da favela ao residencial: reassentamentos populares e...

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1 Patrícia Fabiana Moura DA FAVELA AO RESIDENCIAL: Reassentamentos populares e modos de vida Orientadora: Márcia Mansur Saadallah Co-orientadora: Adriana Maria Brandão Penzim Comissão examinadora: Adriana Maria Brandão Penzim (PUC-MG) Maria Luísa Magalhães Nogueira (UFMG) Belo Horizonte 2010

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Patrícia Fabiana Moura

DA FAVELA AO RESIDENCIAL: Reassentamentos populares e modos de vida

Orientadora: Márcia Mansur Saadallah

Co-orientadora: Adriana Maria Brandão Penzim

Comissão examinadora: Adriana Maria Brandão Penzim (PUC-MG)

Maria Luísa Magalhães Nogueira (UFMG)

Belo Horizonte

2010

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1- INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA

O estudo que aqui se propõe tem como objetivo investigar os impactos decorrentes das

obras do Programa Vila Viva com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento

(PAC) nos modos de vida de uma comunidade. O lócus da pesquisa é a Pedreira Prado Lopes,

uma das seis favelas em Belo Horizonte cuja intervenção do Município prevê a urbanização,

com obras de estrutura e infra-estrutura – alargamento de becos e vias, obras de drenagem,

saneamento e reassentamento em Unidades Habitacionais (UH’s) (BELO HORIZONTE,

2009a) – sendo este último foco desse estudo.

O interesse pelo tema surgiu face ao crescente investimento do poder público em

políticas habitacionais, favorecendo o processo de urbanização de favelas. Aliado ao tema —

tão contemporâneo e ao mesmo tempo tão revisitado pelas ciências sociais, o interesse da

aluna pesquisadora é de compreender, ainda que parcialmente, se e como as obras e ações de

reassentamento urbano podem impactar os modos de vida dos moradores de vilas e favelas.

Deixando seus territórios de origem, espaços que na maior parte das vezes são

construídos pelos próprios moradores, em áreas obtidas muitas vezes a custa de movimentos

de ocupação irregular, as casas dos moradores de favela são mais do que construções

irregulares; são construções de vida. É Guattari quem há muito apontou que a subjetividade

“não se situa no campo individual, seu campo é o de todos os processos de produção social e

material” (GUATTARI E ROLNIK, 1986, p.32). Nesta linha de pensamento, podemos tomar

em referência vários estudos em que se aponta — tal como Penzim (2001) e Ferreira Neto

(2004) dentre muitos outros—, o quanto a realização de políticas e práticas democratizantes

do espaço urbano, voltadas para a melhoria das condições de vida de segmentos populacionais

mais pobres são fatores de reversão de lógicas de desigualdade e segregação urbana, porém o

são também de produção de novos modos de existência1.

O PAC – Programa de Aceleração do Crescimento – lançado pelo Governo Federal

em 22 de janeiro de 2007 tem por objetivo “estimular o crescimento de setores produtivos e,

ao mesmo tempo, levar benefícios sociais para todas as regiões do país” (BRASIL, 2007a).

Durante a atual gestão (2007-2010), o Governo pretende investir R$503,9 bilhões em infra-

estrutura, especificamente nos setores de transporte, energia, habitação, saneamento e

1 Vale ressaltar que não se está aqui fazendo uma atribuição de valores, numa perspectiva de bem e mal, certo ou errado, tem-se apenas a constatação de que diferenças se estabelecem, que novidades se instalam. Quer-se apenas refletir sobre o seu significado na vida de pessoas, grupos e coletivos.

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recursos hídricos. Para a habitação, o PAC pretende destinar R$106,3 bilhões, no intuito de

atender a quatro milhões de famílias (BRASIL, 2007b).

Em Belo Horizonte, o recurso advindo do PAC somam R$572,3 milhões – recurso

parcialmente incorporado ao Programa Vila Viva, pré-existente no município no âmbito da

urbanização de vilas e favelas (BELO HORIZONTE, 2009a). Por sua vez, o Programa Vila

Viva está relacionado ao Plano Global Específico (PGE), um instrumento de planejamento

que objetiva orientar o poder público sobre onde e como investir os recursos na esfera da

habitação (BRANDENBERGER, 2005).

A título ilustrativo e para que se possa dimensionar o vulto dos investimentos e a

abrangência do que está sendo aqui exposto, podem-se citar alguns exemplos em nossa

cidade. Na Pedreira Prado Lopes – uma das favelas mais antigas de Belo Horizonte

(GUIMARÃES, 1992) e lócus dessa pesquisa, o Programa Viva Vila prevê a urbanização e

regularização das habitações. Integrando uma das etapas do projeto, a construção de

Unidades Habitacionais (UH’s) prevê o reassentamento de 272 famílias. Com esse objetivo, o

valor do investimento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é de R$37,4

milhões (BELO HORIZONTE, 2009b).

Como se pode observar, trata-se de grandes obras, que envolvem grandes grupos

populacionais, o que, por certo implica em repercussões importantes que devem ser analisadas

não por um único viés, uma vez que se caracterizam por sua multidisciplinaridade. Os temas

geradores deste estudo inserem-se em questões relevantes na atualidade, que abrangem o

campo do urbanismo como modo de vida, tais como o direito à moradia digna, os entraves

relacionados ao reassentamento de famílias moradoras em favelas, as ressignificações das

histórias a partir do espaço, as políticas públicas de habitação e desenvolvimento urbano,

dentre muitos outros nos quais se insere. Importa-nos verificar ainda o papel da psicologia no

planejamento e na execução das políticas urbanas, como campo do saber propício à

compreensão da produção de modos de ser e de viver nas cidades.

Dentre as inúmeras possibilidades de abordagem de tais questões, esta pesquisa

pretende responder à seguinte problematização: como as obras de urbanização,

especificamente o reassentamento em moradias populares impacta os modos de vida dos

moradores de vilas e favelas? Ao trazer tal questão para o âmbito da pesquisa acadêmica, este

trabalho ambiciona contribuir para a ampliação dos diálogos existentes no campo da

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habitação urbana, em especial no que se refere à habitação popular e incentivar novas

pesquisas e práticas acerca do tema.

Para aprofundar nestas questões, o trabalho foi estruturado em capítulos que discutem

os pontos relacionados ao tema, objetivando tecer uma articulação. Iniciamos a discussão

remontando o surgimento das favelas em Belo Horizonte, desde a sua construção até os dias

atuais. Tratamos também do desenvolvimento das políticas urbanas durante o século XX,

trazendo para nosso foco o município de Belo Horizonte e os programas de urbanização de

vilas e favelas desenvolvidos pelo poder público, pretendendo contextualizar o leitor sobre o

lócus desse estudo – a favela Pedreira Prado Lopes.

Em seguida trouxemos elementos da história de ocupação da Pedreira Prado Lopes -

uma das favelas mais antigas da capital (GUIMARÃES, 1992). Cumpre notar que a Pedreira

Prado Lopes é uma das seis favelas que receberam recurso do Programa de Aceleração do

Crescimento (PAC) para as intervenções previstas no Programa Vila Viva (BELO

HORIZONTE, 2009a). Considerando também o seu adensamento e a proximidade ao

hipercentro de Belo Horizonte, a comunidade é alvo de intenso investimento do poder

público, objetivando a sua urbanização e aproximação aos padrões urbanísticos vigentes.

Após as apresentações do local de intervenção, passamos a discussão teórica que

buscou a articulação entre os conceitos de biopoder (FOUCAULT, 1974; FOUCAULT, 1988)

e sociedade controle (DELEUZE, 1992), articulando-os aos modos de vida decorrentes da

urbanização (WIRTH, 1967). Tal articulação subsidia a discussão destinada à análise dos

dados.

