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IX Encontro nacional de Engenharia de Sedimentos 1 CONTRIBUIÇÃO DA ENGENHARIA DE SEDIMENTOS AO PLANEJAMENTO TERRITORIAL COM ÊNFASE EM REDUÇÃO DE DESASTRES HIDROLÓGICOS Masato Kobiyama 1 ; Gisele Marilha Pereira Reginatto 2 ; Gean Paulo Michel 3 RESUMO --- O aumento da ocorrência de desastres naturais, principalmente hidrológicos, vem alavancando a iniciativa científica internacional em busca de estratégias de mitigação. Desta maneira a aplicação de conceitos hidrológicos para o gerenciamento de bacias hidrográficas se faz necessário. A escassez de áreas planas disponíveis impulsiona a ocupação de áreas de encosta, onde, mesmo livre de inundações, a população fica susceptível à ocorrência de desastres relacionados a sedimentos, tais como movimentos de massa. Faixas de áreas de preservação permanente estão sendo reduzidas pela nova legislação catarinense, agravando o problema de ocupação de áreas impróprias. Além disso, os movimentos de massa podem causar grande aporte de sedimentos aos corpos hídricos, deteriorando a qualidade da água. Os movimentos de massa são de difícil previsão, pois as técnicas necessárias para seu entendimento requerem habilidade com modelos matemáticos e traquejo na área geotécnica. Esses problemas acima mencionados são discutidos com estudos de caso, e para reduzi-los, o presente trabalho propõe a implementação da rede de bacias-escola. Trazendo as informações de geotecnia e pedologia à hidrologia, a engenharia de sedimentos poderá contribuir ao planejamento territorial. ABSTRACT --- The increase of occurrences of natural disasters, mainly hydrological, has been leveraging the international scientific initiative to seek mitigation strategies. Thus the application of hydrologic concepts for the watershed management is necessary. The scarcity of available flat areas boosts the hillside occupation, where even free of flood, the population is susceptible to sediment- related disasters such as mass movements. Strips of permanent preservation areas have been reduced by the new state legislation in Santa Catarina, exacerbating the occupation’s problem of improper areas. Moreover, the mass movements can cause large amount of sediment to water bodies, deteriorating water quality. It is quite difficult to predict the mass movements’ occurrence, because the techniques necessary for its understanding require skills in mathematical models and the geotechnical engineering. These problems mentioned above are discussed with case studies. To reduce them, the present paper proposes the implementation of the school catchments network. Bringing information of soil mechanics and pedology to the hydrology, the sediment engineering can contribute to the land planning. Palavras-chave: Desastres hidrológicos, bacia-escola, sedimentos. 1 Bolsista do CNPq, Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental, Universidade Federal de Santa Catarina, Caixa Postal 476, Florianópolis- SC, CEP 88040-900; [email protected] 2 Bolsista do REUNI, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, Universidade Federal de Santa Catarina, Caixa Postal 476, Florianópolis-SC, CEP 88040-900; [email protected] 3 Bolsista do CNPq, Curso de Graduação em Engenharia Sanitária e Ambiental, Universidade Federal de Santa Catarina, Caixa Postal 476, Florianópolis-SC, CEP 88040-900; [email protected]

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Page 1: CONTRIBUIÇÃO DA ENGENHARIA DE SEDIMENTOS AO … · IX Encontro nacional de Engenharia de Sedimentos 2 1. INTRODUÇÃO Os prejuízos econômicos na sociedade vêm sempre associados

