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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 Produção Didático-Pedagógica Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7 Cadernos PDE VOLUME I I

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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE

2009

Produção Didático-Pedagógica

Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7Cadernos PDE

VOLU

ME I

I

SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO Superintendência da Educação

Diretoria de Políticas e Programas Educacionais Programa de Desenvolvimento Educacional

UNIDADE DIDÁTICA

Formas de Ocupação do Espaço Urbano e as Estratégias para

Criação e Reorganização dos Espaços

Autora: Viviane Rodrigues de Lima Passos

Londrina, 2010.

Formas de ocupação do espaço urbano e as estratégias para

criação e reorganização dos espaços

A análise da ocupação do espaço urbano enfatiza a apropriação do

meio natural pelo homem, causando significativas mudanças na produção do

espaço. Dessa forma, a cidade é entendida como um espaço mutável que se articula

e modifica-se conforme a atuação e interesses dos diferentes agentes sociais que a

compõe, o que refletirá em espaços desiguais, devido aos aspectos referentes à

valorização que farão do solo um bem de acesso seletivo.

Até que ponto se compreende os conflitos e interesses das mais

diversas classes sociais na ocupação de um lugar comum?

Qual a relação existente entre a apropriação do meio natural através

da criação de redes de transformação e circulação lucrativa de mercadorias,

pessoas, informações e capitais, e as constantes e intensas mudanças na produção

do espaço?

Essa rede de transformação e circulação cria espaços econômicos

desiguais? Influencia nas decisões de planejamento e organização espacial?

Figura 1 – Vista de Paris (FR)

Fonte: Passos, Emanuelle de Lima, setembro de 2009.

Figura 2 - Área central de Londrina - década de 1950

Vista parcial aérea de Londrina na década de 1950, mostrando ao fundo a Catedral antiga da cidade e os primeiros edifícios construídos em seu entorno.

Fonte: Museu Histórico de Londrina “Pe. Carlos Weiss”.

Figura 3 – Área central de Londrina - ano de 1986

A característica fundamental do processo de produção da cidade é a

produção de um bem, fruto do processo social de trabalho enquanto processo de

valorização, que vem sob a forma de mercadoria e se realiza através do mercado.

Desse modo, o espaço vai se apresentando como um produto social em constante

processo de reprodução que se dá mediante a reprodução das relações sociais via

divisão social do trabalho.

Veja nas figuras 2 e 3 as diferenças ocorridas no espaço urbano da

área central de Londrina entre uma década e outra. Por ser um produto social,

diversos agentes de maneira complexa, vão provocando constantemente um

processo de reorganização espacial, que se faz via incorporação de novas áreas ao

espaço urbano, densificação do uso do solo, deterioração de certas áreas,

renovação urbana, realocação diferenciada da infra-estrutura e mudança do

Vista parcial aérea do centro da cidade de Londrina na década de 1980 (ano de 1986), no entorno da Igreja

Matriz.

Fonte: Museu Histórico de Londrina “Pe. Carlos Weiss”.

conteúdo social e econômico de determinadas

áreas da cidade (CORRÊA, 1989, p.12).

Atentamos para o fato de que

uma cidade criada na década de 1930 apresenta

em poucos anos mudanças significativas em sua

configuração, com a construção principalmente

de inúmeros edifícios, que começam a pontuar a

área central da cidade ainda na década de 1950.

Vemos de acordo com as gravuras, que a

construção de edifícios aumenta

consideravelmente entre as décadas seguintes,

alterando o modo de vida, gostos e preferências

da população, formando ainda campo propício

para a especulação imobiliária (CORRÊA, 1989).

Como a sociedade está sempre

em movimento, de tempos em tempos

aparecerão espaços diferentes numa mesma

configuração territorial, reafirmando que o

espaço urbano é um produto da formação social

nos diferentes momentos de seu

desenvolvimento. Nesse caso, a cidade assume

o comando espacial: de um lado articulando e

determinando a divisão espacial do trabalho

através da articulação não só da rede urbana,

mas também determinando o papel do campo no

processo geral de produção espacial; e de outro

possibilitando as condições gerais necessárias

ao desenvolvimento do processo de produção

capitalista (CARLOS, 1982).

Diante do aumento populacional e em meio à complexidade de

atividades econômicas e sociais realizadas na cidade, quais os caminhos

encontrados e utilizados para atender à necessidade de expansão? Quais os

agentes envolvidos no processo de produção e reprodução do espaço urbano?

Sendo a terra uma mercadoria, a abertura de loteamentos encontra

Especulação imobiliária é a

compra ou aquisição de

bens imóveis com a finalidade

de vendê-los ou alugá-

los posteriormente, na

expectativa de que seu valor de

mercado aumente durante o

lapso de tempo decorrido.

Se uma pessoa, empresa, ou

grupo de pessoas ou de

empresas compra imóveis, em

grandes áreas ou quantidades e

numa mesma região, isto eleva

a demanda de imóveis no lugar,

e, por consequência, há um

aumento artificial dos preços de

todos os imóveis daquela

região (segundo a lei de oferta

e procura).

http://pt.wikipedia.org/wiki/Esp

eculação_imobiliária

Nesse sentido entendemos que

a especulação imobiliária, é

caracteriza pela

distribuição coletiva dos custos

de melhoria das localizações,

mas em contrapartida há uma

apropriação privada dos lucros

provenientes dessas melhorias.

mercado para os especuladores, que investem na mesma, sabendo que esta será

valorizada com a introdução posterior de serviços públicos de consumo coletivo.

Nesse sentido, questiona-se: em que ritmo e em que áreas são implantados tais

serviços? Qual o papel do poder público na determinação do preço de cada área, na

valorização do solo? De que forma o espaço urbano vai sendo planejado e criado na

perspectiva de garantir a reprodução da força de trabalho e do capital?

O Espaço Urbano

Antes mesmo de analisarmos a produção e reprodução do espaço

urbano, precisamos nos apropriar da compreensão desse espaço, que diz respeito

ao complexo conjunto de usos da terra, ou ainda, à organização espacial da cidade.

Este mesmo espaço que Santos (1988) caracteriza como “[...] um

conjunto de formas contendo cada qual frações da sociedade em movimento”, sendo

ainda: “[...] totalidade verdadeira, porque dinâmica, resultado da geografização da

sociedade sobre a configuração territorial” (SANTOS, 1988, p.77), e que Lefebvre

(2001) expõe como sendo o espaço da racionalidade, da produção e da reprodução,

da ideologia, do poder e das possibilidades de superação dos conflitos e

contradições internos da relação capital-trabalho.

De acordo com Bessa; Silva; Soares (1996), historicamente o

espaço das cidades tem sido destinado a cumprir funções específicas, que variam

segundo as necessidades das organizações sociais, em que a utilização do solo

urbano tem sido submetida apenas aos interesses capitalistas.

Deste modo, a organização espacial das cidades capitalistas, é

entendida como “[...] um produto social, resultado de ações acumuladas através do

Atividades:

1- Faça uma pesquisa sobre as formas de apropriação do espaço pelo homem no

seu bairro ou cidade, avaliando as mudanças ocorridas na produção do espaço

em decorrência dessa interferência.

2- Que razões e interesses determinaram ou influenciaram no planejamento e

organização do seu bairro ou cidade?

tempo, e engendradas por agentes que produzem e consomem espaço” (CORRÊA,

1989, p.11), de modo que este vai sendo constantemente reorganizado.

