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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 Produção Didático-Pedagógica Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7 Cadernos PDE VOLUME I I

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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE

2009

Produção Didático-Pedagógica

Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7Cadernos PDE

VOLU

ME I

I

A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES DA EJA SOBRE O MUNDO DO

TRABALHO

APRESENTAÇÃO

Quando pensamos em formar professores da EJA sobre o mundo do trabalho,

buscamos compreender como se dão as relações trabalho e educação, numa

perspectiva histórica, com o intuito de alcançar resultados significativos na busca ao

entendimento das necessidades de professores e alunos que, fazendo parte de um

mundo permeado de contradições, desse respostas convincentes as nossas

expectativas.

Foi assim que ao longo das leituras efetivadas, elaboramos um material que se

propõe refletir sobre a positividade e a negatividade do trabalho na vida do homem,

que ao longo do tempo foi tomando diferentes matizes.

Na antiguidade, o trabalho era entendido como a atividade dos que haviam

perdido a liberdade e por isso entendido como castigo ou infortúnio. Na tradição

judaico-cristã, associa-se à noção de punição, de maldição. Na sociedade grega,

berço da civilização ocidental, o trabalho era visto em função do produto e este por

sua vez, em função de sua utilidade ou capacidade de satisfazer à necessidade

humana.

Ainda na Idade Média não havia a noção de emprego. A relação trabalhista da

época era a relação senhor servo. O servo devia gratidão ao senhor pelo trabalho e

proteção. Nesse período não existia trabalho assalariado, o que resultava numa

dependência social senhor e servo.

Já na idade moderna as coisas começam a mudar, inicia-se uma era de novos

valores. Nessa época existiam várias empresas familiares que vendiam uma pequena

produção artesanal, todos os membros da família trabalhavam juntos para vender

produtos no mercado. Além de pequenas empresas familiares, havia oficinas com

muitos aprendizes que recebiam moradia e alimentação em troca e, ocasionalmente,

alguns trocados. È por essa época que começa a se esboçar o conceito de emprego.

Com exceção a preguiça, todos os outros pecados (capitais) foram

transformados em virtude. A cobiça, a avareza, a inveja, a gula, a luxúria e o orgulho

tornaram-se as forças motrizes da nova economia. Esse é o marco do surgimento de

uma nova relação no trabalho, que veio a constituir-se no emprego.

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Estabelecia-se uma nova crença de valores que daria a sociedade relação entre

capital e trabalho. É o alvorecer da modernidade.

Foi nesse espaço que, antepondo-se a preguiça, sedimentou-se o emprego

como uma categoria econômica. Deu-se início a uma revolução em que a máquina,

pouco a pouco pôs o homem em movimento. Sua capacidade até então limitada, foi

substituída pelo recurso aos transportes. Surgiu o motor a explosão, a química

orgânica, os materiais sintéticos e a manufatura de precisão. Com o advento da

Revolução Industrial, êxodo rural, concentração dos meios de produção, a maior

parte da população não tinha nem ferramentas para trabalhar como artesãos. Sendo

assim só restava às pessoas oferecer seu trabalho como moeda de troca.

O trabalho sempre foi e continua sendo uma necessidade à sobrevivência dos

seres humanos. Porém o trabalho como criador de valores de uso imprescindível a

reprodução da vida, não tem sido assumido por todos. O que acontece é a exploração

de seres humanos por seres humanos e de classes sobre classes.

Desde o século XIII, em quase todas as sociedades, o trabalho vem sendo

regulado pelas relações sociais capitalistas, onde o trabalhador necessita vender sua

força de trabalho para sobreviver. É o trabalho assalariado cuja centralidade é o valor

de troca, com o fim de gerar mais lucro ou mais capital, os trabalhadores tornam-se

uma mercadoria. A última mercadoria a ser descartada pelo capitalismo atual.

Nessa perspectiva nosso esforço como educadores é, ao mesmo tempo, nos

capacitarmos para ajudar os educandos a ler criticamente a realidade embrutecedora

e mutiladora de vidas sob a sociedade capitalista, e lutar por mudanças.

O processo educativo deve estar compromissado com a mudança social,

buscando garantir a formação de identidade dos cidadãos. Pensar na formação do

jovem adulto trabalhador e idoso, que responda as novas exigências da sociedade,

requer um educador que garanta a inter-relação personalizada e contínua do

educando com o sistema de ensino. Esse professor tem que ter espírito inovador e

disposição para enfrentar e aceitar mudanças. Que seja criativo, com disposição para

trabalhar coletivamente, que privilegie o diálogo e saiba articular o saber do seu

cotidiano com o saber elaborado.

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REFLEXÕES SOBRE TRABALHO E PREGUIÇA: O

TRABALHO COMO NEGATIVIDADE E POSITIVIDADE

Sejamos preguiçosos em tudo, exceto em amar e em beber, exceto em sermos preguiçosos. LESSING

As reflexões aqui apresentadas foram retiradas da introdução escrita por

Marilena Chauí da obra O Direito a Preguiça de Paul Lafargue. Trata-se de um

resumo comentado que busca entender as contradições do mundo do trabalho,

principalmente a necessidade do trabalho e ao mesmo tempo o direito ao tempo livre

como possibilidade de emancipação. A reflexão que empreendemos é a de

compreender como se coloca o trabalho na sociedade capitalista que ao mesmo

tempo em que dignifica o ser humano acaba também por destruí-lo.

“A preguiça, todos sabem é um dos sete pecados capitais”. É com esta frase

que Marilena Chauí inicia sua introdução ao livro de Paul Lafarque, “O Direito a

Preguiça”, Panfleto revolucionário escrito em 1880 e publicado no jornal socialista

L’Egalité, numa série de artigos, entre 16 de junho a 04 de agosto do mesmo ano. O

Direito a Preguiça foi comparado ao “Manifesto Comunista”, traduzido em quase

todas as línguas e reeditado em diferentes momentos da história. Em 1898; 1900;

1944; 1960; 1970 e desde então tem sido constantemente reeditado.

Paul encontrou-se, em 1865, pela primeira vez com Engels e Marx, com cuja

filha Laura, casou-se em 1868. Teve com Laura, três filhos, dois deles morreram com

alguns meses de vida e um terceiro veio a falecer com dois anos. Paul era médico,

porém, após essas perdas, abandonou a medicina e passou a dedicar-se a política e as

lutas revolucionárias socialistas.

O Direito a Preguiça é um painel da sociedade burguesa, visando alcançar o proletariado no nível da consciência de classe e por isso é a crítica da ideologia do trabalho, isto é, a exposição das causas e da forma do trabalho na economia capitalista, ou o trabalho assalariado (CHAUÍ, 1999, p. 23).

