da vontade disciplinar ao juizo micro revolucionario
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Monografia especializaçãoTRANSCRIPT
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
O PAPEL SOCIAL DO PSICÓLOGO
NO ÂMBITO JURÍDICO BRASILEIRO:
Da vontade disciplinar
ao juízo micro-revolucionário
Por: Antonio João de Mello Aranha Caneca
Orientador
Profª. Ana Paula Alves Ribeiro
Rio de Janeiro
2010
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”PROJETO A VEZ DO MESTRE
O PAPEL SOCIAL DO PSICÓLOGO
NO ÂMBITO JURÍDICO BRASILEIRO:
Da vontade disciplinar
ao juízo micro-revolucionário
Apresentação de monografia à Universidade Candido
Mendes como requisito parcial para obtenção do graude especialista em Psicologia Jurídica.
Por: Antonio João de Mello Aranha Caneca.
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AGRADECIMENTOS
Aos amigos da turma K154, que foram
atenciosos e acolhedores comigo, e
suscitaram debates preciosos e assaz
enriquecedores para meu aprendizado:
Camila G. Alonso, Camille Costa
Guimarães, Caroline M. B. Itabaiana
Nicolau, Isabel K. de C. Fortunato,
Janaina F. Limaverde, João Roberto M.
dos Santos, Luciana C. P. de Mello,
Marcela C. M. de Barros, Maria
Fernanda M. Ribeiro, Mariangela de O.
Monteiro, Rafaeli C. da Costa, Renata
March, Werônica A. da Silva Carvalho,
Zoraide R. dos Santos; à Verônica
Ferolla, pelos debates e chistes que
deixaram suas caronas, em retorno à
Niterói, muito mais divertidas; e tam-
bém aos professores, de cujo saber
espero aproveitar de modo duradouro
em minha vida profissional e no exer-
cício micropolítico.
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DEDICATÓRIA
“Você sabe como é. Você pega um livro,
vai até a dedicatória e, mais uma vez,
descobre que o autor dedicou o livro a
outra pessoa.
Mas não dessa vez.
Nós ainda não nos encontramos / temos
uma relação distante / somos loucos um
pelo outro / não nos vemos há muito
tempo / nunca nos encontraremos, mas
apesar disso, creio eu, sempre pensare-
mos com carinho um no outro...
Este livro é dedicado a você.
Você sabe com o quê, e provavelmente
também sabe por quê."
(Dedicatória transcrita de: GAILMAN, Neil.
Os filhos de Anansi. São Paulo: Conrad
do Brasil, 2006)
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RESUMO
O objetivo geral desta investigação resume-se a dois esforços:
conceituar o que se pretende anotar como papel social ; e, equipado por tal
conceituação, examinar como esta se adere às práticas do profissional de Psi-
cologia Jurídica atuante em nosso país e no período atual – ou melhor, assi-
nalar a conformidade do papel prescrito ao psicólogo frente às demandas e
imprescindibilidades com as quais se depara em sua rotina.
A pesquisa demonstrará sua construção e seus resultados em sentido
abstrato, amplo, buscando evidenciar as prescrições básicas àquele profis-
sional implicado, a partir de considerações filosóficas, sócio-políticas, somadas
às determinações que se fazem disciplinadas em nível federal (legislações,
códigos de conduta).
Necessariamente, a exposição se fará iniciar com um relato sucinto
sobre a inserção da Psicologia Jurídica no Brasil. Ainda no primeiro capítulo,
apresentar-se-ão deferências normativas à categoria e observações sobre o
valimento do uso da idéia de “papel social”, descrevendo alguns confrontos e
contribuições adjuntas.
No capítulo seguinte, será ratificada a atitude, circunspecta ao tópico
anteriormente aludido, que se verifica ao psicólogo no domínio jurídico, fun-
damentado especialmente na Psicologia Social, na Psicologia Sócio-histórica e
nas lições de Félix Guattari, Sandra Rolnik e Michel Foucault: o ser humano
como ser social e historicamente determinado; a reflexão crítica; a atitude es-
perada e os agenciamentos; a revolução molecular; a micropolítica.
O capítulo três ventilará sobre as práticas rotineiras que se pretende ao
psicólogo, as áreas jurídicas em que ele se encontra requerido, e também os
questionamentos correlatos que se fazem indispensáveis.
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METODOLOGIA
A metodologia empregada na laboração desta pesquisa acadêmica
consistiu em uma apreciação de artigos científicos e de livros específicos a
cada área de atuação do psicólogo jurídico no Brasil, abastecendo-se, antes,
de noções históricas sobre a constituição do saber e da profissão.
Os movimentos que o exame trouxe e o mote que a impulsionou – qual
seria o papel social do profissional de Psicologia Jurídica no Brasil? – marca-ram o imperativo de se esquadrinhar a atuação que é hoje em dia genui-
namente realizada pelo contato entre a Psicologia e o Direito, como saberes
distintos, mas auxiliares na determinação do destino de sujeitos, grupos fami-
liares e recortes específicos de classe social. Fizeram-se observadas, em
complemento, as legislações que normalizam a ocupação.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - Circunscrições históricas e conceituais 10
CAPÍTULO II - Reflexão crítica e micropolítica 20
CAPÍTULO III – Áreas de intervenção do psicólogo jurídico 31
CONCLUSÃO 63
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 65
BIBLIOGRAFIA CITADA 71
ANEXO 1 76
ANEXO 2 77
ÍNDICE 88
FOLHA DE AVALIAÇÃO 90
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INTRODUÇÃO
Fundamentando-se na doutrina pesquisada, mostra-se inequívoco que
a inserção da Psicologia no campo jurídico desponta a fim de subsidiar os
operadores do Direito, contribuindo com o diagnóstico de particulares elemen-
tos de gênese psicológica para que os procedimentos jurídicos apresentem
mais celeridade e consolidação. Sua assistência se faz cumprindo encargo
pericial – devendo, portanto, trazer imparcialidade: faz-se cogente ao seu zelo
a arregimentação da confiança do magistrado, dos sujeitos envolvidos na pen-
dência e de seus intermediários legais no processo. A profissão – por trazer
vinculação ao Tribunal em que se encontra a demanda, ou a outro componente
da organização judiciária, mesmo que em caráter temporário (circunstância
que se mostra tendente a decrescer) – difere-se da categoria dos auxiliares
técnicos, que podem ou não ser especializados em área psicológica determi-
nada, e que estão contratados por uma das partes litigantes. Aqueles também
podem motivar diagnósticos a propósito de singularidades psicológicas, no
entanto o resultado do serviço, na maioria das vezes, mostra-se partidário.
A tarefa pericial é o recorte da dissertação que se oferece, pois é na
elaboração dela que se pode verificar o saldo da atuação do psicólogo jurídico.
Diz respeito à atuação deste a escolha entre a simples feitura de diagnósticos
de intimidades ou – o que se pretende cada vez mais – a análise crítica dos
contextos dos sujeitos enlaçados pela desavença atendida no Judiciário.
Persiste uma consideração holística, complexa e de fundo sócio-histórico, no
qual se interpenetram práticas e discursos variados, para além do psicológico
(atingindo uma disposição de base filosófica, mesmo, desde que não haja uma
acomodação exclusivamente teórica e desatrelada da práxis que o imperativo
ético, fruto do raciocínio analítico, arrebata).
O estudo é pertinente à nossa contemporaneidade, visto que cada vez
mais se solicita a participação, na justiça pública, dos pareceres e saberes
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psicológicos. Faz-se relevante um ajuizamento do que significa a assistência
deste profissional às engrenagens de tal espaço. Que contexto vem o psicó-
logo jurídico contemplar? De que maneira pode ele colaborar para nutrir os
fenômenos que se evidenciam já válidos e estimados em nossa conjuntura
político-cidadã recente, e como pode operar a favor das mudanças que se
desvendam indispensáveis ao bom acolhimento daqueles que se apresentam
hipossuficientes diante das mazelas sociais, econômicas e políticas?
Mesmo que não se trate de uma diretiva hierarquicamente tencionada,
a partir da força nerval dos governantes no poder e de suas respectivas poli-
ticas públicas, é plausível e potencial que a rotina do psicólogo atuante no
âmbito jurídico confira-se a partir da consideração efetiva da dinâmica parti-
cular e à polpa subjetiva dos sujeitos; uma prática que se demonstre molecular
– micro-revolucionária, porque transformadora.
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CAPÍTULO I
CIRCUNSCRIÇÕES HISTÓRICAS E CONCEITUAIS
"Se queremos progredir, não devemos
repetir a história, mas fazer uma história
nova." (MAHATMA GANDHI)
1.1 – Uma breve introdução à História da Psicologia Jurídica no
Brasil
Perceber as trajetórias percorridas por um saber demonstra-se como
peça fundamental para repensar a atualidade e os rumos que se desdobram
para tal matéria.
O terreno primordial de contato entre uma disciplina psicológica e o
Direito ocorreu quando se estabeleceu a prática clínica da Psiquiatria, noséculo XVIII, como disciplina destacada do cabedal médico, validando-se como
ciência para a pesquisa, basicamente, das enfermidades mentais. À época,
construiu-se uma nova semiologia, vinculando a insanidade, a demência, as
manias ou os disparates emocionais, em teor etiológico, a “distúrbios morais”
ou a desvios das normas sociais e jurídicas.
A Psicologia, como ciência autônoma, começa a se estruturar no finaldo século XVIII, na Europa, atenta à totalidade do ser humano (em seus diver-
sos processos: sensações, discernimentos, emoções e desejos). Seus estudos
iniciais se atêm à análise experimental dos processos psicológicos, em espaço
laboratorial restrito.
Seu objeto, portanto, é bem diferente do da Psiquiatria –
não a loucura e suas imbricações com a razão, mas a
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análise daqueles processos comuns a todo ser humano
(o universalismo), procurando estabelecer as condições
“normais”, ideais, de seu funcionamento e aquelas outras
condições que determinam seu aparecimento diferencia-
do. (JACÓ-VILELA, 2005, p. 16)
A nova ciência foi logo recebida na Justiça com o fito de, com o uso de
testes e verificações, constatar a veracidade das exposições dos participantes
em alguma ação jurídica. Constituiu uma psicologia do testemunho.
No Brasil, a perícia psicológica instalou-se no domínio jurídico a partir
da década de 1930, com a aquiescência dos saberes e exames psiquiátricos
na avaliação da responsabilidade de delituosos nos crimes por eles perpetra-
dos. A partir da década de 1960, muitos magistrados começaram a solicitar
psicodiagnósticos, depois que o Decreto Lei 536/1964 distribuiu ao psicólogo a
realização de pareceres e perícias de conteúdo específico ao seu conheci-
mento, em auxílio ao Judiciário para que se encontrasse, com sucesso, a ver-
dade jurídica do episódio averiguado.
A Psicologia Jurídica no Brasil seguiu o modelo europeu
de produção de pareceres com ênfase no campo da
psicopatologia, para orientar o melhor exercício do Direito.
Fortemente influenciada pelo ideário positivista, que
almejava a comprovação empírica e científica, sua prática
foi marcada pela produção de laudos psicológicos e pelaelaboração de prognósticos sobre o comportamento dos
sujeitos. A tarefa do psicólogo seria identificar as causas
subjetivas ligadas ao desvio de normas sociais, obje-
tivando a modificação do comportamento classificado
como anormal. (BRITO; GOMES; PEÇANHA, 2005, sem
página)
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A partir da década de 1970, alguns psicólogos voluntários e outros
desviados de função atendiam jovens em liberdade assistida e avaliavam os
denominados “menores infratores”, frente ao Serviço de Liberdade Assistida,
no Juizado de Menores da Comarca da Capital do Rio de Janeiro; a nova Lei
do Divórcio, à mesma época, abriu espaço para a atuação dos psicólogos nas
Varas de Família, requeridos, sobretudo, para deliberações sobre posse e
guarda dos filhos de casais em vias de desenlace conjugal.
A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, passou a
exigir concursos públicos para a investidura em cargos efetivos no setor
estatal. Em adição a tal feito, a homologação do Estatuto da Criança e doAdolescente, em 1990, prescreveu a interação de equipes multidisciplinares
nos Juizados da Infância e da Juventude. A circunstância, frente às demandas
crescentes de tratamento e cuidado psicológico, também em outras extensões,
como nas Varas de Família e nas Criminais, veio a justificar a criação do cargo
específico de psicólogo no quadro de servidores em vários estados federativos
no país.1
1.2 – Algumas demarcações legais da profissão
Encontrando-se empossado como psicólogo jurídico, o vínculo empre-
gatício com o Estado assinala a prestação de seus serviços mediante remune-
ração paga pelos cofres públicos. A realização dos concursos públicos acar-
reta, aos bem-sucedidos, colocação como servidores estatutários (os quais
estão sujeitos ao regime jurídico da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990),ou empregados públicos (subordinados à Consolidação das Leis do Trabalho,
Lei nº 5.452, de 1943). Procura-se, com tal medida, subtrair os servidores
eventuais ou temporários – em obediência àquele princípio constitucional que
1 No Rio de Janeiro, por exemplo, em 1992 foi criado o Núcleo de Psicologia da 2ª Vara de
Menores da Comarca da Capital. Em 1996, o Núcleo passou a assessorar também a 1ª Varade menores, e o cargo de psicólogo inseriu-se permanentemente no quadro de pessoal da 1ªInstância do Poder Judiciário. Desde 1998 novos concursos vêm sendo realizados, e osprofissionais passaram a ser distribuídos nas diversas Comarcas, para operar nas esferasmunicipais.
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delibera sobre as investiduras em posto estatal vinculado. Isso não invalida, no
entanto, a contribuição dos profissionais que prestam serviços de matéria
psicológica ao Estado, sem vínculo empregatício, com ou sem remuneração
(como, por exemplo, aqueles assistentes técnicos contratados por uma das
partes em litígio).
Como servidor público, passa o psicólogo jurídico a encerrar responsa-
bilização por seus atos, podendo responder, em decorrência de sua prática, a
um processo administrativo disciplinar, a um processo civil e a um processo
penal, simultaneamente ou não, com as devidas sanções em separado. Obri-
ga-se, igualmente, a observar os princípios e regramentos administrativos de
onde está adstrito. Apreende-se daí porque precisa a categoria informar-se,
continuamente, das legislações relacionadas à sua tarefa.
A Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), fixada pela Portaria
Ministerial Nº. 397, de 9 de outubro de 2002, e editada pelo Ministério do
Trabalho, observa também as atribuições do Psicólogo no Brasil. O mapea-
mento dessas indicações revisa e atualiza as profissões exercidas em áreanacional, estabelecendo o perfil da atividade registrada e auxiliando na formali-
zação dos empregos respectivos. Em decorrência, num sentido dual de reser-
va de mercado e de desígnio profissional, anota o documento legal que o
psicólogo oferece-se “ao estudo e à análise dos processos intra e interpes-
soais e nos mecanismos do comportamento humano” (CLASSIFICAÇÃO BRA-
SILEIRA DE OCUPAÇÕES, 2002).