IX Encontro nacional de Engenharia de Sedimentos 1

CONTRIBUIÇÃO DA ENGENHARIA DE SEDIMENTOS AO PLANEJAMENTO TERRITORIAL COM ÊNFASE EM REDUÇÃO DE

DESASTRES HIDROLÓGICOS

Masato Kobiyama1; Gisele Marilha Pereira Reginatto2; Gean Paulo Michel3

RESUMO --- O aumento da ocorrência de desastres naturais, principalmente hidrológicos, vem alavancando a iniciativa científica internacional em busca de estratégias de mitigação. Desta maneira a aplicação de conceitos hidrológicos para o gerenciamento de bacias hidrográficas se faz necessário. A escassez de áreas planas disponíveis impulsiona a ocupação de áreas de encosta, onde, mesmo livre de inundações, a população fica susceptível à ocorrência de desastres relacionados a sedimentos, tais como movimentos de massa. Faixas de áreas de preservação permanente estão sendo reduzidas pela nova legislação catarinense, agravando o problema de ocupação de áreas impróprias. Além disso, os movimentos de massa podem causar grande aporte de sedimentos aos corpos hídricos, deteriorando a qualidade da água. Os movimentos de massa são de difícil previsão, pois as técnicas necessárias para seu entendimento requerem habilidade com modelos matemáticos e traquejo na área geotécnica. Esses problemas acima mencionados são discutidos com estudos de caso, e para reduzi-los, o presente trabalho propõe a implementação da rede de bacias-escola. Trazendo as informações de geotecnia e pedologia à hidrologia, a engenharia de sedimentos poderá contribuir ao planejamento territorial.

ABSTRACT --- The increase of occurrences of natural disasters, mainly hydrological, has been leveraging the international scientific initiative to seek mitigation strategies. Thus the application of hydrologic concepts for the watershed management is necessary. The scarcity of available flat areas boosts the hillside occupation, where even free of flood, the population is susceptible to sediment-related disasters such as mass movements. Strips of permanent preservation areas have been reduced by the new state legislation in Santa Catarina, exacerbating the occupation’s problem of improper areas. Moreover, the mass movements can cause large amount of sediment to water bodies, deteriorating water quality. It is quite difficult to predict the mass movements’ occurrence, because the techniques necessary for its understanding require skills in mathematical models and the geotechnical engineering. These problems mentioned above are discussed with case studies. To reduce them, the present paper proposes the implementation of the school catchments network. Bringing information of soil mechanics and pedology to the hydrology, the sediment engineering can contribute to the land planning.

Palavras-chave: Desastres hidrológicos, bacia-escola, sedimentos.

1 Bolsista do CNPq, Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental, Universidade Federal de Santa Catarina, Caixa Postal 476, Florianópolis-SC, CEP 88040-900; [email protected] 2 Bolsista do REUNI, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, Universidade Federal de Santa Catarina, Caixa Postal 476, Florianópolis-SC, CEP 88040-900; [email protected] 3 Bolsista do CNPq, Curso de Graduação em Engenharia Sanitária e Ambiental, Universidade Federal de Santa Catarina, Caixa Postal 476, Florianópolis-SC, CEP 88040-900; [email protected]

Page 2: CONTRIBUIÇÃO DA ENGENHARIA DE SEDIMENTOS AO … · IX Encontro nacional de Engenharia de Sedimentos 2 1. INTRODUÇÃO Os prejuízos econômicos na sociedade vêm sempre associados

IX Encontro nacional de Engenharia de Sedimentos 2

1. INTRODUÇÃO

Os prejuízos econômicos na sociedade vêm sempre associados ao desastre natural que é,

segundo UNDP (2004), definido como um sério distúrbio desencadeado por um perigo natural que

causa perdas materiais, humanas, econômicas e ambientais excedentes à capacidade da comunidade

afetada de enfrentar o perigo. O aumento dramático de perdas e casualidades devido aos desastres

naturais após a década de 1950 (Figura 1) desencadeou a maior iniciativa científica internacional

em busca de possíveis estratégias de mitigação. Hoje, existe a Intenational Strategy for Disaster

Reduction – UNISDR na ONU

Figura 1 – Número de desastres naturais e seus prejuízos no mundo. (Fonte: Alcántara-Ayara,

2002). O Emergency Disaster Data Base – EM-DAT do Centre for Research on the Epidemiology of

Disasters – CRED, órgão parceiro da Organização Mundial da Saúde (World Health Organization

– WHO), é responsável pela análise dos dados mundiais das ocorrências dos desastres naturais. Em

2008, o EM-DAT reclassificou os tipos de desastres em dois grandes grupos: naturais e

tecnológicos (Scheuren et al., 2008). Os naturais foram divididos em seis sub-grupos: biológicos,

geofísicos, climatológicos, hidrológicos, meteorológicos e extraterrestres (meteoritos), e estes por

sua vez em doze tipos. Essa nova classificação resultou de uma iniciativa entre o CRED e Munich

Reinsurance Company (MunichRe), que decidiram implantar uma classificação em comum para os

seus respectivos bancos de dados. A principal mudança foi a separação dos movimentos de massa

em dois tipos: secos e molhados. O primeiro é associado apenas a eventos geofísicos (terremotos) e

o segundo a condicionantes hidrológicos e meteorológicos. De qualquer maneira, tais movimentos

de massa são chamados de escorregamentos. A UNISDR também adotou a nova classificação, visto

que o EM-DAT é o principal banco de dados utilizado pela ONU, como observado em UNDP

(2004). Em 2009 houve mais uma atualização da classificação pelo CRED, na qual não se encontra

o desastre extraterrestre (Below et al., 2009) (Tabela 1).

