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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE
VOLU
ME I
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A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NUMA ABORDAGEM SISTÊMICA E CRÍTICA: uma
experiência de sensibilização no ensino fundamental
Cristiane Gomes de Lima1
Angélica Góis Morales2
RESUMO
O presente artigo apresenta o relato de uma experiência de Educação Ambiental com alunos da 5a série do ensino fundamental, do Colégio Baldomero Bittencourt Taques, no Município de Tibagi, Paraná, onde foram desenvolvidas atividades de sensibilização que proporcionaram a integração desses alunos com o ambiente, por meio de jogos e debates e da realização de uma trilha em ambiente preservado, de modo que eles pudessem perceber o fato de ser parte integrante do mesmo. Assim, o objetivo dessa pesquisa foi proporcionar aos alunos, mediante a abordagem de uma Educação Ambiental crítica e sistêmica, perspectivas de relacionamento baseadas nos conceitos de cidadania, sustentabilidade e respeito ao fenômeno vida, diante de sensibilização e contato com o ambiente. Os conceitos e experiências trabalhados durante a implementação do projeto atingiu seu objetivo no que diz respeito a sensibilização dos alunos diante da vida e de seus sujeitos, os alunos apresentaram mudanças significativas em seu comportamento na escola, tornando-se mais sociáveis e cuidadosos com o lixo, com as plantas e animais que encontram no Colégio.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Ambiental, Sensibilização, Trilha
INTRODUÇÃO
A crise ambiental que se apresenta na atualidade tornou o tema “meio
ambiente” quase que obrigatório no meio escolar. A própria política neoliberal
consumista aponta para as “atitudes preservacionistas” como a garantia das fontes
geradoras de renda e consumo. Assim, a Educação Ambiental (E.A.) tornou-se um
1 Professora do Programa de Desenvolvimento Educacional -PDE, área de Ciências. Colégio Estadual Baldomeno Bittencout Taques, Município de Tibagi, PR. E-mail: [email protected]
2 Orientadora – Doutora em Meio Ambiente e Desenvolvimento (UFPR-PR), Docente do Setor de Ciência Biológicas e da Saúde, Departamento de Biologia Geral da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), PR. E-mail: [email protected]
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dos conteúdos escolares, porém, de forma superficial, por meio de práticas
imediatistas e pontuais que não envolvem o indivíduo e, por isso, não conseguem
mudanças significativas em seu comportamento. Observa-se que quando inclui a
sensibilidade, a emoção, sentimentos e energias, maior é a probabilidade de se
obter mudanças significativas de comportamento e atitudes. Nessa concepção, a
E.A. é algo essencialmente oposto ao adestramento ou a simples transmissão de
conhecimentos, constituindo-se num espaço de troca dos mesmos, de experiências
e sentimentos (BRÜGGER, 2004).
Trata-se de uma opção de vida por uma relação mais saudável e que busca
uma reflexão crítica das nossas próprias atitudes. Conhecer, analisar e refletir sobre
o meio ambiente em que vivemos, a própria relação ser humano e meio ambiente e
o respeito a todas as formas de vida, leva o aluno a compreender melhor o seu
espaço socioambiental e a buscar alternativas de resolução para os problemas que
envolvem a si e a sua comunidade.
Dessa forma, esse trabalho torna-se relevante pois, vai ao encontro da
busca de desenvolver uma E.A. sistêmica no contexto escolar a partir de
experiências e contato com o ambiente ao entorno do aluno, principalmente por meio
de atividades de percepção.
Diante das questões abordadas vê-se como problema, o fato de que a E.A.
vem sendo tratada de forma pontual, restrita a atividades temáticas, sem estar
voltada à formação do cidadão consciente da relevância de todas as formas de vida.
Assim, o objetivo dessa pesquisa foi proporcionar aos alunos, mediante a
abordagem de uma E.A. crítica e sistêmica, perspectivas de relacionamento
baseadas nos conceitos de cidadania, sustentabilidade e respeito ao fenômeno vida,
diante de sensibilização e contato com o ambiente.