Chauí inicia o texto destacando a negatividade do trabalho na história. Na

Bíblia, no livro do Gênesis aparece a concepção de trabalho como castigo. Vejamos:

À primeira mulher Deus disse: “Multiplicarei as dores da tua gravidez, na dor darás à

luz filhos. Teu desejo te levará ao homem e ele te dominará” (in, 3:16) Ao primeiro

homem, disse Jeová:”Maldito é o solo por causa de ti! Com sofrimentos dele te

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nutrirás todos os dias de tua vida [...]. Com o suor do teu rosto comerás teu pão, até

que retornes ao solo, pois dele foste tirado. Pois tu és pó e ao pó tornarás” (Gn,3:17-

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Da mesma forma, na sociedade antiga e medieval, o trabalho também é

negatividade. Estas sociedades escravistas vêem o “trabalho como pena que cabe aos

escravos e desonra que cai sobre homens livres pobres” (CHAUI, 1999, p. 11).

Resulta que, tanto na tradição judaico-cristã como nas sociedades antigas,

trabalho é: tripalium, instrumento de tortura para empalar escravos rebeldes e

derivada de palus, estaca, poste onde se empalam os condenados. E labor (em latim)

significa esforço penoso, dobrar-se sob o peso de uma carga, dor, sofrimento, pena e

fadiga. Não é significativo, aliás, que muitas línguas modernas derivadas do latim, ou

que sofreram sua influência, recuperem a maldição divina lançada contra Eva usando

a expressão “trabalho de parto”

Chauí analisa em seguida por que e quando o trabalho enquanto negatividade

passou a ser positividade – “o trabalho dignifica o homem”. Verifica que foi a partir

do capitalismo que surge uma nova concepção de trabalho. O trabalho tornou-se uma

religião.

Paul faz severas críticas ao que ele denomina “religião do trabalho” que

domina as mãos, os corações e as mentes do proletariado, dominado pela burguesia

que reprime toda a tentativa de conhecimento científico da realidade social. Para ele

a religião é um instrumento eficaz de dominação de classe, pois oferece respostas

que satisfaz o proletariado “incréu e ateu” em detrimento da ciência.

Os incompreensíveis e insolúveis problemas sociais fazem Deus tão

necessário, que o teriam inventado se não houvesse existido, segundo Lafargue,

citado por Chauí (1999).

Lafargue num determinado momento do seu texto propõe aos leitores um

enigma. Ao referir-se a “estranha loucura” do operariado francês ou sua paixão pelo

trabalho assalariado escreve:

E dizer que os filhos dos heróis do Terror se deixaram degradar pela religião do trabalho a ponto de aceitar, após 1848, como uma conquista revolucionária, a lei que limitava em doze horas o trabalho nas fábricas; eles proclamavam, como sendo um princípio revolucionário, o direito ao trabalho. Envergonhe-se o operariado francês! Somente escravos seriam capazes de tamanha baixeza! [...]. E se as dores do trabalho forçado, se as torturas da fome se abateram sobre o proletariado em número maior que os gafanhotos da Bíblia, foi ele que as invocou. O trabalho que, em junho de1848, os operários exigiam, armas nas mãos, foi por eles imposto as suas famílias; entregaram aos barões da indústria, suas mulheres e seus filhos. Com suas próprias mãos, demoliram seus lares; com suas próprias mãos, secaram o leite de suas

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mulheres; as infelizes, grávidas que amamentavam seus filhos, tiveram de ir para as minas e manufaturas curvar a espinha e esgotar os nervos; com suas próprias mãos, estragaram a vida e o vigor de seus filhos. Envergonhem-se os proletários! (LAFARGUE, apud CHAUI, 1999, p. 27).

Lafargue questiona como o proletariado, sendo uma classe que possui a chave

para libertar a humanidade, pode deixar-se dominar pelo dogma do trabalho, “todas

as misérias individuais e sociais dos operários foi o que fizeram por merecer com sua

paixão pelo trabalho”, diz Lafargue. Nos seus escritos emprega imagens fortes e

dramáticas com o objetivo de comover e persuadir.

Embora o tema de “O direito a Preguiça” seja o elogio da preguiça, como

condição para o desenvolvimento físico, psíquico e político do proletariado, Lafargue

tem como pressuposto principal, o significado do trabalho, no modo de produção

capitalista, isto é, a divisão social do trabalho e a luta de classes.

São duas suas fontes de inspiração, de um lado as idéias do jovem Marx, nos

“Manuscritos Econômicos” de 1844, sobre o trabalho alienado, e, de outro, a análise

do trabalho assalariado, no primeiro volume de “O Capital”.

Para entender o trabalho alienado, é preciso lembrar que, para Marx e

Lafargue, o trabalho, em si mesmo, é uma das dimensões da vida humana que revela

a nossa humanidade, pois é por ele que dominamos as forças da natureza e é através

dele que satisfazemos nossas necessidades vitais básicas e é nele que exteriorizamos

nossa capacidade inventiva e criadora, o trabalho exterioriza, numa obra a nossa

interioridade.

Para que o trabalho se torne alienado, é preciso que a divisão social do

mesmo force os trabalhadores a trabalhar para os outros, vendendo sua força de

trabalho no mercado. Essa força de trabalho ao ser vendida e comprada se torna uma

mercadoria, com o propósito de cumprir as exigências do mercado capitalista. As

condições impostas pelo mercado de trabalho levam o trabalhador a vender sua

“força de trabalho” por um preço bem inferior ao trabalho que realiza e isso os leva a

um processo de empobrecimento, ao mesmo tempo em que produzem riqueza, uma

riqueza que está fora do alcance do trabalhador. Ou como diz Lafargue, os operários

foram condenados à abstinência de todos os bens que produzem.

Para Marx a diferença entre o modo de produção capitalista e outras formas

econômicas está em acumular e reproduzir a riqueza social e assegurar os meios para

a apropriação privada dessa riqueza. Como? Uma classe social poderosa expropria

outras classes sociais dos seus meios de produção. Assim, tornando-se donos dos

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meios de produção, fazem com que os desprovidos trabalhem para ele, produzindo

bens que serão propriedade privada do empregador, mediante um salário.

Segundo Marx o trabalhador vende a sua “força de trabalho”, por um salário

que será calculado de acordo com o “trabalho necessário” mais o “tempo socialmente

necessário” para a produção das mercadorias. Ainda, segundo Marx o capital cresce e

se multiplica, pela exploração da força de trabalho, ou seja, o tempo trabalhado e não

remunerado, que dá origem a “mais valia” (Max). Essa exploração se chama trabalho

assalariado.

