os privilegios da fazenda publica em juizo

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SUMRIO OS PRIVILGIOS DA FAZENDA PBLICA EM JUZO ..............................................4

I Introduo ..............................................................................................................5 II - A Fazenda Pblica em juzo...................................................................................9 1. Generalidades e conceitos ......................................................................................9 2. A Fazenda Pblica em juzo na condio de demandante....................................12 3. Do juzo competente .............................................................................................12 4. Iseno de depsito prvio: despesas ao final do processo .................................13 5. Da representao jurdica da fazenda pblica ......................................................14 5.1. Inexigibilidade do instrumento de mandato ........................................................15 6. Ao Rescisria ....................................................................................................18 6.1. Prazo para ajuizamento da ao rescisria........................................................19 6.2. A Fazenda Pblica no plo passivo da ao rescisria......................................24 7. A Fazenda Pblica na condio de demandada ...................................................28 7.1. Prazo em qudruplo para contestar a ao........................................................29 7.2. Citao, notificao e intimao da Fazenda Pblica ........................................30 7.2.1. Da citao, notificao e intimao pessoal do procurador.............................31 8. Revelia ..................................................................................................................35 8.1. Inaplicabilidade dos efeitos da revelia Fazenda Pblica .................................39 8.2. Inaplicabilidade dos efeitos da revelia - jurisprudncia.......................................40 9. Prazo em dobro para contra-razes a recurso interposto .....................................43 10. Do recolhimento de custas ..................................................................................45 10.1. Princpios jurdicos que regem as despesas processuais ................................48

2 10.2. Sucumbncia recproca....................................................................................49 10.3. Despesas processuais: particularidades ..........................................................49 10.4. Fazenda Pblica - iseno de custas ...............................................................50 10.5. Dispensa do preparo ........................................................................................53 11. Duplo grau de jurisdio .............................................................................53 11.1. Atos decisrios.........................................................................................54 11.1.1. Despachos ............................................................................................54 11.1.3. Sentena...............................................................................................55 11.1.4. Requisitos da sentena.........................................................................59 11.1.5. Efeitos da sentena...............................................................................61 11.1.5.1. Sentena condenatria ......................................................................61 11.1.5.2. Sentena constitutiva .........................................................................62 11.1.5.3. Sentena declaratria ........................................................................63 12. Coisa julgada ..............................................................................................63 12.1. Coisa julgada formal e material............................................................65 12.2. Limites da coisa julgada.......................................................................67 12.3. Limites objetivos da coisa julgada........................................................67 12.4. Limites subjetivos da coisa julgada......................................................69 13. Duplo grau de jurisdio .........................................................................70 13.1. Origem histrica...................................................................................71 13.2. Duplo grau de jurisdio nos dias atuais .............................................72 13.3. Da remessa ex-officio ..........................................................................74 13.3.1. Princpios violados pela remessa ex-officio ......................................74 13.3.2. Prequestionamento...........................................................................77 13.3.3. Tantum devolutum quantum appellato ..............................................80

3 14. Trnsito em julgado ................................................................................84 14.1. Limitao ao duplo grau de jurisdio..................................................86 15. Da execuo contra a fazenda pblica ...................................................87 16. Dos embargos execuo .................................................................89 17. Precatrio ...........................................................................................90 17.1. A falncia do precatrio ...................................................................92 18. Inaplicabilidade da tutela antecipada contra a pazenda pblica .........94 III. Concluso........................................................................................98 IV. Summary.......................................................................................104 V. Bibliografia .....................................................................................104

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OS PRIVILGIOS DA FAZENDA PBLICA EM JUZO

SEBASTIO DUARTE FERRO

Adotando uma viso crtica, procuramos analisar as disparidades existentes em um mesmo processo, quando um dos litigantes a Fazenda Pblica. Questiona-se, se no estado democrtico de direito admissvel ou tolervel tantas desigualdades. Tambm se questiona a inaplicabilidade de alguns institutos inseridos na legislao processual que objetivaram dar maior celeridade s demandas judiciais. Por fim, analisa-se a total falncia do precatrio, ante a posio dos governantes de ignorarem ou de desrespeitarem as decises judiciais.

5 I. INTRODUO

O presente trabalho tem como objetivo servir de manual prtico para consultas rpidas e objetivas acerca dos diversos privilgios de que goza a Fazenda Pblica, quando em juzo. No tem a pretenso, nem poderia ter, de dissecar o tema, hiptese reservada aos tratadistas do direito, mas apresenta-se to somente como um resumido manual de alerta aos estudantes de direito e a quem se inicia nas lides jurdicas, concitando-os a uma reflexo quanto ao grave desequilbrio existente na relao processual entre litigantes, notadamente no que se refere Fazenda Pblica. Desnuda-se, assim, a realidade da prtica forense que se apresenta exatamente em sentido contrrio ao equilbrio e ao tratamento isonmico preconizado nos princpios que norteiam o devido processo legal. Precedendo o assunto abordado no quadro terico, procuramos justificar a escolha do tema, bem como formular os problemas que sero resolvidos no corpo do texto, levantar as hipteses possveis, traar os objetivos e explicitar a metodologia utilizada, listando, ao final, as diversas etapas da pesquisa, nsita no cronograma apresentado. Reservamos o quadro terico para demonstrar que o presente trabalho expe, de forma clara, concisa e em linguagem simples, as diversas etapas em que o ente pblico figura na relao processual, quer ativa, quer passivamente, merecendo sempre a garantia legal de tratamento diferenciado e privilegiado, ao argumento de que o interesse pblico prepondera sobre o interesse particular. Esses privilgios aparecem j ao ingressar em juzo, ou seja, desde o ajuizamento da ao,

6 prossegue no processo de execuo e culmina no famigerado precatrio, frmula engenhosa de se postergar a quitao do quantum debeatum.ESCOLHA DO TEMA

- h muito que estamos meditando sobre o tema

privilgios da Fazenda Pblica em juzo, especialmente porque, enquanto se propaga aos quatro ventos que necessrio modernizar e democratizar o judicirio brasileiro, na contra-mo dos acontecimentos, vemos o crescente desequilbrio da relao processual quando um ente pblico figura como parte. No h dvida quanto ao acerto das vozes cada vez mais audveis daqueles que preconizam uma relao jurdico/processual isonmica e no h falar em defender-se o interesse pblico, pois o formalismo existente e exigido para os trmites processuais, assegurando a quem quer que seja o direito a ampla defesa e oportunizando-se a comprovao dos fatos alegados por meio de provas documentais, testemunhas e percias, por si s, j so garantidores do zelo ao bem pblico.RELEVNCIA

- embora j existam estudos e livros publicados acerca dos

aspectos relativos presena da Fazenda Pblica em juzo, entendemos necessria uma abordagem crtica no tocante ao desequilbrio verificado na relao processual, que nitidamente passa de uma relao de coordenao para uma de subordinao quando um dos litigantes ente pblico. Em determinadas situaes o fato normal e previsvel, por estar em causa o interesse pblico preponderante. No entanto, a condio de subordinao tambm subsiste de forma generalizada em todas as demandas que envolvam entes pblicos na relao processual, ainda que o interesse pblico no se configure, o que nos induz a crer que tudo no passa de resqucio de um regime totalitrio e autoritrio experimentado pela nao brasileira ao longo de mais de vinte anos.

7 No tocante relevncia da matria, imperioso ressaltar as inmeras distores existentes entre o que a lei normatiza e a praxe forense, mxime em relao ao ciente do representante da Fazenda Pblica aposto nas citaes e intimaes pessoais, conforme preconiza o artigo 35 da Lei Complementar n 75/93 que regula a matria. Neste particular entendemos de extrema importncia que a parte contrria, atravs de seus advogados, fique atenta quanto ao fiel cumprimento da norma, a fim de evitar que mais um privilgio seja criado sem que a lei o preveja, qual seja, o gerenciamento do prazo pelo procurador do ente pblico.QUESTIONAMENTOS SUSCITADOS:

os princpios basilares do direito que

norteiam a relao processual no devido processo legal, preconizam que os litigantes merecem tratamento isonmico nos tribunais, entendimento tambm abraado e defendido por grande parte da doutrina. Assim, os questionamentos suscitados so: nos processos em que a Fazenda Pblica figura no plo ativo ou passivo, a relao processual de coordenao ou de subordinao? Quais os privilgios concedidos Fazenda Pblica e to-somente a esta no processo de cognio? Quais os privilgios concedidos Fazenda Pblica no processo de execuo e na rescisria? So estas as perguntas que, ao longo do nosso trabalho, pretendemos esclarecer, abordando o que entendemos constituir privilgios concedidos aos entes pblicos que transmudam a relao processual para uma relao de subordinao, quando o correto e democrtico seria de coordenao.OBJETIVOS

- tomando como parmetro o conceito de que justia dar a

cada um o que seu na justa medida do seu direito, entendemos que deve ser dispensado tratamento isonmico s partes, quando em juzo, e que a relao processual entre as partes deva ser de coordenao e no de subordinao, como

8 soe acontecer. O que se verifica, no entanto, que, alm da iseno de despesas processuais e pagamento de custas somente ao final, a Fazenda Pblica goza do privilgio do prazo em qudruplo para responder aos termos da petio inicial, prazo em dobro para recorrer, alm do sacratssimo direito ao duplo grau de jurisdio, sob pena de no transitar em julgado a deciso de primeiro grau. Mas os privilgios no param no processo de cognio, pois aps o trnsito em julgado de deciso desfavorvel Fazenda Pblica e da resultar alguma condenao pecuniria, a execuo se processar por via indireta, ou seja, atravs do famigerado precatrio, salvo se a condenao for de pequeno valor. Assim, este trabalho tem como objetivo principal apontar as diversas situaes de tratamento diferenciado dispensado Fazenda Pblica em uma relao processual, alm de mostrar que os privilgios concedidos a esta comprometem o tratamento isonmico que deve prevalecer entre os litigantes, bem como demonstrar que no estado democrtico de direito esses benefcios no mais se justificam.

9 II. A FAZENDA PBLICA EM JUZO

1. GENERALIDADES E CONCEITOS

O inciso I do artigo 5 da Constituio Federal estabelece que todos so iguais perante a lei, o que nos induz a uma concluso ftica de que os litigantes devem merecer tratamento isonmico tambm nos tribunais. Assegurada a garantia constitucional pelo princpio da isonomia, tem-se como integralmente recepcionado pela nova Constituio a norma nsita no artigo 125, inciso I, do Cdigo de Processo Civil. H, no entanto, que se considerar que dar tratamento isonmico s partes, significa tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na justa medida de suas desigualdades, o que implicaria em elevar a parte mais fraca ao mesmo nvel do seu ex-adverso, oportunizando a ambos estar em juzo em p de igualdade, o que afasta qualquer argumento justificador da proteo dispensada Fazenda Pblica, sabidamente mais estruturada e mais organizada do que qualquer pessoa fsica, individualmente falando. Outro aspecto que merece constar das consideraes preliminares, diz respeito denominao do poder pblico quando em juzo. A pessoa jurdica de direito pblico interno aparece na relao processual com as mais variadas denominaes, a saber: Unio, Estado, Municpio, Fazenda Pblica (Federal, Estadual e Municipal). Merece, portanto, que sejam conceituados separadamente. Administrao Pblica: De Plcido e Silva1 nos apresenta duas opes de conceito para a administrao pblica, sendo um em sentido amplo e outro em sentido estrito. Quanto ao primeiro, assim leciona o dicionarista:1

SILVA, De Plcido e. Vocabulrio jurdico. Rio de Janeiro: Forense, 1990. 4v.

