cível - ano de 2012

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Sumários de Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça Secções Cíveis Boletim anual – 2012 Assessoria Cível 1 Janeiro Acidente de viação Peão Veículo automóvel Atropelamento Culpa Concorrência de culpa e risco Respostas à base instrutória I - A não demonstração de certo facto da base instrutória (quesito) não autoriza que se tenha por adquirido o seu contrário. II - A imputação do evento a título de culpa pressupõe, por um lado, a verificação de uma relação de desconformidade entre a conduta devida e o comportamento observado pelo autor do facto e, por outro, a possibilidade de formulação de um juízo de censura na imputação desse facto, impendendo sobre o lesado o ónus da prova desses requisitos, salvo se houver presunção legal – art. 487.º, n.º 1, do CC. III - Se o evento se ficou a dever à inobservância das regras de prudência pela vítima, impostas perante o perigo normal do atravessamento de uma via destinada ao trânsito de veículos, sendo que, em contraponto, nada se apurou, na matéria de facto, quanto às condições de circulação do veículo ou ao seu condutor, que sugira contribuição, por via dos riscos próprios inerentes à utilização em curso na circunstância, para a ocorrência do embate (atropelamento), resulta que a conduta da vítima se apresenta, ela mesma, só por si, suficiente e adequada à produção do acidente. IV - Ou seja, o veículo motorizado revela-se, do ponto de vista da sua aptidão geradora de riscos, em termos de causalidade adequada, indiferente ao choque – a não ser sob o (juridicamente indiferente) aspecto puramente naturalístico –, pelo que o acto de imprudente e contraordenacional invasão da faixa de rodagem, no círculo específico de criação de risco conhecido e de verificação previsível, imputável unicamente ao lesado, exclui a responsabilidade objectiva, assente nos perigos ou riscos, de natureza geral, próprios da utilização e circulação da máquina, acolhida no art. 503.º, n.º 1, como previsto no art. 505.º, n.º 1, ambos do CC. V - Em suma, concluindo-se que o atropelamento ocorreu por facto exclusivamente imputável ao peão, sem que tenha havido qualquer contribuição causal dos riscos próprios do veículo, arredada está a implicação da responsabilidade pelo risco e respectivos efeitos. 10-01-2012 Revista n.º 308/2002.P1.S1 - 1.ª Secção Alves Velho (Relator) Paulo Sá Garcia Calejo Acidente de viação Morte Cônjuge Alimentos Danos patrimoniais Danos futuros Danos não patrimoniais Cálculo da indemnização

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  • Sumrios de Acrdos do Supremo Tribunal de Justia Seces Cveis

    Boletim anual 2012 Assessoria Cvel

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    Janeiro Acidente de viao Peo Veculo automvel Atropelamento Culpa Concorrncia de culpa e risco Respostas base instrutria I - A no demonstrao de certo facto da base instrutria (quesito) no autoriza que se tenha por

    adquirido o seu contrrio. II - A imputao do evento a ttulo de culpa pressupe, por um lado, a verificao de uma relao

    de desconformidade entre a conduta devida e o comportamento observado pelo autor do facto e, por outro, a possibilidade de formulao de um juzo de censura na imputao desse facto, impendendo sobre o lesado o nus da prova desses requisitos, salvo se houver presuno legal art. 487., n. 1, do CC.

    III - Se o evento se ficou a dever inobservncia das regras de prudncia pela vtima, impostas perante o perigo normal do atravessamento de uma via destinada ao trnsito de veculos, sendo que, em contraponto, nada se apurou, na matria de facto, quanto s condies de circulao do veculo ou ao seu condutor, que sugira contribuio, por via dos riscos prprios inerentes utilizao em curso na circunstncia, para a ocorrncia do embate (atropelamento), resulta que a conduta da vtima se apresenta, ela mesma, s por si, suficiente e adequada produo do acidente.

    IV - Ou seja, o veculo motorizado revela-se, do ponto de vista da sua aptido geradora de riscos, em termos de causalidade adequada, indiferente ao choque a no ser sob o (juridicamente indiferente) aspecto puramente naturalstico , pelo que o acto de imprudente e contraordenacional invaso da faixa de rodagem, no crculo especfico de criao de risco conhecido e de verificao previsvel, imputvel unicamente ao lesado, exclui a responsabilidade objectiva, assente nos perigos ou riscos, de natureza geral, prprios da utilizao e circulao da mquina, acolhida no art. 503., n. 1, como previsto no art. 505., n. 1, ambos do CC.

    V - Em suma, concluindo-se que o atropelamento ocorreu por facto exclusivamente imputvel ao peo, sem que tenha havido qualquer contribuio causal dos riscos prprios do veculo, arredada est a implicao da responsabilidade pelo risco e respectivos efeitos.

    10-01-2012 Revista n. 308/2002.P1.S1 - 1. Seco Alves Velho (Relator) Paulo S Garcia Calejo Acidente de viao Morte Cnjuge Alimentos Danos patrimoniais Danos futuros Danos no patrimoniais Clculo da indemnizao

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    I - Quando o cnjuge (sobrevivo) reclama indemnizao por danos futuros reportados perda para sempre da contribuio material do outro cnjuge, falecido em acidente de viao, tal significa que est a reclamar junto de terceiro, nos termos do art. 495., n. 3, do CC, os alimentos, expresso da contribuio para os encargos da vida familiar que podia exigir ao falecido marido e a que este estava vinculado (cf. arts. 1672., 1675. e 2003., todos do CC).

    II - Uma tal indemnizao sempre devida, independentemente da efectiva necessidade do outro cnjuge, pois os cnjuges, no seio da comunho conjugal, no podem deixar de contribuir para os encargos da vida familiar, na proporo das respectivas possibilidades.

    III - Se data do acidente (17-03-2006) a vtima contribua com o seu vencimento para o sustento do seu agregado familiar, composto por si e pelas autoras (a sua mulher, de 34 anos de idade, e a sua filha, de 8 anos de idade), perfazendo tal rendimento o montante de 21 416,04 anuais, a esse valor anual h que abater um tero, montante que se presume que o falecido disporia para os seus gastos pessoais, pelo que restaria a contribuio anual de 14 277,36 para os encargos da vida familiar. Ponderando que a idade da vtima, data do acidente, era de 35 anos de idade, sendo de estimar que ainda trabalharia mais 35 anos (vida activa at aos 70 anos), no olvidando que a indemnizao arbitrada, representando a entrega imediata de um determinado capital, de uma s vez, susceptvel de produzir rendimentos de que as autoras imediatamente podem usufruir, e atendendo, ainda, s evolues salariais, s taxas de juro e da inflao e os ganhos de produtividade por progresso na carreira, julga-se equitativa (art. 566., n. 3, do CC) a fixao da indemnizao pelo dano patrimonial futuro no valor de 250 000.

    IV - Estando provado que o falecido vivia estavelmente com a sua famlia e amava profundamente a sua mulher e filha; que a filha teve de receber apoio psicolgico para a ajudar a superar a morte do pai; que a viva perdeu o carinho, o apoio e a companhia do marido, vendo ruir o seu casamento e o feliz projecto de vida em comum que o mesmo representava, ficando sozinha, com o encargo de providenciar pela educao, formao e assistncia da filha, julga-se equitativo fixar a compensao pelo dano no patrimonial da viva no valor de 40 000 e o da filha em 35 000.

    10-01-2012 Revista n. 4524/06.8TBBCL.L1.S1 - 6. Seco Azevedo Ramos (Relator) Silva Salazar Nuno Cameira Aco de reivindicao Posse Mera deteno Usucapio Corpus Animus possidendi Presunes legais I - Tem-se entendido que prevalece, no nosso direito, a concepo subjectiva da posse. Nesta

    concepo a posse integrada por dois elementos (art. 1251. do CC): a) o corpus, que consiste no domnio de facto sobre a coisa; b) o animus, que a inteno de exercer sobre a coisa, como seu titular, o direito real correspondente quele domnio de facto.

    II - Traduzindo-se o animus possidendi num elemento de natureza psicolgica, a respectiva prova reveste-se de grande dificuldade. Por isso, para facilitar a prova do animus, a lei estabeleceu no citado art. 1252., n. 2, do CC, uma importante presuno de posse a favor de quem tem o poder de facto.

    III - A posse distingue-se da mera deteno; os meros detentores ou possuidores precrios no podem adquirir por usucapio art. 1253. do CC.

    IV - In casu, como a posse (com corpus e animus) para efeito da aquisio do solo, por usucapio, por parte dos rus/recorrentes, s se iniciou em 14-04-1993, e o respectivo prazo em curso de interrompeu em 16-05-2007, com a citao para a presente aco (arts. 1292. e 323., n. 1, do

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    CC), quando apenas tinham decorrido 14 anos e 2 dias, manifesto que os rus no podem ter adquirido o solo por usucapio cf. art. 1296. do CC.

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    do CPC (cf., tambm, arts. 490., n. 2, e 514., n.s 1 e 2, do CPC), o STJ no pode deixar de contemplar, unicamente, a factualidade que vem fixada das instncias, qual as alegaes e concluses extradas pelo recorrente se devem, exclusivamente, ater, no podendo as mesmas ser objecto de analise e ponderao, na parte que extravasem tal limitado mbito.

    II - No domnio da responsabilidade contratual, tendo o recorrente (empreiteiro) a qualidade de devedor da prestao a que se vinculou, por via de contrato de empreitada, no tendo o mesmo ilidido a presuno de culpa do cumprimento defeituoso daquela prestao, decorrente do preceituado no art. 799., n. 1, do CC, tem de ter-se por provada, definitiva e inexoravelmente, tal culpa cf. arts. 349. e 350., n. 1, ambos do CC.

    10-01-2012 Revista n. 2143/07.0TBVCD.P1.S1 - 6. Seco Fernandes do Vale (Relator) Marques Pereira Azevedo Ramos Contrato de mtuo Nulidade do contrato Enriquecimento sem causa Abertura de conta Depsito bancrio Conta solidria nus da prova I - Se o autor qualificou a relao jurdica estabelecida entre ele e o ru como um contrato de

    mtuo, que logo considerou nulo por falta de forma independentemente de tal qualificao no vincular o tribunal (art. 664. do CPC) , seria ele a ter o nus da prova de que entre ambos foi celebrado o contrato invocado como causa de pedir arts. 342., n. 1, 1142., 1143. e 1145., n. 1, do CC.

    II - O enriquecimento sem causa, que visa evitar que algum avantaje o seu patrimnio custa de outrem, sem motivo que o justifique, integra, nos termos do art. 473., n. 2, do CC, trs situaes: a) o que foi indevidamente recebido (condictio indebiti); b) o que foi recebido em virtude de causa que deixou de existir (condictio ob causam finitam); e, c) o que foi recebido com base em efeito que no se verificou (condictio causa data causa non secuta ou condictio ob rem).

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    III - A abertura de conta num Banco e os depsitos pecunirios nela efectuados, exprimem a existncia de um contrato de depsito bancrio que um contrato real, cuja perfeio s se objectiva atravs da prtica material da entrega de dinheiro, no sendo suficiente o mero acordo entre os depositantes e o banco depositrio.