A denúncia do trabalho alienado e a crítica ao trabalho assalariado é que dão

sustentação ao texto de Lafargue que objetiva mostrar aos trabalhadores que são eles

os produtores do capital e da produção e superprodução lançados no mercado, e de

como os proletários se deixaram dominar pela “religião do trabalho” elevando esse a

ser sacrossanto e fonte de todas as virtudes, quando na realidade é a causa de todas as

misérias da classe operária.

O centro de “O Direito a Preguiça” é o capítulo “O que vem após a

superprodução” onde Lafargue escreve sobre a condenação do proletariado a

abstinência de todos os bens e prazeres e condena a burguesia ao super-consumo, a

se cercar de um exército de ajudantes para satisfazer as suas vaidades.

Com a introdução das máquinas e o aumento das horas de trabalho e da

produção torna-se necessário, para continuar a produzir e gerar lucros, exportar o

excedente, assim a burguesia cria, nos novos continentes, necessidades fictícias de

consumo. Surge o “mercado Consumidor”. Para garantir esse mercado, realiza

guerras coloniais, para afastar os competidores. Isso não sendo suficiente, a solução é

baixar a qualidade dos produtos e diminuir sua durabilidade.

Lafargue propõe aos operários a redução da jornada de trabalho para 3 horas

diárias durante 6 meses por ano. Dizia ele que se isso fosse feito, haveria pleno

emprego, os operários não lutariam entre si por trabalho, mas, sobretudo “não

estando esgotados do corpo e da mente, começarão a praticar as virtudes da

preguiça”. (LAFARGUE, 1880, p. 20).

Virtude, essa palavra deriva do latim, virtus, e significa força, vigor. Com o

fortalecimento do corpo e do espírito a classe operária teria tempo para se preparar

para a ação revolucionária de emancipação do gênero humano. A principal virtude da

preguiça é ensinar a maldição do trabalho assalariado e a necessidade de aboli-lo

Indaga o autor. Como tornar a classe operária virtuosa, senhora da virtus?

Como “pedir a um proletariado corrompido pela moral capitalista uma revolução

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viril?” Seria preciso rezar! E convoca o proletariado “ore à Preguiça”. (LAFARGUE,

1880, p. 26)

Oremus:

“Preguiça, tenha piedade de nossa longa miséria! Preguiça, mãe das artes e

das virtudes nobres, seja o bálsamo das angústias humanas!” (LAFARGUE, 1880, p.

26).

Aristóteles imaginou o que aconteceria se, um dia, os fusos e as rocas se pusessem a fiar e a tecer sozinhos e todos os utensílios realizassem por si mesmos todas as tarefas. Se isso acontecesse, os homens estariam para sempre livres do trabalho e não mais haveria necessidade de escravos. “O sonho de Aristóteles é a nossa realidade”, escreve Lafargue, e dia virá em que o proletariado compreenderá que “a máquina é o redentor da humanidade, o Deus que resgatará o homem do trabalho assalariado, o Deus que lhe concederá os lazeres da liberdade”. (CHAUI, 1999, p. 46-47).

O sonho acabou! Tanto Aristóteles quanto Lafargue acreditavam que as

máquinas substituiriam o homem e com isso o trabalhador teria tempo livre para o

ócio, o lazer. Isso, porém, não se realizou, ao contrário, o homem continuou a lutar

pelo direito ao trabalho, pela jornada de oito horas, pelo salário mínimo, direito a

férias, décimo terceiro, salário desemprego, assistência a saúde. Direitos que hoje

vem sendo questionados e suprimidos em várias partes do mundo, sob a lógica do

capital.

A sociedade da abundância esperada por Lafargue deu lugar a uma sociedade

administrada que com o uso da tecnologia controla todas as classes sociais.

Controlam o corpo e a mente dos trabalhadores através da “gerência científica”

(Taylor) e também o seu “tempo livre”

A indústria cultural, a indústria da moda e do turismo, a indústria do esporte e do lazer estão estruturadas em conformidade com as exigências do mercado capitalista e são elas que consomem todo o tempo que Lafargue esperava que fosse dedicado às virtudes da preguiça. (Idem, p. 48)

Os ganhos que os operários tiveram criando assim o “Estado do Bem Estar”,

que no Brasil nem chegou a se instaurar, a burguesia conseguiu transformar em

ganhos para si, inventando necessidades de consumo com produtos de baixa

qualidade, da indústria cultural de baixo nível onde se torna visível a dominação de

classe e a exploração.

“Todavia se o sonho acabou, nem por isso o texto de Lafargue perdeu vigor e

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atualidade” (Ibidem, p. 49), considerando que hoje como ontem o trabalhador precisa

lutar pelo “direito a preguiça”. “Mais do que um sonho terminado, foi um novo

pesadelo que começou”. (Ibidem, p. 49).

No capitalismo contemporâneo impõem-se a idéia de que o trabalho não cria

riqueza, os empregos não dão lucro e os desempregados, assim se encontram por sua

própria incompetência.

Essas idéias encontram eco nas políticas neoliberais, de que as crises

econômicas capitalistas, decorrem do excessivo poder e privilégios dos trabalhadores

organizados. Por isso as tentativas, com sucesso, de enfraquecer os sindicatos,

desorganizar os trabalhadores.

O capital hoje, dono de um imenso desenvolvimento tecnológico não precisa

de um grande contingente de trabalhadores, que com seus direitos e sindicatos

enfraquecidos não tem força para enfrentar o capital e o desemprego.

O muro de Berlim pôde até cair porque um outro, invisível e intangível, já havia sido erguido pela economia capitalista: o muro que, no interior de cada sociedade e entre os países, separa os privilegiados, que fruem a realidade virtual de suas ações (a finança internacional, o Jet set), e os desempregados, massa de humilhados e ofendidos, dos envergonhados e culpados por não possuírem aquilo que o capitalismo não lhes deixa possuir – um trabalho – e os faz crer que tem o dever moral e social de possuir – um emprego.(Ibidem, p. 51)

Algumas propostas nos deixam preocupados, ou melhor, arrepiados, como a

britânica para a crise do emprego. O “trabalho a hora zero” onde o trabalhador só é

pago quando trabalha, mas, só é empregado de vez em quando, se a empresa achar

necessário. Outro conceito diz Forrester, nem o surrealismo ousou inventar, o da

“empresa cidadã” que recebe todo o tipo de incentivo do estado para oferecer

empregos, recebe vantagens, mas não emprega ninguém.

