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Anais do XX Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do V Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 22 e 23 de setembro de 2015 CONTRAPONTO ENTRE A VISÃO DO PROFESSOR E DO ESTUDANTE SOBRE A VIOLÊNCIA NA ESCOLA Bárbara Lopes de Brito Faculdade de Psicologia Centro de Ciências da Vida-CCV [email protected] Raquel Souza Lobo Guzzo Avaliação e Intervenção psicossocial: prevenção, comu- nidade e libertação Centro de Ciências da Vida-CCV [email protected] Resumo: Este projeto constitui-se como um estudo que apresenta uma análise preliminar do contraponto entre as visões de professores e estudantes acerca da violência no contexto da escola. Para tanto, reali- zou-se a análise do conteúdo registrado em 23 diá- rios de campo de quatro escolas públicas de Ensino Fundamental de um município do interior do estado de São Paulo. Desses diários de campo foram extra- ídas as visões de professores e estudantes em rela- ção a vivência de situações de violência na escola . Os relatos foram categorizados, organizados de acordo com o tipo de violência vivida ou presenciada por eles. Foram mais relatos de violência física entre professores e estudantes sendo que os dois perce- bem a violência da mesma forma. No entanto, os estudantes relatam mais episódios de violência por- que eles identificam a violência presente no cotidiano da escola e da família, enquanto os professores apontam os episódios da sala da aula. A violência psicológica é indicada tanto pelos professores quan- to pelos estudantes, especialmente o “bullying”. Es- ses resultados forneceram subsídios para a compre- ensão da relação entre as concepções de violência constituídas por dois atores centrais na vida escolar – professores e estudantes. Palavras-chave: Violência na escola, Conscientiza- ção, Psicologia Crítica. Área do Conhecimento: Ciências Humanas, Psico- logia, Psicologia Social 1. INTRODUÇÃO Para que possamos aprofundar o tema da vio- lência que se expressa dentro da escola, trataremos de configurar o cenário que está colocado, atualmen- te, na escola pública brasileira, buscando apresentar características do pensamento ideológico que a constitui, assim como de seu papel enquanto institui- ção e espaço comunitário. A escola cumpre um papel importante na consti- tuição das pessoas e na forma como a sociedade se organiza, contudo, este processo pode tomar diferen- tes direções, pois depende das concepções de Ho- mem e Mundo adotadas que, irão orientar a maneira como se vive e como é constituído o cotidiano do espaço educativo. Nesse sentido, a autora aponta para o problema da contaminação ideológica invisí- vel, que os valores do capitalismo sobrepõem dife- rentes aspectos da convivência social. Tais valores permeiam as relações sociais, a cultura, e a própria educação [6]. A sociedade capitalista, que valoriza mais o di- nheiro e o capital, mercantilizou a vida humana, e a escola tem sido reprodutora dessa lógica rejeitando e excluindo crianças em sua pobreza, sua forma de se vestir, seu espaço de morar ou viver, seu jeito de agir, falar ou mesmo sentir, adaptando-as e domesti- cando-as em relação ao mundo, onde não as enxer- gam enquanto sujeitos e, por isso, pouco se faz pe- las possibilidades de transformação coletiva e indivi- dual. A educação como uma prática libertadora, dife- rente daquela que está a serviço da dominação, im- plica a negação do homem isolado, desligado do mundo, assim como também a negação do mundo desligado dos homens [3]. A reflexão que propõe é sobre esses homens em suas relações com o mun- do, relações em que consciência e mundo se dão, simultaneamente. Não há consciência antes e mun- do depois, e vice-versa. Faz-se necessário então que a escola e seus atores percebam que crianças e adolescentes constituem-se dependendo da qualida- de das relações que estabelecem com o mundo. Isso significa considerar o contexto em que vivem as con- dições a que estão expostas, a história de vida de suas famílias para conhecê-las e compreendê-las além da superficialidade. Com base nisso construir novas prática educacionais, que tenham significado na vida dos mesmos. O quadro de aumento da violência no Brasil tem uma relação de retroalimentação mútua com a crise da educação, o que torna ainda mais difícil solucio- ná-la [9]. Os múltiplos determinantes que imperam