10Uma das manifestaes do poder pblico na gesto ou execuo de atos ou de negcios polticos. Assim se confunde com a prpria funo poltica do poder pblico, expressando um sentido de governo, cujo conceito, por vezes, se entrelaa com o da administrao, por tal forma que, dificilmente, se poder, de pronto, traar uma diferenciao exata, entre os rgos que estruturam o governo propriamente dito e as funes que indicam seu setor administrativo.

Em sentido estrito a administrao pblica se revela muito prxima da administrao privada, pois considerada como mero gestor de negcios pblicos, conforme leciona o mesmo autor:significa a simples direo ou gesto de negcios ou servios pblicos, realizados por todos os seus departamentos ou institutos especializados, com a finalidade de prover s necessidades de ordem geral ou coletiva. Cada um desses departamentos da administrao pblica, na esfera de atribuies que lhes forem assinaladas em lei, pois, representa a administrao pblica geral, sendo apenas uma de suas ramificaes e mostrando simplesmente uma das facetas por que a administrao pblica se executa.

Municpio: constitudo pela menor subdiviso das unidades da federao, resultante da diviso administrativa de um estado membro, em que seus habitantes gozam do direito de cidadania e se investem no direito de dirigi-lo, autonomamente, pelos representantes que escolhem. Formam a corporao administrativa municipal. , portanto, a menor clula da diviso geogrfica de um pas, notadamente porque os chamados distritos e vilas a eles se vinculam. Estado: em diversos pases esta unidade administrativa recebe denominao de provncia, condado, etc. No caso brasileiro denominado de Estado Membro ou Unidade da Federao (UF), constitudo por grande rea

11 territorial, abrangendo vrios municpios submetidos autoridade de um poder pblico autnomo, mas no soberano, vinculado ao poder pblico central ou federal. Unio: na terminologia do direito ptrio, o vocbulo Unio especialmente empregado para designar o Estado Brasileiro, ou Estado Federal (da aparecer a denominao de Unio Federal), sem distino s subunidades nacionais, integrantes da unidade federativa. Em fim, o governo central do pas. Fazenda Pblica:Com

o nome genrico de fazenda pblica, so

designadas as finanas pblicas federais, estaduais e municipais. o mesmo que se referir ao errio ou fisco e neste particular utiliza-se as expresses: Fazenda Nacional, Estadual ou Municipal, sendo que a primeira eqivale Unio. J a expresso Fisco ou Fazenda se aplica mais corriqueiramente no caso de o Estado figurar em juzo, ou fora dele, na condio de cobrador de impostos. Para qualquer outro objetivo o ideal que se utilize a expresso Unio2, Estado ou ainda Administrao Pblica. Vrios so os sentidos em que empregado o vocbulo Fazenda Pblica. Pode significar o errio como instituidor e arrecadador de impostos, o Estado em juzo litigando genericamente sobre aspectos patrimoniais, ou simplesmente a administrao direta e entidades autrquicas, porque seu errio que suporta os encargos patrimoniais da demanda. Em sntese, o termo Fazenda Pblica pode ser compreendido em trs acepes: I - como teoria do regime econmico do Estado; II - como instituio ou organismo administrativo que gere o dinheiro pblico; III - como o patrimnio que o dinheiro pblico constitui.

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SOIBELMAN, Leib. Enciclopdia do advogado. 5. ed. rev. e atual. de acordo com a Constituio em vigor pelos professores A. Fontes. M. Delmans, R. Reis Friede. Rio de janeiro: Thex ed. Biblioteca Universidade Estcio de S, 1994.

12 2. A FAZENDA PBLICA EM JUZO NA CONDIO DE DEMANDANTE

comum vermos o ente pblico em juzo na condio de demandado, ou seja, como ru. No entanto ele pode figurar em qualquer dos plos da relao processual, seja no plo ativo, na condio de autor ou assistente, seja no plo passivo como ru, opoente, reconvinte ou excipiente, ou ainda como terceiro interessado. Hodiernamente e como se pode verificar ao longo de nossa histria, os entes pblicos figuram, em esmagadora maioria das causas ajuizadas, como demandados, ou seja no plo passivo da relao processual. A justificativa para tanto , em boa medida, pela interferncia ou interveno do Estado na atividade econmica do pas, assumindo, de forma isolada, a liderana do ranking das relaes comerciais e empregatcias, seja como empreendedor, como patro ou como cessionrio e at como avalista de transaes comerciais tipicamente privadas. Somando-se a isso o Judicirio , para a grande maioria dos desvalidos do Estado, o ltimo fio de esperana para reaver pretensas perdas ou prejuzos imputados pelos sucessivos desmandos de governos em todos os nveis: municipal, estadual e federal. No demais lembrar que a Constituio de 1988 procurou proporcionar populao um acesso mais democrtico ao Judicirio e, em boa hora, restaurou um pouco da confiana que deveria ter os tribunais.

3. DO JUZO COMPETENTE

Embora no se trate especificamente de um privilgio, nunca demais lembrar que, no tocante s causas em que figuram a Unio, entidade autrquica ou

13 empresa pblica federal na condio de autoras, rs, assistentes ou opoentes, a competncia para apreci-las e julg-las privativa dos juzes federais, exceto em relao s matrias concernentes a falncia, acidentes do trabalho e as sujeitas justia eleitoral e justia do trabalho, conforme preconiza o inciso I do artigo 109 da Constituio Federal. Ressalte-se, porm, que a Constituio atribui Unio o nus de ajuizar a ao no domiclio da parte contrria, conforme norma nsita no pargrafo primeiro do mesmo artigo. Naturalmente que fica ressalvada a hiptese do ajuizamento de ao rescisria, cuja competncia do Tribunal Regional Federal da Regio a que est vinculado o juiz federal prolator da deciso rescindenda. Em relao aos entes pblicos estaduais e municipais, que no contam com foro privilegiado como ocorre com a Unio, a justia local ou justia comum a competente para dirimir os litgios e cada Estado elabora a lei de organizao da justia estadual, criando, quando necessrio, varas especializadas para melhor atender a demanda exigida pelos jurisdicionados.

4. ISENO DE DEPSITO PRVIO: DESPESAS AO FINAL DO PROCESSO

O artigo 19 do Cdigo de Processo Civil, em seu pargrafo segundo, atribui ao autor a obrigatoriedade de efetuar o pagamento de despesas realizadas com o exerccio de atos necessrios ao caminhar do processo, nos casos em que o juiz determinar, de ofcio ou a requerimento do Ministrio Pblico. No entanto, como se v do inciso VI do artigo acima referido, bem como do disposto no artigo 27 do mesmo diploma legal, a norma vigente libera a pessoa jurdica de direito pblico interno, da obrigatoriedade de efetuar o depsito inicial das despesas realizadas com os atos judiciais, exigncia legal comum a todos os litigantes que vo a juzo. A

14 contrrio sensu, a Fazenda Pblica goza do direito de pag-las somente ao final da peleja judicial, se vencida. Caso contrrio, tais despesas sero suportadas pela parte contrria sucumbente. Em comentrio ao artigo 19 da lei processual civil, Nelson Nery Jnior3 assim justifica o benefcio legal concedido ao ente pblico, in verbis:(...) A fazenda pblica est dispensada do pagamento do depsito prvio porque credora das custas judiciais, no havendo sentido em pagar para si mesma, j que haveria confuso (CC Art. 1049). O artigo no novo Cdigo Civil o de n 381, que tem a seguinte redao: Extingue-se a obrigao, desde que na mesma pessoa se confundam as qualidades de credor e devedor.

H, porm, duas hipteses em que os tribunais j firmaram jurisprudncia no sentido de que so exigveis da Fazenda Pblica o depsito antecipado: em relao s despesas com transporte de oficiais de justia e honorrios periciais. As duas hipteses encontram-se sumuladas pelo Superior Tribunal de Justia, conforme a seguir consignado:Smula 190: Na execuo fiscal, processada perante a justia estadual, cumpre Fazenda Pblica antecipar o numerrio destinado ao custeio das despesas com o transporte dos oficiais de justia. Smula 232: A Fazenda Pblica, quando parte no processo, fica sujeita exigncia do depsito prvio dos honorrios do perito.

5. DA REPRESENTAO JURDICA DA FAZENDA PBLICA

O Cdigo de Processo Civil, em seu artigo 36, normatiza que em juzo a parte ser representada por profissional da advocacia legalmente constitudo para

15 atuar no processo. E diz mais, do instrumento de mandato constaro os poderes que lhe foram outorgados, limitando-se o profissional ao exerccio destes. No tocante defesa dos entes pblicos em juzo, porm, a Constituio Federal prev, em seu artigo 132, quadro prprio para os procuradores dos entes pblicos, organizados em carreira privativa de bacharis em direito e com ingresso pela via do concurso pblico. No que respeita Unio, compete Advocacia-Geral da Unio represent-la judicial e extrajudicialmente, que tambm conta com quadro de carreira que foi definido pela Lei Complementar n 73 de 10 de fevereiro de 1993.

5.1. INEXIGIBILIDADE DO INSTRUMENTO DE MANDATO

O fato de contar com quadro prprio de seus representantes judiciais, por si s, no pode ser considerado um privilgio em favor da Fazenda Pblica, notadamente porque, pelo menos em tese, qualquer empresa privada ou pessoa fsica de poder aquisitivo elevado, poder contratar advogado particular, tantos quanto necessrio forem para defender os seus interesses. No entanto, a primeira diferena verificada reside na exigncia de instrumento de mandato para o advogado, mas no para o procurador, sendo que para este sequer se exige a comprovao da condio de representante judicial da Fazenda Pblica. Ressalte-se, por oportuno, que no particular a lei processual civil em vigor nada esclarece, conforme se constata da leitura do seu artigo 37, caput, que apenas normatiza a situao do advogado quando diz: sem o instrumento do mandato o advogado no ser admitido a procurar em juzo. Como se v, a

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NERY JNIOR, Nelson. Cdigo de processo civil. So Paulo: R. dos Tribunais, 1994. 2003p.

