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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 Produção Didático-Pedagógica Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7 Cadernos PDE VOLUME I I

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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE

2009

Produção Didático-Pedagógica

Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7Cadernos PDE

VOLU

ME I

I

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SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO

NÚCLEO REGIONAL DE CURITIBA

PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE

FACULDADE DE FILOSOFIA CIÊNCIAS E LETRAS – FAFIPAR

PROFESSORA PDE: JOSANE APARECIDA FRANÇA BUSCHMANN

PROF. ORIENTADOR DA FAFIPAR: PROF. DR. MOACIR DALLA PALMA

FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES

CADERNO TEMÁTICO- AGOSTO DE 2010

DISCIPLINA – ÁREA: LÍNGUA PORTUGUESA

TEMA: DESCORTINANDO A CRÔNICA: A ÉTICA NO DIA-A-DIA

ESCOLA DE IMPLEMENTAÇÃO: COLÉGIO ESTADUAL DO PARANÁ

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SUMÁRIO

• Apresentação……………………………………………………02

• Colegas professores (as)………..……………………………04 • Definição de crônica…………………………………………...06 • Abordagem teórica………………………………....................07

• Tipos de crônica………………………………………….…….07 • História da crônica no Brasil – séc. XIX……………….…..12

• Século XX, crônica?............................................................17 • Trabalho com crônica………………………………………....19

• 1ª proposta: – leitura de mundo………...……………….….19

• 2ª proposta: leitura, reflexão e observação......................20

• Rubem Braga……………………………………………….…..21

• 3ª proposta: leitura e escrita..............................................23

• 4ª proposta: leitura, análise da linguagem........................24

• Dica de leitura......................................................................26

• 5ª proposta: metalinguística...............................................27

• 6ª proposta: debate, observação, criação.........................28

• Dicas......................................................................................30 • 7ª proposta: reconhecimento/compreensão.....................32 • Lista de Dicas: leitura, escrita, pesquisa, reflexão...........37

• Referências...........................................................................43

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  2  

A CRÔNICA PONTO A PONTO  

 

 

 

 

 

 

 

Josane

 

Apresentação  

O presente caderno é uma parcela do planejado durante os estudos do

PDE, a partir do projeto “Descortinando a crônica: a ética no dia-a-dia” , seu

intuito maior: o olhar voltado à leitura.

A interpretação, compreendida como leitura em sua acepção mais forte,

leitura do mundo dos textos tanto quanto leitura dos textos do mundo, no mesmo

tempo em que desvela os signos de nossa existência, a fim de tornar a vida mais

plena de sentidos, revela também, por isso mesmo, sua dimensão

intrinsecamente ética (Nunes, 1998; Leopoldo e Silva, 1997), uma vez que isso

supõe uma aprendizagem.

Para o desenvolvimento desse material, como a ideia principal de estudo e

trabalho é a leitura, neste projeto utilizando o gênero crônica, leva-se em conta as

teorias de Hans Robert Jauss. Pois, segundo ele, é importante considerar as

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condições históricas e as evidências (que podem ser comprovadas) que moldam

e influenciam a atitude do receptor do texto em relação ao contexto social. Nesse

sentido, dentro da teoria da recepção, Jauss tende para uma linha de estudo que

privilegia a reconstrução histórica como cenário para a recepção do leitor.

Deste ponto de vista, deve-se compreender que o texto só existe pela e na

leitura, assim o leitor torna-se co-autor da obra. É o ser que age e produz os

sentidos, é o ser que compreende, lentamente ou não, os sentidos do texto, que

preenche as lacunas, re-constrói e sente invadi-lo e, depois, transforma-se,

liberta-se, conhece novos mundos, ganha experiência e se torna mais crítico.

Contamos com a colaboração de profissionais da área, cursos e disciplinas

para a organização do projeto, trabalho pedagógico e aprofundamento das

situações levantadas. Assim, com a participação dos (as) professores (as) e

alunos(as) do Colégio Estadual do Paraná colocaremos em prática o proposto. O

resultado desse material queremos compartilhar com todos os professores das

escolas públicas do Paraná.

O Caderno é uma compilação de informações, textos e estudos com o

objetivo de proporcionar aos professores de língua portuguesa um material de

fácil compreensão na abordagem teórico-metodológica da crônica e que

oportuniza uma reflexão conjunta sobre o dia a dia através da leitura. Buscamos

assim, contribuir na formação de leitores mais perceptivos, críticos e conscientes.

O olho vê, a lembrança revê, e a imaginação

transvê. É preciso transver o mundo.  Manoel  de  Barros

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  4  

COLEGAS PROFESSORES (AS):

C

R

Ô

N

I

C A

BRAGA SABINO

LUIS VERÍSSIMO DIAFÉRRIA

LIA LUFT DRUMMOND

Josane

Temos um desafio ao trabalhar na formação de leitores, encontrar

estratégias que “fisguem” o aluno, provocando seu interesse pela leitura, de

modo geral. Na busca da motivação utilizaremos os temas, as leituras da

realidade, a partir dos elementos obtidos no processo de formação proposto,

que motive a refletir e atuar de forma crítica e construtiva sobre a ética. O ponto

principal desse processo, é a aposta nas possibilidades do professor de levar os

seus alunos a apreender também esses conhecimentos e posturas de vida.

Como incentivar e motivar o aluno para a leitura? O que fazer para que

essa leitura se torne significativa? A crônica pode ser um vínculo (ou veículo) de

leitura como uma instância de informação, debate, diálogo com a atualidade?

A partir deste caderno, convido você, colega professor (a), para

respondermos juntos estas questões e superarmos as barreiras que envolvem a

leitura.

Professor (a), conheça a proposta. Primeiramente, será feita uma

pequena abordagem teórica sobre crônica, logo após os temas e as

abordagens dos autores desenvolvidos neste Caderno Temático que,

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acreditamos, será apoio e auxiliará a agregar leitura com conhecimentos e

construirá caminhos para a formação dos educandos, a fim de possibilitar uma

maior compreensão dos sistemas de valores no contexto sociocultural. Ao fazer

uma reflexão através da leitura de crônicas sobre o porquê da sociedade estar

às voltas com a violência, com o uso/abuso do homem pelo homem,

encaminha-se a ação pedagógica para uma nova prática.

Para Pimenta (1996), na sociedade civilizada, fruto e obra do trabalho

humano, cujo elevado progresso evidencia as riquezas que a condição humana

pode desfrutar, revela-se também uma sociedade contraditória, desigual, em

que grande parte dos seres humanos está à margem dessas conquistas, dos

benefícios do processo civilizatório.

Visando o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo

a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do

pensamento crítico, o trabalho com leitura/literatura proporciona um espaço

importante a ser ocupado, uma vez que é fator indispensável de humanização,

proporciona ao indivíduo a interação com o meio, as variáveis do contexto por

ele vivido, os fatos do dia-a-dia, presenciados/vivenciados, abrem horizontes

para a criação literária, materializam-se no texto.

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  6  

 

 

 

A palavra crônica tem sua origem na palavra grega chronos, que tem

seu significado relacionado ao tempo."Lembrar e escrever: trata-se de

um relato permanente relação com o tempo, de onde tira, como

memória escrita, sua matéria principal, o que fica do vivido."

(ARRIGUCCI, 1987, p. 51)

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ABORDAGEM TEÓRICA

A crônica é um gênero que apresenta dupla descendência, tem do jornal a

concisão e a pressa e da literatura, a magia e a poeticidade que recriam o

cotidiano. O hibridismo entre as modalidades ou sub-gêneros de prosa se

confundem. A crônica pode ser classificada como um artigo, isso porque ao

utilizar tantas informações e a grande carga de elementos externos ou

relacionados à realidade acaba conferindo contornos de um artigo. Por outro lado,

há crônicas que tangenciam assuntos tão universais e profundos que acabam se

confundindo com um ensaio. Há textos, inclusive, em que fica difícil distinguir o

que realmente sejam, nesse aspecto há crônicas que são narrativas construídas

de tal forma que acabam se configurando quase como contos.  

TiPOS DE CRÔNICAS:

• CRÔNICA DISSERTATIVA – opinião explícita, com argumentos mais

"sentimentalistas" do que "racionais". Exposto na 1ª pessoa do singular

quanto na do plural: “ (...) Entender  a  violência  urbana  é  compreender  o  ser  

humano  cotidiano.  É  saber  que  o  homem  tem  novas  expectativas,  necessidades  

e   interesses.   Com   isso   conseguimos   captar   as   causas   e   motivos   de   tanta  

violência.   Temos   uma   sociedade   massificada,   pouco   comunicativa,   em   que  

muitas  vezes  leva  a  violência  como  uma  ação  a  ser  feita,  mas  sabemos  que  não  

se   trata   de   uma   ação   e   sim   de   uma   reação.   Podemos   enumerar   em   vários  

fatores  o  real  motivo  da  violência  urbana,  mas  afirmo  que  o  maior  deles  são  a  

prepotência  e  o  desrespeito  (...)  (JANUÁRIO,    2007,  s/p)  

• CRÔNICA NARRATIVA – tem por eixo uma história, o que a aproxima do

conto. Pode ser narrado tanto na 1ª quanto na 3ª pessoa do singular. Texto

lírico (poético, mesmo na prosa). Comprometido com fatos cotidianos

("banais", comuns); Na crônica "Eu e bebu na hora neutra da madrugada", Rubem Braga desenvolve uma narrativa em 1ª pessoa, a

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qual relata um dia inteiro que ele passa na companhia do Diabo, nesta

crônica ele cria uma certa intimidade e passa a chamá-lo de Bebu, por

Belzebu: "À tarde, eu já não o chamava de Belzebu, mas apenas de Bebu,

e ele me chamava de Rubem." ( BRAGA, 1998, p. 31).

• CRÔNICA DESCRITIVA - ocorre quando uma crônica explora a

caracterização dos seres animados e inanimados num espaço. Viva como

uma pintura, precisa como uma fotografia ou dinâmica como um filme

publicado: “…esqueceu o trabalho e as promissórias, esqueceu a

condução e o telefone e o asfalto, e saiu andando lentamente por aquele

morro coberto de um mato viçoso (...). Por um instante, o homem voltou

seu pensamento para a cidade e sua vida. Aquele telefone tocando em vão

era um dos milhões de atos falhados da vida urbana. Pensou no desgaste

nervoso dessa vida, nos desencontros, nas incertezas, no jogo de

ambições e vaidades, na procura de amor e de importância, na caça ao

dinheiro e aos prazeres. Ainda bem que de todas as grandes cidades do

mundo, o Rio é a única a permitir a evasão fácil para o mar e a floresta…”

(Braga, 1982, 17- 18).