    IV - Aquele que pretende afirmar a propriedade exclusiva do dinheiro depositado em contas bancrias solidrias, tem de ilidir a presuno constante do art. 516. do CC, ou seja, que os valores pecunirios pertencem em partes iguais aos contitulares.

    10-01-2012 Revista n. 467/2002.L1.S1 - 6. Seco Fonseca Ramos (Relator) Salazar Casanova Fernandes do Vale Insolvncia Resoluo em benefcio da massa insolvente Estabelecimento comercial Trespasse Subarrendamento I - O regime jurdico da resoluo em benefcio da massa insolvente est previsto nos arts. 120. a

    126. do CIRE, e neles se regulam os termos em que podem ser resolvidos em benefcio da massa insolvente os actos praticados pelo insolvente antes da declarao de insolvncia, com um alcance maior do que era previsto no CPEREF, de tal forma que o instituto da resoluo passou a assumir o papel que anteriormente era atribudo impugnao pauliana.

    II - Pressuposto do trespasse (cf. art. 115. do RAU, vigente data do contrato) a existncia de um estabelecimento comercial ou industrial, ou seja, de uma empresa. Inerem ao conceito as suas componentes corpreas e incorpreas, enquanto elementos imprescindveis ao conceito de organizao econmica, ou seja, o complexo de bens que interagem no mercado visando a obteno de lucros.

    III - Se, no caso concreto, a trespassante afirma, desde logo, que no proprietria dos bens e equipamentos existentes no estabelecimento, o que transmitido o contrato de arrendamento, j que o estabelecimento alegadamente existente no imvel arrendado trespassante no integra bem seu, pelo que o aludido contrato mais no que um contrato de subarrendamento, que no um contrato de trespasse, tal como as partes outorgantes o denominaram.

    IV - Se o acto em causa fosse aceite pela liquidatria, a falida seria afectada no seu patrimnio pelo facto de ficar privada das rendas devidas pela locatria e, perante o acto lesivo da massa falida, assistiu liquidatria o direito de resolver o contrato apodado de trespasse, mas que, em bom rigor, foi um contrato de subarrendamento.

    10-01-2012 Revista n. 784/03.4TBMR-H.C1.S1 - 6. Seco Fonseca Ramos (Relator) Salazar Casanova Fernandes do Vale Reformatio in pejus Reclamao Objecto do recurso I - A reformatio in pejus contempla to s as situaes em que o recorrente, no se conformando

    com uma parte da deciso, recorre para obter ganho na parte em que ficou vencido. Com esse

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    instituto pretende o legislador salvaguardar o direito ao recurso e evitar que em deciso de um tribunal superior o recorrente veja prejudicada a sua posio.

    II - No estando o tribunal de recurso obrigado e vinculado a nenhum caso julgado parcial no est obrigado a limitar a cognoscibilidade do recurso a uma parcela da deciso ou a uma parte da alegao. A alegao e as respectivas concluses que delimitam o objecto do recurso adquirem plenitude e o tribunal de recurso no tem poderes para as limitar, sob pena de infringir o princpio da plena cognoscibilidade do recurso.

    10-01-2012 Incidente n. 213/05.9TBVLN.G1.S1 - 1. Seco Gabriel Catarino (Relator) Sebastio Pvoas Alves Velho guas Usucapio Servido Incompatibilidade de pedidos Sustentando-se que ocorreu aquisio do direito utilizao e explorao de guas por usucapio,

    sendo, por isso, essas guas bem prprio, resulta juridicamente incompatvel a defesa da ocorrncia de uma servido de guas, pois esta pressupe a existncia de guas de propriedade alheia (vide arts. 1543. e 1557. e segs. do CC, para onde remete o art. 30. da Lei n. 68/93, de 04-09).

    10-01-2012 Revista n. 392/05.5TBTND.C1.S1 - 1. Seco Garcia Calejo (Relator) Helder Roque Gregrio Silva Jesus Contrato de seguro Seguro automvel Tomador Declarao inexacta Anulabilidade Oponibilidade Lesado Indemnizao Juros de mora Actualizao I - O art. 14. do DL n. 522/85, de 31-12, estabelece que as anulabilidades do contrato de seguro

    automvel s podero ser opostas a terceiros, desde que sejam estabelecidas no prprio diploma; ou seja, que a anulabilidade decorra dos termos daquele diploma.

    II - Daqui resulta que qualquer outro vcio gerador da anulabilidade do contrato, previsto na lei geral ou em qualquer norma especial, no poder ser aposto aos lesados.

    III - Como tal, no poder a seguradora invocar e opor aos lesados a anulabilidade do contrato, decorrente da violao, pela tomadora do seguro, do disposto no art. 429. CCom. S poderia opor aos lesados as anulabilidades e excluses resultantes do prprio diploma (e desde que anteriores data do sinistro).

    IV - Se a indemnizao fixada tiver sido objecto de actualizao, de harmonia com o disposto no art. 566., n. 2, do CC, vence juros de mora, somente, a partir da data da deciso

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    actualizadora. Porm, se essa indemnizao no tiver sido actualizada, os juros moratrios devero ser contabilizados desde a citao.

    10-01-2012 Revista n. 734/07.9TBCBT.G1.S1 - 1. Seco Garcia Calejo (Relator) Helder Roque Gregrio Silva Jesus IRS Documento particular Valor probatrio Poderes do Supremo Tribunal de Justia Baixa do processo ao tribunal recorrido Ampliao da matria de facto Contradio insanvel I - As declaraes fiscais so documentos particulares (arts. 369. e 373., n. 1, do CC), sendo a

    sua probatria respeitante to s materialidade das declaraes nelas contidas e no sua veracidade.

    II - As declaraes fiscais tm como destinatrio a administrao fiscal, sendo prestadas no mbito de relaes jurdicas fiscais. Como a seguradora estranha a tais documentos, as declaraes deles constantes apenas podero valer como elementos de prova a apreciar livremente pelo tribunal (art. 361. do CC).

    III - O art. 729., n. 3, do CPC, aplicvel quando o STJ conclui que no est em condies de poder cumprir a sua especfica tarefa de controlar o aspecto jurdico das decises das instncias, por carecer de ser ampliada a matria de facto ou haver nela contradio essencial.

    10-01-2012 Revista n. 884/07.1TBPDL.L1.S1 - 1. Seco Gregrio Silva Jesus (Relator) Martins de Sousa Gabriel Catarino Actividades perigosas Responsabilidade pelo risco EPAL guas guas subterrneas I - A directiva genrica do legislador, constante do art. 493., n. 3, do CC, prope que a definio

    das actividades perigosas passe pela sua perigosidade intrnseca, aferida, a priori, perante a sua especial aptido para produzir danos, atravs da sua prpria natureza ou da natureza dos meios utilizados, e no, propriamente, em funo dos resultados danosos, em caso de acidente, muito embora a magnitude destes possa evidenciar o grau de perigosidade ou o risco dessa actividade.

    II - A actividade de conduo de gua, mesmo em meio subterrneo, em alta presso, a circular em condutas de beto, desenvolvida pela EPAL, pela frequncia e consequncias desastrosas a que, por via de regra, esto associados os acidentes que a envolvem, contm em si prpria, o perigo de causar danos a terceiros, devendo ser considerada uma actividade cujo exerccio importa, de acordo com as circunstncias do caso, um especial grau de perigosidade e, portanto, uma actividade, potencialmente, perigosa, susceptvel de causar danos.

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    Incidente n. 609/1999.L1.S1 - 1. Seco Helder Roque (Relator) * Gregrio Silva Jesus Martins de Sousa Contrato-promessa de compra e venda Incumprimento do contrato Interpelao admonitria Mora do credor Fixao judicial do prazo Incumprimento definitivo Resoluo do negcio I - O devedor falta, culposamente, ao cumprimento da prestao debitria, no s quando a mesma

    se torna invivel, como, tambm, quando a sua realizao se demonstra incontrolvel, por vontade daquele, como acontece quando comunica ao credor, de forma categoria e inequvoca, que s celebra o contrato prometido, por um preo diverso e superior ao convencionado, na inteno de o no cumprir pelo valor acordado.

    II - O instituto da interpelao admonitria pressupe que o credor ainda tem interesse na prestao, ou seja, que se est perante uma situao de mora e no de incumprimento definitivo.

    III - O instituto da interpelao admonitria no de aplicar, analogicamente, mora do credor, sendo a tutela do interesse legtimo do devedor em no permanecer, indefinidamente, vinculado obrigao garantida ao mesmo pelo deferimento ao tribunal da fixao de um prazo para que o credor realize a cooperao necessria ao cumprimento da prestao devida

    IV - Nos contratos bilaterais, o direito de resoluo funciona como uma constante, nos casos de impossibilidade culposa do devedor, isto , em situaes de incumprimento definitivo, em que a prestao j no possvel ou perdeu a sua razo de ser para o credor.

    V - Dependendo o direito de resoluo do contrato de um fundamento que consiste no facto do incumprimento ou numa situao de inadimplncia, no lcito ao promitente faltoso invocar o seu prprio incumprimento como sustentculo da resoluo, pois que apenas o contraente fiel tem legitimidade resolutiva.

    10-01-2012 Revista n. 387/05.9TBVLP.P1.S1 - 1. Seco Helder Roque (Relator) * Gregrio Silva Jesus Martins de Sousa Contrato de compra e venda Coisa defeituosa Vcios da coisa Denncia Empreiteiro Reconhecimento do direito Reparao do dano I - O regime da venda de coisa defeituosa pressupe que a venda seja realizada e a propriedade da

    coisa logo transmitida ao comprador, sofrendo a mesma, ao tempo da celebrao do contrato, de vcios ou carecendo das qualidades a que alude o art. 913. do CC, quer a coisa entregue corresponda, quer no prestao a que o vendedor se encontra vinculado.

    II - O accionamento da responsabilidade pela venda de coisas defeituosas importa que, previamente, seja efectuada a denncia do defeito, a qual, porm, se torna desnecessria, por intil, se o vendedor, aps a entrega da coisa, reconhecer a existncia do mesmo.

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    III - O comportamento do empreiteiro que sempre assumiu a necessidade da reparao das deficincias verificadas na fraco predial vendida, mas, simultaneamente, sempre a protelou com promessas da sua realizao futura, deve ser entendido com o significado de uma declarao, clara e inequvoca, de aceitao e do reconhecimento do seu cumprimento defeituoso e do inerente dever de reparao, causa impeditiva da caducidade do direito propositura da aco.

    10-01-2012 Revista n. 8500/05TBBRG.G1.S1 - 1. Seco Helder Roque (Relator) * Gregrio Silva Jesus Martins de Sousa Contrato de mtuo Contrato de crdito ao consumo Livrana em branco Nulidade do contrato Nulidade por falta de forma legal Formalidades ad substantiam Formalidades essenciais Princpio da confiana Abuso do direito Venire contra factum proprium I - Em matria de nulidade dos negcios jurdicos celebrados contra a lei, impe-se registar dois

    princpios fundamentais, quais sejam, em primeiro lugar, que as formalidades legais de qualquer declarao so, por via de regra, formalidades ad substantiam, e, em segundo lugar, que a inobservncia da forma legal da declarao negocial s origina a nulidade, quando outra no seja a sano, especialmente, prevista na lei.