Para Lefebvre (1991) essas ações ainda viabilizam o propósito da

sociedade capitalista dominante, ou seja, a reprodução das relações de produção e

a manutenção do processo cumulativo de capital, em que o espaço urbano constitui-

se em instrumento que garante esses propósitos. Dessa forma, a reprodução do

espaço urbano recria, constantemente, as condições básicas a partir das quais se

realiza o processo de reprodução do capital.

Nesse aspecto, a cidade vai sendo entendida como o locus

privilegiado da concentração, produção e reprodução do capital e da força de

trabalho, onde as transformações sócio-espaciais são reguladas pela lógica da

acumulação de capital. Num processo infindável, a cidade vai sendo produzida e

reproduzida sob os mais diferentes aspectos e processos.

A Produção Do Espaço Urbano

De acordo com Santos (2009), “a produção do espaço urbano está

intimamente ligada ao jogo de interesses entre os seus agentes e partícipes, fruto

das relações simbólicas e contraditórias do capitalismo em suas múltiplas facetas”.

Ainda na acepção da autora, este espaço é artificial, por ter sido construído no meio

antes natural e, em seguida manipulado numa teia de ações sociais, ressaltando

Atividade:

De acordo com o texto, a cidade vai sendo entendida como o locus privilegiado da

concentração, produção e reprodução do capital e da força de trabalho, onde as

transformações sócio-espaciais são reguladas pela lógica da acumulação de capital.

Num processo infindável, a cidade vai sendo produzida e reproduzida sob os mais

diferentes aspectos e processos.

Você já observou a organização espacial da sua cidade? Os espaços internos dela

são semelhantes ou diferentes? Traga para a sala de aula elementos que demonstrem

como o espaço dela está configurado.

que as relações entre os atores envolvidos nem sempre resultarão na aplicabilidade

das soluções que visem os anseios da maioria (SANTOS, 2009, p. 181).

As cidades brasileiras, especialmente as de médio e grande porte

passaram e passam por um rápido e intenso processo de crescimento físico-

territorial, populacional e de renovação urbana, principalmente a partir da metade do

século XX, renovação esta realizada muitas vezes para atender aos interesses da

classe dominante e de grandes empresas, articuladas e beneficiadas em alguns

momentos pelo poder público, como conseqüência da expansão capitalista.

Diante do aumento populacional e também da complexidade de

atividades econômicas e sociais realizadas na cidade, há a necessidade de novas

áreas destinadas à sua expansão. Dentre as várias possibilidades de produção e

reprodução do espaço urbano, temos inicialmente a expansão físico-territorial por

intermédio do acréscimo de terras de uso rural ao uso urbano, via loteamentos,

conjuntos habitacionais, assentamentos, etc.

Sendo a terra uma mercadoria, a abertura de loteamentos encontra

um mercado para os especuladores que nela investem, sabendo que esta será

valorizada com a introdução posterior de serviços públicos de consumo coletivo,

como água, pavimentação asfáltica, transporte, rede de esgoto.

Figura 4 - Vazios urbanos e área de expansão urbana – Região Norte de Londrina

Pequena parte da porção oeste da Zona Norte de Londrina, tendo como principal Avenida a Saul Elkind que

cruza de leste a oeste a região. A expansão se dá tanto adentrando ao norte da área quanto à oeste, atingindo a

zona rural em direção à Cambé.

Fonte: Google Earth, organizado por Passos, Viviane R. de Lima, acesso em 15 de agosto de 2010.

Figura 5 - Vazios urbanos – Região Norte de Londrina

Veja nas figuras 4 e 5 as inúmeras áreas da cidade consideradas

como vazios urbanos. Tais áreas se encontram em regiões cujo entorno já está

povoado. De acordo com o que vemos, são nítidos os processos aos quais

denominamos de especulação imobiliária. São faixas de terra de propriedade

geralmente de empresas imobiliárias, que ficam aguardando a valorização da área

via incorporação de melhorias no entorno, para então abrirem o loteamento para

comercialização. Com a área dotada de infraestrutura, certamente os preços dos

terrenos serão muito superiores.

Cabe relembrar, que os custos pela melhoria dessas áreas são

distribuídos coletivamente, enquanto os lucros conseguidos por intermédio das

mesmas são apropriados de maneira privada.

Visualiza-se também na imagem 5 as áreas de expansão urbana em

que espaços rurais vão sendo incorporados ao urbano, tanto em sua direção norte

quanto na direção oeste.

Parte da Região Norte, nas imediações da Rodovia João Carlos Strass, principal via de ligação entre a

Região Norte e Central da cidade.

Fonte: Google Earth, organizado por Passos, Viviane R. de Lima, acesso em 15 de agosto de 2010.

Sobre esse contexto, Gonçalves (2002) pontua que a especulação

com terras é uma estratégia de valorização do capital altamente difundida no Brasil.

Para ele “a procura pela terra devido a sua condição de duplo ativo, aliada a

escassez e a existência de forte demanda, elevam a terra à condição de um ativo

altamente desejado” (GONÇALVES, 2002, p. 1). E chama a atenção para o fato de

que na transformação de terra rural em urbana, a especulação desempenha papel

fundamental por ser potencializada pela fiscalização ineficiente e também pela

legislação permissiva, frisando que tal processo é responsável por inúmeros

problemas urbanos, como por exemplo, o encarecimento da moradia e dos

transportes, subutilização da infraestrutura urbana, e ainda, os vazios urbanos.

O solo urbano é disputado pelos seus inúmeros tipos de usos,

disputa esta que ocorre de acordo com as regras do jogo capitalista, fundamentado

na propriedade privada do solo.

A propriedade privada é condição fundamental para a obtenção da

renda da terra, lembrando que esta não é meio de produção que, movimentado pelo

trabalho humano reproduz o seu valor, pois como argumenta Singer (1979), “[...] a

ocupação do solo é apenas uma contingência que o seu estatuto de propriedade

privada torna fonte de renda para quem a detém”. Desse modo afirma ainda que

[...] o capital imobiliário é, portanto, um falso capital. Ele é, sem dúvida, um valor que se valoriza, mas a origem de sua valorização não é a atividade produtiva, mas a monopolização do acesso a uma condição indispensável àquela atividade (SINGER, 1979, p. 22).

Necessário à produção em todos os setores da economia, o uso do

solo passa a ser regulado pelo mecanismo de mercado. Diferentemente dos

produtos do trabalho humano que têm seus preços constituídos pela soma dos

custos e margem de lucro, quem determina os preços no mercado imobiliário é o

que a demanda se predispõe a pagar. Levando em consideração que até mesmo a

demanda por solo urbano muda, o preço de determinada área pode sofrer

oscilações, fazendo com que o mercado imobiliário seja essencialmente

especulativo.

A essência do processo da apropriação da renda fundiária está no

desenvolvimento do modo de produção capitalista que gera um processo de

concentração e acumulação de capital, levando à aplicação de grande parte da

mais-valia apropriada na aquisição de terras. Tal investimento tem se constituído

num caminho seguro para a preservação do capital acumulado e consequentemente

para a ampliação do capital-dinheiro através da apropriação da renda fundiária

(OLIVEIRA, 1978, p. 76).

Independente de sua localização, todo terreno propicia renda ao seu

proprietário. Podemos segundo Singer (1979), distinguir três tipos de renda da terra

urbana.

