoounaiminênciadeoser.Estasdisposiçõesdevemserentendidasemconsonânciacomodispositivoconstitucionalprevistonoart.5º,XI,CF.

ViolaçãodeCorrespondência(arts.151e152,CP)

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RevogaçãodosdispositivosdoCódigoPenaletiposcriminososAlgumasfigurasprevistasnoCódigoPenaltratandodocrimedeviolaçãode

correspondência foram revogadas pela Lei n. 6.538/78, que dispõe sobre osServiços Postais, e pela Lei n. 4.117/62 (Código Brasileiro deTelecomunicações),assimcomosofreramalgumainfluênciapelaLein.9.296/96(LeideInterceptaçõesTelefônicas,art.10),detalformaqueatualmentetêm-seasseguintesfigurascriminosas:a)Violaçãodecorrespondênciafechada(art.40,caput,daLein.6.538/78).b)Apossamentodecorrespondênciaparasonegaçãooudestruição(art.40,§1º,

daLein.6.538/78).c)Violaçãodecomunicação telegráfica, radioelétricaou telefônica (art.151,§

1º,II,CP;art.10daLein.9.296/96).d)Impedimentodecomunicaçãoouconversação(art.151,§1º,III,CP);e)Instalaçãoouutilizaçãoilegaldeestaçãoouaparelhoradioelétrico(art.70da

Lein.4.117/62).f) Desvio, sonegação, subtração, supressão ou revelação de correspondência

comercial,comabusodacondiçãodesócioouempregado(art.152,CP).Nospróximos itenspassar-se-á aoestudodecadaumdos tipos criminosos

sobreditos.

ViolaçãodecorrespondênciafechadaConceito

O crime é disposto no art. 40 da Lei n. 6.538/78, que revogou o art. 151,caput, do Código Penal, embora tenha sua mesma redação: “Devassarindevidamente o conteúdo de correspondência fechada, dirigida a outrem”. Apena prevista é de detenção até 6 meses ou até 20 dias-multa de formaalternativa.Apenamínimanãoédeterminadapelalei,razãopelaqualentende-sequeéde1diadedetençãoou1dia-multa.Poderáhaveraumentodemetadeemcasodedanopatrimonialoumoral(art.40,§2º,daLein.6.538/78).

ObjetividadejurídicaGarantia da liberdade individual do sigilo de correspondência, ligado à

liberdadedemanifestaçãodopensamento.

Sujeitoativo

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Qualquerpessoa,menosoremetenteouodestinatáriodacorrespondência.

SujeitopassivoNeste caso há dupla subjetividade passiva, pois que são vítimas do crime

tantooremetentequantoodestinatário.Note-sequeoremetenteéoproprietárioda carta, podendo livrementepermitir sua leituraporoutrem. Jáodestinatáriopassaaseroproprietáriodacartaquandoarecebe(art.11daLein.6.538/78).Apartirdessemomentopassaodestinatárioapoderexibiracartaaoutraspessoas,aindaqueestatratedeassuntosíntimoseconfidenciais.Mesmocomamortedodestinatárioháodelitoporpartede terceirosquedevassemacorrespondência.Nessecasoossujeitospassivosserãoosherdeiros.

TipoobjetivoOverboé“devassar”,ouseja,violar,tomarconhecimentoparcialoutotaldo

conteúdodacorrespondência.Emboraomeiomaiscomumdechegaraoconteúdodacorrespondênciaseja

pormeiodaabertura,nãohánecessidadedissoparaconfiguraçãodocrime.Seosujeito conseguir chegar ao conhecimento indevido do conteúdo dacorrespondência sem abri-la, estará configurado o delito – por exemplo,colocandooenvelopecontraaluzelendoosescritossemabrir.Nãoobstanteénecessárioqueacorrespondênciasejafechada.

A correspondência deve ter destinatário certo, mesmo que não tenhaidentificaçãodoremetente(cartaanônima).Nãohácrimeseacorrespondênciaéendereçadaapessoainexistenteouaumnúmeroindeterminadodepessoas(v.g.aoscidadãosbrasileiros,aoseleitores,aosmunícipesetc.).

Hácasosemqueacorrespondênciadirigidaaterceirospodeserabertaelidasemque incidaoagenteempráticacriminosa.Sãoexemplos: a)omandatáriopode ler a correspondência do mandante nos limites do mandato; b) oadministradorjudicialnafalênciapoderecebereabriracorrespondênciadirigidaaodevedor, entregando-lheoquenão for assuntode interessedamassa falida(art. 22, III, d, da Lei n. 11.101/2005); c) o diretor do presídio ou da cadeiapúblicapode ler a correspondênciaendereçadaaospresosouporeles redigida(art.41,XVeparágrafoúnico,daLEP);d)aAutoridadeJudicialouPolicialtemacessoàscorrespondênciasdirigidasaoacusadoouinvestigadoouemseupoder,quandooconhecimentodoconteúdopudersermeioparaaelucidaçãodocrime.Oacessosomentepodedar-sepormeiodeordemjudicialdebuscaeapreensão,conformedispostonoart.240,§1º,f,CPP;e)ospaisoututorestêmacessoàs

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correspondências dos que se encontram sob o poder familiar ou tutela; f) damesmaformasupra,ocuradortemacessoàscorrespondênciasdocurateladoemcasosdeinterdiçãoporincapacidadeabsoluta.

Frise-se que os casos tratados nos itens c e d supra são objeto de acesadiscussão quanto à constitucionalidade. Alguns entendem que o diretor dopresídio ou cadeia pública não teria direito a devassar a correspondência dosdetentos sistematicamente em face dos ditames constitucionais. Também seentende que o art. 240, § 1º, f, estaria sem efeito perante a nova ordemconstitucional, de forma que as correspondências fechadas não poderiammaisserobjetodebuscaeapreensão(BITENCOURT,2009,p.519-520).NoentantotemprevalecidooentendimentodequenessescasosdeveprevaleceroPrincípioda Proporcionalidade, dando ênfase à necessidade de segurança dosestabelecimentosprisionaiseao interessedeapuraçãodascondutascriminosas(videportodosBARROS,1997,p.276).

Questão tormentosa diz respeito a decidir se o cônjuge teria o direito dedevassaracorrespondênciado(a)parceiro(a).Háautoresqueentendemqueessedireito,emboranãoexpressonalei,seriaimplícitoaorelacionamentoentreeles,de forma que não haveria crime (v.g. Nelson Hungria, Damásio E. de Jesus,Magalhães Noronha, Euclides Custódio da Silveira). Por outro lado, hádoutrinadoresqueentendemquenaausênciadeautorizaçãolegalocônjugenãopode violar a correspondência do outro, sob pena de incidir em condutacriminosa (v.g. Bento de Faria, Flávio Augusto Monteiro de Barros, HelenoFragoso,AnibalBruno,AdilsonMehmeri,CelsoDelmanto,PauloJosédaCostaJúnior, Ney Moura Teles e José Henrique Pierangeli). Filiamo-nos aoentendimentopredominantequeafirmanãohaverautorização, sejapelaordempenal, civil ou constitucional, para que o cônjuge viole a correspondência deseu(sua)parceiro(a).NoBrasil,nãohánormaquepermitaessadevassa,talqualocorreemalgunscasosdedireitocomparado(v.g.Espanha, Itália,Colômbia–PIERANGELI,2005,p.283).

TiposubjetivoOelementosubjetivoéodolo.Podehavercasoemqueoerroafastaodolo,

como,porexemplo,quandoalguémabrecorrespondênciaalheia,pensandoserparasiendereçada.Nãoexistemodalidadeculposa.

ConsumaçãoetentativaA consumação se dá quando o agente toma conhecimento do conteúdo da

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correspondência de forma indevida total ou parcialmente. Apenas o ato daabertura da correspondência não consumao crime, necessitandoda tomadadeconhecimentodeseuconteúdoparatanto.Atentativaéplenamentepossível.

AçãopenalAaçãopenalépúblicaincondicionada,umavezqueatualmentenãoseaplica

mais o disposto no § 4º do art. 151, CP, que previa a necessidade derepresentação. Como já frisado a matéria é atualmente regulada pela Lei n.6.538/78. Essa legislação determina em seu art. 45 que “a autoridadeadministrativa, a partir da data em que tiver ciência da prática de crimerelacionadocomoserviçopostaloucomoserviçode telegrama,éobrigadaarepresentar, no prazo de 10 (dez) dias, aoMinistério PúblicoFederal contra oautorouautoresdoilícitopenal,sobpenaderesponsabilidade”.Comoénítido,apalavra “representar” neste contexto nada tem a ver com o instituto da“representação”atinenteaoscrimesdeaçãopenalpúblicacondicionada.Trata-sede mera notitia criminis a que está obrigada a autoridade administrativa, deformaqueaaçãopenalé,semdúvida,públicaincondicionada.

AcompetênciaparaoprocessoejulgamentoédaJustiçaFederal.

AumentodepenaeformaqualificadaOs§§2ºe3ºdoart.151,CP,nãosãomaisaplicáveisaocrimedeviolaçãode

correspondênciafechadaoraprevistonoart.40,caput,daLein.6.538/78.Nãoobstante,o§2ºdoart.40dessediplomaprevêdispositivoidênticoàqueledo§2ºdoart.151,CP,determinandoumaumentodemetadedapenaseocorredanoa terceiros. Esse dano pode ser financeiro ou moral e pode atingir tanto oremetente e o destinatário como qualquer outra pessoa que venha a serprejudicada.

Jáoart.43daLein.6.538/78estipulaumaagravantegenéricaparaoscasosemqueocrimeéperpetradoporquemseprevalecedocargoouabusadafunçãoemserviçopostaloutelegráfico.TalqualnasagravantesgenéricasprevistasnoCódigoPenal,olegisladornãoestabeleceoquantumdoaumento,ficandoesteacritériodojulgador.EmvirtudedosnovosdispositivosdaLein.6.538/78,o§3ºdo art. 151, CP, está totalmente revogado, não tendo mais nenhumaaplicabilidade.Quanto ao§ 2º domesmodispositivo, ainda temaplicação aoscrimesquenãoversamsobreoserviçopostaloutelegráfico,ouseja,aoscasosdoart.151,§1º,IIeIII,CP.

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Apossamentodecorrespondênciaparasonegaçãooudestruição

ConceitoO crime está disposto no art. 40, § 1º, da Lei n. 6.538/78: “Incorre nas

mesmaspenasquemseapossaindevidamentedecorrespondênciaalheia,emboranãofechada,parasonegá-laoudestruí-la,notodoouemparte”.

Este dispositivo revoga o art. 151, § 1º, I, CP, embora tenha redaçãosemelhante. Apenas promove a antecipação do momento consumativo dainfração,oqualanteriormenteocorriacomaefetivasonegaçãooudestruiçãoeagoraacontececomomeroapossamento.

SujeitoativoQualquerpessoa(crimecomum).

SujeitopassivoSão o remetente e o destinatário da correspondência (dupla subjetividade

passiva).

TipoobjetivoAcondutaconsistenoapossamentoindevidodacorrespondênciaalheiaafim

de sonegá-la ou destruí-la.Neste caso a correspondência pode ser fechada ouaberta.

TiposubjetivoOcrimesomenteépunidoatítulodedolo, inexistindofiguraculposa.Esse

doloéespecífico,poisexigequeoapossamentosedêcomofitodesonegaroudestruiracorrespondênciaalheia.

ConsumaçãoetentativaOcrimeseconsumacomoapossamento, sendoa sonegaçãooudestruição

parteda intençãodelitivacujaefetiva realizaçãoconsistirá emexaurimentodocrime.Assimsendo,trata-sedecrimeformal.Tambémnãoéprecisoqueoautordo crime chegue a tomar conhecimento do conteúdo da correspondência. Nocasodeoagentetomarconhecimentodoconteúdodacorrespondênciafechada,responderásomentepelocrimeemestudo,sendoaviolaçãodecorrespondênciafechadaabsorvida(PrincípiodaConsunção).Atentativaépossível.

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AumentodepenaeformaqualificadaVide comentários à figura anterior (arts. 40, § 2º, e 43, ambos da Lei n.

6.538/78).

AçãopenalPúblicaincondicionada.

Instalaçãoouutilizaçãoilegaldeestaçãoouaparelhoradioelétrico

ConceitoOcrimeéprevistonoart.70daLein.4.117/62:

Constituicrimepunívelcompenadedetençãode1a2anos,aumentadadametade se houver dano a terceiro, a instalação ou utilização detelecomunicações, sem observância do disposto nesta Lei e nosregulamentos.

Referidodispositivorevogouoart.151,§1º,IV,CP.Tambémnãoseaplicaaestecrimeacausadeaumentodepenaprevistano§2ºdoart.151,CP,vezqueestajáseencontraprevistanopróprioart.70daLein.4.117/62.

SujeitoativoCrimecomum(qualquerpessoa).

SujeitopassivoOEstadoesubsidiariamenteapessoaprejudicadapelacondutadoagente.

TipoobjetivoOsverbostípicossão“instalar”e“utilizar”,deformaquetantoainstalação

(montagem, preparação, colocação em funcionamento) como a utilização deaparelhagensinstaladasporoutremconstituemocrime.

Trata-se de norma penal em branco, vez que a instalação ou utilização detelecomunicações em si não é crime.Somentehá crimequando isso sedá emdesacordo com o disposto na “Lei e nos regulamentos”. A complementaçãonecessáriadanormaentãodeveserbuscadanobojodaprópriaLein.4.117/62eemregulamentaçõesdiversassobreainstalaçãoeutilizaçãodetelecomunicaçõeslegalmenteautorizadas.

Tiposubjetivo

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Éodolo,inexistindofiguraculposa.Odoloégenérico.

ConsumaçãoetentativaOcrimeseconsumacomainstalaçãoouutilizaçãodetelecomunicaçõesde

forma ilegal. O prejuízo eventualmente causado a terceiros será causa deaumentodepenaexpressamenteprevistanafigurapenal,masnãoénecessárioparaaconsumação.Admite-seatentativa.

AçãopenalPúblicaincondicionada.

Violaçãodecomunicaçãotelegráfica,radioelétricaoutelefônica

ConceitoEstabeleceoart.151,§1º,II,CP:

Namesmapenaincorrequemindevidamentedivulga,transmiteaoutremouutiliza abusivamente comunicação telegráfica ou radioelétrica dirigida aterceiro,ouconversaçãotelefônicaentreoutraspessoas.

SujeitoativoQualquerpessoa(crimecomum).Noentanto,seoautordocrimeatuacom

abusode funçãodo serviço telegráfico, radioelétricoou telefônico, aplica-seodisposto no art. 58, II, a e b, da Lei n. 4.117/62, que estabelece umaqualificadora,sendoentãoapenadedetençãode1a2anosouperdadocargopúblico.Nestescasosnãoincideoart.151,§3º,CP.

SujeitopassivoSãooremetenteeodestinatáriodacomunicaçãotelegráfica,radioelétricaou

telefônica.

TipoobjetivoSãoosverbos“divulgar”,“transmitir”e“utilizar”.Adivulgaçãodizrespeito

aoconhecimentodacomunicaçãoporumnúmeroindeterminadodepessoas.Jáatransmissãorefere-seaoconhecimentodadoaumapessoadeterminadaouaumgrupo determinado de pessoas. Sendo assim, bastará para a configuração docrimearevelaçãodoconteúdodacomunicaçãoparaumasópessoa.Autilizaçãoseconstituinousodoconteúdodacomunicaçãoparaqualquerfim.

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Note-se que a utilização do conteúdo de uma comunicação para o fim deobtervantagemeconômicaindevida,medianteoconstrangimentodavítimapormeiodechantagemouameaças,constituiocrimedeextorsão(art.158,CP),oqualabsorveodelitoemapreço.

Noqueserefereàscomunicaçõestelefônicasháentendimentodequehouvederrogaçãodoart.151,§1º,II,CP,peloart.10daLein.9.296/96(BARROS,1997,p.285;TELES,2004,p.320eJESUS,2005,p.286-287).

Discorda-sedesseenfoque,poisqueparecequeapenashaverádoiscamposde aplicação distintos reservados a cada tipo penal acima arrolado. Havendointerceptaçãopropriamentedita,demaneira ilegal, incidirá realmenteoart. 10da Lei n. 9.296/96. Observe-se que nesses casos a eventual divulgação doconteúdodascaptaçõesconstituir-se-áemmero“exaurimento”docrime,quejáse consumacomo ato anterior, não sendode se falar emconcursode crimes.Issoporqueoart.10daLein.9.296/96antecipouomomentoconsumativoparaa simples realização da interceptação, nãomais exigindo a divulgação para aconsumação do ilícito. De sua banda, o art. 151, § 1º, II, CP, será aplicávelsempre que houver algumadivulgação, transmissãoouutilização indevidas degravações ou captações que não sejam realizadas pormeio de interceptações.Assim,o atual tratamentodamatéria se completa, nãodeixandocomooutroraomissõesnaproteçãoàliberdadedascomunicações.

TiposubjetivoOelementosubjetivoéodolo,inexistindofiguraculposa.

ConsumaçãoetentativaO crime do art. 151, § 1º, II, CP, somente se consuma com a divulgação,

transmissãoouutilizaçãoindevidasdoconteúdodacomunicação.Atentativaéadmissível.

AumentodepenaeformaqualificadaApenaéaumentadadametadesehádanoaoutremnostermosdoart.151,§

2º,CP.Nãoseaplica,porém,o§3ºdoart.151,CP,seocrimeécometidocomabuso da função em serviço telegráfico, radioelétrico ou telefônico, já que talcaso foi abarcado pelo art. 58, II, b, da Lei n. 4.117/62, que determina aaplicaçãodapenaemdobroquandoocrimeforcometidoporautoridade.Acasoofuncionárionãosejaconsideradoautoridade,apenaserádedetençãode1a2anos ou perda do cargo ou emprego, nos termos do art. 58, II,a, da Lei n.

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4.117/62.Nenhumadessasdisposiçõeséaplicávelaoscasosdoart.10daLein.9.296/96.

AçãopenalNos termosdo§4ºdoart.151,CP,aaçãopenalépúblicacondicionadaa

representação.Odireitoderepresentaçãoseráexercidoindependentementepeloremetente e pelo destinatário, de forma que, havendo conflito de vontades,prevaleceráodesejoderepresentar.Noscasosdeincidênciadoart.10daLein.9.296/96aaçãopenalserápúblicaincondicionada.

ImpedimentodecomunicaçãoouconversaçãoConceito

Ocrimeéprevistonoart.151,§1º,III,CP,consistindonoimpedimentodecomunicaçãoouconversaçãotelegráfica,radioelétricaetelefônica.

SujeitoativoQualquerpessoa(crimecomum).

SujeitopassivoOremetenteeodestinatáriodacomunicação.

TipoobjetivoOverbo é “impedir”, ou seja, obstaculizar a comunicação.Neste caso não

importa a captação das comunicações pelo autor, mas o mero impedimentocausadoaoseulivreexercício.

TiposubjetivoOelementosubjetivodotipoéodolo(dologenérico).

ConsumaçãoetentativaA tentativa é admissível. O crime se consuma quando os comunicadores

tornam-seimpossibilitadosdecomeçaroucontinuaracomunicaçãonodecorrerdeumtempoconsiderável.

AumentosdepenaeformaqualificadaApenaéaumentadadametadesehádanoaoutremnostermosdoart.151,§

2º, CP. Não se aplica, porém, o § 3º do art. 151, CP, conforme já antesconsignado.

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AçãopenalPúblicaincondicionada.

Correspondênciacomercial(art.152,CP)Conceito

Oconceitoestáinsertonoart.152,CP,inverbis:

Abusardacondiçãodesócioouempregadodeestabelecimentocomercialouindustrial para, no todo ou emparte, desviar, sonegar, subtrair ou suprimircorrespondência,ourevelaraestranhoseuconteúdo.

SujeitoativoSomentepodemcometerocrimeosócioouempregadodeestabelecimento

comercialouindustrial,tratando-se,portanto,decrimepróprio.

SujeitopassivoÉoestabelecimentocomercialouindustrialdestinatáriodacorrespondência.

TipoobjetivoAcondutadescritanotipoconsisteemdesviar,sonegar,subtrairousuprimir

correspondência,ourevelaraestranhoseuconteúdo.Acorrespondênciadeveserdenatureza“comercial”,pois,casocontrário,haveráocrimeprevistonoart.40daLein.6.538/78.Éclaroquetambémacorrespondênciaemapreçodeveserdealgumarelevânciaparaaatividadecomercialouindustrial.Casocontrário,nãohavendo possibilidade de dano patrimonial ou moral à empresa, inexistirá ocrime.

TiposubjetivoÉodolo(dologenérico).

ConsumaçãoetentativaOcrimeseaperfeiçoacomoefetivodesvio,sonegação,subtração,supressão

ourevelaçãodacorrespondência.Atentativaépossível.

AçãopenalPúblicacondicionadaarepresentação(videart.152,parágrafoúnico,CP).

DivulgaçãodeSegredo(art.153,CP)

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ConceitoAdefiniçãodelitivaencontra-senoart.153,CP:

Divulgaralguém,sem justacausa,conteúdodedocumentoparticularoudecorrespondência confidencial, de que é destinatário ou detentor, e cujadivulgaçãopossaproduzirdanoaoutrem.

ObjetividadejurídicaProtegeodelitoemapreçoa liberdade individualdeguardar segredoscuja

difusãopodeensejardanoaalguém.

SujeitoativoSãoodestinatárioouodetentor(legítimoouilegítimo)dodocumentoouda

correspondência.

SujeitopassivoQualquerpessoaquepossaserprejudicadacomadivulgaçãodosegredo.

TipoobjetivoOs objetos materiais são o documento particular e a correspondência

confidencial.Odocumentopúbliconãoéprotegido,justamenteporserpúblico,ouseja,suanaturezaéseracessível.Acorrespondênciatambémdeverátratardeassuntoconfidencial,sigiloso,secreto.Se,porém,umsegredoétransmitidoemconfiançaaoutremporcomunicaçãoverbal,nãoháproteçãopenal,anãoserporcometimentodeeventualcrimecontraahonra(v.g.difamação).

O verbo utilizado pelo legislador é o “divulgar”, havendo discussão nadoutrina se basta que o segredo seja divulgado a uma só pessoa (CelsoDelmanto)ouseénecessárioquehajaoconhecimentoporváriaspessoasparaque o crime se aperfeiçoe (Nelson Hungria, Heleno Fragoso, MagalhãesNoronha, Euclides Custódio da Silveira, Damásio E. de Jesus, Cezar RobertoBitencourt,Mirabeteetc.).Temprevalecidoosegundoentendimento.

Otipopenalemestudoédotadodeumelementonormativo,consistentenafalta de justa causa para a divulgação do segredo. Havendo justa causa, adivulgaçãonãoconstituicondutacriminosa.Atente-seaindaparaofatodeque,dependendo da espécie de segredo e da finalidade do agente, podem ocorreroutroscrimesprevistosnopróprioCódigoPenalouemleisextravagantes.Porexemplo: violação de segredo profissional (art. 154, CP), violação de sigilo

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funcional(art.325,CP),violaçãodesigilodepropostadeconcorrência(art.326,CP), concorrênciadesleal (art.195,XIeXII,daLein.9.279/96),violaçãodesigilo empresarial (art. 169 da Lei n. 11.101/2005), revelação de notícia,informaçãooudocumento(art.144,CPM),crimecontraaSegurançaNacional(arts.13e21,daLSN)etc.

TiposubjetivoÉodolo(dologenérico).

ConsumaçãoetentativaO crime se consuma quando um número indeterminado de pessoas tem

conhecimentodosegredo.Atentativaéviável.

Formaqualificada(§1º-A)ALein.9.983/2000incluiuo§1º-Anoart.153,CP,incriminandodeforma

especial e mais gravosa a divulgação de informações sigilosas ou reservadas,verbis: “divulgar, sem justa causa, informações sigilosas ou reservadas, assimdefinidasemlei,contidasounãonossistemasdeinformaçõesoubancodedadosdaAdministraçãoPública”.Apenaprevistaédedetençãode1a4anos,emulta.

Ocrimenãoéfuncional.Trata-sedecrimecomum,masosujeitopassivoéoEstado. Também se trata de uma norma penal em branco, pois que asinformaçõesreservadastransmitidasaterceirosdevemseracobertadasporsigiloimpostopor leiquecomplementaráanormapenalsobcomento.A informaçãoconsiderada sigilosa devido a decretos ou atos administrativos (portarias,resoluçõesetc.)nãoestáacobertadapelanorma.

Asnormasquecomplementemamatériaestãodispostasbasicamentenoart.23daLein.8.159/91,Decreton.4.553/2002,Lein.11.111/2005eDecreton.5.301/2004.

AçãopenalA regra para esse crime, conformedispõe o § 1º do art. 153,CP, é a ação

penalpúblicacondicionadaarepresentação.Noentanto,sejanoscasosdocaputoudo§1º-A,aaçãoserápúblicaincondicionada,semprequehouverprejuízoàAdministraçãoPública(§2ºacrescidopelaLein.9.983/2000).

ViolaçãodeSegredoProfissional(art.154,

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CP)Conceito

O crime de violação de segredo profissional está ligado à característicainerente a determinadas atividades em que as pessoas confiam segredos aindivíduos que exercem a prestação de serviços, aconselhamentos, orientaçõesetc.Estessãooschamados“confidentesnecessários”,osquaisestãoobrigadosaguardarsigiloemvirtudedaconfiançaquelhesédepositadadevidoaoexercíciodecertasfunções,atividadesouprofissões.

ObjetividadejurídicaProtegeanormaaliberdadeindividualdemantersegredos,cujadivulgação

possaproduzirdanoaoutrem.