• CRÔNICA NARRATIVO-DESCRITIVA – é quando uma crônica explora a

caracterização de seres, descrevendo-os. Ao mesmo tempo mostra fatos

cotidianos que podem ser narrados em 1ª ou 3ª pessoa do singular. Na

crônica “Brinquedos incendiados”, de Cecília Meireles os exemplos são

claros: “(...)Ora, uma noite, correu a notícia de que o bazar incendiara. E foi

uma espécie de festa fantástica. O fogo ia muito alto, o céu ficava todo

rubro, voavam chispas e labaredas pelo bairro todo. As crianças queriam

ver o incêndio de perto, não se contentavam com portas e janelas, fugiam

para a rua, onde brilhavam bombeiros entre jorros d’água. A elas não

interessavam nada peças de pano, cetins, cretones, cobertores, que os

adultos lamentavam. Sofriam pelos cavalinhos e bonecas, os trens e

palhaços, fechados, sufocados em suas grandes caixas. Brinquedos que

jamais teriam possuído, sonhos apenas da infância, amor platônico. O

incêndio, porém, levou tudo. O bazar ficou sendo um fumoso galpão de

cinzas. Felizmente, ninguém tinha morrido (...)” (MEIRELES, 2000, pp.121 -

122)

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• CRÔNICA HUMORÍSTICA – apresenta uma visão irônica ou cômica dos

fatos. A crônica de humor procura basicamente o riso, com certo registro

irônico dos costumes. Apresenta-se tanto sob a forma de um comentário

quanto de um relato curto, próximo do conto. Do primeiro caso tem-se

como exemplo um trecho de “O flagelo do vestibular”, de Luis Fernando Veríssimo: “Nunca tive que passar pelo martírio de um vestibular. É uma

experiência que jamais vou ter, como a dor do parto. Mas isso não impede

que todos os anos, por essa época, eu sofra com o padecimento de

amigos que se submetem à terrível prova, ou até de estranhos que vejo

pelos jornais chegando um minuto atrasados, tendo insolações e tonturas,

roendo metade do lápis durante o exame e no fim olhando para o infinito

com aquele ar de sobrevivente da Marcha da Morte de Batan [...]. Você

pode parar de roer as unhas. O pior já passou. - Não consigo. Vou levar

duas semanas para me acalmar. – Bom, então roa as suas próprias unhas.

Essas são as minhas. – Ah, desculpe. Foi terrível. A incerteza, as noites

sem sono. Eu estava de um jeito que até calmante me excitava, e quando

conseguia dormir sonhava com escolhas múltiplas: A) fracasso, B) vexame,

C) desilusão...” (VERÍSSIMO, 2008)

• CRÔNICA LÍRICA – linguagem poética e metafórica. Expressa o estado

do espírito, as emoções do cronista diante de um fato. Caracteriza-se pelo

flagrante de aspectos sentimentais, nostálgicos ou de simples beleza da

vida urbana, especialmente do Rio de Janeiro. Seu maior expoente é

Rubem Braga, seguido por legítimos poetas-prosadores como Carlos

Drummond de Andrade, Antônio Maria, Paulo Mendes Campos e outros.

Este tipo de comentário poético parece em desuso, provavelmente devido

à violência e a degradação na vida das grandes cidades brasileiras. Veja-

se este fragmento da crônica “Procura-se”, de Rubem Braga: “Procura-

se aflitivamente pelas igrejas e botequins, e no recesso dos lares e nas

gavetas dos escritórios, procura-se insistente e melancolicamente, procura-

se comovida e desesperadamente, e de todos os modos e com muitos

outros advérbios de modo, procura-se junto a amigos judeus e árabes, e

senhoras suspeitas e insuspeitas, sem distinção de credo nem de plástica,

procura-se junto às estátuas e na areia da praia e na noite de chuva e na

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manhã encharcada de luz, procura-se com as mãos, os olhos e o coração

um pobre caderninho azul que tem escrito na capa a palavra endereços e

dentro está todo sujo, rabiscado e velho. Pondera-se que tal caderninho

não tem valor para nenhuma outra pessoa, a não ser seu desgraçado

autor. Tem este autor publicado vários livros e enchido ou bem ou mal

centenas de quilômetros de colunas de jornal e revista, porém sua única

obra sincera e sentida é esse caderninho azul, escrito através de longos

anos de aflições e esperanças, de negócios urgentes e amores

contrariadíssimos, embora seja forçoso confessar que há números de

telefone que foram escritos em momentos em que um pé do cidadão

pisava uma nuvem e outro uma estrela e os outros dois... “(BRAGA, 1986,

p.57).

• CRÔNICA POÉTICA – apresenta versos poéticos em forma de crônica;

Clarice Lispector: “Conheço em mim uma imagem muito boa, e cada vez

que eu quero eu a tenho, e cada vez que ela vem ela aparece toda”.

(LISPECTOR, 1999, p. 36) É uma crônica linda, em que Clarice imagina

uma verde clareira que tem borboletas e um leão, um lugar de felicidade e

paz.

• CRÔNICA REFLEXIVA – reflexões filosóficas sobre vários assuntos.

Apresenta uma reflexão de alcance mais geral a partir de um fato

particular. É um texto analítico em que o cronista analisa um tema ligado à

condição humana. Escrito em 1ª pessoa, a crônica não tem estrutura fixa,

predomínio da linguagem coloquial, dialogismo com o leitor, que conferem

ao texto um tom de conversa íntima, predomínio de recursos estilísticos:

metáforas, comparações analogias etc. O assunto é abordado a partir da

visão subjetiva do autor. Um exemplo é a crônica “A luta e a lição“, de Carlos Heitor Cony, publicada na Folha Online: “Um brasileiro de 38 anos,

Vítor Negrete, morreu no Tibete após escalar pela segunda vez o ponto

culminante do planeta, o monte Everest. Da primeira, usou o reforço de um

cilindro de oxigênio para suportar a altura. Na segunda (e última),

dispensou o cilindro, devido ao seu estado geral, que era considerado

ótimo. As façanhas dele me emocionaram, a bem sucedida e a malograda.

Aqui do meu canto, temendo e tremendo toda a vez que viajo no bondinho

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do Pão de Açúcar, fico meditando sobre os motivos que levam alguns

heróis a se superarem. Vitor já havia vencido o cume mais alto do mundo.

Quis provar mais, fazendo a escalada sem a ajuda do oxigênio

suplementar. O que leva um ser humano bem sucedido a vencer desafios

assim? [...] Somos o que somos hoje devido a heróis que trocam a vida

pelo risco. Bem verdade que escalar montanhas, em si, não traz nada de

prático ao resto da humanidade que prefere ficar na cômoda planície da

segurança” (CONY,1998, cad.04, p. 07)

• CRÔNICA-ENSAIO - Apesar de ser escrita em linguagem literária, ter

uma veia humorística e valer-se inclusive da ficção, este tipo de crônica

apresenta uma visão abertamente crítica da realidade cultural e ideológica

de sua época, servindo para mostrar o que autor quer ou não quer de seu

país. Aproxima-se do ensaio, do qual guarda o aspecto argumentativo.

Nelson Rodrigues é o grande nome dessa linha, mas devemos citar

também Paulo Francis, Arnaldo Jabor, Carlos Heitor Cony e, em alguns

textos, Luís Fernando Veríssimo. Observe este fragmento da crônica No

país dos escândalos, saudade dos velhos carnavais, de Arnaldo Jabor:

“O carnaval virou uma paisagem de nádegas: Hoje é carnaval e como ando

numa onda nostálgica sou arremessado para 1950, no colo de meu pai, na

Avenida Rio Branco, vendo passar as sociedades carnavalescas. Eram

grandes carros alegóricos, cheios de rodas moventes, de estátuas de papel

e massa, toscas e épicas com grandes rostos, estrelas, engrenagens

brilhantes, sóis, luas, cobertos de mulheres provocantes. Meu pai me

levava pela mão e eu olhava um imenso carro (seria grande mesmo ou era

a escala de minha infância?) que era um despotismo de cachos de

bananas, com uma lindíssima mulher morena e nua no alto. Os pais de

família, as mães de família (todo mundo era de família...) diziam: ‘Olha a

Elvira Pagã! Olha a Elvira Pagã!’. Elvira Pagã era apenas uma vedete,

mas, naquele ano remoto, ela queria provar alguma coisa. Algumas

mulheres como ela (Luz del Fuego e outras) transcendiam o palco e

viravam o símbolo vivo de alguma loucura no ar, de algum desejo reprimido

no coração das famílias. Eu olhava em volta e via nas senhoras distintas...”

(JABOR, 2001, E-8)

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A HISTÓRIA DA CRÔNICA NO BRASIL – século XIX

A história da crônica no Brasil está ligada a uma produção engajada na

formação de uma literatura brasileira, no século XIX, enquanto “sistema”, ou seja,

como conjunto de obras que formam uma tradição literária e que possuem entre si

denominadores comuns:

Estes denominadores são, além das características internas, (língua tema, imagens), certos elementos de natureza social e psíquica, embora literariamente organizados, que se manifestam historicamente e fazem da literatura aspecto orgânico da civilização. Entre eles se distinguem: a existência de um conjunto de produtores literários, mais ou menos conscientes de seu papel; um conjunto de receptores, formando os diferentes tipos de público, sem os quais a obra não vive; um mecanismo transmissor, (de modo geral, uma linguagem, traduzida em estilos), que liga uns a outros (CANDIDO, 1993, p. 23)

No século XIX, com o avanço da imprensa e do jornal, a crônica tornou-se

"Folhetim". João Roberto Faria no prefácio de Crônicas Escolhidas de José de

Alencar nos explica:

Naqueles tempos, a crônica chamava-se folhetim e não tinha as características que tem hoje. Era um texto mais longo, publicado geralmente aos domingos no rodapé da primeira página do jornal, e seu primeiro objetivo era comentar e passar em revista os principais fatos da semana, fossem eles alegres ou tristes, sérios ou banais, econômicos ou políticos, sociais ou culturais. O resultado, para dar um exemplo, é que num único folhetim podiam estar, lado a lado, notícias sobre a guerra da Criméia, uma apreciação do espetáculo lírico que acabara de estrear, críticas às especulações na Bolsa e a descrição de um baile no Cassino. (FARIA, 1995 )

O folhetim fazia parte da estrutura dos jornais, era informativo e crítico. Aos

poucos foi se afastando e se constituindo como gênero literário. A linguagem se

tornou mais leve, mas com uma elaboração interna complexa, carregando a força

da poesia e do humor.

