composição da flora de trecho arborizado - 2000

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COMPOSIÇÃO DA FLORA DE TRECHO ARBORIZADO DA CIDADE UNIVERSITÁRIA, DENOMINADO "EUCALIPTAL" (SÃO PAULO, SP, BRASIL)¹ Leandro Pressinotti² Miguel Romero² Rodrigo Pavão² Carla Fiadi² Ricardo Bertoncello³ Resumo O presente trabalho trata da pesquisa de alterações ambientais ocorridas no campus da Cidade Universitária Armando de Salles Oliveira, comparando uma área que sofreu interferência humana com outra área preservada com vegetação nativa, com o objetivo de interpretar as conseqüências das intervenções e propor recomendações de estudo e preservação. O local escolhido para comparação com a reserva foi o trecho arborizado localizado entre o prédio do Instituto de Química e o Instituto de Geociências, denominado “Eucaliptal”. Foram realizadas coletas e medições de material vegetal e da fauna do local, permitindo elaborar comparações com as descrições já existentes sobre a vegetação nativa do local.

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Dissertação

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Materiais e mtodos

COMPOSIO DA FLORA DE TRECHO ARBORIZADO DA

CIDADE UNIVERSITRIA, DENOMINADO "EUCALIPTAL"

(SO PAULO, SP, BRASIL)

Leandro Pressinotti

Miguel Romero

Rodrigo Pavo

Carla Fiadi

Ricardo Bertoncello

Resumo

O presente trabalho trata da pesquisa de alteraes ambientais ocorridas no campus da Cidade Universitria Armando de Salles Oliveira, comparando uma rea que sofreu interferncia humana com outra rea preservada com vegetao nativa, com o objetivo de interpretar as conseqncias das intervenes e propor recomendaes de estudo e preservao.

O local escolhido para comparao com a reserva foi o trecho arborizado localizado entre o prdio do Instituto de Qumica e o Instituto de Geocincias, denominado Eucaliptal. Foram realizadas coletas e medies de material vegetal e da fauna do local, permitindo elaborar comparaes com as descries j existentes sobre a vegetao nativa do local.

As condies analisadas evidenciaram que a rea passou por um processo de violenta destruio do solo durante o perodo de construo dos prdios e que no momento atual encontra-se em aparente processo de sucesso ecolgica, com alguma vegetao pioneira semelhante mata nativa. Foi recomendado melhores cuidados no planejamento de futuras edificaes e sugerido estudar o processo de disperso zoocrica das espcies nativas para monitorar a recuperao da rea ainda degradada.

Dissertao apresentada como exerccio sobre o Tema: Ambientes alterados do campus da USP

na disciplina Fauna, Flora e Ambiente-2000 do Curso de Biologia do IB-USPInstituto de Biocincias USP, Aluno do Curso de Graduao em Biologia - Diurno

Instituto de Biocincias USP, Aluno do Curso de Graduao em Biologia - Noturno1. Introduo

O campus da Cidade Universitria Armando de Salles Oliveira apresenta cobertura vegetal com caractersticas que estimulam a comparao entre vegetao nativa e ambientes alterados.

A existncia de uma valiosa rea conservada, denominada Reserva de Preservao Permanente para Estudos dos Corpos Docente e Discente do Instituto de Biocincias da Universidade de So Paulo, representando um remanescente da cobertura vegetal da cidade de So Paulo, permite a realizao de estudos e pesquisas sobre as alteraes na vegetao ocorridas no entorno da reserva.

Diante desse cenrio, o presente trabalho teve a finalidade de pesquisar uma rea localizada relativamente prxima da reserva, denominada Eucaliptal, estabelecendo um paralelo entre a flora encontrada e a flora imaginada antes da ocupao humana, considerando os seguintes objetivos:

1. Comparar a vegetao atual com a provvel vegetao nativa do local e

interpretar as divergncias percebidas.

2. Discutir as implicaes dos resultados interpretados.

3. Analisar o significado da pesquisa e propor solues.

2. Material e Mtodos

A rea estudada localiza-se no terreno da Cidade Universitria Armando de Salles Oliveira, entre o Restaurante Universitrio do Instituto de Qumica, Rua do Lago, Instituto de Geocincias e o prdio da Letras (Fig. 1). Ocupa uma rea de aproximadamente 5000 m2 e quase totalmente coberta por um eucaliptal. O terreno inclinado apresentando um patamar intermedirio, com um desnvel de 17m entre a parte mais elevada e a parte mais baixa.

Geologicamente, a rea pertence bacia de So Paulo, sendo caracterizada por depsitos do tercirio e do quaternrio, segundo Joly (1950). Durante a construo do prdio da Qumica o terreno foi terraplanado, soterrando o solo original da rea estudada, restando um solo pobre em matria orgnica.