SujeitoativoA temática do sujeito ativo deste crime tem proporcionado abordagens

divergentes nos ordenamentos jurídicos, podendo-se identificar três sistemasbásicos:a)SistemadaIndicaçãoTaxativa–adotadonaAlemanha,estabelecenopróprio

tipo penal de forma expressa as pessoas que podem incorrer no crime deviolaçãodesegredoprofissional.

b)SistemadaEnumeraçãoExemplificativa – adotado na França, utiliza-se dométodode interpretaçãoanalógica,arrolandoalgunsexemploscasuísticosefechandoadicçãolegalcomumafórmulagenéricaafimdeabrangercasossimilares.

c)SistemaAberto–adotadonaItália,ondeotipopenalnãoapresentanenhumafórmula casuística, reduzindo-se a afirmar genericamente as atividades quedevemguardarsegredo.EsteéosistemaadotadotambémpeloCódigoPenalBrasileiro.Ocrimesobcomentoépróprio,somentepodendocometê-looexercentede

função,ministério,ofícioouprofissãoquetenhacomoinerenteàsuaatividadeoconhecimento de segredos aos quais fique vinculado em termos de sigilo (v.g.sacerdotes, advogados, médicos, dentistas, psicólogos, fisioterapeutas,massagistas, parteiras, enfermeiras etc.).Tambémpodem responderpelo crimeos auxiliares dos respectivos profissionais, como por exemplo, estagiários,secretárias,enfermeirasetc.

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O conhecimento do segredo deve dar-se por ocasião do exercício daatividade respectiva. Não libera o agente do dever de sigilo o fato de haverdeixadoaatividade.

O art. 154, CP, refere-se à revelação de segredos relativos a atividadesprivadas. A violação de sigilos relacionados a funções públicas é punida deacordo com o disposto no art. 325,CP. Frise-se ainda que, se a revelação forreferente a proposta apresentada em licitação, configurado estará o crimeespecialdoart.94daLein.8.666/93,oqualrevogoudeformatácitaoart.326,CP. Também podem ocorrer outros crimes especiais, tais como: violação desigilodeinstituiçãofinanceiraousigilobancário(art.18daLein.7.492/86),usoindevidodeinformaçãoprivilegiadanomercadodevaloresmobiliários(art.27-D da Lei n. 6.385/76, com as alterações da Lei n. 10.303/2001), violação desegredo relativo a serviço postal ou telegráfico (art. 41 da Lei n. 6.538/78),violação de sigilo empresarial (art. 169 da Lei n. 11.101/2005 – crimefalimentar)etc.

Algunscasosespeciaismerecemanálise:a)Barbeirosecabeleireiros–normalmentenãoestãoobrigadosaosigilo,salvo

quandooconhecimentoobtido revele-se inerenteaoexercíciodaprofissão.Por exemplo, revelar o fato de que os cabelos de pessoa que tinge sãogrisalhos.

b)Empregadosdomésticos–aquestãoécontroversa.Algunsautoresadmitemos empregados domésticos (faxineiras, diaristas, motoristas particulares,copeiras,cozinheiras,jardineirosetc.)comoautoresdocrime,vezqueseriam“confidentesnecessários”emrazãodanaturezadesuasatividadesexercidasno recesso do lar (v.g. Euclides Custódio da Silveira, Adilson Mehmeri).Outros negam tal possibilidade, vez que o conhecimento de segredos ouintimidadesdospatrõesnãoénecessárioparaoexercíciodeseusrespectivosmisteres. Tal conhecimento dar-se-ia tão somente pormera indiscrição daspessoasenvolvidas,razãopelaqualafastadaahipótesedeincidênciadoart.154,CP,aosdomésticos(v.g.FlávioAugustoMonteirodeBarros).Háaindaaquelesqueadotamumaposiçãointermediária,afirmandoquepoderiaexistiro crime para os domésticos excepcionalmente, desde que comprovado queabusaram de suas funções revelando segredos íntimos dos patrões a quetiveram acesso devido a um relacionamento de amizade e confiança (v.g.Mirabete,PauloJosédaCostaJúnior).Emnossoentendimentorazãoassisteaosquereputamexcluídosdopoloativodestecrimeosdomésticos,vezquenãosetratade“confidentesnecessários”.Elespodemperfeitamenteexercer

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seusmisteresno lar semnecessidadealgumade inteirarem-sedossegredosdospatrões.Efetivamenteesseconhecimentosedáporsimplesliberalidadeouleviandadedaspessoasenvolvidasnarelaçãodeemprego.

c)Herdeirodoprofissionalfalecido–estenãorespondepelocrimenocasoderevelarsegredoprofissionalaqueteveacessoporintermédiodoprofissionalmorto. Afinal, tal conhecimento não foi obtido por meio do exercício defunção,ministério,ofícioouprofissão, eaobrigaçãodeguardade segredo(denaturezapersonalíssima)nãopodesertransmitidaporlegadoouherança(nestesentido:MagalhãesNoronhaeFlávioAugustoMonteirodeBarros).

d) Jornalistas – estes profissionais não estão obrigados ao sigilo. Aliás, suafunçãoérevelarasnotíciasaopúblico.Trata-sedeindiscriçãoeimprudênciade quem revela segredos a estes profissionais. No máximo, poderá ojornalista,emcertoscasos,serresponsabilizadoporcrimescontraahonraeserobrigadoaindenizaçãopordanosmoraisemateriais,nostermosdoart.5º,V,CF.Por fim, é interessante anotar a orientação de FlávioAugustoMonteiro de

Barros, a fim de obter um critério razoavelmente seguro para a distinção doscasos em que haverá dever de sigilo e, portanto, incidência do tipo penal sobcomento:

Opontobásicodasoluçãoresidenadistinçãoentreconfidêncianecessáriaevoluntária,sóconfigurandoodelitonaprimeirahipótese.Confidência necessária é a revelada a pessoas que, para bem desenvolver afunção,ministério,ofícioouprofissãodeveminteirar-sedesegredosalheios.Confidênciavoluntáriaéareveladaapessoascujamissãonãoéaderecebersegredos(BARROS,1997,p.302-303).

SujeitopassivoÉ o titular do segredo a pessoa física ou jurídica à qual pertencem as

informações confidenciais. Com a morte do sujeito passivo do crime, aindasubsiste a necessidade de guardar o segredo, desde que a revelação possaprejudicar terceiros (parentes, cônjuge, herdeiros etc.). Se não houverpossibilidade de dano a terceiros, porém, com a morte do sujeito passivo arevelaçãodosegredoestaráliberada.

TipoobjetivoAcondutaconsisteem“revelar”osegredo,transmitiraterceirosinformações

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sobreintimidadesdepessoaquedesejaocultartaisfatos,devidoàpossibilidadedeocorrênciadedanomaterialoumoral.Nestecasobastaráparaaconfiguraçãododelitoarevelaçãodosegredoaumaúnicapessoa,nãonecessitandoquetalsedêaumnúmeroindeterminadodepessoas.

Ocrimeédeformalivreepodeinclusivesercometidoporomissão,desdequeoautortenhaodeverjurídicodeguardarosegredo.

Quandoapessoaaqueméreveladoosegredojátinhaciênciaanteriormentedeste, por exemplo, por narrativa da própria vítima, configura-se crimeimpossível(art.17,CP).

É importante anotar que o segredo revelado deve versar sobre fatoverdadeiro.Seanotíciareveladapeloautoréfalsa,configura-sesomentecrimecontraahonra.Osegredotambémdeveserdotadodepotencialdecausardanomaterialoumoralaoutrem.A revelaçãode fatos inócuosexcluiocrime.Nãoobstante, não é preciso que ocorra efetivamente o dano, bastando apotencialidade,demaneiraquesetratadecrimeformal.

Também é imprescindível para configuração do delito a satisfação doelementonormativodotipo,ouseja,quearevelaçãodosegredosedê“semjustacausa”. São exemplos de justa causa: a notificação compulsória feita pelomédico de determinadas doenças, sendo que, pelo contrário, a falta denotificação é que configurará omissão ilícita nos termos do art. 269, CP; acomunicação à autoridade competente pelo médico ou outras profissõessanitárias de crime de ação penal pública de que tenha conhecimento noexercício da profissão, desde que a ação não dependa de representação e ainformação não exponha o paciente a processo criminal (ver art. 66, LCP);especificaçãodacausadamorteematestadosdeóbito,nostermosdoart.80,n.8, daLei n. 6.015/73; todos os casos previstos no art. 73 doCódigo deÉticaMédica(ResoluçãoCFM1.931/2009).Tambémhaverájustacausaseoprópriotitular do segredo liberar sua revelação, já que se trata de bem jurídicodisponível.Na verdade não há um critério seguro ou um rol de situações quepossaesgotarashipótesesdejustacausapararevelaçãodosegredo.Somenteaanálisedocasoconcretosolucionaráaquestão.

Questãocontrovertidaéaquelaqueversasobreapossibilidadeounãodeomédicoouadvogadorevelarsegredosdopacienteouclientenobojodeprocessodecobrançadehonorários.Adoutrinasedivide,masprevaleceoentendimentodequepodehaverarevelação,desdequesedetenhanadescriçãoabsolutamentenecessária para o conhecimento da questão atinente aos honorários. Há

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entendimento de que a justa causa para a revelação do segredo nestes casosdependeria do sucesso ou não da ação de cobrança (Florian), o que tem sidoveementementerechaçadopelamodernadoutrina(BARROS,1997,p.314).

TiposubjetivoOcrimeédoloso(dologenérico).Nãoháformaculposa.

ConsumaçãoetentativaO crime se aperfeiçoa quando alguém toma conhecimento do segredo. A

tentativaépossível,especialmenteporescrito.

AçãopenalA ação penal é pública condicionada a representação (art. 154, parágrafo

único,CP).

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PARTEIIDosCrimesContraoPatrimônio(arts.155a

183,CP)

Furto(art.155,CP)

FurtodeCoisaComum(art.156,CP)

roubo(art.157,CP)

Extorsão(art.158,CP)

ExtorsãoMedianteSequestro(art.159,CP)

ExtorsãoIndireta(art.160,CP)

AlteraçãodeLimites,UsurpaçãodeÁguaseEsbulhoPossessório(art.161,CP)

SupressãoouAlteraçãodeMarcaemAnimais(art.162,CP)

Dano(art.163,CP)

IntroduçãoouAbandonodeAnimaisemPropriedadeAlheia(art.164,CP)

ApropriaçãoIndébita(art.168,CP)

ApropriaçãoIndébitaPrevidenciária(art.168-A,CP)

ApropriaçãodeCoisaHavidaporErro,CasoFortuitoouForçadaNatureza;ApropriaçãodeTesouroeApropriaçãodeCoisaAchada(art.169eparágrafoúnico,IeII,CP)

Estelionato(art.171,CP)

DuplicataSimulada(art.172,CP)

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AbusodeIncapazes(art.173,CP)

InduzimentoàEspeculação(art.174,CP)

FraudenoComércio(art.175,CP)

OutrasFraudes(art.176,CP)

FraudeseAbusosnaFundaçãoouAdministraçãodeSociedadesporAções(art.177,CP)

EmissãoIrregulardeConhecimentodeDepósitoouWarrant(art.178,CP)

FraudeàExecução(art.179,CP)

Receptação(art.180,CP)

DisposiçõesGeraisdosCrimesContraoPatrimônio(arts.181a183,CP)

Furto(art.155,CP)Conceito

Oconceitodefurtoestáexplícitonoart.155,caput,CP,comoa“subtraçãodecoisaalheiamóvelparasiouparaoutrem”.

ObjetividadejurídicaDiscute-senadoutrinaacercadofurto tutelaraposseouapropriedade.No

entanto,aconclusãoédequetutelaigualmenteapossecomoapropriedade.

SujeitoativoCrimecomum.Qualquerpessoapodepraticar.

SujeitopassivoTanto a pessoa física como a pessoa jurídica que tenham a posse ou a

propriedade.

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TipoobjetivoAação é “subtrair”, que significa tirar.O objetomaterial é a “coisa alheia

móvel”.Nãopodemserobjetodefurtoosdocumentos.Nestecasoconfigura-secrime

específico previsto no art. 305, CP. Partes de uma casa podem ser objeto defurto,masdeve-se teremmentequeoimóvelcomoumtodoé insuscetíveldesubtração.Asárvores,navioseaeronavessãoequiparadasaimóveisnoDireitoCivil,masnoPenalpodemserobjetodefurto.

Acoisamóvelalheiaparaserobjetodefurtodeveserdotadadealgumvalorfinanceirooupatrimonial.

Ar, água dos rios emares, luz natural, não podem ser objeto de furto porserem “coisas comuns ou de uso comum”. Isso a não ser que sejam“destacados”,comoporexemplo,oarcomprimido,águaemrecipientesetc.Aáguafornecidapelasempresasdeabastecimentoetratamentotambémpodeserobjetodefurto,vezquedeixadeserbemdeusocomum,medianteacobrançaparaseuconsumo(TELES,2004,p.348).

O desvio de um curso d’água de uma propriedade vizinha para outra nãoconfigurafurto.Nestecasohácrimeespecíficode“usurpaçãodeáguas”noart.161,I,CP,alémdepossívelcrimeambiental(Lein.9.605/98).

Tambémacaçaouapescanapropriedadealheiadeveserdistinguida:a)seosanimaisoupeixessãoselvagens,poderáhaverapenascrimeambiental(Lein.9.605/98); b) se os animais ou peixes são criados em cativeiro, como porexemplo,poçosdepeixesempesqueiros,hácrimedefurto.

No que tange à relação entre a coisa e eventual proprietário, certasexpressões latinas são relevantes: a) Res Nullius – coisas que nunca tiveramdono (não há crime no apossamento); b) Res Delericta – coisas que foramabandonadas(tambémnãohácrimenoapossamento);c)ResDeperdita–coisasperdidas. Neste caso pode haver crime no apossamento, mas não o crime defurto. Ocorrerá, eventualmente, uma modalidade de apropriação indébitadenominada“apropriaçãodecoisaachada”,previstanoart.169,II,CP.

Também,segundoadoutrina,partesdocorpohumanopodemserobjetodefurto, desde que tenham possibilidade e finalidade de destino financeiro (v.g.cabelos, dentes etc.).Obviamente tambémpodem ser objetode furto próteses,peçaspostiçasacopladasaocorpohumano,comodentaduras,perucas,aparelhosortopédicosetc.

O cadáver também pode ser objeto de furto, dependendo da finalidade do

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agente.Seelesubtraiocadáverparaexplorarseuvaloreconômico(ex.:subtraium cadáver de uma faculdade de medicina para vendê-lo a outra ou parapesquisadores), há crime de furto. Nos demais casos haverá o crime de“subtraçãodecadáver”(art.211,CP).

Há discussão na doutrina sobre se a subtração de folhas ou de talão decheques configura furto. Hoje parece pouco defensável a tese de que nãoconstituiria,vezqueindubitavelmentetêmelasvaloreconômico.Noentanto,seo agente utiliza os cheques depois, há crime de estelionato que, segundoentendimentopredominante,absorveocrimeantecedentedefurto,consideradomerocrime-meio.

Situação intrincada é aquelade alguémque temapossedeumacoisa, porexemplo,comodepositário,eoproprietáriodacoisa lhesubtrai.Haverianestecasocrimedefurto?

Arespostaquantoàocorrênciaounãodefurtoésimples:nãohaveriafurto,vezqueacoisasubtraídanãoé“alheia”,demodoquefaltaumelementodotipopenal. O problema torna-se mais difícil quanto à tipificação da conduta doagente.Seodepósitosedáaoterceiroporforçadeordemjudicialoucontrato,haveráclaramenteatipificaçãodoart.346,CP(nestesentido:NelsonHungria,HelenoFragoso,DamásioE.deJesusePauloJosédaCostaJúnior).Mas,seodepósitodecorredeoutrosfatoresquenãoordemjudicialouconvenção,comoporexemplo,umadeterminaçãodeautoridadeadministrativa,comoocorrenoscasosdeapreensãodeveículosdevidoafaltade licenciamento,oproblemadatipificaçãotorna-secomplicado.Jánãoéaplicáveloart.346,CP,quesomentetemrelaçãocomordensjudiciaisoucontratos.Poder-se-iapensarnatipificaçãodoart.345,CP.Noentanto,tratando-sedeaçãopraticadasemviolênciaougraveameaça,ocrimeseriadeaçãopenalprivada.Nestecasoquema intentaria?ODetran?APolíciaMilitar?OdepositáriocredenciadopeloEstado?Naverdade,aúnica solução viável seria a responsabilização do agente pelo crime dedesobediência (art. 330, CP) (observe-se a dissidência doutrinária deNORONHA, 1990, p. 209-212, para quem em ambos os casos ocorreria furtomesmo, e de BITENCOURT, 2008, p. 9-12, para quem o fato seriaabsolutamenteatípico,afastandotambémosarts.346e330,CP).

TiposubjetivoÉinformadopelodolo,inexistindofiguraculposa.Odolo,queéespecífico,

sedivideemdoisaspectos:AnimusFurandi(vontadedesubtrair)eAnimusremsibihabendi(desejodeseapossardacoisaalheia,parasiouparaoutrem).

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Emboraocrimesejapatrimonial,nãohánecessidadedointuitodelucro.Oautordocrimepode,porexemplo,apossar-sedacoisaporvingança,capricho,inveja,superstiçãoetc.Noentanto,issonãoinvalidaaafirmaçãodequeodolodeveserespecífico.Asubtraçãodevesercomointuitoespecíficodeficarcomacoisa para si ou para outrem. É neste aspecto que o dolo é consideradoespecífico.

Por derradeiro deve-se abordar a questão da relevância ou não doconsentimentodavítimanasubtraçãoparaaconfiguraçãodocrimedefurto.

Amatériaéobjetodeacesascontrovérsias,vezqueopatrimônioéumbemjurídicodisponível,deformaqueseriadefensávelatesedequeoconsentimentoda vítima elidiria a tipificação criminal.De outra banda, deve-se considerar aopçãodolegisladorpátrio,elegendoaaçãopenalpúblicaincondicionadaparaocrimedefurto,demaneiraatornaroconsentimentodavítimairrelevanteparaaatuaçãoestatal.

Nadoutrina, afirmamalgunsautoresque seoconsentimentoocorreapósaconsumação é irrelevante, mas se ocorre antes ou concomitantemente àsubtração afasta o crime (v.g. Mirabete, José Henrique Pierangeli). Outrosafirmam que o consentimento da vítima elide o crime, sendo seu dissensoelemento implícito do delito enfocado (v.g. Magalhães Noronha, AdilsonMehmeri,CezarRobertoBitencourt,FernandoCapez,MauricioAntonioRibeiroLopes). O entendimento que nos parece mais coerente é o de que oconsentimentodavítimaelideocrime,vezquesetratadetuteladopatrimônio,o qual é, sem dúvida, bem jurídico disponível. Embora a necessidade dodissensonãosejaexpressanotipopenal,comoocorre,porexemplo,comocasodo crime de violação de domicílio, este encontra-se implícita ou tacitamentepresente.Aafirmaçãodanecessidadedequetalconsentimentosejaanteriorouconcomitante à subtração significa, anossover, nadamaisdoquea filiaçãoàconvicçãodequeoconsentimentodavítimaé irrelevante,poisaexigênciadequetalconsentimentosedêantesouconjuntamenteàsupostasubtraçãoequivalea dizer somente que quando não há subtração não há furto, o que, com todorespeito,édizeroóbvio.Ora,seoapossamentodobeméautorizadopelavítimaantesouconcomitantementeàsuaefetivação,simplesmentenãohouvesubtraçãoalguma. Então se o consentimento se dá depois e é considerado inválido paraafastar a tipicidade, tal entendimento equivale à afirmação de que no furto oconsentimentodavítimaéirrelevante.

NãosedeveconfundiroDireitoMaterialcomoFormalouAdjetivo.Ofatodeocrimedefurtoserdeaçãopenalpública incondicionadanãopode levara

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conclusões acerca da configuraçãomaterial do ilícito. Isso equivaleria a dizerquequandoumapessoaéagredida,sofrendolesõesleves,edeixaderepresentar,não ocorreu crime algum. Na verdade, o crime (Direito Material) ocorreu,apenasnãoseráintentadaaçãopenal(DireitoFormal).Nãoobstanteisso,seriamuitobem-vindaumaalteraçãoqueéprevistanoProjetodeCódigoPenalemestudo no Congresso Nacional, tornando o furto crime de ação penal públicacondicionadaarepresentaçãodoofendido,oquedeixariabemmaisexplícitaarelevânciadoconsentimentodoofendidoparaaconfiguraçãodaconduta,bemcomoanaturezadisponíveldopatrimônio.

ConsumaçãoetentativaA jurisprudência adotou a “Teoria da Inversão da Posse”, entendendo-se

comoconsumadoofurtoquandooagentetema“possetranquilaoudesvigiada”da coisa, ainda que por pouco tempo. A tentativa é possível, pois se trata decrimematerial.

Distinçãoa) Quem adultera sinal identificador de veículo furtado não é coautor ou

partícipedofurto,maspraticaocrimeautônomoprevistonoart.311,CP.b)Quemsubtraicoisaalheiaparasatisfazerpagamentodedívidaquetempara

com a vítima na condição de credor comete não crime de furto, mas sim“ExercícioArbitráriodasPrópriasRazões”(art.345,CP).

c) Subtração de Nota Promissória e sua destruição constitui o crime de“SupressãodeDocumento”(art.305,CP).

d) A “Trombada” ou “Arrebatamento” pode caracterizar furto ou roubo deacordocomograudeviolênciaempregado.

e)Adquirircoisasfurtadaspodeconfigurarocrimedereceptação(art.180,CP).f)Ajudaroautordofurtoaocultararesfurtiva,nãohavendoconcertoprévio,

configura o crime de “Favorecimento Real” (art. 349, CP). Se houverconcertoprévio,hácoautoriaouparticipaçãonofurtooumesmoreceptação.

g)Basicamenteadiferençaentreofurtoeorouboéoelementodaviolênciaougrave ameaça ou ainda de meio que impossibilite a resistência da vítimaexistentenosegundo.

Furtodeenergia(art.155,§3º,CP)Equiparouolegisladoràcoisamóvelaenergiaelétricaouqualqueroutraque

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tenha valor econômico (ex.: térmica, solar, atômica etc.). A equiparaçãoanteriormentesomentesedavanocampopenal.Noentanto,comoadventodonovoCódigoCivil,dispõealeiemseuart.83,I,que:“considera-secoisamóvelparaefeitoslegais:I–asenergiasquetenhamvaloreconômico”.Destaformaháatualmenteumaharmoniasistemáticaentreoscamposcivilepenal.

Note-se que na Exposição de Motivos do Código Penal menciona-se a“energiagenéticadosreprodutores”comoexemplodecasodefurtodeenergia.HouvenestepontoumequívocodoilustreMinistroFranciscoCampos,vezquenestescasosconfigurar-se-áafiguratípicaordináriadofurto,jáqueosêmenécoisapassíveldeapreensãoe remoção,ouseja,coisanaturalmentemóvel,nãonecessitandovaler-seoaplicadordoDireitodaequiparaçãolegal.

Cabeobservarquedependendodaformacomoseobtémodesviodaenergiaelétricapodevariaratipificaçãopenaldaconduta.Vejamos:a)Seoagentedesviaaenergia,fazendocomquenãopasseesejaregistradapelo

medidor da empresa fornecedora, haverá realmente o chamado “furto deenergia”.Nalinguagempopularsãoosconhecidos“gatos”.

b)Noentanto,seoagentesimplesmentefraudaomedidor,deixandoqueenergiapasse por ele, mas não seja devidamente registrada, logrando enganar aempresa fornecedora, obtendo vantagem indevida em prejuízo alheio, ocrimeserádeestelionato.Outraquestãorelevanteeatualsãooscasosdefraudepara recebimentode

sinal de TV fechada e para utilização de pulsos telefônicos. Será que nestescasos configurar-se-ia crime de furto de energia, furto comum ou ainda furtoqualificado?

Certamente o sinal de TV a cabo ou por assinatura, bem como os pulsostelefônicos,nãopodeserconsideradocoisamóvel,nempodeserequiparadoaestas por força do disposto no § 3º do art. 155, CP, vez que não é de formaalguma “energia”. Qualquer aproximação configuraria espúria analogia inmallampartem.CezarRobertoBitencourtsinalizanestesentido,masdeixaemabertoaquestãoquantoàatipicidade relativaouabsolutadaconduta,dandoaentender que se posiciona pela atipicidade absoluta (BITENCOURT, 2008, p.66-67). Discordamos parcialmente desse respeitável entendimento, poisconfigura-se claramente o estelionato, uma vez que o autor da conduta obtémvantagem econômica indevida, induzindo a empresa de TV ou de telefonia aerro.

Discute-se ainda na doutrina se o crime de furto de energia configuraria

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crime continuadoou crimepermanente.No crime continuado o agente praticavárias condutas, as quais, cada uma de per si, constituem crime. Já no crimepermanente,oagentepraticaumacondutacujaconsumaçãoseprotrainotempo,dependendodavontadedoagente.Nasubtraçãodeenergiaelétricaocrimeseconsumaquandooagentefazaligaçãoclandestinaecomeçaausufruirdesta.Aconsumação vai se alongando no tempo, enquanto o agente pretenderpermanecer sendo beneficiado pela subtração. Resta claro que se trata dehipótesedecrimepermanente.

Furtonoturno(art.155,§1º,CP)Aleipenalprevêumaumentodepenaemfacedamenorvigilânciaexistente

noperíododerepousonoturno,deixandoobemcommenorproteçãoe,portanto,demonstrandomaiorperigonacondutadoagente.

