comercialização e autonomia no campo

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Os agricultores e agricultoras do Sítio Carretão, situado no distrito de Rajada, município de Petrolina, no Sertão do São Francisco de Pernambuco, fundaram a Associação dos Pequenos Produtores Rurais de Carretão, em 1994. A necessidade de se organizar veio pela dificuldade de comercialização dos seus produtos. No início, a associação contava apenas com 20 associados, mas hoje já são 50 sócios. A primeira conquista dos associados foi a construção da sede, que envolveu diretamente a própria comunidade durante o processo. Iniciamente a maior dificuldade encontrada era conseguir o apoio dos políticos da região, mas ao longo dos anos, os/as agricultores/as perceberam que a associação precisava ficar independente. Para tanto, resolveram somar esforços. Com o tempo algumas conquistas começaram a mudar a realidade da comunidade. A chegada das cisternas, da energia, do transporte coletivo, e recentemente, dos novos equipamentos para casa de farinha comunitária, foram determinantes para o entrosamento e fortalecimento do grupo. Há três anos, a associação começou a ter assessoria técnica do Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA), e com isso passaram a discutir sobre as alternativas e oportunidades de geração de renda. Fruto desse processo surgiu à possibilidade de acesso a vários mercados, inclusive o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), do Governo Federal. Os/as agricultores/as sabiam da existência do programa, mas não como funcionava na prática, dessa maneira, a assessoria técnica foi decisiva para o desenvolvimento do projeto. Na oportunidade se formou um grupo de 16 agricultores/as para fazer o acesso. “A gente considera que o PAA gera renda de forma sustentável, pois os agricultores têm uma consciência ambiental, não é só dinheiro a qualquer custo”, explica Nélio Gurgel, extensionista do IPA. Em 2009 foi elaborado o projeto, e então começaram a entregar para o programa alguns produtos in natura e beneficiados como macaxeira, galinha, carne de bode, ovos, doce de umbu, de leite e de goiaba, além de mel e polpas de frutas. O grupo dividia as responsabilidades, desde o processo de produção e estocagem, passando pela parte burocrática, até a comercialização. A Prefeitura de Petrolina foi parceira no transporte dos produtos, e Pernambuco Ano 5 | nº 125 | setembro | 2011 Petrolina - Pernambuco Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Comercialização e autonomia no campo 1 Agricultores/as fazendo o beneficiamento da carne de bode.

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Page 1: Comercialização e autonomia no campo

Os agricultores e agricultoras do Sítio Carretão, situado no distrito de Rajada, município de Petrolina, no Sertão do São Francisco de Pernambuco, fundaram a Associação dos Pequenos Produtores Rurais de Carretão, em 1994. A necessidade de se organizar veio pela dificuldade de comercialização dos seus produtos. No início, a associação contava apenas com 20 associados, mas hoje já são 50 sócios. A primeira conquista dos associados foi a construção da sede, que envolveu diretamente a própria comunidade durante o processo. Iniciamente a maior dificuldade encontrada era conseguir o apoio dos políticos da região, mas ao longo dos anos, os/as agricultores/as perceberam que a associação precisava ficar independente. Para tanto, resolveram somar esforços.

Com o tempo algumas conquistas começaram a mudar a realidade da comunidade. A chegada das cisternas, da energia, do transporte coletivo, e recentemente, dos novos equipamentos para casa de farinha comunitária, foram determinantes para o entrosamento e fortalecimento do grupo. Há três anos, a associação começou a ter assessoria técnica do Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA), e com isso passaram a discutir sobre as alternativas e oportunidades de geração de renda. Fruto desse processo surgiu à possibilidade de acesso a vários mercados, inclusive o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), do Governo Federal. Os/as agricultores/as sabiam da existência do programa, mas não como funcionava na prática, dessa maneira, a assessoria técnica foi decisiva para o desenvolvimento do projeto.