Como todo espaço urbano é propriedade privada (com as exceções cabíveis), mesmo a pior localização tem que ser comprada ou alugada. O seu aluguel constitui a renda absoluta, sendo sua altura determinada, em última análise, pela margem existente entre o preço de mercado dos produtos da empresa que utiliza esta localização e o seu preço de produção (SINGER, 1979, p. 25)

Outro tipo é a renda de monopólio, que decorre da existência de

localizações que conferem aos que as ocupa o monopólio do fornecimento de

determinadas mercadorias, e nestas condições, podem cobrar preços mais elevados

pelos produtos que vendem. É o caso de bares e restaurantes localizados em

clubes, aeroportos, escolas, shopping centers, etc. (SINGER, 1979, p. 26).

De acordo ainda com a localização, as empresas podem ter custos

diferenciados, supondo que o preço em cada mercado cubra em médio prazo os

custos mais margem adequada de lucros das empresas pior localizadas, que

contam com menos vantagens locacionais. Dessa forma, aquelas com melhor

localização teriam um superlucro na medida em que seus custos seriam menores

que os das pior localizadas, constituindo assim a renda diferencial do solo (SINGER,

1979, p. 24).

Com relação ao uso do solo urbano para fins de habitação, é o

acesso a serviços urbanos como transporte, água e esgoto, escolas, comércio, entre

outros, que vão privilegiar determinadas localizações. Devido à rápida expansão do

espaço urbano, cujos serviços de consumo coletivos já citados não são implantados

no mesmo ritmo, as áreas bem servidas passam a ter acentuada valorização, e

terão acesso a estas, as camadas de renda mais elevada, ficando as camadas mais

pobres com as áreas pior servidas, portanto, mais baratas.

De acordo com Singer (1979) quem promove a distribuição perversa

dos serviços urbanos é o mercado imobiliário. Ainda declara que,

Sendo o montante de serviços urbanos escassos em relação às necessidades da população, o mercado os leiloa mediante a valorização diferencial do uso do solo, de modo que mesmo serviços fornecidos gratuitamente pelo Estado aos moradores – como ruas asfaltadas, galerias pluviais, iluminação pública, coleta de lixo, etc. – acabam sendo usufruídos apenas por aqueles que podem pagar o seu „preço‟ incluído na renda do solo que dá acesso a eles (SINGER, 1979, p. 36).

Vemos então que quem

planeja, monopoliza e cria o espaço

urbano são os promotores imobiliários à

medida que orientam que tipo de classe

ocupará uma ou outra parcela do

espaço. Este arranjo vai configurar a

segregação socioeconômica e esta,

intrínseca ao sistema capitalista, vai

diferenciando o espaço urbano,

garantindo a reprodução da força de

trabalho e do capital.

Enquanto o coletivo paga para o Estado investir, através de impostos – que é uma parcela de seu salário, mas também é mais-valia socialmente produzida – somente a classe detentora dos meios de produção, ou a classe dominante, que fará uso desses serviços coletivos (ALVES, 1991, p. 55).

É sobre este aspecto que Oliveira (1982) afirma que “[...] o urbano

hoje no Brasil são as classes médias, isto é, as cidades são por excelência [...] a

expressão urbana dessa nova estrutura de classe”. Nesse sentido, são as classes

médias que vão criando demandas dentro das cidades e o Estado em sua relação

com o urbano vai sendo determinado por essa demanda (OLIVEIRA, 1982, p. 51).

Isto para reforçar que o urbano, sendo criação e reprodução do

espaço, tem sido elaborado por uma classe dominante, que vai ditando regras,

planejando e monopolizando o espaço, e que o Estado, através de suas ações que

O Estado, sendo o responsável

pelo provimento de parte dos serviços

urbanos, desempenha papel importante na

determinação do preço de cada área, na

valorização do solo e consequentemente

no deslocamento dos moradores mais

antigos e pobres que não podem mais

pagar pelo preço do solo.

Justamente aqueles que

deveriam ser beneficiados, passam a dar

lugar aos novos moradores que podem

pagar pela terra.

regulam aspectos da vida urbana, desde leis de uso de solo até códigos de

construção, responsável pelo provimento dos serviços urbanos, atende às

demandas dessa classe que são determinadas pelo padrão de acumulação

monopolista.

Texto Complementar

Texto I - PRODUÇÃO DO PERTO E DO LONGE

(Do livro: "O que todo cidadão precisa saber sobre habitação", Flávio Villaça, Editora Global, 1986, São Paulo, pág.86 a 89)

A inserção da casa na cidade toma-se uma questão cada vez mais vital. Não só a inserção da casa,

como mais comumente se costuma pensar. Também a do supermercado, da Prefeitura, do

escritório, da delegacia de polícia, da escola maternal, das enchentes, do pronto-socorro, do

restaurante, da poluição, do salão de beleza, da praia etc.

Note-se que não estamos falando do processo de urbanização nem do crescimento das cidades, mas

do processo da distribuição interna de seus componentes, seus centros de emprego, seus bairros,

seus sistemas de transporte. Falamos da cidade como um enorme ninho que envolve os diversos

locais onde se dá de um lado o trabalho e de outro, os inúmeros locais onde a vida se reproduz. A

produção desse ninho, pois ele é um enorme produto de trabalho coletivo, se dá sob a égide de uma

acirrada disputa: a disputa pelo controle dos tempos e custos despendidos em transporte. “A

disputa em torno do “perto” e do „longe”. Essa disputa não significa que o "perto" é sempre

procurado. Como explicar que a burguesia brasileira esteja hoje residindo em subúrbios longínquos?

Significa que o "perto" é determinante (no sentido althusseriano) na produção do ambiente

construído. Ele explica porque, somente hoje, a procura do ar puro e do verde dos subúrbios passou

a dominar dentre os critérios de escolha do local de morar por parte de certas parcelas da nossa

burguesia. Somente a partir da década de 70, a difusão do automóvel e das auto-estradas

encurtaram as distâncias e permitiram que essas parcelas se espalhassem espacialmente. Não só se

espalharam seus bairros residenciais, mas também seus escritórios, seus shopping centers e seus

locais de lazer.

Pelas razões acima expostas é que os sistemas de transportes são vitais na modelagem das cidades,

a ponto delas serem classificadas e periodizadas em função desse sistema: Cidade da caminhada a

pé (até a Idade Média), cidade das carruagens (cidade barroca, quando aparece a avenida , cidade

do trem, do metrô, do bonde, do ônibus e do automóvel.

Dadas as diferentes condições de transporte das distintas classes sociais em nossas cidades, cada

ponto de seu território oferece diferenciadas possibilidades de deslocamento para os demais pontos

da cidade. A ampla possibilidade de deslocamentos é vital para o homem urbano, sendo inclusive

um índice revelador de riqueza e desenvolvimento. David Harvey disse, com muita propriedade, que

os ricos comandam a produção do espaço urbano, mas este, para os pobres, é uma arapuca que os

aprisiona. Os especialistas em transporte medem as viagens feitas pelos habitantes das cidades e

sabem que o número de viagens (por habitante por dia) é muito maior entre as classes de mais alta

renda do que entre as de renda mais baixa.

Ressalte-se, entretanto - é isso que desejamos destacar aqui - que a produção do perto e do longe

já acontece na própria produção do espaço urbano. Ela envolve os meios de transporte, porém vai

além deles.

Há uma forte disputa entre as classes sociais em torno da produção do ambiente construído.