O capítulo acerca da análise dos dados por sua vez, contempla os dados obtidos em

campo e a articulação teórica que se faz nos capítulos anteriores. O entrecruzamento entre as

técnicas de coleta de dados e a bibliografia selecionada possibilitou a discussão acerca do

impacto das intervenções de obras nos modos de vida dos moradores da Pedreira Prado

Lopes. Essa discussão obviamente não se esgota, mas ambiciona abrir campo para novos

diálogos e práticas.

Por último, apresentou-se a conclusão do estudo, tarefa complicada de fazer, dada a

complexidade do tema e a sensação da responsabilidade em produzir algo que fosse fidedigno

e ético para a ciência e para os sujeitos envolvidos na pesquisa. Nesse sentido, a conclusão

não apresenta o fim, mas a expectativa de novos recomeços e outras inquietações...

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2- PROBLEMAS E OBJETIVOS

Constituiu objetivo geral do estudo analisar os possíveis impactos nos modos de vida

dos moradores da Pedreira Prado Lopes, decorrentes da intervenção das obras previstas no

escopo do Programa Vila Viva/ PAC.

Dentre os objetivos específicos destacam-se:

- Pesquisar como se dá o processo de reassentamento de famílias cujas moradias favelizadas

foram removidas do espaço urbano, em obras do Programa Vila Viva, em Belo Horizonte.

- Conhecer e analisar a experiência dos moradores de um condomínio popular, que tenham

sido objeto de reassentamento nas Unidades Habitacionais (UH’s), visando identificar os

modos de vida ali presentes, observados seus traços peculiares e buscando compreender de

que maneira tal prática contribuiu ou não para a produção de novos modos de vida.

- Identificar fatores relevantes que promovam a ressignificação do espaço e sua apropriação

pelos sujeitos, nas novas moradias.

3- PROCEDIMENTOS

Conforme dito, a pesquisa teve como objetivo analisar os possíveis impactos nos

modos de vida dos moradores da Pedreira Prado Lopes, decorrentes da intervenção das obras

previstas no escopo do Programa Vila Viva/ PAC. Nesse sentido, adotamos uma metodologia

qualitativa com vistas à tentativa de nos aproximar de dados e informações que excedessem

números e valores que compõem a intervenção urbana. Conforme Minayo (1994):

A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. (p.21,22).

No trajeto desse trabalho, elegeu-se como técnicas a entrevista semi-estruturada e a

observação participante. A entrevista, no entanto não serviu somente à lógica dos manuais

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metodológicos (GIL, 1989), mas trouxe elementos da História de Vida/ História Oral dos

participantes da pesquisa. Para Haguette (1999), a História de Vida permite-nos buscar

elementos que fogem às teorias e à estagnação do método. No caso do estudo sobre as favelas,

se tomássemos apenas o referencial teórico e documental, nos faltaria as histórias individuais

que compõem o movimento de organização e luta, bem como os aspectos cotidianos e

particulares no interior da favela. A autora pontua que a História de Vida busca em vários

elementos e fontes, dados que se complementam e a tornam verídica, distanciando-se assim

das obras de ficção.

A História Oral para Haguette (1999) leva em consideração a oralidade; tudo que está

no campo do dizível e que pode ser preservado para considerações posteriores compõem a

especificidade da técnica. De acordo com Haguette (1999), “a HO está preocupada com o que

é relevante e significante para a compreensão da sociedade e não na acumulação anárquica de

supostas peças de evidência que não acrescentam nada aos dados já existentes.” (p.93). Dessa

forma, entende-se como História Oral todos os dados obtidos através de entrevistas, conversas

informais, contatos telefônicos e qualquer outro tipo de comunicação humana que possa ser

registrado (HAGUETTE, 1999).

Le Ven (2008) utiliza o termo história oral de vida para referenciar o método que

busca captar dos sujeitos suas memórias, reflexões e ponderações acerca das suas experiências

de vida em determinado contexto. Importa, mais do que recolher aspectos contextualizados no

tempo cronológico, trazer aspectos individuais, únicos. Na história oral de vida, a relação

entre pesquisador/ pesquisado interfere no teor do que é acolhido como informação.

Alguém disse que, na história oral, a entrevista diz tanto do entrevistador como do entrevistado. Mas isso representa bem o que quero dizer sobre o afeto: que é afetar e ser afetado. Se não houver esse afeto, outras palavras, se houver uma demanda, uma interlocução, não haverá possibilidade de intervenção. (LE VEN, 2008, p.60, grifos do autor).

No intuito de fornecer ao leitor subsídios que o permitam compreender o trajeto

percorrido pela pesquisa, fizemos essa breve diferenciação. Utilizando o termo referenciado

por Le Ven (2008), pode-se dizer que as entrevistas semi-estruturadas feitas no lócus desse

estudo trazem elementos da história oral de vida, mas não podem ser tomadas exclusivamente

como tal. Também a observação participante levou em consideração os muitos relatos

individuais que trouxeram à tona fragmentos da memória coletiva da comunidade e sua

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perspectiva diante da intervenção das obras, assim como os impactos nos modos de vida que

daí decorrem.

Os entrevistados foram escolhidos aleatoriamente. Mas, mesmo diante do ‘aleatório’,

do casual, a preocupação em identificar diferentes sujeitos que pudessem contribuir de

diversas maneiras, permeou todo esse estudo. Não querendo adotar uma posição maniqueísta,

procuramos identificar não somente os dois lados da intervenção urbana – positivo e negativo,

mas a multiplicidade do processo de urbanização e os impactos nos modos de vida dos

moradores (DELEUZE & GUATTARI, 1995).

Cumpre notar que o projeto de pesquisa que antecedeu a pesquisa foi submetido ao

Programa de Bolsas de Iniciação Científica (PROBIC) da PUC Minas em 2008, tendo sido

deferido pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da mesma instituição. A observação

participante foi realizada entre os meses de março de 2008 a outubro de 2009 enquanto as

entrevistas foram realizadas nos meses de setembro e outubro de 2009. Aos participantes foi

solicitada a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido garantindo o

anonimato e a substituição dos nomes visando preservar a identidade. Aqui uma ressalva: os

participantes queriam se ver reconhecidos no estudo, ver elementos da sua história traduzidos

nas páginas da história oficial. Diante de demandas como essa, nos deparamos com a

responsabilidade do pesquisador, de promover a repercussão dessas vozes frequentemente

silenciadas ao longo da história – isso nos dimensiona também o peso da ética ao fazer

pesquisas.

4- RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 Sobre as favelas2 e a sua origem em Belo Horizonte

Para remontar brevemente o histórico das favelas em Belo Horizonte, é necessário

compreender o sentido da palavra favela. Desde o princípio segregadas do espaço urbano e

literalmente às margens da sociedade, a origem do nome favela está relacionada à uma

vegetação predominante da caatinga, resistente à seca. Sua alusão aos morros está ligada à

Guerra de Canudos, por volta de 1900. Quando os combatentes retornaram da Guerra de

2 Apesar da palavra favela ser freqüentemente substituída por termos “politicamente corretos” como vilas e aglomerados (SILVA & SOUZA, 2002), opta-se aqui por assumir a favela de modo completo – desde a sua etimologia, perpassando a sua origem, história e significação.

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Canudos, ainda não tendo recebido o seu soldo, ocuparam temporariamente os morros da

cidade do Rio de Janeiro de forma semelhante à vegetação dos morros da cidade de Canudos,

originando as favelas (ZALUAR & ALVITO, 1999).