Deve-se lembrarque“repousonoturno”nãoésinônimode“noite”.Estasecaracterizapelaausênciadeluzsolar.Jáorepousonoturnorefere-seaohorárioemqueaspessoascostumamdormir.

Indaga-se se é necessário que a casa esteja habitada ou que osmoradoresestejamdormindoefetivamente,bemcomoseoaumentodepenaseaplicaaoscasos de furtos ocorridos na via pública, em veículos ou em estabelecimentoscomerciaisouindustriais.

Ajurisprudênciasedivide,havendodecisõesnosentidodeapenasimportarohorárioetambémoutrasemsentidoinverso,dizendonãoserpossíveloaumentoseosmoradoresestãodespertos,seacasaestásemninguémouaindaemfurtosnaruaouemestabelecimentoscomerciaisouindustriais.

A posição mais correta, em nosso entender, seria aquela que considera ohorárioprimordial,nãolevandoemconsideraçãocircunstânciasoutras,porqueoaumentodepenaserefereàqueleindivíduoquerevelamaiorpericulosidadeaoescolher o horário noturno,mais propício à prática do furto, colocando assim,emtese,obemjurídicosobmaiorperigodedano.Amaioriadadoutrinaapontaparaestasolução,sendoexemplosFernandoCapez,HelenoFragoso,BentodeFaria,DamásioE.deJesus,RomeudeAlmeidaSallesJúnior,NeyMouraTeles,MagalhãesNoronha,PauloJosédaCostaJúnioreMirabete.Estetambémfoioposicionamento adotado pela Primeira Conferência dosDesembargadores. Emsentido contrário, destacando que a jurisprudência predominante afasta oaumentoquandoacasaestádesabitada,osmoradoresestãodespertos,ouquandoo furto se dá na rua ou em estabelecimento comercial ou industrial ondeninguém permanece dormindo à noite, podem-se arrolar: José Henrique

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Pierangeli, Celso Delmanto e Cezar Roberto Bitencourt. Embora ajurisprudênciadominanteaponteparaoafastamentodamajorantenoscasossobestudo,destacaCapezqueoSuperiorTribunaldeJustiçaeoSupremoTribunalFederal já decidiram por sua configuração baseada tão somente no critério dohorário(CAPEZ,2010,p.385).TambémDamásiochamaaatençãoparaofatodequeateseoradefendidafoipredominantenoTribunaldeAlçadaCriminaldoEstadodeSãoPaulo(JESUS,2005,p.315).

Éincontroversoqueoaumentodepenapelofurtonoturnosótemaplicaçãoparaoscasosdefurtosimples,enãoparaosfurtosqualificados.Comacertoanosso ver manifesta-se Paulo José da Costa Júnior, afirmando que acircunstânciadeofurtohaverocorridoduranteorepousonoturno,noscasosdefurto qualificado, pode ser levada em conta na aplicação da pena comocircunstância judicial, nos termos do art. 59, CP (COSTA JÚNIOR, 2010, p.319).

Furtoprivilegiado(art.155,§2º,CP)Paraaconfiguraçãodofurtoprivilegiadodevemconcorrerdoisrequisitos:a)

criminosoprimário;b)coisadepequenovalor.Primário é todo aquele que não ostenta condenação criminal transitada em

julgadoantesdapráticadocrimee tambémaquelecondenadoapós5anosdocumprimentoouextinçãodapenaimposta.

Encontra-sediscussãonadoutrinaenajurisprudênciaquantoàpossibilidadeda exigência pelo juiz de outros requisitos subjetivos para a concessão dobenefício, além daqueles preconizados expressamente na lei (primariedade epequeno valor da coisa). Tem-se discutido se poderiam ser levados emconsideração também fatores como maus antecedentes, conduta social oupersonalidadedoréuetc.

Aquisecolocaaquestãodeseojuiz“pode”ou“deve”aplicaradiminuiçãosemprequeo réu satisfizerosdois requisitosexplícitosna lei.Oupodeo juizavaliaroutrosfatoresedecidirlivrementeseoréufazjusounãoaobenefício,emborasatisfeitosaquelesrequisitoslegalmenteestabelecidos?

Quantoaissoadoutrinaeajurisprudênciasedividem:a)Afirmamalgunsqueojuiz“pode”aplicarobenefício,podendoavaliaroutros

fatores,ouseja,mesmopresentesosrequisitoslegais,ojuizpodedeixardereconhecer o privilégio. Isso porque o verbo “poder” utilizado pela leideixariaclarotratar-seoreconhecimentodoprivilégiodemerafaculdadedo

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julgador(v.g.DamásioE.deJesuseMirabete).b)Ojuiz“deve”aplicarobenefícioquandopresentesasduascondiçõeslegais,

sendo-lhevedadasoutrasconsiderações,sendofatoqueconstituioprivilégio“direito público subjetivo do réu” que preenche os requisitos legalmenteprevistos (v.g. Celso Delmanto, Paulo José da Costa Júnior, Luiz RegisPrado,JoséHenriquePierangeli,FernandoCapez,NeyMouraTeles).Alémdeprevalecer,éamelhordoutrinaaquelaqueseposicionadeacordo

comasegundaorientaçãosupraexposta,vezquesatisfeitososrequisitosdoart.155,§2º,CP,surgeum“direitopúblicosubjetivodoréu”,nãopodendoojuizdeixardeaplicarodispositivo.EmumEstadoDemocráticodeDireitonãosãoconcebíveispoderespessoaisconferidosaquaisquerautoridades.Todopoderéum poder-dever e todas as decisões devem ser fundamentadas sob pena denulidade(videart.1ºc/c93,IX,CF).Ora,presentesosrequisitoslegaisesendoestes devidamente reconhecidos pelo julgador, como poderia fundamentarconsistentementesuadecisãodenãoaplicarabenesse,deformaquenãoatuassepormerocaprichoouexercíciodeumpoderpessoal?

Quantoaopequenovalordacoisatemsidoquasepacíficanajurisprudênciaaorientaçãoquedefineovalordeumsaláriomínimovigenteàépocadofato.Noentanto,hádoisoutrosposicionamentosminoritáriosnostribunais:a) levaremconsideraçãoaspossesdavítima;b)nãoexistênciade regra rígida,devendoopequenovalorseraferidoemcadacasoconcreto.

Certamente uma das maiores polêmicas neste campo refere-se à distinçãoentre“pequenovalordacoisa”e“pequenoprejuízo”.Opequenovalorserefereao valor da coisa quando da subtração. Já o pequeno prejuízo se refere aomomentoposterior,deacordocomarecuperaçãototalouparcialdaresfurtiva.

Aquestãoéimportanteporquehátendêncianajurisprudênciaempretenderequipararo“pequenovalor”ao“pequenoprejuízo”,oquenãonosparecejusto.Talentendimentofazmençãoaodispostonoart.171,§1º,CP,quefazreferênciaexpressaao“pequenovalordoprejuízo”,aplicando-seasmesmasregrasdoart.155,§2º,CP,eentãoconcluindopelainjustiçaderestringirnocasodofurtooprivilégio somente aos casos de “pequeno valor”. Damásio faz interessanteexposiçãododebatejurisprudencialsobreotema,concluindonosentidodequeparaofurtodeve-selevaremcontaovalordacoisa,enãoodoprejuízo(JESUS,2005,p.316-321).

Outra indagaçãopertinentediz respeitoàpossibilidadeounãodeaplicaçãodo privilégio aos casos de furto qualificado, ou seja, seria possível haver um

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furtoconcomitantementeprivilegiadoequalificado?A doutrina tem se posicionado majoritariamente pela impossibilidade de

combinação entre privilégio e qualificadoras no caso do furto, mas vem ajurisprudência, inclusivedoSTJ (EREsp842425/RS),decidindopelaadmissãodaconciliaçãodoprivilégiocomaqualificação.Emnossoentenderoprivilégionocrimedefurtoéplenamentecompatívelcomasqualificadorasaliprevistasno§ 4º, isso porque se trata de circunstâncias objetivas que não apresentamincompatibilidadealguma.

O § 2º do art. 155, CP, possibilita ao legislador três opções de benesses aserem concedidas pelo juiz ao infrator em caso de reconhecimento do furtoprivilegiado,quaissejam:substituirapenadereclusãopordetenção,diminuí-lade um a dois terços ou aplicar somente a pena de multa. Poderia o julgadorsubstituirapenadereclusãopordetençãoeaindadiminuí-la?

A resposta é positiva, vez que o legislador pode inclusive optar por nãoaplicar qualquer espécie de pena privativa de liberdade, escolhendo apenas apenademulta.Ora,quempodeomaispodeomenos.

Furtoqualificado(art.155,§4º,CP)Apenaparaoscasosdefurtoqualificadoédereclusão,dedoisaoitoanos.

São casos emqueo agente revelamaior capacidadepara superar obstáculos àsubtraçãooumesmoformasmaiseficazesdecometerocrime.

Analisemosseparadamentecadaqualificadora:

ComdestruiçãoourompimentodeobstáculoàsubtraçãodacoisaTrata-sedearrombamentosdefechaduras,trancas,janelas,portas,cofresetc.

Acondutadevedirigir-seaumobjetoqueviseimpediraremoçãoousubtraçãoda coisa, e não à própria coisa. A simples remoção, como por exemplo, odesparafusamentoouretiradade telhas,nãoconfiguraaqualificadora.Nocasodastelhas,poderáhaveraescalada.

Indaga-sesobreocasodoindivíduoqueingressanumacasapelaportaquefoiesquecidaaberta.Alisubtraibenseaosairverificaqueoventobateuaportaeestasetrancou.Eleentãoaarrombaesai,levandoaresfurtiva.Haverianestecasofurtoqualificado?

Para Magalhães Noronha não, pois o rompimento ou destruição deve ser“anteriorouconcomitante”àsubtração(NORONHA,1990,p.233).Noentanto,a doutrina dominante considera que o rompimento pode ocorrer até a

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consumação do crime, de modo que no caso apresentado o furto seriaqualificado(verportodos:MIRABETE,2011,p.213).

A provamaterial da qualificadora se faz pela perícia, que é indispensável.Semeladescaracteriza-seaqualificadora.

Comabusodeconfiança,oumediantefraude,escaladaoudestrezaOcorre abuso de confiança quando o sujeito ativo aproveita-se da menor

vigilânciadavítimaemrelaçãoàsuapessoa,movidapelaconfiança,realizandoassimcommaiorfacilidadeasubtração.Essa“confiança”deveserdemonstradaemcadacasoconcreto,nãobastandoasimplesrelaçãodeemprego.Ouseja,ochamado “Famulato” (furto praticado pelo empregado contra o patrão) não ésempre e necessariamente qualificado pelo abuso de confiança. Na verdade,somente o será em casos excepcionais, nos quais fique patente a relação deespecialconfiançadepositadanoempregado.

No caso específico de empregados domésticos, não comprovada a efetivaconfiança,poderárestaraindaaagravantegenéricadoart.61,II,f,CP.

Não se deve confundir o furto qualificado pelo abuso de confiança com ocrimedeapropriaçãoindébita.Noprimeirooagentesubtraiacoisaenosegundorecebeacoisainicialmentedavítimaedepoisseapropria.

Ocorrefraudesemprequeoagenteseutilizadealgummeioenganosoparaludibriaravítimaeobterasubtração.

Éimportantesaberdistinguirofurtomediantefraudedocrimedeestelionato.Noprimeirooagenteenganaavítimaparapodersubtrairacoisa;nosegundo,aprópriavítimaentregaobeminduzidaaerropeloagente.

Aescalada“éautilizaçãodeviaanormalparapenetrarnacasaoulocalemquevaioperar-seasubtração”(MIRABETE,2011,p.214).

Para a configuração desta qualificadora é preciso que o agente tenha deutilizar instrumentos (escada, cordas etc.) ou aomenos tenhade empregar umdesforçofísicoconsiderável.

Aescalada,conformepodesugerironomenjuris,nãoexistesomentequandoháocaminhodasubidaemobstáculos(v.g.pularmuros,janelasetc.).Qualquerviaanormalpodeserconsideradaintegrantedaqualificadoraemestudo(ex.:umtúnel).

No que tange à prova pericial, há decisões jurisprudenciais considerando-adispensávelnoscasosdeescaladaporquenormalmentenãodeixavestígios.Noentanto, é de todo aconselhável sua realização, mesmo porque também há

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decisõesqueconsideramoexamepericialindispensável,especialmentequandohá vestígios (ex.:marcas de pés nomuro,mãos etc.). Em geral, nestes casos,mesmo não havendo vestígios, costuma-se elaborar um croqui, indicando omodusoperandidoagentee,principalmente,aalturadosobstáculosgalgados.

Destreza “é a habilidade física ou manual do agente, que possibilita asubtração sem que a vítima perceba” (MIRABETE, 2011, p. 215). Estaqualificadora só é afastada se o agente é inábil. Porém, se ele age comhabilidade, mas mesmo assim não consegue consumar o crime, responde portentativadefurtoqualificado.

Também deve-se ter ciência de que a destreza refere-se tão somente àespecial habilidade física ou manual de retirar objetos que as pessoas trazemjuntoa si semqueestaspercebam.Nãoconfiguramaqualificadoraemestudooutrasespeciaiscapacidadesquepodemdealgumaformaauxiliarnoscasosdefurtos ou outros crimes patrimoniais, tais como conhecimentos especiais deinformática, noções especiaisdeusode explosivos, capacidadede abrir cofresoufechadurasetc.Nestescasospodemconfigurar-seoutrasqualificadoras(v.g.fraude,rompimentodeobstáculo,chavefalsaetc.),masnãoadestreza.

ComempregodechavefalsaCaracteriza“chavefalsa”a imitaçãodaverdadeiraouqualquer instrumento

utilizado para fazer funcionar mecanismo das fechaduras (gazuas, michas,gramposetc.).

Quandooagentepegaachaveverdadeiraparadepoisusá-laparaofurtonãose configura a qualificadora da chave falsa, podendo reconhecer-se, porém,aquelareferenteaoempregodefraude,umavezqueseriaabsurdoconsiderar-sea“chaveverdadeira”como“chavefalsa”.Omesmosedigadecasosemqueoagente se utiliza da chave verdadeira deixada na porta por esquecimento daprópriavítima,apenascomadiferençadequenestescasosnãoháquesefalaremcrimequalificadopelafraude,massimdefurtosimples.

A ligação direta para furto de veículo automotor não caracteriza aqualificadora em estudo. A jurisprudência tem entendido que não há aqualificadora da chave falsa nesses casos, pois não há o objeto materialnecessárioàsuaconfiguração(chavefalsaouinstrumentosimilar).Podehaveraqualificadora em destaque se o agente se utiliza de instrumentos para abrir ocarro.

A perícia pode comprovar o uso de chave falsa para a prática do crime,mesmonãoselograndoapreenderoinstrumento.Nãoobstante,acasoesteseja

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apreendido,deve,necessariamente,sersubmetidoaexamepericialparaaferiçãodesuaeficácia.

Quando o autor não se utiliza da chave falsa para a subtração, ou seja,anteriormente ou concomitantemente a esta, mas apenas depois, como noexemplodoladrãoqueusachavefalsaparaabrirumcofreemseuesconderijoapóssubtraí-lo,nãoseconfiguraaqualificadora.Aleiexigequeoempregosejapara a prática da subtração, devendo ocorrer, portanto, durante a execução dofurto,enãoapóssuaconsumação.

MedianteconcursodeduasoumaispessoasHá nesse caso indicação de maior periculosidade dos agentes que unem

esforçosparamelhorexecuçãodocrime.Podeumdosagentessermenorouinimputável,configurandoaqualificadora

da mesma maneira. Em sendo o crime praticado com um menor pode haverinfração em concurso formal com o art. 244-B do ECA – Lei n. 8.069/90(corrupçãodemenores).

Nãohánecessidadedequeosparticipantesatuemnaexecuçãodasubtração,configurando a qualificadora, por exemplo, a participação intelectual ou ochamado “olheiro”. Apenas Nelson Hungria discorda desse entendimento queproliferanadoutrinaemgeral,sustentandoatesedequeparaaconfiguraçãodaqualificadoraemestudoénecessárioqueaspessoasparticipemdiretamentedapráticadasubtração(HUNGRIA,1967,p.46).

Se houver a configuração do crime de quadrilha ou bando (art. 288, CP),afasta-se a qualificadora, restando concurso material de crimes de furto equadrilhaoubando,evitando-seobisinidem.

ConcomitânciadequalificadorasHavendo duas ou mais qualificadoras, uma delas serve para qualificar o

crimeeasdemaisdevemserapreciadasnadosimetriadapenanostermosdoart.59,CP(DELMANTO,2010,p.346;CAPEZ,2010,p.388,eTELES,2004,p.359).Háautores(MIRABETE,2011,p.216)queequivocadamentesugeremqueasegundaqualificadorasejautilizadacomocircunstânciaagravantegenéricanostermos do art. 61, CP. Tal solução, no caso do furto, é inviável simplesmenteporquenãohámençãonoart.61doscasosqueconfiguramqualificadorasdessecrime,demaneiraatornarimpossívelorecursoaessaoperação.

Furtodeveículoautomotor–qualificadoraespecial(art.

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155,§5º,CP)Comocrescimentodapráticadefurtodeautomóveisolegisladorcriouuma

novamodalidadeespecialdecrimequalificadonoart.155,§5º,CP,pormeiodaLei n. 9.426/96, que promoveu reformas pontuais nos crimes contra opatrimônio.Apenaparaestescasoséaindamaiordoqueparao§4º(reclusãode3a8anos).

Não obstante, não foi o furto de veículos automotores que foi erigidosimplesmente a crime qualificado especial, somente tendo em consideração oobjetododelito.Paraqueocrimesejaqualificadodeconformidadecomo§5º,alémdeoobjetomaterialnecessitar serumveículoautomotor,estedeverá sertransportadoparaoutroEstadoouparaoexterior.

Havendo infringência a casos do § 4º e § 5º concomitantemente, seráaplicado somente o § 5º, servindo as circunstâncias do § 4º como critériodefinidordapena-basenostermosdoart.59,CP.

O furto de peças de veículos automotores, ainda que levadas para outroEstadoouparaoexterior,nãoconfiguraaqualificadorado§5º.

Um problema bastante grave encontra-se na descrição típica. A Lei n.9.426/96 ao tratar da receptação faz diferenciação entre “transportar” e“conduzir”,levandoadoutrinaaconsiderarquenãosãoexpressõessinônimasdeacordocomalegislação.Assimteríamos:a)transportar–seriaoatodelevaroautomóvel em outro veículo (a bordo); b) conduzir – seria o ato de guiar oveículo (o próprio autor do furto ou terceiro), importando que o carro selocomovacomaforçadeseuprópriomotor.

Essadiferenciaçãogeraumarelevantecríticaàredaçãodo§5ºdoart.155,CP,quesómenciona“transportar”,ficandoadescobertoacondutadequemleveoprópriocarroparaoutroEstadoouparaoexterior.

OutraquestãoserefereànecessidadedequeparaconfiguraraqualificadoraoveículotenhadeefetivamentecruzarasfronteirasdeumoutroEstadooupaís.Se isso não ocorre a solução é o furto simples ou então, conforme o caso, aaplicaçãodo§4º,afastando-seo§5º.Inclusive,emvirtudedisso,tementendidoa doutrina predominante ser inviável a figura da tentativa dessa qualificadora.Afirmamos autoresqueparaqueo tipopenal se complete énecessárioqueoautor primeiro obtenha a subtração, de forma que passe então a transportar oveículoparaoutroEstadoouparaoexterior.Nessaocasiãojáseestariadiantedeumcrimeconsumado,deformaqueseriainviávelpensar-seemumretornoparaa fase de tentativa. Assim sendo, ou bem o agente subtrai o veículo e logra

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transportá-loparaoutroEstadoouparaoexterior,eocrimeprevistono§5ºseconsuma; ou então subtrai o veículo e, ao não conseguir seu intento detransportá-loparaoutroEstadoouparaoexterior,deveresponderporcrimedefurtosimplesouqualificadocombaseno§4º,tambémconsumados,inexistindoapossibilidadedereconhecimentodetentativado§5º.Mesmoquandooagentesejasurpreendidotentandoaindasubtraircomafinalidadedetransportarocarropara outro Estado ou para o exterior, haveria tentativa de furto simples ouqualificado com base no § 4º. Isso porque o § 5º não faz menção ao móvelsubjetivodoagente,ouseja,àsuaintençãodetransportaroveículoparaoutroEstadoouparaoexterior,esimaofatoconcretodequeoveículo“venhaasertransportadoparaoutroEstadoouparaoexterior”.Esteaspectotemsidoobjetodecríticas e sugestõesde reformapeladoutrina, aduzindo-sequemelhor seriaqueo legisladornãohouvessedito “venhaa ser transportado”, e simutilizadoalguma expressão que designasse o desejo do agente de transportar o veículoparaoutroEstadoouparaoexterior(BITENCOURT,2010,p.60).

Poroutrolado,autorescomoCapez(2010,p.396)eMouraTeles(2004,p.359)aduzemqueemregraatentativaseráimpossível,maspoderiaocorreremcasos de subtrações de veículos automotores em localidades próximas afronteiras,sendofatoqueoautordocrimedesdeasubtraçãonãotenhaapossetranquiladoproduto,emboraconsigacruzara linha fronteiriça, sendodetidoepresopelapolícialogoemseguida.

CelsoDelmantochamaaatençãoparaofatodequeolegisladorolvidouumaspectoimportantenoqueserefereaessetransportedoveículo.Esqueceu-sedemencionar o Distrito Federal, de modo que se alguém furta um veículoautomotor,transportando-odeumEstadoparaoDistritoFederalouvice-versa,nãoseconfiguraaqualificadoraemestudo(DELMANTO,2010,p.347).

Outra crítica presente em praticamente toda a doutrina a respeito dasinovações impostas pela Lei n. 9.246/96 refere-se ao fato de que o legisladorolvidoupreverapenademultaparaocrimequalificadodo§5º,abandonandotradicionaltratamentodamatériareferenteaoscrimespatrimoniaisemgeral.

Porderradeirofaz-semistertratardaquestãodoobjetomaterialdacondutado § 5º do art. 155, CP, qual seja, o significado da expressão utilizada pelolegislador:“veículoautomotor”.

Amaioriadadoutrina abordaaquestãodemaneira superficial, dandoumarespostarápidasemmuitareflexão.Taisautoressimplesmenteconsideramcomoabrangidos pela expressão “veículo automotor” quaisquer veículos dotados de

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motor a propulsão e que se movam por seus próprios meios. Os exemplospassampelos veículos amotor utilizadosno transporte depessoas e coisas notrânsito viário terrestre (carros de passeio, motos, caminhões, ônibus etc.),chegandoaabranger tambémoutrosveículossimilaresutilizadosno transporteaéreo (aeronaves motorizadas – aviões, helicópteros etc.) ou aquático(embarcaçõesamotor–navios,lanchasamotor,jetskietc.).

Embora seja essa a orientação que será encontrada na maior parte dostrabalhos doutrinários, pensamos tratar-se de posicionamento precipitado eirrefletidoquenãomereceguarida.

Em nosso entendimento, para responder o que seja veículo automotor nostermos da Lei n. 9.426/96 é imprescindível indagar se existe uma definiçãotécnicanoarcabouçojurídicobrasileiroparatalexpressão.

Seguindopor esta trilha percebe-se claramente queo eventual alargamentoda definição de veículo automotor a quaisquer engenhos capazes de selocomover com motor próprio e força de propulsão ali gerada, incluindo-seembarcaçõeseaeronaves,poderiaatéserpossívelantesdoadventodoCódigodeTrânsitoBrasileiro(Lein.9.503,de23-9-1997).Issoporquesobaégidedoentão Código Nacional de Trânsito (Lei n. 5.108, de 21-9-1966) e seuRegulamento (Decreto n. 62.127, de 16-1-1968), a definição de veículoautomotorera realmentepulverizadaecarentedeumaconceituaçãodetalhada.Por seu turno, o novo Código de Trânsito Brasileiro, em seu Anexo I (“Dosconceitosedefinições”),apresentaumaclaraconceituação,considerandocomoveículo automotor “todo veículo a motor de propulsão que circule por seusprópriosmeios,equeservenormalmenteparao transporteviáriodepessoasecoisas,ouparaatraçãoviáriadeveículosutilizadosparaotransportedepessoasou coisas.O termo compreende os veículos conectados a uma linha elétrica eque não circulam sobre trilhos (ônibus elétrico)”. Além disso, o Código deTrânsito Brasileiro equipara os ciclomotores às motocicletas e,consequentemente,considera-osnãomaiscomooutrora (veículosdepropulsãohumana),massimcomoespéciesdeveículosautomotores.

Temosentãoumadefiniçãotécnico-jurídicadoquesejaveículoautomotornoCódigodeTrânsitoBrasileiroeaeladevemosrecorreraobuscarmososentidodovocábuloempregadonaleipenalporforçadasreformasintroduzidaspelaLein.9.426/96.OutranãoéaorientaçãodeCarlosMaximilianoaoasseverarque“ojuiz atribui aosvocábuloso sentido resultanteda linguagemvulgar; porque sepresume haver o legislador, ou escritor, usado expressões comuns; porém,quando são empregados termos jurídicos, deve crer-se ter havido preferência

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pela linguagem técnica” (MAXIMILIANO, p. 109). Portanto, não se podeadmitir, com o advento do Código de Trânsito Brasileiro, interpretaçãoampliativaparaosignificadodeveículoautomotornosdispositivosemestudo.Somente se poderão considerar abrangidos aqueles que, além de dotados demotordepropulsãoprópria,sejamutilizadosparao transporteviário terrestre,excluídas, desse modo, embarcações, aeronaves e outros veículos que não sesubsumamperfeitamenteaoconceitolegalagoraclaramenteestabelecido.Aliás,ainda que antes do advento doCódigo deTrânsitoBrasileiro, a ampliação doconceitonãose justificariaemfacedamotivaçãoda iniciativapromovidapelaLein.9.426/96explicitadaemsuaExposiçãodeMotivos:olegisladordeixaaliclaroqueasalteraçõeslevadasaefeitodestinam-se“acombaterumacrescenteeinquietante forma de criminalidade de nossos dias”, o que certamente não dizrespeitoaoutrassubtraçõesquenãoasdeautomóveis,caminhões,motocicletase demais veículos adequáveis à definição do Anexo I do Código de TrânsitoBrasileiro.