O texto da CBO se articula de forma abrangente para envolver os tipos
vários de psicologia e seus afazeres correspondentes, mencionando, por isso,
objetos múltiplos de estudo e diversas atividades. Trecho bastante relevante
concentra-se na especificação distintiva do ofício do psicólogo jurídico (sob
código 0-74.50 ):
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Atua no âmbito da Justiça, colaborando no planejamento
e execução de políticas de cidadania, direitos humanos e
prevenção da violência, centrando sua atuação na orien-
tação do dado psicológico repassado não só para os juris-
tas como também aos indivíduos que carecem de tal
intervenção, para possibilitar a avaliação das caracte-
rísticas de personalidade e fornecer subsídios ao
processo judicial, além de contribuir para a formulação,
revisão e interpretação das leis: avalia as condições
intelectuais e emocionais de crianças, adolescentes e
adultos em conexão com processos jurídicos, seja por
deficiência mental e insanidade, testamentos contes-
tados, aceitação em lares adotivos, posse e guarda de
crianças, aplicando métodos e técnicas psicológicas e/ou
de psicometria, para determinar a responsabilidade legal
por atos criminosos; atua como perito judicial nas varas
cíveis, criminais, Justiça do Trabalho, da família, da
criança e do adolescente, elaborando laudos, pareceres e perícias, para serem anexados aos processos, a fim de
realizar atendimento e orientação a crianças, adoles-
centes, detentos e seus familiares; orienta a adminis-
tração e os colegiados do sistema penitenciário sob o
ponto de vista psicológico, usando métodos e técnicas
adequados, para estabelecer tarefas educativas e profis-
sionais que os internos possam exercer nos estabeleci-mentos penais; realiza atendimento psicológico a indiví-
duos que buscam a Vara de Família, fazendo diagnós-
ticos e usando terapêuticas próprias, para organizar e
resolver questões levantadas; participa de audiência,
prestando informações, para esclarecer aspectos técnicos
em psicologia a leigos ou leitores do trabalho pericial
psicológico; atua em pesquisas e programas sócio-
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educativos e de prevenção à violência, construindo ou
adaptando instrumentos de investigação psicológica, para
atender às necessidades de crianças e adolescentes em
situação de risco, abandonados ou infratores; elabora
petições sempre que solicitar alguma providência ou haja
necessidade de comunicar-se com o juiz durante a execu-
ção de perícias, para serem juntadas aos processos;
realiza avaliação das características das personalidade,
através de triagem psicológica, avaliação de periculo-
sidade e outros exames psicológicos no sistema peniten-
ciário, para os casos de pedidos de benefícios, tais como
transferência para estabelecimento semi-aberto, livramen-
to condicional e/ou outros semelhantes.
Pode assessorar a administração penal na formulação de
políticas penais e no treinamento de pessoal para aplicá-
las.
Pode realizar pesquisa visando à construção e ampliação
do conhecimento psicológico aplicado ao campo do
direito.
Pode realizar orientação psicológica a casais antes da
entrada nupcial da petição, assim como das audiências
de conciliação.
Pode realizar atendimento a crianças envolvidas em
situações que chegam às instituições de direito, visando à
preservação de sua saúde mental.
Pode auxiliar juizados na avaliação e assistência
psicológica de menores e seus familiares, bem como as-
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sessorá-los no encaminhamento a terapia psicológicas
quando necessário.
Pode prestar atendimento e orientação a detentos e seus
familiares visando à preservação da saúde.
Pode fazer acompanhamento de detento em liberdade
condicional, na internação em hospital penitenciário, bem
como atuar no apoio psicológico à sua família.
Pode desenvolver estudos e pesquisas na área criminal,
constituindo ou adaptando os instrumentos de investi-
gação psicológica. (CLASSIFICAÇÃO BRASILEIRA DE
OCUPAÇÕES, 2002)
A passagem é extensa, mas conveniente; improvisa um compêndio
assaz apropriado sobre o meio em que o psicólogo jurídico se encontra legal-
mente alocado. Faz-se intuir, em mira do que fora divulgado, que o panoramade trabalho não é uniformizado, visto que a práxis elaborada se aprimora, em
caráter ininterrupto, em função das situações e propósitos que se apresentam
no órgão institucional em que atua aquele promotor. A categoria reúne, assim
sendo, aqueles
que exercem sua prática junto aos Tribunais, mas tam-
bém aqueles que trabalham com questões diretamenterelacionadas ao sistema de justiça. Por exemplo, psicó-
logos que executam medidas sócio-educativas junto aos
adolescentes em conflito com a lei, ou que trabalham em
organizações não governamentais, abrigos, ou outras ins-
tituições. (BRITO, 2002, sem página)
1.3 – Algumas demarcações conceituais escolhidas
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Boa parcela das legislações acerca de pertinências sociais aproveita a
palavra “função” para delimitar as características que se deseja restringir a um
grupo especificado.
Na acepção finalística, a função consiste na atribuição a
um sujeito do encargo de perseguir a satisfação de um
interesse ou de um direito que ultrapassa sua órbita
individual. (FILHO, 2010, p.34)
O contrapeso de tais atribuições é o recebimento de um poder jurídico
circunscrito à procura da concretização do objetivo legalmente apoiado. O con-
ceito, assim posto, originaria uma subordinação passiva ao sujeito aquilatado
com a “função”, trazendo-lhe deveres, mas consentir-lhe-ia uma situação ativa,
proporcionando direitos para agir em área destinada privativamente a ele.
O fundamento da nomenclatura encontra-se em edificações teóricas
do século XVIII, quando o pensamento sociológico principiava sua sistemati-zação. Sob forte influência do Positivismo, acordou-se derivar as ciências
sociais das ciências físicas. A sociedade esteve figurada como um organismo
vivo, ordenada por diversas estruturas e funções, que funcionavam, de modo
combinado, segundo um modelo físico ou mecânico.2
Entre tantos cientistas que amparavam a doutrina organicista, Émile
Durkheim (1858 – 1917), por exemplo, destacava que os fatos sociais deve-riam ser tratados como coisas; a ciência deveria não só explicar as causas dos
fenômenos, mas rotular a função que o fato social vai satisfazer. A miséria, a
exclusão social e a delinqüência não passariam de “enfermidades ou anoma-
2 O Organicismo, como movimento filosófico-científico, apresentava vertentes diferenciadas,
com detalhes distintivos a cada pensador ou grupo de teóricos; guardavam estes, no entanto,em seus aspectos mais gerais e básicos, muitos pontos em comum.
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lias sociais”.3 Parte da doutrina colocou alento às idéias de evolução social, em
similitude ao desenvolvimento humano quanto à estatura e à robustez. Vários
pensadores endossaram a necessidade de a sociedade ser comandada pelos
indivíduos da mais briosa racionalidade, tal qual uma hierarquia natural, confor-
me se dá o governo do cérebro em relação aos demais componentes do corpo
(numa associação que muitas vezes justificou, mais tarde na História do
Ocidente, a manutenção das disparidades sociais – inclusive, como se verá
adiante, no Brasil). O conjunto dessas idéias perdeu força na virada do século
XX, mas permaneceu até os dias contemporâneos de forma não explícita,
permanecendo manifesta em muitas categorizações e imagens, tanto na
ciência quanto no senso comum.
Sem economizar cautela quanto à lembrança organicista, patrocinou-
se nesta monografia o uso da expressão “papel social” com o intuito de
referenciar às tarefas e atitudes que o psicólogo vivifica no âmbito jurídico,
salvaguardando-se nos ensinamentos da Psicologia Social, ao invés de
consagrar o termo “função” (ainda que este continue flagrante até em normas
jurídicas ainda vigentes). Os valores, crenças e sentidos do ser humanoestabelecem-se no processo de socialização, quando o indivíduo recém-
inserido num conjunto social determinado absorve os códigos, leis e
adequações ao relacionamento habitual. Um papel social faz-se esclarecido no
condicionamento da conduta de um sujeito dentro de um grupo social ou
instituição, a partir de normas de uso geral e amplo nas interações sociais. As
expectativas de comportamento socialmente arranjadas determinam o papel
prescrito de uma pessoa; o comportamento demonstrado, por sua vez, revelao papel desempenhado, ainda que divergente da prescrição coletiva.
3 A analogia organicista também influenciou o Direito, elaborando o sistema jurídico como um
“corpo” organizado de normas. As irregularidades, as lacunas da lei, os suportes injustos: tudoisso constituiria “doença social”.
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Os papéis sociais permitem melhor compreensão da conjuntura social,
pois, ao perceber o outro, instala-se a referência para o comportamento do
observador.
E aqui vale a pena ressaltar que, quando aprendemos um
papel social, aprendemos também o papel complementar,
isto é, quando aprendemos a nos comportar como alu-
nos, desde o início de nossa vida escolar, estamos tam-
bém aprendendo o papel do outro com quem interagimos
– o papel do professor.
Os diferentes papéis sociais e a nossa enorme plastici-
dade como seres humanos permitem que nos adaptemos
às diferentes situações sociais e que sejamos capazes de
nos comportar diferentemente em cada uma delas. Apren-
der nossos papéis sociais é, na realidade, aprender o
conjunto de rituais que nossa sociedade criou. (BOCK;
FURTADO; TEIXEIRA, 2002, p.140)
Justifica-se, destarte, o termo escolhido para emprego das especula-
ções que serão provocadas no desenvolvido da dissertação. Ao longo dos
próximos capítulos, identificar-se-á a atuação ideal e mais profícua dos psicó-
logos em efeito às demandas que ordinariamente se apresentam. Primeiro, os
juízos que fundamentam a atitude do que – aspira-se – seja o papel prescrito
da categoria, na época presente. Em seguida, a abordagem dos desdobramen-tos e polêmicas que se fazem peculiares a cada matéria jurídica em que, por
lei já implantada (ou por hiato normativo não se proíba, porém seja admissível,
sob feitio de costume praeter legem4), chama-se o psicólogo a participar.
Intensifica-se a expectativa de que o papel desempenhado harmonize-se cada
vez mais com as necessidades prescritas.
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CAPÍTULO II
REFLEXÃO CRÍTICA E MICROPOLÍTICA
“O homem não tem natureza, o homem
tem História”. (ORTEGA Y GASSET)
O papel social que se confia ao psicólogo jurídico insinua uma urgente
reordenação do sujeito que se vai atender.
O ser humano, como pressuposto, não pode ser estudado como deten-
tor de uma natureza estável, uma essência que encerra suas qualidades e afe-
tos; ele é um produto histórico, mutável e multideterminado pelos momentos
variados de sua biografia e pelo tipo de sociedade em que habita. Não deve,
também, ser estudado isoladamente, porque aquele é definido pelo conjunto
de suas relações sociais. O ser humano é, portanto, ente sócio-histórico.
Ao entendermos o homem e a sociedade, a psicologia e a
política como territórios produzidos historicamente que
não se opõem, mas que se atravessam e se constituem,
estamos afirmando uma relação com o tempo-aconte-
cimento, sempre provisória e múltipla; produção de devi-
res, de-vir-a ser, de fluxos mutantes. (COIMBRA; LEITÃO,
2003, p.14)
Esquivar-se da atuação como técnico ou “parecerista” importa em não
classificar as pessoas em atendimento como se fossem singelos objetos de
pesquisa, nulificando suas subjetividades. É indispensável ao psicólogo jurídi-
co, como grau elevado de implicação, construir seu exercício profissional com-
4 Os costumes praeter legem trazem natureza supletiva às normas postas, preenchendo as
lacunas do ordenamento jurídico de acordo com o que é freqüentemente adotado, desde quenão se apresente ilícito.
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frontando as particularidades vislumbradas às circunstâncias econômicas, so-
ciais e políticas que engendram aquelas.
A Psicologia Sócio-histórica, desenvolvida a partir dos estudos de Lev
Vigotski (1896 – 1934), observa o mundo psíquico do ser humano como algo
bastante modificável. É defendida a tese de que aquele reage e acompanha às
formas de vida, à realidade material e sensível coletivamente estabelecida. A
linguagem e o pensamento têm, assim, origem social. Como princípios de
estudo, algumas deferências fazem-se importantes: os fenômenos devem ser
examinados como processos em constante transformação; é preciso analisar
os fenômenos para além de suas aparências, visando encontrar sua consti-tuição vital, que muitas vezes se encontra dissimulada e sutil; deve-se rastrear
a evolução dos fenômenos, porque sua procedência e seus movimentos escla-
recem as aparências da manifestação daqueles; as transições psíquicas indivi-
duais são determinadas pelas condições sociais dos sujeitos.
A teoria vacina-se contra a idéia de natureza humana, pleiteando que
não há essência permanente e universal do ser humano. O indivíduo não éautônomo, determinante único e cabal de sua individualização, entretanto se
faz moldado pelos acontecimentos biográficos, por suas relações interpessoais
e pelas intervenções com seu meio. A condição humana define-se pelo juízo
de que o homem é um ser ativo, social e histórico. Logo, o estudo psicológico é
forçosamente corrigido pela atenção ao homem concreto, compreendendo-se
os vínculos e relações daquele, determinadas em conferido momento e local.
O desvendamento das concepções assoalhadas abona a nova atitude
que se arranja imprescindível: recusar a disposição positivista anterior, resis-
tente ainda, no momento, em tantas práticas, a qual transpunha ao psicólogo
uma especialização neutra, objetiva e apolítica. As modificações incessantes
da sociedade acendem questionamentos aos modelos tradicionais de família, a
condição da infância e da adolescência, a assistência e a escuta no ambiente
jurídico, etc. O psicólogo, além de
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analisar as suas contra-transferências, as implicações de
suas pertenças e referências institucionais, coloca em
análise o lugar que ocupa na divisão social do trabalho,
da qual é um dos legitimadores. Portanto, aponta para o
lugar que ocupa nas relações sociais em geral e não
apenas no âmbito da intervenção que está realizando, os
diferentes lugares que ocupa no cotidiano e em outros
locais de sua vida profissional; em suma, os lugares que
ocupa na História. (COIMBRA, 2001, p. 147)
Aparelhar-se de novos identificadores teóricos em sua rotina, em estilo
eminentemente questionador, dilata as possibilidades de intervenção positiva,
ajudando não simplesmente na resolução do conflito de ordem jurídica, mas
agenciando a reflexão crítica dos sujeitos sobre seu contexto social, sobre a
ordem político-econômica e sobre sua subjetividade: seu espaço íntimo e parti-
cular, mental, composto por emoções, sentimentos e pensamentos, com o qual
produz uma via relacional com o universo social e exterior, determinando suasexperiências históricas e culturais, e sendo determinado por estas em retorno.
Quebra-se, com isso, a produção dos paradigmas de normalidade que corro-
boraram a exclusão e o controle social.
Pensar dessa forma traz efeitos para nossas práticas
enquanto psicólogos: de especialistas a interventores /
agenciadores. Essa proposta é, sem dúvida, um compro-misso político que aposta na criação e na mudança, em
formas diversas de existência, de sociabilidade. Trata-se
de afirmar as potências, as diferenças, as multiplicidades
e possibilidades finitas e ilimitadas do homem, da socie-
dade, da psicologia e da política. A aposta na produção
de “verdades” sempre provisórias, temporais e temporá-
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rias, nas “paixões alegres”, num “mundo onde caibam
muitos outros mundos”. (COIMBRA; LEITÃO, 2003, p.14)
Um agenciamento envolve elementos heterogêneos de várias injun-
ções: biológica, social, maquínica5, gnosiológica, imaginária. Carecem as sub-
jetividades da enunciação de um agenciamento que venha a ocasioná-las.
