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CORNUALHA CONHECENDO A PONTINHA DA INGLATERRA Pensando bem, Cornualha é uma palavra feia pra caramba. Vem do córnico Kernow (nem sabia que existia essa língua) que, em latim, significa Cornubia ou Cornuvia. Este é o nome da região que corresponde ao sudoeste da ilha da Grã-Bretanha que tem relações históricas com a região homônima que se localiza na França. Esse condado tem paisagens muito bonitas, mas uma bandeira bem tétrica, para o meu gosto. Além disso, um dos símbolos da região é um diabrete. Estranho, não é? Os córnicos, que foram habitantes há muito tempo desse condado, eram celtas, assim como os primeiros moradores da Bretanha na França por isso o bretão, falado nesta região, no continente, tem enorme similitude com o córnico, falado na Cornualha. Embora seja reconhecida como a língua histórica desse povo, hoje, apenas 2000 pessoas falam este idioma. A mim pareceu incrível e não sei se você leitor vai acreditar, mas com tão pouca gente guardando o legado de sua língua, que é sempre a alma e a expressão de um povo, existe um movimento autonomista da região em relação à Inglaterra. Imagino que seja minoritário, mas existe. Andando por essas bandas, deparei-me com uma bandeira hasteada na frente de uma casa, que demonstra mais sensatez e parece buscar um acordo – é a bandeira da Cornualha, contendo num dos quadrantes, a do Reino Unido. Fonte; https://pt.wikipedia.org/wiki/Cornualha Fonte: https://www.ordemdafenixbrasileira.com/20 17/02/conteudo-ofb-diabretes-da- cornualha.html

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C O R N U A L H A

CONHECENDO A PONTINHA DA INGLATERRA

Pensando bem, Cornualha é uma palavra feia

pra caramba. Vem do córnico Kernow (nem

sabia que existia essa língua) que, em latim,

significa Cornubia ou Cornuvia.

Este é o nome da região que corresponde ao

sudoeste da ilha da Grã-Bretanha que tem

relações históricas com a região homônima que

se localiza na França. Esse condado tem

paisagens muito bonitas, mas uma bandeira bem

tétrica, para o meu gosto. Além disso, um dos

símbolos da região é um diabrete. Estranho, não

é?

Os córnicos, que foram habitantes há muito

tempo desse condado, eram celtas, assim como

os primeiros moradores da Bretanha na França

por isso o bretão, falado nesta região, no

continente, tem enorme similitude com o córnico,

falado na Cornualha. Embora seja reconhecida

como a língua histórica desse povo, hoje, apenas

2000 pessoas falam este idioma.

A mim pareceu incrível e não sei se você leitor vai

acreditar, mas com tão pouca gente guardando

o legado de sua língua, que é sempre a alma e a

expressão de um povo, existe um movimento

autonomista da região em relação à Inglaterra.

Imagino que seja minoritário, mas existe.

Andando por essas bandas, deparei-me com

uma bandeira hasteada na frente de uma casa,

que demonstra mais sensatez e parece buscar

um acordo – é a bandeira da Cornualha,

contendo num dos quadrantes, a do Reino Unido.

Fonte;

https://pt.wikipedia.org/wiki/Cornualha

Fonte:

https://www.ordemdafenixbrasileira.com/20

17/02/conteudo-ofb-diabretes-da-

cornualha.html

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A riqueza da Cornualha sempre veio da

atividade mineira, mas hoje é o turismo o carro

chefe da sua economia.

Afora dois ou três eixos rodoviários mais

importantes, todas as vias que cortam esse

território são muito estreitas. Ficamos nos

perguntando por que? Observando os limites

entre propriedades e entre elas e os caminhos,

bem demarcados por muros de pedra erguidos

há muito tempo, suponho que eles podem ser as

barreiras históricos ao alargamento das vias.

Ampliar as estradas significaria não apenas

desapropriações, mas também derrubar essas

delimitações de pedras centenárias, que são um

patrimônio que conta um pouco da ocupação

do território. É uma hipótese – deve haver

pesquisa tratando do tema, mas não conheço.

Encontrei esse mapa antigo da Cornualha e, por

meio dele, podemos observar elementos de sua

história e ver que algumas das estradas e

lugarejos por onde passamos estão lá há muito

tempo.

Também fiquei sabendo que o primeiro Conde

de Cornualha foi Ricardo I, que viveu entre 1209

e 1272. Vejam aí do lado a moeda que circulava

durante esse período.

Fonte:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Ricardo,_1.%C2%BA_Con

de_da_Cornualha

Fonte:

https://boullan.files.wordpress.com/2011/10/1.jpg?w=

665

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Gostamos de experimentar coisas difefentes. Na França, chambre d’hôte e gîte rural; na

África do Sul e em Portugal, estivemos em guest houses; na Espanha e em Portugal, já

ficamos em hospedagem rurais. Bem, por aqui, resolvemos conhecer, via AirBnB, uma

cottage. A reserva foi feita e, depois do relativamente longo percurso entre York e o

Liskeard, lá estávamos nós circulando por rodovias estreitas, à procuara da propriedade

rural chamada Olde Pensipple.

Roda daqui, roda dali, anda mais um pouco e para, pergunta e desanima de

perguntar e, finalimente, chegamos a Pensipple. Que alívio!

Entramos com o carro pela lateral do imóvel, meu marido bateu na porta da grande

casa. Demora um pouco e sai uma senhora elegante que nos olha friamente e informa:

“Aqui é Pensipple. Vocês devem estar procurando Olde Pensipple (pronunciando com

ênfase cada sílaba do Olde) que fica ali adiante”. O tom da voz dela combinava com

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o carro Mercedes Benz estacionado na frente da casa e denotava intenção de nos

deixar bem claro que Olde Pensipple está longe de chegar aos pés de Pensipple.