Para além da semelhança com a vegetação da caatinga, a favela urbana teve desde o

início como marca identitária a ocupação irregular, sem planejamento urbano ou a estética

arquitetônica. Com pouca ou nenhuma infra-estrutura, a favela virou cenário e sinônimo de

pobreza, falta de higiene e criminalidade.

A favela, vista pelos olhos das instituições e dos governos, é o lugar por excelência da desordem. (...) Ao longo deste século, a favela foi representada como um dos fantasmas prediletos do imaginário urbano: como foco de doenças, gerador de mortais epidemias; como sítio por excelência de malandros e ociosos, negros inimigos do trabalho duro e honesto; como amontoado promíscuo de populações sem moral. (ZALUAR & ALVITO, 1999, p.14, grifo dos autores).

Para Conti (2006), a história das favelas é análoga à história das cidades brasileiras. Se

antes era constrangedor associar a favela à dinâmica da urbanização, ao longo do século XX

fez-se necessário considerar a amplitude de fatores que envolvem a favelização. Mais do que

um déficit habitacional, a favela reflete os processos sociais, políticos, culturais e até estéticos

(JACQUES, 2001).

Conti (2006) discute a abordagem cultural, em que a favela traz na sua concepção uma

identidade que excede a cultura dominante, formalizada; para além disso, influencia e é

também influenciada pelos processos culturais da sociedade. Nesse sentido, a favela foi e

continua sendo vetor de expressiva identidade cultural, especialmente o samba (OLIVEIRA &

MARCIER, 1999) e a cultura afrodescendente. A este respeito, à marca da cultura

carnavalesca que surgiu nos morros cariocas e para justificar a despejada e processo de

remoção das favelas na década de 1940, o governo do Rio de Janeiro assim argumenta:

O preto, por exemplo, via de regra não soube ou não poude (sic) aproveitar a liberdade adquirida e a melhoria econômica que lhe proporcionou o novo ambiente para conquistar bens de consumo capazes de lhe garantirem nível decente de vida. Renasceu-lhe a preguiça atávica, retornou a estagnação que estiola (...) como ele todos os indivíduos de necessidades primitivas, sem amor próprio e sem respeito à própria dignidade – priva-se do essencial à manutenção de um nível de vida decente mas investe somas relativamente elevadas em indumentária exótica, na gafieira e nos cordões carnavalescos... (ZALUAR & ALVITO, 1999, p.13, grifo nosso).

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Conti (2006) aponta também a abordagem estética, que busca compreender a favela

como parte integrante do processo de urbanização e não como algo que falha à cidade, como

as desigualdades sociais e o crescimento sem planejamento da urbe. Nessa abordagem, a

favela guarda no seu âmago uma estética própria que lhe confere identidade, uma “estética da

ginga” (JACQUES, 2001). Partindo dessa visão, Jacques (2001) defende que os labirintos,

barracos e rizomas observados nas construções e na dinâmica da favela representam uma

beleza própria; arte e arquitetura que demandam a mínima intervenção do Estado. Através de

questionamentos, a autora defende a estética da favela, criticando a imposição da ‘inclusão na

cidade formal’:

Mas as favelas já não fazem parte da cidade há mais de um século? Será necessária a integração formal? Não seria uma imposição autoritária de uma estética formalista visando a uniformização do tecido urbano? Porque não assumir de uma vez a estética das favelas sem as imposições estéticas, arquitetônicas e urbanísticas da arquitetura e do tecido urbano original da favela para criar novos espaços sem identidade própria, dos quais, muitas vezes, a população local não se apropria, e que ficam rapidamente deteriorados e abandonados? Por que o modelo do bairro é sempre o exemplo a ser seguido em detrimento do inventivo e rico, tanto cultural quanto formalmente, processo espacial da favela, tentando aprender com sua complexidade cultural e riqueza formal? (JACQUES, 2001, p. 14).

Conti (2006) tece uma crítica a partir da argumentação trazida por Jacques (2001).

Para o autor, se por um lado a abordagem estética apresenta-se como cativante e romanceada,

por outro, falha em não apontar medidas efetivas e o tipo de intervenção que pode ser

caracterizado como “intervenção mínima”. No decorrer do artigo e ao final dele, Conti (2006)

pontua que as abordagens que discutem as favelas não se integram, mas apresentam

argumentos pontuais, “que acabam retalhando sua história em inúmeras histórias cuja única

finalidade é atender à necessidade de contextualização de inúmeros estudos de caso.”

(CONTI, 2006, p.38). Por fim, Conti (2006) destaca a abordagem fenomenológica defendida

por Malard (1992, apud CONTI, 2006). Nela, a apropriação do espaço e análise da realidade

local possibilita a atuação pautada na autogestão e nos processos participativos. Para o autor,

“No contexto atual, trata-se da necessidade de um genuíno processo de autogestão pautado na

inter-relação entre agente local (comunidade) e agentes parceiros (sociedade civil). Esse

processo é, a nosso ver, o motor que vai tornar operativa uma abordagem como essa.”

(CONTI, 2006, p.48).

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Dito isso, voltemos a atenção ao nosso cenário. Em Belo Horizonte, as favelas

ocuparam o seu espaço desde a sua construção. Projetada para ser a Capital do Estado de

Minas Gerais e acolher o funcionalismo público, o projeto arquitetônico não previa o

alojamento do grande número de trabalhadores da construção civil. Sem moradia, esses

trabalhadores foram incentivados a montar barracos no entorno da construção, originando as

favelas. Dois anos antes da inauguração da nova capital, Belo Horizonte já contava com duas

ocupações irregulares3 (GUIMARÃES, 1992). Por serem inicialmente considerados

provisórios, os assentamentos não mereceram a atenção do poder público. Entretanto, cerca de

cinco anos após a inauguração da capital, ao observar o rápido crescimento populacional4, o

poder público delimitou uma área – denominada Área dos Operários, próxima ao centro e

destinada à habitação dos trabalhadores braçais. Ainda assim, o crescimento desordenado das

favelas comprometia o modelo arquitetônico da cidade, com ocupações irregulares que

gradativamente tomavam o entorno da região central e avançavam para as áreas periféricas.

Obviamente, a área antes demarcada pelo poder público foi insuficiente, mas a preocupação

desse e da elite da nova capital resumia-se a manter afastado do hipercentro as favelas e os

seus habitantes (GUIMARÃES, 1992).

4.2 O processo de urbanização e as intervenções governamentais

O que se seguiu nos 30 anos após a inauguração de Belo Horizonte foi um fenômeno

de ocupação e remoção constantes. Á medida em que áreas da cidade eram urbanizadas e

valorizadas, as favelas iam sendo removidas, alvo da perseguição do poder público;

paradoxalmente havia também a conivência do poder público para a ocupação irregular

quando havia o interesse na mão-de-obra e necessidade de valorização de áreas ainda não

urbanizadas. Mais tarde, sob a justificativa de urbanização e obras que visavam o bem

coletivo, intensificou-se o combate às favelas, objetivando a sua extinção. Houve, entretanto,

movimentos de resistência por parte dos moradores, ora ocupando outras áreas e formando

novas favelas, ora retornando para os mesmos lugares de onde haviam sido removidos

(GUIMARÃES, 1992).

3 As duas favelas – Córrego do Leitão e Alto da Estação estavam localizadas onde atualmente são os bairros Santa Teresa e Barro Preto. 4 Durante a construção da cidade, entre os anos 1893-1897, observou-se um aumento da população de 2.650 para 12.000 habitantes – o que representava um crescimento anual de 45,9% (GUIMARÃES, 1992).