REFERENCIAL TEÓRICO
A visão que marcou o pensamento científico nos últimos três séculos talvez
seja um dos principais motivos pelos quais a educação tenha se estabelecido como
“não ambiental”, de maneira que acabou por acarretar um afastamento do ser
humano e do meio, como se ele mesmo não fosse um componente natural. “A cisão
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cartesiana entre natureza e cultura é a base da educação moderna e constitui-se em
um dos principais entraves para a promoção de uma educação ambiental realmente
profícua.” (GRÜN, 1996, p.56-57)
Essa visão tecnicista e materialista vem passando conceitos de uso do meio
como forma de apropriação dos recursos para sobrevivência humana, ignorando seu
caráter finito. E é justamente esse conceito repassado de forma acrítica, apenas
transmitindo conteúdos, que está longe de permitir a transformação do
conhecimento em cidadania, mais parecendo um “adestramento” que reduz a
questão ambiental a uma dimensão meramente técnica. (BRÜGGER, 2004)
A Educação Ambiental (E.A.) que vem sendo implantada nas escolas é por
vezes, apenas uma forma de se dar uma resposta ao modismo ambiental dos dias
atuais, mas de forma alguma se mostra eficiente na formação de um aluno crítico e
envolvido. Como cita Brügger (2004, p.87), A Educação deve pertencer ao domínio do pensamento crítico e, em sendo assim, deveria proporcionar os meios básicos para tornar os alunos capazes de distinguir o caráter dos diversos discursos, independentemente das formas sob os quais possam se apresentar.
O caráter fragmentado da educação privilegia essa formação
tecnicista/materialista “endurecendo” o conhecimento de forma a desnaturalizar o
educando, afastando-o do meio como se ele estivesse em outro plano, em que
pudesse controlá-lo como numa tela de computador e dessa forma dispor do mesmo
sem levar em conta o fato de, ao contrário do que pareça, fazer parte desse sistema
natural.
A educação “não ambiental” como elege Grün (1996), afasta o ser humano
do meio, impondo-lhe uma condição de um ser “não natural”, tornando a E.A. uma
proposta de difícil assimilação dentro do sistema educacional tradicional. Sabemos que qualquer tentativa de preservação ambiental dentro do paradigma cartesiano é literalmente impossível. [...] Isso ocorre quando no próprio discurso que visa preservar a natureza introduzimos, imperceptivelmente, aqueles mesmos elementos que são responsáveis por sua degradação (autonomia da razão, natureza objetificada, ética utilitarista, ética antropocêntrica, cisão entre natureza e cultura, etc.). (GRÜN,1996,p.56)
Dentro desse contexto, é necessário, rever os planos cartesianos para abrir
espaço para um novo paradigma, em que a relação ser humano-natureza seja
natural, sistêmica, crítica e renovadora.
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Essa visão sistêmica tende a demonstrar uma concepção que vê o mundo
inter-relacionado e integrado, com o elemento humano envolvido física e
psicologicamente com todos os fenômenos do meio (CAPRA,1982, p. 243). Como
reafirma Capra (1982, p. 243) “Todo e qualquer organismo – desde a menor das
bactérias até os seres humanos, passando pela imensa variedade de plantas e
animais – é uma totalidade integrada e, portanto, um sistema vivo.”
É justamente nesse ponto que a E.A. deve ser inserida e discutida no
contexto escolar, norteando novos aspectos que precisam ser abrangidos, como a
relação socioambiental, uma vez que o ser humano estando inserido no meio
ambiente não se pode continuar com conceitos meramente conservacionistas e
preservacionistas que não passam de uma visão tecnicista do ambiente. Como
defende Gadotti (2000, p. 96): A educação ambiental vai muito além do conservacionismo. Trata-se de uma mudança radical de mentalidade em relação à qualidade de vida, que está diretamente ligada ao tipo de convivência que mantemos com a natureza e que implica atitudes, valores, ações. Trata-se de uma opção de vida por uma relação saudável e equilibrada, com o contexto, com os outros, com o ambiente mais próximo, a começar pelo ambiente de trabalho e doméstico. (grifo do autor)
A escola como um espaço privilegiado para a construção do conhecimento e
reflexão, deve levar a essa mudança de mentalidade sobre o modelo de
desenvolvimento econômico vigente, sobre a cultura da sociedade de consumo e
desperdício e a conhecer os resíduos gerados.
Também cabe a escola demonstrar a ação do ser humano sobre o meio e
vice-versa, e a importância de todas as formas de vida, levando o aluno a
compreender melhor seu espaço, e a buscar alternativas de resolução para os
problemas que o envolvem.
