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COMPARATIVO ENTRE O DIREITO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO E
ANGLO-EUROPEU E A POSSIBILIDADE DE UMA COMUNIDADE LATINO-
AMERICANA
Alexandre Sturion de Paula*
RESUMO
O estudo em questão possui enfoque nas atribuições do Estado no tocante ao direito
constitucional e comunitário. Analisa estudo de direito constitucional comparado tendo a
comunidade e a sociedade como plano de fundo. Pretende trazer reflexões sobre a
Constituição, especificamente acerca da interação entre a Constituição brasileira e o
constitucionalismo anglo-europeu, almejando destacar se o texto constitucional brasileiro
promulgado em 1988 representa os anseios nacionais ou traduz-se apenas como um
conjunto normativo constitucional que sintetiza os demais textos constitucionais da
Europa e dos EUA. Estas reflexões direcionam o estudo para a constatação da
possibilidade ou não da formação de uma comunidade latino-americana tal como
preconiza o parágrafo único do artigo 4º da Constituição brasileira. A Constituição deve
representar os anseios de uma determinada nação que nela consagra as conquistas do
passado, a realidade presente e as metas para o futuro do Estado. Por tal razão é que a
concepção de Constituição apresenta-se sempre premente. A analise da Constituição pátria
com o constitucionalismo mundialmente tradicional nos conduz à possibilidade de
identificar a maior ou menor presença de uma Constituição material e nacional ou uma
Constituição meramente formal. Diante destas reflexões pretende-se concluir entrelaçando
o direito constitucional nacional com os valores comunitários para responder à questão da
possibilidade de constituição de uma comunidade latino-americana segundo os valores que
se consagrou na Constituição de 1988. Adotou-se o método de procedimento comparativo
e técnica de pesquisa documental indireta, segundo a abordagem dedutiva.
PALAVRAS-CHAVE: COMUNIDADE – ESTADO - CONSTITUIÇÃO
* Advogado. Especialista em Direito do Estado (Constitucional) e Mestrando em Direito Negocial (Processo Civil) pela UEL. Bolsista da CAPES. Autor e Coordenador das obras: O Direito Alternativo e o Novo Paradigma Jurídico; Exame de Ordem; Estudos Avançados do Direito; Ensaios Constitucionais de Direitos Fundamentais; Dimensões de Direito Público. E-mail: [email protected]
2
ABSTRACT
The study in question it possesss approach in the attributions of the State in regards to the
constitucional law and communitarian. It points study of constitucional law compared
having the community and the society as plain of deep. It intends to bring reflections on
the Constitution, specifically concerning the interaction between the brazilian Constitution
and the constitutionalism anglian-european, longing for to detach if the promulgated
Brazilian constitutional text in 1988 it represents the national yearnings or it is only
expressed as a constitutional normative set that synthecizes the too much texts
constitutional of the Europe and U.S.A. These reflections direct the study for the evidence
of the possibility or of the formation of a latin american community as it does not praise
the only paragraph of the article 4º of the brazilian Constitution. The Constitution must
represent the yearnings of one definitive nation that in it consecrates the conquests of the
past, the present reality and the goals for the future of the State. For such reason it is that
the conception of Constitution is always presented pressing. It analyzes it of the native
Constitution with the world-wide traditional constitutionalism in leads them to the
possibility to identify to the greater or minor presence of a material and national
Constitution or a mere formality Constitution. Ahead of these reflections it is intended to
conclude interlacing the national constitucional law with the communitarian values
according to to answer to the question of the possibility of constitution of a latin american
community values that if consecrated in the Constitution of 1988. One adopted the method
of comparative procedure and technique of indirect documentary research, according to
deductive boarding.
KEYWORDS: COMMUNITY - STATE - CONSTITUTION
1. INTRODUÇÃO
Já se faz cristalino entre nós a concepção de que não convivemos mais
em uma comunidade como antigamente. Percebemos, inclusive, que nem mesmo estamos
imersos em uma sociedade local, mas sim, numa sociedade internacional, globalizada,
onde pobres e ricos; socialistas, comunistas e capitalistas; liberais, sociais e neoliberais;
brancos e negros; intelectuais e analfabetos de diferentes nações convivem em camuflada
3
harmonia. Harmonia esta que é revestida pelos valores culturais dos diferentes povos e da
proteção de seus Estados.
Cada Estado possui suas fronteiras, onde tentam ao máximo preservar
valores regionais mínimos para que a internacionalização exagerada e forçada não retire
valores que são relevantes para um Estado e sua nação e irrelevantes para os interesses de
outros Estados de maior potencial econômico e/ou bélico. E o limite desta fronteira é a
Constituição dos Estados que amparam no âmbito interno os cidadãos e no âmbito
internacional impõe a identidade do Estado, que será melhor vislumbrada conforme a
maior proximidade entre a Constituição formal e a material. Por tais motivos é sempre
fundamental bem compreendermos as nascentes da Constituição e a nossa Constituição
vigente.
A Constituição pretende traduzir a vontade da nação, daí sua
significativa importância no ordenamento jurídico, pois reflete os valores materialmente
conquistados e cristalizados pela soberania popular, apresentando-se, ainda, como
comando obrigatório às atribuições do Estado. Assim, ao cotejarmos acerca da
possibilidade de formação de uma comunidade latino americana tal como preconiza o
parágrafo único do artigo 4º da Constituição Federal de 1988, é necessário
compreendermos o que de fato representa a Constituição, bem como se a Constituição
Federal de 1988 fora concebida a partir dos interesses nacionais ou segundo o
constitucionalismo tradicional com amparo em textos paradigmas anglo-europeus, para
então entrelaçarmos o direito constitucional pátrio com a possibilidade de um direito
comunitário latino-americano.