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Anais do XX Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178

Anais do V Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420

22 e 23 de setembro de 2015

CONTRAPONTO ENTRE A VISÃO DO PROFESSOR E DO ESTUDANTE SOBRE A VIOLÊNCIA NA ESCOLA

Bárbara Lopes de Brito Faculdade de Psicologia

Centro de Ciências da Vida-CCV [email protected]

Raquel Souza Lobo Guzzo Avaliação e Intervenção psicossocial: prevenção, comu-

nidade e libertação Centro de Ciências da Vida-CCV

[email protected]

Resumo: Este projeto constitui-se como um estudo que apresenta uma análise preliminar do contraponto entre as visões de professores e estudantes acerca da violência no contexto da escola. Para tanto, reali-zou-se a análise do conteúdo registrado em 23 diá-rios de campo de quatro escolas públicas de Ensino Fundamental de um município do interior do estado de São Paulo. Desses diários de campo foram extra-ídas as visões de professores e estudantes em rela-ção a vivência de situações de violência na escola . Os relatos foram categorizados, organizados de acordo com o tipo de violência vivida ou presenciada por eles. Foram mais relatos de violência física entre professores e estudantes sendo que os dois perce-bem a violência da mesma forma. No entanto, os estudantes relatam mais episódios de violência por-que eles identificam a violência presente no cotidiano da escola e da família, enquanto os professores apontam os episódios da sala da aula. A violência psicológica é indicada tanto pelos professores quan-to pelos estudantes, especialmente o “bullying”. Es-ses resultados forneceram subsídios para a compre-ensão da relação entre as concepções de violência constituídas por dois atores centrais na vida escolar – professores e estudantes. Palavras-chave: Violência na escola, Conscientiza-ção, Psicologia Crítica.

Área do Conhecimento: Ciências Humanas, Psico-logia, Psicologia Social

1. INTRODUÇÃO Para que possamos aprofundar o tema da vio-

lência que se expressa dentro da escola, trataremos de configurar o cenário que está colocado, atualmen-te, na escola pública brasileira, buscando apresentar características do pensamento ideológico que a constitui, assim como de seu papel enquanto institui-ção e espaço comunitário.

A escola cumpre um papel importante na consti-tuição das pessoas e na forma como a sociedade se organiza, contudo, este processo pode tomar diferen-

tes direções, pois depende das concepções de Ho-mem e Mundo adotadas que, irão orientar a maneira como se vive e como é constituído o cotidiano do espaço educativo. Nesse sentido, a autora aponta para o problema da contaminação ideológica invisí-vel, que os valores do capitalismo sobrepõem dife-rentes aspectos da convivência social. Tais valores permeiam as relações sociais, a cultura, e a própria educação [6].

A sociedade capitalista, que valoriza mais o di-nheiro e o capital, mercantilizou a vida humana, e a escola tem sido reprodutora dessa lógica rejeitando e excluindo crianças em sua pobreza, sua forma de se vestir, seu espaço de morar ou viver, seu jeito de agir, falar ou mesmo sentir, adaptando-as e domesti-cando-as em relação ao mundo, onde não as enxer-gam enquanto sujeitos e, por isso, pouco se faz pe-las possibilidades de transformação coletiva e indivi-dual.

A educação como uma prática libertadora, dife-rente daquela que está a serviço da dominação, im-plica a negação do homem isolado, desligado do mundo, assim como também a negação do mundo desligado dos homens [3]. A reflexão que propõe é sobre esses homens em suas relações com o mun-do, relações em que consciência e mundo se dão, simultaneamente. Não há consciência antes e mun-do depois, e vice-versa. Faz-se necessário então que a escola e seus atores percebam que crianças e adolescentes constituem-se dependendo da qualida-de das relações que estabelecem com o mundo. Isso significa considerar o contexto em que vivem as con-dições a que estão expostas, a história de vida de suas famílias para conhecê-las e compreendê-las além da superficialidade. Com base nisso construir novas prática educacionais, que tenham significado na vida dos mesmos.