    II - Na verdade, existe sano diversa da nulidade para a inobservncia da forma legal da declarao negocial, mesmo sem texto que assim o declare, quando dos termos da norma ou de quaisquer outros factores atendveis na sua interpretao, se possa concluir, com suficiente grau de probabilidade, resultar pouco adequada a sano da nulidade, atendendo aos interesses em presena e ao fim prosseguido pelo legislador, como reaco, em determinada situao, violao de uma norma injuntiva.

    III - Na base da tutela conferida pelo instituto do abuso de direito encontra-se a reaco contra o propsito exclusivo de criar outra parte uma situao lesiva, atravs do funcionamento da lei.

    IV - Por fora do princpio utile per inutile non vitiatur, no deve o negcio jurdico ser anulado, s por ter infringido um determinado preceito legal, quando dessa violao no resulta qualquer leso, real e efectiva, dos interesses e valores protegidos pela norma, como acontece quando o obrigado cumpre catorze das primeiras setenta e duas prestaes do mtuo bancrio, como se o contrato estivesse perfeito, vlido e, plenamente, eficaz, no obstante a falta de entrega de um exemplar do mesmo, por ocasio da celebrao do contrato, cuja nulidade vem invocar, na oposio execuo.

    V - No pode exercer um direito quem, luz do princpio da confiana, actue por forma a convencer que aceita certo comportamento e, ao fim de mais de um ano de cumprimento de um contrato com a durao de seis anos, pretende destrui-lo, por incorrer em abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.

    VI - A tutela da confiana justifica, em situaes excepcionais, a invocao da exceptio doli contra a alegao de nulidades formais contrrias boa f.

    VII - No mbito das relaes imediatas, compete ao subscritor de uma livrana, accionado pelo seu portador, que se pretende defender contra o mesmo com a excepo do preenchimento abusivo, o respectivo nus da prova, sob pena de o facto impeditivo do efeito jurdico dos factos articulados pelo exequente, em que se consubstancia o preenchimento abusivo do ttulo,

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    no se ter produzido, e de dever aceitar que o mesmo foi efectuado, correctamente, sem violentar a vontade do seu subscritor.

    10-01-2012 Revista n. 5664/06.9YYPRT-A.P1.S1 - 1. Seco Helder Roque (Relator) * Gregrio Silva Jesus Martins de Sousa Sociedade annima Assembleia Geral Convocatria Ordem de trabalhos Deliberao da Assembleia Geral Direito de voto Votao Aces Anulao de deliberao social Nulidade de acrdo Omisso de pronncia I - Do conceito de questes, a que alude o n. 2, do art. 660., do CPC, que se relaciona com a

    definio do mbito do caso julgado e com a nulidade por omisso de pronncia, excluem-se as questes prvias ou prejudiciais ao conhecimento do mrito, mas, tambm, os raciocnios, argumentos, razes, consideraes, pressupostos ou fundamentos produzidos pelas partes para a defesa dos seus pontos de vista que, podendo constituir questes, em sentido lgico ou cientfico, no integram matria de deciso jurisdicional.

    II - A anulabilidade da deliberao que rejeitou submeter a votao da assembleia geral a proposta de um accionista, determinando o seu desaparecimento da ordem societria, implica, consequentemente, que a assembleia fique subordinada ao assunto definido pela ordem do dia constante do respectivo aviso convocatrio, com repetio dos trabalhos, que sero retomados com referncia ao momento em que ocorreu o vcio determinante da anulabilidade verificada, sem necessidade de uma deliberao substitutiva, nem de condenao expressa da r-sociedade nesse sentido, observando a nova assembleia a ordem do dia, previamente, estabelecida, que se mantm, vlida e regular.

    III - No podem ser excludas do direito de voto as aces que, data da deliberao social anulanda, faziam parte da carteira de ttulos do accionista, alegadamente, impedido de participar na votao, sendo certo que s podero discutir e votar na futura assembleia geral que vier a ser convocada, onde o eventual impedimento poder ser deduzido, aqueles que detiverem o estatuto de accionistas, de acordo com a lei e o contrato social.

    IV - O impedimento do accionista em participar na votao de uma proposta no constitui inibio do direito de voto do capital social por ele, anteriormente, detido, e cuja transmisso para outrem se operou, dada a natureza das aces ao portador que, na sua totalidade, o compunham.

    V - A votao da colectividade dos scios que rejeitou submeter uma proposta a deliberao da assembleia uma inequvoca deliberao dos scios, e no uma mera deciso, sendo certo que inexistem decises colectivas dos accionistas reunidos em assembleia geral que no se compreendam no conceito de deliberaes dos scios.

    VI - A inutilizao da deliberao negativa, atravs da aco de impugnao judicial, apenas conduz restaurao da situao anterior, sem que tal signifique, necessariamente, a converso da deliberao negativa em deliberao positiva.

    VII - As menes do aviso convocatrio no requerem um grau de pormenor to elevado como o que se exige para as propostas a apresentar assembleia, sendo suficiente a identificao do thema deliberandum, de forma directa e acessvel, de modo a permitir aos interessados os

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    elementos mnimos de informao que lhes permitam conhecer, de modo satisfatrio, a concreta questo sobre que se dever deliberar.

    VIII - A incluso como ponto suplementar da ordem do dia da assembleia de uma proposta de declarao de anulao dos actos praticados pelos administradores no extravasa o mbito do assunto objecto da convocatria, que consistia na apreciao e posicionamento das iniciativas empreendidas pelo conselho de administrao da sociedade, relativamente execuo de uma deliberao tomada em assembleia geral pretrita, no constituindo, portanto, uma questo nova ou desprovida de clareza suficiente.

    IX - S a impugnao judicial do contedo de deliberaes substantivas da assembleia-geral de uma sociedade e no a impugnao do procedimento de deliberaes instrumentais aquelas conducentes constitui matria da reserva exclusiva dos tribunais.

    X - No relevando na motivao da rejeio da proposta apresentada por um accionista votao da respectiva assembleia um determinado fundamento, atento o teor da deliberao impugnada, no pode o mesmo relevar, em sede de recurso jurisdicional, por tal constituir violao do princpio da proibio do efeito surpresa das decises.

    10-01-2012 Revista n. 515/07.0TBAGD.C1.S1 - 1. Seco Helder Roque (Relator) * Gregrio Silva Jesus Martins de Sousa Transporte internacional de mercadorias por estrada TIR Conveno CMR Perda das mercadorias Furto Responsabilidade contratual Limite da indemnizao nus da prova Facto extintivo Facto modificativo Sub-rogao Incio da prescrio I - Assentando a sub-rogao, enquanto fonte da transmisso de um crdito, no facto jurdico do

    cumprimento, o prazo prescricional de curta durao, previsto no art. 498., n. 1, do CC, apenas se inicia, no que se refere ao direito de reembolso, com o pagamento efectuado ao lesado.

    II - De acordo com o disposto nos arts. 3. e 17., n. 1, da Conveno CMR, o transportador responsvel pela perda total ou parcial da mercadoria transportada, mesmo que essa perda derive de actos ou omisses dos seus agentes a cujos servios recorra, sem prejuzo do preceituado no n. 2 do art. 17. (O transportador fica desobrigado desta responsabilidade se a perda, avaria ou demora teve por causa uma falta do interessado, uma ordem deste que no resulte de falta do transportador, um vcio prprio da mercadoria, ou circunstncias que o transportador no podia evitar e a cujas consequncias no podia obviar).

    III - A causa de excluso da responsabilidade correspondente a situaes de caso fortuito ou de fora maior refere-se aos casos em que a conduta do transportador ou dos seus agentes absolutamente impotente para evitar tal consequncia nefasta.

    IV - No caso vertente, tendo em conta a natureza da mercadoria transportada, material informtico de elevado valor, e a frequncia com que ocorrem furtos em veculos de transporte rodovirio de mercadorias, no prudente o uso de uma simples proteco de lona, facilmente cortvel ou removvel, para evitar eventual subtraco daquela mercadoria. Por outro lado, no foi utilizada a diligncia exigvel a um profissional que, numa rea de servio anexa a uma auto-estrada espanhola, dorme tranquilamente no veculo tractor enquanto algum procede

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    retirada das embalagens de 431 monitores informticos contidos no atrelado do mesmo veculo, apropriando-se dos mesmos, tudo sem perturbar o sono do motorista.

    V - A distribuio do nus da prova, prevista no art. 342. do CC, corresponde ao critrio da normalidade que serve de princpio orientador nesta matria, nos termos do qual, quem invoca um direito, deve provar os factos que normalmente o integram; a parte contrria, por seu lado, dever provar os factos anormais, ou seja, aqueles que excluem ou impedem a eficcia dos primeiros.

    VI - A limitao ao direito de indemnizao, constante do art. 23., n. 2, da Conveno CMR (A indemnizao no poder, porm, ultrapassar 8,33 unidades de conta por quilograma de peso bruto em falta), funciona como um impedimento ou uma modificao do direito indemnizao fixada de acordo com o n. 1 daquele preceito legal , pelo que ter a natureza de uma excepo modificativa da obrigao em causa e como tal dever ser alegada e provada nos seus elementos factuais pelo interessado na sua verificao ou seja, o transportador responsvel, ao abrigo do n. 2 do art. 342. do CC.

    10-01-2012 Revista n. 4631/07.0TVLSB.L1.S1 - 6. Seco Joo Camilo (Relator) Fonseca Ramos Salazar Casanova Elevador Responsabilidade extracontratual Actividades perigosas Causa do acidente Culpa Direito indemnizao Prescrio Crime I - A actividade de conservao e manuteno de elevadores no qualificvel, em si mesma ou

    por natureza, como actividade perigosa. II - Resulta do Decreto n. 513/70, de 30-10, com as alteraes introduzidas pelo Decreto

    Regulamentar n. 13/80, de 16-05 Regulamento de Segurana de Elevadores Elctricos , que as portas de patamar devero possuir dispositivos de encravamento seguros que permitam que todas elas permaneam permanentemente encravadas com excepo daquela que esteja situada no patamar onde a cabine esteja estacionada e que devero ser munidas de dispositivos de controlo de encravamento e de fecho de portas de patamar que garantam quer o referido encravamento permanente, quer a impossibilidade de incio de movimento se todas as portas no estiverem encravadas (cf. arts. 39., n. 1, e 40.).

    III - Viola as regras de segurana o facto da vtima ter tido a possibilidade de proceder abertura da porta do ascensor num patamar sem que a cabine do ascensor ali estivesse estacionada, caindo na caixa do ascensor, existindo evidente nexo de causalidade adequada entre o incumprimento daquelas normas de segurana e o acidente.