O estudo, portanto, almeja trazer a lume o resgate conceitual da
Constituição, a relação entre nosso texto constitucional com os principais paradigmas do
constitucionalismo mundial e apontar pela possibilidade ou não da formação de uma
comunidade latina.
2. GÊNESE DA CONSTITUIÇÃO POSITIVA
As atuais concepções acerca da Constituição emergiram com a sua
positivação, cujo marco pode ser firmado em 1653 com o “Instrument of Government” de
Cromwell, considerada a primeira Constituição escrita.1 Observe-se, porém, que para se
1 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Almedina, 1993, p. 62.
4
alcançar a vigente noção de Constituição, o esboço constitucional que se apresenta é
pretérito ao séc. XVII de Cromwell, remontando à politeia grega, onde se principia as
noções de Constituição enquanto essência da comunidade, sendo que Aristóteles, em
Política, apresentava a seguinte conceituação de Constituição: “A Constituição do Estado
tem por objeto a organização das magistraturas, a distribuição dos poderes, as atribuições
de soberania, numa palavra, a determinação do fim especial de cada associação política”.2
Extrai-se desta concepção aristotélica a idéia de Constituição como a
estrutura de uma associação política a qual poderíamos hoje associar como sendo o
Estado, e em cujo conteúdo já constava a distribuição dos poderes, antecedendo ao
aclaramento de Montesquieu. Os romanos, com Cícero e as concepções republicanas,
também apresentavam uma compreensão de Constituição a partir desta res publica, que
entendia, citado por Canotilho, como “agregado de homens associados mediante um
consentimento jurídico e por causa de uma utilidade comum”.3
Estas concepções clássicas, ainda que de certa forma rudimentares em
comparação às noções hodiernas, bem demonstram que os conceitos de Constituição
antecedem em muito à sedimentação da Constituição escrita. Lassalle mesmo já salientava
que “uma Constituição ‘real’ e ‘efetiva’ a possuíram e a possuirão sempre todos os países,
pois é um erro julgarmos que a Constituição é uma prerrogativa dos tempos modernos”.4
Mas a noção grega ou romana de Constituição sedimenta-se nas idéias
de Constituição material, e não na formal, cujos conceitos e proliferação eclodiram a partir
do séc. XVII. Karl Loewenstein já enfatizava que:
Para Platón y Aristoteles, así como en toda la teoria política griega,
la ‘politeia’ fue la constitución en sentido material. Aun los más
agudos juristas de la época posterior de la República romana, sobre
todo Cicerón y los estoicos, no exigieron que las normas
fundamentales de la comunidad fuesen escritas en ‘legues’
materiales, o simplemente codificadas. Ellos tenían conciencia de
un derecho superior que, conforme a la naturaleza, predominaba
sobre todas las legislaciones humanas.5
2 ARISTOTÉLES, Política. Trad. Mario da Gama Kury. Brasília: UnB, 1997, p. 98. 3 CANOTILHO, op. cit., p. 58. 4 LASSALLE, Ferdinand. A Essência da Constituição. 6. ed., Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2001, p. 25. 5 LOEWENSTEIN, Karl. Teoría de la Constitución. Trad. Alfredo Gallego Anabitarte. 2. ed., Barcelona: Ariel, 1970, p. 152.
5
Porém, é cristalino que de fato a partir do final do séc. XVII, que se
universaliza a Constituição escrita, em especial em razão das conquistas das revoluções
americana e francesa, assim como da autocracia napoleônica e da disseminação das
técnicas de Constituição escrita à monarquia constitucional.6 Esta crescente adesão à
positivação formal da Constituição é que promove eco e estudos acerca da Teoria da
Constituição.
Porém, é de se ressaltar que enquanto as Constituições materiais
possuíam maior solidez, vez que se alicerçavam nos costumes, princípios, valores
observados pela comunidade, as Constituições escritas detinham e ainda apresentam
algumas desvantagens, como seu caráter formal e legal. Como bem salienta Santi Romano,
Com a queda do dogma do Estado de natureza e com a dissipação
das teorias contratualistas, revigorado o princípio da unidade
orgânica do Estado, as constituições escritas não são hoje
consideradas senão como uma categoria de leis, ainda que tenham
o mesmo caráter e, às vezes, eficácia diversa e maior do que a das
leis ordinárias.7
Significa dizer que as Constituições estão sujeitas às alterações por
critérios políticos, econômicos e jurídicos, não raras vezes discutíveis, abrindo espaço a
interesses escusos ou a movimentos e tendências nacionais e internacionais virem a
interferir na sua alteração e da dirupção dos valores e cultura nacionais.
E tal fato não dista de nosso cotidiano. Recentes exemplos deste aspecto
vêm se dando na Constituição Cidadã desde 1995, com as modificações por Emendas
Constitucionais n.º 5, 6, 7, 8, 9, 16, 19, 20, 27, 28, 30, 39, sob a forte influência dos efeitos
da globalização8, demonstrado-se que o direito, e a própria Constituição material de um
Estado cede espaço à economia global.
Contudo, apesar desta característica desvantagem, que retira a força
ideológica e material da Constituição escrita, esta ainda consiste em sistema largamente
difundido, “e aparece, indissoluvelmente, ligado à forma do constitucionalismo hodierno,
6 Ibid., p. 159. 7 ROMANO, Santi. Princípios de Direito Constitucional Geral. Trad. Maria Helena Diniz. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977, p. 44. 8 GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Constitucional Comparado. Porto Alegre: SAFE, 2006, p. 19-22.