Empresas privadas não são cívicas e não são agentes de caridade e não

precisam de muitos empregados para obterem lucros. “A apatia e a indiferença”, hoje

reinantes, escreve Forrester, possuem uma causa mais surda e quase inaudível. Se até

hoje os seres humanos eram essenciais ao funcionamento do planeta, hoje essa massa

humana é desnecessária material e economicamente, pois o trabalhador tornou-se a

“última mercadoria descartável” (Ibidem, p. 55).

Aquilo que Viviane Forrester chama de Horror Econômico é, como “O

Direito a Preguiça” um grito de alerta, para que tenhamos coragem de reagir e tomar

consciência dos fatos que estão marcando a história hoje. É preciso diz Forrester,

exigir, sem medo, da sociedade “um sentimento áspero, ingrato, de um rigor

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intratável que recusa qualquer exceção: o respeito”

Longe, portanto, de o direito a preguiça ter sido superado pelos acontecimentos, é ele que, numa sociedade que já não precisa da exploração mortal da força de trabalho, pode resgatar a dignidade e o auto-respeito dos trabalhadores quando, em lugar de se sentirem humilhados, ofendidos e culpados pelo desemprego, se erguerem contra os privilégios da apropriação privada da riqueza social e contra a barbárie contemporânea porque podem conhecê-la e aboli-la. Lutarão, não mais pelo direito ao trabalho, e sim pela distribuição social da riqueza e pelo direito de fruir de todos os seus bens e prazeres. (Ibidem, p. 56).

Contudo, olhando sem preconceito os diversos lados da questão, podem-se

perceber as possibilidades contraditórias, como que as duas faces do mesmo

fenômeno, que faz com que a mesma tecnologia que dá condições a novas formas

mascaradas, sorrateiras de servidão e dominação, também abre oportunidades

concretas para a libertação do trabalhador, ou melhor, para a libertação do trabalho e

a emancipação pelo trabalho.

BILBIOGRAFIA

LAFARGUE, Paul. O direito à preguiça. Tradução de J. Teixeira Coelho Netto; introdução de Marilena Chauí. São Paulo: Hucitec; Unesp, 1999. FRIGOTTO, Gaudêncio. A dupla face do trabalho: criação e destruição da vida. In: Frigotto, G. e CIAVATTA, M. (Orgs.). A experiência do trabalho e a educação básica. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. PISTRAK. Fundamentos da escola do trabalho. São Paulo: Expressão Popular, 2000.

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A ORGANIZAÇÃO CIENTIFICA DO TRABALHO: O TAYLORISMO

“No passado o homem estava em primeiro lugar; no futuro, o sistema terá a primazia” Taylor

Mais de um século depois do início da obra de Frederick Taylor, a sua

influência sobre o modo como trabalhamos e como nos apercebemos do trabalho

continua a ser inegavelmente significativa.

O movimento da gerência científica teve início nas últimas décadas do século XIX por Frederick Winslow Taylor, caracteriza-se pelo empenho no sentido de aplicar os métodos da ciência, aos problemas complexos e crescentes do controle do trabalho nas empresas capitalistas, em rápida expansão. Investiga não o trabalho em geral, mas a adaptação do trabalho às necessidades do capital, teoria, que nada mais é que a explícita verbalização do modo capitalista de produção. Faltam-lhes as características de uma verdadeira ciência porque suas pressuposições refletem nada mais que a perspectiva do capitalismo com respeito às condições da produção. (BRAVERMAN, 1987, p. 82)

Taylor ocupava-se dos fundamentos da organização dos processos de trabalho

e do controle sobre ele, de como controlar o trabalho alienado, ou seja, a força de

trabalho comprada e vendida. Antes de Taylor, admitia-se que a gerência tinha o

direito de “controlar” o trabalho, que na prática significava apenas a fixação de

tarefas.

A herança da obra de Taylor continua nas empresas com tendência para

enfatizar a quantidade sobre a qualidade e foi entusiasticamente adotada por Henry

Ford no desenvolvimento das técnicas de produção em massa.

Taylor criou, segundo Braverman (1987), uma linha de raciocínio que

conquistou fortes seguidores entre capitalistas e administradores. Sua obra começou

por volta de 1880, mas foi na década seguinte que iniciou suas conferências, artigos e

publicações. As suas idéias logo se tornaram conhecidas em todos os países

industrializados. Tinha ele uma personalidade considerada obsessivo-compulsiva, no

mínimo maníaca neurótico. Para Sudhir Kakar que fez um estudo sobre sua

personalidade, essas características se ajustam perfeitamente, visto que o que é

neurótico no indivíduo, no capitalismo é normal e socialmente desejável para o

funcionamento da sociedade.

Os elementos centrais do sistema desenvolvido por Taylor envolvem quatro

etapas: desenvolvimento de uma ciência para cada etapa do trabalho, seleção do

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trabalhador e dos instrumentos, a noção de cooperação e a manutenção de uma

divisão de trabalho e responsabilidades entre a administração e o trabalhador. Além

da tarefa e da gratificação.

A grande contribuição de Taylor para a sociedade capitalista foi o

estabelecimento da gerência científica que provocou um aumento na produtividade

sendo utilizada, também, como uma forma de controle da produção e dos operários.

Os estágios do controle gerencial sobre o trabalho antes de Taylor incluíram, progressivamente: a reunião de trabalhadores numa oficina e a fixação da jornada de trabalho; a supervisão dos trabalhadores para garantia de aplicação diligente, intensa e ininterrupta; execução das normas contra distrações ...que se supunha interferir na aplicação; a fixação de mínimos de produção etc. Um trabalhador está sob controle gerencial quando sujeito a essas normas ou a qualquer de suas extensões e variações. (BRAVERMAN, 1987, p. 86)

Taylor buscava o aumento da produtividade através da limitação das

interferências do trabalhador (como hábitos e costumes tradicionais), consideradas

imprevisíveis. O trabalhador deveria ser recompensado pelo aumento da

produtividade através da gratificação o que garantiria uma maior motivação do

operário ao trabalho. Entretanto, através do estabelecimento de tarefas repetitivas e

da separação do trabalhador do controle sobre o processo produtivo, o taylorismo

contribuiu para uma maior exploração do trabalhador e a sua alienação. A seguir os

princípios em que Taylor se baseia para todo projeto avançado de trabalho ou

engenharia industrial.

Primeiro princípio:

Neste princípio vemos a importância e a grande responsabilidade do

administrador, que tem a seu cargo reunir todo o conhecimento tradicional,

anteriormente nas mãos dos trabalhadores e mais, classificar, tabular e reduzir esse

conhecimento a regras, leis e fórmulas. Desse modo, o poder do capital apropria-se

do saber operário para elaborar o método de trabalho que lhe parece mais rentável.

