corpo, midia
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“corpo e cidade: comunicação como performance; e 1 vídeo.”por Pablo Assumpção
Tanto mente como consciência são signos, no sentido de Peirce, logo objetos não
completos e não auto-contidos. Merrell explica na verdade que a mente e a consciência
tendem a fundir-se, e com o mundo, num processo geral e contínuo. Merrel concebe a
seguinte imagem à semiose (i.e. ao movimento dos signos), que os signos em geral, lutam
por preenchimento através de outros signos, e quando um signo passa ao seu outro, ao
que ele não é ainda, ele já deu início ao processo de criar outro que este outro. A semiose
é essa ação do signo em perpétuo esforço de organização de um “mundo semiótico” –
que é o mundo por linguagem, cognitivo, que permite a sobrevivência do corpo. A
consciência se estrutura como linguagem, também o pensamento, a emoção, coisas que
emergem da performance, do presente-já da mediação do Real pelo corpo. Merrell diz
que, numa semiose bem sucedida, os signos são capazes de modelar (padronizar) algum
aspecto desse domínio “semioticamente real”, de uma performance do mundo num corpo,
para seus respectivos agentes semióticos: para leitores, testemunhas, espectadores.
Penso sobre como entender esse “bem-sucedido” de uma representação.
Intuímos que uma performance do mundo num corpo é algo singular, e que a
singularidade de um corpo implica numa singularidade de consciência, se concordamos
que a consciência é um trabalho do corpo, mas Merrel explica que o trabalho da
consciência (em sua ignição inconsciente, pois algum trabalho do corpo não passa por
uma escolha: a respiração, o sistema imunológico etc.) o trabalho da consciência é gerar
sucessivos pensamentos-signos (que são signos da mente), construindo um mundo de
acordo com sua própria imagem. Merrell usa essas palavras, “de acordo com sua própria
imagem”, de modo que há um si-mesmo, um self, uma singularidade da carne, que está
implicada na semiose. E uma percepção do mundo, uma performance do mundo na carne,
é antes de mais nada uma manifestação fenomenal de nós mesmos, essa representação,
essa semiose, somos nós mesmos. O que compreendo é que há muitas singularidades de
semiose, mas uma só evolução. O “pensar” e seu “objeto-pensamento imediato são a
mesma coisa vista por diferentes ângulos. Essa “mesma coisa” possivelmente pode ser
vista, inclusive, de infinitos ângulos. Ontologicamente falando, o corpo é a prova
cosmológica desse Real que pode ser desmembrado em infinitas possíveis
representações. O corpo é esta organização material da evolução cósmica cujo trabalho é
organizar a si em relação com o mundo, e o corpo faz isso pela semiose – claro que
Peirce diria que em certa medida o corpo em si é resultado de semiose, mas aqui me
refiro ao processo de representação do Real de modo “bem sucedido”, como diz Floyd
Merrel. Parto da idéia que a performance do mundo num corpo é um processo de mímese
interna do ambiente, é a relação do ambiente com o corpo, representada na consciência, e
esta representação é ao mesmo tempo o mundo e o meu corpo. Há empatia, meu corpo
reage ao mundo, busca-o, recebe-o, metaboliza o mundo como informação. A filosofia
estética define empatia como processo estético, a mímese interna, a imaginação
implicada na percepção. Nos indagando sobre um modo bem-sucedido de falar sobre essa
comunicação com o mundo, propomos portanto um experimento estético.
Quando eu ia para a aula, três vezes por semana, cruzava um cemitério para
chegar ao ponto de ônibus. Me popava tempo, e também me dava certo prazer olhar ao
redor, as esculturas, os túmulos. O silêncio do lugar, as cores, a diversidade de pessoas,
me dava prazer cruzar, lembrava da morte, mas era em trânsito. Meu corpo busca o
mundo, e ali meu recebia informações específicas: como representá-las?
O vídeo a seguir é um dos modos de representação deste fluxo de informações.
(Ver vídeo. 5 min.)
Esta é minha contribuição à discussão sobre a performance: o modo de sua
singularidade, e o desafio de sua representação. Pensemos a subjetividade não como algo
restrito à individualidade, mas à comunicação entre corpo e ambiente, um processo de
organização da vida que nos integra. Obrigado.
Pablo Assumpção fez mestrado no departamento de Estudos da Performance da Universidade de Nova York (NYU), foi bolsista da Fundação Vitae (2003), é artista independente e atualmente cursa Mestrado em Comunicação e Semiótica, na PUC-SP, onde investiga o modo de prática como pesquisa ("practice-as-research") usando a semiótica e a teoria da performance.