6
em contraposição ao fato de que as constituições precedentes eram todas, salvo algumas
exceções particulares, prevalentemente consuetudinárias.”9
Seja qual for a forma adotada, material ou escrita, é certo que a
Constituição possui funções imprescindíveis à existência do Estado e ao exercício do
poder. Konrad Hesse de forma sintética reúne tais funções ao ensinar que:
La Constitución es el ‘orden jurídico fundamental de la
Comunidad’. La Constitución fija los principios rectores con
arreglo a los cuales se debe formar la unidad politica y se deben
asumir las tareas del Estado. Contiene los procedimientos para
resolver los conflictos en el interior de la Comunidad. Regula la
organización y el procedimiento de formación de la unidad politica
y la actuación estatal. Crea las bases y determina los principios del
orden juridico en su conjunto. En todo ello es la Constitución ‘el
plan estructural básico, orientado a determinados principios de
sentido para la conformación juridica de una Comunidad’. [...] La
Constitución establece los presupuestos de la creación, vigencia y
ejecución de las normas del resto del ordenamiento jurídico.10
Desta forma encerra-se que a Constituição fixa os princípios, determina
as tarefas do Estado, disciplina a criação e execução de leis, limita poderes, estrutura e
planeja o ordenamento jurídico e disciplina as relações internacionais, em atenção aos
valores da nação, tudo a partir da formação e da cooperação das atuações humanas que se
organizam para realizar as tarefas estatais. Podemos findar afirmando que a Constituição
direciona com imperatividade e normatividade as atuações do Estado através das funções
desempenhadas pelos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, devendo estes,
obrigatória e independentemente, cumprir todos os preceitos e valores constitucionais,
uma vez que a cada um fora atribuída uma função específica, mas a todos compete o
cumprimento da completude do sistema constitucional.
3. CARACTERÍSTICAS DO CONSTITUCIONALISMO ANGLO-EUROPEU
Como percebemos a Constituição é a pilastra de uma comunidade e
sociedade interna e do Estado. Mas a Constituição que temos diferencia-se ou identifica-se
com as demais que estão guardando os Estados estrangeiros? Representa a vontade 9 ROMANO, op. cit., p. 45. 10 HESSE, Konrad. Escritos de Derecho Constitucional. Madrid: Lael, 1983, p. 16-17.
7
nacional ou retrata o conjunto normativo constitucional apresentado por demais
Constituições anglo-européias?
O professor Arnaldo Sampaio Godoy leciona que as Constituições
escritas reproduzem um único ideal, de matriz nacional, iluminista e oitocentista. Aponta
que o contexto local acerca das influências teológicas, sociológicas e antropológicas são
irrelevantes, pois hoje se preocupa muito mais com os direitos humanos e conquistas de
liberdades mundiais sem se preocupar, de fato, com a realidade dos cidadãos nacionais.11
Esta questão é relevante, pois, se as comunidades e sociedades nacionais
são diferentes umas das outras, e a Constituição é um retrato da sociedade, então como
podem existir Constituições do Ocidente e do Oriente tão semelhantes? Induz-se, pois, a
uma identidade fruto de um ou mais referenciais constitucionais.
Observa-se que os países também agem em efeito “manada”, ou seja,
nada se cria, tudo se copia, mas não se copia aleatoriamente, reproduz-se aquilo que está
“na onda”, no “momento”, o que está em voga. Assim é que o Direito Constitucional
Inglês tornou-se o pai de vários outros Direitos Constitucionais que em nada se
aproximam com a sociedade inglesa, inclusive o Brasil.
Também é desta forma é que o Direito Constitucional Norte-americano
se tornou o irmão mais velho e referencial de constitucionalismo para o restante do
mundo, e de igual modo é que atualmente, o Direito Constitucional Alemão, vêm se
apresentando como o caçula preferido da Teoria Constitucional. A pergunta que devemos
fazer é: estes direitos constitucionais, que servem de inspiração a tantos outros Estados, de
diversos continentes, e de diferentes culturas, conseguem ou devem ser exemplos para
todo e qualquer sociedade nacional?
A título de melhor exemplificação façamos um paralelo entre algumas
Constituições de Continentes diferentes.
Bem sabemos que o Direito Constitucional Inglês é o patriarca do
constitucionalismo. Mas o que apresenta este Direito Constitucional?
Forma Consuetudinária – não escrita – 1215
11 Cf. GODOY, op. cit.
8
Origem Da tradição constitucional e política inglesa e de suas
revoluções
É modelo? Sim, foi e continua sendo inspirada por outros Estados como:
EUA, Índia, Paquistão, Austrália, etc
Característica Resistência popular contra o poder absolutista
Realidade social De fato a Constituição representa a realidade da sociedade
inglesa
Rigidez Flexível – a partir de John Locke. Mas durável, estável em
razão de cultura material estar sedimentada
Modelo Político e
Econômico
Monarquia parlamentarista (Primeiro-Ministro), Capitalismo,
Liberalismo
Principais fontes de
Direito
Petição de Direitos (1628); Declaração de Direitos (1689);
Ato de União com a Escócia (1707) e com a Irlanda (1800);
Estatuto de Westiminster (1931).
Relações internacionais Por se tratar de um sistema consuetudinário os princípios
estão acobertados pelos próprios costumes internacionais.
O Direito Constitucional Inglês, como se pôde perceber, deriva da
tradição, dos costumes que ganharam autoridade, alicerça-se na Constituição material e
não na Constituição escrita. Este modelo singular acabou sendo reproduzido
indiscriminadamente por Estados que em nada se identificam com a sociedade inglesa e o
Estado inglês.