Tambémnãoédeprocedênciaaalegaçãodequeo legisladoraoelaboraraLein.9.426/96,de24dedezembrode1996,fariausodeumsentidovulgarde“veículo automotor”, pois que ainda inexistente o conceito do Código deTrânsito Brasileiro (Lei n. 9.503, de 23-9-1997). Na realidade, com o seuadvento,seeramviáveisinterpretaçõesabertas,tornaram-sevedadasporestritaobservância do basilar Princípio da Legalidade, servindo a definição oravigoranteparaoâmbitopenal,sejadosdispositivosdessanaturezaexistentesnopróprioCTB(arts.302a312),sejaparaoutrostipospenaisquefaçammençãoao conceito técnico.A ampliação desse conceito só pode ocorrer por expressadisposiçãolegalqueopretenda,umavezqueemmatériapenalaanalogiasóépossível in bonam partem. Ademais, como já frisado anteriormente, mesmoantesdavigênciadoCTB,emfacedamens legisexplicitada naExposição deMotivos da Lei n. 9.426/96, seria aconselhável ao intérprete a restrição doconceitodeveículosautomotoresàquelesutilizadosnotransporteviárioterrestredepessoasecoisas,poisquenítidaaimpressãodequeasalteraçõeslegaisnadatinham a ver com furtos de embarcações ou aeronaves (ver neste sentidoCABETTE,2001;TELES,2004,p.358,eMIRABETE,2011,p.217).

FurtofamélicoounecessitadoO furto famélico caracteriza-se quandoo agente pratica a subtração como

fimúnicodesaciarafomeprópriaoudeoutrem(podemserfamiliaresounão).Nãohánocasoointuitodeaumentarseupatrimôniomedianteasubtração,mas

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tão somente a influência de um instinto natural de preservação. Por isso, noscasosdefurtofaméliconãohácrime,sejaporfaltadoânimodetomaralgoparasi (fato atípico por ausência do elemento subjetivo do tipo), seja porreconhecimento de Estado de Necessidade (art. 24, CP) ou mesmo porreconhecimentodeInexigibilidadedeCondutaDiversasupralegal.

AçãopenalPúblicaincondicionada.

FurtodeCoisaComum(art.156,CP)O crime de furto de coisa comum, previsto no art. 156, CP, tem

característicasmuito similares ao crime de furto tipificado no art. 155,CP, demaneira que parcela bastante significativa daquilo que foi comentadoanteriormente lhe pode ser aplicada. Por isso, tratar-se-á neste tópico tãosomente de alguns aspectos que revelam a especificidade do tipo penal emdestaque.

O primeiro aspecto significativo neste caso é que o autor do crime nãosubtrai coisa alheia, agora ele também é o proprietário da coisa, embora nãosozinho.

Aocontráriodofurto(art.155,CP),nofurtodecoisacomum(art.156,CP)trata-se de crime próprio. Somente podem praticar o crime determinadaspessoas:a)condômino;b)herdeiro;c)sócio.

A doutrinamajoritária afirma que o furto de coisa comum em relação aossóciossóseconfiguranoscasosde“sociedadedefato”.Nassociedadesqueseconstituemempessoasjurídicasocorreriafurtocomumprevistonoart.155,CP.

Sendoacoisasubtraídafungível,nãoépunívelasubtraçãoquenãoexcedaàcota-parteaquetemdireitooagente(art.156,§2º,CP).

A ação penal no crime do art. 156, CP, é pública condicionada arepresentação (art. 156, § 1º, CP). Tendo em vista a pena máxima cominada(detençãode6meses a 2 anosoumulta), trata-se de infraçãopenal demenorpotencialofensivo.

Roubo(art.157,CP)Conceito

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Ocrimederoubo,aexemplodofurto,consistenasubtraçãodecoisaalheiamóvelparasiouparaoutrem,apenastendoacaracterísticadequeomeioparaestasubtraçãoéaviolência,agraveameaçaouqualqueroutromeioquereduzaavítimaàimpossibilidadederesistência.

ObjetividadejurídicaOrouboéumcrimecomplexo,emqueaobjetividadejurídicaimediataéo

patrimônio,mastutelatambémaintegridadefísica,aliberdadeeavidahumana.

Sujeitosativoepassivoa)Sujeitoativo–équalquerpessoaportratar-sedecrimecomum.b) Sujeito passivo – além do proprietário, possuidor ou detentor da coisa, é

qualquerpessoaatingidapelaviolênciaougraveameaça.

TipoobjetivoAcondutaésubtrairpormeiodeviolência(lesõescorporaisouviasdefato),

grave ameaça ou qualquer outromeio a reduzir a vítima à impossibilidade deresistência(ex.:drogas,hipnose,bebidasalcoólicasetc.).

TiposubjetivoÉ crime doloso, devendo existir o animus ren sibi habendi, com o dolo

específico“parasiouparaoutrem”.Nãohámodalidadeculposa.

ConsumaçãoetentativaO roubo se consuma quando a coisa sai da esfera de vigilância da vítima

(posse tranquila). Há, porém, decisões jurisprudenciais do STF e do STJindicando a consumação do roubo pelo critério da amotio, ou seja, com asimples retirada do bem do local onde se achava (ZAFFARONI; BATISTA,2006, p. 487). É possível a tentativa, pois trata-se de crime material eplurissubsistente.

Entretanto,quantoàconsumação,tendoemvistaosbensjurídicostutelados(crime complexo), há duas correntes: a) o roubo se consuma somente com asubtração da coisa, não bastando a prática da violência ou grave ameaça(majoritária);b)o rouboseconsuma logocomapráticadaviolênciaougraveameaça,independentementedaefetivasubtração(minoritária).

Rouboimpróprio(art.157,§1º,CP)

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Trata-sedasituaçãoemqueoagenteinicialmentepraticaasubtraçãosemoemprego de violência, mas depois, para garantir seu proveito ou impunidade,praticaviolênciaougraveameaça.Há,porassimdizer,umainversãonaordemnaturalemrelaçãoaoroubopróprio.

Note-se, porém, que essa violência ou grave ameaça posterior à subtraçãopara caracterizar o roubo impróprio deve ser imediata. Havendo um lapsotemporalconsiderável,haveráoutroscrimes(v.g.art.129,CP,ouart.121,§2º,IVeV,CP).

Diferentementedoroubopróprio,norouboimprópriosomenteaviolênciaougrave ameaça caracterizam a conduta, não havendoprevisão de “outrosmeiosquereduzamavítimaàimpossibilidadederesistência”.

Ensinam a doutrina e a jurisprudência majoritárias que não é possível atentativadorouboimpróprioporqueénecessárioqueasubtraçãotenhaocorridoe a violência ou grave ameaça vise somente assegurá-la.Há, porém, decisõesjurisprudenciaisadmitindoatentativaderouboimpróprio,poispoderiaoagente,apósasubtração,serdetidoaotentarusardeviolênciaparaassegurarapossedoobjetoousuaimpunidade(FRANCO,1995,p.2014-2015).

Roubocomaumentodepena(art.157,§2º,IaV,CP)Seaviolênciaouameaçaéexercidacomempregodearma

Oempregodearmadenotanãosóamaiorpericulosidadedoagente,comomaiorperigoàincolumidadefísicaeàvidadavítima.

O sentido da palavra “arma” é amplo, ou seja, qualquer instrumentovulnerante, abrangendo as armas próprias (revólver, espingarda, pistola,metralhadora etc.) e as impróprias (faca de cozinha, pedaço de pau, foice,navalha,caniveteetc.).

Certamenteomaiorquestionamentoacercadestacausadeaumentodepenarefere-seaousodachamada“armadebrinquedo”.

Nãohádúvidadequeaarmadebrinquedoserveparaconfigurarafiguradoroubo simples por meio da grave ameaça, desde que idônea a provocar aintimidaçãodavítima.

A questão intrincada refere-se à configuração ou não da causa especial deaumento de pena, de forma que inicialmente poderíamos reduzir osposicionamentos da doutrina basicamente a duas correntes: a) a dos que nãoadmitem a causa de aumento de pena em estudo para as armas de brinquedo,poisenfatizamqueomotivodaexasperaçãoseriaespecialmenteomaiorperigo

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que a arma ocasionaria à incolumidade física da vítima. Além disso, tambémargumentamsobreainfraçãoaoPrincípiodaLegalidade,jáque“brinquedonãoé arma e arma não é brinquedo” (CINTRA JÚNIOR, 1997, p. 1.) (CorrenteObjetiva); b) a dosque admitema causade aumentopela armadebrinquedo,pois que enfatizam o maior potencial intimidativo da conduta,independentemente do maior perigo à incolumidade da vítima (CorrenteSubjetiva).

Essedebateseguiu-sepormuitotemponadoutrinaenajurisprudênciaatéaediçãodaSúmula174doSTJ,quedizia:

No crime de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza oaumentodepena.

A partir de então teríamos uma pacificação em termos para amatéria. Noentanto,houveumagrandereaçãoporpartedadoutrina,criticandoseveramenteoenunciadodaSúmulasupratranscrita.Ocorreuentãoalgoinusitado.Noanode2001 (decisãoproferida em24deoutubrode 2001), decidiu oSTJ cancelar aSúmula 174, de forma que, numa interpretação contrario sensu do referidodecisório,conclui-sequeatualmenteentende-sequeaarmadebrinquedonãoéidôneaparaconfiguraracausaespecialdeaumentodepena.

Emnossoentendimentoestaérealmenteamelhororientaçãosobreotema,jáquevigeoPrincípiodaLegalidadeEstritanocampopenale,efetivamente,umachamada “armade brinquedo” é, na verdade, umbrinquedo, e não uma arma.Eventualequiparaçãoconfigurariaespúriaanalogiainmalampartem.

Deoutrabanda,vêmentendendoadoutrinaeajurisprudênciaqueousodearmadescarregadaoudefeituosaéidôneoparaaconfiguraçãodacausaespecialdeaumentodepena,poisque,neste caso, tratar-se-iade arma real e capazdeintimidar,deformaquenãoestariahavendoumaanalogiaproibida.Entretanto,há claros sinais de que a jurisprudência tende a alterar esse entendimento,migrando para o pensamento da inadequação da arma defeituosa oudescarregadaparaaconfiguraçãodamajorante.

Quandooagenteapenasportaaarma,masnãoautilizaparaasubtração,nãose configura a causa especial de exasperação, já que a arma tem de serempregada,nomínimo,comsuaexibiçãoostensiva.

SeháconcursodeduasoumaispessoasVerarespeitoasmesmasobservaçõesfeitassobreaqualificadoranoscasos

defurto.

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Seavítimaestáemserviçodetransportedevaloreseoagenteconhecetalcircunstância

Sãoexigidosdoisrequisitosparaqueseperfaçaacausadeaumentodepena:a)vítimaemserviçodetransportedevalores(dinheiro,selos,pedrasoumetaispreciososetc.).Osvaloresdevempertenceraterceiros,eavítimaostransporta(ex.: roubos de carros-fortes). O dispositivo fala em transporte de “valores”,portantoosfamosos“roubosdecarga”,tãocomunshojeemdia,nãoconfigurama qualificadora; b) conhecimento do agente acerca do transporte de valores.Trata-se de um elemento subjetivo do tipo indispensável à sua configuração,significandoqueoagentedevedirecionarsuacondutaàquelavítimajustamenteporsaberqueelaestátransportandovalores.

Seasubtraçãofordeveículoautomotorquevenhaasertransportadoparaoutroestadoouparaoexterior

Verobservaçõesfeitassobreaqualificadoraidênticadocrimedefurto.

Seoagentemantémavítimaemseupoder,restringindosualiberdade

Sãooscasosemqueparaapráticadasubtraçãooagentemantémavítimaemseupoder.Normalmente,paraqueocorraestacausadeaumentodepenajáestarão presentes outras, tais como emprego de arma ou concurso de pessoas,vindogeralmenteafuncionarsomentecomocircunstânciajudicial(art.59,CP).

Este inciso foi incluído no art. 157,CP, pelaLei n. 9.426/96 e antes dissohavianessescasosas seguintes soluções jurisprudenciais: a) rouboe sequestroemconcursomaterial;b)rouboesequestroemconcursoformal;c)roubo,sendoosequestroabsorvidocomocrime-meio.

Hoje,aquestãoésaberquandoseaplicaoart.157,§2º,V,equandopodehaverconcurso.Alémdisso,comoadventodaLein.11.923/2009acresce-seanecessidadedesaberdiscernirentreatipificaçãodoart.157,§2º,V,CPeoart.158,§3º,CP,noscasosdodenominado“sequestrorelâmpago”.

Basicamente destacam-se as seguintes soluções quanto ao concurso com ocrimedesequestro(art.148,CP):

ParaDamásioE. de Jesus eCezarRobertoBitencourt (JESUS,2005,p. 4;BITENCOURT,2010,p.12):a)Seosequestroforanteriorouconcomitanteàsubtração,paraasseguraresta

ouescapardaaçãopolicial(crime-meio),aplica-seoart.157,§2º,V,CP,e

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afasta-seoconcurso.b)Seosequestro(art.148,CP)épraticadodepoisdasubtração,haveráconcurso

materialentrerouboesequestro,afastadaaqualificadoradoart.157,§2º,V,CP.Porseuturno,EduardoAraújodaSilva(SILVA,1997,p.11)apresentauma

soluçãodiferenciada,baseadanosverbosdostipospenaisemtestilha.Paraesseautor a distinção se faria tão somente pelomaior oumenor lapso temporal daprivação/restriçãodeliberdadedavítima.Issoporqueoart.148,CP,usaoverbo“privar”aliberdade,indicandoumtempomaioremaiorataqueaobemjurídico.Desuabanda,noart.157,§2º,V,CP,seusaoverbo“restringir”a liberdade,indicando um tempomenor emenor ataque ao bem jurídico. Dessemodo, sehouverum lapso temporalmais largo,haveriaconcursomaterial entre rouboesequestro.Porém,sendoesseperíodomenor,haveriaatipificaçãodoart.157,§2º,CP,afastadaacausadeaumentodepena.

Entendemosqueambososcritériosdiferenciadoresacimaapresentadosnãose excluem mutuamente, ao contrário, podem complementar-se e orientar oaplicadordoDireitoeoestudiosonasoluçãodoscasosconcretos.

O advento da Lei n. 11.923/2009 com a pretensão de tipificar o chamado“sequestrorelâmpago”trouxenovapolêmicaedificuldadesobreotema.Éagorapreciso saber quando aplicar o tipo penal do roubo qualificado acimamencionadoequandoaplicarotipodaextorsãoqualificada(art.157,§3º,CP).ObviamenteoadventodaLein.11.923/2009nãoteveopoderdefazertipificartodososcasosnoart.158,§3º,CP,comoparecetersidoodesejofrustradodolegislador. O art. 157, § 2º, V, CP, não foi revogado nem expressa nemtacitamente,demodoqueaquestãosomentepodeser resolvidamedianteumainicialtriagemdecasos,concluindo-sepelaocorrênciaderoubooudeextorsãoemcadasituaçãoconcreta,paradepoisdeliberarqualseráafiguraqualificadaaseraplicada.

Para tanto se remete o leitor ao próximo item, em que se desenvolverá oestudo do crime de extorsão e sua distinção com relação ao crime de roubo.Tambémserecomendaaleitura,paramaioraprofundamentodotema,doartigode nossa autoria intitulado “A Lei n. 11.923/2009 e o famigerado sequestrorelâmpago.Afinal,queraiodecrimeéesse?”(CABETTE,2009).

Rouboqualificadopelaslesõescorporaisdenaturezagraveoumorte(latrocínio)

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Ocorre sempre que da violência utilizada pelo autor do crime para asubtraçãoresultarem:a)lesõescorporaisgraves;b)morte.

Essesresultadosmaisgravososdevemadvirdoempregodaviolência,pois,se forem oriundos de grave ameaça (ex.: vítima sofre um enfarte), não seconfiguraráotipopenalqualificado.

Aqualificaçãopodeocorrertantonoscasosderouboprópriocomoderouboimpróprio.Noentanto,emhavendoconcomitânciadeincidênciasnoscasosdo§2ºedo§3º,aspenasserãoaquelasdo§3º,semaplicaçãodeaumento,devendoascausasdo§2ºserlevadasemconsideraçãotãosomentenaindividualizaçãodapenanostermosdoart.59,CP.

Emambasassituaçõesqualificadorasbastaqueaviolênciasejaempregadaparaofimdeobterasubtração.Porexemplo,semprequeoagente“matarpararoubar”ocorreráolatrocínio.

A conduta dolosa quanto àmorte e a conduta preterdolosa quanto àmorteservemparaconfigurarocrimede latrocínio,poisamorte,nosdoiscasos, foimeioparaasubtração.

Noscasosdelatrocíniopodehavermortedepessoadiversadaquelaquesofreasubtração.Noentanto,amortedeumcoautornãocaracterizao latrocínio, jáqueinexistearelaçãodecausalidadedoeventocomoobjetivodosautores.

ConsumaçãoetentativadolatrocínioObviamente a consumação ocorre com a efetiva subtração e a morte da

vítima.Surgeoproblemaquandoumdoselementosdocrimecomplexonãoseperfaz,variandoentãoassoluçõesofertadaspeladoutrinaepelajurisprudência:a)seambosnãoseconsumam(oagentetentamatarparasubtrairenãoconseguesubtrair nem matar), aceita-se pacificamente a ocorrência de tentativa; b) seconsegueasubtração,masavítimanãomorre,costuma-setambémreconheceratentativa de latrocínio, embora haja alguma controvérsia na doutrina (posiçõesminoritárias); c) a situaçãomais conturbada acontece quando ocorre a morte,masnãoasubtração.

Nessascircunstânciashávariadasposiçõesedecisões jurisprudenciais,mastemprevalecidoatesedolatrocínioconsumado,deacordocomaSúmula610,STF, com a seguinte dicção: “Há crime de latrocínio, quando o homicídio seconsuma,aindaquenãorealizeoagenteasubtraçãodebensdavítima”.

CrimehediondoOart.1º,II,daLein.8.072/90,consideraolatrocíniocomocrimehediondo.

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Refere-se expressamente à figura do roubo qualificado pela morte, ou seja, apartefinaldo§3º,doart.157,CP,deformaqueorouboqualificadopelaslesõesgraveseasdemaisformasderoubo(simplesoucomaumentosdepena)nãosãoconsideradascrimeshediondos.

AçãopenalecompetênciaA ação penal para o crime de roubo em todas as suas formas é pública

incondicionada.Já houve muita discussão acerca da competência para o julgamento do

latrocínio, pois havendo a morte poderia ser do Júri como do Juiz Singulardevidoasercrimecontraopatrimônio(NORONHA,1990,p.250-255).Hoje,porém,trata-sedetemasuperado,poisqueépacíficooentendimentodequeolatrocínio é de competência do Juiz Singular, dada sua característica de crimepatrimonial.HáinclusiveaSúmula603,STF,nessesentido.

Extorsão(art.158,CP)Conceito

Oprimeiropontorelevanteéadistinçãoentreocrimedeextorsãoeoutrosilícitospenaisalgosemelhantes:a)ExtorsãoeRoubo–aextorsãosedistinguedoroubopelofatodequenelanão

éoagentequesubtraiacoisa,esimavítimaqueéobrigadaaentregá-laaoagente. Também se argumenta que na extorsão a vítima ainda tem algumadeliberação, alguma liberdade para entregar ou não a coisa, enquanto norouboessaliberdadeénula.Portanto,nãosomenteofatodeseravítimaqueentregaouoagentequesubtraiéquediferenciaessescrimes,mastambémamaioroumenorchancedeopçãodavítima.Exemplificando:oagentepodeserobrigadoaentregaracarteiraameaçadocomarmadefogoe,noentanto,tratar-sederoubo,poisnãolhehaviaqualqueropção,como,porexemplo,nocasodeumachantagem.

b) Extorsão e Estelionato – na extorsão o agente entrega a coisa medianteameaçaouviolência,nãohavendodesuapartenenhumaespontaneidade.Jánoestelionato,avítimaé levadaaerro(semviolênciaougraveameaça)e,inicialmente,entregadebomgradoacoisa.

ObjetividadejurídicaTrata-se de crime complexo, sendo, portanto, defendidos vários bens

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jurídicos(patrimônio,integridadefísicaeliberdade).

SujeitoativoOcrimeécomum,demodoquequalquerpessoapodecometer.Noentanto,

seoagenteéfuncionáriopúblicoeexigevantagememrazãodafunção,ocrimeédeconcussão(art.316,CP).Mas,seessefuncionário,paraobteravantagem,usadeviolênciaougraveameaça,ocrimenãoédeconcussão,masdeextorsão(CAPEZ,2010,p.428;MIRABETE,2011,p.234).

SujeitopassivoQualquerpessoa.

TipoobjetivoAconduta é constranger (obrigar, forçar, coagir), sendoomeio empregado

para esse constrangimento a violência ou a grave ameaça. Essa violência ougraveameaçadeveobjetivarumacondutaporpartedavítima(fazer,tolerarquese faça ou deixar de fazer algo). O objeto material pode ser bens móveis ouimóveis.

TiposubjetivoÉo dolo e como dolo específico de “obter vantagem econômica indevida

parasiouparaoutrem”.

ConsumaçãoetentativaHá duas correntes acerca do tema: a) considera-se crime formal, bastando

que a vítima faça, deixe de fazer ou tolere que se faça algo, não havendonecessidade de que o agente tenha a vantagem econômica para a consumação(entendimentomajoritário);b) considera-secrimematerial,demodoque só seconsumaquandooautorobtémavantagem(entendimentominoritário).

Emambosos casos,porém, seria cabível a tentativa.Noprimeiro (formal)desdequeaameaça,porexemplo,nãochegasseaoconhecimentodavítimaou,mesmochegandoesendoidônea,masavítimanãoseintimidasse.

ExtorsãocomaumentodepenaequalificadaVercomentáriosjáexpendidossobreocrimederoubo,comreferênciaaoart.

158,§§1ºe2º,CP.Quantoaochamado“sequestrorelâmpago”(art.158,§3º,CP)cabemalgumasobservaçõesimportantes:

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a)Emprimeirolugaronovotipopenalnãotemocondãodetipificar todososcasosdopopularmentedenominado“sequestrorelâmpago”.Haverácasosderoubo que continuarão sendo normalmente tipificados no art. 157, § 2º,V,CP,tudodependendosempredeumatriageminicial,discernindo-sesobreaocorrênciaincasuderoubooudeextorsão.Somentequandoseconcluirpelaocorrênciadeumaextorsãoéquesepoderácogitardaaplicaçãodoart.158,§ 3º, CP, havendo cerceamento da liberdade deambulatória da vítima.Tambémnãosepodeesquecerdapossibilidadedeconcursodecrimes,sejaentre roubo e sequestro (art. 148,CP), seja entre extorsão e sequestro (art.148,CP).Issoquandonãohouvernexodenecessidadeentreosequestroeorouboouaextorsão.Aprópriaredaçãodo§3º,doart.158,CP,dadapelaLein.11.923/2009,deixaissobemclaroaoexigirqueosequestrosejacondição“necessáriaparaaobtençãodavantagemeconômica”.Paraquesetipifiqueorouboouaextorsãoqualificadospelocerceamentodeliberdadedavítimaosequestro deverá sermeio para a execuçãodos crimes patrimoniais. Se ele(sequestro) for praticado apenas no contexto de um roubo ou de umaextorsão,mas sem nexo de necessidade, ou seja, não sendo “meio” para aprática do roubo ou da extorsão, será o caso de concurso de crimes.Finalmente, não se pode perder de vista a possibilidade de tipificação, emcertos casos, do crime de extorsãomediante sequestro (art. 159, CP). Issoocorrerá em situações mais graves em que o tempo de cerceamento daliberdade da vítima for mais alargado, bem como houver refém cujalibertaçãosefaçadependerdopagamentoderesgate.

b)ALei n. 11.923/2009 criouumanovaqualificadorano crimede extorsão edentrodeladistinguiutrêsfiguras:

Umaprimeiraemqueocrimesequalifica,compenadereclusão,de6a12anos,alémdamulta,pelosimplesfatodehaver“restriçãodaliberdadedavítima”comomeioparaapráticadaextorsão.Nessecasonãosefalaemresultadosmaisgravososcomolesõesgravesoumorte.