O quadro de aumento da violência no Brasil tem uma relação de retroalimentação mútua com a crise da educação, o que torna ainda mais difícil solucio-ná-la [9]. Os múltiplos determinantes que imperam

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sobre a violência parecem produzir um efeito de cas-cata. Entre os fatores de risco associados, [2] estão: a falta de capital social, a superposição de desvanta-gens; e, entre os fatores de proteção, a presença de capital social, o acesso a direitos – em particular, o direito à saúde, à educação, à cultura e ao lazer. Nesse estudo, as autoras evidenciaram que as regi-ões de São Paulo onde a presença da violência era mais forte, eram as mais atingidas pela falta de acesso a direitos básicos.

Pelo não cumprimento ao direito à educação es-colar por parte do governo brasileiro, a maioria da juventude é excluída da participação política e do processo de produção econômica, social e cultural [10]. Pode-se compreender, a partir desta afirmação, a relação da violência com a crise da educação que vivemos. Sendo assim, a violência estrutural torna-se uma importante categoria a ser descrita no presente trabalho. Definida como aquela que oferece um mar-co à violência do comportamento, aplica-se às estru-turas institucionalizadas e organizadas como a famí-lia, os sistemas econômicos, culturais e políticos. Essa forma de violência conduz à opressão de gru-pos, classes, nações e indivíduos, aos quais são ne-gadas conquistas da sociedade, tornando-os mais vulneráveis que os outros ao sofrimento e à morte [7].

Contudo, a violência escolar não é apenas a me-ra reprodução de efeitos oriundos de outros contex-tos institucionais, como a política, a economia, a fa-mília, a mídia e etc., novas modalidades da violência são produzidas no cotidiano escolar, na (re) apropri-ação desses vetores de força, por parte de seus ato-res e seus procedimentos.

O educador deve ser mais do que educador do educando, mas aquele que, enquanto educa, é edu-cado, em diálogo, afirmando que ninguém educa ninguém, tampouco ninguém educa a si mesmo, os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo. A relação professor-estudante, não só importa efeitos de violência externos, mas os institui nas práticas educativas como representantes hierár-quicos de uma determinada prática social [3]. Sem perspectivas de ações preventivas e de transforma-ção dessa realidade, as intervenções para com os estudantes ficam resumidas ao “encaminhamento”: encaminha-se para o coordenador, para o diretor, para os pais ou responsável, para o psicólogo, para o policial, revelando práticas muito engessadas [1].

Dessa forma a escola têm se tornado um espaço que, ao invés de fomentar o pensamento humano, passa a ser um campo de batalhas, expresso através

dos mecanismos de violência simbólica e institucio-nalizada. Nesse sentido as desigualdades sociais refletem-se na relação professor-estudante e as prá-ticas da escola conseguem anular, desvalorizar, ig-norar a realidade de crianças e adolescentes, cons-truindo um enorme abismo entre o processo educa-cional e a vida cotidiana dessas crianças [6].

A psicologia escolar, em conjunto com uma edu-cação libertadora, agindo para a conscientização, pode constituir um modelo de intervenção para o compromisso com a transformação do espaço edu-cativo e a promoção de processos de libertação – libertação compreendida como um processo de es-forço para tornar homens e mulheres sujeitos de sua própria história, que saiba decidir, escolher, persistir e lutar por condições essencialmente dignas para a sua vida [6].

A atuação do psicólogo necessita romper com o modelo clínico descontextualizado, quando se trata de situações de violência. É preciso agir na medica-ção da relação entre a escola e órgãos que partici-pam da rede de proteção à criança e adolescente. Ainda, é preciso desmistificar rótulos e preconceitos identificando as contradições existentes entre o que está previsto nas políticas de proteção à criança e adolescente e ações cumpridas pelos diferentes segmentos da rede [10].

A desmistificação e desnaturalização da realida-de são processos que , caminham para superação da alienação e a conscientização como prática cen-tral no trabalho do psicólogo em ambientes educati-vos e comunitários. Somente quando os oprimidos descobrem o opressor e se engajam na luta organi-zada por sua libertação, começam a crer em si mesmos, superando sua convivência com o regime opressor [3].