Entretanto, o que as classes sociais realmente disputam quando da produção desse ambiente, é

mais que o comando do espaço urbano em si: é o controle do tempo despendido em deslocamentos

intra-urbanos, já que o tempo não pode ser controlado diretamente. O homem controla o tempo

indiretamente, atuando sobre o espaço. É assim que se diz, por exemplo, que com a invenção do

avião (rapidez, tempo) o mundo (espaço) encolheu.

Portanto, na medida em que os homens produzem as cidades enquanto espaços físicos

estão produzindo simultaneamente as condições de deslocamento espacial, as condições de gasto de

tempo e energia nos deslocamentos, as condições do seu consumo. Simultaneamente com a

produção do espaço urbano é produzido o "perto", o "longe”, o "fora de mão". Perto para alguns,

longe para outros.

A disputa que se trava em torno da produção do "longe" e “perto" é mais vital do que aquela que se

trava em torno do acesso à rede de água, de esgoto ou de iluminação pública. Esses melhoramentos

podem ser (e tendem a ser, embora muito a longo prazo) implantados por toda a cidade. Nos países

ricos, por exemplo, eles existem em todos os locais das cidades e mesmo do campo. Ao contrário, o

tempo despendido em transporte, nunca poderá ser eqüitativamente repartido por entre todos os

habitantes de uma cidade. A classe dominante então luta para produzir o "perto" para si e o "longe”

para os outros.

Evidentemente o "perto" e "longe" não podem ser reduzidos a simples distâncias físicas. São

produzidos através dos sistemas de transportes, através da diferente disponibilidade de veículos por

entre as diferentes classes sociais, (automóvel x transporte público) através da distribuição espacial

das classes sociais, dos locais de emprego, das zonas comerciais e de serviços, etc. Nessas

considerações está, por exemplo, a chave da compreensão das razões pelas quais as camadas de

mais alta renda crescem mais em certas direções das cidades do que em outras; ou das razões pelas

quais os centros das cidades crescem mais em certas direções do que em outras

A cidade, por outro lado, ajusta-se ao veículo que predomina na classe dominante. O automóvel

"pede" um tipo de cidade e a classe dominante produz (pelo menos na região onde ela trabalha e

mora) esse tipo de cidade na qual é extremamente difícil viver sem automóvel. As auto-estradas

fazem nascerem os subúrbios residenciais "longínquos" (tornando-os assim "perto"), os shoppings

centers, os afastados "centros empresariais" ou edifícios de escritórios, que por sua vez mais exigem

auto-estradas e automóveis, viadutos e minhocões. Ao ser proposto um tema como o da inserção da

habitação na cidade, é possível que as idéias que mais freqüentemente vêem à mente das pessoas

possam ser expressas através de perguntas tais como: em que bairro está sua casa? É longe do

centro? Tem condução fácil? Tem comércio e serviços próximos? A rua é pavimentada? Essas

perguntas exprimem a questão vital das relações entre a cidade e a casa. Mostram bem que a

questão da moradia não se limita à casa, sua forma, seu tamanho, sua solidez. Interessa também, e

muito, sua localização, sua vizinhança, os serviços e comércio próximos, as distâncias aos locais de

emprego. Interessa enfim, o próximo e o distante, o bom "ponto" e o "fora de mão".

Texto II - FORMAS DE ESPECULAÇÃO

(Do livro: "Moradia nas cidades brasileiras", Arlete Moysés Rodrigues. Ed. Contexto, 1988, p. 21-23)

Os mecanismos da chamada especulação imobiliária relacionada com a ocupação da cidade podem

ser praticados de várias formas. A mais comum, por estar relacionada a um único grupo

incorporador, refere-se ao interior da área loteada e diz respeito à retenção deliberada de lotes.

Em geral, vendem-se inicialmente os lotes pior localizados – em relação aos equipamentos e

serviços - para, em seguida, gradativamente e à medida que o loteamento vai sendo ocupado,

colocarem-se os demais à venda. A simples ocupação de alguns já faz aumentar o preço dos demais

lotes, "valorizando" o loteamento. Esta é uma forma de ocupação programada, onde é também

comum deixar-se lotes estrategicamente localizados para a instalação de serviços e comércio de

abastecimento diário - padarias, açougues, farmácias, etc. - ou então os conjuntos comerciais.

Estes lotes obviamente terão seu preço elevado em relação aos residenciais, porque visam à

conquista de um mercado que se amplia e consolida.

Outra forma de atuação da "especulação" imobiliária refere-se ao loteamento de glebas, que, via de

regra, consiste em não fazer um loteamento vizinho ao já existente, mas deixar-se uma área vazia

entre dois loteamentos. Esta segunda maneira é mais difícil de ser concretizada se as glebas não

fizerem parte de um monopólio de terras. Mesmo porque não se deve considerar que haja uma

solidariedade entre dois proprietários para se extrair conjuntamente uma renda. Ou seja, as glebas

vazias existentes entre dois loteamentos, beneficiarão os proprietários dessas glebas, (não se

conhece nenhum caso em que a renda extra obtida por esse processo tenha sido apropriada

coletivamente por proprietários de terras). Ou seja, há também urna concorrência entre os

proprietários de terras, buscando cada um obter a maior renda possível. Assim, os proprietários se

beneficiam não só da produção social da cidade, mas também da produção que ocorre nos terrenos

vizinhos.

Estranha contribuição para a produção social da cidade: os proprietários que deixam a terra vazia,

ociosa, sem nenhum uso, apropriam-se de uma renda produzida socialmente.

Por outro lado, os que mais precisam usufruir de uma "cidade com serviços e equipamentos

públicos" – aqueles que têm baixos salários – compraram lotes/casas em áreas distantes, onde o

preço é mais baixo. Gastam um tempo elevado – de duas a três horas – em deslocamentos

casa/trabalho/casa. Além do custo do transporte, constroem suas casas, em geral, nos fins-de-

semana, organizam-se para obter serviços públicos necessários á sobrevivência e assim, através do

seu trabalho, conseguem obter "melhorais" para estes bairros, aumentando ao mesmo temo o preço

da terra, que beneficiará os proprietários de terras vazias. Não puderam pagar por estes serviços,

lutaram para consegui-los, inclusive até perdendo vários dias de trabalho remunerado, e elevam o

preço da terra, que será apropriada por outros.

Muitas vezes, quando a "valorização" do lugar faz aumentar em demasia o preço da terra e os

impostos, parte daqueles que lutaram por esta transformação são, pela impossibilidade de pagar

estas taxas, "empurrados" para mais longe, para recomeçar a produção social da cidade em outro

lugar e de novo propiciar a apropriação de renda por apenas uma parcela, na qual não está incluído.

Também conseguem, é claro, aumentar o preço de suas casas/lotes, mas sempre como produto de

um sobre-trabalho, enquanto as glebas e os lotes vazios beneficiam alguns proprietários por esta

lógica da "valorização" de um bem sem valor.

É evidente que esta "valorização" também ocorre nas áreas dos denominados loteamentos de alto

padrão, condomínios fechado, bairros-jardins, onde se vende, além da terra, segurança,

homogeneidade de classe social, equipamentos e serviços coletivos, ar limpo, puro, verde, local

para lazer, etc., comércio em supermercados e shopping-centers. E aqui como nos loteamentos da

"periferia pobre" (porque estes também estão espacialmente localizados na periferia, mas na

"periferia rica"), o processo é basicamente o mesmo. Vendem-se alguns lotes que "viabilizam" o

investimento, e quando começa a ocupação, os demais serão colocados à venda, como expansão do

loteamento, face ao sucesso alcançado, por um preço mais elevado que os anteriores. Ou então se

vende os lotes mais bem localizados prevendo-se uma valorização futura.