16 legislao processual em vigor no exige nem esclarece quanto a necessidade da outorga ou no de mandato para os procuradores da Fazenda Nacional. A Lei n 8.906/94, conhecida como Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, tambm no se preocupou com a questo, at porque diz respeito a advogados e no a procuradores. Na falta de legislao especfica, cabe aos tribunais cuidarem do tema e fixar jurisprudncia acerca de questes atinentes aos problemas advindos da falta de instrumento adequado para se postular em juzo em nome alheio. No vcuo da legislao, como afirmado acima, os tribunais firmaram entendimento majoritrio, inclusive o Supremo Tribunal Federal, no sentido da desnecessidade do instrumento procuratrio para os procuradores da Fazenda Nacional, ressalvadas, naturalmente, as causas que envolvam as autarquias que postulam em juzo, estas representadas por advogados e no por procuradores. O fato que no h previso legal dispensando expressamente os procuradores de juntarem o instrumento de mandato nos autos, mas to-somente uma construo jurisprudencial, calcada no argumento de que, ao representarem em juzo os entes pblicos, os procuradores no estariam cumprindo contrato, mas sim exercendo o mister do cargo no qual foram investidos. A jurisprudncia, no entanto, tem repetido textualmente a existncia de lei que regulamenta a matria, a exemplo da deciso a seguir transcrita, o que na realidade no se verifica:primeira deciso: Os advogados do Banco Central do Brasil e os dos procuradores autrquicos em geral, atuando em juzo pela autarquia respectiva, no cumprem mandato 'ad judicia - contrato que se prova pela procurao, mas exercem atribuio do seu cargo, para o que no dependem de outro ttulo que a investidura nele" (RE 6.470-0-BA, STJ, 21 T., reI. Min. Jos de Jesus Filho, DJU 25 out. 1993, p. 22468);

17segunda deciso: Embargos de declarao. Recurso Extraordinrio. Representao judicial do Estado e de suas autarquias. Relator: Ministro Paulo Brossard. A representao judicial do Estado, por seus procuradores, decorre de lei. Por esta razo, dispensa-se a juntada de instrumento de mandato em autos de processo judicial. A representao judicial das autarquias, por seus advogados, decorre de mandato outorgado por seu diretor, que detm esta representao, sendo obrigatria a juntada de seu instrumento em autos de processo judicial, sob pena de serem considerados inexistentes os atos praticados (art. 37, pargrafo nico, do CPC; art. 70, 1 e 2, do Estatuto da OAB - Lei n. 4.215/63). O art. 50 da Lei n. 4.595/94 no dispensa os advogados do Banco Central do Brasil, do Banco do Brasil S/A, e das demais instituies bancrias ali mencionadas, do dever de juntar o instrumento de mandato em autos de processo judicial. Emb. de dec. conhecidos, mas rejeitados, unanimidade (STF, RTJ, 139:641).

Em momentos de indeciso ou por cobrana da parte contrria, juzes de primeira instncia tendem a cobrar a apresentao de algum documento, por parte do representante do ente pblico, que comprove a sua alegada condio de procurador. Pelo menos um caso j foi documentado, ocorrido na Vara do Trabalho de Patrocnio-MG4, onde h registro de que o magistrado exigiu do procurador da Unio apresentao de cpia da carteira funcional como prova da condio de legtimo representante do ente pblico que patrocinava no processo de n 085/91, sob pena de no mais poder falar naqueles autos. So essas as confuses causadas pelas lacunas da lei que somente os tribunais, atravs de reiteradas decises, poder pacific-las.

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SOUTO, Joo Carlos. A Unio federal em juzo. So Paulo: Saraiva, 1998. 232p.

18 6. AO RESCISRIA

A ao rescisria foi imaginada e concebida para hipteses e situaes excepcionalssimas com o objetivo nico de oportunizar parte sucumbente, depois de transitada em julgado a deciso judicial, buscar em juzo a desconstituio da sentena de mrito. Para tanto, e por ser excepcionalssima, ofereceu uma margem estreita ao jurisdicionado para fundamentar o seu pedido com base no cabimento da ao, cujos requisitos esto capitulados no artigo 485 do Cdigo de Processo Civil, in verbis:Art. 485. A sentena de mrito, transitada em julgado pode ser rescindida quando: I se verificar que foi dada por prevaricao, concusso ou corrupo do juiz; II proferida por juiz impedido ou absolutamente incompetente; III resultar de dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida, ou de coluso entre as partes, a fim de fraudar a lei; IV ofender a coisa julgada; V violar literal disposio de lei; VI se fundar em prova, cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou seja provada na prpria ao rescisria; VII depois da sentena, o autor obtiver documento novo, cuja existncia ignorava, ou de que no pde fazer uso, capaz, por si s, de lhe assegurar pronunciamento favorvel; VIII houver fundamento para invalidar a confisso, desistncia ou transao, em que se baseou a sentena; IX fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa.5

Em que pese a excepcionalidade da ao rescisria, tambm aqui se concede Fazenda Pblica os mesmos privilgios assegurados no processo principal, mesmo sabendo que a matria nela versada j foi objeto de decises que, na mais das vezes, percorreu vrias instncias em grau recursal, recebendo, por fim,

19 o trnsito em julgado. Portanto, j existe ttulo judicial que autoriza parte vencedora buscar a satisfao deste pela execuo, restando ao sucumbente cumprir as obrigaes fixados pela sentena. O artigo 488 do Cdigo de Processo Civil, em seu inciso II, exige que ao propor a rescisria o autor dever depositar a importncia equivalente ao percentual de 5% (cinco por cento) calculado sobre o valor da causa, cuja natureza jurdica se transmuda de depsito prvio para multa, na hiptese de

inadmissibilidade ou de improcedncia da ao, assim declarada por unanimidade de votos. Neste ponto constatamos um privilgio concedido Fazenda Pblica, na medida em que o pargrafo nico do mesmo artigo diz ser inaplicvel esta regra quando a rescisria for proposta pela Unio, Estados, Municpios e Ministrio Pblico. Esta iseno constitui verdadeiro salvo conduto para que estes entes pblicos ignorem a tica e proponham aes rescisrias com o intuito nico de delongar a j demorada e burocrtica execuo do ttulo judicial conferido parte contrria.

6.1. PRAZO PARA AJUIZAMENTO DA AO RESCISRIA

Tambm aqui o poder pblico tentou, de forma arbitrria, atribuir privilgios Fazenda Pblica. Conforme disciplina o Cdigo de Processo Civil, em seu artigo 495, o prazo para ajuizamento da ao rescisria de dois anos, a contar do trnsito em julgado da deciso de mrito proferida no processo principal e foi neste ponto nevrlgico, o prazo de dois anos, que o poder pblico e no o interesse pblico como propagam alguns, interferiu na relao processual de forma unilateral e5

BRASIL. Cdigo de processo civil. Obra coletiva que contou com a colaborao de Antnio Luiz de

20 arbitrria, utilizando-se da famigerada Medida Provisria para elastecer o prazo em favor da Unio, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios, bem como para as autarquias e fundaes institudas pelo poder pblico. de domnio pblico que o Poder Executivo federal tem se utilizado do instituto da Medida Provisria para legislar em causa prpria, e na mais das vezes, em reas que no de sua competncia, mas sim exclusivamente do Congresso Nacional. Essa triste realidade chegou a tal ponto que levou o Parlamento brasileiro a propor e aprovar Emenda Constitucional ao artigo 62, limitando o poder legiferante do Executivo. Enquanto livre para legislar em matria processual, pela via da Medida Provisria, o Poder Executivo, ardilosamente, interferiu no prazo decadencial da ao rescisria, elastecendo o prazo de dois para quatro anos, em um primeiro momento. Como as informaes no chegam ao grande pblico e quando chegam lhe so transmitidas de forma incompreensvel para os leigos, no houve maiores repercusses ou reaes, salvo da Ordem dos Advogados do Brasil e de alguns poucos docentes. Assim, o poder pblico entendeu estar livre para manipular o prazo decadencial da rescisria a seu bel prazer, e o fez legislando em causa prpria, na medida em que os destinatrios e beneficirios dessas intromisses indevidas eram os entes pblicos. A consagrao da intromisso indevida do

Executivo na legislao processual civil veio atravs da Medida Provisria n 1.63211, de 9 de abril de 1998 que, em seu artigo 4 ampliou de 4 para 5 anos o prazo para que os entes pblicos pudessem propor a rescisria, conforme redao a seguir:

Toledo Pinto; Mrcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lvia Cspedes. 32. ed. So Paulo: Saraiva, 2002.

21Art. 4o O direito de propor ao rescisria por parte da Unio, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municpios, bem como das autarquias e das fundaes institudas pelo Poder Pblico extingue-se em cinco anos, contados do trnsito em julgado da deciso. Pargrafo nico. Alm das hipteses referidas no art. 485 do Cdigo de Processo Civil, ser cabvel ao rescisria quando a indenizao fixada em ao de desapropriao, em ao ordinria de indenizao por apossamento administrativo ou desapropriao indireta, e tambm em ao que vise a indenizao por restries decorrentes de atos do Poder Pblico, em especial aqueles destinados proteo ambiental, for flagrantemente superior ao preo de mercado do bem objeto da ao judicial.

A reao, embora tmida como afirmado anteriormente, foi suficiente para provocar o Supremo Tribunal Federal a manifestar-se quanto a

inconstitucionalidade do ato arbitrrio, ajuizando-se a competente Ao Direta de Inconstitucionalidade, autuada sob o nmero ADIn-1.910-1. Para tranqilidade do jurisdicionado, aquela Corte Constitucional deferiu medida cautelar para restabelecer a redao original dos artigos modificados pela famigerada Medida Provisria, conforme a seguir transcrita:Deciso: O Tribunal, por unanimidade, deferiu o pedido de medida cautelar, para suspender, at a deciso final da ao direta, a eficcia do art. 188 do Cdigo de Processo Civil, na redao dada pelo art. 5 da Medida Provisria n. 1.703-18, de 27/10/1998, em sua reedio no art. 1. da Medida Provisria n. 1.798-3, de 08/4/1999, e, por maioria, vencidos os Srs. Ministros Nelson Jobim, Mauricio Correa, Octavio Gallotti e Moreira Alves, tambm deferiu a medida cautelar de suspenso da eficcia do inciso X, acrescentado ao art. 485 do Cdigo de Processo Civil, pelo art. 5. da MP n. 1.703-18/1998, reeditada na MP n. 1.798-3/1999, em seu art. 1. Votou o Presidente. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Celso de Mello

22(Presidente) e Sydney Sanches. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Carlos Velloso (Vice-Presidente). Plenrio, 22.4.99. Art. 6o A Lei no 8.437, de 30 de junho de 1992, passa a vigorar acrescida do seguinte artigo, renumerando-se os atuais 5o e 6o para 6o e 7o: "Art. 5o Nas aes rescisrias propostas pela Unio, Estados, Distrito Federal e Municpios, bem como pelas autarquias e fundaes institudas pelo Poder Pblico, caracterizada a plausibilidade jurdica da pretenso, poder o tribunal, a qualquer tempo, conceder medida cautelar para suspender os efeitos da sentena rescindenda." Deciso publicada no D.J. e no D.O.U de 29/06/2001.