Assim para favorecer a criação de um ambiente psicossocial de crescimento pessoal e social – com congruência, aceitação, empatia e diálogo – são ne-cessárias a organização comunitária e a luta reivindi-catória e política, que criam possibilidades para que o indivíduo possa se colocar de uma maneira mais crítica diante de sua realidade, pois a reorganização da atividade pressupõe uma reorganização diferente do psiquismo. Essa afirmação vale, tanto para os moradores das comunidades, quanto para os psicó-logos [11].

2. OBJETIVOS Identificar o contraste das principais situações de

violências vividas e concepções sobreviolência rela-

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tadas por professores e estudantes de quatro esco-las públicas da periferia de uma grande cidade do interior do estado de São Paulo.

3. MÉTODO

3.1 - Metodologia Esse estudo foi desenvolvido pela leitura dos re-

gistros de diários de campo e condução de uma sín-tese para a consequente elaboração de categorias, segundo a perspectiva da epistemologia construtiva e interpretativa [5].

Nesta orientação metodológica, a elaboração de categorias busca explicitação dos sentidos construí-dos pelos sujeitos acerca de fenômenos específicos, neste caso a violência. Os dados extraídos deste processo são organizados e sistematizados, de mo-do a favorecer sua compreensão.

Ainda buscando a compreensão dos fenômenos em sua complexidade a metodologia qualitativa é de grande valia, pois se propõe a compreender a teia das relações sociais estabelecidas sob a perspectiva do sujeito, para que ocorra uma compreensão a prio-ri [4].

3.2 – Fontes de informação

As fontes de informação deste trabalho foram 23 diários de campo extraídos do banco de dados ge-rais (BDG) produzidos pelo GEP-InPsi1 referentes à duas escolas inseridas no projeto ECOAR (Espaço de Convivência, Ação e Reflexão), durante o período de abril a novembro de 2014.

3.3 - Procedimentos de organização e

análise do corpus da pesquisa Trata-se, portanto, de uma pesquisa documental

onde a principal técnica utilizada foi a análise de diá-rio de campo realizados pelos participantes do ECOAR e disponibilizados no BDG. Os diários de campo contêm observações, percepções e reflexões que expõem a dinâmica do ambiente observado, nesse caso, a escola [8].

Os 132 diários de campo disponibilizados no BDG do grupo de pesquisa foram lidos e avaliados, em relação à presença de relatos, de professores e estudantes, sobre violência vivenciada dentro da es-cola ou fora dela, assim como expressões do concei-to sobre violência. Desses, apenas 23 continham o objeto de estudo dessa pesquisa e constituíram o corpus desse estudo.

Os diários foram lidos na íntegra e alguns tre-chos foram retirados dos diários e agrupados de acordo com a temática da violência indicando a ex-pressão de professores e estudantes. Após essa etapa, foi organizado um conjunto de categorias so-bre o tipo de violência identificada nos relatos, sepa-rando as categorias destes, foram separados os fei-tos por professores e estudantes dentro das catego-rias identificadas.

A partir daí, foram discutidos os contrapontos en-tre as duas manifestações – de estudantes e profes-sores. A apresentação dos relatos dentro das tabelas se fez pelas descrições dos Diários de Campo - DC1, DC2, DC3, e assim por diante – como também pela descrição do relato dos estudantes (RE1, RE2, RE3, etc.) e do relato dos professores (RP1, RP2, RP3, etc.).