Os investimentos de incorporação ao espaço urbano e que demandam trabalho são adicionados à

renda da terra e, também, provocam uma valorização diferencial no espaço urbano, por suas

características diferentes - cada um deles dirigido a uma determinada fração de classe social.

Esta mercadoria "sui generis", a terra, tem um preço que é definido pela propriedade, pela

capacidade de pagar dos seus compradores e não pela sua produção. Desta mercadoria se obtém

renda. Para determinar-se o preço da habitação acrescenta-se a renda da terra-absoluta e

diferencial, os lucros dos investimentos de incorporação, da construção da casa, e os juros do

capital financeiro – o que atingirá um número extremamente elevado e inacessível para a maioria

dos trabalhadores.

Segregação Socioespacial

Vimos anteriormente que no processo de produção do espaço

urbano os promotores imobiliários vão orientando acerca de que tipo de classe

ocupará uma ou outra parcela do espaço. Tal arranjo configura a segregação

socioeconômica, que Casttells citado por Villaça, conceitua como sendo “(...) a

tendência à organização do espaço em zonas de forte homogeneidade social interna

e de forte disparidade social entre elas, entendendo-se essa disparidade não só em

termos de diferença como também de hierarquia.” (CASTELLS apud VILLAÇA, 1998

p.148). Este processo, intrínseco ao sistema capitalista, vai diferenciando o espaço

urbano, possibilitando a garantia da reprodução da força de trabalho e do capital.

Interessante destacar que as diferenças socioeconômicas entre as

diversas regiões da cidade por si só não caracterizam a segregação. Para a

verificação desse processo é de suma importância levar em consideração os

deslocamentos, pois a acessibilidade aos espaços de consumo, aos bens de

consumo coletivo e aos serviços em geral é uma das principais características

definidoras deste processo socioespacial.

Sabemos que a atual organização do espaço urbano é fruto de todo

um processo histórico, político e social que modela as cidades e lhes dão

características únicas. Verifica-se nas cidades um processo infindável de construção

e reconstrução, além de novos usos atribuídos às antigas construções devido à nova

organização do espaço.

No intuito de entendermos melhor sobre os elementos que

favoreceram a segregação, lembramos do processo de industrialização ocorrido no

Brasil que provocou um processo de urbanização acelerado, impulsionado pelo

intenso êxodo rural devido, dentre outros fatores, a grande quantidade de pessoas

sem emprego no campo, decorrência da mecanização da agricultura, além do

aumento da concentração fundiária.

Com a intensa migração campo-cidade, as cidades foram crescendo

de maneira exacerbada e desordenada, devido à falta de planejamento ou

planejamentos inadequados. As pessoas que chegavam às cidades geralmente não

tinham condições de morar num local urbanizado e com acesso aos bens de

consumo coletivos, tendo como alternativa as ocupações irregulares ou os cortiços.

Como soluções momentâneas aos problemas de moradia dessas pessoas, áreas

pouco atrativas, inexploradas ou áreas não ocupadas dentro de loteamentos já

constituídos começam a ser ocupadas, gerando em várias cidades uma

descontinuidade da malha urbana, com distribuição e acesso bastante desigual dos

bens de consumo coletivos. (ALMEIDA JÚNIOR; WITHACKER, 2007, p. 74)

Lembramos que as áreas que possuem amenidades e uma boa

acessibilidade ao centro de bens e serviços são tidas como as melhores

localizações. Como todos os terrenos têm graus de acessibilidade diferentes entre

si, o que vemos na cidade é uma disputa pelas melhores localizações que

geralmente estão próximas ao centro ou com um acesso direto a ele. Cabe aqui

destacar a afirmação de Lefebvre: “Social e politicamente, as estratégias de classe

(inconscientes ou conscientes) visam à segregação” (LEFEBVRE, 1969, p.90).

Nesse sentido a classe dominante usufrui das melhores localizações, enquanto a

classe média tende a possuir um acesso mais difícil ao centro e ao local de trabalho,

restando para as classes com menor poder aquisitivo as piores localizações,

geralmente distantes do centro e do trabalho.

Mas a segregação não é proveniente apenas da disputa entre

classes sociais distintas. E a atuação do Estado? O que tem por trás de suas

estratégias de atuação? E o capital imobiliário? Sobre esta questão Souza (2005)

esclarece:

Estado, tradicional promotor de segregação residencial (junto com o capital imobiliário, ou tendo este por trás) ao investir diferencialmente nas áreas residenciais da cidade e estabelecer estímulos, zoneamento e outras normas de ocupação do espaço que consolidou a segregação, atua, também como agente repressor. Via de regra, na tentativa de colocar os pobres “no seu devido lugar”: antes uma guarda das elites que uma polícia cidadã, igualmente respeitadora de homens, negros, de moradores privilegiados e pobres (SOUZA, 2005, p. 90).

Nesse mesmo viés utilizamos Lefebvre (1969) que afirma:

O Estado age, sobretudo por cima, e a empresa por baixo assegurando a habitação e a função de habitar nas cidades operárias e os conjuntos que dependem de uma „sociedade‟, assegurando também os lazeres, e mesmo a cultura e a „promoção social‟ (LEFEBVRE, 1969, p. 90).

Esta situação fica bastante explícita quando identificamos, por

exemplo, a instalação de equipamentos de consumo coletivo de forma bastante

diferenciada entre as diversas regiões da cidade, além dos elementos de

infraestrutura. Existem áreas bem assistidas pelo poder público em detrimento de

outras em que a população sobrevive desprovida de tudo. Não é novidade que o

poder público, através da legislação, tem muitos poderes sobre o espaço urbano,

mas neste caso, utilizando Lefebvre (1969), cabe frisar que:

Se os habitantes das diversas categorias e “estratos” se deixam manobrar, manipular, deslocar para aqui e para ali, sob o pretexto de “mobilidade social”, se aceitam as condições de uma exploração mais apurada e mais extensa que outrora, tanto pior para eles. Se a classe operária se cala, se não age, quer espontaneamente, quer através da mediação de seus representantes e mandatários institucionais, a segregação continuará com resultados em círculo vicioso (a segregação tende a impedir o protesto, a contestação, a ação, ao dispersar aqueles que poderiam protestar, contestar, agir) (LEFEBVRE,1969, p.114).

Texto Complementar

(Do livro: O que é cidade – Raquel Rolnik – Ed. Brasiliense – 1988 – pág. 40-43)

Nas grandes Cidades hoje, é fácil identificar territórios diferenciados: ali é o bairro das mansões e

palacetes, acolá o centro de negócios, adiante o bairro boêmio onde rola a vida noturna, mais à

frente o distrito industrial, ou ainda o bairro proletário. Assim quando alguém, referindo-se ao Rio

de Janeiro fala em Zona Sul Ou Baixada Fluminense, sabemos que se trata de dois Rios de Janeiro

bastante diferentes; assim como pensando em Brasília nos lembramos do plano-piloto, das mansões

do lago ou das cidades satélites. Podemos dizer que hoje nossas cidades têm sua zona sul e sua

baixada, sua "zona", sua Wall Street e seu ABC. É corno se a cidade fosse um imenso quebra-cabeça,

feito de peças diferenciadas, onde cada qual conhece seu lugar e se sente estrangeiro nos demais. É

a este movimento de separação das classes sociais e funções no espaço urbano que os estudiosos da

cidade chamam de segregação espacial.