A grande disparidade entre essas atividades e as diferentes espécies de conhecimento que podem ser colhidas sobre elas, ilustra que, para Taylor – como para os administradores hoje - nenhuma tarefa é simples ou tão complexa que não possa ser estudada com o objetivo de juntar nas mãos da gerência pelo menos a informação conhecida pelo trabalhador que a executa regularmente, e provavelmente mais. (BRAVERMAN, 1987, p. 103)

A partir deste princípio o processo de execução do trabalho não depende mais

e tão somente do conhecimento dos trabalhadores, devem estar nas mãos habilidosas

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de administradores que adotam políticas gerenciais de controle. “Podemos chamar

este primeiro princípio de dissociação do processo de trabalho das especialidades

dos trabalhadores” (BRAVERMAN, 1987, p.103).

Segundo princípio:

“Todo possível trabalho cerebral deve ser banido da oficina e centrado no

departamento de planejamento ou projeto...” Esta é a chave da administração

científica, que é separar a concepção da execução, desumanizando o processo de

trabalho, reduzindo o trabalhador na forma animal de executar uma tarefa,

desprovida de propósito e de auto-motivação. No passado ele escolhia seu próprio

trabalho e treinava-se a si mesmo como podia. Agora todo o trabalho intelectual deve

ser eliminado da fábrica e centralizado no departamento de planejamento. No

entendimento de Taylor a organização do trabalho pelo próprio operário é uma arma

contra o capital.

Este poderia ser chamado o princípio da separação de concepção e execução, melhor que seu nome mais comum de princípio da separação de trabalho mental e manual. Isso porque o trabalho mental, trabalho principalmente do cérebro, é também suscetível de separação de concepção e execução conforme o mesmo princípio: o trabalho mental é primeiro separado do manual e, como veremos depois subdividido rigorosamente de acordo com a mesma norma. (BRAVERMAN, 1987, p. 104).

Para Taylor a “ciência do trabalho” nunca deve ser desenvolvida pelo

trabalhador, mas sempre pela gerência. No tempo de Taylor essa idéia foi muito

questionada, com o tempo passou a ser aceita e hoje completamente absorvida e

natural. Dizia Taylor: “É também claro que na maioria dos casos um tipo de homem

é necessário para planejar e um tipo inteiramente diferente para executar o trabalho”

(BRAVERMAN, 1987, p. 105). Consuma-se aí a dominação do capital sobre o

trabalhador no interior do espaço produtivo, impondo-lhe um rendimento

padronizado.

O objetivo de Taylor era baratear o trabalhador ao diminuir seu preparo e

aumentar a sua produção, orientados por instruções simplificadas e cumprir sem

questionar ou pensar e nem compreender.

Terceiro princípio:

Cooperar cordialmente com os trabalhadores para articular todo o trabalho

com os princípios da ciência que foi desenvolvida. Na prática, trata-se de aplicar a

“ciência do trabalho” e controle até os mínimos detalhes de sua execução.

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(...) Se o primeiro princípio é a coleta e desenvolvimento dos processos de trabalho

como atribuição exclusiva da gerência – juntamente com a recíproca, a ausência

desse conhecimento entre os trabalhadores – então o terceiro princípio é a utilização

deste monopólio do conhecimento para controlar cada fase do processo de trabalho

e seu modo de execução. (BRAVERMAN, 1987, p. 108)

O princípio da colaboração é fundamental para estabelecer uma relação

íntima e cordial entre o operário e a hierarquia da fábrica, anulando a existência da

luta de classes no interior do processo de trabalho.

Segundo o autor, a gerência moderna veio a existir com base nesses

princípios e ainda hoje pode se beneficiar de sua persistência em manter um

relacionamento cooperativo entre o operário e a direção, afinal é da qualidade desse

relacionamento que depende a produtividade da organização.

Taylorismo na escola

O taylorismo na escola manifesta-se de diversas maneiras: para a análise do

trabalho e o estudo dos tempos e movimento, para a escola criam-se o tempo padrão

para a realização de tarefas (hora/aula de 50 minutos) e a fragmentação das

disciplinas.

Ao pensar na fadiga do trabalhador o reflexo na escola é a implantação do

intervalo, o denominado “recreio”. Passa-se também à preocupação com a saúde do

professor e a construção de mobiliário. Para evitar o desperdício de “tempo”.

Para a divisão do trabalho “usurpar do trabalhador” o domínio do todo e

especializar para uma única tarefa, enfadonha e repetitiva, na escola desenvolve-se o

especialista: administrador escolar; orientador educacional; o supervisor escolar.

Quanto à distribuição de tarefas, criam-se regulamentos e organogramas. É

necessário enfatizar a hierarquia (expressão de poder) e institui direitos/deveres.

Os incentivos salariais e os prêmios de produção se traduzem em planos de

carreira, licença prêmio, fundo de garantia, tudo visando produtividade

empresa/escola.

Para melhorar as condições nos ambientes de trabalho, destinam-se recursos a

educação/escola que possibilitam construir projetos arquitetônicos adequados e

favoráveis.

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Com a padronização de métodos e máquinas surge na escola o planejamento,

livros de chamada, livros didáticos, tudo utilizado como estratégias de controle,

juntamente com os especialistas (AD; OE; SE; IP...)

A força taylorista continua muito presente e eficaz nas escolas, como

princípio de dominação capitalista. Citando uma frase de Lafargue: “todas as

misérias individuais e sociais dos operários foi o que fizeram por merecer com sua

paixão pelo trabalho”. Consideramos aqui o “Homo Econômicus” que para satisfazer

suas “necessidades” fictícias criadas pelo capital, o consumo, muitas vezes

desnecessário, supérfluo, o homem se torna um superprodutor, faminto e miserável

que gasta toda sua energia a serviço do capital.

BIBLIOGRAFIA

BRAVERMAN,Harry. Trabalho e capital monopolista: a degradação do

trabalho no século XX. Rio de Janeiro. RJ: LTC, 1987

http://br.geocities.com/luizaqui2000/administracao/fichamento_trabalho_e_capital_monopolista.doc - visitado em 26/07

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FORDISMO E TOYOTISMO. UMA VISÃO HISTÓRICA: E SUA INFLUÊNCIA NA EDUCAÇÃO

Sem sombra de dúvida, a vontade do capitalista consiste em encher os bolsos, o mais que possa. E o que temos a fazer não é divagar acerca da sua vontade, mas investigar o seu poder, os limites desse poder e o caráter desses limites. ( Karl Marx )

O belga Thomas Gounet (1999), membro atuante do Partido do Trabalho da

Bélgica, se propõe a uma análise crítica sobre o rápido processo de reestruturação

produtiva, sob a égide de um novo modelo: o toyotismo. Assim na obra Fordismo e

Toytismo na civilização do automóvel, analisa a reestruturação produtiva

contemporânea à década de 90, focando na indústria automobilística, tendo em vista

a representatividade deste setor na economia global.