O Direito Constitucional Norte-americano também é amplamente
difundido no mundo. Vejamos suas características:
Forma Escrita mas extremamente reduzida – 1787 (4400 palavras) e
27 Emendas até hoje.
9
Origem Da reação das Colônias da América do Norte contra a
Inglaterra onde essas saíram vitoriosas
É modelo? Sim, o texto sintético e eficaz foi alvo de referência inclusive
para a Revolução Francesa. O federalismo também fora
largamente difundido.
Característica Resistência das colônias agrícolas contra a tributação e
opressão da monarquia inglesa
Realidade social De fato a Constituição representa a realidade da sociedade
norte-americana.
Rigidez Média flexibilidade – mas altamente durável e estável
Modelo Político e
Econômico
Presidencialismo, Capitalismo, Liberalismo
Principais fontes de
Direito
Constituição, emendas constitucionais, legislações estaduais,
jurisprudência
Relações internacionais A seção 8, inciso 3 determina que cabe ao Congresso regular
as relações internacionais.
O Direito Constitucional Norte-americano também recebeu calorosos
aplausos pela sua forma sintética, mas materialmente tão densa que ainda permaneça
vigente mesmo após mais de 200 anos de existência. As Constituições, inglesa e norte-
americana, serviram de referencial para dezenas de Estados.
O Direito Constitucional Alemão do pós-Guerra, de 1949, também é
amplamente difundido nos dias atuais, inclusive sendo bem recebido pelo Constituinte e
pela doutrina brasileira, que tem nos Direitos constitucionais alemão e português seu
alicerce pretérito e atual. A Constituição Alemã é a Constituição moderna mais copiada da
atualidade.
Forma Escrita e extensa: 146 artigos e conta com várias Emendas –
10
1949.
Origem Fruto da ruptura política e do término da 2ª Guerra em que a
Alemanha fora derrotada pelos Aliados.
É modelo? Sim, em especial pela defesa dos direitos essenciais e
proteção da pessoa humana. A Constituição do Brasil de 1988
colheu parte do rol de direitos fundamentais que a seção
inicial da Constituição alemã apresentou.
Característica Mudança de um regime nazista para um regime democrático.
As alterações atuais decorreram que após 1989 houve a
reunificação das Alemanhas Oriental e Ocidental
Realidade social De fato a Constituição representa a realidade da sociedade
alemã.
Rigidez Alta – constitucionalidade controlada pelo Tribunal
Constitucional Federal. Estável.
Modelo Político e
Econômico
Presidencialismo (com Chanceler Federal), Capitalismo.
Embora a Constituição apregoe a social democracia, a
economia alemã é liberal.
Fontes de Direito Constituição, emendas constitucionais, legislação federal e
estadual, jurisprudência
Relações internacionais A Constituição alemã prevê que as regras de Direito
Internacional produzirão direitos e obrigações para os
habitantes do território federal e prevalecerão sobre as leis.
O Direito Constitucional Alemão tem sido alvo de estudos de diversos
constitucionalistas brasileiros, justamente pelo tratamento que dá aos direitos
fundamentais, ao controle de constitucionalidade, e à hermenêutica constitucional.
11
O Direito Constitucional Francês também apresenta um
constitucionalismo marcante e reproduzido, mormente em razão dos ideários da
Revolução Francesa de 1789.
Forma A Constituição de 1791 é a mais conhecida, embora a vigente
Constituição seja de 1958, com alterações relevantes em
1968. Escrita.
Origem Fruto da pós crise da Argélia, onde se desenvolveu
movimento político reformista que redundou na 5ª República,
comandada inicialmente por Charles de Gaulle.
É modelo? A Constituição de 1791 sim, em especial pela incursão desde
Monstesquieu do fracionamento dos poderes.
Característica Caracteriza-se pelo mote: liberdade, igualdade e fraternidade.
Tem a melhor tratativa na relação entre direitos do homem e
os princípios da soberania.
Realidade social De fato a Constituição representa a realidade da sociedade
francesa.
Rigidez Alta – as alterações constitucionais devem ser aprovadas por
3/5 do Parlamento e por referendo popular. Estável.
Modelo Político e
Econômico
Presidencialismo (com Primeiro-Ministro), Capitalismo.
Embora a Constituição apregoe a social democracia, a
economia francesa prepondera pelas linhas econômicas do
liberalismo
Fontes de Direito Constituição, emendas constitucionais, legislação federal e
estadual.
Relações internacionais A Constituição francesa atribui competência ao Presidente da
República para negociar e ratificar tratados.
12
O Direito Constitucional Francês atual não é alvo de maiores
inspirações, mas sim, o seu constitucionalismo pós Revolução Francesa, mormente a
Constituição de 1791.
O Direito Constitucional Português não é difundido como as demais
Constituições européias, no entanto, foi o grande referencial para as colônias portuguesas,
dentre elas o Brasil.
Forma Escrita – 1976.
Origem Fruto da ruptura política com a queda do regime fascista e da
ditadura opressora.
É modelo? Não. Pelo contrário, inspirou-se na Constituição Alemã para a
redação de partes de seu texto.
Característica Mudança de um regime facista. Adequação ao integralismo
nacional que se firmou em meados da década de 70.
Realidade social De fato a Constituição representa a realidade da sociedade
portuguesa.
Rigidez Alta – a alteração exige o respeito a mais de uma dezena de
cláusulas pétreas.
Modelo Político e
Econômico
Presidencialismo, Capitalismo. Embora a Constituição
apregoe a social democracia, a economia portuguesa é liberal.