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Na década de 1960, houve um importante marco na questão da habitação no Brasil – o

Seminário Nacional de Habitação e Reforma Urbana, que propôs a definição de políticas

urbanas que garantissem o direito a moradia e infra-estrutura das favelas. Porém, com o Golpe

Militar, os movimentos de extinção das favelas e coerção dos moradores ganharam força. A

década seguinte reforçou o processo de desfavelização, com a criação da Coordenação de

Habitação de Interesse Social (CHISBEL), cuja principal atribuição era remover vilas e

favelas sob a justificativa de urbanização e obras de interesse público (GUIMARÃES, 1992).

Já na década de 1980, com o processo de redemocratização do País, o poder público

volta novamente sua atenção para a favela, criando programas que visavam a regularidade

urbana, reconhecendo-se implicitamente o direito à moradia e propriedade dos moradores de

favelas. No mesmo período, a ocorrência de chuvas e enchentes que provocaram

deslizamentos de terra e quedas de barracos acentuou o problema dos desabrigados, aliado ao

crescimento constante das favelas e ocupações em áreas de risco geológico. Nesse sentido, a

criação do Programa de Desenvolvimento de Comunidades (PRODECOM), no fim da década

de 1970-80 e posteriormente o Programa Municipal de Regularização de Favelas (PRÓ-

FAVELA) possibilitou um avanço na política de urbanização e habitação. Houve também a

criação da Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (URBEL), substituindo a CHISBEL,

o que representou um novo posicionamento do poder público, mais democrático às questões

de habitação das favelas, que excedia a remoção das famílias e a tentativa de extinção das

favelas (GUIMARÃES, 1992).

Diante do movimento crescente das favelas, que configurava uma ocupação

desordenada dos espaços, Belo Horizonte institui, na década de 1990, uma política

habitacional, pautada em leis como a 7.166/96 que regulamenta o uso e a ocupação do solo do

Município e outras leis relativas ao urbanismo e habitação5. Ainda na tentativa de recuperar

os espaços urbanísticos, intencionou-se melhorar as condições de habitação e promover a

moradia para pessoas sem-casa, privilegiando os movimentos organizados em torno dessa

demanda. Nesse sentido, em 1997, é criado um instrumento de planejamento e regulação que

serve à política urbana – o Plano Global Específico (PGE), no intuito de mapear as áreas

favelizadas de Belo Horizonte, levantando dados relativos à infra-estrutura, condições de

habitação e realidade socioeconômica da população, traçando metas e políticas de

5 Sobre a legislação, consultar a lei 10.257/01, na esfera federal; no âmbito municipal, ver leis 7.277/97 e 8.616/03.

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investimento para urbanização e desenvolvimento das vilas e favelas6. O PGE se assenta em

três pilares: o direito à posse do território; o desenvolvimento socioeconômico e a

caracterização urbanística e ambiental (BRANDENBERGER, 2005).

Paralelo ao PGE, o Município criou o Programa Vila Viva que abrange obras de

saneamento, construção de novas moradias, erradicação das áreas de risco e urbanização das

vilas e favelas atendidas (BELO HORIZONTE, 2009a). Em 2007, o Programa de Aceleração

do Crescimento (PAC) – do Governo Federal foi incorporado ao Vila Viva, com destinação

de recursos de R$572, 3 milhões direcionados à obras de infra-estrutura e estrutura.

Para além das obras, o Programa Vila Viva contempla também ações de cunho social e

comunitário como educação sanitária-ambiental e projetos de geração de trabalho e renda.

Essas ações objetivam a inserção dos moradores de favela no espaço urbano (inserção na

cidade formal), e promoção da autonomia e cidadania, pela via do trabalho e geração de

renda, além da conscientização ambiental (BELO HORIZONTE, 2009a).

Conforme dados censitários divulgados pela Prefeitura Municipal de Belo Horizonte,

existem atualmente 174 vilas e favelas no município, com uma população aproximada de

362.793 habitantes (BELO HORIZONTE, 2009c). Desse universo, o Programa Vila Viva tem

atuado em seis favelas de Belo Horizonte, a saber: Aglomerado da Serra, Morro das Pedras,

Taquaril, Vila Califórnia, Vila São José e Pedreira Prado Lopes. Essa última é locus dessa

pesquisa. Foi escolhida por ser uma das favelas mais antigas de Belo Horizonte

(GUIMARÃES, 1992), possuir uma história de ocupação, resistência e organização

comunitária destacada, além de representar parte importante da trajetória profissional da

pesquisadora (mais do que isso, afetos). Para além disso, a Pedreira Prado Lopes tem nas suas

ruas e becos dados que ultrapassam as estatísticas que a figuram entre as favelas mais

violentas e pobres de Belo Horizonte. Suas histórias individuais e coletivas de luta e

superação alimentam livros (SOARES & ANTUNES, 2001; RIBEIRO et al, 2001) e fazem

refletir.

Trazendo novamente a pauta desse estudo, é sabido que a urbanização representa

profunda transformação no espaço da favela, incluindo a alteração da sua imagem, a

concepção que dela se tem e os modos de vida. Inserido nesse espaço que simultaneamente

6 A Pedreira Prado Lopes foi a primeira favela a ter o PGE realizado, através do Orçamento Participativo de 1997. (BRANDENBERGER, 2005).

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integra, produz e dele sofre interferências, também muda o morador. Transforma-se a favela,

transformam-se os moradores, transforma-se ali a vida...

4.3 Pedreira Prado Lopes e Programa Vila Viva: alguns dados e considerações

Segundo dados do IBGE e URBEL, a Pedreira Prado Lopes tem aproximadamente

8.900 habitantes, em uma área de 14.810 m2 (BELO HORIZONTE, 2009d). Nesse espaço

estão condensados cerca de 1.914 domicílios. Dos principais problemas apontados na

comunidade estão a urbanização irregular, elevada densidade habitacional, índice significativo

de violência, sobretudo associada ao tráfico de drogas, falta de saneamento básico e

insuficiência de redes de esgoto e coleta de lixo, além do sistema viário precário (URBEL,

1998; URBEL 2009).

Conforme abordado anteriormente, a URBEL elaborou em 1998 o Plano Global

Específico (PGE) da Pedreira Prado Lopes, viabilizado pelo Orçamento Participativo de

1997-98 (BELO HORIZONTE, 2009b). Cabe ressaltar que a comunidade foi pioneira desse

estudo, que tem como proposta, orientar a intervenção do poder público quanto aos

investimentos que visem a melhoria das condições de habitação, estabelecendo a

hierarquização das ações e obras. Para isso o PGE pauta-se em três eixos: a recuperação

urbanístico-ambiental; a regularização fundiária e o desenvolvimento sócio-organizativo

(BRADENBERGER, 2005).

Como já citado, a Pedreira Prado Lopes é uma das seis favelas que receberam recurso

do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) através do Programa Vila Viva. O

investimento na comunidade é da ordem de R$37,4 milhões (BELO HORIZONTE, 2009b).

Dentre as obras previstas estão a reestruturação urbanística – com a restauração dos espaços

urbanos (áreas de lazer, erradicação das áreas de risco); a requalificação do sistema viário –

com o alargamento de ruas e becos e abertura de novas vias; a construção de 272 unidades

habitacionais; ampliação das condições de saneamento e meio-ambiente, além do

desenvolvimento sócio-organizativo – que contempla ações de organização e mobilização

comunitária, educação ambiental e fomento às atividades de geração de trabalho e renda

(BELO HORIZONTE, 2009e; URBEL, 2009).

O objetivo desse estudo é propor uma reflexão acerca dos impactos nos modos de vida

a partir das obras de intervenção do PAC/ Vila Viva na Pedreira Prado Lopes, com destaque

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para o reassentamento em Unidades Habitacionais. Para isso, utilizamos entrevistas com foco

na história oral de vida de moradores da Pedreira Prado Lopes, entrelaçados com os conceitos

teóricos apresentados a seguir.