A Educação Ambiental deve permear a “educação sustentável” como traz
Gadotti (2000), contemplando muito mais que a visão pontual e fragmentada dos
projetos de ação ambiental (dia da árvore, dia do meio ambiente, etc.). É preciso
uma visão mais ampla em que o aluno seja levado a compreender os “porquês”
dessas ações, consiga refletir sobre as relações humanas entre si e com o meio e
finalmente possam internalizar conceitos que lhes permitam proceder de forma mais
ética junto a todas as formas de vida.
A questão da sustentabilidade deve ser tratada na educação como processo
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de transformação dos indivíduos para uma forma de vida mais responsável com o
uso dos recursos naturais, principalmente no que diz respeito ao consumo, repensar
o uso de materiais e reduzir a produção dos resíduos. “A sustentabilidade no tempo
das civilizações humanas vai depender de sua capacidade de se submeter aos
preceitos de prudência ecológica e de fazer bom uso da natureza.” (SACHS, 2004,
p.214).
Essa nova forma de pensamento em que a preocupação com o uso do meio
vem associada com as relações de consumo e desenvolvimento é que pode tornar
possível a própria sobrevivência do ser humano nesse planeta. E, por meio de uma
educação voltada para essas questões e princípios podem passar a ser assimilados
no cotidiano de nossos alunos promovendo modificações em sua forma de se
relacionar com a vida, formando cidadãos mais comprometidos com o meio em que
vivem.
MATERIAIS E MÉTODOS
O desenvolvimento da pesquisa se deu de forma a explorar as características
dos alunos para levantar a forma como compreendiam o tema proposto, e a
avaliação ocorreu de forma subjetiva, sem preocupação nos dados e análise
quantitativa, sendo portanto uma pesquisa de caráter qualitativo, tendo como foco o
ambiente natural da sala de aula. Sobre isto, consideram-se as palavras de Lüdke e
André (1986, p.11):A pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como sua fonte de dados e o pesquisador como seu principal instrumento, a pesquisa qualitativa supõe o contato direto e prolongado do pesquisador com o ambiente e a situação que está sendo investigada […]
Foram realizadas atividades com quinze (15) alunos da 5a série do Ensino
Fundamental do Colégio Baldomero Bittencout Taques – EFM, localizado no distrito
de Alto do Amparo, município de Tibagi, estado do Paraná, durante o período de
agosto a novembro de 2010.
A escolha dos alunos foi feita após uma breve apresentação do projeto em
sala de aula, os alunos que possuiam a disponibilidade de transporte no contraturno
e que demonstraram interesse no projeto foram selecionados.
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1a Etapa – Diagnóstico e percepção do meio ambiente:
Foram realizadas atividades com auxílio de DVD, jornais e revistas que
traziam o tema “meio ambiente” focando questões ligadas à cidadania, como
comportamentos frente ao meio ambiente e suas relações, para estimular debates
em sala de aula. Logo após os debates os alunos registraram suas impressões e
conclusões em forma de texto.
Desta forma, foi possível diagnosticar a forma como os alunos
compreendiam e se relacionavam com o meio, por meio de temas atuais do nosso
cotidiano.
2a Etapa – Atividades de incentivo:
Em seguida, foram realizadas atividades fora de sala de aula, como
meditação, jogos e brincadeiras em contato com ambiente natural para que o aluno
realizasse uma aproximação com o meio, como uma forma de integração e incentivo
a interagir com as dimensões sociais, econômicas, políticas, naturais, éticas, entre
outras, diante dos problemas ambientais.
3a Etapa – Trilha – Atividade perceptiva e interpretativa:
Os alunos foram levados a conviver por algumas horas com um ambiente
natural e preservado, por meio de uma trilha, o que contribuiu para trabalhar com a
percepção e interpretação desse ambiente.
Durante a mesma, os alunos foram estimulados a aguçar seus sentidos,
percebendo os sons, as cores, os odores, a textura de tudo que os cercava. Nesse
momento, os alunos não só receberam informações sobre a vegetação e a fauna do
local, como passaram por momentos de integração com o meio.