Em outra figura, na parte final do dispositivo enfocado, prevê as outras duashipótesesqualificadoras.Nessescasos,descreveolegisladoraextorsãocomrestriçãodaliberdadedavítimasomadaaofatodequeocorramlesõesgravesou morte. Nessas duas situações últimas estabelece as mesmas penas docrimedeextorsãomediantesequestroqualificadoporlesõesgravesoumorterespectivamente(art.159,§§2ºe3º,CP).Assimsendo,doravanteseocorrerum crime de extorsão simples (sem restrição de liberdade nem resultadosgravososdelesõesgravesoumorte)aplicar-se-áoart.158,caput,CP,ouno

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máximo o art. 158, § 1º, CP (extorsão com aumento de pena), acaso hajaconcursodeagentesouempregodearma.Poroutrolado,seocorreremlesõesgravesoumorte,masemextorsõespraticadassemcerceamentodeliberdadedavítima,aplicar-se-ánormalmenteoart.158,§2º,CP,queremeteaoart.157,§3º,CP.Finalmente,seocorrerextorsãocomrestriçãodaliberdadedavítima, mas sem os resultados mais gravosos de morte ou lesões graves,aplicar-se-áoart.158,§3º,primeiraparte,CP,compenadereclusãode6a12anosemulta.Esehouverrestriçãodeliberdadeeaindaamorteoulesõesgraves,aplicar-se-áapartefinaldoart.158,§3º,CP,queremeteapenasdoart.159,§§2ºe3º,CP.Note-sequetambémaextorsãoqualificadapelamorteécrimehediondo(art.

1º,III,daLein.8.072/90).OadventodaLein.11.923/2009trouxemaisumproblemaaojáconturbado

arcabouço jurídico-penal brasileiro, especialmente no relacionamento entre amatéria codificada e a abundante legislação esparsa. Ocorre que a Lei dosCrimes Hediondos (Lei n. 8.072/90) prevê como crime hediondo a extorsãoqualificadapelamorte,especificandoemparêntesesquetalserefereaoart.158,§2º,CP(art.1º,III,daLein.8.072/90).ComoadventodaLein.11.923/2009ea criação do § 3º, do art. 158, CP, para tratar das extorsões com restrição daliberdadedavítima,inclusivedaquelascomresultadomorteoulesõesgraves,olegisladorensejouumacontradiçãolamentável,mascujasoluçãosomenteseriapossívelmedianteumaviolaçãoao“PrincípiodaLegalidade”.

A legislação empresta um tratamento mais rigoroso à extorsão medianterestrição da liberdade da vítima, mas ao mesmo tempo passa a extorsãoqualificadapelamortesemrestriçãodaliberdadeasercrimehediondo(art.1º,III,daLein.8.072/90),enquantoqueaextorsãocomomesmoresultadoeaindapraticadamediantecerceamentodeliberdadenãooé.

Certamente haverá aqueles que pretenderão indicar a tipificação hediondaparaoscasosdemortedo§3º.OsargumentosserãopossivelmenteofatodequeolegisladorcometeuumlapsoaonãoajustaraLein.8.072/90ànovarealidadeedequeestenãopoderiaterem1990previstooscasosdeum§3º,quesomenteadveio em 2009. Ademais, a determinação final do § 3º, do art. 158, CP, deaplicação das mesmas penas do crime de extorsão mediante sequestroqualificado (crime sem nenhuma dúvida hediondo, inclusive em sua formasimples), levaria à conclusão de equiparação das situações, justificando aqualificação hedionda da extorsão qualificada pela morte com restrição deliberdade,bemcomoaaplicaçãodoaumentodepenaparaaextorsãoqualificada

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pelamorteou lesõesgraves,praticadacomrestriçãoda liberdadedavítima.Aprópria contradição que destrói toda a sistemática legal estaria a apontar apossibilidade de uma interpretação ampliativa nesses casos. Aliás, RogérioSanchezCunhaeLuizFlávioGomesjásemanifestarampelaaplicabilidadedasregrasdaLeidosCrimesHediondosao§3º,doart.158,CP,considerando-oummerodesdobramentodoantigo§2º,domesmodispositivo(CUNHA;GOMES,2009).

Emborataisargumentosapresentemcertacoerênciaepossamserconstruídosna tentativa de colmatar uma lamentável lacuna legal e reconstruir umasistemáticacoerente,nãodevemseracatados,poisqueimplicariamnumanítidaviolênciaao“PrincípiodaLegalidade”.ComoadventodaLein.11.923/2009asextorsõescomrestriçãodaliberdadequalificadaspelamortenãosãohediondas.Issosimplesmenteporquealeiassimnãoprevê,restringindoaaplicabilidadedodispositivodoart.1º,III,daLein.8.072/90aoscasosespecíficosdo§2º,doart.158, CP. Uma lei penal restritiva deve ser restritivamente interpretada, nãocomportandoampliaçõesouanalogias.Cabeaolegislador,obedecendoàestritalegalidade,alteraraLein.8.072/90paraadequá-laànovarealidade.NãocabeaosintérpretesouaplicadoresdoDireitoviolaro“PrincípiodaLegalidade”paraconsertarosequívocosdolegislador.Admitiressahipóteseseriaextremamenteperniciosoaosistemagarantistaerigidoconstitucionalmente,conflitandocomaprópriaconformaçãodeumEstadoDemocráticodeDireito.

AçãopenalPúblicaincondicionada.

ExtorsãoMedianteSequestro(art.159,CP)Tendo emvista o estudo anterior da extorsão simples (art. 158,CP), cujos

preceitossãoaplicáveisaocrimeoraenfocado,apenascomadiferençadequenesteomeioparaoalcancedavantageméosequestro,faremosapenasalgumasobservaçõessobreitensrelevantes.

SujeitoativoTrata-se de crime comum,mas se um policialmantém pessoa ilegalmente

presa, exigindo vantagem para soltá-la, não comete crime funcional, e simextorsãomediantesequestro.

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TipoobjetivoImporta ter em mente que o sujeito passivo do crime somente pode ser

pessoa. Dessa forma um animal não pode ser objeto de extorsão mediantesequestro,aindaquearrebatadoeexigidoresgateparasuadevolução.Nestecasoocorreráocrimedeextorsãodoart.158,CP.Tambémocadávernãopodeserobjeto desse delito. Sua subtração não configura extorsãomediante sequestro.Nocasopodehaverocrimeprevistonoart.211,CP, e,havendoexigênciadevantagemeconômicapara sua restituição, crimedeextorsão (art. 158,CP) emconcursomaterial.

Ocrimeépermanente,persistindoaconsumaçãoenquantohouveraprivaçãodeliberdadedorefém,dependentedaaçãodoagente.

Háafirmaçãonadoutrinadequeocrimeseriaexcluídosehouvesseaoinvésde sequestro o cárcere privado (NORONHA, 1990, p. 271). No entanto, talafirmaçãonãoserveparaafastara incidênciado tipopenalem todososcasos,independentementedeconfiguraçãodesequestrooucárcereprivado,eisquesealeipuneomenos(sequestro),devepuniromais(cárcereprivado).

Algumasdistinçõessãorelevantes:a)sequestrooucárcereprivado(art.148,CP) – a conduta é a mesma, só que não há o objetivo de obter vantagemeconômica indevidacomela;b) reduçãoàcondiçãoanálogaàdeescravo (art.149, CP) – o objetivo aqui é a exploração da força de trabalho semcontraprestação.

ConsumaçãoetentativaConsuma-se o crime com o simples sequestro (privação da liberdade da

vítima).É crime formal e não exige a efetiva obtençãoda vantagemalmejadaparasuaconsumação,sendoqueestaconfigurarámeroexaurimento.

Emboraformal,ocrimeadmitetentativaporqueéplurissubsistente(condutafracionável).Exemplo:agenteédetidoquandoestáarrastandoavítimaparaumautomóvelafimdelevá-laaocativeiro.

FormasqualificadasDispõeoart.159,§1º,CP,queapenaserádereclusãode12a20anosnos

seguintescasos:a)aprivaçãodaliberdadedurarmaisde24horas;b)sequestrodemenorde18anosoudemaiorde60anos;c)crimecometidoporbandoouquadrilha.

Também os §§ 2º e 3º preveem formas qualificadas, nestes casos pelos

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resultados respectivamente de lesão corporal grave e morte. Tais resultadosdevematingirosequestrado,enãoterceiros,paraqueocrimesequalifique.Étambém importante frisar que a lesão grave ou a morte do sequestrado nãoprecisa ser resultado da violência direta dos criminosos, podendo derivar, porexemplo, das condições do cativeiro, pois a lei fala que “se do fato” resultarlesãocorporalgraveoumorte.

Delaçãopremiada(art.159,§4º,CP)A chamada “Delação Premiada” vem sendo adotada no Direito Penal

Brasileiro por assimilação de institutos do Direito Norte-Americano (PleaBargaining)eItaliano(Pentitismo).

SuaprimeiraapariçãofoinaLeidosCrimesHediondos(Lein.8.072/90),naqualestáinseridoocrimedoart.159,CP,emcasosdequadrilhaparaapráticade crimes hediondos ou equiparados (art. 8º, parágrafo único). A seguir foiadotada também pela Lei n. 8.137/90 (Crimes contra a ordem tributária,econômica e relações de consumo), conforme alteração promovida pelaLei n.9.080/95 (art. 16, parágrafo único, da Lei n. 8.137/90). No mesmo ano foiprevista tambémpelaLeidecombateaoCrimeOrganizado(Lein.9.034/95–art.6º).ALein.9.269/96ampliouaaplicaçãodaDelaçãoPremiadaaquaisquercasosde extorsãomediante sequestropraticada emconcursode agentes, aindaque não configurando quadrilha ou bando nem crime organizado, mediante ainserçãodo§4ºnoart.159,CP.

Em1999surgiuaLein.9.807,de13dejulho,quedispõesobreaproteçãoàsvítimas, testemunhas e acusados que colaboram no esclarecimento de crimes.Esta lei,emseusarts.13e14,ampliougrandementeocampodeaplicaçãodaDelaçãoPremiada,queagoranãoserestringeàsquadrilhasdecrimeshediondos,crime organizado, crimes contra a ordem tributária, econômica e relações deconsumoeextorsãomediantesequestro.Agoraoinstitutoirradia-seamplamenteatodasasinfraçõespenaisenãosóéprevistaumareduçãodepena,mascria-sehipótesenovadePerdãoJudicial.

Verifica-seclaramentequeoinstitutosobcomentovemganhandogradativoespaço na legislação nacional. Tudo isso gera na doutrina uma polêmica quegravitaemtornodoconflitoentreumavisãopragmáticaeoutravisãoéticadoDireito. Para uns o que importa são os resultados obtidos com o instituto daDelaçãoPremiada.Paraoutros,eleseriaalgoabominávelcomoumacontradiçãointerna no Direito, que premiaria condutas reprováveis como a delação e atraição,malvistasatémesmoentreosmaisceleradosdoshomens(CABETTE,

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2001).

ExtorsãoIndireta(art.160,CP)Também o estudo deste tipo penal dispensa a reiteração de todos os itens

abordados na exposição da extorsão (art. 158, CP), dadas claras semelhanças.Assim sendo, serão destacados apenas tópicos de interesse, os quais revelamtraçossingularesdessacondutatípica.

Ocrimedeextorsãoindiretaprevêaexploraçãotorpedocrédito,emqueocredor, além das garantias normais, visa uma vantagem ilícita, qual seja, a depoderdarcausaaumprocessocriminalcontraodevedor.Dessaforma,eleexigecomo garantia de seu crédito algum documento “que pode dar causa aprocedimento criminal contra a vítima ou contra terceiro”. Esses documentospodem ser, por exemplo: a) umcheque sem fundos; b) um recibode depósitoinexistente;c)umacartaemqueseconfessaumcrime.

Atente-se que para a configuração da extorsão indireta esses documentosdevem servir como garantia de dívida. Se esses documentos são usados paraextorquir,masnãohavendoacaracterísticadegarantiadedívida,ocrimeéodeextorsãocomum(art.158,CP).

Trata-se de crime de ação múltipla, conteúdo variado ou tipo mistoalternativo,vezquetemdoisverbos“exigir”e“receber”.Nocasodoprimeiroocrimeéformal,sósendopossívelatentativaporescrito.Nosegundo,ocrimeématerial,sendosemprepossívelatentativa.

Ébastantecomumaligaçãodessecrimeàpráticadausura(art.4ºdaLein.1.521/51), e a jurisprudência tem entendido que, se configurada a usura, aextorsãoindiretarestaabsorvida(v.g.Tacrim447/400).

AlteraçãodeLimites,UsurpaçãodeÁguaseEsbulhoPossessório(art.161,CP)

Asinfraçõespenaisprevistasnoart.161,CP,tratamdaapropriaçãoeinvasãode bem imóvel e de desvio ou represamento de águas alheias, concedendo aproteção penal ao bem jurídico, afora todo o sistema civil para solução deconflitosdessaespécie.Naalteraçãode limiteso sujeitoativoéoproprietárioconfrontante do imóvel da vítima (crime próprio, segundo a maioria dadoutrina). A conduta consiste em “suprimir ou deslocar” marco divisório do

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terreno.Odoloéespecífico,poisqueaaçãosedirigeaofimdeapropriar-senotodo ou em parte de imóvel alheio. Não há modalidade culposa. O crime éformal, de modo que, havendo a remoção da divisória, não importa se há aapropriaçãoefetivadoimóvel.Estaseráexaurimento.Épossívelatentativa.Emhavendousodeviolênciaimpõealei(art.161,§2º,CP)concursomaterial.

Na usurpação de águas protegem-se as águas públicas e particulares,tratando-se de crime comum. Os verbos são “desviar e represar”. Só existemodalidade dolosa e a infração é formal, não importando se o agente obtémproveitodesuaconduta.Éviávelatentativa.

O Esbulho Possessório também tutela a propriedade imóvel. Invade-seterreno alheio emconcursodelitivo demais de duas pessoas e/ou comusodeviolênciaougraveameaça.Pelaredaçãotípicaseriasuficienteonúmeromínimode três pessoas, mas há decisões jurisprudenciais exigindo a presença de nomínimo quatro para configuração. Só há figura dolosa (dolo específico deperpetraroesbulho).Ocrimeécomum.Avítimaéodonodoterrenoinvadido.Aconsumação sedácomaefetiva invasão,mas se tratadecrime formal,nãonecessitandoqueo agente logre seuobjetivode tomaro imóvel.A tentativa épossível.

Emqualquerdoscasosdoart.161,seu§2ºdeterminaoconcursomaterialcom o crime relativo à violência empregada para a prática das usurpaçõesimobiliárias.

SupressãoouAlteraçãodeMarcaemAnimais(art.162,CP)

Ocrimetutelaaposseeapropriedadedesemoventes.Consisteemsuprimir(eliminar)oualterar(modificar)marcaemanimais(crimedeaçãomúltipla,tipomisto alternativo ou de conteúdo variado), normalmente em gado, pois que écostume amarcação a ferro ou outras técnicas para identificação do dono. Ocrime é comum e o sujeito ativo também pode ser qualquer pessoa física oujurídica quedetenha a posse oupropriedadedo animal objeto da ação.O tipopenal em estudo apresenta um elemento normativo consistente na palavra“indevidamente”, demaneira que, se a supressão ou alteração se dá de formapermitida, não há incriminação (por exemplo, com autorização do dono doanimal). O gado ou rebanho que tiver a marca identificatória suprimida oualteradadeveser“alheio”,demodoque,obviamente,aalteraçãoousupressão

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demarcaemgadopróprionãoconstituiilícito.Observe-seaindaquealeiapenasprevê a supressão ou alteração de sinal preexistente, demodo que é atípica acondutadaquelequemarcagadoou rebanhoalheioquenãoera anteriormenteidentificado.Essaé,anossover,umalacunaindesejáveldalegislação.Nãoháprevisão de conduta culposa. O elemento subjetivo, portanto, é o dolo (dologenérico). O crime se consuma com a supressão ou alteração do sinal, nãoimportando sehaveráounão lesãopatrimonial.A tentativa épossível.Aaçãopenal é pública incondicionada. Ocorrendo crime patrimonial (furto, roubo,estelionato,apropriaçãoindébita),ocrimedoart.162,CP,torna-sepost factumnão punível, sendo absorvido como mero exaurimento do crime antecedente.Consigne-se, por oportuno, que a Lei n. 4.714/65 regula as dimensões,localizaçõeseregistrodemarcasemanimais.

Dano(art.163,CP)Esteéumcrimecontraopatrimônioemqueoagentenãodesejaassenhorar-

sedosbensalheios,esimdestruí-losoudanificá-los.Obemjurídicotuteladoéaposse ou propriedade de bens móveis ou imóveis. Trata-se de crime comum,somentenãopodendocometera infraçãooprópriodonodobem,jáquesendoeleoproprietáriotemodireitodedisposição.Agoraseobemforcomum,podehavercrimededano,desdequesejainfungívelouoprodutordodanoultrapassesuacota–parte.Tambémnãohaverácrimededano,esiminfraçãoaoart.346,CP,quandooprópriodonodestróicoisaprópriaqueestejaempoderdeterceiroporordemjudicialouconvenção.Avítimaseráoproprietáriooupossuidordobem.

O crime de dano é de ação múltipla ou conteúdo variado possuindo trêsverbos(destruir,inutilizaredeteriorar).

Umadasquestõestormentosasnocrimededanoeraacondutade“pichação”demuros,fachadas,edifíciosetc.Noentanto,comovigordaLein.9.605/98eseuart.65,essacondutapassouaserexpressamenteregulada.

Ocrimepodeserperpetradoporaçãoouomissão.Exemplifica-seaomissãona conduta de um funcionário que, dolosamente, deixa de lubrificar umequipamentoparaqueestesedanifiqueafimdeprejudicaropatrão.

Éimportanteressaltarquenasearapenalsomenteéprevistoocrimededanodoloso (dolo genérico). O dano culposo pode ocorrer, mas configurará meroilícitocivil.

Ocrimeseconsumacomoresultadomaterial(crimematerial).Épossívela

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tentativa.Ocrimededano simples é infraçãodemenorpotencial ofensivo, poisque

suapenamáximaédeseismesesdedetenção.Ocorrequea lei tambémprevêfigurasqualificadasnosincisosIaIVdoart.163,parágrafoúnico,CP.Nessescasos a infração deixa de ser de menor potencial, pois que a pena sobe para“detençãodeseismesesatrêsanos”.

A primeira qualificadora se refere ao crime praticado “com violência àpessoaougraveameaça”.Éprecisonotarqueessaviolênciaougraveameaça,para configurar a qualificadora, deve ser meio para a prática do dano. Casocontráriohaveráconcursodecrimes.Porexemplo:a)umindivíduoquerquebraro vidro do carro de outrem, mas essa pessoa fica à sua frente, protegendo oveículo.Entãoeleameaçaapessoacomumabarradeferroeconsegueafastá-lapara praticar o dano. Este é um caso de dano qualificado; b) ocorre umadiscussão e então um dos envolvidos quebra a bicicleta pertencente ao outro.Depois,estandoesteapenasolhando,parteparacimadeleeoagride,causandolesões.Trata-sedeconcursomaterialdecrimesdedanoelesõescorporais,enãodecrimededanoqualificado.Emocorrendoocrimededanoqualificadocomviolência,odispositivo,emseupreceitosecundário,determinaquesejaaplicadoosistemadecúmulomaterial.Note-sequeomesmonãoocorrecomaameaça,queseráabsorvidapelodanoqualificado.

O segundomotivo qualificador é o “emprego de substância inflamável ouexplosiva”.Observe-sequea leinessecasodeterminaqueaqualificadoraseráaplicadasomentenãohavendo“crimemaisgrave”(v.g.explosãoouincêndio–arts. 250 e 251, CP).Nessas hipóteses o dano será absorvido por se tratar decrimesubsidiário(subsidiariedadeexpressa).

A terceira qualificadora diz respeito à especial proteção do patrimônio da“União, Estado, Município ou concessionários de serviços públicos”. Aqualificaçãosejustificaporquenessecasonãoéapenasumaoualgumaspessoasquesãoatingidas,masacomunidadesocialcomoumtodo.Questãocontroversadiz respeito aos danos perpetrados por detentos em rebeliões ou tentativas defuga em estabelecimentos penitenciários ou cadeias públicas. No caso derebeliões ou outras circunstâncias de prática de dano deliberado é pacífico oentendimentodequeháo crimededano.Noentanto,quandoodano temporobjetivoafuga,hádecisõesjurisprudenciaisafastandoatipificaçãoporquenãohaveriaapresençadodolonecessário,sendoodanomeromeioparaafuga.Nãoobstanteaquestãonãoépacífica,havendotambémdecisõesemcontrário(videANDREUCCI, 2010, p. 436; DELMANTO et al., 2010, p. 597). Em nossa

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opinião,nãohavendoqualquerprevisãodedoloespecífico,razãoassisteàquelesque entendem por configurada a tipicidade. Entretanto, em caso de fuga tempredominadooentendimentocontrário.

A última qualificadora refere-se ao “motivo egoístico” ou à ocorrência de“prejuízoconsiderávelàvítima”.Omotivoegoísticoestá ligadoà intençãodoagente em obter vantagem pessoal ou patrimonial (v.g. prejudicar umconcorrente comercial; sabotar a moto de um corredor concorrente em umaprova etc.). Quanto ao prejuízo considerável, este deve ser avaliado em cadacaso concreto, inclusive levando em conta as posses da vítima. É tambémimportante nesse caso comprovar a vontade do infrator de ocasionar o danoconsiderável.

Aaçãopenaléregradanoart.167,CP.Nodanosimples(art.163,caput,CP)aaçãopenaléprivada.Jánodanoqualificadoaaçãoépúblicaincondicionadanoart.163,parágrafoúnico,incisosI,IIeIII,CPeprivadanocasodoincisoIVdomesmodispositivo.

IntroduçãoouAbandonodeAnimaisemPropriedadeAlheia(art.164,CP)

Obemjurídicotuteladoéapropriedadeeapossedeimóveis,especialmenteseuusoegozopelorespectivotitular.Ocrimeécomum,somentenãopodendosercometidopeloprópriodonodasterras.Osujeitopassivoéoproprietáriooupossuidordobemimóvelnoqualosanimaissãodeixados.

Caso o proprietário esteja com o imóvel próprio em posse legítima deterceirosevieraabandonaranimaisali,nãopoderáserenquadradonoart.164,CP,porqueestefalaempropriedadealheia.Restaráeventual responsabilizaçãopor dano (art. 163, CP). Esse é o posicionamento que vem predominando(HUNGRIA, 1967, p. 113; FRAGOSO, 1977, p. 30; JESUS, 2005, p. 417).Entretantoháquementendaqueaexpressão“propriedade”devesertomadaemum sentido amplo no tipo penal emdiscussão, demodoque a tutela da possejustificaria que o proprietário de terreno alugado ou arrendado também possacometer o crime do art. 164, CP (neste sentidominoritário: FARIA, 1961, p.85-86;NORONHA,1990,p.331).Nossaopiniãoéquearazãoassisteàcorrenteminoritária.

Outraquestãoestánadicçãolegalemqueseusaapalavraanimaisnoplural.Serianecessáriaainserçãodemaisdeumanimal?

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Muitoemborahajaentendimentodequehaveriaessanecessidade,entende-semajoritariamentequealeiquisfazerreferênciaaogênero“animais”,abrangendoqualquerespécieenãoreferindo-seàquantidadedeanimaisdeixadosnolocal,demodoqueapenasumjásatisfariaotipopenal(MIRABETE,2011,p.244;veremcontrárioDELMANTOetal.,2010,p.599).

O tipo émisto alternativo, dotado de dois verbos (introduzir e deixar).Hácrime tanto para aquele que faz entrar animal na propriedade alheia semconsentimentodequemdedireito(introduzir),comoparaaquelequedepoisdeintroduzirlicitamenteoanimal(comconsentimento),vemasenegararetirá-loquandosolicitado(deixar).

Somentehaverácrimeseosanimaisforemintroduzidosoudeixadossemoconsentimentodequemdedireito,bemcomosehouverprejuízoàvítima.Paraque o crime ocorra, deve acontecer então algumdano provocado pelo animal,consumo de pasto, destruição de lavoura etc. O crime é doloso, não havendofigura culposa, a qual constituirámero ilícito civil. Trata-se de crimematerialque se consuma como dano ocorrido.Não há possibilidade de tentativa, poisque sóhaverácrimesehouveroprejuízo (Esseéoentendimento francamentemajoritário. Em sentido contrário, isoladamente, BITENCOURT, 2008, p.216-217, admitindo a tentativa). Havendo este ocorre crime consumado, nãohavendo, figura atípica. A ação penal, nos termos do art. 167, CP, é privada,aplicando-se a Lei n. 9.099/95, pois que se trata de infração penal de menorpotencialofensivo.

Danoemcoisadevalorartístico,arqueológicoouhistórico(art.165,CP)Figurarevogadatacitamentepeloart.62,I,daLein.9.605/98.

Alteraçãodelocalespecialmenteprotegido(art.166,CP)Tipopenalrevogadotacitamentepeloart.63daLein.9.605/98.

ApropriaçãoIndébita(art.168,CP)Objetividadejurídica

Protege-seopatrimônio.

Sujeitosativo/passivoQualquerpessoa(crimecomum).

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TipoobjetivoO objeto material é a “coisa alheia móvel”. A coisa fungível dada em

empréstimoparaulterior restituiçãonamesmaespécie,quantidadeequalidadenãopode,normalmente,serobjetodeapropriaçãoindébita(ex.:empréstimodedinheiro),tratando-sedemeroilícitocivilanãorestituição.Podeocorrercrime,porém,mesmo em se tratando de coisas fungíveis, se elas são entregues paraserem transmitidasa terceiro.Éexemploocobradorque recebea contae ficacom o dinheiro. Também se trata demero ilícito civil o caso do prestador deserviçoquerecebedinheiroenãoprestaoserviço.

Éindispensávelparaconfiguraraapropriaçãoindébitaqueoagentetenhaaposse ou detençãoanterior e legítima da coisa. O que ocorre é que o agenteinicialmente recebe a coisa legitimamente, mas depois manifesta o ânimo deapropriar-sedela,tornando-acomosesuafosse.Emsuma,eleinverteaposseoudetençãoempropriedade.