É de Machado de Assis a crônica que, ao caracterizar o “folhetim” e o

“folhetinista”, está apresentando as características da crônica, conforme se pode

constatar no seguinte trecho extraído de Coutinho:

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O folhetim nasceu do jornal, o folhetinista, por conseqüência do jornalista. Esta última afinidade é que desenha as saliências fisionômicas na moderna criação. O folhetinista é a fusão admirável do útil e do fútil, o parto curioso e singular do sério, consociado com o frívolo.[...]. Efeito estranho é este, assim produzido pela afinidade assinalada entre o jornalista e o folhetinista. Daquele cai sobre este a luz séria e vigorosa, a reflexão calma, a observação profunda. Pelo que toca ao devaneio, à leviandade, está tudo encarnado no folhetinista mesmo; o capital próprio. O folhetinista, na sociedade, ocupa o lugar do colibri na esfera vegetal; solta, esvoaça, brinca, tremula, paira e espaneja-se sobre todos os caules suculentos, sobre todas as seivas vigorosas. Todo o mundo lhe pertence; até mesmo a política. (COUTINHO, 1986, p. 121-122)

Nessa época, além das pinturas e fotografias que “retratam a paz

doméstica abrigada pelo livro.” (ZILBERMAN, 1999, p. 16) a cidade contava com

os elementos necessários para a formação e o fortalecimento de uma sociedade

leitora, mecanismos mínimos para a produção e circulação de literatura, como

tipografias, livrarias e bibliotecas. Dessa maneira, era perfeitamente concebível o

projeto romântico de sedução e consolidação de um público indispensável à

fundação da literatura nacional. Nesse sentido, cabia criar o hábito e a ideia da

leitura como prazer na nossa burguesia apenas, e quando muito, alfabetizada.

Os textos folhetinescos - entre eles as crônicas - buscavam estabelecer

uma passagem entre uma cultura predominantemente oral e a cultura escrita,

conversando familiarmente com os leitores, recapitulando o lido, explicando o

aparecimento de novos personagens etc. Lê-se em Memórias de um sargento de

milícias, publicado em folhetim em 1852:

Dadas as explicações do capítulo precedente, voltemos ao nosso memorando, de quem por um pouco nos esquecemos. Apressemo-nos a dar ao leitor uma boa notícia: o menino desempacara do F, e já se achava no P, onde por uma infelicidade empacou de novo. (ALMEIDA, s/d, p. 64)

Outra narrativa bastante frequente era simular uma atitude de intimidade

com o leitor. Leia-se em crônica dos anos de 1850, de Joaquim Manuel de

Macedo, reunida sob o título de Um passeio pela cidade do Rio de Janeiro:

Não se incomodem com os preparativos de uma viagem, que talvez seja longa: eu tomo isso à minha conta. Não tenham medo de se verem metidos por mim dentro dos ônibus, gôndolas ou carros da praça; desejo muito dar o maior prazer que for possível aos meus companheiros de passeio, para condená-los a semelhante martírio. (MACEDO, 1991, p. 21)

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Sonia Brayner (1982, p. 428) chama a atenção para a crônica machadiana

como “laboratório ficcional”, ou seja, lugar de ensaio de uma narrativa dialógica

experimental, cujo narrador intruso interrompe frequentemente o enredo para

comentar seu processo ficcional com o leitor. Nesse sentido, compare-se como o

cronista de A Semana costumava abordar a elaboração de seu próprio texto em

tom de conversa e, mais adiante, como o narrador de Esaú e Jacó ratificava essa

nova perspectiva na literatura brasileira:

Eu, quando vejo um ou dois assuntos puxarem para si todo o cobertor da atenção pública, deixando os outros ao relento, dá-me vontade de os meter nos bastidores, trazendo à cena tão-somente a arraia miúda, as pobres ocorrências de nada [...]. É que eu sou justo e não posso ver o fraco esmagado pelo forte. (ASSIS, 1973, p. 568)

Através dessas conversas com os leitores, a produção folhetinesca ia

colocando em prática o projeto romântico de consolidação de uma literatura

nacional. Assim, a utilização do jornal como suporte dessa literatura também tinha

o seu fundamento. De acordo com Patrícia Pina, a folha diária mediava as

relações entre a cultura oralizada tradicional e a cultura letrada, pois “Era fácil ler

um jornal: suas folhas se dobravam, era pouco volumoso, podia ser guardado até

nas algibeiras. Podia ser lido na esquina, compartilhado por muitas pessoas.”

(PINA, 2006, p. 68)

A produção folhetinesca oitocentista não foi simplesmente determinada por

um público de tradição oral, ao qual ela deveria se conformar. Dialeticamente, ela

também interfere ativamente nesse panorama, criando um público e modificando

comportamentos. A compreensão desse gênero genuinamente brasileiro, como

avalia Afrânio Coutinho, precisa ser conjugada com um esforço de recuperação

da história nos estudos literários, em perspectiva diferente daquela adotada no

século XIX pelos historiadores da literatura.

A crônica oitocentista, ao elaborar estratégias textuais visando à fundação

de um público leitor, deixa entrever uma sólida tradição de elementos do passado

literário fundada em regras e preceitos retóricos. José de Alencar, cronista do

Correio Mercantil nos anos 50, definia sua conversa semanal com os leitores

como algo objetivo, da esfera do prazer, mas também da utilidade: “A conversa é

uma das coisas mais agradáveis e mais úteis que existe no mundo. [...] A palavra

é um instrumento, um cinzel, um crayon que traça mil arabescos, que desenha

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baixos-relevos e tece mil harmonias de sons e de formas.” 1

A crônica brasileira moderna tem, em Machado de Assis, um dos seus

principais fundadores. Machado escrevia suas crônicas sob pseudônimos. Só 40

anos após sua morte é que se descobriu o verdadeiro autor das chamadas

Crônicas de Lélio.

Na crônica publicada no jornal Gazeta de Notícias, em 19 de maio de1888,

Machado de Assis aborda com ironia a questão da abolição da escravatura, que

havia acorrido no dia 13 de maio de 1888:.

Bons dias! Eu pertenço a uma família de profetas après coup, post factum, depois do gato morto, ou como

melhor nome tenha em holandês. Por isso digo, e juro se necessário fôr, que tôda a história desta lei de 13 de maio estava por mim prevista, tanto que na segunda-feira, antes mesmo dos debates, tratei de alforriar um molecote que tinha, pessoa de seus dezoito anos, mais ou menos. Alforriá-lo era nada; entendi que, perdido por mil, perdido por mil e quinhentos, e dei um jantar.

Neste jantar, a que meus amigos deram o nome de banquete, em falta de outro melhor, reuni umas cinco pessoas, conquanto as notícias dissessem trinta e três (anos de Cristo), no intuito de lhe dar um aspecto simbólico.

No golpe do meio (coup du milieu, mas eu prefiro falar a minha língua), levantei-me eu com a taça de champanha e declarei que acompanhando as idéias pregadas por Cristo, há dezoito séculos, restituía a liberdade ao meu escravo Pancrácio; que entendia que a nação inteira devia acompanhar as mesmas idéias e imitar o meu exemplo; finalmente, que a liberdade era um dom de Deus, que os homens não podiam roubar sem pecado.

Pancrácio, que estava à espreita, entrou na sala, como um furacão, e veio abraçar-me os pés. Um dos meus amigos (creio que é ainda meu sobrinho) pegou de outra taça, e pediu à ilustre assembléia que correspondesse ao ato que acabava de publicar, brindando ao primeiro dos cariocas. Ouvi cabisbaixo; fiz outro discurso agradecendo, e entreguei a carta ao molecote. Todos os lenços comovidos apanharam as lágrimas de admiração. Caí na cadeira e não vi mais nada. De noite, recebi muitos cartões. Creio que estão pintando o meu retrato, e suponho que a óleo.

No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe com rara franqueza: - Tu és livre, podes ir para onde quiseres. Aqui tens casa amiga, já conhecida e tens mais um

ordenado,umordenadoque... -Oh! Meu senhô! fico.************************************************************* - ...Um ordenado pequeno, mas que há de crescer. Tudo cresce neste mundo; tu cresceste imensamente. Quando nasceste, eras um pirralho dêste tamanho; hoje estás mais alto que eu. Deixa ver; olha, és mais alto quatro dedos................................................................................................................. -Artur a não qué dizê nada, não, senhô........................................................................................... - Pequeno ordenado, repito, uns seis mil-réis; mas é de grão em grão que a galinha enche o seu papo. Tu vales muito mais que uma galinha............................................................................................... - Justamente. Pois seis mil-réis. No fim de um ano, se andares b em, conta com oito. Oito ou sete.

Pancrácio aceitou tudo; aceitou até um peteleco que lhe dei no dia seguinte, por me não escovar bem as botas; efeitos da liberdade. Mas eu expliquei-lhe que o peteleco, sendo um impulso natural, não podia anular o direito civil adquirido por um título que lhe dei. Êle continuava livre, eu de mau humor; eram dois estados naturais, quase divinos.

Tudo compreendeu o meu bom Pancrácio; daí pra cá, tenho-lhe despedido alguns pontapés, um ou outro puxão de orelhas, e chamo-lhe bêsta quando lhe não chamo filho do diabo; cousas tôdas que êle recebe humildemente, e (Deus me perdoe!) creio que até alegre.

O meu plano está feito; quero ser deputado,e, na circular que mandarei aos meus eleitores, direi que, antes, muito antes da abolição legal, já eu, em casa, na modéstia da família, libertava um escravo, ato que comoveu a tôda a gente que dêle teve notícia; que êsse escravo tendo aprendido a ler, escrever e

                                                                                                               

1  Ao correr da Pena de José de Alencar , p.114 – informações tiradas do site www.enad.unama.br

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contar, (simples suposições) é então professor de filosofia no Rio das Cobras; que os homens puros, grandes e verdadeiramente políticos, não são os que obedecem à lei, mas os que se antecipam a ela, dizendo ao escravo: és livre, antes que o digam os poderes públicos, sempre retardatários, trôpegos e incapazes de restaurar a justiça na terra, para satisfação do céu.

Boas noites. (ASSIS, 1973: p. 489 – 491)

Machado de Assis não deixa de lado a luta dos intelectuais oitocentistas

por uma tradição literária no Brasil. Sendo assim, o lastro da produção anterior

pode ser lido nas suas crônicas que também atualizam os ensinamentos

clássicos, compreendendo a linguagem como insubmissa e articuladora do real.

Exemplo disso está em texto do dia 29 de outubro de 1893, no qual o cronista

explica a uma leitora sobre a debilidade dos fatos fora do domínio da linguagem:

“- Palavras, frases. A senhora é uma linda frase de artista. Tem nas formas um

magnífico substantivo: os adjetivos são da casa de Madame Guimarães. A boca é

um verbo. Et verbum caro factum est.” 2

A crônica, mesmo comprometida com uma recepção mais ampla e com o

projeto de formação de uma tradição na literatura brasileira, cria um novo estatuto

ficcional que consiste em compreender a linguagem como elemento insubmisso à

realidade positivada, capaz de subvertê-la e recriá-la através do humor e da

desestabilização das estruturas organizadoras desse real, como a lógica linear.