Foram convidados a se sentarem no meio da mata para perceber por meio
de seus sentidos toda a vida que os cerca, ali foram orientados sobre a importância
de todas as formas de vida, para que por meio desses estímulos estabelecessem
uma relação de integração com o meio e assim pudessem perceber a importância de
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se respeitar, preservar e conservar3 todas as formas de vida.
Ao final da trilha todos foram convidados a participar de uma atividade de
meditação junto à cachoeira. Em seguida, participaram de brincadeiras e um banho
de cachoeira.
Durante o retorno foram instigados a relatarem suas impressões sobre a
atividade. Suas conclusões foram descritas em forma de textos utilizados nos
debates em sala de aula, durante a avaliação do projeto.
4a Etapa – Avaliação:
Foi uma retomada da primeira etapa, para avaliar as modificações em
relação as suas conclusões e conceitos sobre o tema.
Mais uma vez os alunos foram levados a debater sobre filmes, reportagens,
entre outros recursos didáticos-pedagógicos, a cerca dos conteúdos propostos na
primeira e segunda etapas, bem como sobre suas próprias impressões sobre as
atividades desenvolvidas durante todo o projeto.
ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
A implementação do projeto no Colégio ocorreu no segundo semestre de
2010, em contra turno, com alunos das 5as séries do ensino fundamental. Os alunos
participaram por adesão, uma vez que dependiam de disponibilidade de transporte
escolar para comparecerem no contra turno.
Ao primeiro encontro os alunos foram apresentados ao tema Educação
Ambiental bem como, as propostas de atividades e as etapas do projeto (foto 01).
Em seguida, receberam o material didático pedagógico4 produzido pela professora
PDE Cristiane Gomes de Lima, sob a orientação da professora Dra Angélica Góis
Morales (UEPG).
3 Preservação: Proteção integral, intocabilidade de um ambiente, para garantir a biodiversidade de um ecossistema ou bioma.
Conservação:proteção dos recursos naturais, com a utilização racional, garantindo sua sustentabilidade e existência para as futuras gerações.
4 Unidade Didática “Educação Ambiental”, elaborada pala professora PDE para o desenvolvimento do projeto, disponível no Portal Dia-a-dia Educação (www.diaadiaeducacao.pr.gov.br).
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Foto 01 – 1o Encontro na Biblioteca Fonte: A autora
O material didático pedagógico sobre o Tema Meio Ambiente foi elaborado
em formato de unidade didática por meio de textos com abordagem crítica sobre a
Educação Ambiental, com desenvolvimento de atividades relacionadas ao tema.
Esse material serviu como apoio didático para iniciar os debates com os alunos
sobre suas relações com o meio ambiente.
Os alunos foram convidados a se apresentar, e para tanto, foi realizada a
dinâmica proposta na Unidade Didática em que cada aluno entrevistou um colega
levantando as relações de cada um com o ambiente. Depois cada aluno apresentou
um colega para todo o grupo.
Essa atividade demonstrou que os alunos possuiam dificuldades em
compreender o que seria interação com o meio ambiente, ao apresentarem seus
colegas, mencionaram simplesmente “separar o lixo” ou “plantar árvores” como
relação com o meio.
Um dos aspectos constatados foi o distanciamento desses alunos com o
assunto proposto, pois a grande maioria não se sentia responsável pelo meio
ambiente. Outro foi o não pertencimento dos alunos no ambiente, os alunos não se
viam como componentes do ecossistema e tinham o entendimento de que os
problemas ambientais não se relacionavam com os problemas sociais e econômicos.
Apontando justamente para o que era esperado, uma posição distante,
antropocêntrica, principalmente quando questionados sobre suas responsabilidades,
apontavam para questões como “...se não fizermos nada não teremos mais meio
ambiente para retirar nossos alimentos... vai faltar água para beber...” Não havendo
preocupações com as demais formas de vida. Os alunos não se viam como sujeitos
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do ambiente, como afirma Gonçalves (2008, p. 27):[…] Eis aí o paradoxo do humanismo moderno: sua imperiosa necessidade de afirmar uma visão de mundo antropocêntrica, onde o homem é o rei de tudo, o faz esquecer o outro significado do termo “sujeito” - o sujeito pode ser o que age ou o que se submete. […]
Depois da atividade os alunos assistiram 3 vídeos curtos5 sobre uso indevido
da água, dos solos, respeito à vida e finalmente sobre a questão do lixo. Ao final foi
aberto um debate onde abordaram essas mesmas questões dentro da realidade de
cada um, tentando sempre levantar sugestões sobre uma nova forma de ação sobre
esses temas.