UmexemplodadoporNelsonHungriaémuitointeressante:umindivíduoéincumbidodeefetuaro transportedeumcofre.Nomeiodocaminhopara eoarromba,subtraindoodinheiroejoias.Há,nestecaso,umcrimedefurtoenãodeapropriaçãoindébita,poisque“aposseoudetençãodocontinente,entreguecerrado, não importa a posse oudetençãodo conteúdo” (HUNGRIA, 1967, p.132).

TiposubjetivoO crime é doloso. Esse dolo é o de tomar a coisa como sua,após o seu

recebimento lícito (posse ou detenção). Se o dolo não é posterior, sendo abinitio,poderáhaverfurtoouestelionatoconformeocaso.

ConsumaçãoetentativaAconsumaçãoseoperaquandooagentetransformaaposseoudetençãoem

propriedade,ouseja,quandoseinverteameraposseoudetençãoemdomínio.Adoutrina costuma afirmar em geral que a tentativa é, em tese, possível, masmuitodifícildeconfigurar-senaprática.DeoutrabandaRicardoA.Andreuccientendequeatentativasóécabívelseoautortentavenderoudispordacoisaenãoconseguir.Paraocitado jurista, seoautor ficacomacoisapara si, nãoépossível a tentativa (ANDREUCCI, 2010, p. 441). Ousando discordar dadoutrina em geral, entendemos que no crime de apropriação indébita éabsolutamenteimpossíveleimpensávelafiguradoconatus.Issoporqueocrime

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seconsumacomainversãodaposseemdomínio,oqueocorrenumprocessodevoliçãointernoaoagente(subjetivamente).Oubemoindivíduotomaadecisãointernadeficarcomacoisaeocrimeestáconsumadoounãotomaessadecisãoe não há crime.Mesmo que depois pretenda dispor da coisa e não consiga ocrime já está consumado. Ele já inverteu a posse. A disposição ou comércioulteriordacoisaémeroexaurimento.

Algumasdistinçõesimportantesa)Estelionato– neste o dolo é antecedente à posse e a vítima entrega a coisa

enganada.b)Furtomediantefraude–nesteoagentenãorecebeacoisa,masasubtraida

vítimaqueédistraídaetambémodoloéantecedente.c) Peculato – quando a apropriação é praticada por funcionário público no

exercíciodasfunções.

Apropriaçãoindébitamajorada(art.168,§1º,I,IIeIII,CP)d)Art. 102 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/2003) – “Apropriar-se de ou

desviar bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento do idoso,dando-lhes aplicação diversa de sua finalidade”. Portanto, se a vítima formaior de 60 anos (idosa – art. 1º, da Lei n. 10.741/2003), aplicar-se-á adisposiçãoespecial.Olegisladorimpõeumaumentodepenadeumterçonosseguintescasos:

a)Depósitonecessário–Oconceitodeveserbuscadonaordemcivil.OdepósitonecessáriosedivideemDepósitoLegal(art.647,I,CC);DepósitoMiserável(art.647,II,CC–casosdecalamidades,incêndios,inundações,naufrágiosesaques) e Depósito de bagagens de viajantes, hóspedes ou fregueses dehospedarias, estalagens, hotéis e pensões. Em todos esses casos a pessoarecebeascoisasemsuapossecomespeciaisresponsabilidades,justificando-seoaumentodareprimenda.

b)Quandoaquelequeseapropriadealgoétutor,curador,síndico,liquidatário,inventariante, testamenteiro ou depositário judicial. Nesse caso leva-se emconsideração a relevância dos deveres inerentes às funções exercidas.Observe-se que o síndico era aquele que administrava a massa falida.Atualmente essa figura não se encontra mais na Lei de Falências eRecuperaçãoJudicial eExtrajudicialdeEmpresas (Lein.11.101/2005).Asfunções do antigo síndico são atribuídas ao chamado “Administrador

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Judicial”. Nada impede que a este seja aplicado o aumento de pena oraestudado,vezquehouveapenasumaalteraçãodenomenclatura.Noentanto,seria interessante uma atualização terminológica do Código Penal. É claroqueoaumento sópode ser aplicado sea coisaapropriadaestiver ligadaàsfunções elencadas, não sendo suficiente que a pessoa exerça essas funçõesparaser-lheimpostaaexasperação.

c)Quando a apropriação indébita é praticada em razão de ofício, emprego ouprofissão. Também devido às obrigações e confiança inerentes a essaspessoas. São exemplos o corretor que se apropria de aluguéis; o advogadoqueseapropriadevalores levantados judicialmentecomusodeprocuraçãodoclienteetc.

ApropriaçãoindébitaprivilegiadaOart.170,CP,determinaaaplicaçãodasdisposiçõesdofurtoprivilegiadoao

crime de apropriação indébita (art. 155, § 2º, CP). Remete-se o leitor aoscomentáriosjáexpendidosacercadofurtoprivilegiado.

AçãopenalAaçãopenalépúblicaincondicionada.

ApropriaçãoIndébitaPrevidenciária(art.168-A,CP)

Noquetangeaobemjurídicotutelado,afirma-sequeseriaopatrimôniodaprevidênciasocialeseufuncionamentoregular(SILVA,p.183).OsujeitoativoéoresponsávelpelorecolhimentodascontribuiçõesprevidenciáriaseosujeitopassivoéaPrevidênciaSocial.Ocrimeé,portanto,próprio.

Aconduta(“deixarderepassar”)éomissiva(crimeomissivopróprio).Aleiafirmaqueocrimeseperfazseocontribuintedeixaderepassarascontribuições“noprazoenaformalegalouconvencional”,erigindo-seentãonormapenalembranco, a qual deve ser complementada pela legislação previdenciária (Lei n.8.212/91).Outrastrêscondutasomissivassãoequiparadasporforçadoart.168-A,§1º,I,IIeIII,CP.

Ocrimeédoloso,nãoháfiguraculposa.Discute-seanecessidadeounãododoloespecífico(animusremsibihabendi),prevalecendoopensamentodequeocrime é de dolo genérico,meramente omissivo e não necessitando de animusespecial, diferentementedoqueocorre coma apropriação indébita prevista no

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art. 168,CP.Enfim, o crimedo art. 168-A,CP, inobstante onomen juris, nãoseria uma espécie de apropriação indébita, mas sim um crime previdenciárioomissivo e formal. Há, no entanto, vozes divergentes, tal como RobertoDelmanto(DELMANTOetal.,2010,p.609),oqualapontaapredominânciadainexigência do dolo específico, inclusive na jurisprudência, mas opõe suaopinião e decisão da 6ª Turma do STJ em AgRg em REsp n. 695.487/CE.Inobstante a respeitável posição de Delmanto e outros autores, bem como odecisum do STJ, entendemos que a razão está com amaioria, tendo em vistatratar-seclaramentedecrimeomissivoeformal.

Aconsumaçãosedácomapráticadacondutaomissiva,nãosendopossívelatentativa,exatamenteportratar-sedecrimeomissivopróprioeformal.

Emseus§2ºe§3º,I,oart.168-A,CP,prevêpossibilidadesdeextinçãodepunibilidade e perdão judicial ou apenas aplicação de pena de multa,estabelecendorequisitostemporaisepessoais.Noentanto,entendemosquetaisdispositivos foram tacitamente revogados pelo art. 9º, da Lei n. 10.684/2003(PAES) e arts. 68 e 69 da Lei n. 11.941/2009 (REFIS da Crise). Essasdisposições são mais benéficas e posteriores, permitindo a extinção dapunibilidadepelorecolhimentodascontribuiçõeseacessóriosaqualquertempoesemoutrasexigênciascomaconsequênciadaextinçãodepunibilidade.ALein. 11.941/2009 inclusive deixa clara a possibilidade de parcelamento dascontribuiçõesprevidenciárias,oqueeraantesvedadopelaLein.10.666/2003.Portanto, a partir de agora, havendo o pagamento integral das contribuições eacessórios a qualquer tempo extingue-se a punibilidade. Também poderá serobtidaaextinçãomedianteoparcelamentodosdébitosnostermosdoart.9º,daLein.10.684/2003.Esseparcelamentotambémpodeocorreraqualquertempo,apenasexigindo-sequesedêantesdo trânsitoemjulgadodacondenação.Noentanto,comoadventodaLein.12.382/2011,ficouestabelecidoque,nocasodoparcelamento,paraaextinçãodepunibilidade,estedeveráserlevadoaefeitoatéo recebimentodadenúncia (TANGERINO,2011, p. 6).Nesse casohaverásuspensãodapretensãopunitivaedoprazoprescricional.Comocumprimentodo parcelamento (pagamento final integral) será decretada a extinção dapunibilidade. Logicamente, se o beneficiado pelo parcelamento abandonar opagamento,seráreiniciadaaaçãopenal.Essasnovasnormastêmligaçãocomostributos,masamaioriadadoutrinaedajurisprudênciavementendendoquesãoplenamenteaplicáveisàscontribuiçõesprevidenciárias,asquaistambémteriamnaturezatributária(DELMANTOetal.,2010,p.613).Aliás,osarts.68e69daLein.11.941/2009sãoexplícitosemabrangerascontribuiçõesprevidenciárias.

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Tendo em vista essa aproximação entre as contribuições previdenciárias etributos, também se tem entendido que, a exemplo do que é disposto para oscréditostributáriosnoart.83daLein.9.430/96,condicionandoarepresentaçãoda fazenda perante oMinistérioPúblico por crime contra a ordem tributária àdecisãofinaldaesferaadministrativasobreaexigênciafiscaldocrédito,tambémse deve aguardar o final do procedimento administrativo referente ao débitoprevidenciárioparatomadadeprovidênciascriminais(STJ,HC128.672/SP,Rel.Min.MariaThereza deAssisMoura, j. 05.05.2009).Esse tem sido tambémoentendimentodoSTF(RT837/519).

Superada a questão do pagamento do débito e da pendência de processoadministrativo,deve-seatentarparaapossibilidadedeperdão judicialoumeraaplicação de pena de multa, quando o agente for primário e de bonsantecedentes, bem como “o valor das contribuições devidas, inclusiveacessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social,administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suasexecuçõesfiscais”.EssedispositivoestáemplenovigorenãoémanifestaçãodochamadoPrincípiodaInsignificância,namedidaemqueestelevaàatipicidadeda conduta pelo reconhecimento da diminuta ou inexistente lesão ao bemjurídico.Nãoéocasododispositivo,queapenasprevêperdãojudicialouatémesmoaplicaçãodeumapenapecuniáriaisolada.

Éinteressanteverificarqueemoutrassituaçõessimilaresdecrimescontraaordem tributária ou mesmo de descaminho, tem aplicado a jurisprudência oPrincípioda Insignificância, sendomuitomaisbenéficoao réuou investigado.Em nosso entendimento, inobstante o regramento legal diferenciado, talprincípioseguepodendoseraplicadoàhipótese,especialmenteconsiderandoapossibilidade de que o réu venha a ser apenado commulta, o que não ocorrequando o fato é considerado simplesmente atípico (ver neste sentido:DELMANTOetal.,2010,p.612).

É também importante distinguir o crime de apropriação indébitaprevidenciária (art. 168-A, CP) do crime de “Sonegação de contribuiçãoprevidenciária”(art.337-A,CP).

AaçãopenalépúblicaincondicionadaedecompetênciadaJustiçaFederal,vezqueatingeentedaUnião(INSS),conformeart.109,I,CF.

ApropriaçãodeCoisaHavidaporErro,CasoFortuitoouForçadaNatureza;Apropriaçãode

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TesouroeApropriaçãodeCoisaAchada(art.169eparágrafoúnico,IeII,CP)

Noart.169,caput,oindivíduoseapropriadecoisaqueveioaseupoderporerrodeterceiro(vítima),casofortuitoouforçadanatureza.Esseerropeloqualobem vem ao poder do criminoso não pode ser induzido, senão ocorreráestelionato.Tambéméprecisodistinguiressecrimedo“PeculatoMedianteErrodeOutrem ou Peculato – Estelionato”, previsto no art. 313, CP, que descrevecondutaidêntica,somentequepraticadaporfuncionáriopúbliconoexercícioouemrazãodasfunções.Ocrimeécomum,tutelandoopatrimônio,razãopelaquala vítima é o proprietário do bem apropriado. Só há modalidade dolosa,consumando-secoma inversãodaposse.A tentativaé,emtese,possível (videcomentáriossobreoconatusnocrimedeapropriaçãoindébita).

O art. 169, parágrafo único, I, CP, trata da apropriação de tesouro, que édefinidoconformedispõeoCódigoCivilnoart.1.264.Ocrimeécomumetemporsujeitopassivoodonodoimóvelondeotesouroéencontrado.Seotesouroéencontrado semapermissãododonodo terreno, aquelequeencontranão temdireitoanenhumacota–partedemodoquecometeocrimequandoseapropriade qualquer parcela (art. 1.265, CC). Também assim é quando aquele queencontraofazpordeterminaçãododonodoterreno,novamentenostermosdoart. 1.265,CC.Agora, se o encontro é casual, aquele que acha o tesouro temdireitoàmetade,demodoquesomentehaverácrimeseesteexcederàsuacota–parte (art. 1.264, parte final,CC). Igual soluçãoocorre entreodescobridordotesouroeoenfiteutaemcasode terrenoaforadonos termosdoart.1.266,CC(Enfiteuseéodireitorealalienáveletransmissívelaosherdeiros,queconfereaalguémoplenogozodo imóvelmedianteaobrigaçãodenãodeteriorá-loedepagarumforoanual,emnumerárioouemfrutos.Suaconstituiçãoatualmenteévedada peloCódigoCivil de 2002, conforme art. 2.038, valendo apenas as jáexistentessobaégidedoCódigoCivilde1916).Ocrimeédolosoeseconsumacomaapropriação,sendopossível,emtese,atentativa.

Finalmente,noart.169,parágrafoúnico, II,CP, incrimina-seaapropriaçãodecoisaachada(coisaperdidaouresdeperdita).AobrigaçãodedevoluçãodacoisaachadatambémétratadanoCódigoCivil(arts.1.233e1.234).Ocrimeécomum,sendocometidoporaquelequeencontracoisaperdidaenãoarestituiaoproprietáriooupossuidor(vítima).Portanto,paraoDireitoPenalnãovaleoditopopular“achadonãoéroubado”(sic).Trata-sede“crimeatermo”,vezquealeiconfereumprazode15diasparaaentregadacoisaaodono(acasooagenteo

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conheça) ou à Autoridade (caso não saiba quem é o dono). Essa Autoridadenormalmente é a Autoridade Policial (Delegado de Polícia), mas pode sertambémqualqueroutraquepossafazerobemchegaràpessoaqueoperdeu(oart. 1.233, CC, não especifica a Autoridade, referindo-se à “autoridadecompetente”). Importasalientarqueaapropriaçãopodeser integralouparcial,conformedicção legal.Ocrimeédolosoe,portanto, seoagenteémeramentenegligenteofatoéatípico.

Quanto à possibilidade de tentativa a doutrina diverge, havendo quemdefendasuapossibilidadeporqueocrimepoderiaseconsumarantesdos15diassempre que o agente invertesse a posse antes (GRECO, 2011, p. 510;BITENCOURT,2008,p.664).Emnossopensamentoé impossívela tentativa,uma porque a inversão da posse é, como já se salientou, produzidasubjetivamente;duasporqueantesdoprazolegalnãosepodefalaremcrimeedepoisdesteodelitoestáconsumado,nãosehavendofalaremtentativa(nestesentido:ANDREUCCI,2010,p.451;PRADO,2003,p.488).

A ação penal em qualquer das modalidades previstas no art. 169, CP, épúblicaincondicionada.

Estelionato(art.171,CP)Conceito

O crime de estelionato consiste em enganar alguém para a obtenção devantagempatrimonialilícita.AetimologiadapalavraéderivadadolatimStellio(lagarto que muda de cores, iludindo os insetos de que se alimenta e ospredadoresnaturais).

BemjurídicoÉopatrimônioesecundariamenteaboaféeasegurançadosnegócios.

SujeitosativoepassivoTantosujeitoativocomopassivopodemserqualquerpessoa(crimecomum).

Porémseoenganadoéincapaz(v.g.menordepoucaidade,louco),ocrimepodeserdeFurtomediantefraude(art.155,§4º,II,CP)ouAbusodeincapazes(art.173,CP).Issoporqueéexigidoqueavítimatenhaaomenosalgumacapacidadepsíquicaderesistênciaaoassédiodoestelionatário.Casocontrárioelafuncionacomoumaespéciedeinstrumentoparaumasubtraçãoouabuso.Tendoemvistaaspeculiaridadesdessecaso,emboradoutrinaejurisprudênciasedividamentre

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ofurtoqualificadoeoabusodeincapazes,entendemosqueocrimedeabusodeincapazes,devidoàespecialidade,seriaomaisadequado.

Avítimadeveserpessoa(s)determinada(s).Seocrimesedestinaapessoasindeterminadaspodehavercrimecontraaeconomiapopular (Lein.1.521/51),crimecontraasrelaçõesdeconsumo(Lein.8.137/90–art.7º)oucrimecontraoconsumidor (Lei n. 8.078/90). São exemplos: aparelhos que viciam balanças;bombasdegasolinaadulteradasetc.

Também é preciso atentar para o crime previsto nos arts. 106 e 108 doEstatutodoIdoso(Lein.10.741/2003).Respectivamente:“Induzirpessoaidosasemdiscernimentodeseusatosaoutorgarprocuraçãoparafinsdeadministraçãodebensoudelesdisporlivremente”.E“Gravaratonotarialqueenvolvapessoaidosa sem discernimento de seus atos, sem a devida representação legal”. Éprecisoatentarqueo idosocomdiscernimentoévítimacomumdeestelionato.Apenas aqueles sem discernimento é que, nos casos específicos acimamencionados,enquadram-senosartigosdoEstatutodoIdoso.Inclusive,mesmoestes, fora dos casos específicos ali mencionados, serão vítimas de furtoqualificadoouabusodeincapazes,conformeacimajáexplicado.

TipoobjetivoAcondutaéadeenganaravítimaparaobtervantagemilícita (induzindo-a

oumantendo-aemerro).Sãomeios:a)artifício–quandooagenteseutilizademeiosquemodificamacoisa,aomenosaparentemente(Ex.documentosfalsos,falsificações de bilhetes de loteria etc.); b) ardil – quando o agente usa deastúcia,sutileza,esperteza,deaspectomeramenteintelectual;c)qualqueroutromeiofraudulento–trata-sedefórmulagenéricaquesegueoscasuísmos,abrindoaspossibilidadesdemuitascondutascapazesdeenganarquepoderãoadequar-seaotipopenal(v.g.golpesperpetradospormeiodainternetetc.).

Questão interessante diz respeito à “fraude ou torpeza bilateral”, emque oestelionato somente funciona porque a própria vítima age demá-fé (ex. contodo bilhete premiado em que o estelionatário vende um bilhete de loteria demilhões por umabagatela e só faz isso porque a vítima agedemá-fé e pensaestar ludibriando quando, na verdade, é ludibriada). Discute-se se a fraudebilateraldesnaturaoestelionato,maspredominaoentendimentodequeissonãoocorre,somentepodendoserutilizadoofatonadosimetriadapena–base(art.59,CP–comportamentodavítima).

Tiposubjetivo

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Édoloehavendoaindaodoloespecíficode“obterparasiouparaoutrem,vantagemilícita”(patrimonial).

ConsumaçãoetentativaO crime é material e se consuma com a efetiva obtenção da vantagem

patrimonialindevida,sendoplenamentepossívelatentativa.

EstelionatoeusodedocumentofalsoSobreessetemahádiversascorrentes:a)entende-sequeháapenasocrime

doart.304,CP,sendooestelionatoabsorvido;b)entende-sequeháocrimedeestelionato, sendo o uso de documento falso absorvido como crime – meio(majoritária); c) entende-se haver concurso formal; e d) entende-se haverconcursomaterial.

ASúmula17doSTJ,filia-seàletrab,supra,aduzindoqueocrimedoart.304, CP é absorvido sempre que “o falso se exaure no estelionato”. Esseposicionamento jurisprudencial é deveras equilibrado, tendo a seguinteconsequência: a) se o usodedocumento falso somente serve à consecuçãodocrime de estelionato é por este absorvido; b) se o uso de documento falso épraticado no estelionato, mas também independentemente, há concurso decrimes(certamenteconcursomaterial).

EstelionatoprivilegiadoValem aqui as observações feitas quando do estudo do furto privilegiado,

apenasatentandoparaqueagoraaleimencionao“pequenovalordoprejuízo”,enãoo“pequenovalordacoisa”.

CondutasespecialmentemencionadasnaleiO legislador, no art. 171, § 2º, CP enumera determinadas condutas que

normalmente seriam casos de estelionato,mas que se achou por bemdestacarparaquenãorestassemdúvidas,tendoemvistaalinhatênuequemuitasvezesseparaamá-fécriminaldomeroilícitocivil.Vejamoscadaumadelas:I–DisposiçãodeCoisaAlheiavomoPrópria

Possívelemalienaçõesdebensmóveiseimóveis.OsexemplosvãodesdeoscasosmaisfolclóricoscomoavendadoPãodeAçúcaratéacomercializaçãodeveículoscom leasing, imóveis alugadosou arrendados etc.Nãoháo crimedoart. 171, § 2º, I, CP, porém, se um autor de crime anterior (furto, roubo,estelionato etc.) vende depois o produto, há, sim,mero exaurimento do crime

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antecedente.II–AlienaçãoouOneraçãoFraudulentadeCoisaPrópria

Destavezacoisa(móvelouimóvel)pertenceàpessoa,masnãopoderiaserdisposta devido a algum gravame legal ou contratual. Nesse passo écontrovertida a venda de coisa penhorada.A penhora é instituto processual, enão direito real sobre coisa alheia, portanto, embora já se tenha decidido pelaconfiguração de alienação fraudulenta de coisa própria, vem-se entendendohaveratipicidadedofatoeapenasresponsabilizaçãocivildodepositário infiel.Tambémjásedecidiuporcrimedeestelionatonaformabásicaeporcrimedefraudeàexecução(art.179,CP).Emboracientedequeesseposicionamentoéminoritário, prevalecendoo entendimentodeque se tratademero ilícito civil,entendemos que há realmente subsunção perfeita ao art. 171, § 2º, II, CP. Éprecisoobservarquenesteincisonãoévedadoocomérciodascoisasgravadasdealgumônus,esimoseucomérciosemquesejadadaciênciaaoadquirentedessacondição.III–DefraudaçãodePenhor

Agora não se trata da penhora processual,mas do contrato de penhor (art.1431,CC)queconsistenatradiçãodacoisamóvel,suscetíveldealienaçãoque,emgarantiadodébito,odevedoroualguémporele fazaocredor, ficandoelavinculadaàobrigação.IV–FraudenaEntregadeCoisa

Afraudepodeser:a)quantoàsubstânciaouessência(ex.:entregarumajoiadizendoserdeouroquandonãoé);b)quantoàqualidade(ex.:ajoiaédeouro,mas o estelionatário diz que é de 24 quilates quando é de 18); c) quanto àquantidade (ex.:dimensão,número,pesoetc.).Aquiépreciso relembrarqueocrimedevetervítimadeterminada,acasosejaindeterminadapodeocorrercrimecontraoconsumidor,relaçõesdeconsumooueconomiapopular.V–FraudeparaRecebimentodeIndenizaçãoouValordeSeguro

Tratam-se de golpes contra firmas de seguros. São exemplos comuns: a)esconderautomóveleregistrarfurtoparareceberseguro;b)simularacidentedeautomóvel; c) indivíduo que se autolesiona para haver valor de seguro. Oestelionato normalmente é crime material, que se consume com o efetivoprejuízo financeiro. Mas nessa figura ocorre uma exceção. Trata-se de crimeformal,queseconsumecomosatoslesivosefraudulentos,nãonecessitandooefetivo recebimento do valor do seguro para a consumação. Esse recebimentoefetivoconstituirámeroexaurimentodocrime.

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É preciso distinguir as condutas praticadas por incêndio, explosão oudestruiçãodeembarcaçõesouaeronaves.Háconcursoaparentedenormas,masnaverdadedevemprevalecerosarts.250,§1º,I,CP;251,§2º,CP,e261,§2º,CP,tiposquepreveemcomocausasdeaumentodepenaouacréscimodepenademultaointuitoeconômico(PrincípiodaEspecialidade).Jánoscasosemque,parareceberosegurooagentepratiqueosdelitosdeinundação(art.254,CP),desastre ferroviário (art.260,§1º,CP),desabamentooudesmoronamento(art.256,CP),haveráconcursoformalpornãoestarprevistonestesdelitosoproveitoeconômico.VI–FraudenoPagamentopormeiodeCheque

Cometeessecrimequem:a)emitechequesemsuficienteprovisãodefundos;b)frustraopagamento(háfundos,masoagentesustadolosamenteocheque).Oendossante que repassa o cheque não comete esse crime, pois não “emitiu” ochequenemosustou.Comete,porém,oprevistonoart.171,caput,CPse temciênciadequeochequeésemfundosousustadoeorepassaaterceiro.

Hánecessidadedequeo agente obre commá-fé ou fraude.Seo cheque édesvirtuadodesuafunção(ordemdepagamentoàvista)eaquelequeorecebesabe disso, não há crime (exs.: cheques pós-datados; cheques dados comogarantia de dívida). Também não há crime quando um cheque é sustado comjustacausa(ex.:inadimplementocontratualporpartedorecebedordocheque).