Sugere Machado que o bom cronista é aquele que prefere as “semanas pobres”,

pois as ricas exigem “muitas cortesias”, prejudicando a liberdade de criação.

                                                                                                               

2   informações tiradas do site www.portalsaofrancisco.com.br.alfa/centenariode-machado-de-

assisa/a-semana5.phpa

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SÉCULO XX, CRÔNICA?

Em crônica publicada na revista O Cruzeiro, Rubem Braga, considerado

um dos nossos mais importantes cronistas, na tentativa de responder à pergunta

“Para quem você escreve?”, observa que, estando no jornal, o cronista se dirige a

“toda gente” e que a crônica, “uma espécie de prolongamento de conversa”, é “o

gênero mais precário que existe e depende de tudo, inclusive da moda”. Por não

ter “tempo nem inspiração para fazer coisa melhor”, o cronista “não pode ter a

pretensão de fazer todo dia alguma coisa interessante”. Mas, também reconhece

que a “sua meio-literatura apressada” (BRAGA apud BELTRÃO, 1980, p. 70-72)

chega ao seu destino, o leitor, nele provocando reações de agrado ou de

desagrado, manifestadas em contatos com o escritor, o que reforça o caráter de

“conversa” de que nos fala.

Tentando também responder à suposta pergunta “o que é crônica?”, na

metacrônica “Teoria da Crônica”3, sem tirar do texto o seu jeito de “prolongamento

de conversa”, Afonso Romano de Sant’Anna teoriza sobre o gênero e sobre o

escritor, fazendo uso de uma linguagem rica em metáforas, como fizeram outros

por ele lembrados:

Machado de Assis dizia que o cronista é uma espécie de colibri que beija um assunto aqui, outro ali. [...] Veríssimo diz que o cronista é como uma galinha, bota seu ovo regularmente, e Carlos Eduardo Novaes define as crônicas como laranjas: podem ser doces ou azedas, e ser consumidas na poltrona da casa ou espremidas na sala de aula. (SANT’ANNA, 2000, p. 201-205)

Em texto de apresentação do livro O Nariz & Outras Crônicas, Veríssimo

se manifesta sobre recorrente discussão quanto ao difícil enquadramento do

gênero em parâmetros que o conceituem teoricamente. Bem ao seu estilo, pelo

recurso à metalinguagem, à metáfora e ao humor, o cronista assume um

posicionamento que lhe garante a liberdade de produção, independente de

conceitos pré-formulados.

                                                                                                               3 Crônica com data de 08/10/1996, sem referência de publicação e pertencente ao conjunto de crônicas publicadas no livro “A Sedução da Palavra”.

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CRÔNICA E OVO

A discussão sobre o que é, exatamente, crônica, é quase tão antiga quanto aquela sobre a genealogia

da galinha. Se um texto é crônica, conto ou outra coisa, interessa aos estudiosos da literatura, assim como se

o que nasceu primeiro foi o ovo ou a galinha interessa aos zoólogos, geneticistas, historiadores e (suponho) o

galo, mas não deve preocupar nem o produtor nem o consumidor. Nem a mim nem a você.

Eu me coloco na posição da galinha. Sem piadas, por favor. Duvido que a galinha tenha uma teoria sobre o

ovo, ou na hora de botá-lo, qualquer tipo de hesitação filosófica. Se tivesse, provavelmente não botaria o ovo.

É da sua natureza botar ovos, ela jamais se pergunta “Meu Deus, o que eu estou fazendo?” Da mesma forma

o escritor diante do papel em branco (ou, hoje em dia, da tela limpa do computador) não pode ficar se

policiando para só “botar” textos que se enquadrem em alguma definição técnica de crônica. O que aparecer

é crônica.

Há uma diferença entre o cronista e a galinha, além das óbvias (a galinha é menor e mais nervosa).

Por uma questão funcional, o ovo tem sempre o mesmo formato, coincidentemente oval. O cronista também

precisa respeitar certas convenções e limites mas está livre para produzir seus ovos em qualquer formato.

Nesta coleção existem textos que são contos, outros que são paródias, outros que são puros exercícios de

estilo ou simples anedotas e até alguns que se submetem ao conceito acadêmico de crônica. Ao contrário da

galinha, podemos decidir se o ovo do dia será listado, fosforescente ou quadrado.

Você, que é o consumidor do ovo e do texto, só tem que saboreá-lo e decidir se é bom ou ruim, não se

é crônica ou não é. Os textos estão na mesa: fritos, estrelados, quentes, mexidos... Você só precisa de um

bom apetite. (VERÍSSIMO, 1996, p. 4-5)

Nesse texto, Veríssimo estabelece como seu interlocutor, o leitor que

busca uma leitura sem compromissos teóricos ou didáticos – o que demonstra a

sua consciência de que há leitores diversos, dependendo do interesse com que

abordam o texto. Revelando uma certa impaciência, perceptível no parágrafo

inicial do texto, ao mesmo tempo em que “tranquiliza” o leitor e lhe garante

liberdade de ação, o escritor parece mandar um recado a “outros leitores”,

tentando pôr fim à eterna discussão sobre o gênero “crônica”.

Nas duas primeiras décadas do século XX, o gênero deixara de ser

designado por “folhetim”. A partir da Semana de Arte Moderna de São Paulo, em

1922, os autores serviram-se da crônica para divulgar e defender novos ideais de

arte e literatura. O humor nos fatos do cotidiano, fatos banais, nova linguagem

literária. Um jovem inicia como colaborador de jornal nesse período e se tornará

um dos principais representantes do gênero: Rubem Braga.

O poema em prosa de Mário Quintana, “Crônica”, faz uso da alusão ao

discutir se o poema, enquanto obra literária, não seria também uma espécie de

crônica, pois revela no seu processo constitutivo uma relação intertextual

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subjacente, no qual reproduz construções temáticas e figurativas, que embora

possam ser substituídas, são comuns aos dois gêneros textuais: "Ah, essas

pequenas coisas, tão cotidianas, tão prosaicas às vezes, de que se compõe

meticulosamente a tessitura de um poema... talvez a poesia não passe de um

gênero de crônica, apenas: uma espécie de crônica da eternidade". (QUINTANA,

2008, p. 126)

TRABALHO COM CRÔNICA

Há alguns anos publicou-se um texto que dizia “crônicas são fotografias”, e

foi partir dessa frase que surgiu a inspiração, o ponto de partida para o projeto

“Descortinando a crônica: a ética no dia-a-dia“. Quando se lida com a vida, muitas

são as imagens que nos surgem, dignas de serem registradas em imagens. As

fotografias são esses registros destas imagens que queremos preservar na nossa

lida diária com a vida.

Apresentamos algumas propostas para trabalhar em sala de aula, é

importante desenvolvê-las sem a necessidade do(a) professor(a) se deter às

teorias sobre crônicas, pois isso virá com o tempo.

1ª proposta: leitura de mundo

• Os (as) alunos (as) registrarão passagens do cotidiano através de fotografias

tiradas por eles (as); (ao explorar outras linguagens artísticas o professor

deve se preocupar se todos têm as mesmas oportunidades para realizá-

las);

• relatos ao grupo sobre as imagens registradas;

• separação das fotografias por temas correlatos;

• pesquisa de textos (independente do gênero), em jornais e revistas, que

tenham relação com as fotografias;

• leitura dos textos, destacando as passagens relacionadas às imagens;

• todo o trabalho desenvolvido envolve o grande grupo;

• escrita de textos a partir das imagens (não definir o tipo ou gênero de texto,

o professor notará que surgirão narrações, descrições, reflexões, etc.).

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Cada um procura a melhor forma de fazer seus registros, buscando

artefatos que lhe sejam mais agradáveis. O que importa é o registro feito. O

conhecimento é uma experiência prazerosa e toda vez que se faz registro, está

repassando o conhecimento adquirido e vivenciado para outras pessoas. O

conhecimento não é nem nunca foi egoísta. Precisa ser partilhado. Convivido.

Obs.: todo o material será guardado para exposição.

Da mesma forma que se registram as imagens em fotos, as crônicas registram as mesmas imagens em frases e textos. Assim, existe uma crônica,

existe uma imagem escrita para garantir a preservação da lida diária da vida.

2ª proposta: leitura, reflexão e observação

• o (a) professor (a) distribui textos (crônicas) à turma e esta fará a

pesquisa de imagens que estejam relacionadas aos textos (atividade

inversa da primeira proposta).

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PARA PENSAR: O prazer do compartilhamento está em cada um de nós. Cada

prazer vivido por nós e partilhado, pode gerar uma nova proposta de ver o mundo.

Novas janelas podem ser abertas e novas construções podem ser erguidas.

Vivemos hoje num jogo em que não sabemos as regras mas sabemos que

não se pode parar de jogar. Não podemos nos descuidar. Não podemos ser

apenas amadores. Este jogo é para quem tem curiosidade na alma e que saiba

conviver bem. Registrar, visualizar, memorizar bem.

A gestão da curiosidade deve ser uma constante em nós, lentes ou

escreventes. Não importa como vamos fazer para saciar a nossa curiosidade.

Quais os instrumentos que vamos usar. Precisamos fazer algo diferente

acontecer. Precisamos gerenciar nossa curiosidade de tal forma, que ela anime

outras pessoas. Ela nos faz perguntadores e questionadores, dá vida a novas

formas, está na arte de pensar e de ver. Gera novos pensamentos, novas visões.

RUBEM BRAGA, em 1936, lançou seu primeiro livro de crônicas, O Conde e o

Passarinho (BRAGA, 1998). Único escritor brasileiro reconhecido essencialmente

como cronista iniciou sua trajetória literária como jornalista, cumpriu o papel de

narrador-repórter e dotado de uma sensibilidade especial, captou com maior

intensidade os sinais da vida imperceptíveis aos olhos de seus colegas de ofício,

emprestou para o jornal ares de literatura e se eterniza nas páginas dos livros.

Nas obras de Braga, recheadas de simplicidade, o leitor aprende a ler na história

inventada a sua própria história e reconhecer o lirismo no mundo de hoje pelas

vias da emoção aliada à razão.Rubem Braga inovou a crônica com elementos de

ficção e várias formas textuais. A crônica “Recado ao Senhor 903“, por exemplo,

é uma carta:

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Recado ao Senhor 903

“Vizinho,

Quem fala aqui é o homem do 1003. Recebi outro dia, consternado, a visita do zelador,

que me mostrou a carta em que o senhor reclamava contra o barulho em meu

apartamento. Recebi depois a sua própria visita pessoal – devia ser meia-noite – e a sua

veemente reclamação verbal. Devo dizer que estou desolado com tudo isso, e lhe dou

inteira razão. O regulamento do prédio é explícito e, se não o fosse, o senhor ainda

teria ao seu lado a Lei e a Polícia. Quem trabalha o dia inteiro tem direito a repouso

noturno e é impossível repousar no 903 quando há vozes, passos e músicas no 1003.