A tranqilidade do jurisdicionado s no maior porque a deciso final ainda no foi proclamada, isto porque, em 21 de junho de 2001, o Pleno do Supremo Tribunal Federal to-somente acolheu questo de ordem suscitada no sentido de se suspender a proclamao do julgamento at ulterior deliberao do Congresso Nacional. Naquela oportunidade o Tribunal tambm recusou a prejudicialidade

invocada pela Unio Federal, aguardando, ento, que o Congresso Nacional delibere sobre a converso em lei ou no da Medida Provisria em apreo. Ainda no tocante propositura da ao rescisria, pela Fazenda Pblica, o desmedido desejo legiferante do poder pblico deixou resqucios danosos para a igualdade das partes na relao processual, concernente previso da possibilidade de se conceder medida liminar para suspender os efeitos da sentena rescindenda e, em conseqncia, obstar o prosseguimento da j demorada execuo. Esta previso, at a edio de 27 de novembro de 1998 da Medida Provisria n 1.703, na sua verso de nmero 19, constou do artigo stimo, com a seguinte redao:Art. 7o A Lei no 8.437, de 30 de junho de 1992, passa a vigorar acrescida do seguinte artigo: Art. 4o-A. Nas aes rescisrias propostas pela Unio,

23Estados, Distrito Federal e Municpios, bem como pelas autarquias e fundaes institudas pelo Poder Pblico, caracterizada a plausibilidade jurdica da pretenso, poder o tribunal, a qualquer tempo, conceder medida cautelar para suspender os efeitos da sentena rescindenda.

Assim, pela norma acima transcrita, ao receber uma ao rescisria proposta pelo ente pblico, o magistrado est autorizado a conceder liminar obstando o prosseguimento da execuo. Na verdade trata-se de verdadeira antecipao de tutela, na medida em que, contra a certeza contida no ttulo transitado em julgado, se concede uma simples liminar com fora suficiente para obstar a execuo do ttulo. A interferncia do Poder Executivo na relao processual constitui, assim, um dos piores e mais graves desacertos e desrespeito ao princpio do devido processo legal, o que inconcebvel em um regime democrtico. Os defensores dos privilgios concedidos aos entes pblicos no entanto, uma vez mais saem em defesa da tese, ao argumento de que na relao processual em que figura a Fazenda Pblica no se deve cogitar do princpio da igualdade entre os litigantes, tendo em vista que o que est em causa o interesse pblico, levantando a suspeita de que em todos os processos em que restou sucumbente o ente pblico, para tal desiderato contriburam os juzes, serventurios da justia e o seu prprio corpo de procuradores. Resta-nos a dvida se estes profissionais merecem a pecha de desidiosos ou corruptos, conforme se infere da citao do articulista Joo Carlos Souto6, a seguir transcrita:Desse modo, a ampliao do prazo para o ajuizamento da ao rescisria no causa, mas efeito dos desmandos cometidos por alguns funcionrios graduados em acordos judiciais esprios em que se envolveram servidores dos Poderes Executivo e Judicirio, superestimando valores de

24indenizaes contra o INSS e contra o INCRA, entre outros rgos. O legislador, respeitando o ato jurdico perfeito e a coisa julgada, busca, com isso, viabilizar meios legais para que os rgos pblicos possam reaver algumas centenas de milhes de reais que se encontram em mos de uma minoria, muito embora pertenam a toda a sociedade. Por fora dessas consideraes (e numa sntese por demais apertada) que os impropriamente denominados "privilgios processuais da Fazenda Pblica" (melhor seria assinalar precaues processuais em defesa do patrimnio pblico) so plenamente justificveis.

6.2. A FAZENDA PBLICA NO PLO PASSIVO DA AO RESCISRIA

A ao rescisria, como afirmado anteriormente, tem por objetivo a desconstituio de deciso de mrito j transitada em julgado. Portanto, j existe um ttulo judicial. Como se sabe, no processo de cognio ou de conhecimento, parte-se das alegaes, fatos e provas para s ento se chegar a uma deciso justa ou que mais se aproxime da verdade levada a juzo, com a prolao da sentena de mrito. Na ao rescisria, assim como no processo de execuo, o ttulo judicial j existe, portanto, no permite que toda a matria tratada na deciso rescindenda seja rediscutida, mas to-somente o quanto baste para se saber se a deciso rescindenda contm ou no vcios, tais como definidos no artigo 485 do Cdigo de Processo Civil. A razo destes argumentos iniciais justifica-se pelo fato de que, tambm aqui na ao rescisria, nossos tribunais consagraram entendimento de que so aplicveis Fazenda Pblica os privilgios constantes do artigo 188 do Cdigo de Processo Civil que diz respeito ao processo de conhecimento.6

SOUTO, Joo Carlos. op. cit. P. 122.

25 O que se verifica, no entanto, que no captulo especfico da ao rescisria constante do Cdigo de Processo Civil, no h qualquer previso ou remisso aos artigos respeitantes ao prazo em qudruplo para a Fazenda Pblica contestar a ao, conforme se infere da redao atual do artigo 491, verbis:Art. 491. O relator mandar citar o ru, assinando-lhe prazo nunca inferior a 15 (quinze) dias nem superior a 30 (trinta) para responder aos termos da ao. Findo o prazo com ou sem resposta, observar-se- no que couber o disposto no Livro I, Ttulo VIII, Captulos IV e V.

Do texto acima transcrito no h como se fazer ilao pertinente aos prazos privilegiados para a Fazenda Pblica, a teor do artigo 188 do Cdigo de Processo Civil, pois em nenhum momento o legislador sinalizou que so aplicveis, aos entes pblicos, os mesmos privilgios previstos no processo de cognio. Os Captulos IV e V do Ttulo VIII a que se refere o artigo em comento, diz respeito tosomente ao procedimento ordinrio e nem de longe menciona os privilgios capitulados no artigo 188 j referido. Assim, o juiz ou tribunal o faz por sua prpria conta e risco, mas que esteja certo de que est se promovendo acentuado desequilbrio na relao processual sem que a lei o preveja, tanto mais porque de inteira responsabilidade do judicirio garantir o tratamento isonmico s partes. O fato tambm parece claro para o poder pblico. Tanto verdade que, diante de controvrsias j existentes envolvendo a matria, o Poder Executivo federal, quando da edio da Medida Provisria n 1.703, teve o cuidado de ali consignar essa previso em seu artigo quinto, in verbis:Art. 5o Os arts. 188 e 485 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Cdigo de Processo Civil), passam a vigorar com as seguintes alteraes: Art. 188. O Ministrio Pblico, a Unio, os Estados, o Distrito Federal, os Municpios, bem como suas autarquias e fundaes, gozaro do prazo: I -

26em dobro para recorrer e ajuizar ao rescisria; e II - em qudruplo para contestar.

Note-se que o poder pblico no s estendeu para a ao rescisria os privilgios constantes da redao original do artigo 188 do Cdigo de Processo Civil, mas acolheu o ensejo para tambm ampliar o rol de beneficirios dos privilgios ali consignados que passou a ser: Ministrio Pblico, Unio, Estados, Distrito Federal, Municpios, bem como suas autarquias e fundaes mantidas pelo poder pblico. Mesmo aps o retorno ao status quo, ou seja, depois de restabelecida a redao original do artigo 188 em comento, os tribunais continuam a aplicar ao rescisria os privilgios ali previstos para o processo de conhecimento. No h, em nosso entendimento, qualquer argumento capaz de justificar a concesso do prazo em qudruplo para a Fazenda Pblica contestar a ao rescisria. No se sustenta a verso de desconhecimento ou surpresa concernente aos fatos, documentos e provas que instruem a petio inicial da rescisria, pois o autor, na rescisria, no poder tratar de matria distinta daquela versada nos autos do processo principal e mais especificamente na deciso rescindenda, a qual de inteiro conhecimento dos procuradores da Fazenda Pblica. Os argumentos dos defensores do privilgio do prazo em qudruplo para a Fazenda Pblica contestar a rescisria, tm se pautado na desorganizao do quadro de procuradores, bem como na distncia que separa a sede das procuradorias e o frum, pois, a teor do 2 do artigo 109 da Constituio Federal:As causas intentadas contra a Unio podero ser aforadas na seo judiciria em for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem demanda ou onde esteja situada a coisa, ou ainda, no Distrito Federal.

27 Esses argumentos parecem pouco convincentes, na medida em que a Lei Complementar n 73 de 10 de fevereiro de 1993, em seus artigos 2 e 3, tratou de organizar o quadro de procuradores da Unio criando as procuradorias regionais, o que j soluciona a dificuldade relativa distncia. Quanto a dificuldade de obteno de documentos e informaes, conforme justifica Joo Carlos Souto7, tambm se mostra argumento insuficiente no tocante ao rescisria, pois o autor no poder inovar em sua petio inicial, mas to-somente alegar que a deciso rescindenda foi dada por prevaricao, concusso ou corrupo do magistrado; proferida por juiz impedido ou absolutamente incompetente; resultar: de dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida, de coluso entre as partes a fim de fraudar a lei, em ofensa coisa julgada, em violao literal a disposio de lei; se fundar em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou seja provada na prpria ao rescisria; quando houver fundamento para invalidar a confisso, desistncia ou transao em que se baseou a sentena; sentena fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa; ou, depois de prolatada a sentena, o autor obtiver documento novo cuja existncia ignorava, ou de que no pde fazer uso, capaz, por si s, de lhe assegurar pronunciamento favorvel. Salvo em relao ao documento novo, nenhuma surpresa ou novidade em relao ao processo principal dever constar da rescisria, a ponto de justificar prazo to elstico para a Fazenda Pblica contest-la. Mesmo na hiptese de

documento novo a jurisprudncia pacfica no sentido de que o denominado documento novo , na verdade, cronologicamente velho, pois j deveria existir desde a poca da propositura da ao principal, mas que o autor, por algum motivo, dele

6 Ibidem. p. 127.

28 no pode fazer uso. No entanto, no encontrando base jurdica plausvel que justifique a manuteno desse privilgio, o articulista reconhece que o problema est na burocracia que campeia nas reparties pblicas. Quanto a essa confisso explcita registra:A razo de ser do prazo diferenciado concedido Fazenda Pblica reside na macroestrutura da Administrao Pblica e no emaranhado de rgos existentes, o que torna lenta a coleta de informaes e documentos indispensveis sua defesa, mormente em se tratando de questes atinentes Unio Federal. Esse procedimento de colher informaes e documentos necessrios defesa demanda tempo, que se consome em despachos e decises to comuns burocracia estatal da maioria das naes e especialmente no Brasil. s vezes, as informaes e documentos encaminhados no so suficientemente esclarecedores, o que importa em nova solicitao. Transpondo-se essa realidade para as milhares de aes ajuizadas mensalmente contra a Unio Federal, tem-se o panorama da situao que autoriza, dessarte, a manuteno do benefcio8.