Sobre a consumação desse crime há várias doutrinas: a) Basileu Garciaconsideracrimeformalqueseconsumecomasimplesemissãodotítulo,ouseja,comameraassinaturadoagente;b)NelsonHungriaafirmaqueaconsumaçãosedáquandoochequeépostoemcirculação;c)MagalhãesNoronhaconsideracrimematerialquesóseconsumequandoapresentadoochequeaosacadoeesterecusaopagamentopela inexistênciade fundosouexistênciade contraordem.Esta última tese é abrigada pela jurisprudência, inclusive pela Súmula 521 doSTFassimredigida:

Oforocompetenteparaoprocessoe julgamentodoscrimesdeestelionato,sobamodalidadedeemissãodolosadechequesemfundos,éodolocalondesedeuarecusadopagamentopelosacado.

Noestelionatoporchequesemfundos,opagamentoantesdorecebimentodadenúnciaenseja faltade justacausaparaaaçãopenal,conformeentendimentodo STF. Há inclusive a Súmula 554, STF, que preceitua: “O pagamento decheque emitido sem suficiente provisão de fundos, após o recebimento dadenúncia,nãoobstaoprosseguimentodaaçãopenal”.

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Háaindacasosemquesãousadoschequesemestelionatos,masocrimeéodoart.171,caput,CP(exs.:comprascomchequesfurtados;chequesdecontasencerradas; chequesemitidoscomnome falso; chequeemitidodecontaabertacomdadoscadastraisfalsosetc.).NessassituaçõesacompetêncianãoseregulaconformeaSúmula521,STF,masnormalmentepelaregradoart.70,CPP.

EstelionatoMajorado(art.171,§3º,CP)A lei prevê aumentodepenadaordemdeum terço se a lesãopatrimonial

atingeentidadededireitopúblicoou institutodeeconomiapopular,assistênciasocialoubeneficência.ASúmula24STJestabelecequeesseaumentoseapliqueà lesão a entidade autárquica de previdência social. O incremento penal sejustifica, pois que não se trata de vítima particular, mas de um conjuntoindeterminadodepessoas,dasociedadeemgeral.

AçãoPenalPúblicaincondicionada.

DuplicataSimulada(art.172,CP)Obemjurídicotuteladoéopatrimônio,tratando-sedecrimepróprio,jáque

somente pode perpetrá-lo a pessoa que emite duplicatas, faturas ou notas devenda.O sujeito passivo é a pessoaquedesconta ou contra quemé emitidootítulo.Overtoé“emitir”,correspondendoàcolocaçãodo títuloemcirculação.Exigeaindaotipopenalqueodocumentonãoespelhecorretamenteatransaçãocomercialouretratetransaçãoinexistente.Discute-seseoendossanteouavalistacometem também o crime. A maioria da doutrina entende que não, apenasdivergindodissoMagalhãesNoronha.Essaspessoassomentecometemocrimese agem com má-fé desde o início participando da emissão fraudulenta(MIRABETE, 2011, p. 293). O mesmo se pode dizer do sacado, que énormalmente vítima do crime e somente pode ser responsabilizadocriminalmente se age em concurso com o emissor, ciente desde o início daoperaçãofraudulenta.Ocrimeésomentedoloso.Trata-sedecrimeformalqueseconsume com a mera emissão do título, sendo eventual lesão patrimonial dosacadomeroexaurimento.Nãoseadmitetentativaporsercrimeunissubsistente.Noparágrafoúnicodoart.172éequiparadaacondutadefalsificarouadulterarlivroderegistrodeduplicatas.Nafalsificaçãooagentecriaumlivroinexistenteenaadulteraçãomodificaolivroexistenteeválido.Essafiguraseconsumecom

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a efetiva falsificação ou adulteração, mas, diferentemente do caput, admite atentativa, pois que se trata de tipo plurissubsistente. A ação penal é públicaincondicionada.

AbusodeIncapazes(art.173,CP)Tutela-seopatrimôniodosincapazes.Ocrimeécomum,eosujeitopassivo

são os menores de 18 anos e os alienados ou débeis mentais. Os verbos são“abusar” e “induzir” em conjunto, pois que o criminoso abusa do incapaz e oinduz à prática de ato prejudicial.O crime é doloso e comdolo específico deobterproveitopatrimonialparasiouparaterceiro.Ocrimeéformal,razãopelaqual se consume com o abuso e induzimento, bem como a prática de atosuscetíveldeprejuízopelavítima,sendoaobtençãodeefetivavantagemmeroexaurimento.Podehavertentativaquandoemborainduzidaavítimaéimpedidadapráticadoatolesivo.Aaçãopenalépúblicaincondicionada.

InduzimentoàEspeculação(art.174,CP)Tutela-se o patrimônio. O crime é comum, consistindo no induzimento

abusivodepessoainexperiente,simplóriaoudepoucacapacidadeintelectualapraticar jogos ou apostas ou especular no mercado financeiro, tendo oconhecimentorealoupotencialdequetaiscondutasserãoruinosas.Ocrimeédedolo específico, consistente no desejo de obter “proveito próprio ou alheio”(patrimonial).Emboraotipopenalafirmaqueoagentesaibaoudevasaberqueaoperaçãoseráruinosa,essedeversabernãoabrangeacondutaculposa,queéatípica. O deve saber está ligado ao dolo eventual. O crime é formal e seconsume com a prática do jogo, aposta ou especulação pela vítima, sendoindiferente a consecução da vantagem patrimonial indevida pelo autor(exaurimento). É possível a tentativa sempre que a vítima for impedida depraticar o ato prejudicial ao seu patrimônio. A ação penal é públicaincondicionada.

FraudenoComércio(art.175,CP)Opatrimônio éobem tutelado.Ocrimeépróprio, poisque somentepode

perpetrá-loocomerciante.Avítimaéoadquirenteouconsumidordeprodutos.Aconduta é de “enganar”, vendendoou entregandomercadorias.Seumapessoanão comerciante perpetrar as condutas descritas no tipo, responderá por

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estelionatonamodalidadeprevistanoart.171,§2º,IV,CP.Afraudepodedar-sequantoàqualidadeouasubstânciaouessênciadamercadoria.Essamercadorianãopodeserprodutoalimentíciooumedicinal,poisnessecasoserãoaplicáveisosarts.272e273,CP.O§1ºprevêcrimequalificadoquandooagentealteraemobraaqualidadeoupesodemetalempregadoouentãoquandosubstituipedrapreciosa verdadeira por falsa; também prevê a venda de pedra falsa porverdadeira e demetal não precioso por precioso oumesmo precioso, mas demenorqualidade.Novamenteé importante ter emmentequeoautordocrimedeve ser comerciante, senão será aplicado o crime de estelionatosupramencionado.Sãoaplicáveisaessecrimeasbenessesdofurtoprivilegiadodeacordocomoart.175,§2º,desdequesatisfeitosseusrequisitos.Ocrimeédoloso (dolo genérico). Trata-se de crime material que se consume com orecebimentodomaterial fraudadopelavítimae respectivoprejuízo financeiro,sendocabívelatentativa.Aaçãopenalépúblicaincondicionada.

OutrasFraudes(art.176,CP)Novamentetutela-seopatrimônio.Ocrimeécomum,eosujeitopassivoéo

donoderestaurante,hoteloumeiodetransporte.Acondutaconsisteemtomarrefeição (inclusive bebidas), alojar-se em hotel ou utilizarmeio de transporte,sabendooagentequenãodispõedenumerárioparaopagamentodasdespesas.Nocasodos restaurantes ehotéisdeve-se aplicaruma interpretação analógica,sendoos termos“restaurante”e“hotel”exemplosdelocaisondeháserviçoderefeiçõesebebidas,bemcomodehospedagem.Dessaformaháocrimequandosetratadebares,estalagens,pensões,hospedarias,cantinas,boates,motéisetc.Énecessárioqueoautordocrimeatuecientedequenãotemdinheiroparapagar.Setiverenãoquiserpagar,nãohácrime,esiminadimplementoaserdiscutidona esfera civil. O crime é doloso (dolo genérico) e não existe modalidadeculposa (ex.: a pessoa que toma refeição e esqueceu-se da carteira). Tem-seentendidoquenocasodasrefeições,comooverboé“tomar”refeição,estadeveocorrer no estabelecimento.Nos casos dedelivery ou em que o agente leve acomidaparaserconsumidaemoutrolocalhaveriaestelionato(BITENCOURT,2008,p.698).EntretantoRogérioGrecoapontaafaltadeproporcionalidadedetal solução, pois que haveria apenação maior de quem não se utiliza doestabelecimentoesuasinstalações.Naopiniãodoautor(minoritária),dever-se-ia aplicar emambosos casoso art. 176,CP(GRECO,2011, p. 545).Emboraminoritário,oentendimentodeGreconospareceomaisequilibrado.Ocrimeé

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material e se consume com a prática das condutas da tomada da refeição,alojamento ou uso do meio de transporte sem pagamento, de modo que atentativaépossível.Oparágrafoúnicodoart.176dispõequeoJuizpodedeixardeaplicarpenadeacordocomascircunstânciasdocaso.Trata-sedehipótesedeperdão judicial, normalmente aplicada a situações de pequeno prejuízo,miserabilidade do agente etc. É preciso, porém, atenção com as situaçõesfamélicas, em que não haverá crime, superando a situação de mero perdãojudicial. A ação penal é pública condicionada à representação (art. 176,parágrafoúnico,parteinicial).

FraudeseAbusosnaFundaçãoouAdministraçãodeSociedadesporAções(art.177,CP)

O bem tutelado é o patrimônio. O crime é próprio, sendo cometido porfundadordesociedadeporações.Jáosujeitopassivopodeserqualquerpessoa.A conduta consiste na criação fraudulenta de sociedade por ações. Só hámodalidadedolosa.Aconsumaçãosedácomaafirmaçãofalsaouaocultaçãodefatoimportanteacercadasociedade.Ocrimeéformal,demodoqueeventuaisprejuízos causados constituem exaurimento. Afirma-se na doutrina que atentativaépossível em tese, emboradedifícil ocorrênciaprática.A infraçãoésubsidiária(subsidiariedadeexpressa)emrelaçãoaoscrimescontraaeconomiapopularprevistosnaLein.1.521/51.Háprevisãodeváriosincisosno§1º,comespécies equiparadas praticáveis pelo diretor, liquidante, gerente ou fiscal.Tambémháprevisãodecrimeespecíficono§2º,paraoacionistaquenegociarseuvotonaassembleia,visandovantagempessoalouparaterceiros.Nestecasoodoloéespecífico.Aaçãopenalépúblicaincondicionada.

EmissãoIrregulardeConhecimentodeDepósitoouWarrant(art.178,CP)

Tutela-se o patrimônio.O sujeito ativo é o depositário (crime próprio) e osujeito passivo é o endossatário ou o portador do título. O verbo é “emitir”,colocandoo títuloemcirculação.Esse títuloéoconhecimentodedepósitoouwarrant,ouseja,papéisexpedidosadepositantesdemercadoriasporarmazénsgerais,passíveisdetransferênciaporendosso,demodoapossibilitaratransação

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dasmercadoriasdepositadas.Owarrantéumtítulodecréditoqueconsisteemuma promessa de pagamento e atribui ao depositante uma espécie de penhorsobre os bens depositados. Para que haja crime, a emissão deve dar-se “emdesacordo com disposição legal”, de forma que se trata de norma penal embranco a ser complementada pelo Decreto n. 1.102/2003 que disciplina aquestão. Trata-se de crime doloso e formal que se consuma com a emissãoirregular do título. Não há possibilidade de tentativa. A ação penal é públicaincondicionada.

FraudeàExecução(art.179,CP)Afraudeàexecuçãoprotegeopatrimôniodocredor(vítima),tratando-sede

crimepróprioquesópodeserperpetradopelodevedorexecutadojudicialmente.A conduta consiste em fraudar a execução, mediante o desvio, destruição oudanoabensouasimulaçãodedívida,demodoquesetratadecrimedeformavinculada.Discute-seseocrimeemtelasomentepodeserpraticadonafasedeexecuçãoousepodeocorrerapartirdacitaçãoemumaaçãodecobrança,porexemplo,ounoprocessodeconhecimentoemgeral.Hádivisãodoutrináriadeforma que Delmanto, Bitencourt, Magalhães Noronha, Rogério Greco,Andreucci, Mariano da Silva e Mirabete alegam que o crime somente podeocorrer na fase executória, enquanto Fragoso, Damásio, Costa Júnior, Capez,BentodeFaria ePradodefendema tese adversa.Hádecisões jurisprudenciaisemambosos sentidos.Em facedadicção legalpredominaa tesedequedevehaverprocessodeexecução,comoqueconcordamosporforçadoPrincípiodaLegalidade, não sendo admissível a interpretação extensiva neste caso. Só hámodalidade dolosa.O crime ématerial, consumando-se com a efetiva lesão àexecução,demaneiraquecabetentativa.Aaçãopenalé,emregra,privada(art.179,parágrafoúnico,CP),maspoderáserpúblicaincondicionadaseaexecuçãoversarsobrepatrimôniodaUnião,EstadoouMunicípio,conformeart.24,§2º,CPP(v.g.execuçãofiscal).

Receptação(art.180,CP)Noçõesbásicas

Areceptação,sejaemsuaformasimples,qualificadaouculposa,éumtipomistoalternativo,deconteúdovariadooudeaçãomúltipla,comportandováriosverbos. Ela é um crime autônomo, não havendo coautoria ou participação no

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crime antecedente,mas sim no crime do art. 180,CP, nos casos daqueles queadquirem produtos de origem ilícita. No entanto, é crime acessório ouparasitário,porquedependedaocorrênciadeumcrimeanteriorparaexistir.

ObjetividadejurídicaÉopatrimônio,poisareceptaçãoafastaaindamaisacoisadeseulegítimo

proprietário. Indiretamente a receptação viola também o interesse daadministraçãodajustiça,dificultandoaaçãopolicialejudiciária.

SujeitoativoQualquerpessoapodesersujeitoativodereceptaçãosimplesouculposa(art.

180,capute§3º–crimecomum).Jáareceptaçãoqualificada(§1º)sópodeserpraticada por empresários (comerciantes ou industriais) no exercício darespectiva atividade (crime próprio). Inclusive são abrangidas atividadesindustriaisoucomerciaisclandestinas,conformeequiparaçãopromovidapelo§2º,doart.180,CP.

O coautor ou partícipe do crime antecedente não responde por receptação,mas somente pelo crime primeiro. O advogado pode cometer o crime dereceptaçãoserecebecoisaquesabiaserprodutodecrimecomopagamentodeseushonorários.

SujeitopassivoÉoproprietáriodacoisaquefoiobjetodocrimeantecedente.

TipoobjetivoParaconfigurara receptação,é indispensávelumcrimeanterior,masnãoé

necessário inquérito, processo e muito menos sentença condenatória (ver art.180, § 4º, CP). Não importa, inclusive, se o autor do crime principal édesconhecidoouimpunível.

O crime antecedente normalmente será patrimonial, mas na doutrina háposicionamentodequenãoé imprescindívelquesejapatrimonial,podendoserprodutosdeoutroscrimesquaisquer,como:peculato,lenocínio,contrabandooudescaminhooumesmooutrareceptação.Tambémnãoimportasequemcometeuocrimeanterioréinimputável.

Eseosupostoautordocrimeantecedentefoiabsolvido?Isso depende da natureza da absolvição: a) se foi absolvido por falta de

provasouporquenãoéconsideradooautordocrimeantecedente,éindiferente

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paraa receptação;b)se foiabsolvidopor reconhecimentodeexcludentes (ex.:estado de necessidade), Nelson Hungria considera que isso não beneficia oreceptadorpor se tratardequestãopessoal,maso restantedadoutrina tendeaestender o benefício ao receptador. Hungria segue um critério de justiça. Aabsolvição por excludente é pessoal e não pode ser estendida a outrem(HUNGRIA, 1967, p. 321). O restante da doutrina segue um critério técnico,pois, se há causa excludente de antijuridicidade, não há propriamente “crimeantecedente”,deformaadesnaturarareceptação(oacessóriosegueoprincipal).Emnossaopinião,Hungria tem razão,masestanãoé aposiçãopredominantesobre o tema; c) se foi absolvido porque o fato não existiu fica prejudicada areceptação,poisquedesapareceocrimeprincipal.

Areceptaçãosimplescostumaserdivididaem:a)própria–verbosadquirir,receber, transportar, conduzir ou ocultar; e b) imprópria – influir para queterceiro de boa-fé a adquira, receba-a ou oculte-a. Nas modalidades detransportar,conduzireocultar,ocrimeépermanente,nasdemaiséinstantâneo.Na receptação imprópriao crimeé formal,não se exigindoquea “influência”seja bem-sucedida, bastando que seja idônea, isto é, mesmo que a pessoa deboa-fé não venha a adquirir, receber ou ocultar o produto, o crime estaráconsumado. Acaso ambos (adquirente e influenciador) estiverem de má-fé,responderãoporreceptaçãoemcoautoria(receptaçãoprópria).

Indaga-seseoimóvelpodeserprodutodereceptação.Adoutrinadominanteentendequesomenteosmóveispodemserobjetodereceptação(nestesentido:Alberto Silva Franco, Celso Delmanto, Paulo José da Costa Júnior, Damásioetc.).Esses autores se baseiamem reiteradasdecisões doSTFenos seguintesargumentos: a) os crimes de furto e roubo só podem ser cometidos tendo porobjeto coisa alheia móvel e quando em outros crimes patrimoniais se querestenderao imóvelaaplicaçãoofazo legisladorexpressamente;b)receptaçãoviriade“receptáculo”,sendoligadaàquiloquerecebealgoesomenteomóvelseadequariaaisso,porserpassívelderemoçãodeumlugarparaooutro.Contraessepensamento(emminoria),aduzindoquehácrimespatrimoniaisqueafetamimóveis também e que o art. 180, CP, não é restritivo, temos Mirabete eMagalhães Noronha. Em nosso entendimento, embora minoritária, a razãoassisteaestasegundacorrente.Aprincípio,oargumentosobrefurtoerouboétotalmentedescabido,umavezqueocrimeantecedentepodeperfeitamenteseroutro, inclusive daqueles que admitem como objeto material imóveis (v.g.extorsãoouestelionato).Oargumentoetimológicoéaindamaisrisível,alémdoquenadajustificariaquealguémqueadquirisseumimóvelprodutodecrime(de

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extorsão,porexemplo),cientedisso,restasseimpunívelporatipicidade.Nareceptaçãoculposaoagentenãosabequeoprodutoédeorigemilícita,

masdeveriaterdesconfiado,sejapeladesproporçãoentreovaloreopreço,sejapelascondiçõesdequemooferece.

TiposubjetivoNo art. 180, caput, CP (receptação simples) o crime é doloso, devendo o

agentesaberqueacoisaéprodutodecrime.Nessedispositivosócabeodolodireto,enãooeventual.Odolotambéméespecífico(“emproveitoprópriooualheio”).

Existe, porém, a receptação culposa (art. 180, § 3º, CP), de modo que,existindo dúvida quanto à origemda coisa, haverá receptação culposa, a qual,extraordinariamente,abrangetambémodoloeventual.

Jánareceptaçãoqualificada(art.180,§1º,CP)olegisladorusouaexpressão“devesaber”,provocandomuitapolêmica,masprevalecendoquecabemodolodiretoeoeventual (ver a respeitoSTJ,HC97.344,2ªTurma,Rel.Min.EllenGracie).

Indaga-se sobrea situaçãoemqueoagenteadquirealgo,nadahavendodesuspeito inicialmente, e que, depois, vem a saber que é produto de crime.Haverianessecasoreceptação?

Esseéochamadodolussubsequensquepodesimcaracterizarareceptação,desdequeapósaciênciadaorigemilícitadoprodutooagente insistaemficarcomeleourepassá-loa terceirodeboa-féoumesmooutroreceptador.Éclaroque a pessoa que, ao saber da origem ilícita, procura pelas autoridades paraprovidênciaslegaisnãocometereceptação,aomenosnãonaformadolosa.

ConsumaçãoetentativaA receptação se consuma quando integrado algum dos verbos típicos. A

tentativa é inviável na receptação culposa e possível na dolosa simples ouqualificada. Na simples a possibilidade de tentativa varia: a) na receptaçãoprópria épossível– crimematerial; b)na receptação impróprianãoépossívelporque se trata de crime formal que se consuma coma simples influência, demodoqueaaquisiçãoourecepçãoposterioréexaurimento.

PerdãojudicialereceptaçãoprivilegiadaO§5º,doart.180,CPprevêapossibilidadedeperdãojudicialnareceptação

culposa(§3º),seocriminosoforprimárioeconsiderandoascircunstânciasdo

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caso (exs.: coisa de pequeno valor etc.). Também prevê em sua parte final aaplicabilidadedasdisposiçõesdofurtoprivilegiadoàreceptaçãodolosa.

AumentodepenaO§6º,doart.180,CPmandadobrarapenadocaputacasosetratedebense

instalaçõesdopatrimôniodaUnião,Estado,Município,empresaconcessionáriade serviços públicos ou sociedade de economia mista. Nesses casos há oatingimento da coletividade, e não de uma pessoa particular, justificando-se aexacerbação punitiva. É preciso atentar para que esse aumento somente seaplique ao caput (receptação simples) e jamais aos §§ 1º e 3º (receptaçãoqualificadaouculposa).Issoporquealeiéexpressanessesentido.

AçãopenalA ação penal na receptação, em todas as suas modalidades, é pública

incondicionada.

DisposiçõesGeraisdosCrimesContraoPatrimônio(arts.181a183,CP)

Neste tópico trata-se das chamadas imunidades nos crimes patrimoniais.Essas imunidades são denominadas absolutas e relativas. As imunidadesabsolutas estão previstas no art. 181, I e II, CP, e ocasionam isenção de penaquandoocrimeécometidoemprejuízo:a)Docônjuge,naconstânciadasociedadeconjugal.Tem-seadmitidoaextensão

desse benefício aos casos de união estável, considerando o tratamentoparitáriodadopelaConstituiçãoepelaordemcivil(ANDREUCCI,2010,p.483; GRECO, 2011, p. 574). Há, porém alguns autores que entendemdiversamente,alegandoquenãosepodeaplicarosefeitoscivisnaáreapenalno caso da união estável (BITENCOURT, 2008, p. 744), sob pena deestender-separaocrimedebigamiaaabrangênciadauniãoestável(NUCCI,2003,p.603).Esseentendimentotemprevalecido.Anossoveroraciocíniopor último invocado é errôneo. Confunde o tratamento de normas penaispunitivas com o de normas benéficas ao réu, que é o caso da imunidadeabsoluta.Nessa situação cabe analogia porque esta é in bonam partem; nocaso da bigamia, obviamente é incabível, pois que seria inmalam partem.Nãohárazãoparaexcluiroscompanheirosdobenefício(ubieademratio,ibieademjus–ondeháosmesmosmotivos,deve-seaplicaromesmodireito).A

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única diferença será a prova da união estável. Enquanto no casamento aprova é documental (Certidão de Casamento), na união estável deveráperpassarpelaprovatestemunhal,pelapalavradoscompanheiroseatépelaprova documental (v.g. casamento religioso, contratos de aluguel comuns,filhos comuns etc.).Odivórcio elimina a imunidade.Omesmonãoocorrecomameraseparaçãodefatooumedidascautelaresprévias.Aconstânciadaunião deve ser aferida no momento do crime, de modo que o casamentoposterior não exclui a punibilidade, assim como não afasta da exclusão odivórcio posterior ou a anulação domatrimônio (BITENCOURT, 2008, p.744).Obviamente não são abrangidos amantes,meros namorados, relaçõesextraconjugais,concubinatoetc.Noscasosemquea imunidadeéaplicávelnão importao regimedebensdo casamento,mas somente a constânciadasociedadeconjugal.

b)Do ascendente ou descendente, abrangendo qualquer espécie de parentescocivil ou natural. A lei fazmenção ao parentesco legítimo ou ilegítimo poranacronismocomonovosistemacivileconstitucional.Essasdiferenciaçõessãohoje inconstitucionais.Mesmoamençãoexpressadosparentescoscivilou natural é anacrônica a partir do momento em que foram totalmenteequiparadosparatodososfinspelaConstituiçãode1988epeloCódigoCivilde2002.Porseuturno,asimunidadesrelativasestãoprevistasnoart.182,IaIII,CPe

não impedemaplicaçãode pena,mas somente tornama açãopenal, que é emregra pública incondicionada, em pública condicionada à representação. Issoquandoocrimeécometidoemprejuízo:a)Docônjugedesquitadoou judicialmente separado–Atualmente a primeira

partedodispositivo,quandoserefereaocônjuge“desquitado”,éinaplicável,umavezquenãosubsisteemnossoordenamentoafiguradodesquitedesdeadécadade1970(videLein.6.515/77).Quantoaosjudicialmenteseparados,mesmo após a EmendaConstitucional n. 66, de 13 de julho de 2010, queestabelece o divórcio direto como regra (videart. 226, § 6º,CF), há acesadiscussão doutrinária sobre a possibilidade excepcional, especialmente emcasos litigiosos, da subsistência da separação judicial nos termos daLei n.6.515/77. Assim sendo, temos: a) cônjuges na constância da sociedadeconjugal – imunidade absoluta; b) cônjuges judicialmente separados –imunidaderelativa;c)divorciadosoucasamentoanulado–nãoháimunidadealguma.

b) Do irmão – Obviamente a expressão abrange irmão e irmã. A lei

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anacronicamentetambémfalaemirmãolegítimoeilegítimo,oquehojepodeser desprezado, inclusive no aguardo de alteração legislativa que conserteessaimpropriedade.

c)De tioou sobrinho,comquemoagentecoabita –Tambémvale para tias esobrinhas.Nãobastasertioousobrinho,mashánecessidadedequemoremsobomesmo teto, senãoé afastadaa imunidade.Tambémnãoé suficienteque morem próximos ou num mesmo terreno, mas que morem realmentejuntos.As referidas imunidades absolutas ou relativas são afastadas nos seguintes

casos previstos no art. 183, I a III, CP, mesmo que estejam satisfeitos seusrequisitossupraelencados:a)Seo crime é de rouboou extorsão, ou, emgeral, quandohaja empregode

grave ameaça ou violência a pessoa –As imunidades não se aplicam aoscrimes patrimoniais informados pela violência ou grave ameaça. A leimenciona explicitamente o roubo e a extorsão, mas a vedação abrangequalquer situação de violência contra a pessoa (v.g. dano com violênciacontraapessoa,extorsãomediantesequestro).Note-sequeaviolênciadevesercontraapessoa.Seformeraviolênciacontracoisa,nãoháafastamentodaimunidade.

b) Ao estranho que participa do crime – Logicamente as imunidades sãopessoaiseporissosomentetêmvalidadeparaaquelequeaspossui.OincisoIIdoart.183,CP,chegaaserdispensável,tendoemvistaodispostonoart.30,CP,queregulaaincomunicabilidadedascircunstânciaspessoais.Aregraéválidaparacrimesviolentosounão.

c)Seocrimeépraticadocontrapessoacomidadeigualousuperiora60anos–EsseúltimoincisofoiacrescidopeloEstatutodoIdoso(Lein.10.741/2003).Sendoavítimaidosanaocasiãodocrime,asimunidadessãoafastadas,aindaque se trate de crime sem violência ou grave ameaça. Entretanto, se naocasião do crime a vítima não tem 60 anos oumais,mesmo completandoessaidadeposteriormente,asimunidadesnãosãoafastadas.Finalmenteérelevantesalientarque,comoadventodaLeiMariadaPenha

(Lei n. 11.340/2006) e a previsão, em seu art. 70, IV, da chamada “violênciapatrimonial” contra amulher, tem-se alegadoque as imunidades são afastadasquandoavítimaformulheremsituaçãodeviolênciadomésticaoufamiliar.Paraessa concepção, teria havido derrogação tácita dos arts. 181 e 182,CP, nessescasos pela Lei n. 11.340/2006, art. 7º, IV (lei posterior), tendo em vista sua

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incompatibilidade. Isso porque as imunidades impediriam a aplicação da LeiMariadaPenhanaviolênciapatrimonialcontraamulher,eisquenessescasosgeralmente estariam envolvidos beneficiados pela imunidade (v.g. cônjuge,ascendente,descendente,irmão,tioetc.)(Nestesentido:DIAS,2007,p.88-89).Entendemosdemododiverso,poisqueoart.183,CP,comsuasexceções, fazcomqueosdispositivosdosarts.181e182,CP,eoart.7º,IV,daLeiMariadaPenha possam conviver harmonicamente, não havendo incompatibilidade quejustifiquederrogaçãotácitaquandoavítimaformulheremviolênciadomésticaou familiar. Ademais, as imunidades relativas (art. 182, CP) não impedem apunição e persecução penal, mas apenas a condicionam à representação daofendida(videCABETTE,2007).