Os alunos demonstraram grande interesse e levantaram alguns
questionamentos sobre seu comportamento em relação ao meio ambiente.
"Então tudo que fazemos modifica o meio ambiente?" (A1)
"O que precisamos fazer para proteger o nosso meio ambiente?" (A2)
Diante desses questionamentos discutimos sobre a importância de se
respeitar todas as formas de vida, usando os recursos naturais com inteligência para
que não venham a faltar num futuro próximo, lembrando a importância da vida como
bem maior.
Alguns alunos deram sugestões para as questões abordadas: “Poderíamos
fazer cartazes sobre o lixo da escola...” (A3) “..e se conversássemos com o diretor
para melhorar o ambiente do colégio.” (A4).
Alguns cartazes foram produzidos, mas os alunos pouco se comprometeram
com o trabalho, demonstrando que para eles só os cartazes falariam por si, não se
dispondo a interagir com os demais alunos do Colégio para apresentar e explicar o
porque desse trabalho.
No segundo encontro os alunos leram o texto introdutório da unidade
didática e debateram sobre as relações de consumo. Durante o debate foram
levantados pontos polêmicos sobre a necessidade de se adquirir (ou não) diversos
produtos.
Levantaram questões como: "Então não podemos comprar mais nada...."
preocupou-se A3; "...Deveríamos voltar a viver como nossos bisavós, plantar tudo
que precisamos para comer..." afirmou A4 . Tais questionamentos levaram os alunos
5 Coleção “Kit Ecologia”: aquecimento global, poluição e reciclagem; Coleção “Alerta Verde”: Dvd 1: água; Dvd 2: lixo e reciclagem; “A Carta da Terra: valores e princípios para um futuro sustentável”.
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a refletir sobre as ações de cada um e de suas famílias diante dos bens de consumo
e todos concluíram que a redução e a reciclagem seriam uma boa saída.
Após o debate, os alunos foram até a sala de informática (foto 02) onde
realizaram o teste da "pegada ecológica" no site da WWF do Brasil 6. O teste
envolvia perguntas como a forma de alimentação, vestuário, hábitos diários etc.,
coisas que, para os alunos não pareciam ter nenhuma relação, ou interferir no
ambiente, afinal, para os alunos, somente o lixo produzido seria um problema.
Ao fim do teste todos se surpreenderam com os resultados, como suas
ações por mais corriqueiras, poderiam afetar o meio ambiente,
Foto 02 – Laboratório de Informática Fonte: A autora
O trabalho desenvolvido na sala de informática levantou junto aos alunos
uma discussão sobre seu prório comportamento, o que é muito interessante, pois no
momento em que existe o questionamento pode se abrir a possibilidade de mudança
de atitude.
Os alunos terminaram a atividade demonstrando desejo de “fazer alguma
coisa para mudar”, como eles mesmos citaram.
Ao terceiro encontro os alunos leram e interpretaram 2 textos da Unidade
Didática, elaborada para esta pesquisa, os quais foram: “Desenvolvimento e
Sustentabilidade” e “Ser Humano x Meio Ambiente: relações harmônicas e
desarmônicas” além de trechos selecionados da Carta do Índio Seatle, onde
puderam discutir entre eles a ação do ser humano sobre o meio ambiente e também
a relação do ser humano com as demais formas de vida.
Durante o debate foi possível perceber que ainda existe a cultura da
superioridade humana sobre os demais seres vivos e que esse pensamento permite
6 www.wwf.org.br
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o uso dos recursos sem preocupação com o respeito a vida. Discutimos a relevância
de todas as formas de vida para o meio e como deveriam ser as atitudes humanas
diante dos demais seres vivos.
A maioria dos alunos apresentou convicção em suas ideias de superioridade
humana, e demonstrou com naturalidade o fato de que a natureza foi feita para
servir ao ser humano.
Durante a reflexão sobre a Carta do Índio Seatle, muitos tiveram dificuldade
em compreender questões como “tratar os animais como irmãos” ou “a terra é nossa
mãe”, gerando grande discussão em torno do tema.
Os alunos são formados dentro de uma cultura de superioridade que torna
difícil a compreenção de uma relação igualdade com os demais seres.