7. A FAZENDA PBLICA NA CONDIO DE DEMANDADA

At ento vimos privilgios concedidos aos entes pblicos enquanto autores da ao. Doravante passaremos a analisar a Fazenda Pblica figurando no plo passivo da relao processual, destacando os pontos que entendemos constituir privilgio em relao ao litigante privado. Nesta seara denota-se que no s quanto aos prazos das citaes ou das audincias que a pessoa jurdica de

8

6 Ibidem. p. 127.

29 direito pblico goza de privilgios, mas tambm quanto aos procedimentos para que se efetivem as citaes ou intimaes. A regra de citao e intimao feita de forma diferenciada para os entes pblicos encontra embasamento jurdico na Lei Complementar de

Organizao da Advocacia-Geral da Unio, de n 73/93 que, estabelecendo regra exclusiva para as causas em que figuram a Unio, diz textualmente que a contagem do prazo fluir somente a partir da cincia pessoal, na pessoa do Advogado Geral da Unio ou do Procurador Regional. A norma em comento encerra duas importantes regras processuais em favor do ente pblico, a saber: I - a contagem do prazo em dobro para recorrer; II - a contagem do prazo s fluir a partir da aposio do ciente do Advogado Geral da Unio, ou de Procurador da Geral da Unio, enquanto que para o particular o prazo no em dobro e a intimao se d pela simples publicao.

7.1. PRAZO EM QUDRUPLO PARA CONTESTAR A AO

O artigo 188 do Cdigo de Processo Civil fixa a regra de que a Fazenda Pblica, ao contrrio do litigante comum, dispe do prazo em qudruplo para contestar a ao, bem como determina a contagem em dobro do prazo para apresentar recurso da deciso proferida em qualquer grau de jurisdio. Pela regra do artigo supracitado, parte significativa da doutrina entende ser aplicvel a todas as modalidades de resposta da Fazenda Pblica quando na condio de r, extensivo, tambm impugnao dos embargos do devedor que tem regra prpria. Em sentido contrrio, outra parte no menos significativa afirma ser aplicvel apenas quanto ao que a lei se refere taxativamente. Na praxe forense,

30 como nem todos que lidam com os processos tem domnio dessas mincias procedimentais, a aplicabilidade do preconizado pela primeira corrente doutrinria vira regra. No que pertine s audincias de instruo e julgamento nas aes de procedimento sumrio, enquanto para o litigante comum o prazo de dez dias, para os entes pblicos o prazo de vinte dias, ou seja, em dobro. Assim, quando a Fazenda Pblica figurar no plo passivo do processo, a parte autora ter de aguardar o decurso do prazo contado em qudruplo para saber se esta apresentou ou no a sua defesa, sabendo que as conseqncias de eventual silncio da demandada no resultar qualquer benefcio para o autor, em virtude de outro privilgio, pois ao ente pblico no se aplica os efeitos da revelia. O artigo 297 do Cdigo de Processo Civil estabelece o prazo de 15 dias para que o ru conteste a ao proposta pelo autor. Na hiptese de figurar no plo passivo a Fazenda Pblica, este prazo se eleva para 60 dias, o que constitui uma disparidade inexplicvel.

7.2. CITAO, NOTIFICAO E INTIMAO DA FAZENDA PBLICA

Dentre tantos privilgios concedidos Fazenda Pblica em juzo, seguramente a questo relativa publicidade dos atos judiciais o que mais contribui para diferenci-la dos litigantes privados, bem assim o que mais causa espcie aos jurisdicionados. Sabidamente as procuradorias tm fcil acesso ao Dirio da Justia, da Unio ou dos Estados, veculo prprio de divulgao dos atos e decises judiciais. No entanto, a citao, a intimao e a notificao da Fazenda Pblica, especialmente da Unio, no se do pela simples publicao como soe acontecer com todos os particulares, ao contrrio, exige-se que os atos judiciais que

31 requeiram a cincia dos entes pblicos, sejam levados a seu conhecimento de forma personalizada, na pessoa do seu representante legal, ou seja, na pessoa do Advogado-Geral da Unio, Procurador-Geral da Unio e Procurador da Fazenda Nacional, conforme preconiza o artigo 35 da Lei Complementar n 73/93. Esta regra, que desagrada quase totalidade dos jurisdicionados, tambm foi estendida ao Ministrio Pblico.

7.2.1. DA CITAO, NOTIFICAO E INTIMAO PESSOAL DO PROCURADOR

Por que a citao e intimao pessoal constituem uma das maiores distines entre o ente pblico e o litigante privado, na relao processual? Porque de certa forma a procuradoria citada, notificada ou intimada passa a estabelecer, de forma unilateral e sem qualquer base legal, o dia de incio e, por conseguinte, o dia do termo final do prazo para a prtica do ato ou interposio de recurso para o qual foi intimada. Em suma, ela passa a gerenciar os prazos abertos a seu favor. Hodiernamente essa praxe bastante comum nos tribunais,

naturalmente contando com o desconhecimento, omisso ou conivncia dos magistrados que a tudo assistem sem esboar qualquer reao no sentido de evitar essa prtica odiosa. Quanto ao particular, pessoa fsica ou jurdica que litiga contra o ente pblico, este, o particular, que nada poder fazer em relao a essa prtica condenvel, em face do temor que o aplaca, tamanha a sua pequenez na relao processual perante a Fazenda Pblica. As citaes, notificaes e intimaes dos entes pblicos so realizadas por meio de ofcio endereado ao procurador-chefe do rgo de

32 representao respectivo que, nunca ou quase nunca ape o seu ciente de imediato. Assim, entrega-se a correspondncia na sede da procuradoria e aguarda-se pacientemente a devoluo da cpia com o ciente do procurador, o que pode demorar mais de uma semana, para s ento se iniciar a contagem do prazo fixado. Tudo isso em obedincia ao preceito legal constante da Lei Complementar acima referida, que determina que a contagem do prazo inicia-se a partir do ciente do procurador. Mesmo sendo realizada a intimao de forma personalizada e no somente pela publicao no dirio de divulgao do expediente do tribunal, ainda assim as procuradorias tm usado de expediente reprovvel, qual seja: ps datando o seu ciente para at uma semana depois. No Tribunal Superior do Trabalho essa praxe odiosa tem se verificado com certa freqncia. Certa feita presenciamos a reao indignada de uma parte que, ao deparar com o ciente ps-datado do procurador, para uns trs dias depois, esbravejou e verbalizou toda sua revolta e indignao mas, desalentada e sem qualquer poder de reao que pudesse resultar em efeitos prticos, ante aquela violao legal, conformou-se e aguardou o decurso do prazo gerenciado pelo procurador. Ciente desses desacertos na prtica da intimao pessoal, resta-nos a esperana de que nossos legisladores providenciaro o quanto antes a remoo desses privilgios que tanto mal causa aos jurisdicionados. A igualdade das partes na relao processual uma necessidade imperiosa em qualquer pas que adote o regime democrtico e onde vigore o princpio do devido processo legal. So comuns as queixas das partes atingidas pelas conseqncias de tantos privilgios concedidos aos entes pblicos. O Judicirio tambm sai chamuscado com as crticas, na medida em que recebe a pecha de pachorrento em

33 virtude da longa espera a que submetido o jurisdicionado para ver a soluo final de sua demanda contra a Fazenda Pblica. So tantos os descontentes pelo gerenciamento do prazo que as vtimas desse procedimento reprovvel j provocaram e apelarem ao Judicirio, pela via recursal, para que os tribunais disciplinem melhor a questo da intimao pessoal dos procuradores e membros do Ministrio Pblico, conforme se infere da deciso do Supremo Tribunal Federal, divulgada no Informativo STF9 e a seguir transcrita:Ministrio Pblico: Termo Inicial do Prazo Recursal. Concludo o julgamento de habeas corpus em que se discutia se o termo inicial do prazo para que o Ministrio Pblico interponha recurso conta-se da remessa dos autos secretaria do citado rgo, com vista, ou se do lanamento do ciente pelo parquet v. Informativo 327. O Tribunal, por maioria, acompanhou o voto proferido pelo Min. Marco Aurlio, relator, no sentido do deferimento do writ, para declarar a intempestividade do recurso especial interposto pelo Ministrio Pblico estadual, por entender que. Em face do tratamento isonmico que deve ser conferido s partes para se evitar privilgios, o prazo para interposio de recurso pelo Ministrio Pblico inicia-se com a sua intimao pessoal, a partir da entrega dos autos com vista secretaria do rgo. Salientou-se, na espcie, que a adoo de entendimento diverso implicaria o gerenciamento, pelo Ministrio Pblico, do termo inicial do prazo recursal, a partir da aposio do ciente. Vencidos os Ministros Joaquim Barbosa, por entender necessria na espcie a intimao pessoal e Celso de Mello, por considerar que, no caso concreto, no se poderia presumir a cincia prvia e inequvoca do representante do Ministrio Pblico apenas pela entrada dos autos na repartio, inclusive porque o processe sequer havia sido entregue no gabinete do promotor responsvel pelo caso. HC deferido para consignar a intempestividade do recurso

34especial interposto, ficando, em conseqncia, restabelecido o acrdo impugnado. HC83255/SP, relator Min. Marco Aurlio, 5.11.2003. Deciso constante da Ata nmero 33, publicada no Dirio da Justia de 14/11/2003 (grifamos).

Reportando-nos, uma vez mais aos inmeros problemas decorrentes da intimao pessoal dos procuradores e membros do Ministrio Pblico, passemos a listar a seqncia de atos que a envolve, para termos uma idia precisa de quo burocrtica, arcaica e dispendiosa ela : I - a intimao da Fazenda Pblica realizada somente aps a publicao da deciso ou despacho, ou seja, alm de publicar necessrio a expedio de ofcio de intimao, o que contribui para retardar ainda mais a soluo final do processo; II - aps a publicao, elabora-se ofcio de intimao, individualizando cada processo; III - o envio da correspondncia normalmente pela via postal ou por servidor do tribunal; IV - h uma demora inexplicvel na aposio do ciente do procurador e, por conseguinte, na devoluo da intimao secretaria do juzo ou tribunal; V - o gerenciamento do prazo pela prpria parte, como afirmado na deciso acima transcrita, fato inconteste, o que torna essa prerrogativa mais odiosa, por ensejar enorme desequilbrio na relao processual em que a Fazenda Pblica figure como parte. H de se perguntar se os procuradores do quadro da Procuradoria Geral da Repblica, Procuradoria da Fazenda Nacional e demais procuradores no teriam fcil acesso ao Dirio da Justia da Unio ou do Estado respectivo, tal como9

Informativo STF n 328 de 3 a 7 de novembro, pg. 1. Braslia: STF, 2003

35 ocorre com os advogados contratados pelas partes. Tambm h de se indagar se eles merecem a pecha de desorganizados e incapazes de acompanhar e controlar o incio e termo final dos prazos judiciais, a partir da publicao no rgo oficial de divulgao, como ocorre com os advogados de autarquias e empresas pblicas, bem como com os advogados de entes privados. Hodiernamente, quando a informao on line acontece em velocidade espantosa, causa-nos espcie que ainda se admita semelhante privilgio e que estes privilgios sejam defendidos por uns poucos, em detrimento da grande maioria, trazendo enorme prejuzo ao jurisdicionado comum. A defesa desses privilgios, como soe acontecer, est amparada simplesmente no jargo jurdico que a tudo justifica: o interesse pblico. Na verdade, como j foi dito anteriormente, o grande pblico mantm-se margem dos pretensos benefcios resultantes desses privilgios concedidos em seu nome.