Ou melhor; é impossível ao 903 dormir quando o 1003 se agita; pois como não sei o

seu nome nem o senhor sabe o meu, ficamos reduzidos a ser dois números, dois

números empilhados entre dezenas de outros. Eu, 1003, me limito a Leste pelo 1005, a

Oeste pelo 1001, ao Sul pelo Oceano Atlântico, ao Norte pelo 1004, ao alto pelo 1103

e embaixo pelo 903 – que é o senhor. Todos esses números são comportados e

silenciosos: apenas eu e o Oceano Atlântico fazemos algum ruído e funcionamos fora

dos horários civis; nós dois apenas nos agitamos e bramimos ao sabor da maré, dos

ventos e da lua. Prometo sinceramente adotar, depois das 22 horas, de hoje em diante,

um comportamento de manso lago azul. Prometo. Quem vier à minha casa (perdão: ao

meu número) será convidado a se retirar às 21h45, e explicarei: o 903 precisa repousar

das 22 às 7 pois as 8h15 deve deixar o 783 para tomar o 109 que o levará ate o 527 de

outra rua, onde ele trabalha na sala 305. Nossa vida, vizinho, está toda numerada

(...)Peço-lhe desculpas – e prometo silêncio...................................................................

Mas que me seja permitido sonhar com outra vida e outro mundo, em que um homem

batesse à porta do outro e dissesse: ‘Vizinho, são três horas da manhã e ouvi música

em tua casa. Aqui estou’. E o outro respondesse: ‘Entra vizinho e come do meu pão e

bebe do meu vinho. Aqui estamos todos a bailar e a cantar, pois descobrimos que a

vida é curta e a lua é bela’E o homem trouxesse sua mulher, e os dois ficassem entre os

amigos e amigas do vizinho entoando canções para agradecer a Deus o brilho das

estrelas e o murmúrio da brisa nas árvores, e o dom da vida, e a amizade entre os

humanos, e o amor e a paz.” BRAGA, Rubem. “Recado ao senhor 903”. In: Para gostar de ler: crônicas. V. 1. 2. Ed. São Paulo: Ática, 1977, PP. BRAGA, 1977, 74-75

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• Fato corriqueiro transformado em fato singular e único: O leitor

acompanha o acontecimento, como uma testemunha guiada pelo olhar do

cronista que tem a pretensão de registrar de maneira pessoal o

acontecimento.

• Na crônica "Recado ao Senhor 903", há uma crítica à desumanização

na cidade grande, na qual somos, muitas vezes, apenas números. Houve

uma inversão proposta pelo narrador ao final da crônica: no lugar da

intolerância, tão comum nas cidades grandes, ele propõe um possível

acolhimento amigo e não fazer barulho, o personagem foi ético em suas

atitudes.

• As personagens não têm descrição psicológica profunda.

3ª proposta: leitura e escrita

• Discutir com os alunos sobre cartas, como são usadas atualmente.

• Em uma caixinha serão colocados todos os nomes dos alunos (em papéis

dobrados) cada aluno retira um.

• Escreverá uma carta a esse (a) colega, relatando tudo que tem observado

sobre ele (a). Obs.: orientá-los para que salientem o que há de mais

positivo em cada um. É o reconhecimento que o ser humano falha, mas

tem muitas qualidades.

• As cartas serão encaminhadas à pessoa relatada.

• leitura dos textos, destacando as passagens que ele (a) mais se identificou;

• o trabalho pode ter sequência, cada um conversa com a família sobre os

vizinhos mais próximos, até que ponto realmente eles os conhecem, o que

fazem, quantos moram na casa, a idade deles, etc.

A vida em comunidade, a necessidade de interação entre os seres,

exemplificar com fatos relatados no programa “Fantástico”, da Rede

Globo, no quadro “O Conciliador”.

• Discutir sobre cartas, como são usadas atualmente, mostrar outros

exemplos de crônicas nesse formato. Há muito para conversar sobre isso.

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4ª proposta: leitura, análise da linguagem

• Vamos chamar de “garimpagem do texto”.

• O narrador-personagem da crônica reconhece que faz barulho e por isto

pede desculpas. Procurar as palavras e afirmações que

constroem essa idéia.   (resposta   -­‐"consternado",  

"desolado",   "lhe   dou   inteira   razão",   "O   regulamento   do   prédio   é   explícito",  

"Quem   trabalha   o   dia   inteiro   tem   direito   ao   repouso",   "Peço   desculpas",  

"Prometo  silêncio".)  

• Através de ironias, o narrador reconhece sua falta, mas explicita que não

concorda com a situação. Ele faz isso, especialmente, quando?

possíveis respostas:

o ironiza   as   estruturas   dos   prédios   em   que   as   pessoas  

ficam  empilhadas,  perdendo  o  contato  humano;  

o refere-­‐se  a  todos  os  vizinhos,   incluindo  ele  próprio,  pelo  número  do  

apartamento  e  não  pelo  nome;  

o critica  o   isolamento  e  a  distância  entre  as  pessoas  cujas  vidas  estão  

limitadas  pelas  normas  que  cerceiam  o  convívio  humano;  

o  sonha  com  outra  relação  mais  humana  e  fraterna,  entre  as  pessoas.  

• Ironia e humor a) "Todos esses números são comportados e silenciosos:

“apenas eu e o Oceano Atlântico fazemos algum ruído e funcionamos fora dos

horários civis; nós dois apenas nos agitamos e bramimos ao sabor da maré,

dos ventos e da lua." Verifique ainda como o uso do elemento "apenas", usado

duas vezes intensifica a sua exclusão em relação aos demais moradores do

prédio.

b) O excesso de referências a números: "Prometo sinceramente adotar,

depois das 22 horas, de hoje em diante, um comportamento de manso lago

azul. Prometo. Quem vier à minha casa (perdão: ao meu número) será

convidado a se retirar às 21h 45, e explicarei: o 903 precisa repousar das 22

às 7 pois às 8h 15 deve deixar o 783 para tomar o 109 que o levará até o 527

de outra rua, onde ele trabalha na sala 305."

c) o contraste entre uma situação e outra: os que mantêm silêncio e pessoas,

como o narrador, que não o fazem;

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d) o inesperado: o texto parece se encaminhar para um sentido e bruscamente

aponta para outro.

Professor, se achar importante trabalhar a parte gramatical, seguem alguns

exemplos:

• Uso de verbo

a) usa os verbos no pretérito imperfeito do subjuntivo, o que indica

possibilidade/desejo/hipótese:

"Mas que me seja permitido sonhar com outra vida e outro mundo, em que

um homem batesse à porta do outro e dissesse: 'Vizinho, são três horas da

manhã e ouvi música em tua casa. Aqui estou'. E o outro respondesse:

'Entra vizinho e come do meu pão e bebe do meu vinho. Aqui estamos todos

a bailar e a cantar, pois descobrimos que a vida é curta e a lua é bela'.

E o homem trouxesse sua mulher, e os dois ficassem entre os amigos e

amigas do vizinho entoando canções para agradecer a Deus o brilho das

estrelas e o murmúrio da brisa nas árvores, e o dom da vida, e a amizade

entre os humanos, e o amor e a paz.”

• Uso dos artigos

a) "Quem fala aqui é o homem do 1003.".

• Foi usado o artigo definido ( o ), particularizando, dessa forma, um

indivíduo, entre outros.

• b) "Mas que me seja permitido sonhar com outra vida e outro mundo, em

que um homem batesse à porta do outro e dissesse (...). E o outro

respondesse (...)"

• Há artigo indefinido ("um homem"), quando foi introduzido um elemento

ainda não citado no texto, generalizando-o. Há artigo definido ("o

outro"), quando novamente se tem um indivíduo já citado,

particularizando-o.

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• Essas escolhas linguísticas vão constituindo a ligação/coesão entre as

partes do texto, de tal maneira que, mais do que saber o nome das

classes da gramática - substantivos, adjetivos, artigos, advérbios,

verbo, conjunção, pronome, preposição, numeral - é importante saber

suas articulações na construção dos sentidos de um texto.

DICA DE LEITURA: Assim como na crônica “Recado ao Senhor 903” na

crônica "UM PÉ DE MILHO", o cronista mais uma vez induz o leitor a uma

reflexão. A crônica está em 1ª pessoa e apresenta uma narrativa de cunho íntimo

que revela ao leitor a origem do escritor, seu íntimo e a realidade em que vive.

Parece uma meditação lírica de um Eu que narra, mas aparenta estar falando

sozinho "Sou um ignorante, um pobre homem de cidade. Mas eu tinha razão..."

(BRAGA, 1998, p. 42).

Ele utiliza metáforas e simbologias que oferecem um lirismo constante no

corpus do texto: "mas na glória do seu crescimento, tal como o vi em uma noite

de luar, o pé de milho parecia um cavalo empinado, as crinas ao vento - e em

outra madrugada parecia um galo cantando." (BRAGA, 1998, p. 43)

A crônica se refere à roça e à cidade, causando uma mesclagem entre as

duas através do ser humano. Um homem que carrega uma cultura do meio rural,

mas vive atualmente na cidade. Resgata sua origem através de um pé de milho,

que metaforiza a presença do ser fora do seu habitat natural. Esse resgate da

origem confere ao homem um conforto e preenchimento pra alma: "E eu não sou

mais um medíocre homem que vive atrás de uma chata máquina de escrever: sou

um rico lavrador da Rua Júlio Castilhos." (BRAGA, 1998, p. 43)

Dentro dessa experiência narrada, o autor oferece ao leitor a oportunidade

de fazer uma auto-análise, conferindo a si mesmo seus valores: "É muito

perceptível a dificuldade do narrador para generalizar a experiência pessoal,

transformando-a em conselho prático para os outros, ao mesmo tempo que essa

experiência em si mesma se vai tornando cada vez mais rala, num mundo que

adotou o ritmo desnorteante das mudanças contínuas e imprevisíveis."

(ARRIGUCCI JR, 2001, p. 25)

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5ª proposta: metalinguística

Para Chalhub (1989) a palavra que é do domínio de todos, no poema, no

romance ou na crônica, necessita ser singular para transpor as fronteiras de sua

natureza de signo: "são temas metalinguísticos na órbita do criador emissor".

• A abordagem metalinguística, aos moldes dos cronistas, seria um

instrumento didático a se considerar, para tanto, o aluno relata, em forma de crônica, suas dúvidas na elaboração dos vários tipos de

textos exigidos em situações concretas do cotidiano escolar.