4.4 Favela e os modos de vida

A favela é cenário e espaço de inúmeros fenômenos urbanos. O fato de conviver e

coabitar com cidade formal, suas ocupações indesejáveis não somente “comprometem” o

planejamento urbano e suas características arquitetônicas cartesianas, mas aponta as falhas do

Estado em garantir acesso a políticas públicas para minimizar as fendas históricas da

desigualdade. Mais do que isso, a favela é parte do fenômeno urbano, embora sejam

constantes as tentativas de negação.

Wirth (1936) nos aponta que o urbanismo altera a concepção de cidade e os modos de

vida dos sujeitos que nela vivem. A concentração no lócus urbano, devido às maiores ofertas

de serviços e tecnologia acaba por influenciar individual e coletivamente os grupos. As

relações sociais são alteradas na medida em que expandem-se os limites territoriais. De modo

análogo, Guattari (1994) nos mostra que os limites não são marcados somente pela carta, mas

pelas subjetividades. Conforme o autor:

O ser humano contemporâneo é fundamentalmente um ser desterritorializado. Seus territórios existenciais originais – corpo, espaço doméstico, clã, culto – não estão mais plantados em solo estável, mas integram-se – desde agora – em um mundo de representações precárias e em constante movimento. (GUATTARI, 1994, p.9).

Nesse sentido, a urbe não é mais a base cartográfica que a concebeu – no caso de Belo

Horizonte uma planta que assemelhava-se a um tabuleiro de xadrez, e que a dividia em área

urbana, suburbana e rural. Na contemporaneidade, os territórios são fluidos, não há fronteiras

que delimitem o seu espaço; agora há linhas de fuga e características rizomáticas que

compõem a trama urbana e que vão impactar nas subjetividades e nos modos de vida.

(GUATTARI, 1994; DELEUZE & GUATTARI, 1995).

Para Wirth (1936), o urbanismo como modo de vida tem três características que se

inter-relacionam: 1) é constituída de uma estrutura física que acolhe na sua base a população,

tecnologia e ecologia; 2) tem um sistema de organização social e comunitária próprios, com

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modelos de relações sociais e instituições assimiladas ao seu contexto; 3) tem atitudes e

personalidades que refletem o coletivo e são objetos de controle social. Com efeito, embora as

favelas apresentem semelhanças, cada comunidade tem características que as tornam

diferentes, refletindo os modos de vida que ali se observam (WIRTH, 1967).

Guattari (1985) aponta que os territórios, apesar de coletivos, reproduzem a solidão.

Mesmo com a intensa comunicação, sobretudo pela via da mídia, os sujeitos se vêem

frequentemente num contexto de isolamento. A busca de semelhantes e a afiliação aos grupos

servem então à territorialidade/ desterritorialidade, conforme o nível social e os sentimentos

de pertencimento. A cidade é um campo de territórios existenciais, que passam do limite

cartográfico às subjetividades, sem uma “fronteira” que delimite claramente essas noções de

espaço. Para Simmel (1902):

A característica mais significativa da metrópole é essa extensão funcional para além de suas fronteiras físicas. E essa eficácia reage por seu turno e dá peso, importância e responsabilidade à vida metropolitana. O homem não termina com os limites de seu corpo ou a área que compreende sua atividade imediata. O âmbito da pessoa é antes constituído pela soma de efeitos que emana dela temporal e espacialmente. Da mesma maneira, uma cidade consiste em seus efeitos totais, que se estende para além de seus limites imediatos. (SIMMEL, 1967, p. 23,24, grifo nosso).

A exemplo da Pedreira Prado Lopes e outras tantas favelas que constituem a urbe, o

que importa não são mais os limites territoriais que se impõem, mas as relações e as

subjetividades que compõem a comunidade. Conforme relata uma das entrevistadas: “(...) não

importa onde você mora, mas sim o que você é, sabe? Então não tem como eu esconder.

Importa eu morar lá no Belvedere e ser de um jeito diferente? Eu moro na Pedreira e sou

assim, tenho o maior orgulho sim, pela história da Pedreira, porque não é todas as favelas

que tem história igual a essa, sabe; é onde começou o samba em Belo Horizonte, eu sei que

foi aqui em cima na Pedreira; sei também, a gente vai crescendo sabendo que tirou as pedras

foi daqui, sabe? Sei muita coisa (...) tudo bem que tem altos e baixos, mas eu procuro sempre

valorizar os altos (...)”. A partir desse fragmento é possível perceber que as relações são

marcadas pela territorialidade/ desterritorialidade que ultrapassam os limites físicos.

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4.5 Favela, biopoder e sociedade controle

As relações de poder também se manifestam no contexto das favelas. Para trazer à

tona essa discussão, tomemos como referência o conceito de biopoder articulado por Foucault

(1988). Desde a antiguidade, a função soberana do governo era gerir os povos; ao Soberano

era reservado o direito de decidir sobre o direito de vida e morte das pessoas. Em nome da

honra de uma nação, era concebível entregar os seus soldados para lutar e morrer em frentes

de batalha ou dizimar nações que representassem ameaça ao poder instituído (FOUCAULT,

1988).

Segundo Foucault (1988), o poder sobre a vida desenvolveu-se a partir do século XVII

com o que ele chama de poder disciplinar. A disciplina sobre os corpos, que por sua vez eram

tratados como máquinas suscetíveis ao esquadrinhamento para elevá-los à máxima

produtividade, encontrou nas instituições (prisões, escolas, indústrias) a perfeita representação

do poder disciplinar. No século XVIII, o controle do corpo foi também atravessado pelos

processos biológicos: natalidade, fecundidade – “uma bio-política da população”

(FOUCAULT, 1988, p.152). Conforme o autor:

A velha potência de morte em que se simbolizava o poder soberano é agora, cuidadosamente, recoberta pela administração dos corpos e pela gestão calculista da vida. Desenvolvimento rápido, no decorrer da época clássica, das disciplinas diversas – escolas, colégios, casernas, ateliês; aparecimento, também, no terreno das práticas políticas e observações econômicas, dos problemas de natalidade, longevidade, saúde pública, habitação e migração; explosão, portanto, de técnicas diversas e numerosas para obterem a sujeição dos corpos e o controle das populações. Abre-se, assim a era de um “bio-poder”. (FOUCAULT, 1988, p.152).

Em “O nascimento da medicina social” Foucault (1974) nos traz que a expansão do

capitalismo e o consequente controle da sociedade não se dão somente através da política e

das ideologias, mas através do controle sobre o corpo e das populações – biopoder. Dessa

forma, o corpo é um instrumento bio-político e a medicina uma estratégia bio-política.

(FOUCAULT, 1974). A seguir, o autor nos traz o desenvolvimento da medicina social em

três sociedades: a medicina de Estado, desenvolvida na Alemanha no século XVIII; a

medicina urbana, na sociedade francesa do século XVIII e a medicina da força de trabalho,

desenvolvida na Inglaterra no século XIX. Por trazer elementos convergentes com o foco

desse estudo, enfatizaremos a medicina urbana, articulada por Foucault (1974).

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A medicina urbana se desenvolveu na França, no século XVIII, a partir do

desenvolvimento da urbanização. O contexto urbano francês refletia a organização política da

época – descentralização do poder e da economia. Era preciso então um plano de unificação

do Estado. Por razões econômicas e políticas fazia-se necessário concentrar o poder e com

isso regular a população. A economia capitalista, com foco crescente na produção, demandava

a unicidade do poder estatal, enquanto a política buscava vias de controlar a plebe e as

crescentes manifestações de revolta urbana, decorrentes da precariedade das condições de

vida associadas à urbanização (FOUCAULT, 1974).