8. REVELIA

Conceito: o instituto da revelia resulta da ausncia no justificada do demandado audincia previamente agendada, depois de regularmente citado. Traz como conseqncia o prosseguimento do processo contra o ru,

independentemente de nova intimao ou notificao para a contagem do incio dos prazos, ou para a prtica de atos no processo. H, na doutrina, divergncia de entendimento quanto ao significado comum entre revelia e contumcia, isto , se so ou no palavras sinnimas. Para melhor entendimento da matria, convm consignar que a contumcia se caracteriza pela deciso obstinada da parte em no praticar qualquer ato processual. a

36 deliberada desobedincia s intimaes judiciais, seja para comparecer em juzo, seja para praticar determinado ato em relao ao processo. A revelia, por sua vez, como acima conceituada, consiste na desobedincia da parte ao mandado expedido pelo juiz para vir defender-se, em dia e hora prefixados. Em qualquer dos casos, porm, o demandado poder ingressar no processo quando lhe convier, recebendoo no estgio em que se encontra, sem poder se reportar a atos pretritos praticados nos autos. O instituto da revelia j era previsto nas Ordenaes Afonsinas, de 1446, com um diferenciador: o no-comparecimento do ru ou de seu procurador acarretava sua condenao, devendo o autor provar suas alegaes. J nas Ordenaes Manoelinas, de 1514, a ausncia do ru no obstava o prosseguimento do processo, sendo vedado ao autor imitir-se na posse de seus bens, tanto nas aes pessoais quanto nas de direito real. A evoluo do instituto no para por a. Ele aparece no Regulamento nmero 737, de 23 de novembro de 1850, j no mais atribuindo ganho de causa ao autor, mas, como nos dias atuais, o no-comparecimento do ru primeira audincia importava no prosseguimento do processo, permitido seu ingresso posteriormente, mas o recebendo no estgio em que se encontrava. A revelia no processo do trabalho difere, quanto ao momento de incidncia, do mesmo instituto no Cdigo de Processo Civil. No processo civil revel quem no contestar a ao no prazo legal, enquanto que no processo do trabalho revel o reclamado que no comparecer audincia para a qual foi regularmente notificado ou, quando se fizer representar por preposto que no tenha a carta respectiva. Assim, deduz-se que no processo do trabalho o no comparecimento do reclamado audincia quer significar a sua renuncia ao direito de se defender, pois

37 este o momento processual em que se deve contestar ponto a ponto o pedido do demandante. Ainda que o advogado legalmente constitudo comparea audincia com a pea de defesa, configura-se a revelia pela ausncia do reclamado audincia. Nesse sentido, o Tribunal Superior do Trabalho se posicionou sobre a matria atravs da Orientao Jurisprudencial n 74, da SDI-1, que assevera:Revelia. Ausncia da Reclamada. Comparecimento de advogado. A Reclamada ausente audincia em que deveria apresentar defesa revel ainda que presente seu advogado munido de procurao.

No Cdigo de Processo Civil a revelia est prevista no artigo 319, que disciplina: Se o ru no contestar a ao, reputar-se-o verdadeiros os fatos afirmados peloautor.

O demandado citado para responder aos termos da ao proposta pelo autor. Por se tratar de uma faculdade, diante dos fatos articulados na inicial o ru poder: I - aquiescer com o pedido do autor; II - contestar ponto por ponto; III reconvir; IV - apresentar, em petio separada, exceo de incompetncia relativa ou suspeio do juiz, ou ainda, exceo de impedimento na prpria contestao; V simplesmente permanecer inerte e no tomar qualquer atitude no prazo que lhe foi assinado (de 15 a 60 dias), passando condio de revel. Os efeitos da revelia, conforme se pode observar do disposto no artigo acima, so: I - reputar-se-o verdadeiros os fatos afirmados pelo autor; II prosseguimento do processo independentemente da intimao do demandado em relao aos atos processuais posteriores, conforme preceitua o artigo 322, primeira parte, do Cdigo de Processo Civil. No tocante natureza jurdica do instituto da revelia h, na doutrina, quem entenda ser uma presuno legal absoluta, isto , juris et de jure, por outro

38 lado h quem defenda que se trata de presuno juris tantum. Embora se possa extrair da leitura do artigo 319, acima transcrito, que a natureza jurdica do primeiro efeito da revelia seja juris et de jure, constata-se que os tribunais ptrios firmaram jurisprudncia com acentuada tendncia conceituao da revelia como presuno juris tantum, certamente aplicando a interpretao do artigo 131 do CPC, que autoriza o juiz a apreciar livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstncias constantes dos autos, ainda que no alegados pelas partes, devendo indicar na sentena os motivos que lhe formaram o convencimento. No artigo subseqente o Cdigo de Processo Civil fixa as excees aos efeitos do instituto da revelia, in verbis:Art. 320. A revelia no induz, contudo, o efeito mencionado no artigo antecedente: I se, havendo pluralidade de rus, algum deles contestar a ao; II se o litgio versar sobre direitos indisponveis; III se a petio inicial no estiver acompanhada do instrumento pblico, que a lei considere indispensvel prova do ato. Art. 324. Se o ru no contestar a ao, o juiz, verificando que no ocorreu o efeito da revelia, mandar que o autor especifique as provas que pretenda produzir na audincia.

Em relao ao primeiro inciso do artigo acima, que diz respeito existncia do denominado litisconsrcio passivo, isto , quando a demanda ajuizada contra mais de um ru, no caso de um deles contestar a ao, ficaro afastados os efeitos da revelia em relao aos demais. Um exemplo que demonstra bem essa hiptese a ao de cobrana ajuizada contra o devedor e o fiador. Se apenas o fiador apresentar contestao aos termos da inicial, o devedor, em que pese revel, no sofrer os efeitos decorrentes da sua inrcia. O que se deve levar em conta, na hiptese do inciso I do artigo em comento, o interesse comum entre os litisconsortes, pois a finalidade da

39 contestao refutar ponto a ponto o pedido do autor e, in casu, dever abranger a defesa que o litisconsorte revel poderia fazer.

8.1. INAPLICABILIDADE DOS EFEITOS DA REVELIA FAZENDA PBLICA

Depois de rememorarmos o instituo da revelia e suas excees, creio que estamos bem mais conscientes e preparados para entendermos a razo, ou melhor, para no compreendermos qual a razo de mais este privilgio concedido Fazenda Pblica. Pela simples leitura do artigo das excees da revelia acima transcrito, no d para se concluir em qual dos incisos estaria a autorizao para essa iseno, pois no h previso expressa. No entanto, a doutrina e a jurisprudncia firmaram entendimento de que os efeitos da revelia no atingem a Fazenda Pblica, para tanto, invocam os fundamentos do inciso II do artigo 320 do Cdigo de Processo Civil, o que protege os direitos indisponveis. Como de conhecimento dos profissionais do direito, a revelia equipara-se a uma renncia faculdade de contestar o pedido do autor, o que no se concebe, tanto mais quando est em causa o interesse de pessoa jurdica de direito pblico ou, como decantado pelos pregoeiros dos privilgios, o interesse pblico. O ente pblico titular de direito indisponvel no sujeito a transao, j que pertence a toda a sociedade brasileira, salvo quando houver expressa previso legal autorizadora da transao, o que deveria sinalizar que em hiptese alguma os seus procuradores poderiam deixar de contestar a inicial. Assim, figurando no plo passivo da relao processual a Fazenda Pblica, mesmo que no conteste o pedido ou os pedidos do autor, no sofrer os efeitos da revelia, por fora da construo doutrinria e jurisprudencial com

40 fundamento no inciso II do artigo 320 do Cdigo de Processo Civil. E aqui se verifica mais um dos privilgios atribudos aos entes pblicos, no por previso legal, mas por obra e graa de interpretaes generosas da lei pelos nossos tribunais.

8.2. INAPLICABILIDADE DOS EFEITOS DA REVELIA - JURISPRUDNCIA

A jurisprudncia dos tribunais, como afirmado acima, tambm tem construdo privilgios Fazenda Pblica, afastando os efeitos da revelia no processo de execuo em decorrncia da indisponibilidade dos bens pblicos. Veja-se, a ttulo de exemplo, a Smula 256 do extinto Tribunal Federal de Recursos que infirmou: A falta de impugnao dos embargos do devedor no produz,em relao Fazenda Pblica, os efeitos da revelia.A revelia induz confisso ficta. A regra geral do art. 319 do CPC, porm, admite as excees previstas nos arts. 320, lI, 302, I e pargrafo nico, e 351. Por sua vez, o art. 803, a que se arrimou a sentena, por remisso do art. 1.053, sofre as mesmas restries feitas ao art. 319 citado. A presuno de veracidade no se aplica Fazenda Pblica. O Procurador, por si mesmo, no tem poder para confessar ou renunciar direito da autarquia que representa (AC 72.6O4-AL).

Improcede a preliminar de nulidade da sentena, que seria decorrente da intempestividade da impugnao dos embargos. Com efeito, na execuo fiscal, por versar sobre direito indisponvel, no h falar em revelia, falta de impugnao dos embargos (RTFR 90/ 31) (AC 89.564-RJ).

Nas aes contra a Prefeitura, a falta de contestao, a revelia, no acarreta a condenao da r sem qualquer prova do alegado, pois que os

41procuradores no tm poderes para transigir, confessar, desistir (TJGB, RJTJGB 5/158).

RESP 215526/MA; RECURSO ESPECIAL 1999/0044453-1 Fonte DJ DATA:07/10/2002 PG:00176 - Relator Min. FRANCISCO FALCO (1116) Relator p/ Acrdo Min. LUIZ FUX (1122) Ementa: PROCESSUAL CIVIL. AO MONITRIA CONTRA A FAZENDA PBLICA. POSSIBILIDADE. 1.O procedimento monitrio no colide com o rito executivo especfico da execuo contra a Fazenda Pblica previsto no art. 730 do CPC. O rito monitrio, tanto quanto o ordinrio, possibilita a cognio plena, desde que a parte r oferea embargos. No caso de inrcia na impugnao via embargos, forma-se o ttulo executivo judicial, convertendo-se o mandado inicial em mandado executivo, prosseguindo-se na forma do Livro II, Ttulo II, Captulo II e IV (execuo stritu sensu), propiciando Fazenda, mais uma vez, o direito de oferecer embargos execuo de forma ampla, sem malferir princpios do duplo grau de jurisdio; da imperiosidade do precatrio; da impenhorabilidade dos bens pblicos; da inexistncia de confisso ficta; da indisponibilidade do direito e no-incidncia dos efeitos da revelia. 2. O propsito da ao monitria exclusivamente encurtar o caminho at a formao de um ttulo executivo. A execuo deste ttulo contra Fazenda Pblica deve seguir os trmites do art. 730, que explicita o cnone do art.100, da Carta Constitucional vigente. 3. Os procedimentos executivo e monitrio tm natureza diversa. O monitrio processo de conhecimento. A deciso 'liminar que nele se emite e que determina a expedio do mandado de pagamento no assegura ao autor a prtica de atos de constrio patrimonial, nem provimento satisfativo, uma vez que a defesa (embargos) tempestiva do ru instaura a fase cognitiva e impede a formao do ttulo. 4. Recurso provido (grifamos).