    IV - Estando-se no domnio da responsabilidade civil extracontratual, se daquele acidente, ocorrido em 24-08-2001, resultaram leses fsicas enquadrveis ( data) na prtica do crime de ofensas corporais por negligncia, p. e p. pelo art. 148., n. 1, do CP, sendo o prazo de prescrio do procedimento criminal de 5 anos, nos termos daquele preceito e do art. 118., n. 1, al. c), do CP, tendo a r sido citada a 03-04-2006, no decorreu o prazo prescricional do direito de indemnizao, atendendo ao estatudo no art. 498., n. 3, do CC, sendo irrelevante o facto das consequncias das infraces ao Regulamento de Segurana de Elevadores ser de natureza contraordenacional (uma coisa a constatao administrativa dessas infraces e outras as consequncias decorrentes para terceiros de acidentes provocados por essas infraces).

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    Revista n. 863/06.6TBFAF.G1.S1 - 1. Seco Mrio Mendes (Relator) Sebastio Pvoas Moreira Alves Poderes do Supremo Tribunal de Justia Omisso de pronncia Baixa do processo ao tribunal recorrido Nas situaes de nulidade por omisso de pronncia s poder ter lugar uma interpretao restritiva

    do n. 2 do art. 731. do CPC, nos casos em que o STJ tiver bvios fundamentos para revogar o decidido, independentemente da apreciao da questo omitida.

    10-01-2012 Revista n. 991/08.3TJVNF.P1.S1 - 1. Seco Mrio Mendes (Relator) Sebastio Pvoas Moreira Alves Presunes judiciais Poderes do Supremo Tribunal de Justia O STJ s pode sindicar o uso de presunes judiciais pela Relao no sentido de averiguar se essa

    actividade ofende qualquer norma legal, se padece de alguma ilogicidade ou se parte de factos no provados.

    10-01-2012 Revista n. 466/06.5TCGMR.G1.S1 - 6. Seco Marques Pereira (Relator) Azevedo Ramos Silva Salazar Contrato-promessa de compra e venda Resoluo do negcio Incumprimento definitivo Mora Restituio do sinal Comportamento concludente Perda de interesse do credor I - Segundo doutrina e jurisprudncia, hoje, quase uniformes, s o incumprimento definitivo

    justifica a resoluo do contrato-promessa bem como a exigncia do sinal em dobro ou a perda do sinal passado, pois a simples mora no pode ter tal consequncia.

    II - Chegada ao conhecimento do devedor declarao resolutiva do contrato, esta opera seus efeitos, independentemente, de ser lcita ou ilcita, pelo que esse mesmo devedor j no pode cumprir e o prprio credor deixa de poder exigir o cumprimento.

    III - O comportamento do promitente-comprador, ao tomar a iniciativa de, primeiro, e, preliminarmente, a esta aco, comunicar aos rus a resciso do contrato e deles exigir o sinal em dobro e, posteriormente, prop-la, formulando essas mesmas pretenses, manifesta, implicitamente, de forma clara, sria e inequvoca, a sua inteno de no cumprir a sua parte no contrato.

    IV - Quando o devedor toma atitudes ou comportamentos que revelem inequivocamente, a inteno de no cumprir a prestao a que se obrigou, porque no quer ou no pode, o credor no tem de esperar pelo vencimento da obrigao (se ainda no ocorreu), no tem de alegar e provar a

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    perda de interesse na prestao do devedor, nem o tem de interpelar admonitoriamente, para ter por no cumprida a obrigao.

    10-01-2012 Revista n. 25/09.0TBVCT.G1.S1 - 1. Seco Martins de Sousa (Relator) * Gabriel Catarino Sebastio Pvoas Recurso de apelao Impugnao da matria de facto Reapreciao da prova Duplo grau de jurisdio Gravao da prova Poderes da Relao Matria de direito Poderes do Supremo Tribunal de Justia I - O desiderato do duplo grau de jurisdio s pode ser completamente conseguido se a Relao

    perante o exame e anlise crtica da prova produzida a respeito dos pontos de facto impugnados, eventualmente contextualizados com a prova global disponvel, puder formar a sua prpria convico.

    II - Consequentemente, em sede de reapreciao da prova gravada, nos termos do disposto nos arts. 690.-A, n. 5, e 712., n. 1, al. a) (ltima parte), e n. 2, do CPC, impe-se Relao que analise criticamente as provas indicadas em fundamento da impugnao, seja prova testemunhal, documental, pericial ou decorrente inspeco ao local pelo prprio tribunal da 1. instncia, conjugando-as entre si, contextualizando-a, se necessrio, no mbito da demais prova disponvel, de modo a formar a sua prpria e autnoma convico, que deve ser devidamente fundamentada.

    III - O STJ pode apreciar se, verificando-se os pressupostos que condicionam a reapreciao da deciso de facto pela 2. instncia, ocorreu reapreciao deficiente ou incorrecta por violao da lei processual que a disciplina, por se tratar de matria de direito.

    IV - No se trata, por conseguinte, de sindicar a valorao efectuada pela Relao dos meios probatrios disponveis, ao abrigo do princpio da livre apreciao da prova de que dispe a 2. instncia em sede de reapreciao (quanto a isso, nem seria admissvel recurso art. 712., n. 6, do CPC), mas de averiguar se a Relao, no seu labor reapreciativo da matria de facto, violou ou no a lei processual que disciplina o exerccio desse poder-dever de garantir um duplo grau de jurisdio em matria de facto.

    10-01-2012 Revista n. 1452/04.5TVPRT.P1.S1 - 1. Seco Moreira Alves (Relator) Alves Velho Paulo S Unio de facto Morte Segurana Social Penso de sobrevivncia Alimentos Requisitos Aplicao da lei no tempo

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    I - luz do regime institudo pelo DL n. 322/90, de 18-10, Decreto Regulamentar n. 1/94, de 18-01, e Lei n. 7/2001, de 11-05 (na redaco anterior Lei n. 23/2010, de 30-08) para que o membro sobrevivo de uma relao de facto tivesse direito s prestaes sociais do regime geral da segurana social decorrente do bito do companheiro(a) beneficirio(a), tinha de provar, cumulativamente, os seguintes requisitos, tidos como elementos constitutivos do direito: 1. que vivia com o beneficirio falecido h mais de dois anos em condies anlogas s dos cnjuges; 2. que o beneficirio falecido era pessoa, no casada, ou, sendo casada, se encontrava separada judicialmente de pessoas e bens; 3. que o companheiro sobrevivo carecia de alimentos; e, 4. que os no podia obter de nenhuma das pessoas referidas nas als. a) a d) do art. 2009. do CC, nem da herana do falecido companheiro, quer porque no existiam bens, quer porque, a existirem, eram insuficientes.

    II - A Lei n. 23/2010 veio introduzir importantes alteraes na Lei n. 7/2001, designadamente, mantendo o direito de acesso s prestaes sociais em causa, estabelecendo que o membro sobrevivo da unio de facto tem direito prestao por morte, segundo o regime geral ou especial da segurana social, independentemente da necessidade de alimentos, bastando provar a unio de facto h mais de dois anos data da morte do beneficirio cf. art. 6. da Lei n. 7/2001, na redaco introduzida pelo art. 1. da Lei n. 23/2010.

    III - O bito do beneficirio o elemento determinante do direito atribuio da penso de sobrevivncia e subsdio por morte, no sendo elemento constitutivo desse direito. A Lei n. 23/2010 no restringiu o seu campo de aplicao ao estatuto pessoal de membro sobrevivo de uma unio de facto dissolvida no seu domnio, ou seja, aps o incio da sua vigncia.

    IV - A Lei n. 23/2010 regula directamente este novo estatuto pessoal, abstraindo do facto que lhe deu origem: como evidente, tal situao jurdica prolonga-se no tempo, independentemente do momento em que se constituiu, i.e., da dissoluo, por morte de um dos seus membros, da unio de facto pr-existente.

    V - H que distinguir entre a entrada em vigor e a produo de efeitos da Lei n. 23/2010: a) como no foi estabelecida qualquer vacatio legis na lei, ela entrou em vigor no 5. dia aps a respectiva publicao; b) nos termos do art. 6. da Lei n. 23/2010, a aplicao da lei (nova) situao concreta, implica que o direito s prestaes sociais abrange apenas as prestaes que se vencerem a partir da entrada em vigor da Lei do Oramento do Estado para 2011.

    10-01-2012 Revista Excepcional n. 1938/08.2TBCTB.C1.S1 - 1. Seco Moreira Alves (Relator) Alves Velho Paulo S Investigao de paternidade Prazo de propositura da aco Prazo de caducidade Inconstitucionalidade I - O estabelecimento da paternidade insere-se no acervo dos direitos pessoalssimos, entre os

    quais, o de conhecer e de ver reconhecida a verdade biolgica da filiao, a ascendncia e marca gentica de cada pessoa.

    II - Contm, em si mesmo, por isso, o direito de investigar a maternidade ou paternidade. III - Tal direito fundamental tem proteco constitucional, como vertente que , do direito

    integridade moral, identidade pessoal e ao desenvolvimento da personalidade (arts. 16., 18., 25., n. 1, e 26. da CRP).

    IV - O Estado no pode, pois, restringir o assentamento da filiao/identidade pessoal, atravs de prazos de caducidade, sejam eles quais forem.

    V - O direito de investigar a paternidade ou maternidade , portanto, imprescritvel, no se justificando qualquer limite temporal para o seu exerccio.

    VI - O douto Ac. do TC n. 26/2006, que declarou a inconstitucionalidade, com fora obrigatria geral, do n. 1 do art. 1817. do CC na medida em que prev, para a caducidade do direito

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    de investigar a paternidade, um prazo de dois anos a partir da maioridade do investigante, apesar da aparente limitao do seu segmento decisrio, contm em si a ideia de imprescritibilidade das aces que tenham por objecto o reconhecimento judicial da paternidade ou maternidade.

    VII - A redaco actual do n. 1 do art. 1817. do CC, conferida pela Lei n. 14/2009, tambm ela inconstitucional, por violao dos arts. 16., n. 1, 18., 25., n. 1, 26., n. 1, e 36., n. 1, da CRP.

    10-01-2012 Revista n. 193/09.1TBPTL.G1.S1 - 1. Seco Moreira Alves (Relator) * Alves Velho Paulo S Acidente de viao Coliso de veculos Auto-estrada Indemnizao de perdas e danos Privao do uso de veculo Morte Danos no patrimoniais Responsabilidade pelo risco Excluso de responsabilidade I - A privao do uso de uma coisa pode constituir um ilcito gerador da obrigao de indemnizar,

    uma vez que impede o seu dono do exerccio dos direitos inerentes propriedade, i.e., de usar, fruir e dispor do bem nos termos genericamente consentidos pelo art. 1305. do CC.

    II - No suficiente, todavia, a simples privao em si mesma: torna-se necessrio que o lesado alegue e prove que a deteno ilcita da coisa por outrem frustrou um propsito real concreto e efectivo de proceder sua utilizao.

    III - So equitativos e equilibrados os valores indemnizatrios de 25 000 para a viva e 20 000 para cada um dos dois filhos, estabelecidos para compensar os danos morais prprios sofridos com a morte do seu marido e pai, em virtude de um acidente de viao, perante elementos de facto demonstrativos da brutalidade desse sinistro e de que os laos afectivos entre a vtima, sua mulher e filhos, eram muito fortes e profundos, e por isso srio e duradouro o desgosto causado pela sua morte em virtude do acidente.