• Tal procedimento formalizaria um quadro analítico e individual da

classe ao especificar suas generalidades e idiossincrasias.

• Cabe ao professor, nessa situação, elaborar estratégias de acordo com

as necessidades e as disponibilidades no âmbito de um trabalho

conjuntivo e interdisciplinar.

• Adquirida a competência de elaborar textos a partir de sua vivência

como sujeito histórico o aluno estará apto a superar suas barreiras

físicas e cognitivas e a perceber o diálogo entre os diversos gêneros

com os quais nos deparamos no cotidiano escolar e ao interagirmos

socialmente.

Conforme postula Fiorin (1994), ao descrever a vida do mundo e das trocas

simbólicas em que nada é inteiramente superado e esgotado, pois um símbolo

pode ser revestido com novos significados, remete-nos ao conceito de intertexto,

isto é, a incorporação a um texto qualquer do discurso de outrem e dos fatores

externos a sua elaboração. Há, por conseguinte, três tipos de intertextualidade:

a estilização, que se configura na reprodução do conjunto de procedimentos do

discurso de outrem; a alusão, que consiste na reprodução de construções

sintáticas em que certas figuras são substituídas por outras, mas todas

relacionadas entre si; e por último a citação, que pode confirmar ou alterar o

sentido do texto citado por meio de elementos em comum.

Na crônica, "tudo é vida, tudo é motivo de experiência e reflexão, ou

simplesmente de divertimento, de esquecimento momentâneo de nós mesmos a

troco do sonho ou da piada que nos transporta ao mundo da imaginação. Para

voltarmos mais maduros à vida" (CANDIDO, 1992, p. 20).

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6ª proposta: debate, observação, criação

Há o tempo da espera e do apelo: aquele em que se forma e se difunde a imagem de um Salvador desejado [...]. Há o tempo da presença, do Salvador enfim surgido, aquele, sem dúvida, em que o curso da história está prestes a se realizar [...]. E há ainda o tempo da lembrança: aquele em que a figura do Salvador, lançada de novo no passado, vai modificar-se ao capricho dos jogos ambíguos da memória, de seus mecanismos seletivos, de seus rechaços e amplificações. (GIRARDET, 1987, p. 72)

O trabalho com o gênero crônica, a partir da sensibilização, debate, observação de cartazes produzidos na escola e em exposição na mesma, Mini-Fóruns, utilização de ferramentas da WEB e criação do álbum são estratégias

para alavancar os diversos olhares, o respeito aos mesmos, o incentivo da sua

comunicação, visando o exercício do olhar crítico e sua expressão artística. Criar

o álbum virtual é uma proposta para reunir dois diferentes gêneros textuais

(crônica e álbum) em um gênero híbrido no meio virtual atualiza, ainda, as novas

formas de produção de textos trazidas pelo meio interativo da internet,

essencialmente híbrido. O Álbum não é só um suporte, nem o jornal, nem o objeto

criado, é o meio de comunicação, suporte e objeto comunicativo da força de

expressão do olhar dos alunos.

DESENVOLVIMENTO: escolher um texto que esteja nas páginas de jornais e

revistas no momento, aqui citamos como exemplo as eleições.

O trabalho será dividido em três etapas: Antes, durante e pós eleições,

sendo a primeira etapa uma leitura coletiva dos trabalhos já apresentados pela

turma na disciplina de Sociologia (dependendo do tema pode ser outra disciplina)

– Ética e eleições. Nessa etapa será trabalhada a sensibilização, a compreensão

do tema e apropriação dos conhecimentos necessários para a produção do

Álbum-crônica. Na segunda etapa, os alunos terão autonomia para continuar

suas pesquisas, observações e registros de memórias das eleições. Na terceira etapa, os alunos produzirão o Álbum-Crônica - ÉTICA E ELEIÇÕES.

Para a sensibilização será utilizado como estratégia:

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Fonte: redenews-edu.blogspot.com/2009/11/exclusivo. Acessado em 29 de abril de 2010.

• Leitura da charge: o professor poderá conversar com os alunos sobre o

sentido do apagão ético e fazer a relação com a ética de quem vende o

voto por troca de “favores políticos”, ou consegue energia elétrica através

dos “gatos”, ou aquele que fura filas, ou aquele que não respeita o espaço

destinado aos idosos e pessoas portadoras de necessidades especiais,

etc.

• Ouvir o Poema de Elisa Lucinda: ”Só de Sacanagem” , disponível no site

http://www.youtube.com/watch?v=03qln0920mk. Analisar a charge e o

poema, ver as relações entre eles.

• à observação e o debate acerca dos trabalhos (exposição de cartazes;

gráficos; exibição de vídeos, músicas, coletânea de textos jornalísticos,

etc.) produzidos nas disciplinas de Artes, Português, Geografia, Sociologia,

leitura e debate de crônicas publicadas sobre as eleições e a apresentação

de Álbum-crônica elaborado para este fim, exemplificando o produto.

A compreensão do Tema e do Produto: durante a exposição, da análise das

crônicas e da apresentação do Álbum-Crônica, será realizado junto com os alunos

o levantamento dos temas, foco de olhar dos autores e as formas de expressão e

de argumentação dos cartazes, dos cronistas e do Álbum-Crônica.

Competências necessárias para a produção do Álbum-Crônica: Trabalhar a

pesquisa de imagens na internet a partir dos assuntos e temas abordados nos

objetos de aprendizado (cartazes, crônicas e Álbum-Crônica), navegando por

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entre as imagens e descrevendo aquelas que chamaram atenção do grupo.

Realizar passo-a-passo para a construção do álbum eletrônico. (selecionar a foto,

copiar, colar, editar, e postar no ambiente virtual). Depois, pesquisar as definições

semânticas das palavras crônicas, álbum, assunto, tema e da expressão gênero

textual e ainda da palavra olhar.

Para estimular a autonomia, a criatividade e a liberdade de escolha do

Tema, os alunos serão convidados a participar criticamente como observadores

das eleições, realizando anotações e observando imagens das notícias

televisivas, dos jornais, charges etc..

Durante a produção do Álbum-Crônica, o papel do mediador será o de

auxiliar na seleção, ordenação e elaboração de legendas e titulação que serão os

materiais narrativos: ÉTICA E ELEIÇÕES. A partir do assunto Eleição e do Tema

(recorte) promover a interdisciplinaridade, convidando professores titulares das

disciplinas abordadas em um mini-Fórum. Ex. O brasileiro e as eleições, convidar

um professor de filosofia (ou outra disciplina) para apresentar sua visão filosófica

sobre ética, um de geografia para falar sobre eleições, e assim por diante.

A fase final será a publicação definitiva dos Álbuns-Crônica e a Exposição

permanente dos trabalhos em ambiente virtual, que poderão ser acessadas por

outros alunos, pais, etc., no laboratório de informática ou em qualquer lugar.

DICAS:

1ª Na crônica de Olavo Bilac, publicada na Gazeta de Notícias, em 1904,

observamos o descaso dos políticos, sutilmente através de sua ironia debochada

habitual, recriminava a falta de mecanismos de escoamento de água durante as

enchentes que constantemente assolavam o Rio de Janeiro durante o verão:

Uma chuva torrencial se despenhou do céu, afugentando os últimos calores, lavando a cidade, - e além desse grande serviço higiênico, dando-nos o regalo de um espetáculo raro: as ruas transformadas em rios, as praças mudadas em lagoas, os bondes metamorfoseados em gôndolas, - e homens e cachorros nadando, como peixes, pela vasta extensão das águas derramadas. 4

                                                                                                               

4  informações tiradas do UNESP – FCLAs – CEDAP, v.4, n.2, p. 206-224, jun. 2009.

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O modo pelo qual Bilac trata a palavra, o recurso retórico e linguístico, a

contextualização, nota-se que são instrumentos reveladores de múltiplos

comprometimentos persuasivos e ideológicos. A intenção do raciocínio persuasivo

de Bilac era jogar com a palavra a seu favor, recontextualizando-a de acordo com

seu interesse, de maneira que os valores, conceitos e atitudes por ele defendidos

na crônica fossem compreendidos. A ironia seria seu contraste entre o que é

afirmado e o que é significado, exige interpretação especial do decodificador.

A crônica expõe caminhos abertos para a crítica de valores que ela

propunha: Rachada a Prefeitura mesmo, rachado o Olimpo de pedra e argamassa, de onde o Júpiter Municipal expede os raios de suas portarias, que podia ainda esperar a cidade de Mem de Sá?5

Bilac, neste texto, escolheu termos interessantes para se referir à

municipalidade. Ao saber que uma rachadura ameaçava tombar o prédio da

prefeitura, o cronista abusou de oposições para caracterizar os membros da

Diretoria de Obras Públicas. Primeiramente, comparou a construção agora

decadente da Prefeitura com o Olimpo. À primeira vista tal comparação mostrava-

se elogiosa, visto que o Olimpo, para a mitologia greco-latina, seria a habitação

das grandes divindades, dos seres abençoados e idolatrados, superiores aos

meros mortais. Contudo, a ironia aposta na contraposição de termos, antítese, um

prefeito que não resguardava nem o edifício de onde comandava a urbe, pouco

poderia fazer pelo restante das construções municipais. Ao fazer referência a

termos mitológicos para aludir ao governo carioca.

2ª Ver a relação entre o cotidiano e as práticas sociais nas crônicas de Rubem Braga - como o autor trabalha com o tema política. 3ª Analisar sobre a importância ou não da aparência dos candidatos – ler a crônica “O Outro”, de Moacyr Scliar, escrita nas eleições para a escolha dos prefeitos de 2000, em que fala sobre a aparência ideal de um candidato político.(SCLIAR, 2006)

                                                                                                               

5  informações tiradas da UNESP – FCLAs – CEDAP, v.4, n.2, p. 206-224, jun. 2009.

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7ª proposta: reconhecimento/compreensão

O ato de ler, na perspectiva da Estética da Recepção, relaciona-se aos

estágios pelos quais passam o autor e o leitor de uma obra literária. O ato de

produzir o sentido da obra, o ato de sentir o efeito estético da obra e valorizá-la, o

ato de se transformar, purificar-se, refinando os sentidos, demonstra que a leitura

da Literatura fortalece a consciência compreensiva e crítica acerca da

individualidade e do papel social do sujeito no mundo.

Em sala de aula, a partir desses atos, procede-se o estudo dos estilos

literários, a contextualização histórica dos autores, já que os textos escolhidos,

além de serem escritos por autores diversos, são de contextos histórico-sociais

diferentes, estão imersos em estilos de época distintos e revelam conflitos eternos

do homem: a construção da identidade, a auto-imagem.