O modo pelo qual os indivíduos vivem essa subjetividade
oscila entre dois extremos: uma relação de alienação e
opressão, na qual o indivíduo se submete à subjetividade
tal como a recebe, ou uma relação de expressão e de
criação, na qual o indivíduo se reapropria dos componen-
tes da subjetividade, produzindo um processo que eu
chamaria de singularização. (GUATTARI; ROLNIK, 1986,
p. 40)
Contrariamente à propensão hegemônica da máquina de produção ca-
pitalista, que propende à uniformização redutora de tudo e de todos e bloqueiaa potência cognitiva dos processos de singularização dos sujeitos, acionam-se
os processos de produção do desejo.6 E os modelos dominantes penetram na
vida das pessoas desde a tenra infância, justamente na abertura dos proces-
sos de socialização que vêm a tomar parte.
Toda criatividade no campo social e tecnológico tende a
ser esmagada, todo microvetor de subjetivação singular,recuperado. Uma deriva geral dos modos territorializados
5 Idéia que se refere tanto aos engenhos mecânicos quanto às “máquinas” teóricas, todas as
quais não funcionam isoladamente, mas por associação ou por agenciamento. Em exemplo:uma máquina técnica, utilizada em uma indústria, interage com variados maquinismos, decomposição social, de pesquisa, comercial, entre outros.
6 “Por não querer me atrapalhar com definições complicadas, eu proporia denominar desejo a
todas as formas de vontade de viver, de vontade de criar, de vontade de amar, de vontade deinventar uma outra sociedade, outra percepção do mundo, outros sistemas de valores”
(GUATTARI; ROLNIK, 1986, pp.260-261).
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de subjetivação ocorre por toda parte. Tradições Milena-
res de um certo tipo de relação social e de vida cultural
são rapidamente varridas do planeta. Todas as pretensas
identidades culturais residuais são contaminadas. Todos
os modos de valorização da existência e da produção
encontram-se ameaçados no desenvolvimento atual das
sociedades. Até os valores mais tradicionais, mais bem
ancorados, como o trabalho, estão sendo minados por
dentro pelas revoluções industriais. (GUATTARI; ROLNIK,
1986, pp. 48-49)
À “ousadia” de singularizar (e singularizar-se) traz arrojo de resistência
contra o processo imperante padronizador, ao produzir modos de subjetivação
originais e únicos. A esta iniciativa titulou Félix Guattari (1930 – 1992) de revo-
lução molecular . É esta dimensão molecular que vai ligar-se ao devir (ou vir a
ser, na perenidade da mudança constante) dos sujeitos.
A questão micropolítica – a apreciação da formação do desejo nocampo social – refere-se ao contraste entre as heterogeneidades sócio-econô-
micas mais amplas e a perspectiva de agenciamentos moleculares.
A formação da singularidade do sujeito-psicólogo insere-se numa
práxis que não é alienada, cujas finalidades se afirmam a partir do desejo de
romper os modelos das máquinas dominantes. A intervenção salutar demons-
tra-se precisamente na dinâmica estratégica em atendimento ao sujeito-paci-ente, favorecendo sua desalienação e reflexão crítica. De modo condescen-
dente ao caráter agenciado, tal alinhamento dirige-se a transformar as estru-
turas de produção e reprodução social e as relações sociais do cotidiano.
“(...) devemos interpelar todos aqueles que ocupam uma
posição de ensino nas ciências sociais e psicológicas, ou
no campo do trabalho – todos aqueles, enfim, cuja posi-
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ção consiste em se interessar pelo discurso do outro. Eles
se encontram numa encruzilhada política e micropolítica
fundamental. Ou vão fazer o jogo dessa reprodução de
modelos que não nos permitem criar saídas para os
processos de singularização, ou, ao contrário, vão estar
trabalhando para o funcionamento desses processos na
medida de suas possibilidades e dos agenciamentos que
consigam pôr para funcionar. Isto quer dizer que não há
objetividade científica alguma nesse campo, nem uma
suposta neutralidade na relação.” (GUATTARI, Félix;
ROLNIK, Suely, 1986, p.29).
Mais um filósofo sustenta concepções que compõem certa proximi-
dade com as idéias aventadas: o francês Michel Foucault (1926 – 1984). O
pensador endossa a precisão de interferência coletiva na sociedade, para
conceber micropolíticas de transformação social.
O método contínuo de questionamento dos alicerces das pesquisastradicionais, as quais apartavam ideologicamente a ciência da política, exige a
substituição da postura “do pesquisador e dos pesquisados, uma vez que
todos passam a ser co-autores do processo de diagnóstico da situação-pro-
blema e da construção de caminhos para o enfrentamento e solução das ques-
tões” (AGUIAR; ROCHA, 2007, p. 651).
Os desdobramentos daquele processo ininterrupto de indagação apro-veitam os referenciais sócio-políticos pertinentes ao “ser social” pesquisado e
atinente a sua subjetividade. Ressalta-se o diagnóstico, portanto, da dimensão
sócio-histórica do sujeito, para que se possa decodificar a inventividade huma-
na que – no encontro e desencontro dos interesses individuais – determinam a
naturalização de certas construções ideológicas e suas propriedades.
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A pesquisa-intervenção, por sua atitude crítica (inventiva)
e implicativa (desnaturalizadora), se afasta de posturas e
posições reativas (de negação e julgamento) e amplia as
condições de um trabalho compartilhado. Em nosso
presente, as práticas emancipatórias que se sustentam
no conceito de ideologia, vinculando-se à visão de uma
sociedade bipolarizada, cujo movimento se faz pela com-
tradição entre as classes nos seus valores, interesses e
necessidades, merecem ser abordadas com cautela. O
que está em questão não é deixar de considerar a
possibilidade de um recorte do social referido às classes,
mas perceber que outras clivagens podem estar em jogo,
pois as formas de inserção na vida social são múltiplas e,
além disso, outros vetores podem estar movendo o
cotidiano do coletivo com mais intensidade. (AGUIAR;
ROCHA, 2007, p. 661)
Foucault demonstra em suas preleções a formação de uma sociedadeque procura disciplinar os sujeitos, principalmente a partir do século XVIII. A
realização de tal finalidade tem sua pedra angular no Direito. O aparecimento
das ciências humanas, contudo, veio a sustentar com mais potência a estru-
tura, servindo aquelas como disciplinas auxiliares. A Medicina Forense e a
Psiquiatria intensificaram a idéia de que o indivíduo desviante da normalidade
que se esquematizou como padrão suscitava dano social, carecendo de cor-
reção / punição. Pouco a pouco houve meticulosa expansão de mecanismosde controle no tecido social, fundamentados numa forma de poder institucio-
nalizada por uma arquitetura do saber que os abona e valida.
As instituições de seqüestro (ou totais) – características das socieda-
des disciplinares contemporâneas – abrangeriam quatro poderes básicos: o
seqüestro do tempo dos indivíduos; a substituição do tempo pela disciplinari-
zação; a intensificação de um domínio totalizante (de ordem política, econô-
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mica e social), que passaria a estipular as regras de maneira contínua no Esta-
do; um saber-poder, o qual distingue seletivamente as pessoas conforme sua
adequação às novas regras e intenções hierarquizadas. Para dar vazão a tais
instituições (escolas, fábricas, prisões, etc.), começam a se desenhar outras
especializações profissionais, como a Psiquiatria, a Criminologia, a Pedagogia.
Esse bloco de saber-poder estruturou-se na disciplina, na vigia e na correção,
reservando-se a autoridade para organizar o tecido social sob alento de um
conhecimento fechado e restrito.7
Muitos indivíduos, em seus enlaces sociais e periódicos, mostram-se
incapazes de perceber concretamente a realidade desse influxo de forças,crítica e sensatamente. Revelam-se passivos e extremamente acessíveis às
recomendações exteriores para decidir como governar a si, sujeitando-se à
ação de outros agentes. Assim, submetem-se mais facilmente ao jogo
disciplinar que é diagramado pelo poder político constituído, através das
formas de controle social e manipulação que ficam revigoradas a cada inova-
ção técnica ou científica.
O psicólogo, quando da intervenção nos diferentes estabelecimentos
judiciais e normativos, encontra-se atravessado e fundado pelos saberes espe-
cíficos das ciências psicológicas que legitimam tanto seu papel-social quanto
seu saber-poder . Mantém aquele um comprometimento ético-político de
amparar os sujeitos em sua autodeterminação, como um agenciador de
micropolíticas. Sua práxis é comprometida com o “cuidar do outro” e apurada
pela consciência e pela lucidez construídas a partir da elaboração crítica dosfenômenos da trama social; por isso, a sensibilidade que se exige, na atitude
que ultimamente se adverte ao profissional atuante no âmbito jurídico, embara-
ça a apatia e a indiferença que poderiam ser levadas à sua atuação.
7 Os conceitos de Foucault sobre disciplinarização e punição serão retomados no capítulo 3
desta dissertação, servindo de argumento histórico-político que justifica o sistema penalbrasileiro. Modera-se, por aqui, tais descrições, com fito de não ser repetitivo.
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Para Foucault os saberes, compreendidos como materia-
lidade, práticas e acontecimentos, são dispositivos políti-
cos articulados com as diferentes formações sociais ins-
crevendo-se, portanto, em suas condições políticas. Daí,
afirmar que não há saber neutro: todo saber é político.
Para ele a análise do saber implica necessariamente na
análise do poder, visto não haver relação de poder sem a
constituição de um campo de saber. Da mesma forma,
todo saber constitui novas relações de poder, pois onde
se exercita o poder, ao mesmo tempo, formam-se sabe-
res e estes, em contrapartida, asseguram o exercício de
novos poderes. (COIMBRA; NASCIMENTO, 2001, p. 246)
No trabalho com uma demanda, deve também atentar o psicólogo para
a pretensão de que apresentará respostas às múltiplas solicitações. Auxiliar o
magistrado ou outro operador do Direito não significa subsidiar o discurso
jurídico – ao qual compete revelar a verdade dos fatos. Nos relatórios ou
pareceres que se farão produzir, não existe imposição para que se narre todasas informações adquiridas ao longo dos atendimentos ministrados. Esta res-
ponsabilidade se encontra designada no próprio Código de Ética:
Art. 1º - São deveres fundamentais dos psicólogos: (...)
g. Informar, a quem de direito, os resultados decor-
rentes da prestação de serviços psicológicos, transmitindosomente o que for necessário para a tomada de decisões
que afetem o usuário ou beneficiário. (CÓDIGO DE
ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO, 2005, sem pá-
gina)
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Mais especificamente, versa também o código sobre as posturas na
atuação conjunta com outros profissionais detentores de saberes distintos e
sobre as ocasiões de quebra de sigilo:
Art. 6º - O psicólogo, no relacionamento com profissionais
não psicólogos: (...)
b. Compartilhará somente informações relevantes para
qualificar o serviço prestado, resguardando o caráter con-
fidencial das comunicações, assinalando a responsa-
bilidade, de quem as receber, de preservar o sigilo. (...)
Art. 9º - É dever do psicólogo respeitar o sigilo profissional
a fim de proteger, por meio da confidencialidade, a inti-
midade das pessoas, grupos ou organizações, a que
tenha acesso no exercício profissional.
Art. 10 - Nas situações em que se configure conflito entreas exigências decorrentes do disposto no Art. 9º e as
afirmações dos princípios fundamentais deste Código,
excetuando-se os casos previstos em lei, o psicólogo po-
derá decidir pela quebra de sigilo, baseando sua decisão
na busca do menor prejuízo.
Parágrafo Único - Em caso de quebra do sigilo previsto
no caput deste artigo, o psicólogo deverá restringir-se a prestar as informações estritamente necessárias. (CÓDI-
GO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO, 2005,
sem página)
O sujeito em atendimento ostenta o direito de conhecer as informações
contidas no documento elaborado e os objetivos de sua preparação. Devem-se
elucidar as dúvidas e suspeitas do paciente, demonstrando-lhe que vai lidar
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com um profissional de saúde, o qual se propõe a escutá-lo, embora a prática
se faça colocada nos limites geográfico-temporais jurídicos.
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CAPÍTULO III
ÁREAS DE INTERVENÇÃO DO PSICÓLOGO JURÍDICO
"Nós somos aquilo que fazemos repetidas
vezes, repetidamente. A excelência, por-
tanto, não é um feito, mas um hábito".
(ARISTÓTELES)
O psicólogo jurídico traduz-se, tal qual já se mostrou nítido, como umaespécie do gênero psicólogo; o jurídico faz-se adjetivo da qualidade técnico-
profissional abalizada pelo saber psicológico abstrato. De tal monta, a determi-
nação do trabalho deste profissional, atuando nas instituições de Direito, deve
corresponder apropriadamente aos regulamentos indicados no Código de Ética
Profissional do Psicólogo recente (o qual se encontra disciplinado pela Resolu-
ção CFP Nº 010/2005).
Indubitavelmente, o “cliente” dessa categoria será o Poder Judiciário, já
que o psicólogo jurídico traz vínculo empregatício direto com a corporação
pública em que trabalha. Isto, no entanto, não determina a atuação profissional
dos psicólogos como “os olhos e ouvidos do juiz”, ou faz subjugar as atri-
buições daqueles às definições dos operadores jurídicos do local. Na medida
em que o exercício de seu papel social desenrola-se, promovido por seu ofício
legal, o psicólogo, no campo jurídico também, compromete-se a se orientar
pelos princípios gerais e fundamentais,8 consignados para sua especialidade
em seu regramento ético-profissional.
Desse modo, vê-se o psicólogo que atua no campo jurídico compelido
a: realizar uma contínua reflexão sobre o contexto social e institucional em que
atua (avaliando, inclusive, as relações de poder e os conflitos destas com suas
8
Ver Anexo 2.
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atividades); analisar crítica e historicamente a realidade multifacetada contem-
porânea, bem como seu impacto frente a sua atuação e para as pessoas
atendidas; proporcionar discussões sobre os direitos e as condições dos
favorecidos de seus serviços; promover a liberdade, a dignidade, a igualdade e
a integridade do ser humano, tanto quanto a saúde e a qualidade de vida das
pessoas e das coletividades; informar e trazer conhecimento sobre a ciência
psicológica à população em geral.
Percebe-se que, ao utilizar-se dos conhecimentos da psicologia sócio-
histórica, da atuação crítica e reflexiva, da micropolítica, não faz mais o psicó-
logo do que cumprir à risca muitos dos preceitos citados em seu Código de
Ética. Participa, conseqüentemente, de maneira ativa do crescimento dos indi-
víduos que atende; colabora verdadeiramente para o desenvolvimento institu-
cional de seu posto de trabalho, aperfeiçoando sua atuação, incrementando
condignamente o segmento social reparado. Os primeiros princípios funda-
mentais estipulados em seu regramento profissional ressalvam:
I. O psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da
integridade do ser humano, apoiado nos valores que em-
basam a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
II. O psicólogo trabalhará visando promover a saúde e
a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e
contribuirá para a eliminação de quaisquer formas denegligência, discriminação, exploração, violência, cruelda-
de e opressão.