42RESP 281483/RJ; RECURSO ESPECIAL 2000/0102549-0 Fonte DJ DATA:07/10/2002 PG:00181 - Relator Min. MILTON LUIZ PEREIRA (1097) Relator p/ Acrdo Min. JOS DELGADO (1105). Ementa: PROCESSUAL CIVIL. AJUIZAMENTO DE AO MONITRIA CONTRA A FAZENDA PBLICA. POSSIBILIDADE. ART. 1.102A, 'B' E 'C', E PARGRAFOS, DO CPC. 1. A norma que introduziu a ao monitria no Cdigo Processual Civil (art. 1.102a, 'b' e 'c', e pargrafos) revelou-se absolutamente omissa quanto possibilidade de ser utilizada frente Fazenda Pblica, ou por ela. Pelo fato do regime brasileiro de execuo contra o Estado possuir caractersticas especiais, conferindo-lhe privilgios materiais e processuais que so indiscutveis, evidencia-se, inobstante tais peculiaridades, que os preceitos legais instituidores do procedimento monitrio no comportam uma leitura isolada, necessitando que sejam cotejados com os demais comandos do nosso ordenamento jurdico a fim de que se torne vivel a aplicao do mesmo em face dos entes pblicos. 2. No havendo bice legal expresso contra a sua utilizao perante a Fazenda, no cabe ao intrprete faz-lo, face ao entendimento de que regra de hermenutica jurdica, consagrada na doutrina e na jurisprudncia, a assertiva de que ao intrprete no cabe distinguir quando a norma no o fez, sendo inconcebvel interpretao restritiva na hiptese. 3. A deciso proferida em sede do procedimento monitrio (art. 1.102b, do CPC) tem eficcia de ttulo executivo judicial, mesmo quando no haja interposio de embargos. A necessidade de observncia da disciplina do art. 730, do CPC, no induz o raciocnio de que a execuo pressupe ttulo judicial (REsp n 42.774-6/SP, Rel. Min. Costa Leite, DJU 19/09/94). 4. Embora parte da doutrina irresigne-se contra a expedio initio litis do mandado de pagamento ou de entrega da coisa contra o Estado, tal argumento deve sofrer atenuaes em sua interpretao. Nada impede que a Fazenda reconhea o seu dbito e efetue a obrigao exigida pelo credor, cumprindo voluntariamente a ordem injuntiva, sem desrespeitar o sistema do

43precatrio. Para tanto, basta o reconhecimento da condio de devedora. 5. No cumprido o mandado para pagamento ou entrega da coisa, Fazenda facultado o oferecimento de embargos (art. 1.102c do CPC). Tal hiptese evidencia-se mais tranqila, eis que estes sero processados pelo procedimento ordinrio, assegurando-se amplamente o contraditrio e ensejando a possibilidade de farta discusso dos fatos, ampliando sobremaneira o mbito cognitivo do magistrado e a defesa da devedora. Se rejeitados os embargos, aps submisso da sentena ao duplo grau de jurisdio, prossegue-se a execuo, em caso de quantia certa, de acordo com os termos do art. 730 e seguintes, do CPC, e em obedincia ao sistema dos precatrios previsto no art. 100, da CF/88. 6. Se a Fazenda no apresentar embargos, constituir-se- de pleno direito o ttulo executivo judicial, convertendo-se o mandado inicial em mandado executivo, prosseguindo-se, igualmente, no caso de quantia certa, o rumo traado pelo art. 730 e seguintes, devendo adequar-se, no particular, s regras do art. 1.102c, caput, parte final, e 3, parte final, todos do CPC, protraindo-se o pagamento pelo precatrio nos termos do art. 100, da CF/88. 7. Na hiptese de no interposio de embargos, com a conseqente converso do mandado de pagamento em ttulo executivo, comungo do entendimento que defende a possibilidade de, nos casos em que a Fazenda figurar no plo passivo da demanda, haver reapreciao da deciso pelo Tribunal. Assim, resguardadas estaro as prerrogativas do Estado de que contra ele no prevalece a regra da confisso ficta e a incidncia dos efeitos da revelia, por se tratar de direito indisponvel (art. 320, II, do CPC). 8. Recurso especial improvido (grifamos).

9. PRAZO EM DOBRO PARA CONTRA-RAZES A RECURSO INTERPOSTO

O artigo 188 do Cdigo de Processo Civil expresso em fixar os privilgios da Fazenda Pblica somente para contestar a petio inicial da ao e

44 para interpor recurso. Consoante parte majoritria da doutrina, no h previso legal para que os entes pblicos gozem do privilgio do prazo em dobro adicional para as contra-razes a recurso interposto pela parte contrria. A praxe forense, no

entanto, uma vez mais dita a regra ao adotar a contagem em dobro do prazo fixado em lei para que o ente pblico possa contra-razoar o recurso interposto. Somente aps o decurso do prazo contado em dobro que se d seguimento ao processo, ainda que dele no se utilize o ente pblico. Assim, usando ou no o privilgio que lhe foi graciosamente oferecido, o ente pblico garante, no mnimo, um retardamento na j demorada deciso final da lide. Na Justia Especializada, mais precisamente na Justia do Trabalho, tambm h a previso legal dos privilgios em favor dos entes pblicos, porm, tambm no h previso do prazo em dobro para contestar, conforme texto do Decreto-Lei n 779/69 de 21 de agosto de 1969, in verbis:art. 1. Nos processos perante a Justia do Trabalho, constituem privilgios da Unio, dos Estados do Distrito Federal, dos Municpios e das autarquias ou fundaes de direito pblico federais, estaduais ou municipais que no explorem atividade econmica: I - a presuno relativa de validade dos recibos de quitao ou pedidos de demisso de seus empregados ainda que no homologados nem submetidos assistncia mencionada nos 1 , 2 e 3 da art. 477 da CLT; II - o qudruplo do prazo fixado no art. 841, in fine, da CL T; III - o prazo em dobro para recurso; IV - a dispensa de depsito para interposio do recurso; V - o recurso ordinrio ex officio das decises que lhe sejam total ou parcialmente contrrias; VI - o pagamento de custas a final, salvo quanto a Unio Federal, que no as pagar.

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10. DO RECOLHIMENTO DE CUSTAS

Antes de passarmos diretamente ao tema sob exame, procuremos entender com mais vagar as denominadas custas processuais, cientes de que estas esto contidas em despesas processuais, ou seja, uma espcie do gnero despesas processuais. Assim, para melhor entendimento, ser necessrio conceituarmos o gnero, para s ento passarmos ao conceito e entendimento de custas processuais. Conceito de despesas processuais: so todos os gastos decorrentes dos atos e trmites de um processo, a compreendidos os dispndios com postagem, custas judiciais, multas s partes, deslocamentos dos oficiais de justia, conduo e indenizao s testemunhas, remunerao de peritos e at honorrios de advogado. Tambm podem ser includas neste rol as despesas com pareceres de jurisconsultos que, mesmo sendo despesas extraprocessuais, qualquer das partes poder fazer uso desse recurso tcnico para enriquecer um documento processual e prestar maior clareza matria discutida nos autos e, via de conseqncia, poder pleitear o ressarcimento do quantum despendido a esse ttulo. Conceito de custas processuais: as custas guardam pertinncia com a parte das despesas judiciais realizadas com os atos processuais tais como: informaes, tramitao e terminao do processo. Resulta de previso legal. Assim, as custas so os gastos das partes ou daqueles que vm ao processo incidentemente para gesto de procedimento. Ao proclamar a sentena, o juiz concluir a deciso, transferindo parte vencida o dever de satisfazer o dbito apurado a ttulo de custas e honorrios.

46 A condenao do vencido ao pagamento das custas se dar em homenagem ao princpio geral de direito processual conhecido como victus victori expensas condemnatur, princpio esse que se afigura em duas modalidades: a primeira, quando as custas so atribudas ao vencido de forma imperativa, independentemente de requerimento das partes; a segunda, quando as custas s so cobradas do sucumbente a requerimento das partes, a denominada regra jurdica de aplicao estimulada. Entre as espcies de custas incluem-se: I - custas decorrentes de retardamento do processo: advindas da desdia das partes, hiptese em que ser atribuda quela parte que deu causa delonga judicial; II - custas ex causa: a serem suportadas pelo prprio demandante nos processos de jurisdio voluntria ou graciosa; III - custas pro rata ou proporcionais: so aquelas cujo pagamento obriga ambas as partes e decorrem da sucumbncia recproca ou de transao. O direito processual brasileiro aderiu primeira modalidade, no resultando qualquer conseqncia prtica para a parte que omitir esse fato no seu pedido, cabendo ao juiz, de ofcio, condenar o vencido ao pagamento das custas respectivas, por imperativo legal, conforme disposio constante do artigo 20 do Cdigo de Processo Civil, in verbis: A sentena condenar o vencido a pagar aovencedor as despesas que antecipou e os honorrios advocatcios. Essa verba honorria ser devida, tambm, nos casos em o advogado funcionar em causa prpria.

