crônica welligton pereira

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 Crônica: arte do útil ou do fútil? (Ensaio sobre a crônica no jornalismo impresso) Wellington Pereira – Editora Idia – !o"o Pessoa# $%%& 'a pgina a * o autor fa+ um contraponto, bem interessante, -ue n"o se alia aos argumentos literrios e nem aos jornal.sticos -ue en-uadram a crônica como g/nero opinati0o1  p1 2o instante em -ue a crônica passa a 3abitar os c4nones da literatura, surgem alg uma s def ini 56es red uto ras, col oca ndo#a numa pos i5"o de conforto dia nte dos 7g/neros maiores8 da literatura1 Estas leituras simplificadoras podem at ajudar os leitores menos curiosos a aceitar a crônica como sendo um g/nero transit9rio -ue  precisa se ap oiar nas di0ersas formas da linguage m para assum ir caracter.stica pr9pria1 crônica n"o se submete ao -ue os estudiosos da literatura costumam fa+er, redu+indo a crônica ; cons e- u/ ncia dos outros g/ ne ro s como se ne la encontra#s e o re st o, indefinido, como se sua sina seja r ecol3er tra5os de outros g/neros1  p1 < c9digo literrio deu ; crônica amplos significados, libertando#a de uma 0is"o  positi0ista do mundo1 =as e>iste um certo preconceito por parte dos nossos te9ricos da literatura, -uando n"o consideram ter a crônica a menor consist/ncia esttica1  p1 < conceito de crônica -ue encontramos na maioria dos manuais de teoria da literatura , costumeiramente, regido por uma preocupa5"o em enfati+ar o estilo do autor e emprestar#l3e uma 0aga no5"o de 7-ualidade literria8, como o fa+ fr4nio Coutin3o, anteriormente citado1 @embra -ue Candido e =oiss se referem a Aubem Braga e os romancistas, desde len ca r e =ac3ado at os mode rn os, pi n5 ando a -u es t"o do estilo do auto r e des0alori+ando a crônica en-uanto g/nero, tem um trec3o dos dois (= e C) -ue tradu+ isso, procurar1  p1 & crônica no jornal impresso assume 0rias formas lingu.sticas: pode estar no  plano da denota5"o, reelaborando not.cias pode ocupar n.0eis de conota5"o, se apro>imando da fic5"o1 Portanto, o -ue define a crônica no jornal a sua capacidade de conceber 0ria s e>pr ess6 es est ticas, como a lingu agem cinem atogr fica, poti ca, radiofônica, sem ser redu+ida a mero e>erc.cio de literariedade1  p1 & Esta preocupa5"o em comparar a crônica a alguma manifesta5"o literria torna o e>erc.cio do cronista dependente de alguns preceitos literrios assim o cronista perde suas liberdades estticas1

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Crônica Welligton Pereira

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Crnica: arte do til ou do ftil? (Ensaio sobre a crnica no jornalismo impresso)Wellington Pereira Editora Idia Joo Pessoa- 1994

Da pgina 22 a 28 o autor faz um contraponto, bem interessante, que no se alia aos argumentos literrios e nem aos jornalsticos que enquadram a crnica como gnero opinativo.

p. 22 No instante em que a crnica passa a habitar os cnones da literatura, surgem algumas definies redutoras, colocando-a numa posio de conforto diante dos gneros maiores da literatura. Estas leituras simplificadoras podem at ajudar os leitores menos curiosos a aceitar a crnica como sendo um gnero transitrio que precisa se apoiar nas diversas formas da linguagem para assumir caracterstica prpria.