III. O psicólogo atuará com responsabilidade social,
analisando crítica e historicamente a realidade política,
econômica, social e cultural. (CÓDIGO DE ÉTICA PRO-
FISSIONAL DO PSICÓLOGO, 2005, sem página)
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Sem dúvida, o psicólogo deve fundar seus afazeres numa coleção
apurada de considerações, conforme já foi vislumbrado. Os raciocínios e indi-
cações serão direcionados pela demanda encontrada, o que se manifesta ex-
tremamente variante a cada setor jurídico em que se atua. As matérias perti-
nentes às querelas típicas a cada aparelho do Judiciário determinam as reso-
luções de atitude do psicólogo e serão estudadas na seqüência da dissertação.
A atitude a que se faz referência é mais um empréstimo da Psicologia
Social e permanecerá bastante reportada ao longo dos próximos itens. Trata-
se de uma predisposição para agir, cultivada favorável ou desfavoravelmente
em relação às pessoas e aos objetos do meio social em que o agente se
insere. Atitudes, então, são impulsos de condutas, provenientes de encadea-
mentos de crenças, valores e opiniões. A atitude positiva em relação às pés-
soas em atendimento, na conjuntura profissional do psicólogo jurídico, tem viés
eminentemente de amparo. Ela não há como ser edificada, no entanto, sem
uma disposição reflexiva – já intensamente ressalvada, mas agora outra vez –
sobre o contexto sócio-histórico do sujeito a que se vem em auxílio, para que
se possa, depois, inaugurar agenciamentos.
3.1 - A atuação do psicólogo jurídico na Justiça da Infância e
da Juventude
As circunstâncias que ora se descrevem são bastante delicadas, pois a
assistência, aqui, envolve pelo menos uma criança ou adolescente, nos casos
de adoção ou de transgressões incorridas por estes. Nessas demandas, é
importante que a criança ou o adolescente seja ouvido, sempre, mesmo que
sua fala não seja mandatária ou determinante na decisão do processo em que
tal sujeito esteja implicado.
3.1.1 - A adoção
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O Estatuto da Criança e do Adolescente especifica a criação de equipe
interprofissional nos episódios de adoção, em acompanhamento prévio, na
fase de habilitação dos pretendentes e pretendidos, prolongando-se até a
materialização das escolhas.
A preparação psicossocial e jurídica equivale-se ao conjunto de ativi-
dades discursivas e encontros entre a equipe mencionada e os requerentes de
adoção (candidatos a adotantes), para elaborar certos questionamentos
referenciais à própria adoção, ao lugar da futura criança adotada e sobre os
motivos dessa demanda, na tentativa de que se constituam adoções
conscientes, implodindo certas fantasias e mitos, e propiciando reduzidonúmero de devoluções.
Os vínculos a serem estabelecidos entre os membros de uma família
re-constituída por uma adoção – e isso precisa ficar bem compreendido – não
são acarretadas por perspectivas biológicas ou naturais. A pauta de assuntos
forçosos de abordagem segue, por exemplo, o rol abaixo listado:
a) A infertilidade: a adoção serve de virtual solução para ainfertilidade, mas ao mesmo tempo a atualiza;
b) O segredo: devem os novos pais contar sobre a adoção à criança
adotada ou não? Existe liberdade legal aos adotantes a fazê-lo, porém se
acastela igualmente o direito do adotado a buscar suas origens;
c) O “perfil” da criança: na falta de um rebento originado por via
biológica e hereditária direta, os adotantes podem fantasiar a “aquisição” da
melhor criança possível, mais bem aceita na proporção da similaridade deaparência a eles. Deve-se atentar para o perigo de se idealizar uma criança;
d) O mito da consangüinidade ou da filiação: deve-se manter a
construção de um modelo de família exclusivamente achegado por eventos
biológicos (de nascimento e de gestação) ou desconstruí-lo? Qual a natureza
do afeto? Os vínculos são biologicamente determinados ou não?;
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e) Os limites da adoção e os desdobramentos afetivos nos
adotantes: a espera pela criança, a construção relacional intrafamilar, a possi-
bilidade de recusa;
f) Do que se trata uma família, afinal? Seria uma construção social,
em que as pessoas são agrupadas por consangüinidade e afinidade, ou
diferentes tipos de vínculos são relevantes?
g) Remoção de dúvidas jurídicas sobre a legalidade de certos atos e
compromissos adquiridos e sobre algumas noções de desenvolvimento infanto-
juvenil.
Uma questão-problema que arrecada muitas contestações é a adoçãopor pares homossexuais. O art. 42, § 2º do Estatuto9, alterado pela lei nº
12.010 de 2009, fortifica a idéia de adoção apensada à figura de um pai e de
uma mãe, unidos estavelmente – ou civilmente enlaçados. A família, assim
constituída e juridicamente indicada, mantém-se aprisionada sob certos este-
reótipos, de alto teor preconceituoso e sem embasamento científico.
A homossexualidade, em abordagens contemporâneas que reavalia-ram antigos conceitos psicológicos e psicanalíticos, não se constitui patologia.
O Conselho Federal de Psicologia, inclusive, estabelece punições para os
profissionais que se disponibilizarem neste sentido, propondo uma possível
cura à escolha / opção sexual do sujeito. Estudos modernos internacionais
sugerem que não há qualquer desvantagem em homossexuais criarem uma
criança, comparados a um casal modelar heterossexual. A ausência de um
papel masculino ou feminino localizado intrafamiliarmente não impediria ouprejudicaria a formação da identidade sexual da criança, nem o restante de
sua constituição psíquica. A família adotante deve guardar, primordialmente,
capacidade real de proteção e sociabilização de suas crianças ou adoles-
9 “Art. 42 (...) § 2º. Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados
civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família.” (ESTATUTODA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, 1990, sem página)
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centes. As escolhas sexuais parentais não geram dados comprovados de tal
inabilidade.
Outras controvérsias que merecem análise do psicólogo são aquelas
acendidas pelos tipos determinados de adoção. Cada ocorrência enverga um
cenário de problematização específico, como a adoção monoparental, a ado-
ção interracial, a adoção tardia (quando a criança tem mais de 5 anos).
O Cadastro Nacional de Adoção é um instrumento preconizado tam-
bém pela lei nº 12.010/2009 (indicado pelo art. 50, § 5º do Estatuto),10 que traz
o registro oficial dos requerentes e das crianças passíveis de adoção, Com seuuso, evita-se a aproximação entre mães desesperadas para oferecer seus
rebentos para adoção e demandantes incapacitados.
3.1.2 – Os adolescentes em conflito com a lei
Até o final do século XX, todas as práticas reservadas ao trato com os
menores de 18 anos se faziam voltadas para o asilamento, para o afasta-
mento, para a institucionalização. O primeiro Código de Menores do Brasil,
fixado em 1927, trazia disposições para a penetração e o controle da família
em desajuste com os modelos e valores burgueses, e indicava a destituição do
pátrio-poder quando provocadas pelo abandono moral e material dos pais.
Aqueles considerados perigosos ou em situação de risco podiam ser captu-
rados pela polícia e pelos juízes de menores, posteriormente distribuídos às
delegacias ou internatos. O Código de Menores de 1979 dispunha sobre assituações virtuais de risco, relativamente às irregularidades e delinqüências.
Todas estas legislações se faziam herdeiras da nomenclatura “menor”
estipulada pelo Código Penal Brasileiro de 1830, abordando-o em vinculação
ao ato ilícito.
10 “Art. 50 (...) § 5º. Serão criados e implementados cadastros estaduais e nacional de crianças
e adolescentes em condições de serem adotados e de pessoas ou casais habilitados àadoção.” (ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, 1990, sem página)
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Cabe ao psicólogo não se esquivar da problematização dos dados
históricos e políticos que o imaginário social se utilizou para alocar a criança
carente, a qual é criada numa atmosfera, na maioria das vezes, de indigência e
indiferença. O desenvolvimento das sociedades disciplinares fez com que os
setores sociais dominantes não se ocupassem dos delitos praticados, mas sim
das virtualidades dos sujeitos, a infração que pode vir a acontecer. No Brasil,
essa categorização incentivou as exclusões e marginalizações, considerando o
espólio que a escravidão legou ao país, as teorias racistas e eugenistas de fim
do século XIX, o período higienista do início da República.
Em nosso país, desde o início do século XX, diferentes
dispositivos sociais vêm produzindo subjetividades onde o
“emprego fixo” e uma “família organizada” tornam-se PA-
drões de reconhecimento, aceitação, legitimação social e
direito à vida. Ao fugir a esses territórios modelares entra-
se para a enorme legião dos “perigosos”, daqueles que
são olhados com desconfiança e, no mínimo, evitados,afastados, enclausurados e mesmo exterminados. (COIM-
BRA; NASCIMENTO, 2005, p. 345)
Urge desnaturalizar, portanto, as categorias sociais, sem que se deixe
fisgar pelo processo de fabricação de verdades impostas pelo saber acadêmi-
co que sustenta o controle social. Quais seriam as origens de tais disparidades
sociais? Até que ponto os desvios e os erros cometidos pelos jovens carentessão fruto de seu meio e de sua privação material e psíquica?
Em nosso país, a partir de meados dos anos 1980, com a
gradativa implantação de medidas neoliberais –onde a
nova ordem mundial começa a aparecer com seus coro-
lários de globalização do mercado, Estado Mínimo, flexibi-
lização do trabalho, desestatização da economia, compe-
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titividade, livre comércio e privatização – temos uma mas-
siva produção de insegurança, medo, pânico articulados
ao crescimento do desemprego, da exclusão, da pobreza
e da miséria.
Nesse dantesco quadro, os jovens pobres, quando esca-
pam do extermínio, são os “excluídos por excelência”,
pois sequer conseguem chegar ao mercado de trabalho
formal. Sua atuação em redes ilegais como o circuito do
narcotráfico, do crime organizado, dos seqüestros, dentre
outros vem sendo tecida como única forma de sobre-vivência e se prolifera, cada vez mais, como práticas de
trabalho à medida que aumenta a apartação social.
A exclusão e a alienação dos jovens pobres, pelo envol-
vimento com a ilegalidade, têm produzido fortes marcas
em suas existências: os que conseguem sobreviver aos
extermínios, certamente não escapam do recolhimentoem internatos e prisões. (COIMBRA; NASCIMENTO,
2005, p. 347-348)
A suspensão do uso do nome “menor” como referência às crianças e
adolescentes, por exemplo, é uma obrigação notória para os agenciadores. A
nova designação tem base constitucional, tanto quanto o espírito que se de-
seja entusiasmar:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado
assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prio-
ridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educa-
ção, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade,
ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comu-
nitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negli-
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gência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão. (CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERA-
TIVA DO BRASIL, 1988, sem página)
Essa Doutrina da Proteção legal é a inspiração que fundamenta o
Estatuto da Criança e do Adolescente. Quando um magistrado aplica a medida
sócio-educativa, enquadra o adolescente em um artigo penal. Contrariando o
Estatuto da Criança e do Adolescente, posiciona-se o jovem como imputável
penalmente. Este não comete crime, por disposição legal, mas atos infracio-
nais,11 e só pode ser apreendido em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada do Juiz da Infância e da Juventude.
A nova normalização aborda avanços importantes, no sentido de pro-
mover a compreensão dos adolescentes de que os cidadãos têm co-respon-
sabilidade na construção da sociedade.
A prática dos psicólogos junto às instituições de abrigamento de
crianças e adolescente, as quais se fazem em caráter residencial, deve-segerenciar o espaço como se fosse aquele um sustentáculo estável, para que
sejam razoáveis as possibilidades do desenvolvimento humano (físico, cogni-
tivo e psicossocial) e a formação de auto-estima dos abrigados.
3.2 - A atuação do psicólogo jurídico nas Instituições Penais
Escorando-se novamente a doutrina de Foucault, entende-se que osistema penal institucionalizado é uma manifestação das relações de poder
persistentes em dada sociedade. A revelação dessas forças, após análise
acurada, aproxima o pesquisador do entendimento sobre o que determina os
interesses predominantes, já que as decisões jurídicas penais acabam por
11 As medidas referentes aos atos infracionais estão previstas no artigo 101 do Estatuto da
Criança e do Adolescente.
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exibir o que uma sociedade considera como certo e errado em determinada
época (também são construções sócio-históricas).
O processo de disciplinarização dos corpos, docilizando-os, serviu para
a adequação dos indivíduos ao Capitalismo, como formas de controle e inter-
venção na população, ajustando-a às transformações econômicas e aos novos
sistemas produtivos.
Rusche e Kirchheimer, após muitas pesquisas, concluíram que a elei-
ção de quaisquer punições, em vez de outras, são determinadas por forças
aderentes ao sistema produtivo e econômico que se estabelece. O Feudalismosuprimiu a pena de escravidão e trabalhos forçados, retornando aos antigos
métodos de penas capitais ou corporais aos pobres / servos (e penas pecúnia-
rias aos ricos); o Mercantilismo originou as casas de correção, utilizando-se do
esquema fábrica-prisão; o contraste entre o crescimento populacional do sécu-
lo XIX frente à adoção cada vez maior das máquinas a vapor, trouxe dificul-
dades econômicas e miséria aos trabalhadores, que passaram a ser reprimi-
dos com artifícios de tortura e encarceramento; a virada para o século XXexibiu expansão da produção industrial e o trabalho humano passou a ser
estimado novamente, motivando programas assistenciais e políticas de preven-
ção criminal.
O modelo capitalista contemporâneo inventa ritualizações consumistas
que se aderem de jeito quase inafastável às pessoas, e esta dinâmica exclui
grande quantidade de indivíduos. Estes não conseguem se colocar no merca-do de trabalho formal, nem alcançar êxito em suas aspirações de consumo.12 A
restrição dos indivíduos às ofertas de consumo múltiplas e deslumbrantes, em
contraste à escassez dos empregos, cria um caos social a que se procurou dar
solução através do encarceramento.
12 Na dissertação será retomado este contexto mais à frente, no item sobre políticas publicas, e
– por conta disso – ele se apresenta abreviado na argumentação trazida.
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O cuidado do psicólogo ao sujeito atendido não se presta a mitigar as
construções penais que se encontram impostas a ele, mas ao contrário, deve
ter sempre em mente que a idéia corretiva da punição em nossa época recente
não existe para apagar o crime, mas para servir de castigo transformador ao
culpado. A conseqüência do crime (a pena) pode vir a corroborar uma decla-
ração coletiva que representa um modelo cultural dominante. A micropolítica
exigida dirige-se a avaliar os discursos, também, que levam às alterações de
previsão legal para lei penal.
Os questionamentos alargam-se até a ponderação sobre: a qualidade
e a (in)eficácia do sistema carcerário (de regime fechado); as classificaçõesdos condenados, exigidas pela Lei de Execução Penal de 1984;13 a aplicação
do Exame Criminológico (o qual planeja, de modo estéril, vislumbrar a virtua-
lidade criminal do sujeito apenado); as decorrências das faltas disciplinares,14
os pedidos de progressão ou regressão das penas; as expectativas geradas
pelos dias de visitação.