O clima apresenta a estao menos chuvosa entre maio e setembro, com precipitao mdia anual de 1428mm, temperatura mdia anual de 17,6oC e umidade relativa de 80%. Segundo Hueck (1956), a USP localiza-se dentro da regio da floresta subtropical de planalto.

O processo de obteno e manipulao do material foi precedido de algumas premissas. Supondo que os locais onde foram realizadas as coletas apresentavam sua comunidade vegetal distribuda homogeneamente, foram selecionados aleatoriamente os locais de estudo, de modo que no houvesse nenhum tipo de alterao na qualidade amostral dos experimentos. Aps a determinao aleatria dos locais, iniciou-se a demarcao dos quadrados que delimitaram o campo de estudo, utilizando barbante e estacas de madeira fincados no cho.

O procedimento para a anlise dos indivduos existentes dentro do limite do barbante seguiu roteiros diferentes para flora e fauna. Na realizao da coleta do material botnico foi utilizado um quadrado de 4m2, especfico para herbceas e gramneas, e outro de 32m, especfico para contagem das rvores. Na coleta da fauna foi utilizado um quadrado de 1m, peneira e bacia, com as quais foi selecionada a serrapilheira, separando os animais para conserv-los em lcool.

O material coletado (ramos de plantas e os espcimes de invertebrados) foi identificado por especialistas nas respectivas reas (professor Srgio Vanim na zoologia de invertebrados e um especialista apresentado pelo ps-graduando Humberto Mesquita Jnior na rea de botncia)

As pesquisa de campo foi realizada no ms de julho, em perodo de clima frio, seco e de pouca nebulosidade.3. Resultados

Trecho denominado Eucaliptal

Nessa mata no se observou um dossel ntido, devido topografia do local, porm existem dois estratos claramente observveis: um arbreo, de altura mdia igual a 20m e, um herbceo de altura mdia de 50 cm.

A luminosidade nessa regio alta, devido inclinao do terreno e a localizao espaada das rvores, alm disso, as observaes foram tomadas em um perodo de seca intensa, desfolhando as rvores. Essa luminosidade estimula a germinao de sementes fotossensveis.

Todos os indivduos vegetais encontradas na regio so invasores ou pioneiros em um processo de sucesso ecolgica. As espcies do estrato superior ou arbreo so o Persea americana (abacateiro) e os Eucaliptus sp (eucalipto) J as espcies do estrato inferior, ou herbceo/gramneo, so Rubiaceae, Chapitalia sp, Pterocaulum sp, Zanthoxylum sp, Eupatorium sp, Labiatae, Mimosaceae e uma espcie no identificada, semelhante quela planta de aqurio. As freqncias dessas espcies esto mencionadas na tabela 1. Essas espcies vegetais so normalmente zoocricas, ou seja, so dispersas por animais, como descrito por Rossi (1994)

A fauna do local so os Crustcea Isopoda (tatuzinho); Aracnida Araneida (aranha) e Acarina (caro); Insecta Hymenoptera (formiga); Coleoptera (besouro) e Isoptera (cupim). A freqncia de cada indivduo est na tabela 2.

Mata nativa

Segundo Joly (1950), a descrio do campus do Butant continha campos, brejos e baixadas. Considerando aquela regio um antigo morro aplainado por ao antrpica, a mais provvel vegetao nativa correspondente era uma vegetao de campo de uma antiga fazenda. A vegetao era mais exuberante que a primeira baseado em comparaes de precipitao e de clima em geral

Vista de longe, a regio do campo aparentava conter uma vegetao uniforme, pois eram raros os arbustos que se sobressaiam. No entanto, ao se aproximar, notou-se que no era uniforme, pois surgiam manchas avermelhadas de solo exposto. Tal fato era explicado pela prtica de queimas realizadas na poca de criao dos pastos da fazenda.

A flora era basicamente constituda por Mimosaceae, Rubiaceae, Bromelieacea, Moracea, Labiatae, em sua maioria. Essa composio apresentou coincidncia de trs famlias entre a mata atual e a mata nativa.

Um exemplo vivo da fauna da mata nativa foi observado em visita tcnica mata da reserva durante a aula do dia 5 de julho de 2000. Considerando que a mata da reserva representa a mata nativa, o material coletado naquela oportunidade foi includo como representante da mata nativa. Os resultados daquela coleta apresentaram uma fauna muito mais numerosa e diversificada em comparao com a fauna de um trecho de Eucaliptal prximo do Instituto de Biocincias, apesar de haver algumas coincidncias das espcies dois locais.