Fontes de Direito Constituição, emendas constitucionais, legislação federal e
estadual.
Relações internacionais Admite a eficácia dos tratados mesmo quando material ou
formalmente inconstitucionais, desde que vigentes no
ordenamento da outra parte, e desde que não viole direitos
fundamentais portugueses.
13
Estes foram os principais modelos constitucionais existentes e
inspiradores do constitucionalismo dos demais Estados, os quais se percebem terem
servido de referencial para o Brasil, demonstrando que o país jungiu anseios nacionais
com constitucionalismo mundial.
4. DIREITO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO
O Direito Constitucional Brasileiro tem a característica de ter colhido
dos demais modelos constitucionais alguns pontos essenciais. É possível encontrar em
nossa Constituição características de todas as demais Constituições acima apontadas.
Contudo, mesmo apresentando-se com um texto constitucional recente
em comparação aos demais acima referidos, a Constituição brasileira já fora alvo de
discussão de diversos constitucionalistas, cientistas políticos, juristas em geral em todo o
mundo, em razão de seu tratamento humanitário que dá às relações e ordem econômica e
às legislações infraconstitucionais que inspirou. São estas suas principais características.
Forma Escrita e extensa – 1988
Origem Fruto da ruptura política com a queda do regime ditatorial e
pela democratização incursionada pelo Movimento Diretas
Já, que contou com a participação de toda a sociedade.
É modelo? Não podemos reputar a Constituição brasileira como modelo
aos demais Estados, mas com certeza, em um referencial
indispensável a um estudo de Direito Constitucional
Comparado.
Característica Retorno da democracia e do governo de civis. Ampliação do
catálogo dos direitos e garantias fundamentais. Instituição de
um Estado Democrático de Direito com forte vinculação
social.
Realidade social A Constituição, infelizmente, não representa a realidade da
sociedade brasileira, que embora tenha a dignidade humana
como princípio mor, tem mais de 50% de analfabetos e
14
marginalizados, e milhares que literalmente passam fome em
um dos maiores países agrícolas do mundo.
Rigidez Alta – a alteração exige a aprovação por parte de 3/5 do
Congresso em dois turnos. Embora seja alta a rigidez é
Instável, pois a Constituição é freqüentemente alterada.
Modelo Político e
Econômico
Presidencialismo, Capitalismo. Embora a Constituição
apregoe também a social democracia, a economia brasileira
oscila entre o liberalismo e o neoliberalismo.
Principais fontes de
Direito
Constituição, emendas constitucionais, legislação federal e
estadual.
Relações internacionais Disciplinou especificamente sobre as relações internacionais
com a instituição de 10 princípios no artigo 4º. Também
trouxe nova recepção aos tratados nos parágrafos do artigo 5º.
Se bem observamos podemos concluir pelo seguinte: o Constituinte
brasileiro adotou o modelo convencional e mais difundido no mundo quanto a forma de
redação da Constituição, ou seja escrita. O ordenamento jurídico brasileiro, inclusive,
caracteriza-se por ser exacerbadamente positivado.
No tocante a origem, a Constituição brasileira empregou também a
noção elementar do constitucionalismo internacional de que em havendo ruptura do
regime político, de governo, ou mesmo de alterações sociais, inclusive guerras e
revoluções, que demandem uma nova reformulação de agir do Estado e/ou da nação, há de
se erigir um novo Texto Constitucional. Como entre nós houve a queda do regime
ditatorial para a democracia, e a configuração de um Estado social, justificou-se a
promulgação da Constituição de 1988.
Quanto ao modelo, podemos perceber que a Constituição brasileira de
certa forma tem se destacado como referencial não por apresentar algo que é inovador,
pelo contrário, justamente por condensar o que o mundo inteiro apontou de bom. A
elaboração de uma Constituição como centro do ordenamento jurídico e limitador do
poder, copiamos dos ingleses; a moderna tripartição das funções dos poderes em
15
Legislativo, Executivo e Judiciário copiamos dos franceses; o presidencialismo copiamos
dos norte-americanos; o controle de constitucionalidade condensamos os modelos
concentrado e difuso que colhemos da Alemanha, Portugal e Estados Unidos; o rol de
direitos e garantias fundamentais copiamos da Alemanha e Portugal em especial, enfim, a
Constituição brasileira pode ser considerada a essência do constitucionalismo
internacional.
No que se refere à realidade é que nos vem a principal diferenciação.
Nos demais Estados a Constituição representa o que a sociedade vive e clama. Por certo o
grau de desenvolvimento econômico e cultural tem grande influência, assim como a
experiência do Antigo Mundo. No entanto, poderíamos ter absorvido a experiência
conquistada nos demais Estados e percebido que não se faz uma Constituição aos moldes
de outra sociedade, mas sim, segundo as nossas próprias realidades, segundo as questões
regionais internas e não externas.
O Brasil seguramente tem um dos melhores textos constitucionais, mas
que ainda não conseguiu se concretizar no seio da sociedade, em especial as que mais
demandam dos direitos e garantias colacionados na Constituição. Não se trata de
realizarmos outra Constituição, mas de aproveitarmos o que de bom temos, o que nos
exige uma mudança de pensamento, fazendo com que este novo paradigma jurídico que a
Constituição de 1988 seja melhor interpretada e aplicada.
Quanto a rigidez nossa Constituição seguiu em parte o modelo francês, e
em especial, se inspirou no modelo português quanto ao estabelecimento de cláusulas
pétreas. Porém, diferente da Constituição norte-americana que tem 27 Emendas em mais
de 200 anos, em apenas 18 anos já contamos com mais de 52 Emendas Constitucionais
que estão retalhando a Constituição.