A educação recebida pelos alunos os conduziu a um pensamento puramente
antropocêntrico, até por convicções religiosas, “prisioneiros de uma cultura cristã
predatória” como cita Gadotti (2009, p. 63).
No quarto encontro os alunos foram levados ao gramado nos fundos do
Colégio, em contato com área verde, foi observada a falta de uma arborização do
local, neste ambiente foi executado o “Jogo da cadeia alimentar” (Unidade Didática)
e, sentados na grama, em círculo, debateram as consequências do desequilíbrio
ambiental onde muitos alunos se surpreenderam com a mecânica do equilíbrio dos
ecossistemas.
Observaram também a atividade de algumas aves com ninhos na cobertura
da quadra (atenção com filhotes) fazendo uma analogia com o cuidado materno
humano. Os alunos perceberam que as diferentes formas de vida apresentam níveis
de inteligência e que é necessário respeitá-los.
Ao retornarmos à sala de aula, os alunos foram estimulados a
desenvolverem desenhos (figuras 1 e 2) nos quais apresentaram suas impressões
sobre as atividades por eles realizada.
Os desenhos foram apresentados aos colegas da turma, para que
pudessem debater sobre as impressões que cada um teve sobre a atividade que
realizaram no pátio do colégio.
Nesse momento os alunos demonstraram perceber a necessidade de se
observar o ambiente que os rodeia, para apreciar a diversidade dos seres vivos e a
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dinâmica vida.
Figura 1 - Desenho Figura 2 - Desenho Fonte: Aluno 1 Fonte: A luno 2
Os desenhos apresentados pelos alunos demonstraram sua visão sobre o
meio ambiente, pode ser observado que nenhum deles apresenta a figura humana
como componente do mesmo, mais uma vez, demonstrando o não pertencimento
dos mesmos ao ambiente.
Quando foi abordado sobre a atuação humana nesse relacionamento, a
maior parte apenas conseguiu ver ações de destruição do ecossistema sem
perceber que o ser humano também integra o meio, relacionando-se com ele de
forma positiva, construtiva. Diante da apresentação desse fato, se mostraram
surpresos. Durante o jogo, parte dos alunos apenas se divertiu com a “brincadeira”,
enquanto outros realmente aproveitaram os conhecimentos sobre as dinâmicas de
relacionamento entre os seres vivos em um ecossistema, comparando inclusive essa
dinâmica com o próprio desenvolvimento humano.
No quinto encontro, as atividades foram realizadas no gramado do Colégio,
iniciamos com uma meditação a sombra de uma árvore, os alunos ainda não
acostumados com esse tipo de atividade demonstraram um pouco de dificuldade em
se concentrar, mas a medida que foram relaxando aproveitaram o momento.
Depois, saímos do Colégio e fomos a um rio que passa a pouco mais de
100m do mesmo. Lá ouvimos os pássaros, observamos as espécies vegetais e
discutimos sobre o lixo que a população local despeja no rio.
Os alunos criticaram os hábitos da população local e apontaram sugestões
para resolver o problema: “... a subprefeitura devia fazer alguma coisa...os
moradores deviam receber uma multa ou pelo menos alguém devia ensinar para
eles que sujar o rio é muito feio.” (A1).
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Ao retornarmos, os alunos produziram cartazes (figura 3) alertando sobre a
importância da preservação do meio ambiente e também redigiram textos (figura 4)
onde relataram a experiência vivida com a meditação.
Figura 3 – Cartaz sobre preservação Fonte: Alunos 2, 3 e 4
Figura 4 – Texto sobre a experiência de meditação Fonte: Aluno 3
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Os cartazes produzidos apresentaram desenhos muito simples, a maior
parte deles retratando uma paisagem semelhante a que tiveram que imaginar
durante a atividade da meditação.
Os textos produzidos trouxeram a descrição das suas experiências durante a
meditação, apontando o que puderam visualizar no exercício. O que foi percebido é
que os alunos descreveram o que imaginam ser um ideal de meio ambiente
preservado, apontando o mesmo como muito belo e como um ideal de sentimentos
de felicidade e de prazer.
Alguns alunos conseguiram, inclusive, se perceber inseridos nesse ambiente
e demonstram que esse sentimento de integração é importante para sua própria
vida.