Há inúmeros casos de crônicas que, reunidas em livro, eternizaram-se. São

exemplos as obras de Carlos Drummond de Andrade, Rubem Braga, Fernando

Sabino. A fugacidade, entretanto, parece adequada quando aplicada às crônicas

que versam sobre temas bastante específicos, pois estas precisam de uma

compreensão prévia do contexto no qual foram publicadas para serem

compreendidas em sua totalidade.

Deixo como sugestão trabalhar a crônica “Os Tatuadores”, de João

do Rio, e a letra da música “Tatuagens”, de Chico Buarque, com a

finalidade de estabelecer um diálogo com a atualidade, ou melhor,

questionar por que o jovem do século XXI usa tatuagem? Analisar: a saúde diante de lugares contestáveis; a possibilidade de

arrependimento; o significado das figuras tatuadas.

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Tatuagem Quero ficar no teu corpo feito tatuagem Que é pra te dar coragem

Pra seguir viagem

Quando a noite vem

E também pra me perpetuar em tua escrava

Que você pega, esfrega, nega

Mas não lava

(...) Compositor: Chico Buarque Josane

- Quer marcar? Era um petiz de doze anos talvez. A roupa em frangalhos, os pés nus, as mãos pouco limpas e um certo ar de dignidade na pergunta. O interlocutor, um rapazola louro, com uma dourada carne de adolescente, sentado a uma porta, indagou: - Por quanto? - É conforme, continuou o petiz. É inicial ou coroa? - É um coração! - Com nome dentro? O rapaz hesitou. Depois: - Sim, com nome: Maria Josefina. - Fica tudo por uns seis mil réis. Houve um momento em que se discutiu o preço, e o petiz estava inflexível, quando vindo do quiosque da esquina um outro se acercou. - Ó moço, faço eu; não escute embromações! - Pagará o que quiser, moço. O rapazola sorria. Afinal resignou-se, arregaçou a manga da camisa de meia, pondo em relevo a musculatura do braço. O petiz tirou do bolso três agulhas amarradas, um pé de cálix com fuligem e começou o trabalho. Era na Rua Clapp, perto do cais, no século XX... [...] Para marcar tanta gente a tatuagem tornou-se uma indústria com chefes, subchefes e praticantes [...] Eu contei só na Rua Barão de S. Félix, perto do Arsenal de Marinha, e nas ruelas da Saúde, cerca de trinta marcadores. Há pequenos de dez, doze anos, que saem de manhã para o trabalho, encontram os carregadores, os doceiros sentados nos portais. - Quer marcar? - perguntam; e tiram logo do bolso um vidro de tinta e três agulhas. [...] Os pequenos, os outros marcadores ambulantes, têm um chefe, o Madruga, que só no mês de abril deste ano fez trezentas e dezenove marcações. Madruga é o exemplo da versatilidade e da significação inumerável da tatuagem. Tem estado na cadeia várias vezes por questões e barulhos, vive nas Ruas da Conceição e S. Jorge, tem amantes, compõe modinhas satíricas e é poeta. É dele este primor, que julga verso: - Venha quanto antes d. Elisa / Enquanto o Chico Passos não atiça / Fogo na cidade... Homem tão interessante guarda no corpo a síntese dos emblemas das marcações - um Cristo no peito, uma cobra na perna, o signo de Salomão, as cinco chagas, a sereia, e no braço esquerdo o campo das próprias conquistas [...] Enquanto andou a fornecer-me o seu profundo saber, Madruga teve três dessas senhoras - a Jandira, a Josefa e a Maria. A primeira a figurar debaixo de um coração foi a Jandira. Um belo dia a Jandira desaparecia, dando lugar à Josefa, que triunfava em cima, entre as chamas. Um mês depois a letra J sumira-se e um M dominava no meio do coração. Os marcadores têm uma tabela especial, o preço fixo do trabalho. As cinco chagas custam 1$000, uma rosa 2$000, o signo de Salomão, o mais comum e o menos compreendido porque nem um só dos que interroguei o soube explicar, 3$000, as armas da Monarquia e da República 6$ a 8$, e há Cristos para todos os preços. (RIO, 2007: p.16)

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De autoria do jornalista, cronista, contista e teatrólogo carioca João do Rio

(João Paulo Emílio Coelho Barreto), o texto "Os tatuadores", aqui resumido, é

resultado da observação do autor sobre os mais variados tipos de tatuagens e

sobre os inúmeros tipos de pessoas que às deixam figurar nos seus corpos,

mesmo sendo as tais "figuras" mal vistas pela maioria das sociedades.

Colocando-se como personagem central que circula pelas ruas observando

o comportamento humano nos "guetos", nas periferias mais sórdidas, João do Rio

utiliza-se do discurso em primeira pessoa para criar com o leitor uma proximidade

tal que seja capaz de levá-lo (o leitor) a acompanhar o autor nas suas andanças,

ora observando pequenos "marcadores", ora analisando jovens, adultos e velhos

"marcados".

A palavra tatuagem é relativamente recente. Toda a gente sabe que foi o

navegador Loocks que a introduziu no ocidente, e esse escrevia tattou, termo da

Polinésia de tatou ou to tahou, desenho. Muitos dizem mesmo que a palavra

surgiu no ruído perceptível da agulha da pele: tac, tac. Mas como é ela antiga! O

primeiro homem, decerto, ao perder o pêlo, descobriu a tatuagem.

PESQUISA: Quais os significados da tatuagem no texto?

R: (Há três casos de tatuagem no Rio, completamente diversos na sua significação

moral: os negros, os turcos com o fundo religioso e o bando das meretrizes, dos rufiões e

dos humildes, que se marcam por crime ou por ociosidade. Os negros guardam a forma

fetiche, quase todos têm um crucificado. O feiticeiro Ononenê, morador à Rua do

Alcântara, tem do lado esquerdo do peito as armas de Xangô, e Felismina de Oxum a

figura complicada da santa d’água doce.

Os turcos são muçulmanos, maronitas, cismáticos, judeus, e nestas religiões

diversas não há gente mais cheia de abusões, de receios, de medos, a tatuagem forra a pele

dos homens como amuletos. Os maronitas pintam iniciais, corações; os cismáticos têm

verdadeiros eikones primitivos nos peitos e nos braços; os outros trazem para o corpo

pedaços de paramentos sagrados. É por exemplo muito comum turco com as mãos

franjadas de azul, cinco franjas nas costas da mão, correspondendo aos cinco dedos. Essas

cinco franjas são a simbolização das franjas da taleth, vestimenta dos Khasan, nas quais

está entrançado a fio de ouro o grande nome de Ihaveh.

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A outra camada é a mais numerosa, é toda a classe baixa do Rio – os vendedores

ambulantes, os operários, os soldados, os criminosos, os rufiões, as meretrizes. Para marcar

tanta gente a tatuagem tornou-se uma indústria com chefes, subchefes e praticantes. Quase

sempre as primeiras lições vieram das horas de inatividade na cadeia, na penitenciária e

nos quartéis. Muitos portugueses, cujos braços musculosos guardam coroas da sua terra e o

seu nome por extenso, deixaram-se marcar porque não tinham que fazer. Um Cristo no

peito, uma cobra na perna, o signo de Salomão, as cinco chagas, a sereia, e no braço

esquerdo o campo das próprias conquistas. Esse braço é o prolongamento ideográfico do

seu monte de Vênus onde a quiromancia vê as batalhas do amor.

A religião, a imitação, o ócio, a vontade, o espírito de corpo ou de seita, as paixões

nobres, as paixões eróticas e o atavismo são as causas mantenedoras dessa usança. Quase

todos os rufiões e os rufistas do Rio têm na mão direita entre o polegar e o indicador, cinco

sinais que significam as chagas. Não há nenhum que não acredite derrubar o adversário

dando-lhe uma bofetada com a mão assim marcada. O marinheiro Joaquim tem um Senhor

cruficificado no peito e uma cruz negra nas costas. Mandou fazer esse símbolo por

esperteza. Quando sofre castigos, os guardiões sentem-se apavorados e sem coragem de

sová-lo. A sereia dá lábia, a cobra atração, o peixe significa ligeireza na água, a âncora e a

estrela o homem do mar, as armas da República ou da Monarquia a sua compreensão

política. Pelo número de coroas da Monarquia que eu vi, quase todo esse pessoal é

monarquista. [...] Nos braços estão em geral os nomes das amantes, frases inteiras, como

por exemplo esta frase de um soldado de um regimento de cavalaria: viva o marechal de

ferro!... desenhos sensuais, corações. O tronco é guardado para as coisas importantes, de

saudade, de luxúria ou de religião. [...] Há tatuagens religiosas, de amor, de nomes, de

vingança, de desprezo, de profissão, de beleza, de raça, e tatuagens obscenas. As

meretrizes e os criminosos nesse meio de becos e de facadas têm indeléveis idéias de

perversidade e de amor. As mulheres mandam marcar corações com o nome dos amantes.

Há ainda a vaidade imitativa. As barregãs das vielas baratas têm sempre um

sinalzinho azul na face. É a pacholice, o grain de beauté, a gracinha, principalmente para as

mulatas e as negras fulas que o consideram o seu maior atrativo. Grande parte desses

homens e dessas mulheres têm o delírio mais sensual, fazem os nomes queridos em partes

melindrosas, marcam os membros delicados com punhais, lâmpadas e outros símbolos.

Num meio de tão fraca ilusão, onde as miçangas substituem os pendentifs d’arte e a

vida ruge entre o desejo e o crime, depois de muito os pobres entes marcados como uma

cavalhada – a cavalhada da luxúria e do assassínio –, começa a gente a sentir uma

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concentrada emoção e a imaginar com inveja o prazer humano, o prazer carnal, que eles

terão ao sentir um nome e uma figura debaixo da pele, inalteráveis e para todo o sempre.