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Tabela 1 – Classificação dos desastres naturais.

Classificação antiga (até 2007)

Classificação atual Principais tipos

Geológico Geofísico Terremotos, vulcões, movimentos de massa (secos)

Hidrometeorológico Meteorológico Tempestades Hidrológico Inundações, movimentos de massa (úmidos)

Climatológico Temperaturas extremas, secas, incêndios Biológico Biológico Epidemias, pragas e infestações de insetos

A Figura 2 mostra a distribuição anual de 1950 a 2008 das cinco principais categorias de

desastres naturais. Nota-se que, apesar de todos os itens apresentarem um aumento na sua

freqüência ao longo do tempo, os desastres hidrológicos seguidos dos meteorológicos, tais como as

inundações, escorregamentos e as tempestades severas são os que tiveram um maior aumento.

Figura 2 – Ocorrências de desastres naturais no mundo no período entre 1950-2008.

Os três princípios hidrológicos dos recursos hídricos são: (i) ciclo hidrológico que ocorre

naturalmente; (ii) variabilidade espacial; e (iii) variabilidade temporal. Esses princípios regem a

disponibilidade da água em cada região (Kobiyama et al., 2008). Em outras palavras, devido ao

ciclo hidrológico natural, excessos e escassez de água ocorrem naturalmente em qualquer lugar no

mundo e a qualquer momento. Tais ocorrências de excessos e escassezes causam naturalmente os

desastres.

Para minimizar os prejuízos causados pelos desastres naturais, Lamontagne (2002) destacou a

importância da popularização da ciência. Como os desastres naturais no Brasil ocorrem

principalmente devido à ação da água, acredita-se que a hidrologia possui uma grande contribuição

nesse assunto. Segundo UNESCO (2007), a hidrologia é uma das principais ciências envolvidas no

estudo de desastres naturais. Além de demonstrar os mecanismos desencadeadores desses desastres,

a hidrologia traz também a percepção dos fenômenos hidrológicos vivenciados diariamente, e

evidencia a importância da água e do convívio integrado com a natureza.

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No contexto de gerenciamento de desastres naturais – GDN, é essencial que cada pessoa seja

responsável pela sua própria vida. Entretanto, como o poder de cada indivíduo é pequeno e

limitado, é necessário uni-los para criar uma força significativa. UNISDR (2007) discutiu o GDN

em três níveis: comunitário, nacional e internacional, concluindo que o mesmo com base

comunitária é essencial. Isto enfatiza a importância das comunidades estarem fortalecidas contra

desastres naturais.

O ideal é que todas as pessoas dentro de uma comunidade tenham conhecimento da aplicação

da hidrologia no cotidiano. O conhecimento de cada indivíduo poderá fortalecer sua auto-confiança

o que conseqüentemente intensificará a sua participação nas atividades comunitárias. A participação

fortalecida de cada um aumentará naturalmente a qualidade e a quantidade das ações das

comunidades, as quais conseguirão fazer o gerenciamento participativo de desastres naturais

(GPDN) (Figura 3).

Professor

A lunos (Crianças)

Conscientização (Hidrologia)

Cidadão

Participação Intensificada

Participação Intensificada

Comunidades

Participação Intensificada

Gerenciamento de

Desastres

Naturais

Gerenciamento

Participativo de

Desastres

Naturais

Redução de Desastres

Figura 3 – Efeito da conscientização no gerenciamento participativo de desastres naturais.

Neste contexto, o objetivo do presente trabalho foi discutir alguns aspectos gerais dos

desastres hidrológicos por meio de apresentação de quatro estudos de caso, e demonstrar o desafio

da engenharia de sedimentos no planejamento territorial.

2. CAUSAS DOS DESASTRES HIDROLÓGICOS – ESTUDO DE CASO Silveira et al. (2009) realizaram o levantamento dos registros históricos de inundações,

demografia, área urbana, e precipitação anual no município de Joinville (Figura 4), maior município

do Estado de Santa Catarina (SC) durante o período de 1851 (fundação do município) até 2008.