Quanto ao modelo político apenas nos adequamos como os principais
países do Ocidente fizeram, ou seja, romperam o modelo monarquista para o
presidencialista. O parlamentarismo no Brasil teve curtíssima duração e não funcionou à
época. Como estamos numa aldeia global que não pára e sempre gira, também adotamos
ou toleramos o capitalismo. Contudo, o maior conflito brasileiro, inclusive no seio
jurídico, é conciliar o modelo liberal com o social, ou seja, o particular versus o
público/coletivo. Neste duelo caminhamos por um neoliberalismo que tange lá e cá em
significativas oscilações.
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As fontes de direito adotadas pelo Brasil, são as mesmas adotadas pelos
Estados que contam com ordenamento jurídico positivado e Constituição escrita. É
interessante ressaltar que depois que Hans Kelsen passou pela face da Terra, falar em
costumes e jusnaturalismo passou a perder força argumentativa, contudo, os movimentos
sociológicos e filosóficos estão retornando com força: Movimento do Direito Livre,
Jurisprudência dos Interesses, Realismo Jurídico Norte-americano e Escandinavo; Direito
Alternativo; enfim, o positivismo jurídico está sendo posto em xeque, pois não atende
mais as exigências das realidades sociais em todo o mundo, o que faz com que o Direito
busque cada vez mais apoio da Filosofia e da Sociologia para encontrar suas balizas
procedimentais novamente;
A Constituição brasileira, no tocante às relações internacionais destacou-
se por inserir no próprio texto constitucional, de forma explícita, princípios que regem a
República Federativa do Brasil perante os Estados estrangeiros e as relações
internacionais, consignando mais ainda, a formação de uma “comunidade latino-
americana”. A questão é: esta principiologia de relações internacionais de fato proporciona
condições para uma comunidade latino-americana ou estes próprio princípios são o
entrave desta formação?
5. ENTRELAÇAMENTO ENTRE O DIREITO CONSTITUCIONAL E A
POSSIBILIDADE DE INTEGRAÇÃO LATINO-AMARICANA
A partir das reflexões acima que apontaram pela gênese da Constituição
positiva, pelas características das Constituições paradigmas e da Constituição brasileira,
questionamos se diante do salto de valores nacionais para a recepção de valores
internacionais poderemos retornar com segurança para a constituição de uma comunidade
latino-americana considerando o que colhemos dos demais textos constitucionais e que
doravante compõem nossa Constituição formal.
De pronto podemos aferir que como a Constituição de um país
representa a norma fundamental que determinará o que os seus Poderes deverão fazer no
âmbito interno e externo. É dela que devem ser extraídos os princípios que nortearão o
Estado em suas relações internacionais. E estes, por sua vez, conduzirão o país a uma
maior ou menor abertura social, política, econômica e jurídica diante das relações
exteriores, conforme o grau de resguardo que os princípios constitucionais apresentarem à
'Soberania', que exerce relevante papel na formação do Estado e na sua conduta frente a
17
seus pares estatais. Em síntese, os princípios permitirão ou não que o Brasil deixe o
artificialismo da sociedade internacional e forme a comunidade latino-americana
juntamente com os demais Estados latinos.
Ao erigir a principiologia das relações internacionais, o legiferante
constitucional demonstrou ora um acompanhamento com os ordenamentos jurídicos e
constitucionalismo moderno, ora um anacronismo por manter princípios que não se
compatibilizam com as exigências internacionais atuais, e que à época, 1988, já se
tornavam consideravelmente visíveis. Os avanços consistiram, em síntese, quanto à
solidificação do país na defesa da paz, na solução pacífica dos conflitos, na igualdade
entre os Estados, na cooperação e na defesa dos direitos humanos, que, considerando-se as
turbulências historicamente existentes na América Latina representam respeitável posição.
Entretanto, o mesmo Constituinte obstaculizou, de certa forma, não só a
formação de uma comunidade latino-americana, como a aplicação dos próprios princípios
que beneficiam a relação internacional brasileira, quando fez marcar indelevelmente a
perene e reverberadora presença do resguardo exacerbado à Soberania, através dos
princípios da independência nacional, da autodeterminação dos povos, não-intervenção, e
subjetivamente, nos princípios da igualdade entre os Estados, repúdio ao terrorismo e
concessão de asilo.
Verifica-se que os princípios da prevalência dos direitos humanos e da
cooperação entre os povos para o progresso da humanidade, acabam por sintetizar os
princípios que não estão isolados na restrita defesa da Soberania, por permitirem a
inserção de conceitos e diretrizes para a fomentação de fatores culturais, compartilhando-
se, desde a sua gênese, os mais diversos valores que promovam a elaboração de uma
efetiva comunidade intrinsecamente ética e moral.
O professor Celso A. Mello12 observa que o nosso Texto Maior
consagrou "uma antinomia da ordem internacional: a soberania e a cooperação
internacional, vez que esta só se realiza às expensas daquela", por isto ressalta o emérito
professor que "a tendência atual é a da soberania existir como um conceito meramente
formal". Frise-se que a cooperação está arraigada na 'moral internacional', caminhando
12 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito Constitucional Internacional: uma introdução. 2. ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 131.
18
tenuamente com o princípio da solidariedade e auxílio mútuo. Desta forma, conveniente
um singelo dizer sobre ambos princípios.