No sexto encontro, os alunos foram estimulados a debater sobre as relações
que têm com o meio, bem como as relações do homem moderno com os bens de
consumo, a produção do lixo e das situações de pobreza e desequilíbrio do meio
ambiente.
Por meio de figuras e fotos discutiram o consumismo e o capitalismo e
depois produziram um texto em que apontavam ideias para melhorar suas ações
para com as formas de vida e atitudes para melhorar seu futuro.
Depois, fora da sala de aula, com a ajuda de uma lupa observaram
pequenos animais e flores num campo ao lado do Colégio, onde foi comentado
sobre a importância de qualquer forma de vida, animal ou vegetal.
É interessante perceber que parte dos alunos já demonstravam menos
repulsa aos animais observados, mostrando preocupação com a manutenção das
plantas. Após essas observações mostraram-se mais interessados em cuidar do
jardim da escola e principalmente em evitar que seus colegas jogassem tanto lixo no
chão, ou quebrassem galhos das poucas árvores.
Os alunos já demonstram um comportamento mais ligado ao ambiente,
questinando uns aos outros sobre suas atitudes: “... não jogue lixo no chão, você
está destruindo o jardim,... cuidado com os insetos!... (A2).
No sétimo encontro, os alunos fizeram uma trilha em uma mata ciliar
preservada até uma cachoeira. Durante o caminho os alunos foram estimulados a
perceber as cores e odores diferentes, a temperatura, os sons e rastros de animais.
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Observaram tocas de pequenos mamíferos, ninhos de aves e vários invertebrados,
perceberam também a forma harmoniosa como os diferentes seres convivem neste
local. Ao chegarem próximo a cachoeira, fizeram uma breve meditação e depois
foram se divertir na cachoeira.
No final da atividade, foram estimulados a descrever o que perceberam,
demonstraram a importância de se respeitar a vida em todas as suas formas. Porém,
alguns alunos deixaram lixo no local, indicando que muitas vezes as palavras não
condizem com as ações, foram questionados sobre o acontecido e puderam se dar
conta que alguns vícios ainda são difíceis de se abandonar.
Foto 2 – trilha Foto 3 – trilha Fonte: A autora Fonte: A autora
A trilha foi o momento mais importante de todo o projeto, uma vez que levou
os alunos a passar algumas horas em contato com um ambiente preservado, em
que puderam, através de seus sentidos, perceber a dinâmica de equilíbrio do
ambiente.
Os alunos demonstraram grande euforia ao chegar no local, embora morem
em propriedades rurais, não apresentaram grande intimidade com o ambiente
visitado, agindo com surpresa aos eventos apresentados.
Durante um momento em que a caminhada foi interrompida, para em
silêncio, apenas escutar os “sons da mata”, demonstraram surpresa com a
variedade de sons percebidos, não só cantos de pássaros, mas também o vento,
galhos que rangem, estalos no chão, provavelmente de pequenos animais.
Apontaram também, as diferentes cores, os “tons de verde”,o colorido de
algumas flores, líquens e folhas.
O comportamento dos alunos durante a experiência da trilha apontou para a
falta da realização de atividades de E.A. em anos anteriores, bem como a cultura
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das famílias de não pertencimento ao ambiente, fato mostrado claramente nos
momentos em que foram estimulados a sentar-se no chão.
Os alunos demonstraram surpresa com as texturas, sentiram-se
incomodados e muitas vezes com medo diante de insetos, indicando a falta de
intimidade com o meio.
Apesar de terem discutido várias vezes sobre a interação ser humano-meio
ambiente, os alunos só vieram a compreendê-la melhor durante a trilha, pois após as
atividades de observação propostas e as brincadeiras na cachoeira, é que passaram
a demonstrar afetividade com o local e com tudo que os cercava. Mesmo havendo
fatos isolados, como o lixo deixado no local por alguns alunos, foi possível perceber
um sentimento de preocupação em se manter o ambiente como eles o encontraram.
Essa tranformação no comportamento dos alunos demonstra a importância
de atividades como esta, em que os alunos são estimulados a paticipar do meio
ambiente, modificando a forma como o veem, gerando o diálogo entre eles sobre os
assunto e consequentemente a geração de ideias, como defende Oliveira (2009):[…] A vivência em grupos permite que se construa uma ação dialógica entre os indivíduos, onde as idéias passam a ser compartilhadas, criando-se novas concepções e percepções, agora em caráter coletivo.