Na parte intitulada Concorrência e Estratégia de Acumulação na Indústria

Automobilística, Gounet narra a evolução das organizações da produção e do

trabalho na indústria automobilística, contextualizando-as historicamente, desde os

seus primórdios, com a produção sendo processada de forma praticamente artesanal,

evoluindo pelo sistema de produção em massa, baseado nos princípios da

Administração Científica de Taylor e do fordismo, até chegar aos tempos atuais, com

o modo de produção puxado pela demanda e pelo crescimento, pela organização

flexível do trabalho, e pela intolerância ao desperdício, característicos do toyotismo.

O fordismo, organização da produção a do trabalho desenvolvida por Henri

Ford, e aplicada à indústria automobilística que leva o seu nome, nasce em 1913.

Ford aplica os métodos do taylorismo (“administração científica do trabalho”) para

produzir um modelo que custasse pouco e que facilitasse a vida dos agricultores

norte-americanos possibilitando-lhes um meio de transporte sem complicações e que

os ajudasse a romper o seu isolamento.

Cada uma dessas novas formas de organização da produção e do trabalho

objetiva garantir a acumulação de capital e, por conseguinte, a sobrevivência das

empresas, pois essas, no sistema capitalista estão em luta constante para dominar o

mercado e liderar a categoria econômica.

Segundo Gounet, o fordismo se apóia em cinco transformações principais:

Produção em massa; para isso racionaliza ao extremo as operações dos operários

em combate o desperdício, principalmente de “tempo”. Parcelamento das tarefas;

se o trabalhador faz um número limitado de gestos, significa que ele deixa de ser um

artesão especialista em mecânica. É a desqualificação dos operários. Linha de

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montagem; uma esteira rolante desfila perante os operários que repetidamente, um

ao lado do outro realizam as operações que lhes cabe, permitindo uma produção

fluída e controlável pela direção. Padronização das peças; para obter um bom

resultado ele adquire as firmas que as produz. É aqui que o empresário com tudo nas

mãos pode controlar todo o processo de produção de “cima a baixo”. Automação da

fábrica.

Os resultados dessas mudanças são surpreendentes. Se na antiga organização

precisava de 12h30min para montar um veículo, após Ford o mesmo seria produzido

em 01h30min.

Porém, Ford enfrenta um grave problema: podendo escolher, os operários preferem o método antigo, que constrange menos e valoriza mais, mantendo pelo menos sua qualificação. Henri Ford não encontra os trabalhadores necessários à sua produção em massa. Propõe então um salário de 5 dólares por uma jornada de oito horas de trabalho. Antes, e entre os concorrentes, o salário era de 2,5 dólares. Dobrando a remuneração, Ford pensa em atrair os operários que lhe faltam. O que ele não diz é que, para receber seus 5 dólares, o trabalhador deve dar provas de boa conduta, ou seja: não ser uma mulher, não beber, destinar seu dinheiro à família... A empresa cria um serviço social para controlar a situação nas casas dos beneficiários do prêmio Ford e, nos primeiros anos, ele recusará os 5 dólares a 28% do pessoal (GOUNET, 1999, p. 20).

Com sua nova forma de organização e produção Ford conquista o mercado

mundial, e com a baixa nos preços dos veículos, conquista o consumo em massa. Em

1921, 53% dos automóveis do mundo vêm das fábricas Ford.

Frente a essa máquina de guerra econômica, os concorrentes não têm escolha: ou se adaptam às soluções fordistas, inclusive o salário de 5 dólares, ou se refugiam em um nicho, uma trincheira onde a produção artesanal ainda seja rentável, como os setores de carros de luxo ou esporte, ou então desaparecem. Efetivamente, a mortalidade de empresas automobilísticas é altíssima. Nos Estados Unidos, o número de fabricantes cai de 108 em 1923 para 12 em 1941. Os sobreviventes introduzem os novos métodos de produção e pagam 5 dólares a seus operários (Idem, p. 20-21).

Adotando esse sistema de produção, algumas empresas suplantam a Ford, um

exemplo, a General Motors, que em 1923 aparece como a primeira empresa

automobilística do mundo. Depois da segunda Guerra Mundial, no “Plano Marshall”

pela reconstrução da Europa ocidental com capitais americanos, várias missões de

estudo européias vão aos Estados Unidos conhecer o “fordismo” então referência

para toda a indústria automobilística. Porém essa forma de organização passou a ser

contestada no final dos anos 60.

Dessa apresentação histórica, segundo o autor, podem-se extrair alguns dados

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imprescindíveis para a sobrevivência das empresas em geral. A empresa que muda

sua organização para ser mais eficaz, assume a liderança; Aponta também que as

transformações no plano organizacional devem anteceder a introdução de novas

tecnologias. Reconhece também que, mudanças acontecem se houver certa adesão

dos operários, vem daí os 5 dólares pagos por Ford. Nessas condições, os rivais o

seguem ou saem do mercado. E por último, quando todos o aplicam, as vantagens

desaparecem. “A empresa inovadora pode perder sua liderança” (Ibidem, 1999, p.

22). “Para continuar competitivas, deixam de investir em melhorias nas condições de

trabalho e os operários se vêem cada vez em condições piores. Daí a crise do sistema,

a crise do fordismo” (Ibidem, p. 23).

O Japão também tenta introduzir os novos métodos de produção. Nos anos 20, as três grandes firmas norte-americanas, todas de Detroit, criam filiais no arquipélago. Em 1933 surge a primeira empresa automobilística japonesa de certa importância, a Nissan (primeiramente chamada Datsun), que introduz o fordismo (Ibidem, p. 23).

As indústrias automobilísticas japonesas, dadas as condições físicas e

culturais do arquipélago, não conseguem viabilizar a incorporação da produção e do

trabalho executado pelo fordismo, da forma como se processa nas indústrias norte-

americanas e européias. Quais são os principais impedimentos:

Segundo Gounet, o mercado japonês é muito restrito; a demanda é débil e a

preferência dos japoneses é por carros menores, devido ao pequeno espaço de seu

território; a demanda é mais diversificada o que obriga a produzir mais modelos; o

fordismo exige espaço para estocar a produção em massa de veículos. Percebe-se que

o fordismo é inviável no Japão. É necessário adaptá-lo.