O Princípio da Prevalência dos Direitos Humanos é rico em
comentários que no momento não nos permite maiores apontamentos. Mas é salutar
destacar a lição de Pedro Dallari citado por Mazzuoli acerca deste princípio ao preconizar
que:
A ‘prevalência dos direitos humanos’, enquanto princípio
norteador das relações exteriores do Brasil e fundamento colimado
pelo País para a regência da ordem internacional não implica tão-
somente o engajamento no processo de edificação de sistemas de
normas vinculados ao Direito Internacional Público. Impõe-se
buscar a plena integração das regras de tais sistemas à ordem
jurídica interna de cada Estado.13
Cremos, portanto, que não estaríamos equivocados em dizer que a
questão reside em buscar a aplicação dos direitos humanos do genérico regramento
transnacional para a efetiva aplicação em solo nacional, ou seja, abstrair da sociedade
internacional para implantar na comunidade regional. O professor Fernando Barcellos de
Almeida, acerca deste tópico, tece o seguinte conceito:
Direitos humanos são as ressalvas e restrições ao poder político ou
as imposições a este, expressas em declarações, dispositivos legais
e mecanismos privados e públicos, destinados a fazer respeitar e
concretizar as condições de vida que possibilitem a todo ser
humano manter e desenvolver suas qualidades peculiares de
inteligência, dignidade e consciência e permitir a satisfação de suas
necessidades materiais e espirituais.14
Inegável que dentre todos os princípios este é o mais abrangente, além
de nele estar sintetizado todos os demais direitos fundamentais, uma vez que respeitados
os direitos humanos estar-se-á homenageando os demais princípios, que de certa forma,
estão intrinsecamente alicerçados nele.
13 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Direitos Humanos & Relações Internacionais. Campinas: Agá Juris, 2000, p. 132. 14 ALMEIDA, Fernando Barcellos de. Teoria Geral dos Direitos Humanos. Porto Alegre: SAFe, 1996, p. 24.
19
A prevalência dos direitos humanos na América Latina consiste,
contudo, num desafio ardoroso, visto que historicamente os países latinos são marcados
por caudilhismos, ditaduras que foram extintas recentemente, golpes de Estado e
populismos que persistem até o presente milênio, além dos eternos movimentos
guerrilheiros e sociais de luta armada e da inconstante efetividade constitucional dos
países deste Continente, conforme leciona o professor Paulo Napoleão Nogueira da
Silva.15 A efetivação de uma comunidade latino-americana de nações não subsistiria
paralelamente a tais anacronismos.
Portanto, pejorativo que os países sul-americanos promovam com
autenticidade e veemência a aplicação dos direitos humanos que é o berço da democracia e
da completa e plena configuração de uma comunidade internacional, mas que tal
promoção seja de dentro para fora, e não mera retórica de governantes que pregam em
parlatórios internacionais, exigindo o fim da fome no mundo, enquanto seus pátrios
sobrevivem de lixões ou de bolsas paternalistas, que em nada se diferenciam de
condicionamento à miserabilidade.
Se o nosso escopo é de que haja uma comunidade internacional, é
imprescindível a existência intrínseca, perene e incomodadora, se for o caso, dos direitos
humanos e dos direitos subjacentes que este comporta, em todas as Nações que pretendam
harmonizar-se numa só comunidade internacional.
O Princípio da Cooperação entre os Povos para o Progresso da
Humanidade também está previsto no art. 4º, IX, da Lei Maior. Tupinambá Miguel C. do
Nascimento16 afirma que a "cooperação indicada no inciso IX do artigo em comento é
finalística. Há a cooperação com o objeto de alcançar o progresso da humanidade. Não é
uma simples cooperação; é o ato de cooperar altamente positivo", isto por, como sabemos,
poder existir uma cooperação entre países para um fim destrutivo. O mencionado
doutrinador salienta ainda, que "esta cooperação pode se realizar de duas formas
diferentes: como ato unilateral brasileiro, colaborando e ajudando outros Estados em sua
tentativa de progredir, e como ato bilateral".17
15 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira. Direito Constitucional do Mercosul. 1. Ed., Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 267 seq. 16 NASCIMENTO, Tupinambá Miguel C. Comentários à Constituição Federal: princípios fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997, p. 219. 17 Id Ibid.
20
O Brasil, diga-se, possui várias relações internacionais de cooperação,
reflexo do princípio em questão, citamos, apenas a título de exemplo: a Declaração de
Princípios sobre a Cooperação entre o Governo da República Federativa do Brasil e o
Governo do Canadá para a Manutenção da Paz e da Segurança Internacionais, realizado
em Brasília, em 15 de janeiro de 1998, e o Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta
entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil, aprovado pela
Resolução da Assembléia da República n.º 83/2000, de 14 de dezembro de 2000. O
próprio Tratado de Assunção, de 1991, representa uma forte cooperação entre os países do
Mercosul.
Conclui-se, portanto, que há de estender às relações internacionais no
sentido de promover a cooperação cultural, sócio-econômica, tecnológica e científica, e o
intercâmbio educacional, entre outras diversas áreas, no seio da comunidade latino-
americana, pois possuem características mais próximas que os europeus conosco. Entre os
países da comunidade latina, não deve pairar o artificialismo, a mera camaradagem
existente na cooperação entre sul-americanos e europeus, asiáticos ou anglo-saxãos, mas
sim, um efetivo enraizamento cooperativo entre as nações aqui presentes, que além de
vizinhos, necessitam viver numa fraternidade política, econômica, jurídica e social,
harmonizando as peculiaridades culturais inerente a cada um.