Os alunos estimulados pela atividade passaram as suas percepções aos
demais colegas da escola, gerando mais diálogos sobre o assunto, fato que se
refletiu em maior interesse geral dos alunos nos temas ligados a área.
No oitavo encontro, os alunos foram estimulados a comentar sobre suas
percepções durante a trilha e depois a analisar cada um dos encontros anteriores.
Ao final descreveram a forma como veem e se relacionam com o ambiente: “Eu não
prestava muita atenção na forma como cuidavam do lixo em casa, agora falo pra
mãe separar...” (A1); “... depois da trilha começei a perceber os pássaros que cantam
perto de casa...” (A2); “...sempre que posso faço trilhas perto de casa, me sinto bem
na trilha... (A3)”
Foi possível perceber que uma parte dos alunos perceberam a importância
de se ver como parte integrante do meio em que vivem e não como superior a ele,
outra parte dos alunos apesar de apresentarem algumas mudanças de
comportamento, principalmente no que se refere a cuidado com o lixo, ainda
percebem as demais formas de vida inferiorizadas em relação ao ser humano.
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Os alunos se surpreenderam com os momentos de interação com a
natureza durante o projeto, especialmente durante a trilha, em que tiveram a
oportunidade de estabelecer um contato mais íntimo com a mesma: “...é possível
sentir a energia do mato....” (A4); “...parece que o ar é diferente no mato... (A5) “.
Os momentos de integração com a natureza foram muito proveitosos para
todos, o que se refletiu nas aulas de Ciências, apresentaram-se mais receptivos ao
debate e a participação nas aulas.
Durante os debates foi possível perceber que os alunos se mostravam muito
interessados no tema e que, aos poucos foram conseguindo ver as interligações
entre as várias questões propostas (conservação do meio, pobreza, economia, etc. ),
e a partir dessas relações conseguiam se ver inseridos no ambiente que habitam.
As experiências na trilha foram especialmente enriquecedoras, pois levaram
os alunos a refletir sobre sua ação no meio, interagir com ele, sentir, perceber, se
envolver com cada componente do mesmo. Esse momento gerou um debate que
acrescentou em muitos novos hábitos diante de seu comportamento com o
ambiente.
Foi observado também, melhora no comportamento geral durante as aulas,
mais respeito com os colegas e cuidado com o lixo na escola.
Em síntese, o trabalho desenvolvido levantou questões importantes sobre o
comportamento dos alunos diante do respeito às formas de vida, apresentando
transformações no que diz respeito ao cuidado com os seres vivos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com o desenvolvimento do projeto, pode-se observar vários aspectos
relacionados ao comportamento dos alunos de 5a série do Colégio Baldomero
Bittencout Taques, município de Tibagi, estado do Paraná.
Os alunos que antes apresentavam-se desligados das questões ambientais,
como cuidado com o lixo ou com o jardim e as plantas da escola, passaram a
demonstrar preocupação e cuidado com os mesmos. Até mesmo em relação a
disciplina nas salas de aula e demais ambientes escolares, puderam ser percebidas
mudanças nesses alunos. Também apresentaram uma maior disposição ao
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desenvolvimento de atividades em grupos e melhora na habilidade de interpretação
e compreensão na disciplina de Ciências.
Os conceitos e experiências trabalhados durante a implementação do
projeto atingiu seu objetivo no que diz respeito a sensibilização dos alunos diante da
vida e de seus sujeitos, os alunos apresentaram mudanças significativas em seu
comportamento na escola, tornando-se mais sociáveis e cuidadosos com o lixo e
com as plantas e animais que encontram no Colégio.
Porém, ainda mantendo certo antopocentrismo, o que precisa ser trabalhado
melhor durante a formação inicial com os alunos. Diante desse contexto, ressalta-se
que a escola, em geral, ainda não apresenta uma postura de envolvimento com a
Educação Ambiental, nem mesmo com as ações pontuais costumeiras (dia da
árvore, etc). Embora o período de desenvolvimento do projeto tenha gerado algum
interesse e motivação pelos alunos, ainda há muito que se modificar no
comportamento e visão de todos os envolvidos.
REFERÊNCIAS
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Contemporâneas, 2004.
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