O exame criminológico é um instrumento técnico usado para investigara personalidade dos encarcerados e sugerir sua previsão de condutas, acon-
selhando o parecer concludente sobre concessões de benefícios e progres-
sões de pena. Avalia-se, na verdade, as presunções sobre possibilidades de
reinserção ao ato criminoso, de o preso delinqüir novamente, fundado no tra-
balho de reconstituição de vida pregressa e vindo a reforçar, muitas vezes, o
estigma de marginalizado e incorrigível. Atribui-se ao psicólogo, destarte, uma
tarefa quase “adivinhatória”.
O exame não deixou de existir, mas a Lei 10.792/03 retirou o termo do
texto legal processual relacionado à progressão para regime menos rigoroso
13 Para tal finalidade implantou-se nas instituições penais a Comissão Técnica de Classificação,
presidida pelo diretor da unidade penal em que se encontra implantada, e formada, pelo menos,por dois chefes de serviço, um psiquiatra, um psicólogo e um assistente social.
14 Também a critério das já citadas Comissões.
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nas penas de privação de liberdade.15 Por conta disso, vários pedidos de
progressão estacionaram, e muitos passaram a obter tratamento leniente, já
que a avaliação do comportamento dos apenados passou a ser feita pelos
diretores das penitenciárias. Críticas de vários setores sociais e políticos à
medida fizeram alguns membros eleitos reverem a disposição legal, e já existe
um movimento articulado para o retorno desse tipo de teste.16
O perigo gerado ao profissional que não reproduz a
engrenagem institucional poderia consistir no fato do
mesmo ser visto como descartável, já que não respon-
deria à demanda solicitada a ele. O aprisionamento às
atribuições previstas em regulamentos pode referir-se a
uma provável impossibilidade por diversos motivos, de
construções de outras práticas. Contudo a proposição
aqui feita é de que essa estratégia de resistência seja
realizada de forma sutil e processual, onde inicialmente o
profissional não deixaria de atender a demanda de um
lugar de perito, apenas produziria complexificações emseus laudos, apontando para a própria complexidade hu-
mana. Trata-se de uma subversão da demanda, demons-
trando a sua capacidade em ser crítico para avaliar o que
lhe é solicitado, e questionar até que ponto o pedido
supera suas possibilidades, para que possa pensar em
15 O texto do artigo 112 exigia exame criminológico e parecer da Comissão Técnica deClassificação. A nova redação, no entanto, dispõe: “A pena privativa de liberdade seráexecutada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a serdeterminada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regimeanterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabele-cimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.” (LEI DE EXECUÇÃO PENAL, 1984,sem página)
16 No dia 14 de outubro de 2009, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ)
aprovou, em caráter terminativo, o Projeto de Lei do Senado 190/2007, exigindo-se o examecriminológico para instruir decisão sobre progressão de regime, livramento condicional, indulto ecomutação da pena – solicitado pelo juiz, quando necessário, para qualquer dos casos.
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outras práticas, outros fazeres mais condizentes com
seus preceitos éticos.
A outra maneira de resistência pacífica consistiria na pro-
posição de outras atividades de intervenção parale-
lamente às estritas construções investigativas. Ressalta-
se, porém, que estas proposições exigiriam uma impli-
cação com aqueles que são alvos das intervenções pro-
fissionais. O reconhecimento destes como sujeitos de
direitos, que demandam um acolhimento neste processo
de institucionalização que muitas vezes podem levá-los a
mortificações de seus lugares subjetivos singulares, se
faz fundamental. O objetivo seria a promoção de sujeitos
críticos, autônomos, que produzissem revoluções molecu-
lares, linhas de fuga, e que fossem donos de suas cons-
truções sobre si mesmos. (BICALHO, 2009, sem página)
Faz-se essencial, para tanto, as articulações com a tradição criminoló-gica edificada desde o século XVIII, levando-se em conta as influências do
Positivismo Científico, do paradigma etiológico no início da Criminologia (a
antropometria criminal de Lombroso, a sociologia criminal de Enrico Ferri, o
prognóstico de periculosidade de Garófalo). Há que se decifrar, também, o
significado ideológico do sistema punitivo do país, cotejando as práticas penais
que montaram os castigos e as penalidades desde o período colonial.
No Brasil colonial, sempre existiu diferenciação penal entre brancos e
negros escravos. Aos negros, além da pena capital para alguns delitos, havia
prévia de torturas e suplícios (muitas vezes públicos, para servirem de exemplo
preventivo). A lei estabelecia sanções mais brandas para o mesmo crime,
quando o ultrajado fosse ou equivalesse a servo. O Código Criminal de 1830
manteve a pena de morte aos negros revoltosos, buscando reprimir as fugas e
o sugimento dos quilombos, mas selecionou punições pecuniárias e de encer-
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ramento aos brancos. A condição de escravo manteve seu estado de “agra-
vante de penalidade”.
Outras conformações passam a surgir, embora conservem similares
mecanismos seletivos e estigmatizantes.17
Sobre a pretendida ressocialização dos presos, deve-se apreciar as
lições da teoria do etiquetamento (do referencial teórico do labeling approach
de Rusche e Kirchheimer). Os ex-detentos, ao tentarem reintroduzirem-se no
tecido social, obter empregos, reorganizar seu círculo de amizades, depara-se
com um estigma que o rotula, fundamentada na concepção naturalista da cri-
minalidade (para a qual o crime é qualidade ontológica do sujeito). A rein-
serção mostra-se quase impossível, e não se oferecem outras perspectivas de
escolha ao ex-aprisionado: incorrer novamente na delinqüência é quase
garantido, ficando aquele cativo de seu destino.
A desnaturalização dos acontecimentos com enfoque no eixo punitivo
faz alcançar a percepção do controle das condutas, antes e após o delito,reservada para a massa popular excluída, marginalizada.
O sentimento de injustiça que um prisioneiro experimenta
é uma das causas que mais podem tornar indomável seu
caráter. Quando se vê assim exposto a sofrimentos que a
lei não ordenou nem mesmo previu, ele entra num estado
habitual de cólera contra tudo o que o cerca; só vê carras-cos em todos os agentes da autoridade; não pensa mais
ter sido culpado; acusa a própria justiça. (FOUCAULT,
2007, p. 235)
17 Como, por exemplo, no Brasil, as ideologias da Defesa Social e da Segurança Nacional,
desenvolvidas no período do pós-guerra.
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Ao psicólogo tocam, além, as discussões e os cuidados provenientes
das situações de violência doméstica. O labor com estes casos é complexo,
frente ao gigantesco número de variáveis culturais e psíquicas com as quais se
pode figurar. A matéria, portanto, guarda suas especificidades, contudo arran-
ja-se articulada a muitos dos pontos já expostos, nomeadamente os padrões
familiares construídos socialmente. Outras imagens teóricas fazem-se salien-
tes neste contexto, como os papéis de gênero que são constrangidos aos su-
jeitos por nossa tradição patriarcal.
A perpetração do abuso é freqüente, no Brasil, tanto contra adultos –
principalmente mulheres – quanto contra crianças. A Lei 11.340/2006 (conheci-
da como Lei Maria da Penha) impõe mecanismos de coibição às agressões
físicas e psicológicas contra as mulheres. Esses novos dispositivos do ordena-
mento jurídico nacional modificaram muitas interpretações de casos, e geraram
novas perguntas a serem apreciadas.
Entretanto, as medidas punitivas são insuficientes para o trato do as-
sunto, e a cooperação estatal compensa-se exatamente nas ações de preven-ção, re-educação, assistência social e psicológica irrestrita à família atingida, e
no incitamento à reabilitação do agressor. O acompanhamento psicológico do
abusado e do abusador ratificam o princípio de proteção à família, como
totalidade. No plano ideal, o psicólogo recolhe dois desempenhos: facilita a
promoção da saúde, destinada à reestruturação psicofísica familiar, e agencia
os sujeitos na edificação de sua cidadania, porque certifica os direitos huma-
nos, fundamentais àqueles.
O Código de Processo Penal exige o exame de corpo de delito para a
comprovação dos danos empreendidos pelo provocador:
Art. 158. Quando a infração deixar vesti-
gios, será indispensável o exame de cor-
po de delito, direto ou indireto, não po-
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dendo supri-lo a confissão do acusado.
(CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, 1941,
sem página)
A observação da lei, na prática, é intricada, porque muitos Institutos
Médico-legais nem mesmo possuem salas reservadas ou camas ginecológicas
para verificação de estupros. Perante o tema violência doméstica, foco do exa-
me de corpo de delito direto é a comprovação de materializações dos maus-
tratos. Mas os danos psíquicos só podem ser averiguados de forma indireta,
pelos depoimentos testemunhais, e através das vistorias psicológicas, já que
estas marcas não se fazem visíveis de modo concreto. Por tal pretexto, não
evidenciando “materialidade”, muitos laudos psicológicos são recusados como
provas no litígio criminal.
3.3 - A atuação do psicólogo jurídico no Direito de Família
Com mais freqüência, a atuação dos psicólogos nas Varas de Família
é proporcionada nas demandas referentes à mediação familiar – sobretudo
quando existe discrepância, entre os consortes, em suas pretensões,
geralmente incitadas mais por paixões do que pela constatação de autêntica
necessidade – e à guarda dos filhos.
3.3.1 - A mediação familiar
A dissolução da sociedade ou do vínculo conjugal é um dos aconteci-
mentos mais estressantes da vida das pessoas, a qual afeta a todos os
membros da família. Para os envolvidos, é um período de vulnerabilidade
maior, de receios trazidos pela rude transição que a nova experiência deflagra.
Mais adaptações precisam ocorrer, gerando seguintes desgastes, quando há
prole, pois a configuração familiar passará a se constituir, findo o casamento,
de modo binuclear . O serviço de mediação nas Varas de Família vem a servir
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de suporte às famílias em transformação, como nexo orientador e elucidativo,
visando a permanência das relações parentais após a separação do casal.
A mediação objetiva cumprir a escuta das partes em contenda, aperfei-
çoando a autonomia de cada sujeito, para que este possa se apropriar de sua
biografia, de seus conflitos, e em seguida decidir sobre suas reais neces-
sidades, responsabilizando-se também pela resolução dos problemas. As
negociações tendem a ser intricadas, pois a fragilidade emocional e o amua-
mento “reduzem a capacidade de perceber os limites interpessoais e as reais
necessidades patrimoniais e extrapatrimoniais das partes”, mas a intercessão
do psicólogo será conveniente no sentido de fazer as pessoas implicadas nolitígio se conscientizarem de suas escolhas (CHAVES; MACIEL, 2005, 184).
Um sistema de mediação em todas as Comarcas forneceria ingre-
dientes para que as partes se refaçam e possam lidar com os problemas
emocionais com maior lucidez, contribuindo para amortizar o retorno dos
casais atendidos aos tribunais, para resolver os litígios mal-elaborados. Ainda
não existe, apesar disso, legislação nacional para regular satisfatoriamente aprática da mediação familiar nos tribunais. A Lei Nº 9.307/1996 dispõe sobre o
instituto da arbitragem no país; não há, contudo, algo similar em relação à
mediação. Há Projetos de Lei a respeito: o de Nº 4.827/1998, apresentado pela
deputada Zulaiê Cobra Ribeiro, e um segundo projeto proposto em 2001, pelos
juristas Kazuo Watanabe e Ada Pelegrini Grinover, representando o Instituto
Brasileiro de Direito Processual. Ambos os projetos foram razoavelmente fun-
didos pelo Substitutivo PLC (Projeto de Lei da Câmara) 94/2002, de autoria doSenador Pedro Simon, já aprovado em comissão. Por este texto legal, a
mediação se fará no âmbito judicial e extrajudicial; a de tipo judicial, todavia, se
ajeitaria como reservada a advogados com pelo menos três anos de efetivo
exercício de atividades jurídicas e inscritos no Registro de Mediadores. A
mediação para o Direito de Família seria do tipo paraprocessual, mais ou
menos como ocorre presentemente, e os mediadores (ou co-mediadores)
ficariam equiparados aos funcionários públicos, para os efeitos da lei penal,
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estendendo a iniciativa da prática a outros saberes mais bem compatibilizados
a demandas específicas:
Art. 16. É lícita a co-mediação quando, pela natureza ou
pela complexidade do conflito, for recomendável a atu-
ação conjunta do mediador com outro profissional espe-
cializado na área do conhecimento subjacente ao litígio.
§ 1º A co-mediação será obrigatória nas controvérsias
submetidas à mediação que versem sobre o estado da
pessoa e Direito de Família, devendo dela necessaria-
mente participar psiquiatra, psicólogo ou assistente social.
§ 2º A co-mediação, quando não for obrigatória, poderá
ser requerida por qualquer dos interessados ou pelo
mediador. (Projeto de Lei da Câmara Nº 94/2002)
3.3.2 - A guarda dos filhos
A ruptura dos laços conjugais muitas vezes cria uma mágoa intensa
naqueles que não conseguem elaborar adequadamente o luto da separação. O
sentimento de abandono trazido pelo término de uma relação matrimonial pode
acarretar um forte anseio por vingança, em certas ocasiões, inclusive, transfe-
rindo a responsabilidade da separação exclusivamente ao ex-parceiro. O difícil
momento da separação pode se transformar em disputa pela guarda dosfilhos, momento marcado pela intensa busca de falhas e defeitos do outro
genitor. Os ex-casais, nesta circunstância, permanecem
emaranhados na dor, desilusão e raiva pelo fracasso da
relação; sentimentos compatíveis com o período pré-
divórcio e com o divórcio legal. Utilizam-se da criança
para manter o litígio, numa forma disfuncional de tentar
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alcançar a fase do “divórcio psíquico”. (RIBEIRO, 2005, p.
165)
O psicólogo é chamado para atuar neste contexto, incumbido da vil
missão de recomendar ao magistrado aquele genitor que é o mais adequado, o
melhor, o que reúne melhores condições para tomar a posse e a guarda das
crianças. Contudo, quais critérios psicológicos poderiam dar esta indicação? O
desempenho do psicólogo como perito e como avaliador do “melhor pai” pode
ser convertido numa atitude mais estimulante e que desenvolva as demandas
camufladas nos atos da família em litígio, assegurando aos pais e às crianças
a liberdade de opinião e de expressão e o direito de informação.
Deve a equipe de psicólogos priorizar um trabalho com os
pais, a fim de que estes possam chegar a um acordo
sobre o cuidado com os filhos, auxiliando-os na procura
por respostas próprias sobre o significado de questões
relacionadas a: filiação, guarda, visitação, etc. Caberia
ainda a essa equipe assessora o atendimento a criançase jovens envolvidas na disputa judicial. (BRITO, 2004, p.
232)
Percebe-se a partir das afirmações expostas que o psicólogo deve
conhecer bastante as legislações que regram as famílias e os domínios
relativos a ela, jamais se esquecendo de orientar seu trabalho após uma
análise social e histórica do assunto, inserindo o episódio da família observada(em atendimento) no conjunto de informações ponderadas.