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Figura 4 – Locais dos municípios de estudo no estado de Santa Catarina. Os resultados mostram que as ocorrências das inundações em Joinville possuem mais relação

com a urbanização do que com a pluviosidade (Figura 5). Em outras palavras, as ocorrências dos

desastres são associadas mais ao fator humano do que ao ambiental (ou climático). A Figura 5(b)

mostra uma leve tendência na diminuição da precipitação anual no município. Embora as

inundações sejam consideradas geralmente como desastres hidrológicos, em Joinville parece ser de

caráter mais humano do que hidrológico.

Conforme notícias nos jornais brasileiros, desastres hidrológicos (inundações e

escorregamentos) têm causado muitos danos sócio-ambientais no país inteiro nas últimas décadas,

mas especialmente nas regiões sul e sudeste. Além disso, existe uma tendência na qual o elevado

número de pessoas relacionam a quantia e a magnitude dos desastres hidrológicos e/ou outros

desastres naturais com a mudança climática. Hoje em dia, pulando a lógica científica, é comumente

falado que os desastres naturais ocorrem devido à mudança climática ou que a mudança climática e

os desastres naturais são sinônimos. Mas esse assunto deve ser mais estudado. Será que realmente a

mudança climática causa os desastres naturais?

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1951 -1960

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Figura 5 – Relação da freqüência das inundações no município de Joinville no período 1851 – 2008: (a) com Área urbanizada; e (b) com a precipitação anual. (Fonte: Silveira et al., 2009)

O fato é que as inundações e os escorregamentos são fenômenos puramente naturais, nada

mais. Quando tais fenômenos geram danos à sociedade, são chamados desastres. Nesse processo de

transformação de apenas fenômeno natural para desastre natural, sempre existem fatores

antropogênicos. O aumento das ocorrências de desastres deve estar associado com ações humanas:

(i) crescimento populacional; (ii) exclusão social; (iii) expansão urbana; (iv) aumento de áreas

impermeáveis; (v) ocupação de encostas muito inclinadas; (vi) aumento do número de pessoas em

áreas de risco, entre outros. Assim, a magnitude e a freqüência das ocorrências dos desastres

naturais podem ser facilmente elevadas sem mudança climática, mas sim com ações humanas

inadequadas.

Por isso, Silveira et al. (2009) alertaram que os problemas de inundação não resultam da

mudança climática, mas sim dos problemas das ações humanas. Neste caso, pode-se dizer que

existem soluções, uma delas é fazer o gerenciamento de bacias hidrográficas de forma correta e

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adequada. Se os problemas de inundações fossem somente devido à mudança climática, as soluções

seriam muito mais difíceis.

3. EVOLUÇÃO DE DESASTRES HIDROLÓGICOS 3.1. Água para sedimentos Um dos mais relevantes fatores humanos que resultam em desastres hidrológicos é o

uso/ocupação de terras. Normalmente a implantação de uma cidade começa com a ocupação da

planície de inundação. Isto tem sido observado desde as primeiras grandes civilizações que se

desenvolveram às margens dos rios (Tigre e Eufrates na Mesopotâmia, Nilo no Egito, Indus na

Índia, e Amarelo na China) de onde garantiam o abastecimento de água e, conseqüentemente, seu

desenvolvimento social e econômico. Então, é natural que a comunidade inicialmente sofra com

inundações (desastres relacionados à água – DRA) devido ao local de ocupação.

Após a ocupação da maior parte da planície de inundação, a comunidade crescente começa

ocupar as áreas de encostas. Estas áreas possuem maior potencialidade de ocorrência de desastres

relacionados a sedimentos (DRS) em relação às áreas de planície. O momento da ocupação das

encostas condiz com o início dos DRS, e com o tempo, o número das ocorrências deste tipo de

desastre e os prejuízos associados a ele resultarão maiores do que DRA.

A Figura 6 ilustra a evolução dos desastres hidrológicos de DRA para DRS em uma cidade,

devido à mudança de ocupação de terras. Essa evolução vem tornando-se cada vez mais comum nos

municípios de SC.

Assim, esses dois tipos de desastres DRA e DRS podem ser conceitualmente definidos e

analisados. Entretanto, na prática, não é fácil distingui-los. O fato é que existem diversos

mecanismos que podem gerar tanto DRA e DRS.