A crnica no se submete ao que os estudiosos da literatura costumam fazer, reduzindo a crnica consequncia dos outros gneros como se nela encontra-se o resto, indefinido, como se sua sina seja recolher traos de outros gneros.p. 22 O cdigo literrio deu crnica amplos significados, libertando-a de uma viso positivista do mundo. Mas existe um certo preconceito por parte dos nossos tericos da literatura, quando no consideram ter a crnica a menor consistncia esttica.p. 23 O conceito de crnica que encontramos na maioria dos manuais de teoria da literatura , costumeiramente, regido por uma preocupao em enfatizar o estilo do autor e emprestar-lhe uma vaga noo de qualidade literria, como o faz Afrnio Coutinho, anteriormente citado.Lembra que Candido e Moiss se referem a Rubem Braga e os romancistas, desde Alencar e Machado at os modernos, pinando a questo do estilo do autor e desvalorizando a crnica enquanto gnero, tem um trecho dos dois (M e C) que traduz isso, procurar.p. 24 A crnica no jornal impresso assume vrias formas lingusticas: pode estar no plano da denotao, reelaborando notcias; pode ocupar nveis de conotao, se aproximando da fico. Portanto, o que define a crnica no jornal a sua capacidade de conceber vrias expresses estticas, como a linguagem cinematogrfica, potica, radiofnica, sem ser reduzida a mero exerccio de literariedade.p. 24 Esta preocupao em comparar a crnica a alguma manifestao literria torna o exerccio do cronista dependente de alguns preceitos literrios; assim o cronista perde suas liberdades estticas.p. 24 Para garantir uma certa legitimidade ao texto, pede-se ao cronista uma demonstrao de seus dotes poticos ou de suas qualidades de ficcionista. Sendo assim, as caractersticas da crnica sero reconhecidas a partir de sua natureza literria.Os vrios autores que esboam uma tipologia da crnica guardam sempre uma ressalva: a crnica no tem independncia esttica. Portanto, quando a classificam, eles produzem conceitos hbridos, cuja valorao semntica se d a partir da forma discursiva e do gnero literrio que prevalece no texto de determinados cronistas.p. 25 Ao classificar a crnica como simples explorao do eu, alguns estudiosos impem uma viso destorcida ao leitor da produo do cronista. Este procedimento limita o carter de renovao lingustica que a crnica empreende no interior da linguagem jornalstica. Portanto, no devemos aceitar como premissas verdadeiras algumas categorizaes da crnica.

p. 26 O cronista estabelece novos processos de enunciao, ultrapassa os limites impostos pela conotao, procurando transformar o exerccio da crnica num espao textual que absorve, criticamente, vrias linguagens. Neste sentido, a crnica no se define apenas a partir do grau de literariedade nem do referencial jornalstico: se torna a possibilidade de leitura dos nveis lingusticos passveis de uma reconstruo no interior do jornal. Para renovar a estrutura dos enunciados jornalsticos ou literrios, o cronista constri seu texto alm das exigncias denotativas ou conotativas que as conceituaes emprestam crnica no espao jornalstico.

p. 26 A pluralidade dos discursos na crnica no a transforma em um axioma, cuja existncia independe de uma conceituao linear. A crnica no est no eixo sintagmtico nem ocupa o paradigmtico, inscrevendo-se, simplesmente, no plano da denotao ou conotao. Ela uma conjuno de elementos lingusticos e expresses verbais que so legitimados a partir da linguagem coloquial.Na literatura brasileira, geralmente, se confunde com a prtica (p. 27) textual do cronista com a do romancista, do contista ou poeta, sempre colocando a crnica numa medida cuja extenso ser um determinado gnero literrio. Neste caso, no se leva em considerao as contradies que a crnica instaura no espao jornalstico, mas apenas o grau de literariedade predominante no texto de alguns cronistas.

p. 27 Se o cronista consegue ultrapassar os limites impostos pela denotao e pela conotao, estar colocando a crnica alm das exigncias referenciais do texto jornalstico e do grau de literariedade de algumas formas narrativas. Portanto, a crnica no se define pela natureza referencial das matrias jornalsticas nem tampouco se estabelece a partir de modelos literrios.

p. 27 ... a crnica no serve como mtodo para aprofundar a notcia, pois esta se configura como um dos gneros jornalsticos que trazem procedimentos tcnicos que lhes so peculiares no processo da linguagem do jornal impresso. As tcnicas que regem o jornalismo noticioso ou opinativo no se aplicam ao exerccio do cronista.p. 27 Por ser um texto que abriga vrias manifestaes estticas, a crnica vai instaurar rupturas dentro do universo da linguagem jornalstica: quer seja do ponto de vista lingustico, quer seja do ponto de vista temtico. E o cronista reordena as leis que regem o periodismo atualidade, universalidade, periodicidade e difuso ampliando o tempo da narrativa jornalstica.