Historicamente, foi transmitida à mulher (e mãe) a incumbência de
criação e cuidados com os filhos; ao homem coube a tarefa de sustento do lar,
a subsistência econômica dos contíguos familiares. O modelo de família
nuclear – composta por pai, mãe e prole, mais a família extensa, ou seja,
aqueles que detêm laços consangüíneos ou de dependência – traz fundo
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romano-cristão, e veio consolidado no Código Civil Brasileiro de 1916, que
previa a separação dos corpos apenas por justa causa, não se desfazendo,
assim, a amarração matrimonial. A retenção da guarda, neste momento de
nossa História, cabia àquele cônjuge inocente de falta ou deslize conjugal,
recombinando-se a família numa ordem monoparental. Em caso de culpa
comum pela separação, as crianças ficariam até os seis anos em companhia
materna, passando a partir daí o pai a exercer, de modo privilegiado, seu pátrio
poder . O paradigma anteriormente erigido para a família vem constantemente
sendo abalado, desde meados do século XX, pelo aparecimento ascendente
de novos arranjos domésticos e pela marcha das mulheres ao mercado de
trabalho, valendo-se estas de renda própria e, em algumas incidências,
assente independência do marido. A tradicional hierarquia patriarcal
despedaça-se frente a uma disposição mais igualitária, com ênfase no
individualismo e no prazer.
A Lei 6.515/1977 – Lei do Divórcio – modificou algumas práticas legais
anteriores: passou a conferir guarda exclusiva dos filhos a um dos genitores,
cabendo ao outro direito de visitação; introduziu obrigação comum aos ex-cônjuges na manutenção dos filhos, conforme necessidade e possibilidade;
manteve, no entanto, o juízo de passar a guarda dos filhos ao genitor que não
deu causa ao desenlace conjugal, e conservou a imagem de criação dos filhos
como algo natural às mulheres, dando-as a guarda dos filhos menores no caso
de co-responsabilidde pela separação.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, disposto na Lei 8.069/1990,converteu expressivamente a sorte jurídica da infância no país, acentuando
crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, estabelecendo um dever
compartilhado aos pais pela criação e educação dos filhos. As recentes
legislações vêm priorizar o melhor interesse da criança, sobrepondo-se às
deficiências do contrato matrimonial. O atual Código Civil (Lei 10.406/2002),
em vigor desde 2003, alterado pela Lei 11.698/2008, reforça a possibilidade de
guarda compartilhada, garantindo que as decisões sobre as atividades e
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encaminhamentos filiais sejam tomadas por ambos os genitores, consolidando
para estes direitos e deveres equivalentes:
Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada.
§ 1o Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a
um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art.
1.584, § 5 o ) e, por guarda compartilhada a responsa-
bilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do
pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto,
concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. (CÓDI-
GO CIVIL, 2002, sem página)
Acrescenta o regulamento que o magistrado instruirá os genitores
sobre a guarda compartilhada, suas atribuições e sanções pelo descum-
primento de suas cláusulas; assegura, também, ao pai que contrair novas
núpcias o direito de convivência com o filho.
A codificação traz reconhecimento expresso ao trabalho do psicólogo
jurídico – tanto quanto de outros profissionais inseridos na equipe interdis-
ciplinar – que, na condição de perito, vem a fornecer subsídios para a decisão
judicial e serve de auxiliar experto para o meritíssimo, no trato especial e difícil
da matéria:
Art. 1.583. (...)
§ 3o Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e
os períodos de convivência sob guarda compartilhada, o
juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público,
poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou
de equipe interdisciplinar. (CÓDIGO CIVIL, 2002, sem
página)
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Pretende-se, com as medidas presentes, distinguir a parentalidade
(cuja autoridade prossegue, inalterada, após o término do matrimônio) da
conjugalidade (que vai se extinguir). A nova modalidade de direito paterno –
convém anotar – não se trata de guarda alternada, em que a criança se
desloca rotativamente entre as residências paternas, de modo extremamente
prejudicial, já que tem inter-rompido o continuum de suas relações sociais, seu
ajuste espacial e afetivo, quando seus pais detêm a prerrogativa de estipular
uma rigorosa divisão de tempo de convívio. A modalidade funciona melhor,
evidentemente, se os ex-companheiros forem cooperativos, pois vão aproveitar
o exercício conjunto do poder familiar .
O dispositivo da guarda conjunta, ou compartilhada, tem o
objetivo de reforçar os sentimentos de responsabilidade
dos pais separados que não habitam com os filhos.
Privilegia-se a continuidade da relação da criança com os
dois genitores que, simultaneamente, devem se manter
implicados nos cuidados relativos aos filhos, evitando-se,como conseqüência da separação conjugal, a exclusão
de um dos pais do processo educativo de sua prole e a
conseqüente sobrecarga do outro. (BRANDÃO, 2008, 90)
A guarda participativa dos filhos é um propósito acertado pela sensatez
e pelo afeto. Mas os contrastes que se fazem notórios nas Varas de Família
nem sempre permitem a aplicação dessa medida.
Art. 1.584. (...)
§ 2 o Quando não houver acordo entre a mãe e o pai
quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que
possível, a guarda compartilhada.
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§ 5 o Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer
sob a guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda à
pessoa que revele compatibilidade com a natureza da
medida, considerados, de preferência, o grau de
parentesco e as relações de afinidade e afetividade. (CÓ-
DIGO CIVIL, 2002, sem página)
Impugnada a guarda conjunta, o juiz decretará – com apoio, se
necessário, da equipe multidisciplinar – a guarda unilateral. Restaura-se, por
conseguinte, a dificuldade da seleção do “melhor pai” e a ocasião se faz
preâmbulo a um ponto que pode se encontrar nas famílias assim
reconstituídas: a supressão da experiência paterna – no caso, o parente que
não detém a guarda, ou melhor, o genitor descontínuo – na biografia do filho.
O evento, às vezes, se produz por desinteresse do genitor, que se afasta
emocionalmente da prole. Existe, todavia, a possibilidade de um abuso
emocional por parte do genitor contínuo (em posse da guarda filial), desferido
contra o filho, para que este rompa seus laços afetivos com o outro cônjuge. A
violência qualifica-se como alienação parental, e merece zelo aprumado dospsicólogos, se um caso que apresenta tais indícios é trazido ao seu labor.
Quando os filhos menores ficam sob guarda do parceiro que nutre as
dores da rejeição e do desfavorecimento frente à nova condição, este pode
utilizar-se dessa convivência para revelar àqueles um processo de desvalo-
rização e descrédito do ex-cônjuge, fazendo-os de instrumento de agressão.
Criam-se situações para dificultar a visitação, reduzindo-se o contato entre opai (ou a mãe) visitante e a prole.
Um genitor que vier a perceber que o outro cria impedimentos ao seu
direito legal de visitação e participação na vida dos filhos pode demandar ação
autônoma. O requerimento pode ser motivado também pelo Ministério Público
ou em ato ex officio do juiz, o qual poderá, caso se perceba necessário,
assistir-se de perícia psicológica, e posteriormente ajustar a situação com
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medidas preservativas à integridade psicológica do menor e assecurativas de
sua convivência com o parente alienado.18 A responsabilização do alienador
pode vir a ser definida como abuso de autoridade, ensejando reversão da
guarda ou mesmo destituição do poder familiar.19
Atualmente tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei Nº 4.053,
do deputado federal Regis de Oliveira, assentado uma legislação específica
para coibir os casos de alienação parental. Recentemente aprovada (no dia 19
de novembro de 2009), pela Comissão de Constituição e Justiça e de
Cidadania (CCJ), o projeto se harmoniza com a Lei Nº 11.698/2008 – Lei da
Guarda Compartilhada, e também demarca o que seria alienação parental;prevê a perícia com base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial,
conforme o caso, por profissional ou equipe multidisciplinar habilitados (com
prazo de 90 dias para apresentação de laudo); e determina instrumentos
processuais para inibir ou atenuar os efeitos da alienação e para punição do
alienador, podendo o juiz, de acordo com cada ocorrência, advertir e estipular
multa ao alienador, ampliar o regime de convivência familiar em favor do
genitor alienado, alterar o tipo de guarda ou invertê-la, suspender ou conferir adestituição do poder familiar.
O acompanhamento psicológico, para qualquer das passagens
mencionadas, tem em vista, ao mesmo tempo, suavizar a angústia e as
frustrações que o rompimento conjugal causa, tanto para os ex-cônjuges
quanto para os filhos.
18 A dificuldade do psicólogo, neste ponto, se faz presente também por se necessitar de
celeridade na preparação dos laudos psicossociais. Não se deve retardar a identificação daalienação parental, pois a criança tende, com o tempo, a aceitar a mentira criada pelo genitorguardião, acreditando naquilo repetido com insistência. Nem mesmo o guardião consegue,após certo período, distinguir entre a veracidade dos fatos e suas calúnias, fazendo com que ofilho se identifique cada vez mais consigo e se afaste do genitor alienado, rompendo tal vínculoafetivo; a alienante passa a assumir controle total da nova conjuntura doméstica.
19 Conforme o Art. 1.637 do Código Civil (Lei 10.406 de 2002): “Se o pai, ou a mãe, abusar de
sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça recla-mada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando
convenha.”
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3.4 – Uma reflexão de conteúdo sócio-histórico para a atuação
do psicólogo jurídico frente às políticas públicas
As políticas públicas revelam-se basicamente como empreendimentos
de teor ético-político, através dos quais a sociedade integra-se ao impulso
estatal, como beneficiária, de um projeto de desenvolvimento sócio-econômico.
Tal engenho realiza-se em ações coordenadas, com escopo público, coletivo,
iniciativas idealmente elaboradas para impelir o estabelecimento da cidadania,
para garantir os direitos humanos e sociais, para tentar a promoção de auto-
nomia de determinadas camadas sociais.
Os projetos de amparo acabam sendo traçados a partir de um conceito
abstrato de homem; ainda que o foco seja uma fração restrita da sociedade,
para determinada política pública, concebe-se o atendimento com óbvio cará-
ter universalista, sem levar em conta – ainda – as diferenças sócio-culturais e
subjetivas de cada pessoa ou família beneficiada.
As práticas psicológicas devem relevar, portanto, justamente as dispa-
ridades entre os sujeitos, intervenção a qual faz parte mesmo de suas ferra-
mentas, agenciando vínculos e escutas; aproximando e facilitando a comuni-
cação através do estabelecimento de redes (tanto de trabalho quanto sociais);
estimulando reflexões nos cidadãos, para que estes se reposicionem do lugar
de assistidos para um local protagonista de direitos. Os tecidos a serem
entrelaçados passam a considerar o singular naquele múltiplo idealizado nos
detalhamentos finalísticos do projeto, a partir da construção que é feita pelo
psicólogo no seu ambiente de atuação.
Precisamente, dando vigor à atitude reflexiva que nesta investigação
tanto se endossa, sucintas observações serão apresentadas, a seguir, sobre a
questão social que acomete o Brasil e dá ânimo à efervescência às políticas
públicas, de modo geral.
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3.4.1 – Neoliberalismo e exclusão social
É inequívoco constatar-se, no nosso período contemporâneo, que o
desenvolvimento de produtos e de bens, duráveis ou de consumo rápido, ou o
fruto do progresso tecnológico não se distribuem de maneira proporcional à po-
pulação. Não servem, portanto, a uma melhoria social autêntica. Antes, porém,
o desenvolvimento econômico, principalmente em sua fase neoliberal, estabe-
lece exclusões sociais aceleradas e de termos que não se indicam alteráveis,
ou mesmo com instigação política eficaz para solucionar a situação desde o
âmago do problema.
O Estado Democrático de Direito, o qual pressupõe a igualdade
material e a garantia de direitos sociais aos cidadãos, acaba sendo uma dissi-
mulação não-consagrada na realidade social de muitos países – o Brasil inclu-
so – que convencionaram tal ideação política em suas Constituições. Vê-se
que o capitalismo
se expande à custa da redução sem limites dos custos do
trabalho, debitando na conta do trabalhador e dos pobres
o preço do progresso sem ética nem princípios, privatiza
ganhos nesse caso injustos e socializa perdas, crises e
problemas sociais. (MARTINS, 2002, p. 11)
A pobreza, minimamente apreciada como deficiência material, acabasendo marginalizada e criminalizada. No entanto, a carência pode ser remen-
dada com uma lógica de separação social, cuja parte excluída trilha uma traje-
tória de banalização e descarte, simplesmente porque já não servem mais
como mão-de-obra de reserva ao mercado empregatício. A nova época trouxe
o desaparecimento de empregos e passou a motivar uma exclusão em massa
de multidões se tornam supérfluas e inviáveis no jogo de interesses do Estado
neoliberal.
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A substituição de homens por máquinas e equipamentos sempre foi
um propósito capitalista, como recurso das categorias empregadoras e
proprietárias dos meios de produção para cada vez lidar menos com as neces-
sidades e direitos dos assalariados e suas respectivas subjetividades. O siste-
ma capitalista de até meados do século XX, todavia, utilizava-se dos exceden-
tes de pessoas aptas ao emprego como, entre outros, estratagema de acha-
tamento salarial e negociação de benefícios, acomodando certos contingentes
que se revezavam nas posições transitórias de potenciais trabalhadores apro-
veitados e aqueles ainda desempregados e marginalizados.
Um desempregado, hoje, não é mais objeto de uma
marginalização provisória, ocasional, que atinge apenas
alguns setores; agora, ele está às voltas com uma
implosão geral, com um fenômeno comparável a
tempestades, ciclones e tornados, que não visam
ninguém em particular, mas aos quais ninguém pode
resistir. Ele é objeto de uma lógica planetária que supõe asupressão daquilo que se chama trabalho; vale dizer,
empregos. (FORRESTER, 1997, p. 11)
As manobras e discursos de estadistas profissionais alimentam falsas
esperanças de que o desemprego é uma crise transitória, escondendo a dura
realidade da nova manifestação político-econômica. Fecham-se as portas para
os indivíduos como alicerce produtivo, contudo vias largas ainda se mantémdilatadas para estes como consumidores e abastecedores do mercado. Na mo-
déstia de seu arrojo gastador, tais indivíduos são por isso responsabilizados;
instalam-se a culpa e a vergonha por não se adequarem às determinações da
sociedade contemporânea, na qual o sujeito atrela sua cidadania ao potencial
consumerista.
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O desastre toma proporção frente à constatação da influência da
imagem neoliberal na sociedade, na qual se acomodou sorrateiramente, e da
falta de consciência do senso comum quanto às probabilidades decorrentes de
sua tenacidade, o que acarreta certa impassibilidade e expectativa de mudan-
ças que não virão.
Está instalada (...) a era do liberalismo, que soube impor
sua filosofia sem ter realmente que formulá-la e nem
mesmo elaborar qualquer doutrina, de tal modo estava ela
encarnada e ativa antes mesmo de ser notada. Seu
domínio anima um sistema imperioso, totalitário em suma,
mas, por enquanto, em torno da democracia e, portanto,
temperado, limitado, sussurrado, calafetado, sem nada de
ostentatório, de proclamado. Estamos realmente na
violência da calma. (FORRESTER, 1997, p. 45)
Passa-se a insuflar, cada vez mais, ideologicamente a liberdade indivi-
dual e a propriedade como valores indispensáveis da sociedade. As dispari-dades sociais e a excessiva individualização, no entanto, transformam a crise
compartilhada em fracasso pessoal, e o novo jogo econômico que estimula o
consumo desenfreado aumenta ainda mais o desconforto que afasta aqueles
que desejam e aqueles que podem satisfazer seus desejos.