    IV - Se os factos concretos apurados no processo no autorizam concluses seguras acerca do modo como ocorreram as vrias colises (suas causas) e, designadamente, acerca do comportamento dos condutores (se conduziam ou no com excesso de velocidade, desatentos, de forma descuidada, com os faris ligados, etc.), no pode atribuir-se qualquer parcela de culpa a nenhum dos intervenientes, pelo que, estando-se perante colises de veculos, vale a disposio do art. 506. do CC.

    V - A expresso acidente imputvel ao prprio lesado utilizada no art. 505. do CC para excluir a responsabilidade pelo risco estabelecida no art. 503,, n. 1, do mesmo diploma deve ser interpretada no sentido de acidente devido a facto praticado por ele, lesado, culposo ou no.

    VI - O facto do condutor de um dos veculos que colidiram ter sido atropelado no seu exterior, quando atravessava a auto-estrada no local da coliso em circunstncias e por razes no completamente esclarecidas, no determina necessariamente que se exclua a sua qualificao como detentor da viatura para o efeito previsto no art. 503., n. 1, do CC.

    10-01-2012 Revista n. 189/04.0TBMAI.P1.S1 - 6. Seco Nuno Cameira (Relator) Sousa Leite Salreta Pereira

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    Princpio da plenitude da assistncia dos juzes Respostas base instrutria Despacho Reclamao Nulidade processual Sanao Factos conclusivos Matria de direito Documento particular Valor probatrio Prova plena Princpio da livre apreciao da prova I - O princpio da plenitude da assistncia dos juzes, previsto no art. 654. do CPC, respeita

    unicamente ao julgamento da matria de facto, no impedindo que, julgada esta, outro magistrado profira a sentena, designadamente nos casos em que o juiz que presidiu audincia de julgamento foi transferido, deixando de exercer funes no tribunal onde o processo decorre.

    II - Se o juiz no procedeu leitura do despacho de respostas base instrutria, depositado na secretaria, a irregularidade cometida, impeditiva do exerccio da faculdade prevista no art. 653., n.s 4 e 5, do CPC, deve ser arguida, no prazo de 10 dias previsto no art. 153. do CPC, junto do tribunal que omitiu o acto, podendo constituir, se for desatendida, objecto de recurso de agravo, sob pena de se considerar sanada.

    III - O art. 646., n. 4, do CPC, manda ter por no escritas apenas as respostas sobre matria de direito, e no propriamente as respostas conclusivas, sendo duvidoso, no mnimo, que a regra nele contida possa aplicar-se por analogia a esta ltima situao, por no ser inteiramente lquido que procedam no caso omisso (factos conclusivos) as razes justificativas da regulamentao do caso previsto na lei (questo de direito).

    IV - praticamente impossvel formular questes rigorosamente simples, que no tragam em si implicadas juzos conclusivos sobre outros elementos de facto; e assim, desde que se trate de realidades apreensveis pelos sentidos e compreensveis pelo intelecto dos homens, no deve aceitar-se que uma pretensa ortodoxia e um exacerbado rigorismo na organizao da base instrutria impea a sua quesitao, sob pena da resoluo judicial dos litgios ir perdendo progressivamente o contacto com a realidade da vida e assentar cada vez mais em abstraces distantes dos interesses legtimos que o direito e os tribunais tm o dever de proteger.

    V - Resulta do art. 376., n. 2, do CC, que relativamente aos documentos particulares cuja autoria seja reconhecida pela parte a quem so opostos os factos compreendidos na declarao do seu autor consideram-se provados na medida em que forem contrrios aos interesses do declarante. Significa isso, na prtica, que nas relaes entre declarante e declaratrio tal declarao assume fora probatria plena, como se de confisso se tratasse art. 358., n. 2, do CC.

    VI - Porm, os documentos particulares escritos ou assinados por terceiros so apreciados livremente pelo tribunal, dado que a fora probatria estabelecida neste preceito s vale nas relaes entre as partes que os subscreveram.

    10-01-2012 Revista n. 197/04.0TCGMR.S1 - 6. Seco Nuno Cameira (Relator) Sousa Leite Salreta Pereira Respostas base instrutria Matria de facto

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    Alterao Poderes da Relao Direito de propriedade Aquisio originria Posse Compropriedade Diviso de coisa comum Usucapio I - O STJ no pode censurar o no uso pela Relao dos poderes de alterar a matria de facto, mas

    pode censurar o uso que a Relao deles faa. Assim, por exemplo, se a Relao, por presuno judicial, d como provado um facto que no foi alegado, nem quesitado, facto esse em oposio com um facto dado como provado por acordo das partes, em violao do disposto nos arts. 664., 490., n. 2, 659., n. 3, e 712., todos do CPC.

    II - De igual modo, o STJ pode sindicar qualquer desrespeito dos estritos pressupostos, em que a alterao, pela Relao, da matria de facto possvel, ao abrigo do art. 712. do CPC.

    III - A Relao pode alterar a matria de facto, constando do processo todos os elementos de prova que serviram de base deciso, no s relativamente aos pontos impugnados, nos termos do art. 690.-A do CPC, como nos demais casos em que entenda que a prova produzida deveria dar origem a outra resposta.

    IV - O caminho para a dominialidade a posse stricto sensu, no a posse precria ou mera deteno, onde apenas se verifica o corpus mas no concorre o animus possidendi.

    V - Vem sendo entendido que o estado de facto criado pela diviso feita pelos comproprietrios, sem escritura ou auto pblico, pode converter-se em estado de direito, pelo princpio da usucapio, se cada um dos comproprietrios tiver exercido posse exclusiva sobre o quinho que ficou a pertencer-lhe na diviso e tal posse se revestir dos requisitos legais.

    10-01-2012 Revista n. 2226/06.4TBFIG.C1.S1 - 1. Seco Paulo S (Relator) Garcia Calejo Helder Roque Desconsiderao da personalidade jurdica Pessoa colectiva Sociedade por quotas Contrato de compra e venda Contrato-promessa de compra e venda I - Justifica-se o levantamento da personalidade coletiva de sociedade que outorgou escritura de

    compra e venda em 21-12-1995, constatando-se que essa sociedade era mero testa de ferro do oculto comprador, seu scio dominante com 85% do capital, considerando-se, por via do levantamento ou desconsiderao da personalidade dessa sociedade, celebrado o contrato entre o oculto comprador e os demais intervenientes na compra e venda.

    II - O abuso da personalidade coletiva da sociedade revela-se pela circunstncia de que, com a interveno dela, e no do seu scio maioritrio homem oculto na escritura de 1995, pretendia impedir-se que os imveis adquiridos se integrassem no patrimnio desse scio que, muitos anos antes (1988), outorgara contrato-promessa de compra e venda com traditio desses mesmos imveis (apesar de ao tempo no ser deles ainda proprietrio), sujeitando-se, se no se acobertasse em 1995 sob o manto da personalidade coletiva da sua sociedade, ao pedido de execuo especfica (art. 830. do CC) por parte do promitente comprador de 1988, atenta a mora em que h muito incorria o promitente vendedor.

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    Revista n. 434/1999.L1.S1 - 6. Seco Salazar Casanova (Relator) * Fernandes do Vale Marques Pereira (Acrdo e sumrio redigidos ao abrigo do novo Acordo Ortogrfico) Impugnao pauliana Requisitos Os requisitos da impugnao pauliana (art. 610. do CC) so a anterioridade do crdito em relao

    ao acto impugnado e dele resultar a impossibilidade para o credor de obter a satisfao integral do seu crdito ou o agravamento dessa impossibilidade. A nossa lei exige ainda, no caso do acto impugnado ser oneroso, a m f do devedor, do terceiro, do alienante e do posterior adquirente (arts. 612. e 613. do CC), a qual se traduz na conscincia do prejuzo que o acto causa ao credor (art. 612., n. 2, do CC).

    10-01-2012 Revista n. 175/03.7TCFUN.L1.S1 - 6. Seco Salreta Pereira (Relator) Joo Camilo Fonseca Ramos Contrato misto Contrato-promessa Contrato de compra e venda Aces Loteamento Obrigao pecuniria Documento particular Ttulo executivo Execuo especfica I - Estabelecendo-se numa clusula contratual: O preo global da prometida compra e venda de

    aces de 862.287.000$00 e ser pago da seguinte forma: a) 10.000.000$00; b) 30.000.000$00; c) 30.000.000$00 at 30 dias a contar da aprovao do projecto de loteamento indispensvel converso do mencionado terreno rstico em urbano, que a segunda contratante se compromete a entregar na Cmara Municipal de (), no prazo de 60 dias a contar da data da publicao do Plano de Pormenor, esta clusula, vista isoladamente, constitui ttulo executivo particular, pois obedece aos requisitos previstos no art. 46., n. 1, al. c), do CPC.

    II - A clusula em questo no pode, porm, cindir-se do todo em que se encontra inserida, no pode autonomizar-se do negcio jurdico sinalagmtico que integra, traduzindo a obrigao em causa uma antecipao parcial do preo devido pela compra e venda das aces, ainda no realizada.

    III - A sociedade compradora, uma vez decorrido o prazo de pagamento, entrou em mora (art. 805., n. 1, al. c), do CC), possibilitando aos promitentes-vendedores pedir a execuo especfica do contrato, transformar a mora em incumprimento definitivo e pedir a respectiva resoluo, ou exigir indemnizao pela mora. O que no parece possvel a execuo isolada da referida obrigao, at porque h que no esquecer o sinalagma, a promessa de venda no cumprida.

    IV - A entrega das parcelas do preo global a que a sociedade se vinculou constitui uma garantia do cumprimento do contrato por parte desta, passando a assumir uma funo penitencial, aps a mesma esta obrigao est indissociavelmente ligada ao contrato-promessa celebrado, tendo por objectivo garantir o seu cumprimento e compensar o benefcio do prazo.

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    V - Os promitentes-vendedores no podem executar a obrigao questionada, sem discutirem o contrato no seu todo. O contrato celebrado no constitui ttulo executivo, sendo, no entanto, passvel de execuo especfica: a execuo especfica exige a propositura de aco declarativa, em que se pea ao tribunal que profira sentena que tenha os efeitos da declarao negocial do faltoso.

    10-01-2012 Revista n. 4902/08.8TBSTS-A.P2.S1 - 6. Seco Salreta Pereira (Relator) Joo Camilo Fonseca Ramos Contrato de arrendamento Impossibilidade superveniente Caducidade Indemnizao Danos no patrimoniais Danos patrimoniais Em caso de caducidade do contrato de locao decorrente da sua impossibilidade superveniente, no

    caso desta ser resultante de culpa do locador na produo do facto gerador da mesma, impende sobre aquele a responsabilidade de indemnizar o locatrio por tal situao, indemnizao essa fundada no art. 798. do CC e em cujo clculo sero atendveis os danos patrimoniais e no patrimoniais a que aludem os arts. 496. e 562. e segs. do CC, sendo que tal atribuio indemnizatria se mostra dependente de pedido formulado pelo inquilino em tal sentido.