Para não sucumbirem à concorrência e para se tornarem tão competitivas

quanto as indústrias americanas, a partir de estudos desenvolvidos por Taiichi Ohno,

vice-presidente da Toyota, programam-se, progressivamente entre as décadas de

1950 e 1970, os novos métodos de produção a serem aplicadas às indústrias

nipônicas: o toyotismo. “Nasce o sistema produtivo próprio do Japão, que, conforme

o caso recebe o nome de métodos flexíveis, just-in-time, método kanban ou

toyotismo, já que a Toyota foi a primeira a empregá-lo” (Ibidem, p. 25).

O surgimento do toyotismo se deve a necessidade de as empresas japonesas

se tornarem tão competitivas quanto as americanas e de aplicar o fordismo no Japão,

mas dentro das possibilidades do país. Kiichiro Toyoda, então presidente da Toyota

escreve em 1933:

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Quanto ao método produtivo, tiraremos partido da experiência norte-americana de produção em série. Mas, não o copiaremos. Vamos lançar mão de nosso potencial de pesquisa e criatividade para conceber um método produtivo adaptado à situação de nosso país. (TOYODA, apud GOUNET, 1999, p. 25) Conforme Gounet pode-se resumir o sistema toyotista em uma frase, diríamos

que é um sistema de organização da produção baseado em uma resposta imediata às

variações da demanda e que exige, portanto, uma organização flexível do trabalho

(inclusive dos trabalhadores) e integrada. Pode-se também caracterizar o toyotismo

pelos cinco zeros:

- Zero atrasos; Zero estoques; Zero defeitos; Zero panes; Zero papéis:

Gounet (1999) reafirma as condições de estresse em que são submetidos os

trabalhadores no modelo toyotista de produção, que exige ainda mais do trabalho

operário que o fordismo. O trabalho é intensificado, a relação um homem/uma

máquina passa para uma relação uma equipe/um sistema, e mais:

[...] o gerenciamento by stress (por tensão). Em toda a cadeia de produção há sinais luminosos com três luzes: verde, tudo em ordem; laranja, há super-aquecimento, a cadeia avança em velocidade excessiva; vermelha há um problema, é preciso parar a produção e resolver a dificuldade (GOUNET, 1999, p. 29) Poder-se-ia crer que, enquanto todos os departamentos estão no verde, a

direção está satisfeita e que seu objetivo foi atingido. Mas não é assim. Em realidade,

é preciso que as lâmpadas oscilem continuamente entre o verde e o laranja. Dessa

forma, a direção está segura de que os trabalhadores estão ocupados ao máximo.

Desta maneira os trabalhadores estão sempre sob pressão. O trabalho

representa uma completa servidão. O operário já não dispõe de tempo para o lazer e

para a vida familiar, pois o único tempo livre é utilizado para repouso e recuperação,

a política básica é usar o mínimo de operários e o máximo de horas extras.

O operário, para trabalhar em equipe tem que ser polivalente e apresentar

mais aptidões que o fordismo. Ainda assim os salários não são corrigidos de acordo

com o aumento da qualificação. “O principal obstáculo quando eles lançam as bases

de seu sistema produtivo, no início dos anos 50, é o sindicato” [...]. “Em resumo: é

preciso acabar com o sindicato” (Idem, p. 30).

A oportunidade se apresenta no início dos anos 50. Após a Segunda Guerra,

pressionada pela depressão, a Toyota demitiu um quarto de sua força de trabalho, a

resposta foi a greve que dura muitos meses gerando uma enorme crise. A empresa

termina vencendo graças a ajuda dos bancos. As demissões são mantidas. Esta

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atitude teve duas conseqüências: o afastamento do presidente da empresa e a

construção de um novo modelo de relação capital-trabalho que acabou se tornando a

fórmula japonesa, com seus elementos característicos como emprego vitalício,

promoções por critérios de antiguidade e participação nos lucros.

Após esta crise e outra greve na Nissan, o patronato sente que pode resolver

o conflito a seu favor, faz com que os líderes sindicais sejam presos e cria um novo

sindicato com a colaboração de um operário que visita os grevistas, aconselhando-os

a entrar no novo sindicato e voltar ao trabalho. Esses operários desmobilizados

voltam à empresa. A Nissan criou o “sindicato-casa”, característico hoje em todo o

Japão.

“Assim os fabricantes usam a cenoura e o chicote, garantia de emprego

vitalício e o sindicato totalmente atrelado ao patrão, para impor a seus empregados as

mudanças nas condições de trabalho” (Ibidem, p.31).

Os resultados são particularmente favoráveis aos japoneses, nas comparações

com outros países. Enquanto no Japão, em 1987, para fabricar um automóvel são

necessárias 19 horas, nos Estados Unidos leva-se em média 26,5, nas melhores

fábricas européias 22,6, e a média na Europa é de 35,9. A organização japonesa

permite maior produtividade, tornando-os mais produtivos e em consequência mais

competitivos.

Segundo Gounet, a lógica de produção japonesa responde melhor às

transformações do mercado, e cita:

O toyotismo é uma resposta à crise do fordismo nos anos 70. Em lugar do trabalho desqualificado, o operário é levado à polivalência. Em vez da linha individualizada, ele integra uma equipe. No lugar da produção em massa, para desconhecidos, trabalha um elemento para “satisfazer” a equipe que vem depois da sua na cadeia. Em suma, o toyotismo elimina, aparentemente, o trabalho repetitivo, ultra-simplificado, desmotivante, embrutecedor. Afinal chegou a hora do enriquecimento profissional, do cliente satisfeito, do controle de qualidade (Ibidem, p. 33).

Por conta de seu sistema produtivo, a Toyota derruba os seus concorrentes e

ganha mercado. O enfrentamento é duro para os concorrentes, e as alternativas

acabam sendo as mesmas que as antigas empresas adotaram contra o fordismo. O

difícil é descobrir a essência da vantagem na concorrência.

Veremos a partir do estudo do fordismo e do toyotismo como se dá as

relações entre educação e trabalho.

No regime de acumulação flexível, característico de estados neoliberais, que

aprofunda a dualidade estrutural e a diferença de classes é a pedagogia das

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competências ou “Pedagogia Toyotista” (Kuenzer, 1998), que toma espaço e dissocia

o saber teórico da práxis.

A escola, como responsável pela transmissão de uma forma de

conhecimentos, característico da cultura de uma classe social e fruto de uma prática

fragmentada, expressa e reproduz a fragmentação, através de conteúdos, métodos e

formas de organização e gestão. É necessário, devido às mudanças na base material

de produção, capacitar o trabalhador que venha a atender às demandas desse novo

processo produtivo.

As capacidades agora chamadas de “competências” na pedagogia toyotista

mudam das habilidades psicofísicas para o desenvolvimento de competências

cognitivas complexas. Crítica feita ao toyotismo por Gounet (19999): “...esta nova

forma de organização e gestão do trabalho, aparentemente amplia o conteúdo do

trabalho ao substituir a linha pela célula de produção, onde um trabalhador cuida de

várias máquinas.”

O objetivo das novas formas de organização, não supera, mas, aprofunda a

divisão entre capital e trabalho.

A reconstituição da fragmentação do trabalho pedagógico, seja através do trabalho

pedagógico, seja através do chamado “paradigma” da transdisciplinaridade, ou na tentativa de articular teoria e prática ou através da intenção de conferir unidade ao trabalho pedagógico de modo a superar a formação dos especialistas, embora seja uma aproximação positiva, não supera a fragmentação inerente à função da escola no capitalismo, uma vez que se constitui em mecanismo interno às práticas educativas, e portanto insuficiente para transformar o modo de produção capitalista, este sim, origem da divisão. (KUENZER, 2004, p. 6).

Isto não quer dizer que se deva defender, ou até mesmo aceitar, as diferentes

formas de fragmentação. É necessário que a escola, tenha clareza sobre os seus

limites e principalmente busque compreender como a fragmentação se faz presente

no modo de organização do trabalho pedagógico.

Na Pedagogia Toyotista, firmada em uma sociedade de classes, com

características sociais de exploração, o trabalho pedagógico desempenhará a função

de desenvolver subjetividades pleiteadas pelo projeto hegemônico, neste caso, o

capital, que necessita de disciplinamento para a vida social e produtiva que por sua

vez objetiva o desenvolvimento de uma visão de mundo tão unânime quanto seja

possível, para atender as necessidades de valorização do capital.

Duas tendências são hegemônicas quanto ao estudo de organização e gestão

do trabalho: o taylorismo/fordismo e o toyotismo (métodos flexíveis).

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O paradigma taylorista fordista deu origem às tendências pedagógicas,

tradicional, nova e tecnicista. Propostas estas centradas nos conteúdos e nas

atividades sem buscar uma relação entre aluno e conhecimento em sua totalidade. O

principal método era o expositivo combinado com cópias e questionários.

Privilegiava a memorização, articulados ao disciplinamento, ambos fundamentais

para a participação no trabalho e na vida social.

As mudanças ocorridas no mundo do trabalho a partir dos anos 90 mudam

radicalmente as demandas de disciplinamento, e em decorrência as demandas que o

capitalismo faz à escola.

A relação entre educação e trabalho passa a ser mediada pelo conhecimento

que implica em domínio de conteúdos e de habilidades cognitivas e

comportamentais, tais como análise, síntese, rapidez nas respostas, criatividade,

comunicação em diferentes linguagens, capacidade de trabalhar em grupo, gerenciar

processos, eleger prioridades, tomar decisões, enfrentar mudanças permanentes e

estudar continuamente.

Surge a necessidade de um novo modelo de educação para os trabalhadores e

uma nova pedagogia. No que tange à nova pedagogia, ela encontra sua melhor

expressão na “pedagogia das competências”. Tendência toyotista na educação:

Combate ao desperdício e a concepção do administrador como “gestor”.

O princípio da flexibilidade viabiliza a reunificação do trabalho fragmentado

e sugere a reunificação do trabalho dos profissionais da educação. A polivalência não

significa, no entanto, a superação de parcialidade e fragmentação ou a compreensão

da totalidade, a interdisciplinaridade é uma “juntada” de partes e a “politecnia

significa o domínio intelectual da técnica e a possibilidade de exercer trabalhos

flexíveis, recompondo as tarefas de forma criativa” (KUENZER, 2004, p. 11)

Com relação à organização do trabalho pedagógico, a politecnia implica em

tomar a escola como totalidade, em compreender a gestão como prática social de

intervenção na realidade para transformá-la, supõe uma nova qualidade na formação

dos profissionais da educação, oportunizando uma sólida base comum, que entenda e

tome as relações entre sociedade e educação, as formas de gestão e organização do

trabalho pedagógico, as políticas, os fundamentos e as práticas educativas que os

conduza ao “domínio intelectual da técnica”.

Na análise do exercício laboral e da formação dos chamados trabalhadores

flexíveis, percebe-se que o trabalho da maioria está cada vez mais desqualificado,

intensificado e precarizado, como resultado do novo regime de acumulação.

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Do ponto de vista da gestão empresarial o que existe hoje é a ampliação de

tarefas do trabalhador, sem que isso signifique uma nova qualidade na sua formação.

Como o trabalho pedagógico escolar, ocorre em meio às relações sociais e

produtivas, ele não está imune às mesmas determinações.

BIBLIOGRAFIA

GOUNET, Tomas. Fordismo e Toyotismo: na civilização do automóvel. São Paulo: Boitempo Editorial, 1999. LAFARGUE, Paul. O direito à preguiça. Tradução de J. Teixeira Coelho Netto; introdução de Marilena Chauí. São Paulo: Hucitec; Unesp, 1999. KUENZER, Acácia Zeneida. As políticas de formação: a constituição da identidade do professor sobrante. <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73301999000300009 > Acesso em 01/06/2010. KUENZER, Acácia Zeneida. Exclusão includente e inclusão excludente: a nova forma de dualidade estrutural que objetiva as novas relações entre educação e trabalho. <http://www.diaadia.pr.gov.br/det/arquivos/File/SEMANAPEDAGOGICA/13_Exclusao-Includente-Acacia_Kuenzer.pdf> Acesso em: 01/06/2010. PROF. DR. ADRIAN ALVARES ESTRADA: Organização do trabalho pedagógico. Curso específico PDE, Cascavel, dias 03 e04/12/2009.

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TRABALHO ALIENADO

Tratados como mercadoria Reserva de mão de obra Antes indispensável Bravamente unidos lutaram Armando piquetes e barricadas Lutando com muita garra Homens livres e também escravos Onde, quem não manda é explorado. Algumas conquistas foram bem-vindas Longe, bem longe do que buscavam Interesses do proletariado. Emergindo de entranhas estranhas Nada... que não seja usado A favor dos abonados Dos que tiram do trabalhador O lucro desordenado. Lourdes Zanin Vieira