Como produto inevitável do apetite consumista disseminado em massa
tão desigual, sobreveio um crescimento da criminalidade. E, como confrontoescolhido para arrefecer tal processo e lidar com as pessoas excluídas do
mercado de consumo, ampliou-se as populações carcerárias e os modelos
punitivos – incrementa-se o Estado penal. Aqueles indivíduos, despojados,
passam a ser caracterizados como perigosos e potencialmente criminosos, já
que não conseguem se esquivar do desejo de consumo. Ficam, também, sub-
metidos a uma estigmatização espacial, ocupando bairros ou zoneamentos de
tipos excluídos – o que o sociólogo Loïc Wacquant denomina marginalidade
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avançada (ver: WACQUANT, 1997) –, ao qual se somam categorizações e
preconceitos étnicos / raciais, e tendo como efeito uma cidade dividida.
Basicamente, o que distingue a nova segregação daquelas consti-
tuídas até o final do século XX, são: a erosão da capacidade integradora tra-
balho-salário; a desconexão funcional dos trabalhadores desempregados,
proveniente de tendências macroeconômicas; a fixação e a demarcação
territoriais, cada vez mais isolados e vistos como refugos sociais; a alienação
ou dissolução do lugar (as populações urbanas marginalizadas não se sentem
seguras e protegidas no seu local de domicílio); a impossibilidade de retorno
ou fuga para o interior rural, em face às dificuldades de empregos na cidade; a
ausência de uma linguagem comum que unifique simbolicamente os excluídos,
como antigamente se fazia no contexto operário contraposto à classe
dominante e à acumulação de capital (ver WACQUANT, 1997, pp.166-171).
O discurso pseudo-moralizador do uso da violência pelo Estado
ganhou força, e o meio jornalístico insuflou persistentemente no público um
terror à pobreza, anunciada como delituosa; abriu-se inclinação, assim, à“prudência” de dirigir a vida dos pobres como perfeito recurso de combate ao
problema e se produziu uma sociedade urbana sociopática.
Nesses tempos de globalização, em que, cada vez mais,
menos ganham e muitos perdem, os gastos orçamen-
tários do Estado com as despesas ligadas à manutenção
da ‘lei e da ordem’ – como os efetivos policiais e osserviços penitenciários e, principalmente, os gastos com
equipamentos ligados à tecnologia de segurança nas
prisões – crescem em todo o planeta. Os malefícios infli-
gidos através da pena de prisão atingiram o nível de co-
mercialização como de qualquer outro produto.
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Percebe-se nitidamente que todo o processo globalizador
é alimentado pela autopropulsão do medo. (...)
Todo o medo e insegurança gerados pela crescente
parcela de excluídos da sociedade é, então, somatizado
pela população ainda incluída, que vê como única saída
para combater esse mal, que assola a humanidade, as
instituições carcerárias. (GUIMARÃES, 2005, p. 170)
3.4.2 – Neoliberalismo e políticas públicas
O controle, como foi visto, passou a ser uma ação de contenção. Os
reflexos desse acontecimento se agravam quando se mira implantar pro-
gramas de trabalho como meios de reabilitação e ressocialização do ex-
detento. Propaga-se ainda que o trabalho formal seja a verdadeira natureza do
homem, em contraste com a redução ininterrupta de postos de mão-de-obra
empregada. Sem driblar o cenário aviltante que se montou, ou mesmo adentrar
as causas verdadeiras do imbróglio para tentar uma autêntica solução, a
política neoliberal aposta num reordenamento da proteção social, sem arranhar
ainda as lógicas de mercado que servem de arcabouço ao sistema político-
econômico vigorante.
A família, em tal contexto, apreende grande estima, porque é o espaço
primeiro de proteção do indivíduo, mas também de socialização e reprodução
de valores, intentando-se, por conseguinte, sub-repticiamente a permanência eo reportar do ideário neoliberal, vinculando-se a cidadania às potencialidades
de consumo do indivíduo. As políticas públicas, assim, tomam forma de assis-
tencialização de bens e serviços sociais, consideradas sob o aspecto de
“programas de transferência de renda como um mecanismo compensatório,
residual e focalista, eficiente no combate à pobreza e substitutivo dos
programas e serviços existentes” (CAVALCANTI, 2008, pp.32-33).
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Os direitos sociais e políticos, constitucionalmente garantidos, passam
a se modelar como privilégios, inclusive submetidos a condições específicas
para o indivíduo acessar os programas de assistência. Deixam de observar os
governos que estimulam essa prática assistencialista que os direitos não
devem ser obtemperados a exigências ou contrapartidas, já que direitos são, e
não regalias.
Dentro dessa lógica, a organização dos serviços é
centrada na perspectiva do indivíduo-problema (a criança,
o adolescente, a mulher, o idoso) a partir de situações
específicas (doença, delinqüência, abandono, maus
tratos, exploração, etc.) ou, ainda, de acordo com as suas
necessidades (saúde, educação, habitação etc.),
traduzindo-se em ações pontuais, atomizadas e
insuficientes, uma vez que não enfrenta efetivamente a
real situação de vulnerabilidade social, econômica e
pessoal desses indivíduos, tampouco dos seus grupos
familiares. (CAVALCANTI, 2008, p. 36)
A atual disposição político-econômica não suscita uma concreta
mudança na vulnerabilidade dos excluídos. O incentivo à capacitação
profissional para futura reinserção no mercado de trabalho é falaciosa e
ilusória, na medida em que não há como se fomentar postos de trabalho
suficientes para todos os desempregados. Conservar o trabalho como
paradigma na sociedade e conjuntura atuais revela-se inócuo, e as demandassociais extrapolam até mesmo as contradições históricas entre a classe
operária e o capital. Assim, frente à incapacidade de atender a toda a
população excluída, os programas de assistência tendem à permanência dos
atendidos, que vão sendo substituídos periodicamente quando deixam de
atender às condicionalidades exigidas pelas instruções do projeto de amparo
governamental, por outros indivíduos ou famílias eleitos segundo tais critérios.
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Mantém-se, assim, um ciclo vicioso de retroalimentação
da pobreza, sem que sejam fornecidas condições
objetivas às famílias para romperem com o circuito
marginal de inserção social (produção, consumo e
cidadania) em que se encontram. (CAVALCANTI, 2008,
p. 42)
Até mesmo em outras esferas, como na atenção sanitária, por exem-
plo, o modelo estatal condiciona-se pela proposta neoliberal: agencia-se a
prática curativa, ao invés de se oferecer ações de prevenção e acesso palpável
à higiene e à saúde.
A ciência trilha seu caminho de forma contígua às transformações e
camadas sociais; suas múltiplas conexões estabelecem nexos e campos de
força variados, e “as organizações de trabalho e as relações de troca que
sustentam o conceito e o uso da mercadoria agrupam interesses em comum
que é a obtenção do lucro, esses atuam como vetores de força vigorosos
sobre a ciência” (SEHN, 2004, p. 38). A produção do conhecimento insere-seno tecido social de forma disciplinar, portanto, ainda no ciclo neoliberal,
obtendo a sujeição dos corpos e o controle do tempo e das populações. O
papel do psicólogo jurídico, aqui, desenha-se não somente no trato
diferenciado e subjetivado às pessoas beneficiadas pelas campanhas e
projetos estatais realizados em seu espaço de atuação, considerando-as em
sua significância sócio-histórica, outrossim, na utilização de seu conhecimento
– ou melhor, seu saber-poder – como pivô para ponderar a questão social efazer repercutir aberturas de reflexão, de entendimento e de transformação.
O psicólogo precisa, assim, ampliar os limites da dimensão política de
seu empreendimento profissional – no campo acadêmico, para influenciar um-
danças, e no domínio institucional, para produzir agenciamentos fecundos.
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CONCLUSÃO
O psicólogo jurídico não só é capaz como deve, em harmonia com seu
código profissional, delinear seus afazeres bem mais além do que o lugar de
parecerista que as legislações do século XX lhe reservou. As novas normas
jurídicas, em arrumação condizente com os Direitos Humanos e com as
necessidades sócio-econômicas que se acumulam no tecido social, conjeturam
sua aplicação ética.
O cotidiano desses profissionais precisa ser atravessado pelas situa-
ções sócio-históricas de cada sujeito atendido, por suas relações interpessoais
e pelos respectivos processos de socialização percebidos nas pesquisas. A
divulgação das informações colhidas, ainda que seja para subsidiar certas
decisões jurídicas ou para fazer avançar o trâmite processual, também se
submete a regras éticas de preservação da intimidade dos sujeitos. Convém
não participar da articulação das verdades construídas no tribunal, visando
emoldurar rigidamente os sujeitos envolvidos no litígio e resolver o conflito, que
é o escopo maior do Direito.
A dissertação que ora se completa construiu três disposições nítidas
para o psicólogo elaborar em sua atitude:
1) Disposição reflexiva: analisar profundamente os aspectos diver-
sos do acolhido, atentando para sua variabilidade e multideterminação, sem
isolá-lo de seu contexto sócio-histórico;
2) Disposição molecular: (a partir de suas especulações) promover a
singularização dos sujeitos investigados, acionando os processos de produção
dos desejos (os agenciamentos), invalidando, assim, os padrões dominantes e
desnaturalizando as realidades construídas para servirem de imposição;
3) Disposição micropolítica: auxiliar os sujeitos, igualmente, muni-
ciado de seu saber-poder psicológico (em seguida aos anteriores, que são de
ordem filosófica), reavaliando seu papel institucional.
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Os raciocínios atingidos, quando coordenados em sua práxis diária
frente às demandas levadas ao psicólogo jurídico, proporcionam a descons-
trução do lugar de especialista neutro, despolitizado e objetivo.
A atuação, por certo, terá como orientação as demandas específicas
encontradas no local de trabalho. Os contextos de cada ambientação podem
trazer peculiaridades que vão determinar o labor do psicólogo, mas este fica
compelido eticamente a desnaturalizar os fatos, a fim de atingir o que se es-
conde ideologicamente e o fluxo de forças que determina sua matéria de pés-
quisa. As Varas de Família, por exemplo, podem motivar tratamentos que não
se repercutam nas Varas Criminais, completamente dessemelhantes; a dispo-
sição, a atitude que o psicólogo jurídico deve se prestar, no entanto, demons-
tra-se indelével, perseverante.
Mais uma vez se autentica: o psicólogo não tem “função”; compete-lhe
um papel social – isto sim! – bastante extraordinário.
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ANEXO 1
CFP Nº 010/05
Aprova o Código de Ética Profissional do Psicólogo.
O CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, no uso de suas atribuições legais
e regimentais, que lhe são conferidas pela Lei no 5.766, de 20 de dezembro de
1971;
CONSIDERANDO o disposto no Art. 6º, letra "e", da Lei no 5.766 de
20/12/1971, e o Art. 6º, inciso VII, do Decreto no 79.822 de 17/6/1977;
CONSIDERANDO o disposto na Constituição Federal de 1988, conhecida
como Constituição cidadã, que consolida o Estado Democrático de Direito e
legislações dela decorrentes;
CONSIDERANDO decisão deste Plenário em reunião realizada no dia 21 de
julho de 2005;
RESOLVE:
Art. 1º - Aprovar o Código de Ética Profissional do Psicólogo.
Art. 2º - A presente Resolução entrará em vigor no dia 27 de agosto de 2005.
Art. 3º - Revogam-se as disposições em contrário, em especial a Resolução
CFP n º 002/87.
Brasília, 21 de julho de 2005.
ANA MERCÊS BAHIA BOCK
Conselheira-Presidente
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ANEXO 2
CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL DO PSICÓLOGO
Apresentação
Toda profissão define-se a partir de um corpo de práticas que busca atender
demandas sociais, norteado por elevados padrões técnicos e pela existência
de normas éticas que garantam a adequada relação de cada profissional comseus pares e com a sociedade como um todo.
Um Código de Ética profissional, ao estabelecer padrões esperados quanto às
práticas referendadas pela respectiva categoria profissional e pela sociedade,
procura fomentar a auto-reflexão exigida de cada indivíduo acerca da sua
práxis, de modo a responsabilizá-lo, pessoal e coletivamente, por ações e suas
conseqüências no exercício profissional. A missão primordial de um código deética profissional não é de normatizar a natureza técnica do trabalho, e, sim, a
de assegurar, dentro de valores relevantes para a sociedade e para as práticas
desenvolvidas, um padrão de conduta que fortaleça o reconhecimento social
daquela categoria.
Códigos de Ética expressam sempre uma concepção de homem e de
sociedade que determina a direção das relações entre os indivíduos.
Traduzem-se em princípios e normas que devem se pautar pelo respeito ao
sujeito humano e seus direitos fundamentais. Por constituir a expressão de
valores universais, tais como os constantes na Declaração Universal dos
Direitos Humanos; sócio-culturais, que refletem a realidade do país; e de
valores que estruturam uma profissão, um código de ética não pode ser visto
como um conjunto fixo de normas e imutável no tempo. As sociedades mudam,
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as profissões transformam-se e isso exige, também, uma reflexão contínua
sobre o próprio código de ética que nos orienta.
A formulação deste Código de Ética, o terceiro da profissão de psicólogo no
Brasil, responde ao contexto organizativo dos psicólogos, ao momento do país
e ao estágio de desenvolvimento da Psicologia enquanto campo científico e
profissional. Este Código de Ética dos Psicólogos é reflexo da necessidade
sentida pela categoria e suas entidades representativas, de atender à evolução
do contexto institucional-legal do país, marcadamente a partir da promulgação
da denominada Constituição Cidadã, em 1988, e das legislações dela
decorrentes.
Consoante com a conjuntura democrática vigente, o presente Código foi
construído a partir de múltiplos espaços de discussão sobre a ética da
profissão, suas responsabilidades e compromissos com a promoção da
cidadania. O processo ocorreu ao longo de três anos, em todo o país, com a
participação direta dos psicólogos e aberto à sociedade.
Este Código de Ética pautou-se pelo princípio geral de aproximar-se mais de
um instrumento de reflexão do que de um conjunto de normas a serem
seguidas pelo psicólogo. Para tanto, na sua construção buscou-se:
a. Valorizar os princípios fundamentais como grandes eixos que devem
orientar a relação do psicólogo com a sociedade, a profissão, as
entidades profissionais e a ciência, pois esses eixos atravessam todasas práticas e estas demandam uma contínua reflexão sobre o contexto
social e institucional.
b. Abrir espaço para a discussão, pelo psicólogo, dos limites e interseções
relativos aos direitos individuais e coletivos, questão crucial para as
relações que estabelece com a sociedade, os colegas de profissão e os
usuários ou beneficiários dos seus serviços.
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c. Contemplar a diversidade que configura o exercício da profissão e a
crescente inserção do psicólogo em contextos institucionais e em
equipes multiprofissionais.
d. Estimular reflexões que considerem a profissão como um todo e não em
suas práticas particulares, uma vez que os principais dilemas éticos não
se restringem a práticas específicas e surgem em quaisquer contextos
de atuação.