Desde os mais remotos tempos vemo-la a transformar-se: distintivo honorífico

entre uns homens, ferrete de ignomínia entre outros, meio de assustar o adversário para os

bretões, marca de uma classe para selvagens das ilhas Marquesas, vestimenta moralizadora

para os íncolas da Oceania, sinal de amor, de desprezo, de ódio, bárbara tortura do Oriente,

baixa usança do Ocidente. Na Nova Zelândia é um enfeite; a Inglaterra universaliza o

adorno dos selvagens que colhem o phormium tenax para lhe aumentar a renda, e Eduardo

com a âncora e o dragão no braço esquerdo é só por si um problema de psicologia e de

atavismo.) Obtida de "http://pt.wikisource.org/wiki/Os_Tatuadores" Categoria: A Alma Encantadora das Ruas

A crônica, “Os tatuadores”, de João do Rio, divide os “atrasados morais”

(qualificação dos indivíduos que se tatuavam) em duas categorias: “a camada que

trabalha braçalmente, os carroceiros, os carregadores, os filhos dos carroceiros” e

a “outra, a perdida, o oceano da malandragem e da prostituição”, mas também

descrevia “o espaço elegante e fútil do dândi”. Fazendo um apanhado geral da

estranha “fauna” que circulava pelas ruas da capital brasileira o escritor produziu

crônicas jornalísticas que retratavam o espaço das ruas do Rio de Janeiro da

Belle Époque, a rua, como “agasalhadora da miséria, o aplauso dos medíocres,

dos infelizes, dos miseráveis da arte”. A tatuagem como registro: história, amor,

crenças, alegrias, ódio etc. Ela é a exteriorização daquilo que a alma carrega. E

dentre as várias formas de constituir discursos tendo como veículo, suporte e

texto o corpo, destaca-se, em João do Rio, a tatuagem. Pois, nas palavras do

próprio cronista, a “tatuagem é a inviolabilidade do corpo e a história das paixões”

(RIO, 1995, p. 30).

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LISTA DE DICAS Como sabemos, um mesmo fato pode ser mostrado por diversos pontos de

vista e em vários gêneros textuais. Propomos, assim, que um mesmo fato seja

levado para a sala de aula em forma de crônica, charge, notícia, filme, imagens,

etc.. Caberá ao professor orientar o aluno na busca pelas diferentes matizes

acrescidas ao fato na esfera correspondente a cada gênero. Segue uma lista

de temáticas que podem ser pesquisadas em crônicas e trabalhadas

juntamente com diferentes textos, imagens, músicas, vídeos, etc, (cito alguns

exemplos). Assim se trabalha: leitura, escrita, pesquisa, reflexão e análise.

1. QUESTÕES FAMILIARES, comportamentais, valores, ambiente

escolar

utilizar cenas do programa Malhação, da rede Globo, que é assistido

por muitos jovens e retrata assuntos diversos.

2. GRAVIDEZ na adolescência

Leitura – “Tio, tô grávida!” - Adilson Toledo (2006)

Dados do IBGE 7,3% das jovens de 15 a 17 anos têm, pelo menos,

um filho. Os dados também revelam índices altos de gravidez na

adolescência, uma vez que, entre as jovens de 15 a 17 anos, a proporção de

mulheres com, pelo menos, um filho é de 7,3% no país. Na região

metropolitana do Rio de Janeiro, esse índice chega a 4,6% e na região

metropolitana de Fortaleza, 9,3%. Na comparação com as pesquisas

anteriores, Maranhão, Ceará e Paraíba continuam apresentando altas

proporções de jovens adolescentes com filhos.

(dados http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/12062003indic2002.shtm)

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3. HEROIS contemporâneos:

Leitura “Herói, Morto. Nós” – Lourenço Diaféria (1977).

Os heróis de outras décadas ( quadrinhos , filmes, ídolos, super-

heróis) - como exemplo, pode-se citar Constantine das histórias de

quadrinhos de Hellblazer, Hellboy de Mike Mignola, e Homem- aranha,

Hulk, Superman, Batman, Demolidor, Elektra, Liga Extraordinária, Do

Inferno, V de Vingança, Estrada para Perdição, Quarteto Fantástico,

Spawn, X-men comparados aos ídolos de hoje (jogadores, artistas, etc.)

Questionar as influências.

4. VIOLÊNCIA, DESESTRUTURA FAMILIAR E OUTRAS SITUAÇÕES

Texto - Viver a qualquer momento - Danuza Leão

O escritor Carpinejar mergulha na infância no livro Família Não é Empresa. Um livro de crônicas, no qual o poeta mergulha na sua infância e

compara com as visões de mundo de seus dois filhos (Mariana, 15, e

Vicente 7 (http://www1.folha.uol.com.br/folha/livrariadafolha/ult10082u650386.shtml)  

Em "Múltipla Escolha", Lya Luft indaga, debate e transgride com o

fervor de alguém que refuta a mediocridade e escolhe a vida. Como se

sobre um palco, cercada de portas simbólicas, o complexo mundo

contemporâneo à frente, a autora convoca sua "tribo" para o necessário

ritual de pensar. Em foco, questões fundamentais, como a velhice e a

juventude, os novos dilemas e tabus da sexualidade, a comunicação

virtual, as fronteiras entre o privado e o público, drogas, violência, bondade

e perversidade, o mal-estar social: elementos-chave da nossa rotina diária.

Aqui há um trecho que realça algumas características, bases para que as

pessoas pensem:

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"O olho do outro está grudado em mim e me sinto permanentemente

avaliado, nem sempre aprovado: se eu não for como sugerem ou exigem

meu grupo, família, sociedade, se não atender às propagandas, aos

modelos e ideais sugeridos, serei considerado diferente. Como

adolescentes queremos ser iguais à turma, como adultos queremos ser

aceitos pela tribo: a pressão social é um fato inegável" (LUFT, 2010. 23)

Outro livro de crônicas, da autora, que aborda temas relacionados a vida

pública, ética, educação,conflitos sociais é “Em outras palavras “. (LUFT,

2006)

“Menor perverso”, de Olavo Bilac, crônica publicada,

provavelmente, no jornal Gazeta de Notícias. “Tive muita pena da pobre

criança de três anos, morta no meio de horríveis torturas. Mas tenho

também muita pena dessa outra criança, que uma brincadeira funesta (ou

uma inconsciente moléstia moral, perfeitamente curável) levou à prática de

um ato tão cruel. Nesse pequeno infeliz, que os jornais consideram um

grande criminoso, há um homem que se vai perder, por nossa culpa, -

porque não lhe podemos dar o tratamento que a sua enfermidade requer“.

(BILAC,1997: p. 737-738)

Produzir um vídeo sobre o tema. (Professor (a), é importante

indicar como esse vídeo será produzido. Indicar os caminhos e

procedimentos, envolvendo a leitura dos textos anteriores.)

5. FELICIDADE

Produzir crônicas utilizando citações dos trechos e vídeos vistos. O professor

pode criar com os alunos “blogs” (ou na impossibilidade desse recurso utilizar

o portal da escola), nos quais as crônicas seriam expostas. Tal proposta

despertaria o interesse dos alunos, pois veriam a valorização da sua

criatividade e função social em suas produções.

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Coletânea - Felicidade não tem preço Eu sonhei com um pote de

ouro/ Meu lindo tesouro/ Pobreza nunca mais/ Sonho de menino, virei um

grã-fino! De quina pra Lua estou em cartaz/ O jogo da vida aprendi a

ganhar/ Adeus pindaíba, chega de chorar! Oh! Felicidade me diz o teu

preço/ Eu sei que mereço e posso pagar Bem-me-quer meu bem querer!/

Vou comprar seu coração/ Tô pagando por um beijo/ Saciando meu desejo

no baú da ilusão Sou o dono do mundo/ Meu tempo é dinheiro, eu quero

investir/ Nessa ciranda onde a grana fala alto Lá no céu tô perdoado, já

paguei sem refletir/(…)Dinheiro não compra a felicidade. (ACADÊMICOS DA ROCINHA. Samba enredo 1990. Disponível em: <www.

musicas.mus.br/letras> Acesso em: 6 nov. 2006.)

Para Aristóteles, a causa final do homem, seu objetivo supremo é a

felicidade. Ela não é um forte prazer que se esvai logo em seguida; ao

contrário, deve ser algo perene e tranquilo, sem excessos, pois o excesso

faz com que uma boa ação torne-se seu oposto. Uma pessoa amável em

demasia, por exemplo, não passa de um incômodo bajulador. Atingir a

felicidade depende então de uma conduta moral moderada, sem excesso,

baseada no que Aristóteles denomina “meio-termo”. (HISTÓRIA DA

FILOSOFIA. São Paulo: Nova Cultural, 2004. p. 63 e 268. (Coleção Os

Pensadores). [Adaptado].

Consumismo.gera.felicidade?

Ver os vídeos disponíveis nos sites:

http://www.youtube.com/watch?v=hFOT8srccYs&feature=relat

http://www.youtube.com/watch?v=cU8FyaapKEk&NR=1

6. SOCIEDADE

Leitura coletiva e interpretativa da crônica: “Dois pequenos pensamentos”, de João Ubaldo Ribeiro, publicada no jornal O Estado de

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São Paulo – Jun/2001. Instigar os alunos a identificarem fatos indicativos

da crônica como: experiências pessoais do cronista, ironia (o autor ironiza

sua própria imagem), críticas à sociedade, exagero de expressões em

favor do humor, parágrafos longos, indignação com as atitudes

“desumanas” das pessoas, reflexão.

Indicação de sites, de crônicas e cronistas (Luiz Fernando Veríssimo, Ruy

Câmara, Fernando Sabino, Lêdo Ivo, Ignacio de Loyola Brandão, Rubem

Alves, Lourenço Diaférria, Carlos Drummond de Andrade, Lígia Fagundes

Telles, Rubem Braga, João Ubaldo Ribeiro, Lya Luft, Cristovão Tezza,

entre outros).

No laboratório de informática - os alunos poderão organizar-se em equipes

(grupo com três alunos) – o professor dá aos estudantes liberdade para

escolherem os cronistas e uma crônica de sua preferência, com a

finalidade de realizar uma leitura que una o prazer do contato com um texto

simples, muitas vezes engraçado, sem deixar de lado a reflexão e a crítica

social.

7. CORRUPÇÃO

• Produção de textos do gênero

cada equipe poderá escolher um fato, um acontecimento, uma notícia

ou mesmo uma crônica para produzirem uma crônica, utilizando os mais

variados recursos linguísticos. Devem fazer referências e/ou citações de

certas partes dos textos a fim de que estes lhe sirvam de mote, um ponto

de partida, para sustentar seus argumentos sobre o tema corrupção, numa

crônica dissertativa e/ou humorística

“Levanta   aí   que   você   tem   muito   protesto   pra   fazer   e   muita   greve  

Você  pode  e  você  deve,  pode  crer.”  (Até  Quando?  ,  Gabriel  Pensador)  

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                                                                                                           ÉTICA, PROGRESSO, TRABALHO, SAÚDE, EDUCAÇÃO e CULTURA não combinam

com corrupção. Ver imagem no site: http://picnicterraqueo.files.wordpress.com/2008/12/corrupcao.jpg  

Histórias – Diálogos – Divagações “De notícias e não notícias faz-se a crônica “, de Carlos Drummond de Andrade.

“ Este livro contém histórias leves e desajuizadas opiniões sobre o desconcerto do mundo em que uns vivem e outros olham viver. Foram publicadas inicialmente no ‘Caderno B’ do Jornal do Brasil. “(DRUMMOND, 2007, p.17)

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