Outras observaes consideradas em nossa discusso que podemos citar so os ntidos traos da ao antrpica, como poluio (plsticos, vidros, papis, entulhos e excrementos), obras de alvenaria (a escada que liga a geologia ao restaurante), a existncia de espcies de plantas invasoras e, finalmente, a ntida manipulao do terreno para construo civil (terraplanagem).

4. Discusso

Conforme observado na elaborao dos resultados, podemos registrar que as caractersticas aparentes de composio do terreno atual no so compatveis com as caractersticas encontradas nas antigas descries da mesma rea. Esta primeira observao decorreu das evidncias de intensa movimentao mecnica do solo, de modo intencional e artificial, que, ao aplainar o topo da antiga elevao, acabou por expor o prprio subsolo na superfcie anteriormente ocupada pelo solo. Tais movimentaes ocorreram em razo das edificaes que foram instaladas na parte mais superior da colina, agora ao lado do trecho arborizado deste estudo.

Essa observao inicial sobre o solo proporcionou melhor compreenso sobre as observaes seguintes, quando foi constatada expressiva diferena entre a cobertura vegetal verificada no trecho do "Eucaliptal" com a cobertura vegetal encontrada nos registros anteriores sobre a vegetao nativa. Essa percepo pode ser aguada quando examinamos o trecho a grande distncia, passando a impresso de que s existem eucaliptos naquela rea, em enorme contraste com a mata da reserva, logo ao lado.

Entretanto, essa percepo, alcanada de longe, esconde um curioso aspecto evidenciado nos resultados dos exames dos materiais coletados nos espaos amostrais dentro do terreno. H um extrato herbceo e arbustivo em aparente processo de invaso bem sucedida, apesar da fraqueza do solo e da toxidade natural do eucalipto. Provavelmente, tais plantas que atuam invadindo a regio esto atuando como pioneiras na regenerao e/ou recriao do solo e do espao anteriormente destrudo. A curiosidade est representada no fato de que vrias das espcies que atuam como invasoras foram identificadas nas descries da antiga mata nativa. Acreditamos que essas mesmas espcies, as quais sobreviveram na mata da reserva, relativamente prxima do trecho estudado, e que, em razo do processo de disperso zoocrica apontado nos estudos mencionados, estariam conseguindo chegar nesse terreno.

Sendo assim, nossa concluso sobre a composio da flora do trecho denominado "Eucaliptal" que teria sido uma rea anteriormente coberta por vegetao nativa semelhante a da mata da reserva. A rea teria passado por um violento processo de destruio, motivado pela necessidade de espao para edificaes da Cidade Universitria, tendo em seguida recebido um extenso plantio de eucaliptos sobre solo com caractersticas de subsolo, encontrando-se atualmente em lento processo de sucesso com espcies pioneiras provenientes da mata da reserva.

Essa concluso evidencia a necessidade de maior cuidado no planejamento de ocupao de espaos considerados como vegetao nativa, destacando-se a dificuldade e a lentido da recuperao da rea atingida pelo trabalho da edificao. Uma recomendao seria elaborar um estudo de impacto ambiental na rea que fosse destinada para edificao em local de vegetao aparentemente nativa.

Outro aspecto valioso, porm invisvel neste relatrio, foi o crescimento do grupo que elaborou o trabalho de pesquisa, passando a perceber melhor as interaes temporais (destruio>sucesso), interaes espaciais (chegada de pioneiras provenientes da reserva), interaes ambientais (solo rido>vegetao afetada) e interaes biolgicas (disperso zoocrica e toxidade vegetal).

Como ltima contribuio desta discusso, sugerimos que seja avaliada a possibilidade de uma prxima pesquisa para estudar o sistema de disperso zoocrica ligada s espcies pioneiras no "Eucaliptal", como oportunidade de monitorar o processo de sucesso em andamento no local.

5. Agradecimentos

Agradecemos ao ps-graduando Flvio Beraldo pelo acompanhamento no local da pesquisa, ao ps-graduando Humberto Mesquita Jnior pelas sugestes e ao professor Srgio Vanin pelas contribuies durante o desenvolvimento deste trabalho.

6. Referncias Bibliogrficas

Hueck, K. 1956. Mapa fitogeogrfico do Estado de So Paulo. Boletim Paulista de Geografia 22:17-25

Joly, A.B. 1950. Estudo fitogeogrfico dos campos de Butant. Boletim da Faculdade de Filosofia Cincias e Letras da Universidade de So Paulo 109, Botnica 8:5-68.

Rossi, L. 1994. A flora arbreo-arbustiva da mata da Reserva da Cidade Universitria "Armando de Salles Oliveira" (So Paulo, Brasil). Boletim do Instituto de Botnica, So Paulo, 9. 1-105.