p. 36 Uma prtica jornalstica indefinida se evidencia na construo do texto jornalstico e no exerccio sistemtico da crnica. Com o advento do Romantismo, a crnica passa a ocupar uma funo intermediria no jornal: transita entre a capacidade de anunciao das notcias e a reelaborao de enunciados que se aproximam das formas da literatura romntica. De um lado, encontramos a crnica com a liberdade esttica, com a facilidade de reescrever gneros, de inverter a cumplicidade leitor versus autor; do outro, um jornalismo rgido, doutrinrio, no qual ainda predomina a opinio. O choque ser lingustico: o jornalismo no tem uma linguagem especfica, e o exerccio da crnica parece afirmar a definio de jornal como um gnero que trata de tudo e todos sem a menor profundidade ou consistncia.

p. 85 Estas etapas tambm demonstram que a crnica no apreende apenas os fatos que estabelecem uma travessia temporal no cotidiano; mas transforma velhos acontecimentos em algo novo. O espao jornalstico ocupado pela crnica vive em constante tenso. Uma tenso que no se mede s pela extenso social dos fatos trabalhados textualmente pelo cronista, mas pela reorganizao da linguagem jornalstica. A isto, somam-se tambm a influncia do processo de industrializao nas artes, e as novas formas de narrar o mundo moderno.

p. 85 ... a crnica busca retirar, de cada fato corriqueiro, formas narrativas que garantem sua independncia lingustica em relao ao texto jornalstico.

3 A crnica no jornalismo brasileiro contemporneo

Wellington Pereira traa uma relao da crnica no sculo XX com o jornalismo imprensa empresa e a adoo de um texto mais prximo da objetividade com o olhar voltado para a notcia como mercadoria.

p. 107 A crnica, no final do sculo passado, se constituiu num elemento transitrio entre o modelo narrativo de um mundo considerado ainda arcaico e as formas narrativas adquiridas no processo de industrializao que passaram a identificar formas de produo, e a perplexidade dos homens diante do projeto de modernizao das grandes cidades. Os cronistas tiveram um papel fundamental nesse perodo de transio. A grande contribuio se deu na tentativa de adequar os escritos jornalsticos realidade dos grandes centros urbanos, destruindo, completamente, o falso lirismo que ainda atravessava boa parte das informaes construdas atravs dos jornais.

p. 109 O papel do cronista no jornalismo brasileiro contemporneo no de um transgressor de normas lingusticas. O cronista moderno se preocupa com a definio do espao que est ocupando e com a relao mantida entre as vrias formas de organizao de mensagem jornalstica, atravs de uma linguagem prpria adquirida pelos jornais impressos.O cronista no jornalismo brasileiro do sculo XX tem uma funo especfica: contribuir para a elaborao de uma linguagem do jornalismo. Ele abandona o simples processo de observao dos fenmenos sociais, atravs do discurso bacharelesco dos nossos jornalistas-literatos, que dominavam as pginas dos hebdomadrios no pas, para conjugar a necessidade de informar, com o talento de retirar efeitos estticos de articulaes semnticas que permitem ao leitor um melhor entendimento do espao social em que habita.A crnica quem melhor reflete a transio da imprensa politico-partidria para o jornal-empresa, principalmente quando se tenta perceber as transformaes em nveis da linguagem e a forma como se organizam os espaos destinados a informar o leitor no jornalismo deste sculo.

p. 110 O cronista talvez seja o primeiro a perceber a relao intrnseca que a linguagem do jornal moderno mantm com o modelo econmico representado pela burguesia. A sua percepo se concretiza quando a crnica se abre, enquanto espao lingustico, veiculao de temas at ento considerados sem o menor valor jornalstico, mas que so reordenados pelos cronistas no mesmo plano dos fatos sociais, como: os cultos religiosos, as danas folclricas e as festas mundanas.