3.4 – Procedimentos Éticos da Pesquisa

Considerando de total importância a ética em to-das as pesquisas envolvendo seres humanos, faz-se necessário esclarecer que, de acordo com o artigo 1º, parágrafo IV da resolução proposta pela Comis-são de Ciências Humanas e Sociais para Pesquisas com seres humanos, esta pesquisa é dispensada de avaliação pelo comitê de ética, por se tratar de uma pesquisa documental em banco de dados, nos quais as informações são agregadas, não existindo a pos-sibilidade de identificação individual.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados desse trabalho demonstram as

manifestações de estudantes e professores sobre a violência vivida ou presenciada na escola e fora dela. Esses relatos foram registrados em Diários de Cam-po e analisados de acordo com o tipo de violência, como apresentado na Tabela 1 – Relatos de violên-cia na escola abaixo:

Relatos de violência na escola

Tipo de violência Total por violência %

Violência Física 40 30,40 Violência Psicológica 27 20,52

Negligência 8 6,08 Violência Sexual 1 0,76

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22 e 23 de setembro de 2015

Totalizaram 24 relatos de violência vivenci-ados pelos professores da rede pública de uma ci-dade do interior do Estado de São Paulo. Sendo 10 de violência física, 8 de negligência, 5 de violência psicológica e 1 de violência sexual. Já os estudan-tes totalizaram 52 relatos de violência, sendo que 30 eram de violência física e 22 de violência psicológica.

Podemos identificar a violência física em

relatos de professores e de estudantes. No DC14 extraímos no RE26 o relato de um estudante que apresentou um caso de violência física entre profes-sor-estudante dentro da escola o que resultou na mãe da criança indo à escola para revidar a agres-são sofrida pelo seu filho.

Nos DC6 e DC14, nos relatos dos estudan-tes, podemos ver que a violência física entre eles é aparente e considerada comum

“Quando ele abaixou a calça de S., este partiu para cima, para bater em cima desse. Como defesa, o aluno que estava apanhando pegou um lápis e tentou enfiar no olho de S.” (RE12)

“Começaram a dizer que violência era xingar, bater, bullying, dar voadora. Um dos meninos contou que uma vez levou uma faca na escola porque o Rafael tinha comprado um tênis igual ao seu e ele queria matar ele.” (RE25)

Já no DC18, um professor relata a violência

fora da escola:

“Uma vez o pai bateu tão forte na mãe que descolou a retina dela e que agora ela está grávida, mas fala que não pensa em sair de casa (...)” (RP17).

Podemos identificar a violência psicológica também em relatos de professores e estudantes, como no DC10 que há relato de professores que po-demos identificar tal violência entre estudantes:

“ao longo de toda a atividade muitas gracinhas acontecerem, de um xingar o outro, chamar de churrasqueiro, de gordão, e de queimado (...)” (RP9).

Já no DC16, no relato de um estudante, ve-mos a violência psicológica direcionada aos estudan-tes por um professor:

“(...) surgiu, em grande escala, a questão da professora de aula ofender os alunos. Relatos dela chamando os alunos de pobres miserá-veis, macacos, pulguentos e sujos (...)” (RE33).

No DC5 a violência sexual naturalizada fi-cou aparente a partir do relado de um professor:

“Algumas mães de crianças foram na escola reclamar que o aluno D. estava abusando dos filhos delas. Ao chamar a mãe de D. pa-ra conversar a respeito, essa tratou com a questão com naturalidade, e ainda afirmou que isso acontecia porque ‘os maiores’ fazi-am isso com ele também.” (RP3) No DC18 o relato de um professor apresenta

sua visão de negligência sobre a vida de uma crian-ça que estuda em sua escola:

“O relato de L. sobre seu dia a dia começou estranho quando esta disse que sempre de-pois da escola fica na casa de sua melhor amiga (vizinha) até depois da 00h. Ela afirma que os pais não se importam que ela fica na casa da amiga, desde que ela tenha deixado toda a casa arrumada (...)” (RP19)

A partir dos resultados obtidos é possível

considerar que a violência na escola vem sendo ba-nalizada. A violência vem de toda parte. No entanto, contrapondo os relatos de estudantes e os relatos de professores sobre a violência é possível perceber que apesar dos estudantes relatarem mais situações de violência que os professores, quando compara-mos os relatos observa-se a mesma concepção do que é a violência.