Entre as torres envidraçadas e gestos tensos dos homens de terno e pasta de executivo, meninas

pulando corda e jogando amarelinha estariam totalmente deslocadas; assim como não há travesti

que faca michê na porta do Citibank às 3 horas da tarde. Não se vê vitrinas de mármore, aço

escovado e neon na periferia, nem lama ou falta d'água no Leblon (Rio), Savassi (Belo Horizonte) ou

Boa Viagem (Recife). É como se a cidade fosse demarcada por cercas, fronteiras imaginárias, que

definem o lugar de cada coisa e de cada um dos moradores.

As meninas pulando corda e jogando amarelinha, fechadas no pátio da escola, se separam da rua

por uma muralha de verdade, alta, inexpugnável; já a fronteira entre um bairro popular e um bairro

chique pode ser uma rua, uma ponte, ou simplesmente não ser nada muito aparente, mas somente

uma imagem, um ponto, uma esquina. Em algumas cidades, como em Johanesburgo, na África do

Sul, placas sinalizam a segregação, indicando os territórios permitidos ou proibidos para os negros.

As áreas restritas são protegidas por forças policiais que podem prender quem por ali circular sem

autorização. Neste caso, a segregação é descarada e violenta.

A segregação é manifesta também no caso dos condomínios fechados – muros de verdade, além de

controles eletrônicos zelam pela segurança dos moradores, o que significa o controle minucioso das

trocas daquele lugar com O exterior. Além de um recorte de classe, raça ou faixa etária, a

segregação também se expressa através da separação dos locais de trabalho em relação aos locais

de moradia. A cena clássica cotidiana das grandes massas se deslocando nos transportes coletivos

superlotados ou no trânsito engarrafado é a expressão mais acabada desta separação - diariamente

ternos que percorrer grandes distâncias para ir trabalhar ou estudar. Com isto, bairros inteiros das

cidades ficam completamente desertos de dia, os bairros-dormitórios, assim como algumas regiões

comerciais e bancárias parecem cenários ou cidades-fantasmas para quem a percorre à noite.

Com isto, bairros inteiros das cidades ficam completamente desertos de dia, os bairros-dormitórios,

assim como algumas regiões comerciais e bancárias parecem cenários ou cidades-fantasmas para

quem as percorre à noite. Finalmente, além dos territórios específicos e separados para cada grupo

social, além da separação das funções morar e trabalhar, a segregação é patente na visibilidade da

desigualdade de tratamento por parte das administrações locais. Existem por exemplo, setores da

cidade onde o lixo é recolhido duas ou mais vezes por dia; outros, uma vez por semana; outros,

ainda, onde o lixo, ao invés de recolhido, é despejado. As imensas periferias sem água, luz ou

esgoto são evidências claras desta política discriminatória por parte do poder público, um dos fortes

elementos produtores da segregação.

Agentes e Fatores que orientam a Produção do Espaço Urbano

Na organização espacial da cidade capitalista verifica-se um

conjunto de diferentes usos da terra, que se apresenta articulado, devido suas

partes manterem relações entre si, relações estas manifestadas através dos fluxos

de veículos, pessoas, relações envolvendo de maneira geral, a produção, circulação,

distribuição e consumo. Vários agentes de maneira complexa vão provocando

constantemente um processo de reorganização espacial, possibilitando a mudança

do conteúdo socioeconômico de algumas áreas, incorporação de novas áreas ao

espaço urbano, dentre outros. O crescimento urbano por si só implica na

necessidade de reestruturação do uso das áreas já ocupadas, de modo que, a

expansão de algumas áreas esbarra em outras, provocando o deslocamento de

seus habitantes para novas áreas. Neste contexto se verifica com bastante

intensidade a especulação imobiliária que sutilmente vai alterando o modo de vida e

preferências da população.

De modo geral, os agentes modeladores do espaço urbano são:

1- O morador (proprietário ou inquilino) que tem pequena influência

nas decisões sobre alterações no uso e valor do solo urbano;

2- O proprietário do solo que se preocupa em exercer barganha com

o solo urbano, com o objetivo precípuo da maximização da renda da terra, sem se

interessar com o uso que lhe será dado, realizando operações de especulação

imobiliária;

Atividade:

Após a leitura do texto complementar e de sua apreensão do conteúdo apresentado,

elabore um texto abordando o assunto, utilizando como exemplos a realidade de seu

município ou bairro.

3- A promoção imobiliária,

representada por pessoas ou firmas que

transacionam com terrenos ou edificações; tentam

organizar e controlar o mercado de solo urbano em

função de seus interesses imediatos objetivando a

obtenção de lucros;

4- A indústria da construção civil, cuja

função é a criação de novos valores de uso para os

consumidores com o objetivo de criar valores de troca

em seu benefício. Suas relações com os promotores

imobiliários são extremamente fortes, a ponto de se

confundir um com o outro;

5- Os proprietários industriais, que

têm como objetivo básico a otimização de sua

localização visando maximizar lucros;

6- O poder público (o Estado): é sem

dúvida alguma o agente mais analisado e o mais

controvertido, pois „exerce o duplo e contraditório

papel de agente e mediador no processo de gestão

do solo urbano, na medida em que se reservam os

encargos sociais de desenvolvimento urbano‟;

portanto, além de ser um mediador, um juiz, ele é também um agente modelador do

uso do solo, como executor de políticas públicas; além disso, as pessoas que

integram seus quadros, não estão isentas de serem também representantes de

outros agentes, o que torna mais complexa e conflitante a sua atuação (ALMEIDA,

1982, p. 18-20).

Na realidade é através da implantação de serviços públicos como

calçamento, esgoto, água, coleta de lixo, entre outros, que a atuação do Estado se

faz de modo mais corrente e esperado, mas também envolve a elaboração de leis e

normas vinculadas ao uso do solo, como as normas de zoneamento e o código de

obras, outro atributo dele, no que se refere ao espaço urbano.

Em se tratando da atuação do Estado na organização da cidade,

Corrêa (1989) afirma que “sua atuação tem sido complexa e variável, tanto no tempo

como no espaço, refletindo a dinâmica da sociedade a qual é parte constituinte”.

Os

conflitos de interesse

entre os proprietários

industriais e os demais

agentes são geralmente

mais complexos, pois

podem envolver

problemas que afetam

grandes parcelas da

população, como as

questões sobre fontes

poluidoras do meio

ambiente, ou alterar as

taxas de lucratividade

dos promotores

imobiliários, ou ainda

modificar o valor de

uso dos imóveis

prejudicando os

proprietários/moradores

.

Sobre a mesma questão, Souza; Rodrigues (2004) lembra que o Estado capitalista

tende a favorecer os setores economicamente mais fortes. Avaliando diversos

estudos acerca da temática, Boscariol; Silveira (2007) atestam que de fato existe

uma relação entre o Estado e o tipo de sociedade em que se encontram, afirmando

ainda que

[...] esta relação depende do jogo de forças que existe na sociedade e que

nos dias de hoje se traduz através da desigualdade de renda. De um lado

há uma população abastada, com acesso à qualidade de vida, educação e

com capacidade de se organizar e pressionar o governo. Do outro lado,

uma população desfavorecida, volumosa e com dificuldade de se organizar

e de ser ouvida pelo poder público. Isto gera problemas na distribuição

desigual de bens e serviços coletivos, a favor dos mais afortunados, o que

gera disposição a atritos e conflitos sociais, aumentando a pressão social

(BOSCARIOL; SILVEIRA, 2007, p. 3).