    10-01-2012 Revista n. 384/04.1TBGDL.E1.S1 - 6. Seco Sousa Leite (Relator) Salreta Pereira Joo Camilo

    Sociedade comercial Patrimnio Capital social Credor Garantia das obrigaes Responsabilidade do gerente Culpa Dano Danos reflexos Nexo de causalidade I - O estatuto econmico da sociedade comercial factor decisrio do crdito que lhe concedido,

    no se limitando apenas ao capital social, mas tambm tendo em considerao o estofo patrimonial da empresa (sociedade) que possa tranquilizar os seus credores.

    II - Alis, h que ter em ateno que, como ensina o Prof. Pereira de Almeida, costuma-se dizer que o capital social a garantia comum dos credores, carecendo tal afirmao de ser explicada. Na verdade, diz o citado o Professor que o capital social figura no balano como rubrica do passivo e a garantia dos credores certamente constituda pelo activo, acrescentando, mais adiante, que o capital social distingue-se do patrimnio, o qual constitui efectivamente a garantia geral dos credores (art. 601. do CC).

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    III - Logo, as normas que tutelam a conservao ou promovam o aumento desse patrimnio tm tambm em vista a sua proteco, na expresso de Ildio Rodrigues, na obra referida no texto deste aresto.

    IV - S assim se entende que o legislador tenha estabelecido o enlace normativo entre a inobservncia culposa das disposies legais destinadas proteco dos credores sociais e a insuficincia do patrimnio social para a satisfao dos respectivos crditos, na previso do n. 1 do art. 78. do CSC.

    V - Em concluso, a diminuio do patrimnio social produzida pela inobservncia de normas legais do direito societrio, constitui um dano directo da sociedade, desde que se verifique o necessrio nexo de causalidade e um dano indirecto dos credores sociais, desde que essa diminuio se torne insuficiente para a satisfao dos respectivos crditos.

    VI - Consequentemente, as normas legais inobservadas, na medida em que da sua violao resultam danos (ainda que indirectos) para os credores da sociedade, visam igualmente evitar tais danos, logo, proteger tambm os referidos credores, e no somente lhes aproveitam.

    VII - Este o critrio teleolgico-racional que se mostra mais ajustado, no s no plano jurdico-societrio, como no aspecto da realidade scio-econmica e empresarial. 12-01-2012 Revista n. 916/03.2TBCSC.L1.S1 - 2. Seco lvaro Rodrigues (Relator) * Fernando Bento Joo Trindade

    Empreendimentos tursticos Factos provados Documento autntico Sentena Certido Ttulo constitutivo Liberdade contratual Vinculao Validade Abuso do direito Excepo de no cumprimento Carcter sinalagmtico Equilbrio das prestaes I - O art. 659., n. 3, do CPC manda que o julgador atenda, no s aos factos constantes da

    especificao e aos da base instrutria dados como provados, mas tambm queles provados por documentos, como sejam os constantes de uma certido com nota de trnsito em julgado de uma sentena proferida numa aco entre as mesmas partes.

    II - O regulamento interno de um empreendimento turstico no substitui o ttulo constitutivo desse mesmo empreendimento, o qual constitui uma imposio legal e de interesse pblico.

    III - No obstante, nada impede que as partes de, em termos provisrios e no mbito da liberdade negocial, assegurar o funcionamento desse mesmo empreendimento atravs de acordo meramente privado.

    IV - Sempre constituiria abuso de direito o facto do autor, depois de ter aceite tal regulamento interno e a ele se ter vinculado, vir, contra aquilo que seria de esperar, invocar a sua invalidade substancial, como forma de se eximir ao pagamento das taxas nele previstas.

    V - O conjunto das relaes bilaterais acordadas entre autor e ru inserem-se no contexto do gozo integrado, especfico de tal tipo de aldeamento, e esta insero faz com que tenha de se considerar que as relaes entre autor e r dimanem todas elas, do objectivo da explorao e gozo de uma nica realidade global; logo as obrigaes que da derivam para cada uma das partes so contrapartidas umas das outras.

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    VI - Assim se, no cumprindo o autor as suas obrigaes contratuais, pudesse ainda assim exigir o fornecimento de gua no caso de gozo de uma casa integrada num aldeamento turstico , entraria em crise o princpio do equilbrio contratual.

    12-01-2012 Revista n. 427/1999.E1.S1 - 2. Seco Bettencourt de Faria (Relator) Pereira da Silva Joo Bernardo

    Cheque Ttulo executivo Documento particular Quirgrafo Negcio causal Relao jurdica subjacente Negcio formal Requerimento executivo nus de alegao I - O cheque que no valha como ttulo executivo cambirio, pode continuar a valer como ttulo

    executivo, enquanto documento particular assinado pelo devedor, bastando para o efeito que o exequente alegue a obrigao causal no requerimento executivo e que este no seja um negcio jurdico formal.

    II - Resultando do requerimento executivo que as partes acordaram em que o exequente pagaria as dvidas no executado o que aquele fez nos anos de 2000 e 2001, liquidando a quantia de 39 903,83 e que este se obrigou a devolver ao exequente tais quantias, esto perfeitamente identificados os sujeitos, os termos e o objecto do negcio, mostrando-se por isso cumprido o nus de alegao exigvel ao exequente para que se possa servir do cheque como ttulo executivo, enquanto mero quirgrafo.

    12-01-2012 Revista n. 395/10.8TBLMG-A.P1.S1 - 2. Seco Bettencourt de Faria (Relator) Pereira da Silva Joo Bernardo

    Responsabilidade extracontratual Acidente de viao Direito indemnizao Privao do uso de veculo Dano emergente Lucro cessante I - A falta de reparao de uma viatura sinistrada ou, quando esta no seja vivel pela sua

    onerosidade, a indemnizao correspondente, no retiram ao lesado o prejuzo que este sofreu pela privao do veculo, pelo menos at reparao ou pagamento dessa mesma indemnizao.

    II - O chamado dano de imobilizao pode ser visto sob a perspectiva de um lucro cessante se determinar a frustrao de ganhos ou de rendimentos de explorao ou de um dano emergente quando h remdio para suprir a falta de utilizao, ainda que de forma onerosa.

    III - Tendo resultado provado que a autora recorreu a veculos de substituio, o dano ter de ser analisado nos custos que suportou para obter a disponibilizao desses veculos (alugueres) os

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    quais se reconduzem a prejuzos ou diminuies patrimoniais (danos emergentes), e no a frustrao de ganhos ou de rendimentos de explorao (lucros cessantes).

    IV - No caso sub judice em que se questiona o dano privao de uso em termos de lucros cessantes a indisponibilidade da viatura foi suprida pelo recurso ao aluguer de outras viatura, logo, a privao do uso daquela no implicou para a autora um dano em termos de lucro cessante (muito embora fosse possvel configurar um dano emergente, cuja indemnizao, no obstante, no foi peticionada).

    V - A simples privao do uso de um veculo, desacompanhada da demonstrao de outros danos seja na modalidade de lucros cessantes (frustrao de ganhos), seja na de danos emergentes (despesas acrescidas justificadas pela impossibilidade de utilizao) no susceptvel de fundar a obrigao de indemnizar.

    VI - Da que, no tendo a autora alegado, nem demonstrado, quaisquer ganhos ou vantagens frustradas pela impossibilidade de utilizao do veculo sinistrado, nem as despesas que teve de suportar com o aluguer de viaturas inexista dano de privao.

    12-01-2012 Revista n. 1875/06.5TBVNO.C1.S1 - 2. Seco Fernando Bento (Relator) Joo Trindade Tavares de Paiva

    Impugnao Escritura pblica Justificao notarial nus da prova Usucapio Aco de reivindicao Prazo Registo predial Presuno de propriedade I - A impugnao da escritura de justificao notarial reconduz-se impugnao dos factos a

    declarados como geradores da usucapio e tanto pode ter lugar em aco especialmente dirigida a tal fim (aco de declarao negativa em que, como decorre do art. 3434., n. 1, do CC, compete ao Ru a prova dos factos constitutivos do seu direito), como em aco de reivindicao por pessoa diversa do justificante, aco esta, por sua vez, imprescritvel, sem prejuzo dos direitos adquiridos por usucapio art. 1313. do CC e em que a usucapio funcionar com excepo peremptria do direito do autor, cuja prova competir ao ru.

    II - Logo, nada impede que os factos invocados na escritura de justificao notarial sejam impugnados depois de decorrido o prazo de 30 dias aps a publicao do extracto da escritura, seja por via de aco declarativa negativa, seja por via de aco de declarao positiva (maxime de reivindicao) intentada com fundamento no direito de propriedade de outra pessoa.

    III - Em ambos os casos incumbe ao ru o nus da prova dos factos constitutivos do direito que se arrogou na escritura de justificao notarial.

    IV - Perante a impugnao de tal escritura o justificante no beneficia da presuno decorrente do art. 7. do CRgP posto que esta assenta na validade e eficcia do ttulo que serve de base ao registo uma vez que a escritura de justificao notarial no comprova a legitimidade do interessado, nem a validade e regularidade do que nela se contm.

    12-01-2012 Revista n. 880/08.1TBVRS.E1.S1 - 2. Seco Fernando Bento (Relator) Joo Trindade Tavares de Paiva

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    Contrato de arrendamento Resoluo do negcio Causa de pedir Obras Deteriorao Demolio de obras Obrigao de indemnizar Reconstituio natural Dano Reparao do dano Danos futuros Limites da condenao Condenao em objecto diverso do pedido I - As obras realizadas no locado que, sem autorizao do senhorio, alteraram a diviso interna das

    suas divises e por isso fundamentaram a resoluo do contrato de arrendamento configuram-se como deterioraes incompatveis com uma utilizao prudente do mesmo e cuja eliminao compete ao locatrio, como tpica obrigao de indemnizao na forma de reconstituio natural.

    II - Os danos constitudos por essas alteraes no se confundem com os danos causados pela reposio do locado no estado em que o locatrio o recebeu, mas sobre este impende a obrigao de indemnizar uns e outros.

    III - Formulando-se um pedido de relativamente ao valor dos danos causados para reposio do locado no estado em que o mesmo se encontrava, caso venha a ser necessrio, se condenassem os Rus, solidariamente, no pagamento do valor que os autores venham a despender, a liquidar em execuo de sentena, tratando-se de um dano futuro, o mesmo deve improceder se no foram alegados e concretizados os danos que previsivelmente sero causados pelos trabalhos de reposio do locado.