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Assim é preciso desconsiderar uma ideia de embate na escola, uma vez que tanto professores quanto estudantes sofrem com a violência. A violên-cia percebida por professores e estudantes faz parte do cotidiano deles e seria importante que ações pu-dessem ser propostas para mudar essa situação. tanto individualmente, quanto comunitariamente. Além da escola e da comunidade, o estado, que por não cumprir com seu papel de fornecedor de condi-ções dignas de educação, saúde e moradia corrobo-ra com a manutenção dessa cadeia de violência. Essa cadeia, nada mais é que a violência instituída como marca das relações sociais em todos os ambi-tos da vida recriada na escola e fomenta pela falta de preparo dos educadores para lidar com tal problema.

5. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Podemos considerar que a violência na es-cola ainda é um problema constante para a educa-ção no Brasil, principalmente no contexto aqui apre-sentado, escola pública e de periferia. Nesse con-texto, os estudantes, ainda precisam lidar com uma rotina diária de mais violência, o que inclui a pobre-za, o tráfico de drogas, a violência na comunidade e em casa e, principalmente, a omissão de ajuda da parte do estado.

Para os professores a situação é a mesma. Esses são colocados numa posição de “autoridade” onde muito se exige e pouco se oferece. Muitas ve-zes a formação dos profissionais não os orienta a respeito de como agir perante a situação de violên-cia. O que acarreta na reprodução de mais violência, uma vez que os profissionais pressionados acabam agindo violentamente, calando, culpabilizando, pu-nindo e suspendendo estudantes.

Mesmo com as situações de violência rela-tadas pelos estudantes e professores, a escola con-tinua com a prática que não se volta para uma ação libertadora. Isso ocorre, principalmente, quando igno-ra o fato de que a violência que é reproduzida dentro do ambiente envolve uma gama de fatores que vão muito além dos pequenos muros da escola.

6. . AGRADECIMENTOS

Agradeço às integrantes do grupo de pesquisa Flávia de Mendonça Ribeiro e Juliana Bernal Leme, sem as quais este trabalho não teria sido possível. À Profª. Raquel Guzzo por acreditar em nós, e ao CNPq pelo financiamento deste trabalho.

7. REFERÊNCIAS [1] Aquino, J. (1998) A violência escolar e a cri-

se da autoridade docente. Caderno Cedes, ano XIX, n. 47.

[2] Cardia, N.; Schiffer, S.(2002) Violência e De-sigualdade Social. Revista Ciência e Cultura, São Paulo, p. 25-31.

[3] Freire, P.(1987) Pedagogia do Oprimido. 17 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra.

[4] Godoy, A. S.(1995) Introdução à pesquisa qualitativa e suas possibilidades. Revista de Administração de Empresas. São Paulo, v. 35, p. 57-63.

[5] González Rey, F. (2005) Pesquisa qualitativa e subjetividade: os processos de construção da informação. São Paulo: Pioneira Thom-son.

[6] Guzzo, R.S.L. (2005) Escola Amordaçada: compromisso do psicólogo com este contex-to. In: A. Martínez (org). Psicologia escolar e compromisso social. Campinas: Alínea, p. 17-29.

[7] Minayo, M. C. S. (2005) Violência: Um velho-novo desafio para a atenção à saúde. Revis-ta Brasileira de Educação Médica, vol.29, n.1, p.55-63.

[8] Montero, M.(2006) Dos técnicas auxiliares em la investigacion e intervencion comunitá-rias: las anotaciones o diário de campo y el uso de documentos secundários. In Montero, M. Hacer para transformar: El método de la psicologia comunitária. Buenos Aires: Pai-dos.

[9] Ristum, M.(2001) O conceito de violência. 2001. 397f. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação, Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia, Salvador.

[10] Sant’Ana, I. M.; Costa, A. S.; Guzzo, R. S. L.(2008) Escola e Vida: Compreendendo uma Realidade de Conflitos e Contradições. Pesquisas e Práticas Psicossociais, São Jo-ão Del-Rei, v. 2, n. 2.

[11] Vieira, E. M.; Ximenes, V. M.(2008) CONSCIENTIZAÇÃO: Em que interessa este conceito à psicologia. Psicologia Argumento, v. 26, n52, p. 23-33.