Os DRA são normalmente chamados de inundações. No Brasil, as inundações são

classificadas em 4 tipos: inundação gradual, inundação brusca, inundação litorânea, e alagamento.

Aqui convencionalmente trata-se dos dois primeiros devido à freqüente ocorrência. Kobiyama &

Goerl (2007) mostraram a extrema complexidade e dificuldade de distinguir esses dois tipos de

inundações. Esses dois tipos ocorrem de forma transitória. A diferença entre inundações graduais e

bruscas pode ser em relação à velocidade.

Os DRS podem chamar-se de movimentos de massa que consistem em diversos tipos, tais

como: escorregamento, fluxo de detritos (debris flow), rastejamento, e queda de bloco. Os primeiros

dois são mais comuns. Similarmente ao caso da inundação, é observado que escorregamento e fluxo

de detritos ocorrem de forma transitória. Também uma das diferenças entre escorregamento e fluxo

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de detrito é a velocidade. Assim sendo, pode-se encontrar dificuldade no momento de identificá-los

e classificá-los.

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Implantação da cidade Presente

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Dominância dos desastres relacionados

a sedimentos

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Tempo

Dominância dosdesastres relacionados

a água

Figura 6 – Evolução de desastres hidrológicos associada à mudança de ocupação da terra.

(Fonte: Kobiyama et al., 2010a) Além disso, os fenômenos mais rápidos, isto é, inundação brusca e fluxo de detritos, também

possuem sua transição que caracteriza o fluxo hiper-concentrado, em termos de concentração de

sedimentos. A Figura 7 conceitualmente mostra a classificação e a relação dos diferentes tipos de

desastres hidrológicos em termos de velocidade e concentração de sedimentos. Embora ocorram de

forma transitória, as ocorrências gerais pela observação macroscópica demonstram a evolução dos

tipos dos desastres hidrológicos, essa ilustrada na Figura 6.

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Velocidade

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Escorregamento

Inundação Gradual

Fluxo de detritos

Fluxo Hiperconcentrado

Inundação Brusca

Figura 7 – Classificação conceitual dos desastres hidrológicos. (Fonte: Kobiyama et al., 2010a) 3.2. Dificuldade na redução de desastres naturais relacionados a sedimentos Existem grandes diferenças no gerenciamento e na recuperação dos locais afetados pelos

DRA e DRS, sendo que os DRS apresentam maior dificuldade de avaliação e superação. Algumas

semelhanças e diferenças significativas entre os dois tipos de desastres são apresentadas na Tabela

2.

Com a realização de levantamentos em campo, Goerl et al. (2009b) relataram que muitos

escorregamentos ocorreram em virtude da ação antrópica sobre a paisagem, considerando-os mais

como desastres tecnológicos ou mistos, do que propriamente naturais. Nesse sentido, fica evidente

que a sociedade necessita de um correto entendimento dos fenômenos naturais a fim de reduzir os

desastres ocasionados pelos mesmos.

Tabela 2 - Semelhanças e diferenças entre desastres relacionados à água (DRA) e sedimentos

(DRS).

DRA DRS

Semelhanças

• Desastres hidrológicos; • Iniciados por chuvas intensas; prejuízo à saúde pública; • Prevenção exige planejamento da ocupação da terra e popularização da hidrologia; • Importância da ciência: monitoramento e modelagem hidrológica.

Diferenças

• Conseqüências: danos materiais (objetos, residências, plantações); desabrigados temporários; perdas humanas são raras. • Avaliação de risco: é visual, individual; assim que o nível da água baixa, cada um sabe que pode voltar para casa. • Superação: pode ser superado poucos dias após ocorrência, assim que o rio se normaliza.

• Conseqüências: danos materiais (residências inteiras, terrenos, plantações); desabrigados temporários e permanentes; muitas perdas humanas. • Avaliação de risco: é difícil, o retorno da população às suas residências depende de avaliação rigorosa por especialistas. • Superação: o solo fica instável por meses; superar o desastre pode demorar meses ou anos.

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De acordo com Pinto (2002) a ruptura dos solos é quase sempre um fenômeno de

cisalhamento. Portanto, é necessário compreender bem a natureza da resistência ao cisalhamento do

solo para poder atuar na prevenção de DRS. Softwares como FLO-2D (O’Brien et al., 1993) e

SHALSTAB (Dietrich & Montgomery, 1998), utilizados para o mapeamento de áreas de perigo a

escorregamento, requerem como parâmetros de entrada propriedades mecânicas do solo. Nesses

modelos, tais propriedades são sensíveis, o que exige que seus valores sejam os mais corretos

possíveis nas simulações.