Nesse cenário, a saúde pública ganha destaque sob a forma de uma “angústia diante da

cidade” (FOUCAULT, 1974, p.51). Isso porque as aglomerações urbanas representavam não

somente fenômenos políticos, mas alterações na saúde da população.

Nasce o que chamarei medo urbano, medo da cidade, angústia diante da cidade que vai se caracterizar por vários elementos: medo das oficinas e fábricas que estão se construindo, do amontoamento da população, das casas altas demais, da população numerosa demais; medo, também, das epidemias urbanas, dos cemitérios que se tornam cada vez mais numerosos e invadem pouco a pouco a cidade; medo dos esgotos, das caves sobre as quais são construídas as casas que estão sempre correndo o perigo de desmoronar. (FOUCAULT, 1974, p.51).

A medicina urbana consistia em três eixos ou objetivos: a análise dos lugares de

acúmulo e amontoamento que poderiam servir à proliferação de doenças infecto-contagiosas

(epidemias) – que incidiu principalmente no intenso esquadrinhamento dos cemitérios

públicos e a classificação dos mortos. A característica principal desses cemitérios era o

amontoamento dos corpos, sem critérios de identificação ou organização. A preocupação na

identificação e “contenção” dos mortos era de ordem político-sanitária – era preciso proteger

os vivos da contaminação dos falecidos, daí a necessidade de organização fúnebre e a

constituição dos cemitérios tal como conhecemos hoje, na cultura Ocidental: caixões

enfileirados, lápides e outras práticas higienistas (FOUCAULT, 1974).

O segundo objetivo da medicina urbana era o de controle de circulação, não de

indivíduos, mas de ar e água. Isso baseado na crença de que a qualidade do ar – úmido, seco,

frio, quente – influenciava diretamente no organismo humano e, dependendo das

características e da circulação do ar, poderia ser patogênica à vida urbana (FOUCAULT,

1974).

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O terceiro objetivo da medicina urbana era a organização das distribuições e

sequências. Essa organização referia-se aos sistemas de drenagem e esgotamento sanitário. No

intuito de estabelecer condições e critérios para a salubridade da vida urbana, a rede

hidrográfica das urbes francesas constituía preocupação do poder público. Essa preocupação

culminou em um Plano Hidrográfico de Paris, em 1742, que mapeava a rede fluvial e os

sistemas de drenagem. Com efeito, à época da Revolução Francesa, em 1789, “a cidade de

Paris já tinha sido esquadrinhada por uma polícia médica urbana que tinha estabelecido o fio

diretor do que uma verdadeira organização de saúde da cidade deveria realizar.”

(FOUCAULT, 1974, p.54).

Trazendo os aspectos da medicina urbana para os dias atuais, pode-se perceber no

Plano Global Específico (PGE) da Pedreira Prado Lopes algumas semelhanças. A análise de

acúmulos ou amontoados remete-nos à destinação do lixo na comunidade, constituindo há

tempos uma questão problemática para os serviços públicos de limpeza urbana.

Sobre o controle de circulação de água e ar, o adensamento das edificações na Pedreira

Prado Lopes, além de ‘comprometer’ a estética urbana, implicam também na ventilação e

consequentemente na saúde da população. No que diz respeito aos sistemas de drenagem e

esgotamento sanitário da Pedreira Prado Lopes, encontramos alguns pontos críticos, onde há

esgoto a céu aberto. A insuficiência das redes de esgotamento sanitário propicia o acúmulo de

dejetos e as condições insalubres. Sobre um dos pontos críticos na comunidade, o PGE aponta

o seguinte:

(...) Trata-se de uma área de encosta sujeita a deslizamentos e de onde já foram removidas algumas famílias em situação de risco. A rede de esgoto está rompida há bastante tempo e o volume de esgoto que escoa a céu aberto é significativo, bem como o lixo acumulado, causando insalubridade, mau cheiro, proliferação de ratos e outros vetores. (URBEL, 1998, p.40).

A medicina urbana, mais do que uma manifestação do biopoder a que Foucault (1974)

nos afere, traz também elementos da sociedade controle, articulada por Deleuze (1992).

Substitutiva da sociedade disciplinar (FOUCAULT, 2004), a sociedade controle não mais

opera com dispositivos disciplinares, mas com modulação, capazes de controlar toda a

sociedade, de modo sutil e extremamente eficaz. Com a crise das instituições disciplinares,

era necessário criar novas formas de regulação das massas, a que a sociedade controle executa

de sobremaneira.

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Ao passo que os diferentes modos de controle, os controlatos, são variações inseparáveis, formando um sistema de geometria variável cuja linguagem é numérica (o que não quer dizer necessariamente binária). Os confinamentos são moldes, distintas moldagens, mas os controles são uma modulação, como uma moldagem auto-deformante que mudasse continuamente, a cada instante, ou como uma peneira cujas malhas mudassem de um ponto a outro. (DELEUZE, 1992, p.221).

A habitação não foge à sociedade controle. Reconhecendo-se a capacidade de

consumo das classes C e D, não raro moradores de favelas, torna-se imperativo inseri-los na

cidade formal, imputando-lhes altos padrões de consumo condizentes com o processo de

urbanização.

(...) a cidade desencoraja uma vida econômica na qual o indivíduo, numa época de crise, tenha uma base de subsistência à qual recorrer, e desencoraja o emprego autônomo. (...) A casa própria envolve maiores ônus e é mais rara. Os aluguéis são maiores e absorvem uma proporção maior da receita. Apesar do habitante da cidade se ver beneficiado com muitos serviços comunais, gasta-se uma grande proporção da sua renda com itens como recreação e aperfeiçoamento da educação e uma proporção menor com alimentos. (WIRTH, 1967, p.119).

Pretendendo investigar os possíveis impactos nos modos de vida dos moradores de

favela, especificamente da Pedreira Prado Lopes, acreditamos que o conceito de sociedade

controle (DELEUZE, 1992) traz elementos que podem ser articulados à urbanização e aos

modos de vida (WIRTH, 1967). Para tanto, usamos categorias de análise para servir de

fomento a essa discussão.

4.6 Da análise dos dados

A fase de análise de dados é parte fundamental do processo de pesquisa, pois permite a

interlocução entre o referencial teórico e o que foi observado na prática. A análise dos dados

abrange a sua interpretação e deve ser uma constante durante a trajetória do pesquisador

(GOMES, 1994). Nesse estudo, optamos por categorizar as informações, conforme nos aponta

o autor:

As categorias são empregadas para se estabelecer classificações. Nesse sentido, trabalhar com elas significa agrupar elementos, idéias ou expressões em torno de um conceito capaz de abranger tudo isso. Esse tipo de procedimento, de um modo geral,

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pode ser utilizado em qualquer tipo de análise em pesquisa qualitativa. (GOMES, 1994, p.70).

Nesse relato, destacaremos as seguintes categorias para análise:

Visão da intervenção urbana pelos moradores: limites e potencialidades;

A favela como modo de vida: o orgulho de ser “favelado”;

Urbanização, modos de vida e sociedade controle.

4.6.1 Visão da intervenção urbana pelos moradores: limites e potencialidades

Com essa categoria procuramos identificar, entre muitas variáveis, os limites e

potencialidades das obras de intervenção na Pedreira Prado Lopes, apontados pelos próprios

moradores. Como potencialidade, Vitor7 nos fala da possibilidade de trabalho e geração de

renda na comunidade - isso porque parte da mão-de-obra da construção civil é composta por

moradores da própria Pedreira; Vitor também indica como ponto favorável a construção das

UH’s pelos trabalhadores que serão futuros moradores, o que aumenta a sensação de

pertencimento. Outra potencialidade, dessa vez apontada por Aline, diz respeito à melhora nas

condições de moradia:

“A minha casa era horrível. A minha casa era tipo aquela da música, a minha casa não

tinha nada, não tinha porta, não tinha parede, não tinha nada. Agora tem uma porta, tem

parede, tem o chão, porque lá não tinha. E a minha casa não estava em área de risco não, é

porque ia passar a rua então, graças a Deus, que passou a rua lá e me tirou.”