p. 111 Joo do Rio representa bem a tentativa da crnica ampliar significados no espao jornalstico, atravs de um trabalho de depurao da linguagem. O cronista no jornalismo do sculo XX sabe que, para superar os limites da escrita jornalstica, deve empreender novos recursos narrativos. Mas no basta demonstr-los apenas em nvel textual; preciso reconstruir todo o percurso da informao. Desta forma, nasce a contribuio do cronista para a elaborao de uma linguagem jornalstica: surgem as novas formas de captao da informao trabalhadas com sentido esttico que extrapola a prtica dos jornais informativos.O cronista deixa de ser um mero observador para ir buscar os fatos onde eles estiverem. Este procedimento nasce, no jornalismo brasileiro do sculo XX, com a publicao das crnicas de Joo do Rio, cujo ncleo narrativo se desloca do centro das informaes geradas no interior do prprio jornal para as ruas.

p. 112 A contribuio do cronista, na elaborao de uma nova linguagem para os jornais impressos, no se encerra apenas na ampliao do universo da informao, nem tampouco no tratamento estilstico emprestado s informaes jornalsticas. parte isso, o cronista abre espaos para que seja discutido o tratamento especfico dado a algumas reas de informao. Nasce a preocupao da sistematizao dos gneros narrativos, que sero ncleos-narrativos independentes, mas ordenados por procedimentos tcnicos geradores de recursos lingusticos que tm como objetivo principal informar.p.119 A leitura da crnica no espao jornalstico deve ultrapassar as rubricas impostas aos textos atravs das categorias que definem a caracterstica da informao.p. 119 crnica no cabe a funo de avaliar o relato jornalstico, nem sequer estabelecer parmetros para conceituao de um determinado fato social no exerccio da opinio. Nem sempre a crnica estaria dentro de uma perspectiva temporal que d sentido produo de opinies.p. 120 A crnica fere todo o enquadramento da informao proposta pelas categorias do jornalismo, ou seja, prprio do cronista a reescritura permanente do enunciado jornalstico. Portanto, a crnica no obedece temporalidade exigida no universo jornalstico para identificar o referente das informaes.

p.121 Numa relao direta com outros gneros jornalsticos, a crnica aponta diferenas que devem ser levadas em considerao quando verificamos sua insero no jornal impresso. A primeira diferena que se estabelece a independncia mantida pela crnica com relao estrutura dos gneros opinativos.

p. 121 Em sua estrutura, os gneros opinativos, geralmente, correspondem formula de apreenso de fatos, cuja regra bsica sempre uma tentativa de definir o objeto do enunciado. Para cada gnero, h sempre um conjunto de procedimentos que devem ser relacionados com a categoria jornalstica. A crnica passa ao largo dessa cadeia de enunciados predeterminados no espao do jornal. O seu exerccio uma constante reelaborao dos temas que trazem ao leitor uma carga de significados fora da temporalidade dos jornais, sem procurar estabelecer uma definio prvia dos enunciados que veicula.p. 123 As possibilidades de leitura da crnica no devem se esgotar numa anlise das tcnicas do jornalismo impresso, sequer nas comparaes entre jornalismo e literatura. A crnica cria um novo tempo narrativo no interior dos jornais, acrescenta relaes semnticas que enriquecem a pobreza lexical dos peridicos. Portanto, classificar a crnica como gnero jornalstico ou literrio negar a independncia esttica da crnica em relao s unidades narrativas do texto jornalstico.p. 124 A crnica extrapola o universo do jornal. Cria novos significados, para sobreviver rigidez imposta pelo conjunto de tcnicas que procuram transformar o jornal num espelho da histria ou dos fatos sociais que ocupam uma escala de valores diferenciada no processo de seleo das notcias.

p. 126 A crnica, no jornalismo do sculo XX, faz parte de um universo cuja linguagem j se encontra estruturada. Ao cronista, cabe a percepo dessas vrias linguagens que se interligam no (p. 127) texto jornalstico. A crnica, agora, tenta sobreviver numa relao direta com os gneros jornalsticos. Sua funo no ser apenas de negar o tratamento retrico dado informao: ela procura verificar como funcionam as unidades narrativas do jornalismo. Neste sentido, o cronista refaz todo o percurso da mensagem jornalstica, imprimindo-lhe novos significados e dando ao leitor a oportunidade de conviver com outras formas e expresses, como a poesia, o conto, a linguagem cinematogrfica, no universo jornalstico.