O que se percebe mesmo é que o espaço urbano vai atendendo à

necessidade de acumulação do capital monopolista à medida que a produção e a

circulação de mercadorias aumentam com a expansão territorial da cidade e o

Estado, representando os interesses das classes dominantes, de fato vai garantindo

essa circulação à medida que estende os serviços públicos de consumo coletivo por

diversos pontos de consumo da cidade (ALVES, 1991, p. 87).

Texto Complementar

Texto I - PRODUÇÃO SOCIAL E APROPRIAÇÃO INDIVIDUAL

(Do livro: "Moradia nas cidades grandes" – Arlete Moysés Rodrigues – Ed. Contexto – 1988 – pág. 20)

Dentre os vários agentes que produzem o espaço urbano, destaca-se o Estado, que tem presença

marcante na produção, distribuição e gestão dos equipamentos de consumo coletivos necessários à

vida nas cidades. Entre os consumos coletivos mais importantes no atual contexto histórico

destacam-se: abastecimento de água, luz, telefone, e a instalação de redes correspondentes;

sistema viário e transporte coletivo; espaços coletivos de lazer e esporte, equipamentos e serviços

de saúde, educação e habitação para as chamadas classes populares 'trataremos deste último

aspecto no capítulo referente à atuação do Estado).

Quando o Estado assume a provisão de um destes valores de uso, está canalizando, através de

impostos e taxas - diretos e indiretos - parte do trabalho global da sociedade. O Estado reúne estes

recursos escassos - porque cada capital aspira obter as vantagens da urbanização, mas quer que

seus custos sejam pagos por outros - e, atua de forma não homogênea no espaço urbano. Esta

atuação dependerá de uma multiplicidade de determinantes, que se estendem desde a lógica de

cada um destes valores de uso-rentabilidade, necessidade, existência de recursos, etc., até os

interesses políticos e econômicos. A heterogeneidade de atuação no espaço urbano acentua uma

"valorização" diferencial de uma área para outra.

As diferenças de preço relativas à localização, em áreas beneficiadas ou não, com os equipamentos

de consumo coletivos, referem-se à produção social da cidade, ao investimento realizado na área

onde se localiza a terra e não necessariamente na própria terra. A apropriação dessas condições

gerais de existência na cidade é feita individualmente pelos proprietários de terras. Obtém-se para

as áreas bem localizadas um lucro extra na venda da casa/terreno, além de usufruir de uma cidade

bem equipada. Cidade produzida socialmente e renda apropriada individualmente.

Todos os cidadãos contribuem para esta produção, seja pelo pagamento direto ou indireto de taxas

e impostos, seja pela produção de sua casa na cidade. Um dos casos mais comuns de contribuição

direta na produção ocorre quando se compra um terreno numa área pouco ocupada e se constrói

(autoconstrução, empreitada). Logo após as primeiras construções, os lotes vagos são vendidos, a

preço mais elevado que o dos primeiros, sem que os terrenos vagos tenham sofrido qualquer

transformação.

Muitos loteamentos são realizados e colocados á venda, com pouca ou nenhuma infra-estrutura, o

que significa que de várias formas os compradores se organizam e lutam para obter os equipamentos

e serviços coletivos – asfalto, transporte coletivo, luz, água, escolas, creches, postos de saúde, etc.

Beneficiam, sem dúvida, aqueles que estão produzindo seu espaço, mas beneficiam principalmente

aqueles que deixaram as terras vazias aguardando "valorização".

Texto II - ESPAÇO URBANO E ESTADO

(Do livro: "O que todo cidadão precisa saber sobre habitação", Flávio Villaça, Editora Global, 1986, São Paulo, pág. 98 a 101)

E o Estado? Como se comporta diante dessas transformações territoriais comandadas pela classe

dominante e pelo seu sistema de mercado imobiliário?

O Estado, em primeiro lugar, faz nas regiões onde se concentram as camadas de mais alta renda,

enormes investimentos em infra-estrutura urbana, especialmente no sistema viário, ao mesmo

tempo em que abre frentes pioneiras para o capital imobiliário, como o Centro Administrativo de

Salvador, a Avenida Rio Branco ou a esplanada do Castelo, no Rio ou a Avenida Faria Lima, em São

Paulo. Assim, o sistema viário naquelas regiões é muito melhor que no restante da cidade, não só

para atender o maior número de automóveis, mas também para abrir frentes de expansão para o

capital imobiliário.

São inúmeras as obras públicas feitas para melhorar a região central da cidade onde se instala a

burguesia, inclusive na face do centro da cidade para ela voltada. A abertura das Avenidas Central e

Beira Mar no Rio de Janeiro foi uma obra custosíssima proporcionalmente aos recursos e ao tamanho

da cidade na época. Obras igualmente enormes e custosas foram os desmontes dos morros. É

significativo que os morros arrasados tenham sido exatamente aqueles que se encontravam na

extremidade sul do centro. Para abrir espaço para a renovação e modernização do centro do Rio

foram removidos os morros do Castelo, do Senado e de Santo Antônio, enquanto que os morros da

extremidade norte - o morro de São Bento e o da Conceição - permanecem lá até hoje. A seqüência

de obras gigantescas no eixo sul do Rio de Janeiro é impressionante. As Avenidas Mem de Sá,

Henrique Valadares e outras ocuparam a área do morro do Senado. Vastas áreas, todas na

extremidade sul do centro foram oferecidas ao capital imobiliário para as maiores obras de

remodelação urbanas já realizadas no país: as valorizadíssimas terras centrais obtidas com o

desmonte dos morros do Castelo e depois o de Santo Antônio. A essas obras deve ser acrescentada

uma grande quantidade de aterros da orla marítima, do aeroporto Santos Dumont a Botafogo, os

gigantescos aterros do Flamengo e de Copacabana, e ainda o elevado do Joá e inúmeros túneis.

Note-se que tais obras atendem exclusivamente à Zona Sul, ou seja, são obras que nem

parcialmente atendem aos interesses de outras regiões da cidade. O contrário se deu na Zona Norte.

As obras de vulto da região, corno a Avenida Presidente Vargas, a Avenida Brasil, ou os elevados

associados à Ponte Rio - Niterói destina-se também a atender o escoamento do tráfego rodoviário

extra-urbano e, portanto não são obras destinadas a atender exclusivamente aos interesses da Zona

Norte. O mesmo se deu com as ferrovias e depois com as rodovias. Essas obras foram construídas

para atender a interesses regionais extra-urbanos e a população da Zona Norte apenas tirou partido

delas. Mesmo assim as ferrovias sofreram um violento processo de deterioração dado o abandono a

que foram relegados os seus serviços suburbanos de passageiros. O que fez o governo baiano ao

construir o Centro Administrativo de Salvador numa região quase virgem, porém, estrategicamente

localizada na direção da cidade para onde a média e alta burguesia vêm se deslocando há décadas?