    IV - A condenao na reposio do locado no estado anterior aquele em que se encontrava, aquando da celebrao do contrato ou no pagamento, no regime de solidariedade, do valor que os apelantes venham a ter que despender para tal efeito, relegando-se para execuo de sentena tal valor, configuraria perante aquele pedido nos termos em que foi formulado, condenao em objecto diverso do pedido, determinativa da nulidade da sentena nessa parte. 12-01-2012 Revista n. 649/09.6TVLSB.S1 - 2. Seco Fernando Bento (Relator) * Joo Trindade Tavares de Paiva

    Responsabilidade extracontratual Culpa Omisso Culpa do lesado Bem imvel Propriedade horizontal Partes comuns Compropriedade Inundao Escadas Dever de diligncia Perigo Responsabilidade solidria

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    I - O art. 483. do CC vem estabelecer uma clusula geral de responsabilidade civil subjectiva,

    fazendo depender a constituio da obrigao de indemnizao da existncia de uma conduta do agente (facto voluntrio), a qual represente a violao de um dever imposto pela ordem jurdica (ilicitude), sendo o agente censurvel (culpa), a qual tenha provocado danos (dano), que sejam consequncia dessa conduta (nexo de causalidade entre o facto e o dano).

    II - O juzo de censura ao agente apreciao da culpa pode ser estabelecido por duas formas: um primeiro critrio aponta para a apreciao da culpa em concreto, exigindo ao agente a diligncia que ele pe habitualmente nos seus prprios negcios ou de que capaz; um segundo critrio aponta para a apreciao da culpa em abstracto, exigindo a lei ao agente a diligncia padro dos membros da sociedade, a qual naturalmente a diligncia do homem mdio, do bonus pater famlias.

    III - O critrio adoptado no CC, no art. 799., n. 2, onde se prev que a culpa apreciada, na falta de outro critrio legal, pela diligncia de um bom pai de famlia, segundo as circunstncias do caso, aponta para o critrio tradicional da apreciao em abstracto segundo a diligncia do homem mdio, que continua a ser definido atravs da frmula tradicional do bom pai de famlia, significando a referncia a circunstncias de cada caso que o prprio padro a ter em conta varia em funo do condicionalismo da hiptese e, designadamente, do tipo de actividade em causa.

    IV - Este juzo de censura pode resultar de infraco de uma norma destinada a proteger interesses alheios produzindo um dano, incluindo-se aqui a violao das normas que visam prevenir, no a produo de um dano em concreto, mas sim o simples perigo do dano em abstracto.

    V - A relevncia jurdica da omisso est ligada ao dever genrico de preveno de perigo, querendo-se com isto significar que o criador ou o mantenedor da situao especial de perigo tem o dever jurdico de o remover, sob pena de responder pelos danos provenientes da omisso.

    VI - Tendo resultado provado que devido ao facto de as escadas do prdio onde vivia em fraco arrendada a autora caiu no ltimo lance de escadas entre a fraco da porteira e a porta do prdio , e que esse mesmo prdio est constitudo em propriedade horizontal, encontrando-se as mesmas inscritas a favor do ru e dos intervenientes, so os mesmos responsveis (enquanto comproprietrios dessa parte comum), pela omisso de reparao da instalao geral de gua, posto que no s no acautelaram a ruptura da canalizao, como no procederam sua reparao imediata.

    VII - Significa isto que os condminos poderiam ter evitado a queda da autora caso tivessem agido com o dever geral de cuidado, observando as mais bsicas regras de segurana, que se limitariam a uma reparao imediata da ruptura ou, pelo menos, a alertar a EPAL para fechar a gua, sem omitir a necessria limpeza das escadas.

    VIII - Tanto os condminos cujas fraces do acesso s aludidas escadas, quanto os condminos cujas fraces do acesso imediato rua so comproprietrios no s das escadas como das instalaes gerais da gua, pelo que todos eles so co-responsveis pela queda da autora, sendo a sua obrigao de indemnizar solidria.

    IX - Inexiste culpa da autora ao, vendo as escadas inundadas, ainda assim resolver atravess-las, posto que no s era inexigvel que a lesada ficasse retida em casa at que a gua fosse cortada pela EPAL (o que s aconteceu 10 dias depois), como ainda no resultou provado que as escadas estivessem intransitveis e que, por via disso, ningum pudesse sair de casa.

    12-01-2012 Revista n. 149/2002.L2.S1 - 7. Seco Granja da Fonseca (Relator) Silva Gonalves Pires da Rosa

    Aco de reivindicao Registo predial Descrio predial

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    Presunes legais Pedido Pedido implcito Cumulao de pedidos Reconhecimento do direito Usucapio Aquisio originria Emparcelamento Fraccionamento da propriedade rstica I - A finalidade do registo predial no garantir os elementos de identificao, mas apenas a de

    assegurar que, relativamente a esse prdio, se verificam certos factos jurdicos, sendo assim legalmente admissvel que, no julgamento da matria de facto, o tribunal conclua, no tocante s reas e confrontaes dos imveis constantes do registo, por forma distinta descrio dos mesmos retratada naquele registo.

    II - Assim, os elementos integrantes da descrio predial designadamente a rea, confrontaes e/ou limites dos imveis registados no beneficiam da presuno de verdade do art. 7. do CRgP, dada a frequente falta de rigor/fidedignidade dos factos descritivos registais, no que concerne sua materialidade.

    III - A aco de reivindicao uma aco petitria que tem por objecto o reconhecimento do direito de propriedade por parte do autor e a consequente restituio da coisa por parte do possuidor ou detentor dela.

    IV - Mas, embora se reconhea que, nas aces condenatrias sobre direitos reais, se renem dois juzos um de apreciao (implcito) e outro de condenao (explcito), de tal modo que o tribunal no pode condenar o eventual infractor sem que antes se certifique da existncia e violao do direito do demandante essa cumulao de pedidos apenas de carcter processual, pois que substancialmente o pedido um s: o de restituio da coisa.

    V - Por isso se vem aceitando que se o autor se limita a pedir a restituio da coisa no formulando expressamente o pedido de reconhecimento do direito de propriedade este pedido se deva considerar implcito naquele.

    VI - A invocao de usucapio pode ser feita de modo implcito, desde que se aleguem os factos com ela condizentes, no sendo necessria a formulao de um pedido expresso de reconhecimento do direito de propriedade por via da usucapio.

    VII - A usucapio determina o aparecimento de um direito novo, afastando a relevncia de outros direitos que com ele conflituem; assim, irrelevam quaisquer irregularidades ou vcios de natureza formal relativas alienao ou transferncia da coisa para o novo titular, tais como os referentes ao fraccionamento ou emparcelamento.

    12-01-2012 Revista n. 136/05.1TBFUN.L1.S1 - 7. Seco Granja da Fonseca (Relator) Silva Gonalves Pires da Rosa

    Recurso de apelao Gravao da prova Impugnao da matria de facto Transcrio Rejeio de recurso Despacho de aperfeioamento Lei interpretativa

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    I - O art. 690.-A do CPC, aditado pelo DL n. 39/95, de 15-02, imps ao recorrente o nus de transcrio, mediante escrito dactilografado, das passagens da gravao em que se fundava o recurso da matria de facto.

    II - No obstante esta exigncia ter sido modificada pelo DL n. 183/2000, de 10-08, uma vez que aquando da entrada em vigor da mesma o ru j havia sido citado, continuava a ser aplicvel aos autos a verso resultante do DL n. 39/95, de 15-02 (art. 7., n.s 3 e 8, do DL 183/2000), razo pela qual se impunha aos apelantes a transcrio dos depoimentos que esta exigia.

    III - O prprio texto do art. 690.-A do CPC (na redaco do DL n. 39/95) cominava a falta de transcrio com a rejeio do recurso, diferentemente do art. 690., n. 4, do mesmo diploma que, determinava o convite ao aperfeioamento, razo pela qual desta dicotomia sempre se entendeu que para aquela situao no tinha o legislador querido prever o convite ao aperfeioamento, posio que, alis, veio expressamente a adoptar no art. 685.-B do CPC (redaco dada pelo DL n. 303/2007, de 24-08), a qual sempre ser de considerar como interpretativa.

    12-01-2012 Revista n. 11/1999.L1.S1 - 2. Seco Joo Bernardo (Relator) Oliveira Vasconcelos Serra Baptista

    Pedido Causa de pedir Princpio da substanciao Limites da condenao Contrato-promessa Validade Nulidade do contrato Objecto do processo Objecto do recurso I - O objecto da aco, considerando o princpio da substanciao, definido pelo pedido e pela

    causa de pedir, sendo que este objecto encerra, ele prprio, os limites da sentena, nos termos do art. 661., n. 1, do CPC.

    II - Os autores ao pretenderem no recurso de apelao que oportunamente intentaram a declarao de nulidade do contrato-promessa quando na petio inicial, sempre pugnaram pela validade do mesmo situaram-se fora dos limites que eles mesmos traaram e, consequentemente, que as leis processuais lhes impunham, vcio esse que se mantm no presente recurso de revista.

    12-01-2012 Revista n. 105/03.6TBMCN.P1.S1 - 2. Seco Joo Bernardo (Relator) Oliveira Vasconcelos Serra Baptista

    Matria de facto Poderes do Supremo Tribunal de Justia Documento Ordem dos Advogados Documento particular Documento autntico Princpio da livre apreciao da prova

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    I - O art. 722., n. 2, do CPC admite a alterao factual em recurso de revista, nos casos em que exista uma disposio expressa da lei que exija certa espcie de prova para a existncia do facto ou que fixe a fora de determinado meio de prova.

    II - O ofcios emanados da Ordem dos Advogados no tm natureza de documentos autnticos, no surtindo os efeitos probatrios fixados pelo art. 372. do CPC, razo pela qual a sua valorao apenas cabe s instncias.

    12-01-2012 Revista n. 2/08.9TBCVL.C1.S1 - 2. Seco Joo Bernardo (Relator) Oliveira Vasconcelos Serra Baptista

    Contrato de empreitada Defeitos Defeito da obra Denncia Caducidade I - O empreiteiro no responde pelos defeitos da obra se o dono desta a aceitou sem reserva, com

    conhecimento deles, presumindo-se conhecidos os aparentes, tenha havido ou no aceitao da obra art. 1219. do CC.

    II - S desta denncia nascem e vivem os direitos conferidos nos arts. 1221. a 1223. do CC: eliminao dos defeitos, reduo do preo ou resoluo do contrato e indemnizao dos prejuzos sofridos (sempre sucednea ou complementar dos direitos antecedentes).

    III - A denncia pode ser feita atravs de contactos pessoais e telefnicos, sem ser necessrio especificar desde logo qual dos direitos conferidos por lei se pretende exercer, sendo certo que o reconhecimento do defeito, com promessa de o eliminar, dispensa a denncia e constitui impedimento de caducidade (art. 1220., n. 2, do CC).

    IV - Nos presentes autos, tendo resultado provado que a R. denunciou Autora um defeito no sistema de ventilao e depurao do ar referindo a existncia de fumo e cheiro e que na sequncia da mesma a Autora enviou um tcnico (em Janeiro de 2006) que colocou um filtro de carvo e uma hotte que fizeram com que a situao melhorasse, mas no fosse totalmente debelada a situao do fumo, de concluir que a R aceitou a obra no estado em que estava, uma vez que, no s continuou com o estabelecimento em funcionamento, como no fez qualquer reclamao, mesmo aquando da deslocao do tcnico da Autora 2 meses depois a fim de efectuar uma manuteno do sistema. 12-01-2012 Revista n. 445/07.5TJLSB.L1.S1 - 2. Seco Joo Trindade (Relator) Tavares de Paiva Bettencourt de Faria Lopes do Rego (vencido) Orlando Afonso

    Prestao de contas Sociedade entre cnjuges Contrato de distribuio Titularidade Obrigao

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    I - A aco de prestao de contas tem por objecto o apuramento e aprovao das receitas obtidas e das despesas realizadas por quem administra bens alheios e a eventual condenao no pagamento do saldo que venha a apurar-se.