Na oportunidade se formou um grupo de 16 agricultores/as para fazer o acesso. “A gente considera que o PAA gera renda de forma sustentável, pois os agricultores têm uma consciência ambiental, não é só dinheiro a qualquer custo”, explica Nélio Gurgel, extensionista do IPA. Em 2009 foi elaborado o projeto, e então começaram a entregar para o programa alguns produtos in natura e beneficiados como macaxeira, galinha, carne de bode, ovos, doce de umbu, de leite e de goiaba, além de mel e polpas de frutas. O grupo dividia as responsabilidades, desde o processo de produção e estocagem, passando pela parte burocrática, até a comercialização. A Prefeitura de Petrolina foi parceira no transporte dos produtos, e

Pernambuco

Ano 5 | nº 125 | setembro | 2011Petrolina - Pernambuco

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Comercialização e autonomia no campo

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Agricultores/as fazendo o beneficiamento da carne de bode.

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além do apoio do IPA, o projeto também foi apoiado pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS) e Conselho Municipal de Segurança Alimentar (Consea).

Inicialmente o grupo entregou para seis escolas, fazendo com que 1.784 alunos pudessem ter acesso aos alimentos. No ano seguinte foi preparado outro projeto maior, que incorporou mais produtos, mas ainda estão aguardando a aprovação da proposta. Durante esse período, o grupo também fez entrega dos mesmos produtos ao PAA municipal, e já estão cadastrados para fornecer ao PAA estadual. Apesar do entrave da continuidade do acesso ao programa, a associação ficou conhecida pelo trabalho que desenvolve. Além disso, o reconhecimento público é algo que estimula o grupo, já que os/as agricultores/as envolvidos/as puderam participar de eventos e de feiras, tornando-se uma referência na região. Atualmente o grupo enfrenta dificuldades no que se refere à falta de recursos para armazenamento da matéria prima e aquisição de embalagens e equipamentos. Para eles, a prioridade é a diversificação dos produtos. A ideia é manter um equilíbrio na oferta, ou seja, quando perder em um produto, ganhar em outro.

De acordo com os/as sócios/as, depois que começaram a acessar o PAA, o grupo aprendeu como fazer um bom planejamento, a enxergar o processo de comercialização de maneira mais ampla, além da conscientização ambiental relacionada à produção de alimentos saudáveis, adquirida durante o processo. O aprendizado contribuiu com a prática cotidiana de cada agricultor/a envolvido/a. Apesar do foco do trabalho ser na comercialização, tem-se uma preocupação específica com a segurança alimentar das famílias engajadas. “Hoje eu fico me lembrando do dia que derrubei um pé de imbuzeiro porque eu não achava importante mantê-lo. Se naquela época eu tivesse a consciência que tenho hoje, jamais teria feito isso”, acredita o agricultor José Manoel, conhecido como Guega.

A Escola Malaquias Mendes, situada no Povoado de Atalho, recebeu os produtos do PAA, e considerou importante inserir o ensino contextualizado no currículo escolar. O grupo acredita que o projeto funcionou como um gancho que puxou essa discussão, e outras escolas também manifestaram o desejo de receber os alimentos do grupo do Sítio Carretão. A associação vem discutindo junto com o conselho a viabilização de mini-fábricas nas comunidades, para construir unidades de produção dos alimentos. A perspectiva é que outros grupos sejam incorporados, com a finalidade de criar redes de comercialização na região. Um dos desafios consiste em avançar para outros canais de comercialização como o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), mas, principalmente, acessar outros mercados não institucionais.

A associação já está se empenhando na busca de apoio junto aos setores público e privado. Eles acreditam que a união dos grupos é um caminho interessante, uma vez que, cada um deles tem limitações distintas, portanto não deve haver competição. “Nosso sonho é coletivo, pois a gente deseja fortalecer o grupo cada vez mais para que ele seja autosustentável. Com um capital guardado, os/as agricultores/as terão uma melhor qualidade de vida. Isso tudo não é tão impossível assim, pois quem tem a vontade, tem a metade”, pontua Francisco João, mais conhecido como Chico Carretão, atual presidente da associação.

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Apoio:

www.asabrasil.org.br

Famílias apresentando as variedades de doce produzidas.