Para a determinação dos parâmetros de resistência ao cisalhamento do solo, as técnicas mais

utilizadas são o ensaio de cisalhamento direto e o ensaio tri-axial. A execução desses ensaios de

laboratório necessita a coleta de amostras não deformadas de dimensões e qualidades criteriosas.

Maccarini (1999) mencionou que a representatividade dos parâmetros obtidos em laboratório

depende fundamentalmente da qualidade das amostras coletadas em campo.

Hoje na prática, a maioria dos trabalhos técnico-científico opta pela utilização de dados já

existentes relativos à resistência dos solos, ao invés de executar os ensaios. Isso acontece devido à

dificuldade na determinação correta desses parâmetros, que segundo Das (2007) requer experiência

e conhecimento teórico adequado na área de engenharia geotécnica. Além disso, o peso das

amostras e o local de coleta das mesmas, que em trabalhos deste gênero são geralmente muito

íngremes e de difícil acesso, dificultam ainda mais a realização dos ensaios.

Na natureza, os parâmetros relativos à resistência dos solos são bastante heterogêneos. Cada

tipo de solo em cada local pode apresentar diferentes valores. Portanto, é muito importante realizar

amostragens adequadas e corretos ensaios em laboratório para gerar um banco de dados maior e

significativo.

3.3. Mananciais Relatando a ocorrência de um escorregamento na bacia do rio Cubatão do Norte no município

de Joinville (Figura 4), Kobiyama et al. (2009b) trataram da influência do mesmo na turbidez e nos

sólidos totais no rio. Figura 8a mostra o comportamento normal da turbidez antes da ocorrência do

escorregamento, enquanto Figura 8b o comportamento bastante anormal da mesma durante da

ocorrência do escorregamento.

Deterioração da qualidade dos rios maiores obriga a comunidade procurar a captação de água

nas cabeceiras onde inclinação da encosta encontra-se maior e conseqüentemente maior freqüência

de escorregamento. Além disso, devido ao desenvolvimento regional descentralizado, cada vez mais

as estradas vêm sendo construídas. Essa construção pode gerar ainda mais escorregamentos.

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IX Encontro nacional de Engenharia de Sedimentos 11

Portanto, os possíveis locais de escorregamento devem ser identificados, e modelos

hidrossedimentológicos que consideram escorregamentos devem ser desenvolvidos.

(a)

(b) Figura 8 – Valores de turbidez e vazão no rio Cubatão do Norte: (a) antes da ocorrência do

escorregamento (21 a 28/10 de 2008); e (b) durante da ocorrencia do escorregamento (27/11 a 04/12

de 2008). (Modificado de Kobiyama et al., 2009b)

Nem sempre a ocorrência do escorregamento aumenta a turbidez e sólidos totais no rio. Caso

a área de deposição do escorregamento não alcance o rio, eles não aumentam. Portanto, a

conectividade hidrossedimentológica deve ser investigada.

3.4. APP é APP? Recentemente ocorreram alterações no Código Estadual do Meio Ambiente de SC. Com estas

alterações, a comunidade catarinense passou a discutir qual deveria ser a faixa de APP (área de

preservação permanente) ao longo dos rios. Por esta razão, deve-se enfatizar que “APP é APP!”.

Essa afirmação é baseada em observações feitas em campo após a ocorrência das tragédias no vale

do Itajaí, SC, em 2008. As APP’s apresentam alto risco de serem atingidas por fluxos de detritos

que contêm troncos, além de serem os primeiros locais a serem inundados em épocas de cheia.

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IX Encontro nacional de Engenharia de Sedimentos 12

Como em SC as árvores possuem em média 20 a 30 m de altura, uma faixa do mesmo valor a partir

da margem do rio deve ser considerada Área de Perigo Permanente, podendo também ser

denominada de APP (Figura 9). Para promover a conscientização, diz-se “APP é APP”. Assim,

através da hidrologia, é necessário discutir a relação entre água, meio ambiente e desastres naturais.