Como limite, os moradores apontaram a falha na articulação dos serviços públicos

oferecidos à população, agravado pelas obras de intervenção. Após o reassentamento em UH,

a adaptação ao novo imóvel pode se dar de forma rápida ou mais lenta, conforme as

expectativas anteriores. Vitor nos relata que gostou da UH, mas transparece em suas falas, a

falta de um espaço que possa servir aos hábitos anteriores – fazer churrasco com os amigos,

ouvir som alto ou ter um animal de estimação. Mas, logo após indicar o que parece lhe fazer

falta, entre resignação e aceitação ele nos diz que ‘tudo é uma questão de adaptação’. Já

Aline, revela-nos exultante que a mudança para UH foi algo muito desejado por ela e seus

7 Nomes trocados para preservar a identidade dos entrevistados.

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filhos; diz ainda que se preparou para o reassentamento, comprando materiais de acabamento

para o novo imóvel, como cerâmica e tinta para as paredes, além de móveis novos.

4.6.2 A favela como modo de vida: o orgulho de ser “favelado”

Durante a pesquisa, nos deparamos com inúmeros relatos que transpareciam o orgulho

de ser morador da Pedreira Prado Lopes. A favela, ao mesmo tempo que carrega um estigma,

é também motivo de orgulho. Desde a concepção da pesquisa, marcou-nos o orgulho de

alguns moradores em identificarem a sua origem; contrapôs-se a esses depoimentos os relatos

de moradores que omitem o lugar de origem, por implicar restrições de acesso. Diante da

contradição e procurando destacar a condição de morador de favela, reproduziremos o termo

“favelado” entre aspas, ressaltando que há um desconforto, principalmente no meio

acadêmico, em reproduzi-lo.

“(...) mas eu graças a Deus, não tenho nem nome negativo no mercado; então repetindo, sou

“favelado” porque moro, não na falta de educação; muitos outros, ao contrário, são

“favelados” na mente, porque tem a mente menos evoluída, são pessoas mais porcas em

certo linguajar (...) então esse é o “favelado” de mente, é o “favelado” que não sabe como

agir aí fora.” (João).

Wirth (1936) nos fala sobre os laços afetivos construídos no lócus urbano, laços esses

que nem sempre são consanguíneos, mas pressupõem uma afinidade, e que por vezes

substituem os laços parentais. Como d. Yvone nos diz: “(...) porque quase todo mundo era

quase uma família só; e os que não eram (da) família eram vizinhos muito chegados, mas

toda vida é assim – cada um na sua casa, a criação foi essa, mas todo mundo conhecia todo

mundo e nisso tivemos toda vida um bom relacionamento com os vizinhos.”

Em virtude da ineficácia de laços reais de parentesco, criamos grupos fictícios de parentesco. Em face do desaparecimento da unidade territorial como base da solidariedade social, criamos unidades de interesse. Enquanto isso, a cidade como comunidade decompõe-se numa série de relações segmentárias tênues, sobrepostas a uma base territorial com um centro definido, mas sem uma periferia definida, e a uma divisão do trabalho que transcende bastante a localidade contígua, e é universal em extensão. (WIRTH, 1967, p.120).

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4.6.3 Urbanização, modos de vida e sociedade controle

A urbanização traz alterações nos modos de vida dos indivíduos e, num contexto mais

amplo, de grupos populacionais. Uma das importantes alterações diz respeito à inclusão no

urbanismo. Isso porque, mesmo que a favela faça parte do cenário urbano, os seus moradores

muitas vezes não são reconhecidos como tal. A sua participação e atuação na sociedade é

muitas vezes restringida à margem. No tocante a esse aspecto, as obras de urbanização das

vilas e favelas intencionam incluir os moradores na cidade formal. Diz-se inserção a

possibilidade de cidadania, reconhecida sobretudo através do direito a moradia. Mas a lógica

da inclusão não pretende somente garantir direitos, mas estimular o consumo de uma

população que tem representativo potencial de compra. A esse respeito Wirth (1936)

argumenta:

Aquilo que os serviços da comunidade não oferecem, o habitante urbano é obrigado a comprar, e pode-se dizer que praticamente não existe nenhuma necessidade humana que deixou de ser explorada pelo comercialismo. Fornecer emoções e meios de escapar ao tédio, à monotonia e à rotina torna-se, pois, uma das principais funções da recreação urbana, a qual, na melhor das hipóteses, fornece meios para a auto-expressão criadora e a associação dos grupos, mas que, mais tipicamente no mundo urbano, resulta em contemplação passiva, por um lado, ou sensacionais façanhas inéditas, por outro. (WIRTH, 1967, p. 119).

Na sociedade controle, importa a capacidade que um indivíduo tem de consumir.

Conforme nos mostra Deleuze (1992), “a linguagem numérica do controle é feita de cifras,

que marcam o acesso à informação, ou a rejeição (...). Os indivíduos tornaram-se “dividuais”,

divisíveis, e as massas tornaram-se amostras, dados, mercados ou “bancos”.” (p.222, grifos do

autor). Para que se tenha uma noção do que representa a inclusão dos moradores na sociedade

controle, tomemos os relatos de Aline e Vitor. Eles nos dizem que após o reassentamento,

passaram a usufruir de prestação de serviços e de comércio, antes restringidos devido ao local

em que moravam. Os entrevistados dizem que agora é possível pedir pizza e solicitar a

entrega na residência; também é possível pedir ao taxista que espere na porta – o que pode

parecer irrisório para alguns adquire status de reconhecimento para eles. D. Yvone nos aponta

que o acesso ao consumo é algo positivo e diretamente relacionado às obras. “Eu não sei, mas

pode ser que meus filhos alcancem aqui um Carrefour, um Supernosso, porque você acha que

eles vão perder de abrir aqui um Carrefour, um Supernosso (?)” (d. Yvone.).

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É com essa fala que encerramos a análise dos dados, pontuando que essa análise, no

entanto, abre às reflexões e discussões. De fato, há muitos elementos que podem ser trazidos à

tona e que servem de fomento à novas pesquisas sobre o tema. Não sendo possível abranger a

magnitude e a complexidade da urbanização e os impactos nos modos de vida dos moradores

de vilas e favelas, esse estudo pretendeu ressaltar alguns elementos para análise, articulando-

os nas categorias acima destacadas.

5- CONCLUSÃO

Esse trabalho buscou compreender se/e de que maneiras as obras de intervenção

podem impactar nos modos de vida de moradores de vilas e favelas. Para isso, utilizamos o

exemplo da Pedreira Prado Lopes e as intervenções do Programa Vila Viva/PAC. Conforme

dito, a escolha da comunidade se deu pelo interesse da aluna pesquisadora em compreender,

ainda que parcialmente, os modos de vida existentes no interior da favela e as mudanças

decorrentes do processo de urbanização. Por ser um tema ainda pouco discutido pela

Psicologia, buscamos em outros autores, sobretudo das ciências sociais, elementos que

pudessem enriquecer a nossa discussão.

Buscando alicerçar a discussão sobre os dados obtidos na pesquisa de campo, fizemos

um breve levantamento da história de Belo Horizonte atrelada ao início da ocupação da

Pedreira Prado Lopes. Por ser uma das favelas mais antigas de Belo Horizonte, a história da

Pedreira em muitos momentos converge com a história da capital, entrecruzando-se. Traçando

um breve panorama, foi possível perceber que as favelas fazem parte do cenário urbano desde

o seu princípio, apesar de estarem às margens tanto no sentido literal quanto simbolicamente.