    II - Em contrato de distribuio celebrado entre autor e r, casados entre si, enquanto distribuidores independentes auferindo ambos retribuies mensais sob a forma de comisses e bnus , e a sociedade M, no ocorre alterao da titularidade do contrato quando o autor deixa de exercer a funo de distribuio, a qual passa a ser exercida apenas pela r, que da mesma retira a sua principal fonte de rendimento.

    III - Assumindo a r, em exclusivo, a actividade de distribuio, fica obrigada a prestar contas ao autor, nos termos definidos pelos arts. 1014. e segs. do CC.

    IV - A obrigao de prestar contas, referida em III, emerge do contrato de distribuio.

    12-01-2012 Revista n. 357/06.TBCMN.G1.S1 - 2. Seco Joo Trindade (Relator) Tavares de Paiva Bettencourt de Faria

    Responsabilidade extracontratual Acidente de viao Clculo da indemnizao Danos no patrimoniais Incapacidade permanente parcial Equidade Juros Actualizao I - Os mtodos de clculo indemnizatrios consagrados na Portaria n. 377/2008 de 26-05 no so

    directamente aplicveis resoluo judicial dos litgios referentes indemnizao do dano corporal resultante de acidentes rodovirios.

    II - A fixao de uma indemnizao no caso de incapacidade no pode ter como limite inultrapassvel ou como critrio orientador os valores que tm sido encontrados para as situaes de perda de vida; no obstante o bem jurdico mais valioso ser a vida, a impossibilidade de gozar e aproveitar em pleno o que ela nos proporciona, deve ser valorada em nveis de fixao superior aos que so utilizados na indemnizao do direito vida.

    III - Tendo em ateno que: (i) o autor em consequncia do acidente ficou com sequelas que lhe determinaram uma incapacidade permanente de 80%; (ii) passou a ver-se permanentemente dependente de terceiras pessoas para o exerccio da sua vida pessoal diria, posto que ficou sujeito utilizao da cadeira de rodas; (iii) foi intervencionado cirurgicamente trs vezes com complexidade, seguindo-se-lhe uma reviso cirrgica incluindo ao crebro, tendo para o efeito sofrido 7 internamentos; (iv) ficou com impotncia funcional ao nvel do membro superior esquerdo e incontinncia urinria e fecal; (v) deixou de participar em actividades da vida diria e familiar, sendo que era uma pessoa ligada aos meios literrios e do teatro; (vi) padeceu dores fortes no acidente e tratamentos num quantum doloris de grau 5, e um dano esttico de grau 4, na escala de 7; (vii) a frustrao duma expectativa de vida com qualidade e sade trouxeram-lhe depresso, ansiedade, sentimento de inutilidade e vontade de morrer; afigura-se adequada a indemnizao fixada pelas instncias a ttulo de dano no patrimonial no valor de 60 000.

    IV - A indemnizao por danos no patrimoniais sempre uma deciso actualizadora: o quantum respectivo, no estando previamente balizado, s achado com referncia ao momento concreto da deciso.

    V - Se a deciso condenatria no utiliza critrios actualizadores do montante indemnizatrio peticionado, nada obsta a que, em sede de condenao, se contabilizem os juros a partir da citao.

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    12-01-2012 Revista n. 4867/07.3TBSTS.P1.S1 - 7. Seco Lopes do Rego (Relator) * Orlando Afonso Tvora Victor

    Conhecimento no saneador Saneador-sentena Contrato de empreitada Caducidade Defeitos Defeito da obra Facto controvertido Base instrutria

    No permitindo a matria de facto assente apurar o momento da entrega da obra, bem como o

    momento em que ocorreu a recepo da obra e consequentemente estabelecer com segurana o dies a quo da contagem do prazo quinquenal dentro do qual a r responsvel por quaisquer deficincias, deterioraes ou indcios de falta de solidez que a obra revele (constante do contrato de empreitada) o conhecimento do mrito da excepo peremptria de caducidade foi prematuro, razo pela qual bem andou a Relao ao relegar o conhecimento da mesma para deciso final, aps o apuramento da factualidade controversa neste particular.

    12-01-2012 Revista n. 1358/TBOER.L1.S1 - 2. Seco Joo Trindade (Relator) Tavares de Paiva Abrantes Geraldes

    Terceiro Escritura pblica Contrato de mtuo Confisso de dvida Nulidade do contrato Documento autntico Documento particular Valor probatrio Fora probatria plena I - No pode invocar-se no confronto de terceiros, cujos direitos so abalados pelo teor de

    declarao confessria, constante de certa escritura pblica em que intervieram credor e devedor, o valor de prova plena de tal confisso extrajudicial, em termos de vedar ao terceiro a impugnao, por qualquer meio probatrio, da validade ou veracidade do reconhecimento confessrio.

    II - Reconhecido pelo credor, nos articulados, que certa escritura, aparentemente constitutiva de um mtuo, continha afinal um mero acto recognitivo das dvidas emergentes de anteriores e informais emprstimos, consubstanciados em documentos particulares juntos e logo impugnados pela contraparte e que sero, desde logo, nulos na medida em que no hajam respeitado as exigncias de forma impostas pelo art. 1143. do CC incumbe-lhe fazer prova da autoria e genuinidade de tais documentos e de que na base deles esteve a efectiva entrega ao muturio das quantias pecunirias neles mencionadas.

    12-01-2012

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    Revista n. 6933/04.8YYLSB-C.L1.S1 - 7. Seco Lopes do Rego (Relator) * Orlando Afonso Tvora Victor

    Falncia Reclamao de crditos Privilgio creditrio Garantia real Contrato de trabalho Lei aplicvel Aplicao da lei no tempo

    I - O momento decisivo para definir o regime normativo aplicvel graduao de crditos no

    mbito de um processo de liquidao universal o do decretamento definitivo da falncia, e no o que, porventura, vigorar na data do encerramento da discusso e julgamento do subsequente processo de reclamao, verificao e graduao de crditos , tramitado como dependncia do procedimento global de liquidao universal do patrimnio do falido.

    II - Tendo a falncia sido decretada por sentena proferida em 10/11/03 e que transitou em julgado em 13/1/04, a cristalizao nesta data das garantias reais dos trabalhadores inibe a aplicao do inovatrio regime normativo, consubstanciado na previso de um privilgio imobilirio especial, editado por diploma legal o Cdigo do Trabalho que apenas passou a vigorou no ordenamento jurdico cerca de 6 meses aps a definitividade do decretamento da falncia.

    III - Neste caso, gozam os trabalhadores do regime emergente do preceituado nas Leis 17/86 e 96/01 ou seja, -lhes aplicvel o privilgio imobilirio geral, com o regime fixado pelo art. 749 do CC, (como decorrncia, desde logo, das alteraes introduzidas em sede de privilgios creditrios pelo DL 38/03, j em vigor data da sentena que decretou a falncia), no prevalecendo, deste modo, os seus direitos sobre as hipotecas anteriormente registadas e reclamadas na falncia.

    12-01-2012 Revista n. 91/09.9T2AVR-A.C1.S1 - 7. Seco Lopes do Rego (Relator) * Orlando Afonso Tvora Victor

    Omisso de pronncia Nulidade de acrdo Erro de julgamento Matria de facto Poderes da Relao Impugnao da matria de facto Gravao da prova Renovao da prova

    I - Constando do acrdo recorrido que o conhecimento de uma determinada questo fica

    prejudicado pelo entendimento nele vertido, no existe omisso de pronncia; o que h o entendimento de que tal questo no pode ser conhecida, entendimento esse cuja bondade no pode dar origem a uma nulidade, mas antes ao conhecimento do seu mrito.

    II - No sendo a Relao um segundo tribunal de 1. instncia, mas sim um primeiro tribunal de 2. instncia e no sendo caso, por isso, de se realizar um novo julgamento integral a reapreciao da matria de facto que a feita incidir fundamentalmente sobre a apreciao dos meios de prova que o tribunal de 1. instncia utilizou para fundamentar as respostas, servindo-se, no s dos elementos fornecidos pelas partes, mas tambm de todos os elementos em que aquele tribunal se tenha fundado cf. art. 712., n. 2, do CPC.

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    III - No obstante as respostas aos concretos pontos impugnados no terem assentado no depoimento da testemunha cuja depoimento no ficou gravado, acaso a Relao entendesse que o mesmo era absolutamente indispensvel para o apuramento da verdade (e perante a impossibilidade de o apreciar em gravao) poderia determinar a renovao do mesmo na prpria Relao, conforme o permite o art. 712., n. 3, do CPC.

    12-01-2012 Revista n. 4674/04.5TBSTS.S1 - 2. Seco Oliveira Vasconcelos (Relator) Serra Baptista lvaro Rodrigues

    Recurso de revista Poderes do Supremo Tribunal de Justia Matria de facto Fora probatria Letra de cmbio Aval Avalista Benefcio da excusso prvia Protesto Falta de pagamento Insolvncia

    I - O STJ, como tribunal de revista que , aplica definitivamente aos factos fixados pelo tribunal

    recorrido o regime jurdico que julgue aplicvel (art. 729. do CPC), no conhecendo, consequentemente, de matria de facto, salvo havendo ofensa de uma disposio expressa de lei que exija certa espcie de prova para a existncia do facto ou que fixe a fora de determinado meio de prova (art. 722., n. 2, do CPC).

    II - Nesta ltima situao a interveno do STJ residual e limita-se apenas a averiguar da observncia das regras de direito probatrio material.

    III - O aval, apresentando-se como uma garantia do pagamento da letra ou livrana, no tem carcter subsidirio em relao a esta, mas antes cumulativo; ou seja, embora seja acessrio a outra obrigao, e obrigao do avalista originada por uma obrigao autnoma.

    IV - Uma vez que, nos termos do art. 32. da LULL, o dador do aval responsvel da mesma maneira que a pessoa por ele afianada, no se torna necessrio primeiro pedir ao avalizado o cumprimento da obrigao para depois, e s na recusa deste, se exigir o pagamento a qualquer outro signatrio (art. 47. da LULL).

    V - Assim, no se pode afirmar que o avalista goze do benefcio de excusso prvia. VI - O portador de uma letra ou livrana conserva os seus direitos de aco contra o avalista do

    aceitante independentemente de protestou ou falta de pagamento, pois responsvel da mesma maneira que este e continua e ser responsvel, embora a letra no tenha sido protestada por falta de pagamento.

    VII - Tendo em conta a autonomia das obrigaes do avalista em relao s obrigaes da avalizada, a declarao de insolvncia desta (avalizada) nenhuma influncia tem nas obrigaes do avalista, uma vez que estas obrigaes se mantm independentemente das vicissitudes da obrigao do avalizado, salvo ocorrncia de algum vcio de forma.

    12-01-2012