(a)

(c)

(b)

Figura 9 – Destruição da APP devido ao fluxo de detritos: (a) antes da ocorrência do fluxo de detritos, (b) transporte longitudinal dos troncos, e (c) transporte transversal dos troncos

(Fonte: Kobiyama et al., 2010a) Recentemente, os fluxos de detritos ocorridos pela chuva intensa no município de Rio dos

Cedros (Figura 4) vêm sendo investigados por Goerl et al. (2009a, 2009b) e Kobiyama et al.

(2010b). Nos locais onde ocorreram tais fluxos, observações e análises em campo comprovam que

APP (Área de Preservação Permanente) é APP (Área de Perigo Permanente). Figura 10 mostra que

o fluxo de detritos retirou as florestais ripárias com faixa de aproximadamente 30 m. A situação

atual requer com urgência zoneamentos de áreas de perigo para então reduzir os prejuízos devido

aos desastres hidrológicos. O aumento da ocupação das APP certamente resultará no aumento

abrupto da ocorrência dos DRS.

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Figura 10 – Ausência da floresta ripária logo após da ocorrência do fluxo de detritos.

4. BACIA-ESCOLA Para o gerenciamento adequando de bacias hidrográficas com o intuito de reduzir os desastres

hidrológicos, uma série de atividades devem ser realizadas, tais como: planejamento territorial com

base no zoneamento de áreas de perigos e riscos; medidas estruturais adequadas; e implementação

de sistema de alerta com base na previsão do tempo. É importante salientar que todos os itens

necessitam de um monitoramento hidrológico. Sem os dados monitorados, é impossível obter o

gerenciamento desejado.

No caso de SC, empresas de reflorestamento normalmente possuem muitas bacias de

cabeceira nas suas propriedades. É de extrema importância a participação dessas empresas nos

projetos de hidrologia, uma vez que estas podem disponibilizar os locais de interesse (bacia de

cabeceira) para serem utilizados como áreas de estudo. É, portanto, muito difícil construir uma

bacia experimental sem a colaboração das empresas de reflorestamento e dos proprietários.

Nesta circunstância, no município de Rio Negrinho (Figura 4), a cooperação entre a

universidade e uma empresa de reflorestamento local transformou as bacias de cabeceiras em bacias

experimentais. Além disso, a realização de educação ambiental com a participação das comunidades

locais e da prefeitura possibilitou convertê-las em bacias-escola (Figura 11). Assim, através do

projeto de hidrologia florestal realizado nesse município, Kobiyama et al. (2007) definiram bacia-

escola como uma bacia experimental que serve para pesquisas científicas e atividades de educação

ambiental.

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Figura 11 – Transformação das bacias de cabeceira em bacias-escola. (Fonte: Kobiyama et al., 2008).

A bacia-escola desperta na comunidade o interesse pela hidrologia, e conseqüentemente

aumenta o conhecimento nessa área de estudo, fazendo com que aumente a participação da

população no gerenciamento dos recursos hídricos. A Figura 12 mostra a relação entre a bacia-

escola e o gerenciamento participativo. Este tipo de cooperação entre universidades e empresas de

reflorestamento, atuando em conjunto com as comunidades locais, é indispensável para assegurar

um gerenciamento integrado dos recursos hídricos. É importante ressaltar que as bacias-escola são

importantes não só para as comunidades locais, mas também para os hidrólogos. Elas são campos

(objetos) fundamentais para a realização de pesquisas hidrológicas. Segundo Uhlenbrook (2006),

nessas pesquisas, interesses puramente científicos coincidem com práticas do gerenciamento dos

recursos hídricos para apoiar o desenvolvimento sustentável. Kobiyama et al. (2007) relataram que

a conscientização da comunidade sobre a hidrologia pode ser intensificada com uso de bacias-

escola.

Figura 12 – Relação entre bacia-escola e o gerenciamento participativo. (Fonte: Kobiyama et al., 2008)

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Segundo Kobiyama et al. (2006), a prevenção de desastres naturais é dividida em dois

aspectos: (1) compreensão dos mecanismos dos fenômenos naturais que geram os desastres; e (2)

aumento do potencial de resistência da sociedade contra esses fenômenos. O primeiro item é a

execução da ciência, e o segundo necessita do apoio da ciência. Sendo assim, é bem claro que a

implementação da rede de bacias-escola certamente contribui no gerenciamento de desastres

naturais (Kobiyama et al., 2009a).