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PARTEIIIDosCrimesContraaPropriedade

Imaterial(arts.184a196,CP)

ViolaçãodeDireitoAutoral(art.184,CP)

UsurpaçãodeNomeouPseudônimoAlheio(art.185,CP)

DosCrimesContraoPrivilégiodeInvenção(arts.187a191,CP);

dosCrimesContraasMarcasdeIndústriaeComércio(arts.192a195,CP)edosCrimesdeConcorrênciaDesleal(art.196,CP)

ViolaçãodeDireitoAutoral(art.184,CP)Tutela-seodireitodeautoredaquelesquelhesãoconexos.Odispositivoé

norma penal em branco, devendo ser complementado pela Lei n. 9.610/98.Ocrimeécomum,eosujeitopassivoéoautorouaquelequedetématitularidadesobre os direitos autorais. Sendo obra que caiu no domínio público, o sujeitopassivo será a sociedade. A violação pode ser patrimonial ou moral (v.g.exploração financeira sem autorização ou plágio). O direito autoral abrangeobrasliterárias,artísticasecientíficas.Hámuitasformasdeviolaçãodedireitoautoral,mas asmais comuns são o plágio (imitação da obra alheia, ainda que

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dissimuladaporartifícios)eacontrafação(publicaçãooureproduçãoabusivadatotalidadeoupartedeobraalheia).Atente-separaofatodequeseaviolaçãofordeprogramasdecomputadorprevaleceocrimeespecialdaLein.9.609/98(art.12). O crime é doloso e se consuma com a efetiva violação. A tentativa éadmissível.

O § 1º prevê qualificadora quando ocorre reprodução de “obra intelectual,interpretação, execução ou fonograma”, sem autorização expressa de quemdedireito e com o intuito de lucro direto ou indireto. Outra qualificadora estádisposta no § 2º, para a exploração comercial com intuito de lucro de obrareproduzida de acordo com o § 1º. Finalmente o § 3º prevê novamodalidadequalificada pela oferta ao público, com uso de meios eletrônicos, de obra ouprodução que viola direito autoral, também com intuito de lucro direto ouindireto.

O § 4º prevê hipóteses de exclusão de tipicidade: a) casos de exceções oulimitaçõesdodireitodeautorprevistosnaLein.9.610/98(videarts.46,IaVII;47 e48dessediploma); b) cópiaúnicaparausoprivadodapessoaque copia,sem intuitode lucrodiretoou indireto.Oproblemadessadisposiçãoéqueelasomenteserefereaosparágrafosdoart.184,CP,enãoaocaput.Assimsendo,elasetornainútil,porquenessesparágrafosafaltadointuitodelucrojáafasta,por si só, a tipicidade. Quanto ao caput, de acordo com alguns, mesmo umaúnicacópiaconfigurariaainfração(SILVA,2006,p.241).Naverdade,mesmoamenção das exceções ou limitações do direito do autor são inúteis, já que, seexistem,atipicidadenormalmenteseriaafastada,independentementedacriaçãoounãodo§4º(MIRABETE,2011,p.343).Agoracomrelaçãoàafirmaçãodequeumaúnicacópiaparausoprivadoesemintuitodelucroconfigurariaocaput(SILVA, p. 241), não se pode concordar, pois que o afastamento das formasqualificadaspressupõeoafastamentodocrimesimplesmedianteumcritériodeproporcionalidadeebom-senso.

Quanto à ação penal, ela é regulada no art. 186, CP. No caso do crimesimples(art.184,caput,CP),aaçãoéprivada.Épúblicacondicionadanoscasosqualificadosdos§§1º,2ºe3º.Finalmente,épúblicaincondicionadaseocrimeforpraticadoemprejuízodeentidadesdedireitopúblico,autarquias,empresaspúblicas,sociedadesdeeconomiamistaoufundaçõespúblicas.

UsurpaçãodeNomeouPseudônimoAlheio(art.185,CP)

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RevogadopelaLein.10.695/2003.

DosCrimesContraoPrivilégiodeInvenção(arts.187a191,CP);dosCrimesContraasMarcasdeIndústriaeComércio(arts.192a195,CP)edosCrimesdeConcorrênciaDesleal(art.196,CP)

Todos revogados pela Lei n. 9.279/96, que trata dos crimes contra apropriedadeindustrial.

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PARTEIVDosCrimesContraaOrganizaçãodo

Trabalho(arts.197a207)

AtentadoContraaLiberdadedoTrabalho(art.197,CP)

AtentadoContraaLiberdadedeContratodeTrabalhoeBoicotagemViolenta(art.198,CP)

AtentadoContraaLiberdadedeAssociação(art.199,CP)

ParalisaçãodoTrabalho,SeguidadeViolênciaouPerturbaçãodaOrdem(art.200,CP)

ParalisaçãodeTrabalhodeInteresseColetivo(art.201,CP)

InvasãodeEstabelecimentoIndustrial,ComercialouAgrícola.Sabotagem(art.202,CP)

FrustraçãodeDireitoAsseguradoporLeiTrabalhista(art.203,CP)

FrustraçãodeLeisobreaNacionalizaçãodoTrabalho(art.204,CP)

ExercíciodeAtividadecomInfraçãodeDecisãoAdministrativa(art.205,CP)

AliciamentoparaoFimdeEmigração(art.206,CP)

AliciamentodeTrabalhadoresdeumLocalparaoutrodoTerritórioNacional(art.207,CP)

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AtentadoContraaLiberdadedoTrabalho(art.197,CP)

Tutela-se a liberdade do trabalho. O crime é comum, e a vítima pode serqualquerpessoa,inclusivepessoajurídica.Aviolênciapodeserexercidacontraqualquer pessoa, inclusive terceiros. São quatro condutas: a) constrangimentoviolentoouameaçadoraonãoexercíciodearte,ofício,profissãoouindústria;b)constrangimentoviolentoouameaçador a trabalharounãoemcertosperíodosoudias;c)constrangimentoviolentoouameaçadoràaberturaoufechamentodeestabelecimento de trabalho; c) constrangimento ameaçador ou violento àparticipação de parede ou paralisação de atividade econômica. Em caso deviolência,aleiimpõeoconcursomaterial.Ocrimeédoloso(doloespecífico)ematerial, consumando-se com o constrangimento da vítima e admitindo atentativa.Aaçãopenalépúblicaincondicionada.

AtentadoContraaLiberdadedeContratodeTrabalhoeBoicotagemViolenta(art.198,CP)

Bem jurídico tuteladoéa liberdadede trabalho.O tipoédivididoemduaspartes: a primeira refere-se ao atentado contra a liberdade de contrato detrabalho;asegunda,àboicotagemviolenta.Háduascondutas,masotiponãoémisto alternativo, e simmisto cumulativo, de forma que a prática das duascondutas ensejará responsabilização por dois crimes em concurso material. Aprimeira parte refere-se ao constrangimento, mediante violência ou graveameaça à celebração de contrato de trabalho não desejado. Note-se que, se oconstrangimentoforparaanãocelebraçãodocontrato,nãohaveráocrimedoart.198,CP,masconstrangimentoilegal(art.146,CP).Entretanto,nãoimportaseocontratoéindividualoucoletivo,escritoouverbal,originalourenovação,modificaçãoouadição.Jánaboicotagemviolenta,agraveameaçaouviolênciaéempregada para constranger alguém a não negociarmatéria-prima ou produtoindustrial ou agrícola. Trata-se de figura somente dolosa (dolo específico),materialequepodeserpermanenteou instantâneo,dependendodacondutado

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agente.O atentado se consuma com a celebração do contrato e a boicotagem,comoconstrangimentodapessoaanãonegociar.Atentativaépossível.Aaçãopenalépúblicaincondicionada.

AtentadoContraaLiberdadedeAssociação(art.199,CP)

Bemtuteladoéaliberdadedeassociaçãoconstitucionalmenteprevistanoart.5º, XVII, CF. Sujeitos ativo e passivo podem ser qualquer pessoa (crimecomum). A conduta se constitui no constrangimento por violência ou graveameaçaaparticiparounãodesindicatoouassociaçãoprofissional.Aviolênciaensejaconcursomaterialdecrimes.Acondutaédolosaematerialeseconsumacom o constrangimento, admitindo tentativa. Ação penal é públicaincondicionada.

ParalisaçãodoTrabalho,SeguidadeViolênciaouPerturbaçãodaOrdem(art.200,CP)

Tutela-se a liberdade do trabalho e a ordem pública. O crime é comum,podendoserperpetradopeloempregado (greve)ouempregador (lockout).Nãose pune a greve ou paralisação (direito individual),mas seu exercício abusivocomempregodeviolênciacontraapessoaoucoisa.Asvítimasserãoaspessoasque sofrem com a violência. Trata-se de crime de concurso necessário, poisexigeaparticipaçãomínimadetrêspessoas.Sóhácondutadolosa,eocrimeématerial,consumando-secomapráticadaviolênciaduranteagreveoulockout,deformaaadmitiratentativa.Açãopenalépúblicaincondicionada.

ParalisaçãodeTrabalhodeInteresseColetivo(art.201,CP)

ODireito deGreve é constitucionalmente assegurado,mas não é absoluto.AschamadasatividadesessenciaissãosubmetidasaregrasespeciaispelaLein.7.783/89.Agreveoulockoutqueprejudiqueobrapúblicaouserviçodeinteressecoletivo, foradasnormasdaLein.7.783/89, caracterizaráocrimeemestudo,tendoporsujeitoativotantoempregadoscomoempregadores.Sujeitopassivoé

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a coletividade. O crime é doloso, e a paralisação tem de ser considerável,prejudicandooserviçoouaobra(PrincípiodaInsignificância).Trata-sedecrimecomumematerial,consumando-secomaparalisaçãoeoprejuízoaoserviçoouobra.Admite-seatentativa.Açãopenalépúblicaincondicionada.

InvasãodeEstabelecimentoIndustrial,ComercialouAgrícola.Sabotagem(art.202,CP)

Tutela-se a organização do trabalho. A conduta consiste na invasão dosestabelecimentos supramencionados comdolo específicodeprejudicar o cursonormaldefuncionamento(invasãoouocupação)oudepraticardanosmateriais(sabotagem). O crime é comum, somente não o praticando o empregador ouproprietário do estabelecimento, que é vítima, juntamente com a coletividade.Consuma-secomainvasãoousabotagemeadmite-seatentativa.Açãopenalépúblicaincondicionada.

FrustraçãodeDireitoAsseguradoporLeiTrabalhista(art.203,CP)

Bemjurídicosãoosdireitostrabalhistas.Acondutaéafrustração,porfraudeouviolência,dosdireitostrabalhistas.Emcasodeviolênciaháconcursomaterialde crimes. Note-se que a infração é de forma vinculada, de modo que afrustração deve se dar por fraude ou violência. Emoutros casos tratar-se-á demerainfraçãotrabalhistapenalmenteatípica.Tambémaameaçanãoéprevista,demodo que constituirá crime de ameaça (art. 147, CP) ou ConstrangimentoIlegal (art. 146, CP) (JESUS, p. 48). O crime é comum, e a vítima é otrabalhador.Trata-se de normapenal embranco, devendo ser completada pelaLegislaçãoTrabalhista.Crimematerial,seconsumacomafrustraçãododireitotrabalhista, admitindo tentativa.Hácondutas equiparadasprevistasno§1º, dodispositivoenfocado,prevendoaretençãodotrabalhadormedianteaobrigaçãode aquisição de mercadorias em certo estabelecimento, de modo a atá-lo adívidas,bemcomooimpedimentodeseudesligamentoporcoaçãoouretençãode documentos pessoais ou contratuais. Nesses casos deve-se atentar parasituaçõesdereduçãoàcondiçãoanálogaàdeescravo(art.149,CP)esupressãodedocumentos(art.305,CP),devendo-sefazerasdevidasdistinçõesquedizemrespeitobasicamenteaoselementossubjetivos.

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Há previsão de aumento de pena de um sexto a um terço se a vítima formenor,idosa,gestante,indígenaouportadoradedeficiênciafísicaoumental(§2º).Açãoépúblicaincondicionada.

FrustraçãodeLeisobreaNacionalizaçãodoTrabalho(art.204,CP)

Em algumas atividades laborais a CLT (arts. 352 a 371) estabelece aproporção obrigatória de empregados brasileiros para a proteção danacionalizaçãodotrabalho,bemjurídicotuteladopeloartigoemestudo.Ocrimeécomum,eo sujeitopassivoéoEstado (crimevago).Acondutaconsisteemviolar a legislação sobre a nacionalização do trabalho, mediante fraude ouviolênciaapessoa(normapenalembrancocompletadapelaCLT).Nãotratadaameaçaqueconfiguraráinfraçãoaoart.147ouart.146,CP,conformeocaso.Sóhá figura dolosa, sendo crime material que se consuma com a frustração dasnormas correlatas, de modo que cabe tentativa. Ação penal é públicaincondicionada.

ExercíciodeAtividadecomInfraçãodeDecisãoAdministrativa(art.205,CP)

É tuteladoo cumprimentodasdecisões administrativas.Ocrimeépróprio,somente podendo ser cometido por alguém que esteja impedidoadministrativamentedeexercercertaatividade.OsujeitopassivoéoEstado.Aconduta consiste em exercer a atividade impedida, desobedecendo adeterminação administrativa impediente. Se o impedimento se dá por decisãojudicial, o crime é o do art. 359, CP. O crime é doloso e habitual, exigindoreiteração de atos, de forma que não existe a tentativa. A ação é públicaincondicionada.

AliciamentoparaoFimdeEmigração(art.206,CP)

Defende-seapermanênciadostrabalhadoresnoBrasil.Ocrimeécomum,eosujeitopassivoéoEstado.Acondutaconsisteemrecrutartrabalhadoresparalevá-los a território estrangeiro. O recrutamento deve dar-se mediante fraude

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(forma vinculada). Usando a palavra no plural (“trabalhadores”), a lei exigepluralidade vitimal. Discute-se na doutrina se seriam ao menos dois (SILVA,2006, p. 255; JESUS, 2005, p. 609;DELMANTO et al., 2010, p. 682) ou aomenos três trabalhadores (GRECO, 2011, p. 598; PRADO, 2003, p. 133;BITENCOURT,2008,p.783;MIRABETE,2011,p.364;NORONHA,1990,p.70). Embora prevalente a opinião sobre a necessidade de ao menos três,entendemosquebastamdoistrabalhadores,jáquealeinãoéexpressa.Afiguraésomentedolosa(doloespecífico).Temdehaveroelementoda“fraude”,razãopelaqualoaliciamentodetrabalhadoresparaoexteriorsemfraudeéfatoatípico(MIRABETE,2011,p.364).Ocrimeéformaleseconsumecomoaliciamento,nãonecessitandoqueostrabalhadoresdeixemoterritórionacional.Noentanto,cabeatentativa.Açãoépúblicaincondicionada.

AliciamentodeTrabalhadoresdeumLocalparaoutrodoTerritórioNacional(art.207,CP)

Valem asmesmas observações do artigo anterior, apenas com as seguintesdiferenças: visa-se evitar a migração, e não a emigração. Procura-se conter aevasão de trabalhadores de certas áreas do país para outras, gerandodesequilíbrio.Aquinãoseexigeafraude(crimedeformalivre).Oaliciamentoemsijáécriminalizado.Afraudesomenteaparecenaformaequiparadaprevistano § 1º.Nesta a conduta consiste no aliciamento dentro do território nacionalcom fraude ou cobrança de valores do trabalhador. Também se prevê oaliciamentoemquenãoseasseguraaorecrutadomeiosparaavoltaaolocaldeorigem. A tentativa é admissível no caput e nas duas primeiras figurasequiparadas,asquaisseconsumamcomomeroaliciamento,nãonecessitandoaefetiva partida dos trabalhadores. Quanto à última figura equiparada, estasomente se consume quando do fim do contrato de trabalho sem que oempregadotenhacondiçõesderetorno.Tratando-sedecrimeomissivopróprio,nãoéviávelatentativa.No§2º,éprevistoaumentodepenadeumsextoaumterçoseavítimaformenor,idosa,gestante,indígenaouportadoradedeficiênciafísicaoumental.

É importante uma observação final sobre todos os crimes contra aorganização do trabalho. Diz respeito à competência, pois que a Constituição(art. 109,VI) determina ser da Justiça Federal. Ocorre que o STF consolidoujurisprudênciaafirmandoqueessacompetênciasomentesedáemcasodedanocoletivo,enãoindividual.Noscasosdedanoindividualacompetênciaseriaada

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Justiça Estadual. Com todo respeito ao entendimento do STF, não há nalegislaçãoordináriaemuitomenosconstitucionalnadaqueaboneessapostura.Nãoobstante,trata-sedeentendimentojáconsolidado.

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PARTEVDosCrimesContraoSentimentoReligiosoe

ContraoRespeitoaosMortos(arts.208a212,CP)

UltrajeaCultoeImpedimentoouPerturbaçãodeAtoaEleRelativo(art.208,CP)

ImpedimentoouPerturbaçãodeCerimôniaFunerária(art.209,CP)

ViolaçãodeSepultura(art.210,CP)

Destruição,SubtraçãoouOcultaçãodeCadáver(art.211,CP)

VilipêndioaCadáver(art.212,CP)

UltrajeaCultoeImpedimentoouPerturbaçãodeAtoaEleRelativo(art.208,CP)

Tutela-sealiberdadedecrençaeolivreexercíciodecultoreligioso(art.5º,VI,CF).Ascondutassãooescarnecimento(zombaria)pormotivodecrençaoufunçãoreligiosa;oimpedimentoouperturbaçãodecerimôniaoucultoreligiosoe o vilipêndio (menoscabo) público de ato ou objeto de culto religioso. Só há

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modalidadedolosa.Otipoémistocumulativo,demodoque,seoagenteincidiremmaisdeumaconduta,ocorreráconcursomaterial(GRECO,2011,p.602).Oescarnecimentoeovilipêndiodevemserpúblicos.Ocrimeécomum,podendocometê-lo inclusive crentes e religiosos. No escarnecimento a vítima será oreligiosooucrenteescarnecido,sendoobrigatoriamentepessoadeterminada.Naindeterminaçãoofatoéatípico(ex.:escarnecerdeumaclassedereligiosos).Jánas demais condutas a vítima é a comunidade religiosa. A tentativa noescarnecimento verbal é impossível. No impedimento (crime material) atentativa é possível.No vilipêndio, se formaterial (v.g.quebrar uma imagem)cabetentativa;seforformal(ex.:xingamentosaumobjetodeculto),nãocabetentativa.Emcasodeviolênciacontraapessoaoucoisaháaumentodeumterçoda pena, sem prejuízo do concurso material de infrações. A ação é públicaincondicionada.

ImpedimentoouPerturbaçãodeCerimôniaFunerária(art.209,CP)

Tutela-seo respeito aosmortos.Ocrimeé comum, eo sujeitopassivo é acoletividade. O morto é objeto material. A conduta é impedir ou perturbarenterrooucerimônia funerária (enterro,velório, cremaçãoetc.).Amissade7ºdia parecemelhor enquadrável no art. 208, CP. Já a chamadamissa de corpopresenteéatinenteaocrimeoraemestudo.Ocrimeédolosoeseconsumecomo impedimentoouperturbação, admitindo a tentativa.Há tambémaumentodepenapelaviolênciacontracoisaoupessoaeconcursomaterialdecrimes.Aaçãopenalépúblicaincondicionada.

ViolaçãodeSepultura(art.210,CP)Tutela-seo respeito aosmortos.Ocrimeé comum, eo sujeitopassivo é a

coletividade.Acondutaconsisteemviolar(abrir,arrombar,destruir)ouprofanar(desrespeitar, ofender). O objeto material é a sepultura ou urna funerária. Ocrimeédoloso(dologenérico)ecabe tentativa.Trata-sedecrimedeconteúdovariado, demodoque incidindo emambas as condutas responde o agente porapenas um crime. Pode haver concurso com furto ou subtração de cadáver(MIRABETE,2011,p.376).Jáaexumaçãoirregulardecadáverécontravençãopenalprevistanoart.67,LCP(op.cit.,p.376).Aaçãoépúblicaincondicionada.

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Destruição,SubtraçãoouOcultaçãodeCadáver(art.211,CP)

Obemtuteladoéorespeitoaosmortos.Acondutaédedestruir,subtrairouocultar cadáver ou parte dele. A ocultação só pode ocorrer antes dosepultamento, já a destruição ou subtração pode ser anterior ou posterior.Normalmente o crime é instantâneo,mas é permanente no caso de ocultação.Crime comum, tendo por sujeito passivo a coletividade. Objeto material é ocadáver ou suas partes. O cadáver é somente aquele quemantém a aparênciaíntegra, não sendo, portanto, abrangidos os corpos decompostos, múmias,esqueletos,cinzasetc.Quantoaofetoeaonatimorto,há3correntes:a)ambosnãosãoprotegidospelanormaquepressupõeonascimentoanteriorcomvida;b)seriamprotegidosonatimortoeofetocommaisde6meses;c)nãohácrimeemse tratando de feto abortado, mas há no caso do natimorto. Este últimoentendimento é que prevalece no Brasil (PIERANGELI, 2005, p. 745). Aconsumaçãosedácomoperfazimentodosverboseépossívelatentativa.Sóhámodalidade dolosa. É preciso atentar para os casos em que ocorre retirada deórgãosoupartesdocorpoparafinsdetransplante,aplicando-senormaespecialdaLein.9.434/97(arts.14a20).Aaçãoépúblicaincondicionada.

VilipêndioaCadáver(art.212,CP)Tutela-se o respeito aos mortos. A conduta é vilipendiar (desrespeitar,

menoscabar,ofender).Oobjetomaterialéocadáveresuascinzas.Inversamenteaocrimeanterior,sãoabrangidosoesqueletoeocorpoemdecomposição,jáqueascinzas(quesãomenos)sãotuteladas(NORONHA,1990,p.109).Quantoaofeto e ao natimorto, valem as mesmas observações anteriores. São exemplos:cuspir num morto ou atos de necrofilia (praticar sexo com um cadáver) etc.Crime comum, tendo como sujeito passivo a coletividade.A conduta deve serdolosa(doloespecíficodevilipendiarocadáver).Ovilipêndiopodesermaterial(exemplossupra)ouformal(v.g.ofensasverbaisaocadáver).Noprimeirocasoépossívelatentativa,nosegundoelaéinviável.Igualmenteéimportanteatentarparaosarts.14a20daLein.9.434/97(LeideTransplantes).Aaçãoépúblicaincondicionada.

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