No primeiro momento, imaginei que teríamos que andar ainda muito, mas bastou dar

marcha a ré no carro e entrar 20 metros depois num pequeno caminho de terra para

chegar no imóvel que estava topograficamente abaixo de Pensipple e deduzo que, no

passado, compunha cavalariça e construções de apoio à casa maior. Era bem

simpática a casa 4 destinada a nós. As paredes de pedra, sabe-se lá erguidas há quantas

décadas, nos espreitavam à noite. Durante o dia, os campos cultivados agradavam

nossas retinas.

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Fizemos dois percursos para conhecer um pouco a Cornulha. Era muita coisa para ser

vista, se ficássemos observando os detalhes propostos nos roteiros 1 e 2 do Guia de

Estradas da Visual Folha. Tivemos que fazer escolhas.

Primeiramente fomos para oeste em direção à extremidade da Cornualha. A chegada

a Saint Mawes foi difícil, devido ao trânsito intenso demais para as estradas estreitas.

Embora aqui na Inglaterra já tenham terminado as férias escolares de verão, parece que

o país inteiro ainda está viajando. Como a população é, na média, muito idosa, suponho

que o período de férias seja influenciado pelo ano letivo, mas não tanto como em outros

países com estrutura demográfica mais jovem.

O ponto alto de St Mawes é o forte de Henrique VIII, no porto natural Carrick Roads.

Você leitor assistiu a série da Netflix sobre Henrique VIII? Se não assistiu, recomendo, para

saber de suas seis mulheres (entre elas a famosa Ana Bolena) e de sua luta para ter um

herdeiro. Ele reinou entre 1507 e 1549.

Olhando agora até me pareceu que seu forte para defesa do sul da Inglaterra não era

lá grande coisa e tenho dúvidas se esses quatro canhões eram suficientes para eliminar

os inimigos.

Depois do conhecer o forte, fomos até a pequena cidade que foi, no passado, uma vila

de pescadores. O ambiente era extremamente simpático: a sisudez das construções

centenárias em pedra com telhas de ardósia, era quebrada pelas janelas e portas

brancas ou azul claro. Pelas ruas, pouca gente passeava. Em alguns bancos de frente

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ao mar, casais de idade avançada tomavam sol – passavam mais a impressão de

moradores do que de turistas.

A parada seguinte foi em Porthchurno, na porção mais ocidental da Inglaterra. É um

lugar que fica em cima de um penhasco, de onde se pode ver paisagens litorâneas

lindíssimas. Não foi fácil chegar a este pedacinho da ilha, passar por ruas estreitíssimas,

conseguir estacionar em meio a outras dezenas de turistas que queriam fazer o mesmo,

procurar a máquina onde se paga o ticket para o estacionamento (e não a encontrar),

perguntar aqui e ali, para chegar a um caminho estreito, meio ruela, meio escada e,

somente então, ver o mar. É bonito, não tem dúvida, mas não foi fácil dar essa espiada

na linda baía cercada de penhascos.

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A escolha da parada seguinte foi orientada por um único critério – precisávamos

encontrar onde comer, o que não tinha em Porthcurno. Consultamos o guia Visual Folha

e havia uma indicação para Mousehole, a de um pequeno bistrô francês na Fore Street.

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A fome era tanta que, ao invés de seguir em direção à oeste e, depois norte, voltamos

para trás e lá chegamos no endereço indicado, um pouco depois das 15h. Num primeiro

momento, a jovem garçonete informou que o serviço de almoço estava terminado, pois

já era a hora do chá. Sabíamos que era o único restaurante naquele lugarejo: nossa

insistência e cara de fome comoveu a moça e lá nos sentamos, com vistas para o mar à

espera dos pratos que estavam bastante bons (isso na Inglaterra não é pouca coisa).

Fazia tempo que eu não comia moules.

O melhor do bistrô? Foi ver que uma porção de senhoras bem vestidas, na média com

75-80 anos, maquiadas e animadas, que chegavam em duplas, trios ou quartetos,

pediam o chá, que todas temperavam com leite, comiam uma enorme fatia de torta

doce, conversam não mais do que por 20 minutos e se iam.

Essa visita das senhoras ao bistrô parecia ser rotineira pelo modo familiar como a

garçonete as tratava, no entanto, era tão rápida que me pergunto o que tinham a fazer

depois desse programa? Talvez olhar os barcos ancorados na pequena baía, lembrar de

suas próprias vidas e imaginar que mundos há do outro lado do horizonte.

St Ives foi nossa última parada nesse dia. Essa cidade viveu da pesca durante alguns

séculos, mas em 1877, quando a ferrovia chegou até lá, trouxe consigo turistas e artistas

atraídos pelo sol e pela luz. Hoje, a cidade é cheia de pequenas galerias de arte e tem

um comércio animado, com lojas de roupas, móveis e objetos de decoração, Os

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pequenos atelliers dos artista são de pinturas ou trabalhos em vidro. Alguns muito bonitos,

outros nem tanto.

À beira mar, misturam-se edificações comerciais, pequenos hotéis e restaurantes.

Subindo as encostas da colina que está ao lado do porto, há séries e séries de casinhas

iguais que me pareceram ser segunda moradia ou estavam tendo uso destinado a

turistas, nesse período do ano, porque de lá desciam famílias (sempre acompanhadas

de cachorros) para uma cerveja ou café de frente para o mar. As gaivotas, por todo

lado, espiavam o movimento geral ou optavam por passear pelas calçadas, à moda dos

humanos, esses estranhos.

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Carminha Beltrão

Setembro de 2018