6. CONCLUSÃO
Tendo como características a limitação do poder, a constituição do
Estado, a atribuição das tarefas dos poderes estatais e aos governantes, a instituição das
bases jurídicas e a preservação dos valores peculiares a um determinado povo e Estado, a
Constituição erigiu-se como um forte instrumento normativo, que quanto maior
identificar-se dos anseios de seu povo, maior poder formal emprega.
Para a criação desta lex legum os Estados absorveram o que se
apresentavam ao momento histórico da elaboração de suas Constituições, servindo-se dos
referenciais anglo-europeus como norte do constitucionalismo e de redação da
Constituição.
O Brasil seguiu a mesma trilha dos demais Estados quanto da elaboração
da Constituição de 1988, com maior independência em razão do próprio amadurecimento
do final de II Milênio, porém, com a consagração do constitucionalismo tradicional de
então.
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Neste anseio a comunidade rural brasileira interou-se com a sociedade
internacional. Os valores nacionais com os internacionais. E a Constituição formal passou
a padecer um distanciamento da Constituição material.
E subjacente a este cenário podemos concluir que a doutrina do
humanismo social que busca integrar o homem ao Estado está sofrendo uma inversão pelo
que até então se pôde verificar, pois entre o indivíduo e o poder político existem grupos
naturais, tais quais a família, que estão intrinsecamente relacionados ao conceito de
comunidade, no entanto, as transformações sócio-econômicas estão conduzindo esta
comunidade, essencialmente natural, a um artificialismo concentrado na sociedade
internacional. Ecoa, desta forma, as palavras de Rousseau18, segundo o qual 'o homem
nasce livre e em toda parte se acha aprisionado'.
Verificamos isto com a prisão que a sociedade impõe através de sua
codificação nacional e também internacional, por intermédio da soberania, aos brasileiros
e estrangeiros. Em épocas pretéritas, mas não muito longínquas, o ser humano vivia
verdadeiramente em família, sem os rebuscos da globalização. Com o progresso da
humanidade a comunidade passou a se relacionar mais, surgindo a sociedade. E a
globalização, e tudo o que está subjacente a esta palavra e concepção, pacificaram a
existência de uma sociedade internacional.
Nesta mutação, o homem deixou de ser homem para ser representado por
papel. Sua existência não está mais no que "é", mas no que "tem" ou no que pode
"comprovar ser". Surgiram as legislações e as codificações em cada Estado, regulando o
que a comunidade poderia fazer dentro da sociedade. A lei intrincou-se no cerne da
população de tal forma que a comunidade foi relegada a segundo plano.
Em seguida os Estados começaram a se relacionar entre si, assim, as
ciências jurídicas logo resolveram de criar tratados, convenções, princípios... que
regulassem a convivência e as diversas relações existentes entre as sociedade formando
uma autêntica sociedade internacional como está hoje, agrupada em blocos econômicos,
sobrepondo as relações comerciais aos valores culturais da nação, que transcende o
18 ROUSSEAU, Jean Jacques. Do Contrato Social. São Paulo: Hemus, 1997.
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conceito de povo, como já dizia Emmanuel Joseph Sieyès19, em seu clássico Qu'est-ce que
le Tiers État?.
Concluímos por fim, que se constata que o mundo está vivendo um caos
justamente por desprestigiar a sua natureza, seus conceitos primordiais, que estavam bem
alicerçados na arcaica comunidade. E a análise do direito constitucional comparado
demonstra um cenário pessimista, em que os Estados não conseguirão mais romper com o
constitucionalismo liberal reinante do passado e preponderante no presente, de forma que
o Estado social, por exemplo, embora vislumbrado por vários textos constitucionais
apresenta-se como meras folhas de papel no dizer pretérito e atual de Lassalle, que em
nosso entender, apenas uma alteração judicial seria capaz de transformar esta evolução
legal e política de deterioramento das conquistas em prol à dignidade da pessoa humana.
REFERÊNCIAS
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SAFe, 1996.
ARISTOTÉLES, Política. Trad. Mario da Gama Kury. Brasília: UnB, 1997.
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__________. Comentários à Constituição de 1988. 1. v., Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 1990.
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 25. ed., São Paulo:
Saraiva, 2005.
GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Constitucional Comparado. Porto Alegre:
SAFE, 2006.
GUSMÃO, Paulo Dourado de. Manual de Sociologia., 3. ed., Rio de Janeiro: Forense,
1970.
HESSE, Konrad. Escritos de Derecho Constitucional. Madrid: Lael, 1983.
19 Cf. SIEYÈS, Emmanuel Joseph. A Constituinte Burguesa, Trad. Norma Azeredo, 3. ed., Lumem Juris, 1997.
23
KELSEN, Hans. Teoria Geral do Direito e do Estado. Trad. João Baptista Machado. 3.
ed., São Paulo: Martins Fontes, 2000.
LASSALLE, Ferdinand. A Essência da Constituição. 6. ed., Rio de Janeiro: Lumen Júris,
2001.
LOEWENSTEIN, Karl. Teoría de la Constitución. Trad. Alfredo Gallego Anabitarte. 2.
ed., Barcelona: Ariel, 1970.
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introdução. 2. ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2000.
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NASCIMENTO, Tupinambá Miguel C. Comentários à Constituição Federal: princípios
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OLIVEIRA, Odete Maria de. Relações Internacionais: estudos de introdução. Curitiba:
Juruá, 2001.
OLIVEIRA, Olga Maria B. Aguiar de. Monografia Jurídica: orientações metodológicas
para o trabalho de conclusão de curso. Porto Alegre: Síntese, 1999.
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ROUSSEAU, Jean Jacques. Do Contrato Social. São Paulo: Hemus, 1997.
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