Não só colocou o aparelho do Estado bem mais acessível a essas classes (e mais longe das classes

subalternas) e melhorou o acesso a elas através de novas e rápidas avenidas expressas, mas também

desbravou inúmeras novas fronteiras e oportunidades fabulosas para a especulação imobiliária. Além

disso - em que pese alegar o contrário - colocou o aparelho do Estado muito afastado (em termos de

distância, mas especialmente em termos de tempo e oportunidades de viagem) das classes

subalternas.

Em São Paulo não foi menor a ação do Estado para preparar a expansão das chamadas "zonas nobres"

da cidade e ainda abrir novas fronteiras para a especulação imobiliária. Através de um de seus mais

conhecidos prefeitos, Prestes Maia, renovou toda a região do centro da cidade voltada para o

quadrante sudoeste e sobre a qual incidia o interesse da burguesia. A maioria das grandes avenidas

que abriu localiza-se nessa região.

Não só a mais famosa e importante delas, a Avenida Ipiranga, mas também a Avenida Vieira de

Carvalho e o novo Largo do Arouche, a Avenida Duque de Caxias, a Avenida Rio Branco, Rua São Luís

e a nova Rua da Consolação. Porém, bem antes disso, o Estado já vinha preparando a cidade para os

interesses da burguesia. A construção do Viaduto do Chá, obra arrojada e da mais avançada

tecnologia da época (estrutura de ferro), custosíssima para uma pequenina cidade de algumas

dezenas de milhares de habitantes, não representava outra coisa senão a oferta de acesso mais

direto entre o centro e a região que as elites queriam ocupar, ou seja, as encostas de Santa Cecília,

Vila Buarque, Avenida Paulista e depois seu próprio espigão. Antes, a ligação entre o centro e essa

região era pelo Acú, atual ponto de onde a Avenida São João cruza o Vale do Anhangabaú e

representava um percurso longo. O Viaduto do Chá veio a representar uma significativa melhoria

daquela ligação. O alargamento da Rua Líbero Badaró e da Rua São João, a urbanização do Vale do

Anhangabaú (todas no quadrante sudoeste) são outros exemplos de melhoramentos, que

beneficiaram a faceta sudoeste do centro.

Em segundo lugar, o Estado transfere suas próprias instalações para a mesma direção de

crescimento da classe dominante, mostrando claramente através do espaço urbano, seu grau de

captura por essa classe. O já citado exemplo de Salvador não é o único. O Palácio do Governo do

Estado de São Paulo era inicialmente no Pátio do Colégio, no coração da cidade. Transferiu-se daí

para o Palácio dos Campos Elíseos e depois para o Morumbi. A Assembléia Legislativa saiu do Parque

D. Pedro II e foi para o Ibirapuera. O Gabinete do Prefeito saiu do Anhangabaú e foi para o

Ibirapuera e a absoluta maioria das repartições e empresas públicas transferiu-se para a região da

Paulista - Faria Lima. No Rio, tanto o Senado como a Câmara Municipal eram no Campo de Santana,

e transferiram-se para a nova "zona nobre" do centro que passou a ser sua extremidade sul, a Praça

Floriano Peixoto. Também o Executivo, assim que foi proclamada a República, instalou-se na

direção norte, no Palácio do ltamarati, e depois transferiu-se para o Catete. Processos idênticos

ocorreram em maior ou menor escala em muitas cidades brasileiras até mesmo entre as pequenas.

A Verticalização na Produção do Espaço

Figura 3 – Parte da área central de Londrina, destacando a Rua Pará.

Um elemento que merece destaque ao se falar da produção do

espaço, e que está presente na paisagem urbana principalmente das grandes e

médias cidades do Brasil, é o edifício com vários pavimentos. Dentre as estratégias

utilizadas para a reprodução do capital, a verticalização historicamente modifica o

modo de se viver nas cidades.

No Brasil, a verticalização enquanto uma das formas de produção do

espaço urbano teve bastante êxito a partir de 1964, com a criação do Banco

Nacional da Habitação - BNH, um banco público que muito financiou esse processo,

vindo ao encontro dos interesses do capital que de um lado garante a

monopolização de espaços urbanos para especulação, e de outro, garante o

consumo da mercadoria habitação, que por sua vez atribui níveis mais altos de

renda para os proprietários de terras e de mais-valia para os donos dos meios de

produção.

Fonte: http://commondatastorage.googleapis.com/static.panoramio.com/photos/original/2527909.jpg

Figura 4 – Vista aérea de Londrina, destacando área verticalizada

Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/6/60/Londrinalago.jpg/270px-Londrinalago.jpg

A partir da instituição do BNH, foi constituído no Brasil um dinâmico

mercado de acesso à casa própria, assentado sobre um sistema especializado no

crédito habitacional. Estabeleceram-se dois mercados distintos dirigidos a públicos

diferentes. Os agentes privados (agentes financeiros, promotores e construtores

imobiliários privados) operando no setor de renda média e alta, onde o Estado atuou

controlando o processo de financiamento à produção e estabelecendo as condições

de seus investimentos; e as agências estatais criadas para esta finalidade na forma

de agentes promotores em associação com empresas privadas de construção,

operando nos setores de baixa renda, onde o Estado desempenhou atividades do

tipo produtivo associado, substituindo o setor privado em determinados momentos

do processo produtivo.

O BNH era o gestor do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço

(FGTS), e ainda regulador do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo

(SBPE), cujos subsistemas compunham o Sistema Financeiro da Habitação (SFH),

um sistema financeiro que, atrelado ao mecanismo da correção monetária,

possibilitaria a realização de financiamentos de médio e longo prazo, sendo assim,

um sistema financeiro voltado exclusivamente à provisão habitacional (ARRETCHE,

1990, p. 23-25).

Sobre esse aspecto Bastos (2001, p. 95), argumenta que “[...] essa

política, estruturada sob o princípio da correção monetária, direcionava o

financiamento para o produtor de moradias. Assim, dinamizou o setor da construção

civil, privilegiou os grupos de elite formados pelos agentes financeiros,

incorporadores e empreiteiros”.

Quanto à propriedade fundiária e o seu uso pela verticalização, é

objeto de múltiplas alianças entre os donos da terra e os incorporadores, manifestas

por uma intermediação do Estado que, tanto libera o solo para a verticalização por

intermédio da lei de zoneamento e uso do solo, quanto promove a sua valorização

através da implementação das políticas públicas.

É considerável a estreita relação entre incorporação e Estado. Este

cria possibilidades de aquisição dos produtos da incorporação – os apartamentos,

que realizam o ideal de casa própria de milhões de brasileiros, impulsionando assim,

incorporação e verticalização.

Dessa forma compreende-se que o processo de produção do

espaço verticalizado, constitui-se numa das formas privilegiadas de um segmento

muito importante da reprodução do capital no espaço, realizando segundo Souza

(1994, p. 247), “[...] uma complexa estratégia no processo de produção capitalista na

sua mais ampla dimensão”. Para tanto, o espaço urbano atende à necessidade de

acumulação do capital monopolista devido ao acréscimo na produção e circulação

desse tipo de mercadoria - os edifícios - mediante a expansão da cidade, e o

Estado, representando os interesses das classes dominantes, vem garantir essa

circulação ao permitir essa expansão estendendo por diversos pontos da cidade os

serviços públicos de consumo coletivo.

Atividade:

Se em sua cidade verifica-se o processo de verticalização, pesquise acerca de quando o

processo aconteceu; em que regiões da cidade; para atender a que função e a que

classe socioeconômica.

Traga os dados para a sala e discuta com os colegas e o professor.

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