5. ITENS RELEVANTES PARA ESTUDOS AVANÇADOS

Para melhor entendimento dos processos hidrológicos ocorridos em uma bacia e correto

gerenciamento de seus recursos, se faz necessária a realização de medições em campo de diversos

parâmetros. As medições geram as variáveis utilizadas em modelos que simulam o comportamento

da bacia para inúmeros eventos, sejam eles comuns ou extremos.

A medição de sedimentos em suspensão no corpo hídrico é de extrema importância. SILVA et

al. (2003) relatam que o sedimento é, possivelmente, o mais significativo de todos os poluentes,

devido a sua concentração na água, seus impactos no uso desta e seus efeitos no transporte de outros

poluentes. As atividades agrícolas e florestais em áreas com grande declividade e o desmatamento

de encostas e margens de rios, propiciam a redução da infiltração de água no solo e, por conseguinte

o aumento do escoamento superficial. Esses fatores acabam favorecendo os processos erosivos do

solo que desestabilizam encostas e conferem maior carga sedimentar ao fluxo de água no canal.

Portanto a análise de sedimentos pode evidenciar o melhor uso de solo e cobertura vegetal para a

bacia, a fim de assegurar a qualidade da água e prevenir movimentos de massa.

A granulometria do solo, outro parâmetro a ser medido, é a base para sua classificação.

Através dela, outros parâmetros podem ser estimados por meio de funções de pedo-transferência,

facilitando a aplicação de modelos de estabilidade e erosão. No corpo hídrico, a granulometria do

sedimento depositado ao longo do canal pode indicar o potencial de transporte do rio. A medida que

o rio se afasta de áreas declivosas adentrando em planícies, diminui a velocidade,

conseqüentemente sedimentos maiores vão se depositando. Portanto a estimativa deste potencial é

importante, entre outras finalidades, para avaliação da área de abrangência de um fluxo de detritos

que atinge o canal.

A espessura da camada de solo tem relação direta com a capacidade de armazenagem de

água na bacia, transmissividade e produção de sedimentos. Desta maneira, é necessário que se

conheça este parâmetro e que seja estimado na modelagem. A profundidade dos solos interfere no

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grau de estabilidade das encostas, sendo que grandes profundidades de solo acarretam em elevados

pesos.

Assim, a hidrologia necessita de informações da área de geotecnia e pedologia. Quando a

inserção dessas informações à hidrologia for obtida, a engenharia de sedimentos certamente

contribuirá ainda mais ao planejamento territorial, reduzindo desastres hidrológicos. Isto deve ser o

desafio principal da engenharia de sedimentos.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS No mundo a freqüência e a intensidade dos desastres hidrológicos vêm aumentando

consideravelmente. O presente trabalho ilustra como reduzir tais desastres através da aplicação da

hidrologia, embasado em vários estudos de caso no estado de Santa Catarina, Brasil.

O estudo de caso de Joinville mostra que as inundações resultam muito mais da ocupação

territorial mal planejada do que da pluviosidade. Isto implica que o principal fator que causa a

inundação não é a mudança climática, mas sim o fator humano. Para corrigir as ações antrópicas no

momento da implantação e ocupação de um local, é essencial que os resultados de estudos

hidrológicos sejam levados em consideração. Para tanto, a criação da rede de bacias-escola pode ser

fundamental. A importância das redes de bacias-escola foi justificada e comprovada através do

estudo de caso no município de Rio Negrinho.

Os desastres hidrológicos evoluem juntamente com a evolução da cidade. No início do

crescimento de uma cidade os desastres relacionados à água (inundação) são predominantes, porém

ao longo do tempo torna-se evidente a predominância de desastres relacionados a sedimentos. Essa

evolução pode ser observada em Rio dos Cedros, onde a redução dos desastres relacionados aos

sedimentos é um desafio para a comunidade e para os hidrólogos.

“Se não gerenciar a água, não será possível governar o país” é um dos antigos provérbios da

China. Este provérbio vem se tornando cada vez mais verdadeiro em todos os locais no mundo.

Através do mesmo pode-se dizer: “Se a sociedade entender a hidrologia e aplicar seus

conhecimentos em suas atividades, reduzirá os desastres hidrológicos, principais desastres naturais,

e conseqüentemente melhorará a qualidade de vida.”.

AGRADECIMENTOS Os autores agradecem aos membros do Laboratório de Hidrologia – LabHidro, do

Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da Universidade Federal de Santa Catarina

pelas discussões sobre desastres naturais.

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