Custas judiciais: so aquelas que se originam de atos processuais em que tenha agido o juiz, funcionrio pblico ou outra pessoa que, por delegao do juiz, tenha que atuar no processo. Custas extrajudiciais: so aquelas percebidas pelos advogados, denominadas de honorrios advocatcios. Tambm diz respeito s despesas que tenham sido realizadas fora do juzo, tais como: transporte, selos, preo de

47 postagem de correspondncias, telefonemas, papel, envelopes e outros materiais necessrios prtica dos atos no processo. A interposio de recurso tambm constitui fato gerador desse tipo de obrigao, podendo ser exigido da parte recorrente a comprovao do pagamento do preparo respectivo, cuja finalidade a de custear a formao e a montagem do processo que englobar o novo recurso, bem como sua remessa ao tribunal ad quem. O preparo , na verdade, a satisfao antecipada da exigncia legal do pagamento das custas processuais. foroso reconhecer e destacar a diferena existente entre custas, preparo e multa. Esta ltima a forma de satisfao de uma penalidade aplicada s partes, enquanto aquelas servem para custear os gastos realizados com o processo. Na hiptese da multa a condenao resultante de falta atribuda parte infratora. O Cdigo de Processo Civil conta com uma gama de artigos onde se prev a aplicao de multa, dentre os quais destacamos: I - artigo 30: regulamenta a cobrana excessiva ou indevida de custas; II - artigo 35: prev a condenao da parte por litigncia de m-f; III - artigo 161: multa aplicada a quem ignorar a proibio de cota marginal ou interlinear nos autos; IV - artigo 233: refere-se penalidade aplicada pelo requerimento doloso de citao por edital; V - artigo 488, inciso II: diz respeito ao depsito prvio de 5% do valor da causa, exigido a ttulo de multa na hiptese de improcedncia da ao rescisria; VI - artigo 538: multa prevista para a hiptese de embargos de declarao com intuito protelatrio, assim declarado pelo juiz; VII - artigo 557, 2: previso de multa de um a dez por cento sobre o valor corrigido da causa, em favor do agravado, quando o agravo for manifestamente inadmissvel ou infundado; VIII - artigo 601 e pargrafo nico: multa inibidora de atos atentatrios dignidade da justia; IX - artigos 644 e 645: previso de multa por dia de atraso na execuo; X - artigo 695: impe multa ao arrematante

48 que se recusa a pagar o preo da arrematao; XI - artigo 701, pargrafo segundo: impe multa por arrependimento do arrematante de imvel de incapaz.

10.1. PRINCPIOS JURDICOS QUE REGEM AS DESPESAS PROCESSUAIS

Os princpios jurdicos que regem as despesas processuais tm o propsito de aclarar pontos de suma importncia que, diuturnamente, aparecem na labuta jurdica dos causdicos. As despesas processuais esto sob a gide dos seguintes princpios jurdicos: I - o desembolso das partes, concernente s custas decorrentes de atos de juzes ou do Ministrio Pblico, obrigao que pertence ao direito pblico; II - a obrigao de restituir ao vencedor as custas por ele recolhidas antecipadamente, de direito privado; II - a obrigao de pagar ou de restituir despesas nada tem com a relao de direito material que se examinou no pedido, nem com ela no estado ltimo em que aps a sentena. Uma das conseqncias da resultante a de que a parte poder ser constrangida a restituir mais do que o valor objeto da demanda judicial, ou que teria direito a receber, na hiptese de vitria na causa; IV - a regra fundamental sobre despesas a de que o vencido arcar com o nus da sucumbncia; V - a obrigao de arcar com as despesas processuais se materializa com a prolao da sentena; VI - a restituio das despesas pede-se por meio de ao prpria; VII - antecipao dos valores concernentes s custas ou despesas a serem efetuadas com a prtica de determinados atos requeridos pela parte, a exemplo do que dispe o artigo 19 do Cdigo de Processo Civil, o artigo 30 do Decreto-Lei 3.365/1941, relativamente ao de desapropriao. No decorrer do processo o juiz poder determinar, de ofcio ou a requerimento do Ministrio Pblico, a realizao de atos que importem custos s

49 partes. Nessas hipteses, cabe ao autor antecipar os valores correspondentes e, se vitorioso, ser ressarcido pelo vencido ao final.

10.2. SUCUMBNCIA RECPROCA

Ao ajuizar a ao o autor poder, na petio inicial, formular um ou vrios pedidos e ao prolatar a sentena o juiz, diante dos fatos e provas carreados aos autos, poder conceder apenas parte do que foi pleiteado, resultando, assim, em vitria parcial ou, em derradeira anlise, resultando em sucumbncia recproca dos litigantes. Em semelhantes decises, constar da sentena a distribuio proporcional das despesas, que podero ser assim enquadradas: a) se o autor vitorioso apenas em parte, as despesas por ele antecipadas e as demais fixadas pela sentena sero divididas entre os litigantes, de forma proporcional. Pode o juiz optar por levar em conta o percentual de xito de cada um e a partir da definir o valor das custas por eles devidas, cabendo quele que patrocinou as despesas, ser reembolsado dos valores pago a maior; b) o magistrado poder determinar que se somem os valores referentes s custas, despesas e honorrios e a partir do quantum apurado, fixar a participao equnime dos litigantes, de forma que no haja prejuzo para qualquer das partes. A regra da diviso equnime das despesas processuais s se aplica quando for significativa a vitria do autor. Caso contrrio, conforme dispe o pargrafo nico do artigo 21 do Cdigo de Processo Civil, ele suportar toda a despesa.

10.3. DESPESAS PROCESSUAIS: PARTICULARIDADES

50 No tocante s despesas processuais, existem particularidades em determinadas hipteses que devem ser abordadas caso a caso, mas como isso no ser possvel aqui, apontemos apenas as mais comuns e corriqueiras. Dentre tantas, figura a hiptese dos processos sem contraditrio, tambm denominada de jurisdio voluntria, cuja regra determinada pelo artigo 24 do Cdigo de Processo Civil, que impinge ao autor o dever de antecipar os valores necessrios ao impulso do processo mas, ao final, ser rateada entre todos os interessados da demanda. Outra regra que merece destaque a constante do artigo subseqente, que prever a diviso proporcional das despesas entre os interessados que comparecem a juzo divisrio, ainda que no haja litgio. A base de clculo para se chegar aos valores proporcionais o quinho destinado a cada interessado. Numa eventual desistncia ou reconhecimento do pedido manifestada nos autos, o desistente arcar, sozinho, com as despesas, desde que a desistncia ou reconhecimento tenha sido no todo. Sendo ela parcial, a responsabilidade ser proporcional ao valor correspondente parte desistida ou reconhecida, surtindo igual reflexo nos honorrios advocatcios. Na transao, como o que ocorre um acordo negociado entre os litigantes o ideal que os valores referentes s despesas processuais sejam includos na composio. No havendo previso a respeito nos termos do acordo, as despesas sero igualmente rateadas entre os litigantes.

10.4. FAZENDA PBLICA - ISENO DE CUSTAS

Agora que j conhecemos a natureza jurdica, os princpios orientadores e a finalidade das despesas processuais, em especial das custas, e

51 considerando ainda que o constituinte de 1988, quando pretendeu isentar a parte do pagamento de custas o fez expressamente ou previu a edio de lei especfica para esse fim, a exemplo do que ocorre com a previso de assistncia judiciria gratuita, quando se criou a Defensoria Pblica, artigo 134 da Constituio Federal e a Lei Complementar n 80/94, no nos afigura de boa tcnica que o legislador ordinrio exorbite do seu poder de legislar e crie privilgios que isentam os entes pblicos do pagamento de custas processuais, mxime porque o constituinte sequer sinalizou neste sentido. Sabendo-se que a cada vez que acionado o aparelho judicial consome boa parte do errio, as custas tambm tm um sentido de apenao pedaggica do sucumbente. Este, mesmo sabendo que no detinha o bom direito, nada fez para evitar a peleja no tribunal, ou pior, provocou e at estimulou a busca da via judicial para soluo do litgio, quando o correto seria envidar todos os esforos no sentido de uma composio amigvel. Assim, quando o legislador ordinrio concedeu a iseno de custas para a Unio, Estados, Municpios e respectivas autarquias e fundaes, condimentou ainda mais o sabor da impunidade que hodiernamente graa em nossa ptria. H quem justifique como acertada essa medida, ao argumento de que no se trata de um privilgio, mas de uma medida bvia que evita a burocracia de se exigir que o rgo arrecadador faa repasses a si prprio. Louvando e respeitando a quem assim advoga, no nosso modesto modo de pensar esse argumento pouco convincente, pois no consta que os municpios, fundaes e autarquias sejam detentoras do poder de organizar seus prprios tribunais e, portanto, se submetem aos juzes e tribunais da justia comum estadual, bem como aos Tribunais

52 Superiores, sabidamente federais, onde causaro despesas sem a devida contrapartida. Tambm no se sustenta o argumento em apreo em virtude da isonomia que deve nortear a atuao do Judicirio, dispensando a todos os litigantes igual tratamento. Assim, o que determina a condenao em custas processuais a sucumbncia, como preconiza o brocardo victus victori expensas condemnatur, ou seja: ao vitorioso a vitria, ao condenado as despesas. A qualificao da parte jamais poderia interferir neste princpio. De qualquer sorte, privilgio ou no, a matria encontra-se

regulamentada pela Lei n 9.289, de 4 de julho de 1996, que dispe sobre as custas devidas Unio e, ao revogar a Lei n 6.032/74, estendeu os mesmos privilgios aos Estados, Distrito Federal, Territrios e Municpios e respectivas autarquias e fundaes. Tambm estende o privilgio ao Ministrio Pblico, aos que provarem insuficincia de recursos e aos autores das aes populares, civis pblicas e aes coletivas, previstas no Cdigo de Defesa do Consumidor. Somente nas hipteses de comprovada litigncia de m-f no manejo dessas aes coletivas que os autores ficaro obrigados a recolher custas processuais. A iseno alcana, sem ressalvas, o habeas corpus e o habeas data. Esta lei pe termo a qualquer discusso doutrinria ou jurisprudencial quanto a obrigatoriedade ou no do recolhimento de custas por parte da Unio, dos Estados, Municpios, Territrios Federais, Distrito Federal e as respectivas autarquias e fundaes, pois em seu artigo 4 isenta a todos, embora j houvesse previso legal em relao Unio. Da iseno consta a ressalva de que persiste a obrigatoriedade quanto ao reembolso das despesas judiciais feitas pela parte vencedora, pois o pargrafo nico do artigo 4 da lei em comento esclarece que os

53 entes pblicos, caso no logrem xito no processo judicial, esto obrigados a reembolsar os valores correspondentes s despesas custeadas pela parte contrria. Esta ressalva vem como que para evitar possveis embates jurdicos, j que o que fixa o artigo 19 so custos resultantes de despesas geradas por atos necessrios praticados por peritos e ou serventurios da justia, que inicialmente so suportadas pelo autor e, se vencedor, h de ser reembolsado pelo ente pblico sucumbente.

10.5. DISPENSA DO PREPARO

A todo vencido que pretenda recorrer da deciso dever, no ato da interposio do recurso, apresentar comprovante do recolhimento do preparo, quando exigido por lei, conforme preconiza o artigo 511 do Cdigo de Processo Civil. O mesmo artigo, em seu pargrafo nico, dispensa de tal exigncia as pessoas jurdicas de direito pblico (Unio, Estados, Municpios e respectivas autarquias) alm do Ministrio Pblico e outras previstas em lei. Neste particular se verifica especial discrepncia entre o tratamento dispensado Fazenda Pblica e o particular, notadamente se considerarmos que o preparo pressuposto de admissibilidade do recurso interposto e o no recolhimento deste implica na desero do apelo, nus suportado to somente por ente privado.

11. DUPLO GRAU DE JURISDIO

Antes de passarmos diretamente ao tema sob exame, vamos procurar entender o que vem a ser atos decisrios, sentena e coisa julgada, pontos que sero largamente utilizados durante a nossa dissertao sobre duplo grau de jurisdio.

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11.1. ATOS DECISRIOS

Art. 162 - Os