Ao aprovar e divulgar o Código de Ética Profissional do Psicólogo, a
expectativa é de que ele seja um instrumento capaz de delinear para a
sociedade as responsabilidades e deveres do psicólogo, oferecer diretrizespara a sua formação e balizar os julgamentos das suas ações, contribuindo
para o fortalecimento e ampliação do significado social da profissão.
Princípios Fundamentais
IV. O psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da
liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiadonos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
V. O psicólogo trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das
pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer
formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão.
VI. O psicólogo atuará com responsabilidade social, analisando crítica e
historicamente a realidade política, econômica, social e cultural.
VII. O psicólogo atuará com responsabilidade, por meio do contínuo
aprimoramento profissional, contribuindo para o desenvolvimento da Psicologia
como campo científico de conhecimento e de prática.
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VIII. O psicólogo contribuirá para promover a universalização do acesso da
população às informações, ao conhecimento da ciência psicológica, aos
serviços e aos padrões éticos da profissão.
IX. O psicólogo zelará para que o exercício profissional seja efetuado com
dignidade, rejeitando situações em que a Psicologia esteja sendo aviltada.
X. O psicólogo considerará as relações de poder nos contextos em que atua e
os impactos dessas relações sobre as suas atividades profissionais,
posicionando-se de forma crítica e em consonância com os demais princípios
deste Código.
Das Responsabilidades do Psicólogo
Art. 1º - São deveres fundamentais dos psicólogos:
a. Conhecer, divulgar, cumprir e fazer cumprir este Código;
b. Assumir responsabilidades profissionais somente por atividades para as
quais esteja capacitado pessoal, teórica e tecnicamente;c. Prestar serviços psicológicos de qualidade, em condições de trabalho
dignas e apropriadas à natureza desses serviços, utilizando princípios,
conhecimentos e técnicas reconhecidamente fundamentados na ciência
psicológica, na ética e na legislação profissional;
d. Prestar serviços profissionais em situações de calamidade pública ou de
emergência, sem visar benefício pessoal;
e. Estabelecer acordos de prestação de serviços que respeitem os direitosdo usuário ou beneficiário de serviços de Psicologia;
f. Fornecer, a quem de direito, na prestação de serviços psicológicos,
informações concernentes ao trabalho a ser realizado e ao seu objetivo
profissional;
g. Informar, a quem de direito, os resultados decorrentes da prestação de
serviços psicológicos, transmitindo somente o que for necessário para a
tomada de decisões que afetem o usuário ou beneficiário;
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h. Orientar a quem de direito sobre os encaminhamentos apropriados, a
partir da prestação de serviços psicológicos, e fornecer, sempre que solicitado,
os documentos pertinentes ao bom termo do trabalho;
i. Zelar para que a comercialização, aquisição, doação, empréstimo,
guarda e forma de divulgação do material privativo do psicólogo sejam feitas
conforme os princípios deste Código;
j. Ter, para com o trabalho dos psicólogos e de outros profissionais,
respeito, consideração e solidariedade, e, quando solicitado, colaborar com
estes, salvo impedimento por motivo relevante;
k. Sugerir serviços de outros psicólogos, sempre que, por motivos
justificáveis, não puderem ser continuados pelo profissional que os assumiuinicialmente, fornecendo ao seu substituto as informações necessárias à
continuidade do trabalho;
l. Levar ao conhecimento das instâncias competentes o exercício ilegal ou
irregular da profissão, transgressões a princípios e diretrizes deste Código ou
da legislação profissional.
Art. 2º - Ao psicólogo é vedado:a. Praticar ou ser conivente com quaisquer atos que caracterizem
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade ou opressão;
b. Induzir a convicções políticas, filosóficas, morais, ideológicas, religiosas,
de orientação sexual ou a qualquer tipo de preconceito, quando do exercício de
suas funções profissionais;
c. Utilizar ou favorecer o uso de conhecimento e a utilização de práticas
psicológicas como instrumentos de castigo, tortura ou qualquer forma deviolência;
d. Acumpliciar-se com pessoas ou organizações que exerçam ou
favoreçam o exercício ilegal da profissão de psicólogo ou de qualquer outra
atividade profissional;
e. Ser conivente com erros, faltas éticas, violação de direitos, crimes ou
contravenções penais praticados por psicólogos na prestação de serviços
profissionais;
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f. Prestar serviços ou vincular o título de psicólogo a serviços de
atendimento psicológico cujos procedimentos, técnicas e meios não estejam
regulamentados ou reconhecidos pela profissão;
g. Emitir documentos sem fundamentação e qualidade técnico-científica;
h. Interferir na validade e fidedignidade de instrumentos e técnicas
psicológicas, adulterar seus resultados ou fazer declarações falsas;
i. Induzir qualquer pessoa ou organização a recorrer a seus serviços;
j. Estabelecer com a pessoa atendida, familiar ou terceiro, que tenha
vínculo com o atendido, relação que possa interferir negativamente nos
objetivos do serviço prestado;
k. Ser perito, avaliador ou parecerista em situações nas quais seusvínculos pessoais ou profissionais, atuais ou anteriores, possam afetar a
qualidade do trabalho a ser realizado ou a fidelidade aos resultados da
avaliação;
l. Desviar para serviço particular ou de outra instituição, visando benefício
próprio, pessoas ou organizações atendidas por instituição com a qual
mantenha qualquer tipo de vínculo profissional;
m. Prestar serviços profissionais a organizações concorrentes de modo quepossam resultar em prejuízo para as partes envolvidas, decorrentes de
informações privilegiadas;
n. Prolongar, desnecessariamente, a prestação de serviços profissionais;
o. Pleitear ou receber comissões, empréstimos, doações ou vantagens
outras de qualquer espécie, além dos honorários contratados, assim como
intermediar transações financeiras;
p. Receber, pagar remuneração ou porcentagem por encaminhamento deserviços;
q. Realizar diagnósticos, divulgar procedimentos ou apresentar resultados
de serviços psicológicos em meios de comunicação, de forma a expor
pessoas, grupos ou organizações.
Art. 3º - O psicólogo, para ingressar, associar-se ou permanecer em uma
organização, considerará a missão, a filosofia, as políticas, as normas e as
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práticas nela vigentes e sua compatibilidade com os princípios e regras deste
Código.
Parágrafo único: Existindo incompatibilidade, cabe ao psicólogo recusar-se a
prestar serviços e, se pertinente, apresentar denúncia ao órgão competente.
Art. 4º - Ao fixar a remuneração pelo seu trabalho, o psicólogo:
a. Levará em conta a justa retribuição aos serviços prestados e as
condições do usuário ou beneficiário;
b. Estipulará o valor de acordo com as características da atividade e o
comunicará ao usuário ou beneficiário antes do início do trabalho a ser
realizado;
c. Assegurará a qualidade dos serviços oferecidos independentemente do
valor acordado.
Art. 5º - O psicólogo, quando participar de greves ou paralisações, garantirá
que:
a. As atividades de emergência não sejam interrompidas;b. Haja prévia comunicação da paralisação aos usuários ou beneficiários
dos serviços atingidos pela mesma.
Art. 6º - O psicólogo, no relacionamento com profissionais não psicólogos:
a. Encaminhará a profissionais ou entidades habilitados e qualificados
demandas que extrapolem seu campo de atuação;
b. Compartilhará somente informações relevantes para qualificar o serviçoprestado, resguardando o caráter confidencial das comunicações, assinalando
a responsabilidade, de quem as receber, de preservar o sigilo.
Art. 7º - O psicólogo poderá intervir na prestação de serviços psicológicos que
estejam sendo efetuados por outro profissional, nas seguintes situações:
a. A pedido do profissional responsável pelo serviço;
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b. Em caso de emergência ou risco ao beneficiário ou usuário do serviço,
quando dará imediata ciência ao profissional;
c. Quando informado expressamente, por qualquer uma das partes, da
interrupção voluntária e definitiva do serviço;
d. Quando se tratar de trabalho multiprofissional e a intervenção fizer parte
da metodologia adotada.
Art. 8º - Para realizar atendimento não eventual de criança, adolescente ou
interdito, o psicólogo deverá obter autorização de ao menos um de seus
responsáveis, observadas as determinações da legislação vigente;
§1° - No caso de não se apresentar um responsável legal, o atendimento
deverá ser efetuado e comunicado às autoridades competentes;
§2° - O psicólogo responsabilizar-se-á pelos encaminhamentos que se fizerem
necessários para garantir a proteção integral do atendido.
Art. 9º - É dever do psicólogo respeitar o sigilo profissional a fim de proteger,
por meio da confidencialidade, a intimidade das pessoas, grupos ou
organizações, a que tenha acesso no exercício profissional.
Art. 10 - Nas situações em que se configure conflito entre as exigências
decorrentes do disposto no Art. 9º e as afirmações dos princípios fundamentais
deste Código, excetuando-se os casos previstos em lei, o psicólogo poderá
decidir pela quebra de sigilo, baseando sua decisão na busca do menor
prejuízo.
Parágrafo Único - Em caso de quebra do sigilo previsto no caput deste artigo,o psicólogo deverá restringir-se a prestar as informações estritamente
necessárias.
Art. 11 - Quando requisitado a depor em juízo, o psicólogo poderá prestar
informações, considerando o previsto neste Código.
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Art. 12 - Nos documentos que embasam as atividades em equipe
multiprofissional, o psicólogo registrará apenas as informações necessárias
para o cumprimento dos objetivos do trabalho.
Art. 13 - No atendimento à criança, ao adolescente ou ao interdito, deve ser
comunicado aos responsáveis o estritamente essencial para se promoverem
medidas em seu benefício.
Art. 14 - A utilização de quaisquer meios de registro e observação da prática
psicológica obedecerá às normas deste Código e a legislação profissional
vigente, devendo o usuário ou beneficiário, desde o início, ser informado.
Art. 15 - Em caso de interrupção do trabalho do psicólogo, por quaisquer
motivos, ele deverá zelar pelo destino dos seus arquivos confidenciais.
§ 1° - Em caso de demissão ou exoneração, o psicólogo deverá repassar todo
o material ao psicólogo que vier a substituí-lo, ou lacrá-lo para posterior
utilização pelo psicólogo substituto.
§ 2° - Em caso de extinção do serviço de Psicologia, o psicólogo responsávelinformará ao Conselho Regional de Psicologia, que providenciará a destinação
dos arquivos confidenciais.
Art. 16 - O psicólogo, na realização de estudos, pesquisas e atividades
voltadas para a produção de conhecimento e desenvolvimento de tecnologias:
a. Avaliará os riscos envolvidos, tanto pelos procedimentos, como pela
divulgação dos resultados, com o objetivo de proteger as pessoas, grupos,organizações e comunidades envolvidas;
b. Garantirá o caráter voluntário da participação dos envolvidos, mediante
consentimento livre e esclarecido, salvo nas situações previstas em legislação
específica e respeitando os princípios deste Código;
c. Garantirá o anonimato das pessoas, grupos ou organizações, salvo
interesse manifesto destes;
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d. Garantirá o acesso das pessoas, grupos ou organizações aos
resultados das pesquisas ou estudos, após seu encerramento, sempre que
assim o desejarem.
Art. 17 - Caberá aos psicólogos docentes ou supervisores esclarecer, informar,
orientar e exigir dos estudantes a observância dos princípios e normas
contidas neste Código.
Art. 18 - O psicólogo não divulgará, ensinará, cederá, emprestará ou venderá a
leigos instrumentos e técnicas psicológicas que permitam ou facilitem o
exercício ilegal da profissão.
Art. 19 - O psicólogo, ao participar de atividade em veículos de comunicação,
zelará para que as informações prestadas disseminem o conhecimento a
respeito das atribuições, da base científica e do papel social da profissão.
Art. 20 - O psicólogo, ao promover publicamente seus serviços, por quaisquer
meios, individual ou coletivamente:a. Informará o seu nome completo, o CRP e seu número de registro;
b. Fará referência apenas a títulos ou qualificações profissionais que
possua;
c. Divulgará somente qualificações, atividades e recursos relativos a
técnicas e práticas que estejam reconhecidas ou regulamentadas pela
profissão;
d. Não utilizará o preço do serviço como forma de propaganda;e. Não fará previsão taxativa de resultados;
f. Não fará auto-promoção em detrimento de outros profissionais;
g. Não proporá atividades que sejam atribuições privativas de outras
categorias profissionais;
h. Não fará divulgação sensacionalista das atividades profissionais.
Das Disposições Gerais
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Art. 21 - As transgressões dos preceitos deste Código constituem infração
disciplinar com a aplicação das seguintes penalidades, na forma dos
dispositivos legais ou regimentais:
a. Advertência;
b. Multa;
c. Censura pública;
d. Suspensão do exercício profissional, por até 30 (trinta) dias, ad
referendum do Conselho Federal de Psicologia;
e. cassação do exercício profissional, ad referendum do Conselho Federal
de Psicologia.
Art. 22 - As dúvidas na observância deste Código e os casos omissos serão
resolvidos pelos Conselhos Regionais de Psicologia, ad referendum do
Conselho Federal de Psicologia.
Art. 23 - Competirá ao Conselho Federal de Psicologia firmar jurisprudência
quanto aos casos omissos e fazê-la incorporar a este Código.
Art. 24 - O presente Código poderá ser alterado pelo Conselho Federal de
Psicologia, por iniciativa própria ou da categoria, ouvidos os Conselhos
Regionais de Psicologia.
Art. 25 - Este Código entra em vigor em 27 de agosto de 2005.
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ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
(CIRCUNSCRIÇÕES HISTÓRICAS E CONCEITUAIS) 10
1.1 – Uma breve introdução à História da Psicologia Jurídica
no Brasil 10
1.2 – Algumas demarcações legais da profissão 121.3 – Algumas demarcações conceituais escolhidas 16
CAPÍTULO II
(REFLEXÃO CRÍTICA E MICROPOLÍTICA) 20
CAPÍTULO III
(ÁREAS DE INTERVENÇÃO DO PSICÓLOGO JURÍDICO) 313.1 - A atuação do psicólogo jurídico na Justiça da Infância e
da Juventude 33
3.1.1 - A adoção 33
3.1.2 – Os adolescentes em conflito com a lei 36
3.2 - A atuação do psicólogo jurídico nas Instituições Penais 39
3.3 - A atuação do psicólogo jurídico no Direito de Família 46
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3.3.1 - A mediação familiar 46
3.3.2 - A guarda dos filhos 48
3.4 – Uma reflexão de conteúdo sócio-histórico para aatuação do psicólogo jurídico frente às políticas públicas 55
3.4.1 – Neoliberalismo e exclusão social 56
3.4.2 – Neoliberalismo e políticas públicas 60
CONCLUSÃO 63
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 65
BIBLIOGRAFIA CITADA 71
ANEXO 1 76
ANEXO 2 77
ÍNDICE 88
FOLHA DE AVALIAÇÃO 90
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FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição:
Instituto A VEZ DO MESTRE / Universidade Candido Mendes (UCAM).
Título da Monografia:
O PAPEL SOCIAL DO PSICÓLOGO NO ÂMBITO JURÍDICO BRASILEIRO: Da vonta-
de disciplinar ao juízo micro-revolucionário.
Autor:
Antonio João de Mello Aranha Caneca.
Data da entrega:
28 de março de 2010.
Avaliado por: Profª. Ana Paula Alves Ribeiro. Conceito: