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Página 1 de 25 CURSO CARREIRAS JURÍDICAS DATA 09/08/2016 DISCIPLINA PROCESSO PENAL PROFESSOR MARCOS PAULO MONITOR UYARA VAZ AULA 01 ___________________________________________________________________ Ementa: Bibliografia; Polícia judiciária; Inquérito policial: Conceito Características Dispensabilidade; Inquisitoriedade; Bibliografia Curso de Processo Penal - Renato Brasileiro - Obra mais abrangente em termos de edital e verticalização média. Deve-se tomar cuidado com provas de bancas locais, como MPMG e Magistratura. Curso de Processo Penal Aury Lopes Júnior - Obra mais crítica, mas não esgota todos os pontos do edital. Eugenio Pacelli Concursos para MPF.

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CURSO – CARREIRAS JURÍDICAS

DATA – 09/08/2016

DISCIPLINA – PROCESSO PENAL

PROFESSOR – MARCOS PAULO

MONITOR – UYARA VAZ

AULA 01

___________________________________________________________________

Ementa:

Bibliografia;

Polícia judiciária;

Inquérito policial:

Conceito

Características

Dispensabilidade;

Inquisitoriedade;

Bibliografia

Curso de Processo Penal - Renato Brasileiro - Obra mais abrangente em

termos de edital e verticalização média. Deve-se tomar cuidado com provas

de bancas locais, como MPMG e Magistratura.

Curso de Processo Penal – Aury Lopes Júnior - Obra mais crítica, mas não

esgota todos os pontos do edital.

Eugenio Pacelli – Concursos para MPF.

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Informativos STF e STJ – análise retrospectiva do ano em curso e dois anos

para trás para quem já está estudando. Quem começou a preparação agora,

manter os informativos deste ano em dia. Ler os julgados pelo critério

temático e não cronológico.

PROCESSO PENAL

1. POLÍCIA JUDICIÁRIA

Não se pode confundir polícia judiciária com polícia administrativa, haja vista

que a polícia administrativa tem sempre um viés preventivo, tem por fim evitar que

um dano venha a ser causado. Ex.: A interdição de um prédio pela Defesa Civil é

expressão da polícia administrativa, porque é o Estado intervindo para restringir

garantias individuais, mas para evitar que um dano venha a ser causado.

A polícia judiciária, por sua vez, já tem um viés repressivo, ou seja, houve um

crime e a partir deste crime houve um dano. Possui finalidade de repressão, pois

não há mais o que prevenir, afinal de contas o crime já foi cometido, restando apurar

e, passado o devido processo legal, punir. O tema veio disciplinado no art. 144, § 1º,

IV, CR/88:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I - polícia federal;

§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a:

IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.

§4º - às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.

No âmbito federal o poder de polícia judiciária é exercido com exclusividade

pela Polícia Federal. Ao passo que no âmbito dos Estados será exercido pela Polícia

Civil. No âmbito estadual, o §4º do art. 144, CR/88, não repetiu a locução “com

exclusividade” – silêncio eloquente. Logo, será sem exclusividade, isso para permitir

o exercício concomitante, embora limitado, pela Polícia Militar, a quem foi confiado o

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policiamento ostensivo. No momento de canalizar as investigações, estas serão

canalizadas na Polícia Civil, vez que a instauração do inquérito é atribuição privativa

dos Delegados de Polícia de carreira, conforme art. 144, §5º, da CR/88:

§5º - às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.

No exercício do policiamento ostensivo pela Polícia Militar, pode envolver

tanto o poder de polícia judiciária quanto o poder de polícia administrativa. Ex.: Um

policial militar designado para regular o tráfego de pessoas e veículos em um grande

evento estará investido no poder de polícia administrativa. Entretanto, também faz

repressão ao crime, atuando com poder de polícia judiciária.

Quando se pensa em inquérito policial, pensa-se na sua instauração através

de Portaria ou por meio de auto de prisão em flagrante. Só que no âmbito dos

Juizados Especiais Criminais, o procedimento investigatório por excelência não será

o inquérito, mas o termo circunstanciado, previsto no art. 69, Lei 9.099/95.

Merece reparo, igualmente, o fato de que o flagrante, no mais das vezes, ser

exercido pela PM, no entanto, a lavratura do BO é de competência exclusiva da

polícia judiciária, ou seja, Polícia Civil no âmbito estadual. A instauração de inquérito

policial é atribuição privativa do Delegado de Polícia de Carreira. No âmbito das

infrações penais de menor potencial ofensivo, a lavratura dos TCOs, conforme prevê

o artigo 69 da Lei 9099/95, também é atribuição privativa dos Delegados de Polícia

de Carreira.

Art. 69. A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários.

“O STF não admite delegações à Polícia Militar para lavrar termo

circunstanciado, porque, enquanto procedimento investigativo é de atribuição

privativa dos Delegados de Polícia de carreira, à semelhança do inquérito, o

que é reforçado pela lei 12.830, art. 2º, § 1º. Ainda que a matéria seja

procedimental, descabe ao Estado legislar de forma diversa, conforme art. 24,

§§ 1º e 4º, CR/88”.

A lei 12.830/13 veio disciplinar a Polícia Judiciária e o art. 2º prevê:

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Art. 2o As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais

exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado.

§ 1o Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a

condução da investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei, que tem como objetivo a apuração das circunstâncias, da materialidade e da autoria das infrações penais.

Quando o § 1º fala em “outro procedimento previsto em lei”, seria incluído o

termo circunstanciado. Ainda que a investigação seja, e é matéria procedimental, a

desafiar competência legislativa concorrente dos Estados, evidentemente que essa

competência legislativa dos Estados vai atuar, sobretudo a título complementar,

jamais afastando o que foi preceituado em lei federal. Portanto, isso torna ainda

mais inconstitucional uma lei estadual que pretendesse dar à Policia Militar poderes

para lavrar termo circunstanciado. Esse discurso não se restringe à Polícia Militar,

podendo pensar na Polícia Rodoviária Federal.

Mas questiona-se: até onde poder-se-ia admitir a investigação pelo Ministério

Público, vez que o art. 144, CR/88, só tratou das polícias? O Pleno do STF assentou

entendimento no sentido de:

“O STF, na linha do STJ, admite a investigação direta pelo MP, não

apenas para realizar atos investigatórios pontuais, mas também desencadear

procedimento próprio, diverso do policial, a título complementar ou

suplementar. Concorrentemente, apenas quando em jogo crimes contra a

Administração Pública ou abuso de autoridade”.

O MP poderá realizar atos de investigação pontuais, como requisitar um

documento, colher um depoimento. Isso sempre foi feito pelo MP. A dúvida é se o

MP poderia instaurar um procedimento investigativo próprio. O STF disse que é

possível, mas, como regra, esse procedimento investigativo do MP não pode ser

concorrente, mas apenas instaurado de forma complementar ou suplementar.

Somente se admite o procedimento investigativo próprio do MP em crimes contra a

Administração Pública ou crimes de abuso de autoridade.

A argumentação irá se projetar em três níveis – constitucional,

infraconstitucional e no direito comparado.

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Argumentos constitucionais

A primeira linha argumentativa está baseada no art. 129, VII e VIII, CR/88 c/c

a teoria dos poderes implícitos. Se o MP pode controlar externamente a atuação

policial e requisitar, isto é, ordenar diligências investigatórias, porque não poderia

investigar? Quem pode o mais, pode o menos – teoria dos poderes implícitos. Foi o

argumento mais utilizado pelo STF para admitir o procedimento investigativo próprio

do MP.

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

VII - exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior;

VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais;

A segunda linha argumentativa combina o art. 129, VII c/c VI, CR/88. Se cabe

ao MP controlar externamente a atuação policial, não seria demasiado dizer que a

investigação policial não deixa de estar sujeita à fiscalização do próprio MP, ou seja,

não deixa de ser um procedimento, em última análise, sujeito à sua atribuição – uma

atribuição fiscalizatória, de controle.

O inciso VI diz que são funções institucionais do MP expedir notificações nos

procedimentos administrativos de sua atribuição (atuação policial), requisitando

informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar

respectiva. Essa lei complementar é a 75/93 que, em seu art. 8º, V, dispõe que os

membros do Ministério Público da União poderão, diretamente, investigar. Ou seja, a

referida lei complementar deu expressamente aos membros do Ministério Público da

União poderes de investigação.

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

VII - exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior;

VI - expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva;

Nesse sentido: “considerada a investigação policial, procedimento

sujeito à atribuição investigatória do MP, incide o inciso VI do art. 129, CR/88 e,

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consequentemente, o art. 8º, V, da lei complementar 75/93. Essa prerrogativa

alcança os Ministérios Públicos estaduais, consideradas a unidade e a

indivisibilidade do MP (art. 127, § 1º, CR/88), embora possa se evocar o art. 26,

I, a, lei 8625/93”.

Art. 8º Para o exercício de suas atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência:

V - realizar inspeções e diligências investigatórias;

No âmbito dos MP estaduais não há uma previsão tão eloquente quanto ao

MPU, embora se possa chegar a essa conclusão pelo art. 26, I, a, lei 8.625/93, que

assim dispõe:

Art. 26. No exercício de suas funções, o Ministério Público poderá:

I - instaurar inquéritos civis e outras medidas e procedimentos administrativos pertinentes e, para instruí-los:

a) expedir notificações para colher depoimento ou esclarecimentos e, em caso de não comparecimento injustificado, requisitar condução coercitiva, inclusive pela Polícia Civil ou Militar, ressalvadas as prerrogativas previstas em lei;

Contudo, o MP é uno e indivisível, sendo certo que uma prerrogativa dada

aos membros do MPU será aplicável ao MP estadual e vice-versa, evidentemente

guardada a repartição das atribuições entre MPU e MP dos Estados.

Também se pode buscar fundamento no art. 129, III, CR/88, por analogia. O

dispositivo dá ao Ministério Público atribuição para promover o inquérito civil público.

O inquérito civil público é um procedimento investigatório que objetiva carrear justa

causa que vai permitir a deflagração de uma futura ação civil pública, que tem no MP

um de seus legitimados.

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;

Na ação civil pública versa-se sobre interesses metaindividuais. Migremos

para a ação penal – esta tem uma dimensão metaindividual, mas diferentemente da

ação civil pública, o titular privativo é o Ministério Público. Logo, se o MP pode

diretamente investigar para carrear justa causa, visando o ajuizamento de uma ação

civil pública, por que não poderia investigar diretamente para viabilizar o ajuizamento

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de uma ação penal, se ambas têm uma dimensão metaindividual, versam sobre

direitos indisponíveis e se a ação penal ainda tem um plus – privativa do MP?

“Se o MP pode, diretamente investigar, carreando justa causa a permitir

a deflagração da ação civil pública, que não tem nele (MP) o titular privativo,

porque não poderia fazer o mesmo com a ação penal, também metaindividual,

versando sobre direitos indisponíveis? Não raro o apurado no ICP (inquérito

civil público) tem relevância criminal, a revelar que são procedimentos

investigatórios comunicáveis entre si, e não estanques”.

Outro fundamento importante deve ser buscado no art. 129, IX, CR/88 c/c art.

129, I, CR/88. O inciso IX deixa claro que as atribuições conferidas ao MP e

arroladas naquele dispositivo não são exaustivas, pois que ao MP podem ser dadas

outras funções, desde que compatíveis com suas funções institucionais. Como a

primeira função institucional do MP é promover a ação penal, não haveria entrave

conceder a ele poder investigativo.

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;

IX - exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas.

“Na medida em que a ação penal pública é privativa do MP, qualquer

atribuição relacionada ao exercício desse mister, como a investigatória, será

constitucional”.

Quanto à argumentação constitucional, ainda é importante destacar que

embora a CR/88 tenha tratado da polícia judiciária no art. 144, CR/88, só se

referindo à polícia e não a outros órgãos, não teria a Constituição dado à polícia o

monopólio investigativo. Essa argumentação se refuta quando se depara com o art.

58, § 3º, CR/88, dispondo que as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs)

disporão de poderes de investigação equiparados aos da autoridade judiciária. Logo,

significa que a investigação não seria de monopólio policial, pois outros órgãos

foram investidos de um poder investigatório, como as CPIs.

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Todo Estado Democrático de Direito se pauta no sistema de pesos e

contrapesos, exatamente para permitir uma relação harmônica e controlada entre os

poderes. Se a Polícia investiga, quem a controla externamente é o MP. Daí surge a

dúvida: se o MP investigasse diretamente, quem o controlaria? Haveria primeiro o

controle administrativo, exercido pelo Conselho Nacional do Ministério Público,

consoante art. 130-A, § 2º, II, CR/88, que afirma competir ao Conselho o controle da

atividade do MP genericamente, apreciando a legalidade dos atos administrativos

por ele levados a cabo. O CNMP é colegiado de composição heterogênea, ou seja,

não é formado apenas por membros do MP.

Art. 130-A. O Conselho Nacional do Ministério Público compõe-se de quatorze membros nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, para um mandato de dois anos, admitida uma recondução, sendo:

§ 2º Compete ao Conselho Nacional do Ministério Público o controle da atuação administrativa e financeira do Ministério Público e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros, cabendo lhe:

II - zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos Estados, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência dos Tribunais de Contas;

Investigar é um ato administrativo, cuja legalidade estaria sujeita ao controle

realizado pelo CNMP, sem prejuízo do próprio controle jurisdicional (art. 5º, XXXV,

CR/88). Assim, em se admitindo a investigação direta do MP, ela estaria passível de

controle administrativo, no âmbito do CNMP, e pelo Poder Judiciário.

Argumentos infraconstitucionais

É importante ressaltar, em um segundo momento, que propor a investigação

direta pelo MP não seria propor uma novidade propriamente, mas algo que, a rigor,

já existiria entre nós, mesmo antes da ordem constitucional de 1988, destacando os

seguintes dispositivos: o art. 4º, parágrafo único; art. 27 e art. 47, todos do CPP.

Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria. Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função.

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Art. 27. Qualquer pessoa do povo poderá provocar a iniciativa do Ministério Público, nos casos em que caiba a ação pública, fornecendo-lhe, por escrito, informações sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção.

Art. 47. Se o Ministério Público julgar necessários maiores esclarecimentos e documentos complementares ou novos elementos de convicção, deverá requisitá-los, diretamente, de quaisquer autoridades ou funcionários que devam ou possam fornecê-los.

Esses são dispositivos originários da redação de 1941 do CPP, reveladores

dessa possibilidade de o MP investigar. Esses dispositivos já revelariam que a

investigação não seria monopólio policial, pois outras autoridades poderiam ter

poder de polícia judiciária, a partir de uma previsão legal nesse sentido. Assim, o MP

seria incluído, levando-se em conta o regramento da lei complementar 75/93, art. 8º,

V, e lei 8.625/93, art. 26, I, sem contar a possibilidade de aplicação, por analogia, do

CPP.

O caput do art. 4º sofreu uma alteração em 1995, mas o parágrafo único é

originário de 1941, ou seja, já neste período o próprio legislador já admitia a

investigação sendo realizada por órgãos diversos do policial. Assim, a possibilidade

de investigação direta pelo MP não seria propor um modelo novo, mas um modelo

que possui respaldo legal no Brasil desde 1941.

Argumento no direito comparado

“No direito comparado, a regra em países como Portugal e Itália, é o MP

investigar, sendo-lhe tal atribuição originária, de maneira que as polícias

destes países investigam por delegação”.

O MP reconhece a constitucionalidade da Resolução 13 do CNMP, que já

estabelecia regras gerais pertinentes a um procedimento investigatório autônomo

ministerial. Com base nessas considerações, se reconhece a Resolução 77 do MPF,

que também estabelecia o regramento geral da investigação no âmbito do Ministério

Público Federal. Assim, fixam-se a constitucionalidade de todas as resoluções que já

especificavam uma investigação direta pelo MP, como se dá no MPMG.

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Nesta toada, isso não deveria vir por lei? Será que essas resoluções não

extrapolariam os limites do poder regulamentar, inovando em direitos? E

considerando ser a matéria processual penal, será que isso não ofenderia o art. 22,

I, CR/88?

“À luz dos argumentos aduzidos acima, conclui-se que a investigação

ministerial já teria respaldo legal. Logo, a disciplina deste procedimento por

resolução não extrapolaria o poder regulamentar, não inovando em direitos”.

Argumentação em sentido contrário

“Houve silêncio eloquente do Poder Constituinte, pois poderia ter dado

ao MP poderes de investigação no art. 129, CR/88, ao listar as atribuições

deste, ou no art. 144, CR/88, ao disciplinar a polícia judiciária, ficando em

silêncio em ambas as oportunidades, embora não tenha pestanejado em dar-

lhe poder para promover o inquérito civil público. Em verdade, houve uma

repartição de atribuições, sem confiar ao MP a investigação direta para

preservar o mister principal consistente na defesa da ordem jurídica (art. 127,

caput, CR/88)”.

O Constituinte poderia ter dado ao MP poderes diretos de investigação no art.

129, como de fato o fez, mas no que toca ao inquérito civil público (ICP). Ao

disciplinar a polícia judiciária, ou seja, a investigação em si, no art. 144, poderia

também ter mencionado o MP. Entretanto, somente aludiu à polícia. Se em duas

oportunidades o Constituinte pode dar ao MP poderes diretos de investigação e não

o fez, isso seria revelador de um silêncio proposital, pois a finalidade teria sido

estabelecer uma repartição de atribuições entre polícia e MP. À Polícia a linha de

frente, a repressão, e ao MP a retaguarda, daí o controle externo das investigações,

daí requisitar e não executar, para que o MP não ficasse prejudicado naquilo que é o

seu mister principal – defesa da ordem jurídica – art. 127, caput, CR/88. A defesa da

ordem jurídica exige uma postura desinteressada. Não chega a ser uma postura

imparcial, mas exige, pelo menos, isenção.

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Na medida em que se admite uma investigação direta pelo MP, sai a figura de

um promotor de justiça, entrando a figura de um promotor de investigação, de uma

pessoa que irá deflagrar a ação penal de forma interessada a que toda investigação

por ele proposta seja, em juízo, afirmada. Dai então se concluiria pela

impossibilidade do MP investigar.

O art. 129, VII e VIII, CR/88 – se disser que houve silêncio eloquente do

Poder Constituinte, não se pode trabalhar com a teoria dos poderes implícitos.

Assim, essa linha argumentativa já cairia por terra.

Se disser que houve silêncio eloquente do Poder Constituinte, o fato de o

inciso VI remeter à legislação infraconstitucional se torna algo neutro, pois obriga a

realizar uma interpretação restritiva da legislação infraconstitucional, de maneira que

qualquer alusão à procedimento investigatório, obrigatoriamente, se excluiria o

criminal.

Da mesma forma, se disser que houve silêncio eloquente do Poder

Constituinte, é porque inexistiu lacuna, neutralizando o art. 129, III, por analogia.

Por outro lado, o inciso IX com o inciso I, do art. 129, CR/88, remete à

legislação infraconstitucional, ocorrendo a mesma questão anteriormente esplanada.

A menção à CPI, no art. 58, § 3º, só reforça o silêncio eloquente, cabendo o

discurso de quando o Constituinte quis dar poderes de investigação para órgãos

diversos do policial ele fez, que foi o caso da CPI. Esse artigo só reforça o silêncio

eloquente quanto a possibilidade de o MP diretamente investigar.

Evidentemente que a linha argumentativa sobre o controle também cai por

terra, na medida em que parte-se da premissa que o MP não pode diretamente

investigar e, com base nisso, toda a legislação (art. 4º, parágrafo único; art. 27; art.

47, CPP) seria merecedora de filtragem constitucional, para decotar qualquer

possibilidade de se entender o poder de investigação criminal pelo MP.

Por fim, as resoluções 13 do CNMP e 77 do MPF seriam inconstitucionais por

todas as razões acima e pelo fato de o poder regulamentar extrapolar seus limites.

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A argumentação do direito comparado também é passível de resposta, pois

nos países citados – Portugal e Itália – não é preciso discutir isso, pois por

mandamento constitucional expresso, a investigação é do MP. A Polícia desses

países investiga por delegação.

Obs.: Questão semântica curiosa: chefe de Polícia no Brasil chama-se Delegado de

Polícia. Se falar em delegado, parte-se da premissa subliminar que há uma

delegação. É um atuar por meio de delegação; um atuar delegado.

Obs.1: “Por paridade de armas, nada impede que no inquérito a defesa do

indiciado produza provas, pois a inquisitoriedade deste não elimina a ampla

defesa, tornando-a apenas dispensável”.

Obs.2: “Em se entendendo pela impossibilidade de o MP investigar, cabe

habeas corpus trancativo da ação penal por falta de justa causa, se pautada

em procedimento investigatório ministerial”.

Obs.3: “A súmula 234 do STJ não se confunde com a possibilidade de o

promotor que participou da investigação ser arrolado como testemunha. Ante

a teoria do órgão, tal é inviável, à exceção de membro de ramo do MP despido

de qualquer atribuição penal (MP do Trabalho e MP junto ao Tribunal de

Contas)”.

Súmula 234, STJ: A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.

A súmula 234 do STJ diz que o membro do MP que participou das

investigações não está impedido, nem tampouco suspeito para oferecer a denúncia.

Nada mais natural, pois já vimos que para os tribunais superiores, se o MP pode

investigar em procedimento próprio, poderá participar das investigações, estando

dentro das suas atribuições constitucionais. Todavia, não poderá ser arrolado como

testemunha.

2. INQUÉRITO POLICIAL

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2.1 – Conceito: é procedimento administrativo, de cunho investigatório-inquisitório,

presidido pela autoridade policial, objetivando reunir justa causa para deflagração da

ação penal.

2.2 – Características:

a) Dispensabilidade: se o MP já dispuser dessa justa causa para deflagração da

ação penal, não haverá necessidade de se passar pelo inquérito, não sendo

este uma etapa obrigatória. Vide arts. 12; 27; 46, § 1º; 39, § 5º, todos do CPP.

Art. 12. O inquérito policial acompanhará a denúncia ou queixa, sempre que servir de base a uma ou outra. Art. 27. Qualquer pessoa do povo poderá provocar a iniciativa do Ministério Público, nos casos em que caiba a ação pública, fornecendo-lhe, por escrito, informações sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção. Art. 46. O prazo para oferecimento da denúncia, estando o réu preso, será de 5 dias, contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos do inquérito policial, e de 15 dias, se o réu estiver solto ou afiançado. No último caso, se houver devolução do inquérito à autoridade policial (art. 16), contar-se-á o prazo da data em que o órgão do Ministério Público receber novamente os autos. § 1

o Quando o Ministério Público dispensar o inquérito policial, o

prazo para o oferecimento da denúncia contar-se-á da data em que tiver recebido as peças de informações ou a representação Art. 39. O direito de representação poderá ser exercido, pessoalmente ou por procurador com poderes especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz, ao órgão do Ministério Público, ou à autoridade policial. § 5

o O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a

representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal, e, neste caso, oferecerá a denúncia no prazo de quinze dias.

Não se confunde o inquérito com o processo em si, até pelas naturezas

distintas – o inquérito é administrativo e o processo é jurisdicional. A pedra

inaugural do processo é a denúncia ou a queixa crime, que são

manifestações do direito de ação, que é abstrato.

Se o processo tem como pedra inaugural a denúncia ou a queixa,

materialização do direito de ação, abstrato, evidente que eventuais nulidades

verificadas no inquérito não podem contaminar o processo, pois não haveria

nexo causal. Logo, nulidades que constam no inquérito, morrem no inquérito.

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Nesse tocante há o princípio da causalidade, o qual preceitua que a nulidade

de um ato acarreta a nulidade de todos os demais atos que dele sejam

consequência, conforme art. 573, § 1º, CPP.

Art. 573. Os atos, cuja nulidade não tiver sido sanada, na forma dos artigos anteriores, serão renovados ou retificados. § 1

o A nulidade de um ato, uma vez declarada, causará a dos atos que dele

diretamente dependam ou sejam conseqüência.

Deste modo, a ação penal deflagrada por um inquérito que possua nulidade

será válida.

Alguns autores trazem uma imprecisão técnica - vão dizer que algumas

irregularidades do inquérito irão contaminar o processo: flagrante provocado

(súmula 145, STF), flagrante forjado e acervo indiciário ilícito. Isso está

errado, pois esses três exemplos não são causas de nulidade da ação, sendo

questões de mérito, ou seja, repercutem na procedência ou não do próprio

pedido. Ex.: Se o juiz reconhecer que o flagrante foi forjado não irá anular o

processo, mas absolver o réu com base no art. 386, I (inexistência da própria

conduta) ou IV (autoria forjada). Neste caso o processo foi válido, tanto que

está sendo julgado com resolução do mérito, sendo julgado improcedente o

pedido.

Flagrante provocado: súmula 145 do STF, traduz crime impossível, o que dá

azo a uma sentença absolutória com base na atipicidade da conduta, art. 386,

III, CPP.

Súmula 145: Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação.

Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: III - não constituir o fato infração penal.

Flagrante forjado: é o reconhecimento de que a conduta nunca existiu ou até

existiu, mas a autoria foi forjada, o que dá azo à absolvição, com base no art.

386 I e IV, CPP. Note que o processo não foi nulo e sim extinto com

julgamento de mérito.

Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: I - estar provada a inexistência do fato; IV – estar provado que o réu não concorreu para a infração penal;

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Acervo indiciário ilícito: há duas possibilidades. A primeira é o reconhecimento

pelo juiz, rejeitando a denúncia, com base no art. 395, III, CPP (falta de justa

causa). Não terá o juízo, assim procedendo, anulado o processo, mas

extinguindo-o sem resolução do mérito. De outra forma, se o acervo indiciário

ilícito for enfrentado apenas ao final do processo, haverá absolvição por

insuficiência probatória – art. 386, II, V, VI, 2ª parte, ou VII, CPP.

Em nenhum dos três casos acima o processo foi nulificado, pois eram

questões de mérito. Estas questões, uma vez equacionadas, levam à

procedência ou improcedência do pedido.

b) Inquisitoriedade: “embora alguns autores associem a inquisitoriedade à

ausência de contraditório e da ampla defesa no inquérito, em verdade

existem sim, considerado o art. 5º, LXIII, CR/88, mas não como

elementos essenciais, como são para o processo, e sim acidentais”.

Não são poucos os autores que vão associar a inquisitoriedade à ausência de

contraditório e ampla defesa. Logo, em muitas provas objetivas há a assertiva

dizendo que pela inquisitoriedade, não há contraditório e ampla defesa no

inquérito. Se deparar com uma questão dessa, deve-se fazer vista grossa e

marcar como verdadeiro. Entretanto, na realidade, essa assertiva não está

precisa, pois contraditório e ampla defesa podem existir no inquérito, a

diferença é que no processo são indeclináveis e no inquérito são facultativos.

“A defesa pode, por exemplo, acompanhar o interrogatório policial,

instruindo o indiciado a evocar o silêncio, não respondendo

determinada pergunta. Contudo, formular perguntas não é prerrogativa

do advogado, mas a autoridade policial pode, por cortesia, franqueá-las

(inteligência do art. 7º, XXI, Lei 8.906/94 com a redação dada pela lei

13.245/16). Por outro lado, impedir o advogado de estar presente ao ato

nulifica o interrogatório policial. Alcançar as demais peças informativas

apenas se concebe quanto às reveladas pelo próprio indiciado, no caso,

por exemplo, de confissão. Tal pode comprometer a justa causa para a

ação penal, mas não o processo crime em si. Por outro lado, a menção à

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indicação de razões e quesitos submete-se a um juízo discricionário da

autoridade policial, nos termos do art. 14, CPP”.

Art. 7º São direitos do advogado: XXI - assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva apuração; Art. 14. O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade.

O indiciado tem direito a assistência de um advogado. É evidente que o

Delegado não pode impedir que o defensor/advogado acompanhe o

interrogatório policial. Se houver esse impedimento, esse ato se mostrará

nulo. Contudo, não se pode potencializar, em demasia, o inciso XXI do art. 7º,

lei 8.906, pois este diz que importará a nulidade de todos os atos que dele

decorram direta ou indiretamente. Essa quadra é relevante se nessa

inquirição policial tiver havido confissão e o advogado/defensor estava

presente e lhe foi bloqueado o acesso ao ato. Assim, o ato como um todo se

mostrará nulo. Nulidade esta que pelo princípio da causalidade (art. 573, § 1º,

CPP), vai alcançar as peças de informação que tenham sido angariadas a

partir do que foi dito pelo indiciado. Isso tudo irá repercutir no acervo

indiciário. Ou seja, não vai contaminar, tornando nulo, o futuro processo-

crime. Mas irá comprometer a justa causa para a deflagração da ação penal,

rejeição da denúncia por falta de justa causa (art. 395, III, CPP).

Mas se o indiciado comparecer sem advogado/defensor e o Delegado o

advertir que teria direito à assistência, mas aquele logo indagar quais eram as

perguntas, não haverá nulidade.

Haveria um direito para o próprio advogado formular perguntas ao indiciado?

Não, pois, ao contrário, deixaria de ter um procedimento inquisitório para ter

um procedimento em contraditório. O Delegado pode, no entanto, por

cortesia, liberalidade, oportunizar perguntas ao advogado.

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“Em verdade, razões e quesitos veiculados pela defesa apenas seriam

de observância obrigatória presente a prova pericial, na medida em que

os peritos estão sujeitos à disciplina judiciária (art. 275, CPP)”.

Art. 275. O perito, ainda quando não oficial, estará sujeito à disciplina judiciária.

Os peritos são, na realidade, juízes. Tanto que aos peritos são oponíveis as

mesmas hipóteses de suspeição e impedimentos oponíveis ao juiz. Os peritos

são juízes técnicos, tanto que as partes não interferem na sua nomeação.

Nos termos do art. 275, CPP, o perito está vinculado a uma disciplina

judiciária. Neste caso, não se fala mais de uma peça inquisitória, mas de um

procedimento probatório que, enquanto tal, lhe é inerente o contraditório.

Tanto que é bem sugestivo o fato de a lei 8.906 ter utilizado a palavra

quesitos, razões, pois são palavras próprias ao exame pericial. Assim, tão

somente neste caso não incide o art. 14, CPP.

Tem-se o princípio do livre convencimento motivado do juízo estampado no

art. 93, IX, CR/88. Esse princípio é uma garantia que o próprio magistrado

tem que sua atuação foi imparcial. Ainda é uma garantia das partes de que o

contraditório e a ampla defesa não cairão no vazio. O princípio do livre

convencimento motivado cumpre essa finalidade dupla:

1) Na medida em que o juiz fundamenta a sua decisão poderá ser rotulado de

tudo, menos de parcial, pois apresentou razões que conduziram à

determinada conclusão;

2) Na medida em que o juiz é obrigado a fundamentar, garante-se que o

contraditório e a ampla defesa não caiam no vazio. Ex.: Promotor apresenta

alegações finais extensas, de mais de 20 laudas. O defensor também

apresenta alegações finais no mesmo patamar. O juiz condensa em uma

frase: “condeno, porque quero” ou “absolvo, porque quero”. Nesse caso o

contraditório ficou completamente esvaziado. O contraditório será preservado

na medida em que o juiz enfrente a tese acusatória, a antítese defensiva,

para então apresentar a sua síntese. Se não for assim, contraditório e ampla

defesa não passarão de uma ficção.

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Esse introito foi realizado para se chegar à conclusão de que seria

inconcebível um processo em contraditório e ampla defesa sem o livre

convencimento motivado do juiz. Só que no inquérito, todavia, não se tem um

contraditório e uma ampla defesa como elementos essenciais, mas como

elementos acidentais, o que explica o art. 14, CPP. Como não há um

contraditório e uma ampla defesa em relação a qual a autoridade policial deva

prestar contas, ante requerimentos da vítima e do indiciado, tudo vai se

resumir, por parte da autoridade policial, em um “defiro” ou “indefiro”.

Não chega a ser um juízo arbitrário, mas discricionário puro, pois o

procedimento é inquisitório. O momento é de repressão, pois a valoração

ficará para o processo crime.

“O art. 14, CPP é consequência da inquisitoriedade”.

O art. 6º, CPP, lista as etapas investigatórias a serem cumpridas pela

autoridade policial durante o inquérito e uma delas é ouvir o indiciado (art. 6º,

V, CPP). O art. 6º, V, CPP é uma regra de 1941, ao passo que o

interrogatório sofreu alterações profundas pela lei 10.792/03.

Art. 6o Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a

autoridade policial deverá: I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias; IV - ouvir o ofendido; V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título Vll, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que Ihe tenham ouvido a leitura; VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações; VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias; VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes; IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e caráter. X - colher informações sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma deficiência e o nome e o contato de eventual responsável pelos cuidados dos filhos, indicado pela pessoa presa.

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Interrogatório Judicial

Antes da lei 10.792/03 Depois da lei 10.792/03

1. O interrogatório era ato privativo do

juiz.

1. O interrogatório tornou-se uma

audiência em contraditório, conforme

art. 188, CPP.

2. Presença da defesa técnica –

facultativa. O defensor apenas

precisaria estar presente se o

indiciado fosse menor de 21 anos.

2. Presença da defesa técnica –

obrigatória (art. 185, caput, CPP), até

para viabilizar a entrevista pessoal e

reservada que o réu tem direito com

seu defensor antes da inquirição (art.

185, § 5º, CP).

3. Se o defensor estivesse presente,

as perguntas eram liberalidade do

juízo. Era um modelo totalmente

inquisitório.

3. Modelo acusatório.

Com a lei 11.900, passou-se a ter, a título excepcional, a possibilidade de

videoconferência determinada pelo juiz. A videoconferência é uma ferramenta

que minimiza a ampla defesa, pois esta perpassa pelo direito que o réu tem

de se fazer presente no dia do seu julgamento. Na medida em que se

implementa a videoconferência, esse direito resta minimizado. Ainda assim,

excepcionalmente, é possível no processo, que é acusatório. Em assim

sendo, também será possível no inquérito, que é inquisitório, não havendo

incompatibilidade. Ou seja, nada impede que a autoridade policial determine a

videoconferência quando necessária à determinada oitiva.

A inquisitoriedade tem relevância direta no desvalor probatório do inquérito,

nos moldes do art. 155, caput, CPP, vez que presente a sentença

condenatória, o inquérito tem valor obter dictum (argumento de reforço). O

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inquérito não atua como ratio decidendi – não pode haver condenação

lastreada apenas no inquérito.

Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.

OBITER DICTUM – SINGULAR – Argumento de reforço.

OBITER DICTA – PLURAL – Argumentos de reforço.

O inquérito, ante uma sentença condenatória, tem força argumentativa

secundária, pode ser um argumento a mais, mas não pode ser a razão da

condenação.

Prova para a Defensoria Pública cabe uma crítica: “contrapondo a natureza

acusatória do processo à inquisitória do inquérito, nem como argumento

de reforço este último serviria, afinal, não raro, é difícil identificar a ratio

decidendi dos obter dicta”.

Por essa dicção, teria uma incompatibilidade ontológica tamanha entre

inquérito e processo, que na realidade o inquérito não serviria, frente a uma

sentença condenatória, nem como argumento de reforço. Ou seja, não

deveria ser aludido como um todo. Ressalta-se que é muito difícil, na prática,

identificar tranquilamente a ratio decidendi separando-a dos obter dicta.

Ex.: São muito comuns no Júri as testemunhas do “ouvi dizer”. Imagine-se

que tem uma testemunha de fato presencial, que foi ouvida em sede policial,

mas ela não foi encontrada. O MP também arrolou como testemunha o

Delegado, que irá prestar o depoimento indireto, ou seja, confirmar em juízo

que aquela pessoa realmente disse tudo aquilo em sede policial. Com base

nisso, tem-se a condenação ou, no Júri, a pronuncia do réu. Neste caso, o

que de fato pesou para a condenação ou a pronúncia foi o depoimento em

sede policial, que foi simplesmente referido em juízo e, por esse motivo, já

seria suficiente. A fronteira fica muito tênue e a chance desse problema ser

controlado pelo STF e STJ é zero, a não ser que o Ministro relator queira

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enfrentar isso, pois o discurso para não conhecer já está pronto –

impossibilidade de reexame fático em sede especial e extraordinária.

Ao passo que se não fosse possível explorar nem mesmo como argumento

de reforço, esse controle já seria possível, bastando constatar, ou seja, não

poderia ter em uma sentença qualquer alusão ao inquérito, com as ressalvas

contidas no art. 155, CPP. Isso aumenta de importância, pois o art. 155,

caput, CPP dispõe que não se pode ter o inquérito subsidiando uma

condenação, mas esta regra também alcança a pronúncia, tendo em vista que

se o inquérito bastasse na pronúncia, não precisaria ter no Júri um

procedimento bifásico, porque o recebimento da denúncia equivaleria à

pronúncia, indo logo para o plenário. Logo, se há uma primeira fase, é com a

expectativa de que o que se apurou no inquérito seja minimamente ratificado

em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa.

O Conselho de Sentença não fundamenta seus veredictos, sendo norteado

pelo sistema da íntima convicção. Imagine-se que no plenário do Júri o

promotor sustenta a acusação toda em cima do inquérito, fazendo uma ou

outra alusão a alguma peça do processo. Assim, tem-se um veredicto

condenatório. Não é possível atestar que os jurados condenaram com base

no inquérito, mas se a sustentação se pautou, em grande parte, no inquérito,

existe essa chance. Nesse caso, a posição doutrinária aplicada será aquela

segundo a qual entende que pronunciado o réu, o inquérito tem que ser

desentranhado, para não dar margem para que o MP o explore em plenário,

não dando margem a um veredicto condenatório pautado somente no

inquérito.

“A fim de não dar margem ao veredicto condenatório lastreado no

inquérito, parte da doutrina pondera que, uma vez pronunciado o réu, o

inquérito deve ser desentranhado dos autos, à exceção das provas

cautelares antecipadas e irrepetíveis, as únicas aludidas no art. 473, § 3º,

CPP, a revelar silêncio eloquente do legislador”. Posição importante para

provas para a Defensoria Pública.

Art. 473. Prestado o compromisso pelos jurados, será iniciada a instrução plenária quando o juiz presidente, o Ministério Público, o assistente, o

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querelante e o defensor do acusado tomarão, sucessiva e diretamente, as declarações do ofendido, se possível, e inquirirão as testemunhas arroladas pela acusação.

§ 3o As partes e os jurados poderão requerer acareações, reconhecimento

de pessoas e coisas e esclarecimento dos peritos, bem como a leitura de peças que se refiram, exclusivamente, às provas colhidas por carta precatória e às provas cautelares, antecipadas ou não repetíveis.

As correntes destinadas à Defensoria Pública também devem ser exploradas

na prova de Delegado Civil do Rio de Janeiro, pelo fato de o examinador ser o

doutrinador André Nicolitt.

“As restrições ao contraditório e à ampla defesa no Júri são as listadas

no art. 478, CPP, sem proibição de alusão ao inquérito. Ademais, o tema

foi debatido durante o processo legislativo referente à lei 11.689/08, e tal

proposta foi descartada”.

Art. 478. Durante os debates as partes não poderão, sob pena de nulidade, fazer referências: I – à decisão de pronúncia, às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado; II – ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento, em seu prejuízo.

Não existe a possibilidade de o inquérito servir para absolver, pois se está

cogitando o inquérito para tentar uma absolvição, é porque tudo que se

apurou em juízo só referendou a denúncia. Deste modo, haverá uma

sentença condenatória.

Exceções ao desvalor probatório do inquérito são as provas cautelares

antecipadas e irrepetíveis. Aqui há uma redundância - o art. 155, caput, fala

em provas cautelares e provas antecipadas, sendo uma redundância pelo fato

de o legislador ter contemplado o gênero de provas cautelares, já incluindo a

espécie (produção antecipada de provas).

Porque as provas cautelares e as antecipadas já teriam valor mesmo que

produzidas no inquérito? Pois são provas cautelares, exigindo um

pronunciamento jurisdicional. São provas produzidas sob o crivo do juiz

natural (art. 5º, LIII, CR/88), do contraditório e da ampla defesa, ainda que,

eventualmente, sejam estes diferidos (art. 5º, LV, CR/88). Como já existe o

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trio formado – juiz natural, contraditório e ampla defesa – já haverá prova,

deixando de ser mero indício.

Obs.: Sempre que o trio juiz natural, contraditório e ampla defesa estiver

presente haverá prova, deixando de ser mero indício.

A produção antecipada de prova existe para evitar a perda de uma prova.

Provas irrepetíveis devem ser interpretadas como provas periciais.

Ex.1: Laudo pericial onde a droga foi totalmente consumida no exame. Não

será possível repetir o exame. O que torna a prova não é essa irrepetibilidade,

mas o fato de ser um laudo pericial.

Ex.2: Sujeito presta depoimento em sede policial, sai da Delegacia e, ao

atravessar a rua, é atropelado e morre na hora. Não será possível repetir esse

depoimento. Essa irrepetibilidade não vai tornar esse depoimento uma prova,

sendo mero indício, pois para ser uma prova deve haver o trio já mencionado

– juiz natural, contraditório e ampla defesa. Neste caso não há nenhum dos

três.

A questão não é a irrepetibilidade, mas o fato de ser prova pericial, pois os

peritos estão submetidos à disciplina judiciária (art. 275, CPP). Ou seja,

laudos periciais são provas, até porque partem por alguém que tem o mesmo

compromisso com a imparcialidade que o juiz possui (arts. 276 e 280, CPP).

No art. 280, CPP, onde se lê suspeição deve-se incluir o impedimento.

Art. 276. As partes não intervirão na nomeação do perito.

Art. 280. É extensivo aos peritos, no que Ihes for aplicável, o disposto sobre suspeição dos juízes.

Importante frisar que se deve atentar para as terminologias. O inquérito é

inquisitório, logo, fala-se em indiciado, investigado ou imputado (gênero –

serve para o inquérito e para o processo). Estando no processo, fala-se em

réu, acusado, denunciado e imputado.

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Ademais, no processo fala-se em prova (juiz natural, contraditório e ampla

defesa). No inquérito fala-se em indício, o que não se confunde com prova

indiciária do art. 239, CPP.

Art. 239. Considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias.

“O art. 239 do CPP cuida da prova indiciária, que sozinha não subsidia a

condenação, mas em conjunto com outras, formando um todo

harmônico e coerente, sim, pautadas em método dedutivo”.

Ex.: Uma testemunha afirma que viu João matar Pedro. É uma prova direta,

pois não exige nada mais que constatação. De outro modo, uma testemunha

fala que não viu João matar Pedro, mas sabe que há uma semana João

ameaçou de morte Pedro, achando que Pedro seria amante da sua esposa,

dizendo que faria de Pedro “picadinho”. Uma semana depois Pedro aparece

morto, esquartejado. Essa testemunha narrou uma ameaça, porém através

dela chegou-se ao homicídio, por dedução.

Essas provas indiciárias podem subsidiar uma condenação? Uma só não,

porém, em havendo várias provas indiciárias reunidas, formando um todo

harmônico e coerente, poderá haver uma condenação.

Por fim, salienta-se que testemunha só existe em juízo. Testemunha é aquela

ouvida em juízo e compromissada com a verdade. No inquérito não há

testemunha, mas informante. Isso posto, surgem duas perguntas:

1) Pode ter falso testemunho no inquérito? Sim, pois há cinco sujeitos ativos e

desses cinco, quatro deles têm compromisso permanente com a verdade,

quer esteja em sede policial, sede judicial ou em sede de procedimento

administrativo disciplinar ou processo arbitral, sendo o perito, o contador, o

tradutor e o intérprete, nos exatos termos do art. 342, CP.

Art. 342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

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2) O quinto sujeito ativo é a testemunha. Neste caso, engloba-se o

informante?

“A maioria da doutrina, em apreço ao princípio da tipicidade, não admite

o informante como sujeito ativo do crime de falso testemunho, mas,

segundo o STF (precedentes), se o art. 342, CP, alude a procedimentos

não jurisdicionais é porque, ontologicamente, testemunha foi

empregada como sinônimo de depoente, englobando o informante”.

Na medida em que o art. 342, CP, alude a processo judicial, mas também a

processo arbitral, inquérito policial e processo administrativo disciplinar, ou

seja, processos que não são judiciais, testemunhas não podem ser

interpretadas de maneira rigorosa, como aquela ouvida em juízo e

compromissada com a verdade. Testemunha aqui teria sido utilizada de forma

vulgar, como sinônimo de declarante. Sob essa ótica englobaria o informante.

Todavia, nossa doutrina parte da premissa que a testemunha foi utilizada no

seu sentido técnico-processual, inclusive em respeito ao princípio da

tipicidade e legalidade penal estrita – normas penais incriminadoras devem

ser sempre interpretadas restritivamente, seus vocábulos não podem ter outra

interpretação senão esta. Portanto, excluem-se os informantes.

Obs.: Quando o Professor Marcos Paulo se utilizar da expressão

“precedentes”, trata-se de julgados antigos do STF, este não voltou a analisar

o tema.