A falta de padronização urbanística das favelas abriu campo às justificativas “remocionistas”

do poder público, argumentando-se que as favelas eram ocupações irregulares e foco de toda

sorte de moléstias e criminalidade, comprometendo assim, a saúde e a segurança dos

habitantes da cidade formal. Era preciso, portanto, removê-las do cenário urbano, para

restituir a salubridade e a paz da urbe.

A partir dos dados obtidos, fez-se uma análise dos mesmos, estabelecendo para isso

algumas categorias de análise. Da pesquisa de campo inferiu-se alguns apontamentos: as

obras de intervenção urbana repercutem nos modos de vida dos moradores; nesse sentido, os

entrevistados nos mostraram nas suas falas grande expectativa relacionada à urbanização da

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Pedreira Prado Lopes, que incluía desde melhorias nas condições de infra-estrutura até o

direito à dignidade e reconhecimento. Na observação participante, foi possível perceber

também o sofrimento associado às intervenções das obras – é como se cada casa demolida

representasse um pedaço do corpo: demolindo a casa, tornava-o fragmentado, ruía-o; aqui não

só as casas removidas causavam descontentamento, mas as relações de amizades constituídas

no interior dos becos que se perderam em nome da coletividade e do bem-comum.

Ressaltamos que não é possível fazer julgamento de valores quanto às intervenções, dada a

complexidade do tema; antes, a urbanização de vilas e favelas deve ser discutida de diversos

ângulos, com foco em diferentes aspectos, buscando a complementaridade e a discussão dos

focos de análise.

A partir dos dados obtidos e a articulação com o material bibliográfico, vimos que a

urbanização serve à sociedade controle e ao biopoder. Nesse tocante, um dos objetivos das

intervenções das obras é inserir os moradores na cidade formal, garantindo-lhes o direito à

propriedade e à moradia em condições salubres, além de incentivar o aumento do consumo e

o controle das populações, decorrente da aproximação aos padrões urbanísticos da urbe. A

cidadania na sociedade controle está diretamente relacionada à capacidade de consumir dos

habitantes da metrópole. Pode-se dizer também que o biopoder encontra repercussão na

urbanização – as UH’s construídas servem a um modelo de família que interessa à urbe – com

poucos membros e adaptáveis aos novos espaços. Além disso, a nova configuração das vias

de circulação e das moradias atende aos aparelhos de Estado – nesse sentido, a abertura de

ruas e becos favorece não somente a circulação de ar e água, mas a atuação mais efetiva das

instituições de poder, sobretudo as polícias. Também a urbanização serve como importante

instrumento político, sendo as moradias importantes meios de intervenção política.

No que diz respeito ao processo de pesquisa, faz-se importante tecer alguns

comentários. Esse trabalho não tem como objetivo encerrar-se; antes intenciona-se abrir novas

questões, ampliar as discussões existentes sobre o tema. Das perguntas que motivaram o tema,

outras surgiram ao longo desse percurso, inquietando, acenando para novas reflexões e

diálogos, destacando-se aqui a importância da ética nas políticas públicas. Entretanto,

reconhecendo-se aqui os limites dessa pesquisa, ressalta-se que essa conclusão não representa

o fim, mas uma nova direção...

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6- REFERÊNCIAS

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DA FAVELA AO RESIDENCIAL: Reassentamentos populares e modos de vida

RESUMO

Este estudo tem como objetivo investigar de que maneira as obras de intervenção do

Programa Vila Viva com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)

impactam nos modos de vida dos moradores de vilas e favelas. Como lócus de estudo elegeu-

se a Pedreira Prado Lopes - uma das seis favelas em Belo Horizonte cuja intervenção do Vila

Viva prevê a urbanização – alargamento de becos e vias, obras de drenagem, saneamento e

reassentamento em Unidades Habitacionais (UH’s) – sendo este último foco desse estudo.

Para introduzir a discussão sobre a urbanização das vilas e favelas, fez-se um

levantamento bibliográfico contextualizando o surgimento e o crescimento das favelas em

Belo Horizonte; também traçamos um breve panorama do desenvolvimento das políticas

urbanas no século XX na capital, remetendo as ações do poder público nos espaços

favelizados da urbe.

Feito esse recorte, este trabalho pretendeu apresentar os dados obtidos em campo

através da pesquisa. Por se tratar de um estudo qualitativo, as técnicas utilizadas privilegiaram

o conhecimento dos moradores acerca da intervenção urbana na Pedreira Prado Lopes, suas

impressões e reflexões, buscando articular o conhecimento produzido, gerando daí um

diálogo entre a teoria e o que se observou na prática.

Ressalta-se que os resultados obtidos não encerram a discussão existente sobre a

urbanização de vilas e favelas e os impactos nos modos de vida dos seus moradores; antes,

abre-se a novos diálogos e análises que tenham como objetivo uma atuação mais ética no que

tange às intervenções urbanas.

Palavras-chave: Programa Vila Viva/PAC; urbanização de vilas e favelas; modos de vida.

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PARECER DO ORIENTADOR

Belo Horizonte, 11 de maio de 2010 À ABEP Venho por meio deste recomendar o Trabalho de Conclusão de Curso de minha orientanda Patrícia Fabiana Moura, intitulado – Da Favela ao Residencial: Reassentamentos populares e modos de vida, para concorrer ao Premio Silvia Lane. O trabalho foi desenvolvido no curso de Psicologia da PUC Minas São Gabriel, durante o ano de 2009. O trabalho discute uma temática de grande relevância social para a Psicologia. Além disso, seu texto é bem escrito, coerente metodologicamente e consistente teoricamente Atenciosamente

Márcia Mansur Saadallah Orientadora de Monografia – PUC Minas São Gabriel

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MEMORIAL

Graduada em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais8, a

minha formação converge para a busca de elementos e análises que contextualizem a

dinâmica sócio-espacial e os atravessamentos nos modos de vida do homem moderno no

lócus urbano. A partir da minha experiência profissional em Autarquias Municipais9 em Belo

Horizonte, o meu interesse de pesquisa voltou-se com mais veemência para os processos de

urbanização de vilas e favelas e reassentamento de famílias oriundas desses espaços. Nesse

sentido, desenvolvi durante o ano de 2009 um estudo10 cujo objetivo foi investigar os

impactos nos modos de vida dos moradores da Pedreira Prado Lopes decorrentes das obras de

intervenção previstas no escopo do Programa Vila Viva com recursos do PAC. Os resultados

da pesquisa apontaram impactos diversos – alteram-se os espaços, transformam-se ali as

vidas...

Entendendo que esses espaços – que aqui incluem tanto o público quanto o privado –

podem modificar a forma como o homem se posiciona nas relações, pretendo dar

continuidade ao processo de pesquisas e questionamentos que me afetam e permeiam a minha

trajetória profissional. Para isso, elegi o Programa Vila Viva em Belo Horizonte como campo

de intervenção; sua abrangência e amplitude fornecem elementos que contribuem de

sobremaneira para a construção do relatório de pesquisa que ora apresento.

8 Conclusão do curso em dezembro de 2009. 9 Experiência de estágio na SUDECAP, entre 2007/2008 e, mais recentemente, no Programa Vila Viva na Pedreira Prado Lopes (2009 – atual). 10 MOURA, Patrícia Fabiana. DA FAVELA AO RESIDENCIAL: reassentamentos populares e modos de vida. 2009. 67fls. Monografia (conclusão de curso). Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Departamento de Psicologia, Belo Horizonte.